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INTRODUÇÃO

ESCOLA, ESTADO E SOCIEDADE – BÁRBARA FREITAG

A autora Bárbara Freitag, em seu livro “Escola, Estado e Sociedade”, de forma


sucinta, aborda a realidade educacional entre os períodos de 1964 e 1975 no Brasil. É,
portanto apresentado de acordo com as teorias mais tradicionais, um enfoque
sociológico, tendo como base a sociologia e a economia da educação.
Tendo em vista que a prática do capitalismo no Brasil no período de 1930
determinou uma organização entre as relações sociais, econômicas, políticas e culturais,
visto que Estado passou ter obrigações mais diretas em relação à ampliação também das
relações estruturais, sendo estabelecida assim uma relação entre capital nacional e
capitalismo mundial, surgindo consequentemente novas exigências educacionais, as
mudanças no modo de produção acarretaram modificações profundas na forma de
conceber a educação.
A fim de descrever o quadro educacional do país, o livro de Bárbara Freitag é
distinto em períodos. O primeiro período durou até o ano de 1929, quando explodiu-se
uma crise mundial que gerou sérios problemas econômicos com respeito aos produtos
de exportação brasileiros. Sendo que a educação nesse período era baseada neste
modelo exportador, que como objetivo educacional formar sujeitos prontos para essas
atividades econômicas de acordo com as classes sociais a qual pertencessem.
A economia brasileira nesse período espelhava-se no modelo agroexportador
implementado na época da colônia, onde políticas educacionais eram quase que
inexistentes. A sociedade política e a sociedade civil não eram compostas por
instituições, mas exclusivamente pela igreja. Estavam também presentes na sociedade
escravos, senhores de casas grandes, representantes da nobreza, Coroa e clero. A
organização da produção era o que garantia a reprodução dessa estrutura de classes. A
escola então se tornava desnecessária como instrumento de reprodução dessas classes
sociais.
O segundo período é compreendido entre os anos de 1930 e 1945, quando a
gratuidade e obrigatoriedade do ensino são concedidas, e o ensino religioso, por sua vez,
torna-se facultativo. O ensino profissionalizante é introduzido e tornam-se obrigatórias
as disciplinas de educação moral e política. Surge então o Ministério da Educação, que
acaba por se tornar o marco do modelo econômico de substituição de importações.
Entre os anos de 1945 e 1964, é aprovado o texto definitivo da LDB (Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional) seguida por uma versão em 1971, que
vigorou até a promulgação da mais recente em 1996.
A LDB veio a se tornar um reflexo dos equívocos e conflitos que caracterizavam
as próprias divisões de classe da burguesia no Brasil, em que havia uma seletividade do
sistema educacional em relação à população em idade escolar. Era idealizada uma
classe indiferente, onde os alunos eram tratados de forma igual, ainda que tivessem sido
adotados critérios de aprovação ou reprovação, sendo estes selecionados segundo
inteligência, desempenho no trabalho, dentre demais capacidades. Ainda assim, deveria
ser mantida uma relação de percentual constante de pessoas provenientes de classes
sociais diferentes.
Também é apresentada no livro a Lei de Reforma do Ensino Superior, que de
uma forma geral defendia a democratização do ensino, para que diversos alunos fossem
selecionados e posteriormente disciplinados.
ESCOLA, ESTADO E SOCIEDADE

Numa visão geral, a obra da autora apresenta conceitos de educação presentes em


preceitos de vários autores que já discorreram sobre a relação entre educação e
concepção de homem e sociedade ou ainda sobre o processo educacional que se dá
através de instituições particulares como igreja, família ou escola), que acabam por se
tornar veículo de determinada doutrina pedagógica.
Segundo Bárbara, o pioneiro na sistematização do papel da educação na
sociedade foi Émile Durkheim, que define o processo educacional como parte do
conceito de indivíduo que necessita ser moldado para a vida em sociedade. Esse sujeito
seria baseado primordialmente pela família, mas também por outras instituições, como
escola, igreja, dentre outras. Portanto, segundo esse preceito, uma criança é destinada a
certos números de estados físicos, intelectuais e morais. Implica-se, então, em gerações
mais novas baseando-se nas experiências das gerações adultas, e isso seria indispensável
para o prosseguimento de dada sociedade.
Assim,
“A educação é um fato social. Se impõe coercitivamente ao
indivíduo que, para seu próprio bem, sofrerá a ação educativa,
integrando-se e solidarizando-se com o sistema social em que vive.
Os conteúdos da educação são independentes das vontades
individuais; são as normas e os valores desenvolvidos por uma
certa sociedade (ou grupo social) em determinado momento
histórico, que adquirem certa generalidade e com isso uma
natureza própria, tornando-se assim “coisas exteriores” aos
indivíduos.”.

