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AS RELAÇÕES DE GÊNERO DENTRO DO AMBIENTE ESCOLAR

Ana Paula Lopes Bogas Perez1

Introdução

Este artigo traz como preocupação central a construção das relações de gênero
dentro do ambiente escolar. Assim, pretendemos verificar, neste trabalho, se a escola é
um marco fundamental para a construção da identidade de gênero, considerando que
através dela há reprodução dos valores das classes dominantes, pela internalização da
cultura dominante. Trata-se de buscar compreender como os valores internalizados
influenciam nas desigualdades de gênero dentro do ambiente escolar.
Desta forma, temos como hipótese a seguinte afirmação: que as construções
sociais atribuídas às mulheres, ou seja, os papeis sociais, desde cedo, é moldado. Sendo
assim, a partir das construções dentro do espaço familiar, os jovens levam os seus
valores para dentro do ambiente escolar, porém estes são hostilizados, e de modo
simbólico, podemos considerar que a escola corrobora com as representações,
construídas socialmente, do que é “ser” mulher.
A principal justificativa deste trabalho está delineada na própria importância
histórica do tema. Com a efervescência, na década de 1960, dos movimentos feministas2
surge com mais relevância a questão das mulheres. Entre as diversas propostas teóricas,
encontra-se aquela que demonstra como as relações patriarcais definem os papeis
sociais de homens e mulheres, submetendo as últimas ao plano da família e cuidado dos
filhos.
Desde os primeiros movimentos, que ganharam notoriedade nos EUA, com as
mulheres queimando as roupas íntimas – simbolizando uma crítica à submissão e
repressão da mulher - o estudo de gênero continua com notoriedade no meio acadêmico,
nos movimentos sociais e populares.
Embora cada vez mais essa temática já tenha espaço, ainda existe grande
necessidade de estudá-la, pois, no cenário nacional, podemos notar a crescente violência
contra as mulheres, tanto física quanto simbólica. Há também medidas austeras, por parte
das instituições sociais, que definem os direitos e deveres sobre seu próprio corpo.
São esses fatores que contribuem para instigar o estudo sobre as relações de

