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como-ajudar-seus-alunos-nesse-processo

Publicado em NOVA ESCOLA Edição 230, 01 de Março | 2010

Avaliação

Autoavaliação: como
ajudar seus alunos nesse
processo
A reflexão sobre o próprio desempenho é um meio eficiente
para o aluno aprender a identificar e corrigir seus erros.
Nesse caminho, o papel do professor é essencial
Bianca Bibiano

Ao término de cada bimestre, você reserva alguns


minutos de aula para que cada aluno reflita sobre
o que estudou e como fez isso. Numa ficha com
uma série de itens, é preciso responder a
perguntas sobre comportamento, procedimentos
de estudo e conteúdos. No fim, cada um atribui
uma nota a si próprio, que você vai considerar na
média da disciplina. "Até que a turma reconhece
as próprias falhas!", você se surpreende. Mas, nos
É REVENDO POSTURAS meses seguintes, a garotada não corrige os
Na pré-escola da Escola da deslizes que apontou na autoavaliação. Por que
Vila, a autoavaliação oral é o isso ocorre?
caminho para cumprir
combinados. Foto: Rodrigo Erib A intenção foi a melhor possível: a abertura para
o diálogo na avaliação é uma medida
interessante tanto para o estudante tomar consciência de seu percurso de
aprendizagem e se responsabilizar pelo empenho em avançar - é a chamada
autorregulação - como para ajudar o docente a planejar intervenções em sala. Mas
a forma como a autoavaliação foi aplicada não é a mais recomendável. É provável
que a atividade tenha sido encarada como uma mera formalidade. Nesses casos, a
tal "postura crítica" da turma é pouco mais que um apanhado de coisas que o
professor espera ouvir: "Preciso bagunçar menos", "Tenho de respeitar os colegas",
"Faltou estudar antes para a prova". Já aconteceu com você?

Da lista de equívocos que se pode apontar no exemplo do parágrafo inicial (leia o


quadro abaixo), o mais grave é a falta de acompanhamento e intervenção do
professor. "Após o aluno refletir sobre o que e como aprendeu, o professor deve
realizar um conjunto de ações para modificar o que está inadequado", afirma
Leonor Santos, docente da Universidade de Lisboa, em Portugal, e especialista no
assunto. "O objetivo é levar o estudante a confrontar seu desempenho com o que
se esperava e agir para reduzir ou eliminar essa diferença."

Os principais equívocos na autoavaliação

Deixar o aluno dar a sua própria nota


É algo que nada acrescenta à aprendizagem. Ainda que seja adequado
esclarecer os conceitos que justificam a nota, estabelecê-la é tarefa que cabe
apenas ao professor.

Fazer perguntas genéricas


Questões como "O que você aprendeu nesse semestre?" e "Como avalia sua
aprendizagem?" dão margem a respostas vagas. Quanto mais específicas as
indagações, mais o estudante consegue se focar no que precisa avançar
naquele momento.

Dizer os resultados sem comentar


Não adianta arquivar tudo sem se deter no que foi observado pelos alunos. A
autoavaliação serve como uma maneira de promover a autorregulação.
Especialmente no início, o professor tem um papel essencial nesse processo,
debatendo as reflexões de cada estudante e mostrando as dificuldades que
passaram despercebidas.

Deixar tudo para o fim do bimestre


Definir um único momento para o aluno pensar em toda a sua caminhada
torna a reflexão mais superficial. É preciso identificar quais pontos têm de ser
melhorados e abordá-los de maneira objetiva ao longo de todo o
aprendizado.

Saber o que o docente pensa ajuda o estudante a se avaliar

No início do processo, é provável que os comportamentos tendam a extremos, da


rigidez à condescendência. O trabalho, aqui, é ajudar a construir um retrato mais
próximo da realidade. A avaliação do professor ajuda o aluno a estabelecer
parâmetros para refletir sobre se sua autoimagem está adequada. "Nesse
processo, é preciso dialogar com o aluno sobre os critérios que balisaram sua
escolha, debatendo possíveis divergências", diz Andréa Luize, coordenadora
pedagógica da Escola da Vila, em São Paulo.

Outra precaução diz respeito à natureza da autoavaliação. Para Leonor, não se


deve misturar procedimentos, atitudes e conteúdos. É possível analisar
separadamente cada um deles. No caso dos conteúdos, o ideal é abordar o que foi
aprendido no encerramento da cada tema (leia o quadro abaixo), garantindo que
haja tempo para correções. Tornar a reflexão constante é importante pela
dificuldade, sobretudo nos anos iniciais da escolarização, de abordar o equívoco
muito depois do ocorrido. Um aluno que erre um problema de divisão no dia
anterior à autoavaliação tenderá a considerar o equívoco com mais atenção do
que no fim do bloco de conteúdo.

