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Meu punho atinge o nariz do filho da puta. O esmagamento do osso
é satisfatório sob meus dedos. Ainda nem tirei meu punho do rosto dele
e já quero fazer de novo.
Palavrões saem de sua boca enquanto o sangue escorria por seu
nariz. As luzes coloridas piscantes das bolas de discoteca acima de nós
banham o sangue em diferentes tons de vermelho. Uma mão agarra seu
nariz quebrado enquanto a outra sobe para me dar uma bofetada. Eu me
preparo, pronta para receber o tapa, mas uma mão estende para pegar
seu braço. A referida mão está ligada a um homem cuja aparência
rivaliza com um deus. Dou uma olhada nele e imediatamente me sinto
atraída por ele.
Ele é do tipo sombrio e rústico. O tipo que sua mãe insiste que é
ruim para você, embora ela também queira transar com ele secretamente.
Bem acima de 1,80m, com cabelos escuros e olhos bonitos. Eu estou
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disposta a apostar o falso anel de diamante em meu dedo que ele tem
um sorriso perverso capaz de desintegrar a calcinha de qualquer mulher
heterossexual.
Eu me viro e vou embora. Eu nem digo obrigada.
— Garota, podemos sair apenas uma vez sem você quebrar o nariz
de um cara? – Minha melhor amiga, Amelia, brinca ao meu lado. É
nosso primeiro ano de faculdade e consegui a melhor colega de quarto.
Nunca tive amigos antes dela.
Eu bufo. — Aparentemente não. Não é minha culpa que ele estava
agarrando meu peito. Nós estávamos dançando por literalmente trinta e
oito segundos. – digo com exasperação.
— Trinta e oito segundos, não é? – Amelia repete, levantando uma
sobrancelha perfeitamente feita. Eu mataria por suas sobrancelhas.
— Eu estava contando o momento apropriado para passar para o
próximo cara, mas acho que não deveria ser tão gentil da próxima vez.
Ela inclina a cabeça para trás e ri. Pego a mão dela e a guio pelo
resto do caminho pela multidão até o bar. Dou uma olhada para alguns
no caminho, já que dizer “com licença” educadamente só me dá um
olhar feio e silêncio.
Eu nunca fui do tipo paciente, de qualquer maneira.
Quando chego ao bar, inclino-me, mostrando uma ampla quantidade
de decote e espero que o barman me note. Impacientemente, eu devo
acrescentar.
O barman que me nota primeiro é uma garota. Cabelo loiro mel,
olhos castanhos e um delicado piercing no nariz. Ela olha para o que
estou oferecendo. Quando escolhi o meu vestido verde esmeralda justo,
foi especificamente pelo jeito que faz a minha bunda e os meus seios
parecerem photoshopados.
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Um... dois... e lá vem ela.


Eu retribuo seu sorriso perverso.
— Dois Long Islands1, por favor. – eu peço.
— Claro. – ela diz, adicionando um sorriso atrevido. Eu gosto dela.
— E duas gotas de limão! – Amelia grita ao meu lado quando a
bartender se vira para fazer nossas bebidas. Ela confirma o pedido de
Amelia com uma piscadinha sexy. Eu lambo meus lábios em resposta.
— Você está determinada a me dar uma ressaca, não é? – eu
reclamo com a Amelia, ainda de olho na bartender. Sua bunda é perfeita
em seu short jeans rasgado. Afasto os olhos, recusando-me a olhar de
soslaio como os homens pervertidos invadindo este clube como baratas.
— Diz a vadia pedindo um Long Island. Você só precisa de dois
desses e já está sentada.
Eu fungo. — Tanto faz.
A bartender volta com os nossos pedidos, deslizando-os em nossa
direção. Antes que eu possa agradecer, outra garota está chamando por
ela. Uma com um corpo muito mais curvilíneo e lindos cabelos ruivos.
Eu também me ignoraria por ela.
— River, pare de querer foder com a bartender. Você nem gosta de
garotas. – Amelia repreende. Eu bebo meu Long Island, ignorando as
pessoas que querem pedir suas bebidas.
Ela tem razão. Nunca estive com uma garota. Mas isso não significa
que eu não tenha pensado nisso. Não significa que eu não faria.
— Como estão você e David? – pergunto, mudando de assunto. Ela
e o namorado estão juntos há alguns anos e são melhores amigos há
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1Long Islands: é um coquetel alcoólico normalmente preparado com


vodka, tequila, rum claro, gin, e um toque de refrigerante de cola, que dá ao
preparado as mesmas cores da bebida que lhe empresta o nome.
mais tempo ainda. A paixão adolescente não desapareceu até hoje,
apesar de seus pais não a aprovarem.
Um olhar sonhador toma conta de seus olhos e, por uma fração de
segundo, quero enfiar meu canudo neles. Nenhuma reflexão sobre ela ou
seu namorado. Eu amo os dois.
Mas estou com ciúmes.
Eu nunca tive isso. Não com qualquer homem. E às vezes - bem, às
vezes dói pra caralho.
A sensação se desvanece em nuvens de fumaça quando um lindo
sorriso se abre em seu rosto. Afinal, a felicidade dela me traz paz.
Estrelas brilham em seus olhos quando menciono David. Se eu pudesse
pegar um par do céu e colocá-los em seus olhos, isso apenas mancharia
o brilho. Amelia também não teve a infância mais fácil. Ela merece
alguém que a ame incondicionalmente.
— Ele é incrível. – ela declara. — Ele vai me levar para um
encontro surpresa amanhã. Não vai me dizer o que é. Até o coagi com
uma boquete.
Eu levanto uma sobrancelha. — E não funcionou?
Um rubor surge em suas bochechas e um sorriso culpado surge em
seus lábios. — Isso meio que saiu pela culatra. Ele acabou me fazendo
esquecer completamente disso, na verdade.
Eu rio de sua timidez. — Parece um bom problema para se ter. – eu
comento, tomando mais um pouco do meu Long Island.
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Eu deveria maneirar.
— Deveria maneirar. – Amelia diz, ecoando os meus pensamentos
exatos. Juro que a vadia pode ler minha mente às vezes.
— Eu deveria. – eu concordo sem entusiasmo.
Mas eu não vou.

Calabria da Enur pulsa através do som surround e em minhas veias.


Minha visão está turva, e Amelia está em algum lugar atrás de mim, tão
embriagada quanto eu. Meu corpo ameaça se mover de acordo com o
ritmo antes que eu esteja totalmente na pista de dança. A multidão bate
palmas junto com o ritmo, e vejo alguns movimentos de busto de garotas
que me levariam a um hospital.
Eu me perco na multidão e finalmente me solto.
Minhas mãos sobem enquanto os meus quadris movem com cada
batida. Eu me movo e giro ao som da música animada, rindo enquanto
meu mundo gira. Estou livre. Livre da vida e de todas suas expectativas
enquanto meus pés me carregam pela pista de dança suja.
Sinto primeiro o toque em minhas mãos ainda levantadas, leve e
sensual. Seus dedos tocam o anel no meu dedo, mas isso não o detém.
Eu uso para esse exato propósito, mas nem sempre funciona. Algo me
diz que ele sabe que é falso. Não sei como, mas posso sentir na forma
como as suas mãos percorrem o meu corpo como se ele estivesse me
desafiando a dizer não.
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Não ouso olhar para minha próxima vítima atrás de mim. Começo
a contar enquanto suas mãos percorrem meus braços, deixando um
rastro de arrepios. Pelas minhas laterais e pelos meus quadris.
Oito, nove, dez…
Suas mãos agarram meus quadris possessivamente, como se ele
finalmente tivesse pego a joia rara no meio de uma armadilha perigosa.
Sou puxada contra um corpo muito maior que o meu. O calor absorve
meu corpo enquanto um cheiro inebriante preenche meus sentidos. Uma
colônia de especiarias com um toque de suor. Absolutamente divino.
Quinze, dezesseis, dezessete...
Nossos quadris colidem, e fico feliz em descobrir que não há um
pau duro cravando em minhas costas. Gosto de um homem com
controle.
Eu giro contra ele, com seus quadris combinando perfeitamente com
meus movimentos. Surpreendentemente, um sorriso surge em meu rosto.
Começando pequeno e ampliando até que estou quase rindo de novo. E
em algum lugar entre o final da Calabria e o meio da próxima música,
parei de contar.
Ainda assim, não o olho no rosto.
Seu toque permanece forte e confiante, mas nunca cruzando uma
linha ou vagando para territórios inapropriados. Lábios macios
percorrem o meu pescoço e ombros, mas ele nunca afunda os dentes na
maçã. Ele nunca perde o controle.
Ah, como eu quero que ele faça isso.
Isso me deixa um desejo, me faz me contorcer. O calor pulsante
entre minhas pernas fica mais forte a cada música que termina.
Estou perdida nele. Muito perdida.
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Eu o quero. Eu o quero em volta de mim enquanto ele se perder


dentro de mim. Quero estar em volta dele quando o prender e não soltar
até que a luz da manhã penetre pelas minhas janelas. Só então mostrarei
a sua alma perdida como partir.
Sofro por tudo isso sem ao menos ver seu rosto. A química de seu
corpo me diz que ele é atraente. Ele está confiante. Suave e lento.
E ele sofre por mim também.
Sou arrancada da minha doce fantasia quando um puxão
desesperado quase me arranca do universo que os nossos corpos
criaram. Meus olhos se abrem e o rosto de Amelia está diante de mim.
Sem ter que pedir, as mãos deixam meu corpo e fico desolada e com um
frio de gelar os ossos.
Eu não quero ir embora. Minha amiga precisa de mim, no entanto.
Eu me afasto sem olhar para trás. Dói, mas não quero um rosto ligado a
essa fantasia. Prefiro que ele permaneça anônimo para não procurá-lo
em todos os lugares que vou e em todos os rostos que passam por mim.

Anjos estão pairando ao meu redor, acenando para que eu me


aproxime. Para rastejar para a luz - uma luz dolorosa e ofuscante que
está desencadeando uma infinidade de fogos de artifício dentro da minha
cabeça. Eu certamente não sou capaz de ficar de pé agora.
Eu vou explodir em pedaços por todos os lugares se eu fizer isso.
Gemo, virando na minha cama. A cama do dormitório normalmente
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não é a mais confortável, mas agora, parece que estou deitada em uma
cama de pedras. Meus cobertores parecem nylon molhado e acho que as
pequenas penas do meu travesseiro estão aparecendo.
Ainda estou com o vestido da noite passada, a maquiagem está toda
grudada no meu rosto e minha boca tem gosto de gambá morto.
Nunca comi gambá morto, mas tenho certeza de que é esse o gosto.
Um gemido em resposta soa do outro lado do quarto onde está a
cama de Amelia.
— Eu te odeio pra caralho. – Amelia resmunga, com sua voz rouca
de sono. Olho para ver seu cabelo loiro dourado ondulado espalhado em
seu rosto, com algumas das mechas presas em sua boca. Normalmente
Amelia está sempre bronzeada, mas agora ela parece um zumbi pálido.
Não ajuda que sua maquiagem esteja borrada em seu rosto. Tenho
certeza de que seus olhos de guaxinim são exatamente iguais aos meus.
Poderíamos entrar em um set de filmagem de terror e ser contratadas
instantaneamente no local.
— Eu também me odeio.
Até mesmo falar agora envia pontadas agudas de dor na minha
cabeça. Tento me lembrar se tenho alguma aula hoje, mas todos os meus
pensamentos estão obstruídos pelas toxinas do álcool. Desisto de tentar
pensar, decidindo que não me importo se tenho aula hoje ou não. Seja
qual for o dia de hoje.
Minha cabeça está latejando e a náusea gira nas trincheiras do meu
estômago enquanto tento me sentar. Desesperadamente, olho para minha
mesa de cabeceira e encontro uma garrafa de água vazia.
Ugh. Maldita River bêbada. Não conseguiu nem se preparar com
sucesso antes de desmaiar.
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Aqueles malditos Long Islands. São a porra do diabo embrulhado


em um lindo laço.
— Nós precisamos de comida gordurosa. – Amelia diz enquanto
toma um gole de sua garrafa cheia de água. A visão me deixou
irracionalmente frustrada, quase a ponto de chorar. Por que a Amelia
bêbada é muito mais bem sucedida do que eu?
Notando minha aflição, Amelia tampa a garrafa e a joga para mim.
Pela graça de Deus, ela cai ao meu lado na minha cama, em vez de no
chão, onde tinha certeza de que cairia com aquele arremesso lamentável.
Tomo um gole da água com gratidão, resistindo à vontade de entornar.
O pensamento de comida me faz querer seguir aqueles anjos
irritantes para a luz. Quem precisa estar viva, afinal? Deixe a vida
selvagem ter a porra do planeta de volta. A natureza merece este planeta
mais do que nós.
— Quem vomitar primeiro está comprando. – digo.
— Combinado, vadia.

Eu arrasto minhas batatas fritas pelo monte de ketchup e as enfio na


boca. Levo uma eternidade para mastigar, considerando que a minha
garganta se recusa a engolir. A bondade geralmente salgada tem gosto
de veneno de rato na minha língua. Eu forço engolir as batatas fritas e
enfio mais algumas.
Não vou desperdiçar comida de graça.
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Como ganhei, escolhi o lugar. Marty's Diner, o melhor restaurante


simples que você encontrará na Carolina do Norte. A gordura está
permanentemente presente em todas as superfícies deste lugar, incluindo
as cabines vermelhas rachadas e as mesas decoradas com recortes de
revistas aleatórios. Normalmente, o cheiro me acalma, mas agora a
química entre o conteúdo do meu estômago e a fumaça da gordura está
causando uma luta épica de gatos na boca do meu estômago. Meu
cérebro confuso vagueia, evocando um fosso de luta real com uma bola
de fumaça e uma bolha verde ácida com braços batendo um no outro
como duas colegiais.
— Então, River, quem vai ser seu acompanhante na festa? – Amelia
pergunta sobre a sua comida, tirando a minha atenção dos meus
pensamentos induzidos pelo álcool. Tenho certeza de que ainda estou
bêbada.
Ela faz uma careta enquanto mastiga, fica um pouco verde e tem
que engolir a comida. Desvio o olhar antes que a náusea dela piore a
minha. Eu sou uma vomitadora simpatizante.
Encolho os ombros sem compromisso. Eu nem quero ir, para ser
honesta. Eu deveria encontrar minha mãe nesse dia. Não que esse seja
um bom motivo para perder a festa. Prefiro fazer um diagrama de Venn
com o gosto do gambá morto e meu hálito matinal do que me encontrar
com a Barbie.
— Talvez peça a Ryan? – ela se protege. Meus olhos se voltam para
ela, mudando de dourado manchado para ouro derretido. Eu sei por que
Amelia graciosamente me perguntou sobre isso sem parar. Ryan provoca
essa reação em mim sem minha permissão, e deve ser a coisa mais
irritante até agora.
— Você sabe que ele está namorando Alison. – resmungo. Odeio
que ela possa ver que estou interessada nele. Estar interessada na espécie
masculina é uma droga quando eles não fazem nada além de me fazer
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querer odiá-los. Infelizmente, aqui estou eu, me molhando para um


homem comprometido. Um homem que sempre acho que estou fazendo
um trabalho excelente em esconder meu interesse, mas, na verdade,
posso muito bem vestir uma fantasia e dançar como as pobres almas que
você vê na beira da estrada, enquanto acena uma placa que aponta
diretamente para a minha vagina. Aberta para negócios.
O homem da noite passada se insinua em meus pensamentos, mas
eu o afasto da minha mente antes de ficar obcecada por um estranho sem
rosto.
Amelia balança uma mão despreocupada no ar, dando-me um olhar
exasperado.
— Eles terminaram no fim de semana passado. – ela diz
levianamente.
As batatas fritas que estou segurando paralisam a meio caminho da
minha boca, com o ketchup pingando no meu colo.
— Eles terminaram? – eu ecoo com indiferença, voltando a minha
atenção para o ketchup em minha calça de moletom já manchada na
esperança de que isso esconda meu interesse despertado. Estou me
escondendo dela e ela sabe disso. Com toda a honestidade, eu estou
chocada. Ryan e sua namorada eram namorados no ensino médio. Eles
estão juntos desde sempre. Tenho certeza de que eles estavam noivos.
— Sim. – ela diz, com o sorriso em seu rosto desaparecendo devido
a ela ter que se esforçar muito para não vomitar em todos os lugares.
Novamente.
— O que aconteceu? – pergunto, tentando soar casual. Porra, eu
falhei. Não pareço tão imperturbável quanto eu esperava. Eu não quero
bater palmas, droga.
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Ela encolhe os ombros. — Não tenho certeza. – ela responde. —


Tudo o que sei é que uma horda de vadias com tesão já está reunindo-se
em torno dele em todos os lugares que ele vai. E Cindy disse que houve
uma festa de fraternidade ontem à noite e ele já estava curtindo com
outra garota enquanto Alison estava na mesma sala.
Meus olhos se arregalam como pires. Foda-se tentar parecer legal,
eu não me importo mais. — Sério? Ela ficou com raiva?
Amelia balança a cabeça lentamente, com um olhar estranho em seu
rosto. — Essa é a coisa estranha. Cindy disse que parecia que ela não se
importava.
A esperança palpita em meu peito. Talvez isso signifique que não
terei que lidar com uma ex-maluca se alguma vez tentar algo com ele.
Esqueça o fato de que ele não olhou duas vezes para mim, isso pode ser
facilmente mudado. Caras como Ryan são fáceis de enganar se você
souber como armar a armadilha.
Com esse pensamento em mente, mudo de assunto para o projeto de
arte de Amelia – nunca fui do tipo fofoqueira. De qualquer forma, estou
genuinamente interessada em sua arte. Ela pinta como Michelangelo e
sabe muito bem disso.
Agora só basta eu conseguir encontrar meu próprio hobby.

— Você está atrasada. – Barbie resmunga, com um cigarro meio


fumado pendurado no canto de sua boca paralisada. Só posso imaginar
que tipo de substância suja ela envolveu em torno de seus lábios - algo
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saboroso o suficiente para deixar crosta, eu acho.


Eu encolho os ombros, despreocupada com sua reclamação.
— O que você vai fazer sobre isso? – pergunto secamente. Não me
lembro da última vez que a minha mãe despertou em mim qualquer
emoção real além de irritação e desejo de que ela morresse já.
Ela me xinga - e eu devidamente a ignoro. Seus lábios se contraem
ao redor do cigarro e ela traga até quase acabar o cigarro.
Bom. Talvez ela morra mais rápido.
— Eu deveria ter abortado você. – ela murmura, com seus olhinhos
redondos olhando para mim.
— Viu. Podemos concordar em algo. – eu respondo, sem emoção
como sempre. — Você tem o maldito dinheiro ou o quê?
Ela enfia a mão no bolso do pijama sujo e tira algumas notas
amassadas.
Notas de um dólar, para ser mais precisa.
— Por favor, me diga que você está brincando.
Um sorriso maligno surge em seu rosto. Parte da crosta racha e cai
em seu colo. Eu mal posso sentir nojo.
— Isso é tudo que você merece.
Reviro meus olhos. Se dependesse desse desperdício de carne, ela
não me daria nem metade do dinheiro. Não que a mulher fosse se
esforçar para dar metade do dinheiro de qualquer maneira - não quando
ela tem que economizar sua energia para foder homens em busca de
drogas.
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— O que mereço e o que você precisa fazer são duas coisas


diferentes, Barbie. – eu retruco, tentando manter a calma e falhando. Eu
nem estou com raiva por ela não ter meu dinheiro. Eu esperava, na
verdade. Mas foda-se, ter que estar perto dessa mulher mais do que o
absolutamente necessário causa irritação em minha alma. Barbie não
tendo todo o dinheiro significa que tenho que voltar.
Ela ainda não está acostumada com nosso novo acordo, mas não
tem escolha a não ser ficar íntima desse novo relacionamento entre nós.
— Onde está o resto? – pergunto ao mesmo tempo em que imploro
a Jesus por paciência. E talvez alguma intervenção divina. Se uma
árvore for atingida por um raio e cair diretamente sobre a casa
exatamente onde ela está, eu me tornaria uma freira.
— Nas minhas veias. – ela diz, virando-se para abrir a geladeira. Eu
franzo o meu lábio quando o mofo paira da coisa velha. A geladeira
quebrou quando eu ainda morava aqui, e Deus sabe que ela não pode
comprar uma nova quando cheira ou injeta todo o dinheiro que não está
me dando.
Ela pega uma garrafa de água meio vazia.
Eu nunca fui o tipo de garota de copo meio cheio.
Eu bufo quando vislumbro o vazio absoluto na geladeira antes que a
porta se feche atrás dela. O que significa que o mofo está lá há algum
tempo e ela nunca o limpou. Toda a limpeza deixou de existir no
momento em que me mudei.
Claro.
— Deixe-me adivinhar: não conseguiu clientes suficientes? Seu
ganha-pão finalmente secou de todos os paus cheios de DST que você
enfiou dentro de você?
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— Vá se foder, River. – ela sussurra, jogando a garrafa agora vazia


em mim. Ela cai muito distante e bate inutilmente no chão. Que poético.
— Isso foi embaraçoso de assistir. – digo, sorrindo com a raiva dela.
Ela parece tentada a me atacar, mas nós duas sabemos que a derrubaria
facilmente.
Eu escolhi brigas suficientes na minha infância para me transformar
em uma vadia briguenta. Não que eu precise saber como brigar quando
se trata de um fantasma meio morto como ela tentando me machucar.
Essas brigas foram lições e não teriam sido tão vitais quanto o oxigênio
em meus pulmões se não fosse por causa dela e de seus clientes. É algo
pelo qual nunca vou agradecer, mas ela pode agradecer a si mesma se
tiver a infelicidade de esbarrar no meu punho.
— Eu deveria ter...
— Nós duas estamos bem cientes das coisas que você deveria ter
feito, Barbie. Mas, infelizmente, isso não muda o fato de que você não
tem a porra do meu dinheiro. – eu retruco, finalmente me cansando
desse carrossel em que constantemente nos encontramos.
Ela abre a boca para vomitar mais palavras venenosas na minha
direção, mas uma batida na porta da frente a interrompe. Seus lábios se
curvam.
— Saia, eu tenho um cliente.
Jogo as notas inúteis de volta para ela, com as bolas de papel
amassadas caindo a seus pés.
— Trabalhe muito duro esta noite. Quero meu dinheiro até terça-
feira.
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Três dias devem ser suficientes para uma prostituta como ela.
Entro no carro com um sorriso radiante no rosto, com meus olhos já
fixos no meu namorado. Cabelo loiro escuro jogado para o lado, um
suéter marrom com uma gola de flanela no decote e nos pulsos, calça
cáqui apertada, mocassins e um relógio de pulso. Ele esbanja elegância e
classe.
Normalmente, um boyzinho não é meu tipo. Ryan é diferente, no
entanto. Ele se comporta com tanta confiança e naturalidade - de uma
forma que sugere que ele não tem medo de nada. Isso me atraiu tão
profundamente.
Se nada pudesse assustá-lo, certamente os monstros escondidos em
minha cabeça também não o fariam.
Os olhos de Ryan encontram os meus, o azul sem brilho movendo
com segredos e algo escuro que me atraiu como uma mariposa para uma
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chama. Depois de quase dois anos juntos, sinto que apenas arranhei a
superfície com ele.
E, finalmente, estou conhecendo seus pais. Por muito tempo, ele
evitou, alegando que não queria apresentar outra garota para seus pais
até ter certeza de que era a garota com quem ele iria se casar. O dia em
que ele me disse que queria que eu os conhecesse foi um dos dias mais
felizes da minha vida.
Ele diz que eles vão me amar. Eu digo que vão me amar também.
Os pais costumam amar.
— Você está usando muita maquiagem. – ele comenta. O sorriso
derrete em meu rosto como manteiga em uma frigideira.
Eu pisco.
— Não mais do que o normal. – eu argumento gentilmente. Não
desvio o olhar enquanto coloco o cinto de segurança.
Ele se afasta de mim de qualquer maneira, colocando seu BMW em
movimento e saindo com facilidade. Coloco uma mecha do meu cabelo
preto encaracolado atrás da minha orelha, de repente autoconsciente.
Pesei demais na base? Meu rosto parece um bolo com covinhas? Talvez
eu devesse não ter usado o delineador.
— Talvez dê certo. – diz Ryan após vários minutos de silêncio.
Meus olhos viram para ele novamente. Às vezes ele parece muito
próximo de um buraco negro. Ele suga você, corpo e alma, sem chance
de escapar enquanto ele destrói cada pedacinho de você.
— Como assim?
— Vai ser sexy ver isso escorrendo pelo seu rosto depois de chupar
meu pau. – ele diz isso casualmente, mas com a escuridão suficiente se
aproximando.
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Minhas sobrancelhas perfeitamente feitas formam um pequeno V.


Ele ainda está olhando para frente, com uma mão no volante e a outra
casualmente no câmbio. A imagem da sensualidade e da força. Um
pequeno sorriso aparece no canto de seus lábios finos. Essa é a palavra
dele. Ele está se sentindo particularmente selvagem esta noite.
— Você quer dizer depois do jantar? – eu esclareço, esperando estar
certa.
Ele dá uma pequena olhada com o canto do olho, com seu sorriso se
estreitando.
— Agora mesmo, River.
Esperança - que emoção inútil.
Ele está me punindo por usar muita maquiagem. Ele diz que tenho
uma beleza natural e maquiagem me faz parecer uma prostituta. Mas
sempre adorei usar cores em meu rosto. Eu me certifico de não pegar
muito pesado, mas isso não importa para Ryan. Intensificar minha
beleza significa intensificar os olhares de outros homens. Ele é
possessivo e fica territorial quando outros homens dão em cima de mim.
Ele ainda não me desencorajou para usá-la.
Às vezes eu gosto quando ele tenta. E às vezes não.
Seu pau já está duro, pressionando contra sua calça cáqui. Ele é um
cara comum, mas usa isso como se fosse uma arma.
— Ryan... – Sua sobrancelha arqueia em desafio à minha hesitação,
desafiando-me a desafiá-lo. Lambo meus lábios enquanto uma sensação
de enjoo cresce em meu peito. Como posso sair dessa sem irritá-lo? Se
eu recusar, vou decepcioná-lo, e isso é a última coisa que quero.
— Estou conhecendo seus pais pela primeira vez. Preciso causar
uma boa primeira impressão. – Meu argumento é válido. Mas ainda sai
fraco. Por que motivo? Parece que estou dizendo que meu hálito cheira
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mal, então não posso chupar o pau dele agora.


Normalmente, eu adoraria a oportunidade. Há sempre uma boa dose
de apreensão quando se trata de sexo com Ryan. Ele tem um apetite
estranho e ainda estou aprendendo a lidar com isso. Tudo que eu quero é
satisfazê-lo. Fazê-lo feliz. Dar a ele algo que nenhuma outra mulher deu
antes de mim.
Lutar pela aprovação de Ryan tem sido minha prioridade número
um desde o dia em que chutei uma garota de seu lugar ao lado de Ryan e
a substituí. Sua conquista da semana não gostou, e eu prontamente disse
a ela para se foder. Ele olhou para mim como se estivesse vendo uma
mulher de verdade pela primeira vez. Reverência, admiração e muita
necessidade.
Isso despertou algo dentro de mim. Na verdade, acendeu um inferno
inteiro. Daquele dia em diante, eu queria que Ryan olhasse para mim
assim todos os dias. Como se cada dia fosse uma nova descoberta.
Ryan gostou da minha falta de vergonha na época. Mas agora ele
gosta de mim dócil. A maquiagem borrada pelo meu rosto não é um
talvez - é uma promessa. Uma que ele, sem dúvida, sairia de seu
caminho para fazer acontecer. No entanto, meu corpo me trai, com o
calor entre minhas pernas ficando úmido.
Estou decepcionada comigo mesma. Desapontada porque, embora
eu realmente não queira fazer isso, meu corpo diz o contrário.
Ryan também sabe disso. Eu fui derrotada. Não vou tirar esse olhar
de Ryan se recusar.
— Você tem dez minutos até chegarmos lá. – ele diz friamente. Ele
nem se dá ao trabalho de desabotoar para mim. Ele prefere que eu perca
tempo.
A ansiedade se infiltra em meus nervos. Minhas mãos tremem e se
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atrapalham com seu botão, arrancando uma risada cruel de sua


garganta. Lágrimas ardem em meus olhos, sentindo-me envergonhada.
Ryan é tão experiente e sempre me faz sentir como uma virgem.
Faço como ele diz. E ele também mantém sua palavra. Ele empurra
minha cabeça para baixo até que eu esteja sufocando e ofegante. E
quando penso que vou desmaiar; ele empurra minha cabeça para baixo
com mais força. Lágrimas escorrem dos meus olhos, ranho escorre pelo
meu nariz e baba escorre pela minha boca.
O babaca leva nove minutos para gozar.
Estou ofegante quando entramos na garagem. Abaixando o visor,
examino o dano.
Eu estou em estado deplorável.
Limpo as evidências o melhor que posso, mas não estou tão bonita
quanto quando entrei no carro. Acho que ele gosta de mim feia.
— Certifique-se de estar apresentável. – ele ordena. Um resmungo
sobe pela minha garganta e as lágrimas surgem de novo em meus olhos,
desta vez de frustração. Por que ele precisa cavar a faca mais fundo? Ele
conseguiu o que queria. E, obviamente, preciso estar apresentável. Pela
minha própria dignidade, não pela dele. Apesar da minha raiva, não digo
isso em voz alta. Isso pode deixá-lo com raiva de mim, e eu já estou
exausta.
Ryan está calmo agora, com seus músculos relaxados enquanto me
observa me limpar. Felizmente, a maquiagem essencial sobressalente
está na minha bolsa. Eu retoquei a maquiagem. Deslizo batom vermelho
em meus lábios carnudos apenas para irritá-lo. E uso um cotonete para
remover o resto do delineador sem bagunçar mais nada.
Cotonetes é vida.
Sua mão acaricia suavemente minha bochecha quando termino,
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embora um brilho de menosprezo apareça em seus olhos quando ele


nota o batom vermelho.
— Eu te amo. – ele murmura.
Ele olha para mim como se eu fosse uma propriedade. Eu gosto de
ser a sua posse. Essas três palavras eliminam qualquer raiva ou
constrangimento persistente. Eu sou patética pra caralho.
— Também te amo. – digo, com aquele sorriso perdido novamente e
estampando meu rosto mais uma vez. Estou pronta para conhecer os pais
dele agora. Talvez um dia eles se tornem meus sogros. Eles serão os
primeiros pais que eu já tive.
Ryan conheceu minha mãe há três semanas. Era tudo o que você
poderia esperar ao entrar no ninho de uma víbora. Ela zombou dele com
desdém. Ele levantou o queixo e olhou para ela igualmente enquanto eu
me movia nervosamente de um pé para o outro. Quando ele ordenou que
eu ficasse quieta, afirmando seu domínio sobre mim, eu escutei. Barbie
resmungou e me chamou de fraca. Parte de mim teve que concordar com
ela.
Crescer em uma maldita cidade, em uma pocilga com uma mãe
ainda pior te ensina a ser independente. Shallow Hill é um terreno fértil
para gangues, prostitutas e sem-tetos. Aprendi a sobreviver. Mas estou
desprovida de conexão humana. Às vezes parece que Ryan pega aquela
necessidade patética dentro de mim e a usa a seu favor.
Enquanto a Barbie vive entre as baratas, os Fitzgeralds vivem com
conforto e estilo. A casa da infância de Ryan é uma casa cinza de três
andares, com paredes de pedra acentuadas e uma entrada de pedra.
Bonitos postes de luz se alinham na passarela que leva até a porta da
frente vermelha brilhante. A luz quente e brilhante atravessa as janelas,
convidando qualquer um para o seu calor.
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E tem grama. Grama verde, para ser mais precisa. Com uma cerca
de piquete branca ao seu redor. Minha casa nunca teve grama tão verde.
Apenas relvas crescidas demais, folhas marrons e frágeis, caídas com
lixo aleatório espalhado pelo quintal.
A porta se abre assim que nossos pés atingem o primeiro degrau. A
primeira coisa que invade meus sentidos é o cheiro de torta de maçã
caseira. Tem um cheiro absolutamente divino, quase fazendo meus olhos
revirarem para trás da cabeça, assim como os de Ryan estavam alguns
minutos atrás. Um rosto radiante e sorridente nos cumprimenta em
seguida.
A mãe de Ryan é impressionante. Cabelos loiros, olhos azuis
brilhantes e rugas de riso sutis que se curvam em torno de um sorriso
sincero. Ela irradia pura energia positiva - algo que nunca experimentei
antes. Eu poderia envolvê-la em um abraço caloroso e seria como voltar
para casa.
Sim.
Ela poderia ser minha mãe.
— Bem-vindo ao lar, querido. – ela diz a Ryan primeiro, levantando
a bochecha para aceitar um beijo casto. Virando-se para mim, ela diz: —
Ah, você não é linda. Meu nome é Julie, por favor, entrem.
Linda.
A palavra me faz estremecer. Muitas vezes a palavra saiu de lábios
rachados, dentes irregulares amarelados e acompanhada de hálito
rançoso. Eu não deixo a palavra vacilar meu sorriso. Perseverança.
— É um prazer conhecê-la, Sra. Fitzgerald. Obrigada por me
receber. – digo educadamente, com um sorriso radiante seguindo minhas
palavras.
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— Ah, por favor, me chame de Julie. – ela corrige, acenando com a


mão em minha saudação.
— Acho que posso lidar com isso. – adiciono com uma piscadinha
fofa. Quando ela ri, nós derretemos comumente na ponta dos dedos uma
da outra. Instantaneamente, sinto um vínculo com ela que me lembra
muito Camilla.
Ryan observa a interação com um olhar atento. Quando meus olhos
dourados se chocam com os dele, ele me dá um aceno de aprovação. Eu
não precisava de sua aprovação – eu já sabia que tinha a aprovação de
Julie. Mas seu elogio envia orgulho em minhas veias como uma dose de
morfina.
Sr. Fitzgerald é um homem alto e rechonchudo com profundas rugas
de expressão, olhos castanhos brilhantes e uma mão suave quando ele
envolve a minha mão delicada. Ele se apresenta como Matt. A energia
dele está na mesma sintonia que a de Julie. Calorosa e segura.
— Eu sou River, é um prazer conhecê-lo.
— Que nome interessante. – ele comenta ligeiramente.
— É onde nasci. – eu encolho os ombros. Suas sobrancelhas
levantam em questão, com sua atenção agora despertada.
Poucas pessoas nascem em rios. É muito anti-higiênico. Mas essa
palavra resume a totalidade de Shallow Hill.
— Mas isso é uma história para outro dia. – eu rio, esperando –
rezando – que ele siga em frente. Ele faz isso com um toque de
relutância, o incomum local de nascimento o intriga. Ainda nem contei
essa história a Ryan. Não que ele já tenha perguntado.
Não é uma história feliz de qualquer maneira. Talvez ele suponha
isso e não queira saber do meu sofrimento porque me ama.
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Ou ele é apenas um idiota e eu estou delirando.


Assim que relaxo, um deus caminha pelo hall de entrada. A
princípio, estou convencida de que sou a única que o vê. Certamente,
apontar que o gêmeo maligno e mais sexy de Zeus está andando no reino
humano me faria parecer louca.
Mas então Ryan fica tenso ao meu lado. Talvez ele tenha os poderes
da Medusa?
Julie conduz o homem adiante, encorajando uma apresentação.
Por favor, não.
Ele é alto - mais de um 1,80m, mas nunca fui boa em adivinhar
alturas. Cabelos pretos como nanquim, um pouco mais longos em cima
do que nas laterais, olhos verdes vivos que competem com a grama lá
fora e tatuagens. Tatuagens em todos os lugares.
— Você é o irmão dele? – A pergunta escapa antes que eu possa
pará-la. Eu cuidadosamente mudo minha feição para uma de curiosidade
inocente. Os membros de pedra de Ryan se desarticulam o suficiente
para virar a cabeça para me encarar. A aprovação desaparece como
fumaça ao vento.
Segunda falta, River. Claramente, há conflito entre os dois.
Os lábios carnudos do homem curvam em um sorriso. Um que me
diz que sabe que eu nunca soube de sua existência até agora. Esse
sorriso pode causar uma reação visceral dentro de mim que me recuso a
nomear ou reconhecer, mas que pena para ele. Ele pode ser gostoso, mas
estou apaixonada por Ryan.
— Eu sou. – ele responde brevemente. Fico abalada até o âmago
quando ele fala. Sua voz é profunda como o oceano, mas suave e sedosa.
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Ele é perfeito demais. Uma das razões pelas quais Ryan o odeia. Não
foi dito em voz alta. Afinal, eu nem sabia que ele existia até dois
minutos atrás. Mas Ryan e eu estamos sintonizados um com o outro
agora. Posso sentir o que ele sente. E o ódio está emanando dele em
ondas.
Uma boa namorada também o odiaria, puramente por associação.
Certamente, há uma boa razão para Ryan o odiar.
Eu murmuro, mudando minha feição para uma expressão vazia. Não
serei rude com ele na frente de Julie e Matt, mas também não cometerei
o erro de ser legal.
A mão delicada de Julie pousa em seu bíceps, com um tom
vermelho iluminando suas bochechas. — River, este é meu outro filho,
Mako. Mako, esta é a namorada de Ryan, River. – Julie apresenta,
notando a falta de apresentação que seus filhos ofereceram e olhando
para ambos com desaprovação.
Eu digo um educado: — Prazer em conhecê-lo, Mako.
Que nome estúpido.
Mais uma vez, ele levanta aquela sobrancelha estúpida como se
soubesse o que estou pensando. E quando ele responde, parece que está
respondendo ao meu pensamento. — Igualmente.
Ryan sutilmente move seu corpo na minha frente. Garoto estúpido.
Ele apenas entregou sua insegurança.
Eu gosto que ele seja inseguro quando se trata de mim.
Mako percebe, e sua sobrancelha se levanta ainda mais. Ele não
sorri. Ou considera isso um desafio. Ele apenas balança a cabeça e vai
embora.
Estranho.
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— Não me disse que tinha um irmão. – eu sussurro


acusadoramente quando Julie e Matt seguem Mako em direção à sala de
jantar.
— Eu não tenho. – ele diz antes de ir atrás deles.
Você tem, mentiroso.

Julie e Matthew têm uma casa que saiu da revista Home


Improvement. Todo o projeto é uma atmosfera rústica, com vigas de
madeira expostas, várias colorações de madeira e luz suave em toda a
casa que lhe traz conforto e aconchego. Tudo nesta casa parece
aconchegante, apesar de seu tamanho enorme. É difícil desviar os olhos
de cada detalhe quando tudo que posso imaginar é como seria minha
vida se eu crescesse em uma casa como esta.
Não consigo imaginar que seria tão amarga quanto os dois homens
adultos sentados à mesa, um dando olhares de ódio e o outro ignorando
sua existência completamente. Mako só olha ou interage com seus pais,
mas quando faz isso, sua expressão é cheia de cordialidade e respeito.
Considerando que Ryan come seu jantar como uma criança mimada
forçada a comer suas verduras.
Como alguém pode ser infeliz quando você tem uma casa e pais
assim?
— Então, River, Ryan me disse que você vai se formar na faculdade
este ano. No que você está se formando? – Matt pergunta logo antes de
colocar uma garfada de brócolis na boca. Ryan coloca a mão na minha
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coxa e aperta, como se me avisando para não dizer a coisa errada.


Que pergunta típica. Por que não me pergunta quais são meus
interesses? Onde eu cresci? Que tipo de pessoa eu sou? E as coisas que
realmente dizem sobre uma pessoa?
Eu poderia ser uma vadia louca. Talvez eu seja uma vadia louca.
Não seria importante saber?
Eu sorrio serenamente. — Psicologia.
Que resposta típica.
Como se estivesse lendo minha mente, Ryan revira os olhos. Ele
nunca aprovou minha escolha de carreira.
Por que você não quer que eu te entenda, doce Ryan?
— Por que psicologia? – Mako pergunta desta vez, olhando para
mim ao invés de sua comida. Eu tremo quando sua voz ecoa. Ele não
falou comigo desde a nossa apresentação.
Hum. Porque minha mãe fez muita merda quando eu era criança e
estou desesperada para entender por quê? Não, não pode ser isso. Quem
se importaria em entender uma viciada em crack? Isso é tudo que existe
para ela. Seringas e crack.
Eu encolho os ombros. — Porque sou boa em entender as pessoas. –
respondo suavemente.
— Ah, você se achou esperto, Ryan. Certifique-se de ter cuidado. –
Matt brinca, piscando para Ryan enquanto faz isso. Matt fala com a boca
cheia. Julie o repreende levemente por fazer isso. Ele apenas sorri para
ela em troca.
Algo me diz que não incomoda muito Matt. Isso me faz querer
descobrir o que incomoda.
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Ryan zomba humildemente. — Acho que posso lidar com ela.


Eu acho que posso lidar com você também, baby.
O jantar se arrasta. Toda vez que me fazem uma pergunta, Ryan
aperta minha coxa, avisando-me para tomar cuidado com minha boca.
Não tenho certeza do que poderia dizer, mas estou começando a me
sentir desanimada. Será que eu o envergonho tanto?
No momento em que enfio o último pedaço de torta de maçã
pecaminosa na boca, posso sentir um hematoma se formando. É quase o
suficiente para me distrair da torta, mas tenho certeza de que podemos
ser bombardeados por um terrorista agora, e eu ainda pediria segundos.
Ele vai beijar o hematoma em mim mais tarde.
— Você precisa de ajuda para lavar a louça? – pergunto a Julie
graciosamente. Ela sorri para mim e aceita. Ryan bate na minha coxa
duas vezes em agradecimento. Eu sorrio quando a vertigem inunda meu
peito.
Pego o meu prato e o de Ryan primeiro, com as minhas mãos
tremendo com a perspectiva de quebrar a porcelana fina de Julie. Com o
dinheiro que Matt e Julie ganham, esta porcelana provavelmente custa
mais do que minha mensalidade da faculdade. Se eu quebrá-la, vou
envergonhar Ryan. Ele nunca me perdoaria por isso.
Quando dou a volta para pegar o prato de Mako, ele gradualmente
vira seu olhar para mim. Seus olhos encontram os meus, e eu gostaria de
não ter ficado por perto. Julie deveria ter levado seu prato.
Estendo a mão em expectativa, mantendo um sorriso simpático no
rosto. Ele leva seu tempo, como se eu estivesse aqui esperando por ele,
não importa o que aconteça. Os olhos de Ryan queimam o lado da minha
cabeça e toda a apreciação anterior desapareceu.
Agora estou brava. Eu trabalhei duro para isso.
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— Seu braço perdeu a função motora? – pergunto com um tom


entediado quando Mako apenas olha.
O menor movimento contrai seus lábios exuberantes. Sem desviar o
olhar, ele entrega o prato. Eu o arranco de suas mãos e saio correndo,
dane-se a porcelana. Meu coração está acelerado e meu estômago está
revirando. Sinceramente, não consigo descobrir o porquê. Ele nem tinha
falado comigo.
— Você está bem? – Julie pergunta, observando a expressão no meu
rosto. Não tenho certeza de como é, mas imagino que pareço nervosa.
Muito mais nervosa do que deveria estar quando acabei de comer a
melhor torta de maçã da Carolina do Norte. Provavelmente até do
mundo.
— Tudo bem. – eu sorrio, colocando delicadamente os pratos na
água com sabão que Julie havia preparado.
— Eu lavo, você seca. – ela diz.
Que clichê. Sorrio e obedeço, pegando um pano de prato seco e
esperando o primeiro prato. Acho que lavar pratos nunca foi tão
estressante na minha vida.
— Então, como você e meu filho se conheceram?
Franzo a testa, um pouco surpresa por Ryan ainda não ter contado a
ela. Presumi que Ryan pelo menos havia contado a ela tudo sobre mim.
— Faculdade. – digo, forçando o sorriso novamente no meu rosto.
— Estávamos juntos na mesma aula de História Americana. Eu o notei
antes que ele me notasse. – Carinhosamente, me lembro de todas as
vezes que vi Ryan entrar pelas portas, rindo e conversando com os
amigos. Às vezes até com outra garota. Esses momentos foram
péssimos.
Depois que ele e Alison terminaram, levou apenas alguns meses
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antes de eu dizer foda-se e decidir chutar a garota para fora de seu lugar
e sentar ao lado dele. Eu era uma pequena caloura e ele era o grande
veterano mau, com garotas escorrendo de seus braços como água.
Mesmo depois que eu o persegui, não foi até a metade do meu segundo
ano que ele se comprometeu apenas comigo, muito depois de se formar.
Ele tinha acabado de sair de um longo relacionamento e não estava
pronto para outro tão cedo, disse ele. Ele queria passar o resto de seus
anos de faculdade solteiro.
Eu esperei por ele.
Julie me entrega um prato. A ansiedade me provoca quando pego o
prato com o pano de prato, tomando cuidado para não manchá-lo com os
dedos. Enxugo-o delicadamente e coloco-o na mesa com toda a graça
que consigo reunir. Normalmente não sou desajeitada, mas também não
costumo ficar nervosa. Eu não lido bem com nervosismo.
— Ele é um bom garoto. Ambos os meus meninos são. – ela diz. —
Parece que vocês dois estão apaixonados.
O elogio envia calor percorrendo pelas minhas veias. Se a mãe dele
pode ver, então ele deve me amar de verdade, certo?
— Nós estamos. – eu concordo.
Alguém bufa atrás de nós. — Okay, certo.
Quase deixo cair o prato da minha mão. Aquela voz. Um calor
diferente preenche o meu corpo. É um sentimento que não consigo
identificar, mas me envergonha de qualquer maneira. Ele não deveria
estar me fazendo sentir nada.
Colocando cuidadosamente o prato na mesa, eu me viro e olho para
Mako com desgosto. Em vez de falar como eu quero, eu me viro e dou
as costas para ele. Ele não significa nada para mim.
Não causaria uma boa impressão na frente da mãe de Ryan se eu
discutisse com o outro filho dela. Eu nunca iria querer envergonhar
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Ryan assim.
— Ah, pare com isso, Mako. – Julie adverte ligeiramente, acenando
com a mão ensaboada no ar para parar suas palavras. A espuma voa da
mão dela para a minha.
— Ryan não ama ninguém mais do que a si mesmo. – afirma Mako
secamente, enquanto abre a geladeira e pega uma cerveja. Eu me
concentro na espuma na minha pele bronzeada, observando as bolhas
estourarem e se desintegrarem lentamente.
Não se envolva, River. Isso é o que ele quer.
— Ela vai embora logo. Assim como as últimas. Mas acho que ela
já sabe disso, já que é muito boa em entender as pessoas.

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Minha cabeça bate na parede enquanto uma mão segura minha
mandíbula. Os dentes de Ryan acompanham, devastando meu pescoço
até que estou rangendo minha mandíbula com a mistura de dor e prazer.
Eu arqueio minhas costas, gemendo enquanto os seus dentes afiados
extraem sangue.
— Sem chupão. – eu aviso, empurrando seu peito nu um pouco. Ele
apenas pressiona ainda mais em mim, resmungando para mim em
advertência.
— Você é minha. Vou fazer o que eu quiser. – ele resmunga,
mudando seu ataque para o outro lado do meu pescoço.
Ele morde particularmente forte, soltando um suspiro marcante
entre meus lábios. Isso dói. Mas não o impeço. Quero isso. Eu realmente
quero. Eu quero, eu quero, eu quero.
Eu atribuo minha própria dor, cravando minhas unhas em seu peito.
Uma coxa se encaixa entre as minhas, e eu me esfrego descaradamente
nela, extraindo prazer. Mais gemidos escapam da minha garganta,
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enquanto suas mãos agarram meus seios nus e apertam. Não tenho seios
enormes, mas eles ainda enchem as mãos de Ryan. Ele adora isso.
Beliscando um mamilo com seus dedos, ele afasta a boca do meu
pescoço - finalmente - e ataca minha boca, enfiando a língua entre meus
dentes. Eu a engulo avidamente, enviando gemidos ao entrelaçar nossas
línguas. Eu me movo com mais força, sentindo o início de um orgasmo
começar a crescer.
Eu preciso de mais, no entanto.
— Foda-me. – eu imploro entre beijos.
Ele se afasta, olhando intensamente para mim. Seus olhos azuis
escureceram como as águas profundas do oceano. É um pouco
desanimador que não consigo discernir se é de luxúria ou raiva. Ou
talvez um pouco de ambos.
— Você quer que eu te foda? Ou você gostaria que eu fosse o
Mako? – ele resmunga, envolvendo sua mão em volta do meu pescoço e
batendo minha cabeça contra a parede mais uma vez. Não forte o
suficiente para machucar realmente, mas sua agressividade é confusa.
Eu fico imóvel, e minhas sobrancelhas levantam. Gelo impregna
meu corpo, distinguindo todo o calor que irradia de meus poros.
— O que? – pergunto, totalmente perplexa com sua pergunta. Meu
sangue gela enquanto Ryan continua a me encarar. Não há mais dúvida
se é por luxúria ou raiva. Meu namorado está completamente furioso e
não tenho ideia do porquê. Eu não tinha pensado em Mako nenhuma vez
desde que entramos pela porta e ele rasgou minhas roupas.
— Não se faça de estúpida, River.
Minha boca abre e fecha, sem saber o que diabos dizer. Estou
surpresa com a pergunta dele. Ele assume isso como culpa. Ele me
empurra com força, me pressionando contra a parede pela terceira vez.
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Desta vez é forte o suficiente para me fazer tombar. Bati meu cotovelo
no chão no processo, com a dor subindo pelo meu braço.
— Eu sabia disso. – ele grita, olhando para mim com acusação.
Olho para ele em estado de choque, com o pânico aumentando.
Como ele poderia pensar isso? Por que ele não consegue ver o quanto eu
o amo? — Ryan, eu não tenho ideia do que você está falando. Não quero
Mako, só quero você. – eu imploro, desesperada para que ele veja a
verdade. Porque não quero Mako. Eu me levanto do chão e dou um
passo em direção a ele, com as minhas mãos levantadas em sinal de
conciliação.
Ele se sai melhor e avança em minha direção. Instintivamente, eu
recuo contra a parede. Esta parede e eu nunca nos conhecemos tão bem,
e isso está começando a me irritar. Ele pressiona seu peito no meu e se
inclina para frente até sua respiração provoca minha orelha.
— Se você estiver mentindo para mim, eu vou te machucar, River.
A ameaça envia calafrios pela minha espinha. Ele nunca me
ameaçou antes, não com violência física, pelo menos. Apenas um
minuto atrás, eu estava no topo do mundo, pronta para gozar em sua
coxa antes que ele me fodesse brutalmente. Agora, sinto-me desolada.
Vazia, insatisfeita e completamente desolada.
— Eu não estou. – digo. Parece fraco. Patético e desesperado.
Terminado o momento, ele bufa como um touro e se afasta, com o
jeans ainda caindo. Olho para o meu próprio corpo nu. Uma marca de
mão marca minha coxa desde o jantar.
Inclinando minha cabeça para o lado, eu a observo.
Em meus livros de psicologia, isso seria considerado abuso. Mas eu
me sinto abusada?
A lágrima escorrendo pelo meu rosto responde a minha pergunta
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para mim. Eu enxugo antes que Ryan veja.


Idiota.
— Então, como foi conhecer os pais? – Amelia pergunta, com seus
olhos castanhos cheios de expectativa irradiando empolgação. Não
somos mais colegas de quarto, mas nunca nos separamos, mesmo
conosco agora no último ano e em casas separadas.
Forço um sorriso amplo. Conhecer os pais foi ótimo até chegarmos
em casa, então tudo deu errado. Ainda estou confusa com o que
aconteceu, e desde então um buraco frio e profundo se formou em meu
estômago. — Os pais dele são muito legais. Acho que eles gostaram de
mim.
O sorriso de Amelia cresce e ela pula algumas vezes com
entusiasmo. Minha melhor amiga é uns bons quinze centímetros mais
baixa do que eu, então é como assistir a uma dança de duende porque
eles encontraram o ouro no final do arco-íris. — Estou feliz pra caralho
por você, amiga. Eu sei o quanto importante é conhecer os pais.
Ela está. Ela e o marido, David, estão juntos há cinco anos, um de
casados. No começo, os pais católicos de David não aprovavam as
crenças ateístas de Amelia. Demorou vários anos até que eles se
tornassem amigos dela e agora a convidam para jantar. Eles são um
casal lindo, por dentro e por fora. Nunca conheci um homem mais
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sincero do que David. Não faz mal que ele pareça um lenhador daqueles
romances eróticos que eu lia escondido na biblioteca quando era uma
garotinha. Suponho que funcione, considerando que Amelia parece ter
saído da revista Vogue, apesar de sua baixa estatura.
Eu encolho os ombros. — Para ser honesta, eles são aqueles tipos de
pais que provavelmente amariam alguém, desde que não fossem
adoradores de Satanás ou algo assim. Eles são pessoas bem tranquilas.
Amelia acena com a mão. — Seja qual for o motivo, estou feliz.
Você fodeu na cama de infância dele? – ela pergunta, movendo as
sobrancelhas para mim sugestivamente. Agora parece um Leprechaun
seduzindo uma criança para comer os amuletos da sorte.
Eu rio. — Nada disso desta vez.
Ela faz um barulho de nojo. — Você me desapontou.
Estamos a caminho de uma sorveteria local que vende o melhor
sorvete em um raio de oitenta quilômetros. É apenas uma pequena
cabana com bancos do lado de fora. Dá a você aquela experiência
completa - você não está realmente tomando sorvete, a menos que esteja
correndo contra o sol e tentando tomá-lo antes que derreta em sua mão.
— Ele tem um irmão, no entanto. Eu nem sabia disso até chegar lá.
– eu menciono casualmente. Quando Amelia para de andar e franze a
testa para mim, eu mordo meu lábio. — Isso é estranho, não é?
— Tipo, nunca, nunca o mencionou? Nunca?
— Jamais. Na verdade, ele disse especificamente que era filho
único.
Sua testa franzida intensifica, junto com os dentes cravando em meu
lábio. Só paro quando começo a sentir gosto de cobre. Seu cabelo loiro
move ao vento enquanto ela se vira e caminha para trás, com mechas
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grudadas em seu rosto enquanto ela parece contemplar isso. Sua beleza
sem esforço me faz querer borrar sua maquiagem ou algo assim. Estou
apenas esperando que ela tropece, mas ela nunca faz isso.
Ela é uma vadia graciosa.
— Tem certeza que ele é realmente o filho deles?
Eu encolho os ombros. — A mãe dele disse isso várias vezes.
— Hum. – ela diz. — Imagino por que.
Eu bufo. — Bem, isso ficou um pouco claro quando os vi juntos.
Eles se odeiam.
— Talvez eles tenham alguma estranha rivalidade entre irmãos
acontecendo. – ela diz casualmente.
Chegamos à sorveteria e o cardápio chamou sua atenção. Decido
esquecer isso. Já ouvi falar de irmãos se odiando. Isso acontece.
Normalmente, eles não agem como se o irmão não existisse, a menos
que algo importante aconteça.
O que você está escondendo, doce Ryan?
— Oi. – Uma voz ecoa atrás de mim. O som faz meu coração parar.
Eu me viro para encontrar minha inimiga. A ex-namorada de Ryan.
Amelia se vira e seu rosto a entrega. Ela nunca foi formalmente
apresentada a Alison, mas sabe exatamente quem ela é. E ela também
sabe que a vadia tentou sabotar meu relacionamento.
Cabelos castanhos claros, olhos castanhos que mudam de cor
dependendo da iluminação e um corpo bombástico. Ela é linda e eu a
odiei à primeira vista. Ainda mais quando conversei com ela.
— Oi, Alison. – respondo friamente. Ela tem a audácia de parecer
nervosa.
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— Desculpe se estou incomodando. Só queria ver como você está?


Tento não empalidecer, mas faço mesmo assim. As sobrancelhas de
Amelia franzem em confusão. Eu limpo minha garganta.
— Estou bem.
Seus ombros caem, junto com sua voz enquanto ela sussurra: — Eu
realmente gostaria que você me ouvisse.
A raiva envolve em minhas entranhas com tanta força que a minha
garganta se fecha. Amelia sabe que ela tentou sabotar o meu
relacionamento, mas eu nunca contei a ela como. E não pretendo falar
disso.
— Esta não é a hora nem o lugar. – eu murmuro baixinho, então só
ela pode ouvir.
Os lábios carnudos e mentirosos de Alison ficam sérios. Covinhas
aparecem em suas bochechas e eu a odeio por isso. Minhas covinhas
estão escondidas em minha expressão de riso. As dela são mais fofas.
Finalmente, ela acena com a cabeça. Ela dá um olhar para Amelia e
passa por mim. Sua mão toca meu cotovelo brevemente enquanto ela
sussurra: — Tenha cuidado.
Eu mal me contenho de arrancar meu braço de seu aperto. Em vez
disso, mantenho meu olhar direto para frente e a deixo passar.
Amelia entrega meu sorvete lentamente, olhando para o local onde
Alison desapareceu com confusão.
— Ela foi... legal. – ela termina hesitante.
— Ela é uma cobra.
Amelia não parece convencida. E isso parte um pouco meu coração.
— O que ela disse?
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— Nada que eu já não tenha ouvido. Ela está com ciúmes e quer
que eu o deixe.
Não compartilho os motivos. Isso é para eu pensar.
O rosto de Amelia se transforma em desgosto. — Que vadia.
Ela é, não é? Contemplo isso enquanto lambo meu sorvete de menta
com gotas de chocolate.

— Onde você estava? – Ryan pergunta assim que cruzo a porta.


Faço uma pausa e, porra, isso me fez parecer culpada. Ele está sentado
no sofá, com um pé apoiado no joelho enquanto assiste à ESPN. A casa
está impecável, e nosso gato, Bilby, cochila no encosto de cabeça atrás
dele.
— Tomei sorvete com Amelia depois da aula.
— Sim, tenho certeza. – ele diz com desdém, sem tirar os olhos da
tela nem uma vez. — Ela age como uma prostituta, então tenho certeza
que havia caras lá também.
Eu suspiro baixinho. — Querido, éramos só nós duas, eu juro. Sem
caras. E ela tem um casamento feliz com David.
Ele enrola a língua em sua boca. Ele está irradiando raiva. O ar fede
ao seu mau humor. — Deixe-me ver seu celular, então. – Eu hesito. Por
que ele precisa ver meu celular?
Ele estende a mão em expectativa. Relutantemente, eu o entrego.
Não porque eu tenha algo a esconder, mas porque ele não confia em
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mim e eu quero consertar isso. Ryan é meu primeiro relacionamento,


então não é como se eu fosse uma infame traidora e tivesse um passado.
Não me interpretem mal, eu dormi com alguns caras e Ryan sabe disso,
mas eu era solteira e independente. Ryan fez o mesmo, então não é justo
usar meu passado contra mim. Sua desconfiança é completamente
injustificada. Eu nunca dei a Ryan qualquer motivo para pensar que eu
iria querer outra pessoa.
Eu o vejo abrir minhas mensagens, percorrê-las e, em seguida, abrir
cada bate-papo e verificá-los. Então ele abre minhas redes sociais e,
finalmente, minhas fotos. Ele desliga o celular e acena com a cabeça em
aceitação.
— Isso significa que também posso olhar seu celular? – digo com
uma ponta de amargura. Ele olha para mim e me encara fixamente.
Embaraço me consome. Vou levar isso como um não.
— Como foi o trabalho? – eu tento, mudando de assunto e tentando
soar alegre. Eu odeio quando ele está com raiva.
Ele vira o seu olhar para mim. — Meu pai contratou uma nova
secretária. Mesma idade que eu. Não conseguia manter suas mãos de
vadia para si mesma.
Meu sangue gela e a ansiedade explode em meu estômago, girando
como ácido. Ela é mais bonita do que eu? Ele transou com ela? E se ela
for melhor do que eu?
— É melhor que ela tenha. – eu retruco, com minha atitude cada vez
mais adormecida subindo à superfície.
Por fim, um sorriso. Ou melhor, um sorrisinho. Seu pé começa a
bater no joelho.
— Não se preocupe, baby. Não quero ninguém além de você. – ele
garante com doçura. Algo obscuro se desenrola em meu peito,
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maculando qualquer aparência de bom humor que eu tinha. Alison já


havia estragado meu dia, e agora a atitude estranha de Ryan está
arruinando-o completamente.
— Venha aqui, baby. Eu só senti sua falta, isso é tudo. Sou patético
e só quero você por perto o tempo todo. – ele diz, dando um tapinha no
sofá ao lado dele. Seu tom parece sincero, embora eu ainda hesite.
Lentamente, meus punhos se abrem e meus ombros relaxam. Pequenas
marcas vermelhas estão aparecendo na palma da minha mão e ardem. Eu
não tinha percebido que as apertei.
Com a minha reação, seu sorriso aumenta. — Venha aqui. Senti a
sua falta.
Eu me aproximo, grata por ele estar de melhor humor. Ainda estou
um pouco zangada com a mulher, mas quando ele me olha com tanto
orgulho como agora, é difícil ignorá-lo.
Eu me aconchego ao seu lado, e ele envolve um braço em volta de
mim. Um leve beijo é dado em minha têmpora e fico tentada a começar
a ronronar como Bilby.
Um dedo se curva sob minha mandíbula e, gentilmente, ele levanta
meu queixo até que eu esteja olhando em seus olhos azuis desbotados.
— Por favor, nunca me deixe. Eu não poderia viver sem você.
— Eu nunca deixaria você. – eu prometo.
Ele balança a cabeça, e o que parece uma agonia cruza por seu
rosto. — Bom. Acho que não sobreviveria. Provavelmente me mataria.
Um vinco se forma entre minhas sobrancelhas. Suas palavras são
doces e perturbadoras ao mesmo tempo. — Não diga isso, Ryan. – eu
exijo baixinho. — Você não se mataria.
— Eu faria. – ele diz com firmeza, com os seus olhos fixando nos
meus.
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— Por quê? – pergunto incrédula.


— Nunca vou encontrar alguém que me faça tão feliz quanto você.
– ele diz suavemente. — Eu nunca vou encontrar alguém tão perfeita
quanto você.
Eu me derreto. Como aquele maldito sorvete que tomei antes.
— Eu não vou. Você é perfeito para mim.
Ele sorri, exibindo seu lindo sorriso. — É?
Eu mordo meu lábio e aceno. Ele pega minha mão e a esfrega sobre
seu pau duro, pressionando contra sua bermuda.
— Por que você não me mostra o quanto perfeito eu sou para você?
Então eu mostro. Ele adormece apenas um minuto depois de gozar.
Eu nem tenho energia para me divertir depois do dia estranho que tive.

É domingo e Ryan e eu não temos nada planejado. Acordo com um


sorriso no rosto, animada para ficar o dia todo com meu namorado. Ele
me deixou mudar para esta casa apenas alguns meses atrás e, até agora,
não tivemos um dia inteiro para apenas relaxar.
Eu estico meu corpo, aproveitando todas as dores sendo distendidas.
A cama de Ryan é o paraíso absoluto, a mistura perfeita de firmeza e
deitar em uma nuvem. Meu corpo estava deitado em nada além de pisos
duros e camas irregulares até eu me mudar. Na verdade, levou um bom
mês antes que eu parasse de acordar incrivelmente dolorida - meu corpo
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não estava acostumado a nada tão luxuoso. Agora, mal consigo sair da
cama.
O lugar de Ryan ao meu lado está vazio. Dando tapinhas em seu
lugar, eu encontro ele frio. Ele está acordado há pouco tempo. O sorriso
desaparece lentamente do meu rosto enquanto minha mão vagueia pelo
local que ele ocupou a noite toda. Costumávamos acordar juntos nos fins
de semana e nos aconchegar na cama antes de termos que levantar e
cumprir nossas responsabilidades. Faz alguns meses desde a última vez
que ele ficava por aqui de manhã.
Ryan tem andado estranho ultimamente. Agressivo, desconfiado,
distante e bravo. Embora Ryan sempre tenha sido um pouco nervoso, ele
nunca causou tanto tumulto em nosso relacionamento antes. Até
recentemente, ele sempre fazia de tudo para me fazer sentir especial,
amada e cuidada.
Tantas lembranças de encontros maravilhosos que terminaram em
sexo ardente. Momentos em que apenas ríamos juntos, às vezes sem
motivo algum. Ele me amando, declarando amor por mim das maneiras
mais fofas e sempre me surpreendendo com presentes piegas. Não sei
quando essas memórias começaram a se misturar com outras muito mais
sombrias. Os sentimentos e mimos estão longe de serem vistos. Todas as
pequenas coisas que ele costumava fazer por mim, como garantir que eu
tomasse café pela manhã, manter minha água favorita estocada ou voltar
para casa com flores depois do trabalho, desapareceram. Agora, é apenas
Ryan exigindo mexer no meu celular, me chamando de prostituta por
usar muita maquiagem ou roupas reveladoras, e agora colocando as
mãos em mim de maneira quase violenta.
O trabalho o tem estressado ultimamente, talvez seja por isso. Ele
ainda está tentando ser reconhecido não sendo ligado ao seu pai. Posso
ser compreensiva e deixar essas relevar essas pequenas coisas, não são
coisas que preciso dele de qualquer maneira. Contanto que Ryan e eu
estejamos felizes, isso é tudo que importa.
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Levantando, eu rapidamente passo minhas mãos pelo meu cabelo.


Vou escovar os dentes depois do café da manhã. No entanto, ainda não
consigo sentir o cheiro de nada cozinhando.
Quando desço para a sala de estar, Ryan está sem camisa no sofá
com o notebook no colo e os óculos de leitura no nariz. Ele parece tão
sexy, eu quero pular em cima dele. Bilby está deitado em seu lugar
habitual no encosto do sofá, roncando alto.
Eu o resgatei do abrigo alguns meses atrás, e ele tem sido minha
pequena sombra desde então. Ryan não presta muita atenção a ele e
frequentemente zomba do pelo de gato em todos os lugares, mas fora
isso não reclama muito. Ryan me pediu para largar meu emprego
quando me mudei, então fico sozinha em casa enquanto ele trabalha. Ter
um companheiro aliviou a maior parte da minha solidão.
— Bom dia. – eu digo.
Ele me dá um olhar, mas não diz nada.
Faço uma pausa no último degrau. Hum. Está bem então.
— Você quer café da manhã? – pergunto.
— O que você acha que eu estava esperando? – ele pergunta
friamente, sem tirar os olhos da tela. Meu sorriso desaparece e toda
felicidade se esvai lentamente.
— Porra! – ele grita inesperadamente, batendo seu notebook no sofá
com raiva. Eu pulo com a explosão repentina, com minha mão voando
para o meu peito como se estivesse impedindo-o de pular para fora da
minha caixa torácica.
— O que está errado? – pergunto sem fôlego, tentando controlar
meu batimento cardíaco de volta ao ritmo normal.
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— A porra da internet caiu de novo. – ele murmura, indo para seu


escritório onde está o roteador. Eu fico lá confusa, olhando para o
espaço onde ele desapareceu. Ele tem brigado com nossa empresa de TV
a cabo nos últimos meses por causa disso, mas nunca se preocupou com
isso antes. Em segundos, ele volta furioso, se joga no sofá e começa a
trabalhar em seu notebook novamente.
— Há mais alguma coisa errada? – pergunto hesitante. Outro olhar,
desta vez cheio de aborrecimento.
— Não.
Decidindo deixar para lá por enquanto, imediatamente começo a
fazer o café da manhã. Rabanada, bacon e ovos. Talvez ele esteja apenas
com fome e é por isso que ele esteja de mau humor. Seria hipócrita agir
como se eu também não ficasse com fome às vezes. Encho seu prato
quando a comida está pronta e até adiciono alguns morangos frescos e
creme em sua torrada francesa.
Ele pega o prato e come. Em completo silêncio. Nem mesmo um
obrigado.
Claro que não.
Lentamente, eu me sento ao lado dele e como. Fiz algo de errado?
Não quero irritá-lo ainda mais. Olho para ele, observando seu rosto em
busca de uma reação à comida. Só pioraria as coisas se eu não fizesse
um bom café da manhã para ele.
— Gostou? – pergunto ansiosamente. Ele olha para mim, lambendo
um pouco de creme no canto da boca.
— Estou comendo, não estou?
Eu franzo a testa. Isso não é realmente uma resposta.
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Não consigo identificar, mas há uma parede ao redor dele. Como se


eu falasse, ele explodiria. Eu mantenho minha boca fechada. Mantenho-
a fechada no café da manhã, no almoço e até no jantar. Minha única
fonte de entretenimento é brincar com Bilby até que Mary e Ava
cheguem.
Elas são as faxineiras que Ryan contratou para vir todos os
domingos. Na maioria dos dias, insisto em ajudar. Sou uma mulher
adulta e perfeitamente capaz de limpar a minha sujeira, então sempre me
sinto estranha por deixar as meninas limparem a nossa sujeira.
Mary é uma mulher mais velha, com cabelos grisalhos, rugas ao
redor dos olhos e da boca e uma leve curvatura para trás. Sua avó
construiu sua empresa de limpeza do zero e Mary, agora com 60 anos,
manteve o negócio funcionando. Ela é uma mulher muito severa, mas
tem uma gentileza que preserva apenas para Ava e eu. Ava, neta de
Mary, está seguindo os passos da família. Ela tem apenas dezesseis anos,
cabelos pretos lisos, olhos grandes de corça e um sorriso tímido. Ambas
sempre foram tão boas para Ryan e eu. E embora Mary odeie quando eu
ajudo, ela sempre acaba cedendo, já que Ava se concentra em limpar
melhor quando estou por perto.
Mesmo depois que Mary e Ava vão embora, Ryan ainda não fala
comigo o dia todo, e fico com raiva. Ele fala com algumas pessoas ao
telefone, ele é brincalhão e ri com elas. Com as mãos acenando
vigorosamente, mais animadas que um cadáver acordado por um
necromante.
Por que ele não conversa assim comigo? No momento em que ele
desliga, a frieza volta, cobrindo toda a casa com sua energia.
Normalmente não sou uma pessoa mesquinha, mas estou prestes a
queimar sálvia pela casa para expulsar suas vibrações negativas.
Algumas vezes, tentei perguntar por que ele não conversa comigo.
Ele nem olhou para mim quando disse: — Você também não está
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conversando.
Sim, porque você está me ignorando, idiota.
Ele não tinha mais nada a dizer e, se eu pressionasse, ele
simplesmente se levantaria e iria para outro cômodo da casa. Nem
mesmo Bilby conseguiu curar minha solidão hoje. Como duas pessoas
podem coabitar na mesma casa, mas parecer que estou sozinha? Desisto
de tentar e, à noite, estou furiosa silenciosamente.
Nós fomos para a cama perfeitamente bem ontem à noite. Acordei
no sofá e ele me deu um lindo sorriso sonolento. Ajudei-o a ir para a
cama e ele murmurou o quanto me ama. Ele me abraçou a noite toda, até
de manhã cedo, quando acordou antes de mim.
E agora isso. Estávamos bem. Nós estávamos bem pra caralho. O
que aconteceu?
Coloco um filme sem perguntar se ele quer assistir. Não me importo
se ele quer ou não. Eu me acomodo no sofá, com o couro preto macio
me confortando enquanto me aconchego em um cobertor macio. A sala
de estar é grande, com três grandes sofás preenchendo o espaço, uma
enorme televisão de tela plana com os consoles de jogos de Ryan
instalados embaixo dela e uma decoração habilmente posicionada e
fotos de família ao longo das paredes. O bom gosto de Ryan é mais
moderno e estéril, com muitos tons de preto, cinza e branco. É uma casa
linda, mas definitivamente não tem a vibe aconchegante e caseira que a
casa de Julie e Matt tem.
Estou na metade do filme quando Ryan fecha seu notebook e me
cutuca na coxa de brincadeira. O gesto me irrita, mas eu seria uma
mentirosa se também não plantasse aquela sensação de desespero
novamente em mim. Esperança. A esperança é impossível.
— Venha dá um abraço. – ele pede com bom humor. Ele ainda tem
coragem de me dar aquele olhar pidão.
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Desculpa, o que? Olho para ele com uma mistura de choque e


raiva. A audácia.
— Ah, agora você quer falar comigo? – eu me atrevo.
Ele zomba e balança a cabeça, como se eu não fosse razoável.
Como se eu fosse louca e ele não tivesse ideia do que estou falando.
— Tudo bem, então não faça isso. Eu só queria abraçar. – Aquela
voz fria e áspera está de volta, exceto que desta vez, ele olha para mim
como se não pudesse acreditar na minha atitude. Ele se inclina e cruza os
braços, com o muro erguido mais uma vez. A pouca atenção que ele me
deu desapareceu e agora me sinto sozinha novamente.
A tristeza me atinge. Ele me ignorou o dia todo e finalmente está me
dando atenção, mas estou recusando.
— Diga-me por que você me ignorou o dia todo. – eu exijo, sem
vontade de voltar ao silêncio. Ele me dá um olhar estranho, como se eu
tivesse acabado de perguntar se ele pintaria seus mamilos de verde para
mim.
— Você também não estava conversando, River. Você sempre faz
isso. Torna as coisas importantes quando éramos apenas nós sentados
em um silêncio confortável e relaxando. Por que você está tentando
brigar comigo sem motivo?
Meu lábio treme. É isso que eu estava fazendo? Todo esse tempo eu
pensei que ele estava me ignorando, quando na verdade, ele estava
apenas curtindo minha companhia em um silêncio confortável. Eu me
sinto tão idiota.
— Você quer um abraço ou não? – ele diz. Ele está me jogando um
último osso e eu o pego como um cachorro faminto. Vergonhosamente,
eu rastejo em seu colo. Ele abre um largo sorriso e envolve os braços em
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volta de mim, ficando em uma posição confortável para que possamos


assistir ao filme.
Ele beija intermitentemente o lado da minha cabeça e desliza as
pontas dos dedos sobre a minha pele. Vamos para a cama da mesma
forma que fizemos na noite anterior. Ele tem um sorriso no rosto e me
abraça a noite toda, enquanto fico acordada me repreendendo por
estragar o dia.
Da próxima vez, farei melhor.

Shallow Hill é um buraco negro neste estado. Normalmente, tudo o


que entra, nunca sai. Eu era uma das poucas exceções. Alguns dias,
ainda não sei como consegui. Alguns dias, ainda parece que estou presa
aqui neste lugar desolado onde as almas inocentes morrem.
Ando ao longo do rio onde nasci. Até o rio está morto. Escuro,
parado e desprovido de vida. E, francamente, fede pra caralho. Como
não contraí algum tipo de doença deste rio está além de mim.
Lares destruídos se alinham do outro lado de mim. As janelas que
não estão intactas estão tapadas com lascas de madeira podre. A maioria
das casas está sem tapumes laterais, expondo os esqueletos de madeira
abaixo. E toda casa tem trânsito de homens e mulheres enlouquecidos
entrando e saindo. Alguns são daqui, a maioria não.
Gritos abafados podem ser ouvidos à distância. Continuo andando
até chegar na casa da Barbie. A casa dela costumava ser branca, mas
agora é de um cinza doentio com tapumes quebrados e ferrugem.
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Quanto mais me aproximo, mais alto o grito se torna, até que fica
evidente que Barbie está em outra briga com um viciado. Mais do que
provavelmente porque ela fumou e injetou todas as drogas deles depois
que ela os fodeu até que eles desmaiassem.
Lentamente, ando em direção à porta dos fundos. Está enferrujada e
range quando a abro. Barbie e um homem magro aparecem, ambos
gritando tanto que estão cuspindo na cara um do outro. Eles estão na
cozinha, com piso de linóleo rachado e amarelado, uma geladeira
infestada de mofo e uma mesa de cozinha cheia de bitucas de cigarro,
garrafas de bebida vazias e agulhas usadas.
Parece exatamente da mesma forma que aconteceu todos os dias
durante os dezoito anos em que estive presa dentro deste depósito de
lixo.
— Sua vadia de merda! Aquilo era meu! – O homem grita, dando
um tapa no rosto de Barbie. Eu nem me encolho. Ela agarra a bochecha
em estado de choque - sinceramente, não consigo entender por que ela
está chocada - e então recua e acerta o nariz dele.
O baque ocorre um segundo antes de o homem começar a gritar,
segurando o nariz ensanguentado.
— Você quebrou meu nariz! – Uma maneira de apontar o óbvio.
— Você mereceu, seu pedaço de merda!
— Saia. – eu exijo humildemente. Ambos paralisam e se viram para
mim. Nenhum deles sequer percebeu que eu estava aqui. Seria tão fácil
matar os dois. Ninguém se importaria o bastante com eles para descobrir
quem fez isso.
Os olhos redondos do homem me olham com raiva e perversão, com
sua mão ainda segurando o nariz.
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— Quem diabos é você? – ele pergunta, com a sua voz agora


anasalada e cheia de sangue.
— A dona desta casa. Agora vá embora, porra.
Ele bufa e se vira para sair pela porta da frente, murmurando
obscenidades e promessas de vingança baixinho o tempo todo.
Barbie se vira para mim e me dá um sorriso amarelo. — Obrigada,
baby.
Honestamente, deve ser uma das sete maravilhas do mundo sobre
como eu vim... disso. Barbie já foi bonita em sua juventude, mas você
não saberia disso olhando para ela. Só descobri quando encontrei uma
foto antiga de Barbie e Billy na casa dos 20 anos, logo quando Barbie
começou a se viciar em drogas. Eu sou uma réplica de seu antigo eu.
Cabelos pretos longos e cacheados, olhos dourados e um sorriso largo.
Agora, seu cabelo mal cai sobre os ombros, com os fios oleosos finos e
ralos. Sua pele está cheia de marcas e rugas e rachada como couro
barato. E ela é pele e osso, embora retenha alguma massa muscular da
briga constante em que se encontra com homens e mulheres.
Acho que é uma coisa que posso dizer sobre a Barbie. Além de
Billy, ela não leva desaforo de ninguém. O homem atualmente cuidando
de seu nariz quebrado pode atestar isso.
— Eu não fiz isso por você. – digo inexpressiva. Seu sorriso falso
desaparece, revelando sua verdadeira face.
— Vadia. – ela murmura. Nada que eu não tenha ouvido antes. —
Por que você está aqui, afinal?
— Você sabe exatamente por que, Barbie. Vim cobrar o aluguel.
Seus ombros ficam tensos. Ela não precisa dizer isso, eu já sei. Ela
não tem dinheiro. Ela fumou, injetou ou cheirou tudo. Provavelmente
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bebeu também.
— O que você roubou desta vez? – pergunto casualmente,
referindo-me ao homem com o nariz quebrado.
Ela resmunga, com os seus olhos dilatados fervendo enquanto se
enfurece: — Eu não roubei nada! Eu fodi com ele gostoso e muito por
essa merda. Eu ganhei isso, e era meu.
Eu suspiro e belisco a ponta do meu nariz. — Se você vai vender
seu corpo, pelo menos ganhe dinheiro com isso. Como você vai comer e
pagar o aluguel de outra forma? – É como falar com uma parede de
tijolos. Não sei por que as palavras saíram da minha boca. Elas nunca
vão penetrar em seu cérebro viciado em drogas de qualquer maneira.
Ela se senta na cadeira e acende um cigarro, sem se preocupar em
responder. Típico. Ela prefere agir como se eu não tivesse dito nada do
que reconhecer o fato de que ela me deve dinheiro.
— Eu possuo esta casa. Posso despejar você quando quiser. Tudo o
que preciso fazer é ir ao tribunal e lhe entregar os papéis, e sua bunda
estará fora em um mês, no máximo. – eu ameaço, sentando na cadeira
em frente a ela.
Tomo cuidado para não tocar em nenhuma das superfícies, se puder
evitar. Não sei que tipo de doenças eu poderia pegar. Ryan me mataria
se isso acontecesse.
— Você acha que porque está namorando um homem rico que pode
se safar do que quiser. – ela diz, com seus olhos vidrados se estreitando
em fendas. — Shallow Hill está em seus ossos, garotinha. Você nunca
será melhor do que eu, então pare de agir assim.
— Você parece amarga, Barbie. – eu afirmo com tédio. — Isso não
muda o fato de que eu possuo esta casa e você me deve aluguel.
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Esta casa foi hipotecada quando eu era caloura na faculdade. A


essa altura, eu já tinha me matado desde os dezesseis anos, trabalhando
em uma lanchonete na cidade vizinha e depois trabalhando meio período
em um call center quando fiz dezoito anos. Economizei cada centavo,
consegui um cartão de crédito e construí meu crédito de baixo para
cima. Quando a casa foi hipotecada, comprei-a no banco por um preço
insanamente barato. Era quase um insulto. O dinheiro foi por água
abaixo. Obviamente, nunca vou lucrar com ela revendendo - ninguém
quer morar em Shallow Hill - mas valeu a pena. Vale a pena manter
minha mãe sob meu controle. Porra. Cada centavo.
Suas mãos tremem quando ela afasta o cigarro.
— Vou contar a Billy. – ela ameaça em meio a uma nuvem de
fumaça. Eu levanto uma sobrancelha. Ela diz isso toda vez que atrasa o
aluguel. Que é todo mês, lembre-se.
— Billy não dá a mínima para você, Barbie.
— Ele dá quando está com as bolas dentro de mim. – ela responde.
Reviro os olhos com sua imaturidade. Billy não se importa com
ninguém, mesmo quando está com as bolas dentro deles.
Barbie e eu vimos em primeira mão o que acontece quando Billy
fica com raiva de alguém. Vimos o que acontece quando ele fica
entediado com eles, também. Perspectivas igualmente aterrorizantes.
Nenhuma de nós o procura se pudermos evitar.
— Ele dirá o que você quiser ouvir e, no segundo em que gozar, já
se esqueceu de você.
Uma mão bate na mesa com raiva. Não tenho ideia do que ela
estava pretendendo. Assustar-me? Eu nunca a temi para começar. Não
quando seus clientes sempre faziam muito pior do que ela jamais
poderia fazer.
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Billy sempre foi o pior, e o que mais andava por aí. Ele mantém
minha mãe viciada em drogas, e ela lhe dá informações e sexo ruim em
troca.
Ele é um traficante e tem conexões insanas. E a Barbie fode todo
mundo. Homem e mulher. Com isso, todos da cidade. Barbie enrola o
laço em suas bolas e Billy as amarra. Ele é o dono desta maldita cidade
inteira.
Nunca vou admitir isso para ela, mas Billy me mata de medo. Ele é
capaz de fazer qualquer um desaparecer sem deixar vestígios. Barbie
sabe disso no fundo, mas acho que há uma parte minúscula dela que não
está disposta a entregar sua filha ao próprio Satanás. Além disso, Billy
sempre gostou mais de mim, e Barbie também sabe disso.
Ele causou dano o suficiente para carregar pelo menos minhas
próximas três vidas. Ele tirou minha inocência e toda a minha infância.
Ambas insubstituíveis. Ambas eu nunca vou ter de volta.
— Quero o dinheiro na próxima semana. Esforce-se ainda mais,
tenho certeza que você consegue.
Eu saio pela porta, com seus gritos e xingamentos me seguindo
muito depois de eu sair.

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— A hora da morte foi há pouco mais de dois dias, com base na
decomposição de seu corpo. Olhando para o respingo de sangue, ele foi
baleado a cerca de três metros de distância. – Observa o criminalista
Redd, enquanto tira mais algumas fotos do cadáver.
Há um pequeno buraco em sua cabeça. Parece um ferimento de um
calibre .22. Esculpida em seu peito nu está a palavra "Ghost".
— Os entalhes têm a consistência de uma faca de caça. Você pode
dizer pelos padrões que quem fez isso, fez com calma. Não parece
desleixado ou apressado. – continua Redd.
— Ele estava vivo quando isso foi esculpido em seu peito? –
pergunto, observando as letras irregulares de perto. O sangue já secou e
formou uma crosta em seu peito.
— Sim. – diz Redd. — Muito vivo. Há sinais de luta, mas não
condiz com esse tipo de tortura... é muito sutil. Presumo que havia pelo
menos duas pessoas segurando-o. Não há como ele ter agido sozinho.
Balanço minha cabeça, a cena diante de mim é mórbida pra caralho.
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Já vi muita merda na minha carreira - o Ghost Killer não é o pior que já


vi. Apenas o mais inteligente.
Meu parceiro, Amar, está ao meu lado, com as mãos nos bolsos
enquanto observa a vítima.
— Ghost Killer ataca novamente. – ele murmura para si mesmo.
Greg “Froggy” Barber. Tem uma ficha criminal relacionada à
atividade de drogas mais antiga do que a última sinfonia de Beethoven e
entrou e saiu da prisão desde os treze anos de idade. O garoto cresceu no
subúrbio com uma mãe caloteira e um pai desaparecido. Vender drogas
provavelmente era sua única forma de sobrevivência.
Sua mãe nem sequer relatou seu desaparecimento.
— E como sempre, ele está coberto de DNA. – Redd suspira,
balançando a cabeça com decepção.
Normalmente, encontrar DNA na cena do crime é uma sorte. Mas
neste caso, isso não significa nada. Todas as vítimas que encontramos
mortas pelo Ghost Killer estavam cobertas de DNA aleatório.
Principalmente profissionais do sexo, mas encontramos DNA de
assassinos e estupradores que estão na prisão há anos, atribuindo esses
crimes a pessoas que não têm relação com as vítimas.
Nenhuma maldita pista de como ele faz isso.
Ele tem que ter uma conexão interna em algum lugar. O problema é
que os condenados estão em prisões aleatórias em todo o país, sem
nenhuma conexão óbvia entre eles. Quem quer que seja o Ghost Killer,
ele é poderoso.
— Vamos voltar para a delegacia, ver se encontramos alguma
conexão com a vítima. – digo ao meu parceiro, frustrado com esse filho
da puta. Estou perseguindo-o há um bom ano, e foram os trezentos e
sessenta e cinco dias mais longos da minha vida.
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Amar acena com a cabeça, nunca falando mais do que o necessário.


Isso é o que faz dele um ótimo parceiro. Ele vê coisas que eu não vejo,
enquanto me supero em juntar todas as peças do quebra-cabeça.
Eu olho para ele, percebendo como ele olha para o corpo de Greg
com tristeza. Esse garoto tinha todo um futuro pela frente - um que eu
espero que seja cheio de redenção. Talvez Greg tivesse visto a luz
eventualmente e se esforçado para sair de uma situação ruim. A parte
fodida disso é que nunca saberemos. O pobre garoto sofreu uma morte
horrível por causa de um indivíduo doente.
Amar é uma alma gentil, provavelmente muito gentil. Ele migrou da
Índia para a América quando tinha dez anos. Ele teve uma recepção
difícil quando seu pai foi morto ao sair de uma mercearia por causa da
cor de sua pele. Foi isso que gerou a necessidade de Amar de buscar
justiça para todas as almas inocentes cujas vidas terminaram muito antes
do tempo.
Assim que entro no carro, meu celular toca.
— Oi, pai. – eu cumprimento.
— Eu pedi o almoço. Venha, faça uma pausa. Traga Amar. – ele
diz. Papai tem o dom de adotar pessoas como filhos, para desgosto de
meu irmão. Ele trata Amar como um filho, e isso deixa Ryan furioso.
Eu passo minha mão pelo meu cabelo enquanto uma dor de cabeça
começa a latejar em meu crânio. Estou com muita fome. Não tenho
muita certeza da última vez que comi, para ser honesto. Não faz mal que
minha presença geralmente arruíne o dia inteiro de Ryan, e eu mentiria
se dissesse que não me divirto com esse conhecimento.
Pensamentos sobre River vêm junto com esse pensamento,
arruinando a satisfação. Quando Ryan tem um dia ruim, todo mundo
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sofre por isso. Especialmente as suas namoradas. Por uma fração de


segundo, penso em falar com Ryan sobre ela, mas ignoro a ideia assim
que ela entra na minha cabeça. Não vou usá-la como isca para irritá-lo.
Não quando ela vai sofrer as consequências.
— Tudo bem. – eu admito. — Estarei aí em quinze minutos.

— Onde está Ryan? – pergunto com indiferença mordendo o meu


sanduíche BMT2.
— Ele se enfurnou em seu escritório na última hora. – Papai
responde, encolhendo os ombros. Ele não parece preocupado. Vida
típica de um advogado, eu suponho. Não é estranho para mim papai se
trancar em seu escritório ao lidar com um caso particularmente brutal.
Naqueles dias, o brilho em seus olhos era sempre mais fraca, mas de
alguma forma, ele conseguiu se esforçar e sorrir para Ryan e para mim.
Mesmo quando ele estava estressado até as orelhas, ele ainda arranjava
tempo para jogar uma bola conosco ou nos ensinar a andar de bicicleta.
Ele é a pessoa mais resiliente que conheço.
— Então, Amar, como está Clara? – Papai pergunta, com seus olhos
azuis brilhantes brilhando. Ele sempre foi romântico. Difícil não ser
quando você está casado e feliz com sua alma gêmea há mais de trinta
anos.
Clara é a esposa de Amar. Eles estão casados há quinze anos e, além
dos meus pais, nunca vi um casal mais perfeito um para o outro. Onde
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Amar é quieto e calmo, Clara é barulhenta e animada. Eles me dão uma


esperança real de encontrar a única ou o que diabos os jovens dizem
hoje em dia.

2 Sanduíche BMT: é o nome de um sanduiche do Subway.


Tive muitos bons modelos em minha vida quando se trata de
relacionamentos. Não tenho certeza de como diabos Ryan acabou tão
cínico.
Dou a última mordida no meu sanduíche enquanto Amar responde
ao meu pai. É a única vez que vejo os olhos de Amar brilharem.
— Já volto. – murmuro. Nenhum deles me dá atenção.
Vou direto para o escritório de Ryan. Já estou me preparando para
algum tipo de confronto. Não sei por que me incomodo em encontrá-lo.
Ryan não é capaz de me tratar como nada além de merda, e sempre
termina comigo instigando-o e depois ele me expulsando.
Não é como se eu não tivesse tentado me aproximar de Ryan, é só
que ele tornou isso impossível. O idiota não fez nada além de me
atormentar durante toda a minha infância. Não que eu tenha brigado com
Ryan, mas nenhuma surra fez Ryan me odiar menos. Sua hostilidade só
ficou mais forte ao longo dos anos, e eu não dou a mínima para ele
tentar consertar isso. Tentei isso uma vez anos atrás e nunca mais
cometerei o mesmo erro.
O cara tem uma atitude instável desde que me lembro. Sou maior e
mais velho, mas Ryan nunca se importou. Ele é como a porra de um
chihuahua, um merdinha que age como se tivesse um grande latido e
tenta dominar todos os maiores do que ele. A maior parte da vida de
Ryan isso também funcionou.
Só não comigo. Nunca comigo.
Toda a frente do escritório de Ryan é só janela, exceto que agora
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ele está com as persianas fechadas. Eu fico do lado de fora de sua porta
por um momento, debatendo se devo apenas ser um idiota e entrar ou
bater. De qualquer maneira, ele não estará me esperando. É muito raro
visitar Ryan quando almoço com papai.
O que é suficiente para que Ryan comece a fechar suas persianas a
esta hora. Filho da puta mesquinho.
Com o canto do olho, noto que uma das persianas está presa no
parapeito, permitindo ver seu escritório em uma pequena janela. Eu me
aproximo, movendo para a esquerda e para a direita até conseguir um
bom ângulo. Nunca disse que estava acima de espioná-lo. Eu sou um
maldito detetive, afinal de contas. Ser intrometido está na descrição do
trabalho e meu irmão idiota comete crimes suficientes diariamente para
justificar isso.
Um resmungo quase escapa da minha garganta quando finalmente
consigo um bom ângulo. A mulher com pernas abertas em sua mesa é
sua secretária. Entre as pernas dela está a cabeça dele firmemente presa
em suas garras cor vermelho-cereja. Sua cabeça está jogada para trás,
com sua garganta esbelta movendo com gemidos enquanto ele vai para o
caminho em sua boceta.
Minha coluna fica ereta e tenho toda a intenção de invadir o lugar.
Ele tem uma linda garota em casa que o trata muito melhor do que
ele merece, e ainda assim ele fode por aí. Não posso dizer que estou
surpreso. Se alguém trataria uma garota como merda, é Ryan. Ele tratou
Alison como lixo por anos, não há razão para ele tratar River de forma
diferente.
Não consigo contar quantas vezes Alison chorou no meu ombro,
com os óculos escuros cobrindo os olhos roxos e os braços manchados
de hematomas. Ele passou clamídia para ela, pelo amor de Deus, depois
de dois anos de namoro. Eu queria prendê-lo por violência doméstica
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todas as vezes, mas Alison sempre se recusou a prestar queixa. Ela


estava com muito medo. Eu estava disposto a ir mais longe por ela e
prestar queixa de qualquer maneira, mas ela pediu e implorou para que
eu não fizesse isso. Ela ainda não estava pronta para deixar Ryan, e se
ele soubesse que estava sendo acusado de violência doméstica, nós dois
estávamos com medo de que a fizesse desaparecer. Permanentemente.
Se alguém tiver as conexões para fazer isso acontecer, eu confiaria em
Ryan para ser um deles.
Tantas vezes, encorajei Alison a pelo menos seguir em frente,
encontrar alguém melhor. Alguém que não iria traí-la e abusar dela. A
certa altura, ela perguntou se esse alguém melhor poderia ser eu. Eu
tinha dito não. Ela era uma menina doce, mas eu não sentia nada mais
por ela do que preocupação e amizade genuínas.
Mas quanto mais eu intervinha; pior Ryan a tratava. O abuso
tornou-se mais violento e os hematomas se transformaram em ossos
quebrados. Sempre havia uma desculpa pronta na ponta da língua, mas
ela só tentava fazer isso com seus amigos muito preocupados. Por fim,
aprendi que, se fosse ajudá-la, não poderia fazer isso na cara dele. No
dia em que ela finalmente escapou dele, senti um peso sair de meus
ombros.
Isto é, até River entrar em cena. Agora parece mais pesado do que
nunca.
— Mako! – Amar chama atrás de mim. Eu me viro, com a raiva
ainda estampada em meu rosto. Estou parado na frente da janela dele há
um minuto inteiro, olhando para a janela de vidro, furioso com esse
desgraçado. Tenho certeza de que pareço um maldito lunático, mas não
me importo.
— Está pronto para ir? – Amar pergunta atrás de mim, caminhando
até onde estou. Ele me olha com cautela, como se eu fosse um urso e ele
fosse o peixe que estou a dois segundos de atacar.
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Engulo em seco e aceno com a cabeça.