1 Graduanda em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina. Contato: anapaula.perez@hotmail.com

2 O movimento feminista organizado surgiu nos Estados Unidos na segunda metade dos anos sessenta. Expandiu-se
pelo ocidente propagando a libertação da mulher e não apenas a emancipação. Suas principais reivindicações eram a
igualdade em direitos em todas as esferas, em relação ao homem (RODRIGUES, 2007. p. 06).
“gênero”, pois, embora se tenha uma ampla produção bibliográfica, as mulheres
continuam em situação de desvantagens nos diversos campos da vida social.
Neste sentido, procuramos discutir as reproduções das desigualdades na ótica da
sociologia reflexiva. Neste primeiro momento, os conceitos de ação pedagógica, violência
simbólica e habitus, serão utilizados para elucidar a questão das relações de gênero no
ambiente escolar.
Como afirmam Bourdieu & Passeron (2009), as relações simbólicas são
simultaneamente autônomas e dependentes das relações de força, portanto, toda ação
pedagógica pode ser considerada como uma violência simbólica, pois é dirigida por um
poder arbitrário (BOURDIEU & PASSERON apud ROSENDO, 2009, p. 4). E neste
contexto, podemos destacar o conceito de ação pedagógica: é exercida pelos membros
educados de um grupo social, e depende das relações de forças presentes na estrutura
social da sociedade, reproduzindo a mesma estrutura.
Para Bourdieu & Passeron (2009), o trabalho pedagógico está diretamente ligado à
imposição de habitus. Por habitus se entende o produto de interiorização de um arbítrio
cultural capaz de perpetuar mesmo quando a ação pedagógica cessa. Portanto, o campo
em que estamos lidando, teoricamente, é fundamental focar que a eficácia do trabalho
pedagógico é sempre muito menor nas classes mais baixas, isto porque a cultura
dominante tende a considerar a cultura dominada como algo ilegítimo, ou seja, considera-
se a escolaridade obrigatória como o reconhecimento legítimo da cultura dominante pela
dominada.
Outro ponto importante realizado neste trabalho é a breve contextualização da
inserção das mulheres no cenário brasileiro, no que tange a questão educacional. Até
meados do século XV, no imaginário brasileiro, a educação da mulher era considerada
como não necessária e vista com descaso. Nos valores que estavam ligados a este
imaginário predominavam a ideia de que a mulher era responsável pelos trabalhos
domésticos.
Como afirma Rodrigues (2007), devido à influência das instituições sociais, código
de valores e de comportamento trazidos da Europa, a vida e a postura da mulher
brasileira permaneceu atrelada à aceitação da sua permanência no interior do domicílio.
Estes valores, que confinam as mulheres no âmbito do doméstico, permearam até
meados do século XIX, onde o seu papel primordial era o de ser mãe e esposa,
educadora das gerações do futuro e pilar de sustentação do lar. Assim, sua educação
exigiria uma moral sólida e bons princípios.
A partir das últimas décadas do século XIX, surge a necessidade da educação para
a mulher vinculando-a a modernização da sociedade, à higienização da família, à
construção da cidadania. A preocupação em vincular o conceito de trabalho à “ordem e
progresso”, levou os condutores da sociedade a arregimentar as mulheres das camadas
populares (RODRIGUES, 2007, p. 13).
A partir do século XX, o movimento feminista teve papel central para com a luta e
conquista dos espaços políticos, econômicos e educacionais que beneficiou mais de três
gerações de mulheres em todo Brasil. Entretanto, é importante ressaltar, que o teor da
luta feminista é internacional. Nesse sentido, a luta feminista leva para o espaço de
discussões políticas os assuntos que anteriormente que eram tratados como questões de
caráter privado, rompendo com a relação binária público-privado. Como vemos no
trabalho de Costa (2006), essa dualidade apresenta o público como à esfera do Estado e
suas instituições, a economia e a tudo mais identificado com o político. Já o privado se
relaciona com a vida doméstica, familiar e sexual, identificado com o pessoal, alheio à
política.
Embora se tenha uma grande contribuição das lutas feministas, não devemos
engessar a análise, pois há no imaginário social a legitimação dos valores patriarcais.
Assim, a posição da mulher está estruturada em um conjunto de papeis hierarquicamente
organizado, sobrando a ela o papel de reprodutora, com a educação restrita socialmente
ao cuidado, aos afazeres domésticos, não podendo participar da esfera pública (SOUZA;
BOTELHO, 2001, p. 420).
Na terceira parte do trabalho é feita uma breve análise sobre as inquietações de
pesquisas no meio acadêmico que está contribuindo para o debate entre gênero e
educação e suas relações com outras temáticas. As principais pontuações dizem respeito
às apropriações dos espaços físicos, desempenho na sala de aula com as diversas
disciplinas, grupos de socialização e amizades relações simbólicas das/os alunas/os.
Para finalizar, discorremos, brevemente, sobre os conteúdos que a disciplina de
sociologia aborda especialmente aqueles que podem colaborar com a desnaturalização
das construções sociais dos gêneros. Considerando que a sociologia possui um caráter
intrinsecamente questionador da realidade social, procurando demonstrar uma
possibilidade de análise sobre as relações desiguais entre homens e mulheres as/os
alunas/os, com o objetivo de estimular uma maneira de reflexão com caráter crítico.

