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Reportagem

A física por trás das mudanças climáticas


Por que os climatologistas estão tão confiantes de que as atividades humanas
estão aquecendo a Terra perigosamente? A seguir, alguns dos participantes do
relatório internacional mais abrangente das evidências científicas resumem os
argumentos e discutem por que ainda restam incertezas

por William Collins, Robert Colman, James Haywood, Martin R. Manning e Philip Mote

Para os cientistas que estudam as Dlillc Corbis


mudanças climáticas, gritar
“Eureka!” é muito raro. Geralmente
o progresso nesses estudos é obtido
através de um cuidadoso juntar de
peças, de cada nova medida de
temperatura, dados de satélite ou
com experimentos de modelos de
clima. As informações obtidas são
verifi cadas e revisadas, as idéias
são testadas repetidamente. Será
que as observações confirmam as
mudanças preditas? Bons
climatologistas precisam se
assegurar de que todas as
descobertas feitas sejam submetidas
aos testes mais rigorosos.

As evidências de mudanças
aumentam à medida que os
registros climáticos vão ficando mais
longos, assim como nossa
compreensão dos sistemas
climáticos melhora e os modelos
climáticos vão se tornando cada vez
mais confiáveis. Ao longo dos
últimos 20 anos, as evidências de
que o homem está afetando o clima se acumularam inexoravelmente, e com elas, uma consciência
cada vez maior de toda a comunidade científica sobre a realidade das recentes mudanças climáticas e
das mudanças futuras que poderão ser ainda maiores. Essa certeza crescente está muito clara no
último relatório do Painel Internacional de Mudanças Climáticas (IPCC), o quarto de uma série de
avaliações sobre o estado do conhecimento do assunto, escrito e revisado por centenas de cientistas
do mundo todo.

Em fevereiro, o painel publicou uma versão condensada da primeira parte do relatório, sobre a base
física das mudanças climáticas. Chamado de “Resumo para Gestores de Políticas”, foi distribuído
também ao público em geral com uma mensagem ambígua: os cientistas têm mais certeza do que
nunca de que o homem interferiu no clima e que mais mudanças climáticas induzidas pela humanidade
estão a caminho. Ainda que o relatório acredite que algumas dessas mudanças sejam inevitáveis, a
análise também confirma que o futuro, especialmente em longo prazo, estará totalmente em nossas
mãos – a magnitude da mudança esperada depende do que os homens farão a respeito das emissões
de gases de efeito estufa.

A avaliação da ciência física focaliza os responsáveis pelas mudanças climáticas, as mudanças


observadas nos sistemas climáticos, a compreensão das relações de causa e efeito, e projeções de

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futuras mudanças. Houve avanços importantes desde a avaliação do IPCC em 2001. A seguir,
descrevemos as principais descobertas que documentam a extensão da mudança e chegam a uma
conclusão inevitável: a causa é a atividade humana.
Causas das Mudanças Climáticas
As concentrações atmosféricas de vários gases – basicamente dióxido de carbono, metano, óxido
nítrico e halocarbonetos (que já foram muito usados como refrigerantes e propelentes de sprays) –
aumentaram por causa das atividades humanas. Esses gases capturam a energia térmica (calor)
dentro da atmosfera por meio do conhecido efeito estufa, o que leva ao aquecimento global. As
concentrações atmosféricas de dióxido de carbono, metano e óxido nítrico permaneceram
praticamente estáveis por quase 10 mil anos, antes do crescimento abrupto e acelerado dos últimos
200 anos . As taxas de crescimento das concentrações de dióxido de carbono foram mais rápidas nos
últimos dez anos do que em qualquer outro período de dez anos, desde que o monitoramento contínuo
da atmosfera começou, em meados de 1950. Hoje, essas concentrações estão aproximadamente 35%
acima dos níveis pré-industriais (que podem ser determinados pelas bolhas de ar aprisionadas em
núcleos de gelo). Os níveis de metano estão aproximadamente duas vezes e meia maiores que os
níveis pré-industriais, e os de óxido nítrico, 20% mais altos.