Na certa, foi melhor assim Amar me chamando. Mais uma vez,
estou sentindo aquela sensação familiar para ajudar outra das vítimas de
Ryan. Mas desta vez parece pessoal, e nem quero descobrir o porquê.
Estou na delegacia há horas, trabalhando no caso. Minha perna tem
tremido na última hora, um claro indicador de que estou ficando
impaciente. Minhas mãos passam pelo meu cabelo pela milionésima
vez, além de frustradas com este caso. Vou ficar careca aos quarenta se
continuar assim.
Cada pista que recebo me leva a outra conexão que não bate certo.
Resolver quebra-cabeças é o que faço de melhor. Papai sempre me
comprava aqueles quebra-cabeças de mil peças quando eu era criança,
maravilhado com a rapidez com que eu os montava. Os quebra-cabeças
me relaxavam. Conectar os pontos vem naturalmente. Mas nada está se
conectando neste caso.
Ghost Killer está me mandando em uma caçada inútil, levando-me a
todos os tipos de becos sem saída. Ele está deliberadamente fodendo
comigo, manipulando-me como uma marionete e eu sou o idiota que
continua caindo na armadilha.
Preciso ver este caso de uma perspectiva diferente. Em vez de
seguir as pistas que ele continua dando para mim, preciso procurar as
que ele está tentando encobrir.
Deslizo minhas mãos até meu pescoço, massageando suavemente
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enquanto eu deslizo. As mulheres têm a ideia certa. Preciso marcar uma


visita em um spa o mais rápido possível. Não poderia me importar
menos se assusta as pessoas que um homem de 1,85m está relaxando em
um banho de lama, eu preciso disso.
Eu olho para o relógio no canto da tela do meu computador, notando
que é quase onze da noite.
Porra. Preciso dormir também. Mas já posso dizer que meu cérebro
não desliga. Não depois de investigar a vida de Greg o dia todo com
metade do meu cérebro, e certamente não quando River está possuindo a
outra metade.
Eu quero ajudá-la. Eu deveria, mas não deveria.
Ela é diferente de Alison. Mais difícil. Mais mesquinha. Cabeça
dura. E leal como um cão. Alison queria minha ajuda, enquanto River
definitivamente não quer. Quero dizer, merda, durante o jantar ela olhou
para mim como se eu a machucasse de alguma forma. Ela está
protegendo Ryan quando posso garantir que ela não tem ideia do que o
está protegendo. Quando alguém odeia seu irmão tanto quanto Ryan me
odeia, qualquer um pensaria que ele tem um bom motivo para isso. Na
verdade, ele não tem um único motivo além do fato de sentir que roubei
o amor e o carinho de nossos pais.
Ele é um idiota mimado que tem tido um longo acesso de raiva
durante a maior parte de sua vida. Ainda me choca como duas das
pessoas mais amorosas e atenciosas que já conheci criaram um monstro
sociopata.
Meus dedos estão digitando o nome de River antes que eu possa me
impedir. Depois que a conheci, saí um pouco da linha e fiz uma
verificação de antecedentes dela. River McAllister, nascida e criada na
maldita Shallow Hill. Não há muito mais sobre ela além do fato de que
ela comprou uma casa em Shallow Hill alguns anos atrás. Não faço
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ideia porque faria isso.


Parei minha pesquisa ali, sentindo dez tipos diferentes de arrepios. E
aqui estou eu de novo, olhando para a vida dela quando não tenho nada a
fazer. Mas não posso ver outra garota inocente sofrer nas mãos daquele
idiota. Não me considero um cara legal, mas também não sou um
monstro. Eu não abuso de garotas. Eu não estupro garotas. Eu não faço
nada para elas, elas não querem que eu faça. Peça por consentimento, e
eu receberei. É a porra da moral básica.
Depois de alguns minutos pesquisando, descubro que ela está
cursando a universidade. Ela tem três aulas por semana, uma delas na
zona sul do campus. Essa área está escondida em um pequeno recanto
privado com pouco tráfego. Um local perfeito para iniciar uma conversa
com alguém sem muitos olhares indiscretos ao redor.
Porra. Eu bato meu punho contra a minha mesa, frustrado comigo
mesmo. Intrometer-se em outro relacionamento de Ryan pode - e
provavelmente terminará - em um desastre completo. No final das
contas, não posso forçar nenhuma garota a deixar Ryan. Não posso
forçá-las a ver a verdade em Ryan. É algo que elas precisam enfrentar
elas mesmas. Mas porra, se eu vou ficar parado e ver uma garota sofrer
violência doméstica sem ao menos tentar ajudá-la.
Aparecer na universidade deve ser a pior e a melhor ideia que já
tive. No entanto, eu ainda levanto minha cabeça e vejo que aula é.
Aula de Psicologia 101 do Professor Tumbling.
Engraçado, ela disse que era boa em ler as pessoas, mas ainda assim
ficou cega para o diabo bem na frente dela.
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Recorri à porra da perseguição. Acho que poderia dizer que


perseguir também está na descrição do trabalho, mas River não é uma
criminosa - que eu saiba - e isso não é uma emboscada. Não há como
justificar isso. Porra, é para o bem maior e tudo mais se eu conseguir
convencer seu traseiro teimoso a ver a luz. Ou melhor, a escuridão em
Ryan.
Passa um pouco das duas horas da tarde quando ela sai do prédio
usando tênis Chucks pretos e jeans que moldam sua bunda de uma forma
que deveria ser ilegal. Isso sem falar na camisa branca com botõezinhos
no peito - botões totalmente desabotoados, provocando olhares errantes
para o decote amplo que quase devora a corrente de ouro pendurada
entre os seios.
Seu longo cabelo preto absorve toda a luz, os cachos balançam
enquanto ela cruza o estacionamento. River tem uma beleza marcante
diferente de tudo que já vi. Seus olhos dourados e pele bronzeada são
etéreos, mas não são apenas os traços de seu rosto, mas a maneira como
ela se comporta. Ela caminha com a coluna ereta e o queixo erguido. Ela
fala com a cabeça levemente inclinada para baixo, olhando para você
através de sobrancelhas angulares e cílios longos, fazendo você sentir
como se ela estivesse olhando para você em vez de para você.
Ela é linda. E completamente, extremamente, absolutamente
tentadora.
Porra. Passo a mão no rosto, já frustrado com a forma como isso
está indo. Balanço a cabeça, passando a mão pelo cabelo e me
esforçando para me recompor. A última coisa de que preciso é fazê-la
pensar que estou tentando atacá-la. Eu não deveria estar olhando para ela
assim, pensando nela dessa maneira. Mas a onda de ciúme cobrindo
minhas veias como óleo é difícil de ignorar. Uma linda garota reduzida a
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um maldito saco de pancadas por um psicótico de merda, que vergonha.


Ela ainda não pode me ver. Estou me escondendo atrás de um
pinheiro, observando sua bunda mover enquanto ela caminha em direção
ao carro, lembrando-me de seu doce cheiro de canela de quando
conheceu meus pais. Ela anda como se alguém estivesse atrás dela, mas
se recusa teimosamente a correr. Apressada e tensa, mas confiante com o
queixo erguido de orgulho.
Sua cidade natal é interpretada em cada movimento que ela faz. Isso
mostra que ela cresceu em um ambiente volátil e perigoso, mas a cada
passo ela derrota seu passado com uma vingança diferente de tudo que
eu já vi.
Ela não se acovardará em suas raízes, mas se curva como uma
roseira para meu irmão. Seus espinhos podem picar, mas, no final das
contas, ele os cortará até que ela fique com uma espinha dorsal fraca que
se quebrará facilmente sob suas mãos. Tudo o que antes a tornava
vibrante e bonita murchará e, eventualmente, ele a jogará de lado quando
não restar mais nada dela.
Dou um passo em sua direção, mas sou interrompido quando uma
garota baixinha de cabelo loiro corre até River, enganchando seu braço
no de River e arrastando-a para longe de seu carro.
A garota diz algo para River, fazendo-a jogar a cabeça para trás de
tanto rir. Algo em meu peito aperta e torce violentamente. Algo que eu
realmente não quero nomear. Eu preciso colocar minha maldita cabeça
no lugar.
Se eu estiver fodido da cabeça, não há como eu ser capaz de
influenciar suas boas graças e ajudá-la a ficar longe de Ryan. Antes que
ele a quebre completamente. Antes que ele faça algo como matá-la.
Houve dias em que eu tinha certeza de que Alison estava morta. Eu
prefiro morrer se eu deixar outra garota inocente se encontrar nessa
posição, onde existe até a possibilidade de ela ter sido assassinada.
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Não sei por que não entrei na profissão de guarda-costas pessoal,


do jeito que minha vida está ficando.
Persegui-la é meu único recurso. Que porra mais eu posso fazer?
Mandar uma mensagem para ela? Esse psicopata provavelmente está
sincronizado com sua nuvem e está lendo todas as interações que ela tem
sem seu conhecimento.
Ryan está apenas dando a ela a ilusão de que ela tem alguma
aparência de privacidade e independência. Não me surpreenderia se ele
começasse a dar o celular dela como uma porra de um privilégio e tirá-lo
dela como punição - foi exatamente o que aconteceu com Alison.
Meu celular vibra no meu bolso de trás. Distraidamente, eu o pego
enquanto observo River e sua amiga se afastando cada vez mais. Decido
não segui-la mais hoje. Aproximar-se de River será como abordar um
cachorro assustado. Ela vai morder, e vai morder com força pra caralho.
Melhor que eu não a coloque nessa posição na frente de outras pessoas.
Ou melhor, eu mesmo passar por isso na frente de outras pessoas.
Olhando para o meu celular, meu coração para. Como se eu a
tivesse conjurado, o nome de Alison está aparecendo no meu celular.
Ela nunca me liga. Não mais, pelo menos. Nós nos separamos no
mesmo dia em que ela e Ryan se separaram oficialmente. Por mais
idiota que isso possa me tornar, eu só me senti responsável por colocá-la
em segurança, não juntar os pedaços para ela.
— Mako. – eu atendo, mantendo minha voz profissional.
— Oi... – ela para sem jeito. — Sinto muito por incomodá-lo. Mas
hum, estou um pouco preocupada, na verdade. Sobre a nova namorada
de Ryan, River? – ela diz seu nome como uma pergunta, sem saber se eu
já a conhecia ou não.
— Sim, eu a conheci. – digo. O momento e a razão por trás da
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ligação de Alison apenas reforçam minha determinação. Parece quase


como obra do destino.
Alison faz uma pausa e depois limpa a garganta. — Tentei falar com
ela. Ela é... ela não é uma pessoa muito acessível. – Eu abro um sorriso
com isso. Uma declaração nada assombrosa, se você me perguntar. Ela
continua: — Ryan a enfeitiçou e, embora eu tenha saído da névoa, não
sei como diabos conseguir outra pessoa.
É bom saber que não sou o único que quer tentar ajudar River a
escapar. Alison é gentil - inerentemente gentil. Ela não é o tipo de garota
que fica com ciúmes quando seu namorado do colégio a troca por outra
pessoa. Não, tenho certeza que há uma pequena parte de Alison que está
feliz por não ser mais ela. Mas isso não significa que ela está acima de
deixar a nova garota sofrer quando ela está mais do que ciente do que
está acontecendo com ela a portas fechadas.
Eu espero. Já sei o que ela quer. Mal sabe ela que já enfiei o nariz
no meio de algo que provavelmente não deveria ter a porra do meu nariz
nisso.
— Você pode falar com ela, Mako? Talvez tentar convencê-la de
que ela se meteu em algo bastante... bastante brutal? A única razão pela
qual sobrevivi a esse relacionamento é por sua causa. Você me livrou.
Você me salvou. Eu preciso que você a salve também.
Eu suspiro. Eu odeio quando ela diz coisas assim.
— Você salvou a si mesma Alison, não foi eu. Só te dei o empurrão
para fazer isso. Você era a única no relacionamento, e você era a única
que foi capaz de sair dele. Isso foi tudo você.
A garota é mais forte do que ela acredita. Alison já passou por muita
coisa para dar o crédito a outra pessoa. De jeito nenhum eu vou aceitar
isso.
Ela resmunga baixinho. Minha boca se curva, com o som fofo
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vindo dela. — Você sabe o que quero dizer, Mako. Eu nunca teria
forças para sair se você não estivesse lá para ajudar. Eu... eu sei que eu
mesma fiz isso. Mas você ainda foi meu trampolim.
Frustrado, viro e começo a caminhar de volta para o meu carro.
Estou demorando em um campus ao qual não pertenço, onde qualquer
um pode me ver. A última coisa de que preciso é que alguém me
reconheça. Ryan pode ter se formado, mas deixou sua marca neste lugar.
E muitas pessoas sabem quem eu sou e exatamente o que ele sente por
mim. Essas mesmas pessoas também são cachorros leais pra caralho.
— Eu estava planejando ajudá-la, Ali. – digo finalmente, mudando
de assunto de volta para o assunto em questão. Fico enjoado quando ela
fica toda sentimental comigo.
Ela suspira de alívio, o que torna a responsabilidade que sinto ainda
mais sufocante. Agora tenho Alison contando comigo também.
Abro a porta do carro, quase me jogo dentro do carro e bato a porta.
O calor é sufocante, mas ainda não ligo o carro.
— Mas não posso fazer isso para sempre. – suspiro, admitindo o
pensamento que me assombra desde que soube o que Ryan estava
fazendo com ela. — Não sei se posso salvar todas as namoradas dele
para sempre. Talvez River eventualmente irá deixá-lo, mas nós dois
sabemos que haverá outra. Ryan não é do tipo que fica sozinho. Ele
precisa de alguém para controlar e quebrar, e se não for você, ou River,
vai ser outra garota. Como passo o resto da minha maldita vida
mantendo o controle sobre ele e tentando convencer suas namoradas a
deixá-lo?
Isso está me matando, é o que eu não digo. O estresse é exaustivo,
mas quando imagino o que elas estão passando, meu estresse parece tão
trivial e não tenho força de vontade para ir embora.
Alison zomba. — É por isso que convenceremos River a prestar
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queixa. Eu... eu estava com muito medo. Mas se River se apresentar, eu


também irei. Vou testemunhar contra ele ou algo assim. Terminamos
com a River. – A convicção em seu tom seria doce, mas a pobre Alison
também é muito ingênua.
— Mesmo se ela fizer isso, não vai atrapalhar Ali. Ele é a porra de
um advogado, pelo amor de Deus, e sei que o maldito asqueroso já fez
conexões com pessoas más. Ele é sujo. E mesmo que não fosse o caso,
Ryan é muito bom em manipular as pessoas, especialmente nosso pai.
Se Ryan não se safar, nosso pai vai... E então River estará em mais
perigo do que antes.
Outra sensação de frustração me percorre. Eu quero dar um soco no
volante. Nunca vou me surpreender com o quanto bem Ryan tem nossos
pais sob seu controle. Eles acham que ele é o filho perfeito - ao meu
lado, é claro, porque nossos pais nunca escolheriam favoritos. Mas
porra, eles realmente deveriam considerar que um de seus filhos é um
pedaço de merda absoluto. Ryan contará uma história sobre como River
é manipuladora e mentirosa, e apenas tentando obter uma parte da
fortuna da família. E mamãe e papai vão acreditar.
Sei disso porque eu tentei convencê-los antes, de que ele estava
espancando Alison. Mostrei a eles as fotos dos hematomas dela e as
mensagens ameaçadoras dele, e quando Ryan os convenceu de que
haviam feito photoshop, procurei meus colegas. Fui até o meu chefe.
Tenente Sharp acreditou em mim, mas quando ele iniciou uma
investigação, ela foi imediatamente encerrada por seu superior. O
alcance de Ryan estava longe demais - ele fez muitas conexões valiosas.
Minhas reivindicações foram enterradas e meus pais me disseram para
desistir. Alison estava mentindo, era só isso. Ryan nunca faria isso com
uma garota - muito menos uma garota por quem ele estava apaixonado.
Essa é provavelmente a única falha de nossos pais - mas é uma falha
que está colocando vidas em perigo. Eles amam muito Ryan e Ryan é
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muito bom em manipular as pessoas. Os abusadores não apenas


manipulam suas vítimas, mas também manipulam os outros para que
acreditem que são pessoas honestas.
Eles os manipulam para acreditar que nunca machucariam uma
mosca, então, quando as acusações vêm à tona, elas são consideradas
ultrajantes. Essas pessoas conhecem Ryan e sabem que ele nunca
abusaria de uma mulher.
E eu não sei mais como consertar isso. Não sei como fazer meus
pais - ou qualquer outra pessoa - ver a luz quando eles acreditam que já
a estão vendo.
Ryan nunca será punido por seus crimes, a menos que uma de suas
vítimas apresente queixa. E com as conexões de Ryan, a probabilidade
de ele realmente sofrer quaisquer consequências é baixa. Ryan é
inteligente o suficiente para não bater nelas em público e sabe como
assustá-las até que fiquem em silêncio. Ele se preocupa mais com sua
reputação do que com a mulher quem está abusando.
Implorei a Alison para apresentar queixa - para tentar. Não
importava que eu prometesse a ela minha proteção, ela ainda estava com
muito medo de falar contra Ryan. No final, não deu em nada e eu criei
uma divisão na família. Mamãe e papai me reprovam, acreditando
firmemente que eu era ingênuo e caí na teia perversa de Alison.
Mas há uma tensão subjacente no ar durante os jantares em família.
No fundo, eles sabem que ainda acredito em Alison e isso os incomoda.
— Então o que sugere que façamos, Mako? – Alison diz, trazendo-
me de volta para a conversa. — Deixá-lo abusar das garotas como ele
achar melhor? E se ele matar alguém? Nós saberíamos o que ele está
fazendo e não faríamos nada a respeito. Isso... isso é errado pra caralho e
você sabe disso! – ela termina sua frase quase histérica.
Eu bato minha cabeça contra o encosto de cabeça.
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— Eu não sei, Ali. Eu realmente não sei. Agora, vou me concentrar


na River. O que quer que venha depois, eu vou descobrir isso quando
chegar lá.
— Responda-me este enigma, River. Quanta força é necessária
antes que um osso se quebre? – Uma voz diz atrás de mim. Arrepios
percorrem minha pele quando aquela voz rouca surgia em meus ouvidos.
Paro no meio do passo, quase tropeçando nos meus pés quando meu pé
pisa desajeitadamente. Imediatamente, fico frustrada. Eu odeio que ele
me pegou desprevenida e eu odeio que ele agora saiba que fez isso.
Relutantemente e com muita irritação, viro-me para encontrar
Mako, o que só aumenta meu mau humor quando vejo como ele parece
deliciosamente pecaminoso. Ele está vestido com jeans preto e uma
camiseta preta, destacando suas tatuagens coloridas. Quero vê-las mais
de perto, perguntar por que ele conseguiu cada uma delas. Você pode
aprender muito sobre uma pessoa apenas com suas tatuagens. Mas eu
nunca perguntaria - tenho tanto interesse em conhecer Mako quanto em
conhecer um tubarão. Ambos são perfeitamente capazes de me devorar
viva.
As engrenagens na minha cabeça estão girando ao longo do tempo
enquanto tento descobrir como diabos ele me encontrou e por que ele
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me encontrou. Não há como Mako vir para a faculdade aqui. Ele parece
muito velho, definitivamente mais velho que Ryan.
O perseguidor levanta uma sobrancelha quando continuo a olhar
estupidamente. Tremendo, sinto o sangue subir ao meu rosto.
— O que está fazendo aqui? – pergunto, com meu tom acusador e
áspero agora que ele me pegou olhando para ele.
Quem estou enganando, teria sido áspero de qualquer maneira.
Eu tinha acabado de sair da minha aula de psicologia e estava indo
em direção à minha loja de donuts favorita. Estou a apenas um
quarteirão de distância. Não é bom para o meu corpo, e Ryan ficaria
irritado se eu ganhasse peso, mas estou com muita fome hoje.
Pelo menos até Mako aparecer. Agora, meu apetite desapareceu
completamente. Na verdade, eu me sinto um pouco mal.
Ele sorri. — Comprando um donut.
Sem minha permissão, meus olhos percorrem seu corpo. Ele não
parece que come donuts.
— Certo. – digo em dúvida, e então me viro para caminhar em
direção à loja de donuts. Eu como donuts. Eu não sou uma mentirosa
como ele é.
Ele caminha atrás de mim, e meu sangue esquenta e gela ao mesmo
tempo. Um suor frio e nervoso escorre pela minha testa, embora esteja
30ºC aqui fora.
E se Ryan nos vir? Ele poderia facilmente passar de carro. A loja de
donuts fica a apenas alguns quarteirões de seu trabalho. Se Ryan visse
Mako andando ao meu lado, não sei como ele reagiria. Ele me ama e não
me quer perto de más influências. Uma olhada em Mako e é fácil ver
que ele se enquadra nessa categoria.
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— Você não pode andar ao meu lado. – eu repreendo, apressando


meus passos para frente. Suas longas pernas diminuem a pouca distância
que ganhei em questão de segundos.
— Por que não? – ele pergunta, embora pareça que ele já sabe a
resposta. Parece que ele está me testando.
— Porque eu não gosto de você.
Ele diz. — Então, você vai me responder? Quanta força é necessária
antes que um osso se quebre?
— Não sei. Você teria que perseguir alguém com um diploma de
anatomia. – eu respondo rapidamente, ainda tentando acelerar o meu
passo. Tudo o que estou conseguindo é me exercitar antes de me
empanturrar de açúcar e calorias.
— Eu vou te dizer a resposta. Não é sobre a força, é sobre o ângulo
de ataque. Se você for inteligente e tiver um bom ângulo, pode quebrar
alguém sem nenhum esforço.
Eu paro e Mako não perde o ritmo. Ele para ao meu lado, com seu
calor se acumulando em mim até que estou em perigo de uma insolação.
Sua energia parece como se eu estivesse sendo atacada por uma
explosão solar.
Eu me viro para ele, com meus olhos se estreitando. A raiva pulsa
através de mim em ondas de calor brilhantes. Se ele olhasse perto o
suficiente, ele veria isso vibrando no meu pescoço.
— Eu sei o que você está insinuando. Ryan me ama. – digo.
Por que eu parecia uma criança aqui? Em vez de sorrir em triunfo,
ele franze a testa.
— Você realmente acredita nisso? – ele pergunta sério.
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— Sim. – eu respondo com convicção.


Ele parece desapontado. Por que ele se importaria? Eu estou
desapontada por me importar porque ele se importa. Lentamente, ele
acena com a cabeça, como se estivesse aceitando algo que acabou de
perceber.
— Ele é bom, eu admito. – Quando franzo a testa, ele esclarece: —
Ele quebrou você com tanta facilidade que a dor nem atingiu você ainda.

É noite de encontro e acabei de passar duas horas me preparando.


Eu coloquei maquiagem mínima desta vez e decidi deixar minha roupa
fazer todo o brilho. Estou usando um vestido de cetim azul royal, com
escarpins prateados. Faz meus olhos dourados brilharem, parecendo
quase não naturais. Estou muito orgulhosa da criação que fiz de mim
mesma.
Ryan está sentado no sofá, esperando impacientemente por mim. Eu
posso sentir a energia negativa através das paredes. Ele está me levando
a um restaurante de elite à duas cidades daqui. Apenas reputação.
Porque só pessoas de alto nível social entram com reserva. Quem está do
lado de fora na rua é colocado em uma lista e constantemente ofuscado
pelas pessoas de grande importância.
O pai de Ryan é um dos melhores advogados do país. Ryan está
pronto para assumir o escritório de advocacia de Matt - embora ele tenha
apenas 25 anos. Ninguém ousaria recusar a única pessoa capaz de tirar
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você de qualquer situação. Não sei como a personalidade


despreocupada de Matt se traduz em um advogado feroz, mas, de
alguma forma, ele conseguiu manter sua moralidade.
Ryan, nem tanto.
Desço a grande escadaria, com nervuras em preto e dourado no
mármore imaculado. Ryan está esperando no hall de entrada, com o
candelabro extravagante pendurado acima dele envolvendo-o nas
sombras da casa escura. Quando ele me vê, seus olhos percorrem
lentamente meu corpo. Um arrepio percorre minha espinha. Seu olhar
rivaliza com o de um vampiro quando eles sentem o primeiro cheiro de
sangue fresco.
— Você está linda. – ele diz suavemente. Uma emoção que não
consigo nomear surge em seus olhos, desaparecendo muito rapidamente
antes que eu possa descobrir.
Aí está aquela palavra de novo. Linda.
Apesar de sua escolha de palavras, meu coração palpita e o maior
sorriso surge em meu rosto. Ele retribui meu sorriso com um sorriso
sinistro e estende a mão para mim. Eu aceito sem reservas, com minha
animação crescendo. Ele aperta minha mão e me leva até o carro.
O trajeto até lá é silencioso e um pouco rígido. Eu me mexo,
revirando meu cérebro em busca de algo para dizer. Eu odeio a conversa
banal, mas às vezes não sei mais o que dizer. Silêncios confortáveis
entre Ryan e eu são inexistentes ultimamente. Normalmente, quando ele
está em silêncio, ele está pensativo ou irritado e preenche o espaço com
inquietação. Sei que demorei um pouco mais do que deveria para me
arrumar, mas esperava que ele achasse que valeu a pena depois de ver
como estou bonita.
— Espero que esteja com fome. Este lugar tem a melhor comida da
cidade. – Ryan anuncia, embora sua voz não tenha a empolgação
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otimista que tinha quando ele me disse pela primeira vez para onde
estava me levando, dois dias atrás.
Suspiro sonhadoramente com a menção de comida. — Estou
morrendo de fome. A única coisa que comi hoje foi um donut. – digo.
Ryan me dá um olhar estranho. — Espero que você não coma essas
coisas o tempo todo, River. Você vai engordar.
— Não vou engordar. – eu protesto, rindo e batendo em seu braço
em uma tentativa de humor.
Minha risada desaparece quando ele me encara com um olhar
sombrio. — Por quê? Porque você quer que os homens a cobicem? Não
aja como uma prostituta, River.
Pressiono os meus lábios, com meu coração caindo na boca do
estômago com suas palavras. Eu odeio quando ele diz coisas assim para
mim. — Pare de me chamar de prostituta, Ryan. Estou namorando você,
não estou? – digo, ficando irritada com seu xingamento.
Ele ri sem humor. — Então pare de agir como uma. É por isso que
você está vestida do jeito que está. Para mostrar seu corpinho gostoso
como se fosse seu direito.
Eu me sinto afundando rapidamente, circulando em um buraco
profundo que estou cavando. Eu não sei o que dizer. Quando tento me
defender, isso só piora as coisas. Isso nunca o coloca em seu lugar, nem
se preocupa em se desculpar. Parece que não importa mais - nunca serão
as palavras certas. Brigar com um advogado deve ser a coisa mais
frustrante que já experimentei.
Depois de um momento de silêncio, pergunto hesitante: — Você
quer que eu engorde?
Parece que ele está quase amargo sobre o meu corpo. Tenho curvas
nos lugares certos, uma bunda excessivamente generosa e seios
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empinados - eu sei disso e usei isso a meu favor durante meus dias de
festas antes de Ryan. Ele poderia dizer sim e esperar que eu ganhasse
peso. O pensamento envia uma injeção de medo em minhas veias.
Minha beleza costumava ser uma maldição, atraindo homens muito
antes de eu ter idade suficiente, mas agora que estou mais velha e sinto
mais controle de quem pode me tocar, gosto de quem sou e de minha
aparência. Eu gosto de mim e não quero mudar por ninguém.
Ele zomba. — Não seja estúpida. Eu não sairia com você se você
estivesse acima do tamanho 38.
Minha boca abre em choque. 38? É um número obscenamente
pequeno. Ele não percebe que uma mulher pode ter qualquer tamanho e
ainda ter uma barriga chapada? E daí se não tiverem? Por que os homens
sempre atribuem o valor das mulheres à forma de seu corpo e à
aparência delas? Não faz sentido para mim quando nossos corpos vão
para o inferno quando envelhecemos de qualquer maneira.
Com esforço, fecho minha boca e contemplo como diabos abordar
isso. Eu preciso fazer isso de uma maneira que não cause uma briga.
— E se eu for tamanho 40? – A pergunta sarcástica escapa antes que
eu possa impedir. Fecho os olhos em resignação. Isso provavelmente vai
irritá-lo.
Ele ri. — Você não é. Eu verifico suas roupas.
Não surte. Não surte.
— Por quê? – eu sussurro.
— Você afeta minha imagem, River. Não posso arriscar isso quando
estou tentando chegar ao topo.
Ele já se formou em Direito e conquistou uma clientela no escritório
de seu pai. Ainda assim, não tenho certeza de como uma mulher
vestindo tamanho acima de cinco tem algo a ver com isso. Se eu discutir
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sobre o corpo da mulher, ele vai nos virar e não vai me deixar comer
pelo resto da noite. Desesperadamente, quero argumentar sobre o quanto
errado é considerar qualquer mulher acima de cinco gorda e como ele
está agindo de forma obtusa, mas não quero estragar nosso encontro
antes mesmo de começar.
Além disso, estou com fome pra caralho.
Limpo minha garganta e forço um sorriso. — Não vou ganhar mais
peso, não se preocupe. Uso tamanho 38 desde os dezessete anos. Na
verdade, era tamanho 34 por causa da desnutrição, mas não mencionei
isso.
Não estou mais em Shallow Hill. Eu subi acima disso e com um
peso saudável. Eu controlo minha dieta na maior parte do tempo e me
exercito semanalmente. Meu tempo em Shallow Hill não é algo que
estou disposto a pensar.
Chegamos a um restaurante quatro estrelas chamado Rosebud. Eu
obviamente nunca tinha ido, embora tivesse ouvido falar que a comida
aqui é absolutamente divina. Quando entramos, a admiração toma conta
de todo o meu ser. O restaurante é decorado com tons de branco e azul,
com grandes arcos em cada entrada e plantas cuidadosamente estilizadas
e arte cara que decoram o local. Está quieto aqui, os clientes falando em
voz baixa e segurando suas facas e garfos delicadamente. É um pouco
chique para o meu gosto, mas tenho certeza que poderia me acostumar.
Esperançosamente.
Uma bela fonte do tamanho da minha casa em Shallow Hill fica na
entrada onde a anfitriã espera pelos convidados. Quando ela nos vê, ela
imediatamente reconhece Ryan. Um sorriso brilhante se abre em seu
rosto pequeno, e um ardor surge em seus olhos castanhos. Ela é linda. E
ela está olhando para o meu namorado como se soubesse mais sobre ele
do que deveria.
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— Boa noite, Sr. Fitzgerald. Por favor, siga-me, sua mesa está
pronta.
A mulher nos leva a uma sala separada com vista para o lago. O sol
já está começando a se pôr, com seus raios se estendendo sobre a água
cintilante. Vermelho, roxo e rosa brota do sol, pintando o céu com
aquarelas de algodão doce.
Ryan puxa minha cadeira para mim, antes de sentar na sua. A
mulher se afasta, dando um último olhar lascivo para Ryan antes que
nosso garçom se aproxime.
Se fosse o contrário, Ryan já teria me chamado de puta por chamar
a atenção. Talvez eu devesse fazer o mesmo.
— Gostaria de uma garrafa de vinho, Sr. Fitzgerald? – O garçom
pergunta, com seu tom respeitoso.
— Traga o Chateau Petrus Pomerol. – ele diz. O garçom abaixa a
cabeça e corre para pegar a garrafa. Não entendo muito de vinho, mas
acho que é muito caro.
Verifico o menu, as opções são limitadas, mas ainda esmagadoras.
Tudo parece bom e, para a minha vergonha, o meu estômago ronca
enquanto considero minhas opções.
O garçom volta, prontamente servindo uma taça de vinho para Ryan
e para mim, antes de colocar a garrafa em um balde de gelo para gelar.
Ele então lê os especiais.
Ryan me deixa pedir minha comida primeiro, e depois a dele.
Quando o garçom sai com nosso pedido, tomo um gole de vinho e quase
caio da cadeira.
— Isso é delicioso. – eu deliro, tomando outro gole. Ryan sorri,
satisfeito com a minha reação.
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— Estou feliz que você gostou, querida. – ele diz, me observando


de perto enquanto eu tomo outro gole. Eu coloco a taça na mesa antes de
começar a beber tudo. De alguma forma, duvido que Ryan aprecie isso.
Desde que eu afetei sua imagem aparentemente.
— Tenho que comparecer a um evento beneficente em Setembro.
Você será minha acompanhante, certo, querida?
Meu coração derrete com seu tom infantil.
— Claro. Vou começar a procurar um vestido agora.
— Não se preocupe com isso, vou encontrar um vestido para você.
– ele diz, tomando um gole de seu próprio vinho. Eu escondo minha
careta com minha taça.
— Você não quer que eu escolha meu próprio vestido?
Ele suspira com impaciência, aparentemente ficando farto de mim.
Eu não sei por quê. — Por que você sempre me faz parecer o cara mau?
Já considerou que talvez eu só queira cuidar de você? Tirar um pouco do
estresse de seus ombros para que você não precise se preocupar com
isso?
Eu me encolho, decepcionada comigo mesma.
— Você está certo, me desculpe. Não estava tentando parecer
ingrata. Você sabe que eu aprecio você.
Seus ombros relaxam, mas seus olhos ainda brilham de raiva. Meu
coração aperta e uma sensação de enjoo começa a girar em meu
estômago.
Estou arruinando esta noite inteira. Parece que desde o momento em
que entrei no carro, continuo dizendo a coisa errada.
O garçom entrega nossas refeições enquanto Ryan e eu tentamos
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conversar. Cheira absolutamente divino, com os diferentes temperos


flutuando de nossos pratos e se misturando intimamente em meu nariz.
Ryan pediu um filé de carne caramelizada com foie gras, purê de salsa e
molho madeira, complementado por chouriço e beterraba E pedi filé
mignon recheado de siri com molho de pimenta e uísque, aspargos
grelhados e salada de morango com espinafre. A carne é macia e se
desfaz na minha boca. Eu gemo com minha primeira mordida e meus
olhos revirando para trás da minha cabeça.
O de Ryan paralisa, seu garfo parou no ar enquanto seus olhos me
encaravam, brilhando de raiva. Seu rosto fica vermelho, mas ele não diz
nada, em vez disso leva o garfo lentamente até a boca e dá uma mordida
na comida. Ele mastiga devagar, com a raiva em seus olhos ficando mais
nítida.
— Desculpa. – eu peço desculpas baixinho, envergonhada com a
minha reação. — Nunca comi assim antes. – Uma rápida olhada ao redor
confirma que ninguém pareceu notar. As pessoas que vejo estão muito
ocupadas com suas próprias conversas.
Ele sorri, embora pareça tenso e não alcance os seus olhos. —
Acostume-se, querida. Esta é sua vida.
Bem, isso soou ameaçador pra caralho.

— Você sabe que eu te amo, não é? – Ryan pergunta, com os seus


olhos encontrando os meus em uma intensa demonstração de força de
vontade. Ele está afirmando seu domínio, e eu não quero deixá-lo fazer
isso.
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Fecho meus olhos com força, desesperada para bloquear a cena


diante de mim. Eu aceno com a cabeça, embora seja formal. A mão de
Ryan está segurando minha mandíbula com muita força, minimizando
meus movimentos.
— Você sabe que eu sou o único que ama você, River? Eu sou tudo
o que você tem. Ninguém mais vai te amar como eu. E você me obriga a
fazer essas coisas, e eu odeio isso. – ele sussurra. Sua mão aperta, e
minha mandíbula protesta. Eu grito, ficando na ponta dos pés para
aliviar a dor. Ele segue meus movimentos. Minhas bochechas estão
começando a apertar em meus dentes. O cobre surge na minha boca e
não tenho movimento suficiente para engoli-lo.
Ele solta meu queixo por tempo suficiente para envolver suas mãos
em volta dos meus braços e me sacudir com força.
— Por que você me faz fazer isso com você? – ele grita, apertando
as mãos em volta dos meus braços.
— O que eu fiz? – eu choro, com as lágrimas ardendo meus olhos.
— Você se veste como uma prostituta, geme no restaurante como
uma prostituta. Você quer que os homens tirem você de mim? Como
devo protegê-la se você pedir aos homens para transar com você?
Uma lágrima escorre do meu olho.
— Sinto muito... – Meu pedido de desculpas é interrompido por
outro tremor brutal. Ele range os dentes, aproximando o seu rosto
demoníaco do meu.
— Sentir muito não impede os homens de querer foder você! – ele
grita. Eu me encolho. A única coisa que me mantém de pé são as mãos
implacáveis de Ryan em volta dos meus braços.
Isso dói. Dói demais.
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— Você não viu todos aqueles homens olhando para você? Aposto
que gostou, não é?
Eu balanço minha cabeça desesperadamente.
— Você gostou. – ele acusa asperamente. — Olhe para si mesma...
olhe para si mesma agora!
Minha cabeça abaixa quando olho para meu vestido justo. Ele
termina alguns centímetros acima dos meus joelhos. Meus seios estão
aparecendo através do amplo decote, e a parte de trás do vestido é baixa,
expondo minha pele completamente, exceto por algumas tiras que
cruzam minhas costas.
Ele está certo, é um vestido sexy. E captei os olhares interessados de
alguns homens.
Lágrimas embaçam minha visão, distorcendo o rosto zangado de
Ryan. Isso só consegue torná-lo mais aterrorizante. Ele resmunga e me
empurra com toda sua força. Eu caio para trás e pouso desajeitadamente
no meu quadril. Minha cabeça bate contra o chão, fazendo com que as
estrelas surjam em minha visão.
Fico ali por um minuto enquanto ele sai furioso, completamente
chocada com a reação visceral de Ryan. Ele nunca colocou as mãos em
mim assim antes. Claro, eu cai uma vez depois de conhecer os pais dele,
mas ele não me jogou agressivamente do jeito que acabou de fazer.
Ofego, com medo de me mover e em choque com a rapidez com que
esse encontro foi ladeira abaixo. Depois da conversa sobre o evento
beneficente, achei que estávamos nos divertindo muito. Ele sorriu para
mim e brincou comigo, me elogiou mais algumas vezes com aquela
palavra feia – linda. Eu sorri para ele como se a palavra não me fizesse
sentir como se milhões de formigas estivessem rastejando sob minha
pele e fiz questão de dizer a ele o quanto eu estava agradecida por ele ter
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me levado a um restaurante tão lindo.


Então, entramos no carro e ele forçou seu pau na minha garganta
novamente até eu não conseguir respirar. Gemi e agi como se estivesse
gostando, embora não estivesse. Às vezes, acho que é a única coisa que
o deixa excitado.
As lágrimas continuam a encher meus olhos até parecer que estou
me afogando nelas. Eu soluço baixinho e me levanto do chão, sentindo-
me patética pra caralho. Não sei para onde Ryan desapareceu nesta casa
grande, mas só posso rezar para que ele não esteja em nosso quarto.
Meu quadril queima quando eu me levanto do chão. Mancando todo
o caminho, eu me arrasto escada acima e ando pelo longo corredor.
Fotos nas paredes observam minha caminhada de vergonha, com seus
pais me provocando com seus rostos sorridentes e sua fachada estúpida
de uma família perfeita.
Com a ajuda das paredes, chego ao nosso quarto e dou um suspiro
de alívio quando Ryan não está em lugar nenhum. Eu me tranco no
banheiro e deslizo pela porta lentamente, com o peso no meu quadril se
tornando demais.
Depois de alguns momentos de choro, inspeciono o meu corpo.
Marcas de hematomas já estão se formando em torno de ambos os
bíceps. Um hematoma surge em meu quadril também. Felizmente,
minha cabeça não está sangrando, embora pareça que uma de bateria
está ensaiando dentro da minha cabeça.
Eu fungo e me levanto do chão mais uma vez, e arranco o meu
vestido do meu corpo agressivamente, apesar do meu corpo dolorido
protestar. Com raiva, eu olho para o vestido ofensivo.
Ele tem razão. Este vestido me fez parecer uma prostituta. Os
homens estavam olhando para mim com seus olhares famintos. O que eu
esperava usando um vestido como esse? Isso é tudo minha culpa.
Estraguei uma noite perfeitamente boa.
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Eu rasgo o vestido em um ataque de raiva. O barulho de rasgo ecoa


no banheiro enquanto continuo a despedaçá-lo. O azul escuro brilha na
luz do teto enquanto pedaços de cetim caem no ladrilho de pedra como
sonhos esquecidos. Só fico satisfeita quando o vestido não passa de
tecido rasgado.
Pego os pedaços, ignorando o inchaço no meu quadril – eu mereço
essa dor – e jogo os pedaços na lata de lixo ao lado do banheiro.
Volto para o espelho e vejo meu corpo manchado. O rímel escorre
pelo meu rosto, fazendo-me parecer a prostituta suja que sou. Ainda
consigo sentir os olhos de todos os homens que percorriam meu corpo
no restaurante. Suas perversões mancharam minha pele, tornando-a mais
escura do que as mãos fantasmas envolvendo meus bíceps.
Meu punho atinge o espelho, enviando rachaduras por todo o vidro,
distorcendo meu rosto. Uma marca de sangue mancha o espelho e
escorre, perdendo-se nas fissuras. Observo meu punho ainda fechado,
detectando pequenos cacos de vidro alojados em minha mão. O sangue
escorre pelos meus dedos e pinga no chão, juntando-se ao resto do vidro
quebrado.
Eu ando até o chuveiro, ignorando um pouco de dor aguda quando o
vidro se espeta na sola dos meus pés. Abro a água o mais quente que
minha pele aguenta e esfrego meu corpo, desesperada para limpá-lo.
River estúpida, estúpida, estúpida. Prostituta estúpida do caralho.
Você mereceu isso.
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Tenho quase certeza de que morri e fui parar no Inferno. Não sei o
que estava pensando - pelo que sei, não estava estrelando a porra do
Inferno de Dante.
Minha aula de psicologia termina em cinco minutos, e tudo em que
consigo pensar é que Ryan ainda não respondeu a nenhuma das minhas
mensagens. Ele veio para a cama ontem à noite depois da nossa briga.
Não importava que eu colocasse uma mão hesitante em seu ombro,
buscando sua segurança. Ele se virou e se recusou a me tocar a noite
toda.
Eu chorei enquanto dormia. Chorei acordada. Eu chorei na aula.
Agora, cheguei ao final da aula e os óculos de sol não saíram
nenhuma vez. Meus olhos inchados vão atrair atenção indesejada e a
última coisa que preciso é de um bando de vadias mesquinhas julgando
meu relacionamento. Muitas garotas da minha turma conheciam Ryan e
até ficaram com ele. A reputação de Ryan era grande, o que significa
que agora a minha também é.
Elas me observam, esperando por qualquer oportunidade de fofocar
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e destruir nosso relacionamento. Não darei a qualquer uma dessas


vadias a satisfação. Mesmo que usar óculos de sol dentro de um prédio
seja uma bandeira vermelha. Não tenho escolha, além de esperar que
pensem que estou de ressaca depois de festejar a noite toda ou algo
assim.
Qualquer coisa para evitar causar problemas com Ryan. Já fiz o
suficiente disso ultimamente. Se Ryan está preocupado com a sua
imagem, certamente uma namorada perturbada vai manchar isso. Eu não
posso fazer isso com ele. Ele se esforçou muito para chegar onde está,
apesar da reputação de seu pai.
— A classe está dispensada. – Anuncia o Professor Tumbling. O
corpo de alunos levanta de uma vez, correndo para fora da sala. Tomo
meu tempo, juntando meus livros e lentamente caminhando em direção à
porta. Meu quadril ainda está dolorido da noite passada, e preciso ter
calma para evitar mancar ao caminhar.
— Srta. McAllister, eu posso falar com você por um momento? –
Professor Tumbling diz atrás de mim. Faço uma pausa e então suspiro
com resignação. Isso é exatamente o que eu estava tentando evitar. Você
pensaria que manter a cabeça baixa manteria a atenção distante.
Eu forço um sorriso e vou até ele, já temendo essa conversa.
— Só queria falar com você. Você parecia terrivelmente distraída
hoje. Preciso lembrar que as provas finais estão chegando em breve?
Tirar um A nesta aula é vital para sua carreira.
Sim, Sim, Sim. Economize energia e guarde a condescendência para
você, velhote.
— Sinto muito, Professor Tumbling. Isso não vai acontecer de
novo. – eu respondo roboticamente. Estou satisfeita com a firmeza da
minha voz, mesmo que isso me faça parecer sem sinceridade.
Ele me observa de perto, e me mexo sob sua atenção, certificando-
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me de colocar os meus dedos cortados atrás das costas. São cortes


superficiais e quase imperceptíveis. A menos que alguém vá procurá-
los. Seu olhar não parece pervertido, mas me deixa desconfortável de
qualquer forma. Ryan diria que está me checando. Eu diria que ele pode
ver que algo está claramente errado.
O que a entregou? Os óculos escuros em uma sala escura? Esta é a
cena que você vê em qualquer filme. Se ele me pedir para tirar meus
óculos, ele não encontrará olhos roxos, no entanto. Apenas olhos
vermelhos e inchados de tanto chorar.
Vou dizer a ele que meu cachorro morreu. Isso deve funcionar.
— Você pode ir, Srta. McAllister.
Obrigada pela sua permissão, idiota.
Certamente, só piorei a tensão no meu quadril com a rapidez com
que acabei de sair correndo daquela sala de aula, mas acho que vale a
pena se isso significar escapar do olhar inquisitivo do professor.
Essa foi minha última aula da semana. Amelia está pedindo para
tomar café, mas não ouso encará-la agora. Ela me conhece muito bem e
farejaria minha situação em um piscar de olhos.
Mas também não quero ir para casa. Ryan ainda não está em casa,
ou pelo menos não deveria estar, mas a casa vazia só me faria sentir
pior.
Estou parada no estacionamento que está se esvaziando rapidamente
quando sinto os pelos da minha nuca se arrepiarem. Eu sei quem está
atrás de mim antes mesmo de dizer uma palavra. Por que diabos ele está
me seguindo? Eu atribuí a primeira vez a um acaso estranho, mas agora
é óbvio que ele está me procurando. Nossa primeira interação, ele foi
frio e distante. Isso simplesmente não faz sentido.
— Por que você está me seguindo? – pergunto, sem me preocupar
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em me virar.
— Por que está parada no meio de um estacionamento? – ele
responde, com sua voz rouca percorrendo minhas terminações nervosas
maltratadas.
Meu estado mental está frágil hoje. Normalmente, posso confrontar
Ryan - literalmente - mas estou muito desapontada comigo mesma.
— Hoje não, Mako. – murmuro. Eu ando para frente - para longe
dele. Agora, mais do que nunca, tento andar sem mancar. Ele nunca
desistiria se visse. Ele segue imediatamente. Eu já sabia que ele iria, mas
isso me deixa com raiva de qualquer maneira. Eu viro, ranjo os dentes
contra a dor e olho para ele. — Pare de me seguir.
Ele não responde. Em vez disso, seu olhar preocupado me observa
da mesma forma que o Professor Tumbling acabou de fazer.
— Eu não preciso disso. – murmuro, me virando. Uma mão gentil
me detém. Eu me afasto de seu toque, não gostando de como o tipo
errado de calafrios percorre minha espinha. O tipo de arrepio que Ryan
deveria me fazer sentir. Isso faz minha pele arrepiar.
— O que ele fez?
— O que faz você pensar que ele fez alguma coisa? – eu digo.
Mako não responde de imediato. Ele enfia as mãos nos bolsos,
como se precisasse impedi-las fisicamente de fazer alguma coisa. Como
de me tocar.
— Então quem foi? – ele pergunta suavemente. Eu não me enganei.
Uma fúria tenebrosa está na beira do precipício em sua voz, ameaçando
roubar sua gentileza. É como um maremoto batendo em um barco de
brinquedo.
Balanço a cabeça e, mais uma vez, me viro para ir embora. Ele me
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permite desta vez, mas ele ainda segue.


Caramba.
Eu meticulosamente caminho para fora do campus e desço a rua
movimentada. Volto para pegar o meu carro mais tarde. Tudo o que
preciso agora é me afastar da energia impaciente que polui meu corpo.
Estou suando em questão de minutos, mas é bom focar em outra
coisa além do meu quadril.
Caminhamos em silêncio. Cinco minutos se passam. E então dez.
Pego ruas secundárias, evitando qualquer área que Ryan possa passar. A
caminhada inteira, repasso a noite passada na minha cabeça, repassando
cada detalhe minucioso e obcecada com o que eu poderia ter dito ou
feito de forma diferente. Há tantas coisas que eu gostaria de poder
mudar, desde usar algo mais conservador até não discutir tanto com ele
quando ele disse algo que não gostei. Sempre tenho que discutir com
tudo o que ele diz, em vez de apenas escolher minhas batalhas. Nem
tudo vale a pena lutar.
Por fim, subo um pequeno morro em direção a uma biblioteca
abandonada. O grafite cobre as paredes de tijolos, com palavras vulgares
e imagens coloridas em toda a superfície. A porta está pendurada nas
dobradiças. Eu a afasto um pouco e entro pela abertura.
A biblioteca pode ser assustadora para a maioria, mas é um abrigo
para mim.
Passei muito tempo aqui quando era mais jovem e consegui escapar
de Shallow Hill. Fechou há alguns anos e meu coração se comoveu com
isso. Nunca fui capaz de esquecê-la, mesmo quando os vira-latas
começaram a destruí-la lentamente.
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Mako obedientemente me segue. Por alguma razão desconhecida,


ele pretende me perseguir, e estou exausta demais para brigar contra
isso agora.
— Onde estamos? – Sua voz quebra a frágil película de silêncio que
cobria sobre nós. Ryan nem conhece esse lugar. Me dá coceira saber que
Mako está testemunhando uma parte tão íntima da minha vida.
Sinceramente, eu nem tinha percebido que era para onde estava indo até
chegar. Meu corpo parecia saber para onde ir naturalmente - um lugar
que acalma algo dentro de mim que nada mais pode.
— Abrigo. – eu respondo brevemente.
Surpreendentemente, ele não me questiona mais. Apenas segue em
silêncio enquanto eu caminho pelas fileiras vazias onde os livros
costumavam ficar. Passo as pontas dos dedos pelas superfícies
empoeiradas, traçando linhas onduladas pelas prateleiras e cobrindo
meus dedos com uma espessa película de poeira. Se eu fechar meus
olhos, posso sentir os fichários fantasmas tocando meus dedos.
E se eu os mantiver fechados, posso me lembrar da sensação de
abrir um livro e ver as páginas despertarem de seu sono e me mostrarem
sua história. Eu ficava tão perdida nelas quando era mais jovem que
ficava muito tempo depois que a biblioteca fechava.
A bibliotecária, e minha mentora enquanto eu crescia, Camilla, me
deixava ficar o máximo que podia antes que ela tivesse que voltar para
casa para sua própria família. Ela nunca perguntou e eu nunca contei,
mas acho que ela sabia que eu tinha uma vida familiar ruim. É por isso
que acho que ela trabalhou tanto para me dar algo bom em que me
agarrar. Todos os dias, eu comia lanches suficientes para manter minha
barriga cheia pelo resto da noite. Às vezes, ela até me comprava uma
roupa e sapatos novos quando as minhas roupas começavam a ficar
pequenas. Barbie nunca percebeu para questionar de onde eu os
consegui.
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Camilla foi quem me ensinou sobre menstruação e comprou meus


primeiros absorventes. Ela me ensinou sobre sexo e sistema reprodutivo.
Nunca vou esquecer aquele dia - aprendendo que o sexo deve ser entre
duas pessoas que se respeitam e deve ser consensual. Foi também
quando percebi que os homens que se aproveitavam do meu corpo
poderiam me engravidar. Com apenas treze anos, implorei a Camilla que
me ajudasse a tomar anticoncepcionais. Ela sondou e perguntou se eu
estava sendo tocada, mas apenas menti e disse que as cólicas menstruais
eram horríveis - o que era.
A velha bibliotecária cuidou de mim e me amou de uma forma que
eu nunca tinha experimentado antes. Naquele ano, quando eu tinha
apenas treze anos, ela pensou em me adotar. Isso foi o mais feliz que já
estive. Eu tinha certeza de que Barbie adoraria me entregar. Mas antes
que pudesse, ela sofreu um grave derrame e faleceu.
Isso foi o mais triste que eu já estive. Foi também quando comecei a
me prostituir por necessidades básicas para me manter viva.
Meu corpo treme enquanto as memórias me atingem. Estou tão
perdida nelas; A princípio não registro o toque suave de uma mão em
meu quadril.
Eu fico imóvel, e a realidade regressa novamente. Eu me afasto de
seu toque e gemo de dor quando a dor em meu quadril aumenta.
— Está roxo.
Eu não pergunto e ele não explica. Nós dois sabemos o que ele quer
dizer. Minha camiseta da universidade subiu, expondo o hematoma roxo
intenso no meu quadril. Eu sabia que deveria ter usado uma camisa
grande hoje. Esta é larga e vai até o meu pescoço, mas não é grande o
suficiente para passar dos meus quadris. Eu a arrumo apressadamente,
com minhas bochechas ficando quentes de vergonha. A última coisa de
que preciso é o julgamento de Mako. Ele não tem ideia do que está
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falando quando se trata do meu relacionamento com Ryan.


— Eu caí.
Seu rosto fica sério.
Isso não é mentira.
— Eu sei. Resposta típica. Mas é verdade, honestamente.
— Você caiu. – ele repete secamente. — Mas você foi empurrada?
— Não.
Agora eu sou uma mentirosa, mentirosa.
Não sei por que estou tentando convencê-lo. Os olhos de Mako
abaixam novamente para o meu quadril. Agora que ele sabe que está lá,
ele olha como se tivesse visão de raio-x e pudesse ver através do
algodão macio. O silêncio torna-se desconfortável.
— Posso te mostrar uma coisa? – Minha voz levanta seus olhos
verdes escuros de volta para os meus. Eles estão quase pretos de raiva.
Suas mãos grandes estão fechadas em punhos, e os músculos de sua
mandíbula estão pulsando, como um cavalo selvagem preso em uma
jaula.
Ele acena com a cabeça uma vez, bruscamente. Nunca saberei o que
me possuiu, mas pego sua mão e o levo para meu lugar favorito no canto
mais distante da biblioteca. Não é um edifício grande, mas tinha muitas
câmaras de pedras preciosas.
Camilla confiou em mim o maior segredo da biblioteca.
Os livros raros, tão antigos, cairiam se não tivessem sido tão bem
cuidados.
Eles não estão mais aqui, mas a sala está. A porta é acionada por um
alçapão em uma das prateleiras. Um livro não acionava a fechadura, mas
um suporte. Se levantada apenas o suficiente para acionar o mecanismo
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e destravar a porta.
É uma sala que foi mantida a salvo de invasores e maus
adolescentes. Levanto o suporte e abro a estante.
Nenhuma quantidade de poeira poderia impedir meus pulmões de
inalar profundamente. A sala é pequena e cheira a naftalina e almíscar,
mas me traz paz mesmo assim. Há duas pequenas janelas aqui,
permitindo que a luz do sol entre. Os ácaros pairam nos raios enquanto
eu entro.
Mako tem que se curvar um pouco para passar, e eu tenho uma
vontade insana de rir ao vê-lo mexer seu corpo através da abertura. Eu
me afasto antes de ceder a esse impulso.
— Onde estamos? – Mako pergunta, com admiração em sua voz
enquanto olha ao redor da pequena sala.
— Onde vivem os sonhos de infância. – respondo enigmaticamente.
Foi aqui que fiz meus planos de como sair de Shallow Hill. Eu tinha
doze anos com um pacote de giz de cera e um pedaço de papel e um
rascunho de meu futuro. Fiz as contas de como seriam os meus
contracheques tendo um salário mínimo, planejei minhas economias,
com que idade eu teria direito a um emprego melhor e um cartão de
crédito e ajustei de acordo. Camilla me ajudava muito com isso,
explicando todas as coisas de adulto como crédito e como é importante.
Não tinha sonhos típicos de infância de conhecer o Príncipe
Encantado e me apaixonar. Ou se tornar uma astronauta ou descobrir a
cura para o câncer.
Só queria sair de Shallow Hill. Tudo depois disso viria mais tarde,
quando eu cumprisse meu objetivo - um que parecia tão impossível na
época.
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— O seu ainda mora aqui? – ele pergunta, vagando pela sala.


— Não, eles já se tornaram realidade. – Seus olhos encontram os
meus. Eu me sinto presa ao lugar, como se mãos invisíveis estivessem
me segurando. Ele desvia o olhar, e eu posso respirar novamente.
— O que eram?
Eu encolho os ombros, tentando parecer casual. — Sobrevivência.
Um outro olhar. — Isso é tudo?
— Basicamente. – eu brinco, me afastando. Não quero mais falar
sobre isso. Francamente, não quero falar sobre mim. — E você? Quais
eram seus sonhos?
— Ser um piloto de carros de corrida. – ele fala inexpressivo. Eu
bufo e, em seguida, coloco a minha mão sobre a minha boca em
constrangimento. Isso não era muito feminino. Ryan odeia quando eu
bufo.
Não me sinto tão mal quando ele me dá um sorriso enorme de volta.
Na verdade, me dá vontade de começar a bufar como um porco. Ele tem
lindos dentes brancos e caninos afiados. Olhar para a boca dele me faz
pensar do que ela é capaz.
Deus, estou sendo estranha. Eu ignoro rapidamente. Esse sorriso é a
porra de uma arma capaz de aniquilar completamente a minha
determinação. Ainda não gosto dele, nem quero começar.
— E quando ficou mais velho? – eu pressiono.
— Um detetive.
— E como isso funcionou para você?
— Eu obtive sucesso.
Faço uma pausa e me viro para ele. — Você é um detetive? –
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pergunto incrédula.
Ele balança a cabeça e se volta para uma prateleira empoeirada. Não
há nada para ver lá. Gostaria de pensar que sou muito mais interessante
de se olhar do que uma prateleira empoeirada.
Não sei por que estou chocada com a carreira dele. Considerando
que ele descobriu em que aula estou. E quando... faz todo o sentido.
— Foi assim que você descobriu onde faço faculdade? E que aula
estou tendo?
Ele tem a coragem de parecer um pouco envergonhado. — Talvez
eu tenha utilizado minha posição para propósitos nefastos. – ele admite,
me dando um sorriso pecaminoso.
Porra. Pare com isso.
— Por que você me procurou?
— Se eu disser que estou preocupado com você, você acreditaria em
mim?
Eu zombo. — Absolutamente não. Você nem me conhece. E você
foi muito rude na primeira vez que nos encontramos.
Ele enfia as mãos nos bolsos novamente. — Eu não te conheço. Mas
conheço meu irmão. E isso basta. – ele arranha o chão acarpetado com a
ponta de sua bota preta gasta, olhando para baixo enquanto contempla
outra coisa. — Quanto à maneira como te tratei, você ficou do lado de
Ryan e me tratou com hostilidade depois de dizer duas palavras para
mim. Eu reagi de acordo. – ele olha para mim, com aqueles olhos verdes
esmeralda me fixando no local. O canto de seus olhos enruga enquanto
um sorriso malicioso surge em seu rosto.
— Você ainda é hostil. – ele acrescenta. Eu cruzo meus braços, não
impressionada com sua avaliação e apenas provando seu ponto. Eu sou
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hostil. — Espero que Ryan não tenha dito muitas coisas horríveis sobre
mim. Estou curioso para saber que tipo de história ele inventou desta
vez para torná-lo a vítima.
— Não quero falar sobre ele. – digo, irritada com o fato de que
Ryan nem se preocupou em inventar uma história para mim. Eu vim
aqui para ficar em paz. Isso não é ficar em paz.
Ele balança a cabeça e caminha até um canto com um banco
empoeirado. Ele se joga sobre ele, não dando a mínima para a poeira que
cobre a madeira. Ryan nunca faria isso. Na verdade, acho que ele nem
teria pisado neste prédio.
Hesitante, eu me sento ao lado dele, o mais longe possível dele no
banco. O que reconhecidamente não é muito espaço quando seu corpo
ocupa três quartos dele.
Maldito mamute.
Um sorriso lento surge em seu rosto, mas ele não comenta. Não
tenho certeza se ele pode dizer o que estou pensando, mas às vezes
parece que sim. Eu quero fazer algo com esse sorriso. Dar um tapa, ou...
algo assim. Não sei o quê, mas sei que não deveria estar sentindo isso.
— Você vai me prender por invasão de propriedade, Detetive? –
pergunto ironicamente.
Ele ri, com um sorriso perverso se abrindo em seu rosto. Ele é muito
bonito. Estou tentada a enfiar uma faca no rosto dele. — Se você acabar
algemada, não será porque estou prendendo você.
Explosões de lava quente correm em minhas veias e direto entre
minhas pernas. Aperto minhas coxas e me mexo desconfortavelmente.
Idiota.
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Mais uma vez, eu me afasto.


Estamos sentados aqui há horas, conversando sobre tudo e nada,
exceto o óbvio elefante na sala.
Ryan vai me matar. Evitei olhar para a hora, mas com base no
ângulo do sol através das janelas, ele vai se pôr em algumas horas. O
que significa que Ryan já está em casa.
Ele já me mandou mensagem de texto treze vezes e ligou seis, mas
o lado oposto de mim está muito irritada com ele para se importar.
Talvez eu precise mostrar mais raiva? Talvez ele se aproveite de mim
porque sou fraca com ele. Talvez se eu for mais forte, ele comece a me
tratar assim.
O que isso quer dizer? Se você quer ser tratada como uma adulta,
aja como uma. Se eu quero ser tratada como uma mulher forte, devo agir
como uma. Pego o meu celular e leio as mensagens cada vez mais
raivosas, perguntando onde estou.
Excluir.
Ryan pode ir se foder. Eu estava errada por me vestir assim, mas ele
estava errado por me rebaixar. Certo?
Enfio o meu celular no bolso e me viro para o irmão do meu
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namorado. — Então, Sr. Eu-sei-como-um-relacionamento-deveria-ser,


se você é muito melhor do que Ryan, por que está solteiro? – Na
verdade, não sei se ele é solteiro. Eu não deveria me importar, mas me
vejo me importando mesmo assim.
Ele me dá um olhar engraçado, mas cede e encolhe os ombros. —
Eu estive em alguns relacionamentos de longo prazo com mulheres. Eles
não deram certo. – ele responde enigmaticamente.
— Por quê? – eu desafio.
Um sorriso surge em meu rosto. Ele acha que eu me importo. Eu
não me importo. Mas ainda aguardo uma resposta.
Outro encolher de ombros. — Não estava feliz. Indo em direções
diferentes na vida ou querendo coisas diferentes. Razões diferentes.
— Você estava apaixonado por alguma delas?
— Sim e não. Eu tinha um amor imenso por elas, e o que eu sentia
por elas era real, mas não acho que eu estivesse realmente apaixonado
por nenhuma delas, não. Não do jeito que você deveria ser quando está
em um relacionamento. Não do jeito que eu queria ser.
Eu franzo a testa. — Do jeito que você queria? – eu questiono.
— Quero um amor como dos meus pais. Como o do meu parceiro.
Com minhas ex, sempre parecia que algo estava faltando. Isso não é
amor verdadeiro aos meus olhos.
Eu murmuro, refletindo sobre sua resposta. Estou apaixonada por
Ryan assim? Sim, acredito que sim. Sinto que está faltando alguma
coisa?
Às vezes.
— Então, com que idade você finalmente saiu de Shallow Hill? –
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Mako pergunta, afastando-me dos meus pensamentos.


Suspiro e bato minha cabeça contra a parede atrás de mim. —
Dezoito anos, quando me mudei para os dormitórios da faculdade. Até
então, eu tinha a capacidade de comprar a casa da Barbie. Não que
realmente me custou muito. O empréstimo foi pago há um ano.
Ele me dá um olhar sarcástico. — Ainda acho interessante você ter
comprado a casa.
Eu encolho os ombros. — Finalmente tenho alguma vantagem sobre
ela. Cresci sob o maldito teto dela por dezoito anos, fui forçada a lidar
com tudo o que apareceu no meu caminho por causa de suas escolhas de
maldita vida, e essa foi a minha maneira de voltar. Agora é o meu
maldito teto.
— Mas ela não poderia facilmente encontrar um lugar para morar?
Uma risada escapa de mim. — Ela poderia, sim. Mas ninguém vai
deixá-la ficar por mais de uma noite, no máximo. Ela teve sorte de
encontrar lugares para ir quando a casa foi hipotecada pela primeira vez.
Todo mundo sabe que ela obedece o Billy. Eles vão deixá-la por perto
tempo suficiente para transar com ela, mas Barbie sabe muitas coisas.
Ninguém quer mantê-la por perto tempo suficiente para que a Barbie
descubra seus segredos sujos.
Eu havia contado a ele sobre Billy e que ele era um cara mau, mas
não mencionei exatamente quem ele era e o quanto ele era mau. Billy
não é seu nome verdadeiro. Nem tenho certeza de qual é o nome
verdadeiro dele, para ser honesta. Acho que nunca me importei o
suficiente para perguntar.
— Ela não poderia ficar com Billy?
— A Barbie tem muito medo dele. Além disso, Billy nunca deixaria
Barbie morar com ele. Ele provavelmente a mataria depois de uma noite.
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Infelizmente, não sinto nada com essa perspectiva. Se a Barbie


morresse, eu provavelmente suspiraria de alívio. Acho que nunca senti
nada mais por Barbie do que desprezo. Mesmo quando criança, demorei
apenas três ou quatro anos para perceber que Barbie não me amava.
Nem dá a mínima para mim.
E acho que sempre me mantive bastante desapegada. A essa altura,
seus clientes já estavam se divertindo com meu corpo e ela ignorou.
Sempre que eu reclamava, estava sendo dramática. Dizia que era bom eu
estar aprendendo jovem, porque era tudo o que conseguiria na vida.
Chupar um pau sujo e ter seu rosto batido pela a ereção dele seria uma
grande habilidade para adicionar ao meu currículo.
— Não está tecnicamente mantendo a Barbie em sua vida dessa
maneira? Por que não deixar a casa hipotecada e colocá-la nas ruas?
Eu me fiz a mesma pergunta um milhão de vezes. E sempre dou
voltas em torno da mesma resposta.
— Vingança. E eu não me importo se isso não me torna uma pessoa
melhor. Eu tenho poder sobre ela e ela é forçada a me pagar o aluguel.
Depois de tudo que passei naquela casa, diria que estou sendo muito
atenciosa.
— O que você passou? – ele pergunta suavemente. Passei por muita
coisa esse tempo todo, mas ele me pegou em um bom momento. É bom
falar sobre essas coisas. Ryan não pergunta - nem se importa - e Amelia
sabe muito, mas ela está lidando com seu próprio passado de merda.
Nunca pareceu certo despejar o meu em cima do dela.
Acho que nunca consegui falar livremente. E é isso que eu faço com
Mako. Eu expurgo tudo o que foi feito para mim quando criança. Os
homens sujos me estuprando e molestando desde que me lembro. Não
me lembro de beijos de minha mãe, mas dos homens estranhos.
Então conto a ele sobre Camilla e como, por um curto período de
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tempo, ela me salvou. E bem quando realmente pensei que iria escapar
de Shallow Hill muito antes do planejado, ela foi arrancada de mim. Às
vezes me pergunto se fui uma pessoa horrível em minha vida passada, e
esta vida é meu castigo. Estou remediando quaisquer pecados que minha
alma tenha cometido.
Conto a ele sobre as inúmeras vezes que passei fome e tive que
implorar por comida depois que Camilla morreu. Os homens só me
davam comida se eu fizesse favores sexuais. Eu fiz isso. Era minha
forma de sobrevivência. Eu me tornei o que a Barbie sempre disse que
eu seria - uma prostituta.
É por isso que sei que Ryan não está errado. Eu sou uma prostituta.
Fiz sexo com homens aos treze anos para poder comer. Minha única
exigência era que eles usassem camisinha. Prefiro morrer de fome a
pegar uma DST. Tive uma sorte incrível de não ter tido isso até aquele
momento.
— Por favor, não se chame assim. – ele implora baixinho, mas
rispidamente. O tom suave me pega de surpresa. Eu olho para ele com
confusão. Não só eu não esperava que ele se importasse como eu me
chamava, como certamente não esperava que ele pedisse isso tão... bem.
Ryan está sempre exigindo coisas de mim, esperando minha obediência
e depois me xingando quando nem sempre consegue.
— O que?
— Você não é uma prostituta, River. Você foi repetidamente
estuprada e forçada a essas situações porque estava morrendo lentamente
de fome.
A fúria surge em seus olhos. Não sei como, mas sei que não é
direcionada a mim, mas por mim. E eu não sei como me sinto sobre
isso.
Eu abro minha boca. Eu quase digo as palavras.
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Ryan pensa assim.


Mas eu já sei qual será a resposta dele.
Ryan está errado pra caralho.
É ele? Fui chamada de prostituta minha vida inteira. Por minhas
ações - pelo que eu tinha que fazer. Por ser bonita e vestir roupas que
valorizam meu corpo. Homens sussurraram em meus ouvidos inúmeras
vezes que, se eu não parecesse tão sexy de pijama, eles teriam resistido a
mim. É porque sou tão linda que os homens simplesmente não
conseguem resistir a mim.
E isso foi quando eu era uma garotinha.
Ontem, eu vesti algo sexy. E os homens olhavam para mim. Isso
irritou Ryan.
— Eu não acredito nisso.
Mako se vira para mim ainda mais. O banco protesta sob seu peso, e
fico um pouco nervosa com a possibilidade de desabar.
— Você não deveria ser punida por mostrar ao mundo que você é
linda. Aqueles homens estavam errados por sexualizar uma garotinha.
Isso é doentio, River. Está tudo bem se um homem olhar para você -
como uma mulher adulta - e achar você atraente, mas isso não está tudo
bem se esse homem presumir que isso lhe dá o direito de deixá-la
desconfortável de alguma forma. Seja pela forma como ele olha para
você, fala com você ou toca em você. Se você quer sair de casa com a
coisa mais sexy que possui, então está certo, porque é sua escolha exibir
seu corpo. Não dê a nenhum homem o poder de controlar o que você faz
com ele.
— É meu. – eu sussurro.
— É seu. – ele repete. — De mais ninguém.
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Cravo meus dentes em meu lábio inferior. Eu nunca tive um


homem me dando uma escolha. Sempre foi pegue, pegue, pegue.
Mas a ideia de Mako possuir meu corpo... Deus, acho que estou
tendo um ataque cardíaco. É muito pecaminoso. O calor líquido corre
pelo meu sistema e direto para o meu núcleo. Eu aperto minhas coxas
para diminuir a sensação, mas serve apenas para apertar meus mamilos
em pequenas pontas afiadas.
— E se... e se eu quiser que um homem seja meu dono?
Ele se inclina mais perto, e o seu cheiro atinge meu nariz. Puro
masculino com um toque de sabonete. Meus olhos querem revirar, mas
eu não deixo. Eu estou no controle do meu corpo, não ele.
— Então dê esse privilégio a um homem que merece isso. Se você
quer que um homem seja seu dono, então deixe-o. Mas isso não é algo
que ele tenha direito sem o seu consentimento. – ele diz, com sua voz
tão, tão grossa e rouca.
Lambendo meus lábios, sinto-me compelida a perguntar. — Você
quer possuir uma mulher?
Minha própria voz está perigosamente rouca. Minha respiração
diminui. Brava demais. Meu corpo está muito quente, superaquecendo
até ter certeza de que há fumaça saindo da minha boca.
— A única maneira de querer possuir uma mulher é possuindo seu
prazer. Eu quero que seu corpo cante para mim - uma música que só eu
posso ouvir. Quero que seu corpo gravite em direção ao meu como uma
mariposa em uma chama. E eu quero que ela comece a não gostar da
sensação de estar tão vazia quando meu pau não está dentro dela.
É demais. Muito rápido. Eu quero fazer o oposto de negar-lhe. Eu
quero ceder, dar, oferecer. Até que suas mãos estejam cheias de mim e
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meu corpo esteja cheio dele.


Eu preciso ir embora.
— Eu tenho que ir agora.
Sempre ouvi dizer que quando um fantasma está por perto, você
sente um frio incompreensível tão forte que penetra em seus ossos. E
quando um passa por você, é como inalar gelo.
A casa está silenciosa.
Deve haver espíritos brincando de se fantasiar com meu corpo.
Eu sei que ele está aqui.
— Ryan? – eu chamo.
Qual é o ponto em chamá-lo? A expectativa está me matando. A
adrenalina bate forte dentro de mim, e tenho vergonha de admitir que
minhas mãos estão tremendo um pouco. Bilby me cumprimenta de seu
poleiro no sofá, miando baixinho, seguido por um bocejo. Eu me
aproximo, acariciando seu pelo cinza e tentando o meu melhor para me
distrair do confronto iminente.
— Bem aqui. – ele diz em voz baixa. Eu pulo, fazendo Bilby pular e
sair correndo do sofá. Minha distração funcionou muito bem - eu não
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esperava que a voz dele viesse atrás de mim. Eu me viro e o vejo parado
no hall de entrada.
Estou assustada demais para dizer qualquer coisa. Ele dá um passo à
frente e eu manco para trás. Meu quadril ainda dói.
— Onde você esteve? – ele pergunta sombriamente.
— Sai com Amelia. – Ele levanta uma sobrancelha.
— Então por que Amelia disse que não vê você há uma semana?
Ele falou com ela? Porra.
Outro passo em minha direção. — Você está me traindo?
Balanço minha cabeça, com o meu coração disparado. — Não, claro
que não.
— Então por que diabos está mentindo para mim? – ele resmunga
por entre os dentes, com o olhar em seu rosto começando a parecer cada
vez mais com o de um demônio.
— Não sei. Porque estou brava com você.
Seus olhos se arregalam de surpresa por meio segundo antes de se
estreitarem em fendas finas. Uma risada irônica escapa por entre seus
dentes.
— Brava comigo? Eu não fiz nada além de cuidar de você em todo
esse relacionamento. Você tem tudo o que poderia pedir. Eu te amei e
cuidei de você. Só tratei você como você merecia. Se eu tive que te
ensinar uma lição quando você saiu da linha, então não é minha culpa. –
ele cospe. Literalmente também. A saliva sai voando de sua boca
conforme sua raiva aumenta.
— Eu não tenho livre arbítrio, Ryan?
Ele recua. — O que?
— Não preciso da sua permissão para viver minha vida. Se eu
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quiser comprar um donut e dar uma volta no parque, então estou


autorizada a fazer isso.
Sua mão se move tão rapidamente que nem vejo isso chegando. A
dor aguda surge em minha bochecha. Eu grito, mantendo a mão na
minha bochecha dolorida. Eu nem sei por que estou chocada. A raiva
enche meu corpo com tanta força que estou convencida de que meu
sangue evaporou em fios de fumaça.
Eu me saio melhor. Meu punho levanta e colide com seu rosto. Sua
cabeça vira para o lado por causa da força e imediatamente a dor se
espalha por toda a minha mão. Parece que eu a quebrei.
Nós dois paralisamos. Acho que sou mais parecida com minha mãe
do que pensava. Aquela garota do clube volta correndo. A garota
destemida que costumava dançar com homens nojentos e quebrar seus
narizes quando ficavam muito espaçosos. A garota que se recusava a
aceitar merda de qualquer homem.
Para onde ela foi?
A única coisa que se move são nossos peitos fortemente oscilantes.
Lentamente, ele olha para mim. Várias emoções passam por seus olhos.
Choque e fúria são proeminentes, mas há outra emoção que não consigo
identificar.
— Porque você fez isso? – ele pergunta sombriamente.
— Porque você mereceu. – eu respiro, me sentindo um pouco
revigorada.
— Você se sente melhor?
— Só se isso significar que você vai parar de colocar suas mãos em
mim. Você deveria me fazer sentir bem, não me machucar.
Ele lambe o lábio inferior, com aquela emoção sem nome vindo à
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tona. Quase parece calculista, mas não tenho certeza. E para minha
surpresa, ele acena com a cabeça.
— Sinto muito. – ele diz.
Preciso de um dicionário de sinônimos. Quantas palavras existem
para a palavra surpresa? Sinto cada uma delas como se cada sinônimo
fosse uma emoção diferente.
— Você... você sente muito? – pergunto, com minha testa se
juntando em um profundo V. Montanha-russa. Essa é a melhor palavra
para descrever como me sinto.
Ele balança a cabeça e toca a mão na bochecha. — Sim. – ele
sussurra. — Sinto muito. Você não merecia nada disso.
Estreito os olhos, cética em relação ao comportamento dele. Todo
seu rosto se transforma. Com os seus olhos suavizando e o seu rosto
relaxando. Ele parece genuinamente arrependido. Apesar de meus
melhores esforços, sinto que estou amolecendo também.
— Então por que você fez isso?
A vergonha ofusca seus olhos quando ele olha na minha direção. —
Eu fico tão preocupado com você. Tantos homens se aproveitaram de
você e estou com medo de que alguém apareça e tente fazer isso. Não
posso protegê-la se não souber onde você está, River. Não posso manter
os monstros afastados se você mostrar a eles o que eles podem tirar de
você.
Eu mordo meu lábio e me sinto um pouco envergonhada.
— Eu... eu posso te dizer aonde vou, e não vou me vestir de forma
tão provocante. Mas eu preciso que você pare de me bater.
Ele vem até mim com pressa, mas não com raiva desta vez. Desta
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vez, não há nada além de amor em seus olhos. Ele envolve seus braços
fortes em volta de mim com força e me traz para perto, nariz com nariz.
— Eu sinto muito, baby. Eu não deveria ter feito nada disso. Eu não
vou mais bater em você. Fico tão frustrado porque você não entende
como os homens pensam, e eu entendo. Eu só preciso que você me ouça,
ok? Preciso saber onde você está e o que está fazendo. E preciso ter
certeza de que seu corpo está devidamente coberto para que os homens
não tentem roubá-la.
Concordo com a cabeça, e nós dois relaxamos nos braços um do
outro.
Mako estava errado. Ryan não quer ser dono do meu corpo. Ele só
quer me proteger. Manter-me segura.
E ninguém nunca fez isso por mim antes.
— Eu notei o espelho. – ele diz calmamente. Eu enrijeço antes de
me afastar.
— Ryan, eu estou tão, tão triste...
— Shh. – ele sussurra, me interrompendo. Ele agarra a parte de trás
da minha cabeça e me puxa de volta para ele. — Tudo bem. Eu entendo.
Eu já mandei alguém vir e substituí-lo.
A emoção cresce dentro do meu peito. Ou seja, alívio. Não queria
que ele me batesse de novo porque quebrei o espelho dele. Eu mordo
meu lábio. — Tem certeza de que não está bravo?
— Não, baby, eu não estou bravo. Eu te amo tanto, River. – ele diz,
pressionando sua testa contra a minha. — Não posso te perder. Eu não
posso viver sem você.
Lágrimas ardem em meus olhos. Não de tristeza, mas de felicidade.
Eu me sinto no topo do mundo agora. Sinto que finalmente estamos nos
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movendo na direção que precisamos. Parece que estamos nos curando.


— Eu também te amo.
— Deixe-me fazer você se sentir bem. – ele sussurra em meu
ouvido, mordendo minha orelha. Arrepios percorrem minha espinha.
Estou balançando a cabeça antes mesmo de perceber.
Seus lábios tocam os meus em um beijo suave. É doce e
reconfortante. Lentamente, ele aumenta a pressão até que fique faminto.
Ele me pega em seus braços e me carrega até nosso quarto, nunca
deixando seus lábios se afastarem dos meus.
No segundo em que meus pés tocam o piso frio de madeira ao lado
de nossa cama, ele está tirando minhas roupas do meu corpo. Beijos
quentes vão dos meus lábios até o meu pescoço. Eles param em meu
peito e um calor úmido envolve meu mamilo.
Minha cabeça cai para trás enquanto o prazer toma conta de mim.
Isso aqui, é o que me faz sentir amada.
Eu posso me acostumar com isso.

— Acho que posso estar grávida.


Eu engasgo com meu café gelado, inalando um pouco pelo nariz
enquanto o resto sai voando pela minha boca em um arco perfeito.
Ainda bem que a aula acabou e estamos caminhando em direção ao
carro dela. Se estivéssemos no refeitório, eu a mataria.
— Uau. Isso foi nojento.
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Eu rio, parcialmente por descrença. Eu limpo minha boca e nariz


com a mão, tentando limpar o melhor que posso. Ótimo, agora vou ficar
grudenta.
— Isso foi sua culpa. Você está brincando comigo?
— Não. – Amelia suspira cansada.
— Por que você acha que está grávida?
Ela encolhe os ombros. — Porque tenho estado com muito tesão
ultimamente.
Olho para ela incrédula. — É isso? Você está com tesão?
— Não, eu também vomitei com o cheiro de bacon. Duas vezes.
— Ah meu Deus, você definitivamente está grávida. Ninguém
vomita com o cheiro de bacon.
— É? – ela diz, com os olhos arregalados.
— Você está feliz?
— Você está brincando comigo? Estou apavorada, porra.
Eu rio e a puxo para um abraço apertado. — Bem, estou feliz por
você, querida. Você vai ser uma mãe incrível.
Estou muito feliz por ela. Talvez um dia seja Ryan e eu tendo um
bebê também. Nossos bebês podem ser melhores amigos.
Ela sorri e me abraça também. — Obrigada. Mas não posso fazer
isso sem você, ok? Provavelmente vou chorar muito. Eu já chorei
quando assisti a um daqueles shows de competição de dança. Chorei
como um maldito bebê.
Eu rio e a solto. — Acho que sempre choro durante esses shows.
Eles são tão bons que a única coisa que posso fazer é chorar.
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Ela relaxa em alívio. — Ah, que bom, estou feliz por não ser a
única. Eu só ia usar a gravidez como minha desculpa.
— Sim, eu costumo usar minha menstruação como desculpa, tudo
bem.
Nós rimos o resto da caminhada até o carro dela. Ela já está
inventando nomes loucos para bebês como Júpiter e Italea, que
pronuncia-se I-tall-ee-ah.
Eu me pergunto como Ryan gostaria de nomear nossos filhos.

— Você parece melhor.


Por que meu corpo derrete toda vez que ouço a porra da voz dele?
Não quero que meu corpo derreta. Eu quero que ele se transforme em
pedra sólida e não derretido. Ouvir sua voz é como injetar heroína. Mas
só porque a heroína faz bem, não significa que não seja capaz de te
matar. Mako é ruim para mim. Ele é como a Alison, outro rostinho
bonito enfiando o nariz onde não deveria e tentando sabotar o meu
relacionamento. Por alguma razão, eles não suportam ver Ryan feliz.
Mako fica lá como um deus, vestido de calça preta novamente com
uma camisa verde salva que faz seus olhos destacarem.
Ele precisa ir embora.
— Você pode parar de me perseguir?
Uma sobrancelha se levanta com o meu tom áspero. Eu não me
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importo, no entanto. Por um instante, quase acreditei nele. Lamento


cada momento da biblioteca. Falando com ele, contando a ele todos os
meus segredos sujos sobre minha vida passada. Coisas que Ryan ainda
nem sabe.
Isso foi há três semanas, e isso me faz sentir suja. Como se tivesse
traído. De certo modo, suponho que sim. Ainda não confessei a Ryan
sobre aquele dia e nunca farei isso. Isso será algo que levarei comigo
para o túmulo.
Especialmente porque seria ele quem me mandaria para lá se
descobrisse.
E estou feliz por não ter dito nada, ou aquela noite poderia ter sido
diferente. Ryan fez amor comigo e me mimou a noite toda. Não pedi
nada em troca, embora estivesse mais do que feliz em retribuir o favor
de qualquer maneira. E desde então, temos sido perfeitos.
Voltamos para casa um com o outro em alto astral, rimos e
brincamos, tivemos noites de cinema em casa onde demos pipoca um ao
outro e terminamos em guerra de travesseiros e fazendo amor. Ele me
mimou, me abraçou, me preparou banhos à luz de velas e expressou seus
sentimentos vulneráveis em relação a mim. Nós dois nos abrimos mais
um para o outro, e ele realmente ouviu quando contei a ele sobre
Shallow Hill e os homens de lá. Sem julgamento, apenas simpatia e
compreensão.
Ele é um homem totalmente novo, e eu nunca estive tão apaixonada.
— Eu quero que você me deixe em paz. – eu continuo. — Apesar
do que você acha que sabe sobre mim, estou feliz com Ryan.
Mako franze os lábios e algo parecido com desapontamento brilha
em seus olhos. Acabou antes que eu possa ter certeza.
— Ele sussurrou palavras doces para você a noite toda e prometeu
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nunca mais te machucar?


Eu me irrito com suas palavras condescendentes. Uma raiva visceral
está vibrando através de mim novamente. Alguém não deveria ser capaz
de me deixar com tanta raiva tão rapidamente. Claramente, isso é um
sinal. Como eu poderia pensar em ouvir alguém que não faz nada além
de me irritar? Mako não tem minha mais alta estima, ele só se preocupa
em se satisfazer. Como fazer tudo ao seu alcance para garantir que Ryan
esteja sofrendo.
— Você não sabe nada. – eu murmuro, com meus olhos queimando
com ódio indisfarçável.
— Sei mais do que ele. – Eu estremeço, com os meus olhos se
arregalando em choque.
— Você acabou de jogar tudo o que eu disse na minha cara?
— Não. Estou apenas afirmando fatos. – ele responde secamente.
Seu rosto é uma máscara inexpressiva. Nenhuma emoção surge através
de seus olhos.
Eu dou um passo em direção a ele. — A única coisa que importa é
se vingar de Ryan. Não sei o que diabos ele já fez para merecer seu ódio,
mas não traga essa merda para a minha porta. Eu não me importo com o
que você pensa que sabe, você está errado.
Mako apenas olha, com algo semelhante a choque surgindo em seu
rosto.
— Foi isso que ele te disse? Que eu o odeio?
Eu levanto a mão, interrompendo qualquer outra coisa que ele tenha
a dizer. — Não tenho mais nada para falar com você. Deixe-me em paz,
Mako. Ou direi a Ryan que você está me seguindo. – eu ameaço.
Ele ri. Realmente dá risada.
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— Eu não me importaria se você dissesse. – diz ele com um


sorriso. Seu rosto irradia com uma diversão fria e impiedosa com a
ameaça. Isso me faz sentir fria.
Eu vou embora. Não adianta responder. Ele entendeu a mensagem
alta e muito clara.
— Vejo que você ainda é uma maldita drogada. – eu observo
secamente.
Barbie resmunga diante de mim, com o seu cabelo preto oleoso
preso. Ela tem um cheiro horrível pra caralho. Como uma mancha de
merda e leite vencido.
— Vá se foder, River.
— Já tem o aluguel? – eu pergunto no lugar de uma resposta
inteligente.
Seja superior, River. Embora pudesse entrar com roupas velhas de
cinco dias e sem tomar banho por mais tempo ainda, eu ainda realizaria
essa pequena façanha.
Ela enfia a mão no bolso de sua calça de moletom manchada e cheia
de buracos e bate com raiva notas sujas amassadas na mesa. Sua mão
pega uma seringa. Ela levanta, balança no ar e coloca de volta na mesa.
O som me permite saber que rolou da mesa e caiu no chão. Ela não se
incomoda em pegá-la.
E é por isso que nunca vou andar descalça por esta casa.
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Ou tocar naquela porra de mesa.


Ainda bem que vim preparada. Tiro uma luva de borracha do bolso,
coloco-a e pego as notas. Coloco-as em um saquinho plástico Ziploc.
— Você está brincando comigo? Pare de agir como se não fosse de
onde você vem, sua vadia pretensiosa. – ela diz. Seus olhos estão
dilatados e ela não consegue parar de ranger a mandíbula. Eu nem estou
insultada. Como posso estar quando ela está onde está e eu estou onde
estou?
Suas palavras não me machucam há muito tempo.
— Como não contraí uma DST está além da minha compreensão, e
não estou prestes a testar essa sorte.
Não me incomodo em contar as notas. Todas elas estarão lá. Elas
sempre estão quando faço minhas ameaças. Ela sai para encontrar uma
saída, e volta correndo para casa com o bolso cheio de dinheiro sujo.
A porta da frente bate ruidosamente contra a parede. Alguém
acabou de entrar como se fosse o dono da casa.
E só há uma pessoa que ousaria.
Billy.
Barbie e eu paralisamos no lugar e, por um breve momento, nós
compartilhamos uma conexão de terror mútuo. Barbie engole
visivelmente, e eu tento o meu melhor para relaxar meus ombros.
Se Billy decidir que quer mais de mim, não poderei esconder suas
marcas. Ryan nunca vai me perdoar. Ele me deixaria em um piscar de
olhos se visse os hematomas de outro homem em meu corpo. E ele
provavelmente criará mais se descobrir que outro homem esteve dentro
do meu corpo.
Merda.
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Meus ossos tremem e um suor frio surge na minha nuca quando


Billy entra na cozinha. Barbie se vira para cumprimentá-lo, com um
sorriso falso estampado em seu rosto decrépito.
Ele está impecavelmente vestido, como sempre. Cabelo loiro liso e
grisalho, olhos castanhos astutos e uma mandíbula forte. Ele costumava
ser bonito em sua juventude. Na época, ele era um jovem integrante de
gangue, nascido e criado no subúrbio, como a Barbie, mas com mulheres
caindo aos seus pés. Até que ele teve um confronto com um bandido, e
eles cortaram seu rosto.
Essas cicatrizes cruzando seu nariz, olhos e boca o fazem parecer
totalmente assustador. E o olhar sombrio e vazio em seus olhos
certamente não ajuda em nada. Billy é o tipo de homem que você vê nas
ruas e instantaneamente vira para andar na direção oposta. Ele é
incrivelmente intimidador, com um brilho psicótico permanente em seus
olhos que avisa a qualquer transeunte que ele envolveria suas mãos
enormes em volta do seu crânio e o esmagaria até estourar. E desfrutou
disso também.
Agora ele dirige um império de drogas e é podre de rico. O dinheiro
em sua carteira está coberto de sangue e lágrimas de todas as pessoas
que ele matou para obtê-lo.
— Ah, oi, docinho. – Barbie diz, bem alto, devo acrescentar. Seu
nervosismo é palpável. A qualquer momento, ela vai ter má experiência
e não há uma célula em meu corpo que se sinta mal por ela. — Eu não
sabia que você viria hoje.
— Desde quando sou obrigado a anunciar minha chegada? – ele
pergunta, com sua voz desprovida de emoção. Eu vi Billy em todos os
tipos de diferentes estados de emoção, mas o conheço minha vida
inteira, estive perto dele mais do que meus pesadelos são capazes de
acompanhar. É preciso muito para fazê-lo sair de seu estado calmo e
estranhamente quieto.
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Engulo em seco e encontro seus olhos assustadores. As piscinas


escuras encontraram as minhas desde o momento em que ele pisou na
cozinha. Elas não se desviaram uma vez.
Ela ri, com outro som nervoso. — Você tem razão.
Silêncio. Cheio de suas expectativas e promessas sombrias.
— Oi, Billy. – eu cumprimento finalmente, com minha própria voz
mais suave do que eu gostaria. Me envergonha que ele ainda tenha esse
efeito sobre mim. Eu adoraria nada mais do que dizer a ele para ir se
foder e deixá-lo saber que ele não me assusta. Mas minha alma também
está muito apegada ao seu receptáculo.
Ele caminha lentamente até mim, com os seus sapatos engraxados
pisando no chão imundo. O contraste entre os dois quase não faz sentido
em meu cérebro. A imagem parece tremendamente fora do lugar.
Sapatos tão bonitos não deveriam estar andando em um chão tão
nojento.
Estou me concentrando em seus sapatos para não ter que pensar por
que ele está vindo em minha direção. Estou pensando em como há
gosma endurecida nas rachaduras dos ladrilhos, em vez de como ele
parou na minha frente e esperou que eu levantasse os olhos.
Estou pensando em como eu estou prestes a perder o meu
relacionamento esta noite, e talvez até a minha vida.
Ele estende a mão para mim e eu me esforço para não recuar.
Lentamente, seu dedo pega meu queixo, causando arrepios na minha
espinha. Barbie se mexe na minha periférica, nervosa. Isso me deixa
nervosa.
Meu queixo se ergue. Nossos olhos se encontram. A raiva está
infundida em seus olhos. Minha respiração me escapa.
— Você é um fantasma. – ele diz suavemente.
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Minha boca seca e luto para engolir.