A sociologia reflexiva: ação pedagógica, violência simbólica e habitus


Nesta primeira parte vamos discutir as reproduções das desigualdades na ótica
da sociologia reflexiva, neste primeiro momento, os conceitos de ação pedagógica e
violência simbólica e habitus, irão corroborar para a discussão sobre a questão de gênero
no ambiente escolar.
Para Bourdieu & Passeron (apud ROSENDO, 2009), as relações simbólicas são
simultaneamente autônomas e dependentes das relações de força, portanto toda ação
pedagógica deverá ser considerada como uma violência simbólica, pois está sob
imposição por um poder arbitrário (BOURDIEU & PASSERON apud ROSENDO, 2009,
p.4).
A ação pedagógica é exercida pelos membros educados de um grupo social, e
depende das relações de forças presentes na estrutura social da sociedade, reproduzindo
a mesma estrutura.
A ação pedagógica reproduz a cultura dominante, reproduzindo também as
relações de poder de um determinado grupo social. O ensino encarnado
na ação pedagógica tende a assegurar o monopólio da violência simbólica
legítima. Assim, toda a ação pedagógica deverá ser considerada como
violência simbólica, na medida em que impõe e inculca arbítrios culturais
de um modo, também ele, arbitrário. É importante referir que a ação
pedagógica se exerce sempre numa relação de comunicação (BOURDIEU
& PASSERON apud ROSENDO, 2009, p.05).

Assim, podemos afirmar que a ação pedagógica, que situa Bourdieu & Passeron
(2009) é também exercida pelas famílias ou por qualquer outro agente que esteja dentro
da estrutura social, e que a reprodução da cultura dominante, reflete nas relações de
poder.
Como afirma os autores, a ação pedagógica está ligada a meios diretos de
constrangimento na imposição de uma rede de significados. A partir da reprodução, o
arbítrio cultural dominante tende a ficar sempre em posição dominante, o que origina a
ação pedagógica dominante, relacionada às elites, que tende a impor e a definir o valor
do mercado econômico e simbólico à ação pedagógica dominada, relacionada às classes
subalternas (BOURDIEU & PASSERON apud ROSENDO, 2009, p.06).
Por isso que neste ponto, os autores consideram a ação pedagógica como a
expressão máxima da violência simbólica, que visa impor significações, selecionando
umas e excluindo outras. E a maneira que a seleção arbitrária é feita é por um grupo ou
uma classe. Os autores denominam esta ação como arbitrária, pois não é de uma
natureza humana, e sim da objetividade de um grupo ou classe. Assim, as opções
construtivas da cultura, revelam que esta ação está relacionada com as condições sociais
ligadas a estrutura da sociedade (BOURDIEU & PASSERON apud ROSENDO, 2009, p.
06).
Segundo os autores,

Toda a ação pedagógica produz uma autoridade pedagógica, operação


pela qual concretiza a sua verdade objetiva de exercício de violência. Sem
autoridade pedagógica não é possível levar-se a cabo a ação pedagógica,
pois estas detêm o direito de imposição legítima de significações. As
representações de legitimidade da ação pedagógica variaram ao longo da
história. (...) Este trabalho de imposição implica sempre o exercício de
violência simbólica por parte da autoridade pedagógica (BOURDIEU &
PASSERON apud ROSENDO, 2009, p. 07).

Para Bourdieu & Passeron, o trabalho pedagógico está diretamente ligado a


imposição de habitus, e por habitus se entende o produto de interiorização de um arbítrio
cultural capaz de perpetuar mesmo quando a ação pedagógica cessa (BOURDIEU &
PASSERON apud ROSENDO, 2009, p. 09).
Assim,
A educação é um instrumento fundamental para haver continuidade
histórica, tendendo a ser uma pura reprodutora de arbítrios culturais pela
mediação do hábito. (...) O trabalho pedagógico é considerado muito eficaz
porque é capaz de perpetuar mais duravelmente uma atitude do que
qualquer coerção política (BOURDIEU & PASSERON apud ROSENDO,
2009, p.09).