Como podemos ter certeza de que o homem é responsável por esse aumento? Alguns gases de efeito
estufa (a maioria dos halocarbonetos, por exemplo) não têm fonte natural. Para outros gases, duas
observações importantes demonstram a
infl uência humana. A primeira é que as diferenças geográficas nas concentrações mostram que as
fontes estão predominantemente em áreas com maior densidade demográfi ca do hemisfério norte. A
segunda é que as análises de isótopos, que podem identificar as fontes emissoras, demonstram que a
maior parte do aumento do dióxido de carbono provém da queima de combustíveis fósseis (carvão,
petróleo e gás natural). O aumento dos níveis de metano e de óxido nítrico decorre de práticas
agrícolas e da queima de combustíveis fósseis.

Os climatologistas utilizam um conceito chamado forçante radiativa para quantifi car o efeito dessas
concentrações mais altas. Forçante radiativa é a alteração causada no equilíbrio energético global da
Terra em relação à época pré-industrial – e é geralmente expressa em watts por metro quadrado.
Uma forçante positiva induz aquecimento; uma forçante negativa induz resfriamento. Podemos
determinar a forçante radiativa associada a gases de longa duração de efeito estufa com excelente
precisão.

As mudanças climáticas não são causadas somente por maiores concentrações de gases de efeito
estufa; outros mecanismos também têm seu papel. As causas naturais incluem variações na atividade
solar e grandes erupções vulcânicas. O relatório identificou vários mecanismos forçantes signifi
cativos, induzidos pelo homem: aerossóis, ozônio estratosférico e troposférico, albedo da superfície
(refletividade) e esteiras de fumaça de aeronaves, embora seus efeitos sejam muito menos prováveis
do que os gases de efeito estufa.
Os pesquisadores não estão muito certos sobre a Bettmann Corbis
influência do chamado efeito do albedo de nuvens de
aerossóis, nos quais os aerossóis de origem humana
interagem com as nuvens, tornando-as mais
brilhantes e refl etindo a luz do Sol de volta para o
espaço. Há outra dúvida: quanto os aerossóis
refletem e absorvem da luz solar diretamente, como
partículas? Em geral, eles deveriam produzir um
resfriamento que poderia compensar, até certo
ponto, o efeito de aquecimento devido aos gases de
efeito estufa de longa duração. Mas quanto? Poderia
superar o aquecimento? Dentre os avanços
alcançados desde o relatório do IPCC de 2001, um
deles se destaca: os cientistas conseguiram
quantificar as incertezas associadas a cada
mecanismo forçante individualmente, através de
uma combinação de vários estudos observacionais e
de modelos. Conseqüentemente, agora podemos
fazer estimativas confi áveis da influência total do
homem. Nossa melhor estimativa é dez vezes maior
do que a melhor estimativa da forçante radiativa
natural causada por variações da atividade solar.

A certeza maior de uma forçante radiativa positiva


se ajusta bem às evidências observacionais do aquecimento, que serão discutidas a seguir. Essas
forçantes podem ser entendidas como um cabo-de-guerra, com forçantes positivas tentando puxar a
Terra para um clima mais quente e as negativas puxando-a para um estado mais frio. O resultado é

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que não há competição. A Terra está sendo levada para um clima mais quente e será cada vez mais
puxada nessa direção, enquanto os vilões do aquecimento global vão ficando cada vez mais fortes.

Mudanças Climáticas Observadas


Novos conjuntos de dados observacionais foram disponibilizados para que o relatório do IPCC de 2007
pudesse fazer uma avaliação mais abrangente das mudanças que a dos relatórios anteriores. Registros
observacionais indicam que 11 dos 12 últimos anos foram os mais quentes desde que os registros confi
áveis começaram, por volta de 1850. A chance de que essa sucessão de anos mais quentes tenha sido
puramente casual é extremamente pequena. Mudanças na temperatura global, no nível do mar e na
cobertura de neve no hemisfério norte mostram evidências de aquecimento. A avaliação anterior do
IPCC relatou uma tendência de aquecimento de 0,6oC ± 0,2oC no período de 1901 a 2000. Devido ao
forte aquecimento recente, a tendência atualizada para o período de 1906 a 2005 é agora de 0,74oC ±
0,18oC. Observe que, de 1956 a 2005 apenas, a tendência é de 0,65oC ± 0,15oC, enfatizando que a
maior parte do aquecimento do século 20 ocorreu nos últimos 50 anos. O clima continua a variar em
torno dessas médias mais altas, e os extremos mudaram consistentemente com elas – dias
extremamente frios têm se tornado cada vez menos comuns, enquanto ondas de calor e dias quentes
se tornaram mais freqüentes.