— Você nasceu e cresceu aqui. Você foi uma de nós, uma vez. E
agora age como se fosse boa demais para nós. – Apesar dos meus
melhores esforços, meu lábio treme. Deus, ele treme.
Seus dedos apertam minha mandíbula, e tudo que posso fazer é
sussurrar suplicante: — Billy...
— Fantasma. – ele sussurra.
Meu rosto bate na mesa antes que eu possa me preparar.
A dor surge no lado da minha cabeça. O único lado positivo é que
meu rosto estava virado o suficiente para não quebrar meu nariz.
Tanto para não tocar na porra da mesa.
Mantendo minha cabeça presa à mesa, ele se inclina para mais
perto. A superfície implacável faz meus olhos se arregalarem com dor
indisfarçável. Lágrimas ardem em meus olhos e ameaçam escorrer. Não
quero mostrar fraqueza. Eu não quero, mas Billy tem um jeito especial
de arrancar isso de você de qualquer maneira.
Barbie recua alguns passos, com inquietação estampada em suas
rugas.
— Onde você esteve? – ele sussurra, com o seu tom enganosamente
calmo. Há uma tocha acesa dentro de sua corrente sanguínea. Billy está
furioso.
A raiva surge dentro de mim. Eu saí desse maldito buraco do
inferno. Por que diabos eu volto? Por que comprei esta casa estúpida e
por que continuo a mantê-la com minha mãe? Por vingança? Eu estava
mentindo para Mako e para mim mesma quando disse isso.
Shallow Hill está enraizada em meus ossos, e os ossos não
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sobreviveriam sem a medula.


— O inferno não é um lar, Billy. – eu resmungo. — Isso é apenas
um lugar que venho visitar.
— É um lar. – ele grita, com sua voz ecoando enquanto as rédeas de
seu temperamento começam a vacilar. — Você está manchada, River.
Este lugar é uma mancha em nossa alma e nunca mais sairá.
Estou ofegante agora. Em parte por medo, em parte por raiva. Não é
inteligente responder a Billy.
— Você tentou? – eu desafio, apertando meus olhos fechados de dor
quando ele pressiona minha cabeça ainda mais para baixo. Tanto que eu
quero gritar. Estou caindo no precipício de abandonar meu orgulho e
dignidade.
Eu não quero mostrar fraqueza. Eu não quero.
— Sim. – ele murmura pensativo. — E então percebi que estava
apenas mentindo para mim mesmo. A farsa que tentei viver era uma
fachada. Assim como a sua.
Finalmente, Deus, finalmente, ele me liberta. Eu me afasto da mesa
o mais rápido que posso, derrubando minha cadeira no processo, que se
dane a dignidade. A cadeira bate no ladrilho insuportavelmente, com o
som alto imitando o meu e o medo da Barbie.
Barbie está viajando. Literalmente. Ela está chapada, com Deus
sabe o quê, e o medo está mexendo com ela. Pupilas arregaladas e
dilatadas movem entre mim e Billy. Sua respiração é alta e suas mãos
tremem. Logo ela começará a arranhar sua própria pele, desesperada
para sair de seu próprio corpo. O medo é potente e inevitável.
Não presumo que seja por minha causa. Ela só está com medo de
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que ele volte sua raiva para ela quando terminar comigo.
E ele vai.
Ele absolutamente fará isso.
Não posso ir para casa assim. Para enfatizar meu argumento, o
nome de Ryan surge na tela quebrada do meu celular. As pequenas
rachaduras percorrem seu nome com um emoji de coração no final.
É simbólico, e eu quero jogar a porra do celular.
Pressiono o botão de volume na lateral do meu celular.
Instantaneamente, o som estridente silencia. Ele vai ligar de novo.
Silencio o celular completamente para não ter que ouvir mais a desgraça
do meu relacionamento.
Estou suja de novo. Contaminada. Suja. Manchada.
Billy me contou o quanto sentiu a minha falta bem na frente da
Barbie. Ela assistiu com medo e resignação em seus olhos. Mais uma
vez, não por mim, mas por ela. Graças a Deus ele usou camisinha. Billy
não quer um mini correndo por aí, com certeza.
Após ter batido mim, ele se virou para Barbie e fez amor com ela.
Deitou-a no chão da cozinha e a fodeu gentilmente. Isso foi um aviso.
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Seja uma boa putinha de Shallow Hill e não será brutalmente


estuprada e espancada. Você apenas será estuprada gentilmente. Na
cabeça de Billy, essa é a melhor opção.
Do jeito que me sinto, também estou pensando assim.
Nós dois sabíamos que a Barbie conseguiria mais tarde. Billy estava
apenas dando a ela a ilusão de segurança. Barbie era inteligente o
suficiente para saber disso, no entanto. Nem por um segundo ela
relaxou, embora fingisse que estava gostando do pau de Billy dentro
dela independentemente. Se você esnobar Billy assim, ele vai roubar
aquele raro momento de ternura e bater em você até que você precise de
aparelhos. Eu já tinha ouvido gritos de dor enquanto me arrastava para
sair de casa e entrar no meu carro.
Eu paguei a ela a mesma cortesia que ela me pagou e fui embora.
Ou melhor, fugi. Definitivamente tive uma concussão e tudo parece
quebrado. Ele quebrou meu dedo mindinho quando bateu minhas mãos
na porta do freezer e a segurou lá enquanto me pegava por trás, disso
tenho certeza.
Mas é difícil distinguir os seus ferimentos quando tudo parece
quebrado.
De alguma forma, consigo sair de Shallow Hill, mas ainda estou a
uns bons dez minutos de casa.
Uma casa que você não pode ir, River. Que lembrete deprimente é
esse.
Tudo porque não posso simplesmente ficar longe. A culpa é minha.
É minha culpa eu estar naquela casa. É minha culpa eu estar lá
quando Billy apareceu. É minha culpa que ele me espancou e depois me
estuprou também.
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Eu me coloquei nessa situação, então a culpa é minha.


Porra.
Desleixadamente, eu limpo o sangue do meu lábio. Pela última vez,
desvio para o outro lado da rua. Neste ponto, sou uma ameaça absoluta
para a sociedade. Estou basicamente dirigindo inebriada agora e posso
machucar alguém.
Sei que o sofrimento adora companhia, mas sempre fui muito íntima
da vida solitária.
Eu paro o carro em um bairro pitoresco. Classe média. Belas casas
com quintais cuidados, mas nada exagerado e excessivo. O tipo de
bairro onde é seguro estacionar na calçada e não ter que se preocupar em
ser assaltada.
Eu adoraria morar em uma casa dessas. A casa de Ryan
definitivamente se enquadra na categoria "exagerada". Mas cresci com
nada, então não me importo com as coisas simples.
Você não dá valor a algo, não tem nada a que se agarrar. Você dá
muito valor a isso e tem tudo a perder. Já cometi esse erro porque agora
parece que perdi tudo.

Uma batida forte me acorda. Grande erro.


— Filho da pu... que porra é essa? – eu xingo.
Dor. Muita dor. Sou forçada a engolir o choro, caso contrário, nunca
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vai parar. Sinto meus ossos quebrados, meus pulmões esmagados e


minha cabeça girando. Outra batida mais urgente soa novamente perto
da minha cabeça.
Se eu fosse capaz de levantar os braços, agarraria minha cabeça com
o som ressoando em meu crânio. Tenho certeza de que há uma britadeira
perfurando minha cabeça ou... algo assim. Eu gemo e inclino minha
cabeça para olhar pela janela do motorista. Tudo o que posso ver é a
imagem embaçada de uma figura escura agachada, olhando através do
vidro com as mãos em concha ao redor dos olhos. Seria assustador se eu
não fosse tão desmiolada.
Eu desmaiei. Isso não é bom. Especialmente quando tenho uma
concussão. Um ruído de puxar segue a batida.
Ótimo. Agora alguém está tentando arrombar meu carro. Enquanto
estou nele, ainda por cima. Levo um momento para lembrar onde estou.
Ah, sim, aquele bairro enganosamente fofo. Acho que tinha que me
preocupar com assaltos, afinal. Talvez eu apenas os deixe. Na melhor
das hipóteses, eles vão me matar. Na pior das hipóteses, irão embora
com meu carro e me deixarão morrer lentamente.
Uma voz abafada segue em seguida. Parece que a pessoa está
dizendo meu nome?
— River!
Sim, esse era o meu nome. E eles estão gritando isso. Eu estou
delirando.
Porra. Eu destranco a porta. Se eu morrer, eles estariam me fazendo
um favor. Um fodido grande favor.
A porta se abre e mãos gentis agarram meus ombros. Eu gemo,
tentando inutilmente levantar minhas mãos para tirar suas mãos de mim.
É inútil.
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— River, o que diabos aconteceu?


Aquela voz. Ah, de novo não.
— Vá embora. – eu murmuro. Outra tentativa inútil.
Meu cinto de segurança se solta e desliza sobre meu peito. Mako
tem que se esforçar para tirar meu braço do cinto. O barulho do metal
batendo na lateral do carro dói. Gentilmente, ele me pega e eu estou no
ar. Apenas um segundo depois, estou envolta em braços quentes. Braços
quentes e calorosos.
Estou consciente o suficiente para saber que não deveria me aninhar
mais nesses braços, mas faço mesmo assim. Encontrarei tempo para me
arrepender mais tarde, quando não estiver à beira da morte.

Não estou mais em braços quentes, mas em uma cama de hospital.


Ryan e seus pais sentam-se ao meu lado. Mako do outro. Acordei apenas
um minuto atrás com uma luz brilhante e rostos solenes olhando para
mim. No momento em que vi a Julie e o Matt me observando com
preocupação estampada em seus rostos, quase pulei da cama e corri. E
Mako estar aqui só me dá vontade de vomitar. Por que ele não poderia
simplesmente ter ido embora? Outra coisa que Ryan não vai gostar:
Mako me encontrando. Vai parecer que eu o procurei de alguma forma.
A tensão no quarto é suficiente para terminar o trabalho e me matar
por asfixia.
— O que aconteceu? – murmuro. Minha garganta está
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incrivelmente seca. Queima para falar, quanto mais respirar.


— Você foi atacada. – Ryan responde, com sua mão cobrindo a
minha. Seu toque parece frio, mas sua voz é calorosa e preocupada.
Atacada? Demora alguns segundos, mas os eventos de... ontem à
noite? - quando fosse - volta correndo com força total.
Billy. Eu estava em Shallow Hill cobrando aluguel da Barbie e ele
apareceu. Já faz um tempo desde que Billy me venceu até este ponto.
Não posso dizer que nunca estive nessa situação antes, mas naquela
época, minha cama de hospital era minha cama de solteiro em casa.
Minha enfermeira era... bem, eu mesma.
As dores são familiares, mas porra, ainda é um choque para o
sistema.
Virando a cabeça, olho nos olhos de Ryan, franzidos nos cantos com
angústia. Escondido abaixo está uma escuridão girando em suas piscinas
azuis opacas.
Não tenho ideia se é para mim ou para Billy.
— Ah, querida, como está se sentindo? Vou chama a enfermeira. –
diz Julie. Ela se levanta e aperta o botão vermelho para chamar a
enfermeira. Sinalizo fracamente em direção à água. Julie corre em
direção a ela antes que Ryan possa alcançá-la.
Não que ele tentasse, de qualquer maneira.
Ela segura um canudo no meu lábio machucado e me manda beber
devagar. A princípio queima forte, mas depois de alguns goles diminui
até que a água fria se torna um bálsamo para minha garganta.
A enfermeira aparece alguns minutos depois. Eu recebo um
bombardeio de perguntas que mal tenho energia para responder. Sua voz
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é excessivamente doce e irrita meus nervos. Tento ser civilizada - ela


tem que lidar com muitas pessoas em um dia. A enfermeira está
verificando os meus sinais vitais quando o médico aparece.
Ele é mais jovem, tem apenas trinta anos, cabelo espetado e um
sorriso matador. Até tem um queixo com covinhas. Ele é bonito. Não sei
por que essa é a primeira coisa em que me apego.
Talvez porque eu não queira ouvir o que ele tem a dizer.
— Olá, River. Meu nome é Dr. Forrestt. – ele diz, sorrindo para
mim gentilmente. Ele tem lindos olhos azuis. Mais bonito que o de
Ryan.
— Examinei o seu prontuário e a boa notícia é que você vai se
recuperar. Você sofreu uma concussão bastante grave, junto com duas
costelas quebradas e um mindinho quebrado. Fora isso, está gravemente
machucada. Sem sangramento interno e sem outros ossos quebrados. Eu
quero mantê-la mais uma ou duas noites para monitorar sua concussão,
então você deve estar livre para ir para casa.
Dou a ele um fraco sinal de positivo, sem realmente me importar
com o dano. São lesões que já sofri. Provavelmente também não será a
última vez.
Ele me dá um olhar sério. — River, devido ao estado em que
encontramos suas roupas e as escoriações em seu corpo, eu tenho que
perguntar. Você gostaria que fizéssemos um exame de estupro?
O sangue desaparece do meu rosto. — Não. – eu sussurro.
— Por que diabos não? – Ryan grita ao meu lado, olhando para mim
como se eu tivesse três cabeças.
— Porque ela disse não. – Mako intervém, olhando para Ryan com
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raiva. Eu não gosto de Mako me defendendo – isso faz minhas


entranhas parecerem estranhas e apenas irrita mais Ryan.
O médico acena com a cabeça de qualquer maneira, sem forçar o
assunto, enquanto Ryan divide seu olhar entre Mako e eu. Há acusação
em seus olhos, suposições se formando em sua cabeça em alta
velocidade. Tenho certeza de que ele pensa que o trai com Mako de
alguma forma. Talvez ele até pense que foi Mako quem fez isso comigo.
Mako me encontrar foi pura e infeliz coincidência. Eu teria preferido
que o próprio diabo me encontrasse.
— River, nós denunciamos isso à polícia. Alguns policiais estão
aqui e querem falar com você. Tudo bem? – Julie pergunta baixinho. O
rosto dela. Essa é a verdadeira preocupação. Aprecio isso, mas realmente
gostaria que ela não tivesse ligado para eles. Sei que seria a coisa óbvia
a se fazer em famílias normais, mas eu não sou assim. Não venho de
uma família funcional que se preocupa uns com os outros.
Eu forço um sorriso e aceno. Ela vai chamá-los.
— Não se preocupe, River, eles vão descobrir quem fez isso. E
quando o fizerem, vou me certificar de colocá-los em prisão perpétua. –
diz Matt, inclinando-se para frente para dar um tapinha na minha perna
durante. Que doce, mas não vai acontecer.
Quando eles entram, Mako se levanta. Ele obviamente os conhece.
— River, sou o policial Brady e este é o policial Gonzalez. Vejo que
você já conhece o detetive Fitzgerald.
Infelizmente.
O policial que se apresentou é um homem atarracado com uma
careca brilhante e um bigode louro e grosso. Sua cabeça está vermelha
do sol. Ele deveria colocar um pouco de protetor solar.
— Oi. – digo brevemente. O policial Gonzalez dá um passo à
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frente. Ele é atraente, com origem hispânica e olhos cor de chocolate.


Provavelmente estaria interessada nele se vivesse uma vida diferente.
— River, você se lembra de alguma coisa que aconteceu ontem à
noite?
— Com base em onde estou agora, suponho que fui atacada. – Ryan
fica tenso ao meu lado.
— Você sabe quem eles eram?
Um batimento cardíaco passa.
— Não.
— Compreensível, você foi atingida com força na cabeça. – admite
o policial Gonzalez. — Você se lembra onde você estava?
Você sabe, você se lembra, você faz isso, você faz aquilo...
— Shallow Hill.
Os policiais se movem desconfortavelmente. A força policial
geralmente fica longe dessa área. Fica a apenas 25 minutos de onde
moro, mas pode muito bem ser outro estado. Sempre quis me mudar
para fora do estado, mas me apeguei demais à faculdade que estava
cursando e às pessoas nela.
Amelia... Ryan...
Que estupidez, River.
— Por que você estava lá? – Ryan pergunta desta vez.
— Para ver minha mãe. – eu respondo brevemente.
— River, você se lembra de alguma coisa sobre a noite em que foi
atacada? Se houve mais de um. Como eles pareciam. Se eles disseram
alguma coisa? – O policial Gonzalez pergunta, encarando-me com um
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olhar gentil e simpático.


Sua simpatia rebate em mim como uma bola de basquete na quadra.
Recebi simpatia por toda a minha vida por minha situação, mas apenas
uma pessoa se importou o suficiente para me tirar dela, e ela morreu
antes que pudesse. Inúmeros professores e adultos cruzaram meu
caminho, e todos fizeram vista grossa, mesmo quando apareci na escola
suja e coberta de hematomas. Era assim que todas as crianças que
vinham de Shallow Hill se pareciam. Não era nada novo para eles.
Esses policiais não serão muito diferentes. Eles vão fingir que se
importam, fazer perguntas e depois investigar em busca de algumas
pistas. Quando eles não encontrarem nada e todas as pistas esgotarem,
eles abandonarão a fachada e ficarei grata por isso. Porque no minuto
em que esses policiais fizerem as perguntas erradas para as pessoas
erradas, eles desaparecerão sem deixar vestígios.
Por nada.
— Acho que foi só uma pessoa. Mas ele veio por trás de mim. Não
me lembro de nada. – eu respondo roboticamente.
Eles fazem mais algumas perguntas investigativas sem obter muita
resposta de mim.
O policial Brady pigarreia e dá um passo à frente com um cartão na
mão. — Vamos precisar de um depoimento seu quando você sair. Se
você se lembrar de alguma coisa, ligue para nós.
Concordo com a cabeça e pego, e os dois saem. Isso deveria ir para
o lixo, mas por motivos que não consigo citar, eu o guardo. Mako segue
atrás deles, provavelmente para contar o seu lado da história. Tolo
intrometido.
Julie e Matt saem alguns minutos depois, desejando-me melhoras e
prometendo voltar em breve. A preocupação deles aquece meu coração.
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Eu nunca tive uma família antes.


— Ryan! – grito do sofá.
Nenhuma resposta.
Ele mal falou comigo desde que tive alta do hospital, o que foi
ontem. Ele também não gritou comigo nem me questionou. Ele está
apenas... silencioso.
— Ryan! – eu tento de novo.
Estou entalada. Cada músculo do meu corpo está dolorido. Minha
pele está manchada de hematomas por toda parte e ainda não consigo me
mover com facilidade. Parece que um avião caiu direto no meu corpo.
Billy bateu em todo o meu corpo sem sentido. É uma maravilha que eu
não tenha acabado com mais complicações do que algumas costelas
quebradas e pele roxa.
— RYAN! – grito, apesar de minhas costelas protestarem para mim
em troca.
Eu tenho que fazer xixi. Realmente muito.
Tento me sentar, mas a dor é ofuscante. O médico me mandou para
casa com analgésicos, mas eles só aliviam. Rangendo os dentes, consigo
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me sentar. Solto um suspiro áspero antes de me levantar. A tontura


imediatamente me atinge e, antes que eu perceba, estou de volta ao chão
novamente.
Isso me lembra de quando eu era pequena novamente, quando
estava indefesa e não tinha ninguém para me ajudar quando precisava
fazer xixi ou comer. Na maioria dos dias, acabava fazendo xixi até ter
forças para levantar. Também era um bom impedimento para os homens.
Foder uma garotinha não é errado, mas quando ela cheira a mijo? Ah
não, isso é nojento. Prometi a mim mesma que nunca mais voltaria
àqueles dias em que me arruinar e passar dias sem comer era meu estilo
de vida. Agora, aqui estou eu mais uma vez.
— Ryan! – eu tento mais uma vez, com lágrimas frustradas ardendo
meus olhos.
Eu o ouço se movendo lá em cima, e sei que o bastardo pode me
ouvir. Há um lavabo do outro lado da casa, mas com a lentidão com que
me movo, levaria uma eternidade para chegar lá. Ele nem precisa me
carregar até lá; Só preciso de ajuda para me levantar e caminhar até lá.
Dar uma pequena ajuda nunca matou ninguém pelo que sei.
A pressão na minha bexiga aumenta a ponto de eu ter cólicas. É
doloroso, e quando percebo que não vou conseguir chegar ao banheiro,
as lágrimas surgem e caem em rios sobre os olhos.
Pelo menos o sofá é de couro.
— Ryan! – grito mais uma vez. O esforço faz com que minha
bexiga solte. Um soluço sai da minha garganta enquanto perco
completamente toda a dignidade e me mijo no sofá. E quando ele ainda
não responde, sou forçada a deitar nele. Assim como quando eu era
criança.
Promessas, promessas, River. Nem consegue cumprir as suas
promessas.
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O calor é repugnante e, logo, minha pele começa a coçar. Minha


bunda nunca vai esquecer a sensação de assaduras nas áreas mais
sensíveis do meu corpo. Elas eram quase tão horríveis quanto os
próprios ferimentos. Ruim o suficiente para usar meu precioso dinheiro
para comida em creme para assaduras.
Ranho logo se junta às lágrimas salgadas que escorrem pelo meu
rosto. Com raiva, eu limpo, mas as lágrimas e o ranho continuam vindo,
o que me frustra ainda mais.
Estou encharcada o suficiente, não preciso dessa merda.
Depois de mais dez minutos, ouço os passos de Ryan. E eu estou
irritada. A fúria ferve em minhas veias. Estou tremendo de raiva. Como
ele ousa me deixar aqui sozinha, completamente incapacitada? Não é
como se ele tivesse me deixado por um minuto, ele está lá em cima há
mais de uma hora.
Foi ele quem me trouxe aqui, alegando que uma mudança de
cenário ajudaria a me animar. Ele me traz aqui e depois me abandona?
Mas não, eu poderia ter lidado com isso. É o fato de eu ter gritado
várias vezes por ele, e ele ter me ignorado. Ele me ignorou, porra.
Ele dá a volta no sofá e fica paralisado ao ver minha situação. Estou
quase espumando pela boca, mas mantenho minha boca fechada. Quero
ver o que ele faz primeiro.
— Você mijou em todo o meu sofá?
Não pensei que fosse possível ficar com mais raiva, mas aqui
estamos.
— Está falando sério agora? – grito. Eu poderia literalmente matá-
lo. — Eu gritei por você cinco malditas vezes!
Ele olha para a bagunça, com raiva brilhando em seus olhos. Sua
mandíbula contrai e ele vira os olhos para me encarar. — Eu estava
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ocupado. – ele afirma.


— Fazendo o que?!
— Não é da sua conta, porra. – ele grita.
— Não é da minha conta? Sério? O que poderia ser mais importante
do que descer quando sua namorada ferida precisa de você?!
Ele marcha em minha direção e se inclina na minha cara.
— Se você quer agir como uma vadia, então eu vou deixar você se
afogando em seu mijo. – ele ameaça. Eu me esforço para manter minha
boca fechada. Qualquer coisa. — Se alguém tem o direito de ficar
bravo, sou eu. Você foi até a porra da casa daquela vadia e foi atacada.
A culpa é sua, e você mentiu para a polícia sobre quem fez isso. Você
está protegendo as pessoas que a machucaram, então você pode sofrer
com isso.
Sem palavras. Estou absolutamente sem palavras. Eu já havia me
culpado por me colocar naquela situação, mas certamente não pedi por
isso. E eu com certeza não merecia isso.
— Você também recusou um exame de estupro. E você sabe o que
isso me diz, River? – ele não me dá tempo para responder. — Isso me
diz que você fodeu com alguém e não quer ser pega.
Eu empalideço, com meus olhos arregalados com descrença.
— É nisso que você acredita, Ryan? Você acha que eu saí e pedi
alguma coisa disso?
— Então, você admite que fodeu com alguém? – ele grita, com sua
coluna ficando ereta.
— Não! – eu protesto com raiva.
— Então por que não fez o exame de estupro?
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— Porque eu não fui estuprada!


— Como você sabe? Você disse que não se lembra.
— Porque eu seria capaz de saber se alguém me machucasse lá
embaixo!
— Maldita mentirosa! – ele grita, logo antes de sua mão bater no
meu rosto com as costas da mão. A dor não é sentida a princípio. Estou
em choque demais.
Não, meu namorado não poderia simplesmente ter me batido
quando eu já havia sido espancada até a morte. Não, não quando ele me
ama.
Mas a dor vem para mim, e dói. Tudo dói, incluindo o maldito
músculo dentro do meu peito que continua me pegando nessas situações.
Como ele pôde me tratar assim? Como ele poderia me machucar? E
por que não posso contar a verdade ao meu namorado e me sentir
confortável e confiante de que ele não vai me culpar? Que ele não vai
me bater?
Eu não tinha ideia de que Billy estaria lá. Por mais que ele goste de
me chamar de fantasma, ele só aparece naquela casa algumas vezes por
ano. Normalmente Barbie vai até ele. Ele nos pegou de surpresa.
— Não acredito em você. – ele sussurra, com nem mesmo uma
minúscula quantidade de remorso refletida em seus olhos escuros.
— Por quê? – eu exijo lamentavelmente.
— Porque você é uma mentirosa. Mako foi quem te encontrou e te
trouxe. Como isso aconteceu, River? Foi com ele que você fodeu?
Talvez você não tenha ido a Shallow Hill. Talvez você tenha deixado
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aquele merda te foder e ele decidiu bater em você também. Não me


surpreenderia.
Hipócrita.
Mas aí está a acusação que eu estava esperando. Eu sabia que ele de
alguma forma envolveria Mako nisso. Eu sabia que ele presumiria que o
estou traindo com seu irmão. Eu sabia que estava chegando, mas a
acusação me irrita profundamente de qualquer maneira.
— Eu estava dirigindo e parei. Eu não fazia ideia de que era a casa
dele. Foi... coincidência.
Uma risada alta e enlouquecida escapa de sua garganta.
— Coincidência? – ele repete estridentemente. — Eu duvido disso.
Eu sabia que você tinha uma queda por ele no momento em que o
conheceu. Você é uma maldita prostituta, River.
— Eu não sou! – eu grito. Eu só... estou tão cansada de ser chamada
de prostituta!
— Você é. – ele resmunga. — Ele gosta de se dizer que é meu
irmão, mas não é. Ele é uma fraude fingindo fazer o papel.
Suas palavras não fazem sentido.
— Se eu descobrir que você fodeu com ele, eu vou te matar, River.
Você me ouviu? Eu vou cortar sua garganta, porra. – Seus olhos estão
selvagens, o cabelo bagunçado como se ele o puxasse, e suas roupas
estão tortas. Ele parece desequilibrado.
Antes que eu possa responder, ele sai furioso em direção à porta da
frente. Suas chaves são tiradas da mesa perto da porta, e ele a fecha atrás
de si um segundo depois.
— Não me deixe assim! – grito. Eu grito, e grito, e grito. Ele não
volta. Nem mesmo uma hora depois, enquanto ainda estou entalada no
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sofá.
Estou molhada e minha pele está extremamente irritada, minhas
costelas quebradas provavelmente estão ainda mais rachadas com base
no quanto pouco consigo respirar, meu lábio está sangrando e estou
infeliz pra caralho. Esta é a sensação de morrer.
Lentamente, eu levanto do sofá, com os dentes rangendo, e rastejo
até a mesinha onde meu celular está. Demora algumas tentativas, mas
assim que o coloco na mão, apenas fico olhando para ele.
Para quem diabos devo ligar?
Há Amelia... mas não quero que ela me veja assim. Não quero
contar a ela sobre o que Ryan fez. Eu não poderia ligar para os pais de
Ryan, não quando foi o próprio filho deles que me deixou assim.
Não tenho ninguém. A menos que eu faça algo estúpido e ligue para
alguém que realmente não quero.
Coloquei o celular no ouvido. Eu não me importo mais neste ponto.
— Policial Brady.
— Oi, aqui é a River. Eu... você pode me dar o número do Detetive
Fitzgerald, por favor? Gostaria de falar com ele sobre o que aconteceu.
— Senhorita, posso levar o inquérito...
— Gostaria de falar com o Detetive Fitzgerald, por favor.

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Meu bichinho de pelúcia favorito, Rocky, está enfiado na minha
boca. O pelo sujo tem um gosto azedo na minha língua por estar em
tantos lugares imundos. Mas preciso dele. Preciso morder alguma coisa
para não chorar. Quando eu choro, dói. Acho que Billy quebrou minhas
costelas de novo. Ele disse que, desde que meus pulmões não fossem
perfurados, eu ficaria bem.
Como ele sabe que não foram?
Meu tornozelo está torcido quando tentei fugir dele. Torceu porque
Billy me agarrou pelos cabelos e me puxou para trás inesperadamente.
Meu tornozelo cedeu, junto com o resto de mim. Meu corpo, alma e
espírito... estão todos desistindo de mim.
Billy disse que se eu sair do quarto, serei punida novamente.
Minha mãe está no quarto ao lado, gemendo e gritando uma
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mistura de prazer e dor. Billy faz comigo as mesmas coisas que faz com
ela, mas nunca tive vontade de fazer os barulhos que ela faz. Não é
bom. Billy disse que deveria, mas tudo o que faz é machucar. Sempre
dói.
Com ele e com os outros homens que mamãe traz para casa.
Quando eles terminam com ela, eles vêm para o meu quarto à noite.
Eles me machucaram. Eles deixam hematomas e arranhões e até marcas
de mordidas. O último cara deixou uma cicatriz por ter mordido minha
coxa com tanta força.
“Billy, por favor!” Mamãe grita, com as paredes finas não fazendo
nada para mascarar seu terror. Carne batendo em carne segue seus
apelos desesperados, junto com um gemido alto. Billy sempre faz aquele
barulho quando termina. Aguardo ansiosamente aquele barulho porque
aí ele me deixa em paz.
Billy enfia a cabeça na porta alguns minutos depois, sem camisa e
com as calças ainda desabotoadas. Um cigarro está pendurado em sua
boca, com o cheiro forte entrando em meu quarto. As paredes estão
amarelas de tanto fumo. Acho que nunca vi a cor branca na minha vida.
Não quando qualquer coisa pura está contaminada em Shallow Hill.
"Você ainda está chorando?" ele pergunta, com uma sobrancelha
levantada enquanto ele traga o cigarro. Rocky ainda está na minha
boca, mas não tenho mais vontade de chorar. Agora, só quero me
encolher e me esconder.
Tiro Rocky da minha boca e o jogo para o lado, com o dinossauro
azul rolando pelo chão sujo.
"Não.", murmuro. As lágrimas ainda não secaram em minhas
bochechas. Billy não gosta quando minto, mas odeia ainda mais quando
mostro fraqueza.
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“É melhor não estar.”, ele adverte. “A boceta da sua mãe é mais


larga que a porra do Grand Canyon. Mas não tenho esse problema com
você."
Aprendi o que esse termo significa alguns anos atrás. Billy adora
dizer a palavra quando está me sujando. Ele disse que é a melhor que já
teve, mas não quero ser a melhor. Eu quero ser pior que a mamãe. Se eu
fosse maior que o oceano, talvez ele não me quisesse.
"Eu não estou chorando.", digo novamente. Sua ameaça era clara.
Ele viria me sujar de novo se eu continuasse chorando. Ele sempre diz
que vai me dar um motivo para chorar quando eu mostrar fraqueza. E
quando ele faz isso, eu quero morrer.
Billy entra no quarto, agacha-se até o nível dos olhos e me entrega
o cigarro. Eu pego. Se eu não fizer isso, ele vai colocar na minha pele.
O orgulho brilha em seus olhos frios e vazios quando levo o cigarro à
boca e inalo a fumaça. Eu costumava tossir o tempo todo quando Billy
me fazia fumar isso, mas não tusso mais. Eu melhorei nisso.
Ele insiste para que eu trague novamente. Eu trago e faço um
pouco de barulho. A dor não passa, mas parece um pouco mais
tolerável agora.
"Você vai me ajudar a ir ao banheiro?" pergunto baixinho. Pedir
um favor a Billy nunca sai de graça. Eu sei disso, mas a vontade de ir
está começando a se aprofundar.
Ele pega o cigarro de volta e o enfia na boca. Observo seus lábios,
onde eles estão envolvendo o filtro amarelo. Onde meus lábios estavam.
Isso me faz sentir como se ele estivesse me tocando.
“Você está velha demais para precisar de ajuda no banheiro,
River.”, ele adverte.
Meu lábio inferior ameaça tremer conforme a sensação piora. Eu
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realmente tenho que fazer xixi. Mas não quero tentar me levantar na
frente de Billy. Ele vai me ver com dificuldade. Ele vai me ver chorar.
Ele vai me ver fraca. E então ele vai piorar essas coisas.
“Ok, Billy. Eu não tenho que ir muito.” eu minto. É uma mentira
que vale a pena dizer se isso significa que ele vai acreditar em mim e ir
embora. Ele olha para mim, com um sorriso astuto contraindo seus
lábios.
"Ok, River.", ele repete, com sua voz fria e suave. “Espero que não,
porque você está de castigo. Você não tem permissão para sair deste
quarto até de manhã. Você me escutou?"
Respiro dolorosamente, mas aceno com a cabeça.
Billy me dá um último sorriso e sai do quarto, fechando e trancando
a porta atrás de si. As trancas sempre estiveram do lado de fora, nunca
do lado de dentro.
No segundo em que ele sai, eu urinei. Está frio aqui, talvez isso me
mantenha aquecida durante a noite.

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Em que diabos eu me meti?
— Não quero ouvir nenhum comentário seu, ok? – eu exijo, olhando
para ele do meu lugar no chão.
Pareço absolutamente patética, eu sei disso. Mas isso não me
impede de fazer minhas exigências.
Mako olha para mim com uma infinidade de emoções em seus
olhos. A tristeza e a descrença estão presentes. Mas a emoção mais
dominante é a fúria desenfreada.
Eu e você, amigo.
— O que ele fez? – ele pergunta através de uma raiva mal contida.
Seus punhos estão cerrados com tanta força que as juntas dos dedos
estão esbranquiçadas.
— Nada, você pode apenas me ajudar, por favor? – eu desconverso,
não querendo falar sobre o quanto idiota meu namorado é. É embaraçoso
e não quero ouvi-lo dizer eu avisei. Depois de um momento, ele lembra
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de si mesmo e se aproxima de mim.


— Cuidado, não estou limpa agora. – digo, gaguejando sobre como
dizer que me mijei. Ele não me dá atenção. Gentilmente, ele me pega,
mas isso não importa. A dor lancinante nas minhas costelas é de tirar o
fôlego. Eu suspiro de dor, e ele paralisa.
— Sinto muito, baby. – ele diz. Meu coração aperta com o carinho.
Normalmente, a dor me distrairia de suas palavras, mas em vez disso eu
me concentro nisso para me distrair da dor.
Foda-se, coração. Foi isso que me colocou nessa situação.
Claramente, ele não sabe do que está falando.
Com muita dor, ele me segura em seus braços e me carrega até seu
carro. Nunca fiquei tão envergonhada em toda a minha vida. Tanto que
quero me enfiar em um buraco e desaparecer. Antes que eu possa
impedir, minhas mãos estão cobrindo meu rosto e os soluços destroem
meu corpo mais uma vez. Eu não me importo com a dor agora, estou
tão... com raiva. Tão magoada e envergonhada. Não acredito que Ryan
me deixou assim. Não acredito que ele me bateu de novo.
— Eu cuido de você. – ele sussurra em meu ouvido. — Se você está
envergonhada, eu tenho uma melhor. Eu tinha dezessete anos e estava
aparecendo para uma entrevista de emprego. Eu estava tão nervoso que
tive gases. Mas quando eu fui peidar, eu realmente me caguei.
Algo entre um suspiro chocado e uma risada escapa da minha boca.
Dói minhas costelas, mas estou atordoada demais para me importar.
— Você não fez isso!
Prefiro não olhar para Mako e pensar nele se cagando. Ele é muito
gostoso e essa história é simplesmente estranha. Mas parece funcionar o
suficiente para acabar com minha auto-piedade.
— Eu fiz. Saí correndo imediatamente, mas não antes que o gerente
desse uma boa olhada na minha bunda recuando. – Outra risada escapa,
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completamente perplexa por ele não estar nem um pouco envergonhado


com sua história. Ele olha para mim com um sorriso torto e uma fina
camada de diversão mascarando seus verdadeiros sentimentos. Ele está
se distraindo tanto quanto está me distraindo.
Ele abre a porta de seu Jeep Wrangler e delicadamente me coloca no
banco. Enquanto afivela meu cinto de segurança, ele explica: — Sei que
está desconfortável, mas não quero que ele volte para casa enquanto eu
estiver aqui. Se fizer isso, vou acabar na prisão por homicídio de
primeiro grau. Vou sentar você no carro, subir correndo e pegar algumas
roupas.
Não tenho energia para discutir, então eu aceno. — Calcinhas estão
na gaveta de cima. Os pijamas estão na segunda gaveta.
Leva apenas alguns momentos para voltar. Ele deve ter encontrado a
mochila no closet, já que ela está pendurada em seu ombro largo. Ele
entra no carro e minhas bochechas ficam vermelhas.
Estou molhando o banco dele e está fedendo a mijo velho.
— Sinto muito. – eu arfo, olhando para o meu colo úmido.
— Não se preocupe, isso não é sua culpa. – ele diz suavemente,
embora esteja no limite. — Os bancos são de couro e fáceis de limpar.
— Isso ainda é humilhante, apesar de sua conversa fiada, mas sim,
acho que ajuda. – murmuro, dando um pequeno sorriso para tirar
qualquer dor. Apreciei essa história mais do que ele jamais saberá.
— Você vai me contar o que aconteceu? – ele pergunta gentilmente
enquanto se afasta da calçada e se afasta do meu pior pesadelo.
Balanço minha cabeça. — Não agora. Eu só quero ficar limpa. –
digo baixinho.
— OK, eu entendo.
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Acabei de tomar banho e estou só um pouco chapada de
analgésicos. Quando Mako não estava olhando, eu tomei outro. Estou
irritada o suficiente para aceitar ficar chapada.
Estou em seu sofá macio e o Shark Week3 está tocando baixo. Não
gosto muito de sofás agora, mas é macio e confortável. Mako está
sentado ao meu lado, certificando-se de que o meu corpo esteja
posicionado de uma maneira que me cause o mínimo de dor.
A atenção que ele está me dando é... desconcertante. Ryan apenas
me jogou no sofá e foi isso.
— Você precisa de algum creme para assaduras? – ele pergunta.
Será que ele só... não acredito que acabou de me perguntar se
preciso de creme para assaduras. Por um homem devastadoramente
bonito, no entanto. Eu não achava que poderia chegar mais ao fundo do
poço.
O sangue corre para minhas bochechas e eu cubro meu rosto com as
mãos.
— Estou tão envergonhada. – murmuro através da minha barreira
improvisada. Seus dedos cutucam minha mão boa, puxando-os um por
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um e disparando pequenas correntes elétricas através de cada dedo. Eu


não gosto da sensação de sua pele na minha pele. É muito... bom.

3 Shark Week é uma banda de rock.


Tiro minha mão de seu aperto, mas não tenho coragem de encontrar
seus olhos.
— Oi. – ele murmura, levantando meu queixo até que sou forçada a
encontrar seu olhar. — Nada sobre o que aconteceu esta noite é sua
culpa. Não é preciso ser um gênio para saber que você foi deixada
sozinha e não conseguiu se levantar.
— Isso não significa que não seja humilhante. – resmungo.
Ele acena com a cabeça lentamente. — Eu entendo, aparentemente
minha conversa fiada não foi suficiente. Ajudaria se dissesse que o
cheiro de xixi é um fetiche meu? – ele pergunta sério. Eu me afasto com
desgosto.
— Não é! Isso é repulsivo.
Ele abre um sorriso e encolhe os ombros. Quando ele se levanta e
caminha em direção à cozinha sem se defender, fico preocupada que ele
não esteja brincando. — Ah, meu Deus, é realmente um fetiche?
A sala de estar e cozinha é um piso plano aberto. A casa está bem
vazia, mas aparentemente ele acabou de se mudar. Apesar de não
parecer muito habitada, é linda. Pisos de madeira cinza, paredes de cor
sálvia clara com uma parede preta destacada e móveis pretos. Sua mesa
de centro parece uma grande pedra. Sua cozinha tem armários pretos,
um acabamento cinza e branco com detalhes em sálvia e bancadas cinza
claro.
Ele tem bom gosto. Eu admito.
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Mako está remexendo na geladeira de costas para mim, mas posso


ver seus ombros tremendo de alegria. A luz brilha contra suas tatuagens.
Sem permissão, minha boca se abre, com as perguntas na ponta da
língua. Tanto, quero perguntar o seu significado. Do meu lugar no sofá,
posso ver detalhes intrincados de uma rosa vermelha florescendo entre
rosas murchas e escuras. A luz brilhante brilhando contra as cinzas.
Algo sobre isso me atrai. Ele termina de se servir de um copo de leite -
só leite para psicopatas - e se vira para mim. Aquele olhar, olhando para
mim com emoções que não ousaria decifrar, eu me acovardo.
Em vez disso: — Você está rindo de mim. – eu falo inexpressiva.
Ele se vira e um lindo sorriso está em seu rosto. — Se isso significa
que vou ficar mais humilhado do que você, então não, não estou
brincando.
— Mas... é... não é assim que funciona. – eu finalmente saio. O que
é esse sentimento? Na verdade, estou emocionada com a ideia de que ele
prefere se rebaixar apenas para me fazer sentir melhor. Mesmo que seja
óbvio que é mentira, ainda é meio... fofo. Estranhamente. Eu franzo meu
nariz.
Ele faz uma cara séria. — Acho que seu xixi cheira a rosas.
Minha boca se abre em um O perfeito. O que diabos há de errado
com esse homem?
Outro casual encolher de ombros. — Muitas coisas. – ele responde.
Eu nem tinha percebido que fiz essa pergunta em voz alta.
— Esta é a conversa mais estranha que já tive.
— Só ficará mais estranha daqui, baby. – ele diz, pegando uma jarra
de suco de laranja. Ele a sacode para mim. — Quer um pouco?
— Hum. Claro.
Ainda não me recuperei. De qualquer coisa que ele acabou de dizer.
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Incluindo aquele maldito carinho. Estou um pouco chapada demais para


corrigi-lo. Talvez mais tarde.
Esta cama é muito confortável. A única coisa que falta é Bilby
deitado aos meus pés. Sinto falta daquele carinha, ele sempre sabia
quando eu estava triste e encolhia seu corpinho macio no meu.
Minhas mãos deslizam pelo edredom cinza quente. É a cama de
Mako, considerando que seu quarto de hóspedes ainda não tem cama.
Aparentemente, ele não recebe convidados com frequência e isso não era
uma prioridade. Eu me pergunto se é porque todos os seus 'convidados'
dormem em sua cama com ele. O pensamento faz meu coração apertar.
Quando percebo isso, eu alcanço dentro de mim, puxo aquele músculo
irritante para cima e coloco-o de volta em seu lugar onde ele pertence.
O quarto de Mako não tem nenhuma foto pessoal, exceto uma em
seu criado-mudo. Uma foto de um homem que parece idêntico a ele, mas
mais velho. Ele está sorrindo para a câmera, com o mesmo sorriso
presunçoso no rosto de Mako que eu queria tanto dar um tapa quanto
beijar em seu rosto.
Deve ser um tio. Acho que me lembro de Ryan dizendo que Matt
tinha alguns irmãos. Mako não se parece muito com Julie ou Matt, então
ele deve ter herdado seus genes de um dos irmãos de Matt.
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Resistindo ao impulso de agarrar a moldura e olhar mais de perto,


desvio os olhos.
As paredes são de um cinza claro, exceto pela áspera parede de
pedra cinza contra a qual sua cama está encostada. O piso de madeira
preta está bem de acordo com as paredes, dando ao seu quarto a mesma
aura que o resto da casa possui. Confortável. Seguro.
Um forte contraste com a casa de Ryan, que a construiu para parecer
moderna e estéril. Com branco em todos os lugares, exceto alguns dos
móveis e os quadros coloridos pendurados nas paredes. Fria e estéril,
assim como seu dono.
Mako senta e coloca uma garrafa de água e meus comprimidos na
mesinha.
— Existe alguma coisa que eu possa pegar para você? – ele
pergunta baixinho, sentando-se na beira da cama. O colchão macio
comprime profundamente em torno de seu peso.
— Talvez... – eu lambo meus lábios, não tenho certeza do que estou
pedindo. — Talvez apenas falar comigo? – eu me encolho no momento
em que as palavras saem da minha boca. Desesperadamente, quero pegá-
las no ar antes que cheguem a seus ouvidos, mas é tarde demais. Ele já
está virando a cabeça para mim, com seu rosto suave e gentil. Na
verdade, ele parece ter a idade que tem quando me olha desse jeito. Em
qualquer outro momento, o estresse de seu trabalho o envelhece.
Quando ele teve a chance de se sentir jovem? Ser jovem?
— Fale-me sobre você, Mako. – eu digo. — Diga-me algo
significativo.
E assim como Jesus iluminando meus maiores desejos, ele vira seu
braço tatuado para mim, mostrando o belo desenho da rosa vermelha
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florescendo em um canteiro de rosas mortas.


— Consegui isso quando fiz dezoito anos. Simboliza minha vida e
como eu me vejo. Duvido que Ryan tenha contado isso a você, mas Julie
e Matt me adotaram quando eu tinha treze anos.
Minha boca se abre. Todos os comentários estranhos que Ryan faria
sobre Mako não pertencer, ou ele não ser seu irmão de verdade, fazem
todo o sentido agora. O porta-retrato na mesa de cabeceira de Mako,
dele e uma réplica mais antiga dele. Aquele era o pai dele. Seu
verdadeiro pai.
— Antes disso, eu cresci em um maldito bairro com pais muito
ruins. Minha mãe se vendeu por dinheiro e meu pai era traficante de
drogas. – Meu lábio treme, completamente impressionada com a
semelhança da infância de Mako com a minha. De volta à biblioteca,
quando contei a história de minha vida para Mako, ele não disse nada.
— Esta tatuagem é um lembrete de que, apesar do ambiente feio, eu
ainda valia alguma coisa. Que de onde eu vim não mancha quem eu sou
de forma alguma. – ele levanta os olhos para mim, olhando para mim
incisivamente.
O peso de suas palavras é demais. Meus olhos abaixam de novo
para a tatuagem.
— É... linda. – eu sussurro. Aquela palavra. Eu a odeio. Mas é a
única palavra que faz justiça à sua história.
— Entendo você mais do que pensa, River. – ele diz suavemente,
com seus olhos ainda esperando que os meus se juntem a eles mais uma
vez. Eu reúno minhas forças e respondo a sua demanda silenciosa. Seus
brilhantes olhos esmeralda são arrebatadores, tanto que minha respiração
se dissipa. — Eu sei como é não ser a primeira escolha de seus pais. Mas
isso não significa que você não pode ser sua primeira escolha. Escolha
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você mesma, River. Coloque-se em primeiro lugar.


Meu lábio treme. Uma lágrima escapa pelas minhas barreiras e
desce pela minha bochecha. Ele não se esquiva da emoção, em vez
disso, levanta a mão e enxuga a gota com o polegar. Sua pele desliza
contra a minha tão delicadamente deixando um rastro de fogo em seu
rastro. Minha respiração escapa de mim, completamente sem saber o que
dizer.
Ele se levanta e olha para mim mais uma vez. — Diga-me se há
algo que eu possa fazer por você.
Pouco antes de ele sair pela porta, encontro minha voz, embora seja
fina e rouca. — Tem certeza de que não posso simplesmente ficar no
sofá? Eu não quero ser um obstáculo. Você ajudou mais do que o
suficiente.
E quero dizer, muito mais do que suficiente. Ele me ajudou a ir ao
banheiro e até a sair do banheiro em um ponto. Ele me manteve
confortável, hidratada e me alimentou com comida saudável. A
enfermeira disse que uma boa dieta ajuda a curar os corpos. Eu nem
sabia que Mako estava prestando tanta atenção. Ele me manteve
entretida com sua estranha conversa sobre fetiche - sobre a qual ainda
acredito cem por cento que ele está mentindo - e filmes. Ele me deu
segurança e conforto, e uma parte dele que guardarei para sempre. E
agora ele está me dando sua cama.
Nunca fui cuidada assim e não sei como me sentir sobre isso. Mako
não deveria estar fazendo isso por mim, deveria ser Ryan, que nem
mesmo ligou ou mandou uma mensagem. Ou ele ainda não foi para casa,
ou não dá a mínima.
Ambas me fazem querer matá-lo.
— Está tentando acordar com mais dor amanhã? – ele pergunta,
trazendo-me de volta para a conversa.
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Eu franzi a testa. — Bem, não.


— Então cale sua linda boca e durma um pouco.
A porta fecha atrás dele antes que eu possa abrir minha linda boca e
agradecer. Talvez seja o melhor. Ele está me ajudando, mas há uma
parte estranha de mim que parece que ainda devo odiá-lo.
Mais do que provável, vem daquela parte fodida minha que se sente
leal a Ryan. Mas depois do que ele fez hoje, acho que é hora de
finalmente aceitar o fato de que estou namorando uma versão inferior de
Billy.
Um pedaço de merda absoluto.
Estava tão desesperada por amor e conexão humana que me
apaixonei por todas as suas mentiras. Mesmo quando havia pessoas
literalmente enfiando os fatos na minha garganta. E tudo o que fiz foi
cuspir na cara delas.
Deus, Alisson. Dói admitir que ela estava certa, mas, novamente,
isso é apenas meu orgulho. Eu fui horrível com ela. Parte disso foi
devido ao ciúme, a outra parte por causa das coisas que Ryan me contou
sobre ela.
Alison e Ryan cresceram juntos, embora Alison tenha a minha
idade. Seus pais eram melhores amigos e eles caíram naquele conto de
fadas clichê. Os pais os empurraram juntos, Ryan e Alison concordaram,
namoraram durante o ensino médio e quase um ano da carreira
universitária de Alison antes de se separarem.
Ele insistiu que ela era uma vadia louca que o traiu constantemente
e o perseguiu quando ele a deixou. Suas alegações nunca combinaram
com a Alison com quem interagi, mas me convenci de que era tudo uma
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encenação. Que ela era a vadia mentirosa e manipuladora quando o


tempo todo era Ryan.
Ela nunca foi má ou vingativa comigo, ela era apenas uma mulher
tentando ajudar outra mulher.
— Ela estava certa. – eu sussurro em voz alta. — E eu sou uma
idiota do caralho.

— River, o que diabos está acontecendo? Por que diabos ninguém


me disse que você estava no hospital? Por que Ryan não me ligou? E se
você mentir para mim, trocará fraldas por uma semana inteira. Não
brinque comigo. – Amelia ameaça pelo telefone. Sua ameaça me faz
sorrir. Trocar fraldas de uma mini Amelia não parece tão ruim
comparado a dizer a verdade.
Mas, infelizmente. — Fui atacada em Shallow Hill. Não sei por
quem. E Ryan... Ryan tornou tudo pior.
Silêncio. Parece mortal.
— O que você quer dizer com ele piorou, River? – ela pergunta
sombriamente. Eu já vi Amelia furiosa antes - é assustador. Quando não
respondo de imediato, ela continua com suas ameaças. — Esquece isso,
vou fazer um mês. E vou esperar até que minhas seis semanas terminem
e eu e David faremos sexo no quarto ao lado o tempo todo.
— Você está me tentando com tempos bons. – eu respondo em um
tom entediado, embora haja um pequeno sorriso no meu rosto. Observo
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minhas unhas. Elas estão quebradas e irregulares. Eu me pergunto


quantos olhares estranhos eu receberia se entrasse em um salão de
beleza agora. O pensamento me faz querer me esconder e fazer tudo ao
mesmo tempo.
Por que devo esconder que fui atacada? Sou a porra de uma
sobrevivente, certo? Sempre fui. Talvez eu devesse começar a saborear a
atenção de contusões e uma alma quebrada. Talvez eu devesse
transformar isso em armadura.
— …River? RIIIIVEEEERR.
O tom impaciente de Amelia me tira do sério. Eu limpo minha
garganta.
— Ele me abandonou, Amelia. Ele estava com tanta raiva que eu
me coloquei nessa situação.
Mesmo agora, ainda estou amenizando a gravidade de suas ações.
Ainda o estou protegendo e não faço ideia do porquê. Ela poderia me
perguntar se Jesus é virgem e eu teria uma resposta melhor para ela.
Amelia suspira. — Também não estou feliz que você ainda vá lá,
River. É obviamente perigoso e não faz nada além de causar danos. Seja
mental ou físico. Mas apesar disso, você não merecia porra nenhuma do
que aconteceu com você e ele não tem o direito de te tratar assim. Por
que você não vem ficar com a gente? Ainda não transformamos o quarto
de hóspedes em um berçário.
Lambo meus lábios secos. Dizer a verdade ou continuar a mentir?
Hum, decisões.
— Eu... eu meio que tenho um lugar para ficar agora. Estou bem,
Amelia. Realmente.
— Onde você vai ficar? – Maldita intromissão. Eu não posso culpá-
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la. Eu perguntaria o mesmo. — River? – ela pergunta quando eu não


respondo.
— No irmão dele? – eu disse isso como uma pergunta. Porra, eu
disse isso como uma maldita pergunta. Amelia ataca.
— Explique-se. Agora.
Se eu não me sentisse tão quebrada, estaria andando de um lado
para o outro agora. Eu nunca tive o hábito de roer minhas unhas antes,
mas talvez deva começar. Talvez devesse deixá-las bonitas e atarracadas
antes de ir ao salão de beleza.
— Na verdade, ele é um detetive. E coincidentemente, acabei na
frente da casa dele naquela noite. Ele tem ajudado desde então.
Não conto a ela sobre suas aparições repentinas quando estou saindo
da aula. Isso o levaria a confessar por que ele sentiu a necessidade de me
encontrar. E então isso levará ao incidente da biblioteca, quando me
senti muito... livre. Como se eu pudesse dizer qualquer coisa ou fazer
qualquer coisa sem consequências.
— Você está confortável aí?
Sei o que ela está realmente perguntando. Mako é como Ryan? Ele
também me assusta?
Ele assusta. Só não da maneira que ela pensaria.
— Sim. – eu respiro. E desta vez, estou dizendo toda a verdade.
Ela suspira de alívio. — Ok, bem, eu tenho que vomitar agora. Mas
você vai me mandar uma mensagem? Dirá que você está bem e se
precisa de alguma coisa?
Eu sorrio, mais grata do que nunca por Amelia estar na minha vida.
— É claro, querida. Eu te amo.
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— Eu também te amo, River.


126 CHAMADAS NÃO ATENDIDAS.
349 MENSAGENS NÃO LIDAS.
50 CORREIOS DE VOZ.
RYAN: Amor, por favor, volte para casa. Eu preciso de você.
Estou perdendo a porra da cabeça sem você.
RYAN: Eu não posso viver assim, River. Você está me matando.
Você está me matando.
RYAN: Isso te deixa feliz? Que eu quero me matar? Eu vou fazer
isso, River. Vou escrever minha carta de suicídio e dizer a todos que é
tudo culpa sua, assim, quando alguém perguntar como é matar
alguém, você saberá.
RYAN: Estou olhando para esta arma na minha mão e tudo que
quero fazer é colocar uma bala no meu cérebro. Não sei se vou
conseguir me conter.
RYAN: Estou tão magoado com a maneira como você está me
tratando. Você está agindo como se eu não significasse nada para
você.
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RYAN: Nunca mais vou deixar você me deixar, River. Você


prometeu que nunca me deixaria.
RYAN: Foi tudo mentira? Todas aquelas vezes que você disse que
me amava. Que ficaríamos juntos para sempre. Tudo era mentira.
RYAN: Eu quero me matar agora. A única coisa que me mantém
vivo é a esperança de que você volte para mim.
RYAN: Amor, POR FAVOR.
RYAN: Onde diabos você está, River? Eu vou te encontrar se você
não me contar.
RYAN: Ninguém nunca vai me impedir de te encontrar.
RYAN: PORRA ME RESPONDA!
RYAN: Estou indo atrás de você.

Cada vez que seu nome aparece na tela, eu quero quebrá-la. Acabei
de receber este novo celular também, considerando que Billy quebrou o
outro. Durante toda a semana, eu enfrentei dificuldades. Eu iria de
furiosa para sentir falta dele e chorar por causa do que ele fez para mim.
Meus dedos pairavam sobre o teclado, desesperados para responder a
ele. Desesperados para implorar para que ele não se mate. Mas não
consegui fazer isso. Nem mesmo quando ele ameaçou vir me procurar.
Isso foi há dois dias, e ele ainda não me encontrou. Presumo que o
último lugar que ele esperava que eu estivesse era no seu irmão. Ryan
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não sabe que Mako e eu já conversamos após o breve encontro em que


conheci seus pais. Isso não me impediu de olhar constantemente pela
janela com medo, esperando que o carro dele parasse.
É difícil admitir que na semana passada estive aqui, esta é a mais
segura que já me senti em... bem, em toda a minha vida. Eu odeio isso.
Eu odeio que estar perto de Ryan pareça estar ao lado de um tornado,
enquanto seu irmão pareça como encontrar segurança em um abrigo
contra tempestades.
Outra mensagem de texto chega. Desta vez é uma imagem. Ryan
está apontando uma arma para sua cabeça, o olhar em seus olhos
desesperado e selvagem. Meu coração para. Ele realmente vai fazer
isso? Quando ele ameaçou se matar, nunca acreditei de verdade, embora
isso me mantivesse acordada à noite rezando para que ele não o fizesse.
Mas isso parece muito real. Ryan não é do tipo que aponta uma arma
para a cabeça.
Seu nome aparece no meu celular pela milionésima vez. Outra
ligação. Antes que eu possa me conter, pego o celular e aperto no botão
verde.
— Alô?
Um momento de silêncio, e então uma fungada. — Eu não esperava
que você atendesse. – ele parece deplorável, com sua voz oprimida e
cheia de vergonha.
— Eu não esperava que você me deixasse em uma poça de mijo,
mas acho que coisas acontecem, Ryan. Por que você está apontando a
porra de uma arma para sua cabeça? O que há de errado com você? –
Minha voz está cheia de raiva. Não esperava que a raiva me atingisse tão
repentinamente e com tanta força. Mas no momento em que ouvi sua
voz pelo receptor, tudo o que senti foi uma agonia crua de suas ações.
— Porque não posso viver sem você, River! Quantas vezes eu tenho
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que dizer isso? Olha, sinto muito, River. Sinto tanto a sua falta e estou
tão envergonhado da maneira como agi. Você está ferida e não era o
momento certo.
Eu sorrio, embora não com humor. — Quando é a hora certa?
Ele hesita em suas palavras. — O que você quer dizer?
— Você disse que não era a hora certa. Então, diga-me Ryan,
quando é a hora certa de bater na sua namorada?
— Não existe hora certa, não foi isso que eu quis dizer. – ele se
descontrola, ficando na defensiva. Ah, então ele não gosta de ser
criticado por me bater? E eu pensei que fugi dos meus problemas.
— Então o que você quis dizer?
— Quis dizer, que eu deveria ter lidado melhor com isso. Mas,
River, fiquei com raiva por você ter se colocado nessa situação. Eu disse
para você parar de ir lá. É perigoso e é isso que acontece. Você pode me
culpar por ficar irritado por você continuar entrando em uma casa
perigosa todos os meses? Onde você foi estuprada e abusada? Isso
estava prestes a acontecer. E você mentiu para mim, e ainda está
mentindo sobre quem te machucou. Você os está protegendo.
— Não estou protegendo eles. – eu me descontrolo. — Estou
protegendo todos os outros. Você está certo, há pessoas perigosas em
Shallow Hill. E meus fantasmas me alcançaram, mas não vou deixá-los
assombrar a vida de ninguém.
— Meu pai é advogado, eu sou advogado. Eu poderia colocá-los na
prisão. – ele argumenta.
Balanço a cabeça, com a frustração borbulhando dentro de mim. Ele
não entende. Ele nunca vai entender. Ele é um garoto privilegiado que
cresceu com pais amorosos em uma linda casa. Ele sempre conseguiu o
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que queria.
Mas ele não vai conseguir o que quer desta vez.
— Sinto muito. – ele diz, com sua voz à beira do desespero. — Eu
simplesmente te amo pra caralho, River. Mais do que qualquer pessoa
com quem já estive. Eu nunca me senti assim por nenhuma delas, então
isso é... isso é novo para mim, ok? Estou com tanto medo de perder
você. E naquela noite... foi como ver meu pior pesadelo ganhar vida. Eu
surtei. Eu te tratei horrivelmente. Estraguei tudo e sinto muito por isso.
Sua voz falha no final de sua frase, junto com a minha determinação.
Meus ombros relaxam. Por que dói tanto ouvi-lo sofrer? Não dói
nele quando sofro. Eu agarro meu cabelo e puxo, tão frustrada com o
efeito que Ryan tem sobre mim. É como uma correnteza - toda vez que
penso que vou me puxar para fora e me libertar, ele está ali para me
puxar de volta para baixo. Afogando-me e me sufocando. É tão
exaustivo lutar contra ele. Só quero voltar para onde estávamos antes de
ir para Shallow Hill. Estávamos tão felizes, e Deus, eu quero isso de
volta.
— River, podemos apenas... você pode, por favor, voltar para casa
para que possamos conversar?
Eu sinto que estou começando a ceder. Ele me bateu. Ele me
machucou. Ele me abandonou. Ele fez tantas coisas ruins comigo. Mas
penso na imagem dele apontando uma arma para a cabeça, o brilho
enlouquecido em seus olhos. Ele está sofrendo também. E talvez desta
vez, ele esteja realmente arrependido. Na verdade, nunca o deixei antes.
Talvez dessa vez ele tenha me levado a sério e mude.
— Por favor? – ele implora quando eu ainda não respondo. — Eu só
quero falar contigo. Ver como você está e se está bem. Eu prometo que
vamos apenas conversar. Eu nem vou tocar em você se você não quiser.
Eu suspiro. Temos muito o que conversar. Coloquei mais esforço
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neste relacionamento do que jamais eu fiz com qualquer outra pessoa.


Todos os outros homens que entretive foram apenas isso -
entretenimento. Nunca senti as coisas que Ryan me faz sentir.
Está bem claro que Ryan tem problemas, mas talvez se ele se abrir
melhor comigo e estabelecermos mecanismos saudáveis para lidar com
sua raiva, possamos consertar isso. Foi o que aprendi em meus estudos.
Mecanismos de enfrentamento. Encontrar o que o desencadeia e
aprender a lidar com isso de maneira saudável.
Além disso, todos os meus pertences estão lá. Venho usando as
roupas enormes de Mako na semana passada e o peguei me dando
alguns olhares com ardor quando pensava que eu não estava olhando.
Eles enviaram uma emoção direto para minha corrente sanguínea e me
enojaram de uma só vez.
— Vamos lá, apenas algumas semanas atrás estávamos tão felizes.
O jeito que eu fiz você rir. Como forte eu fiz você gozar...
— Ok. – eu interrompo, já me sentindo enfraquecer com essas
memórias. Tenho que admitir, a maior parte dos últimos dois anos juntos
foi uma felicidade absoluta. — Eu voltarei para casa. Mas se eu começar
a sentir medo de alguma forma, vou chamar a polícia na discagem
rápida.
Em algum lugar no fundo da minha mente, percebo que é uma frase
que eu nunca deveria dizer ao meu namorado. Mas eu não tenho espaço
para falar, no entanto. Olha de onde eu vim. Todo mundo tem demônios,
e eu amo Ryan o suficiente para tentar ajudá-lo a lutar contra esses
demônios.
Ele suspira aliviado, e posso sentir seu sorriso pelo telefone. — OK,
baby. Estarei aqui esperando. Essa palavra novamente. Baby. É diferente
saindo da boca de Ryan. Como familiaridade e conforto. Com Mako,
parece… emocionante. Como tocar um fio elétrico. Acho que já tive
emoções suficientes para durar uma vida inteira, agora é a hora em que
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me acomodo e me delicio com o conforto.


Desligo o celular e imediatamente abro meu aplicativo Uber. Mako
está no trabalho, então não preciso me preocupar em fugir.
Volto a vestir o pijama que Mako trouxe para mim, pego as poucas
coisas que eu tinha aqui em uma sacola de compras e entro na parte de
trás do Uber em quinze minutos.
Durante todo o trajeto de volta, tudo o que posso pedir é que isso
não fique feio novamente. Talvez eu não sobreviva desta vez.

— Olá, baby. Senti sua falta. – Ryan diz, levantando-se do sofá e


caminhando em minha direção. Dou um passo para trás, não totalmente
pronta para seu toque. Imediatamente ele faz uma pausa, com um
lampejo de mágoa surgindo em seus olhos. Mas ele recua mesmo assim.
Esse movimento me conforta.
— Desculpe. Posso lhe servir algo? Como você está se sentindo?
— Como parece que eu me sinto? – eu ainda não deixei minha raiva
ir embora. Só porque estou aqui, não significa que ainda não estou
sofrendo.
Seus olhos observam o meu rosto roxo, dedo mindinho quebrado e
curvado sobre o corpo. Cada movimento dói minhas costelas e ainda
manco um pouco.
Ele parece abatido, mas a raiva brilha em seus olhos azuis. — Fico
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com raiva de olhar para você, River. Por causa do que aquele filho da
puta fez com você. Eu quero matar ele.
E aparentemente eu também. Eu mantenho essa parte para mim, no
entanto.
— Por favor, venha se sentar. – Eu olho para o sofá. Memórias de
deitar indefesa no sofá em uma poça de xixi me atingem. Memórias de
choro e gritos por sua ajuda, enquanto ele gritava comigo e me dava um
tapa na cara.
Talvez isso tenha sido uma má ideia.
Eu dou um passo para trás.
— Você não vai embora. – ele diz. As palavras enviam uma
sensação de medo através de mim, como um expresso direto em minhas
veias. Quando meus olhos desviam de volta para ele, sua máscara
preocupada caiu e uma mais sombria a substituiu.
— Eu... eu não ia. – digo. Odeio o quanto fraca eu soei. Eu levanto
meu celular, com meus dedos se movendo em direção ao botão SOS. O
celular é arrancado da minha mão e jogado pela casa em questão de
segundos. Eu me encolho com o estrondo e o som de vidro quebrando.
Ótimo, lá vai outro.
— Você não precisa disso. Só quero te ajudar, River. Você nunca
me deixa ajudá-la.
Seu tom suave contrasta fortemente com a ação agressiva. É
honestamente aterrorizante. Mantenho a boca fechada para conter as
palavras, tentada a lembrá-lo de que estamos nessa situação por causa da
última vez que pedi ajuda.
Sutilmente, eu olho ao redor da casa. Eu conheço esta casa como a
palma da minha mão agora. Eu sei onde estão todas as saídas.
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Eu sei onde estão as facas.


Sorrio para ele. — Eu adoraria que você me ajudasse. – eu estendo
minha mão - aquela sem o dedo mindinho quebrado. — Você vai me
ajudar a ir para o sofá? Ainda estou dolorida.
Seus ombros relaxam, um sorriso abre em seu rosto e ele segura
minha mão gentilmente.
— Viu, amor? Isso é tudo que quero fazer. Fazer você se sentir
melhor. Compensar meus erros do passado.
No segundo em que minha bunda atinge o sofá, o mesmo acontece
com a realidade de que cometi um grande erro ao voltar aqui.
— Então, vamos conversar. – eu respiro. Pego suas mãos e as
seguro firmemente. Elas parecem frias, mas familiares. Eu fecho meus
olhos brevemente e deslizo meus polegares em sua pele.
Sem arrepios. Sem emoção. Apenas familiaridade. Algo que sempre
quis na vida. Conforto, a sensação de estar em casa, de estar contente.
Eu estava tão cansada de ser tocada por mãos desconhecidas que me
deleitei com o conforto das mãos de Ryan em mim. Mas nunca percebi
que familiar não significa seguro até agora.
As mãos de Billy são familiares...
Isso foi um erro.
— Acho que você me deve um pedido de desculpas primeiro. – ele
diz. Meus olhos se abrem. Seu azul opaco penetrou em minhas órbitas
douradas. Ele está cem por cento sério.
Desesperadamente, eu tento encontrar o homem por quem me
apaixonei, mas tudo que vejo olhando para mim é o rosto do mal. Ele
nem está mais tentando esconder.
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Eu limpo minha garganta.


— Pelo que você gostaria que eu me desculpasse?
Amar você apesar de suas falhas? Pensando que eu poderia mudar
você? Mecanismos de enfrentamento saudáveis, uma ova. Ele me
enganou tanto. Eu tinha me enganado, pensando que ele era apenas um
homem com alguns problemas de raiva e um pouco mimado demais.
Agora percebo que estava errada. Tão, tão errada.
— Por ir para Shallow Hill, se colocar em uma situação perigosa e
deixar outro homem tocar em você. – Minha mão treme com a
necessidade de afastá-las da dele. Não quero a pele dele na minha, isso
queima como brasas forjadas no Inferno.
Como poderia, quando ele pensa que deixei Billy colocar as mãos
em mim? Como se eu tivesse a maldita escolha.
— Estou disposto a te perdoar, River. Eu sei. – ele contrai sua
mandíbula. — Sei que outro homem fodeu com você. Estou disposto a
ainda estar com você. Mas eu quero um pedido de desculpas.
Tantos pensamentos estão passando pela minha cabeça que não
consigo definir um único e me concentrar nele.
Desculpe-me por ter sido estuprada, Ryan. Lamento ter sido
espancada quase até a morte enquanto minha mãe assistia e não fez
nada para me salvar. Sinto muito por ter visto minha mãe sendo
estuprada também. Lamento que um homem mau esteja apegado a mim
e fará qualquer coisa para me machucar. E lamento que você seja como
ele.
— Sinto muito, Ryan. – digo baixinho. Se eu falar mais alto, ele
pode detectar a emoção em minha voz. Ele vai ouvir a raiva. O desgosto.
A absoluta vergonha de nunca aprender. Eu sempre volto rastejando
para ele.
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Seus dedos afastam uma mecha de cabelo do meu rosto e a colocam


atrás da minha orelha. Eu tremo sob seu toque.
Ele acha que é porque me excita. Acho que é porque ele me enoja.
— Eu te perdoo, amor. Todos nós cometemos erros. Mas só porque
eu te perdoo, isso não significa que vou esquecer. Você entende isso? –
ele pergunta, com sua voz calma e firme. Sinistra e implacável.
— Eu entendo.
Ele sorri, com seus dentes perfeitos aparecendo. Ele não tem
caninos afiados como Mako. Seus dois dentes da frente não são nem um
pouco mais longos que os outros. Eles se parecem com lentes. Como
eram seus dentes antes de um dentista os fazer quadrados perfeitos em
sua boca mentirosa?
— Sinto muito por ter batido em você, River. Me desculpe por ter
gritado com você. E sinto muito por não ter vindo buscá-la antes de você
se envergonhar no meu sofá. . – Quase fico vermelha quando as últimas
palavras passam por seus estúpidos dentes falsos. — E eu sinto muito
por ter comido minha secretária.
O vermelho surge em um azul gelado enquanto meu sangue corre
frio. — Você... você fodeu com outra pessoa?
Ele zomba. — Você não achou que eu não iria depois que você
deixou alguém foder você? Vamos, River. Era justo que eu me vingasse.
E agora que consegui, podemos ser felizes novamente. Você não vai
mais para Shallow Hill e eu vou demitir aquela vadia.
Ah, doce Ryan, sim, você vai.
— Ok. – eu sussurro. Olho em seus olhos e forço um sorriso frágil.
— Isso é justo.
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O sorriso que ele retribui só pode ser chamado de mal. Assim como
ele.
Ainda bem que eu também posso ser.
O toque estridente do meu celular me assusta. Deixo cair a caneca
de café que estou lavando e ela se estilhaça na pia. Ryan gostou daquela
caneca. A ansiedade corre através de mim enquanto tento descobrir
como vou explicar como quebrou. Talvez ele não perceba.
Estúpida.
Ele usa esta caneca todos os dias.
Minhas mãos tremem enquanto as enxugo em um pano de prato
rapidamente e atendo o celular sem olhar quem é. — Alô?
Estúpida, estúpida, estúpida.
— Onde você está?
Eu fecho meus olhos e solto um suspiro alto. Faz apenas dois dias
desde que voltei para Ryan. Mako me ligou nos dois dias e tem sido um
inferno tentar esconder isso de Ryan. Eu também matei aula para que ele
não pudesse me encontrar lá. Estou me escondendo de Mako e ele sabe
disso. Ele sabe exatamente onde estou.
— Você não pode simplesmente me ligar, Mako.
Ainda bem que nunca salvei o número de telefone dele no meu
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celular. Apaguei todas as evidências dele. Surpreendentemente, Ryan


não perguntou onde fiquei durante a semana que estamos separados. Eu
sei que ele foi me procurar na casa de Amelia. Ela me disse que ele
apareceu e bateu a porta na cara dele, sem confirmar nem negar se eu
estava lá. Acho que ele apenas assumiu que eu estava.
É para lá que eu gostaria de ter ido.
— Por quê? Porque você voltou para ele?
O som da água espirrando no chão de ladrilhos interrompe os meus
pensamentos acelerados. Viro a minha cabeça para ver a pia
transbordando de água.
— Merda. – murmuro enquanto corro para fechar a torneira. Eu me
esforço para pegar o pano de prato para enxugar a água no chão, quase
chorando alto quando minhas costelas protestam. Meu coração está
acelerado, e nem tenho certeza do porquê neste momento.
— River?
— Apenas... apenas espere, ok? – grito. Eu termino de secar a água.
Felizmente, vi antes que fizesse uma grande bagunça. Prendo o celular
entre a orelha e o ombro e torço o pano de prato na pia.
Enfio a mão na pia para poder esvaziá-la e, assim que agarro o
tampão, sinto uma picada aguda no dedo. Encolhendo-me de dor, mordo
o lábio e arranco o tampão da pia. Eu me cortei no vidro quebrado.
— River? – Mako diz novamente, parecendo impaciente.
— O que? O que você quer, Mako? – eu retribuo dez vezes mais sua
impaciência.
Meu dedo está sangrando, minhas mãos ainda estão tremendo e
estou à beira das lágrimas.
— Você foi embora sem dizer uma palavra e não atendeu minhas
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ligações nos últimos dois dias. Achou que eu não ficaria preocupado?
— Sim, realmente. Eu achei. Fique tranquilo, estou bem.
Ele suspira. Ignoro enquanto corro para o banheiro para encontrar a
água oxigenada e um band-aid. Despejo água oxigenada e inspeciono a
ferida. É bem superficial, mas profundo o suficiente para causar uma
cicatriz. Agora definitivamente não poderei esconder meu erro de Ryan.
Lavo o sangue e enrolo um band-aid em volta dele com força.
— Você não parece bem. – eu faço uma pausa, observando o resto
do meu sangue escorrer pelo ralo.
— Eu estava bem até você ligar. – Verdade.
Ryan voltou ao que era antes. Amoroso. Doce. Atencioso. E meu
medo dele está diminuindo provisoriamente. Ele não mostrou seu lado
sombrio para mim desde o dia em que cheguei em casa, e é a ponto de
me questionar, pensando que talvez eu apenas tenha exagerado. É difícil
imaginar na minha cabeça quando ele está sendo tão amoroso agora.
Ele me comprou mais um celular novo, demitiu a secretária com
quem me traiu e trouxe champanhe para casa para comemorar. Eu quase
bebi a garrafa inteira e o deixei me foder na bunda naquela noite, apesar
do meu corpo machucado e quebrado. Encobri minhas lágrimas de
vergonha com a sinfonia de seu ronco.
Independentemente disso, estamos voltando a ser felizes novamente.
Ou algo assim. Ainda estou me recuperando e ele cuidou bem de mim
até agora. Ele deixou claro que, desde que eu seja uma boa menina e não
estrague tudo, ele continuará cuidando bem de mim. Ele prometeu.
— Só estou preocupado com você, River. – ele diz em voz baixa.
Sua voz grossa ressoa através de mim.
— Bem, faça um favor a nós dois e pare. – eu desligo e
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imediatamente apago a ligação do meu registro.


Então, vou e pego um pouco de super bonder. Talvez ele aprecie o
esforço para consertar meu erro.
A caneca se assemelha a pedras irregulares esmagadas como dentes
tortos; a extremidades irregulares presas com cola que vai descolar na
máquina de lavar louça em segundos. Parece comigo. Apenas um monte
de peças incompatíveis mal segurando-as juntas.
Esta caneca nunca mais poderá ir à máquina de lavar louça. Eu
deveria ter colocado lá em primeiro lugar, mas a limpeza me ajuda a
acalmar minha mente. Tirar o pó das pás do ventilador de teto teria sido
menos arriscado, mas a poeira me faz espirrar, e porra, quem se importa
se eu espirrar, porque em breve estarei tentando evitar que o sangue saia
do meu nariz.
E o pior de tudo, agora estou condenada a uma vida inteira lavando-
a à mão. É uma garantia de que vou quebrá-la novamente. Os pedaços
quebrados se quebrarão em pedaços menores repetidamente até que,
eventualmente, será muito tarde para juntar novamente.
Eu poderia muito bem estar olhando para uma maldita bola de
cristal.
Suspiro e cuidadosamente coloco a caneca na mesa de jantar. Minha
mão treme com a ansiedade crescendo dentro de mim. Ryan vai me
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matar. Se ele tentar, dou um tapinha na caneca e ela se desfaz, depois o


esfaqueio na jugular com sua caneca favorita. Poético.
Talvez eu devesse apenas deixá-lo me matar. Embora o bastardo
certamente me faça sofrer primeiro. Não pode ser muito pior do que o
que Billy já fez comigo. E essas serão minhas últimas palavras também.
Ele não era o único a realmente me quebrar.
A porta se abre e ouço os pés de Ryan se movendo pelo chão de
madeira cinza.
— Querida? – ele chama da sala de estar.
Ele parece estar de bom humor. Talvez ele não fique bravo.
Meu corpo sabe que estou mentindo para mim mesma e a ansiedade
piora.
— Aqui. – eu respondo, com o tremor em minha voz proeminente.
Caramba.
A cada passo, minhas mãos tremem mais e ficam mais quentes com
o suor. Eu sento em minhas mãos para diminuir o tremor.
Ele entra na sala de jantar, com o rosto franzido em confusão.
— Por que você está... . – ele faz uma pausa quando vê o meu crime
na minha frente. E as armas do crime estão bem sob minhas nádegas.
Seu rosto fica sem expressão, endireitando-se em uma máscara
perfeitamente calma. A mais assustadora de todas.
— O que aconteceu? – ele pergunta, com sua voz desprovida de
emoção.
Solto um suspiro trêmulo. — Eu estava lavando e escorregou das
minhas mãos. – explico baixinho. Um sorriso hesitante e irregular surge
em meu rosto. — Dá um toque de personalidade, não acha?
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Ele olha para a caneca. Meu coração aperta quando um sorriso se


abre em seu rosto. Não sei o que significa esse sorriso.
— Você se deu ao trabalho de colá-la novamente? – ele pergunta,
com os seus olhos sombrios levantando para encontrar os meus. Um
tremor percorre meu corpo.
— Sim.
— Quanto tempo demorou para você colá-la? – ele pergunta.
Por que, é por quanto tempo você vai me torturar, doce Ryan?
Eu encolho os ombros. — Algumas horas.
Ele caminha até mim e se inclina lentamente. Sinto seus lábios
pressionarem o topo da minha cabeça. Eu não tinha percebido que meus
ombros estavam nas minhas orelhas até que eu os forcei a abaixar.
Prefiro não mostrar como estou nervosa. Homens como Ryan se
alimentam do medo como tubarões em um tanque cheio de sangue.
Suas mãos deslizam pelas minhas costas e pelos meus ombros. Ele
começa a massageá-los e um gemido escapa da minha garganta antes
que eu possa impedir.
— Oi. – ele sussurra suavemente. — Está tudo bem. Acidentes
acontecem. Acho bonito que você se esforçou para consertá-la. – ele
termina a frase com uma risada curta e desliza os dedos pelas
extremidades irregulares.
— Honestamente, me deixa tão feliz que você passou por esse
problema. Eu não pensei que poderia te amar mais.
Eu quero chorar. Aqui estava eu, preparando-me para uma surra, tão
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certa de que ele me bateria. Em vez disso, eu estava apenas sendo


dramática. Se ele não está bravo porque sua caneca favorita quebrou,
então eu não estava dando crédito suficiente a ele.
No fundo, acredito que Ryan me ama. O amor é algo de outro
mundo. Algo totalmente potente e poderoso que te faz fazer loucuras.
Como bater nelas. E ficar quando for atacada. É uma emoção que
ninguém jamais será capaz de definir. Não há como dizer como o amor
deve ser. Uma pessoa pensa que amar alguém significa aceitar suas
falhas, enquanto outra pode pensar que amar alguém significa tentar
ajudá-lo a mudar para melhor. Quem pode dizer quem está certo?
Todos os problemas que tivemos foram parcialmente minha culpa.
Ele não é o único culpado. Claramente, olhar para a monstruosidade de
uma caneca na minha frente prova isso.
— Eu me senti tão mal. – digo, pressionando minha cabeça em seu
abdômen. Sua coluna se endireita quando ele levanta as mãos dos meus
ombros para a minha cabeça, pressionando-me com força em seu corpo.
— Você deveria. – ele sussurra. Minha garganta seca. — Mas você
tentou consertar. É isso que importa.
Uma lágrima escorre do meu olho. Eu aceno com a cabeça e fecho
meus olhos para que nenhum erro passe despercebido. Não quero que
ele me veja tão fraca.
— O jantar está pronto? – ele pergunta.
Meus olhos se abrem, arregalando-se em forma de discos. Ah, meu
Deus. Passei tanto tempo tentando consertar a maldita caneca que
esqueci do jantar. Ele sempre vem para casa para jantar. Ele espera
ansiosamente por isso todas as noites depois de trabalhar na empresa o
dia todo.
Eu limpo minha garganta. — Achei que poderíamos comer pizza
hoje à noite desde que me distrai.
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A mão de Ryan aperta meu cabelo, apertando cada vez mais até
que os fios começam a se soltar. Pequenas alfinetadas pontiagudas
surgem em todo o meu couro cabeludo. Mordo meu lábio para segurar o
gemido.
De repente, ele me solta, deixando minha cabeça girando e meu
estômago embrulhado. — Parece bom, baby. Avise-me quando chegar.
Ele se afasta sem olhar para trás, com o seu corpo se movendo
languidamente para fora da cozinha como se estivesse dando um passeio
à meia-noite na praia.
Outra lágrima escorre. Eu enxugo rapidamente e pego meu celular.
Estou pedindo pauzinhos de canela agora também.

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— Quer me explicar como seu cabelo acabou enrolado no dedo de
Greg Barber? – pergunto, com os meus dedos entrelaçados firmemente
enquanto me inclino para a mulher sentada diante de mim. 'Mulher' é
uma palavra generosa, considerando que ela parece um fantasma meio
morto.
— Quem? – ela resmunga, dando-me um olhar feio.
— Froggy. – digo. O reconhecimento surge em seus olhos castanhos
opacos. É triste dizer que há apenas uma fina camada de vida que separa
os olhos dela dos de Greg.
— Meu cabelo está enrolado... ele está morto? – ela leva três
segundos para concluir por que estou perguntando. Pego as fotos da cena
do crime e coloco na frente dela como resposta. Seus olhos se arregalam
e o horror toma conta de seu rosto. Lentamente, sua mão trêmula pega a
foto que mostra o peito de Greg com a palavra 'Ghost' esculpida nele. A
foto treme em seus dedos pálidos, enquanto a outra mão cobre a boca
aberta. Tinta vermelha colore as suas unhas, quase totalmente lascadas.
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— Você sabe quem faria isso, Srta. Franklin?


Aparentemente, leva um esforço considerável para ela desviar os
olhos para longe da foto e de volta para os meus. A foto cai sobre a
mesa.
— Não.
Só uma palavra. Três letras. E uma grande mentira do caralho.
É normal que as pessoas fiquem chocadas, horrorizadas e até
enojadas com algumas das fotos da cena do crime.
Linda Franklin está tudo isso. Mas ela também está com medo.
Não é normal ter medo do bicho-papão se você acha que ele nunca
virá atrás de você. Parece-me que a profissional do sexo sentada à mesa
em nossa aconchegante sala de interrogatório tem um motivo para estar
com medo.
Amar está parado atrás de mim, com as mãos nos bolsos enquanto
observa Linda.
— Você pode explicar seu cabelo, Srta. Franklin? – Amar pergunta.
Os olhos lacrimejantes de Linda olham para Amar antes de voltar para
as fotos.
— Vou ser presa se contar que dormi com ele? – ela pergunta, com
uma ponta de amargura em sua voz.
— Não. – prometo. Já sabemos que essa mulher é um profissional
do sexo, mas não estamos aqui para prendê-la por vender sexo por
dinheiro.
Ela suspira. — Dormi com ele cerca de um mês atrás. Ele me
pagou. Eu fui embora.
— Você se lembra da data e do local?
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— Eu não sei. – ela se descontrola. — Não anoto no meu


calendário em que dia transei com quem.
— Um palpite, então? – eu pressiono.
Ela bufa. — Talvez no último final de semana do mês passado. Por
volta do dia 25 ou algo assim. No Harper's Motel.
Isso esclarecia, mais ou menos, antes de ele morrer. Teremos que
parar no motel miserável em que eles fizeram sexo e ver se podemos vê-
los em alguma câmera. Identificar todas as localizações em que Greg
esteve que antecederam seu assassinato é importante. Qualquer coisa
nesse período pode nos dar uma pista sobre quem o assassinou e por
quê.
— Essa foi a última vez que você viu Froggy? Ele estava agindo de
forma estranha? Parecia nervoso para você? Ele disse alguma coisa?
Linda começa a balançar a cabeça copiosamente no meio do meu
interrogatório.
— Não, não e não. – ela reclama com irritação. — Não sei nada
sobre ele ou o que ele faz. Ele não disse nada para mim, exceto o que
queria que eu fizesse com ele. Isso é tudo.
— Srta. Franklin, seu cabelo estava enrolado no dedo de Froggy no
dia em que ele foi encontrado morto. Com base no que você acabou de
me dizer, você fez sexo com Froggy não muito antes de ele morrer. Pelo
que sei, as pessoas não guardam o DNA de outras pessoas. Pelo menos
não sem motivo.
— Você está dizendo que eu o matei? – ela pergunta incrédula,
olhando para mim como se eu fosse um completo idiota. Eu me controlo
para não responder a ela. Respiro fundo pelo nariz, controlando minha
frustração.
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— O que estou dizendo, Srta. Franklin, é que você estava em


contato com Froggy logo antes de ele morrer, ou você estava em contato
com o assassino dele, que de alguma forma conseguiu seu DNA. –
explico lentamente. — Ambos os cenários não parecem muito bons para
você.
Ela cruza os braços desafiadoramente e zomba: — Eu gostaria de
um advogado se você continuar me interrogando, Detetive Fitzgerald.
Sim, já estava à espera.

— Fitzgerald!
Eu viro minha cabeça do meu computador para ver Amar vindo em
minha direção, com seu rosto impassível.
— Sim?
— Um homem está aqui. Alega que testemunhou o assassinato de
Greg Barber.
Eu me levanto tão rápido que a cadeira em que estava sentado quase
cai no chão. Ignorando isso, Amar me leva ao que poderia ser nossa
maior pista até agora. Se este homem testemunhou o assassinato de
Greg, há uma boa chance de que ele consiga identificar o Ghost Killer.
A testemunha está de pé com as mãos enfiadas nos bolsos e um
olhar ansioso em seu rosto envelhecido. O cara parece que passou por
uma ou duas guerras. Roupas esfarrapadas e sujas cheias de buracos e
fedor de mijo velho e água de esgoto.
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Observo cada traço em seu rosto, com os meus olhos demorando-se


nos dele. Algo sobre eles me faz parar. Ele está se movendo
ansiosamente, olhando ao redor da delegacia como se estivesse
esperando Freddy Krueger aparecer. Normalmente, os civis encontram-
se num edifício cheio de policiais.
Quando ele me vê, ele para e tira a mão do bolso e a estende para
um aperto de mão. Eu paro. As testemunhas geralmente não tentam
apertar minha mão. Relutantemente, eu estendo minha mão para ele,
com o movimento enviando arrepios na minha espinha enquanto olho
em seus olhos. Ele aperta minha mão uma vez antes de soltar.
— Benedict Davis. – ele se apresenta, com sua voz mais aguda do
que eu teria imaginado.
— Detetive Fitzgerald. Siga-me. – digo, apontando para uma de
nossas salas de interrogatório.
Benedict senta do outro lado da mesa, entrelaçando os dedos
trêmulos frouxamente. Amar reassume sua posição atrás de mim, como
de costume. Algo em sentar à mesa o deixa inquieto.
— Tudo bem, Sr. Davis, eu ouvi dizer que você testemunhou um
assassinato. Você pode me falar sobre isso?
Ele limpa a garganta e se move novamente. — Eu estava a caminho
do posto de gasolina para comprar cigarros na Rua 3 quando ouvi um
barulho. Agora, geralmente não sou de enfiar o nariz onde não deveria,
mas os gritos vindos de uma criança eram difíceis de ignorar. Quatro
homens estavam amontoados sob os trilhos do trem. Dois homens o
seguravam enquanto outro homem encapuzado estava diante deles com
uma arma em uma das mãos e uma faca ensanguentada na outra. Parecia
algum tipo de faca de caça ou algo assim.
— Não consegui ver muito, mas pude ver que o homem gritando
estava coberto de sangue e implorando por misericórdia. O homem
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encapuzado disse algo que não consegui ouvir, levantou a arma e atirou
na cabeça do jovem. Eu corri depois disso, antes que eles pudessem me
localizar.
Suas mãos trêmulas percorrem a sua cabeça nervosamente, muito
parecido com meu próprio tique quando estou frustrado. Seu corpo e
braços estão em constante movimento, e várias vezes ele levanta a bunda
da cadeira como se estivesse se levantando, mas depois apenas se senta
nervosamente. É fisicamente impossível para este homem ficar parado.
— Por que você esperou tanto tempo para relatar isso, Sr. Davis?
Ele zomba, com uma gota de suor escorrendo pelo lado de sua
cabeça. Se ele não estivesse usando uma jaqueta leve, aposto que veria
manchas em sua camiseta. — Porque eu estava apavorado, cara. Corri de
volta para minha casa e basicamente esperei que alguém viesse me
encontrar e me matar em seguida. Eu estava tão paranoico; Não saí de
casa até agora. Achei que se eles estivessem vindo atrás de mim, eles já
teriam me eliminado. Então, vim direto para cá.
Reflito sobre a história dele por um segundo. Isso é consistente com
o local onde nós encontramos o corpo de Greg e também como foi
assassinado. Se a testemunha viu o corpo de Greg no chão e
ensanguentado, ele deve tê-los visto logo após o Ghost Killer esculpir a
palavra no peito de Greg.
— Pode me dizer alguma coisa sobre qualquer um dos homens?
Características, o que eles estavam vestindo, tatuagens, qualquer coisa
do tipo?
Ele passa as costas da mão na testa, escorrendo suor no processo. —
Hum... Hum, sim. O único cara segurando a... a vítima era careca com
algum tipo de tatuagem na parte de trás da cabeça. – ele hesita, com as
mãos tremendo. — Eu estava muito longe para ver exatamente o que
era, mas parecia algum tipo de pássaro.
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Pego a caneta e o bloco da mesa e faço anotações.


