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educacao-financeira-projeto-de-vida
Publicado em NOVA ESCOLA 04 de Abril | 2024

Projeto de vida

Educação Financeira ajuda


estudantes dos Anos
Finais a planejarem o
futuro
Coordenadoras pedagógicas contam como o tema apoiou
os alunos a pensarem no caminho profissional e no projeto
de vida; saiba como replicar as experiências
Dimítria Coutinho

A coordenadora pedagógica Valdete de Souza (esquerda), e as professoras


Suely Garcia (centro) e Maria Aparecida Santos (direita) trabalham juntas
adaptando o material sobre Empreendedorismo oferecido pela Secretaria
Municipal de Educação para o contexto da escola. Foto: Ana Paula Costa/NOVA
ESCOLA.
“Ele se encontrou como empreendedor e descobriu seu talento”, conta a
coordenadora Valdete de Souza, da EM Professora Maria De Lourdes Aquino
Sotana, em Naviraí (MS), sobre um dos estudantes de 9º ano que participou de
um projeto sobre Educação Financeira e Empreendedorismo. O rapaz se
especializou na produção de itens de resina, que faz para vender.
Ajudar os estudantes a pensarem no futuro profissional e no projeto de vida é
uma das funções das escolas nos Anos Finais do Ensino Fundamental, e a
Educação Financeira pode apoiar bastante nesse planejamento. Nessa etapa de
ensino, o assunto pode ir além do cofrinho e atingir temas mais críticos e
menos lúdicos. Abordar o projeto de vida, passando pelo valor do trabalho e
por habilidades socioemocionais, é uma dessas possibilidades.
“É importante que os coordenadores pedagógicos trabalhem com suas equipes
na construção e manutenção de projetos que vislumbram oportunidades no
campo educacional e do trabalho, que sirvam de trampolim para a redução das
desigualdades sociais”, ressalta Aline Soares, coordenadora pedagógica,
membro do time de formadores da NOVA ESCOLA e consultora dessa trilha de
reportagens. Ela explica que é preciso focar no acolhimento dos estudantes
dentro das escolas. “Quando eles reconhecem a importância desse lugar, as
chances de permanência e sucesso são maiores.”
Formular projetos que tenham relação direta com a realidade deles pavimenta
o caminho para que seus sonhos se concretizem no futuro. Para que a
estratégia funcione, é papel do coordenador pedagógico promover a ideia de
que Educação Financeira tem a ver com planejar racionalmente tudo, e não
apenas o uso do dinheiro. Ou seja, ela é útil na hora de organizar o tempo de
estudo para uma prova e de traçar metas para longo prazo, como o custeio de
uma festa de formatura, por exemplo.
LEIA TAMBÉM: Como o planejamento financeiro pode ajudar os alunos no
futuro?
Empreendedorismo e planejamento
Ajudar os alunos a planejar a festa de formatura do 9º ano e a confraternização
de final de ano do 7º ano foi o foco do projeto de Educação Financeira e
Empreendedorismo desenvolvido pelas professoras de Matemática da escola
em Naviraí.
Colocando a mão na massa para fazer a arrecadação, os estudantes acabaram
descobrindo talentos, além de aprender bastante sobre planejamento. A ideia
começou com um livro sobre Empreendedorismo oferecido pela Secretaria
Municipal de Educação. Quando o material chegou na escola, lembra a
coordenadora Valdete, “ninguém sabia por onde começar ou como aplicar
aquele conteúdo.”
Leia também: Coordenação pedagógica: como organizar uma formação
continuada sobre planejamento?
Ela procurou ajuda da própria secretaria de Educação e auxiliou as professoras
da unidade a adaptarem as temáticas abordadas no material ao currículo da
escola e ao perfil dos estudantes. Na sala de aula, as professoras de
Matemática perceberam que os alunos do 9º ano estavam com bastante
dificuldade em vender rifas para realizarem a festa de formatura, então, a
Educação Financeira e o Empreendedorismo surgiram como formas de
solucionar esse problema.
Os alunos, então, passaram a produzir brinquedos de materiais recicláveis,
pensando também na sustentabilidade, e a fazer lanches e doces para serem
vendidos aos demais estudantes da escola. Nas aulas de Matemática, as
professoras os auxiliavam com o fluxo de caixa, calculando quanto tinha sido
gasto e arrecadado e quanto faltava para a meta da formatura.
Arethuza Helena Zero, doutora em Desenvolvimento Econômico pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e autora de materiais didáticos
sobre Educação Financeira, afirma que planejar a formatura é uma das
principais atividades que podem ser desenvolvidas nos Anos Finais para
trabalhar a Educação Financeira na prática. Além de possibilitar a compreensão
do que é planejamento, os alunos se sentem estimulados pela busca de
resultados. Na sua opinião, é possível abordar a temática desde o 6º ano,
construindo um projeto para a turma ao longo dos quatro anos.