As propriedades dos sistemas climáticos incluem não só conceitos como médias de temperaturas, de
precipitação etc., mas também do estado do oceano e da criosfera (gelo marinho, grandes camadas
de gelo da Groenlândia e da Antártida, geleiras, neve, solo congelado e gelo em lagos e rios). As
interações entre as diferentes partes dos sistemas climáticos têm papel fundamental nas mudanças –
por exemplo, a redução do gelo marinho aumenta a absorção de calor pelo oceano e o fluxo de calor
entre o oceano e a atmosfera, o que também pode afetar a camada de nuvens e as precipitações. Um
grande número de observações adicionais é bastante consistente com o aquecimento estudado e
reflete um fluxo de calor da atmosfera para outros componentes do sistema. A cobertura de neve na
primavera, que diminui conforme aumentam as temperaturas nessa estação em latitudes médias do
hemisfério norte, diminuiu abruptamente por volta de 1988 e permanece baixa desde então. Essa
redução precisa ser considerada, pois a cobertura de neve é importante para a umidade do solo e os
recursos hídricos de muitas regiões.
No oceano, vemos claramente tendências de aquecimento, que diminuem com a profundidade. Essas
mudanças indicam que o oceano absorveu mais de 80% do calor adicionado ao sistema climático: esse
aquecimento é um dos principais responsáveis pela elevação do nível do mar. Desde 1993, as
observações por satélite permitiram cálculos mais precisos da elevação global do nível dos oceanos,
agora estimada em 3,1 mm ± 0,7 mm por ano no período de 1993 a 2003. Algumas décadas passadas
mostraram taxas rápidas similares, e serão necessários registros de satélites a longo prazo para
determinar sem ambigüidade se esse aumento está se acelerando. Também foram observadas em
décadas recentes reduções substanciais na extensão do gelo marinho do Ártico desde 1978 (2,7% ±
0,6% por década, no verão), aumento nas temperaturas do permafrost (solo congelado), redução da
extensão do gelo global, assim como das camadas de gelo da Groenlândia e da Antártida.

Mudanças hidrológicas também são bastante consistentes com o aquecimento. O vapor de água é o
gás mais forte de efeito estufa, pois é controlado principalmente pela temperatura. Em geral, ele vem
aumentando pelo menos desde os anos 80. A precipitação varia muito localmente, mas tem
aumentado em várias regiões do mundo, incluindo o leste das Américas do Norte e do Sul, o norte da
Europa e o norte e o centro da Ásia. Secas têm sido observadas no Sahel, Mediterrâneo, sul da África
e partes do sul da Ásia. A salinidade oceânica pode agir como um grande calibrador de chuva. Águas
próximas da superfície dos oceanos têm estado, em geral, menos salgadas em latitudes médias e
altas, enquanto em latitudes mais baixas têm apresentado maior salinidade, em conformidade com as
mudanças nos padrões de precipitação de larga escala.

Reconstruções do clima do passado – o paleoclima – a partir de anéis de árvores e de outros métodos


fornecem uma compreensão adicional importante do funcionamento do sistema climático com ou sem
a infl uência do homem. Elas indicam que o aquecimento da última metade do século passado foi
incomum, pelo menos nos 1.300 anos anteriores. O período mais quente entre 700 a.C. e 1950 foi
provavelmente entre 950 a.C. e 1100, e era vários décimos de grau Celsius mais frio do que a
temperatura média desde 1980.