— E o homem encapuzado? Alguma coisa sobre ele?
— Parecia que estava usando um relógio de prata. Mas não consigo
me lembrar de muito mais do que isso. Ele estava vestido todo de preto e
o capuz cobria seu rosto.
A frustração borbulha dentro de mim. Nunca pode ser tão fácil
quanto ver o assassino e ser capaz de identificá-lo em uma fila. Ser
capaz de identificar seus capangas é pelo menos um começo. Melhor
que nada.
— Mais alguma coisa sobre os outros homens? – pergunto, olhando
para o meu bloco de notas até as palavras se confundirem.
— O outro cara era loiro e tinha uma pesada corrente de ouro no
pescoço. Como algo que você veria em um membro de gangue. Ele era...
– ele para quando o nervosismo parece dominá-lo. Ele fecha os olhos
com força e passa a mão para frente e para trás no topo de seu cabelo
grisalho em um gesto de pânico.
— Oi, oi, Sr. Davis. Relaxe e leve o seu tempo. Você está seguro
aqui, nada vai acontecer com você.
Ele ri sem humor. — Sim, é o que todos os policiais dizem, cara.
Logo antes de você ser morto.
Inclino minha cabeça ainda mais para tentar encontrar seus olhos.
Quando eu faço isso, procuro por sinais de drogas. Seus olhos estão
ligeiramente dilatados, mas isso pode ser explicado pelo medo. Parece
que ele tem algumas feridas no rosto, mas seu rosto parece ter passado
pelo espremedor. Ele não está se mexendo no momento, mas não estou
descartando completamente o uso de drogas.
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— Sr. Davis, estaria disposto a testemunhar contra os assassinos


quando eles forem presos?
Ele para de se mexer e olha para mim, com seus olhos dilatando
ainda mais.
— E se eles mandarem alguém atrás de mim?
Provável que aconteça.
— Vamos garantir que você esteja seguro. Colocar você na proteção
de testemunhas.
O homem olha para baixo, aparentemente para contemplá-lo. — Há
um assassino à solta, Sr. Davis. O que significa que ele pode vir atrás de
qualquer um a seguir. – digo, enfatizando o meu ponto. Se o Ghost
Killer não for preso, o homem diante de mim também pode ser morto.
Principalmente se estiver envolvido com drogas.
— Tudo bem. – ele concede. — Eu me sentiria mais confortável
com um advogado, no entanto.
Por mais que eu queira recomendar meu pai, sei em que mãos isso
vai acabar inevitavelmente. — Conheço alguém que pode ajudá-lo.
Com essa dor saindo da minha boca.

As vítimas do Ghost Killer se originam principalmente de Shallow


Hill, embora qualquer um pudesse adivinhar isso. Os piores dos piores
residem em Shallow Hill. É um milagre absoluto que alguém como
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River tenha nascido e crescido lá e saído como um ser humano decente.


Isso é impressionante.
Amar e eu revisamos a filmagem de Greg Barker e Linda Franklin
entrando juntos no Harper's Motel e saindo separadamente cerca de vinte
minutos depois.
Não demoraram muito.
Quando Greg saiu, a câmera externa pegou apenas uma parte de um
velho Ford Mustang azul com um espelho lateral faltando, pegando o
garoto e saindo correndo. A placa estava fora de cena, mas um espelho
lateral ausente nesse tipo de carro é bastante reconhecível. Se pudermos
encontrá-lo.
Embora fosse inútil, analisamos todas as queixas nos últimos vinte
anos por acidentes de carro envolvendo um Ford Mustang. Nada
correspondia. As pessoas de Shallow Hill não fazem reclamações com o
seguro do carro quando se envolvem em um acidente.
Foi a mãe de Greg Barker, Cindy, quem nos deu uma pista. Foi a
primeira vez que conseguimos que ela ajudasse na investigação desde o
assassinato de seu filho - perdida demais na dor e na raiva para dar a
mínima para encontrar justiça para seu filho no começo. Agora, quando
perguntamos se ela reconhecia um Ford Mustang com um retrovisor
faltando, ela ficou muito feliz com as informações. Dedurar em Shallow
Hill é uma maneira infalível de acabar morto, mas acho que, do jeito que
ela vê, as drogas vão matá-la logo de qualquer maneira, agora que ela
não tem mais um filho pelo qual viver.
Brian Gill, um homem de 42 anos com uma tatuagem de águia
cobrindo toda a parte de trás de sua careca brilhante. O idiota passou dez
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anos preso por roubo e assassinato em segundo grau. Saiu antes por
bom comportamento.
Cindy também nos disse que o ponto de encontro favorito de Brian
era o bar no centro de Shallow Hill. É um lugar decadente com
prostitutas na rua, prontas para atender, e pelo menos quatro negócios de
drogas em um raio de um quarteirão acontecendo a qualquer momento.
Amar e eu estacionamos na rua em frente ao bar, em um
Oldsmobile4 que cheira a fumaça de cigarro rançoso. Pegamos o carro
emprestado de um amigo de Amar, considerando que qualquer coisa
mais nova do que um carro de 2005 seria identificado como suspeito.
Você não dirige bons carros nesta cidade, a menos que seja um visitante
ou seja o dono da cidade. A última coisa de que precisamos é que
alguém perceba que somos visitantes.
Um lampejo de metal rangendo contra metal, uma chama brilhante e
então uma explosão de fumaça saindo de um cigarro aceso. — Você
realmente tem que fazer isso agora? – eu reclamo, olhando para Amar
com o cigarro pendurado na boca.
Ele encolhe os ombros. — Achei que você teria aceitado o fato de
que vai para casa cheirando a fumaça.
— Pelo que sei, você é o único que vai para casa para alguém que
odeia. – eu resmungo, pressionando o controle para abaixar sua janela.
Deixo-a aberta e observo toda a fumaça começar a sair.
— Ela não se importa muito quando estou vigiando um suspeito. Eu
fico estressado. – ele diz suavemente antes de tragar outra vez.
Minha resposta é interrompida por uma comoção no bar do outro
lado da rua. Nosso suspeito está sendo empurrado para fora do bar por
outro homem, o último gritando na cara do primeiro como se fosse
surdo. Uma briga começa, com os dois se socando como se estivessem
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na escola primária.
Eu gemo, com minha mão indo em direção à maçaneta para apartar
a maldita briga. Antes que eu possa segurar a maçaneta, o homem que

4 Oldsmobile: é o modelo de um carro.


empurra Brian saca uma arma da parte de trás da calça e aponta para a
cabeça de Brian.
Amar e eu avançamos simultaneamente, lutando para abrir nossas
portas.
Pop. Pop.
Minha cabeça se volta para a cena, com meu corpo a meio caminho
para fora do carro. Amar e eu paralisamos, absolutamente atordoados
com a rapidez com que tudo deu errado.
— Algum idiota acabou de matar nossa maior pista até agora? –
pergunto sem fôlego.
— Porra. Isso é exatamente o que acabou de acontecer.
Eu soco o volante, provocando um sinal sonoro patético no carro. É
abafado pela gritaria alta que está acontecendo agora que uma pessoa
acabou de ser assassinada ali mesmo na rua.
Furiosamente saindo do carro, Amar e eu atravessamos a rua para
ajudar um Brian muito morto. A metade superior de sua cabeça se foi,
deixando olhos sangrando e cegos olhando para o céu noturno enquanto
outra prostituta é pega para um boquete rápido.
Solto outro suspiro. — Quer apostar que ele não foi apenas
assassinado pelo Ghost Killer? – pergunto, com o sarcasmo cobrindo
minhas palavras.
Amar bufa sem humor. — Prefiro apostar a que horas vamos chegar
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em casa hoje à noite.


— Meia-noite. – eu aposto.
Outra bufada. — Uma e meia da manhã.
— Você sabe que as testemunhas não precisam de advogado, certo?
– Ryan pergunta condescendentemente. É preciso muito esforço para
manter meu punho encostado na mesa e não enfiar fundo na boca de
Ryan.
— Ele pediu um. – eu respondo brevemente, ignorando seu tom.
Não fui para a cama até tarde da noite passada e cinquenta dólares a
menos.
— Faz um ano. Talvez seja hora de passar isso para alguém mais
qualificado. – ele diz. Eu belisco a ponta do meu nariz, com a minha
frustração aumentando e a paciência se esgotando em níveis alarmantes.
— Ryan. Apenas se apresente para a porra do seu cliente e saia da
minha vista. – eu resmungo. Não que ele vá ficar assim por muito
tempo. Minha manhã vai ser passada naquela sala de interrogatório com
o Sr. Davis e seu advogado novinho em folha revisando cada detalhe
daquela noite e providenciando proteção a testemunhas.
Com alguém como o Ghost Killer, você nunca pode estar muito
seguro.
Ryan sai furioso de perto de mim e por alguns segundos gloriosos,
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eu abraço a solidão. Este também é um ótimo momento para tomar


café. Eu dormi mal ontem à noite - o pouco que eu dormi. Com Brian
morto, o caso esfriou novamente.
Um homem foi morto porque um namorado ciumento teve um
ataque de raiva quando viu sua namorada esfregando a bunda no pau de
outro homem. Uma razão estúpida para morrer. Brian já fez coisas muito
piores para as pessoas por muito menos. Não é como se não merecesse o
que estava acontecendo com ele, mas eu preferiria que ele passasse o
resto de sua vida preso do que assassinado na rua por causa de uma
garota fogosa.
Mais tarde, Amar e eu faremos outra viagem para ver a mãe de
Greg, Cindy, para ver se podemos obter mais informações dela. Talvez
sobre o outro homem envolvido no assassinato de Greg, o homem com a
corrente de ouro no pescoço. Agora que está falando, ela provavelmente
tem muito mais informações na manga que ainda não divulgou.
O relatório policial da noite passada se amassa na minha mão. Este
caso não é um beco sem saída. Estou chegando mais perto. Mas o Ghost
Killer ainda parece fora de alcance, tocando a ponta dos meus dedos, me
provocando.
— Você está bem, cara? – Meu parceiro pergunta, tirando-me dos
meus pensamentos. Nem o vi vir até mim.
— Sim. – eu suspiro, esfregando os olhos com o dedo indicador e o
polegar, na esperança de me acordar. Tudo o que consigo fazer é deixar
minha visão embaçada e me dar dor de cabeça.
Amar não parece muito melhor do que eu. Com olheiras sob os
olhos, rosto franzido e uma careta eterna. Ele está tão frustrado com este
caso quanto eu.
— Estou pronto para que essa merda acabe, cara. – eu suspiro,
tomando outro gole de café morno. Faço uma careta com o gosto
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amargo.
— Ele está bem ao nosso alcance, eu posso sentir. – diz Amar,
enfiando as mãos nos bolsos e olhando para longe.
— Eu também. Eu só gostaria de saber o quanto perto.
A luz brilhante da tela da televisão é a única fonte de luz na casa
escura. Dormência tem um ruído. Quase como um barulhinho, mas mais
alto. Parece um zumbido, uma colmeia de abelhas fervilhando na minha
cabeça até que todo o resto seja abafado, exceto o caos dentro de mim.
Meus olhos estão vazios, olhando para o nada, incapazes de
processar o filme passando na minha frente. Não tenho ideia de quanto
tempo estou parada na frente da tela, destruindo ativamente meus olhos
enquanto tento abrir caminho para sair da névoa. Alguém poderia estar
totalmente nu e fazendo polichinelos na minha cara, e eu não notaria.
Não quando tudo o que posso sentir, ouvir e ver é dormência total.
Está até na minha língua, deslizando pela minha garganta e entrando nas
minhas entranhas, envolvendo cada órgão até parecer que sou apenas um
saco de cadáver oco, sem nada dentro de mim além do vazio.
Eu preciso... não sei do que preciso. Eu preciso de algo.
Talvez sair desta casa. A opressão é uma coisa viva e pulsante
quando só tenho permissão para sair para a aula. Faculdade e direto para
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casa. Não tenho permissão para ficar na biblioteca para estudar, e


grupos de estudo estão fora de questão. Quem se importa se minhas
notas caem? Ser uma mulher de carreira não está no meu futuro. Não
quando eu tenho... ele para cuidar de mim.
Amar-me. Mimar-me. Me foder.
Magoar-me.
Uma piscada lenta e o mundo lentamente começa a surgir. O
zumbido na minha cabeça se acalma, as abelhas se acalmam. Mas a
dormência não se dissipa. Parece que a heroína está corroendo minhas
entranhas. Nunca será indetectável.
Meus pés estão me levando para o escritório de Ryan antes que eu
possa processar o que estou fazendo.
Eu preciso sair.
Eu preciso sair.
Eu preciso sair.
Eu preciso sair.
Assim que levanto minha mão para bater na porta do escritório de
Ryan, sua voz é escutada. Ele parece animado. Feliz. Nunca o ouvi soar
tão... jovem.
— ... Eu sabia que era ele. Quero dizer, era tão óbvio com a maneira
como ele estava agindo... Eu sei que não posso acreditar que ele também
não descobriu... Não, eu não estou dizendo nada a ele ainda. Ainda estou
resolvendo mais algumas coisas primeiro, veja quais benefícios posso
tirar disso... Vou, cara, ligo para você assim que der a notícia, vamos
tomar uns drinks para comemorar…
Ouvir como Ryan soa feliz me relaxa e ao mesmo tempo me
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entristece. Ele não parece tão feliz comigo no que parecem anos. Não
desde o primeiro ano de nosso relacionamento, quando quase nunca
brigávamos.
Não importa, pelo menos peguei Ryan de bom humor.
— Querido? – eu chamo enquanto bato gentilmente na porta um
momento antes de abri-la. Ele olha para cima de seu computador com
aborrecimento, com nenhum traço de seu bom humor em qualquer lugar
de seu rosto. Achei que ele ainda estaria feliz, mas o trabalho ainda deve
estar estressando-o mais do que eu pensava. Aparentemente, ele tem
lidado com um cliente difícil nos últimos dias. Ele não fala sobre
trabalho comigo, mas eu o ouvi reclamando com alguém no telefone que
ele ficou preso com um viciado que não consegue calar a boca.
Seu pai o faz aceitar um caso gratuito por ano, e ele não está muito
feliz em trabalhar com um viciado em drogas. Ryan despreza qualquer
um que usa drogas.
— O que eu disse sobre me interromper? – ele exige bruscamente.
A ansiedade toma conta de mim, interrompendo o bréu por tempo
suficiente para me fazer questionar por que estou aqui. Aperto a
maçaneta em minha mão com mais força para cessar qualquer tremor,
com o metal em minha mão ficando escorregadio de suor.
— Sinto muito. – eu me apresso para me desculpar. — Eu só queria
que você soubesse que eu iria me encontrar com Amelia.
Eu nem sei se Amelia está disponível. Não importa. Se ela não
estiver, passarei a noite em meu espaço seguro.
Ele se recosta na cadeira e observa meu corpo. Meus olhos também
abaixam, tentando ver o que ele vê. Uma camiseta folgada com minha
universidade exibida na parte superior com o mascote do nosso time - e
tenho certeza de que é uma mancha de ketchup - até minha calça de
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moletom larga. Não é meu estilo habitual, mas achei que seria uma
briga a menos entre Ryan e eu. Amelia não se importa com o que eu
visto, quem se importa se ela não ficar impressionada?
Ryan levanta uma sobrancelha para a minha roupa.
— Você sairia assim? – ele diz com desdém, olhando para mim
como se eu fosse um bife cozido demais em seu prato. Ryan gosta de
sua carne sangrando.
Eu me mexo. — Sim? Eu só iria passar um tempo na casa dela. Não
faremos nada de especial. – eu espero que sele o acordo. Uma noite
tranquila com minha amiga. Sem clubes, bares ou qualquer lugar público
realmente. Nem Walmart.
Ele zomba, cruzando os braços sobre o peito e virando um olhar feio
na minha direção. — Você iria sair com ela e David. Outro homem.
Minha sobrancelha abaixa em confusão. — David é o marido dela.
Por que isso importa?
— Por que isso importa? – ele repete condescendentemente. —
Porque você estaria saindo com outro homem sem mim por perto. Por
que precisa ser explicado como isso é desrespeitoso comigo?
Minha mão desliza da maçaneta e agarra a barra da camiseta. Eu
olho para baixo e para longe de seus olhos. Como uma covarde. A parte
inferior da minha camiseta desliza entre meus dedos enquanto tento
formular uma resposta que não o aborreça ainda mais.
— Não. Só pensei que você confiasse em mim.
Um sorriso sarcástico surge em seu rosto. O azul em seus olhos
quase desapareceu, em vez disso há uma cor tão turva e escura que mal
reconheço mais o homem à minha frente. Acho que não o reconheço há
muito tempo. Ou talvez ele esteja finalmente tirando a máscara e
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revelando quem ele realmente é. Quem ele tem escondido esse tempo
todo.
Já se passaram seis semanas desde que voltei para casa para Ryan. E
seis semanas desde que ouvi ou falei com o Mako. Parece que ele
finalmente desistiu de mim, e isso me deprime tanto quanto me alivia. É
uma coisa a menos com que tenho que me preocupar agora. Mas eu sinto
falta dele.
— Você não vai. – ele diz depois de uma pausa.
Quando diabos eu pedi?
As palavras quase escapam, mas mantenho o comentário preso atrás
de meus dentes cerrados, pesado em minha língua. Se escapar, ele pode
tentar cortá-la.
Depois de um momento controlando meu temperamento explosivo,
pergunto: — O que você quer dizer?
— Amelia é uma má influência para você. Não confio nela. – diz.
A camiseta passa por entre meus dedos de forma mais agressiva
enquanto muitas emoções para nomear surgem dentro de mim. Acho que
não precisava me preocupar em me sentir entorpecida quando Ryan é
um mestre mágico em trazer emoções para fora de mim. A raiva é mais
proeminente, mas logo atrás dela está o pânico. Amelia é a última pessoa
que posso perder. Ela esteve comigo em tudo - desde que escapei de
Shallow Hill e comecei a traçar meu próprio caminho na vida. Amelia
tem sido a mão que me guia durante alguns dos anos mais assustadores
da minha vida. Se alguém é a má influência, sou eu.
— Não, ela não é. – eu nego fracamente. Ele resmunga do fundo do
peito, olhando para mim com olhos diabólicos. Estou a três metros dele,
mas ainda sinto a necessidade de me afastar. Eu odeio que ele tenha esse
efeito sobre mim.
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— Você pode não discutir comigo pelo menos uma vez? Quando
vai perceber que estou apenas tentando fazer o que é melhor para você?
— Você está tomando uma decisão por mim. – eu argumento. —
Você nem conhece Amelia.
— Eu a conheço bem o suficiente para saber que ela é uma vadia
louca por garotos. Ela não se esforça para me incluir em nada, o que só
me diz que ela não me quer por perto. E a única razão pela qual ela não
me quer por perto é para poder influenciar você.
Minha boca cai aberta. Amelia já tentou convidar Ryan para muitas
coisas antes, mas sempre ignorei. Eu realmente não sei por quê. Nas
poucas vezes em que Ryan e Amelia ficavam juntos, David era
superdoce e sensível, enquanto Ryan sentava-se rigidamente ao meu
lado e desprezava tudo o que eles faziam. É honestamente embaraçoso.
Mas agora, suponho que Amelia não iria querer Ryan por perto, não
depois da maneira como ele me tratou. Amelia guarda mais rancor do
que qualquer pessoa que já conheci. Ela nunca mais aceitará Ryan, e
esse pensamento me deixa incrivelmente triste. Inevitavelmente, isso
colocará uma barreira entre nós. Ryan é meu futuro, não sei como vou
manter uma amizade com ela quando eles se odeiam.
— E nós nos esquecemos do seu pequeno acesso de raiva? Quando
você me deixou por uma semana e Amelia se recusou a me deixar vê-la?
Não tenho respeito por alguém assim.
Quer dizer quando você me deixou em uma poça de mijo e depois
fodeu sua secretária? Aquele acesso de raiva?
Ele continua, fazendo-me sentir cada vez menor. — Eu deixo você
morar aqui sem pagar aluguel. Você não paga nada e eu lhe dou tudo o
que pede. O mínimo que você pode fazer é reconhecer o fato de que tudo
que já fiz foi cuidar de você. Isso é o que estou fazendo agora. Eu só
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estou pensando no seu interesse.


— Mas... – eu paro, sem saber o que dizer. Quanto mais discuto,
mais irritado ele fica. Não quero que ele fique com raiva de mim.
Quando ele fica com raiva, ele fica violento.
— Estou tentando trabalhar, River. Você sabe, para que eu possa
pagar as contas?
Eu me encho de vergonha. Não tenho emprego e ele me sustenta
totalmente. Nunca pedi isso a ele. Ele exigiu que eu deixasse o meu
emprego para poder me concentrar na faculdade, e fui tão cortejada por
alguém realmente cuidando de mim pela primeira vez que eu concordei.
Agora eu me sinto como uma parasita. Ele faz tanto por mim, e não
faço nada por ele, exceto dar-lhe sexo sempre que ele pede. O mínimo
que posso fazer é ficar em casa quando ele me pede, mesmo que suas
opiniões sobre Amelia sejam completamente equivocadas.
— Ok, vou ficar em casa. – eu cedo.
— Eu não quero que você a veja mais. Nunca mais.
Eu não discuto. Não sei se posso cumprir com isso. Eu ainda não
estou pronta para desistir de Amelia. Ela é a minha melhor amiga.
Aparentemente, só vou ter que ser mais sorrateira sobre isso. A tristeza
me domina com o pensamento. Não quero mentir para Ryan. Mas não
quero perder ainda mais minha amizade.

Amelia me liga vários dias depois. Ryan está bebendo com os seus
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amigos. Amigos que eu nunca conheci ou ouvi falar antes. Quando


perguntei quem eram, ele disse que eram alguns caras do trabalho e não
deu nenhuma outra informação. Não querendo pressionar, eu não disse
mais nada e ele não se incomodou em me convidar.
— O que você está fazendo? – ela diz docemente quando atendo
meu celular.
Fico olhando para a TV na minha frente enquanto as mulheres ricas
reclamam de suas vidas e falam merda pelas costas umas das outras. O
brilho da televisão é o único farol de luz na sala de estar escura. Estou
deitada em nosso enorme sofá de couro com uma montanha de
cobertores e travesseiros em cima de mim e uma taça de vinho ao meu
lado.
— Apenas assistindo um programa ruim. – digo, tentando manter
qualquer melancolia fora do meu tom. Não quero que ela ouça como
estou deprimida por ficar sozinha em casa enquanto meu namorado fode
e fica bêbado com amigos desconhecidos.
E provavelmente em um clube de striptease, penso com amargura.
— Venha aqui. – ela diz. — Eu e David estamos fazendo tacos de
frango e margaritas. Bem, minha margarita será virgem, porque esta
vagina definitivamente não é.
Sorrio com suas palavras vis. Isso soa muito incrível. Minha boca
quase saliva com o pensamento.
Então, toda a fome seca minha boca a ponto de quase me sufocar
quando a conversa do escritório de Ryan volta. Suas exigências para que
eu fique longe de Amelia. Para nunca mais vê-la. Um suor frio surge em
minha testa enquanto invento várias desculpas para sair de casa. Estou
proibida de ver Amelia e minha mãe, as duas únicas pessoas na minha
vida. Não tenho outros amigos - pelo menos não alguém que eu pudesse
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ver e não parecesse suspeito para Ryan por que de repente estou saindo
com alguém que nunca sai antes.
— Não sei, Amelia. Eu teria que perguntar a Ryan. – digo antes de
prender meu lábio inferior entre os dentes e mordê-lo em carne viva.
Ela fica em silêncio por um momento. — Ele está em casa? Ele
pode vir. – ela sugere docemente, o que só serve para me fazer sentir
pior. Aqui está ela, fazendo um esforço para convidar alguém que
provavelmente detesta. Não perguntei como ela se sente em relação a
Ryan agora, e acho que não vou perguntar. Não estou pronta para ouvi-
la dizer o quanto ela acha que ele é ruim para mim.
— Ele saiu com alguns amigos. – admito.
— Então tenho certeza que ele não se importaria de você sair com
sua melhor amiga do mundo, certo?
Minha boca se abre, prestes a falar a verdade e dizer a ela que não
posso mais vê-la. As palavras param, mas também a minha desculpa que
se segue. Ryan está fazendo sabe-se lá o quê com quem sabe com que
pessoas, e eu tenho que ficar em casa e fazer... nada?
Olho para Bilby descansando em seu lugar atrás de mim, cochilando
confortavelmente. Como se sentisse meu olhar, ele abre seus olhos
dourados - olhos que me atraíram para ele para começar porque eles se
parecem exatamente com os meus - e mia baixinho para mim, como se
ele estivesse me dizendo uma palavra.
Vá.
— Eu só poderia ficar por algumas horas. – eu me resguardo. Vou
passar lá e voltar antes que Ryan chegue em casa.
Ele me disse para não esperar por ele antes de me dar um beijo de
despedida. Da última vez que ele saiu com os amigos, só voltou para
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casa às duas da manhã. São apenas sete horas agora. Estar em casa às
dez ou onze me daria bastante tempo para me deitar de pijama e agir
como se nada tivesse acontecido.
— O... ok, bem, o jantar estará pronto em quinze minutos. – ela
responde, vacilando em suas palavras como se estivesse confusa. Acho
que nunca me dei um toque de recolher antes.
— Ok, estou a caminho.
Desligo e corro escada acima para vestir uma legging e uma
camiseta universitária de manga comprida. Nada muito chamativo e
revelador. Está 30 graus lá fora agora, mas as palavras de Ryan estão
presas na minha cabeça.
Você se veste como uma prostituta para que os homens olhem para
você.
Escovar meu cabelo e colocar uma maquiagem leve leva dois
minutos antes de eu sair pela porta e dirigir.
Minhas mãos tremem e a adrenalina corre em minhas veias. Estou
saindo furtivamente de casa para ver minha melhor amiga. Minha
melhor amiga que nunca fez mal a ninguém em toda a sua vida. Alguém
que não merece ser banida por mim como se fosse uma vagabunda
desviante, quando a única que age assim sou eu.
Eu franzo a testa. Não é de admirar que Ryan fique bravo comigo.
Estou sempre mentindo e me escondendo dele. Ele não confia em mim,
e ainda não estou dando a ele um motivo para isso. Ainda assim, não
viro o carro.
Embora desobedecer às exigências de Ryan envie doses altamente
tóxicas de ansiedade em minhas veias, não vou perder tempo com minha
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melhor amiga - e especialmente não com tacos de frango e álcool.


Entrar na casa de Amelia e David sempre me traz uma sensação de
paz e acolhimento que não consigo encontrar em nenhum outro lugar,
embora a casa de Julie e Matt chegue perto. A casa de Amelia é menor,
aconchegante e bem habitada.
Sua arte decora as paredes, por insistência de David. Amelia é
humilde demais para exibir sua arte em sua própria casa, mas David não.
Ele sempre foi um de seus maiores apoiadores, ao meu lado, é claro. Se
eu não conhecesse tão bem a arte de Amelia, pareceria uma fotografia
profissional impressa e pendurada em uma galeria.
Amelia é especialista em pintura realista. Ela passa meses e meses
em uma pintura, aperfeiçoando-a até parecer que você está olhando para
uma fotografia real de alguém. Seu talento é absolutamente de tirar o
fôlego.
Ela já apareceu em algumas das principais galerias de arte de Los
Angeles e tem sua arte pendurada nas casas de várias celebridades. No
mundo da arte, ela é muito importante, mas você nunca saberia olhando
para ela ou para a casa dela. Crescer sem nada humilhou Amelia, e ela
está perfeitamente feliz vivendo como se fosse de classe média. Mesmo
que milhões de dólares estejam em sua conta bancária.
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— Oi, meu amor! – Amelia cumprimenta em voz alta, correndo


para me abraçar. Eu a vi na semana passada, mas parece que já se
passaram meses. Normalmente, ficamos paradas depois da aula por
algumas horas antes de seguirmos caminhos separados. Nós não tivemos
a chance de realmente nos visitar por muito tempo.
David se aproxima para me abraçar em seguida. David é um cara
corpulento de um 1,84m, com uma barba grande, olhos azuis celestes e
uma voz áspera. Ele também é um ursinho de pelúcia absoluto e não
faria mal a uma mosca. A menos que aquela mosca estivesse tentando
matar Amelia ou algo assim - então ele mataria a mosca lentamente. Ele
é atraente de uma forma que cresce em você quanto mais você olha para
ele e o conhece. Você não notaria alguém como David imediatamente,
mas uma vez que ele chama sua atenção, torna difícil desviar o olhar.
— Oi, River. – ele diz em voz baixa. Lágrimas surgem em meus
olhos quando os braços de David me envolvem. Ele é meu amigo há
tanto tempo quanto Amelia, e sempre abraçou muito bem. É quente e
seguro em seus braços e não sinto isso há muito tempo. David sempre
foi bom para mim, mesmo quando eu agia de forma imprudente. Em vez
de me julgar como a maioria das pessoas faria, ele me ofereceu um
ombro para chorar e um ouvido para ouvir.
Acho que não poderia ter escolhido pessoa melhor para Amelia
passar o resto da vida.
Antes que possa começar a chorar como um bebê e me envergonhar,
eu o aperto com força e me afasto de seus braços. Se Ryan soubesse que
abracei David, ele ficaria com muita raiva de mim. Meu coração cai em
uma poça de ansiedade repousando em minha barriga e outro franzido
ameaça vir à tona em meus lábios. Estou sempre desafiando Ryan e
depois me pergunto por que ele não confia em mim.
Que estupidez, River. Eu nem deveria estar aqui.
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Assim que me afasto de David, Amelia está voltando com uma


enorme margarita na mão.
— Melancia? – pergunto, forçando um sorriso no meu rosto. Não
posso deixar que me vejam chateada. Eles vão fazer perguntas que eu
não sei responder.
— Você já sabe disso. – ela diz revirando os olhos. A de melancia é
a minha preferida, assim como a minha melhor amiga. Ela sempre se
lembra.
Aceito a bebida com um grande sorriso e bebo um quarto dela de
um só gole.
— Acalme-se. – David adverte ligeiramente, com um brilho
divertido em seus olhos.
Levanto uma sobrancelha e tomo outro grande gole. — Não posso
me acalmar, meu amigo, não posso.
Ele ri e me deixa em paz. David sabe que eu aguento bebida melhor
do que qualquer homem que ele conhece. Ele testemunhou a merda que
eu enfrentei e ainda sendo capaz de andar em linha reta no final da noite.
E Amelia sempre comprava café da manhã na manhã seguinte porque
ela vomitava primeiro.
No fundo da minha mente, sei que seria inteligente seguir meu
ritmo. Não posso ficar bêbada porque tenho que dirigir até em casa.
Amelia e David estariam mais do que dispostos a me oferecer o quarto
extra, mas Ryan ficaria louco se voltasse para casa e encontrasse uma
namorada mentirosa desaparecida. Com esse pensamento em mente,
tomo um gole mais devagar e me empanturro com os melhores tacos de
frango que já comi.
O que Ryan não sabe, não pode me machucar.
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A luz forte ataca meus sentidos, atingindo minhas pálpebras de
vermelho tomate. Lentamente, eu os abro, colocando uma mão sobre
meus olhos para aliviar a dor.
— O que é isso? – murmuro. Quando minha visão se concentra, um
Ryan calmo e impassível está parado na porta, com o dedo no
interruptor de luz. Eu apenas o encaro, confusa com a luz repentina e o
olhar frio em seu rosto.
É de manhã cedo, o sol mal apareceu no horizonte. A turvação ainda
confunde meu cérebro, mas não é preciso ser um gênio para descobrir
que algo está errado.
— O que foi? – eu grito. Eu faço uma careta, franzindo meus lábios
em desgosto quando percebo como minha boca está nojenta.
Arrasto-me para sentar, o cobertor cai de meus seios nus.
Levantando o cobertor revelo o resto do meu corpo nu. Um franzido
contrai os meus lábios, confusa como fiquei nua. Fui para a cama de
pijama.
Uma rápida olhada para o chão resolve esse mistério. Ele está ao
acaso ao lado da cama. As alças da minha regata estão arrebentadas em
uma das extremidades. Minha calça está cortada ao meio. Nenhuma
delas estava rasgada. Eu lentamente observo o quarto, notando a tesoura
na mesinha de canto, junto com uma garrafa de água com um resíduo
branco no gargalo.
Quanto mais vejo, mais horrorizada fico. Apressadamente, empurro
os cobertores novamente para ver o sêmen seco na parte interna da
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minha coxa.
— Fizemos sexo? – pergunto, embora a resposta esteja atualmente
me dando um tapa na cara. Eu deveria ter perguntado, você me
estuprou?
A mandíbula de Ryan contrai. — Você quer dizer que não se lembra
de mim transando com você?
Odeio quando ele responde a minha pergunta com outra pergunta.
Olho para a garrafa de água com a substância suspeita seca dentro
dela. Ele nota minha expressão. Um sorriso sinistro aparece em seu rosto
frio. Não há outra emoção na ação além de diversão amarga.
— Não preciso drogar minha namorada para dormir com ela. – ele
diz com amargura, adivinhando minha linha de raciocínio.
Mas você drogou, doce Ryan.
— É Alka Seltzer. Tive uma forte dor de cabeça ontem à noite por
causa da bebida. – ele explica secamente. A vontade de pegar a garrafa e
cheirá-la é avassaladora, mas isso só pioraria a situação. Ele já está
irritado com alguma coisa. Algo que não tem nada a ver com meu corpo
devastado ou com a porra de uma garrafa de água.
Quando apenas o encaro, ele finalmente caminha em minha direção
até ficar parado ao pé da cama. A posição me deixa vulnerável. Eu me
sinto em desvantagem. Nua, confusa e... dolorida. Muito dolorida.
Se não fosse pelo dragão cuspidor de fogo olhando para mim, eu
procuraria por hematomas.
Calmamente, pergunto: — Há algo errado?
— Onde você esteve ontem à noite?
Meu coração parece uma pedra caindo em um poço. Ele cai tanto
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que temo tê-lo perdido em algum lugar na boca ácida do meu estômago.
No entanto, posso senti-lo bombeando em um ritmo alarmante, com a
adrenalina correndo em minha corrente sanguínea.
— O que você quer dizer? – eu pergunto, com a minha voz
surpreendentemente equilibrada.
— Não se faça de idiota comigo, River. – ele resmunga. Ele aperta o
edredom com a mão e o arranca do meu corpo. Minhas tentativas de
segurar o cobertor são em vão. Instintivamente, cubro meu corpo nu,
curvando minhas pernas contra meu peito de forma protetora.
— Diga-me do que diabos está falando, Ryan. – eu exijo, forçando o
aço em minha espinha. Parece que acabei de esvaziar uma seringa cheia
de gelatina na espinha.
Como é que enfrentei homens grandes e assustadores desde o início
da minha existência, mas esse homem ainda consegue provocar o medo
em mim? Ele é muito menor do que muitos dos homens que enfrentei na
minha vida.
— Você foi à casa de Amelia ontem à noite. – ele diz, com seu peito
começando a arfar com raiva crescente.
Porra, como diabos ele sabe disso? A raiva soca meu peito. Demora
dois segundos para descobrir. O filho da puta me rastreou. Ele está
rastreando meu maldito celular para ver onde estou.
— Como você sabe disso, Ryan? – pergunto, com minha voz ainda
enganosamente calma. Não gosto que minha privacidade seja violada.
Recebi tão pouco dela durante toda a minha infância - ou melhor,
absolutamente nada dela. É preciosa para mim. Sagrada.
Ele sorri para mim, provavelmente notando minha raiva crescente.
O tremor começa nas pontas dos meus dedos, subindo pelos meus
membros e pelo resto do meu corpo como um raio viajando ao longo de
um poste de metal.
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Que curioso. Ele gosta que eu esteja com raiva.


Você quer uma reação de mim, doce Ryan?
Eu me levanto da cama de uma só vez, ficando diante dele em toda
a minha nua e puta glória.
— Por que você iria me rastrear?
— Você obviamente me dá motivos para isso. – ele responde
simplesmente. — Você está desviando do seu erro. Em vez de se
concentrar no que você fez, você está tentando jogar tudo de volta em
mim. Em vez de assumir seu erro e admitir que errou, você prefere
tentar agir como se eu estivesse errado.
— Você está! – grito, dando um passo em direção a ele. Seus olhos
escurecem enquanto a maldade cruza seu rosto. Ele dá três grandes
passos em minha direção, ficando bem na minha frente. Uma mão estica,
envolvendo a minha garganta e apertando.
Minhas unhas arranham suas mãos enquanto ele range os dentes. —
É melhor ver como diabos fala comigo. Você me desobedeceu ontem à
noite, River. Eu disse estritamente para ficar longe daquela prostituta, e
você não ouviu. Garotas más são punidas. E quando você terminar de ser
punida, vou pegar seu celular. Você pode tê-lo de volta quando agir
corretamente.
Antes que eu possa cuspir na cara dele, ele está me virando e
pressionando meu rosto na cama. Luto contra seu aperto implacável.
Quanto mais reajo, mais forte seu aperto aumenta. Ele pega meus dois
pulsos com uma mão, enquanto usa a outra para empurrar minha cabeça
no colchão.
Abro a boca para soltar um grito, mas o som é abafado pela cama. A
batida do meu coração é forte em meus ouvidos, abafando todos os
ruídos que preciso ouvir agora. Se eu tivesse me acalmado, seria capaz
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de ouvir o farfalhar de roupas quando ele deixa cair o short de basquete


que estava usando.
Eu teria sido capaz de me preparar para o deslizamento de seu pau
contra a fenda da minha bunda. Ele solta minha cabeça o suficiente para
cuspir em sua mão e molhar seu pau. Eu uso esse tempo para gritar a
plenos pulmões.
Um soco na minha nuca quase me deixa inconsciente. Meus gritos
são interrompidos enquanto as estrelas surgem em minha visão.
Não há nada que poderia ter me preparado para a sensação de seu
pau entrando em mim. Dentro da minha bunda.
A queimação detona a partir dessa área para o resto do meu corpo.
Outro grito é arrancado da minha garganta, este involuntariamente. Ele
não me dá atenção, continuando a me sodomizar. Sua mão volta para
minha cabeça, me empurrando para baixo tanto que os meus gritos estão
começando a me sufocar.
A dor é tão intensa que não consigo ver ou sentir nada além dele.
Estou sufocando lentamente, e não consigo nem sentir o pânico quando
o pau dele está provocando tanta dor na minha bunda. Minha visão
embaça conforme a dor se intensifica. Suas estocadas ficam instáveis
conforme a excitação toma conta de seu corpo. Está permeando o ar.
Ele está amando isso.
E enquanto ele geme alto, estremecendo seu corpo enquanto goza
dentro de mim, tudo o que posso contemplar é a ferramenta que usarei
para enfiar em sua bunda quando ele menos esperar.
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Sinto sua presença primeiro. Forte e inebriante. Como o cheiro de
um marcador quando está debaixo do nariz. É quase irônico quando vejo
o referido marcador na minha frente, interrompendo meus passos.
Com um bufo irritado, eu olho para a mão dele segurando o
marcador. Suas mãos são enormes. Dedos longos e grossos e calos nas
juntas dos dedos. Suas tatuagens espreitam naquelas mãos, com as cores
desaparecendo em seu pulso.
Quero tocá-los. Aposto que são ásperos. Aposto que pareceriam tão
bem dentro de mim.
— Vá embora. – digo, afastando sua mão da mesma maneira que
afasto aqueles pensamentos obscenos. Asperamente e com desgosto
indisfarçável. Eu levanto meu queixo e retomo minha caminhada até o
carro.
O marcador me para de novo. Com raiva, arranco a caneta de sua
mão e a jogo a seus pés. Vibrações atingem minhas entranhas quando
meus olhos encontram os dele. Eu odeio me sentir atraída por ele. Eu
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odeio que eu senti falta dele.


— O que você quer, Mako? – eu exijo, olhando para ele.
— Eu quero que você use isso. – ele diz em voz baixa, com sua voz
de barítono chegando até mim. Toda vez
Eu levanto uma sobrancelha. — Usar em quê?
Ele desvia os olhos para a minha mão. — Quando se sentir insegura,
quero que o use para desenhar um círculo em sua mão. A maioria das
pessoas que trabalham com atendimento ao cliente sabe o que isso
significa.
Eu não posso evitar. Eu rio.
— Está brincando, não é? Não estou desenhando nada na minha
mão. Não me sinto insegura.
Mentirosa. Você estava se escondendo na casa dele alguns meses
atrás porque se sentia insegura.
Eu me mexo, estremecendo sutilmente com a dor em minhas costas,
apesar de duas semanas terem se passado desde aquela noite. Eu fui
rasgada de uma forma que uma pessoa nunca deveria ser. Desmaiei
depois de alguns minutos. Quando acordei, fui deixada na cama nua e
meu celular sumiu.
Por uma semana inteira, ele se recusou a devolver meu celular.
Levei dois dias para perceber que lutar contra ele não me daria acesso ao
meu celular. Então, comecei a ser boa. Eu escutei. Amei-o, embora
sentisse que ele não merecia. E voltei a ser uma garota dócil e irracional.
Naquele fim de semana, ele me preparou um banho de espuma
quente com rosas e vinho. Ryan sentou-se atrás de mim, chorando em
meu ombro, pedindo perdão.
Não foi até que a água esfriou que eu disse a ele que o perdoava.
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Ele estava tão quebrado, soluçando até não conseguir respirar. Não
demorou muito para que eu estivesse chorando com ele. Ele jurou que
isso nunca mais aconteceria. Ele tirou o rastreador do meu celular bem
na frente dos meus olhos, me devolveu e prometeu melhorar. Ter meu
celular e minha privacidade de volta foi o que acabou com minha
determinação. Nunca vi Ryan tão chateado na minha vida, então sabia
que ele deveria estar realmente arrependido pelo que fez.
Os olhos de Mako escurecem em um verde musgo. Assim como seu
irmão. Tudo fica escuro quando eles ficam com raiva. É como se a
sombra maligna que habita dentro deles viesse à tona.
Ele acena com a cabeça lentamente, com uma mecha de cabelo
caindo em sua testa. Meus dedos latejam com o desejo de afastá-la de
volta. Curvando-se, ele pega o marcador. Então ele se aproxima de mim,
trazendo seu corpo alinhado com o meu. Com a respiração suspensa, não
ouso desviar o olhar de seus olhos, mesmo quando ele envolve o braço
atrás de mim e desliza a caneta no meu bolso de trás.
Calor me atinge, tão quente que o oxigênio em meus pulmões
evapora. Se é assim com camadas de tecido nos separando, como ele se
pareceria pressionado contra mim, pele contra pele?
Tenho vergonha do pensamento assim que ele passa pela minha
cabeça. Eu amo Ryan. Eu nem gosto de Mako.
Os dedos familiares de ansiedade envolvem meu peito. Sem pensar,
olho ao redor, convencida de que Ryan vai me ver de alguma forma. Só
porque ele desligou o rastreador do meu celular não significa que não
haja pessoas me observando. Sei que ele não confia em mim, não depois
que menti para ele sobre Amelia.
Eu claramente não mereço a confiança dele. Olhe para mim agora.
Agindo como uma vagabunda e pensando em seu irmão. Um irmão que
ele despreza.
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Que estupidez, River. Vá embora antes que alguém a veja. Ryan


nunca vai te perdoar.
— Quando eu for jantar hoje à noite, prometo que vou matá-lo se
vir um círculo preto nessa linda mãozinha.
Sem pensar, eu me aproximo e mostro meus dentes bem na cara
dele.
— A única razão pela qual vou colocar um ponto na minha mão é
porque quero ficar longe de você.
— Então por que seus seios estão pressionados contra o meu peito?
– ele pergunta, com um sorriso malicioso aparecendo lindamente em
maldita cara estúpida.
Movendo para trás, quase tropeço em minha busca para agir como
se não estivesse apenas pressionada contra ele como um filme plástico.
Abro a boca para responder, mas nada sai. Não tenho ideia do que dizer
agora.
— Você não vem para o jantar. – eu afirmo finalmente.
Ele sorri. — Papai o designou para o meu caso. Seu cliente é uma
testemunha chave de um assassinato. Ryan e eu estaremos trabalhando
juntos até que este caso seja resolvido. Estou indo jantar, River.
Eu me afasto dele e me viro para ir embora. — Tudo bem. Mas eu
nunca permitiria que você o matasse. – digo por cima do ombro.
Só eu teria essa honra.

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— Quero que o jantar esteja pronto às seis. Faça bolo de carne.


Mako odeia bolo de carne. – Ryan diz pelos alto-falantes do meu carro.
Liguei para ele assim que entrei nesta caixa térmica. Por razões óbvias,
não pude contar a ele que seu irmão me perseguiu novamente e me
contou sobre o jantar. Tive que me fazer de boba e esperar até que ele
me contasse.
Eu não posso acreditar que ele não me contou.
— Eu gostaria que você tivesse me contado isso antes. Agora tenho
que correr para o mercado. – eu reclamo, afastando uma mecha de
cabelo suada do meu rosto. Meu carro está começando a envelhecer, o
que significa que o calor do sol da Carolina está começando a superar
meu ar condicionado. Talvez seja hora de um novo - algo que não posso
pagar agora.
— Só soube ontem. Eu não tive a chance de te contar porque tenho
trabalhado pra caramba, algo que você não saberia. – ele diz, com suas
palavras me atacando como um chicote. Ele sempre sabe exatamente o
que dizer e quando dizer para me machucar mais.
Preciso me controlar para manter minha boca fechada. Trabalhar pra
caramba foi toda a minha vida desde que eu tinha idade suficiente para
ter um emprego - mas, infelizmente, Ryan sempre tem perda temporária
de memória quando esfrega meu estado de desemprego na minha cara.
Algo que ele exigia de mim.
Eu mordo o interior da minha bochecha até sentir o gosto de sangue,
e então agito ao redor da minha boca como um lembrete do que eu vou
sentir na próxima semana se eu responder.
— Desculpe. Eu só quero que este jantar corra bem para você. Eu
sei o quanto Mako te estressa.
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E eu.
Meu ar condicionado finalmente entra em ação assim que mais suor
surge em minha testa. Eu nunca pensei que teria que me preocupar com
Mako dizendo qualquer coisa para Ryan até agora. E se Ryan o irritar e
disser a Ryan que fiquei na casa dele por uma semana em retaliação? Se
eu ainda não soubesse que são as pessoas boas que morrem jovens,
apostaria dinheiro que Ryan teria um ataque cardíaco ali mesmo.
Ryan fica em silêncio por um momento. — Basta fazer o bolo de
carne e deixá-lo pronto às seis. Não o queime. Não se atrase. Apenas
faça algo certo pelo menos uma vez. Você consegue fazer isso? – ele
pergunta, com sua voz sombria e condescendente.
— Sim. – eu sussurro.
Ele desliga o celular sem mais comentários. Estamos brigando
novamente. Os cantos dos meus lábios contraem para baixo quando a
culpa me ataca. Eu odeio quando Ryan está irritado comigo.
Primeiro, olho seu irmão e permito que ele entre no meu espaço
pessoal. Então, reclamo por ele não ter me informado sobre esta noite
antes, em vez de perceber que Ryan está sobrecarregado de trabalho
agora.
Eu também ficaria com raiva de mim.
Meu pé pressiona o acelerador com mais força. Esta noite precisa
ser perfeita.

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— O jantar está pronto. – digo da sala de jantar. Coloquei o bolo de


carne e aspargos crocantes na mesa de três metros em nossa sala de
jantar escandalosamente formal e coloquei nossa melhor porcelana. Não
faço ideia de onde Ryan conseguiu, mas é bonita, então não me importo.
Ryan e Mako estão na sala de estar concentrados no caso. Tudo o
que ouvi esse tempo todo foram as cortadas de Mako e os comentários
condescendentes de Ryan.
Eles se odeiam e nenhum deles se preocupa em esconder isso.
Os dois entram na sala de jantar, com as sobrancelhas franzidas e os
maxilares tensos. Mako para diante de sua cadeira, olhando para o bolo
de carne com uma expressão vazia. Um sorriso maligno aparece no rosto
de Ryan.
Luto contra a vontade de revirar os olhos. Ryan está sendo
mesquinho.
As mãos de Mako apertam o encosto da cadeira até que as juntas
dos dedos fiquem brancas. Se ele não estivesse usando uma camisa de
botão de manga comprida, nem mesmo suas tatuagens seriam capazes de
cobrir as veias pulsando em seus braços. Calmamente, Mako puxa sua
cadeira e se senta, com os seus olhos nunca se desviando da comida
aparentemente ofensiva. Se eu não soubesse, o bolo de carne cresceu
uma boca e atualmente está falando merda para Mako.
Ryan se senta à cabeceira da mesa, enquanto eu me sento à sua
esquerda e Mako se senta à sua direita, bem na minha frente.
— Você fez isso? – ele pergunta, com a sua voz tensa enquanto
levanta seus olhos verdes escuros para mim. Minha respiração para no
meu peito. Enquanto seu rosto está cuidadosamente transformado em
uma máscara vazia, com seus olhos são esmeraldas brilhantes, cheios de
raiva.
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Achei que ser forçado a comer uma comida que você não gosta iria
irritá-lo, mas a tensão que sai dele é potente e sufocante. Não entendo a
reação dele, mas adoraria descobrir. A curiosidade em mim queima para
saber por que o bolo de carne o deixaria tão zangado.
— Sim. – eu respondo. — É caseiro. – acrescento, como se isso
fosse torná-lo mais atraente.
Ele engole e pega o garfo. Silenciosamente, ele dá sua primeira
garfada. E depois outra. E outra. Ele dá várias garfadas antes de eu
perceber que Ryan e eu apenas o observamos com um fascínio mórbido.
Bem, eu estou, pelo menos. Ryan o observa com um sentido doentio de
satisfação.
Pela primeira vez, quero bater em Ryan pela maneira como ele está
tratando o irmão.
Esse sentimento me assusta. Eu amo Ryan. Eu deveria estar do lado
dele, não importa como.
Talvez ele se sinta assim porque Mako fez algo muito ruim para
Ryan quando eram crianças. Talvez tenha batido nele feio. O machucado
de alguma forma. Tem que haver uma boa razão, e eu preciso me
lembrar disso.
Eu como minha própria comida, orgulhosa de como está saborosa.
Esta é a única coisa boa que veio de ter uma infância de merda lutando
contra a fome e o desespero. Assim que tive meios para cozinhar,
mergulhei nisso. Eu cozinhei tanto; Tive que doar 98% para abrigos de
sem-teto porque havia muita comida.
Aperfeiçoei a culinária, e é algo pelo qual Ryan sempre me elogiou.
Algo de que sempre tive muito orgulho.
Olho para cima para ver Mako visivelmente forçar outra garfada.
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Isso deixa um gosto amargo na minha boca. Claramente, ele


simplesmente não gosta de bolo de carne. Mas não gosto que alguém
coma minha comida e não goste. Isso me faz sentir como se estivesse
coberta de óleo.
Ryan solta um gemido suave. Eu olho para vê-lo revirar os olhos
para trás de sua cabeça.
Então está tudo bem quando ele faz isso.
— Esta comida está incrível, baby. – ele elogia em voz alta. Só
assim, eu me sinto melhor. A felicidade atinge meu peito. Fazer Ryan
feliz sempre faz isso comigo.
— Obrigada. – eu sorrio. Mako olha para ele com desgosto mal
disfarçado.
— Então, como está indo o caso? – pergunto, esperando tirar todas
as nossas mentes dessa estranha interação.
— Estamos progredindo. – diz Mako ao mesmo tempo em que Ryan
diz: — Não se preocupe com isso, querida.
Franzo a testa para as respostas conflitantes. Ryan nunca fala sobre
trabalho comigo. Tenho certeza de que muitas coisas são confidenciais,
mas ele sempre me ignora, mesmo nas perguntas mais simples. Tentei
mostrar interesse no que Ryan faz, mas enchê-lo de perguntas só o irrita.
Ryan, o namorado, e Ryan, o advogado, são duas entidades
separadas. Não conheço a segunda pessoa e às vezes isso me incomoda.
Eu adoraria nada mais do que ver Ryan em ação. Eu sei que ele é um
advogado feroz e ver isso com meus próprios olhos seria incrivelmente
gratificante. E talvez um pouco sexy também.
Mako dá a Ryan um olhar que não consigo identificar, distraindo-
me dos meus pensamentos.
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— Desde que o cliente de Ryan coopere, acho que conseguiremos


pegar o assassino. – continua Mako.
Ryan deixa cair o garfo no prato com raiva e olha para Mako com
um olhar feio. Eu olho para o prato dele, inspecionando-o em busca de
lascas ou arranhões.
— Não quero falar sobre trabalho na mesa de jantar. – ele diz,
atraindo meus olhos de volta para seu rosto vermelho.
Mako nem lhe dá uma olhada. Ele mastiga um pedaço de aspargo
lentamente, como se estivesse pensando nas próximas palavras.
— O cliente dele testemunhou um assassinato.
— Um assassinato? – A pergunta escapa da minha boca antes que
eu possa impedir.
Os olhos assassinos de Ryan se voltam para mim. Imediatamente,
enfio um pedaço de bolo de carne na boca e mantenho os olhos baixos
no prato. Os dedos familiares da ansiedade começam a surgir por todo o
meu corpo, tocando todos os meus órgãos vitais até que cada parte de
mim seja dominada pelo pavor.
Eu cometi um erro. Ryan vai ficar tão bravo comigo agora. Ele não
quer falar sobre o caso. Mako está ignorando seu pedido e eu apenas o
incitei.
Que estupidez, River. Que estupidez.
— Ele é apelidado de Ghost Killer. Ele também está ligado ao
tráfico de drogas.
Assim que o nome sai de sua boca, meu coração aperta no meu
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peito. Nunca ouvi o apelido, mas traz à tona as memórias horríveis


daquela noite. Billy me chamando de fantasma enquanto me batia e me
estuprava. Billy - que lida fortemente com drogas, armas e
provavelmente até com o comércio de peles. Billy - que mata pessoas.
Muitas pessoas.
Forçosamente, engulo o bolo de carne agora seco na minha boca. Eu
quase engasgo quando ele desliza pela minha garganta e se acomoda
pesadamente no meu estômago.
Desta vez, não me importo se estou irritando Ryan. Nenhum medo
se compara ao que Billy infude em mim. Se ele está por aí, matando
pessoas publicamente de forma tão descuidada... Isso só pode significar
uma coisa.
— Por que ele é chamado de Ghost Killer? – pergunto baixinho.
— Porque ele esculpe a palavra "Ghost" no peito de sua vítima
antes de matá-la.
Minha mão treme. Cuidadosamente, abaixo o garfo e esfrego as
mãos suadas no meu lindo vestido rosa. O suor surge em minha testa e
escorre pela minha espinha, acompanhado de calafrios. Sinto-me doente.
— Já chega. – Ryan grita, com seu punho batendo ruidosamente
contra a mesa, sacudindo a porcelana. — Você a está perturbando.
Mako me observa de perto, notando meu óbvio desconforto. Eu os
deixo presumir que é porque o assassinato me dá arrepios quando, na
realidade, é apenas o fato de eu saber quem é o assassino.
Para meu alívio, Mako escuta. Ele continua a comer seu bolo de
carne, desta vez com um pouco mais de facilidade. Talvez valha a pena
agora, já que Mako conseguiu irritar Ryan tanto quanto Ryan o irritou
com a comida.
O resto do jantar transcorre em um silêncio tenso.
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Ryan está furioso e eu… preciso ir ver a Barbie.


Estou colocando o último prato na lava-louças – sem a caneca de
café de Ryan – quando ouço passos atrás de mim. Meus ombros ficam
tensos, mas não paro enquanto coloco sabão na abertura, fecho a porta e
ligo a máquina.
Estou apenas pressionando Iniciar quando a mão de Ryan sai e
agarra meu dedo indicador com força. Eu paraliso, com meus olhos
arregalados em seus olhos azuis frios e opacos.
— O que foi? – pergunto, forçando a inocência em meu tom.
— Você sabe. – ele resmunga. Não tenho tempo para formular uma
resposta. Em um movimento rápido, ele estala meu dedo para trás.
Ouço o estalo. Eu sinto. Mas a dor não é registrada imediatamente.
Estou muito chocada, meus olhos arregalados demoram a desviar o olhar
dele e olhar para o meu dedo.
Minha boca cai quando vejo meu dedo curvado completamente para
trás.
Então a dor atinge.
Eu arranco minha mão da dele e a coloco em meu peito enquanto as
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lágrimas escorrem dos olhos. Minha boca se abre em um grito, mas


tudo o que escapa é um gemido. Antes que eu possa me enfurecer com
ele, ele me agarra pelo cabelo e me joga contra a parede. Um grito sai da
minha garganta quando meu dedo quebrado bate na parede, com minha
tentativa de proteger meu rosto. Tontura ultrapassa a dor.
— Estou tão cansado de você me envergonhar, sua vadia. – ele
resmunga antes de bater minha cabeça na parede.
Os instintos assumem o controle. Apesar do fato de estar vendo
estrelas, grito e o chuto, socando com as duas mãos, dedo quebrado que
se dane. Ele me subjuga facilmente, apertando a mão na minha boca no
processo. Ambos os pulsos estão presos na outra mão.
— Faça isso de novo e vou te matar, entendeu? – Quando não
respondo, ele me sacode com força, com o rosto retorcido de pura raiva.
Eu aceno com a cabeça, com lágrimas escorrendo dos meus olhos sem
permissão. — Por que você não entende que sou o único que realmente
te amaria? No entanto, você continua a me desobedecer. Estou pedindo
muito de você, River? – ele grita, com a saliva voando em meu rosto.
Contra meu melhor julgamento, eu me afasto dele. Se fosse possível
me encolher em uma bolinha e desaparecer, eu venderia minha alma
para isso.
— Estou?! – ele berra. Balanço a cabeça com desespero. Só quero
que ele pare de gritar. Não quero mais que ele fique bravo.
— Então por que você me desobedece, hein? – ele pergunta, me
sacudindo novamente. Suas mãos apertam cada vez mais forte até que
parece que meus pulsos vão quebrar. — Faço tudo por você. Eu te trato
como uma rainha. Eu sustento você. Eu deixei você perder seu maldito
tempo com a faculdade e gastar a porra do meu dinheiro. E é assim que
você age!
Ele termina sua declaração com um empurrão forte. A última coisa
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de que me lembro é de cair para trás, com a sensação sem fim de cair no
ar na boca do estômago. E então nada.
A dor aguda na minha cabeça me ataca primeiro. Então o zumbido
em meus ouvidos segue logo atrás. A dor é ofuscante. Apenas o
pensamento de abrir meus olhos parece cansativo e doloroso.
Pés se arrastam ao meu lado. Lentamente, as memórias começam a
voltar. O jantar com Mako. Como Ryan ficou bravo quando Mako me
contou sobre o Ghost Killer. E quando Mako saiu, como Ryan tinha me
agredido.
De novo.
Assim que a memória atinge, o mesmo acontece com a dor no meu
dedo. Meu mindinho acabou de sarar e agora outro dedo está quebrado.
No entanto, tive muitos ossos quebrados durante a minha infância. Se eu
quisesse, poderia acolher a dor como uma velha amiga. Às vezes,
abraçá-la é a única maneira de superar isso.
Ignorando a dor em meu dedo, volto minha atenção para a pessoa
que está andando. Estou em uma cama - nossa cama. E eu estou
completamente nua. O ar frio é registrado e imediatamente arrepios
percorrem pela minha pele como um maremoto.
Porra. Se Ryan notar, ele saberá que estou acordada. A pele de
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ninguém fica arrepiada quando é inconsciente.


Mantenho a minha respiração profunda e constante. Eventualmente,
eu ouço a porta do quarto abrir e, em seguida, fechar. Imediatamente,
meus olhos se abrem. Foda-se facilitar para ele. Não tenho tempo.
A luz aumenta a dor na minha cabeça, mas eu aguento a dor. Preciso
descobrir o que diabos está acontecendo. Olho para baixo para confirmar
que estou nua. Meu lábio treme com o ataque de memórias de acordar
exatamente assim não muito tempo atrás. As coisas que ele fez comigo
depois ficarão marcadas para sempre em meu cérebro, exatamente onde
reside o resto do meu trauma.
Minha respiração fica presa na garganta quando vejo marcas de
mordidas marcando o meu abdômen e coxas. Minhas sobrancelhas
franzem e tento pensar em quando ele fez isso. Elas são recentes.
Algumas das mordidas ainda têm pequenos pontos de saliva que ainda
não secaram.
A dor entre minhas coxas responde à pergunta que agora percebo
que não quero responder.
Fizemos sexo algumas vezes na semana passada e, embora ele tenha
sido excessivamente rude, não me mordeu. Quando meu lábio treme de
novo, eu o mordo, apertando-o com força. Ele realmente fez isso
enquanto eu estava inconsciente? Pelas suas mãos? Quem faz algo
assim? Quem deixa inconsciente alguém por quem supostamente está
apaixonado e depois fode e morde quando está inconsciente?
Não consigo processar algo assim agora. Antes que eu possa
descobrir o que fazer, a porta se abre. Meu coração congela. É tarde
demais para fechar os olhos e fingir dormir. Nossos olhos se encontram
e meu coração vacila como um motor velho.
— Você está acordada. – ele diz, com sua voz calma e sem emoção.
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Ele não parece zangado. Acho que prefiro isso ao cálculo frio em seu
tom. Pelo menos quando ele está furioso, sei o que esperar. Este lado de
Ryan é imprevisível.
— Eu estou. – eu deixo escapar, com minha voz alterada e áspera.
Tento limpar a garganta, mas a desidratação arde demais e só piora as
coisas. — Posso beber um pouco de água? – pergunto baixinho,
propositalmente subjugando a minha voz para soar doce.
Ele gesticula com a cabeça para a mesa de cabeceira ao meu lado.
Eu olho ao meu lado e vejo uma garrafa meio cheia de água e um par de
Tylenol. Não gosto que a água tenha sido aberta, mas no momento não
me importo. Ele não iria me drogar agora, iria? Ele já me tem onde me
quer. Quando levanto minha mão para pegar a garrafa, vejo meu dedo
ainda quebrado. Está roxo e dobrado de forma não natural. A visão traz
de volta a sensação de dor. Por um único momento, eu tinha esquecido
disso. Agora, é tudo o que posso sentir.
Ignorando a dor, pego a garrafa com a mão boa e tomo alguns goles
de água primeiro, antes de forçar os dois comprimidos na minha
garganta. Meu único arrependimento é que eles não são algo mais forte.
Se eu tivesse que suportar isso do homem que amo, pelo menos me
deixe ficar tonta enquanto faço isso.
— Como você está se sentindo? – ele pergunta.
Quero ficar com raiva dele. Fazer a ele as perguntas clichês. Como
você pode? Por que você faria algo assim comigo. Eu pensei que você
me amava…
Mas não faço. Eu apenas o encaro, com os olhos cheios de mágoa e
raiva. Não estou nem com raiva do meu dedo no momento. Não, estou
com raiva da violação do meu corpo. Como um covarde, ele baixa os
olhos para o meu corpo. Ao que ele fez comigo enquanto eu estava
inconsciente por sua própria mão. Ele prometeu que não faria algo assim
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novamente.
Ele prometeu.
Quando seus olhos se erguem para os meus, eles estão vazios. Ele
encolhe os ombros e me dá um sorriso. — Você é minha namorada,
River. Eu possuo você. Eu posso te foder sempre que eu quiser.
— Você teve que fazer isso enquanto eu estava inconsciente?
Depois que você me deixou inconsciente? – eu desafio.
Outro encolher de ombros. — Por que não? Sua boceta estava
disponível e me excitou ao vê-la tão vulnerável a mim. Qual é o
problema? – ele pergunta, com sua voz ficando alterada. Ele age como
se eu não estivesse sendo razoável. Como se perguntar por que ele iria
me estuprar fosse uma pergunta absolutamente absurda.
Mordo meu lábio inferior. Não quero irritá-lo mais.
— Você teria dito não para mim? – ele pergunta, com sua voz
mudando para um tom mais suave. Ele parece um pouco magoado, e
isso me influência. — Sempre adorei que você seja tão acessível e
disposta a fazer qualquer coisa que me deixe feliz. Não pensei que fazer
sexo com minha namorada fosse tão doloroso para você.
Eu franzo a testa. Fazer sexo com seu parceiro não é doloroso, ele
está certo sobre isso. Mas isso não faz com que esteja tudo bem. É
estranho saber que alguém estava dentro de mim sem que eu soubesse.
Sentindo isso. Consentindo com isso. Isso não é a mesma coisa que um
namorado me despertando para o prazer do sexo - com isso eu sempre
ficaria bem. Não havia como acordar. Nenhuma oportunidade de dizer
sim ou não. Um sentimento sombrio cobre o interior do meu corpo.
Eu me sinto usada e suja. Eu me sinto... estranha dentro do meu
próprio corpo.
— Eu só... só queria ter experimentado isso com você. – eu sussurro
finalmente. Seu rosto suaviza.
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— Sinto muito, baby. Queria tentar algo novo. Eu não me


importaria se você fizesse sexo comigo se eu estivesse inconsciente.
Lágrimas ardem em meus olhos. Odeio quando brigamos. Odeio
quando ele está com raiva de mim. Fazer sexo com alguém que você
ama não deveria ser crime. Eu não teria dito não a ele se estivesse
acordada de qualquer maneira. A culpa começa a florescer dentro do
meu peito. Por que estou fazendo ele se sentir mal por algo que teria
sido consensual de qualquer maneira?
— Está tudo bem. – digo suavemente. Ele caminha até mim e se
senta na cama ao meu lado. Lentamente, ele desliza o dedo na minha
testa e atrás da minha orelha.
— Como está sua cabeça?
As lágrimas secam rapidamente. Ele tinha me empurrado. Ele me
machucou. Meu dedo está quebrado.
— Você me machucou.
Ele suspira. — Sinto muito, River. Minha raiva tomou conta de mim
novamente. Eu me sinto péssimo. Por favor, não me faça sentir pior do
que já me sinto.
Olho para baixo e me forço a olhar para o meu dedo quebrado. Ver
o local anormal envia uma nova onda quente de dor em meu dedo. As
lágrimas voltam com força total. Deus, isso dói. Dói que ele continue a
me quebrar repetidamente, por dentro e por fora.
— Você disse que não iria me machucar novamente. – eu o lembro
fracamente.
— Eu sei, baby, eu sei. E desta vez estou falando sério quando digo
que não vou. Eu prometo. Eu sei que realmente preciso trabalhar minha
raiva. O que posso fazer para que veja isso? – ele sonda, com
sinceridade cobrindo sua voz como doce mergulhado em chocolate.
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Eu fungo, com o ranho começando a escorrer pelo meu lábio.


— O que você vai fazer quando ficar com raiva da próxima vez?
Como você vai lidar com isso? – pergunto. Tento endurecer minha voz,
mas ainda me sinto... desolada. Como se algo dentro de mim estivesse
faltando. A maneira como ele está agindo é aliviante e um pouco
reconfortante. Mas estou tendo dificuldade em sentir isso agora.
— Vou me afastar até me acalmar. Então podemos resolver o
problema juntos. Estamos nisso para sempre, baby. Não quero perder
você por causa do meu temperamento.
Mais lágrimas surgem nos olhos até que Ryan se torna uma imagem
borrada. Eu aceno com a cabeça, aceitando seu pedido de desculpas.
Sei que deveria me sentir melhor. Agora, só se eu realmente pudesse
sentir alguma coisa.

— Felizmente, seu dedo estalou. Nenhuma parte foi quebrada. Você


ficará bem curada em cerca de quatro a seis semanas. – diz a enfermeira.
Ela parece mais velha do que eu apenas alguns anos. Seu cabelo
castanho liso está preso em um rabo de cavalo baixo, e seus olhos
castanhos me observam de perto enquanto avalio meu dedo imobilizado.
Ela é direta ao ponto, o que eu aprecio.
— Como isso aconteceu de novo? – ela pergunta, olhando meu dedo
quebrado com pena suficiente para me afogar.
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A apreciação se foi.
Eu tecnicamente não tenho que responder, mas a desculpa escapa
da minha boca de qualquer maneira.
— Eu quebrei na porta do carro. – É a primeira coisa que me veio à
mente. E quando suas sobrancelhas franzem, percebo que provavelmente
não era a desculpa certa.
— Sim. – ela diz, com suspeita em sua voz. — Normalmente, os
dedos não quebram quando são esmagados assim. E especialmente na
maneira como seu dedo foi quebrado.
— Já terminamos? – pergunto impaciente. Ela dá um passo para
trás, pressionando os lábios, aparentemente sentindo minha agitação
crescente.
— Se você não se sente segura...
— Eu me sinto bem. – eu surto, interrompendo-a. Eu não quero ir
por este caminho. A última coisa que preciso é de uma enfermeira
intrometida fazendo perguntas e tentando se intrometer na minha vida.
Estou feliz por não ter contado a ela sobre o ferimento na cabeça. Ryan
disse que não sangrei e que há um pequeno galo se formando na minha
nuca. O galo não está se formando dentro da minha cabeça, então não
estou preocupada. Mais do que provável, eu tenho uma leve concussão.
Eu já havia me curado da última concussão, cortesia de Billy.
Ryan já prometeu que me acordaria a cada duas horas como punição
por causar a concussão.
Em primeiro lugar, eu não teria que vir a este inferno proibido por
deus se eu fosse capaz de cuidar do meu dedo sozinha. Infelizmente,
estava muito dobrado para colocá-lo de volta no lugar. E considerando
que nenhum de nós tem experiência médica, é provável que só
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tivéssemos piorado.
Billy tinha experiência médica. Não há como ele ter adquirido seu
conhecimento médico à moda antiga, frequentando a faculdade. Tenho a
sensação de que Billy lidou com muitos ossos quebrados em sua vida e,
em vez de ir para o hospital, aprendeu a lidar com eles sozinho. Ele tinha
que ter alguém para ensiná-lo com certeza. Suas conexões vão longe e
com pessoas com muitas ocupações diferentes.
Policiais. Políticos. Empresários. Médicos. Até celebridades.
Felizmente, tive apenas pequenos ossos quebrados. Dedos, dedos
dos pés e meu nariz. Billy colocaria meus ossos de volta no lugar para
mim. Nunca tive a impressão de que ele fazia isso porque se importava,
mas porque ter uma prostituta imperfeita não venderia muito bem.
A enfermeira me dá instruções de como cuidar do dedo. Eu mal
ouço, muito ansiosa para dar o fora daqui. Ryan está do lado de fora da
porta, esperando por mim. Ele se recusou a me deixar vir sozinha, para o
caso de a enfermeira que me ajudou ser um homem. Disse que não gosta
quando outro homem me toca, mesmo que seja para cuidar de um dedo
que quebrou.
Eu só quero ir para casa. Eu odeio hospitais, e estou descobrindo um
novo ódio por essa enfermeira também.
— Posso ir agora? – pergunto, cortando-a no meio da frase. Ela me
dá um olhar desprezível e bufa.
— Sim. – ela diz brevemente.
Saio sem agradecer. As enfermeiras merecem agradecimentos, mas
ela vai ter que receber isso de outro paciente esta noite. Página 232
Estou seriamente tentado a apenas sequestrar a pequena moça.
Realmente pensei que ela tinha feito uma descoberta quando ela me
ligou naquela noite. Pior noite da porra da minha vida. Ao ouvir sua voz
baixa pelo receptor, impotente e com dor - eu quase enlouqueci.
Acho que perdi a cabeça.
E então ela desapareceu. Correndo de volta para a porra dos braços
dele. Tanto que eu queria dirigir até a casa dele e levá-la de volta. Mas
eu já vi isso antes. O vai e vem. A manipulação mental. Como ele as
machuca e depois as atrai de volta para seus braços.
Ele é um mestre da manipulação. Ele as convence de que é culpa
delas que ele bata nelas. Como ele faz isso, não faço ideia.
Sei que não consigo nem começar a entender o feitiço sob o qual
elas foram colocadas. Perguntei a Alison repetidamente como ela
continuava caindo na mesma velha merda. Houve tantas vezes no
começo em que ela se enfureceu comigo, gritando comigo que nunca
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vou entender como é estar naquela posição. Eu só... não entendia.


Finalmente, ela tentou me explicar. O medo que toma conta de você
quando pensa em denunciá-lo. Quantas vezes ele ameaçou matá-la e
depois quase cumpriu. Nem por um segundo Ryan fez parecer uma
ameaça vã. E então a lavagem cerebral. Ele iria convencê-la de que é
culpa dela que ele a trata assim. Como se ela realmente merecesse isso.
Manipulação e fazê-las se sentir louca e dramática. Ele iria desumanizá-
la, tirar sua identidade e fazê-la sentir que ninguém mais poderia amá-la,
exceto ele. Que ele está prestando um grande favor a ela ao amá-la
quando ninguém mais poderia.
Sei que ele está fazendo a mesma coisa com River.
Embora eu não possa entender pessoalmente, sei que é real. Sei que
elas estão em uma situação séria e se sentem incrivelmente impotentes,
mesmo quando se convencem de que não são. Foi necessária uma
quantidade incrível de força para Alison deixá-lo. Quando ela fez isso,
ele a ameaçou, depois tentou cortejá-la novamente e, por fim, tentou
atacá-la.
Eu estive lá e o parei.
Ryan sempre me odiou. Eu era o filho que nunca deveria existir. Ele
queria ser o único e me aterrorizou durante toda a nossa infância juntos
por causa disso. O Anjo Malvado5 parecia um filme da Disney em
comparação com Ryan. Inúmeras vezes, ele tentou me machucar. Houve
momentos em que eu tinha certeza de que ele iria para a cozinha, pegaria
uma faca de açougueiro e seguiria com sua fantasia mais sombria, mas
algo sempre o impedia. Eu podia ver isso em seus olhos, no entanto. O
desejo de me fazer desaparecer de vez.
Naquela noite, quando impedi Ryan de machucar Alison, foi quando
seu ódio realmente aumentou. Ela borbulhou em bolhas e se tornou
queimaduras permanentes de terceiro grau em nosso relacionamento.
Acho que se Ryan tivesse a oportunidade agora, ele me mataria.
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E para ser honesto pra caralho, eu sinto o mesmo sobre ele.


Depois disso, ele não teve escolha a não ser deixar Alison escapar.
Eu testemunhei sua reação volátil e intervi quando ele tentou atacá-la.

5 O Anjo Malvado é uma referência ao filme.


Ele me acusou de trepar com Alison, e eu o deixei acreditar. Não havia
como voltar disso.
Ryan prefere morrer do que pegar de volta uma garota que ele acha
que comi. Depois disso, ela está contaminada. Arruinada para sempre.
Desgosto alterou suas feições quando ele me viu protegê-la, e eu sabia
que ele acreditando que eu tinha Alison também era a única maneira de
Ryan realmente deixá-la ir.
Mas não é isso que eu quero para River. Ela foi acusada de ser uma
prostituta desde que aprendeu a falar, então a última coisa que River
permitiria que alguém pensasse é que ela teve que dormir para sair de
um relacionamento. Ela é muito orgulhosa, e eu estaria mentindo se
dissesse que não a respeito por isso.
Eu a deixei sozinha por quase dois meses porque se eu a tivesse
visto, eu a teria sequestrado. E várias vezes por semana, eu tinha que
olhar para o rosto de Ryan e não matá-lo. Minha resistência está
diminuindo lentamente e não tenho mais medo do que sinto que estou
me preparando para fazer.
Por enquanto, vou respeitar River e manter minha boca fechada
sobre nosso estranho relacionamento. Mas ela terá uma surpresa se ela
acha que eu vou deixá-la esquecer que nós temos um.

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— Ghost Killer de novo. – eu suspiro, olhando para o corpo morto.


Mesma morte, apenas corpos diferentes. Está ficando cansativo. E eu
sinto que é pessoal pra caralho. — E posso apostar minha vida no fato
de que não há nada de novo para ver com este corpo.
Redd balança a cabeça severamente, com seus lábios pressionados
com decepção.
— O mesmo modus operandi. Muitas amostras de DNA. Vou testá-
las, mas eu aposto que combinarão com prostitutas e criminosos
encarcerados, assim como os últimos dez corpos.
Eu me agacho, dando uma olhada melhor no homem morto. A
palavra 'Ghost' está esculpida em seu peito como qualquer outra vítima.
As palavras são tão nítidas quanto possível ao esculpir palavras em um
ser humano vivo e se contorcendo. Um pequeno buraco de bala decora o
meio de sua testa. Mesma arma de antes.
— Sabemos quem é a vítima? – pergunto a Redd.
— Sage Blomberg, 19 anos. Fortemente envolvido com a gangue
que comanda seu bairro. – ele responde, tirando outra foto.
Estar fortemente envolvido em uma gangue se traduz em traficante
de drogas. O garoto provavelmente já esteve na prisão por tráfico e
posse. Cada vítima do Ghost Killer entrou e saiu da prisão por algum
tipo de acusação de drogas. Nem todos são tão jovens quanto Sage ou
Greg, mas é perturbador ver que a maioria é.
Essas crianças podem facilmente ser membros de gangues rivais.
Mas meu instinto me diz que não. A palavra esculpida em seu peito é
muito pessoal, muito reveladora de tudo o que eles fizeram para irritar o
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Ghost Killer.
E posso apostar que o motivo do Ghost Killer é insubordinação. O
suspeito é um líder de gangue ou traficante. Alguém a quem essas
vítimas obedeciam. Aposto que ele estava no controle, como a maioria
dos líderes de gangues. E se as crianças são alguma coisa hoje em dia,
elas estão convencidas de que têm a vida toda planejada.
As vítimas mentiram, roubaram ou traíram o Ghost Killer de alguma
forma. Talvez algumas delas até o tenham desafiado, pensando que são
durões. Seja qual for o caso, elas agiram contra a pessoa errada e
pagaram o preço por isso.
— Diga-me a quem o DNA está vinculado no minuto em que você
descobrir. Vou vê-los, mesmo que estejam em outra porra de estado. –
digo a Redd.
Eu me afasto da cena, com Amar seguindo atrás de mim. Quieto
como de costume.
— O que você está pensando? – Amar pergunta depois de um
minuto me deixando sofrer em silêncio.
— Vou descobrir a qual gangue Sage pertencia, e então vamos
vigiar o ponto de encontro deles. Veja quem entra e quem sai.
Amar não discute. É uma vigilância perigosa, vagando pelas ruas
onde o crime acontece em plena luz do dia sem se importar com o
mundo. Mas esse é o ponto que eu mesmo alcancei. Não dou a mínima
se é perigoso, eu só quero pegar o assassino.
Quem quer que seja, é uma barata. Os crimes aumentaram 8% desde
que ele começou a matar seus fantasmas há um ano. As overdoses
aumentaram em 14%. Esses são números enormes dentro de um ano.
E deixar as vítimas em público para que as encontremos mostra sua
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arrogância. Na verdade, ele nunca deixa os corpos em Shallow Hill,


mas na cidade vizinha onde moro. Ele é o número um em seu mundo.
Aposto que ele se sente intocável. Como se ele fosse um deus.
Eu aperto meus punhos até que meus dedos fiquem brancos.
Mal posso esperar para mostrar a esse filho da puta o quanto
humano ele realmente é.
— Mako? – Amar grita, tirando-me de minhas violentas reflexões.
Eu olho para ele, atordoado. Amar está olhando para mim, com seus
olhos escuros cheios de preocupação.
— O que?
— Eu tenho chamado seu nome nos últimos cinco minutos. Estamos
apenas sentados aqui. – ele diz, apontando para o para-brisa, indicando
que ainda estamos em um carro muito estacionado.
Eu nem coloquei as chaves na ignição.
— Desculpe, cara. – murmuro, enfiando as chaves na ignição e
ligando o carro.
— Onde está sua cabeça? – ele pergunta, com seus olhos sondando
e muito observador.
Uma respiração áspera sai da minha boca. — Estou perseguindo
esse filho da puta há um ano e não estou nem perto de encontrá-lo. –
resmungo.
Dizer isso em voz alta me dá vontade de enfiar o punho no volante,
arrancar o air bag e envolvê-lo em volta da minha própria cabeça. Foda-
se, esse idiota me deixa muito alterado.
Não me importo que as vítimas do Ghost Killer sejam criminosos.
São crianças impressionáveis que escolheram o caminho errado para
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trilhar. Mas isso não significa que elas não tiveram a chance de mudar
suas vidas. Isso não significa que elas não poderiam ter sido salvas.
O idiota está me provocando com elas, eu sei disso. Eu sinto isso
nos meus ossos.
— Você está levando para o lado pessoal. – Amar observa ao meu
lado. Em vez de responder, dou uma guinada com o carro para frente,
voltando para a delegacia. Eu tenho que descobrir com quem exatamente
Sage estava envolvido.
— Você está certo, eu estou. – eu admito.
— Talvez você devesse se retirar. – ele sugere baixinho.
Ranjo meus dentes. Apenas Amar se sentiria seguro o suficiente
para dizer merdas como essa para mim. Este caso parece pessoal porque
é pessoal.
— Nós dois sabemos que ele matou seu verdadeiro pai, Mako. Não
contei isso a mais ninguém, mas estou começando a questionar essa
decisão.
Piso no freio um pouco forte demais quando paro em um sinal
vermelho, fazendo o carro parar repentinamente. O carro atrás de mim
buzina, quase nos acertando na traseira com a minha manobra. Se eu
estivesse em um carro de polícia agora, o carro teria ficado silencioso.
Não sou um idiota que precisa mostrar meu distintivo para alguém,
então ignoro sua raiva.
— Merda, desculpe. – murmuro, passando a mão pelo meu cabelo
novamente. Estou tão cansada pra caralho.
Ficamos em silêncio enquanto digiro sua ameaça velada. Está vindo
de um bom lugar, eu sei disso. Mas não significa que não queira
estrangulá-lo por dizer isso. Eu não deveria estar neste caso com meu
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envolvimento com as vítimas do Ghost Killer.


Matt e Julie me adotaram quando eu tinha treze anos, depois de
passar um ano no sistema de adoção. Nos primeiros doze anos da minha
vida, cresci nas ruas com um traficante de drogas como pai e uma
prostituta como mãe.
Johnny Lancaster estava fortemente envolvido com uma gangue
chamada Crucibles. Ele era um péssimo pai, mas ainda havia uma
pequena parte dele que se importava o suficiente comigo para manter os
negócios longe de mim tanto quanto podia. Minha mãe não me dava a
mesma cortesia nas noites em que trabalhava, mas eu preferia ter um
homem sujo procurando uma boceta no quarto ao meu lado do que um
membro de gangue carregando uma arma e drogado de crack.
Isso é até que eu voltei da escola uma noite para encontrar meu pai
morto, em uma poça de sangue com "Ghost" esculpido em seu peito e
um buraco de bala em sua cabeça. Isso foi antes de o Ghost Killer se
tornar o serial killer que é hoje. Foi um modus operandi que ninguém
tinha visto antes e não tinha visto até recentemente - apenas um ano
atrás.
Presumo que minha mãe encontrou meu pai morto ou testemunhou
e foi embora. Ou ela poderia ter morrido também. Daria Lancaster nunca
mais foi vista depois daquele dia, e eu estaria mentindo se dissesse que
não me incomoda não saber onde ela está.
E agora, 16 anos depois, estou sendo assombrado pelo homem que
transformou meu pai em um fantasma.

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Tenho certeza de que estou tendo um ataque cardíaco pela primeira


vez na minha vida quando a vejo. Tenho apenas 28 anos, mas essa
garota vai me mandar para uma sepultura precoce.
Ela está vestindo jeans largos e um moletom vermelho morango
fino. Está 40 ºC aqui fora, mas ela está vestida como se fosse inverno em
Michigan. Seu cabelo está preso em um coque bagunçado e o rosto sem
qualquer maquiagem, mostrando seu rosto anormalmente pálido.
Normalmente, quando vejo River, ela está arrumada com roupas bonitas
e com o cabelo solto. Ela parece tão bonita agora quanto em qualquer
outro momento, mas algo em sua aparência parece tão diferente dela.
Ela parece... em branco. Como uma tela branca.
Meus olhos vê um tom totalmente branco em sua mão. Pelo que sei,
o mindinho dela era o único dedo quebrado e aquele já estava curado.
Agora há um gesso em seu dedo indicador. Jogo a cabeça para trás e
conto até... foda-se, não consigo nem me concentrar nos números agora.
— Esse gesso não estava em seu dedo há duas noites. – digo
enquanto me aproximo dela por trás. A escuridão está ameaçando alterar
minha voz. Faço o meu melhor para mantê-la longe. Assustá-la ou fazer
qualquer coisa para afastá-la seria estúpido. Não quando estou tentando
puxá-la para longe dele.
Ela faz uma pausa ao ouvir minha voz, com seus ombros indo em
direção às orelhas enquanto ela fica tensa.
— Deixe-me. Em. Paz. – Suas palavras machucam. Não porque eu
quero que ela me queira, mas porque isso significa que ela não está mais
perto de querer ficar longe de Ryan.
— Só quando você estiver segura.
— Tudo bem, eu vou para onde estou segura, então você me deixa
em paz. – ela bufa, saindo em direção à calçada.
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Ela estar temporariamente segura não era o que eu queria dizer,


mas não digo nada. Não quando é mais do que provável que ela vá para
a biblioteca de novo, um lugar onde podemos conversar sem que
ninguém nos veja. Eu a sigo pela rota familiar. Uma que ela me levou
apenas alguns meses atrás, quando ela estava mancando por causa de
uma queda que não causou. E agora, ainda está machucada e se
recuperando. Assim como da última vez. Exceto que desta vez, a vida
está lentamente se esvaindo dela.
Seus passos são rápidos e raivosos, fazendo com que seus quadris
balancem de uma maneira tão sedutora – sou forçado a apertar meu pau
como um idiota.
Ela abre a porta quebrada de sua biblioteca abandonada com um
empurrão feroz. Ela entra no prédio empoeirado e cheio de pichações e
marcha pelas prateleiras vazias. Eu a sigo até um corredor que deve ter
sido usado para livros infantis. As prateleiras são grossas, na altura da
cintura e cobertas de poeira.
E então ela para de repente, obrigando-me a me equilibrar na ponta
dos pés para não derrubar seu pequeno corpo. Em um piscar de olhos,
ela está se virando e batendo com a mão no meu rosto. Uma mão que
tem um gesso, e uma que ela definitivamente não deveria estar usando
para bater nas pessoas.
Respiro fundo e desvio o olhar, lambendo meu lábio ensanguentado
enquanto tento controlar meu temperamento. Não gosto que me batam.
Eu tive muito disso antes de me encontrar em uma família legal, é muito
raro eu deixar alguém me bater sem algum tipo de consequência. Eu
nunca machucaria River – isso iria contra todo o meu propósito de tentar
ajudá-la – mas eu certamente ensinaria a lição dela se ela não fosse
devotada a outro homem. Um homem que eu realmente gostaria de
matar com minhas próprias mãos.
Meu maxilar range quando ela me enfrenta, com seu peito arfante
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pressionado contra o meu. Nossas respirações estão sincronizadas,


ambas lutando com adrenalina. Seu cheiro doce de canela invade meus
sentidos. Tudo o que quero fazer é dar uma mordida nela, como se fosse
uma maçã com canela. Estou distraído da minha raiva quando dou uma
boa olhada em seus olhos. Eles são a cor mais original que já vi, a cor
exata de ouro líquido com pequenas manchas de marrom misturadas e
um círculo externo de marrom claro.
Esses são os tipos de olhos dos quais você não consegue desviar o
olhar, não importa o quanto você tente.
— Não preciso que você me salve. – ela resmunga, tirando-me de
minhas reflexões. — Eu não sou uma donzela em apuros. Não sou uma
garotinha fraca que precisa do seu resgate. Não preciso de você, Mako.
A única pessoa que preciso é de mim mesma, porra. Você me entendeu?
Seu rosto está vermelho de raiva e seus olhos dourados brilham com
uma tempestade de emoções odiosas. Não estou olhando para o rosto de
uma garota. Estou olhando para o rosto de uma leoa feroz, com suas
presas puxadas para trás e prontas para arrancar meu pescoço com um
movimento ou palavra errada.
Nunca quis tanto beijar alguém na minha vida.
Aceno com a cabeça, ficando quieto. Sinto o desejo crescendo
dentro do meu peito. Tenho que neutralizar isso, eu preciso. Beijá-la
seria catastrófico.
— Quer me foder, Mako? – ela pergunta, com deboche cobrindo as
suas palavras. Aparentemente, não fiz um bom trabalho em manter a
luxúria longe dos meus olhos.
Sim. — Não é o que eu estou procurando. – eu omito. O músculo do
meu maxilar vai explodir com a força com que ranjo os dentes.
Ela me dá um olhar desafiador e meu coração para. Seu queixo cai
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quando ela dá um grande passo para trás e olha para mim com os olhos
semicerrados. Parece que ela quer montar meu pau enquanto corta
minha garganta. Não tenho certeza de como me sentir sobre isso, mas
foda-se se eu não quero deixá-la fazer isso de qualquer maneira.
Ela estende as mãos para cima e as desce pelas curvas. Sua cabeça
inclina para trás, expondo sua garganta esbelta. Eu poderia facilmente
estender a mão e envolver minha mão em volta do pescoço dela. Eu
poderia apertar até que seu rosto fique rosa e ela esteja desesperada para
respirar. Seus olhos se dilatariam e ela imploraria por mais.
Um gemido escapa de sua boca e todo o meu corpo se transforma
em aço.
— Ryan! – ela arfa em outro gemido. Meus olhos se estreitam em
fendas finas enquanto a raiva sobe em meu peito. Suas mãos continuam
a explorar seu corpo enquanto gemidos suaves e melódicos vibram em
sua garganta. Um resmungo escapa da minha boca antes que eu possa
pará-lo.
— O que você está fazendo, River?
Sua cabeça cai para frente, com seus olhos âmbar escuro e cheio de
raiva e luxúria. Minha porra de combinação favorita.
— É isso que você quer, Mako? – ela provoca, com sua voz baixa e
ofegante. — Você quer tocar meu corpo, sentir como minha boceta está
molhada? – Um sorriso surge em seu rosto e os seus olhos reviram
novamente. — Ah, Ryan!
A pele ao redor dos meus dedos está ameaçando romper de tão forte
que estou cerrando os punhos. A vadia está zombando de mim. Estou a
três segundos de dizer foda-se e empurrá-la contra uma dessas
prateleiras e ensinar-lhe aquela lição.
— Continue assim, River. Você não será capaz de gemer o nome
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errado quando sua boca estiver cheia do meu pau. – eu ameaço com um
resmungo baixo.
Suas mãos caem de seu corpo e a alegria curva seus lábios. De sexy
a fria em questão de segundos.
— Você nunca vai me ter, Mako. Você nunca mais vai encostar um
dedo em mim.
— Está disposta a me prometer isso? Porque vou fazer de você uma
mentirosa, garotinha. – eu desafio, com a minha sobrancelha levantada
sarcasticamente. Eu entro em seu espaço, pressionando nossos peitos
juntos. — Acho que nós dois sabemos que Ryan não te satisfaz do jeito
que você precisa ser.
Com que rapidez meu plano de mocinho saiu pela janela, é
realmente comicamente patético. Essa garota traz à tona algo em mim
que ninguém mais pode. Não quero desejá-la, mas acho que nunca tive
escolha. Ela não deveria estar comigo, mas acho que preciso que ela
esteja.
A escuridão que tentei tanto controlar vem à tona. River sabe como
me irritar. Especialmente quando sua cabeça cai para trás mais uma vez,
seus olhos reviram e ela solta um longo gemido.
— Ahhh, Ryan. – ela geme, dramática, mas ainda muito sexy. Sem
pensar, minha mão estende e faz exatamente o que venho fantasiando
desde que ela começou essa merda. Aperto sua garganta, vendo-a
vermelha enquanto ela geme a porra do nome errado. Quando eu
terminar com ela, ela estará implorando para que eu a machuque.
— Tente de novo. – eu resmungo. Minha mão mal está apertando.
Meu aperto é firme o suficiente para fazê-la parar, mas nem de longe o
quanto forte eu realmente quero apertar. O suficiente para fazer seu rosto
ficar rosado e suas pernas tremerem de desejo. O rosto de River fica
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vermelho de raiva, e seus olhos se voltam para mim com raiva.