Também inspirada em Durkheim, Bárbara Freitag aborda a educação como um


mecanismo para que seja possível a perpetuação dos sistemas sociais. Os pilares da
educação seriam transmitidos entre as gerações, a fim de garantir o funcionamento de
uma sociedade.

1. Divergências entre os autores Dewey e mannheim

As visões divergentes dos autores Dewey e Mannheim também são abordadas,


embora ambos creiam na educação como veículo que dinamiza os pilares através do ato
inovador do homem. Dewey associa a vida à educação. Segundo ele, o indivíduo é
atuante e seu papel na sociedade se transforma em um processo educativo. De tal forma,
ele avalia e reorganiza suas experiências. O indivíduo se prepara para novas atuações.
Para Dewey, a escola é um tipo de comunidade, onde a educação e a democracia
estão interligadas, fazendo parte de uma totalidade, onde os indivíduos deveriam ter
igualdade de oportunidade dentro de uma esfera social com visíveis diferenças
individuais.
Para Dewey:

“[...] este meio é a escola, que deve assumir as características de uma pequena
comunidade democráticas. Aqui a criança aprenderia pela própria vivência as
práticas da democracia, habilitando-se a transferi-las, futuramente, em sua vida
adulta, à sociedade democrática como tal.”.

Os preceitos pedagógicos de Dewey são particularmente parte de uma educação


democrática. Um mecanismo com intuito inicial de preservar e prolongar estruturas
dadas como imperfeitas, assim como as democracias.
Seguindo essa nuance seria possível então afirmar que o alicerce social que
mantém tais estruturas é a da igualdade de chances e não a de igualdade entre os
indivíduos, tendo em vista que os homens têm diferenças natas. Tal pensamento
permaneceu inalterado, isento de modificações ou colocações. A competição por
chances geraria então resultados obtidos democraticamente.

1.1 O processo educativo para Mannheim

Mannheim acrescenta à ideia de Dewey que é preciso educar o homem, desde


muito cedo, às regras do jogo de democracia, evitando assim o caos na sociedade. Um
tipo de controle racional e democrático.
Mannheim acredita que sendo o processo educativo um recurso social para
controlar o homem e sua história, a educação se torna um método de socialização dos
indivíduos a fim de criar uma determinada relação harmoniosa entre eles, onde os
próprios indivíduos a mantêm. E a educação seria um recurso que, primordialmente
coloca em prática os planos desenvolvidos.

2. Passerom e Bourdier – O indivíduo e a sociedade


Os autores Passerom e Bourdier enxergam o indivíduo e a sociedade por uma
nuance histórica, criticando a sociedade capitalista francesa do século XX, em
particular. Para esses autores o sistema de educação é um reprodutor de culturas e bases
das classes sociais. Essas funções se expressam nas representações simbólicas,
realidades do convívio social ou ainda ideologias.
Tendo como base o materialismo histórico de Marx, o objetivo do sistema
educacional é perpetuar a reprodução das relações de produção. Para que tal mecanismo
seja garantido, também as relações simbólicas devem ser reproduzidas e também as
ideias que os indivíduos fazem dessas relações.
A educação garante “a transmissão hereditária do poder e dos privilégios,
dissimulando sob a aparência de neutralidade o cumprimento desta função”.
Para que houvesse o desejo por parte dos dominados de fazer parte da classe
dominante, seria esse um mecanismo que garante a reprodução da ordem na estrutura
das classes.
Os autores Schultz, Edding e Slow, segundo Freitag, seguem a ideia de que há
uma relação intrínseca entre altos níveis de educação de determinada sociedade com
índices competentes de economia. Capital e trabalho não bastariam para justificar tava
de crescimento registrada. É quando surge a ideia de investimento em recursos
humanos, para que se formasse capital humano, se tornando o sistema educacional uma
consequência desses fatores.