Os autores, então, afirma que o habitus é o princípio gerador e unificador da


prática, e têm por si, a aplicação a vários domínios. E para isto o trabalho pedagógico
pela imposição de habitus, reproduz a integração moral da sociedade. E essa integração
depende dos habitus que são impostos pelo trabalho pedagógico das instituições sociais.
O que leva a legitimidade dessa imposição de habitus é a ação pedagógica que por meio
de sua autoridade gera a reprodução cultural e moral dos grupos dominantes.
O que os autores afirmam, e para este trabalho é fundamental focar, é que a
eficácia do trabalho pedagógico é sempre muito menor nas classes mais baixas, isto
porque a cultura dominante tende a considerar a cultura dominada como algo ilegítimo.
Eles consideram a escolaridade obrigatória como o reconhecimento legítimo da cultura
dominante pela dominada. O princípio norteador neste momento é o trabalho pedagógico
que exerce uma influência irreversível, que consiste ele em primário que é transmitido
pela família, onde produz os habitus ou características de classe trabalho pedagógico
secundário, que é exercido pela escola (BOURDIEU & PASSERON apud ROSENDO,
2009, p. 10).
Como vimos as afirmações de Bourdieu & Passeron (2009) tangem no sentido que
a escola é reprodutora de desigualdade social, e que tem influências diretas na vida dos
indivíduos. Agora trataremos da questão das mulheres no ambiente escolar brasileiro.

As mulheres no cenário escolar brasileiro

Até meados do século XV, no imaginário brasileiro a educação da mulher era


considerada como não necessária e vista com descaso. Os valores que estavam ligados
a este imaginário predominavam a idéia de que mantendo a mulher ao espaço doméstico,
facilitaria a supremacia masculina.

Para reproduzir e fixar o padrão étnico europeu no Brasil, muitas mulheres


brancas, sem preocupação com classe social ou moral, foram importadas
para serem reprodutoras dos varões portugueses na Colônia. Havia
claramente uma ausência de liberdade de escolha por parte das mulheres
que eram obrigadas a servir aos propósitos da Coroa e da sua política
demográfica. Tratadas como seres desiguais, sendo levadas a manter a
mentalidade da época, onde sua função principal era a de procriar. Devido
à influência das instituições sociais e o código de valores e de
comportamento trazidos da Europa, a vida e a postura da mulher brasileira
permaneceu atrelada à aceitação da sua permanência no interior do
domicílio (RODRIGUES, 2007, p. 08).

Depois da Proclamação da República, o discurso oficial era o da necessidade de


reconstruir a imagem de um país de caráter colonial, atrasado, inculto e primitivo. O
discurso em voga se dava pela importância da educação para a modernização do país.
Era evidente que as educações das meninas e dos meninos não faziam parte de um
processo único, universal, naquela sociedade. As divisões de classe, etnia e raça tinham
um papel importante na determinação das formas de educação utilizadas na formação de
homens e mulheres daquele período (RODRIGUES, 2007, p.12).
As formas e concepções de educação das mulheres nessa sociedade eram
múltiplas. Para muitos, o destino primordial da mulher era o de ser mãe e esposa,
educadora das gerações do futuro e pilar de sustentação do lar, sua educação exigiria,
uma moral sólida e bons princípios. Só nas últimas décadas do século XIX surge a
necessidade da educação para a mulher vinculando-a a modernização da sociedade, à
higienização da família, à construção da cidadania. A preocupação em vincular o conceito
de trabalho à “ordem e progresso”, levou os condutores da sociedade a arregimentar as
mulheres das camadas populares (RODRIGUES, 2007, p. 13).
O ponto principal que a autora coloca é que há um imaginário que concentra a
figura masculina no centro, e gera diferenças em tratamento e atribuições de pais a
homens e mulheres, desde crianças.
Este modelo que temos ainda hoje, onde os homens ainda ocupam cargos
importantes e direções de empresas e cargos públicos, as mulheres aparecem como
secundárias, e ainda corrobora para as desigualdades de gênero entre homens e
mulheres, o que a autora sugere a modificação gradual pela educação e valores que não
reforcem as concepções de superioridade do mundo masculino em relação ao feminino,
ainda que muitas vezes, são as próprias mulheres as responsáveis pela reprodução do
machismo e das idéias que pregam a suposta inferioridade delas em relação aos homens.
Idéias essas, que são repetidas nas instituições sociais, tornado- as ainda predominantes
(RODRIGUES, 2007, p.14).
Não podemos deixar de pensar as identidades de gênero sem pensar os modelos
familiares que os jovens estão inseridos. Partimos assim, em primeiro momento do
parâmetro da família patriarcal, que é construído, sobretudo, pela revelação do modo
como se davam as relações entre brancos e negros sob a autoridade do senhor branco
proprietário e chefe de família. Outro tema relevante no enredo patriarcal dedica-se a
localizar a mulher no conjunto de papéis hierarquicamente posicionados para os atores da
trama cotidiana entre a casa e fora dela.
De acordo com Souza e Botelho (2001), poderia ser admitido o predomínio deste
tipo de família no Brasil enquanto idéia, restringindo-se aos valores éticos, aos padrões
morais dominantes e suas formas desviantes, enfim, às mentalidades. Nesse sentido, há
distinções entre as proposições ideais e ideológicas de família brasileira, assim, a
apresentação de arranjos concretos de organização familiar ocorridos em tempo e lugares
precisos, encobre uma dificuldade no que tange a questão do pensamento social, desta
forma pensar em grupos sociais distintos dentro da sociedade (idem).
Por assim dizer logo, a mulher continua sendo considerada subalterna ao longo
dos séculos, fato explicado, muitas vezes, pela condição de reprodutora como causa da
inferioridade em que a mulher se encontra, ou até mesmo seu destino, como ser
complementar do homem (RODRIGUES, 2007, p. 14). As classes dominantes, deste
modo vêem a emancipação feminina como um risco para seus interesses, e desta
maneira, se apropriou facilmente dessa condição de subalternidade feminina, apegando-
se na solidez da família como forma de garantir a propriedade privada.
Como pontua Rodrigues (2007) as desigualdades não provêm do fato de termos
nascidos “machos” ou “fêmeas”, mas sim das relações e papéis sociais e sexuais
construídos sócio-culturalmente. A própria sociedade determina o que é masculino e o
que é feminino, através de suas instituições, da cultura, do sistema educacional, da
divisão sexual e social do trabalho, etc. As relações desiguais de gênero é que levam a
mulher à subalternidade.