Alunos do 9º ano vendem lanches e doces no intervalo para arrecadar dinheiro


para a formatura. Foto: Ana Paula Costa/NOVA ESCOLA
Prática que aponta talentos
Na escola em Naviraí, o resultado direto foi excelente, pois os alunos
conseguiram dinheiro suficiente para pagarem o salão e a decoração da festa.
O mais importante, no entanto, foram os diversos resultados pedagógicos
alcançados.
Durante o processo de produzir itens para arrecadar dinheiro, muitos
estudantes se descobriram empreendedores. “A gente viu que muitos deles
tinham aquele talento dentro de si. O empreendedorismo parecia uma coisa
tão distante que até falar a palavra era difícil, não estava no nosso vocabulário,
e depois eles foram notando que isso faz parte do cotidiano deles”, conta a
professora de Matemática Maria Aparecida Santos. Ela notou que muitos
alunos passaram também a valorizar o trabalho de seus pais, como manicures e
donos de pequenos negócios, ao perceber que eles são empreendedores.
Além disso, durante o projeto, as professoras abordaram as características do
empreendedor, presentes no livro oferecido pela secretaria de Educação. Isso
auxiliou os estudantes a se conhecerem, abrindo espaço para trabalhar
habilidades socioemocionais, o que se relaciona diretamente com projeto de
vida.
Pensando no futuro, os estudantes passaram a ver no empreendedorismo uma
forma de conseguir renda, valorizando os estudos. Valdete conta que é comum
abandonarem a escola por terem que trabalhar para ajudar a família. Depois do
projeto, muitos perceberam que é possível manter os estudos e ganhar
dinheiro ao mesmo tempo, se optarem por empreender.
“Muitos alunos, principalmente nas escolas de periferia, já têm esse hábito de
vender algo para ajudar as famílias, e começaram a fazer isso com mais
planejamento, calculando as vendas e fazendo amostras”, comenta Gabriela
Prevedel, coordenadora de área da secretaria de Educação do município. “O
projeto foi muito bom para que eles pudessem descobrir qual é o talento deles.
Cada um ficou livre para fazer aquilo que sabia e gostava”, nota a coordenadora
Valdete.
Mesmo que os alunos não se descubram empreendedores, Arethuza afirma
que o tema é relevante para todos. “O empreendedorismo permite que os
alunos desenvolvam habilidades e reflitam sobre seus gostos, objetivos,
potencialidades e fragilidades. Agir de forma empreendedora é agir de forma
proativa. Com isso, o aluno consegue desenvolver suas potencialidades e
passar por situações de estresse e frustração”, comenta.
Despertando novos interesses
A professora Suely auxilia estudantes em pesquisas sobre como fazer
brinquedos com materiais recicláveis; posteriormente, os itens produzidos
foram vendidos para arrecadação de dinheiro para a turma. Foto: Ana Paula
Costa/NOVA ESCOLA.
No Colégio Estadual Estrela Do Sul, em Aparecida de Goiânia (GO), a Educação
Financeira e o Empreendedorismo também integraram um projeto realizado
com os 9º anos. Ideia do professor de Matemática, Pedro Mateus dos Reis, logo
complementada por um material oferecido pela Secretaria de Educação de
Goiás.
A coordenadora da unidade, Edina Vital, que auxiliou Pedro na adaptação do
material para a realidade local, acredita que é essencial, antes de mais nada,
conhecer os estudantes. “Na nossa escola, eles chegam no 9º ano ainda muito
imaturos, aí começamos a questioná-los sobre o que vem pela frente e vamos
conhecendo o que eles querem”, comenta.
Edina notou que, depois da pandemia de Covid-19, muitos estudantes
passaram a ajudar financeiramente as famílias, o que gerou vontade de “ganhar
dinheiro”. Dentro da sala de aula, Pedro percebeu um forte interesse por
empreendedorismo e por investimentos.
Leia também: Coordenação pedagógica: por que investir em formação
continuada em competências socioemocionais?
O professor, então, se preocupou em abordar as temáticas mais interessantes
para os estudantes. “Antes, quando eles ouviam sobre o projeto de vida em sala
de aula, não mostravam um real interesse”, comenta o professor. Depois de