Atribuição das Mudanças


Embora estejamos bastante convencidos de que as atividades humanas causaram uma forçante
radiativa positiva e que o clima realmente mudou, será que podemos garantir que existe um vínculo
entre eles? Esta é a questão da atribuição: as atividades humanas são realmente responsáveis pelas
mudanças climáticas observadas, ou é possível que elas decorram de outras causas, como alguma
forçante natural ou simplesmente de uma variabilidade espontânea dentro do sistema climático? O

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relatório do IPCC de 2001 concluiu que era provável (mais de 66% de certeza) que a maior parte do
aquecimento desde a metade do século 20 era atribuída à atividade humana. O relatório de 2007 vai
muito além, elevando essa avaliação para muito provável (mais de 90% de certeza).
A fonte de certeza adicional decorre de uma série de avanços isolados. Para começar, agora os
registros contêm aproximadamente cinco anos a mais de dados, e o aumento das temperaturas
globais nesse período tem sido bastante consistente com as projeções do IPCC para o aquecimento
induzido por gases de efeito estufa feitas em relatórios anteriores desde os anos 90. Além disso,
mudanças em outros aspectos do clima foram consideradas, como na circulação atmosférica ou na
temperatura dos oceanos. Essas mudanças descrevem um cenário consistente, e agora mais amplo,
da intervenção humana. Os modelos climáticos, fundamentais nos estudos de atribuições,foram
melhorados e estão em condições de representar o clima atual e o do passado recente com grande fi
delidade. Finalmente, algumas inconsistências aparentes notadas nos registros observacionais foram
quase que completamente sanadas desde o último relatório.

A mais importante foi um aparente desacordo entre o registro instrumental da temperatura da


superfície (que mostrou um aquecimento signifi cativo nas décadas mais recentes, consistente com o
impacto humano) e os registros atmosféricos com balões e satélites (que mostraram um aquecimento
menor do que o esperado). Vários novos estudos dos dados de satélite e de balão resolveram essa
discrepância – tendo sido encontrado um aquecimento consistente na superfície e na atmosfera.

A maneira ideal para testar as causas das mudanças climáticas seria criar um experimento com dados
reais, que replicassem o clima do século 20 com emissões constantes (e não crescentes) dos gases de
efeito estufa. Mas, obviamente, um experimento como esse seria impossível. Por isso, os cientistas
fazem o melhor dentro do possível: simulam o passado com modelos climáticos.

Desde a última avaliação do IPCC, dois importantes avanços aumentaram a confi abilidade no uso de
modelos, tanto para a atribuição quanto para a projeção de mudanças climáticas. O primeiro é o
desenvolvimento de um conjunto abrangente e bem coordenado de simulações de 18 grupos de
modelagem do mundo todo, para estudo da evolução histórica e futura do clima terrestre. Utilizar
vários modelos ajuda a quantifi car os efeitos das incertezas em vários processos climáticos no âmbito
da simulação de modelos. Embora certos processos sejam bem compreendidos e bem representados
por equações físicas (o fluxo da atmosfera e do oceano ou a propagação da luz e calor do Sol, por
exemplo), alguns dos componentes mais críticos do sistema climático são menos entendidos, como as
nuvens, as marés oceânicas e a transpiração da vegetação. Os especialistas em modelagem fazem
aproximações para esses componentes, usando representações simplifi cadas chamadas
parametrizações. A principal razão para desenvolver um conjunto de múltiplos modelos para as
avaliações do IPCC é entender como a incerteza afeta a atribuição e a predição das mudanças
climáticas. O conjunto da última avaliação contém um número sem precedentes de modelos e de
experimentos realizados.

O segundo avanço é a incorporação aos modelos de representações mais realísticas dos processos
climáticos. Esses processos incluem o comportamento dos aerossóis atmosféricos, a dinâmica
(movimentos) do gelo marinho e a troca de água e energia entre o solo e a atmosfera. Hoje, há mais
modelos que incluem os principais tipos de aerossóis e as interações entre eles e as nuvens.
Quando os cientistas IStockphoto
utilizam modelos climáticos
para estudos de atribuição,
primeiramente rodam
modelos de simulações
somente com estimativas
das infl uências naturais no
clima nos 100 últimos
anos, como variações nas
atividades solares e
grandes erupções
vulcânicas. Depois rodam
os modelos que incluem
aumentos nos gases de
efeito estufa e nos
aerossóis induzidos pelo
homem.