O que as pesquisas sobre a temática estão apontando?

Nesta parte do trabalho, trataremos sobre algumas das principais inquietações no


meio acadêmico, em periódicos e eventos3, que trata sobre gênero e educação, e suas
relações, visto que é primordial, como foi situado aqui antes, sobre a importância das
pesquisas sobre gênero.
Algumas pesquisas mais recentes trarão a discussão de gênero e identidade
sexual. No trabalho Oliveira4 (2011), a autora se utiliza de algumas categorias para
conceituar gênero e diferenciá-lo de sexo e identidade sexual.
Para a autora, essas separações categóricas colaboram para desfazer a confusão
entre o que é biológico e o que são construções sociais.
Segundo o texto vimos que,
Sexo se refere à anatomia, aos órgãos sexuais que possuímos. Deste
modo, classificam-se as pessoas em machos ou fêmeas. Por gênero pode-
se entender as “determinações” que cada cultura faz às atribuições de
papéis sociais pelo sexo da pessoa, ou quando pensamos em identidade
de gênero compreender que as relações se constroem de forma relacional.
Ou seja, agimos a partir do outro, como uma resposta ou uma
complementaridade. Mas sabemos que essas características não precisam
ser aceitas, e por isso pensamos em gênero numa outra dimensão: a de
mudança e de ressignificação da atribuição dos papéis ou da relação entre
a diferença entre os sexos. Esse é o papel da educação, e com a qual as
ciências sociais possuem uma grande preocupação: o de desnaturalizar as
relações e construir novas formas de pensamento. Para tal é importante
compreender quais as relações que se perpassam no momento, tal qual o
que é apresentado na televisão, quais as formas dos alunos se
relacionarem e do corpo pedagógico reagir a determinadas relações
(OLIVEIRA, 2011. p. 02).