estudarem sobre Educação Financeira, passaram a enxergar o projeto de vida
de outra forma.
Mesmo dando aulas de Matemática, Pedro tem formação em Física, por isso
também trabalhou temas relacionados à ciência e tecnologia, como
empreendedorismo digital. O professor conta que muitos estudantes passaram
a se interessar, entre outros assuntos, pelo desenvolvimento de aplicativos,
então, cursar o ensino técnico passou a ser uma opção para o futuro.
Além disso, as habilidades socioemocionais entraram no projeto quando o
professor falou sobre perfis de investidores, levando os estudantes também a
se conhecerem e a refletirem sobre temas como autogestão e tomada de
decisão.
Como relacionar Educação Financeira e projeto de
vida?
Arethuza nota que todos os exemplos revelam que Educação Financeira leva a
fazer escolhas de forma mais consciente. Nos Anos Finais, portanto, é papel das
escolas apresentarem aos estudantes as possibilidades de carreira, como
ensino técnico, graduação, cursos profissionalizantes e empreendedorismo –
desmistificando a ideia de que o último caminho é o mais fácil e não demanda
estudo.
“Nesse tema, dá para falar de planejamento, metas de curto, médio e longo
prazo. Se eu fizer um curso técnico, quais são as possibilidades que se abrem?
Se eu estudar X anos da minha vida, quanto eu posso ganhar a mais em relação
a um cenário no qual eu deixei os estudos mais cedo? Essas reflexões ajudam
os alunos a entender sobre salário, renda e futuro”, exemplifica a especialista.
Cíntia Diógenes, especialista em gestão escolar e membro do time de
formadores da NOVA ESCOLA, orienta que os estudantes devem ser levados a
refletir sobre o que gostam de fazer e o que os motiva. “Poucos estudantes na
faixa etária dos Anos Finais param para pensar sobre a futura profissão. Eles
estão em uma fase na qual não são mais considerados crianças, nem estão
naquele clima de Ensino Médio. Nessa etapa, se eles não forem levados a essa
reflexão, dificilmente terão essa iniciativa naturalmente”, comenta.
A relação entre Educação Financeira e futuro pode aparecer em diversos
componentes curriculares, e é papel do coordenador pedagógico promover
essa interdisciplinaridade. “O primeiro passo é se embasar no currículo e na
Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para ver as habilidades que fazem
uma conexão entre a Educação Financeira e o que é desejado que o aluno
desenvolva como habilidade para o componente curricular”, orienta Cíntia.
Nessa etapa, é desafiador engajar os professores em trabalhos
interdisciplinares, já que “alguns profissionais acham que não há conexão entre
o trabalho realizado no seu componente curricular com o de Educação
Financeira”, comenta Cíntia.
A relação entre Educação Financeira, Empreendedorismo e futuro profissional
aparece de forma muito forte em História e Geografia, componentes nos quais
é possível debater sobre desigualdades do mercado de trabalho, sejam elas
regionais, de raça ou de gênero, profissões ao longo da história e diferenças no
mundo do trabalho entre países, permitindo a comparação entre economias,
exemplifica Arethuza.
Além disso, a temática se relaciona bem com a Matemática, componente no
qual é possível trabalhar a organização em planilhas, cálculos de fluxo de caixa
e investimentos. Em outros componentes, como Ciências e Artes, temas
próprios das competências específicas, como questões culturais e ambientais,
podem ser enfocados dentro de projetos de Empreendedorismo.
A seguir, confira um roteiro formativo com o planejamento de um projeto
interdisciplinar para ajudar os estudantes a conciliar escola e trabalho.
BAIXE ROTEIRO FORMATIVO
Consultora pedagógica: Aline Soares, coordenadora pedagógica, formadora de
professores, especialista em gestão escolar e mestre em educação.

Este conteúdo faz parte do projeto Educação Financeira Transforma e


conheça aqui todos os conteúdos da parceria entre a Nova Escola e o
Instituto XP.

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