3. Parsons – Modelos econômicos e sistemas educacionais

Para Huiskien, a economia capitalista consequentemente gera problemas em


relação aos arquétipos da economia e do processo de planejamento educacional que
somente ajustam os indivíduos formados nesse sistema educacional. Economistas da
educação reassentaram o padrão de sistematização de Parsons em suas origens
econômicas. Em tal sistema, ego define suas esperanças e seus atos em vista de alter, já
que espera que alter cubra os seus. Não é possível, nesse preceito, definir papeis
isolados, sempre papeis que se complementem. A escolha do ego é um contingente das
intervenções e ações do alter.
Segundo a linha de pensamento de Parsons, a valorização / crescimento de
gratificações por parte dos indivíduos é relacionada aos lucros ambicionados pelos
capitalistas. Nessa constante disputa, o mais preparado para tal cargo será beneficiado
por ele. Como se cada indivíduo apto para determinada função tivesse nascido para
ocupar aquela vaga. Na lei da oferta e da procura estipulada pela economia isso é
transposto. A mesma lei regulamenta / organiza a ordem dessas variadas competições. A
teoria diz respeito ainda pela igualdade de chances garantida a cada indivíduo no
modelo social, onde se adquiri poder e no modelo econômico.
Freitag se coloca dizendo que:
“Marx mostrou em sua teoria do valor que de fato pode
haver equivalência entre duas mercadorias desde que medidas com
uma unidade padrão que seja comum a ambas: o tempo médio
socialmente necessário absorvido para a sua produção. Por isso se pode
trocar um saco de arroz por dois de feijão. A única mercadoria
disponível no mercado em que a equivalência não funciona é em
relação à própria força de trabalho. O seu valor de uso diverge do seu
valor de troca. Pois ela, ao ser comprada no mercado por um valor,
quando usada no processo de trabalho, produz mais valor do que custou
ao comprador, o capitalista. Os indivíduos ou o Estado, investindo pois
na força de trabalho, e justamente para aqueles setores e ramos em que
há necessidade de trabalhadores mais qualificados, criam um valor.
Este, no ato da troca, recebe seu equivalente (tempo socialmente
necessário para produzi-lo) em salário. Mas na hora que essa força de
trabalho é empregado no processo produtivo, ela gera mais valor do
que o salário percebido. Este excedente não retorna ao indivíduo ou ao
Estado que nele investiram para qualificá-lo, mas é apropriado
pelo comprador, o empresário capitalista. (...) O salário corresponderá,
em seu valor, ao tempo médio socialmente necessário para a produção
e reprodução da força de trabalho, o que inclui sua qualificação para o
trabalho. Mas esse salário é bem menor que o valor que o trabalho cria
no tempo pelo qual vendeu sua força de trabalho. Sua produtividade
face à sua maior qualificação não beneficia a ele, aumentando
gradativamente seu salário, mas ao seu empregador que se apropria da
diferença, mais-valia.” (Freitag, 1986)

A economia da educação, tenta, por sua vez, dissimular a origem do problema


referente à essa ideologia de igualdade de chances e troca de equivalentes.
Althusser, Establet e Poulantzas em suas obras, se colocam em relação ao
funcionamento da escola na moderna sociedade capitalista.

“Assim a escola, na medida em que qualifica os indivíduos para o trabalho,


inculca-lhes uma certa ideologia que os faz aceitar a sua condição de classe,
sujeitando-os ao mesmo tempo ao esquema de dominação vigente. Essa
sujeição é, por sua vez, a condição sem a qual a própria qualificação para o
trabalho seria impossível.”.

Na escola os indivíduos aprendem as justificações da divisão de trabalho, para


que assim possam aceitar, sem mais problemas, sua condição de explorados por uma
classe dominadora.
O que garante a força de trabalho, precisa ser preparado pelos aparelhos
ideológicos, pois os operários precisam tomar como verdade as falsas consciências. É,
portanto, a escola, que atua a favor do interesse da estrutura dominante, a instituição
responsável por esse papel. A política educacional estatal age e se manifesta acima de
tudo na superestrutura, visando assegurar a reprodução ampliada do capital e as relações
de trabalho e de produção que a sustentam.
Gramsci foi o teórico da superestrutura. Sua contribuição consiste na revisão do
conceito de Estado. A sociedade civil assume novo sentido. Para Gramsci ela expressa o
momento da persuasão e do consenso que, conjuntamente com o momento da repressão
e da violência constroem a manutenção da estrutura de poder (Estado). A dominação se
expressa sobre a forma de hegemonia na sociedade civil e na sociedade política sob a
forma de ditadura. Elabora-se assim um conceito emancipatório de educação em que
uma pedagogia do oprimido pode assumir força política, ao lado da conceituação da
educação como instrumento de dominação e reprodução das relações sociais. Ele então
diz que toda relação de hegemonia é necessariamente uma relação pedagógica: no caso
da hegemonia burguesa, trata-se essencialmente do processo de aprendizado pelo qual a
ideologia da classe dominante se realiza historicamente, transformando-se em senso
comum.

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