Por fim, dentre as categorias apresentadas para a compreensão das desigualdades


de gênero, a autora irá questionar de por que o educador compreender essas categorias
e classificações? Nas palavras da autora, é porque o tempo todos os educadores lidam

3
O primeiro trabalho foi apresentado no evento “II Seminário de Estágio da Licenciatura em Ciências Sociais”. Evento
realizado em 23 de novembro de 2011, na Universidade Estadual de Londrina. O Segundo trabalho se trata de um
artigo publicado na revista Pró-posições, em 2006.
4
Trabalho intitulado, “A importância do ensino sobre questões de gênero na educação”.
com indivíduos que sofrem preconceitos por estarem fora de padrões hegemônicos e
ensinar sobre formas de relacionar-se de modo diferente do que é estabelecido, é
contribuir para uma maior compreensão da diferença, prevenindo assim “pré-conceitos”
muitas vezes tão arraigados ao senso comum. E esse é o papel da educação. Com um
viés científico e laico disseminar a importância de compreender as diferentes formas de
relação (OLIVEIRA, 2011, p. 03).
No trabalho de Auad5 (2006), analisa situações do cotidiano escolar na sala de
aula, buscando descrever os processos de diferenciação de desigualdade entre o
feminino e o masculino, e também como em contrapartida o trabalho escolar pode
influenciar as relações de gênero socialmente vigentes.
Segundo Auad (2006), é de amplo conhecimento a existência de diversidades
hierarquizadas nos grupos sociais ou nos próprios indivíduos, e quando se fala
especificamente de educação formal, as relações que permeiam são as de gênero, e
sendo assim, potencializando as desigualdades entre o masculino e o feminino.
Segundo a autora,
Ao se considerar a categoria gênero, é possível ainda colocar em causa as
tradicionais assertivas sobre o que é “natural”, no sentido do que é inato e
instintivo, para cada um dos sexos. Assim, no contexto deste trabalho, ao
se adotar a categoria gênero, faz-se referência ao conjunto de
representações construído por cada sociedade, através de sua História,
para atribuir significados, símbolos e diferenças para cada um dos sexos.
Logo, as características biológicas entre homens e mulheres são
percebidas, valorizadas e interpretadas segundo as construções de gênero
de cada sociedade (AUAD, 2006, p.138).

Deste modo, a autora mostra que a escola parece utilizar das habilidades
produzidas pela educação fora da escola, como na família, que contribui dentro da sala de
aula com o rendimento, como no caso das meninas. Como exemplo, Auad (2006) cita a
questão dos cadernos e deveres por parte das meninas, criando ou reforçando o papel de
boa aluna, e também é uma dessas demandas, com a qual as meninas assumem diante
das professoras e dos meninos, uma maior responsabilidade sobre o bom funcionamento
da classe.
Como é explicitado no trabalho em questão, esse tipo de fenômeno pode ser
percebido como reforço à tradicional socialização feminina e é um modo de perpetuar
uma determinada divisão sexual do trabalho (AUAD, 2006, p.145). Já no caso masculino,

5
Trabalho intitulado, “Relações de gênero na sala de aula: atividades de fronteira e jogos de separação nas práticas
escolares”.
é notado outro tipo de comportamento, como a agressividade, que pode ser, segundo a
autora, a aprendizagem da vida adulta, mas também pode fazer com que meninos e
meninas aprendam já na infância que há um conjunto de comportamentos interditos para
eles e para elas, a partir das representações sobre a agressividade aceita para os
homens e a aceita para as mulheres. Há ainda a genérica demanda e motivação de
comportamentos agressivos para os meninos e a ampla interdição do mesmo tipo de
comportamento para as meninas (AUAD, 2006, p. 145).
Entretanto, para a autora que se utiliza dos conceitos de Louro (1997),

A escola é produtora de diferenças, distinções e desigualdades. A escola


que a sociedade ocidental moderna herdou separa adultos de crianças,
ricos de pobres e meninos de meninas. Herdamos, e agora, de muitas
maneiras, mantemos uma importante instância de fabricação de meninos e
meninas, homens e mulheres. O trabalho de conformação que tem início
na família encontra eco e reforço na escola, a qual ensina maneiras
próprias de se movimentar, de se comportar, de se expressar e, até
mesmo, maneiras de preferir (LOURO apud AUAD, 2006, p. 14).