Para ajudar a turma a tomar as rédeas do próprio aprendizado, é possível lançar


mão de vários tipos de autoavaliação. A modalidade escrita é a mais comum e
serve para diversas finalidades - além de aferir conteúdos, é uma boa opção para
trabalhar com procedimentos. Nesse caso, apostar em respostas discursivas é uma
alternativa interessante. Na Escola da Vila, a turma de 4º ano é convidada a ler um
livro mais longo e, em seguida, refletir sobre a tarefa com algumas questões:
quanto você conseguiu ler? Como organizou a leitura: leu cada dia um pouquinho,
tudo de uma vez, dividiu em capítulos? Que atitudes contribuíram para conseguir
cumprir o prazo? O que você acha importante para dar conta de ler o próximo? No
fim da atividade, a socialização das respostas ajuda cada um a descobrir novas
estratégias e rever as suas.

Quando a ideia é avaliar atitudes, a alternativa é criar uma ficha que possa indicar
à garotada as evoluções ao longo do tempo. Em outro exemplo da Escola da Vila,
dessa vez no 3º ano, itens sobre a postura em sala de aula - "Realizo as atividades
com atenção", "Organizo a mesa para o trabalho", "Levanto a mão para falar" etc. -
são avaliados em uma tabela de quatro colunas. Cada quadradinho é pintado de
acordo com o desempenho individual: vermelho para "Consigo sempre", verde
para "Consigo às vezes" e azul para "Nunca consigo". "O uso das cores é uma
forma direta e rápida de o aluno perceber no que evoluiu e no que precisa
melhorar", diz Andréa.

Aprendendo com a reflexão

A autoavaliação de aprendizagem de conteúdos exige que a garotada participe


da definição de critérios e ações para avançar. Veja como os alunos de 3º ano
da Escola da Vila analisaram a produção de biografias.
1 - Exposição dos conteúdos
Deixar claro para a turma o que será avaliado é essencial para que ela tome
conhecimento do que aprenderá. É preciso deixar a proposta de trabalho
explícita e, durante as aulas, retomar o que foi apresentado.

2 - Definição dos critérios


O ideal é que os itens avaliados sejam escolhidos pelos alunos e pelo
professor. Isso pode ser feito em um debate após a parte expositiva, em que o
docente considera as opiniões da classe e aponta outros aspectos não
notados.

3 - Dupla reflexão
Primeiro, o aluno reflete para preencher sua parte. Num segundo momento, o
professor o avalia seguindo os mesmos critérios. As divergências e os pontos
fracos indicados por ambos devem ser considerados no encaminhamento de
melhorias.

4 - Plano de ação
Com as duas avaliações feitas, cabe ao professor propor o debate de
alternativas para que o aluno avance. Não adianta querer resolver todos os
problemas de uma vez: é preciso focar o essencial e retomar o que ficou
faltando nas aulas seguintes.

Prática pode ser adotada mesmo com turmas da pré-escola

Como olhar para a própria atuação exige maturidade, é natural que nas etapas
iniciais de escolarização as crianças tenham mais dificuldade para participar do
processo de reflexão. Mas a idade não deve servir de desculpa para abandonar a
prática. Em pesquisas com crianças de 5 anos, Leonor Santos constatou que os
pequenos são, sim, capazes de se autoavaliar, identificando seus pontos fortes e o
que precisa ser melhorado. Na Educação Infantil, os momentos de reflexão são
basicamente realizados por meio da oralidade, em rodas de conversa ou de
combinados. As questões procedimentais e atitudinais são as que costumam
demandar mais atenção. A postura da criança, a organização do material e a
relação com os colegas são os principais pontos de discussão nessa idade, já que
os pequenos apenas começam a se reconhecer no papel de estudantes.

Além das autoavaliações orais e escritas, outras formas de favorecer a reflexão são
os portfólios - privilegiando sobretudo os critérios de escolha dos trabalhos - e até
vídeos. 'Depois de um seminário do 2º ano, convidei os alunos a assistir a uma
gravação da apresentação. A atividade deu o distanciamento para ajudá-los a notar
os pontos em que deveriam evoluir", relembra Andréa.

Qualquer que seja o tipo de autoavaliação escolhido, uma etapa não pode faltar: o
encaminhamento de ações concretas para atacar os pontos fracos mostrados na
autoavaliação. Se o conteúdo ficou mal entendido, é preciso retomar a lista de
exercícios ou preparar uma aula de recapitulação dos pontos obscuros. Se o
problema é a falta de método para estudar, pode-se combinar uma semana de
acompanhamento conjunto das tarefas de casa - e assim por diante. Aos poucos,
os alunos passam a interiorizar esse controle, assumindo a regulação que a
princípio é feita pelo docente. Assim, a autoavaliação cumpre seu papel.

Quer saber mais?

BIBLIOGRAFIA

Avaliação: da Excelência à Regulação das Aprendizagens entre Duas


Lógicas, Philippe Perrenoud, 184 págs., Ed. Artmed, tel. 0800-703-3444, 46
reais
INTERNET
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