Os resultados desses
experimentos são
surpreendentes . Modelos
que utilizam somente
forçantes naturais não
conseguem explicar o

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aquecimento global observado desde a metade do século 20 mas, quando incluem os fatores
antropogênicos e os naturais, são bem-sucedidos. Padrões de grande escala de variações de
temperatura também mostram que há mais consistência entre os modelos e as observações quando
todas as forçantes são incluídas.

Dois padrões atestam a marca da influência humana. O primeiro é o maior aquecimento sobre os
continentes do que sobre o oceano, e maior aquecimento na superfície do mar do que em camadas
mais profundas. Esse padrão é consistente com o aquecimento induzido por gases de efeito estufa
numa atmosfera em camadas: o oceano se aquece mais rapidamente por causa de sua grande inércia
térmica. O aquecimento também indica que uma grande quantidade de calor está sendo absorvida
pelo oceano, demonstrando que o reservatório de energia do planeta está desequilibrado. O segundo
padrão de mudanças é que, enquanto a troposfera (a parte mais baixa da atmosfera) tem se
aquecido, a estratosfera tem esfriado. Se a forçante dominante fosse causada por variações solares, o
aquecimento seria esperado nas duas camadas. O contraste observado, no entanto, é exatamente o
esperado pela combinação do aumento de gases de efeito estufa com a diminuição do ozônio
estratosférico. Essa evidência coletiva, quando submetida a análises estatísticas cuidadosas, é
responsável por boa parte da base que faz aumentar a certeza de que os efeitos humanos estão por
trás do aquecimento global. As sugestões de que os raios cósmicos poderiam afetar as nuvens e,
conseqüentemente, o clima se basearam em correlações que utilizavam registros limitados; em geral,
elas não se sustentaram quando novos dados foram incluídos nos testes, e seus mecanismos físicos
continuam especulativos.

E em relação às escalas menores? À medida que as escalas espacial e temporal diminuem, fica mais
difícil atribuir as mudanças climáticas. Esse problema aparece porque as variações naturais de
temperatura em pequena escala são menos “promediadas” e assim mascaram mais rapidamente o
sinal analisado. No entanto, aquecimento continuado signifi ca que o sinal está emergindo em escalas
menores. O relatório verifi cou que é provável que a atividade humana tenha afetado
significativamente a temperatura em todos os continentes, menos a Antártida.
A influência do homem é perceptível também em alguns eventos extremos, como noites
supreendentemente quentes ou frias, e a incidência de ondas de calor. É claro que isso não signifi ca
que eventos extremos isolados (como a onda de calor na Europa em 2003) sejam simplesmente
“causados” por mudanças climáticas induzidas pelo homem – geralmente esses eventos são
complexos, com várias causas associadas. Mas significa que as atividades humanas tenham, muito
provavelmente, afetado as chances de tais eventos ocorrerem.

Projeções de Mudanças Futuras


Como serão as mudanças climáticas no século 21? Essa questão crítica é discutida com simulações de
modelos climáticos, baseados em projeções de futuras emissões de gases de efeito estufa e de
aerossóis. As simulações sugerem que, para as emissões nas taxas atuais ou acima delas, muito
provavelmente as mudanças no clima serão muito maiores do que as já observadas durante o século
20. Mesmo se as emissões fossem imediatamente reduzidas o bastante para estabilizar as
concentrações de gases nos níveis atuais, as mudanças se arrastariam por séculos. Essa inércia no
clima resulta de uma combinação de fatores, como a capacidade térmica dos oceanos do globo e as
escalas de tempo milenares necessárias para que a circulação misturasse calor e dióxido de carbono
nas profundezas do oceano e, dessa forma, entrasse em equilíbrio com as novas condições.