Nesse sentido, podemos considerar que os padrões tradicionais e polarizados


acerca do masculino e do feminino e, conseqüentemente, acerca de mulheres, meninos,
meninas e homens estão presentes em nossa sociedade e, portanto, encontram-se ainda
em ação na escola.

A Sociologia como crítica através dos conteúdos

Tendo a disciplina de Sociologia no Ensino Médio, que contribui para formação


críticas dos alunos, nossa proposta é de analisar alguns trabalhos e documentos que trás
em seus conteúdos a contribuição para a desnaturalização das construções sociais de
gênero, desta maneira estimulando uma reflexão com caráter crítico.
Em dois trabalhos utilizados como bibliografia deste trabalho, trás como proposta a
análise de onde entraria a questão de gênero nos conteúdos das aulas de sociologia.
Camargo6 (2011) irá pensar algumas possibilidades de discutir esse tema, levantando
uma questão importante: “pensar gênero é conteúdo? Deve ser enquadrado como
conteúdo estruturante ou como conteúdo básico? Como conteúdo específico? Em quais
conteúdos dentro da sociologia podemos abordar a temática de gênero, na política, na
antropologia ou na sociologia?” (CAMARGO, 2011, p. 01)

6
Trabalho intitulado, “A relação entre gênero e a dimensão do imperativo desta discussão através do ensino de
Sociologia no âmbito escolar: para uma perspectiva de novos olhares.”
Para a autora, a sociologia tem função de além de desnaturalizar as
representações sociais do que é ser homem e do que é ser mulher, também de
desconstruir que estudos de gênero estejam somente ligados às mulheres, e acima de
tudo de modificar a forma de enxergar as mulheres e suas feminilidades e os homens e
suas masculinidades para uma redefinição do político e do cultural (CAMARGO, 2011, p.
03).
Entretanto no trabalho de Oliveira (2011), ela elenca sugestões de como tratar as
questões de gênero, em diferentes disciplinas dos anos escolares, mas nos ateremos
apenas nos conteúdos da Sociologia, a ressalva importante desde trabalho, é que a
autora propõe que esses conteúdos estejam imbricados desde o ensino fundamental, e
não somente no ensino médio. Deste modo, para a Sociologia,

É possível trabalhar o feminismo enquanto movimento social. E também


trabalhar os clássicos como, por exemplo, a idéia de coerção do fato social
proposto por Durkheim para falar das relações de desigualdade entre
gênero. Tal qual a história precisa ser sociologizada, a Sociologia, que
apesar de levar o título de disciplina escolar, mas também falar da Ciência
Política e da Antropologia precisa ser historicizada. O marco importante da
história pode ser trabalhado através da desnaturalização das relações. Em
específico, a Antropologia tem um importante papel de trazer outras formas
de se relacionar, ao mostrar sociedades distintas e muitas vezes distantes.
É um bom campo para apresentar as sociedades matriarcais (OLIVEIRA,
2011, p. 12.)