Ela se inclina na minha mão. — Como se eu fosse gemer por você.
— Isso é o que você tem feito esse tempo todo. Não finja que não
está imaginando meu pau enterrado dentro de você. – Meu aperto aperta
um pouco. — Foi você quem queria jogar. Agora tente de novo. – eu
exijo, com minha voz aumentando.
Suas narinas inflam enquanto ela me encara com desafio. Estou
jogando-a para o lado e suas costas estão pressionadas contra as
prateleiras em dois segundos. Suas mãos se movem para o meu peito
para se firmar. Eu nem acho que ela percebeu isso ainda.
— O que há de errado, River? Não é tão corajosa agora, não é?
Você gosta de se esconder de suas verdades. Você prefere mentir para
nós dois e fingir que ama aquele pedaço de merda do que admitir que
quer alguém melhor. Você acha que Ryan poderia cuidar de você do
jeito que eu poderia, não é? Você acha que ele faz você se sentir uma
rainha quando na verdade ele te trata como uma porra de uma plebeia.
Dou um passo para mais perto dela, com a minha raiva aumentando.
Ela geme enquanto suas costas cravam nas prateleiras, na madeira
implacável. E assim como previ, seus olhos se dilatam com uma luxúria
tão potente que ela ainda nem entende o que está sentindo.
— Você não gosta do jeito que Ryan te machuca, River, não como
você gosta do jeito que eu gosto. A dor dele só traz tristeza e agonia,
enquanto a minha traz um desejo que você nem sabe como lidar. Agora.
Tente. De novo.
Uma respiração escapa dela através de suas vias respiratórias
contraídas, e com isso é um som tão musical que quase me faz gemer. O
meu nome. — Mako. – ela ofega.
Ela está tão excitada; nem percebe que sua boceta está esfregando
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na minha perna. Se ela não estivesse usando jeans, eu sentiria seus


fluidos escorrendo pela minha calça. Todo o seu plano saiu pela culatra
para ela. Essa garota adora ignorar o que está bem na frente de seu rosto.
Foda-se. Eu não quero salvá-la. Eu quero roubá-la. Vou roubá-la de
meu irmão, direto de suas pequenas mãos e mantê-la para mim. Vou
mostrar a ela como é estar com um homem de verdade. Um homem que
realmente a trata como uma rainha. Alguém que atenderá a todos os seus
desejos, tratará seu corpo como se fosse meu bem mais precioso e
mostrará a ela uma felicidade que ela ainda não sabe que existe.
— Odeio que eu quero você. – ela sussurra. Tenho a sensação de
que ela não quis dizer isso em voz alta.
— Sério? Acontece que eu adoro isso. – eu amo que eu a assusto. Se
isso a assusta, então é real. O que sentimos um pelo outro é real pra
caralho.
Ela balança a cabeça, como se estivesse afastando minhas palavras.
A rainha da evasão.
— Mako. – ela implora. — Não deveríamos estar fazendo isso. Eu
não traio. – Seu corpo pressiona contra minha perna mais uma vez,
contradizendo suas palavras no minuto em que saem de sua boca. Um
sorriso perverso toma conta do meu rosto.
— Prometo não beijar ou tocar em você então. – digo, sorrindo um
pouco mais quando a decepção surge em seus olhos. Eu não estabeleço
contacto. Em vez disso, deslizo os meus lábios levemente contra seu
pescoço, a pele macia com arrepios. Seu pulso vibra contra meus lábios.
Sinto as vibrações enquanto percorro lentamente até seu ouvido.
— Mas isso não significa que não posso ver você se tocar. – eu
sussurro. Um pequeno suspiro escapa de seus lábios macios. Ela para os
pequenos círculos em que está movendo os quadris inadvertidamente.
Dou um passo para trás, observando com fascínio enquanto um rubor
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sobe até seu pescoço.


Tão bonita.
Eu espero. Ela está lutando consigo mesma e não vou forçá-la a
nada. Isso é o que River ainda não entende. Ela tem uma escolha
comigo. E mesmo que não pareça, é ela quem está sempre no controle.
Seus olhos dourados finalmente se erguem para encontrar os meus,
poças gêmeas de fogo derretido. Quando ela levanta a mão e abre o
botão, sinto outro sorriso malicioso contraindo meus lábios. Parece que
ela não se importa em ser má, afinal.
Com uma paciência que não possuo, ela abaixa o zíper da calça
jeans. Enganchando os polegares nas laterais da calça, ela a arrasta pelas
pernas macias. Perfeita. Deus, ela é perfeita. A pele hidratada preenche
minha visão enquanto ela tira a calça e se inclina contra a estante. E com
a graça de uma leoa, ela coloca as duas mãos no topo da prateleira e se
levanta, abrindo as pernas enquanto se senta. Uma calcinha preta
rendada cobre sua parte mais íntima.
Eu tenho que morder o interior da minha bochecha para me impedir
de rasgar o tecido com meus dentes e devorá-la.
— Eu posso te observar também, ou você é um amante egoísta?
Leva um esforço monumental para desviar meu olhar para longe de
sua calcinha e de volta para seus olhos. Meu pau está duro como granito
e pressionando contra o meu zíper, como um prisioneiro desesperado
para escapar de sua cela. Eu sorrio e imito sua reação inicial, abrindo o
botão da minha calça jeans. Seus olhos brilham e sua pequena língua
rosa sai, molhando os lábios em ansiedade.
— Alguém já pensou nisso? – eu provoco, puxando meu zíper para
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baixo, me dando um doce alívio quando a pressão se dissipa. Ela não


desvia o olhar da minha mão, mesmo quando ela me recusa.
— Não.
Meu sorriso aumenta, com nós dois cientes de sua mentira
descarada. Dou um passo para trás até ficar encostado na estante oposta
a ela, pisando na base para ajudar a estabilizá-la, caso contrário, meu
peso me fará espatifar nas prateleiras vazias.
Ela se recosta no braço que não tem um dedo quebrado e planta os
pés na beirada da prateleira. Sua outra mão desliza sobre sua boceta,
seus dedos trilham em sua calcinha, me provocando. Esperando para se
desnudar para mim até que eu o faça. Não tenho nenhum problema em
dar o primeiro passo. Puxo meu jeans e cueca apenas o suficiente para
meu pau sair. Há muita pressão se acumulando. Eu aperto com força,
rangendo os dentes contra a mistura de prazer e dor. Seus olhos se
arregalam, e desta vez ela olha para mim.
Mesmo se eu tivesse força para tirar o sorriso arrogante do meu
rosto, eu não o faria. Não quando ela está olhando para mim como se
não soubesse se quer se aproximar ou fugir. Ela engole em seco e, com
muita delicadeza, empurra a calcinha para o lado.
Fecho meus olhos enquanto minha cabeça cai para trás, com um
gemido saindo da minha garganta. A visão dela quase me deixa de
joelhos.
Tão rosa. Tão linda. E brilhando com o quanto encharcada ela está.
Aperto meu pau novamente, em parte para ajudar a aliviar a pressão
e em parte para dar um choque de controle em mim. Minha cabeça
pende para frente preguiçosamente. Com os olhos semicerrados, ela
separa os lábios e mergulha os dedos dentro. Ela desliza os fluídos até o
seu clitóris, circulando-o lentamente, com um gemido baixo escapando
de seus lábios.
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Minha mão desliza para cima e para baixo em meu pau em


resposta, com um prazer agudo subindo pela minha coluna. Ela circula
os dedos mais rápido, ocasionalmente enfiando os dedos dentro antes de
continuar suas ministrações. Não consigo tirar os olhos dela, assim como
ela não consegue tirar os dela de mim. Os gemidos suaves ficam mais
altos e ousados. Seu corpo ganha vida, enquanto ela abre mais as pernas
e move os quadris desenfreadamente contra a mão.
— Porra, River. – eu murmuro, com minha mão se movendo mais
rápido. Por um instante, seus olhos se fecham e sua cabeça vira, mas ela
rapidamente vira os olhos de volta para mim, como se não suportasse
desviar o olhar por mais de um segundo.
— Eu vou gozar. – ela sussurra, com as pernas tremendo e a testa
franzida.
— Então, faça isso, porra. – eu murmuro, com meu próprio orgasmo
à beira de me consumir. River fica completamente imóvel, até mesmo
sua voz quando ela atinge seu crescendo. E então ela está gozando, e
meu nome é sussurrado em seus lábios. A primeira sílaba do meu nome
é tudo o que preciso ouvir antes de cair do penhasco com ela. Meus
olhos se fecham e meus joelhos ameaçam ceder quando o esperma
quente jorra do meu pau.
— Porra, River. – murmuro, com o prazer intenso quase me
cegando. Ele destrói meu corpo, despedaçando a minha força. Mantenho
meus olhos fixos no corpo de River. Seus olhos reviraram em êxtase e
seus movimentos descontrolados e espasmódicos enquanto ela alcançava
seu orgasmo.
O único arrependimento que tenho é que ela está esfregando a mão,
quando deveria ser a minha língua. Mesmo enquanto gozo lentamente,
com todo o meu corpo mole e tremendo pelo orgasmo mais intenso que
já tive, quero lamber sua boceta até que minha língua caia.
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Sua própria respiração é errática. E ela não encontra meus olhos.


Ela está sentada ereta agora, olhando para o chão, com o peito ainda
arfando e os punhos minúsculos cerrados. Não tenho ideia do que está
passando pela cabeça dela agora, e sou muito covarde para perguntar.
Ela desce da prateleira delicadamente, coloca a calça jeans e enfia
os pés em seu converse, com os calcanhares de seus pés saindo. Eu me
visto, me preparando contra o que quer que saia de sua boca.
Seus olhos dourados erguem-se lentamente para encontrar os meus.
Algo invisível, mas potente, se transfere entre nós. Eu não sei o que é.
Não sei o que isso significa. Mas quero mais disso. Sem dizer uma
palavra, ela se vira e sai do prédio.
Ela estará de volta. Por mais que ela queira negar, ela está tão
viciada em mim quanto eu nela.

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— Oi, baby. – Ryan diz atrás de mim, beijando o topo da minha
cabeça. Estou sentada à minha mesa, fazendo um trabalho para minha
aula de Saúde Publica.
— Oi. – eu respondo distraidamente. Tenho investido em escrever
este trabalho estúpido nas últimas horas, e estou quase terminando.
Meus ombros doem, minha cabeça lateja e tudo que quero é uma garrafa
inteira de vinho na frente.
Um suspiro é arrancado da minha garganta quando minha cabeça
vai para trás. Meu rabo de cavalo está enrolado na mão de Ryan
enquanto ele puxa minha cabeça para trás o máximo que pode. O rosto
inexpressivo de Ryan está acima de mim, olhando para mim com frio
desapego.
— Cheguei em casa de bom humor, pronto para ser mimado pela
minha linda namorada. Em vez disso, tudo o que recebo é um oi. Isso é
jeito de tratar seu namorado?
— Sinto muito. – digo apressadamente, com a minha voz tensa. Seu
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aperto aumenta a um nível excruciante antes que ele me empurre para


frente com força, quase fazendo a minha testa bater na tela do meu
computador.
— Fique bonita para mim. – ele exige friamente. Eu me viro para
ele com cautela, com minha mão esfregando distraidamente a parte de
trás da minha cabeça. Isso dói.
— Onde estamos indo?
— Sair. – ele responde brevemente. Muito informativo, imbecil.
— Preciso saber como me vestir. – eu pressiono. Ele está de costas
para mim agora, e sua cabeça está abaixada enquanto ele tira a gravata e
começa a desabotoar a camisa. A frustração saindo dele é visível. Ele
levanta a cabeça e suspira com raiva mal contida.
— Algo bonito. Um vestido, River. Um que não faça você parecer
uma vagabunda.
Antes que eu possa dizer qualquer coisa, ele arranca sua camisa
branca imaculada. Uma camisa branca com uma mancha vermelha na
gola.
Meu coração para e o meu mundo gira. Ele joga a camisa no cesto,
longe dos meus olhos. Sem esclarecer, ele desaparece em nosso
banheiro, fechando a porta atrás de si. Ouço a água cair segundos
depois.
Você está tirando o cheiro da boceta dela, doce Ryan?
Roboticamente, eu me levanto e caminho até o cesto. Pego a camisa
e encontro a mancha. Está úmida, como se ele tentasse lavar as
evidências, mas não dá para tirar batom vermelho de uma camisa de
grife com água e sabonete barato.
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Eu pressiono o tecido macio em meu rosto e cheiro.


Perfume. Apenas um vestígio disso. Mas o suficiente para saber que
Ryan é um mentiroso. Aposto que ele não demitiu a secretária. Mesmo
que fizesse isso, ele deve ter contratado uma muito nova rapidamente e
já a encantou com seu pau.
Ah, doce Ryan, agora você realmente me deixou louca.
Você me deixou muito, muito... louca.
Meus joelhos caem no chão, incapazes de sustentar meu peso. Meu
peito arfa quando algo parecido com o pânico toma conta do meu
coração com suas garras frias e implacáveis. Meu rosto se contorce
enquanto as lágrimas surgem em meus olhos. Tão difícil - eu tento tanto
segurá-las. Um único soluço escapa, destruindo a frágil represa. Mais
soluços seguem o exemplo quando uma dor aguda apunhala meu peito.
Dei tudo a ele. Tudo de mim. Tudo o que tinha em mim foi entregue
em uma maldita bandeja de prata. Meu coração no meio da bandeja,
sangrando abertamente por ele. E ele pegou uma faca e rasgou mesmo
assim.
Pressiono a camisa no meu rosto, cheiro o perfume desconhecido,
me forçando a nunca esquecer o que ele acabou de fazer comigo.
Recusando-me a me permitir justificar suas ações, a perdoar. Já perdoei
tanto, e tudo por nada. Porra, nada.
Eu me permito um minuto de soluços angustiantes antes de me
acalmar, lento, mas seguramente. Minhas lágrimas secam, meu coração
diminui e algo se instala no fundo do meu peito. Não tenho certeza do
que é, mas é frio e duro, e pega todos os sentimentos que eu tinha por
Ryan e os suga como a porra de um aspirador de pó Dyson 6. É como se
eles nunca tivessem estado lá. Tudo muda, endurece e depois entorpece.
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Tudo o que fez comigo, tudo o que o perdoei não é mais perdoável.
Não a surra, a habilidade mental, viver com medo e ansiedade. Tudo
isso. Não mais.

6 Dyson: é a marca do aspirador.


E o mais importante, eu me perdoo. Desde o dia na biblioteca com
Mako, tenho me punido. Agonizando porque sou uma traidora e uma
prostituta como Ryan sempre me acusou de ser. Não consegui comer
nem dormir nos últimos dias.
E sem motivo. Porque Ryan tem me traído o tempo todo de
qualquer forma. Não me sinto tão mal por trair alguém que estava me
traindo muito antes de a porra do Mako sequer ser considerado. Ryan
nunca mereceu minha lealdade. Quero dizer, realmente, o que ele fez
para merecer isso?
Não posso acreditar que realmente fiquei tanto tempo. Não acredito
que deixei ele me tratar desse jeito. O aspecto físico e sexual nem é a
pior parte, são os malditos jogos mentais que ele jogou. Não é apenas
abuso mental, é uma guerra mental e isso pode ser mais perigoso do que
uma mão levantada. O abuso psicológico e a manipulação é o que
convence as vítimas a ficar e resistir. Eles treinam você para se proteger,
mudando cada parte de você até que você não se reconheça mais. Você é
uma prisioneira em sua própria casa. Existem limitações sobre onde
você pode ir, quanto tempo você fica fora, quem você pode ver e Deus
me livre de sair com alguém sem supervisão. Com muito medo de
parecer bonita com medo de acusações de traição. Mas você vai sair de
casa assim? Deus, você é constrangedora, pelo menos ponha um pouco
de maquiagem. Mas só use quando eu estiver por perto, caso contrário,
você está tentando impressionar outros homens.
Você está bem vestida, para quem você está bonita?
Você quer que os homens olhem para você assim? Você quer que
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eles fodam com você?


Por favor, querida, eu fico tão preocupado que alguém melhor
apareça e leve você para longe de mim.
Você é boa demais para mim. Eu não mereço você.
Você está saindo? Por que, para me trair? Você vai lá para flertar
com outros homens?
Você irá sair com sua amiga? Aposto que vocês estão falando de
outros caras. Por que você sairia com ela sem mim, o que você está
escondendo?
Um ano atrás, não haveria uma maldita pessoa neste planeta que
pudesse me convencer de que eu me permiti chegar a esse ponto. Que eu
deixei um homem me bater. Isso é o que todo mundo sempre diz, certo?
Nunca deixaria um homem me bater. Você nem percebe o que aconteceu
até que seja tarde demais. Você já foi empurrada escada abaixo e levou
um tapa na cara. Já há hematomas nas mãos e impressões digitais
marcando seus braços e pescoço. E você já disse a si mesma que ele
nunca mais fará isso. Que ele está arrependido. Ele está estressado. Você
estava errada. Menina má, má. Sentindo-se culpada por fazê-lo colocar
as mãos em você. Você merece isso. Deixá-lo? Ele vai se matar.
Ninguém nunca vai te amar do jeito que ele ama, e você o ama também.
Você não quer que ele morra.
Mesmo que ele queira que você faça isso.
Jogo a camisa de volta no cesto. Se ele fosse esperto, teria uma
camisa reserva e a jogaria em uma lixeira em algum lugar. Ou talvez ele
simplesmente não dê a mínima se eu vejo ou não. Então, e se eu ver? O
que vou fazer? Deixá-lo?
Não se preocupe, querido, eu não vou te deixar.
Tiro minhas roupas e as jogo no cesto em cima de sua camisa suja.
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Abrindo a porta silenciosamente, eu entro no banheiro cheio de vapor.


O suor imediatamente surge na minha nuca enquanto caminho em
direção ao chuveiro. Vejo a imagem distorcida de seu corpo nu através
do vidro fosco. Seus braços estão levantados enquanto ele enxágua o
cabelo.
Abrindo a porta, entro e a fecho atrás de mim. Ele ainda não se
incomoda em olhar para mim. Tão confiante. Ele não me vê como uma
ameaça. Eu inclino minha cabeça. O quanto quero mudar isso. Fazê-lo
temer minha presença, tremer quando me aproximo.
Sua cabeça está inclinada para trás enquanto a espuma de sabonete
escorre por seu corpo musculoso em uma corrente de água quente. O
corpo de Ryan é lindo. Ele se cuida, vai à academia com frequência e se
alimenta de forma saudável na maior parte do tempo. Ele é magro com
músculos vigorosos e pele bronzeada.
Embora ele possua uma obra de arte, ainda não é tão bonita quanto a
de Mako. Enquanto Ryan é magro, Mako é musculoso. Eu olho para o
meu namorado.
Eu prefiro muito mais o irmão dele.
Ryan não merece possuir um corpo tão bonito. Não dele, e não o
meu.
Eu me aproximo dele, tremendo com o choque da água quente e do
ar frio.
— Eu te magoei? – eu sussurro, deslizando meu dedo por seu peito
e seu abdômen. Paro um pouco antes de alcançar seu pau, já ereto. Eu o
encaro. Ele não é pequeno, um pouco acima da média. Antes eu via isso
como algo que eu não me importava em adorar. Agora, quero envolvê-lo
com minha boca e mordê-lo até que se solte de seu corpo.
Não há como desviar meus olhos da ferramenta que ele usou para
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dar prazer a outra mulher. Ele o enfiou no corpo de outra mulher hoje.
A boca dele tem beijado os lábios dela e sussurrado doces mentiras em
seu ouvido. Com as suas mãos deslizando por sua pele, provavelmente
causando arrepios enquanto ele a fode. Ele provavelmente a olhou bem
nos olhos e a fez acreditar que ele realmente a quer.
Na realidade, tudo o que ele realmente quer sou eu. E ele odeia isso.
Ele odeia me querer tanto. Ele odeia ser tão viciado em mim que sente a
necessidade de me moldar em uma bolinha em suas mãos como massa
de vidraceiro. Ele aperta com muita força e, como massa de vidraceiro,
escorro pelas fendas de seus dedos, separando-me lentamente até
escorrer para o chão.
Ele não pode me conter. E quanto mais ele tenta, mais ele falha.
Meus olhos se levantam ao mesmo tempo em que a sua cabeça
abaixa, aqueles olhos azuis feios e opacos encontram os meus. Meu
mundo está finalmente mudando do jeito que precisa ser. Não sei por
que ele precisou me trair para eu acordar. Não sei por que o abuso físico
e o estupro não foram o catalisador. Talvez porque eu pensei que a dor é
superficial. Eu posso me recuperar. Mas a traição é profunda. É uma dor
que marca como lobos acasalando e durará para sempre. Sabendo que eu
não era boa o suficiente para mantê-lo querendo apenas a mim. Sabendo
que toda vez que ele sai da minha cama, ele está entrando nas pernas de
outra mulher.
E isso simplesmente não vai funcionar.
— Magoou. Mas eu te perdoo. – ele diz simplesmente, antes de se
virar para pegar a bucha.
Eu nunca pedi perdão.
Eu a pego dele, esguicho um pouco desse sabonete líquido nela e
começo a esfregá-lo. Eu o adoro, assim como ele queria. Eu me agacho e
ensaboo suas pernas enquanto a água espirra diretamente no meu rosto.
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Eu mantenho minha cabeça baixa e os olhos fechados enquanto o adoro


a seus pés.
Uma mão envolve meu braço e me levanta.
Sexo no chuveiro nos filmes é falso. A água não apenas escorre do
corpo e magicamente evita seus olhos. Não, isso vai direto para a porra
dos olhos, na verdade. Eu os esfrego como uma criança e olho para ele,
com minhas pupilas agora vermelhas e secas.
Ele sorri para mim, como se eu fosse uma criança bonitinha que
pensa que vai crescer e se tornar uma astronauta.
— Sabe que eu te amo, não é? – ele pergunta. Sua feição mudou
para um suavemente e doce nada.
— Eu sei. – digo. Eu realmente, realmente sei.
E mal posso esperar para mostrar a você exatamente no que seu
amor me transformou.

Ryan me levou a um restaurante elegante chamado Deep Blue. Não


é tão sofisticado quanto o último restaurante, mas a conta facilmente
passará de cem dólares entre nós dois. Fiz questão de escolher a refeição
mais cara do cardápio. Estou terminando minha comida e saboreando
minha terceira taça de vinho quando a sua voz interrompe minha
bebedeira.
— Você se forma em Maio, não é? – ele pergunta, olhando para
mim por cima da borda de seu próprio vinho.
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— Sim. – eu respondo, colocando minha taça na mesa. O vinho me


chama para pegá-lo novamente e terminar. Infelizmente, atuações,
aparências. Não posso envergonhar meu namorado bem-sucedido agora,
caso contrário, sua reputação seria arruinada por uma taça de vinho.
— Quais são seus planos depois da faculdade?
Minha mão vai até a haste da taça, girando-a delicadamente entre
meus dedos com unhas pintadas de vermelho. A secretária dele tem
unhas vermelhas? Aposto que sim. Ryan olha para as mãos dela e finge
que são minhas? Ou ele fecha os olhos e finge que está transando com
ela quando está com as bolas dentro de mim porque não suporta olhar
nos olhos da mulher para quem está mentindo. Então, ele teria que
enfrentar o fato de que é ele quem está errado.
— Vou começar a trabalhar para obter meu doutorado. – respondo.
Ou talvez eu fuja para uma fazenda e dome cavalos selvagens e foda um
cowboy de verdade nos estábulos. Quem sabe?
— Prefiro que você fique em casa.
Mal reprimo o suspiro que se forma no fundo da minha garganta.
— E fazer o que?
Ele olha para mim como se eu fosse estúpida. — Criar nossos
filhos, obviamente. – ele responde lentamente, falando comigo como se
eu sofresse da mesma condição que seu tom.
É bom saber que idiotas abusivos e misoginia andam de mãos
dadas. Ryan e eu já conversamos sobre filhos antes. Eu os quero
eventualmente, mas não estou com pressa; Ryan é inflexível que eu os
tenho de qualquer maneira. Ele tem uma visão tradicional da vida em
que a esposa fica em casa e cria seus pequenos prodígios que um dia
assumirão o escritório de Advocacia, enquanto ele sai para trabalhar e
transar com quem ele quer aparentemente.
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Seríamos o clichê perfeito. Criando pequenos idiotas mimados que


ele só reconhece quando está ensinando lições de vida e moldando-os
em mini Ryans, enquanto eu fico bêbada e chapada para lidar com a dor
de um marido abusivo e me contento com uma vida miserável. E quanto
mais eu me lembro que poderia ter tido uma vida boa se tivesse partido -
com alguém como Mako talvez - mais embriagada eu ficaria até não
conseguir nem lembrar meu próprio nome. Até que não lembro mais o
seu nome.
Não sei de onde veio sua perspectiva. Julie é designer de interiores e
muito bem-sucedida nisso. Ryan sempre dizia que sua mãe só ficou em
casa com ele durante a licença maternidade padrão e depois voltou ao
trabalho, deixando Ryan com uma babá mais velha que ele odiava.
Talvez ele sempre tenha se ressentido com Julie por deixá-lo com a
babá.
Como se estivesse lendo minha mente, ele continua: — Nunca
vamos contratar uma babá para nossos filhos. Não é trabalho de mais
ninguém criá-los, a não ser o seu.
Não é o seu?
— A mãe deve ser sempre quem cria os filhos. Eu ajudo, claro. Eu
não quero que eles cresçam como maricas.
É preciso um esforço extremo para conter a vontade de revirar os
olhos. É mais fácil concordar com ele agora do que discutir enquanto
estamos em público. O que quer que faça o filho da puta feliz.
Eu encolho os ombros. — Ok. – eu concordo como uma boa vadia.
Ele sorri, orgulhoso por eu concordar com suas opiniões sexistas.
Quero socar seu nariz, mais e mais, até que eu esteja encharcada com
seu sangue. Mesmo assim, eu não ficaria satisfeita.
Assim que estou terminando minha taça de vinho, ele se levanta e
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arruma as calças, com seus movimentos inquietos e rígidos. Minha testa


forma um V profundo quando ele anda ao redor da mesa e agarra minha
mão. Eu quase recuo quando sinto como sua mão está suada.
Por que você está tão nervoso, doce Ryan?
Todo o restaurante para e um silêncio paira no salão quando Ryan
se ajoelha e tira uma caixa preta do bolso.
Meus olhos se arregalam, com o choque roubando minha respiração.
Este é o único momento em que Ryan não se importaria de eu parecer
um peixe fora d'água.
— River McAllister, você é o amor da minha vida. Meu coração
bate dentro do seu peito, e não posso viver sem isso. Você me daria a
honra de se casar comigo?
Depois de sua fala cafona, ele abre a caixa, exibindo um anel
enorme e espalhafatoso. É um anel de diamantes com um grande
diamante circular no meio, incrustado por um anel de pedras amarelas.
Odeio diamantes circulares. Também odeio diamantes coloridos.
Especialmente amarelo. Quem quer um diamante amarelo?
Faço questão de cobrir minha boca, que se curva em um resmungo
sob a mão que ainda está engessada com meu dedo indicador. Um gesso
que foi causado por ele. Arregalo os olhos dramaticamente e penso em
quanto tempo perdi com esse pedaço de merda. Ele está me pedindo em
casamento no mesmo dia em que transou com outra mulher.
Que poético da sua parte, doce Ryan.
Lágrimas ardem em meus olhos, exceto em alegria em vez de pura
euforia.
Não é inteligente dizer não a ele aqui. Ele vai ficar envergonhado.
Absolutamente mortificado. E ele vai me matar antes que eu tenha a
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chance de escapar. O desgraçado já sabe que vou dizer sim.


É preciso uma quantidade extrema de disciplina que eu não sabia
que possuía para não rir na cara dele. Só consigo pensar em uma
maneira de passar por esse maldito show. Vergonhosamente, imagino
Mako. Mako de joelhos diante de mim, sorrindo para mim com aquele
sorriso arrogante e olhos verdes brilhando com amor.
Mako - o homem incrivelmente irritante que não fez nada além de
arriscar o pescoço por mim e tentar me ajudar. E embora na maioria das
vezes eu queira torcer seu pescoço, não posso negar a intensa conexão
subjacente com ele. Especialmente depois da biblioteca, onde me
desnudei para Mako e me fodi com os dedos enquanto ele assistia e
gozava.
Esse lembrete traz um sorriso genuíno ao meu rosto. É tudo que
preciso dizer o que preciso dizer a seguir.
— Sim! – eu exclamo, estampando uma máscara de felicidade em
meu rosto. Na realidade, levei apenas alguns segundos para responder.
Seu ombro cai em alívio e seu rosto se abre em um sorriso ofuscante,
mostrando seus dentes brancos perfeitos. Dentes que eu adoraria ver
decorando nossos pisos imaculados.
Ele desliza o anel feio no meu dedo, o anel complementando meu
gesso branco ironicamente. Abro minha mão, sorrindo por fora e furiosa
por dentro. A minha vida se resumiu a isto. Um anel de noivado feio e
um dedo quebrado.
Pelo menos ele foi atencioso o suficiente para não quebrar meu
dedo anelar.
Nós dois nos levantamos, com a bugiganga de metal queimando
meu dedo com uma vingança ardente. Eu quero arrancá-lo, eu odeio a
sensação. Seus lábios tocam os meus, rápido e sem paixão. Ryan não faz
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bem demonstrações públicas. Eu gostaria de foder alguém em um


banheiro público sujo só para irritá-lo.
O restaurante aplaude respeitosamente, com flash de celulares e
uma garrafa de vinho de cortesia é enviada à nossa mesa. Bebo três
quartos dele enquanto Ryan olha para minha mão como se ele
finalmente tivesse pego o animal exótico em sua armadilha sádica. Eu o
encaro e me pergunto por que ele pensou que eu gostaria de ser pedida
em casamento em um maldito restaurante.

— Porra, eu te amo tanto. – Ryan murmura contra meu pescoço.


Estamos na mesma posição em que estávamos depois que conheci os
pais dele pela primeira vez. Exceto que desta vez, quero que ele saia de
cima de mim. Estou rígida e indiferente, com meu rosto se contorcendo
de desconforto.
— Eu também te amo, mas querido, não quero fazer isso agora. –
digo, empurrando seu peito nu um pouco para trás. Ele para friamente,
virando seus olhos sem alma para os meus.
— Por que você não iria querer? – Sua voz é desprovida de emoção.
Uma faísca de ansiedade acende dentro de mim, como a primeira faísca
de fogo em uma noite fria de inverno.
— Tive cólicas o dia todo. Acho que a minha menstruação estará
começando em breve. – eu minto. Se ele me conhecesse, saberia que não
menstruo com meu anticoncepcional.
— Não me importo com um pouco de sangue. – ele diz. Meu nariz
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inadvertidamente franze em desgosto. Eu provavelmente transaria com


alguém na minha menstruação se eu o desejasse o suficiente, mas essa
pessoa nunca mais será Ryan. Não quando ele é um idiota traidor.
No entanto, de alguma forma, sou a prostituta.
— Querido, isso é nojento. – digo, adicionando um sorriso que
espero que ele ache encantador.
— Você acha que eu querer você é nojento? – ele pergunta, com
raiva surgindo em sua voz. Suas mãos apertam meus braços enquanto os
olhos de Ryan escurecem com algo perigoso. Esta conversa está indo
ladeira abaixo rapidamente, e acho que sou forte o suficiente para
mantê-la rolando. Não quero fazer sexo com ele. Eu não deveria ter que
fazer isso.
— Não. – digo lentamente. — O fato de eu estar dizendo não e você
não aceitar é nojento.
Minha cabeça está virando para o lado quando uma explosão de dor
surge em meu rosto. Meus ouvidos estão zumbindo quando Ryan fica na
minha frente. O filho da puta me deu um tapa.
— Você não pode me dizer não. Sou seu noivo, o que significa que
posso tocá-la e fodê-la sempre que eu quiser.
Minha bochecha está pegando fogo. Lágrimas ardem em meus
olhos, e isso só me irrita. Eu juro que este homem se diverte com minhas
lágrimas e dor.
Ele dá um passo para trás, com os braços abertos com uma
expressão horrorizada no rosto.
— Acabamos de ficar noivos. Achei que ficaria animada, River. A
maioria das garotas estaria arrancando as roupas de seus noivos agora.
Eu não entendo.
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Alerta para manipulação. Como eu nunca vi isso antes? Sempre


que eu ficava com raiva o suficiente para perceber que estou namorando
o maior idiota depois de Hitler, ele encontrava uma maneira de me atrair
de volta com sua manipulação e palavras doces.
— Você disse que pararia de me bater. – digo em vez disso. Seu
rosto franze de raiva.
— Sério, River? Acho que sou a vítima aqui. Eu apenas me expus,
me tornei vulnerável a você e fiz algo que nunca fiz por nenhuma outra
garota, e você tem a coragem de me rejeitar.
— Não rejeitei você, Ryan. Eu disse sim. – digo calmamente. Ele
olha para mim como se eu fosse estúpida.
— Está me rejeitando agora. – ele fala com os dentes rangendo. Esta
é uma batalha perdida e posso sentir o desamparo surgindo. Foi isso que
me tornou tão complacente? Que talvez se eu concordasse com as
coisas, eu não iria gritar ou ser espancada?
Ninguém pode negar que o amor de Ryan é mais seguro que sua
raiva. Mas o que ele tenta esconder é que não existe amar você sem que
ele fique com raiva de você por isso.
Eu aceno uma vez. — Eu estou.
Seu rosto fica vermelho, com sua ira se tornando uma entidade
totalmente diferente.
— Você gosta de me irritar, River? Sabe o que acontece quando eu
fico irritado.
Há tantas maneiras de responder a essa pergunta. Você bate, você se
enfurece, você estupra...
Naquele momento, Bilby se aproxima, sentindo a crescente tensão
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na sala. Acontece em câmera lenta. Observo os olhos de Ryan


abaixarem para o meu gato e testemunho o momento em que a ideia o
atinge. Seus olhos se tornam glaciais, e um sorriso maligno surge em
seu rosto. Eu me inclino para frente enquanto Ryan pega Bilby pela
nuca, provocando um grito de dor nele.
— Solte-o! – grito, correndo em direção a ele.
Não, não. Não meu gato. Qualquer coisa menos meu gato.
Ele balança Bilby para fora do meu alcance, ignorando os miados e
gritos altos do gatinho inocente.
— Aparentemente preciso te ensinar uma lição. Se me desobedecer,
não terá coisas boas. Incluindo a porra do seu animal imundo. Eu vou
matá-lo, River. – ele grita, sacudindo meu bebê em suas mãos.
— Pare! – eu choro histericamente, mais uma vez estendendo a mão
para o meu gato. — Farei o que você quiser, Ryan. Por favor, solte-o.
Por favor, por favor, por favor! – eu imploro histericamente, com o
pânico tomando conta. Não consigo desviar o olhar de Bilby. Lágrimas
escorrem pelo meu rosto enquanto o desespero completo e absoluto
toma conta.
Nunca senti um desespero assim antes. Não quando eu estava sendo
estuprada quando criança. Não enquanto eu estava sendo espancada até
quase morrer. Não por Billy ou Ryan.
Ele me encara por dez segundos antes de largar o Bilby.
Paralelamente, o meu suspiro de alívio escapa junto com meu gato do
aperto forte de Ryan. Choro mais alto, agora de puro alívio por ele não
ter machucado seriamente meu bebê. Bilby sai correndo, com seu miado
raivoso em seu rastro.
Assim que dou um passo à frente, pronta para esmagar seu maldito
crânio, ele está me agarrando pelos braços e me arrastando escada acima
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enquanto reajo e grito. Quando consigo me desvencilhar de suas mãos e


tento correr de novo, ele me empurra com força. Meus joelhos cedem e
desço as escadas voando.
Um grito escapa, com meus braços sustentando o peso da minha
queda. Eu viro, com a bunda acima da cabeça e o meu cóccix caindo
dolorosamente na beirada do degrau. Outro grito é arrancado da minha
garganta, com meus olhos se arregalando com a dor excruciante.
Sua mão está no meu cabelo no segundo seguinte e, a cada passo,
ele me arrasta escada acima pelos cabelos. Os fios estão sendo
arrancados do meu couro cabeludo. Reajo contra ele, tentando encontrar
apoio com meus pés nos degraus para detê-lo, mas ele apenas puxa com
mais força. Quando ele tem que agarrar meu cabelo de novo porque
arrancou muito cabelo, desisto dessa tática, agarro o seu pulso e me
levanto, tentando ao máximo aliviar um pouco a dor.
Finalmente, chegamos ao quarto. Ele me joga no chão com força,
fazendo a minha testa bater no chão de madeira. Em meio isso, desejo
carpete no quarto. Aceitaria queimaduras de carpete do que colisões e
hematomas do chão implacável.
Suas mãos agarram a frente do meu vestido, e de uma só vez, rasga
o vestido completamente no meio, deixando-me em nada além de minha
calcinha. Outro puxão e essa é arrancada do meu corpo agredido
também.
Não demora muito para que ele esteja me penetrando com força.
Parece que estou rasgando de dentro para fora. Eu fico com raiva dele e
uso minhas unhas para arranhá-lo. Ele dá um tapa em minhas mãos e
depois me dá um tapa no rosto com tanta força que quase desmaio. As
estrelas surgem em minha visão enquanto ele continua a usar meu corpo
para seu próprio prazer.
Meu coração está batendo forte, meu corpo está doendo e minha
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mente está em pânico total enquanto ele me estupra.


Eu nunca paro de lutar, no entanto. Mesmo depois do momento em
que ele goza dentro de mim.
Quando ele sai, eu me arrasto para a beirada da cama e me encolho
em uma pequena bola patética. Tudo o que posso fazer é chorar. Chorar,
chorar e chorar. Chorar por Bilby. Chorar por mim.
Isso é tudo culpa sua, River. Você deveria ter deixado ele te foder.
Bilby nunca teria se machucado se você tivesse deixado.
— Só para você saber, eu tenho misturado antibióticos em suas
bebidas. Você deveria estar grávida agora. – ele diz casualmente. Meus
olhos se abrem de horror, com um tipo diferente de pânico quase me
sufocando.
Ele está mentindo. Ele tem que estar. Deus, por favor, me diga que
ele está mentindo.
— E se você tentar ir embora, especialmente com meu bebê, eu vou
te encontrar. Não há polícia que me impedirá de te encontrar, River. E
quando eu fizer isso, vou matar você.

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— Você precisa que eu vá buscá-la? – A voz aveludada diz como
uma saudação pelo alto-falante do meu celular. Fecho meus olhos, com
a tentação tomando conta.
Diga sim, River. Diga sim.
— Não. – eu suspiro. Meu lábio encontra-se entre meus dentes
enquanto me preparo para o que estou prestes a pedir a ele. — Preciso
que você leve Bilby.
Mako fica em silêncio do outro lado da linha, acelerando o meu
coração. E se ele disser não? Para onde iria Bilby? Amelia é
severamente alérgica a gatos, e não há absolutamente nenhuma maneira
de mantê-lo na mesma casa que Ryan. Não depois da noite passada. Eu
me recuso a colocar meu gato em perigo. Ele significa tudo para mim, e
eu nunca me perdoaria se ele acabasse morto por causa de minhas más
escolhas.
— Bilby? – ele repete finalmente, confuso.
— Meu gato.
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Mais silêncio.
— Ryan machucou o gato?
Meus olhos se fecham novamente, constrangida com as palavras
prestes a sair da minha boca. — Sim. Não posso pôr em risco a vida
dele.
— Mas você pode a sua própria? – Eu ranjo os dentes. Não importa
que tenha me preparado para isso antes mesmo de ele dizer, isso ainda
me irrita.
— Mako, por favor. – digo em vez disso, com o mesmo desespero
da noite passada se aproximando. — Não estou ligando para você para
falar sobre mim. Eu… eu só preciso que o Bilby fique seguro agora. Por
favor.
Seu suspiro baixo é abafado. — Preciso ir buscá-lo?
— Não. Não, vou entregá-lo antes da aula de hoje.
— Estarei lá. – Meus lábios se curvam enquanto as lágrimas ardem
meus olhos. Nem sei exatamente por que estou chorando, mas o desejo
está se tornando insuportável. Talvez porque tenha que desistir do meu
gato - temporariamente - porque ele não está mais seguro na casa para
onde o trouxe. Eu me sinto tão envergonhada. Isso é algo pelo qual
nunca vou me perdoar.
— Mako?
— Sim, River?
— Obrigada. Por isso.
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Dois olhos redondos me inspecionam da cabeça aos pés.
— Parece que finalmente está recebendo o que merece. – comenta
Barbie, antes de colocar os lábios enrugados em volta de um cigarro.
Ignoro o comentário dela, considerando que já me envolvi em uma
armadura para desviar de seus comentários desagradáveis e presunção.
Apenas Barbie ficaria satisfeita com o fato de sua filha estar sendo
abusada. Especialmente quando esta é a vida que ela sempre quis para
mim, e fui estúpida o suficiente para acreditar que estava conseguindo
algo que ela nunca conseguiu - segurança.
Olho para o maço quase vazio sobre a mesa. No momento, não dou
a mínima para germes.
— Dê-me um. – digo em vez disso, acenando com a cabeça em
direção aos cigarros. Surpreendentemente, ela empurra o maço junto
com o isqueiro. De uma mulher abusada para outra, às vezes tudo o que
precisamos é de um cigarro.
Tiro um cigarro, acendo e trago avidamente.
Não tenho ideia se Ryan realmente batizou minhas bebidas. Talvez
eu esteja grávida, mas agora estou com muita dor para parar de fumar o
cigarro. Faz uma semana desde que ele me pediu em casamento, quase
matou meu gato e então prontamente me espancou - de novo - e ele não
me deixou fora de vista uma vez, até esta noite. Felizmente, ainda não
mostrei sinais de gravidez, então estou começando a duvidar de sua
ameaça.
— Você sabia que Billy estava matando pessoas por toda a cidade?
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– eu começo. Barbie meio ri, meio zomba, com o som cheio de pigarro.
— O que lhe deu a impressão de que ele não estava matando
pessoas? – ela pergunta com condescendência.
Balanço minha cabeça. — Isso é diferente. Billy é inteligente o
bastante para encobrir os seus assassinatos. Ele os está deixando
deliberadamente do outro lado da cidade, aparentemente no último ano.
Ele é considerado um serial killer - eles até o apelidaram de Ghost
Killer.
Barbie ri abertamente, com os seus olhos sem vida brilhando de
alegria. Barbie foi exposta a vários cadáveres ao longo de sua vida.
Principalmente por overdose, mas posso apostar que ela também
testemunhou assassinatos. Provavelmente de viciados em drogas
enlouquecidos tendo colapsos mentais e entrando em ataques psicóticos.
E tenho certeza de que Billy fez de algumas pessoas um exemplo para
garantir que Barbie permanecesse em seu lugar.
— Isso é muito engraçado. – ela diz entre risos, apagando o cigarro
em uma lata de cerveja vazia. Ela costumava manter cinzeiros de vidro
por perto até quebrá-los todos na cabeça de seus clientes. Agora é mais
simples usar o lixo. Afinal, há uma tonelada disso por aqui.
Reviro os olhos para sua elegância.
— Você sabe que isso não é normal para Billy. Ele está sob o radar,
Barbie, e você sabe disso. Por que ele estaria deixando corpos pela
cidade?
Seus olhos se movem, e algo como medo surge em seus olhos.
Desapareceu antes que eu possa ter certeza.
— Ele está ficando viciado em metanfetamina de novo. – ela diz
casualmente. Mas não é nada casual, nós duas sabemos disso. Já se
passaram mais de quinze anos desde que Billy ficou viciado em seu
próprio produto e começou a matar todos os seus homens. Ele invadiria
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a casa, furioso por não ter mais ninguém em quem pudesse confiar
porque todos eles estão mortos.
Barbie era inteligente o suficiente para não fazer perguntas. A
mulher não saberia lhe dizer quanto é oito vezes nove, mas ela não viveu
tanto tempo lidando com alguém como Billy apenas por pura sorte. Ela é
incrivelmente esperta, mesmo quando está chapada. Tantas vezes, eu me
perguntei se a Barbie é muito mais sábia do que ela deixa transparecer.
Então, Barbie manteria sua boca fechada, eu ouviria através da porta
e Billy desabafaria sobre como todos os seus homens continuaram
fodendo as garotinhas que ele trafica e arruinando seu valor. Ou eles
estariam roubando suas drogas ou dinheiro para si mesmos. Ou eles
davam a ele um olhar que ele não gostava.
Seja qual for o caso, ele matou todos eles. Isso colocou Billy em
uma situação difícil quando ele não tinha ninguém para cumprir as suas
ordens. Ele largou as drogas, reconstruiu seu império e ficou bem desde
então.
— Eu não entendo. Ele sabe o que aconteceu da última vez.
Barbie pressiona os lábios, encolhe os ombros magros e acende
outro cigarro. Eu faço o mesmo. Vou precisar dele para esta conversa.
Billy em metanfetamina é... o mal encarnado. É o juízo final. Ele é o
terceiro anticristo que Nostradamus previu.
— Eu não sei o que aconteceu. – ela finalmente diz. — Explica por
que ele apareceu do nada e nos espancou.
Ambas as nossas feridas daquela noite foram curadas, apenas para
serem substituídas por outras. Ela pode gargalhar e rir ao me ver, mas
não parece nada melhor. A única diferença é que a Barbie nunca deixou
de exibir hematomas. Esse é o normal dela. Neste ponto, cada parte de
mim sofreu algum tipo de trauma que não tenho certeza se sei mais
como sentir dor. Acho que estamos virando iguais.
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Olho para a minha mão, com um gesso feio e um anel ainda mais
feio. Eu nem sei por que ainda estou usando essa maldita coisa.
— Ele pode voltar a qualquer momento. – ela continua, tirando-me
dos meus pensamentos sombrios. Seus olhos viram para mim com um
aviso claro. Barbie nunca me avisa sobre nada, exceto o Billy.
Especialmente Billy drogado. Não deixo isso subir à minha cabeça e
pensar que é porque ela realmente se importa comigo. Mas se eu morrer,
esta casa será leiloada e todas nós sabemos que a Barbie não tem
dinheiro para comprá-la de volta.
Por mais que ela odeie, eu estou mantendo-a a salvo das ruas. Se
alguém podia sobreviver, essa seria a Barbie. Ela é como uma maldita
barata, a vadia poderia sobreviver ao apocalipse. Não significa que ela
queira, no entanto.
— Ele tem aparecido com frequência? – pergunto, embora eu possa
sentir meu coração disparar. Não tenho a ilusão de que estou segura
aqui. Que Billy aparecendo nunca mais acontecerá. Mas eu esperava que
ele estivesse muito ocupado matando seus homens em vez de vir ver a
Barbie.
Ela dá uma tragada no cigarro, atrasando uma resposta que eu
gostaria muito de saber. Se ele vem com frequência, então corro mais
perigo do que imaginava.
Por fim, ela responde. — Cerca de uma vez por semana. Ele esteve
aqui ontem à noite.
O súbito desejo de fugir desta casa quase me paralisa. Eu tenho
minhas respostas. Ou pelo menos a resposta que vou conseguir quando
se trata do diabo. Hora de ir.
— Então acho que é hora de eu ir embora.
Barbie sorri. Eu disse isso casualmente, mas, novamente, esta não é
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uma conversa casual. Ela gosta do fato de Billy me assustar. A única


coisa boa de Billy me espancar quase até a morte é que ele passa menos
tempo batendo em Barbie. Contanto que ele se abstenha de me matar
completamente, Barbie não dá a mínima.
— Divirta-se com seu Billy 2.0 em casa. – ela diz, gargalhando em
volta do cigarro. Eu me levanto e olho para ela. Ela parece e cheira a
leite vencido. Como suas palavras poderiam me machucar?
No entanto, elas mexem com algo em mim de qualquer maneira.
Não machucam. Mas dá algo como determinação.
— Ah, eu vou.

— O que diabos aconteceu com você? – Amelia grita, seu rosto é a


imagem perfeita de raiva e choque. Eu poderia fotografar essa cena e ela
seria vendida por milhões. A quantidade de emoção transmitida em seu
rosto é realmente muito bonita.
— Você acreditaria em mim se eu dissesse que caí?
— Ele está batendo em você?! – ela grita, com as suas pequenas
mãos subindo para segurar meu rosto. Sou alguns centímetros mais alta
que Amelia, mas os seus instintos maternais sempre a fizeram parecer
maior que eu. Ela vai ser uma mãe incrível.
— O que levou a essa conclusão? – eu desconverso, habilmente
afastando meu rosto de suas mãos quentes e me virando para caminhar
em direção ao meu carro.
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— Ah, não, você não vai. – ela diz, passando por mim e parando
bem no meu caminho. Ela põe as mãos na cintura, com a barriga
protuberante realçada pelas mãos pequeninas, e me encara com a
impaciência e raiva mal contida. Não posso culpá-la. Eu mataria
qualquer um que fizesse isso com Amelia.
Suspiro, com meus ombros caindo em derrota. — Você não pode
dizer nada, Amelia. Eu... eu consigo lidar com ele.
Seus olhos se arregalam como balões transbordando de hélio. Logo
eles vão estourar. Isso não pode ser bom para o bebê.
— Por favor, não leve a mal, River, mas com certeza parece que
você é a única que está sendo manipulada. – ela responde, com a voz
significativamente mais suave. Eu aceno com a cabeça porque ela está
certa. Não parece que eu manipulei Ryan.
— Tenho que jogar com inteligência. – digo. Ela morde o lábio,
parecendo contemplar algo.
— Quero que você fique comigo. Você não pode voltar para aquela
casa.
Tenho sido muito boa em evitar Ryan desde a noite em que ele me
pediu em casamento, ameaçou matar meu gato e me estuprou com
poucas horas de intervalo. O que deveria ser o dia mais feliz da minha
vida, virou o mais tenebroso muito antes de Ryan fazer o pedido.
Aposto que está fodendo com a secretária enquanto conversamos.
— E eu planejo fazer isso... eventualmente. – eu acrescento com um
olhar triste. — É uma situação delicada que precisa ser tratada como tal.
Não quero te envolver nisso, Amelia. Prefiro morrer a envolver você e
seu bebê ainda não nascido em qualquer tipo de perigo.
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Amelia morde o lábio um pouco mais, parecendo ainda mais


perturbada a cada segundo.
Ela balança a cabeça. — Não. Sinto muito, mas eu não estou
permitindo isso. Não há nenhuma maneira no inferno que vou deixar
você continuar a colocar sua vida em perigo. Se você voltar, ele vai te
matar. E então estarei grávida na prisão.
Abro um pequeno sorriso.
— Ele não vai me matar. – eu sussurro. Eu não vou deixar. Ryan
teve que usar uma gola rolê para trabalhar na última semana de como
minhas marcas eram profundas e vermelhas de quando ele me estuprou.
Uma vez que elas desapareçam, ele simplesmente transformará isso em
uma noite de sexo selvagem e orgasmos que eu claramente não poderia
suportar.
— Claro, que ele não vai. Eu vou matá-lo primeiro. – Uma voz
grossa diz atrás de mim. Eu paraliso, o que faz com que cada dor em
meu corpo ganhe vida. Minha respiração fica mais curta, e juro que é só
porque está mais quente aqui fora do que as bolas de um atleta depois do
treino.
As sobrancelhas de Amelia abaixam e ela inclina o tronco para o
lado para ver Mako melhor. — Quem é você? – ela pergunta, com sua
voz aguda. Se eu não me sentisse uma merda dessas, quase daria risada.
Mako passa ao meu redor, com seu corpo enorme superando o de
Amelia. Ela olha para ele com admiração, com sua pequena boca aberta
em perfeito O. Seus olhos observam lentamente seu corpo incrivelmente
em forma, as tatuagens colorindo ambos os braços até os pulsos e a pura
tensão sexual que ele irradia. Eu ficaria com ciúmes se soubesse que ela
não estava perdidamente apaixonada por David e grávida dele. Eu
também não estou interessada em admitir que ficaria com ciúmes.
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Olho para as costas de Mako enquanto ele estende uma mão


enorme. Minhas bochechas ficam vermelhas quando penso no que
aquelas mãos poderiam fazer comigo. Com ele, ele os usaria para coisas
que só me excitariam, isso é uma promessa.
— Eu sou Mako. Sou o irmão legal. – ele cumprimenta. Amelia
aperta sua mão como se ela fosse a rainha da Inglaterra e ele um humilde
camponês. Apesar da minha frustração de Mako aparecer mais uma vez,
sorrio com a insolência de Amelia.
— Uhum. – ela murmura, não convencida. A única coisa que
Amelia sabe é que eu fiquei na casa dele quando Ryan estava sendo um
idiota depois que Billy me espancou até quase morrer. Eu não disse a ela
que Mako foi quem veio me buscar depois que Ryan me deixou no sofá
indefesa e cuidou de mim de uma maneira que Ryan nunca fez, ou sobre
como ele manteve Bilby em sua casa na semana passada. Também
nunca contei a ela sobre todas as vezes que Mako apareceu depois das
minhas aulas para me convencer a deixar Ryan. Certamente não contei a
ela sobre os incidentes da biblioteca e como perdi todo o bom senso e
deixei Mako chegar muito perto. Qualquer que seja a magia que aquela
biblioteca tenha sobre mim, é perigoso quando Mako está por perto.
Mas o pior de tudo, eu nunca disse a ela como Mako é um homem
pecaminosamente delicioso. Amelia o olha de cima a baixo, com ambas
as mãos agora erguidas em seu quadril arredondado como uma mãe
desprezando seu filho. Ela realmente vai ser uma mãe incrível.
Eu rezo para estar por perto para testemunhar isso.
Quando os olhos desconfiados de Amelia desviam para mim, me
sinto como aquela criança desprezada. As palavras não precisam sair de
sua boca para que eu saiba que ela está magoada. Eu tenho mentido para
ela. Por omissão, mas guardar segredos ainda é mentir.
Eu dou a ela um sorriso tímido. — Você tem algumas explicações a
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fazer. – ela diz com um olhar que diz que você está em apuros.
Mako olha para mim, com um sorriso pecaminoso no rosto. A
maneira como ele olha para mim só pode ser descrita como obscena -
com seu sorriso lascivo e olhos ardentes. E com Amelia observando a
interação com muita atenção, me dá vontade de limpar o olhar do rosto
dele com um pano Clorox e depois borrifar os olhos dele com Lysol para
garantir.
Limpo minha garganta e olho para Amelia com o sorriso mais
inocente que consigo. O que não quer dizer muito quando nada sobre
mim jamais foi inocente.
— O Mako aqui se alistou como meu cavaleiro pessoal de armadura
brilhante, não importa o quanto eu tentei mostrar a ele que eu sou o
dragão. – eu explico. Amelia levanta uma sobrancelha.
— É? E há quanto tempo ele tenta e não consegue salvá-la? – ela
pergunta, com seu tom quase condescendente. Amelia sabe tão bem
quanto eu que nunca fui de aceitar ajuda. Não importa se você é uma
fera de um 1,85m com patas de urso no lugar das mãos, vou chutar suas
bolas se isso significar que você vai parar de tentar me salvar. Parece
que sempre acabo querendo apenas acariciar as dele, mas pelo menos o
recado já foi dito.
— Muito tempo. – murmuro. Eu gritei na cara de Mako e até dei um
tapa na maldita obra de arte sexy e, infelizmente, ele ainda persiste.
Então, parece que vou ter que dar um chute nas bolas dele a seguir... e
então talvez acariciá-las.
— River deixou perfeitamente claro que pode cuidar de si mesma.
Apesar de suas habilidades de durona, o que deixei perfeitamente claro é
que não vou a lugar nenhum até saber que ela está segura. E se der uma
olhada na Prova A. – ele aponta para meu rosto machucado. — Isso
ainda não aconteceu.
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Abro a minha boca para mostrar a ele que meu pé está prestes a
desaparecer quando Amelia me interrompe. — Ok, crianças.
Claramente, isso vem acontecendo há algum tempo. – ela me dá um
olhar feio. — Acho que está claro que River está em uma situação difícil
e nem sempre é fácil sair imediatamente, não importa o quanto
queremos que ela saia.
Meus ombros relaxam com a compreensão inesperada de Amelia.
Às vezes esqueço que Amelia também teve uma infância difícil. Ela
cresceu com um pai alcoólatra e abusivo. Mesmo depois de completar
dezoito anos, ela ficou por perto para tentar cuidar dele até ir para a
faculdade. Até hoje, ela ainda luta contra seu amor por ele.
O maior equívoco com os sobreviventes de abuso é que eles estão
fazendo a escolha de ficar. Qualquer um na nossa situação iria embora se
fosse assim tão fácil. Mas quando alguém está ameaçando sua vida
diariamente, às vezes ficar parece ser a escolha mais segura. Mesmo que
você saiba que isso vai te matar um dia.
O abuso imprevisível ainda é previsível, e isso pode ser um pouco
menos assustador do que tentar reconstruir uma vida por conta própria
com o medo constante de que essa pessoa venha atrás de você e a roube.
Todo aquele trabalho duro se foi. E às vezes sua vida também.
— Vou deixar vocês dois resolverem qualquer tensão que esteja
acontecendo aqui. River, espero um telefonema mais tarde. – Amelia
anuncia, ainda de olho na minha estranha interação com Mako. Como eu
poderia estar pensando em outro homem quando o atual em minha vida
está me usando como um saco de pancadas está além de nós duas. Mas
está acontecendo. E eu não tenho certeza de como diabos parar isso.
Ou se eu quero.
Amelia me dá um abraço de despedida, dá uma última olhada em
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Mako e caminha em direção ao carro. Eu me viro em direção ao homem


mais frustrante que já conheci.
— O que você quer agora? – eu resmungo, assumindo a posição de
Amelia e colocando minhas mãos em meus quadris. Engulo várias vezes
para engolir o caroço na minha garganta quando me lembro que eu
poderia parecer com Amelia em alguns meses também. Uma barriga
arredondada para olhar e me assombrar.
Seus olhos se estreitam, mas, no entanto, ele não responde. Em vez
disso, ele enfia as mãos nos bolsos e olha pelo campus.
— Eu só quero te ajudar, River. Isso é tudo. – ele diz finalmente.
Levanto uma sobrancelha. — Você não quer me foder?
Olhos verde-esmeralda se voltam para mim, brilhando como joias
recém-polidas. O mesmo sorriso lascivo abre em seu lindo rosto, e foda-
se, se meu coração não para e acelera ao mesmo tempo.
— Eu quero foder você, e não apenas quero, mas vou foder você. –
ele diz com ousadia. Meu coração aperta com a promessa. Odeio que
minha boceta fique molhada em resposta. Mas eu amo ainda mais. —
Mas não é por isso que quero ajudá-la. Não posso cortejá-la e mostrar-
lhe como é um homem de verdade se você estiver morta.
Não posso deixar de respeitar alguém que é tão franco quanto eu.
Bato o meu pé e franzo os lábios, contemplando as intenções deste
homem. Além dos incidentes da biblioteca, ele nunca deu nenhuma
indicação de que quer me roubar para seu próprio ganho pessoal. Não há
como negar o que ele fez por mim. Levar Bilby sempre será algo pelo
qual serei grata. Manter meu gato seguro significa mais para mim do que
sou capaz de expressar.
— Como está o meu bebê? – pergunto, mudando de assunto para
longe de mim.
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— Ele ainda está se adaptando. Você nunca disse o que exatamente


aconteceu, mas acho que ele ainda está se recuperando. Ele é muito...
cauteloso.
O fato de que minha adorável bolinha de pelo agora está reduzido à
desconfiança é de partir o coração. Ainda não tive a chance de visitá-lo,
mas assim que o fizer, vou enchê-lo de tanto amor que ele não saberá o
que fazer com isso.
— Ele dorme comigo à noite, no entanto. – Mako continua, sentindo
meu humor acabando. — Ele está se recuperando, River. Ele vai ficar
bem.
Aceno com a cabeça enquanto mordo o meu lábio, sempre me
preocupando com ele. A culpa nunca desaparece.
Mako olha ao redor, com meus olhos seguindo o mesmo caminho.
Estamos em campo aberto e Ryan se formou apenas alguns anos
atrás, antes de partir para a faculdade de Direito. Ele era muito popular e
nunca abandonou nenhum de seus amigos de faculdade completamente.
Muitas vezes, Ryan, o maioral, se encontrava com seus colegas de
faculdade no campus ou aparecia em festas da faculdade. As pessoas o
conhecem. Eles me conhecem. E quer conheçam Mako ou não, podem
facilmente fofocar e dizer a Ryan que estou falando com outro homem.
Um homem muito grande e muito atraente. Aquele que fica olhando
para mim como se eu fosse a cobertura que ele gosta de lamber em seu
cupcake.
— Eu preciso ir para casa. – digo em vez disso.
— Deixe-me levá-la para sair. Em algum lugar que não seja uma
biblioteca, por mais que eu goste disso.
Odeio a pouca consideração que dou à minha resposta. — Tudo
bem.
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Eu me viro e vou embora.


— Quando? – ele diz.
Virando, dou alguns passos para trás e digo: — Você é bom em me
perseguir. Tenho certeza que você pode descobrir um horário e data. –
Seu sorriso é lento e preguiçoso, enviando todos os tipos de sentimentos
direto para o meu âmago antes de eu lhe dar as costas mais uma vez.

A fama e a fortuna dos Fitzgeralds não poderiam ter afetado minha


vida no pior momento possível.
A balconista atrás da caixa registradora olha minhas compras e
depois me olha. Ela é uma mulher mais velha e astuta com cabelo
grisalho, extraflácida com as rugas e um brilho de curiosidade nos olhos.
Ela é definitivamente o tipo de vizinha intrometida, constantemente
espiando pela janela para espionar as pessoas. Ainda bem que ela não é
minha vizinha. Eu apenas abriria as minhas cortinas, abaixaria minha
calcinha, abriria minhas pernas e daria a ela um show que ela nunca
esqueceria. E aposto que ela nunca mais olharia pelas minhas janelas
novamente.
— Você não está namorando Ryan Fitzgerald? – ela pergunta,
pegando cada caixa e observando-a. Cinco delas no total.
É da minha natureza ser rude e dizer a toupeira para cuidar da vida
dela. Mas aquela vozinha no fundo da minha cabeça - aquela que ainda
não dei um fora - ainda exige que eu proteja a reputação de Ryan. Não
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para o benefício dele, mas para o meu. Se eu vou sair viva desta
situação, seria estúpido cutucar o urso antes de preparar a armadilha.
— Sim. – digo com alegria forçada. Espero que ela não veja como
meu sorriso é falso. Parece que foi tão eficaz quanto Botox seria em seus
pés de galinha.
— Espero que sim, se você se encontra na situação que pensa estar.
– ela comenta, tocando alguns botões na tela. — US$ 60,87.
Porra, estes são caros. Eu insiro meu cartão com mais força do que o
necessário. Ela também não perde isso. Ou talvez os nervos em sua
flacidez não estejam funcionando bem e ela não está realmente me
dando um sorrisinho presunçoso.
Minha transação termina quando ela guarda meus itens. E agora o
momento constrangedor em que ela espera o recibo sair da máquina
enquanto penso em apunhalá-la no olho com a caneta presa ao colete de
trabalho. Quando ela entrega o recibo, dou o sorriso mais doce que
consigo.
— Muito obrigada, senhora.
Nós duas estamos revirando os olhos quando me afasto.

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Olho para os pauzinhos, à beira das lágrimas.
Não estou grávida.
Alívio total preenche meu corpo, tão potente que quase desmaio.
Luto para esconder os pauzinhos em um dos meus tênis.
Ryan está com outro humor. Estou sentada no closet, soluçando e
chorando enquanto ele anda pela casa. Estou nua e ainda mais
machucada do que antes. Ele não me bateu desta vez, apenas me fodeu
com força até eu gritar de dor. Só então ele fodeu com mais força. Acho
que ele não precisou bater dessa vez quando obedeci como uma boa
garotinha e o deixei profanar meu corpo.
Ele não gosta que eu não ame mais fazer sexo com ele. Isso o
incomoda, o corta profundamente. Ele quer de volta o que tínhamos no
começo. Quando poderia ser tão rude quanto quisesse, e eu imploraria
por isso. Eu não recuaria toda vez que a sua mão chegasse a um
centímetro do meu rosto. Meu rosto não se curvaria em desgosto, meus
olhos não ficariam vidrados enquanto eu me desligava. Toda vez que
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mostro meu descontentamento, ele mostra o dele de forma violenta e


raivosa.
Muita coisa mudou desde a noite em que conheci os pais dele, cinco
meses atrás. Parece que foi o começo de nossa ruína. Por quê? O que
possivelmente poderia ter um efeito tão dramático e negativo?
Conhecer Mako.
Ryan era rude e manipulador. Mas ele não me atacou até que Mako
apareceu. O que há em seu irmão que ele odeia tanto?
É porque ele é mais bonito? É porque Mako é o tipo alto, moreno e
bonito, enquanto Ryan se parece com o típico garoto de fraternidade?
Não, Ryan é muito vaidoso para isso. Sua aparência foi validada durante
toda a sua vida. As mulheres caíram a seus pés, implorando por sua
atenção desde que as garotas pararam de pensar que os garotos tinham
piolhos.
Se eu não o conhecesse bem, pensaria que Ryan está com medo de
Mako. Mas por quê? Qualquer pessoa com bom senso tem medo de
aranhas ou cobras. Os especialistas dizem que têm mais medo de você
do que você delas, certo? Bem, essas filhas da puta picam quando estão
com medo. E às vezes essas picadas acabam sendo muito mortais.
Tropeço em meus pés, limpando o ranho do meu nariz e enxugando-
o em uma das camisas de botão de Ryan. Meu lado do closet é caótico.
Ryan ficou irritado quando usei uma camisa com gola em V para a aula
outro dia, então agora a maioria das minhas roupas estão rasgadas em
pedaços, ainda penduradas nos cabides como espantalhos desfigurados.
Eu ando e toco um dos meus vestidos favoritos. Um vestido verde
esmeralda sexy que moldava meu corpo como uma criança abraçaria seu
brinquedo favorito. Isso me lembra dos olhos de Mako.
Usei isso no clube muitos anos atrás, quando Ryan era apenas uma
fantasia para mim. As memórias daquela noite voltam à tona. A
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bartender sexy. Os chás gelados Long Island. As gotas de limão. Aquele


homem…
Eu não tinha me esquecido dele, pelo menos não completamente. Eu
pensei nele de forma consistente por um longo tempo depois disso. Mas
assim que Ryan entrou oficialmente em minha vida, guardei aquela
pequena memória no canto mais distante do meu cérebro, deixando-o
para juntar teias de aranha e aranhas como companhia.
Agora, eu afasto as teias e descubro um dos momentos mais
emocionantes da minha vida. Sentir o homem misterioso atrás de mim,
tocando-me habilmente, deixando-me ofegante e carente por mais. Sua
respiração fazendo cócegas na minha orelha, enviando arrepios na minha
coluna e enfraquecendo meus joelhos. Fecho meus olhos, movendo
enquanto relembro minha memória favorita.
Se eu me perder o suficiente, posso sentir as mãos fantasmas se
curvando ao redor de meus quadris, seu peito largo pressionando minhas
costas. Meu corpo se encaixando no dele como uma peça de quebra-
cabeça.
Ryan nunca dançou comigo assim antes. Na verdade, ele nunca
dançou comigo.
Certa vez, Ryan me acompanhou a um bar. Eu o arrastei para a pista
de dança, rindo e gritando, tonta com algumas doses de vodka. Movi
meu corpo sedutoramente, olhando apenas para ele, e ele respondeu
saindo da pista de dança.
Mais tarde, me disse que eu estava dançando como uma prostituta e
isso o envergonhou.
Uma lágrima escorre do meu olho enquanto toco o tecido rasgado.
Essa foi uma das primeiras coisas que ele agarrou, com a tesoura nas
mãos e um olhar selvagem. Ele abriu a tesoura e arrastou a ponta afiada
pelo vestido, várias vezes enquanto eu apenas observava em silêncio,
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com lágrimas escorrendo pelo meu rosto.


Eu estava com muito medo de gritar e reagir. Eu não queria aquelas
tesouras apontadas para mim.
— River! – Ryan grita do lado de fora do closet, fazendo-me pular
vários metros. Toda vez que ouço sua voz, a sobrevivente em mim quer
enfiar a mão em sua garganta e arrancar sua laringe. Mas a pobre
garotinha dentro de mim quer se encolher como uma bola e me esconder
dessa porra de mundo cruel.
Porra, qual é o maldito sentido de estar viva? Talvez eu devesse me
matar. Eu inclino minha cabeça para trás e sorrio. O pensamento não
parece tão ruim. Pelo contrário, soa bastante sedutor, como a voz da
sereia conduzindo os marinheiros para a morte. Eu poderia ser esse
marinheiro, entregando minha vida de bom grado. Desvanecendo-se em
silêncio feliz, com nada além de escuridão me cercando. Não o mesmo
tipo de escuridão que tem sido minha sombra durante toda a minha vida,
mas apenas... nada.
Não me importa se existe céu ou inferno. Eu não me importo se eu
me tornar um espírito preso neste mundo. Qualquer coisa é melhor do
que esta vida.
A porta se abre, com a maçaneta quase quebrando contra a parede
de gesso. Eu não me mexo.
— Onde está Bilby?
Eu quase rio. Só agora ele percebeu que o gato sumiu? Suponha que
eu não deveria estar surpresa. Ryan nunca prestou muita atenção a ele de
qualquer maneira. Abaixo minha cabeça e encontro os olhos azuis
enlouquecidos. Como seriam seus olhos cheios de amor e ternura?
Sempre que pensei que estava encontrando isso em seus olhos, era
apenas o reflexo de como um sociopata pensava que essas emoções
deveriam ser.
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— Eu o devolvi ao abrigo. – eu minto. Deus me livre de dizer a


Ryan que o gato está na casa de Amelia e ele vai procurá-lo lá. Existem
vários abrigos em nossa cidade. Seria fácil dizer que Bilby já foi adotado
se Ryan fosse louco o suficiente para encontrá-lo. Eu esperava que ele
fizesse algo assim só para trazer o gato de volta e me torturar com ele.
Seus olhos se estreitam em fendas finas. — Por quê?
— Porque você quase o matou. – eu respondo brandamente. Estou
achando difícil dar-lhe emoção também. Estou achando difícil sentir
isso. Ele avança mais para dentro do closet, adotando o que deveria ser
uma pose intimidadora. Alargando sua postura, ele se inclina para mim
com os punhos cerrados e olha para mim por cima do nariz.
— Eu lhe dei permissão para entregá-lo? – ele grita.
Eu fungo. Olhos mortos encontram olhos mortos. — Não pedi.
A última coisa que eu vejo antes de fechar os olhos é o choque
estampado em seu rosto e, em seguida, instantaneamente isso se
transformando em fúria descontrolada.
Não abro os olhos de novo, mesmo quando sinto o aperto de Ryan
em meu bíceps me sacudindo. Eu não os abro quando ele me joga contra
a parede, segura minha cabeça com força contra meu compartimento
pintado de branco, assim como Billy fez quando eu estava curvada sobre
aquela mesa suja, e me pegou por trás.
Ele perdeu todo o sentido. Ele não se importa mais em fingir. Ryan
e River não existem mais. Agora é apenas um lunático e sua prisioneira.
Isso significa que se Ryan parou de fingir ser bonzinho, eu também.
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Olho para o meu celular, com a tela embaçada pelas lágrimas em


meus olhos. Quem eu chamo, quem eu chamo? Poderia ligar para Mako,
mas porra, algo dentro de mim só... não quer que ele me veja assim.
Estou envergonhada - tão envergonhada. E Amelia está grávida e eu
prefiro morrer do que colocar em risco ela e seu bebê ainda não nascido.
Eu passo uma mão trêmula no meu rosto. Porra, porra, porra.
Ryan está ficando furioso. Já se passaram mais duas semanas e tudo
o que fez foi me empurrar e constantemente me estuprar e sodomizar.
Toda vez que eu revido, ele fode com mais força. Já decidi como quero
lidar com minha situação, mas preciso ser inteligente.
Ele está irritado esta noite.
Queimei a caçarola, então ele me fez pegar o prato quente do forno
sem luvas. Obviamente, deixei cair a caçarola de vidro no segundo em
que a toquei. O prato quebrou e a comida voou para todos os lados.
Pequenos cortes e queimaduras cobrem minhas mãos agora. O chão
está limpo, mas o temperamento de Ryan ainda está mais quente do que
a comida queimada. Preciso dar o fora daqui antes que ele me mate.
Nunca o vi tão zangado. E juro por Deus que vou matá-lo antes que ele
me mate se tentar esta noite.
Antes de vir para cá, entrei no escritório dele e cortei a internet. Ele
está furioso com isso desde então, ao telefone com a empresa de TV a
cabo, ainda não tendo descoberto que a internet não vai voltar até que a
empresa de TV a cabo envie um cara. As câmeras de segurança estão
conectadas ao Wi-Fi, o que significa que as gravações não serão salvas
em nossa nuvem.
Ryan tem me vigiado obsessivamente pelas câmeras, mesmo
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quando ele está em casa comigo. Estarei fazendo algo banal e Ryan
aparecerá e apontará algo que fiz de errado enquanto ele estava no
escritório, me observando. Então, sem Wi-Fi, não pode me vigiar em
seu celular e, desde que possa me ver, não há como escapar.
Percorro meus contatos e paro na única pessoa para quem poderia
ligar agora. Eu realmente não quero, mas ela entenderia minha situação
melhor do que a maioria. Clico no botão de chamada antes que eu possa
mudar de ideia e levo o celular trêmulo ao meu ouvido.
— Alô?
Deus, Alison parece tão doce. Eu me encolho me afastando de sua
voz.
— Sou eu. – digo baixinho.
— Onde você está? – ela pergunta instantaneamente, com sua voz
endurecendo como aço.
Deixo cair minha cabeça em minha mão, não me importando que
qualquer contato com as queimaduras envie chamas percorrendo minha
carne. O fato de ela saber sem que eu precise dizer nada é uma prova do
que tem lidado há anos. Não há como eu ter ficado tanto tempo quanto
ela. Não porque sou mais forte que ela, mas porque sou mais fraca e
teria me matado. Eu já quero depois de apenas dois anos.
— Na casa dele. Mas posso encontrar você na esquina. – Sussurro.
— Estarei lá em dez minutos.
Meu dedo aperta o botão vermelho antes que eu possa dizer a ela
para não vir. Com o coração acelerado, fico com as pernas bambas, pego
uma sacola e começo a colocar roupas nela. O closet se tornou meu
espaço seguro de Ryan e, na maioria das vezes, ele me deixa ficar com
isso.
Um armário bate na cozinha abaixo de mim. Não há como eu
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escapar de casa sem que ele me veja se ele estiver na cozinha. É no final
do corredor do hall de entrada e o psicopata estará vigiando a porta da
frente como um falcão. Tentei sair há alguns dias sem a permissão dele
e acabei ficando amarrada à cama durante a noite.
Meus pulsos ainda doem e as lesões ao redor deles ainda não
cicatrizaram.
Calço um par de tênis, abro silenciosamente a porta do closet e
espio ao redor. Ele ainda está lá embaixo. Cada passo é amplificado pelo
meu coração acelerado enquanto caminho até a janela. Há um telhado do
lado de fora da janela e, ao lado da casa, é uma estrutura coberta de
trepadeiras e lindas flores cujo nome não sei. Nunca me importei em
aprender.
Mordendo meu lábio, eu gentilmente levanto a janela. Para mim,
parece que estou arranhando um quadro-negro com um prego, mas, na
realidade, quase não faz barulho. Hesitantemente, eu saio. A primeira
lufada de ar fresco é emocionante e aterrorizante ao mesmo tempo.
Como se não me apressasse, nunca mais terei o prazer de experimentar o
ar fresco. Bem quando vou fechar a janela atrás de mim, Ryan entra no
quarto. Eu paraliso. Ele paralisa. Nós dois olhamos um para o outro em
estado de choque.
Em conjunto, nós dois entramos em ação. Ele corre para a janela
enquanto eu corro em direção à extremidade da casa.
— River, volte aqui. – ele grita. Sua voz não é alta o suficiente para
chamar a atenção para nós. Há apenas algumas casas por perto, mas
estão perto o suficiente para ouvir um barulho alto.
Chego à extremidade da casa e corro ao longo da até chegar ao
terraço. Assim que piso o pé, uma mão de aço envolve meu bíceps e me
puxa de volta. Eu grito, mas é imediatamente abafado pela mão de Ryan.
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— Sua puta do caralho! – ele grita quando eu mordo sua mão.


Antes que eu possa gritar de novo, seu punho está batendo na lateral da
minha têmpora. A escuridão ameaça tomar conta de mim. As estrelas
surgem em minha visão enquanto ele me puxa pelo asfalto áspero no
telhado em direção à janela, murmurando palavrões baixinho.
Se ele me levar de volta para lá, ele vai me matar. Com os olhos
arregalados e atordoados, luto e reajo o máximo que posso. Não posso
deixar que ele me leve de volta para lá. Não posso.
Voltamos para a janela. Meu celular no bolso de trás vibra, e isso
me dá vontade de morrer por dentro. Alison está aqui, no final da rua
onde ela não pode me ver. Porra, eu estava tão perto da liberdade.
Ryan põe uma perna na janela, desliza seu torso com os braços
ainda segurando meu corpo que se debate e, de uma só vez, ele me puxa
para dentro. Eu agarro as laterais da janela, mas meus dedos escorregam
antes que eu possa agarrá-la completamente. Minha visão oscila e estou
lutando para me equilibrar antes de ser jogada no chão de madeira. O
monstro diante de mim fecha a janela com força. Ele olha para mim,
com seu rosto vermelho tomate e seus olhos quase pretos de raiva.
Nunca vi algo tão assustador na minha vida.
Quando eu era criança, aqueles homens não queriam me matar tanto
quanto queriam usar o meu corpo. Mas Ryan? Ryan quer me matar.
Mesmo que seja inútil agora, eu grito o mais alto que posso.
Ele avança em minha direção. Eu chuto, tentando ganhar tração para
que eu possa me afastar dele.
— Volte aqui, porra! Você pensou que poderia fugir de mim, não é?
Sua putinha, eu te dei tudo!
Uma mão está envolvendo meu cabelo e me puxando para cima.
— Sinto muito! – eu grito. Nem sei por que diabos disse isso. Eu
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não sinto muito. Não estou arrependida de jeito nenhum. Mas meus
instintos de sobrevivência estão me perseverando.
— Ah, você vai se arrepender. – ele murmura, me arrastando para o
banheiro. Não tenho ideia do que ele planejou para mim, mas foda-se se
vou deixar isso acontecer.
— Foda-se. – digo. Meu corpo fica completamente mole, tornando-
se um peso morto em seus braços. O peso repentino é inesperado,
fazendo-o tropeçar. Antes que ele possa continuar me puxando, eu viro,
arrancando o cabelo no processo e chuto suas bolas. Sempre pensei que
seria Mako quem receberia isso, mas, mais uma vez, eu estava errada
quando se trata desse homem.
— Vadia! – ele grita, imediatamente se curvando e respirando com
dificuldade. Meu pé se levanta e eu o chuto na testa, empurrando sua
cabeça para trás. Ele grita e cai no chão. Com o coração batendo forte,
eu me levanto e corro para as escadas. A adrenalina correndo em minhas
veias está atingindo níveis tóxicos, me deixando sem fôlego.
— Volte aqui! – ele grita, com sua voz estridente e enlouquecida.
Com muito medo de olhar para trás, continuo correndo, alcançando as
escadas e quase me jogando. Os passos pesados de Ryan soam atrás de
mim. Ele está perto. Muito perto. A cozinha fica mais perto do que a
porta da frente e ele está logo atrás de mim. Vai demorar muito para
abrir a porta. Virando rapidamente, sigo em direção à cozinha a toda
velocidade. Quando me viro para a cozinha, a mão de Ryan encontra
meu braço, quase me acertando.
Eu vou direto para as facas. Eu tenho planejado por este momento,
mas não assim. Isso deveria acontecer quando ele estava dormindo, e eu
tendo a vantagem. Mas não estou prestes a deixar esse momento passar
em branco. Não quando finalmente posso me vingar.
Alcanço as facas no momento em que os braços de Ryan envolvem
minha cintura e me puxam para trás. Meus dedos já estão fechados ao
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redor da maçaneta, fazendo com que a gaveta se solte da fenda com


isso. Talheres e facas se espalham pelo chão. Um pico de excitação
acende dentro de mim quando vejo todas as coisas que poderia usar para
matá-lo, apenas um braço de distância.
Tão perto.
O monstro atrás de mim levanta o meu corpo, com minha barriga
abaixando abruptamente com a falta de peso, e então me joga no chão,
com a parte de trás da minha cabeça batendo no chão de ladrilhos. Tudo
ao meu alcance. Minha respiração, meu coração e minha visão.
Estou imóvel no chão enquanto tento lentamente recuperar o fôlego.
Minha visão volta, revelando Ryan de pé sobre mim, ofegante como um
touro irritado com um cavaleiro em suas costas. Seus punhos se fecham
e se abrem, aparentemente tentando reinar em alguma aparência de
controle.
Meus olhos desviam para os dele, e só posso imaginar como pareço
para ele. — Você vai me matar Ryan? – eu provoco com os dentes
rangendo, olhando para ele intensamente. Nunca odiei tanto alguém na
minha vida.
Foda-se a Barbie, ou Billy, ou qualquer um dos homens nojentos
que se aproveitaram do meu corpo inocente. Aqueles homens não me
deviam nada. E pelo menos a Barbie nunca me fez amá-la. Pelo menos
ela nunca me deu qualquer esperança de que ela me amaria.
Este homem diabólico me construiu apenas para me destruir. Fazer-
me amá-lo e contar-me mentiras sobre me amar também. Deu-me uma
vida confortável onde eu não precisava de nada. Dizia-me que ele queria
um futuro com a garota decadente de Shallow Hill com uma bagagem e
uma atitude enfadada.
Ele enfiou a mão na cavidade do meu peito, puxou meu coração e
comeu no jantar. Isso era pessoal, porra.
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Um brilho escuro surge lentamente em seus olhos até que estou


olhando para um homem possuído por um demônio. Seu lábio superior
se curva com um rosnado e ele me observa como um leão faria com uma
gazela.
— Ainda não decidi o que quero fazer com você. – ele diz, olhando
meu corpo de cima a baixo como se estivesse catalogando exatamente
onde e como vai infligir dor.
Eu me levanto nos cotovelos, encontrando seus olhos, apesar do fato
de estar tonta e prestes a desmaiar. Mesmo com tudo se aproximando de
mim, eu me recuso a desistir. — Você está mapeando aonde você vai me
machucar? – eu provoco, mostrando os meus dentes. — Não há um
centímetro do meu corpo que você já não tenha danificado.
Estreitando os olhos, ele se inclina e me levanta pelos meus bíceps.
Meu corpo é um peso morto, tornando mais difícil levantar-me sem
esforço como ele planejou. Isso só o enfurece mais, o que, por sua vez,
me dá mais satisfação. Eu cuspo na cara dele, e no momento em que ele
se afasta e levanta as mãos para enxugar, dou uma cabeçada nele.
Não tenho ideia de como dar uma cabeçada apropriadamente, mas
presumindo que minha adrenalina tenha subido a níveis perigosos, eu
quase não sinto isso. Ele joga a cabeça para trás, o sangue jorra de seu
nariz e da minha bochecha, e parece que ganhei na porra da loteria. No
alto de sua dor, chuto a sua rótula antes que ele possa recuperar a
compostura.
Quando ele cai de joelhos com um grito, uma sensação de calma se
instala em mim. Parece que toda a minha vida me levou a este momento.
Todo o abuso, todos os homens agindo como se fossem donos do meu
corpo, finalmente se tornou realidade.
Os xingamentos e ameaças cheios de dor de Ryan desaparecem em
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segundo plano, tornando-se um ruído. Fico sem peso, com meu corpo
flutuando no ar. Com serenidade, eu me inclino e agito minha mão
sobre o sortimento de facas no chão, provocando-o sobre qual faca eu
vou pegar. Finalmente, minha mão pousa sobre a faca maior. Quando ele
vê a faca que escolhi, seus olhos se arregalam comicamente.
Eu rio, curtindo seu susto.
Levantando-se, ele avança em minha direção, presumindo que
levará a melhor. Como um filme em câmera lenta, observo minha mão
em um arco perfeito, com a faca deslizando por sua bochecha. Observo a
pele se abrir sob a lâmina afiada, o sangue surgindo do ferimento e
escorrendo pelo rosto, e apenas sorrio.
Ele grita, absolutamente enfurecido.
Ah, não. O que ele fará agora que seu rosto perfeito foi marcado
para sempre?
E tudo o que posso fazer é sorrir.
O choque o paralisou, mas o prazer mantém meu corpo relaxado e
livre. Eu movo a faca mais uma vez, com a ponta da lâmina deslizando
em seu peito, parando-a em seu caminho. Ele olha para baixo em
descrença, com a dor ainda não ofuscando o choque puro surgindo
através de seu sistema.
Muito lentamente, seus olhos se erguem para encontrar os meus
enquanto sua boca fica aberta. Não tenho certeza se posso descrever o
olhar que surge em seu rosto. Algo parecido com onde-eu-me-meti.
Dou a ele um sorrisinho perverso. — É a minha vez de ser a quem
pune. Página 298

Arrastar o peso morto de Ryan vários lances de escada é algo para o


qual nunca me preparei. Treinar na academia seria como flutuar na água
em comparação com isso. Levantando - e bastante embaraçosamente -
finalmente o levo para o sótão. Há muitas vigas expostas para escolher,
sendo esta a única parte da casa inacabada.
Enrolo uma corda grossa em volta da viga, amarro no pulso de Ryan
e a uso como um sistema de roldanas. O corpo de Ryan se ergue até as
pontas dos pés tocarem o chão. O suor escorre abundantemente dos
meus poros enquanto amarro a corda a outra viga de madeira a um metro
e meio de distância. Eu testo a resistência da corda, satisfeita quando ela
sustenta com firmeza.
Eu me movo rapidamente, cobrindo a área abaixo de Ryan com
toalhas. Mais tarde, terei que ir à loja comprar plástico. Infelizmente,
não mantemos itens prontos para serial killers em nossa casa. Se houver
muito sangue, ele encharcará e manchará a madeira. Remover sangue de
madeira bruta seria... sim, não vamos chegar a esse ponto.
Meus dentes mordem uma tira de fita adesiva, arrancando alguns
pedaços e batendo cada um no corte no peito de Ryan. Não sei muito
sobre o corpo humano, mas não parece muito profundo. O suficiente
para precisar de pontos, não o suficiente para abrir quaisquer órgãos ou
veias vitais.
O sangue pinga lentamente nas toalhas. A visão me deixa nervosa.
Eu não estava preparada para isso ainda, mas não tenho escolha agora. É
sexta à noite, tenho até segunda de manhã para descobrir o que diabos
vou fazer.
Agora que o tenho aqui na minha frente, indefeso e ferido, não há
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como me parar agora.


Pela segunda vez, estou olhando para o meu celular e pensando para
quem ligar. Apenas algumas horas atrás, eu estava me perguntando
exatamente a mesma coisa, mas em circunstâncias completamente
diferentes. Parece que foi há muito tempo desde que Ryan me atacou e
eu o pendurei para morrer.
Mais uma vez, analiso minha lista muito curta de opções. Amelia
está fora de questão. Mako é um maldito detetive, seria ridículo chamar
um policial. Não tenho outros amigos ou família. Ninguém mais a quem
recorrer. Exceto…
Discando o número antes que eu mude de ideia, repito a história.
Desta vez, não estou chorando pateticamente no chão do closet, nua e
com medo. Agora tomei um banho, ainda maltratada, mas não mais
derrotada.
— River?! Ah meu Deus, você está bem? – A voz frenética de
Alison enche meu ouvido. Eu sorrio com sua preocupação. Doce Alison.
— Estou bem. – eu garanto. Embora estar “bem” seja subjetivo,
suponho. Estou bem em fazer o que acabei de fazer? Ainda não descobri
isso. Eu estava antes, mas agora que está diminuindo a adrenalina, o
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pânico está começando a se instalar um pouco.


Mas você morreu, River? Não. Não posso dizer que sim.
— Onde você está? Ele te machucou? Deixe-me ir buscá-la. – ela
está quase histérica, e quase me esqueço e pergunto por quê. Embora eu
saiba que Alison sofreu anos de abuso nas mãos de Ryan, não me
ocorreu até agora que ela poderia ter que lutar por sua vida.
Como acabei de fazer.
— Que tal eu ir até você? – Sugiro em vez disso. Não quero passar
mais um minuto nesta casa agora. Está muito barulhento aqui. Ficar
sentada sozinha com meus pensamentos enquanto processo o que diabos
acabei de fazer só vai causar um colapso mental. Preciso me acalmar e
me afastar da situação para que eu possa descobrir o que diabos vou
fazer.
Ela faz uma pausa, aparentemente desconcertada com a minha
tranquilidade e tendo a opção de sair. Quando com Ryan, não há opções.
Não, não. Há apenas ouvir instruções.
— Si... sim. – ela gagueja, depois de deixar a pergunta pairar um
pouco longo demais com o choque.
— Estarei aí em breve. – digo, desligando antes que ela possa dizer
ou perguntar qualquer outra coisa. Não tenho ideia do que diabos vou
dizer a Alison. Ela certamente fará perguntas. Obviamente, ela vai fazer
um monte de perguntas. A última vez que ela ouviu falar de mim, eu
estava chorando ao telefone, implorando para que ela viesse me salvar.
Que estupidez, River.
Não sei o que estava pensando.
Eu não preciso ser salva. Eu nunca precisei.
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— Sinto muito por ter te chamado de vadia.
Alison olha para mim, com a testa franzida em confusão. Estamos
sentadas em sua cama de hóspedes, uma de frente para a outra e em um
silêncio constrangedor. Nenhuma de nós sabia o que dizer. Saí do meu
carro e a encontrei na porta da frente, quieta e reservada, mas não
morrendo de choque. Acho que ela não sabe como agir.
Tentar escapar de Ryan não é algo que você simplesmente... se
afasta. Talvez mancando ou rastejando, mas certamente não andando. E
você com certeza não vai fazer isso como se fosse uma modelo andando
na passarela.
— Quando você me chamou de vadia?
— Na minha cabeça. – eu pauso. — Várias vezes.
Sua boca exuberante se curva em um sorriso e ela balança a cabeça
com diversão. — Tudo bem, eu também fiquei na defensiva em relação
a ele, até que finalmente consegui escapar.
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Eu encolho os ombros, não aceitando a saída que ela está me


dando. — Você estava tentando ajudar, e eu me convenci de que você
era a vilã. Pior de tudo, você repetidamente me contou sobre sua própria
dor com ele, e escolhi não acreditar em você. Há vítimas suficientes
sendo culpadas neste mundo, e sinto muito por ter me tornado uma
dessas pessoas.
Algo como gratidão brilha nos olhos de Alison. Desvio o olhar, sem
saber como processar essa resposta. Isso me deixa desconfortável. Toda
essa situação, na verdade. Nunca na minha vida corri para alguém
pedindo ajuda - não até Ryan entrar na minha vida. Quebrei a promessa
não dita para mim mesma várias vezes. Começando com Mako quando
Billy quase me matou, e agora com Alison, onde eu... não consigo
pensar nisso agora.
— Então, e Ryan? – ela pergunta, notando meu desconforto. — Ele
não desiste facilmente. A única razão pela qual escapei foi porque ele
pensou que eu e Mako estávamos dormindo juntos.
Meu mundo para em seu eixo e meu coração hesita como um motor
teimoso finalmente morrendo. — Você e Mako estavam dormindo
juntos?
Seus olhos se arregalam e ela move as mãos na frente dela em um
movimento para se apoiar. — Não, não, absolutamente não. Mako me
ajudou a ficar longe de Ryan. Em um ponto, eu queria… mas Mako não
retribuiu esses sentimentos e eu estou sinceramente feliz por isso. Ser
completamente removida da vida de Ryan é exatamente o que precisava
para me recuperar.
O que, esse homem tem algum maldito complexo de herói salvador?
— Estou feliz que ele ajudou você a fugir. – digo sinceramente.
Realmente estou. Não há muitos homens neste mundo que fariam o que
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Mako faz para afastá-las de um relacionamento abusivo.


Ela sorri para mim timidamente. — E agora ele está ajudando você.
Levanto uma sobrancelha. — Não vou contar a Ryan que fodi com
o irmão dele.
Mesmo que eu tenha chegado perto de fazer exatamente isso.
Suas bochechas coram, com o seu semblante se transformando em
mortificação.
— Não foi isso que fiz. – ela ri nervosamente. — Quando terminei
com Ryan, decidi ter Mako aqui caso Ryan tentasse me atacar. E foi
exatamente isso que aconteceu. Mako veio e Ryan fez suposições. E
bem, nenhum de nós o corrigiu, para ser honesta. Foi uma saída fácil
depois disso. Ryan olhou para mim como se eu tivesse a peste bubônica,
e assim... – ela estala os dedos. — Ele não queria mais nada comigo. Eu
estava livre.
Ah.
Talvez eu pudesse ter considerado esse caminho se não tivesse feito
o que já fiz. Isso provavelmente teria sido muito menos confuso.
— Não acho que Ryan vai ser mais um problema para mim. – digo
distraidamente, com meu olhar distante enquanto imagino uma cena na
minha frente - Mako vestido com uma armadura branca e desviando o
golpe de Ryan com uma espada. É comicamente excitante, para ser
honesta.
— O que quer dizer? – Sua pergunta me traz de volta à realidade.
Meu cérebro leva um segundo para entender e ainda mais para processar
a pergunta. O que ela quer dizer, o que você quer dizer? — Por que
Ryan não seria mais um problema? – ela pergunta quando olho para ela
com confusão.
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Ah, porra. Eu disse isso em voz alta.


