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Virar a sala de aula ao contrário!

17/01/2020

Eu ensino.
Tu aprendes!... Ou não!

Estas considerações iniciais podem parecer abusivas, mas há momentos em


que, apesar de tudo o que fazemos, não conseguimos que alguns alunos
aprendam. Umas vezes por culpa própria, outras porque as diferentes variáveis
em torno do processo não o permitem.

Gosto, enquanto professor, de equacionar o que está nas minhas mãos fazer
para que mais alunos aprendam e, nos últimos anos, tenho percebido que as
emoções são um elemento central da aprendizagem. Por isso, quando a
aprendizagem é realizada entre pares – alunos com alunos –, até pela
linguagem utilizada, o sucesso tende a ser maior. Não se trata de nada
inovador, apenas a constatação de que os alunos conseguem aprender uns
com os outros, desde que enquadrados numa atividade pensada pelo
professor.

Por outro lado, nos momentos em que o trabalho interpares se realiza, o


professor tem mais disponibilidade para acompanhar os alunos com mais
dificuldades, criando condições para uma sala de aula mais inclusiva.

Daí que traga para este texto uma metodologia que a prática docente dos
últimos anos me leve a considerar um dos caminhos possíveis a seguir.

A Instrução Interpares é uma metodologia criada por Eric Mazur (Peer


Instruction) que coloca o aluno como autor da sua própria aprendizagem, tendo
no professor a referência para esse processo.
A metodologia desenvolve-se em algumas etapas:

1. O professor prepara recursos e desenha uma atividade para os alunos


realizarem como trabalho autónomo;
2. Os alunos desenvolvem a tarefa conceptualizada pelo professor – poderá
ser trabalho de casa ou trabalho em sala de aula, no caso dos alunos mais
novos;
3. O professor realiza uma avaliação conceptual;
4. Conforme os resultados obtidos, o professor segue um de três caminhos:
 a. avança para o tópico seguinte, depois de realizada uma síntese;

 b. orienta um trabalho interpares, realizando depois uma nova avaliação


conceptual;

 c. faz uma exposição sobre o tópico, avançando depois novamente para a


avaliação conceptual.

Vejamos cada etapa em pormenor.


1.
A preparação da atividade é um passo decisivo, uma vez que é necessário ter
o cuidado de fazer uma seleção eficaz do conceito a abordar e, sobretudo, dos
recursos a fornecer aos alunos para o seu trabalho prévio à aula.

A atividade a realizar pelos alunos poderá ter diferentes suportes – um texto do


manual, um vídeo, um podcast gravado pelo professor ou uma simples
apresentação –, desde que lhes permitam conhecer o conceito que se pretende
estudar.
2.
Este é o primeiro passo, do ponto de vista dos alunos, que, de forma
autónoma, realizam a tarefa proposta pelo professor em torno do conceito a
estudar. No caso de alunos mais novos, poderá ser útil que este primeiro
momento aconteça em sala de aula. Já no caso de alunos mais experientes, a
tarefa proposta pelo professor poderá ser realizada como trabalho de casa.

É importante que o desafio inicial inscrito na tarefa apresentada pelo professor


seja associado a uma questão, que deverá ser aberta e cuja resposta não
deverá acontecer com uma simples leitura na diagonal do recurso fornecido
aos alunos.

3.
Após a realização da atividade proposta, os alunos realizam um teste
conceptual para verificar o seu nível de aprendizagem. Este teste pode ser feito
de forma mais rudimentar, com uns simples cartões, ou recorrendo a
aplicações digitais, como descrito mais à frente.

4.
Da análise às respostas obtidas depende o caminho a seguir:

- se 70% dos alunos tiverem alcançado valores superiores de aprendizagem, o


professor deve fazer uma síntese e avançar para o tópico seguinte;

- se os resultados mostrarem que entre 30% e 70% dos alunos respondeu de


forma adequada, o professor deve avançar para o trabalho interpares, que terá
como conclusão um novo teste conceptual;

- quando os resultados indicam que a grande maioria dos alunos não


aprendeu, será indicado o professor realizar uma apresentação sobre o tópico
e depois um novo teste conceptual. Neste caso, da parte do professor, importa
refletir se os recursos previamente disponibilizados (manual, vídeos na web,
etc…) terão sido os mais adequados.

A avaliação conceptual
É importante equacionar a forma que irá assumir a avaliação conceptual, sendo
aconselhável optar por questões fechadas que permitam aos alunos responder
de forma precisa, sem ambiguidades. Estamos a falar, por exemplo, de cinco
questões de escolha múltipla, ou de questões para resposta verdadeiro/falso.

Há hoje ferramentas digitais que permitem fazer este tipo de avaliações de


forma muito ágil. Vejamos algumas.
Plickers – https://get.plickers.com
É uma ferramenta gratuita que exige apenas o computador e o projetor da sala,
bem como um telemóvel do professor e acesso à Internet. As folhas de
resposta dos alunos são impressas no formato QR Code. Nesta aplicação os
alunos não necessitam de ter telemóvel, o que a torna a ferramenta mais
adequada.

Socrative – https://socrative.com
Trata-se de uma outra aplicação web que permite a realização de avaliação
com os alunos. Um pouco mais complexa que o Plickers e mais exigente nos
recursos, é, contudo, muito eficaz.

Kahoot – https://kahoot.com
É talvez a mais conhecida ferramenta digital que transporta o conceito de
gamificação para a sala de aula. Exige que cada aluno tenha um telemóvel e,
por isso, é um pouco menos interessante que o Plickers.

No entanto, na ausência de uma solução digital, o professor pode


simplesmente recorrer a cartões coloridos ou identificados com letras. Cada
aluno terá quatro cartões, correspondentes às quatro opções de resposta, que
irá usar para responder a cada uma das questões do teste conceptual que o
professor fará. Embora simples e acessível, esta opção tem a desvantagem de
não se obter de imediato os resultados dos alunos.

Parece-nos, pois, que virar a sala de aula ao contrário, colocando os alunos a


trabalhar em conjunto, mas tendo sempre presente de forma clara quais os
conteúdos em causa, poderá ser uma forma de melhorar a aprendizagem e,
sobretudo, tornar mais felizes as nossas salas de aula.

Por João Paulo Silva

Professor e Formador de Professores

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