Visto que esses são algumas contribuições para o avanço em sala de aula,
entretanto, vamos analisar como é tratado no livro didático e em alguns documentos
oficiais. As Orientações Curriculares Nacional para o Ensino Médio, na parte designada
para a sociologia, depois de um breve histórico sobre a disciplina, o documento mostra
que com a nova LDB – Lei nº 9.394/96 –, a Sociologia se torna obrigatória como disciplina
integrante do currículo do ensino médio. Em seu Artigo 36, § 1º, Inciso III, há a
determinação de que “ao fim do ensino médio, o educando deve apresentar domínio de
conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários.”
Deste modo, cabendo um papel central ao pensamento sociológico contribua com
a desnaturalização das explicações dos fenômenos sociais. A naturalização em si, é fazer
parecer naturais algumas construções sociais, como exemplo, a dominação masculina
fundamentada em uma possível superioridade biológica. Cabendo à Sociologia
desmitificá-las.
Nas OCN’s as próximas sugestões para trabalhar a questão de gênero, é da parte
sobre “temas”, que como o documento mesmo sugere, “dependendo do interesse do
professor, dos alunos, e também da própria escola” (OCNs, 2006, p.119). Porém, e
nenhum momento fala-se das desigualdades, o documento deixa a questão de se
trabalhar com temas, muito ampla, e somente sugere uma vez, se trabalhar com gênero,
sem reforçar a sua importância para a desnaturalização dos alunos.
Há também uma coletânea7 publicada em 2006, que tem como objetivo propor uma
reflexão sobre os estudos feministas e de gênero no Brasil, utilizando alguns dos
importantes periódicos como: Cadernos Pagu; Revista Estudos Feministas; Revista
Gênero; e Caderno Espaço Feminino. São vinte e um trabalhos versando sobre a
temática de gênero, sexualidade, desigualdades, violência, juventude, feminismo, entre
outros. Esse documento foi patrocinado pelo Ministério da Educação, e dá relevância à
dimensão cultural da construção de homens e mulheres e de seus lugares sociais e da
importância desse debate na sociedade brasileira, contribuindo para os educadores a
ação de orientar os alunos, e dentro das salas de aula propor debates, que corroboram à
desnaturalização.

Considerações Finais

A intenção deste trabalho foi verificar se o espaço escolar é um marco fundamental


para as construções das identidades de gênero, e se há valores reproduzidos pela classe
dominante, ou seja, pela internalização da cultura dominante.
Partimos assim, que os valores simbólicos são construídos socialmente e a escola
corrobora através do que a sociologia reflexiva chama de habitus. Podemos pensar as
construções sociais e de identidade de gênero, ligada a construções simbólicas.
Entretanto, em que medida a escola contribui com isso? Como afirmamos na primeira
parte deste artigo, a escola é reprodutora das desigualdades sociais, sendo então a
imposição do habitus reproduzindo os valores simbólicos impostos pelas classes
dominantes, pois estas tendem a achar a cultura dominada e suas manifestações como
algo ilegítimo.
Neste artigo ressaltaram-se também as categorias classificatórias de gênero e
sexo, e que compreender colabora para diferenciar o que é biológico e o que são
construções sociais, entendendo por gênero as determinações que cada cultura faz as
atribuições de papeis sociais pelo sexo e se constroem de forma relacional.
7
Olhares Feministas. Coleção Educação para todos. Publicado em 2006.
Nesse sentido, como proposto inicialmente, as pesquisas em torno das questões
de gênero, contribuíram para o avanço das lutas de mulheres e também do feminismo
como um todo, buscando não só a igualdade de gênero, mas também o devido
reconhecimento, desta maneira, é esperado que este trabalho também contribua de
alguma forma dentro do meio acadêmico e fora também.
Assim, cabe a escola – corpo docente e administrativo – trabalhar desde os
primeiros anos iniciais com os alunos sobre a temática “gênero”, e tudo que engloba ele,
como desigualdade, violência, preconceito, etc. E a sociologia, como disciplina, fica o
papel para desnaturalizar as construções sociais, desmistificar os papeis socialmente
construídos.

Referências

AUAD, D. Relações de gênero na sala de aula: atividades de fronteira e jogos de


separação nas práticas escolares. Pró-Posições. Campinas. V. 17, nº3 p.137-149,
set/dez. 2006.

BOURDIEU, P.; PASSERON, J.C. A reprodução: Elementos para uma teoria do sistema
de ensino. Recensão: ROSENDO, Ana Paula. (Org). Covilhã: LusoSofia, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação. Orientações Curriculares Nacionais. Brasília, 2006.

CAMARGO, A. A relação entre gênero e a dimensão do imperativo desta discussão


através do ensino de Sociologia no âmbito escolar: para uma perspectiva de novos
olhares. In: Seminário de Estágio da Licenciatura em Ciências Sociais. 2. 2011, Londrina.
Anais eletrônicos. Londrina. UEL, 2011. Disponível em:<
http://www.uel.br/projetos/lenpes/pages/seminarios-de-estagio-artigos-da-licenciatura-em-
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