Em outras palavras, os modelos prevêem que ao longo dos próximos 20 anos, para uma faixa de
emissões plausíveis, a temperatura global vai aumentar a uma taxa média de cerca de 0,2oC por
década, próxima à observada ao longo dos últimos 30 anos. Cerca de metade desse aquecimento de
curto prazo representa um “comprometimento” com as mudanças climáticas futuras, que surgirão da
inércia da resposta do sistema climático às concentrações atmosféricas atuais dos gases de efeito
estufa.
O aquecimento de longo prazo durante o século 21, no entanto, depende fortemente das futuras taxas
de emissões – e as projeções cobrem uma ampla variedade de cenários, que variam de crescimentos
econômicos muito rápidos a mais modesto e da maior ou menor dependência dos combustíveis
fósseis. As melhores estimativas do aumento das temperaturas globais variam de 1,8oC a 4,0oC, com
emissões maiores levando a temperaturas mais altas. Com relação aos impactos regionais, as
projeções são mais confiáveis que nunca, e eles irão refletir os padrões de mudança observados ao
longo dos últimos 50 anos (maior aquecimento sobre os continentes do que sobre os oceanos, por
exemplo), mas a magnitude das mudanças será maior do que tem sido até agora.

As simulações também sugerem que a remoção de excesso de dióxido de carbono da atmosfera por
processos naturais sobre os continentes e os oceanos se tornará menos eficiente à medida que o
planeta se aquece. Essa mudança levará a uma porcentagem mais alta de dióxido de carbono emitido
que permanecerá na atmosfera, o que irá acelerar o aquecimento global no futuro. Esse é um retorno
positivo importante sobre o ciclo do carbono (o intercâmbio de compostos de carbono por todo o
sistema climático). Embora os modelos concordem que as mudanças no ciclo do carbono representam
um retorno positivo, a faixa de respostas continua muito grande, dependendo, entre outras coisas, de

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variações pouco conhecidas do seqüestro de carbono pela vegetação ou pelo solo, à medida que o
clima se aquece. Esses processos são tópicos importantes de pesquisas em andamento.

Os modelos também prevêem que as mudanças climáticas afetarão as características físicas e


químicas dos oceanos. As estimativas da elevação do nível do mar durante o século 21 variam entre
30 cm e 40 cm, dependendo das emissões. Cerca de 60% desse aumento é causado pela expansão
térmica da água do oceano. No entanto, essas estimativas baseadas em modelos não incluem a
possível aceleração do aumento nas perdas de gelo, observado recentemente nas camadas de gelo da
Groenlândia e da Antártida. Embora a compreensão científica desses efeitos seja muito limitada, eles
poderiam representar de 10 cm a 20 cm a mais para o aumento do nível do mar, e a possibilidade de
que ocorram elevações signifi cativamente maiores não está descartada. A química dos oceanos
também é afetada, na medida em que o aumento nas concentrações de dióxido de carbono da
atmosfera os torna mais ácidos.

Algumas das maiores mudanças estão previstas para as regiões polares, incluindo aumentos
significativos nas temperaturas em latitudes altas dos continentes, degelo das regiões de permafrost e
violentas reduções nas extensões do gelo marinho no verão, na bacia do Ártico. Latitudes mais baixas
provavelmente sofrerão mais ondas de calor, precipitações torrenciais e furacões e tufões mais fortes
(mas talvez menos freqüentes). Até que ponto os furacões e tufões poderão se tornar mais violentos é
tema de novas pesquisas.
É claro que algumas dúvidas importantes ainda permanecem. Por exemplo, como as nuvens vão se
comportar com o aumento da temperatura? Esse é um item crítico que afeta todas as dimensões das
previsões do aquecimento, e o conhecimento que se tem sobre a complexidade das nuvens ainda é
muito precário.

Agora estamos vivendo numa era na qual tanto os efeitos do homem quanto da Natureza afetam a
evolução futura da Terra e de seus habitantes. Infelizmente, a bola de cristal fornecida pelos nossos
modelos climáticos fi ca turva para previsões além de um século ou pouco mais. Nosso conhecimento
limitado às respostas tanto dos sistemas naturais quanto da sociedade aos impactos crescentes das
mudanças climáticas completa nossas incertezas. No entanto, uma coisa é certa sobre o aquecimento
global: as plantas, os animais e as pessoas viverão com as conseqüências das mudanças climáticas por
pelo menos mais mil anos.

© Duetto Editorial. Todos os direitos reservados.

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