Meu coração bate forte enquanto eu tento descobrir como diabos
responder a isso. Devo dizer que Ryan me deixou por sua secretária?
Não, ela nunca acreditaria nisso. Ryan não abre mão de seus pertences,
mesmo quando se cansa deles. Manter suas vítimas sob sua armadilha
significa menos chance de sairmos e arruinar sua reputação.
Engraçado como ele estava com tanto medo de eu arruinar sua
reputação quando se preparou para isso sozinho. Mulheres desprezadas
não esquecem.
— Eu o matei.
River, sua vadia burra.
Fecho meus olhos em resignação, frustrada por não conseguir
manter minha boca fechada. Preciso dizer a ela que era uma mentira.
Que eu não quis dizer isso - que eu só quero. Ela entenderia isso, não é?
No entanto, algo dentro de mim não permite que minha boca abra e
retire isso.
Mantenho os meus olhos fechados, esperando pelo bombardeio de
perguntas e histeria, talvez algumas por que você faria isso e você deve
confessar. A última coisa que espero é sentir lábios macios tocando os
meus. Meus olhos se arregalam de espanto. E lá está ela. Seu rostinho
doce - tão perto que parece um ciclope - em ângulo oposto ao meu
enquanto ela me beija suavemente.
Não retribuo de imediato, em vez disso, encaro seus olhos fechados
enquanto tento processar que Alison está realmente me beijando. Ela
abre um olho - ou talvez os dois, não sei dizer -, mas não se afasta. Eu
gosto que ela seja ousada o suficiente para não se afastar. Gosto que ela
esteja esperando que eu registre o beijo antes de decidir como reagir. E
eu gosto que ela está me beijando.
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Gentilmente, eu a beijo também, movendo meus lábios contra os


dela sensualmente. Com olhos fixos em um olhar estranho e íntimo,
nossos lábios exploram lentamente. Algo como alívio faz seus olhos
fecharem, e assim como bocejar depois de outra pessoa, meus olhos
começam a fechar também.
Em segundos, nossos olhos estão bem fechados enquanto nossas
bocas ficam ousadas. O primeiro toque de sua língua contra a minha
parece cetim em chamas. Suas mãos deslizam em minha juba de cachos
enquanto uma das minhas mãos envolve sua nuca e a atrai para mais
perto.
Isso parece diferente. Bom. Incrível, na verdade. Diferente de tudo
que já senti antes. Não ouso compará-lo com os sentimentos que Mako
provoca em meu corpo e alma. Não, não quando isso parece incrível de
uma maneira completamente diferente. Não parece que duas almas
colidem e se apaixonam - parece uma cura.
Faço o primeiro movimento, empurrando-a para ver até onde isso
vai. Minha mão agarra sua coxa, parando apenas por um momento antes
de deslizar lentamente para cima até encontrar a junção de seu quadril.
Um gemido suave chega à minha língua. Quase sorrio em resposta. A
noção é completamente apagada do meu processo de pensamento no
segundo em que sinto a mão dela deslizar pelo meu peito e segurar meu
seio.
Meu mamilo instantaneamente fica duro em um bico pontudo, e isso
é todo o encorajamento que precisamos. Tudo acontece rapidamente.
Nossas roupas são tiradas rapidamente, e meu corpo nu está deslizando
sobre o dela. Nossas mãos estão se tocando em todos os lugares, macio
movendo contra macio enquanto a paixão começa a nos dominar.
Ela me vira, me surpreendendo com seu domínio. Seu corpo macio
desliza contra o meu, e eu aprecio a sensação de sua pele contra a minha.
As pontas de seu cabelo fazem cócegas em meus ombros quando ela se
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inclina sobre mim. Ela se inclina e beija suavemente meus lábios mais
uma vez. O beijo não demora. Seus lábios se movem pelo meu queixo e
pescoço, lambendo e chupando enquanto ela desliza mais para o sul.
Ela faz uma pausa longa o suficiente para lamber um dos meus
mamilos, envolvendo o bico rosado em sua boca. Eu gemo, arqueando
minhas costas com seu toque. Com um som, ela solta meu mamilo e
continua seu caminho. Sua língua rosa aparece, com a ponta lambendo
ao longo da minha barriga chapada, descendo no meu umbigo e,
finalmente, na minha boceta.
Não tenho vergonha de como estou encharcada. Alison é gostosa,
não há como negar. Quando ela fica entre minhas pernas, eu me apoio
em um cotovelo, muito fascinada por ela para não me dar uma visão
completa. Ela olha para mim através dos olhos semicerrados. Tanta
inocência.
Nunca pensei que usaria essa palavra, mas é a única coisa que
consigo pensar quando olho para ela, com a boca posicionada sobre
minha boceta. Linda. Estou retirando o significado dessa palavra e
dando para Alison Lancaster.
Porque, porra, ela é linda.
O primeiro toque de sua língua faz minha cabeça cair para trás. É
hesitante, quente, úmida. É incrível, e eu preciso de mais.
— Alison. – eu suspiro, quando sua língua pressiona e ela lambe
toda a extensão do meu centro. Eu estremeço, movendo meus quadris
para encontrar sua boca pecaminosa. Quando minha cabeça cai para
frente mais uma vez e eu dou a ela uma olhada novamente, ela já está
olhando para mim com um pequeno sorriso satisfeito no rosto.
Meu lábio está preso sob os meus dentes com tanta força que estou
perto de cortar a pele. Ela continua lambendo e chupando até que o
orgasmo está aumentando rapidamente, chegando ao ápice e me levando
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ao limite, eventualmente. Minhas pernas prendem sua cabeça contra a


minha boceta, feliz por afogá-la em meus fluídos enquanto aproveito a
sensação de euforia.
Ela se levanta, lambendo os lábios como uma bruxinha malvada. Eu
a puxo para cima e continuo guiando-a até que sua boceta esteja
pairando sobre meu rosto. Sem hesitar, a seguro, dando-lhe o mesmo
tratamento que ela me deu. Não demora muito para ela gozar, gritando
meu nome enquanto seus próprios fluídos escorrem pelo meu rosto.
Nós nos tornamos um borrão em movimento depois. Eu me levanto
e quase a agarro. Nosso beijo é revivido, o desespero em nossas línguas
é palpável.
Eu nem percebo que caímos na posição perfeita até que sinto minha
boceta deslizar contra a dela. Nós duas paralisamos, com bocas abertas e
olhos arregalados enquanto a sensação sobrecarrega completamente
nosso sistema. Em conjunto, nós duas soltamos gemidos. Seus olhos
reviram junto com meus quadris, criando uma sensação tão poderosa
que não tenho certeza de como vou encontrar o caminho de volta.
Ela se apoia nos cotovelos no momento em que me inclino para ela,
com os nossos lábios encontrando a mesma sincronia em que nossos
quadris se movem.
— River. – ela geme em minha boca, deixando-me provar meu
nome em sua língua. Tem um gosto doce, assim como ela. Nossas bocas
se afastam e sua respiração desliza pelo meu mamilo. A sensação de sua
boca quente envolvendo o bico quase me leva ao limite. Olhando para
ela, seus olhos castanhos olham de volta para mim entre um nariz
sardento. Seus olhos brilham de excitação, apesar da inocência em seu
rosto.
Meus olhos ameaçam fechar enquanto gemo o nome dela em troca.
Meus quadris se movem mais rápido e sua boca se afasta do meu seio,
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procurando minha boca mais uma vez. Estou muito feliz em ceder à sua
demanda silenciosa.
O suor escorre pela minha testa enquanto sinto o meu segundo
orgasmo crescendo cada vez mais alto, com o tom de nossos gemidos
seguindo o exemplo.
Meu núcleo aperta enquanto a espiral me consome cada vez mais
até que parece que vou entrar em combustão espontânea. Em segundos,
nossos orgasmos atingem o pico e estamos perdendo o controle. Nossas
mãos lutam desesperadamente enquanto tentamos encontrar algo sólido
para nos agarrar enquanto nossos corpos são completamente arrastados
em ondas de puro êxtase. Olhos arregalados fixos juntos enquanto
gemidos são arrancados de nossas bocas conectadas.
Só quando gozo é que eu percebo que nós estávamos praticamente
gritando. O silêncio repentino é ensurdecedor, apesar de nossa
respiração ofegante cruzar o silêncio.
Acabamos de fazer sexo.
Porque eu disse a ela que matei Ryan.
Saio de cima dela e fico de costas, com ambas os peitos arfando.
Com ambas com os olhos olhando para o teto em choque e descrença. E
talvez um pouco de pânico. Finalmente, eu viro minha cabeça para ela e
a observo. Eu realmente olho para ela. Seus grandes olhos expressivos,
longos cabelos castanhos e pequenas sardas espalhadas em seu nariz e
bochechas.
Meus olhos percorrem seu corpo. Um corpo que conheci muito
bem. Ela é magra, mas curvilínea, com seios fartos e pernas longas.
Sardas espalhadas em seus ombros e abdômen, marrom claro contra um
fundo bronzeado.
Ela é linda. E uma garota muito mais complexa do que eu pensava.
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Ela não olha nos meus olhos, aparentemente com muito medo de
encarar a realidade do que acabamos de fazer. Parece que uma agulha
espetou meu coração. Nada grave, mas o suficiente para doer.
— Você se arrependeu? – ela sussurra, com a sua voz rouca.
Lágrimas surgem em seus olhos e eu observo a sua reação com um
fascínio mórbido. Ela está chorando porque comi ela ou porque eu matei
o ex-namorado dela?
— Não. – eu sussurro, respondendo a ambas as perguntas.
Uma respiração áspera sai de seu peito, expulsando toda a tensão de
seu corpo com ela. Só assim, ela fica mole. E assim meu coração se
aquece novamente, aliviado por ela não estar me rejeitando. Ela se vira
de lado, me encarando completamente e colocando as duas mãos sob a
bochecha.
— Eu também não. – ela diz suavemente. Um pequeno sorriso
hesitante estampa seus lábios inchados.
Com meus olhos fixos naqueles lábios, pergunto: — Então por que
você está chorando?
Ela ri, enxugando uma lágrima perdida antes de retomar sua
posição.
— Sinceramente não sei. Isso foi... muito para assimilar. E o fato de
basicamente termos celebrado você matando nosso agressor fazendo
sexo é meio fodido. – Quando dou a ela um olhar engraçado, ela sorri
timidamente e se corrige. — Ok, realmente fodido. – ela encolhe os
ombros. — Mas foi bom. Parecia um encerramento.
Concordo com a cabeça, confortada por estarmos na mesma página.
O que fizemos não foi fazer amor, nem mesmo foder. Nós certamente
nunca vamos namorar. Embora houvesse atração mútua, era realmente
apenas seguir em frente de uma situação fodida em que ambas ficamos
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presas. Duas almas se conectando por algo que nenhuma mulher deveria
ter que suportar. Foi a libertação.
— Você vai me denunciar? – pergunto baixinho.
Seus olhos nunca se desviam quando ela diz: — Não. Você deu a si
mesma e às futuras mulheres que se encontrariam nas mãos de Ryan
algo que eu não fui capaz de dar. Ele nunca iria parar. Mako tentou, mas
ninguém acreditou nele e Ryan conhecia muitas pessoas poderosas. E
eu... não tentei o suficiente. Mas você conseguiu.
— Liberdade. – eu sussurro. Ela lentamente acena com a cabeça,
com compreensão em seus olhos.
Faz tanto tempo desde que provei isso na minha língua. É quase o
suficiente para dominar o gosto da boceta de Alison na minha língua.

A casa está mortalmente silenciosa.


Bem. Esta parte da casa está. Um pouco de gritos abafados surgem
pelas aberturas do sótão, mas se eu pensar alto o suficiente, não consigo
ouvi-los. Às vezes eu gosto de ouvi-los. Não sei se isso faz de mim uma
psicopata.
Com minha criação, suponho que era inevitável.
Quantos serial killers teve uma infância fodida? Provavelmente era
mais frequentemente do que não. Eu me encaixaria perfeitamente no
perfil. Menina cresce no subúrbio, mãe drogada, pai ausente e sem
nome, e estuprada por homens que acabou levando a uma vida de
prostituição.
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Mas eu fui embora, não foi? Isso não conta para nada? Mesmo que
eu me transforme em uma assassina. Ou eu vou em breve, pelo menos.
Uma batida na porta faz meu coração parar. Eu me escondo nas
sombras, olhando para a silhueta de uma pessoa parada do lado de fora
da porta.
Eu não estou esperando ninguém. Ninguém deveria estar batendo
nessa porta.
Outra batida leve me provoca. Meus pensamentos raivosos me
levam para a toca do coelho. E se for do trabalho de Ryan, procurando
por ele? Não, não. É sábado. Ele só está no sótão desde ontem à noite.
Segunda-feira, no entanto. O que vou fazer na segunda-feira? Ryan não
vai aparecer. Seu pai vai se perguntar, ligar para ele provavelmente.
Ryan não vai atender, e então seu pai virá procurá-lo. Como diabos eu
deveria olhar Matt na cara dele e mentir para ele? Acho que deveria ter
pensado nisso antes de me meter nessa confusão.
Outra batida me afasta dessa linha de pensamento.
É a polícia? Ryan conseguiu um celular? Não… já escondi o celular
no nosso quarto. Não pode ser isso. Apenas um minuto atrás, eu o vi,
certificando-me de que seu corpo estava pendurado com segurança em
torno da viga de madeira e os nós em torno de seus pulsos ainda estavam
apertados. Ele não escapou e tenho certeza de que ninguém pode ouvi-lo
gritando. Moramos em uma mansão, pelo amor de Deus, e o sótão nem
fica no lado da casa mais próxima da rua. Certamente, se alguém
pudesse ouvir gritos vindos de dentro da casa, alguém já teria me
salvado.
Eu rio desse pensamento. As pessoas são péssimas. É inteiramente
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possível que ninguém tivesse me salvado.


— Olá? – Uma voz suave soa. Minha cabeça vira na direção da
porta da frente. Parece o diabo. Deve ser. Quem mais poderia ser? O
diabo veio me buscar pelo pecado supremo que cometi.
Minha respiração perturba o silêncio em pequenas lufadas de ar. Eu
fecho meus olhos quando a batida na minha porta começa novamente.
Talvez, se meus olhos estiverem fechados, a batida desapareça. Talvez o
diabo por trás dela desapareça.
Balançando a cabeça, esfrego as minhas pálpebras com o dedo
indicador e o polegar em frustração.
O diabo não vai embora.
Minha casa está banhada em escuridão e sombras, mas sinto como
se estivesse sob os holofotes. Como uma idiota, estou bem na frente da
porta, sem saber o que fazer. Eu bato meu punho fechado na minha testa,
frustrada comigo mesma. Eu não estava preparada para isso. Para nada
disso. Achei que tinha mais tempo. Estupidez da minha parte pensar que
tinha algo tão precioso quanto o tempo quando vivia com um monstro.
O que eu faço, o que eu faço, o que eu faço?
Atenda.
Não. Nunca vou escapar se eu fizer isso.
Que outra opção eu tenho? Esconder-me?
Talvez funcione por um tempo, mas o diabo vai voltar para mim.
Enfrentar meus demônios de frente é o único caminho.
A respiração fica presa na minha garganta quando ouço a voz. — Eu
sei que você está aí, eu posso te ver.
Porra. Isso é assustador. Isso é literalmente a última coisa que
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alguém gostaria de ouvir.


De quem foi a ideia de fazer uma porta quase toda de vidro? Claro,
é vidro fosco, mas também tem um design bonito doentio com pedaços
de vidro transparente entrelaçados.
Eu fui pega. Não há como voltar atrás agora.
Lentamente, caminho até a porta, com meus pés descalços batendo
levemente no chão de madeira. De pé na frente da porta, eu apenas a
encaro, rezando para que eles desistam e vão embora. Outra batida me
faz assustar, desta vez alta e impaciente. Jesus, isso era realmente
necessário? Minha mão treme quando a levanto até a maçaneta.
Basta abri-la, porra.
Então eu abro. Meu olhar abaixa imediatamente.
— Biscoitos de escoteiro?
Sim, ainda é a porra do diabo.

Mordida.
— Você é uma vadia fodida, sabia disso? – Ryan grita de seu lugar.
Ele está ensanguentado e machucado, com os braços pendurados no teto
com uma corda. Ele está nu, exceto por uma cueca boxer suja pendurada
em seus quadris. Pequenos cortes marcam sua pele, a maioria já
endurecida com sangue seco. Sangue fresco escorre por seus braços das
feridas em torno de seus pulsos. Eu o encaro fascinada enquanto mordo
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meu biscoito.
Minha outra mão gira em torno da faca de corte que estou usando
para cortar sua pele. Cada grito me dá uma pequena emoção. Foi isso
que ele sentiu quando exerceu seu poder sobre mim? Quando ele me
espancou e me estuprou? Eu admito, pode ser bastante máximo.
Estendo o biscoito, com meu braço esticado, um olho fechado
enquanto posiciono o biscoito sobre a cabeça de Ryan. — Sabe, vocês
dois são o diabo. – murmuro, concentrando-me em obter a imagem
certa. Sorrio quando obtenho, então parece um homem com um biscoito
no lugar da cabeça. — Você. E esses biscoitos.
— Ei! – ele grita, com saliva voando de seus lábios. — Porra, me
escute! – Meu braço abaixa e meus olhos desviam novamente para os
dele. Eles estão cheios de adrenalina, com medo potente e raiva em seus
feios olhos azuis. Se olhares pudessem matar…
Mordida.
Porra. Estes são viciantes.
— Vai me explicar por que diabos está fazendo isso? Hã? Porra,
diga-me, River!
Levanto uma sobrancelha, não impressionada. — Pelo que sei, não
preciso responder porra nenhuma se não quiser. E ah, quase esqueci de
te contar. – eu estalo meus dedos para ele, fazendo-lhe um sinal de arma
com um sorriso perverso. — Eu comi sua ex-namorada.
Seus olhos se arregalam brevemente antes de se fecharem em
fendas. — Você está mentindo.
Eu rio e balanço a cabeça. — Ela tem uma sarda bem aqui – eu
aponto bem acima do meu quadril. — E uma sarda bem aqui. – digo,
apontando para a parte interna da minha coxa esquerda a seguir, para
cima perto do meu centro. Seus olhos fazem buracos em minha mão,
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com os seus lábios se curvando em desgosto enquanto ele se enfurece.


Qualquer um poderia ter visto a sarda em seu quadril, mas a sarda em
sua coxa? Bem, eu teria que vê-la nua para isso.
Todo o seu corpo começa a tremer quando a sua fúria começa a
dominá-lo.
— Ela é muito boa, também. – digo. — Gozou mais do que jamais
gozei com você.
— Cale a boca! – ele grita, tentando me atacar. Isso é difícil de fazer
quando apenas os dedos dos pés estão tocando o chão coberto de
plástico. Que, aliás, está sujo com o sangue dele. Ele não consegue,
apesar de suas tentativas cômicas. No final, acaba se debatendo como
uma daquelas coisas infláveis que saem das concessionárias.
Eu rio e ele fica com mais raiva.
— Solte-me agora, River! – ele grita, deixando seu corpo cair com a
derrota, embora com sua atitude certamente ainda não tenha alcançado.
— Não! – eu grito também, deixando cair a caixa de biscoitos e
correndo em direção a ele. Coloco meu rosto o mais próximo possível
dele, dentro de uma distância segura. — Cansei de ouvir você. Não
preciso mais fazer porra nenhuma por você. Você não tem poder. Não
mais. Eu tenho o poder e já é hora de você perceber isso, seu filho da
puta. – digo.
Seu peito arfa junto com o meu. Lágrimas frustradas enchem os
seus olhos. Inclino minha cabeça, com o fascínio mais uma vez tomando
conta.
— Você está chorando. – eu observo. Estendendo a mão, deixei
uma de suas lágrimas cair na ponta do meu dedo. Ele vira a cabeça de
qualquer maneira quando percebe o que estou fazendo. — Nunca vi algo
tão lindo na minha vida. – murmuro com admiração, segurando a
lágrima contra a luz.
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Lindo. Estou começando a gostar dessa palavra.


Ele me ignora e, em vez disso, tenta me manipular. — Eu te amei,
River. – ele implora, com sua voz vacilante e tensa. — Cuidei de você.
— Você me amou. – eu admito. — Mas você não sabe separar o
amor do ódio. Porque você também me odiava, Ryan. Você odeia todas
as mulheres. Você me bateu, me despojou de qualquer amor próprio e
valor e depois cuspiu na minha cara. – Seu lábio inferior treme.
Chego o mais perto possível de seu olhar de ódio, com uma
sensação de queimação crescendo em mim. Algo como raiva, ou mesmo
tristeza. — Sabe qual é a pior parte? – pergunto baixinho, com meus
olhos ardendo com lágrimas.
Ele contrai a mandíbula, recusando-se a responder.
— Eu te defendi. Eu disse a eles que eles estavam errados por ver a
verdade em você quando tudo o que tentei fazer foi ver o melhor em
você.
Eu me aproximo, com uma lágrima quente escorrendo pela minha
bochecha.
— Fui eu que estava errada.
— Vá se foder. – ele se descontrola.
Inclino minha cabeça, genuinamente curiosa. — Diga-me, Ryan.
Por que você é do jeito que é? Você tem pais amorosos, uma linda casa,
um ótimo emprego, dinheiro, uma namorada que faria qualquer coisa
por você. Por quê? Por que, por que, por que, por quê?
Ele balança a cabeça freneticamente. — Pare com isso! Apenas...
pare, porra! Eu não tenho nada. Quer saber por quê, River? Você não é a
única que foi estuprada quando nova, ok? – Meu coração paralisa.
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Minha respiração para.


— Por quem? – eu hesito.
Seu rosto está quase roxo, com a raiva potente em seu semblante e
palavras. Em seu próprio ser. Ryan está furioso. Ele é feito disso.
— Meu querido papai.
Fecho meus olhos enquanto meu coração se estilhaça. Apesar do
quanto detesto Ryan, as lágrimas surgem nos meus olhos de qualquer
maneira. Lágrimas de sofrimento pelo garoto. Sei muito bem como é ser
traído por sua própria carne e sangue. Tudo muito bem.
— Matt? – pergunto, com a minha voz rouca. Não sei por que
perguntei. Ele não tem outro pai. Mas Matt? O doce e brincalhão Matt?
O mesmo homem que sempre tem um sorriso no rosto. Quem está
sempre rindo e tão, tão gentil? Isso não faz sentido no meu cérebro.
Uma vez eu disse que Matt de alguma forma manteve sua moral,
apesar de ser um advogado tão notório.
Parece que eu estava errada.
— Sim, Matt. – ele se irrita, dizendo seu nome como uma maldição.
— Aquele pedaço de merda vil estava chupando meu pau aos oito anos
de idade. E uma parte fodida de mim pensou que era normal. E então
Mako apareceu. Ele começou a me bater então. Eu não era como Mako,
então fui punido por isso. Ele era o filho de ouro. Aquele que papai se
recusou a tocar porque sabia que Mako contaria. Mako não aturava nada
de ninguém e eu era o garotinho fraco que era fodido todas as noites.
Lágrimas escorrem em minhas bochechas.
Eu entendo. Eu entendo o ódio de Ryan que consumiu seu coração e
alma. Eu entendo seu ódio por Mako. Por que ele sente a necessidade de
afirmar o poder sobre as mulheres. Ele se sentiu impotente a vida inteira,
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e sua vingança era fazer com que outras pessoas se sentissem como ele.
Ele quer que todos os outros sofram como ele sofreu.
Isso é errado. Nojento. Mas eu entendo.
— Está arrependido de como me tratou? – pergunto suavemente. —
Por me fazer sentir como seu pai fez você se sentir?
No momento em que faço a pergunta, também me pergunto se o
deixarei ir se ele disser que sim. Agora que entendo Ryan pela primeira
vez, estou com medo do que vou fazer.
Ele pondera sobre a minha pergunta, com a raiva ardente ainda
brilhando em seus olhos. Depois de um momento, Ryan fala. —
Aproveitei cada segundo disso, River. Eu nunca vou me arrepender. As
mulheres são fracas e impotentes. Se eu tive que sofrer com essas coisas,
então todas vocês também. Eu me recuso a me arrepender por isso.
Não é de admirar por que seus olhos azuis eram sempre tão opacos.
Ele não tem mais alma nele. Matt tirou isso dele.
Ele tirou tudo de Ryan e agora ele quer tirar tudo de mim.
— Acha que sou fraca? – Sussurro, confusa com a sua observação -
e um pouco magoada também. Eu tenho sido tudo menos fraca.
Seus olhos se tornam sarcásticos, mas eles não me afetam mais.
Nem suas palavras vazias. — Bati e estuprei você e você continua
correndo de volta para mim, com o rabo enfiado entre as pernas como
uma boa cadela. Você é tão, tão fraca. – Seu corpo treme com a fúria
crescente. — Você está manchada, River. Ninguém vai amar uma
vagabunda suja que veio de Shallow Hill. Especialmente uma que teve
mais paus dentro dela do que uma prostituta em um bordel.
Sorrio lentamente, suas palavras são tão parecidas com as que Billy
me disse não muito tempo atrás.
Estou manchada.
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Eu também sou outras coisas.


Quebrada.
Cicatrizada.
Traumatizada.
Forte.
Feroz.
Vingativa…
Erguendo a faca em seu peito, pressiono a lâmina para baixo e
arrasto, provocando doces, doces gemidos de dor. Ele fica parado - já
tendo aprendido que se debater só piora os cortes. Não me sinto fraca
agora. Imagino que me sinto muito como ele se sentia ao arrancar
gemidos de dor da minha boca.
Inclinando-me para frente, eu encosto meus lábios em sua orelha e
sussurro: — Seu irmão vai me amar. – eu faço uma pausa, com a faca
ainda alojada em sua carne quando me afasto o suficiente para encontrar
seus olhos. Eles estão arregalados de choque e meu sorriso aumenta em
resposta.
— Alison, Mako… eles sabem como é amar um monstro. É muito
mais fácil amar um ao outro, você não acha?
Respirações quentes saem de seu nariz enquanto a sua raiva
transborda.
— A única coisa que vou me manchar é com o seu sangue, Ryan.
De alguma forma, não acho que eles vão se importar muito com isso.
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O noticiário de domingo está no ar. Com as mesmas velhas
histórias. Assassinatos, sequestros e merdas mais deprimentes com um
pouco de inspiração para não deprimir completamente o espectador.
Não estou prestando a mínima atenção nisso. Estou agonizando com
o meu caso, e tudo que consegui foi me dar uma baita dor de cabeça.
Amanhã, me encontrarei com Benedict Davis, revivendo o assassinato
que ele testemunhou. Esta é a quarta vez que falo com ele e, a cada vez,
sua história muda. Ele é inconsistente e, se não fosse pelo fato de saber
certos detalhes aos quais os civis não têm acesso, eu o consideraria um
mentiroso e o abandonaria.
Mesmo sem Benedict Davis e sua história de má qualidade, estamos
chegando mais perto. Encontrar o Ghost Killer está fora do meu alcance,
tão perto que posso senti-lo.
Meu celular vibra no apoio de braço ao meu lado, me assustando ao
tirar os olhos da tela da TV. Não só vou ficar careca, mas agora vou
precisar de lentes bifocais aos quarenta. Olho para ele e vejo um número
que não vejo aparecer no meu celular há meses.
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SERENA: Sinto sua falta, amor. Já faz um tempo que você não me
visita. Venha aqui? Estou usando sua roupa favorita. ;)
Eu suspiro. Minha roupa favorita nela não era nada. De preferência
com o rosto enfiado no colchão e a bunda para cima. Serena sempre
tentou me impressionar com lingerie rendada com babados. Eu nunca
me importei com nada disso quando tudo que queria era uma foda rápida
e ir embora.
Por alguma razão, ela pensou que a lingerie faria com que eu
ficasse, em vez de desenvolver algum tipo de personalidade.
Nunca aconteceu.
Apago a mensagem, depois o número dela, e guardo o celular no
bolso de trás. Serena mal prendeu minha atenção para começar, ela não
tem chance de conseguir nem mesmo uma lasca agora.
Não quando uma mulher em particular está ocupando meu espaço
cerebral. Eu sabia desde o momento em que conheci River que ela iria
me arruinar. Só não tinha percebido que também pareceria condenação.
Meu celular vibra no bolso de trás novamente, indicando uma
chamada recebida. Com um resmungo frustrado, tiro o celular do bolso e
atendo antes de olhar para ver quem é.
— Sim? – eu resmungo.
— Oi… – Uma voz familiar e hesitante surge.
— Oi, Ali. – eu cumprimento com um suspiro. Não me importo em
ouvir ela, mas já sei no que essa conversa vai se concentrar.
— Você soube da River? – ela pergunta.
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— Não. Eu deveria?
Silêncio.
— Ali? – eu pressiono. Quando ela ainda não responde de imediato,
o medo circula pelo meu sistema e um buraco se forma no meu
estômago. Automaticamente, temo o pior. É um sentimento com o qual
me familiarizei bastante, embora definitivamente não tenhamos uma
relação amigável.
— Acho que você deveria falar com ela. – ela diz finalmente. Não
preciso vê-la para saber que ela está roendo as unhas. É um hábito pelo
qual Ryan batia nela constantemente, antes de mandá-la a um salão de
beleza para obter de acrílicos.
— Ela está bem, Ali? O que houve? – pergunto impacientemente,
com meu tom obscurecendo. Sento-me ereto e desligo o noticiário.
— Na... nada. Bem... ela está bem. Ela não está ferida nem nada. –
ela se apressa, hesitando em suas palavras. Minha sobrancelha franze.
Minha ansiedade muda de marcha. Algo está acontecendo - só não tenho
ideia do quê.
— Aconteceu alguma coisa? – pergunto lentamente, cada vez mais
irritado com a falta de explicação dela. Minha mão está agarrando meu
cabelo, prestes a arrancar as mechas.
Ela suspira de frustração. — Sim, mas acho que você deveria falar
com ela, Mako. OK? Isso é tudo o que estou dizendo.
— Ok. – respondo enquanto o meu dedo toca no botão vermelho.
Minha impaciência aumentou. Ser legal é a última coisa em minha
mente quando eu estou muito ocupado imaginando todos os meus
pesadelos ganhando vida. Minha mente gira, considerando as
ramificações se eu simplesmente aparecer na casa de Ryan. Está tarde.
Ele provavelmente vai pirar, mas posso usar a desculpa de precisar
trabalhar no caso. Vou me encontrar com a testemunha dele amanhã e
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não tive a chance de falar com Ryan sobre isso há alguns dias.
Já decidido, pego minhas chaves e vou para a porta, mal me dando
tempo de amarrar os cadarços das minhas botas.
Paro no meio da porta, com minha mão ainda na maçaneta. Talvez
eu deva ligar primeiro? Eu disco o número de Ryan enquanto fecho a
porta atrás de mim e entro no carro. A linha toca, e toca, antes de
finalmente ir para a caixa postal. Eu tento mais uma vez, apesar do fato
de já estar saindo da garagem.
Quinze minutos depois, estou estacionando em sua entrada ampla e
detestavelmente longa com a porra de uma fonte estúpida no meio. Eu
não ficaria surpreso se Ryan construísse um monumento de si mesmo no
meio um dia.
Há algumas luzes acesas na casa monstruosa. Ver esta casa faz meu
lábio se curvar toda vez. É exagerada, com paredes brancas e elegantes,
vidro e madeira que compõem a totalidade da casa. É moderna e muito
pretensiosa.
Porra. Estou nervoso. Minha mão está deslizando pelo meu cabelo,
frustrado com essa merda. Com Ryan e o desconforto intenso e
constante que ele tem me dado desde que fui adotado.
Saindo do carro antes de acabar saindo da garagem, subo correndo
os degraus e bato na porta com força algumas vezes. Olhando para a
hora no meu relógio, noto que são apenas oito e meia. Ryan ainda deve
estar acordado.
Quando ninguém atende, eu bato mais algumas vezes. Às vezes eu
gostaria que ele agisse como qualquer outro idiota rico e contratasse um
mordomo. Eu dou cinco segundos antes de tentar a maçaneta da porta.
Trancada. Há câmeras me gravando agora em um monitor para o celular
de Ryan. Demoro mais um minuto, esperando que ele veja que sou eu e
abra a porta.
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Sim, claro, Mako. Como se isso fosse acontecer.


Foda-se. Estive na casa de Ryan apenas três vezes na minha vida,
mas levei apenas uma vez para catalogar todos os pontos de saída. Eu
corro para os fundos da casa. O quintal é constituído por uma piscina
enterrada à beira de uma falésia, alargando-se para a cozinha em
conceito aberto. A parte de trás da casa é toda de vidro, toda a parede
capaz de deslizar aberta até que o quintal e a cozinha se tornem um só. A
coisa mais estúpida do caralho, se você me perguntar. Quem diabos está
bem com qualquer um sendo capaz de espiar dentro de sua casa? O
pensamento envia arrepios na minha espinha.
Caminhando silenciosamente até a porta, espio pelo vidro e para
ouvir qualquer som. Qualquer berro, grito. Carne batendo em carne. Há
apenas silêncio. Nenhum movimento também.
O vidro se abre suavemente sem fazer barulho e, embora seja bom
para mim, ainda balanço a cabeça em desapontamento. Tão estúpido
deixar qualquer porta destrancada. Vejo muitos malditos assassinatos
para que isso seja aceitável, e o fato de que estou invadindo com tanta
facilidade vai render uma bronca para esse filho da puta. Eu poderia ser
um ladrão e, aparentemente, está tudo bem para Ryan.
A cozinha branca e cinza está escura, lançando sombras na cozinha
imaculada. Está começando a escurecer no início do dia, agora que o
outono está se aproximando. São apenas oito e meia, mas o sol está se
pondo. Uma gaveta está aberta em um ângulo estranho, chamando
minha atenção. Eu espio na gaveta para ver um monte de facas e talheres
jogados ao acaso nela.
Clico na lanterna do meu celular e os inspeciono. Nenhum parece
com sangue. Isso faz pouco para acalmar meus pensamentos acelerados.
Eu inclino a luz sobre as sombras até ter certeza de que não há uma
pessoa escondida nelas. Com base no brilho suave do corredor, há uma
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lâmpada acesa na sala de estar. Forço meus ouvidos, para ouvir passos
ou vozes.
— Ryan? – eu chamo em voz alta, desligando a lanterna e enfiando
o celular no bolso de trás. A última coisa que preciso é ser acusado de
invasão de propriedade por um advogado idiota. Ryan aproveitaria a
oportunidade e comeria como um doce.
Uma voz abafada surgiu, mas eu não consigo identificar onde.
Enquanto me concentro no ruído abafado, um estrondo vindo do andar
de cima chama minha atenção.
Juro pela porra de Deus, se ele apenas estivesse batendo nela... Meu
corpo está se movendo antes que eu possa pensar, correndo pela cozinha
e no corredor. Eu quase bato na parede enquanto me movo ao redor da
escada de mármore branco. Quase tropeçando nas escadas, eu paro
quando o rosto de River aparece. Ela tinha acabado de fazer exatamente
o que eu fiz - quase caindo na pressa de descer as escadas.
— O que você está fazendo aqui? – ela grita, assim como grito. —
Ele te machucou de novo?
— O que? – ela pergunta, perplexa. Estamos ambos imobilizados
em cada extremidade da escada, olhando um para o outro com
expressões selvagens.
— Ele está lá em cima? Ele te machucou? – pergunto novamente
asperamente.
— Não... eu... ele não está aqui. – ela gagueja. A batida no meu
peito lentamente se acalma conforme minhas suspeitas aumentam. Ela
parece ter sido pega com uma faca sobre um cadáver. Culpada pra
caralho. Intrusos não se anunciam. Ryan poderia facilmente ter me
convidado e não ter contado a ela. Então, por que diabos ela parece
verde no rosto? E por que seus olhos estão mudando com paranoia e
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nervosismo?
— O que você está fazendo aqui? – ela grita novamente, cruzando
os braços e ampliando sua postura em uma posição defensiva. Seu
queixo levanta enquanto ela olha para mim. Mal consigo controlar a
vontade de interrogá-la. Afinal, estou invadindo a casa dela. Ela tem
todo o direito de suspeitar de mim.
— Ryan me convidou. – eu minto, enrijecendo minha coluna.
Ela revira os olhos. — Não, ele não convidou.
— Como você sabe?
— Porque ele nem está aqui. – ela repete. Nesse momento, outra
voz abafada soa de algum lugar. Inclino a minha cabeça, tentando
localizá-la.
Percebendo que minha atenção é desviada, ela desce as escadas e se
atira sobre mim, com o cheiro de canela envolvendo todos os meus
sentidos. Tropeçando para trás, luto com seu corpo e o corrimão para
não cair para trás. Que porra é essa?
— Você me assustou. – ela diz sem fôlego. — Mas estou feliz que
você esteja aqui agora. Posso ir até ai?
O olhar em meu rosto só poderia ser descrito como totalmente
perplexo.
— O que diabos está escondendo, River? – eu acuso duramente. Ela
fica tensa em meus braços e imediatamente me empurra e passa por mim
como se não tivesse se jogado dramaticamente em mim.
Essa mulher é uma porra de... nem sequer eu sei.
— Vá embora. – ela ordena estoicamente e toda a emoção de sua
voz se foi.
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Cruzando os braços, amplio a minha postura e levanto uma


sobrancelha, deixando-a saber que não vou a lugar nenhum. Há uma voz
abafada em algum lugar da casa que parece que está gritando, Ryan
desapareceu misteriosamente e River está agindo como se estivesse
escondendo algo. Ela está inquieta e se eu não soubesse bem, River está
mentindo. Terrivelmente, por sinal.
Sutilmente, analiso cada detalhe. Olhos inquietos, mãos trêmulas,
pés inquietos e uma pequena mancha de sangue no pescoço. O cheiro de
algum tipo de solução de limpeza passa pelo meu nariz, dominando seu
cheiro doce de canela.
— Sabe que pode me contar. – eu asseguro gentilmente, tentando
suavizar minha voz trêmula. Ela fez alguma coisa. Ela fez algo muito
ruim.
Ela bufa. — Posso dizer alguma coisa a um policial? Caia na real,
Mako. – ela responde com seu tom pingando veneno e condescendência.
— Já ultrapassei alguns limites por você, River.
— Você está dizendo que é mentiroso? – ela desafia.
— Você está dizendo que vai me dar uma razão para ser? – eu
revido. Seus lábios ficam sérios. Isso seria um grande e retumbante sim.
Jogo minha cabeça para trás e solto uma respiração áspera. — Diga-me,
River. Juro que não vou prendê-la ou colocá-la em qualquer tipo de
problema. Você pode confiar em mim.
Quando levanto minha cabeça para ela, ela está mordendo o lábio
inferior e olhando para mim como se não conseguisse decidir se sou
Robin Hood ou o lobo mau. Também não tenho muita certeza de quem
sou. Depende de quem está perguntando.
— Alison e eu fizemos sexo. – ela deixa escapar. A saliva que eu
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estava engolindo em um momento muito inoportuno se aloja na minha


garganta. Eu engasgo, tossindo forte enquanto tento não morrer ante
seus pés. O duende malvado provavelmente também iria gostar.
As engrenagens do meu cérebro estão girando rápido demais. O
carinha cuidando do meu cérebro está tentando desesperadamente
controlá-las enquanto tento processar o que diabos ela acabou de dizer.
Ela sorri com a minha reação, enquanto sinto meu rosto ficar vermelho.
— Está corando? – ela provoca.
— Não. Porra. Sim. Que porra é essa? É mesmo? – pergunto
asperamente, principalmente porque estou tentando ativamente impedir
que meu pau fique duro como pedra, o que é realmente uma grande
façanha quando não consigo tirar a imagem da minha cabeça.
Ela acena com a cabeça e depois encolhe os ombros com
indiferença. — Não porque gostamos uma da outra ou algo assim.
Acho... que nós só precisávamos disso, sabe?
Estranhamente, eu sei. Eu entendo. Seu rosto está disposto em uma
máscara em branco, mas algo me diz que ela está esperando que eu fique
bravo. Ela espera isso, na verdade. Mas como posso ficar com raiva de
alguém por tentar se recuperar? Por mais que me doa alguns dias, o
corpo de River não me pertence. Ela pode foder quem ela quiser, e eu
não posso opinar. Embora adoraria nada mais do que ter o privilégio,
não vou usar nada contra ela quando ela der esse presente a outra pessoa.
Seus olhos de leoa me observam de perto. Ela ainda está cautelosa e
no limite, mas ainda olhando para mim com uma esperança hesitante de
que esteja completamente distraído. Quase funcionou por um segundo,
mas eu não estaria onde estou hoje se deixasse o óbvio escapar de mim.
Permito um aceno lento. — Mas não é isso que você precisa me
dizer, River.
Seus ombros caem em derrota, desapontada por sua pequena tática
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de distração não ter funcionado.


Mais tarde, revisitarei essa confissão. Completamente.
— Ryan está lá em cima. No sótão. – ela faz uma pausa,
aparentemente pensando no que mais me dizer. Não digo a ela que
forçarei minha entrada no sótão, independentemente da história que ela
contar. Estou totalmente esperando que ela minta para mim.
— Estou torturando-o. – ela confessa baixinho.
Desta vez, fui esperto o suficiente para não engolir, senão teria
engasgado de novo. A última coisa que eu esperava que saísse da boca
dela era a verdade. Ela estava dizendo isso para chocar, esperando que
eu pensasse que ela estava mentindo porque a premissa é tão ultrajante?
É possível que ela esperasse que eu risse, revirasse os olhos e ignorasse
isso como uma piada.
Por mais que me doa, eu já tinha começado a juntar as peças, com
cada peça do quebra-cabeça se encaixando. A ausência de Ryan, a voz
abafada gritando pelo que parecia ser ajuda, a clara paranoia de River...
e o sangue e o cheiro de alvejante.
— River. – eu murmuro, esfregando minha mão no meu rosto.
— O que? – ela grita, desistindo de todo fingimento e ficando na
defensiva mais uma vez. — Ele merece!
— Não é que ele não mereça, River. Mas realmente pensou nisso?
Que porra você vai fazer quando as pessoas vierem procurá-lo? Quando
nossos pais vierem procurá-lo? Se ele não aparecer para trabalhar
amanhã de manhã, as pessoas vão questionar o porquê. Já considerou o
fato de que será a suspeita número um?
Seu rosto fica cada vez mais pálido enquanto a bombardeio com
perguntas muito válidas. Ryan é um cara muito importante para as
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pessoas não notarem sua falta.


Desta vez, quando seus ombros caem, é com resignação.
— Eu pensei. Só não tenho certeza do que dizer ainda.
Dando outro suspiro, olho na direção da escada. — Eu vou lá em
cima.
Ela dá um passo em minha direção, com os olhos esbugalhados. —
Você não pode soltá-lo, Mako. – ela diz apressadamente, com os olhos
ferozes de desespero.
— Não vou. Eu prometo. Mas preciso ver no que você nos meteu. –
explico suavemente, colocando a minha mão em seu cotovelo para
ajudar a acalmá-la. Sua testa franze e ela me dá um olhar feio.
— Não envolvi você em nada, Mako.
Dou a ela um sorriso irônico. — Estamos juntos nessa, amor.

— Bem, você parece um grande monte de merda de cachorro. – eu


comento, com meu tom clínico combinando com meu rosto enquanto
observo o corpo de Ryan.
— Vá se foder. – ele grita de maneira confusa. Pela primeira vez na
minha vida, Ryan ficou feliz em me ver quando entrei. Isso rapidamente
virou uma merda quando sorri para ele, com dentes e tudo.
Ele está ensanguentado. A única coisa em seu corpo cortado e
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machucado, é uma cueca boxer suja. Porra, ele cheira a merda também.
Franzindo o nariz, circulo ao redor dele, observando todos os seus
ferimentos.
Parece que ela usou algo fino e afiado para cortá-lo, como uma faca
de corte. Os cortes não são muito profundos, alguns precisando de
pontos, especialmente o grande corte no peito. Todo o seu torso está
manchado de hematomas, a maioria ainda de um roxo escuro. Ele não
está aqui há tempo suficiente para qualquer um deles ficar amarelo e
verde.
Seu pé parece estar em um ângulo não natural, embora eu não veja
nenhum osso aparecendo. Dois de seus dedos da mão esquerda estão
definitivamente quebrados, completamente dobrados em ângulos
estranhos com osso saindo. Sorrio quando percebo que são os mesmos
dois dedos que River quebrou - um deles foi obra de Ryan. Dedo
mindinho e indicador.
Essa é minha garota.
Eu olho para a mão dela, notando seu dedo indicador e, em seguida,
percorro meus olhos pelo resto dela. Parece que ela acabou de sair de um
ringue de boxe. Ela tem hematomas recentes nos braços e no pescoço,
um corte na testa e um lábio inchado. Tudo pelas mãos de alguém que
dizia amá-la. Suas costelas e concussão já estão curadas, mas os efeitos
persistentes em sua mente nunca desaparecerão.
Esta mulher passou por mais merda do que a maioria pode suportar
na vida. E ela passou por isso a vida inteira. Acho que nunca conheci
alguém tão resiliente. Tão forte. O que ela está fazendo com Ryan... é
uma loucura. Comprovadamente insano. Mas considerando o que ela
passou, porra, não posso culpá-la. Não posso culpá-la por finalmente
explodir.
— Por favor, Mako. Você é um policial. Você é um bom policial.
Não deixe essa vadia se safar dessa merda. Por favor, solte-me. – ele
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implora, com sua voz falhando no final.


Esta é a primeira vez que vejo Ryan assustado. Vulnerável. Ele
sempre representou esse cara durão, mesmo quando ele tinha dez anos e
eu treze, recém-adotado pela família. Era como se ele sentisse que tinha
que provar a si mesmo quando entrei em cena. Mamãe e papai decidiram
ter outro filho, então ele achou que não era bom o suficiente para eles. O
cara era um maldito narcisista egoísta desde o nascimento. Não há como
mudá-lo. Sem salvá-lo.
— Por que eu deveria ajudá-lo? Você não fez nada além de fazer de
tudo para tornar minha vida miserável desde que entrei em cena. – digo,
parando atrás dele onde ele não pode me ver. Ele tenta virar a cabeça
para olhar para mim, mas as suas amarras não lhe permitem muita
liberdade.
— Você nunca pertenceu, Mako.
River dá um passo à frente, com a testa franzida de raiva. — Todo
esse tempo, pensei que você o odiava porque ele fez algo com você. Por
que você me faria - qualquer um - acreditar nisso?
Ryan ri sem humor. — Isso importa, porra? Ele é meu irmão. – ele
diz a palavra com desdém.
— Eu sou? – pergunto com alegria, rindo quando ele tenta mover
seu olhar raivoso para mim. Não funciona muito bem. Uma alma tão
zangada, e para quê? Acabar amarrado e torturado porque não consegue
deixar de ser um humano de merda? E então fazer com que o irmão que
ele intimidou se recusasse impiedosamente a ajudar por causa de suas
ações.
Ryan está se familiarizando bem com o Karma, e caramba, ele é
uma vadia.
Dou a volta para encará-lo mais uma vez e me agacho, com o
sorriso nunca deixando meu rosto enquanto digo: — Nunca me tratou
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como um. Eu estava animado para ganhar um irmão quando nossos pais
me adotaram. Mas você sempre considerou isso um insulto.
— Porque isso foi! – ele grita, tremendo em suas amarras. — Eles
nunca teriam outro filho. Eles disseram que eu era o suficiente para eles.
Estávamos perfeitamente felizes sem você, mas então papai cuidou do
caso de assassinato de seu pai e ele apenas teve que desenvolver um
fraquinho por você. Ele simplesmente não podia deixar você ficar no
sistema como qualquer outra criança desse país. O que há de tão especial
em você, hein? Você é um detetive medíocre que nem consegue
descobrir quem é o Ghost Killer. Você não é bom o suficiente para nós.
Suas palavras me atingem como borracha na madeira. Não posso ser
magoado por alguém com quem nunca me importei de verdade. Eu
tentei em um ponto. Tentei muito construir um relacionamento com ele,
criar um vínculo inquebrável entre irmãos.
Mas ele só queria me odiar. Não demorou muito para que eu parasse
de me importar o suficiente para detê-lo. Ele me torturou, me machucou
e tornou minha infância miserável.
Ele não me queria como irmão antes, certamente não vai conseguir
um agora.

— Tenho uma confissão. – River desabafa. Eu a encaro, cheio de


apreensão e inquietação. Não aguento mais confissões dela. Tive o
bastante para durar várias malditas vidas - isso se eu não estiver
queimando no inferno pelo que estamos fazendo. Estamos na sala,
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sentados no mesmo sofá em que River estava presa há pouco tempo,


humilhada com lágrimas escorrendo pelo rosto. Quando isso acabar, eu
vou queimar essa porra de sofá.
— Matt estuprou Ryan. – ela continua, antes que eu possa protestar.
Meu mundo para em seu eixo, fazendo com que tudo pare. De jeito
nenhum eu ouvi isso direito. Não tem como ela ter dito... Não. Não, não,
não. Sem chance.
— Que porra você acabou de dizer? – pergunto sombriamente. Ela
solta um suspiro alto. Seu rosto está contraído de arrependimento. Com
seus dedos manchados de sangue inquietos, seu olhar fixo nos dedos
girando. Ela não consegue nem olhar para mim.
Matt me salvou. Ele é o meu pai. Eu o amo. E isso está sendo
arrancado de mim agora.
— Ryan me contou. Perguntei a ele por que ficou do jeito que ficou
quando tem tudo na vida. E Mako... não acho que ele estava mentindo.
Realmente não parecia que ele estava.
Esfrego uma mão trêmula ferozmente no meu rosto, tentando apagar
as palavras que ela disse. Minha mão desliza em seu cabelo e agarra com
força. Meu peito aperta dolorosamente, tornando difícil respirar. Minha
visão embaça e leva tudo em mim para me agarrar à realidade. Estou
perdendo minha cabeça. Estou perdendo muito mais do que isso.
— Sinto muito, Mako. – ela sussurra. Eu aceno com a cabeça
distraidamente, sem realmente ouvi-la. Parece que a água está correndo
pelos meus ouvidos, afogando mais desculpas faladas em voz baixa que
não significam merda nenhuma agora. Não é culpa de River, mas quase
a odeio por me contar. Agora tenho que conviver com essa nova
realidade.
Meu pai é um maldito estuprador.
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Ele nunca colocou a mão em mim. Nunca deu qualquer indicação


de que se sentia assim por mim. Uma série de memórias passa pela
minha mente. O quanto Ryan me odiava. O mundo. Como ele estava
com raiva. E como sempre que papai tentava abraçar Ryan, ou mostrar
qualquer afeto, Ryan rejeitava como se estivesse sendo picado por um
ninho de vespas. Pequenas coisas que nunca fizeram sentido estão se
somando.
Eu fecho meus olhos.
Acho que não sou tão bom em juntar peças de quebra-cabeças como
pensava. Meu irmão era a maior peça de todas, bem na minha cara. E
nunca suspeitei de nada. A culpa me acalma.
— Vamos nos concentrar no assunto em questão agora. Eu... eu vou
me preocupar com isso mais tarde. – eu respondo.
River morde o lábio e acena com a cabeça, concordando com
relutância.
— Ryan está traindo você. – eu começo.
O desdém cruza seu rosto quando ela pergunta asperamente: —
Você sabia?
Eu não poderia manter a culpa fora do meu rosto se eu tentasse.
Contar a ela que Ryan a traiu não foi dito como uma confissão, mas
como o começo da história que vamos contar, mas ela me pegou antes
que eu pudesse terminar.
— Você não me contou? – ela acusa, com os olhos brilhando de
fúria. Suas bochechas ficam vermelhas como morango, e tudo que
consigo fazer é fechar minha boca como um maldito peixe, sem saber o
que dizer.
— Não me cabia, River. Pensei que a parte de bater era um pouco
mais preocupante do que Ryan ser um mulherengo. – eu defendo.
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— Quando? – ela exige bruscamente. — Há quanto tempo você


descobriu?
— Eu o vi traindo pouco depois de você conhecer nossos pais. –
confesso com um suspiro alto. Não era aqui que estava tentando chegar,
mas também não vou mentir para ela. — Mas River… ele sempre traiu,
e não quero dizer apenas você. Ele passou clamídia para Alison depois
de alguns anos juntos. Eu deveria ter contado a você, mas como eu disse,
eu estava mais preocupado com a sua segurança.
Ela desvia o olhar, com mágoa irradiando em seus olhos. Incomoda-
me ter causado isso.
— Então, por que me dizer agora? – ela pergunta, seu tom de voz
caiu vários graus e agora está fria.
Coço a parte de trás da minha cabeça, com um olhar tímido no meu
rosto. — Eu não estava, realmente. Estava tentando juntar nossa história,
e Ryan sendo um traidor vai desempenhar um grande papel em nosso
encobrimento.
Desta vez, quando suas bochechas ficam vermelhas, é de vergonha.
— Ah.
— Sinto muito, River. – eu começo, me sentindo pior a cada
segundo por não ter contado a ela a verdade sobre a traição de Ryan
desde o início.
— Foi isso que me fez querer deixá-lo. – ela diz abruptamente,
olhando para mim de lado. — Como todo clichê, achei batom na gola
dele e cheirava a perfume. Ele tentou lavá-la. Perceber que ele estava
transando com outra pessoa foi o que finalmente me fez querer ir
embora.
Não tenho certeza se ela está me dizendo isso para me fazer sentir
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pior, mas funciona pra caralho. Minha cabeça bate contra o encosto do
sofá e suspiro em derrota. Se eu tivesse contado a ela antes... talvez ela
não sentisse que tinha que fazer o que fez. Ela já teria partido, vivendo
sua vida longe dele. Mas Ryan ainda estaria aqui, já procurando por sua
próxima vítima.
— Sinto muito. – eu repito.
— Então, essa história de encobrimento? – ela pergunta, mudando
rapidamente de assunto.
Relutantemente, eu permito. — Ele disse que tinha uma viagem de
trabalho na cidade vizinha. Essa foi a última vez que você o viu.
Ela acena com a cabeça uma vez. — O que acontece quando
descobrem que ele não fez isso?
— É aí que entra a traição dele. Ele poderia facilmente ter saído
para ver outra mulher. Você não sabia dos seus métodos de traição e
acreditou completamente nele quando disse que tinha que viajar para
trabalhar. Se você sabe que ele está traindo, esse será o motivo. Se você
brigou e ele saiu furioso com você, isso faz você parecer culpada. No
que lhe diz respeito, vocês dois eram um casal feliz e sem problemas.
— Tudo bem. – ela concorda. Eu balanço minha cabeça, já sentindo
um peso batendo em cima dos outros 20 quilos em meus ombros.
— Ele estava indo para se encontrar com a amante dele. O Ghost
Killer o pegou primeiro.
River para, com seu corpo inteiro se tornando pedra. Isso me lembra
da reação dela quando contei a ela sobre o Ghost Killer, no dia em que
vim resolver o caso com Ryan e acabei comendo bolo de carne.
Minha mãe costumava fazer bolo de carne para mim. Ela cozinhava
horrivelmente, mas era a única coisa que ela sabia fazer de verdade. Foi
tudo o que comi durante doze anos. Eu não conseguia comer desde
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então. Claro, meu irmão idiota sabia disso e decidiu enfiá-lo de volta na
minha cara.
— Como teve essa ideia? – ela pergunta baixinho, trazendo minha
atenção de volta para ela. Não tenho certeza do que há exatamente no
Ghost Killer que a deixa desconfortável, mas eu não posso culpá-la
exatamente. Sua reputação ganhou atenção suficiente agora que é notícia
nacional. Estar na mesma cidade com um serial killer deixaria qualquer
um desconfortável.
— Sexta-feira de manhã, Ryan me ligou e disse que sabia quem era
o Ghost Killer e já havia construído um processo contra ele. Ele alegou
que encontrou evidências e colocaria o assassino na prisão até segunda-
feira. Ele não compartilhou qual era a informação, mas estava confiante
de que o pegou. Ele passou dez minutos esfregando na minha cara que
descobriu quem era o Ghost Killer antes de mim.
O rosto de River empalidece, sua careta se intensifica enquanto
compartilho algo de que não posso deixar de me envergonhar. Que meu
irmão descobriu quem é o Ghost Killer antes de mim. Ele sabia, e a
única maneira que consigo pensar é porque ele estava fazendo algo
sórdido. O Ghost Killer tem policiais e advogados em seu bolso. Só acho
que ninguém conhecia seu rosto até Ryan.
A lembrança daquele telefonema me irrita novamente. No segundo
em que Ryan desligou o celular, quase quebrei as juntas dos dedos na
mesa de metal da sala de interrogatório. Eu queria que o Ghost Killer
fosse encontrado, não importa o custo, mas foda-se se não doía que
Ryan fosse o único a resolver o caso. Sua confiança era tão inabalável
que acreditei nele.
— Vamos mostrar que o Ghost Killer sabia que Ryan tinha provas
contra ele e se livrou dele. – eu continuo.
River se mexe, encolhendo os joelhos contra o peito e envolvendo-
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os com os braços com força. Ela apoia o queixo nos joelhos e me encara
com tristeza.
— Vamos fazê-lo falar. – ela garante suavemente.
Balanço minha cabeça, passando minha mão pelo meu cabelo. Não
tenho esperança de que Ryan fale. Se sei alguma coisa sobre meu irmão,
é que ele é uma pessoa rancorosa e má. Não me contar quem é o homem
que estou perseguindo há um ano será sua única vitória.
Repasso o restante do plano com ela, certificando-me de que ela
entenda o papel que terá de desempenhar muito em breve. Por mais que
isso me mate, River nunca pode ser vista como a namorada abusada,
pelo menos não até que haja uma quantidade suficiente de evidências
para mostrar que Ghost Killer pegou Ryan. Qualquer coisa para manter
o motivo longe de River é a principal prioridade agora, mesmo que isso
signifique que a reputação de garoto de ouro de Ryan não vai queimar
em chamas com ele.
— Ele precisa desaparecer, River. – digo hesitante. Ela sabe
exatamente o que quero dizer.
Ela acena com a cabeça, não parecendo nem um pouco perturbada
por matá-lo. Algo não está certo em permitir que ela faça isso.
— Eu não acho que posso deixar você fazer isso.
Sua cabeça vira para mim.
— Porra, você não pode. Isto é por mim. Não se atreva a agir como
meu cavaleiro. Quando você vai perceber que não preciso de você para
me salvar? – ela range os dentes, com os olhos perspicazes com raiva.
— Você tem razão. Você não precisa de mim para te salvar. Mas se
eu puder ajudar a evitar que você caia nesse buraco, eu o farei.
Ela balança a cabeça, olhando para longe. Ela deveria esperá-lo em
casa esta noite, de acordo com nossa história inventada. Quando ele não
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voltar para casa, ela vai ligar para meus pais, perguntando se tiveram
notícias dele.
Eles vão garantir a ela que ele está bem, provavelmente atrasado.
Ela vai dormir preocupada. De manhã, quando ele ainda não estiver em
casa, ela vai reportá-lo como desaparecido. É quando a merda vai ficar
real. Realmente muito real.
Ansiedade percorre em meus nervos. Meus braços tremem enquanto
minha adrenalina pulsa. Farei tudo ao meu alcance para manter a
monitorização longe de River. Vou virar um mentiroso por essa garota.
E foda-se, não vou me arrepender nem um segundo disso. Não quando
essa garota me prendeu em seu pequeno feitiço sombrio.
Depois de tudo dito e feito, ainda estou determinado a mostrar a ela
como é um relacionamento real. Nem estou preocupado se ela me quer
de volta. Eu sei que ela quer.
— Esta é a minha matança, Mako. – ela diz suavemente,
sintonizando-me de volta na conversa. — Eu meti... você... nisso. E serei
eu quem o matará.
— Essa noite?
— Essa noite.

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Mako está ao meu lado, apesar de eu pedir para ele ficar lá embaixo.
Ele se recusou e me seguiu apenas para olhar para o patético e velho
Ryan, pendurado por uma corda no teto. Faz apenas dois dias e ele está
desidratado e sofrendo de perda de sangue. Seus braços estão ficando
cinza com uma leve tonalidade azulada, todo o sangue foi drenado de
seus membros há algum tempo. Parte de mim quer deixá-los para baixo
para que ele possa sentir a dor aguda e ardente.
— Prometi a mim mesma que enfiaria alguma coisa na bunda dele.
– eu afirmo calmamente. A cabeça de Mako vira na minha direção muito
mais rápido do que a lenta elevação da cabeça de Ryan. Ele me encara
com o fervor de um atiçador quente em uma fogueira.
— Por quê?
— Pelas vezes que ele enfiou o pau na minha bunda e me estuprou
brutalmente. – eu respondo, com minha voz calma e uniforme. Pressiono
meus lábios, abrindo-os e adiciono: — Duas vezes.
A reação de Mako, no entanto, é oposta à minha. Ele quase explode,
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seu corpo estremece com o choque e então se arrepia quando a ira


familiar que Ryan provoca em Mako assume.
Ele se aproxima de Ryan em dois grandes passos, traz o punho para
trás e o impulsiona direto para o rosto de Ryan. O barulho de seu nariz
quebrando sob o punho de Mako é totalmente satisfatório. Um gemido
alto escapa da boca de Ryan enquanto o sangue jorra de seu nariz
quebrado e desce por sua boca e pescoço. O sangue pinga no chão,
juntando-se ao resto de sua sujeira.
Neste ponto, há mais sangue de Ryan no chão do que dentro de seu
próprio corpo. Eu tinha ido a uma loja de ferragens em Shallow Hill que
tinha certeza que não tinha câmeras e comprei rolos de plástico, usando
apenas dinheiro. Ele está no meio da sala, sem objetos por perto, então o
respingo de sangue não será muito trabalhoso para limpar. Além da
minha pobre vítima, há apenas uma única lâmpada aqui. Nem mesmo
uma janela para ventilação.
O sótão é um dos poucos cômodos desta mansão que nunca foi
terminado, embora não seja o típico sótão empoeirado e assustador da
maioria das casas. Ryan sempre fazia Mary e Ava virem aqui uma vez
por semana para manter limpo. Como em qualquer casa, Ryan guardava
as memórias da família aqui e não as queria em risco pela natureza.
Observo a cena diante de mim com prazer. Se Mako conseguir
liberar um pouco de sua agressividade reprimida pela maneira como
Ryan o tratou por toda a vida, eu ficaria feliz em testemunhar isso.
Afinal, Mako também foi abusado por Ryan. Verbalmente,
mentalmente, emocionalmente. Talvez até fisicamente, se eu conhecesse
bem Ryan. Todos esses são aspectos críticos para uma criança em
crescimento - especialmente aquela que nasceu na vida em que Mako
nasceu. Não faço ideia do que Mako passou antes de conhecer Julie e
Matt, mas acho que não foi nada agradável. Independentemente disso,
ele não merecia o abuso de Ryan mais do que eu ou Alison.
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Ryan xinga Mako, chamando-o de todos os nomes no manual do


diabo. Cada insulto é seguido por outro golpe no rosto. O sangue
respinga no rosto de Mako. Uma gota cai no meu dedo do pé. Eu encaro
a gota, carne batendo em carne e a fala cada vez mais arrastada de Ryan
como pano de fundo para meus pensamentos errantes.
Ryan pode ter sofrido uma dor imensurável nas mãos de seu pai,
mas isso nunca foi culpa de Mako. E isso nunca foi culpa minha ou de
qualquer outra mulher. Ryan descontou sua raiva nos inocentes, e isso é
imperdoável.
Recuso-me a sentir remorso por um homem que não acredita ter
feito nada de errado.
Vou ter que matá-lo. Assassinar Ryan a sangue frio. Esta pequena
gota de sangue vai manchar minha pele para sempre. Mesmo quando
desaparecer, ainda a verei. Vou vê-la lá e vou vê-la cobrindo minhas
mãos.
Posso viver com isso?
Posso viver comigo mesmo sabendo que fui a razão de uma vida ser
drenada dos olhos de uma pessoa?
Eu mexo meus dedos dos pés, com outra gota caindo sobre eles.
Sim eu posso. Recuperei o poder roubado de mim, manejei-o como
uma arma e matei meus demônios.
Mako se afasta furiosamente de um Ryan ensanguentado e mole, e
se posiciona atrás de mim. Ele está ofegante, com a raiva ainda
predominante em seu rosto. Olho para baixo para ver as suas juntas
sangrando e retalhadas. Eu lambo meus lábios. Uma escuridão está se
espalhando por toda a minha alma, manchando-a de preto.
Mako coberto de sangue é uma visão deliciosa. Quero estar tão
coberta de sangue quanto ele.
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— Divirta-se com ela, mano. – Ryan diz incompreensível com o


sangue que escorre em sua boca. Ele cospe e lambe os lábios, como se
isso fosse ajudar. — Você está namorando uma psicopata. Agora que ela
gosta de tortura e assassinato, o que faz você pensar que ela vai parar?
Ela é a maldita fórmula perfeita para um serial killer. Isso é praticamente
entediante.
Olho para o teto, pensando seriamente em matar outra pessoa.
Talvez se eles fossem um estuprador como Ryan. Uma pessoa
verdadeiramente de merda - um monstro absoluto que ataca os inocentes
e fracos. Mas eu pegaria um aleatório na rua e o torturaria e o mataria?
O pensamento me faz querer vomitar. Não importa o que Ryan diga, sei
que, no fundo, nunca poderia matar alguém inocente.
— Realmente eu não tenho muito interesse em encobrir um monte
de cadáveres. – respondo secamente. — O seu vai ser bastante
inconveniente.
Ryan ri, com o som quase atingindo o mesmo tom de uma hiena. —
Boa sorte explicando isso para meus pais. – ele zomba, com seus olhos
fixando Mako e eu com alegria.
Por alguma razão, me incomoda que ele diga meus pais. Como
Mako sendo adotado não qualifica Julie e Matt como seus pais também.
Eles o criaram desde a infância. Eles são tanto pais de Mako quanto de
Ryan.
Mesmo que um deles também mereça morrer.
Eu estendo minha mão, deslizando minha faca no rosto de Ryan. O
corte é superficial. Não deixaria nem uma cicatriz. Mas ainda assim o
corta.
— Eles são os pais de Mako também. – eu digo.
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Ryan não reconhece isso. Ao meu lado, os olhos de Mako estão


abrindo um buraco na lateral da minha cabeça. Eu me recuso a
encontrar seus olhos, não totalmente pronta para enfrentar a emoção que
vou ver. Conectar-se com alguém romanticamente enquanto mata meu
namorado abusivo não me agrada. Mexe com a minha paz interior.
— Eles sabem que eu nunca me mataria. Você não pode fazer disso
um suicídio. Assim que me atrasar para o trabalho, papai saberá que algo
está errado. Sou muito importante, você não pode simplesmente ignorar
minha vida. – Ryan provoca, com sua voz ficando mais forte assim
como sua confiança.
Inclino minha cabeça para o lado e o observo de perto. Seu cabelo
loiro escuro está grudado na cabeça com suor pegajoso. Com os olhos
azuis sombrios que são janelas para uma alma escura e decrépita. E seus
lábios inchados que abrigam dentes muito retos e uma língua perversa.
Sua pele está sem nenhuma cor e molhada de suor. Nunca vi Ryan
parecer tão sujo e desleixado. Só isso me traz satisfação.
Ele acha que não teremos escolha a não ser soltá-lo. Que talvez
tentemos fazer um acordo para o silêncio dele. Ele vai pedir algo
substancial, provavelmente impossível, e vamos implorar para que ele
nunca fale sobre isso.
Isso foi um erro, fiquei com raiva, não queria te causar tanto mal.
E então ele terá mais uma vez poder sobre mim e seu irmão mais
velho. Isso fará com que a dor que ele suportou valha a pena.
Sim.
Isso não vai acontecer.
Eu não negocio com estupradores e agressores. Eu prefiro machucá-
los.
Encolho os ombros com indiferença, fazendo com que o lento
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sorriso vitorioso no rosto de Ryan desapareça. — Não estou preocupada


com isso.
Exceto que eu estou. Só um pouco. Não que eu tenha uma vida
digna de ser vivida. Eu iria para a prisão com certeza, especialmente
com Matt como o pai de Ryan. Merda, Ryan poderia me prender apenas
com ele de qualquer maneira. Para ser sincera, acabaria me matando,
tomando a saída covarde. Qual seria o sentido de viver? Eu realmente
nunca tive uma vida para começar. Certamente não vou encontrá-la
dentro dos limites de uma cela de prisão suja com minha nova esposa
me despindo com os olhos do beliche de cima.
Mas isso não significa que eu não iria fazer explodir meu abuso
antes de fazer isso. Tenho certeza de que Alison me apoiaria. Mako
também. A reputação de Ryan vai queimar nas mesmas chamas em que
eu cair.
Juntos para sempre, amor.
— Você deveria estar. – ele repreende, zombando de mim. Reviro
os olhos em resposta. Ele recua com desgosto com a minha resposta
infantil. Eu ando para pegar minha caixa favorita encostada na parede,
pego um biscoito de escoteira e dou uma mordida, mastigando o doce
pecaminoso com uma expressão entediada.
— Você percebe quantas pessoas vão estar procurando por mim?
Você será a suspeita número um. Especialmente se disser às pessoas que
bati em você. Quanto mais me fizer parecer o vilão, pior você parecerá.
Eu franzo a testa. — Quem disse que vou fazer de você o vilão? –
Ele vacila, momentaneamente confuso com a minha admissão. Ele
esperava que eu gritasse lobo. — Vou agir como a namorada amorosa e
dedicada que fui nos últimos dois anos. Vou chorar e lamentar sua
morte. Mas quando estiver sozinha, vou gozar toda vez que pensar no
fato de que você está a sete palmos debaixo da terra e fui eu quem te
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colocou lá.
Os olhos de Ryan se arregalam gradualmente enquanto eu falo.
Quando termino, ele está tremendo. Percebi que não estou interessada
em beijar seus pés e implorar por perdão. O idiota está balançando como
uma árvore vazia nos ventos do inverno. A qualquer momento, ele será
arrancado do chão e jogado direto na porra de um triturador de madeira.
— Vai pagar por isso, River. Você também. – ele grita, desviando
seu olhar fervoroso para Mako. Nenhum de nós lhe deu uma resposta.
Dar a ele qualquer tipo de garantia ou satisfação certamente me manteria
acordada à noite depois que tudo isso fosse dito e feito. Não importa a
tortura e a matança - saber que ele encontrou até mesmo a menor coisa
para se agarrar em seus últimos dias me faria revirar a noite toda.
Preciso do meu sono de beleza, considerando que tive tão pouco
durante o nosso relacionamento. Ele me deve muito.
— Você não está enojado com isso? – Ryan grita perplexo, olhando
para Mako como se ele tivesse barbatanas e estivesse voltando a ser o
peixe que lhe deu o nome.
Sinceramente, não espero que Mako me queira mais. Eu mostrei as
profundezas da minha depravação. Deixei mais do que claro que estou
muito longe de sentir remorso por minhas ações. Na verdade, deixei
claro que também estou gostando.
Mako é muito... bom. E o pensamento de perder algo assim antes
que eu tivesse dói. Mas posso lidar com isso. Vou me recuperar e, se de
alguma forma me safar disso, vou viver o resto da minha vida com
Mako enfiado no canto de trás do meu cérebro, apenas para sair quando
meu vibrador estiver no meu clitóris.
O referido homem apenas cruza os braços sobre o peito e ergue uma
sobrancelha de tédio. — Sou um detetive. Já vi coisas piores. E também
sei exatamente como encobrir um assassinato. – ele lembra.
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— Por que você iria querer ajudar uma psicopata, Mako? Você
sabe que ela vai te matar a seguir.
— Estou ficando entediada com suas habilidades de barganha.
Como você é advogado? – eu interrompi. Para ser sincera, não quero que
essa semente seja plantada na cabeça de Mako. Aceitei o fato de que ele
não vai me querer, mas isso não significa que quero que ele pense que
sou o mesmo tipo de monstro que seu irmão.
— Vamos acabar logo com isso, River, certo? – Mako diz. Eu tento
captar seu tom, encontrar qualquer tipo de emoção nele. Mas ele está
completamente desprovido disso, e não tenho certeza de como
interpretar isso.
— Primeiro. – eu anuncio. — Quem é o Ghost Killer, Ryan?
Já sei quem é, mas prefiro que venha da boca de Ryan. Ainda não
descobri como vou abordar essa situação. Eventualmente, eu teria que
contar a Mako a verdade. Ele não vai me perdoar por guardar esse
segredo. Mesmo agora, não tenho certeza do que está me impedindo. O
que diriam meus livros de psicologia?
Ah, sim. Que eu tenho pavor de Billy. Billy é o meu famoso
sequestrador. Ele me prendeu em uma casa, fez uma lavagem cerebral
em mim para acreditar que, se eu escapasse, morreria e depois me
deixou sozinha em casa com a porta aberta.
Estou com muito medo de sair por aquela porta, com medo de que
Billy esteja ali esperando por mim.
Ryan inclina a cabeça para trás e ri. Risos e gargalhadas, com a voz
áspera e rouca. — Como se eu fosse te dizer isso. – ele gargalha, o som
é maníaco e desequilibrado. — Você nunca vai saber quem é, e ele
esteve bem debaixo do seu nariz o tempo todo.
Mako está tenso, mas não diz uma palavra. Em vez disso, ele apenas
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encara Ryan com uma indiferença fria, guardando seu último momento
com seu irmão na memória. Eu observo Mako de perto, esperando para
ver se ele quer continuar tentando.
— Vou tornar sua morte menos dolorosa. – eu negocio.
Mako vira a cabeça para mim. — Não, River.
Ryan apenas olha para mim. — Vá se foder, vadia. Não vou contar
nada a ele.
Suspiro, resignada com o fato de que, se Mako não o pegar logo, a
identidade do Ghost Killer sairá da minha boca. E esse pensamento me
apavora mais do que a perspectiva de ser pega pelo assassinato de Ryan.
— Apenas faça isso. – Mako pede baixinho. Eu encontro seus olhos
verdes e não encontro nada além de segurança. Ele está me dizendo que
está tudo bem, e parte meu coração que Ryan ainda esteja machucando
Mako, mesmo diante da morte.
Calmamente, vou até a vassoura quebrada, coberta com fita dupla-
face, exceto pela ponta irregular. Pendurado na ponta do cabo está o feio
anel de noivado de Ryan. Na fita, estão pequenos cacos da caneca
favorita de Ryan. Quando ele me vê chegando com isso, ele luta
arduamente, movendo o corpo de um lado para o outro, tentando escapar
das cordas, mas só consegue desalojar os ombros de suas juntas.
Mako não se vira quando tiro sua cueca, agarro o seu pau mole e
começo a cortá-lo com a faca de corte. Em vez disso, ele pega o rolo de
fita adesiva, arranca um pedaço e coloca na boca de Ryan para abafar o
grito maníaco saindo de sua garganta.
Hesito um pouco quando termino minha tarefa. Posso ser um pouco
desequilibrada, mas porra, isso é nojento. Quando termino, respiro fundo
para tentar acalmar meu estômago revirado. Então, sem hesitar, enfio a
vassoura na bunda de Ryan.
Mesmo a fita adesiva não pode conter os gritos de Ryan. E essa
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merda pode resolver quase tudo.


Leva um minuto para Ryan desmaiar de dor. Mais quatro antes que
ele sangre e morra. Ele estava à beira da morte de qualquer maneira.
Nem por um único momento Mako desviou o olhar do meu
assassinato. De seu assassinato agora também. Ele pode não ter
realmente cometido o assassinato, mas seria considerado cúmplice no
tribunal.
Meu estômago ainda está revirando. Agora que matei oficialmente
um ser humano, preciso de um momento para me recompor. Acabei de
fazer algumas coisas fodidas com uma pessoa viva. E embora meu
refluxo de vômito esteja fazendo hora extra agora, também não consigo
me arrepender.
— Você não tinha que ficar para isso. – digo baixinho, coberta da
cabeça aos pés em sangue e sangue coagulado. Devo parecer a Carrie do
livro de Stephen King.
Bem lentamente - muito lentamente - seus olhos se desviam da cena
sangrenta diante dele e viram para os meus. Ele está calmo e relaxado.
Não tenho certeza se devo ficar aliviada ou preocupada.
— Eu tinha. – ele diz. — Não sinto pena dele. Não depois de ver o
que ele fez com Alison, e especialmente depois de ver o que ele fez com
você. Eu vi um monstro se transformar no diabo desde o momento em
que fui recebido na família. Não vou lamentar a morte dele.
Não digo nada por um momento enquanto contemplo suas palavras.
As palavras de Ryan se contorcem como vermes parasitas em meu
cérebro e, apesar de me lembrar constantemente de que Mako estará
correndo para as colinas em breve, ainda tenho que perguntar. Essa parte
fraca de mim ainda busca essa garantia.
— Você está com nojo de mim?
Seu olhar nunca vacila. — Estou orgulhoso de você, River.
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Apesar de usar luvas, minhas mãos estão tremendo por causa da
queimadura do alvejante. Todo este sótão foi limpo. Até o teto. Inalar
alvejante é avassalador, apesar da máscara e dos óculos de segurança.
Quando terminamos, fervo uma panela de vinagre, coloco na sala e
fecho a porta. Livrar-se do cheiro de alvejante é vital. Os ventiladores
estão ligados, mas essa não é uma solução rápida o suficiente.
Felizmente, Mary e Ava estão agendadas para vir amanhã de
manhã, terminando qualquer coisa que perdemos e nos dando um
motivo válido para o cheiro de alvejante. Normalmente elas vêm no
domingo, mas dada a situação, eu remarquei, alegando que Ryan tinha
ido embora no fim de semana e eu tinha feito a limpeza da casa. É a
única coisa que fiz até agora que parecerá suspeita no tribunal se eles
decidirem me indiciar. Mas, mais do que provável, não vai se sustentar
no tribunal, considerando que as meninas sabem que sempre insisto em
limpar tudo.
É por isso que as meninas não vão se surpreender com o cheiro de
alvejante. Houve inúmeras ocasiões em que elas me pegaram limpando
quando chegaram. E com a falta de ventilação lá em cima, qualquer
policial ou detetive não vai pensar duas vezes quando subir e sentir um
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leve cheiro de alvejante.


Depois que a vida de Ryan foi extinta, imediatamente começamos a
trabalhar para nos livrarmos dele e limpar o sótão. Quando voltamos, já
eram quase onze da noite.
Foi confuso, para dizer o mínimo. E posso ter vomitado algumas
vezes. Exigia invasão de propriedade privada, mas seus restos mortais
foram levados para uma fazenda e dados aos porcos. Era a única certeza
que garantiria que nenhum osso ou parte de Ryan fosse encontrado.
Além disso, a transgressão é o menor dos pecados que cometemos hoje.
Mako e eu não saímos até que cada pedacinho dele fosse
consumido.
As armas que usei para torturar Ryan foram esterilizadas e depois
enterradas no meio da floresta. O anel saiu com o cabo da vassoura
quando o removi do corpo de Ryan. Mesmo que isso me enoje, acabei
limpando isso também. Seria suspeito se eu não estivesse usando meu
anel de noivado enquanto fingia que meu amado namorado desapareceu.
Assim que eu achar apropriado, vou queimar o anel.
Não há mais vestígios dele, exceto por todas aquelas memórias
congeladas no tempo e penduradas pela casa. Eventualmente, elas serão
enviadas para Matt e Julie enquanto lamentam sua morte, destinados a
chorar nas molduras de vidro.
Essa é a única parte que realmente dói. Sua mãe não merece perder
um filho. Não é culpa dela que Ryan acabou por ser um demônio. Ela
fez tudo ao seu alcance para dar a melhor vida a seus filhos, mas você
não pode controlar se seu marido é um pedófilo e transforma seu filho
em um sociopata.
— Precisamos fazer algo com as câmeras. – diz Mako, cansado. Já
passa da uma da manhã, depois de passar várias horas limpando. Seus
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joelhos estão separados, os cotovelos apoiados em cada perna, a cabeça


baixa e as mãos cruzadas na nuca. Livrar-se do corpo de Ryan exigiu
muita energia emocional e física. Ele está esgotado. Nós dois estamos.
Dou um sorriso suave. — Já cuidei de tudo.
As mãos de Mako abaixam e a sua cabeça levanta lentamente.
Quando nossos olhos se encontram, sou jogada para trás pelo olhar em
seu rosto. Claro, ele parece tão cansado quanto eu, mas nunca vi Mako
parecer tão decidido.
— Como?
Eu encolho os ombros, fingindo indiferença quando não sinto nada.
— Tentei escapar. Ryan estava me observando constantemente através
das câmeras, em todos os lugares em que eu estava na casa e me
vigiando. Então, eu cortei o Wi-Fi. Já estávamos tendo problemas com o
desligamento e, enquanto o Wi-Fi estivesse desligado, ele não poderia
me assistir em seu celular.
— Ele me flagrou e tivemos uma luta realmente enorme. Consegui
dominá-lo quando cortei seu peito e o nocauteei. Eu o droguei com
Rohypnol, arrastei-o para o sótão e o resto é história. A internet ainda
está desligada, mesmo agora. Nada disso foi gravado e salvo na nuvem.
Mako me encara com descrença. Quando processa minhas palavras,
seus olhos lentamente se transformam em uma cor de musgo mais
escura.
— Por que diabos havia Rohypnol na casa? − ele pergunta
lentamente, com sua voz rouca caindo uma oitava.
Mordo meu lábio, e eu desvio o olhar. Não é minha culpa que meu
namorado me drogava e me estuprava, mas sinto muita vergonha de
qualquer maneira. A lembrança de acordar com sêmen seco em minha
coxa, com meu corpo dolorido e agredido, e nenhuma lembrança de
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nada disso ter acontecido ainda causa arrepios na minha espinha.


Eu provavelmente deveria encontrar um terapeuta. Um caro, diga-se
de passagem.
— Ele usou em mim antes.
Eu me recuso a encontrar seus olhar furioso. Sentindo que não
quero falar sobre isso, ele suspira e muda de assunto. — Ligue para o
papai. − ele diz, com a voz seca e cansada. Combina muito bem com a
minha aparência. Meus ombros caem de alívio, e estou mais grata do
que jamais poderei dizer por ele ter deixado para lá.
Ryan já está morto. Ficar com raiva agora só será exaustivo neste
momento.
— Não quero mais você envolvido nisso, Mako. Realmente. Toda a
sua moral foi por água abaixo por minha causa. Não vou arriscar que
seja pego e me recuso a arruinar sua vida assim. − digo severamente.
— De jeito nenhum você vai fazer isso sozinha, River. Isso não está
acontecendo.
Meus ombros ficam tensos, indo até os meus ouvidos. Veneno é
injetado em meu tom quando digo: — Não preciso...
— ... de mim para te salvar, sim, eu entendi nas primeiras dez vezes
que você disse isso, querida. − Eu me arrepiei, com o calor subindo em
minhas bochechas com indignação. Assim que minha boca se abre, ele
me interrompe novamente. — Para ser franco, River, não estou
perguntando. A verdade é que você nos fez um favor ao se livrar de
Ryan. Então, vou fazer um favor a você e garantir que sua linda bunda
fique fora da prisão. Agora, por favor, pelo amor de Deus, ligue para o
meu pai. − Quando ele chega ao fim da frase, seu tom se torna duro e
impaciente, e ele olha para mim com olhos suplicantes.
Tudo o que posso fazer é olhar para ele em estado de choque, com
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olhos arregalados e boca aberta. Por motivos que ainda não estou pronta
para enfrentar, tiro o celular do bolso e disco o número de Matt sem
dizer mais nada. Mako retoma sua posição anterior, embora eu tenha a
sensação de que é porque ele quer se esconder dessa conversa.
Tenho que falar com um estuprador. Alguém que machucou um
garoto repetidamente. E agir como se nada estivesse errado. Como se ele
não fosse um pedófilo de merda e eu não apenas matei seu filho.
— Fitzgerald. − Matt responde sonolento. Imagino-o acendendo a
luz em seu criado-mudo, enquanto Julie levanta a cabeça com o olhar
confuso, imaginando por que seu marido está recebendo uma ligação
tarde da noite. A saudação faz meu lábio tremer. Ouvir sua voz faz todo
o meu corpo se contorcer de desgosto.
Engolindo em seco, abro a boca e faço a coisa mais difícil que já
tive que fazer. Lamentar o desaparecimento de Ryan. — Oi, Matt, é
River. − digo, com minha voz tremendo.
Há uma breve pausa, cheia de confusão e apreensão, antes de Matt
se recuperar, parecendo mais alerta. — River! É tão bom ouvir você.
Está tudo bem?
Meus olhos se fecham quando ouço a pergunta. É uma pergunta
simples, na verdade, mas ainda tem a resposta mais complicada.
— Hum, na verdade não tenho certeza, Matt. − eu respondo,
mantendo meu tom preocupado. — Olha, eu realmente sinto muito por
te ligar tão tarde, mas sexta à noite, Ryan disse que tinha que sair da
cidade para trabalhar. Ele não disse para onde estava indo, mas... − eu
paro, deixando as lágrimas se acumularem e sangrarem em minha voz
— Ele já deveria estar em casa. E... ele não está respondendo minhas
mensagens ou ligações. Só estou muito preocupada com ele. − eu
termino o tom com uma fungada, lágrimas reais escorrendo pelo meu
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rosto.
Até agora, a cabeça de Mako já levantou e ele está olhando para
mim com algo entre surpresa e admiração. Tudo o que eu tinha que fazer
era me permitir sentir. Permitir-me encarar o fato de que o homem por
quem pensei estar apaixonada acabou sendo nada mais do que o próprio
Satanás. A maçã não cai muito longe da porra da árvore.
— Hum... bem, uma reunião de trabalho, não é? Bem, querida,
tenho certeza de que ele acabou passando a noite em um hotel ou algo
assim. Vou ver se consigo falar com ele. Se não tivermos notícias dele
até amanhã de manhã, farei algumas ligações, ok? Apenas tente não se
preocupar, tenho certeza que Ryan está são e salvo.
Mako faz uma careta enquanto mordo o interior da minha bochecha
com força. Eu fungo e faço parecer patético quando digo: — Ok, Matt.
Muito obrigada. Avise-me se souber alguma coisa.
— Ok, querida, eu vou. Boa noite agora.
Desligo o celular e solto uma respiração áspera. Falar com Matt foi
especialmente difícil.
Muito mais difícil do que assassinar meu próprio namorado.

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A casa está completamente escura, exceto pela luz forte da TV na
minha frente. Eu fico na frente dela, observando a repórter falando em
uma voz monótona. Ela está usando maquiagem demais.
Eu me corrijo. Ryan sempre disse que eu usava maquiagem demais.
Ela é bonita. Linda.
"Os policiais ainda estão investigando o desaparecimento de Ryan
Fitzgerald, um morador de 25 anos da Carolina do Norte, que foi dado
como desaparecido em 8 de Setembro. Se alguém o viu ou ouviu falar
dele, por favor, entre em contato com a delegacia de polícia local..."
Entre em contato com a delegacia de polícia local? Para onde eles
acham que ele fugiu? Fora do Estado? Ora, ele estava apenas em um
sótão, minha querida. Agora, não há mais nada dele para encontrar. Nem
mesmo se você for procurar na merda de porco.
Um toque estridente atrai meu olhar para o meu celular tocando,
vibrando na mesa ao meu lado. Julie. Eu ainda não falei com ela.
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Eu ignoro e olho de volta para a televisão. A foto de Ryan é exibida


na tela.
Belisco a pele na parte interna do meu pulso até que estou chorando
de dor. Lágrimas surgem em meus olhos. Eu fungo.
— Tenho estado um caos, Julie. − eu choro. — Não tenho notícias
dele e estou com muito medo.
Uma lágrima escorre. Eu luto contra o desejo de enxugá-la.
— E se ele estiver ferido? Ou com dor? E não estou lá para ajudá-
lo?!
Tsc. Muito dramático. Eu tento de novo.
— Sinto tanto a falta dele e só o quero em casa. − sussurro
hesitante, com meus olhos fixos na foto de Ryan na tela. Eu fungo,
permitindo que mais algumas lágrimas caiam pelas minhas bochechas
pálidas.
— Eu sei, Julie, eu sei. Eu também o amo. Eu também o amo…

— Não posso fazer isso, não posso fazer isso, não posso fazer
isso…
— River, me escute...
— Eles estão acampando do lado de fora da porra da casa, Mako. −
digo trêmula, com minha voz pronta para sumir por causa dos tremores.
Passo a mão pelo cabelo, apertando o couro cabeludo até sentir pontadas
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agudas de dor surgindo em minhas terminações nervosas.


Isso não era algo que eu esperava.
Repórteres, paparazzi, vans e câmeras, constantemente na minha
cara toda vez que saio de casa. Matt tentou relatar o desaparecimento de
Ryan na manhã de segunda-feira, mas disseram que ele tinha que esperar
até 72 horas antes de poder prestar queixa de uma pessoa desaparecida.
Quinta-feira de manhã exatamente, ele registrou. Já se passaram quase
duas semanas procurando por seu corpo e, nesse período, a imprensa
divulgou a história.
Ryan não era uma celebridade, pelo amor de Deus. Mas ele é filho
de um notório advogado, que prendeu mais criminosos do que o número
de anos de vida. Ele pode muito bem ser uma celebridade em nossa
cidade. Porra.
Bilby encosta nas minhas pernas, dando um miado doce. Às vezes,
tenho certeza de que ele pode sentir quando estou chateada ou agitada.
Eu me jogo no sofá, enfiando minha cabeça em minhas mãos. Bilby
pula ao meu lado e me dá uma cabeçada. Eu removo uma mão da minha
cabeça para coçar ao lado de sua boca. Ele usa meus dedos como um
pincel e se esfrega contra mim repetidamente.
— Venha até mim esta noite. − Mako exige firmemente. Eu suspiro,
cansada e esgotada. É terça-feira à noite e tenho aulas amanhã. Mas acho
que vou ignorá-las no futuro previsível, assim como tenho feito desde
que Ryan desapareceu. Acho que não consigo lidar com os olhares das
pessoas que se perguntam onde está meu namorado.
Ryan mereceu cada coisa que aconteceu com ele. Não me arrependo
de ter feito o que fiz. Não me arrependo de ter me libertado de um
relacionamento abusivo que com certeza iria me matar um dia. Não me
arrependo de me defender e não me arrependo de ter me vingado de
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todas as merdas que passei.


Mas o efeito posterior é desgastante. Ainda sou uma suspeita pelo
assassinato de Ryan no momento, mas eles estão considerando outras
opções. Mako contou sua verdade - a verdade que acabará levando ao
assassino de Ryan. Ryan descobriu quem era o Ghost Killer. Embora ele
não tenha tido a chance de dizer a Mako quem era, eu sei que Ryan
contou a alguém.
Lembro-me de estar do lado de fora do escritório de Ryan,
preparando-me para pedir permissão para ir na casa da Amelia. O
telefonema que ouvi. A emoção absoluta em sua voz quando ele afirma
ter descoberto algo. Não pensei muito nisso na época, mas agora sei que
ele estava falando com alguém sobre o Ghost Killer.
Eu já havia retransmitido essa memória para Mako, o que apenas
solidificou sua história. Eles estão investigando os registros telefônicos
de Ryan para descobrir com quem ele falou.
Há também outra teoria que estão investigando, uma que me deixa
um pouco enjoada. Com o histórico de Matt prendendo criminosos, é
lógico que eles investiguem o fato de que ele tem inimigos. O que tenho
certeza que ele tem. Ele prendeu inúmeros criminosos.
Além disso, Matt não é o homem que eu acreditava que ele era,
quem pode dizer que ele não tem seus próprios negócios no mercado
negro? Tenho certeza de que o idiota está sentado com a cabeça baixa,
acreditando que existe a possibilidade de que sua carreira tenha matado
seu próprio filho.
— Não sei, Mako... − eu paro. E se eles me seguirem? Ser pega
indo até a casa do irmão de Ryan no meio da noite parece incrivelmente
suspeito. A suposta namorada de coração partido está correndo para o
irmão? Sim, isso não me faz parecer suspeita nem nada.
— Sim, você está certa. − Mako suspira. — Eu simplesmente odeio
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a ideia de você passar por isso sozinha.


Mako e eu temos que agir com muito cuidado por enquanto. Não
podemos dizer o que realmente queremos dizer pelo telefone. Mako não
confia em ninguém para não hackear minhas conversas telefônicas.
Altamente ilegal, mas quando o governo já teve moral?
— Aprecio isso. − digo suavemente. É estranho ser legal com
Mako. Por tantos meses, me condicionei a odiá-lo, me convencendo de
que o ódio de Ryan por Mako era justificado. Que havia uma razão de
algum tipo. Ou simplesmente porque jurei lealdade a alguém que não
merecia.
Mas Mako nunca desistiu de mim. Esta dádiva de Deus de um
homem está me ajudando a escapar impune de um assassinato.
Literalmente. Ele está me ajudando a encobrir a morte de seu próprio
irmão porque... bem, porque Ryan era a porra do diabo encarnado. Ele
abusou de nós dois.
E Mako está lidando com sua própria merda. Ele não apenas fez
essas coisas por mim, mas também está enfrentando a realidade de que
seu pai é um estuprador e como lidar com isso. Por meio de pequenos
trechos de conversa, ele decidiu contar a verdade à mãe. Eu só não acho
que ele decidiu como e quando ainda.
Não há mais como eu tratar Mako mal. Independentemente de
sairmos impunes ou não, devo minha vida a ele. Ele está arriscando tudo
por mim. Sua carreira, reputação, sua vida. Policiais não duram muito na
prisão. Mako tem a maior taxa de prisões de todo o departamento. Seus
inimigos estariam esperando por ele na prisão, prontos para exigir sua
própria versão de vingança.
— Me encontre na biblioteca hoje à noite. − digo. Encontrar alguém
em semipúblico parece mais seguro do que ir à casa dele. Ou ele vindo
aqui. Preciso sair e me afastar desta caixa fria e estéril. É uma caixa
bonita, mas que não guarda nada além de memórias assustadoras. Uma
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que pretendo sair o mais rápido possível.


Não tenho muito em minhas economias, mas tenho o suficiente para
conseguir minha própria casa e recomeçar minha vida. Se eu tiver esse
privilégio.
— Eu estarei lá. − Sua resposta baixa envia arrepios na minha
coluna. O tipo quente que viaja entre minhas pernas e se instala lá. O
que quer que esteja se construindo entre Mako e eu é indescritível. Eu
não sei para onde está indo, mas foda-se se eu puder parar isso. Eu não
quero.
Quero fazer este carrossel andar mais rápido.

Esta biblioteca é um refúgio para mim, com meu próprio fantasma


correndo pelos corredores. Uma jovem quebrada com grandes ambições.
Eu me vejo dentro de cada sala, cada canto, todos os lugares para onde
escapei quando não tinha outro lugar para ir. Camilla, tomando conta de
mim, cuidando de mim, me amando.
Meu Deus, eu sinto falta dela. Às vezes esqueço o quanto sinto falta
dela até entrar neste prédio e ver seu fantasma ao lado do meu.
— É assustador aqui. − A voz grossa atrás de mim me faz pular,
com um grito estridente escapando da minha garganta. Imediatamente,
estou envergonhada. Realmente envergonhada. Nunca fiz um barulho
como esse na minha vida - e tive medo a vida inteira. — Desculpe. −
Mako sussurra, com um sorriso travesso estampado em seu lindo rosto.
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É anoitecer, o que significa que está escuro aqui. Nossa única fonte
de luz é a lua brilhando pelas janelas e a luz suave do meu celular na
minha mão. Os olhos verdes de Mako estão escuros, escurecendo seus
olhos para um verde musgo intenso.
Minha mão está no meu peito, segurando meu coração acelerado,
enquanto meus olhos arregalados permanecem fixos nos dele. Eu só
posso imaginar como eu pareço para ele agora.
— Você é linda. − ele sussurra, como se lesse minha mente. Eu
odeio quando ele faz isso. Odeio que ele saiba o que estou pensando.
Essa palavra - linda - envia gelo pelas minhas costas e fogo em
minhas veias, tudo de uma vez. Mako me chamando de linda é
debilitante. Eu quero odiá-lo e apreciá-lo.
— Odeio essa palavra. − digo de volta, endireitando-me em uma
posição um tanto normal que um ser humano deveria estar.
— Por quê? − ele pergunta, com sua voz ainda baixa e calma. Como
se falarmos mais alto, seremos pegos pela bibliotecária rosnante que
exige silêncio o tempo todo. Eu gostaria que houvesse uma aqui. Ser má
com Mako parece muito divertido.
— Ouvi isso toda a minha vida das pessoas erradas. − eu admito.
Uma raiva fria se instala em seus olhos, mas ele não a libera. Tão calmo
e contido. Tão diferente de seu irmão.
— Você se sente melhor quando ouve isso vindo da pessoa certa? −
ele pergunta, com seu corpo parado.
— Eu não sei. − sussurro. Dou um pequeno passo em direção a ele.
Encurtar o pouco de distância entre nós é como aproximar a mão da
boca de um tigre. A qualquer momento, vou precisar de ajuda. — Diga
isso de novo.
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Mako não reage imediatamente. Em vez disso, ele percorre seus


olhos semicerrados sobre mim. Com o fogo gelado em seus olhos
lentamente se transformando em calor líquido. Meu coração acelera
mais uma vez, quase tão forte quanto quando ele me assustou. Prendo a
respiração enquanto minha expectativa por uma pequena palavra
aumenta, a energia pairando pelo ar, colocando as partículas de poeira
em chamas.
— Você é linda. − ele diz novamente. Minha respiração é liberada e
eu fecho meus olhos, experimentando a palavra que sai de sua boca. Soa
deliciosamente pecaminoso quando ele diz isso. Parece algo com o qual
posso me acostumar. Apenas quando sai de sua boca com o tom baixo
de sua voz grossa.
Mantenho meus olhos fechados, mesmo quando confesso: — Gostei
disso.
Um suspiro quase escapa quando sinto seu corpo pressiona no meu,
com sua frente se moldando às minhas costas. Seu hálito quente mexe
com os cabelos finos em volta das minhas orelhas. Sua mão desliza em
meu cabelo, incendiando minha pele. Arrepios formigam meu corpo
inteiro, fazendo-me tremer em seu aperto. Seus dedos deslizam em
minha carne enquanto ele lentamente acaricia meu cabelo para cair sobre
meu ombro. Outro arrepio percorre minha coluna com a sensação de
cócegas que ele deixa em seu rastro.
— Você sabe como é o amor? − ele pergunta suavemente. Eu fecho
meus olhos e solto um suspiro fundo.
— Sim. − eu sussurro.
— Com o que se parece?
— Eu vi o amor nos olhos de uma mulher quebrada toda vez que ela
tinha drogas na frente dela. Vi nos olhos de um garoto quando ele tomou
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seu primeiro gole de álcool para escapar de sua vida de merda. Eu vi


isso em um homem adulto explorando o corpo de uma garotinha pela
primeira vez. − eu respiro com muita força. — Vi isso em muitos
olhares diferentes.
Um resmungo baixo sai do peito de Mako, com as vibrações
viajando pelas minhas costas. Eu ignoro.
— A face do amor está sempre mudando, mas parece sempre a
mesma.
— Essa não é a face do amor, essa é a arte de fugir. − ele responde
humildemente.
Eu não respondo. Não sei como.
— Leve-me para o lugar secreto. − ele exige gentilmente. Por fim,
abro os olhos.
Eu aceno com a cabeça uma vez, lentamente me afasto de sua mão e
mostro o caminho. Parece que o diabo está no meu encalço. O tipo de
demônio do qual você deve ficar longe, mas só quer se aproximar.
Determinação e força são as duas únicas coisas que me impedem de
correr para a sala. De descobrir exatamente o que Mako planeja fazer
quando chegarmos lá. Estou com medo de descobrir, mas estou quase
tremendo com a necessidade de saber.
Levanto a prateleira secreta e a sala é apresentada a mim. Meu
abrigo longe do inferno. Onde passei a maior parte do tempo longe de
Shallow Hill. Eu entro na sala, com os meus olhos encontrando cada
detalhe desta sala, exceto aquele que eu deveria estar olhando.
A presença exigente de Mako está bem atrás de mim e, quando a
porta se fecha, parece que meu destino foi selado. Ainda não sei o que é,
mas acho que vou gostar.
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Estou nervosa. Não tenho certeza se já senti esse tipo de ansiedade


antes. Este não é o tipo de sentimento que tive quando Billy apareceu.
Ou quando um homem entrava sorrateiramente no meu quarto à noite.
Ou mesmo quando eu deixava Ryan com raiva.
Este é o nervosismo que você sente quando está sozinha em um
quarto com sua paixão. Minha confiança era algo que eu sempre segurei
firmemente. Era minha armadura e me impedia de sentir qualquer coisa
além de segura de mim mesma quando estava no mesmo quarto com um
homem que eu queria.
Essa confiança está fora do meu alcance. Ainda está lá, mas
impossível de entender agora.
— Você se lembra de quando nos conhecemos? − Mako pergunta,
quebrando o silêncio.
— Claro. Quando conheci seus pais. − eu respondo, com minha voz
enganosamente suave.
Mako lentamente balança a cabeça. — Não foi a primeira vez que
nos encontramos, River.
Suas palavras silenciam o nervosismo. Minha testa franze em
confusão enquanto tento me lembrar de como conheci Mako antes disso.
— Eu... eu não me lembro. − digo. Um sorriso quase desanimado
surge em seu rosto. Como poderíamos ter nos conhecido antes de Ryan?
Como não me lembrar dele? Mako tem um rosto que você não esquece.
— Você estava bebendo, então não posso dizer que estou surpreso.
− O cansaço substitui a confusão. Bebi muito no primeiro e no segundo
ano da faculdade. Foi só depois que Ryan e eu começamos a ficar sérios
que parei. Ele disse que ficava mal tendo uma namorada descuidada.
— O que eu fiz? − pergunto hesitante. Ele ri.
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— Você mudou minha vida, foi o que você fez. − O V entre minha
testa intensifica quando franzo a testa. Não sei o que ele poderia querer
dizer com isso.
— Você deu um soco no nariz de um homem por tocá-la de um jeito
que você não gostou. Ele estava se preparando para bater em você, e eu
intervi.
Meus olhos se arregalam quando a memória vem correndo de volta,
atingindo meu cérebro como um maremoto. Aquele era o Mako. O
homem que parou o babaca bêbado ao me dar um tapa depois que
quebrei o nariz dele. Afastei-me dele sem agradecer, embora estivesse
tentada a mostrar meus agradecimentos de maneiras mais nefastas.
— Puta merda. − eu suspiro. — Eu me lembro disso. Eu não tinha...
não sei por que não percebi que era você.
Ele encolhe os ombros, dando um passo em minha direção. A
ansiedade de antes começa voltar quando a temperatura na sala começa a
subir.
— Você também não percebeu que fui eu quem dançou com você
naquela noite. − ele diz - calmamente - como se não tivesse acabado de
jogar uma enorme bomba em mim.
— Foi você? − pergunto incrédula, com meu corpo recuando em
estado de choque. Mako tem sido meu homem misterioso esse tempo
todo? O homem que assombraria o fundo do meu cérebro, apenas para
ser solto em raros momentos de fraqueza.
Um sorriso satisfeito contrai o canto de seus lábios.
— Fui eu. − ele confirma. Ele está olhando para mim agora como se
finalmente tivesse me recuperado. É sexy como o inferno, e meu corpo
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responde da mesma forma. Minha boceta fica molhada, começando a


pulsar enquanto respiro com o olhar pecaminoso que Mako está me
dando agora.
Enquanto percebo o fato de que Mako é com quem eu deveria estar
o tempo todo. O fato de eu estar tão perto de tê-lo é quase devastador. O
que teria acontecido se eu tivesse apenas me virado? Se eu tivesse
descoberto o homem que me faz sentir coisas que nenhum homem
jamais me fez sentir. O que teria acontecido se Amelia não tivesse
vomitado naquela noite, me puxando para longe dos braços de Mako?
Eu teria deixado ele me levar para casa naquela noite. Eu o deixaria
devastar meu corpo e minha alma até que o sol aparecesse entre as
nuvens da manhã. E eu teria dado a ele meu número e pedido para
repetir. Terceira, quarta, quinta e assim por diante até que eu o tivesse
para sempre.
— Por que não me contou antes? − pergunto com perplexidade.
— Porque você estava firmemente sob o feitiço do meu irmão.
Dizer isso não teria mudado nada. E para ser sincero, não queria essa
memória manchada. Você me odiava até há pouco tempo. Se eu tivesse
contado antes, você teria cuspido na minha cara. Acho que não
conseguiria lidar com isso.
A vergonha me faz baixar os olhos para os pés. Ele tem razão. E eu
odeio que ele tenha.
— Sinto muito. − digo. Solto uma respiração áspera. — Sinto muito
pela maneira como te tratei, Mako. Você foi incrivelmente gentil comigo
e joguei tudo de volta na sua cara. Eu te tratei horrivelmente, porra, eu
até te dei um tapa. E sinto muito por ter demorado tanto para dizer isso.
Eu só... sinto muito.
— Não sinta. − ele diz, dando mais um passo em minha direção. Eu
olho a distância, querendo avidamente que ela seja completamente
apagada. — Foi isso que me fez me apaixonar por você, River.
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O tempo para. Suas palavras não são registradas imediatamente.


Minha boca se abre e meus olhos encontram os dele. Ele continua antes
que eu possa descobrir uma resposta.
— Eu não quero que você diga isso também. Mas é a verdade. Você
é tão forte, River. Você é feroz e independente. E apesar do fato de que
alguém estava chutando você ativamente, você continuou se levantando.
Eu te admirava por isso. Isso também me irritou, claro. Mas porra, isso
me fez me apaixonar por você.
Lágrimas quentes ardem em meus olhos, cobrindo o fundo das
minhas pálpebras. Ondas de emoção passam por mim, tantas que nem
sei como distinguir o que estou sentindo. Choque, absolutamente. Mas
qualquer outra coisa não posso decidir. Eu estou feliz? Excitada? Triste?
Não sei.
O que eu sei é que tudo que sentia antes de Mako era mentira.
Apaixonar-se por Mako é como entrar no fogo com a mão dele apertada
firmemente na minha. Queima, mas não estou sozinha.
— Venha cá, Mako.

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Eu não planejei que esse momento acontecesse, pelo menos não
agora de todos os tempos. Admitir para River que eu estou apaixonado
por ela acabou escapando. Mas é muito difícil se arrepender quando ela
está olhando para mim como se estivesse se preparando para me
devorar. A demanda inebriante escapando de seus lábios me fez reagir
instantaneamente, ouvindo seu comando como um cão treinado.
Eu a alcanço em dois grandes passos, ou talvez seja um e ela deu o
outro passo. Minha mão está acariciando em seus cachos macios e sua
boca ainda mais macia está pressionando a minha de uma só vez. Os
lábios de River McAllister nos meus parecem o paraíso na terra.
Um suspiro trêmulo escapa de sua boca, girando na minha enquanto
nossas bocas se abrem e nossas línguas se encontram. Porra, ela tem um
gosto mais doce do que eu imaginava. Incontáveis noites, eu fantasiei
sobre esses lábios nos meus. No meu corpo, e especialmente no meu pau
enquanto eu me distraía a pensar nela. Muitas noites fazendo a mesma
coisa, desde o momento em que coloquei os olhos em River dando uma
coça no paspalho no clube. No momento em que seus olhos dourados
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pousaram em mim, ela me prendeu e me fez dela. Eu não sabia na


época, mas ela nunca me esqueceu.
Um gemido suave vibra em minha boca enquanto minha língua
penetra nela. Eu não me canso dela. Eu não consigo parar de prová-la.
Sua boca é macia e maleável, deixando-me assumir a liderança por
alguns momentos antes de arrebatar o controle e comandar o beijo. Para
frente e para trás, nós empurramos e puxamos para dominar, nunca
permitindo que o outro o tenha por muito tempo.
As unhas de River arranham meu peito, arrancando um rosnado do
meu peito que me faz soar como um urso faminto. O som apenas a
estimula, com seus movimentos se tornando desesperados e carentes. Eu
agarro seus pulsos e os puxo com força para trás, assim como faço
quando prendo um criminoso.
Beijar essa mulher é criminoso.
Tantas coisas que eu poderia fazer com ela. Eu poderia algemá-la
agora, deixando-a suportar a doce tortura do que minha língua poderia
fazer com seu corpo e não ser capaz de me parar. Ela não gostaria, mas
tentaria quando o prazer se tornasse demais para ela suportar.
— Mako. − O apelo suave é murmurado contra a minha língua,
acendendo um inferno dentro de mim. Eu perco o controle. Ou talvez eu
esteja apenas respondendo ao apelo dela.
Faço uma pausa, com minhas mãos segurando cada lado de seu
rosto, e gentilmente a afasto.
— Existe algum lugar que não devo tocar? Ou qualquer coisa que
não quer que eu faça? Posso ser gentil, posso ser o que você precisar. −
Quando termino, tenho certeza de que pareço um fodido desesperado.
Seus olhos dourados brilham e um pequeno sorriso aparece em seus
lábios machucados.
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— Eu… ainda não estou pronta para brincadeira anal. − ela diz
gentilmente. O porquê de ela não estar pronta ameaça ferver meu
sangue. River já havia admitido em voz alta o que Ryan fez com ela. Eu
fecho meus olhos, coagindo minha temperatura perigosamente crescente
a cair antes que eu transborde. Agora não é hora de perder a cabeça.
— Ok. − eu respiro, abrindo meus olhos novamente. — Algo mais?
Ela dá um aceno de cabeça. — A única coisa que peço é que não me
trate como se eu fosse de vidro. Eu não sou fraca. Nunca serei fraca. Eu
só quero que você seja você.
Bem, isso já posso fazer.
Antes de pressionar meus lábios contra os dela mais uma vez,
sussurro: — Nem por um segundo pensei que você fosse fraca.
Suas roupas são arrancadas de seu corpo em questão de segundos.
Garras e mãos atacam minhas roupas enquanto ela rasga o tecido do meu
corpo com a mesma seriedade. Nossas bocas se abrem apenas o tempo
suficiente para tirar as roupas antes de se colarem uma na outra mais
uma vez.
Esta sala é empoeirada e suja, não é um lugar ideal para fazer sexo.
Mas venderia minha alma ao diabo se isso significasse que nunca teria
que parar.
Eu a pego, com as suas longas pernas suaves envolvendo minha
cintura. Meus joelhos quase colapsam quando sinto seu calor úmido
contra meu pau. Um gemido segue quando seus quadris movem uma
vez, duas vezes... — River. − eu resmungo. — Você está me matando.
Ela sorri contra a minha boca e move os quadris novamente, com
meus olhos copiando o movimento de seus quadris. Antes que eu me
envergonhe e caia e a deixe cair, ou goze aqui e agora, vou até o banco
em que nos sentamos apenas alguns meses atrás. O mesmo banco que
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ela retransmitiu a história de sua vida para mim enquanto eu fervilhava


de fúria, querendo matar todos os bastardos que pusessem as mãos nela.
Imagens gráficas encheram minha cabeça de todas as coisas que eu
poderia fazer com eles - fantasias que ainda fervem toda vez que me
lembro do abuso que River sofreu em sua vida.
Giro e me sento no banco, mais do que cauteloso com os protestos
da madeira da última vez que estivemos aqui. Sem falha, o banco geme
sob o meu peso, mas continua firme por enquanto.
Minha mão desliza até a parte de trás da cabeça de River, deslizando
em seus cachos macios. Assim que ela enfia sua doce língua em minha
boca novamente, eu enrolo minha mão e puxo sua cabeça para trás com
firmeza até que sua boca esteja suspensa a alguns centímetros da minha.
Ela geme com a perda da minha boca, e não posso deixar de sorrir com o
som. Eu amo o quanto ela precisa de mim.
— Mako. − ela murmura, com sua voz ofegante e desesperada.
Aproveito o tempo para observar lentamente seu corpo. Porra, má ideia.
Eu estou muito no limite e ela é muito perfeita. Belos seios, do tamanho
perfeito para as minhas mãos, com pequenos mamilos rosados e
esperando pela minha boca. Curvas esculpidas com barriga chapada.
Uma sobrancelha se levanta quando avisto a joia simples enfiada em seu
umbigo. Algo que terei que explorar mais tarde.
— Você é perfeita pra caralho. − eu respiro, com os meus olhos
abaixando em sua boceta envolta do meu pau. Eu tenho que fechar meus
olhos para evitar gozar prematuramente, com a minha mão agarrando
seu cabelo involuntariamente. Ela geme de dor, apenas fazendo minha
determinação hesitar ainda mais. Vê-la conectada a mim é incrivelmente
erótico e algo que pretendo ver todos os dias pelo resto da minha vida.
— Mako, por favor. − ela implora.
Foda-se, foda-se, foda-se! Esta mulher será a minha morte.
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— O que você precisa de mim? − eu sussurro, desviando meus


olhos de volta para suas órbitas douradas derretidas. Elas estão pegando
fogo, como ouro líquido fervendo sobre um fogo intenso apenas para
mim. Suas mãos pressionam o meu peito por um momento antes de
deslizarem para baixo lentamente. Logo antes de chegarem ao meu pau,
eu levanto seus pulsos para cima e para longe.
Em breve, vou deixá-la fazer o que quiser com meu corpo. Mas não
esta noite.
— Mako! − ela protesta, tentando soltar os braços.
— Diga-me o que você quer com as palavras, River. − eu murmuro.
— Eu... eu preciso de você.
Um firme aceno de cabeça. — Não é bom o suficiente, querida. O
que você quer que eu faça com você? − pergunto enquanto transfiro os
dois pulsos para uma mão e uso a outra para acariciar levemente seu
clitóris. Seus olhos quase reviram e eu decido que é a missão da minha
vida ver essa visão sempre que puder.
Quando ela apenas solta um gemido, eu me inclino para frente e
lambo o seu mamilo atrevido. Suas costas arqueiam, com seu corpo
implorando por mais. Eu evito seus desejos, determinado a ouvir o que
ela quer.
Alguém perguntou a ela? Ninguém nunca deu a ela a opção de
escolher? Claro que não. Esses idiotas acabaram tirando isso dela,
desconsiderando as suas vontades e desejos. Desconsiderando as suas
fantasias secretas. Quero ver cada uma delas ganhando vida. Com
apenas uma simples demanda de seus lábios, serei um escravo de cada
um de seus desejos.
— River. − pressiono, quando ela começa a ficar impaciente,
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chegando a encostar seu corpo no meu na tentativa de me fazer chupar


seu mamilo. — Use suas palavras.
Ela geme de frustração. — Chupe-me. − ela diz, quase timidamente.
Nunca na minha vida eu pensaria que River seria tímida, mas foda-se se
isso não faz algo comigo. Atendendo a sua demanda, meus lábios se
fecham ao redor do mamilo, chupando fortemente enquanto deslizo
minha língua por todo seu mamilo sensível.
O gemido alto que escapa de sua boca soa como um doce alívio. Eu
mudo para o outro seio, nunca negligenciando os dois.
— O que mais? − murmuro, olhando para ela. Sua boca está aberta
em um O perfeito, e um vinco profundo franze entre sua testa enquanto
ela olha para mim. Arqueio uma sobrancelha, esperando por sua
resposta.
— To... toque no meu clitóris. Esfregue. − ela diz, com a sua voz
apenas um pouco mais confiante do que antes. Meu polegar esfrega em
seu pequeno clitóris, cheio de desejo. Mais gemidos seguem o exemplo,
e quanto mais altos eles ficam, mais firme eu pressiono. Eu não paro
nenhum dos movimentos - minha língua contra seu mamilo e meu
polegar em seu clitóris - determinado a levá-la ao orgasmo desta forma,
se é assim que ela quer.
— Mais! − ela exige.
— Mais o que?
— Foda-me com os dedos. − ela sussurra, com toda a timidez
ausente de sua forte demanda.
Aí está minha garota.
Ela se levanta apenas o suficiente para que minha mão deslize por
sua fenda e encontre sua abertura. Eu gemo com ela quando insiro um
dedo em seu centro apertado. Ela é perfeita demais. Outro dedo se junta
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ao primeiro, curvando-se em um movimento de vem cá. Meu polegar


encontra seu clitóris novamente assim que meu dedo localiza o pequeno
ponto dentro dela que instantaneamente faz suas pernas tremerem.
— Mako! − ela suspira, com seus quadris circulando contra a minha
mão. Seu orgasmo percorre todo seu corpo, deixando-o completamente
imóvel por um breve momento antes que ela perca completamente o
controle. Seus quadris se movem contra a minha mão com fervor e
ambas as mãos no meu cabelo e agarram em um aperto mortal, com
minha boca firmemente presa em seu seio. Eu não paro de trabalhar nela
e ela não para de gritar.
Ela goza completamente aniquilada contra mim e é a visão mais
encantadora que eu já vi.
Finalmente, quando ela cai goza é quando eu retomo o controle.
Estou a segundos de perder o controle, então leva tudo em mim para me
controlar quando agarro seus quadris, levanto seu corpo e a empalo
diretamente no meu pau.
Pooorrrraa.
Seus olhos semicerrados se arregalam em discos e um grito
distorcido escapa de sua garganta. Nenhum de nós se mexe. Eu permito
que ela se adapte ao meu tamanho enquanto tento não gozar. Seu calor
úmido e apertado me envolve completamente, espremendo a vida fora
de mim.
Minha cabeça colide com a parede de cimento atrás de mim, com
meus dentes rangendo até quase transformá-los em pó.
— Você está bem? − pergunto com a voz rouca, não orgulhoso da
forma como minha voz treme.
— Eu... É normal ter a porra de um pau de cavalo? − ela finalmente
arfa, com seus olhos redondos abaixando para onde estamos conectados.
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Ela já viu meu pau antes, como era grande, mas imagino que senti-lo
dentro dela é uma perspectiva totalmente nova.
Eu não posso evitar. Um enorme sorriso satisfeito se abre em meu
rosto, me fazendo revirar os olhos quando ela o vê. Sei que sou maior
que a maioria, muito maior que a maioria. Mas não me importo com o
que alguém diga, nenhum homem pode negar a satisfação final quando
uma garota elogia isso. Especialmente a garota por quem você está
loucamente apaixonado.
— Eu machuquei você? − pergunto, levantando meus quadris um
pouco. Sua boca se abre e seus olhos voltam ao estado semicerrado.
— Gosto do jeito que você me machuca. − ela sussurra. Algo
primitivo surge dentro do meu peito. É uma fera viva que respira que
River acabou de acordar de seu sono. Minhas mãos apertam seus quadris
até ter certeza de que ela vai ficar com marcas das minhas mãos por um
ou dois dias. Ela se inclina para frente e encosta seus lábios carnudos
nos meus.
Meus jeans descartados estão ao lado do banco. Com facilidade
praticada, tiro minhas algemas e as coloco em seus pulsos, prendendo-as
atrás das costas em segundos. Ela para, com minhas ações alcançando-a
quando ela percebe o que eu fiz.
— Eu sou sua prisioneira? − ela pergunta sedutoramente.
Eu mordo meu lábio, gostando bastante da forma como seu peito se
projeta e seu corpo se curva para acomodar as algemas.
— Enquanto você estiver disposta a ser. − murmuro.
— Você vai me soltar no segundo que eu mandar. − ela me diz, com
sua voz suave, mas severa. Eu encontro seu olhar, certificando-me de
que ela pode ver a verdade em minhas palavras.
— Elas vão embora antes que você termine a frase. − eu prometo.
Ela acena com a cabeça uma vez, girando os pulsos suavemente,
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testando as algemas. Eu as mantive bastante folgadas para que não


esfregassem e deixassem sua pele delicada em carne viva.
Quando vejo sua aceitação, não dou a ela a chance de fazer mais
exigências. Eu abro minhas coxas ainda mais, deslizo minhas mãos para
baixo abaixo das suas nádegas, a seguro contra meu corpo e a fodo
completamente. Pela segunda vez, os olhos de River se arregalam em
discos redondos.
— Ah, meu Deus! − ela arfa, com seu rosto enfiando na curva do
meu pescoço enquanto os tons de seus gemidos aumentam. Minha boca
percorre seu ombro e sobe pela pele macia de seu pescoço, abrindo
caminho enquanto deslizo. Eu agarro um pouco de seu cabelo sedutor e
puxo sua cabeça para trás, provocando outro gemido agudo em sua
garganta. Quando chego ao ponto logo atrás de sua orelha, mordo a
carne macia, com meus quadris movendo implacavelmente.
— Mako! − ela se contorce contra mim, com as algemas tilintando
alto com o choque de nossos corpos. O suor escorre pela minha testa e
peito enquanto luto para manter o controle. Porra, nunca senti nada tão
incrível na minha vida. Ela se molda ao meu pau como argila molhada.
— É disso que você precisava? − digo, enfatizando minhas palavras
com uma estocada forte, arrancando um pequeno grito de sua garganta.
— Você precisava de mim para foder essa boceta gostosa, não é?
— Sim! − ela ofega, balançando a cabeça como um bobblehead7.
— É sobre isso que você fantasiou toda vez que tocou sua boceta,
desejando que fosse eu?
Outro "sim" ilegível vem de sua garganta. — Mas parece muito
melhor. − ela suspira, com o branco de seus olhos quase assumindo o
controle.
— Você é tão perfeita, baby. − murmuro, esfregando meus quadris
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contra os dela algumas vezes quando ela está completamente sentada no


meu pau. Sei que seu clitóris está deslizando contra minha pélvis
apenas pelos suspiros agudos toda vez que eu me esfrego contra ela.

7Um bobblehead (cabeça oscilante) é um tipo de boneco colecionável. Sua


cabeça costuma ser superdimensionada em comparação ao corpo.
Ela está chegando perto, eu posso sentir isso. Eu envolvo meu braço
inteiramente em torno de sua cintura, tomando cuidado com seus braços
restritos, e a levanto ainda mais para cima, mais uma vez empurrando
meus quadris com fortes estocadas. A única coisa que me mantém com
os pés no chão é a minha necessidade de fazê-la gozar primeiro. Eu me
recuso a gozar um segundo antes dela.
Como se estivesse lendo meus pensamentos, ela ofega: — Mako,
porra, eu vou gozar! − Suas pernas apertam contra as minhas e sua
cabeça começa a pender para trás. Palavrões escapam da minha boca
quando a intensidade que nossos corpos estão criando atinge seu pico.
Meu ritmo aumenta conforme eu entro e saio, o som molhado de nossos
corpos se conectando rivalizando com os sons vindos do meu e da
garganta de River.
River para - algo que ela parece fazer logo antes de gozar - antes de
sua boceta pulsar em meu pau e ela mais uma vez perder o controle. Ela
se contrai ao meu redor. Meu nome sai de seus lábios como uma oração
desesperada, finalmente quebrando meu controle.
— Porra! − O grito rouco ecoa do fundo do meu peito enquanto me
esvazio completamente dentro dela, com sua boceta sugando até a
última gota de mim. Meu nome continua a preencher a sala enquanto seu
corpo inteiro convulsiona e treme contra o meu, perseguindo nossos
orgasmos juntos antes de gozarmos inevitavelmente.
Afundo ainda mais no banco enquanto seu corpo se torna um peso
morto em cima de mim, com seu rosto enfiado no meu pescoço. Nós
dois estamos tremendo e completamente exaustos. Pequenos espasmos
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ultrapassam seus membros, arrancando um pequeno sorriso de mim.


Pego as chaves e rapidamente abro as algemas em seus pulsos. Eu rio
quando suas mãos simplesmente caem, batendo contra meus lados.
— Nunca soube que era para ser assim. − ela sussurra. Fecho os
olhos com força, igualmente orgulhoso por ter sido o primeiro a dar isso
a ela e com raiva porque todos os homens antes de mim tiveram a
coragem de dar a ela menos do que ela merecia.
Embora pareçam dois troncos mortos, eu levanto meus braços e os
envolvo em torno de seu corpo, trazendo-a para perto de mim o mais
humanamente possível.
— Conosco sempre será assim. − prometo. — A comunicação é
importante para mim, River. Vou testar seus limites e apresentá-la a
coisas novas, mas nunca farei nada que realmente a machuque. E no
momento em que você não gostar de algo, eu paro e isso nunca mais
acontecerá. Quero mostrar a você como deve ser o sexo entre duas
pessoas é suposto ser. Duas pessoas que se respeitam e se entendem.
Ela está mortalmente silenciosa por tempo suficiente para eu
questionar tudo o que acabou de sair da minha boca. Mas então um
soluço escapa dela e as lágrimas começam a se acumular no meu
pescoço e ombro. O pânico floresce em meu peito.
— Eu disse algo errado? − pergunto, correndo para puxar seu corpo
para longe do meu para que eu possa olhá-la nos olhos. Ela protesta,
encolhendo-se mais e envolvendo os braços em volta de mim com força.
— Não. − ela diz fracamente. — Você disse tudo certo. Você é
perfeito. − A ansiedade diminui, mas não me deixa completamente.
— Por que você está chorando?
Ela funga. — Porque esperei minha vida inteira por alguém como
você. E agora que finalmente o encontrei, estou morrendo de medo de
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perdê-lo.
Fecho os meus olhos, com uma expiração áspera liberando o pânico
persistente. Eu agarro cada lado de sua cabeça e levanto suavemente sua
cabeça até que seus olhos lacrimejantes e vermelhos estejam olhando
para mim. Meu coração para e se contrai. Ela é tão linda que dói.
— Entendo. É assim que me sinto há meses. Mas se eu tiver algo a
ver com isso, River, isso nunca vai acontecer.
Seus olhos se fecham, seus longos cílios negros se aglomeram com
lágrimas se espalhando por suas bochechas avermelhadas. Ela cede e
acena com a cabeça.
— OK. Eu posso aceitar isso.

— Odeio estragar nosso pequeno orgasmo, mas... eu preciso ir ver a


Barbie. − Não nós, mas eu.
Não posso mentir e dizer que essas palavras não esvaziam minha
euforia como a porra de um balão.
— Agora mesmo? − pergunto.
— Sim.
— Por quê? − pergunto, colocando o meu pé em minha bota e
amarrando-a. Seu cheiro está em mim agora e se eu fosse um homem
inferior, nunca mais iria querer tomar banho.
Ela suspira. — Preciso cobrar o aluguel.
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Minha testa franze. Eu pensei que ela tinha parado de ir lá por algo
tão trivial. Duvido muito que a Barbie pague muito aluguel a River.
Mas talvez ela esteja preocupada com dinheiro. Suponho que sem Ryan,
ela acha que precisará começar a se sustentar novamente.
— Nós dois sabemos que não é seguro, River. − digo calmamente,
apoiando os cotovelos nos joelhos separados e entrelaçando os dedos.
Eu olho para ela, observando seu rosto inexpressivo. Ela está sentada na
beirada do banco, com a coluna ereta e os próprios dedos entrelaçados
com força. Ela parece estar prestes a correr.
— Eu sei. − ela concorda. Seus olhos abaixados levantam para os
meus. Algo está à espreita nas profundezas de suas órbitas de mel - uma
emoção que não consigo identificar. Uma pedra se instala em meu peito
e meu estômago embrulha como se eu tivesse bebido leite estragado.
— Você sabe. − eu ecoo lentamente. — E se Billy estiver lá? − eu
pressiono, lembrando o bicho-papão de sua infância e o homem que a
espancou até jorrar sangue de todos os lados. O homem que estou
morrendo de vontade de colocar minhas mãos e conduzir minha própria
tortura. Se eu não a estivesse estudando como um arqueólogo estuda
hieróglifos, teria perdido o ligeiro tremor à menção de seu nome. A
reação desperta todos os tipos de sentimentos dentro de mim. Não
importa o quanto River tente esconder, ela tem pavor de Billy.
Mais uma razão para conhecê-lo.
— Ele não vai estar. − ela afirma com firmeza, segura de si. Não sei
como ela poderia saber disso, mas se sei alguma coisa sobre essa mulher
teimosa é que não importa o que eu diga, ela vai de qualquer maneira.
— Eu vou com você então. − Seus olhos se arregalam e viram para
mim. Um protesto se forma em sua língua, mas eu aperto meus lábios e
dou a ela uma clara advertência, balançando a cabeça uma vez. Seus
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ombros abaixam em derrota. Se ela souber alguma coisa sobre mim, não
importa o que ela diga, irei de qualquer maneira.
Eu fodi tudo.
No momento em que aquelas palavras saíram da minha boca, eu
sabia que tinha fodido tudo. Eu deveria ter pensado melhor antes de
dizer a Mako que vou ver a Barbie. Mas não sabia como ir embora
depois que acabamos de... bem, aquilo, e não ser estranho. Você não sai
apenas com um "até logo" quando alguém te fode do jeito que Mako me
fodeu.
Meu estômago aperta com um desejo inebriante e uma emoção
aguda pela milionésima vez quando me lembro do que fizemos apenas
vinte minutos atrás. É patético da minha parte já querer fazer isso de
novo. E de novo. E outra vez.
Mas preciso ver a Barbie. Já esperei muito tempo, muito ocupada
me escondendo em casa e longe de olhares indiscretos. O Ghost Killer -
ou Billy - ainda está por aí. Eu esperava obter mais informações da
Barbie enquanto tento descobrir como diabos devo contar a Mako quem
é o Ghost Killer. Ele vai me odiar, eu já sei. Ele dedicou muito tempo e
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energia para encontrá-lo, e eu soube desde o momento em que ele me


contou sobre os assassinatos, e não disse nada.
Mas agora, Mako quer vir. Então, a única coisa que posso fazer é
cobrar o tão necessário aluguel e encontrar outra hora para falar com a
Barbie. Se alguém sabe de alguma coisa, é ela. Ela não sabia sobre os
assassinatos de Billy antes, mas agora que isso foi trazido à tona, ela vai
roubar qualquer informação que conseguir. Se a Barbie serve para
alguma coisa além de vender seu corpo, é para obter informações.
O medo se instala em meu peito quando Mako abre a porta do carro
para mim, esperando que eu entre. Trazer Mako aqui é uma péssima
ideia.
— Talvez não devêssemos ir. − digo, me encolhendo quando as
palavras saem da minha boca, estranhas e muito suspeitas. Seus olhos se
estreitam para mim. Eu me mexo, desconfortável com a maneira como
ele está me olhando.
— Eu me sentiria melhor fazendo isso enquanto estou com você. −
ele diz finalmente. Porra. Ele me conhece muito bem. Bem o suficiente
para saber que quero ir sozinha. E não há como Mako deixar isso
acontecer. Não depois que já abri minha boca grande e divulguei
algumas das coisas que Billy me fez passar, e especialmente não depois
que Billy quase me espancou até a morte.
Foda-se, foda-se, foda-se. Não há como escapar disso e a única
pessoa com quem posso ficar com raiva sou eu mesma. Cérebro
induzido por sexo estúpido. O sexo com Mako é perigoso se interromper
completamente a capacidade de pensar corretamente.
Não surte, River. Basta entrar, pegar o dinheiro e sair. Simples.
Nada com Shallow Hill é simples.
Durante todo o tempo em que dou instruções a Mako, fico tentada a
fazê-lo dirigir até uma casa vazia e aleatória e dizer que ela não está em
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casa. Há muitas casas abandonadas em Shallow Hill. Seria fácil. Mas


algo parece errado em mentir para Mako ainda mais do que já estou.
Ele estaciona na garagem da minha decrépita casa de infância.
Assim como todas as outras casas nesta triste cidade, os tapumes
brancos dificilmente são brancos e estão por um fio. Janelas fechadas
com tábuas por causa das brigas explosivas entre Barbie e seus clientes.
Uma frágil varanda de madeira com um degrau caído e um buraco de
quando alguém caiu.
É embaraçoso para dizer o mínimo.
— Você não precisa entrar, Mako.
Ele já está abrindo a porta e contornando o carro para abrir a minha
para mim. Meu coração aperta quando vejo os pequenos olhos redondos
da Barbie espiando pelas cortinas esfarrapadas.
O pavor se consolida dentro do meu peito. Vou precisar de uma
britadeira para esclarecer isso quando tudo isso estiver terminado.
Eu arrasto meus pés entrando em casa, com Mako atrás de mim. Sua
presença é avassaladora e sufocante quando tudo o que quero fazer é
removê-lo desta casa.
— Bem, quem diabos temos aqui? − Barbie diz da porta da cozinha,
com os braços cruzados sobre o corpo frágil. Seus olhos estão devorando
Mako, claramente apreciando a vista com base na emoção não filtrada
em seus olhos. — Ah, isso é uma melhora, querida. Muito melhor do
que o último que você trouxe para casa. Aquele parecia que se fodia com
um pedaço de pau por prazer.
Não posso evitar isso. Bufo em resposta. Às vezes, consigo apreciar
a honestidade da boca da Barbie, mesmo que o veneno que ela despeja
seja principalmente direcionado a mim.
— Barbie, este é o Mako. Não o assuste. − eu aviso.
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Um sorriso pecaminoso se abre em seu rosto. Esta é a Barbie em


ação, mesmo sabendo que Mako nunca vai dar a mínima para ela.
Mako, sempre o cavalheiro, dá um breve: — Olá, Barbie. − Seus olhos
se arregalam quando ela sente uma amostra de sua voz. Rouca - tão
rouca, especialmente quando ele está dizendo as coisas mais obscenas
em seu ouvido enquanto pelo menos vinte centímetros está dentro de
você. Eu estremeço com a memória.
Mesmo quando Mako perceber que vai me odiar em vez de me
amar, vou guardar essa memória com carinho até o dia da minha morte.
— O que você quer? − Barbie diz, desviando seus olhos para longe
do homem magnético atrás de mim. É preciso muito esforço da parte
dela, sei disso por experiência própria. O veneno usual em sua voz está
ausente. Provavelmente muito fascinada por Mako.
— Dia do aluguel. − digo. Seu rosto desanima, revirando os olhos
dramaticamente e virando-se para entrar na cozinha. Quando a Barbie
não está no maldito quarto, ela está na cozinha fumando, injetando ou
cheirando. Precisei de quatro cigarros para me manter naquela cozinha -
o mesmo lugar que Billy me concedeu novos pesadelos - da última vez
que estive aqui. Fumar na frente de Mako parece errado.
A única coisa que tira meus pés do chão é a lembrança de que tenho
Mako aqui comigo. Sua força emana silenciosamente para mim, dando-
me a coragem de que preciso para revisitar meu inferno pessoal.
A cozinha está no mesmo estado da última vez que estive aqui. E
todas as vezes antes disso, desde que me lembro. Observo os olhos de
Mako observando cada detalhe. O desejo irresistível de vendá-lo é quase
insuportável. Odeio que ele veja o lugar em que cresci. Também não
gostei que Ryan visse isso, mas algo sobre Mako descobrir de onde vim
parece diferente.
Com Ryan, senti que precisava impressioná-lo. Provar algo para ele.
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E esta casa suja não existe em nenhuma lista para impressionar seu
namorado. Ryan zombou e olhou para esta casa e Barbie. Toda a
experiência me deixou envergonhada e com um gosto ruim na boca, e
tenho quase certeza que fez Ryan olhar para mim com um pouco menos
de admiração.
Com Mako, só quero protegê-lo desta vida. Não porque sinto
necessidade de impressioná-lo, mas porque tenho medo de que ele tenha
pena de mim. A última coisa de que preciso é pena.
Mas claro, Mako sempre me surpreende. A mesma coisa que
diminuiu nos olhos de Ryan é a mesma coisa que brilha nos olhos de
Mako enquanto ele olha para mim. Admiração. Ele não precisa dizer as
palavras agora, ele já as disse antes. Ele está... orgulhoso por eu ter saído
de um inferno como este e me tornado a mulher que sou hoje. Mesmo
que eu seja uma assassina. Não importa para Mako. Não quando a
pessoa que matei merecia cada coisa que fiz a ela.
— Você tem o dinheiro? − pergunto impaciente. Barbie está sentada
em sua cadeira de sempre, fumando um cigarro.
— Você não pode vir aqui para visitar sua mãe uma vez? Você só
vem aqui por dinheiro. Você está começando a me fazer sentir usada.
Eu dou a ela um olhar seco. — Que fofo, Barbie. Muito fofa.
A escuridão surge no canto da minha visão. Odeio estar nesta
cozinha.
— River já contou a história de como ela conseguiu o nome dela? −
Barbie pergunta, olhando Mako de cima a baixo como um pedaço de
carne. Eu a corrigiria se não fosse culpada de fazer a mesma coisa toda
vez que estou perto dele.
— Não. − Sua resposta é curta e concisa. Eu diria desinteressada se
não fosse pela peculiaridade de uma sobrancelha arqueada em minha
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direção. Eu suspiro, com o arrependimento de trazer Mako para


qualquer lugar perto deste lugar se aprofundando.
— Entrei em trabalho de parto no meio de uma corrida para salvar
minha vida. − Barbie começa, concentrando a sua atenção na mesa
desgastada. — Pensei que seria mais difícil ser pega se eu estivesse no
rio lá fora. − ela acena com a cabeça na direção do rio parado e sujo. —
Achei que ele não poderia me pegar assim. Lá estava eu, sendo
perseguida por um dos homens mais assustadores do mundo, e é aí que
River decide que queria sair. Estava gritando e chorando, implorando
pela minha vida enquanto tentava ativamente evitar que um bebê saísse
do meu corpo. − Uma risada seca escapa de seus lábios rachados. —
Mas River não estava aceitando isso. Ela queria sair ali mesmo. Então, a
água estava no meu peito, Billy não conseguia ver o que estava
acontecendo. Ele estava vindo atrás de mim, com uma arma na mão e já
apontada para minha cabeça, e então para quando levanto River e ele
ouve os primeiros choros de um bebê. − ela faz uma pausa e vira seus
olhos vazios e arregalados para mim. — River foi o que finalmente
salvou minha vida naquele dia. Assim que Billy a ouviu chorar, decidiu
que gostava do som. E então tornou a missão de sua vida ouvi-la chorar
até o dia em que ela escapou de Shallow Hill.
Um silêncio ameaçador paira sobre nós quando as últimas palavras
de Barbie soam e depois desaparecem no ar frio. Eu tremo, apesar de
estar quente como o inferno nesta casa.
Sempre odiei essa história. As origens do meu nascimento e a minha
existência. Billy estava se preparando para matar uma mulher grávida e
deixar ela e o seu bebê morto boiando ao longo do rio. Não
surpreendentemente, houve mais do que alguns cadáveres retirados do
rio. Todo mundo sem família para falar e sem uma alma por perto que
dê a mínima. Barbie pode ter tido a sorte de ganhar alguma simpatia, já
que estaria grávida quando morta, mas não o suficiente para realmente
procurar por seu assassino.
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Tantas noites, desejei que isso fosse o que teria acontecido. Eu me


odiava por ter nascido porque, se tivesse esperado apenas um minuto a
mais, nunca teria existido. Eu nunca teria suportado a tortura e o abuso
que nunca terminaram, mesmo vinte e dois anos depois. Eu teria acesso
ao céu sem ter que enfrentar o inferno primeiro. Eu estaria livre.
— Sua vida pode ter sido salva, mas a minha acabou naquele dia. −
digo, forçando a secura em meu tom. Ela sorri para mim, como se
soubesse o quanto essa história ainda me afeta. Mako não diz nada, mas
os contornos de seus olhos se suavizaram um pouco.
— Dinheiro, Barbie. − eu lembro, estalando meus dedos de forma
desagradável. Ser lembrada de Billy me bombardeou.
— Não tenho. − ela diz curtamente.
Mako vem para ficar ao meu lado, cruzando os braços sobre o peito
largo e olhando para Barbie com uma sobrancelha erguida. Ele não está
olhando para ela como se fosse melhor do que ela, ele está olhando para
ela para intimidá-la.
Por mim.
O choque me dá um tapa na cara quando vejo Barbie corar com o
olhar cuidadoso de Mako. Nunca na porra da minha vida vi a Barbie
corar.
A única coisa que me tira do meu estado de choque é o maço de
notas limpas caindo na mesa suja. Ver as notas paralisa meu coração.
Notas limpas não passam pelas mãos da Barbie. Não é apenas algo que
acontece. Esta cidade é suja e o dinheiro é ainda mais sujo.
— Onde você conseguiu isso? − sussurro, olhando para as notas
como se fossem cobras vivas, levantadas e prontas para picar.
Barbie olha para as notas e depois para mim com uma emoção
ilegível em seus olhos. Quase parece apreensão, mas essa palavra só foi
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associada à Barbie quando Billy está envolvido.


— Você sabe a resposta para isso, River.
— Por que ele está te dando dinheiro? − eu ranjo meus dentes.
— Porque ele sabe que você vem cobrar o aluguel todos os meses.
Diz que quer cuidar de suas garotas favoritas, então ele me dá o dinheiro
para dar a você. Ele disse que mata dois coelhos com uma cajadada só.
Meu estômago azeda, torcendo e revirando até ter certeza de que
vou vomitar. O vômito sobe no fundo da minha garganta. Dou um passo
para longe do dinheiro.
— Não quero o dinheiro dele. − murmuro. — E quanto ao dinheiro
que você ganha?
— Esse é o meu dinheiro! Quem se importa de onde vem, River.
Apenas pegue isso!
Sem pensar, pego o dinheiro e jogo na cara dela, com dezenas de
notas acertando seu rosto antes de cair no chão de ladrilhos imundo.
Barbie levanta, com sua cadeira fazendo barulho atrás dela e fica na
minha cara.
— O que, você está com muito medo de aceitar dinheiro do Ghost
Killer agora? Você aceitou o pau dele dentro de você várias vezes, o que
há de errado com o dinheiro dele?
Todo o ar é sugado para fora do cômodo, deixando nada além de
uma quietude estagnada e arrepiante. Eu me encolho e fecho os olhos,
com as lágrimas já escorrendo pelas minhas pálpebras. Uma escapa
quando ouço Mako dar um único passo à frente.
— Que porra você acabou de dizer? − Uma hora atrás, sua voz
baixa e rouca estava carregada de desejo e necessidade. Agora… Agora
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está rouca com a traição.


Um palavrão escapa da minha boca quando me viro para enfrentar
Mako. Ele já está olhando para mim, com o choque estampado em seu
belo rosto. Juntamente com dor. Dor profunda e cortante.
— Eu ia te contar. − murmuro vergonhosamente. Tanto que quero
baixar os olhos para os pés e me esconder da raiva que enche os olhos de
Mako como um tanque de gasolina vazio sendo enchido de gasolina.
— Você sabia quem era o Ghost Killer? O tempo todo?
A gargalhada irônica da Barbie soa atrás de mim. Meus ombros
sobem até minhas orelhas e o constrangimento me inunda. Esta é a
última coisa que quero que a Barbie testemunhe. Trouxe para casa um
homem que até ela queria, e ele está terminando comigo bem na frente
dela, nem meia hora depois.
— Sim, mas... − Mako está se virando e saindo de casa antes que
eu possa terminar minha frase - ou melhor, minha desculpa esfarrapada.
Estou me virando, correndo atrás dele, mesmo quando as palavras
de parar o coração de Barbie me seguem. — Espere até que ele descubra
que Billy é seu pai também.
Eu quase paro. Quase me viro e exijo o que diabos a Barbie acabou
de dizer. Mas ela deve estar mentindo. Ela está apenas provocando uma
briga para me machucar. Não tem como Billy ser meu pai. Um deles já
teria me dito isso.
— Mako, espere! − grito, não dando a mínima para o fato de haver
uma pequena festa na varanda algumas portas adiante, agora em silêncio
enquanto testemunham o Fantasma de Shallow Hill perseguindo um
homem desconhecido. Um homem que claramente não pertence a esta
cidade.
— Só... foda-se! Entre no maldito carro, River. − ele abre a porta,
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se joga e bate a porta atrás de si. Não querendo que ele vá embora sem
mim, entro no carro, mal fechando a porta antes que ele saia da
garagem, deixando marcas de derrapagem em nosso rastro.
Ambos os punhos estão cerrados ao redor do volante com tanta
força que o couro está rachando sob seu aperto. As juntas dos dedos
brancas me encaram na escuridão, me lembrando de que estraguei tudo.
De novo.
Seus braços tremem e sua respiração preenche o silêncio tenso com
rajadas curtas e desconexas.
— Você tem uma foto dele? − ele pergunta firmemente, com raiva
colorindo seu tom.
— Sim. − sussurro, com minha boca com gosto de cinzas. Lágrimas
embaçam minha visão quando pego meu celular e procuro a única foto
de Billy que tenho. Tirei-a anos atrás, antes de partir. Ele estava
particularmente louco naquela noite, brutalizando-me e destruindo-me
mentalmente e fisicamente. Eu já havia garantido minha vaga na
universidade e sabia que iria embora em uma semana. Ainda não sei por
que me arrisquei, mas entrei furtivamente quando Billy estava olhando
para mim, ainda zangado por tudo o que fiz naquela noite. As razões da
raiva de Billy me escapam, a única coisa que resta é o abuso que ele
infligiu por causa disso.
A luz forte do meu celular ilumina o rosto sério de Mako enquanto
eu entrego o celular trêmula. No segundo em que seus olhos pousam na
foto, ele pisa no freio e joga o carro no acostamento. Meu corpo se
inclina para frente com a força e, mesmo no meio de sua raiva, Mako
ainda se preocupa comigo o suficiente para colocar o braço em meu
peito e me empurrar de volta para o assento.
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— PORRA! − ele grita.


Dou um pulo tão alto que bato com a cabeça no vidro da janela.
Mako cerra o punho e bate no volante, com tanta força que o carro está
berrando por ele ter tocado a buzina.
— Mako, pare! O que está errado?! − grito, com a minha voz
desesperada e assustada. Não tenho medo de Mako em si, mas tenho
medo do que suas reações significam. Não entendo a reação dele à foto.
Ele finalmente para, com as juntas dos dedos já machucadas. Suas
mãos puxam seu cabelo enquanto ele exaspera.
— Quando você descobriu isso? − ele exige, mantendo o rosto
virado para longe de mim e colado na janela.
Rios quentes e constantes de lágrimas escorrem de meus olhos. —
Quando você me contou sobre ele no jantar. Quando Billy me atacou
naquela noite... ele me chamou de fantasma do jeito que era... enfim, é
algo comum em Shallow Hill por causa de Billy. Ele diz que quando
você cresce em um lugar como Shallow Hill, não há como escapar.
Então, quando escapa e depois volta… você é considerado um fantasma.
Alguém que apenas assombra as ruas quando achar oportuno, mas
sempre desaparece no final. − eu limpo o ranho com a barra da minha
camiseta. Eu continuo, com minha voz tremendo enquanto confesso.
— Quando eu tinha seis anos, Billy ficou viciado em
metanfetamina. Muito. Ele ficou desequilibrado e começou a matar
pessoas descuidadamente. É um milagre que Barbie e eu tenhamos
sobrevivido àquela época. Ele vinha para casa, furioso sobre como todos
os homens que trabalhavam para ele o traíram. Seja porque ele pensou
que eles o roubaram ou estavam fodendo com o produto ou qualquer que
seja o motivo. Ele matou todos eles. Não deu em nada porque ele
conseguiu se livrar de todos os corpos. E por mais triste que seja,
ninguém dá a mínima para as pessoas que morrem em Shallow Hill.
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— Quando você me contou sobre o Ghost Killer e a maneira como


eles foram assassinados, eu sabia que não era coincidência. Eu sabia que
era Billy. Fui até a casa da Barbie quando tive a chance de ficar longe de
Ryan, e ela confirmou que Billy está viciado de novo. Novamente
matando todos os seus homens, e agora rotulando-os de Ghost porque
bem... é o que eles são agora.
Um silêncio sufocante toma conta do carro, quase me sufocando
com a raiva de Mako. Ele está tremendo, tremendo tanto de raiva que
parece que está tendo um ataque. Minha boca se abre, pronta para contar
a Mako o que Barbie me disse enquanto eu o persegui porta afora, mas
as palavras morrem em minha língua. Não adianta dizer a ele algo que
eu não confirmei como verdadeiro.
— Por favor, me diga o que está acontecendo, Mako. − imploro
quando o homem irritado ao meu lado continua assimilando. Estou
tremendo como uma folha em ventos cortantes enquanto vejo meu pior
pesadelo ganhar vida. Foi por isso que chorei no peito de Mako na
biblioteca. Porque sabia que machucaria Mako quando ele descobrisse a
verdade. Uma parte pequena e estúpida de mim manteve a esperança de
que ele entenderia por que fiz isso. Mesmo assim, estou perdendo ele.
Assim como eu sabia que iria.
Ele suspira asperamente, lentamente recuperando o controle. —
Essa é a pessoa que alegou ter sido testemunha de um assassinato do
Ghost Killer. Aquele era o cliente de Ryan, o maldito do Benedict
Davis. O homem que matou meu pai e está perseguindo há mais de um
ano estava bem na minha frente. Exatamente como Ryan disse.
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Três longos dias de silêncio desgastantes do Mako. Três dias de
polícia batendo na minha porta, fazendo perguntas. Parasitas espalhados
pelo gramado, esperando qualquer oportunidade para tirar uma foto
minha e publicá-la com algum artigo meia-boca com manchetes como A
verdade por trás do assassinato de Ryan Fitzgerald.
Isso é cansativo.
Relatórios nos últimos dias foram de que o verdadeiro assassino de
Ryan foi finalmente pego. O Ghost Killer. Que também era cliente de
Ryan. Honestamente, não poderia ter funcionado de maneira mais
perfeita. Isso serviu para a história que já havíamos inventado. Ryan
descobriu quem era o Ghost Killer e foi silenciado antes que pudesse
revelar a verdade. A única coisa que falta é o corpo de Ryan, mas a
polícia está descobrindo que o Ghost Killer não seguiu seu modus
operandi porque foi uma morte desesperada de última hora antes que
Ryan pudesse revelar sua identidade.
Em um único instante, Mako resolveu o caso não apenas de seu
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irmão, mas de um dos maiores e mais notórios casos dos Estados


Unidos. Não preciso estar perto de Mako para saber que ele não está
feliz com isso. Ele tecnicamente não descobriu quem era o Ghost Killer
- ele foi informado. De uma maneira bem fodida para começar. Não há
senso de justiça ou satisfação ao descobrir um serial killer dessa
maneira. Ao descobrir que a garota por quem você está apaixonado sabia
quem ele era há meses e não disse nada. E descobrir que é o mesmo
homem que a espancou e estuprou não muito tempo atrás.
Esperei no gelo fino, esperando que a polícia invadisse a casa e me
prendesse pelo assassinato de Ryan. Com certeza, Mako não iria
continuar fingindo depois que menti para ele por tanto tempo.
Certamente, ele não me consideraria digna de arriscar toda a sua vida.
E, no entanto, ele se manteve fiel à sua palavra. Ele encobriu o
assassinato de Ryan, culpando um homem que cometeu inúmeros crimes
hediondos, exceto aquele pelo qual ele será preso.
Essa é a parte mais assustadora. Ele ainda não foi preso. Porque eles
não podem encontrá-lo. Billy tem conexões em todos os lugares. Tenho
certeza de que ele sabia de sua prisão antes mesmo de decidirem que
eles tinham um motivo provável.
Ninguém sabe onde ele está. Portanto, agora não é uma busca para
descobrir quem é o Ghost Killer, mas onde ele está.
— Você está tão pálida. − A voz suave soa atrás de mim. Estou
encolhida como uma bola no sofá, de costas para o mundo. Amelia nem
consegue ver meu rosto e já está me chamando.
Tento fungar, mas ambas as narinas estão completamente
congestionadas. — Você nem pode me ver ainda. − retruco fracamente.
O peso comprime o sofá de couro atrás das minhas pernas. Um bufo
suave escapa de sua boca. Ela está com apenas cinco meses agora, mas
está ficando enorme. Quando você é engravidada por um mamute, só faz
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sentido que você engravide de um.


Eu me viro para minha melhor amiga, confirmando sua declaração
presunçosa e fixando meus olhos em sua barriga de bola de basquete.
— Como está o bebê? − pergunto, com a minha voz rouca e fraca.
Os cantos de seus olhos se apertam, mas ela me agrada de qualquer
forma.
— Estou convencida de que fui abduzida por alienígenas e
inseminada. Não tem como essa coisa ser humana. Estou com cinco
meses e parece que estou pronta para estourar. Aquela senhora no
supermercado me perguntou quando deveria nascer e, claro, quando eu
disse a ela, ela não acreditou em mim! Ela disse que devo ter um
momento de lucidez porque estou claramente prestes a entrar em
trabalho de parto a qualquer momento. − ela bufa aborrecida quando se
lembra da memória. — Maldita bruxa. Posso ter alguém consumindo
lentamente meu corpo de dentro para fora, mas não sou estúpida.
Eu rio de suas travessuras. — Já decidiu o nome?
Amelia me ligou ontem para me informar secamente que está
grávida de um menino. Ela não se preocupou em dar festas de revelação
ou fazer nada especial ou coisas assim. A técnica em ultrassom
perguntou se ela queria saber o sexo, Amelia disse que sim, e aí estava a
resposta dela. Embora ela tenha admitido que chorou quando disseram
que ela estava grávida de um menino.
— Acho que vamos de Beckham.
— Isso é incrivelmente fofo. Você tem minha aprovação.
Ela sorri, embora não alcance seus olhos. Ela está muito preocupada
comigo e isso está afetando sua empolgação.
— Por favor, pare de se preocupar comigo. − eu lamento
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miseravelmente.
— River. Seu namorado foi assassinado há apenas duas semanas.
Você me disse que aquele homem perfeitamente comestível fodeu até a
alma do seu corpo e, uma hora depois, expulsou você do carro porque
descobriu que seu agressor também é um notório serial killer e você
sabia disso e não contou a ele. E, que sua mãe lhe disse que aquele
notório serial killer também é seu pai. − ela faz uma pausa para um
efeito dramático, ganhando um revirar de olhos. — Por que diabos eu
não estaria preocupada?
— Não sei se ele é realmente meu pai. − murmuro, ignorando os
outros vários pontos válidos que ela fez.
— Quer ele seja ou não, ele é um homem mau que tem aterrorizado
você a vida inteira. Eu entendo porque Mako está chateado, eu realmente
entendo. Mas ele não entende até que ponto você está absolutamente
apavorada com Billy? Ele não percebe o trauma que o homem infligiu a
você e, por sua vez, ganha sua lealdade relutante simplesmente porque
você teme por sua vida?
Foi por isso que liguei para Amelia e contei tudo a ela. Bem, nem
tudo. Obviamente, não contei a ela que torturei e matei meu namorado.
Confio em Amelia com toda a minha alma e ser, mas isso não significa
que ela merece ser sobrecarregada com um segredo como esse.
Mas estou feliz por ter confessado tudo a ela. Ela não é apenas um
ombro para chorar e um ouvido para ouvir, mas ela entende. Ela entende
como é ser abusada. Ela entende o trauma e o medo. Nós duas sabemos
que eu deveria ter contado a verdade a Mako. E porque mantive minha
boca fechada, várias pessoas foram assassinadas por causa do meu
silêncio. Nunca foi dito, mas sei que esse pensamento também passou
pela cabeça de Mako.
— Não sei, Amelia. Acho que ele está com muita raiva para
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racionalizar dessa forma. É difícil para alguém fazer isso quando não
sabe como é ter alguém assim assombrando sua vida.
Ela suspira e acena com a cabeça, concordando.
— Acha que Billy vai saber que foi você e Barbie que contaram a
Mako quem ele realmente era?
Mordo meu lábio, debatendo o quanto devo divulgar. Se eu conto a
ela a verdade sobre como estou com medo de que Billy venha atrás de
mim. Olho para ela, e o que quer que esteja em meus olhos deve
responder a sua pergunta. Seu lábio treme.
— As câmeras estão funcionando de novo? − ela pergunta no lugar
da minha resposta. Eu aceno uma vez.
— Venha para casa comigo.
— E possivelmente colocar você e a vida de seu filho ainda não
nascido em perigo? Eu deveria dar um soco em você por sugerir algo
assim. − digo, com um tom mordaz. Ela se encolhe, mas acena com a
cabeça em aceitação. A triste verdade é que Amelia entende que não há
muito que eu possa fazer para me livrar de Billy. E saber disso, como
minha melhor amiga, a está matando por dentro. Assim como
aconteceria comigo se nossos papéis fossem invertidos.
— Então, tirando esse maldito Ghost Killer. Como você está
lidando com tudo? − ela pergunta, forçando a conversa para longe de
algo incrivelmente assustador enquanto ela distraidamente esfrega a mão
na barriga. Ela disse que ele já começou a chutar. Olho fixamente para a
barriga dela, subornando silenciosamente o bebê Beckham para chutar a
mãe para que eu possa sentir.
— Tudo como meu namorado abusivo sendo assassinado ou o fato
de que acho que me apaixonei por seu irmão e ele me odeia agora? −
Amelia me dá um olhar divertido. Eu suspiro. — Não estou triste pelo
Ryan. Talvez eu devesse estar porque estivemos juntos por mais de dois
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anos, mas qualquer amor por ele já foi pela janela. Ele me bateu, me
estuprou e me traiu. Eu não sinto nada.
Amelia cai dramaticamente contra o sofá. — Estou feliz que você
disse isso. Eu estaria totalmente disposta a simpatizar com você se você
ainda estivesse apaixonada e sentisse a falta dele, mas isso também
machucaria minha alma.
Sorrio, sentindo-me um pouco mais leve do que há dias. — Quanto
a Mako… não sei o que está acontecendo. Finalmente percebi que ele é
tudo que eu quero em um homem ao mesmo tempo em que ele percebeu
que eu sou tudo que ele odeia em uma mulher.
Amelia bate levemente na minha perna, dando-me um olhar. — Isso
não é verdade, River. Mako está chateado, e com razão. Mas ele disse
que te amava, e mesmo que eu só o tenha encontrado por tipo, trinta
segundos uma vez, ele não parece ser o tipo de homem que diz isso para
qualquer uma. E nesses trinta segundos, ele olhou para você como se
você pendurasse a porra da lua e as estrelas, por mais brega que essa
merda seja, ok? Ele te ama, ele só está magoado.
Meu lábio treme, e maldita seja a vadia por me dar esperança. Eu
odeio esperança. Odeio essa palavra tanto quanto odeio a palavra linda.
A esperança é desesperada. Esperança é decepção. Eu não esperava que
Mako voltasse para mim e agora estou destruindo essas expectativas e
substituindo-as por outras esperançosas. De mau gosto.
— Devo entrar em contato com ele?
Ela não responde de imediato, parecendo procurar a resposta nas
minhas meias de pinguim, como se os pássaros que não voam fossem
revelar os segredos do universo. Por fim, ela diz: — Deixe que ele venha
até você. Ele precisa se acalmar e pensar sobre as coisas racionalmente,
e agora, isso é muito difícil de fazer quando ele está lidando com pais
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perturbados que acabaram de perder seu filho, uma caçada a um serial


killer muito perigoso, e você tem parasitas bronzeando-se em seu
gramado.
Não posso argumentar com isso.
A noite é quando é pior. A casa é enorme e vazia. Mas não parece
vazia. Parece que há todo tipo de coisa assustadora à espreita nos
milhões de sombras desta casa. Mesmo quando Ryan estava vivo, nunca
gostei de ficar sozinha em casa. Cenas de filmes de terror passavam pela
minha mente em um rolo, e minha frequência cardíaca aumentava até
que eu estava à beira da histeria.
Está muito pior agora. A realidade de que Billy está desaparecido
me atingiu com força total. É improvável que ele saiba que a revelação
de sua identidade tem algo a ver comigo, mas isso não faz com que eu
me sinta menos nervosa. E se Barbie de alguma forma o avisou que
Mako - um maldito detetive - descobriu quem é o Ghost Killer?
Eu a culparia por contar a ele? Sim e não. Barbie avisaria Billy
pelos mesmos motivos pelos quais não contei a Mako quem ele era.
Temor. Algo que Billy enraizou em mim e na Barbie tão profundamente
que está alojado profundamente em nossa medula óssea.
Sem nunca reconhecer totalmente, convenci-me de que, se contasse
a Mako quem era Billy, ele descobriria. Ele saberia que foi eu, e não só
viria atrás de mim, como também viria atrás de Mako. Barbie está
enchendo seu sistema de drogas que facilmente causam paranoia. No
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segundo em que saímos da casa dela, ela provavelmente se convenceu


de que Billy iria descobrir e o avisou.
Perceber isso me fez encolher ainda mais no sofá. Eu mal conseguia
olhar para este sofá por meses depois de me envergonhar dele, e agora é
a única coisa que me oferece um pingo de conforto.
Eu queria que Mako estivesse aqui.
Aumentei o volume da TV, em algum reality show no qual mal
prestei atenção. Espero que as mulheres privilegiadas reclamando de
suas vidas ajudem a abafar os pensamentos muito assustadores que
ameaçam me levar a um ataque de pânico.

Um ruído suave se filtra através dos meus sonhos, persuadindo meu


cérebro a se afastar do sonho e voltar à realidade. Flashes brilhantes de
luz passaram pelas minhas pálpebras antes que as vozes anasaladas da
TV fizessem o mesmo. Reprises daquele reality show ainda estão
passando.
Deus, há quanto tempo?
Meu coração começa a bater forte quando uma sensação de enjoo
começa a se instalar. Algo me acordou. O ar parece diferente. Como se
alguém estivesse na sala comigo.
Com o coração na garganta, lentamente abro os olhos até que a sala
apareça. Nada salta imediatamente para mim. Nada de errado, exceto a
sensação de olhos em mim.
A luz pisca na ampla sala de estar, lançando sombras em toda a
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sala. A sala de jantar se conecta à sala de estar, que também levará à


cozinha onde uma parede é toda de vidro. Ryan mencionou que aquele
vidro era à prova de furacões, mas isso não significa que alguém não
possa encontrar uma maneira criativa de entrar se realmente se dedicar a
isso.
Eu me apoio em meu braço, com meus olhos olhando fixamente
para a escuridão, rezando para não encontrar alguém nas sombras me
observando. Meus instintos estão vermelhos agora, e não consigo ver
por que ainda. Bem quando começo a relaxar um pouco, um pé sai da
sala de jantar. Eu pulo, com o cobertor enrolado em minhas pernas e
quase me faz tropeçar quando um corpo emerge das sombras.
Paraliso quando seu rosto aparece. Cada aviso que eu disse a mim
mesma antes se concretizou. Eu sabia que ele viria atrás de mim. Eu
sabia disso, porra.
— Oi, Billy. − eu cumprimento, com a minha voz tremendo. Não
adianta esconder meu medo. Billy já conhece bem o gosto disso.
— Você estava com saudades de mim? − ele pergunta, com a sua
voz baixa e sinistra. Ele está vestido com um terno, como sempre.
Impecável como sempre, mesmo quando está prestes a realizar um
sequestro. Ele está mais magro do que da última vez que o vi, seu terno
não é tão justo quanto costuma ser. Sua pele está mais pálida e há
crostas de acne espalhadas por seu rosto.
A metanfetamina está afetando ele. Seu corpo está se deteriorando.
Olhos penetrantes me fixam do outro lado da sala. Sempre foi a
qualidade mais assustadora de Billy. Não importa a enorme cicatriz em
seu rosto envelhecido, ou a natureza intimidadora com que Billy se
comporta. Sempre foram seus olhos. Frios, escuros e sem vida. Mesmo a
metanfetamina não pode ofuscar a escuridão daqueles olhos.
— Eu sempre estou. − sussurro, tirando minhas pernas do cobertor e
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me levantando. Graças a Deus vesti uma calça de moletom e uma


camiseta. Billy teria grande prazer em molestar meu corpo com os olhos
se eu estivesse usando algo remotamente revelador.
Meu bicho-papão pessoal enfia as mãos na calça preta e me encara
com uma expressão distante. Arrepios percorrem minha espinha, apesar
do calor da casa. Se eu corresse agora, Billy me perseguiria. Eu posso
conhecer esta casa melhor que ele, mas ele tem muito mais experiência
como o gato caçando o rato. Ele iria me pegar eventualmente.
— O que você está fazendo aqui, Billy? − pergunto, engolindo
nervosamente. Ele dá mais um passo à frente. Meus olhos olham para a
porta do hall de entrada. Eu não consigo mais recuar com o sofá
pressionado contra minhas pernas.
— Não se faça de idiota, River. Você sabe exatamente por que estou
aqui. − ele resmunga baixinho.
Meu coração para. Onde diabos está o meu celular? Provavelmente
entre as almofadas do sofá. Em nenhum lugar que seja facilmente
acessível. E definitivamente não em um lugar onde eu pudesse enfiá-lo
no bolso. Billy está me observando como um falcão, esperando que eu
me mova de uma maneira que ele não gosta antes de atacar.
— O que a Barbie disse para você?
— Você sabe que estou magoado. − ele interrompe antes que as
palavras mal terminem de sair da minha boca. — Eu criei você, River.
Vi você crescer e se tornar uma jovem mulher. Ensinei para você muitas
lições de vida. Achei que tínhamos um vínculo. − Meu coração acelera
quando ele se aproxima. Cada vez mais perto, até que um monstro está
bem na minha frente.
Seus olhos se estreitam, o único sinal de que Billy está com raiva.
Não sei se ele está usando metanfetamina agora ou não, mas Billy pode
ser muito bom em se esconder quando está drogado, se precisar. Sempre
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profissional. Assim como Ryan, ele sempre se preocupou com sua


reputação e imagem com as pessoas. Ele nunca superaria isso se
parecesse com algum viciado das ruas.
— Billy, eu não sei o que a Barbie disse... − O tapa alto soa em meu
ouvido antes que a sensação de queimação se instale completamente. Eu
fecho meus olhos enquanto o fogo finalmente alcança, colocando os
nervos em meu rosto em chamas. Fecho meus dentes, aprendendo minha
lição de não falar.
— Não minta para mim. − ele diz, deixando a máscara em branco
cair por alguns segundos terríveis, antes de colocar a máscara mais uma
vez. A mudança - passando rapidamente de uma pessoa para outra - é
perturbadora de assistir. Calma e controlada em um segundo, para raiva
furiosa em outro, e depois de volta à calma, como se eu tivesse
alucinado a raiva.
Eu não falo de novo, não confiando nas palavras certas para sair da
minha boca. Não há palavras certas. Ele está com raiva e não importa o
que eu diga. Aos olhos dele, não há desculpa para o fato de eu tê-lo
entregado para a polícia. Para um detetive.
— Você percebe quanto dinheiro vai custar para limpar meu nome?
− ele pergunta, inclinando o corpo para baixo na altura dos meus olhos.
Seu hálito cheira a menta, com o cheiro forte invadindo meus sentidos.
Billy sempre gostou de mascar chiclete. Ele disse que não pareceria
profissional matar alguém com mau hálito.
Balanço a cabeça uma vez, pressionando os lábios em uma linha
firme e inexpressiva. Sua mão levanta, me assustando quando ele agarra
um pouco de cabelo e puxa meu rosto para o dele. Eu pulo, com um
grito escapando da minha garganta. Olhos sem vida encaram olhos
arregalados cheios de terror.
— Você me traiu, River. Seu próprio pai.
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Um suspiro se aloja na minha garganta. Meu corpo paralisa e meus


olhos se fecham. Da dor. Negação. Raiva absoluta.
Eu me convenci de que Barbie estava mentindo para mim, só para
me machucar ainda mais. Torcendo a faca que já estava cravada em meu
coração quando Mako descobriu que eu estava mentindo para ele. Eu me
recusei a realmente considerar o que ela estava dizendo. Eu me recuso,
me recuso, me recuso.
— Você está mentindo. − digo com os dentes rangendo, meu corpo
retomando sua luta dez vezes. A raiva ardente me consome. Não tem
como Billy ser a porra do meu pai. — Meu pai poderia ser qualquer um.
A risada sombria de Billy atinge meus ouvidos e desliza para dentro
da minha alma, quebrando-a um pouco mais.
— Fiz um teste de paternidade quando você nasceu. − ele admite,
encolhendo os ombros como se não estivesse destruindo minha vida no
momento. Lágrimas ardem em minhas retinas, com essas palavras
provocando uma resposta em mim que não consigo descrever. Barbie
nunca poderia me dizer quem era meu pai - pelo menos é o que ela
sempre me levou a acreditar. Sempre que eu perguntava, ela zombava de
mim e perguntava com quantos clientes ela fodia em uma semana. Eu
nunca poderia dar a ela uma resposta.
— Não me pareço em nada com você. − eu argumento, um último
esforço para pegá-lo em uma mentira.
Ele sorri sarcasticamente. — Você tem razão. Mas você herdou os
olhos da minha mãe. − Meus olhos se estreitam, ainda não prontos para
acreditar nele.
— Você se parece tanto com a Barbie quando tinha sua idade.
Linda. Mas esses olhos são exatamente como os da minha mãe. Sempre
cheio de fogo intenso. E sabe de uma coisa? − ele faz uma pausa,
esperando minha resposta.
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— O quê? − gritei.
— Eu odiava minha mãe.
Nunca na minha vida pensei que estaria sentado aqui consolando
minha mãe enquanto enterrávamos seu filho - meu irmão. Não que eu
pudesse tecnicamente chamá-lo assim. Ele nunca foi muito irmão e mais
um abusador. Isso é o que ele era para muitas pessoas.
A cabeça de mamãe está apoiada em meus ombros, chorando com
seus olhos azuis tristes enquanto baixamos o caixão de Ryan no chão em
uma manhã fria de sábado. Um caixão vazio. Papai está do outro lado
dela, mal se segurando enquanto abraça sua esposa do outro lado, com
seu braço firmemente em volta de sua cintura fina. Eu estou me
controlando para não levantar meu braço para trás e bater nele. Não
importa que eu odiasse Ryan, isso não muda o fato de que ele estuprou
um garoto por sabe-se lá quantos anos. Ele realmente parou?
Isso é algo que nunca saberei.
Ainda não contei à mamãe a verdade sobre ele. Eu tentei, mas foi
tão difícil de fazer enquanto ela estava de luto pela morte de seu filho.
Estou com medo de ver como ela reagirá quando tiver que chorar pelo
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marido também.
Como muitas pessoas se preocupam com Ryan, mamãe e papai
insistiram em um funeral particular. Apenas família mais próxima, com
a óbvia inclusão de sua namorada.
Ela não está aqui, no entanto. Não tenho certeza se é porque ela
achava que não conseguiria manter a pretensão de sofrer por um homem
que a machucou de tantas maneiras, ou se ela não veio porque não
queria me enfrentar. De qualquer maneira, mamãe e papai estão
chateados por ela não ter vindo, sem uma palavra sobre o motivo.
E eu? Eu só estou puto pra caralho.
Parte de mim não sente que tenho o direito de estar com raiva. Ryan
fez uma merda bem fodida com ela, e se ela não quer aparecer no funeral
dele, então ela não deveria. Talvez eu só esteja com raiva porque isso me
daria uma desculpa para vê-la. Falar com ela. Mesmo que fosse apenas
uma interação cheia de raiva, teria acalmado algo em minha alma vê-la
novamente.
— Nenhuma mãe deveria ter que enterrar seu filho. − Mamãe
sussurra ao meu lado, enxugando o nariz com o lenço delicadamente.
— Eu sei, mãe. − sussurro também, sentindo um milhão de tons
diferentes de culpa quando sou eu quem ajudou a colocá-lo no chão – ou
melhor, em um monte de estômagos de porcos. Não me sinto culpado
por isso ter acontecido, sinto-me culpado por minha mãe ser quem está
sofrendo por isso.
O padre faz algumas orações. Mamãe dá um passo à frente, com o
ursinho de pelúcia de infância de Ryan em sua mão. Supostamente,
quando ele era um bebê, ele nunca largou aquela coisa. Era seu consolo
quando estava com medo, segurando o ursinho de pelúcia com as mãos
minúsculas, convencido de que isso o manteria seguro. Mamãe decidiu
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enterrá-lo em seu caixão na esperança de que ele encontre conforto no


urso mesmo na morte.
Ela joga o urso, agacha-se e com um soluço de partir o coração e
joga o primeiro punhado de terra no caixão. Papai caminha lentamente
para se juntar a ela, agarrando a terra como se isso o tivesse prejudicado
particularmente, com as juntas dos dedos sangrando até ficarem brancas,
antes de jogar o punhado no caixão também. Eles me pediram para fazer
a pequena tradição também, mas eu recusei. Acho que já tenho carma
ruim o suficiente acumulado, não há necessidade de fingir que me
importo tanto.
Eles voltam para o meu lado enquanto a terra começa a se acumular,
com pá sobre pá.
— Onde você acha que ela está? − Mamãe pergunta baixinho ao
meu lado, com suas lágrimas ainda caindo.
Suspiro, sem saber como responder. — Pelo que sei sobre ela, ela
não está acostumada com essa coisa de família. Não acho que ela seja o
tipo de pessoa que encontra consolo em outras pessoas. Ela
provavelmente só precisava ficar sozinha hoje, mãe.
Mamãe assente, aceitando a resposta. Sempre a pessoa mais
bondosa, nunca julgando os outros. — Todo mundo sofre de maneiras
diferentes. − ela diz. — Espero que ela saiba que sempre pode encontrar
uma família em nós.
Meu coração aperta, por razões que nem consigo citar. Não sei dizer
se dói que ela seja incluída na família como namorada de Ryan, e não
minha. Como mamãe reagiria a isso? River e eu nos apaixonando? Às
vezes é difícil dizer para ela. Ela é compreensiva, mas também nunca
lidou com a morte de um filho antes. Ela poderia reagir de maneiras que
nenhum de nós esperaria.
Não que isso importe muito mais, de qualquer forma. River mentiu
para mim várias vezes por vários meses. Entendo que não estávamos
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nos melhores termos - sem minha culpa - mas ela não conseguiu abrir a
maldita boca em nenhum momento enquanto eu a ajudava a encobrir o
assassinato do meu irmão?
Porra, ela até tentou obter a resposta de Ryan antes de matá-lo, já
sabendo a resposta por si mesma. E ela ainda manteve a boca fechada.
Isso dói. Dói que ela soubesse o quanto eu queria resolver este caso, o
quanto isso estava me afetando, e ela não se importava o suficiente
comigo para acabar com meu sofrimento.
Sou um ótimo detetive, eu sei disso. Estou prestes a ser promovido a
sargento, pelo amor de Deus. Cada detetive tem o seu. O único
criminoso que deu a eles um inferno absoluto para pegar. Ghost Killer
era o meu, e nenhuma parte de mim teria se envergonhado se River
revelasse suas suspeitas para mim.
A única coisa que me irrita mais do que River mentindo para mim é
o fato de que o Ghost Killer estava bem debaixo do meu nariz o tempo
todo, tentando foder com a investigação de qualquer maneira que
pudesse. Depois que sua história começou a mudar, parei de confiar
nele. Parei de ouvir. O uso prolongado de metanfetamina fode com sua
memória e não é estranho Billy provar seu próprio produto. Começou
com apenas alguns pequenos detalhes que mudaram e, eventualmente,
alguns detalhes importantes.
Isso me faz pensar o que teria acontecido com a investigação se
Billy tivesse vindo até mim como um homem sóbrio. Detesto admitir
que ele provavelmente teria conseguido foder com o meu caso. Eu não o
estaria perseguindo por tanto tempo se ele não fosse um homem
inteligente. Acho que posso ser grato pela metanfetamina se isso
significar que tenho um assassino frio começando a cometer erros.
O fogo dentro de mim está forte desde o momento em que vi
Benedict Davis no celular de River, olhando para a câmera com olhos
frios e sem vida e uma expressão que melhor se adequaria aos seus
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pesadelos. E aquelas cicatrizes. Aquelas malditas cicatrizes. Fiquei


tentado a perguntar a Benedict como ele as conseguiu ao interrogá-lo,
mas sempre mantive minha boca fechada. Agora, tudo que quero fazer é
dar a ele novas. As chamas estão sendo alimentadas, com as madeiras
jogadas no inferno agora que Benedict - ou Billy - está desaparecido.
Agora que sei quem é o Ghost Killer, ele não tem chance de escapar
de mim agora.

Coloquei mamãe na cama apenas uma hora atrás, quando meu


celular começou a tocar no meu bolso. Eu o ignoro por enquanto, mais
focado em garantir que minha mãe perturbada esteja bem. Não dou a
mínima para como o papai está se sentindo. Mas o som é insistente e
logo papai está me chamando para atender o celular. Eu obedeço apenas
pelo fato de me afastar dele.
Com um suspiro, atendo: — Mako.
— Mako? Ah meu Deus, Mako. Graças a Deus.
Minha testa franze, não reconhecendo a voz ao telefone.
— Quem é?
— É Amelia, a melhor amiga de River.
Meu coração para e tudo ao meu redor paralisa. Se a amiga de River
está me ligando, isso significa que algo aconteceu. Algo ruim.
— Onde está River? − pergunto, com meu tom mordaz.
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— Essa é a maldita coisa, eu não sei! Eu estava na casa dela ontem,


e enquanto ela estava presa no sofá chorando, ela estava bem. E então
eu volto hoje para deixar um pouco de comida caseira e a casa está uma
bagunça! Ela sumiu, Mako, ela sumiu e eu sei que foi o Billy. Sei que
ele a levou, porra!
Ao final de suas palavras, ela está histérica e eu estou tremendo de...
porra, de tantas coisas. Fúria potente está correndo em minhas veias.
Aquele filho da puta levou minha garota, e agora não há esperança de
que eu traga Billy vivo de volta. No segundo em que eu colocar minhas
mãos em volta do pescoço daquele idiota... Não consigo pensar nisso
agora, preciso me concentrar em encontrar River.
— Estou indo para a casa dela agora. Fique aí.
Desligo o celular e saio correndo de casa, com as perguntas
preocupadas de papai me perseguindo. Não tenho espaço cerebral para
ouvi-las, muito menos dar uma resposta concreta.
Estou saindo da garagem e acelerando em direção à casa de Ryan,
ligando minhas sirenes para chegar mais rápido. Ryan morava a cerca de
quinze minutos de distância de nossos pais. Eu chego lá em cinco.
Colocando a marcha em ponto morto, nem me preocupo em desligar
o motor antes de quase tropeçar para fora do carro e entrar na casa de
Ryan. Amelia está na sala de estar, andando fazendo um buraco no
carpete com lágrimas quentes escorrendo por seu rosto. Amelia grita de
alívio e então se atira sobre mim e abraça minha barriga, chorando em
meu peito.
O choque me deixa indefeso, os meus braços estão abertos com
constrangimento por um momento antes de meu cérebro entender.
Relaxo meus braços e os envolvo frouxamente em torno de suas costas,
ouvindo suas palavras distorcidas enquanto olho ansiosamente ao redor
da casa, procurando por qualquer sinal do que aconteceu com River.
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— Preciso que me diga qualquer coisa que sabe. River mencionou


alguma coisa da última vez que vocês conversaram? Ela parecia
assustada ou expressou alguma preocupação de que Billy estava vindo
atrás dela? Qualquer coisa?
Amelia dá um passo para trás e coloca as mãos na barriga de
gravidez. Seu rímel está borrado na minha camiseta branca, mas não dou
a mínima.
— Ela não disse as palavras, mas sim, estava apavorada. Tivemos
uma breve conversa sobre isso. Eu pedi a ela para vir morar comigo e
ela quase mordeu minha cabeça por sugerir isso, sabendo que isso
colocaria eu e meu bebê em perigo. Perguntei se as câmeras estavam
funcionando e ela disse que sim. Foi mais ou menos isso.
Soluços escapam de sua garganta e destroem seu corpo mais uma
vez. Ela deixa cair a cabeça nas mãos, cobrindo o rosto. Minhas próprias
mãos passam pelo meu cabelo, puxando até que a dor aguda rivalize
com a dor no meu peito. Eu não consigo respirar.
River sabia que Billy viria buscá-la.
Porra, fui muito egoísta e estava fervendo em minha própria raiva
para perceber isso. Eu deveria saber, porra. Eu deveria saber que Billy
não deixaria a revelação de Barbie e River impune. O homem é viciado
em metanfetamina e paranoico que todos os seus homens o estão traindo
em dias normais.
Porra!
Essa é a razão pela qual o Ghost Killer surgiu. Sua paranoia. Sua
total convicção de que ninguém é confiável.
Juro por Deus, se eu encontrar River assassinada com aquela
maldita palavra esculpida em seu peito...
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— O que nós vamos fazer? − Amelia chora, afastando-me de meus


pensamentos violentos e muito inúteis.
Já começo a vasculhar cuidadosamente a casa. Olhando para a única
evidência que tenho. Respingos de sangue estão no tapete, não o
bastante para ser fatal, mas o suficiente para parar meu coração no peito.
Um cobertor de lã está jogado no chão, com fios de cabelo preto
encaracolado em cima dele. Pode ter sido de queda natural, mas tenho a
sensação de que é de Billy puxando-a pelos cabelos.
Quanto mais vejo, mais a névoa vermelha na minha visão se
intensifica. Mais sangue no chão da sala de jantar, desta vez em rastros,
como se um corpo fosse arrastado pelo sangue. Ele a fez sangrar de
alguma forma, esperançosamente de um nariz sangrando ao invés de
algo mais brutal como ser esfaqueada ou cortada. Então ele a arrastou
para a sala de jantar, mais do que provavelmente por seu cabelo baseado
em mais alguns fios presos no sangue. Metade de uma pegada está
marcada no chão, provavelmente por ela chutar.
O sangue é consistente por toda a cozinha e sai pela porta dos
fundos. O último prego no caixão é a pequena marca de mão
ensanguentada na janela, do tamanho das mãos de River. Amelia chora
mais quando vê a marca da mão, com nós dois imaginando vividamente
a tentativa desesperada de River de fugir de Billy.
Com base nos rastros de sangue, mais algumas pegadas e
impressões digitais, River deixou todas as evidências de que ela foi
levada à força.
Minha garota não foi embora sem lutar, com certeza.
— O que você sabe sobre Billy?
— Na... nada realmente. River ficava de boca fechada quando se
tratava dele. Ela disse que quanto menos eu soubesse sobre ele, mais
segura eu estaria.
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Eu resmungo de frustração, invadindo o escritório de Ryan, onde


está seu monitor. Já foi analisado pela polícia em busca de qualquer
evidência, mas tudo que foi encontrado foram informações relacionadas
ao trabalho.
Sento-me na cadeira do escritório e abro a câmera de segurança.
Amelia se encolhe atrás de mim, espiando por cima do meu ombro
enquanto eu retrocedo as câmeras. Uma sensação pesada de mal-estar se
instala dentro do meu peito. Preciso ver isso, mas já sei que posso abrir
um buraco no monitor assim que vir Billy encostar um único dedo nela.
Com base no nervosismo que emana de Amelia atrás de mim, tenho
certeza de que ela não está se sentindo muito diferente de mim.
Com a orientação de Amelia desde quando ela saiu de casa, a
transmissão voltou para cerca das dez horas da noite passada, apenas
algumas horas depois que Amelia saiu. River está encolhida como uma
bola, dormindo no sofá, com seu cabelo preto espalhado no sofá. Em seu
sono, ela parece tão inocente. Seu rosto suavizou, quase fazendo-a
parecer uma adolescente.
E então seus olhos se abrem abruptamente, como se ela tivesse
ouvido um barulho. Ela se senta lentamente, apoiada em um braço
enquanto olha ao redor da sala, com a única fonte de luz sendo a TV.
Demora alguns minutos, mas do canto da câmera - bem onde fica a
entrada da sala de jantar - Billy sai das sombras.
Minhas mãos ficam úmidas vendo River se levantar, tropeçando no
cobertor de lã entre as pernas. Não consigo ouvir o que eles estão
dizendo, mas o terror de River é tão potente que posso senti-lo através
da câmera. A adrenalina corre em minhas veias, inundando os meus
ouvidos enquanto vejo Billy se aproximar dela. River pressiona as
pernas no sofá, com os olhos redondos e arregalados enquanto trocam
palavras. Meus dedos se contorcem com a necessidade de estender a
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mão e tocá-la. Salvá-la.


Billy levanta a mão e dá um tapa no rosto dela, com a interação se
tornando mais acalorada. Eu quase entro pela tela, desesperado para tirar
Billy de perto dela e esmagá-lo com meu punho.
Há um momento de pausa, onde ambos se olham, avaliando-se. E
então River corre, correndo para a esquerda em direção à porta da frente.
Billy espera o movimento, segurando-a pela cintura antes de jogá-la de
volta no sofá. River não para para absorver o impacto no sofá, correndo
imediatamente em direção à sala de jantar. Mas Billy está bem ali,
pegando-a novamente.
Ela luta e reage enquanto me sento na ponta da cadeira em suspense.
Eu sei como termina, mas ainda estou esperando que ela escape dele de
qualquer maneira. O rosto de Amelia se aproxima da tela, com sua
bochecha quase pressionada contra a minha. Ela treme assim como eu,
odiando cada segundo de ver sua melhor amiga sendo sequestrada, mas
não consegue desgrudar os olhos da cena.
A boca de River se abre e, embora eu não consiga ouvir, sinto o
grito que ela solta. Tão alto que seu corpo treme com isso. Billy fecha o
punho e dá um soco no rosto dela, uma, duas, três vezes antes que o
corpo de River comece a ficar mole. Sangue escorre de seu nariz.
Billy arrasta seu corpo lutador para fora da sala de estar, passando
pela sala de jantar e indo para a cozinha. Eu mudo as imagens da câmera
enquanto ele a arrasta pela casa, com meu coração batendo forte quando
Billy se aproxima da porta que leva para fora. Depois que eles passarem
por aquela porta, não poderei mais vê-la.
Uma lágrima cai na minha mão quando o resto do corpo de River
desaparece pela porta. Ela se foi. E não sinto nada além de raiva e
desolação.
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Amelia funga, com outra lágrima escorrendo de seu rosto e caindo


na minha mão. Eu não afasto minha mão, nem tento confortá-la. Em
vez disso, deixei as lágrimas da melhor amiga de River penetrarem em
mim, impulsionando minha raiva. River tem pelo menos duas pessoas
em sua vida que morreriam um pouco por dentro se ela morresse. Parte
da minha alma e da alma de Amelia seria enterrada no chão ao lado do
corpo de River.
— Você tem alguma ideia de onde ele poderia tê-la levado? −
pergunto baixinho, com minha voz rouca de emoção.
Ela funga novamente, limpando o nariz. — Eu não faço ideia. Pelo
que sei, Billy não contou muito a River sobre seus negócios com drogas
e, mesmo que contasse, ela não teria me contado nada. Se Billy
descobrisse que eu sabia de alguma coisa, ele teria me matado.
Aceno com a cabeça, já chegando à mesma conclusão. Eu me perco
em pensamentos, olhando para o monitor mais uma vez, tentando
encontrar algo para começar. Qualquer coisa.
— Você a ama? − A pergunta suave de Amelia corta a minha
concentração como uma faca quente. A pergunta dela dói. Porque eu a
amo. E eu a tratei mal, e agora ela se foi. Porra. Ainda estou chateado
com ela por esconder de mim a identidade do Ghost Killer. Mas como
posso culpá-la por estar com medo quando estou assistindo seu
sequestro bem na frente do meu rosto?
— Eu amo. − eu respondo.
Ela acena com a cabeça, como se eu confirmasse algo que ela já
sabia. — Ela ama você também. Acho que ela se apaixonou por você
naquela pista de dança.
Minha cabeça vira para ela, surpreso. Ela está olhando para a tela
desesperadamente. — Ela te disse que fui eu?
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Ela balança a cabeça lentamente. — Eu te reconheci. Mesmo com


minha embriaguez naquela noite, eu me lembrei de ver vocês dois
dançando. Lembro-me de observar o jeito que você olhou para ela. E
reconheci aquele olhar porque o vejo todos os dias quando meu marido
olha para mim. Já vi River dançar com muitos homens até aquele
momento, mas nunca a vi gostar tanto quanto gostava com você. Eu vi
duas almas se conectarem e, embora eu estivesse incrivelmente passando
mal naquele momento, senti muita culpa por afastá-los. Porque sei que
algo especial teria acontecido naquela noite, e é minha culpa que não
aconteceu. E por causa disso, ela correu para os braços de Ryan. Às
vezes também me sinto culpada por isso. Se eu tivesse apenas cuidado
de mim, ela nunca teria namorado aquele monstro.
Outra lágrima escorre de seus olhos. Desta vez, eu enxugo. — Não é
sua culpa, Amelia. Há muitas coisas que eu faria diferente naquela noite.
A primeira seria obter o número de telefone dela.
Um sorriso triste se abre em seu rosto. — Ela não falou muito sobre
você. Eu perguntei a ela uma vez, e o olhar em seu rosto disse tudo. Ela
foi atormentada por você. Ela admitiu que se recusou a olhar para o seu
rosto. E quando perguntei por que, ela disse que não queria que seu rosto
a assombrasse todas as noites, assim como as suas mãos fazem. Ela se
fechou depois disso e eu não forcei.
Ela faz uma pausa e parece que está lutando com algo que quer
dizer. — Ela me contou o que aconteceu entre vocês dois. Eu entendo
porque você está bravo. Eu realmente entendo. Mas isso aqui é o motivo
pelo qual ela não te contou. Espero que você possa perdoá-la.
— Eu já perdoei. − sussurro.
As emoções se acumulam dentro de mim. Eu viro meu rosto de
volta para a tela e assisto mais uma vez enquanto o amor da minha vida
é levado embora. De mim. Da Amelia. De sua vida.
— Acho que precisamos fazer uma visita à mãe dela.
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O latejar incessante em meu crânio é o que me tira da escuridão
abismal em que me perdi. Era confortável lá. Eu não sentia nada.
Fisicamente ou emocionalmente. E agora sinto tudo. Pontadas agudas de
dor surgem na minha cabeça e, se não fosse pelo fato de eu ter acordado
assim algumas vezes na minha vida e ter fortes instintos de
sobrevivência, eu gemeria alto de dor.
Em vez disso, mantenho meu rosto inexpressivo apesar da dor e
deixo o que está ao meu redor entrar. Está completamente silencioso.
Nenhum arrastar de pés ou farfalhar de roupas. Sem respiração.
Quando me sinto confiante de que estou sozinha, abro os olhos
lentamente. Desta vez, deixo escapar um pequeno gemido quando a dor
se intensifica.
Olho para o teto de cimento acima de mim, sem me preocupar em
olhar em volta até que minha memória se atualize. Tudo começa a voltar
para mim em imagens rápidas e borradas. Eu estava sozinha em casa.
Amelia tinha ido embora por algumas horas quando Billy veio me
buscar. Nós lutamos - ou pelo menos eu - até que ele me arrastou para
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fora de casa, para o carro e me jogou no porta-malas. A última coisa de


que me lembro é do punho de Billy vindo em direção ao meu rosto
antes de eu desmaiar.
Merda. Isso não é bom. Não tenho ideia de onde ele poderia ter me
levado. E se eu não sei, ninguém mais saberá.
A fria percepção de que estou bem e verdadeiramente sozinha se
instala. Sempre estive sozinha. Ninguém nunca me salvou antes.
E ninguém com certeza vai me salvar agora.
Mako não saberia o primeiro lugar onde me procurar. E mesmo que
Barbie soubesse, ela não se importaria o suficiente comigo para arriscar
sua vida e contar a alguém. Não quando se trata de Billy.
Agora aproveito para olhar em volta. Estou em um porão. Velho e
decrépito, com teias de aranha espalhadas por todos os cantos,
acompanhadas por esse cheiro antigo e almiscarado. Este porão
definitivamente viu uma inundação ou dez em seus anos. Vigas de
madeira expostas cruzam o conceito aberto do porão com uma lâmpada
exposta no centro do lugar, brilhando forte e brilhando fracamente. E,
claro, há apenas uma rota de fuga - os degraus frágeis que levam a uma
porta trancada com cadeado.
Além de mim e meus demônios, uma única cadeira de madeira e o
fino colchão de algodão em que estou deitada, não há mais nada aqui
embaixo.
Nem mesmo câmeras, o que me surpreende. A velha escola de
Billy, mas não o suficiente para não acompanhar os tempos. Ele é ótimo
em vigilância. Sua paranoia nunca permitiria que ele não ficasse de olho
em todos seus negócios o tempo todo. Talvez haja um de seus capangas
do lado de fora da porta no andar de cima. Se sobrou algum.
Trazer-me aqui não foi premeditado. Ele escolheu este lugar no
último minuto. Talvez ele até tenha decidido me sequestrar no último
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minuto.
Eu me afundo mais no colchão até ter certeza de que posso sentir o
chão frio penetrando em minhas omoplatas e espero que Billy apareça.
O tempo torna-se diluído. Caí em um sono inquieto quando ouço a
batida de uma porta. Meu corpo acorda de repente. Mal consigo me
impedir de ficar ereta. Se Billy não me matar primeiro, o ataque de dor
de fazer algo assim certamente o faria.
Abro minhas pálpebras, apenas para encontrar uma luz suave.
Mesmo com a suavidade do brilho, ele envia pontadas de dor na minha
cabeça.
— Você está acordada. − ele diz friamente. A escada de madeira
range sob seu peso. Cada rangido se irradia por todo o meu crânio,
seguido por uma dor penetrante tão aguda que tenho certeza de que meu
cérebro está se despedaçando. O filho da puta me deu uma concussão.
— Não me diga. − murmuro, com minha garganta seca e ardendo de
desidratação. No momento em que as palavras saem da minha boca, eu
me preparo para seu punho. Billy nunca gostou quando eu respondi.
— Cuidado. − ele surta. Felizmente, ele mantém as mãos para si
mesmo neste momento. Quando reúno coragem para olhar para ele, ele
está de pé sobre mim, com as pernas abertas e as mãos nos bolsos. Com
o rosto impassível e bem vestido como sempre, como se estivesse
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acostumado a sequestrar garotas em um terno Armani de três peças.


Isso mesmo. Ele está.
— O que vai fazer comigo? − pergunto com um suspiro resignado.
Não é que a perspectiva de como Billy vai me matar não me apavore
absolutamente, é que me resignei a esse destino há muito tempo e, agora
que está aqui, é quase um alívio. Não preciso mais olhar por cima do
ombro, esperando não ver o diabo parado atrás de mim.
Eu me cansei e estou farta desta vida. Não estou totalmente triste
por estar sendo interrompida.
— Ainda não decidi. − ele murmura, quase para si mesmo. Ele
suspira, pega a cadeira de madeira bem na minha frente e se senta, com a
madeira frágil rangendo perigosamente sob seu peso. Odeio recuar
quando ele leva a mão ao meu rosto, afastando uma mecha de cabelo dos
meus olhos. Ele pega o cacho errante e o puxa até que fique reto. Seus
olhos percorrem a mecha, fascinados com meus cachos naturais.
Billy sempre amou meu cabelo cacheado.
— Sabe por que sempre adorei seu cabelo? − ele pergunta, captando
meus pensamentos.
Eu realmente não me importo por quê. Mas prefiro que Billy fale
comigo em vez de ele me torturar ou me estuprar.
— Por quê? − resmungo, estremecendo com a secura na minha
garganta. Ele não faz um movimento para resolver o meu problema.
— Seu cabelo sempre foi um símbolo de sua tenacidade. Você se
recupera. Não importava o que eu fazia com você. Eu a pressionei e, por
mais que fizesse, você sempre se recuperava. Foi fascinante ver você
crescer. Isso me fez querer me esforçar mais para quebrá-la, mas nunca
consegui.
Não conseguiu, não é? Eu quase discuto esse ponto. Suponho que a
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versão de Billy de quebrar alguém está levando-os ao ponto em que eles


se matam. Recusei-me a me matar, embora sempre tenha pensado na
ideia como se estivesse decidindo o que vou comer no jantar.
Eu não digo nada. Tenho certeza de que o psicopata espera que eu
me sinta elogiada e agradeça, mas posso cuspir nele se abrir a boca.
Ele suspira e deixa cair o cacho como se fosse carvão em brasa,
aparentemente desapontado com minha falta de resposta. Um narcisista
não gosta que seus elogios não sejam apreciados. Sua mão levanta
novamente para o meu rosto, acariciando a minha pele suavemente.
Arrepios de repulsa percorrem minha espinha e não me preocupo em
esconder a reação.
— Eu deveria ter te matado quando você era jovem. − ele reflete
suavemente.
— Você deveria. − eu concordo.
Ele faz uma pausa e, quando o faz, parece que o mundo também. A
Terra para de girar em seu eixo e, por um momento, o tempo para. Sua
mão estica para meu cabelo no segundo seguinte, me puxando para fora
da cama com força. Um grito assustado sai da minha garganta. O medo
bombeia em minhas veias como veneno enquanto ele me arrasta pelo
chão sujo até o meio da sala. Minha mão envolve seu pulso, desesperada
para me erguer para aliviar a dor aguda que se espalha por todo o meu
couro cabeludo.
— Vadia ingrata. − ele grita, empurrando minha cabeça para longe.
Minha têmpora bate no chão de cimento. Estrelas surgem em minha
visão, deixando rastros de manchas escuras em seu rastro. Meu rosto é
então empurrado para o chão com uma mão enquanto ele arranca minha
calça com a outra.
— O que eu realmente deveria ter feito. − ele começa, com sua
respiração ofegante com o esforço de puxar minha calça pelas minhas
pernas chutando. — Era empurrar sua mãe escada abaixo quando a
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engravidei de você.
— É? − grito, com a histeria começando a possuir meu corpo. —
Queria que você também tivesse feito isso, Billy! Eu gostaria que você
também tivesse. Pelo menos eu nunca teria conhecido um homem vil e
patético como você!
— Cale-se! − ele grita, parando seu objetivo para me dar um soco
na parte de trás da cabeça. Estrelas surgem em meus olhos e, sem minha
permissão, o meu corpo relaxa. Assim que faço isso, Billy finalmente
abaixa minha calça. O frio atinge minha bunda, e algo sobre esse
sentimento faz minha pele arrepiar. Era sempre quando eu sabia que ia
ficar feio enquanto crescia. Uma vez senti minha calça escorregar pelas
minhas pernas, minha rede de segurança havia sumido e o que vinha
depois sempre doía.
A luta em mim rejuvenesceu, eu me contorço com força, movendo
para frente e para trás, mas sem sucesso. Seu peso cai em cima de mim,
me prendendo no lugar. Sinto sua ereção pressionando minha bunda nua,
com o zíper esfregando dolorosamente contra minha pele.
Ele enfia a mão entre nossos corpos, rapidamente desabotoando e
abrindo a calça em questão de segundos. Eu ofego quando sinto carne na
carne.
— Você é meu pai e vai me estuprar?! − grito, indignada e
perturbada por sua falta de moral.
Ainda não quero acreditar que ele é meu pai. Mas, no fundo, sei que
Barbie e ele não estão mentindo. Pequenas partes de memórias passam
pela minha cabeça. Barbie cuspindo em mim quando sorri para meu
ursinho de pelúcia velho, dizendo que eu sorria igual ao Billy. Ou
quando empurrei outro garoto por enfiar a mão no meu vestido,
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quebrando a cabeça, seguido por seu comentário sarcástico dizendo que


eu era igual ao meu pai. Comentários que nunca tiveram peso suficiente
na época, mas de repente parecem uma tonelada de tijolos agora.
Outro soco na nuca é a minha resposta. Ele não se importa que eu
seja do sangue dele. Billy me estuprar nunca foi sobre atração ou desejo.
Sempre foi pelo poder. Sobre usar o medo para me manter na linha.
Desta vez não é diferente.
Antes, eu ficava quieta e deixava Billy contaminar o meu corpo.
Quanto mais eu lutava com ele no passado, mais ele me fodia. Mesmo
sabendo disso, não fico quieta dessa vez. Eu não fico parada ou dócil.
Não. A raiva reprimida está explodindo de mim, eviscerando
qualquer aparência de força que eu tenha deixado dentro de mim. Eu
grito quando ele me penetra. E continuo a gritar muito depois que ele
encontra seu orgasmo. Eu grito sem parar até minha garganta doer e a
porta do porão ser trancada atrás dele.
Mesmo quando minha voz falha, o grito continua a ressoar na minha
cabeça até que todos os meus cinco sentidos são consumidos pela minha
dor.

Dias se passam antes que Billy me visite novamente. Comida


embrulhada e uma garrafa de água foram jogadas escada abaixo antes
que a porta batesse atrás dele. Três vezes ao dia nos últimos três dias. Eu
me recusei a tocar em nada disso. Parte de mim ousou, apenas esperando
que ele envenenasse a comida para que eu pudesse deixar minha
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existência miserável desaparecer. Mas esse não é o estilo de Billy. Ele


prefere me deixar sofrer e agonizar, suando com a perspectiva de ele me
assassinar. Tudo o que estou fazendo é antecipar isso.
Deitei de bruços ao lado da cama, com o rosto esmagado contra o
chão frio de cimento. Um fio de baba sai da minha boca, acumulando-se
sob minha bochecha e molhando a pele. Eu não me importo o suficiente
para limpá-la. Não me importo o suficiente para fazer nada. No
momento, ele está me ignorando. Deixando-me apodrecer neste porão
úmido e ficar sozinha com meus pensamentos. O bastardo também sabe
o que está fazendo porque, foda-se, se meus pensamentos não estão
caindo em espiral.
Não quero mais viver.
Eu não quero existir.
Ser.
Se houvesse algo com que me matar neste porão, eu já o teria feito.
E ele sabe disso também. Ele sabe disso e está prolongando a tortura. É
por isso que tirou a cadeira de madeira. Ele deve ter me visto olhando, já
planejando quebrar a cadeira e usar a ponta afiada da madeira para cortar
meus pulsos. Ele foi embora com aquela cadeira na mão.
Tentei quebrar a madeira dos degraus de madeira, mas não tinha
nada para usar e meu corpo estava fraco demais para conseguir uma
lasca.
Qual é o sentido da vida, afinal? Amelia tem sua própria família e,
embora eu saiba que ela me ama muito, ela também pode viver sem
mim.
Há o Mako.
Mas ele me odeia.
Fecho os meus olhos com força. Não consigo manter o ataque de
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memórias surgindo em minha mente, apesar de minhas tentativas


desesperadas de afastá-las da minha cabeça. Imagens de Mako surgem
em meus pensamentos como uma apresentação de slides. De seu sorriso.
Sua expressão determinada sempre que tentava colocar algum sentido
em mim. Seu sorriso sexy quando eu disse ou fiz algo que ele gostou. E
sua aceitação quando contei a ele sobre meu passado sórdido.
Ele fez muito por mim. Desistiu de tanta coisa. Arriscou tudo por
mim. E eu não podia abrir minha boca e dar a ele uma informação que
poderia ter mudado tudo. Ele poderia ter pego Billy, e eu nunca estaria
nessa situação estúpida. Mais uma vez, eu me encontrei aqui.
Eu fui muito egoísta. Muito fraca. Muito assustada. Tudo o que
pude considerar é que Billy viria atrás de mim se eu delatasse.
Olha onde isso te levou, vadia burra.
Eu poderia rir da ironia.
Um feixe de luz brilha em meu corpo antes que eu ouça o rangido
dos degraus de madeira sob seu peso. Eu fecho minhas pálpebras, muito
cansada e fraca para levantar a mão para bloquear a luz. Cada passo
parece uma batida do meu coração.
— Você parece patética. − ele zomba, com seus elegantes sapatos
pretos aparecendo no meu campo de visão. Eu não me mexo, esperando,
rezando, ele chuta com aquele sapato apenas uma vez, forte o suficiente
para me nocautear completamente. Quando isso acabar, ele pode
continuar chutando pouco me importa.
Seu sapato pode acabar com minha vida como ele faz com seus
cigarros.
— Eu sou patética. − eu corrijo fracamente, lambendo meus lábios
para parar o fluxo de baba.
— Sem nenhuma luta? Sem vontade de viver? Que chato. − Um
pouco de cuspe cai na minha bochecha. Eu me movo, fazendo com que
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cada dor em meu corpo ganhe vida.


Viu, é por isso que fiquei parada. O cimento amorteceu minha dor
enquanto eu não me mexesse.
Com um golpe raivoso, tiro o cuspe da minha bochecha. Idiota.
— Prefiro não trocar doenças contigo. − murmuro sarcasticamente.
Ele ri. Dá risada das minhas palavras. Da minha raiva. Tudo sobre esta
situação é engraçado para ele.
— Ryan estava certo sobre você. Você é tão fácil de chutar, é chato.
− A respiração em meus pulmões paralisa.
— O que você disse? − sussurro.
— Nós nos tornamos bons amigos, ele e eu. Ele estava praticamente
espumando pela boca para ter um traficante na discagem rápida. Tão
desesperado, na verdade, que fez um acordo comigo. Ele queria meus
contatos. O garotinho queria brincar com os garotos grandes e começar a
enfiar as mãos nos meus negócios. E adivinhe qual era a garantia dele? −
ele se inclina para mais perto. — Você. − ele murmura.
Um soluço sai da minha garganta. Suas palavras, sua verdade, isso
dói. Eu sempre fui dispensável para Ryan. Ele faria outra armadilha para
uma garota em pouco tempo, uma vez que eu fosse embora.
— Ele estava disposto a trocá-la pelo Ghost Killer se isso
significasse subir na vida. Fiquei muito feliz em atender. − Uma risada
maligna escapa de sua garganta. — Sabe qual é a melhor parte? Ele não
sabia que eu já possuo você.
Seu pé chuta, mas não onde preciso. Aterrissa bem nas minhas
costelas, enviando ondas de choque de dor por todo o meu corpo. Eu
rolo com o chute, com meus braços pendendo desleixadamente, como se
ele tivesse acabado de vomitar sobre uma pessoa bêbada.
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O rosto do meu atormentador aparece acima de mim, olhando com


desdém para mim como se eu fosse um lixo. — Pode me diferenciar do
resto da sujeira no chão, ou eu me misturo? − eu acrescento um pequeno
sorriso para uma precaução extra. Nesta posição, seu pé vai bater na
minha têmpora e me nocautear mais rápido.
Seus lábios se curvam e, por um segundo, imagino o seu pé
levantando e descendo sobre mim, enchendo minha visão de escuridão.
Isso não importa. Ele apenas balança a cabeça para mim e suspira
lamentavelmente. Esse som me deixa com mais raiva do que qualquer
coisa. Pena. Ele poderia ter dito ou feito qualquer outra coisa para mim e
eu não teria pestanejado. Mas pena faz minha pele arrepiar.
Eu grito. — O que diabos está esperando, velhote? Não causou uma
impressão grande o suficiente espalhando seus pequenos fantasmas por
aí, então você tem que vir pegar no pé de sua filha? − digo a palavra
para ele com todo o desgosto que posso reunir.
Ele sorri para mim. — Você sempre foi a filhinha do papai.
O tempo para, apenas por um momento enquanto as palavras me
percorrem. E então eu estou de pé, gritando e arranhando-o com
movimentos inexperientes. Mas não me importo. A raiva incandescente
domina meus sentidos até que eu seja apenas raiva.
Eu o odeio. Eu o odeio tanto. É tudo o que posso sentir. O ódio
crescendo dentro de mim como um tumor, tão profundo que seria
impossível cortar sem me sangrar até secar.
Sua risada surge, mesmo quando as minhas unhas fazem contato e
arranham sua pele seca. Até tem poças de sangue dos arranhões e
escorre pelo rosto e pescoço. Com um tapa, ele me derruba no chão. Eu
bati com força. Meu cóccix sustentando o peso do meu peso antes de
minha cabeça cair em seguida, quicando no chão como uma bola de
borracha.
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Aceito cada pedacinho da dor que segue. Mesmo que me cegue,


tornando-me completamente inválida e inútil, eu a aceito. Eu a recebo
de braços abertos, porra. Se tudo que posso sentir é dor física, talvez não
sinta as típicas garras dilacerando minha mentalidade.
Lágrimas escorrem nas minhas bochechas. Normalmente, eu as
enxugaria antes que elas pudessem pensar em cair. Mostrar fraqueza na
frente de Billy é o mesmo que abrir as pernas para ele de bom grado. De
qualquer forma, ele estará se forçando dentro de você, seja com a dor ou
com o pau. Ou talvez até ambos.
Desta vez, deixei-as cair. Eu simplesmente não me importo mais.
Ouço um barulho de metal por toda a sala e dentro do meu crânio.
Mal consigo levantar a cabeça o suficiente para ver a bandeja de comida.
Uma maçã rolando da bandeja para um canto escuro para se juntar às
aranhas, um sanduíche de presunto, um copo de frutas e uma garrafinha
de água. Nada que exija utensílios, claro. Embora eu suponha que seja
uma refeição bastante nutritiva para uma prisioneira.
— Coma. − ele diz antes de subir as escadas, assobiando uma
música baixa enquanto faz isso.
Por um longo tempo, eu fico olhando para aquela comida. Eu encaro
até que mais lágrimas se formem em meus olhos, embaçando tudo em
uma bolha, e eventualmente até que tudo tome forma novamente e meus
olhos sequem completamente.
Eu não paro de olhar, não por um longo tempo.

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Engoli a comida e a água, me controlando o suficiente para não


passar mal. Fiz o mesmo nas refeições seguintes. Não sei ao certo
quando decidi fugir. Parece que sempre soube que faria isso, mesmo
quando estava me iludindo com a perspectiva da morte. Toda a minha
vida foi governada por este homem. E quando finalmente experimentei a
liberdade, ela foi arrebatada por outro idiota abusivo. Na verdade, nunca
tive muita chance de governar minha própria vida. Forjar meu próprio
caminho. Decidir o meu próprio futuro. Todas essas coisas foram
constantemente tiradas de minhas mãos.
Eu me recusei a deixar Ryan ter o privilégio por mais tempo, prefiro
morrer a eu deixar Billy ter isso também.
O rangido da madeira sob o peso pesado imediatamente deixa meu
coração acelerado. A adrenalina aumenta, deixando as minhas mãos
trêmulas. Billy vai descer para falar com uma garota completamente
diferente daquela que ele deixou três dias atrás. Ele jogava a comida
escada abaixo e batia a porta atrás de si. Três refeições, três rotações.
Três dias. A mesma quantidade de tempo que ele me fez esperar da
última vez. O que significa que estou aqui há pelo menos uma semana.
Estou esperando outro momento com ele, e agora que chegou, não
tenho certeza se estou pronta.
Mas acho que nunca estarei totalmente pronta. Enfrentar Billy é
algo que nunca consegui antes. Sempre que eu tentava, era derrubada e
sempre estava muito fraca - com muito medo - para me levantar e tentar
novamente. No esforço de conservar minha vida, acabei entregando-a a
ele em uma bandeja de prata.
— Você vai me deixar tomar banho? − pergunto calmamente, antes
que ele possa pronunciar uma palavra para mim. Ele olha para mim, com
seu rosto em seu estado normal inexpressivo.
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Ele leva um momento antes de responder. — Você acha que


merece um banho?
Odeio os jogos mentais de Billy. — Sim. − eu respondo com
confiança. Não porque eu tenha sido uma boa menina entre aspas, mas
porque sou um ser humano e mereço direitos básicos como usar a porra
do chuveiro.
Ele sorri com o meu tom. — Você acha? E por quê?
Eu lambo meus lábios, buscando uma nova tática. — Porque eu sou
sua filha.
Sua cabeça se inclina para trás e uma risada barulhenta sai de sua
garganta. O som me irrita, mas forço a tensão a deixar meu corpo. Se eu
explodir com ele com raiva, isso só vai piorar. E eu preciso sair deste
porão.
— Posso assistir? − ele pergunta, com um sorriso bajulador no
rosto.
Com todo o controle que consigo reunir, forço meu rosto a ficar
calmo, encolho os ombros e digo: — Claro.
Claro, pai, você pode me ver tomar banho. Isso não é repulsivo nem
nada.
Seus olhos azuis me percorrem, calculando e brilhando de alegria.
Este é outro jogo para ele, e parece que tive a sorte de pegá-lo de bom
humor. Quando Billy está de bom humor, ele adora jogar.
Ele acena com a cabeça uma vez, com o pequeno sorriso ainda em
seu rosto. — Vamos então. Filha. Página 433

Billy liga a água do chuveiro para mim, ajustando-a até ficar


satisfeito com a temperatura. Não tenho certeza se isso o faz sentir como
se estivesse cuidando de mim, eu realmente não me importo de qualquer
maneira. Ele me levando para o chuveiro foi minha única desculpa para
sair do porão. Ele me deu um balde e um rolo de papel higiênico fino
para cuidar das minhas necessidades e jogou minha comida.
O que mais uma garota poderia pedir além de um bom banho
quente?
Meus olhos percorreram cada centímetro da casa enquanto ele me
levava ao banheiro. Estou em algum tipo de boca de fumo. Na pequena
sala de estar, havia garrafas de cerveja e agulhas espalhadas pela mesa
de centro, janelas fechadas com tábuas, carpete marrom manchado e
cortinas apodrecidas que cheiravam a naftalina. A cozinha parecia quase
idêntica à da Barbie, puramente baseada na gosma endurecida no piso de
linóleo barato e rachado, com a geladeira mofada e mais agulhas na
mesa. Andando pelo um corredor curto, e no banheiro é onde meu banho
chique me espera.
Está tão sujo quanto o resto da casa.
Na verdade, não pretendo entrar naquela coisa infestada de doenças.
Billy pode dar o sabonete que quiser, eu ainda sairia cheirando a mofo.
Ele me empurra para dentro do banheiro, fecha a porta atrás de mim e a
tranca. Passando por mim, ele segura a cortina de plástico aberta para
mim, silenciosamente me levando a me despir e entrar. Um suor nervoso
surge em minha pele quando seu rosto escurece. As sombras estão
emanando ao redor dele, e o olhar frio e distante que ele me dá faz a
temperatura cair no cômodo em vários graus.
— Entre na porra do chuveiro, River.
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Onde diabos ela está?
O mesmo mantra está passando pela minha cabeça desde o
momento em que Amelia me disse que River sumiu. Mesmo agora,
apenas uma hora depois de assistir ao sequestro de River, estou batendo
com o punho na porta de Barbie, ainda entoando as mesmas palavras.
Deixei a Amelia em casa, apesar de seus protestos incrivelmente
raivosos. Como diabos estou permitindo que uma mulher grávida pise
nesta casa - nesta cidade - onde Billy poderia facilmente aparecer. Não
preciso conhecer o marido dela para saber que ele me mataria. E eu o
deixaria.
— O que, o que, o que, eu estou indo! − Barbie grita do outro lado
da porta, com sua atitude aumentando com as palavras. A mãe de River
abre a porta, como fogo do inferno que ela é, sem se importar com quem
poderia estar batendo em sua porta tarde da noite.
Devo dizer isso dela, essa mulher tem bolas de aço. Pena que vou
esmagá-las em meu punho se ela não me disser o que diabos eu preciso
saber.
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Ambas as sobrancelhas levantam para seu couro cabeludo quando


ela me observa. Uma observação lenta que consiste em seus olhos sem
vida percorrendo meu corpo da cabeça aos pés e um sorriso lascivo
depois, e estou pronto para nocauteá-la. A mesma merda que ela fez na
primeira vez que a conheci, e ainda me dá arrepios.
— Bem, como posso ajudá-lo, doçura? − ela diz com o que deveria
ser um sorriso encantador. Ela se encosta na porta, ficando confortável.
— Billy sequestrou sua filha. Deixe-me entrar agora. − digo, indo
direto ao ponto. Sua coluna se endireita e o que parece ser preocupação
cruza seus olhos por um breve segundo antes de uma máscara
inexpressiva assumir mais uma vez.
Ela abre a porta sem outra palavra, virando-se rigidamente e me
levando para a cozinha. O cheiro de mofo, naftalina e algo suspeito
atinge primeiro, provocando meu refluxo de vômito perigosamente. Eu
tenho que cerrar os dentes para evitar que a repugnância apareça no meu
rosto. Não me preocupo em fazer um inventário minucioso de seu
espaço de vida - prefiro não ver algo que não posso deixar de ver, como
fiz da última vez. Grande erro. Da última vez que estive aqui, observei
os pontos de saída. Agora, tomo muito cuidado para ouvir os sons de
qualquer outra pessoa na casa.
— Então, quando ela foi levada? − Barbie pergunta, como se
estivesse puxando conversa sobre a porra do tempo.
— Ontem à noite. − respondo. Ela se senta à mesa, repleta de
parafernália de todos os tipos. Eu poderia facilmente prender essa
mulher, mas seria apenas uma perda de tempo. Já parece que as paredes
estão se fechando ao meu redor a cada segundo que passa e ela ainda
está nas mãos daquele psicopata.
Ele a está machucando? Ele já a matou?
Eu balanço minha cabeça. Não posso pensar assim. Não agora, ou
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vou perdê-la completamente.


— Você sabe onde ele poderia tê-la levado? − pergunto. Dei um
único passo na cozinha, cobrindo a entrada.
Barbie acende um cigarro e dá uma tragada funda, com as
bochechas esvaziando ao fazer isso. Um resmungo baixo reverbera do
peito para cima e para cima na minha garganta. Mais segundos se
passam.
— Eu não. − ela diz finalmente antes de dar outra tragada. Cruzo os
braços sobre o peito, precisando fazer algo com eles ou então minhas
mãos vão acabar envolvendo o pescoço de Barbie antes que eu possa me
conter.
— Você tem sido a vadia de Billy por metade de sua vida, e você
não sabe onde ele pode estar? − eu pressiono. É um palpite há quanto
tempo Barbie conhece Billy, mas pela aparência abatida em seu corpo
decrépito, não é difícil ver que um demônio sugador de almas como
Billy está em sua vida há muitos anos.
Ela ri, com o som vazio e fraco. — Você realmente acha que eu
gostaria de saber? Quanto mais sei, mais uma responsabilidade eu tenho
e menos chance tenho de sobreviver. Propositalmente fiquei longe dos
negócios de Billy.
Sobrevivendo. Não vivendo, mas sobrevivendo. Isso é tudo o que a
Barbie tem feito e é tudo o que River já conheceu. A pena se forma na
boca do meu estômago pela mãe de River. Não me sinto mal por sua
situação, não quando ela tem sido uma mãe terrível para River, mas uma
parte de mim entende por que Barbie tem sido. Ela foi acorrentada a um
monstro. E quando você coloca uma criança nesse tipo de situação, às
vezes é mais seguro fazê-la odiar você. Porque se elas te odeiam, elas
não vão sofrer quando você finalmente morrer. E se você se recusar a se
apegar à pessoa que trouxe a este mundo, não vai doer tanto quando elas
te deixarem com suas algemas enquanto parte em busca de uma vida
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melhor. Ou, neste caso, se elas morrerem primeiro.


Não é desculpa. Sem justificativa. Mas é a lógica da Barbie.
— Acho que você sabe mais do que nunca deixou transparecer. − eu
suponho, levantando uma sobrancelha. River disse antes que Barbie
dominou a capacidade de obter informações de seus clientes. Ela
também mencionou que Billy reclamava com Barbie em seus estados de
loucura, quando ele estava matando pessoas na primeira vez em que se
viciou em metanfetamina. Quando ele matou meu pai. Tenho certeza de
que todos os tipos de merdas saíram de sua boca nesses momentos -
merdas que ele provavelmente não se lembra de ter dito. A respiração
nos pulmões de Barbie atesta isso.
Ela é esperta - até eu posso ver isso. Barbie pode ter feito parecer
que não estava ouvindo e coletando informações de Billy, mas isso não
significa que não estava. Ela é muito esperta para ficar propositalmente
sem noção, especialmente ao lidar com alguém como ele.
Estou ficando desesperado. Se a Barbie não me disser nada, fico
sem nada. Eu teria que começar do zero. Rastrear as pessoas afiliadas a
Billy, descobrir onde estão seus pontos fortes e seguir o filho da puta
aonde quer que ele vá.
A mulher arruinada joga as cinzas do cigarro antes de tragar mais
uma vez. Suas mãos estão tremendo e ela está tragando aquela coisa tão
fundo que é óbvio que estou certo.
— O que você sabe, Barbie? − eu exijo com os dentes rangendo.
Quando ela não responde, vou até ela, bato a mão na mesa, evitando as
agulhas, e aproximo meu rosto do dela. Seus olhos se arregalam em
discos redondos enquanto ela respira fundo, atordoada pela minha
proximidade repentina.
— Eu juro por Deus, Barbie, se você não começar a falar, vou fazer
todos os anos de sofrimento ao lado de Billy parecerem um maldito
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sonho. Coloque esse cigarro na boca mais uma vez sem responder à
minha maldita pergunta, e você estará engolindo a ponta errada. Agora.
Onde. Ela. Está?
Olho diretamente em seus olhos sem vida, agora infundidos com o
medo que ela está perdendo desde que eu disse a ela que sua filha foi
sequestrada por um dos homens mais perigosos do país. Respirações
ofegantes escapam de seus lábios rachados, com seu peito bombeando
profundamente.
— Eu... estou sendo honesta quando digo que não sei para onde ele
a levou. Mas sei que ele conduz alguns de seus... negócios no centro de
Hawk. Ele aparece lá algumas vezes por semana. Essa é a única
informação que tenho. É verdade quando digo que fico fora de seus
negócios.
Mentirosa. Mas vou aceitar as poucas informações que ela deu.
Melhor do que porra nenhuma, eu acho.
Sem quebrar o contato visual, eu lentamente me afasto. Sua mão
continua a tremer enquanto apaga o cigarro e então, muito gentilmente,
leva-o aos lábios.
— Eu vou encontrar River. Viva. E então vou levá-la para casa e
dar-lhe a vida que ela merece. Mas você nunca mais a verá. Então, se
você se importa com sua filha, console-se com o fato de que ela viverá
como uma porra de uma rainha enquanto você apodrece aqui e definha.
Ela sopra uma nuvem de fumaça e apaga o cigarro. Ela não parece
afetada por minhas palavras, mas traz seu olhar para o meu, com uma
emoção sem nome brilhando nas profundezas de seus olhos mortos.
— Obrigada.
Ela se levanta, joga a ponta de cigarro em uma lata de refrigerante,
com o cigarro se apagando em qualquer líquido que esteja lá dentro. E
então calmamente passa por mim e desaparece por um corredor,
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fechando a porta suavemente atrás dela.


Inquieto com a reação dela, me viro para a saída, empurro a porta
torta e a fecho atrás de mim. Do lado de fora de sua casa, a cerca de
trinta metros de distância, fica o rio onde River nasceu. É escuro e sem
vida, assim como o resto desta cidade.
O completo oposto da mulher com o nome desta imensidão de água.
Porque se River estiver tão sem vida quanto a água diante de mim,
terei grande prazer em rasgar Billy pedaço por pedaço.

O restaurante Hawk's é provavelmente o prédio mais bonito que já


encontrei em Shallow Hill. O que é muito triste, considerando que
parece que o prédio está começando a desabar sobre si mesmo. Uma
Waffle House 24 horas fica do outro lado da rua, parecendo tão patética
quanto a concorrência. Estacionei bem no fundo do estacionamento,
mais perto da rua e com vista direta para o Hawk's. A falta de tráfego de
pedestres e a janela na frente do prédio me proporcionam uma visão
perfeita do interior. Embora eu tenha que me concentrar para ver além
das marcas de mãos e da fina camada de sujeira que cobre a janela.
Se Billy estiver lá dentro, invadir o restaurante como se um
Demônio estivesse mordendo minha bunda não me levaria a lugar
nenhum, a não ser levar um tiro. Tudo o que estou esperando é um
mandado para Billy.
Billy conhece meu rosto. Ele só estava me dando pistas falsas e
tentando foder com o meu caso. E ele prefere tentar um homicídio na
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frente dos moradores de Shallow Hill jantando do que me deixar levá-lo


para a prisão. Afinal, ele é dono de Shallow Hill e, se conseguisse me
matar com um tiro, ninguém contaria a ninguém. Eles provavelmente
até se ofereceriam para ajudá-lo a esconder meu corpo.
Meu punho se fecha, com meus dedos ficando brancos. É preciso
toda a minha força para não enviar meu punho voando pelo para-brisa.
Meu joelho treme, com a energia inquieta correndo por mim. Mais
segundos se passam. Minutos. Horas. Até que finalmente o restaurante
fecha e as luzes se apagam. Já vi todo tipo de pessoa entrar e sair
daquele restaurante. Profissionais do sexo, cafetões, usuários e
traficantes de drogas e até alguns caras comuns que parecem trabalhar
das nove às cinco.
Tantos rostos, mas nenhum que eu preciso ver.
Jogo minha cabeça para trás no encosto de cabeça e solto uma
respiração áspera.
Preciso ir para casa e dormir algumas horas antes de voltar. Até
então, terei meu mandado. Porque quando o fizer, vou caçar minha
garota em todas as casas desta cidade de merda, se for preciso.

— Você conseguiu dormir? − Amar pergunta ao meu lado.


Meus dedos marcam minha coxa enquanto continuo a olhar para o
restaurante. São apenas dez da manhã e faz uma semana que River foi
levada. Uma semana dela passando por Deus sabe que abuso nas mãos
de um morto-vivo. Ele tem sido indescritível. Nenhuma pista. Sem
identificação. Nada. Eu me abstive de bater em portas aleatórias. Só
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porque sei que Billy comanda esta cidade e se souberem que um


detetive está procurando por ele ou por River, ele se esconderia como
uma marmota que acabou de ver sua sombra.
Amelia relatou o desaparecimento de River e contei ao meu
sargento minhas suspeitas sobre quem é o Ghost Killer e mostrei a ele o
vídeo do sequestro de River. Encontrar River não é um trabalho solo,
tenho vários policiais disfarçados patrulhando cada quarteirão em
Shallow Hill, mantendo-se indescritíveis. Não tenho ideia do quanto
Billy sabe sobre meu relacionamento com River, ou se ele sabe que
temos um. Quanto menos Billy suspeitar de algum policial vindo atrás
dele, mais confortável ele se sentirá andando do lado de fora e
mostrando seu rosto pela cidade.
Consegui um mandado que nos permitiu revistar qualquer
propriedade de Billy. Ele possui uma casa em Shallow Hill com o nome
de Benedict Davis. A casa estava completamente estéril, sem sinais de
uso. Tenho certeza de que ele possui propriedades com pseudônimos
falsos, mas isso não me ajuda quando não sei os nomes que ele está
usando.
Amar se senta ao meu lado, observando Hawk's de perto, esperando
que Billy apareça. Amar apareceu algumas horas atrás, entrando no
restaurante, interrogando o proprietário e eventualmente fazendo o
homem teimoso admitir que Billy frequenta o restaurante com
frequência, com apenas um único aceno de cabeça. Ele se recusou a
dizer qualquer coisa além disso, e Amar o deixou em paz por enquanto.
Depois de passar pela vigilância na casa de Ryan novamente,
pegamos em uma das câmeras um SUV preto estacionado atrás da casa,
onde Billy acabou arrastando River para dentro. Com uma placa parcial,
conseguimos rastrear o carro e confirmar seu registro em nome de
Benedict Davis. Marcamos a marca, o modelo e a placa em todo o
quadro. Sempre que as câmeras de rua identificarem o carro,
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receberemos um alerta imediato sobre onde e quando.


— Mako? − Amar pressiona. Olho para ele por um segundo, antes
de meus olhos involuntariamente desviarem de volta para o Hawk's.
— Muito mal. − eu admito. Amar não diz nada por um momento.
Sei que ele não vai me repreender. Não quando ele estaria fazendo
exatamente a mesma coisa se sua esposa tivesse sido sequestrada.
— Ele vai aparecer. − Embora aprecie suas palavras encorajadoras,
elas não fazem nada para me fazer sentir melhor. Não vou conseguir
respirar direito até ter River em meus braços, viva e segura. E se houver
um fio de cabelo fora do lugar em sua linda cabecinha, vou perder a
cabeça.
— Serei responsabilizado pelo que fizer com ele quando o
encontrar? − pergunto. Não estou perguntando porque estou preocupado,
nem a resposta dele vai mudar nada. Estou perguntando para ter uma
ideia de onde está a cabeça de Amar.
Ele fica em silêncio por alguns momentos. — Desde que ninguém
mais esteja por perto... não. Não, você não será. − Se Amar fosse tudo
menos um homem apaixonado, não sei se ele se sentiria da mesma
forma. Nunca estive mais grato por sua esposa em toda a minha vida. —
Ela vai ficar bem, cara. Ela é uma garota durona.
Que eu saiba. River McAllister é perfeitamente capaz de agarrar sua
garganta pelas presas e rasgá-la em pedaços. Ela é a porra da pessoa
mais forte que conheço, e não importa o que Billy a faça passar, minha
garota vai sair do outro lado mais forte do que antes.
Viro meus olhos para ele, dando-lhe um breve olhar de gratidão
antes de voltar meu foco para o Hawk's. Assim que faço isso, meu
celular vibra no porta-copos ao meu lado. Agarrando-o, olho para ver se
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acertamos. O carro de Billy está na rua, indo em direção ao Hawk's.


Viro o celular para Amar, mostrando-lhe o alerta. Um sorriso lento e
sinistro surge em seu rosto, combinando com o meu.
Nós o pegamos.
— Qual é o plano?
— Vamos esperar até que ele saia e depois segui-lo. − A adrenalina
é liberada em minha corrente sanguínea de forma constante. Ele estará
aqui. E ele vai me levar de volta para onde preciso estar. Estou tão perto
que posso provar o derramamento de sangue na minha língua.
E porra, tem gosto doce.

— Ele está indo embora. − digo em voz alta, levantando-me da


minha posição curvada. Billy estacionou o carro nos fundos, escondido
da vista da rua. Demorou alguns minutos, mas Amar e eu conseguimos
encontrar um pequeno beco para estacionar, perto o suficiente para ter
uma visão desobstruída, mas longe o suficiente para que Billy não nos
notasse.
Billy acelera o motor e desce a rua. Eu espero até que ele faça uma
curva até eu sair atrás dele.
Eventualmente, Billy entra em um parque de trailers - Towner's
Park. Os trailers são colocados esporadicamente, cada um ostentando
um desenho diferente de ferrugem e podridão nos painéis. Grama
crescida e danificada preenche as laterais dos trailers, com mais itens
enferrujados amontoando-se nos canteiros de grama. Carros,
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bugigangas, brinquedos infantis. Tudo sobre este lugar parece


degradado e batido.
Cinco minutos. River estava a cinco minutos de distância de mim o
tempo todo.
À minha frente, Billy acelera e vira uma esquina. Não querendo
parecer óbvia, me forço a manter o mesmo ritmo. Acontece que este
parque é mais elaborado do que eu pensava. Assim que viro a rua, o
carro de Billy não está mais à vista. Várias ruas e becos sem saída se
separam da rua.
— Porra. − eu grito, pisando no acelerador com mais força. Não me
importo mais se Billy me vê chegando. A última coisa que o filho da
puta vai ver são meus faróis antes que ele se transforme em uma
bagunça mutilada sob meus pneus, se eu quiser.
— Você o vê? − digo, com a minha voz quase subindo
histericamente. Meu coração está batendo tão forte, é tudo que eu posso
ouvir. Mal ouço as palavras saírem da boca de Amar.
— Ele não pode estar muito longe. Vire aqui. − ele orienta.
Sigo suas instruções um pouco ansioso demais, virando o carro
bruscamente para a esquerda e cantando os pneus. Passo por várias
casas, procurando em cada rua lateral, desesperado para encontrar pelo
menos um vislumbre do carro de Billy. Nas ruas ou estacionado em
qualquer uma das casas. Mas seu carro desapareceu completamente. A
tensão em meu corpo aumenta até que tudo que meu corpo pode
processar é histeria não filtrada.
— PORRA! − grito, batendo meu punho no volante várias vezes,
fazendo o carro desviar. Amar agarra minha mão antes que eu coloque
minha primeira no volante e ative o airbag ou nos jogue direto em um
trailer. O que vier primeiro. Endireitando o carro, eu me forço a me
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acalmar enquanto dou mais voltas, me perdendo no labirinto desse


estacionamento de trailers de merda.
— Vire aqui. − Amar diz novamente, com sua voz mal penetrando o
sangue correndo pelos meus ouvidos. Sigo suas instruções e me esforço
para me acalmar. Perder minha mente não vai encontrá-la mais rápido.
Eu preciso me concentrar, porra.
Estou procurando em cada quintal e garagem, com os meus olhos
percorrendo um lado da rua enquanto Amar inspeciona o outro lado. Por
mais trinta metros, não vejo nada. Assim que estou olhando para frente
para ver para onde ir, percebo à distância uma casa solitária e em ruínas.
Não parece que faz parte do estacionamento de trailers, mas parece estar
na propriedade. Vejo um carro saindo de trás da casa, mas ele não é
revelado o suficiente para eu saber se é o carro de Billy ou não.
— Você vê aquilo? − pergunto. Amar direciona seus olhos para
onde meu dedo está apontando.
— Vamos dar uma olhada.
Já estou dirigindo em direção à casa antes que Amar possa dizer
isso. Billy não está em nenhum lugar deste parque. Que outro motivo ele
teria para passar por aqui? Um pressentimento se instala em meu
estômago. Só sei que é aqui que está a River. Eu posso sentir isso.
Minhas mãos ameaçam tremer, mas as forço a ficarem firmes. A
adrenalina está se tornando mais potente em minha corrente sanguínea
enquanto dirijo em direção à casa. Vejo um flash de movimento através
de uma das janelas do primeiro andar. O movimento foi muito rápido e
eu não estava perto o suficiente para ter certeza de quem era, mas
parecia um flash de cabelo preto.
Meu carro chega a garagem e o carro de Billy aparece. Meu pé está
pisando forte no freio e mal consigo estacionar o carro antes que a porta
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seja aberta e minha bunda esteja fora do banco. Contorno meu carro e
corro em direção à porta da frente, assim que a porta se abre, minha
garota sai correndo esbarrando em mim, com os olhos arregalados de
pânico.
— River! − Seus olhos se fixam em mim e, quando fazem isso, as
lágrimas os inundam. Ela quase me derruba, jogando todo o seu peso em
meu corpo.
— Mako! Cuidado! − A última coisa que vejo é o cano de uma arma
apontada diretamente para minha cabeça.

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O tiro é disparado, com o som alto e abrasivo ecoando. Sinto Mako
se mover embaixo de mim, logo antes de cairmos no chão. Outro tiro
ecoa. Aperto os olhos com força, esperando sentir a queimação nas
costas, mas tudo o que sinto é o peso de Mako abaixo de mim.
— Não se mova mais um maldito centímetro! − Uma voz grita atrás
de mim. Viro a cabeça e vejo o parceiro de Mako apontando uma arma
para Billy, com o último apontando para ele, segurando seu ombro
ensanguentado.
Virando minha cabeça para trás, levanto e inspeciono Mako. O
sangue está se acumulando sob ele, mas seus olhos estão abertos e vivos,
e seus dentes rangendo de dor.
— Mako! Você está bem? Por favor, me diga que você está bem. −
digo, as palavras saindo da minha boca enquanto eu cuidadosamente me
afasto dele. Ele ofega com o movimento.
— Estou bem. − ele resmunga.
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Mentiroso. Ele não está. Ele foi baleado e está sangrando.


— Onde você foi baleado? − pergunto. Ele está vestindo uma
camisa preta, que está escondendo o ferimento de bala muito bem para
meus olhos em pânico. Tudo o que posso ver é sangue. Sangue por toda
parte.
— Meu peito. − ele suspira.
Não, não, não. Antes que eu possa levantar minhas mãos para
aplicar pressão, ele está se levantando. Um longo gemido passa por seus
lábios apertados.
— Pare com isso! − suspiro, tentando empurrá-lo de volta para
baixo. Ele se esquiva, porém, e está de pé antes que eu possa processar
que este homem acabou de levar um tiro no peito e está de pé. E não
apenas isso, mas levantando sua própria arma e apontando para Billy.
Billy também está sangrando, com o braço ferido pendurado e agora
segurando a arma com a mão esquerda. Amar deve ter atirado em
retaliação quando Billy disparou contra ele.
Billy se atreve a tirar os olhos de Amar, observando Mako se
levantar e apontar uma arma para ele com um sorriso maligno no rosto.
— Dói muito, não é? − ele provoca da varanda.
Resmungo, avançando em direção ao meu captor, mas o braço livre
de Mako envolve minha cintura e me empurra para trás dele. Eu daria
um soco em suas costas em desafio se uma bala não passasse por ele. Ou
fez?
Ah, Deus, pode estar alojada lá, pelo que sei.
— Eu já sei, baby, você não precisa de mim para te salvar. − Mako
amansa, com seus olhos ainda em Billy. — Só vou matá-lo, só isso.
Billy inclina a cabeça para trás e ri das palavras de Mako.
— Você acha que pode matar um deus? − ele pergunta, com seus
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olhos azuis brilhando com excitação e pura maldade encarnada. Ele está
gostando desse impasse. Mesmo estando completamente em menor
número e já baleado, ele está tendo um prazer doentio com isso. Billy
sempre amou a emoção de sua vida pairando precariamente à beira da
morte.
Dou um passo para o lado, ainda mantendo a maior parte do meu
corpo atrás do de Mako, apenas se isso significar evitar que ele se
estresse ainda mais. — Você não é um deus, Billy. Você é apenas um
velho fracassado que não tem lealdade. É por isso que você continua
matando todo mundo, certo? Você não pode confiar em uma única alma
neste mundo porque todos te desprezam. − digo as palavras com todo o
ódio que posso.
Os lábios de Billy se curvam. Minhas palavras o consome porque
ele sabe que é verdade. As drogas destruíram o pouco de sanidade que
lhe restava. Ele está muito paranoico agora. Muito nervoso. É por isso
que ele se meteu na investigação de Mako. Ele pensou que se pudesse
mexer os pauzinhos por dentro também, ninguém iria pegá-lo. A última
coisa que ele esperava era que eu tivesse um relacionamento com um
detetive e chegasse perto o suficiente para contar a verdade. Billy matou
tantas pessoas. Feriu tantas famílias. Ele tem um inimigo a três metros
dele o tempo todo, e ele sabe disso.
— Eu te dei a vida, vadia. Vou tirá-la. − ele grita. Eu rio de suas
palavras. Em sua audácia de pensar que me matar é a pior coisa que ele
poderia fazer comigo. Ele já fez o seu pior. Ele já me arruinou para o
resto da vida. Eu nunca serei normal por causa dele. Matar-me seria uma
misericórdia.
— O caralho que você vai. − Mako intervém antes que eu possa
dizer qualquer outra coisa. Em um movimento rápido, Mako levanta a
arma, segurando-a pelo cano, levanta o braço e atira a arma diretamente
na cabeça de Billy. Ele acerta seu alvo, a coronha da arma acerta Billy
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diretamente na testa antes que possa processar o que está acontecendo.


No momento em que a arma saiu da mão de Mako, ele avançou na
direção de Billy, aparentemente confiante de que a arma iria acertar. A
cabeça de Billy vai para trás e ele cai no chão.
— Porra! − Billy grita, com sua mão levantando para a cabeça,
agora derramando sangue copiosamente onde foi atingido. — Seu filho
da puta... − ele não consegue terminar a frase. Mako está sobre ele,
levantando Billy apesar de seu próprio ferimento à bala.
— Mako! Tenha cuidado, seu idiota! − grito, com minhas pernas
finalmente se movendo e me levando para a dupla. Mako me ignora e
arrasta Billy de volta para dentro de casa. Minhas pernas vacilam. Não
quero voltar para dentro daquela casa. Eu me esforcei tanto para sair
dela.
Amar corre até mim. — River, por favor, sente-se no carro. Vou
garantir que Mako esteja bem. − eu não olho para ele. Não quando Mako
está desaparecendo na esquina, arrastando um Billy lutador para a
cozinha e fora de vista.
— Eu... eu não posso deixá-lo sozinho. − digo. Mas ainda assim
minhas pernas ainda não se movem. Por que elas não se movem? Por
que agora meu corpo decide processar o trauma?
Mova-se, River.
— Querida, eu vou atrás dele. Apenas sente-se dentro do carro. − O
final da frase de Amar é abafado por um grito alto, cheio de agonia.
Parecia Billy.
— Não. − digo, com o som finalmente me estimulando a agir. Mako
não fugiu quando me vinguei de Ryan. Eu não vou fazer o mesmo com
ele. Além disso, é justo que eu dê alguns dos meus próprios socos antes
que Billy encontre sua morte. Billy foi meu agressor por muito mais
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tempo do que Ryan e fez muito pior comigo ao longo dos anos. Eu
também quero fazer parte disso.
Eu me arrasto para dentro de casa, lutando contra o frio que quer
tomar conta do meu corpo por estar de volta dentro desta casa. Demorou
meses até que eu pudesse entrar na casa da Barbie sem querer vomitar e
ter um colapso mental.
Só preciso me lembrar: estou segura agora. Mako está aqui. Amar
está aqui. Billy vai morrer, quer ele queira ou não. Estou segura.
No momento em que estou correndo para a cozinha, vejo uma faca
cravada no peito de Billy. Mako está sangrando muito e parecendo mais
pálido a cada segundo. Ele não está indo bem e esse conhecimento
instantaneamente pega qualquer outra coisa que eu esteja sentindo e atira
em chamas. Só consigo pensar no declínio da saúde de Mako.
— Amar, leve-o para o hospital.
— Porra, isso...
— ... Eu ficaria feliz em fazer isso. − Amar e Mako falam ao mesmo
tempo. — Mas não vou deixar você sozinha com ele. Vou levar Mako
até o carro e já volto.
Olho de lado para Amar, ainda desconfiada de onde está sua moral
quando se trata de cumprir a lei. Algo me diz que ele não é certinho e
estava mais do que disposto a deixar Mako fazer o que ele queria. Mas
não tenho tanta certeza de que ele faria o mesmo por mim.
— Estou bem, já resolvi isso. − Mako argumenta. Ele cambaleia.
— Você vai para o hospital, cara. Você perdeu muito sangue. −
Amar diz, correndo em direção a Mako e forçando o braço pesado de
Mako ao redor de seus ombros. O fato de Mako não lutar mais só
aumenta minha preocupação.
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Com um último olhar de relance, Amar diz: — Eu voltarei.


Vejo Amar quase arrastar o corpo de Mako para fora da casa. Os
gemidos de Billy abafam os gemidos de dor de Mako.
Voltando minha atenção para o monstro sangrando e gemendo
diante de mim, transformo minha preocupação com a possível morte de
Mako em uma raiva ofuscante. Se Mako morrer... se Billy levar o único
homem na minha vida que já deu a mínima para mim - e quero dizer que
realmente se preocupa comigo - eu não vou sobreviver. Billy terá
conseguido me quebrar completamente, como sempre quis.
Eu me viro, volto para a varanda e encontro a arma esquecida de
Mako na madeira podre. Pegando-a, eu viro a arma na minha mão,
deleitando-me com o peso em minhas mãos. Nunca atirei com uma arma
antes. Nunca senti a mistura de apreensão e poder que se aninha dentro
de você ao segurar uma arma. Posso entender porque as pessoas usam
armas. Uma coisa tão pequena tem o poder de tirar uma vida em questão
de segundos.
Um barulho alto chama minha atenção de volta para dentro da casa.
Amar tendo colocado Mako no carro, ele corre comigo, encontrando
uma cadeira caída ao lado de Billy. Ele deve ter tentado usar isso como
alavanca para se levantar. A faca ainda está em seu peito, com um riacho
de sangue escorrendo da ferida e caindo no chão. Ele tenta se levantar
novamente, mas escorrega no sangue.
— Venha aqui e me ajude, sua maldita vadia! − ele grita, com a
saliva voando de seus lábios.
Eu o encaro.
— Que porra você pensa que está fazendo, parada aí? Ajude-me! −
Seus olhos estão arregalados de dor e raiva. Vermelhos e molhados. Eu
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quero olhar nos olhos enquanto tiro sua vida. Quero ver a vida
desaparecer deles quando eu fizer isso.
Lentamente, ando até a forma esparramada de meu pai no chão, com
cuidado para não escorregar em seu sangue.
— Amar, por favor, saia. − sussurro.
— Faça o que você precisa fazer, mas não vou deixar você sozinha.
Viro minha cabeça para o lado, observando-o de perto. Quando ele
vê meu olhar, ele repete: — Faça o que você precisa fazer.
Eu sorrio e me viro para Billy.
— Você é patético. − digo calmamente. Eu me agacho, com a arma
pendurada entre meus joelhos enquanto o observo. — Você viveu toda a
sua vida como o monstro. Desesperado para ser o pior para que ninguém
pudesse te machucar. Diga-me, Billy. Você está machucado? − eu faço
uma pausa e arranco a faca de seu peito. Seus gritos causam arrepios
quentes na minha espinha. — Você sente a dor agora? − eu provoco
enquanto enfio meu polegar no ferimento de faca que Mako infligiu.
Os gritos de Billy se intensificam, com suas mãos envolvendo meu
pulso com força. Ele poderia quebrá-lo se quisesse, mas seu aperto é
muito fraco. Ele está perdendo sangue e, se eu não me apressar, ele
morrerá devido aos ferimentos antes que eu tenha minha chance. Se eu
não me apressar, Mako também morrerá. E isso simplesmente não é
inadmissível.
— Você pode me matar, River. Mas nunca vou morrer. Estarei
dentro de você pelo resto de sua vida, causando-lhe dor. Você nunca
será capaz de me esquecer. − ele parece maníaco com seus olhos
enlouquecidos e dentes sangrentos.
Eu sorrio.
— Isso pode ser verdade. Mas será fácil não sentir dor quando tiver
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a doce lembrança de ser a última coisa que você viu antes de morrer.
Ele grita, abrindo a boca para expelir mais veneno. Eu não hesito.
Eu levanto a arma para sua testa e fixo meus olhos nele.
E eu puxo o gatilho.
Sua cabeça é jogada para trás, com sangue e massa encefálica se
espalhando pelo ladrilho. Seu corpo cai, e tudo se desvanece em silêncio
por trás do som do tiro.
Silêncio puro e absoluto.
Algo que nunca tive o prazer de experimentar na presença de Billy.
Parece... bom. Ótimo. Eu coloco minha bunda no chão, sem me importar
que estou sentada em uma poça de sangue. A arma faz barulho perto de
mim.
E eu encaro o cadáver de Billy e apenas sorrio.

Eu me levanto da cadeira dura de plástico e corro em direção a


Amar. — Como ele está? − pergunto a Amar, com minha bunda há
muito tempo entorpecida da desconfortável cadeira do hospital. Estou
sentada aqui por horas a fio, apenas esperando para ouvir qualquer coisa.
Desistirei de bom grado de todos os sentimentos se isso significar que
Mako está bem.
— Ele está estável. − ele responde, com os olhos brilhando de
alívio, apesar da exaustão gravada em cada ruga em seu rosto. Alívio
imediato me atinge, quase roubando minha respiração. Lentamente, a
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imensa pressão no meu peito começa a diminuir.


Amar nos levou às pressas para o hospital e internou Mako na UTI.
Durante a viagem, eu rezei. Rezei para não ter demorado muito para
matar Billy. Rezei para que a bala não tivesse acertado nada vital. Eu
apenas rezei. Enquanto fazia isso, Amar telefonou para o chefe sobre a
morte, explicando a história que ele me contou pouco antes da chegada
dos policiais.
Mako e Amar vigiaram Billy. Segui-os até aqui. E eles basicamente
contaram a maior parte da verdade, com alguns detalhes diferentes. Eu
mesma consegui escapar, saindo correndo de casa assim que chegaram.
Billy imediatamente abriu fogo, atirando em Mako uma vez no peito.
Amar respondeu ao fogo e atirou de volta. Billy correu para dentro de
casa, Mako o seguiu enquanto Amar me impedia de entrar na casa. Lá,
Billy foi até Mako com uma faca, na qual Mako pegou a arma e
esfaqueou Billy com ela. Durante a briga, Mako foi capaz de dominar
Billy e matá-lo com um tiro.
Mako ficou com a glória de matar Billy, mas eu não poderia me
importar menos. Eu não me importo com o que os policiais acreditaram
que aconteceu. Um completo estranho poderia ter obtido a glória por
mim, porque vou dormir em paz à noite sabendo a verdade. Eu tirei a
vida de Billy dele.
— Ele teve um pulmão perfurado e precisou de cirurgia. Teve que
fazer uma transfusão de sangue porque perdeu muito sangue. Mas,
felizmente, a cirurgia foi bem-sucedida. Ele vai ficar bem. − Amar
continua, atraindo minha atenção de volta para ele. Concordo com a
cabeça, enxugando o suor pelo nervosismo com minhas mãos no meu
jeans. Sangue seco formam crostas em minhas palmas. Ainda não tive a
chance de lavar. Cada transeunte olhou para mim como se eu fosse uma
lunática.
Acho que sou uma.
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— Posso vê-lo? − pergunto, levantando-me.


— Sim, você pode vê-lo. Ele acabou de acordar da cirurgia. Haverá
alguns policiais aqui que vão querer tomar seu depoimento, no entanto.
Concordo com a cabeça, com outro suor pelo nervosismo surgindo
em minha testa. Falar com um policial sempre faz você se sentir como se
tivesse feito algo errado, mesmo que não tenha feito. E bem, neste caso,
acho que matar alguém seria classificado como errado.
Notando meu nervosismo, ele diz: — Basta seguir a história e você
ficará bem. É apenas um protocolo.
Mantém-se fiel à história, River. Sim, como se os policiais não
fizessem a mesma pergunta quinhentas vezes só para ver se você muda
sua história.
— Ah, e Julie e Matt estão a caminho.
Não digo nada em resposta. Ainda não estou pronta para enfrentá-
los. Especialmente Matt. Eu poderia ser capaz de matá-lo também.
Passando por ele, ando rapidamente em direção ao quarto de Mako.
Ansiosa para vê-lo, mas incrivelmente nervosa. A última vez que nos
falamos, ele tinha terminado comigo. Eu tinha informações que ele
estava procurando há muito tempo. E escondi isso dele por motivos
totalmente egoístas. Não culparia Mako se ele quisesse cortar relações
comigo. Neste ponto, não tenho sido nada além de uma dor de cabeça
para ele.
Timidamente, caminho para o quarto. Parece errado. Nada em mim
jamais foi tímido. Não até eu conhecer Ryan. Forçando minha coluna a
se endireitar, viro o corredor e vejo Mako deitado na cama do hospital,
olhando distraído para a tela da televisão. Mako é um homem grande,
mas até ele parece pequeno na cama do hospital. Ligado a soros e fios,
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com pele pálida e olheiras. A visão quase me leva às lágrimas.


Olho para cima, notando algum programa de culinária que está
passando. No momento em que meus olhos voltam para ele, seus olhos
verdes já estão fixos em mim, me mantendo no lugar. Eu não posso me
mover agora. Mal consigo respirar com a intensidade de seu olhar.
— Provocando-se com todas as coisas que você não pode comer? −
pergunto, orgulhosa de quanto bem eu mantive minha voz firme.
Um pequeno sorriso abre em seu rosto. Esse pequeno movimento
me dá uma pequena quantidade de conforto, no entanto. Talvez essa
conversa não seja tão hostil quanto imaginei que seria.
— Provocando? Por favor, estou recebendo comida gourmet aqui. −
ele brinca. Abro um pequeno sorriso e entro no quarto.
Limpo minha garganta. — Lamento que você tenha levado um tiro,
Mako.
Ele levanta uma sobrancelha. — Que parte de eu levar um tiro foi
culpa sua?
— O fato de você estar lá? Sei que veio me procurar e agradeço por
isso. Mas nada disso deveria ter acontecido.
Mako apenas olha, com a intensidade em seu olhar aumentando.
— Não era tudo sobre você, sabe? − Eu me encolho com a vergonha
enchendo meus poros.
Que estupidez, River.
Mais uma vez, sendo egoísta e presumindo que Mako estava indo
para lá puramente por minha causa. Claro, Mako teve que ir procurar por
Billy. Ele não era apenas o Ghost Killer, mas também mantinha alguém
cativo. Ele teria ido procurar de qualquer maneira.
— Eu sei, isso foi estupi...
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— Billy matou meu pai. Meu verdadeiro pai. − ele interrompe. Eu


fecho minha boca, assustada com a informação. — Ele foi a primeira
vítima de Billy. Esculpiu "Ghost" em seu peito e atirou uma vez na
cabeça dele. Presumi que meu pai o estava traindo ou algo assim,
imagino. Quem realmente sabe por quê. Minha necessidade de encontrar
o Ghost Killer era porque eu queria vingar a morte do meu pai. Ele não
era um grande homem, mas não merecia o que aconteceu com ele.
Eu aceno lentamente. — Sinto muito. − sussurro.
— Mas então você apareceu. E acontece que você tinha uma
conexão próxima com o Ghost Killer. O mesmo homem que assassinou
meu pai também estava abusando ativamente da minha garota. − Meu
coração aperta quando ele diz minha garota. — Sempre quis encontrar
Billy, River. Mas o plano original era encontrá-lo e colocá-lo na prisão
pelo resto de sua vida miserável. Não tentar assassiná-lo. Isso... isso era
sobre você. Ele roubou você de mim e te machucou de Deus sabe de que
maneiras. − ele fecha os olhos, aparentemente perdendo um pouco de
controle. Depois de um momento, ele fala novamente. — Isso foi muito
mais pessoal do que o que ele fez com meu pai. E eu queria que ele
morresse por isso.
Não tenho certeza de quando as lágrimas começaram a escorrer pelo
meu rosto, mas quando ele termina, eu as enxugo copiosamente.
— Você não está mais com raiva de mim? − pergunto, olhando para
ele com os olhos embaçados. Um sorriso triste surge em seus lábios.
— Não mais. Você escondeu a verdade porque Billy te assustou.
Obviamente, você tinha boas razões para ter medo dele. A única coisa
que odeio é que você não se sentiu segura o suficiente perto de mim para
me confiar essa informação.
Minha cabeça está balançando antes que ele termine sua última
frase. Corro até ele, sentando-me com cuidado na beira da cama ao lado
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dele.
— Esse não era o problema, Mako. Eu me senti... me sinto segura
com você. Eu não estava apenas com medo pela minha própria vida, eu
estava com medo pela sua também. Acho... acho que só tinha mais medo
de Billy.
Ele balança a cabeça e pega minha mão. Não consigo desviar o
olhar da maneira como sua mão enorme envolve completamente a
minha. Eu me sinto tão pequena em comparação com Mako, mas em vez
de me intimidar, me faz sentir segura.
— Ele aterrorizou você durante toda a sua vida, junto com muitos
outros homens, incluindo meu irmão. Você me conhece há pouco tempo.
Não posso esperar que seu medo e falta de fé na população masculina
substituam a proteção que tentei lhe dar. Se alguém deveria estar se
desculpando, deveria ser eu. Eu tentei muito te proteger, e falhei. Sinto
muito por isso. − Sua voz falha na última palavra. Mais lágrimas
inundam meus olhos, e estou mais uma vez balançando a cabeça.
— Por favor, nunca se desculpe por isso. Billy sempre iria me
encontrar, Mako. − eu repito, roubando suas palavras semelhantes de
antes. — Tornei isso impossível para você porque queria me salvar. Isso
é importante para mim.
— River, sei que você pode se salvar. Mas só porque você pode,
não significa que você sempre precisa. Você é incrivelmente forte e eu a
admiro por isso, mas isso não significa que vou deixar você andar por
este mundo sozinha. Você não é uma donzela em perigo, mas prefiro
morrer se não proteger minha garota enquanto ela chuta bunda dele,
entendeu?
O amor não filtrado enche meu peito com tanta força que parece que
meu coração é um balão cheio de hélio. Não consigo descrever a
sensação avassaladora que está tomando minha alma e a dilacerando,
abrindo espaço para o homem ao meu lado. Essa é a única maneira que
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posso descrevê-lo. Duas almas se unindo, entrelaçando-se fortemente


até que não haja fim para mim ou para ele.
— Eu te amo, Mako. Sinto muito por não ter dito isso antes. Mas eu
te amo tanto.
Um sorriso arrogante estampa em seu rosto, e antes que eu possa
retirá-lo, ele envolve sua mão em volta do meu pescoço e me puxa para
ele, efetivamente me distraindo com seus lábios carnudos. Um raio
surge, cruzando em nossos lábios pressionados.
Finalmente encontrei um lar.

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A faca em minha mão treme. Não estou bem neste momento. Meus
olhos encaram o tomate que eu estava cortando, com o líquido vermelho
pingando da ponta serrilhada. Eu estava bem e então o líquido vermelho
lentamente se transformou em sangue.
Uma mão desliza pelo meu corpo. Minha mente gira em espiral.
Sinto a mão de Billy. De Ryan. Todos os homens que tiraram algo de
mim se transformando em um. A mão agarra o meu quadril e me vira.
Instintivamente, minha mão levanta - a que segura a faca de açougueiro -
e pressiona-a ao pescoço dele.
Ele para. Os olhos verdes me encaram, com a familiaridade girando
na escuridão que invadiu minha mente. A clareza volta correndo e o
mundo entra em foco mais uma vez. Mako está olhando para mim
intensamente, com seu rosto cuidadosamente calmo como uma lousa em
branco. Um riacho de sangue escorre na ponta da faca cravada em sua
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pele.
— Ah, meu Deus. − eu saio correndo, com a faca escorregando da
minha mão. Ele a pega antes que caia e é esfaqueado no caminho para
baixo. Minhas mãos levantam para meu rosto e o constrangimento
inunda meus poros. — Eu sinto muito. Porra. Sinto muito, Mako. −
Minha voz é abafada por minhas mãos, mas sei que ele me ouviu muito
bem.
Estou absolutamente horrorizada. Eu quase o matei. Na verdade,
quase o matei.
Ouço o barulho da faca na bancada atrás de mim. E então parece
que a tábua de corte está sendo deslizada pela bancada, para longe de
nós. Um puxão forte e minhas mãos abaixam do meu rosto. A rapidez
disso força um suspiro da minha garganta, e as minhas mãos caem
facilmente.
Suas mãos agarram meus quadris e, de uma só vez, ele me levanta e
me coloca na bancada. Ele me acomoda de modo que meu corpo fique
sentado no canto inferior, onde os dois balcões se encontram.
— Mako! Cuidado! − eu advirto, cautelosa com seu ferimento à
bala. Ele está quase curado, mas ainda não está cem por cento. Ele não
tem permissão para levantar coisas pesadas, e tenho certeza de que o
médico me classificaria como um objeto pesado.
Ele ainda não disse uma única palavra. Oh, Deus. Provavelmente
vai me expulsar agora. Quase cortei seu pescoço. E o pior, é que sou
realmente capaz disso.
— O que desencadeou você? − ele pergunta finalmente, colocando
um dedo sob meu queixo e levantando meu queixo. Meus olhos cheios
de lágrimas encontram seus verdes firmes.
— A faca. − admito com relutância.
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— Por quê?
Eu tento desviar o olhar, mas ele levanta meu queixo de novo para
ele. — Porque a última vez que usei uma, machuquei alguém com ela.
Parece que estou segurando uma arma em minhas mãos agora, não algo
para cortar tomates.
— Ajudaria se a faca se tornasse algo diferente de uma arma?
Minhas sobrancelhas franzem com confusão. — O que quer dizer?
Pensei que era isso que eu estava fazendo cortando tomates... − Minha
voz falha quando ele pega a faca com uma mão, puxa a gola da minha
camiseta com a outra e começa a cortar o tecido no meio.
— Mako. − suspiro, atordoada. A ponta da faca arranha minha pele.
Não o suficiente para cortar a pele, mas o suficiente para deixar uma dor
maçante. Quando olho para ele, os seus olhos estão fortemente
concentrados na faca. Ele está me arranhando de propósito.
Minha frequência cardíaca aumenta, acelerando minha respiração
junto com ela. Minha camiseta cai dos meus ombros e pelos meus
braços. Ele corta meu sutiã em seguida - gostava desse sutiã - e depois
meu short e calcinha. Quando ele termina, meu corpo nu está enfeitado
com pedaços de tecido.
— O que está fazendo? − sussurro, com a ponta da minha língua
saindo para molhar meus lábios secos. Ele me ignora e agarra meus
tornozelos e os abre, colocando cada pé em cada balcão. Em seguida, ele
junta todas as sobras e as joga para trás. Distraída, observo todas elas
caírem no chão.
— Recuperar o que uma faca significa para você.
Meus olhos se voltam para os dele. Ele entra no meu espaço.
Arrepios elétricos percorrem minha espinha quando a textura áspera de
seu jeans esfrega minha boceta nua, provocando um suspiro agudo da
minha garganta.
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— Mako... − Ele deliberadamente move seus quadris, certificando-


se de que o zíper deslize em meu clitóris. Sua respiração aquece meu
pescoço enquanto o seu corpo pressiona ainda mais no meu, me
aquecendo de dentro para fora. Seus lábios deslizam pelo meu pescoço
até minha orelha, fazendo cócegas nos minúsculos pelos da minha
orelha.
— Você confia em mim? − ele pergunta, com sua voz profunda
como o oceano, baixa e rouca.
Não, porque neste momento estou o mais próximo que já estive do
céu e ainda não estou pronta para morrer.
— Sim. − eu sussurro. Só porque estou com mais medo dele parar.
Meu nervosismo se intensifica quando vejo sua mão segurar a faca.
Não pelo cabo, mas pela lâmina. Fico tentada a abrir a boca e dizer a ele
para não se cortar, mas algo me diz que ele não se importaria tanto. Eu
mantenho minha boca fechada, mesmo quando ele levanta a faca e
desliza o cabo levemente em meu abdômen. Meu estômago se contrai
em resposta, igualmente apavorado e ansioso para ver o que ele vai
fazer.
O cabo desliza pelo meu abdômen até chegar à minha boceta. No
minuto em que Mako começou a me despir, meu núcleo encharcou com
fluídos. Mas agora que ele está perigosamente perto da minha área mais
sensível com uma faca... Deus, estou encharcada.
Minha respiração aumenta quando ele circula meu clitóris duro com
o cabo. Não me orgulho do grito que sai da minha boca, nem da maneira
como minhas pernas tremem. Seu sorriso perverso e satisfeito abre em
seu rosto, e se eu não estivesse tão distraída, faria algo a respeito.
Involuntariamente, meus olhos se fecham enquanto me perco na
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sensação. Apenas a quantidade certa de pressão. A espiral no meu


estômago já está perigosamente apertada. A pressão sobe do meu
clitóris e reaparece logo na minha abertura.
Meus olhos se abrem. — Mako. − eu advirto, com meu tom cheio
de apreensão. Ele levanta os olhos de sua tarefa, encontrando os meus
em uma dança acalorada.
— Você disse que confiava em mim. − ele me lembra, com a
maldade ainda presente em seu rosto.
Ofego quando a ponta do cabo desliza por meus lábios e entra em
mim. Ele não pressiona mais, esperando que eu proteste ou diga para ele
não parar, não sei o que ele quer. Muitos pensamentos e emoções estão
girando em meu corpo como um ciclone.
Eu não poderia dizer a você qual é minha mão esquerda e minha
direita neste momento.
Lambendo meus lábios nervosamente, eu dou um aceno sutil. Não
sou capaz de nada além disso. De uma só vez, ele empurra o cabo até o
fim, com cuidado para manter o metal afiado longe da minha pele.
Minha boca se abre, nenhum som escapa quando minha garganta está
completamente fechada.
Um gemido escapa quando ele puxa a faca para fora e depois volta
para dentro. — Mako. − gemo alto, não mais envergonhada pelos ruídos
saindo da minha boca.
— É isso aí, baby. − ele insiste quando meus quadris começam a
mover. Ele mantém o mesmo ritmo constante. Torna-se agonizante e
logo, sons desesperados seguem os gemidos. Meus quadris movem com
mais insistência e meu corpo implorando por mais.
— O que você precisa? − ele pergunta, recusando-se a acelerar o
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ritmo.
— Mais. − murmuro, empurrando meus quadris para frente.
— Diga-me o que quer. − ele exige, ainda não cedendo aos apelos
do meu corpo.
— Me lamba. − sussurro com urgência. Quase grito de frustração
quando sinto sua língua sair, lambendo meu pescoço. Normalmente, eu
não reclamaria, mas não quando preciso da língua dele na minha boceta.
— Mako! − grito, sabendo muito bem que ele sabia exatamente o
que quis dizer.
— Sim? − ele pergunta inocentemente.
— Lamba. Minha. Boceta. − murmuro, com minha mão deslizando
em seu cabelo rudemente e puxando com força. Eu sinto o sorriso contra
o meu pescoço.
— Boa menina. − ele elogia. Ele beija meu pescoço suavemente
antes de seguir com aqueles beijos pelo meu peito. Parando no meu
peito, ele envolve sua boca quente em torno do meu mamilo. Minha
cabeça cai para trás e meus quadris começam a mover mais uma vez
enquanto ele continua a enfiar a faca dentro de mim.
Ele tira outro suspiro de mim quando seus dentes substituem sua
língua, e ele morde meu mamilo. Alfinetadas quentes percorrem meus
nervos, quase me fazendo gritar de dor cada vez mais. Mas mais potente
do que a dor aguda são as ondas de prazer que percorrem meu corpo.
Elas se misturam até que eu não consiga distinguir a dor do prazer.
Com um som, ele solta meu mamilo. Colocando primeiro na área
sensível, ele continua seu caminho passando por meus seios, até meu
abdômen e, finalmente, até minha boceta encharcada.
Ele se ajoelha diante de mim, com a faca firmemente dentro de
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mim. Quando ele olha para mim, seus olhos escurecidos para um verde
musgo, quase gozo ali mesmo. Vendo Mako se ajoelhar diante de mim
como um cavaleiro faria com uma princesa, questiono por que nunca
quis que ele me salvasse.
Mantendo contato visual, ele lentamente se inclina para frente e
coloca sua língua para fora para atacar o meu clitóris. A pequena
quantidade de contato envia meus olhos revirando para trás da minha
cabeça. Antes que eles possam encontrar os olhos de Mako novamente,
ele está gemendo e enfiando a boca no meu núcleo. Não consigo conter
o gemido alto que sai dos meus lábios e ecoa na cozinha. Não quando
sua língua é tão quente e precisa contra o meu clitóris.
Ele geme contra mim, enviando vibrações deliciosas por toda a
minha boceta. A única coisa que consigo pensar em fazer é enfiar minha
mão em seu cabelo macio e me esfregar em sua boca, tomando cuidado
com a faca ainda cravada dentro de mim. A espiral no meu estômago
aperta mais e mais. Meu estômago apertou quando o orgasmo atingiu o
ápice. Meu corpo se imobiliza, fazendo com que o orgasmo seja muito
mais acentuado.
A espiral aperta e eu gozo. A euforia pura toma conta do meu corpo.
É como se minha alma se elevasse de meu corpo físico. Os gritos que
saem da minha boca soam tão distantes, como se eu estivesse flutuando
sobre eles enquanto as ondas de êxtase me inundam.
Distraída, sinto a faca sair de mim e Mako se afastar. Meus olhos
semicerrados mal registram Mako de pé e tirando sua própria calça
jeans. A única coisa que me atrai de volta à terra é a sensação do pau de
Mako projetando-se contra o meu núcleo.
A visão fez meus olhos se arregalarem mais uma vez. Acho que
nunca vou me acostumar com a visão dele. Incrivelmente grosso, com
um comprimento que certamente não é natural. O pau de Mako é
intimidante e de dar água na boca, e agora, parece muito duro.
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Ele envolve seus braços sob minhas pernas e me puxa para frente.
Minhas mãos agarram cada lado da bancada, firmando meu corpo
enquanto ele se alinha. Minha testa franze quando sinto algo molhado
contra minha coxa.
Eu olho e noto uma grande quantidade de sangue escorrendo pela
minha coxa, escorrendo da mão de Mako.
— Ah, meu Deus. − digo. Ele levanta a dita mão e puxa meu rosto
para o dele, não dando a mínima que ele está me cobrindo com seu
sangue.
— Isso te incomoda? − ele pergunta, com sua voz e rosto expresso
em tom sério.
Levo um segundo para responder. O sangue dele me incomoda?
Não no sentido que ele pensa. Não gosto do pensamento dele ferido.
Mas estou chocada com isso? Não, nenhuma dessas coisas. Além disso,
eu tenho a sensação de que Mako se fez sangrar deliberadamente. Olho
para o pequeno rastro de sangue seco em seu pescoço. Ele nem se mexeu
quando fiz isso. Meus olhos desviam de volta para os dele. Eles são
poços ardentes de lava jorrando sua necessidade em mim. A última coisa
que Mako sente é dor.
Mordo meu lábio e balanço a cabeça negativamente.
Ele não precisa ouvir mais nada. Mordendo o seu próprio lábio
carnudo, ele se alinha e enfia seu pau profundamente em minha boceta
em um único movimento.
— Ah, meu... porra, Mako! − Minha cabeça bate contra o armário.
Eu me sinto tão impossivelmente preenchida.
Muito parecido com os seus cuidados com a faca, ele desliza
lentamente antes de me preencher de novo. Prazer intenso sobe pela
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minha espinha, fazendo meu corpo arquear.


Ele se inclina para frente, pressionando o seu corpo no meu e
movendo seus quadris em pequenas estocadas precisas. Seus lábios
encontram minha orelha, dando-lhe uma mordida forte.
— Diga isso de novo. − As palavras murmuradas irradiam pelo meu
ouvido, descem pela minha espinha e vão direto para onde estamos
conectados.
— Mako. − digo, o nome enfatizado por um suspiro agudo quando o
seu pau desliza profundamente dentro de mim. Aperto os olhos,
desesperada para gozar, mas igualmente desesperada para que o
momento nunca acabe.
Suas mãos deslizam pelas minhas coxas, com uma mão deixando
um rastro de sangue. A visão envia um auge de prazer para o meu
núcleo. Algo sobre o erro disso me excita muito mais. Agarrando meus
quadris, ele força meu corpo em sua direção enquanto começa a entrar
em mim rápido e com força.
Seus gemidos se juntam aos meus gritos altos, com o tom de nossas
vozes e a união de nossos corpos se tornando um crescendo alto. O
aperto familiar em meu estômago me avisa do orgasmo que certamente
vai me devastar.
— Porra, River, eu preciso gozar. Goze em meu pau agora. − ele
exige asperamente. Tão simples quanto tocar uma tecla em um piano,
sua demanda tem resultados imediatos. A espiral aperta e eu gozo mais
uma vez.
Eu não posso respirar. Meus olhos reviram e o corpo convulsiona ao
redor dele. O gemido alto de Mako é meu único aviso antes que ele me
penetre mais algumas vezes e depois pare. Jorros quentes de esperma me
enchem, tanto que escorre por seu pau.
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— Porra, River. − ele geme, demorado e alto.


Nossa respiração é ofegante e irregular. Parece que todos os ossos
do meu corpo foram extraídos, fazendo-me sentir como um saco de pele
derretendo.
— Acho que funcionou. Facas são minha nova coisa favorita.

"A vítima mais recente do Ghost Killer, River McAllister,


reconstruindo sua vida após o trágico sequestro."

O vermelho surge em minha visão. Vítima. É por isso que sou


conhecida. Não alguém que sobreviveu. Apenas alguém que foi
vitimizada. Eu amasso o papel em meu punho e jogo o jornal idiota do
outro lado da sala. Os olhos de Mako se voltam para mim, com uma
sobrancelha levantada em indagação.
— Quem ainda lê o maldito jornal? − murmuro, com as minhas
bochechas ficando vermelhas com raiva e vergonha persistentes.
— Aparentemente você. − ele afirma sem rodeios.
Eu suspiro. — Bem, não mais.
— Você ainda está lendo esses artigos?
— Eles estão por toda parte! − eu explodo, levantando minhas mãos
com frustração. — A vítima do Ghost Killer faz isso, a vítima faz aquilo.
Quando vão parar de se referir a mim como uma vítima e não como uma
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maldita sobrevivente?
Mako abre a boca para falar, mas eu o interrompo. — Na verdade,
quando eles vão me deixar em paz? Quer eu seja uma vítima ou uma
sobrevivente, lembrar-me do meu trauma não é uma cura para mim!
A investigação foi encerrada rapidamente após a morte de Billy.
Com a declaração de Amar e Mako apoiando a minha, eles consideraram
o caso encerrado. O Ghost Killer estava oficialmente fora das ruas, isso
é tudo com o que eles realmente se importavam.
Decidi que era melhor fazer terapia. Seria muito hipócrita da minha
parte me tornar uma terapeuta, mas recusar o serviço para mim. Isso tem
ajudado, mas nunca poderei falar sobre a verdade real. O que fiz com
Ryan e Billy, e como os matei tão insensivelmente. Poucas pessoas
sabem a verdade, mas Mako é o único que realmente conhece os
detalhes do que aconteceu naqueles dois dias. É algo que aprofundou
tremendamente nossa conexão.
Algumas noites, ficamos acordados até o amanhecer, conversando
sobre meus sentimentos e pensamentos sobre o assunto enquanto ele
apenas escuta. Já concluí que não estou totalmente sã devido aos anos de
abuso e trauma. Certas coisas estão me provocando, mesmo algo tão
pequeno quanto Mako levantando as mãos em direção ao meu rosto.
Também concluí que Mako também não é são. Puramente porque
ele concorda em ficar com uma lunática como eu. Ele ama minha
loucura e aceita cada parte de mim, incluindo o lado sombrio e
assassino. Mesmo agora, ainda não aceitei isso totalmente. Há uma
pequena parte de mim esperando que Mako se vire para mim e se torne
um monstro familiar. Mas todos os dias, ele prova que é a coisa mais
distante de um monstro, e mais parecido com o cavaleiro de armadura
brilhante que eu nunca quis que ele fosse.
Mako larga o celular e se esgueira pelo sofá até se aconchegar ao
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meu redor.
— Não posso dizer por que eles escolheram vê-la como uma vítima
e não como uma sobrevivente, e não posso dizer por que escolheram vê-
la como uma história e não como uma pessoa, mas o que posso dizer é
que as pessoas que importam veem você como essas coisas. Você está
certa de que não está curando para você, então talvez seja melhor você
simplesmente parar de ler os artigos.
Eu suspiro, com meus ombros relaxando.
— Só quero que o resto do mundo siga em frente como estou
tentando fazer. Não quero mais ser conhecida como a namorada do
falecido Ryan Fitzgerald. Ou a vítima do Ghost Killer. Só quero ser eu e
o resto do mundo voltará a não saber quem eu sou.
Ele vira meu corpo e me pega debaixo da minha bunda e me coloca
em seu colo. Minhas pernas envolvem em torno de sua cintura. A calma
me atinge com sua presença me envolvendo. Por mais que minha
valentona interior odeie admitir, é aqui que me sinto mais segura. Nos
braços de Mako.
Minha vida era tão sombria antes de ele entrar na minha vida. Eu
estava constantemente cercada pelo mal do mundo que sugou todas as
coisas boas da vida de mim e me deixou com nada além da vontade de
morrer. Agora, tenho todas essas coisas de volta. Todas as coisas boas.
Tenho esperança. Amor. Segurança. Um futuro de verdade. E a vontade
de viver. Mako devolveu essas coisas para mim como se estivesse
tirando-as da lixeira de Achados e Perdidos e devolvendo-as ao seu
legítimo dono.
— É impossível que as pessoas se esqueçam de você, baby. Tudo o
que pode fazer é mostrar a eles quem você é. O que eles tiram disso não
é problema para você. Os pensamentos e opiniões de outras pessoas não
vão mudar você.
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Eu me inclino e dou um beijo suave em seus lábios.


— Obrigada, eu sussurro.
— Pelo que?
— Por me lembrar quem eu sou.
Eu sou digna. Sou forte. Sou independente. E sou uma sobrevivente.

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— Acho que é muito cedo para isso. − digo, com meus olhos fixos
em Bilby enquanto o acaricio. Ele olha para mim e pula para longe.
Acho que ele apenas me mostrou seu desacordo.
Ele se recuperou do período com Ryan. Mako e ele se apaixonaram.
Constantemente se abraçando e se entendendo. Acho que sou a segunda
favorita de Bilby agora. É tão irritante quanto fofo.
— O quê? − ele pergunta.
Movo meu dedo indicador entre mim e a sala de estar.
— Ficar aqui todas as noites. Deixar as roupas aqui. Eu estou
praticamente morando aqui agora. Tenho certeza de que é muito cedo.
Somos mesmo namorado e namorada? Você nunca me pediu em
namoro, você sabe. Você também nunca me pediu para me mudar. São
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essas coisas que devemos apenas supor, mas nunca falar? Não vamos
fazer aniversário...
— Baby, por favor, cale a boca. − ele pede baixinho, com sua voz
grossa mais baixa do que o normal. O som faz meu núcleo apertar com a
luxúria. Deus, o que sua voz pode fazer apenas comigo é totalmente
antinatural. E depois do incidente com a faca alguns meses atrás, meu
corpo ficou mais reativo a ele do que antes. A excentricidade de Mako
abriu uma nova porta de desejo para mim.
Meus lábios se fecham, ficando sérios. Eu estou nervosa. Não sei
por que estou nervosa, no entanto.
Mako caminha em minha direção. Ou melhor, ele espreita em
minha direção. Ele parece um tigre perseguindo uma presa pelo jeito que
ele se aproxima de mim. Prendo a respiração e meus nervos se acendem
como fogos de artifício. Quando Mako Fitzgerald volta toda a sua
atenção para mim, eu ganho vida.
— Você quer ser minha namorada? − ele pergunta, mas não do jeito
típico do ensino médio, mas sim, me perguntando o que eu quero. Ele
puxa meu corpo para a beira do sofá e se agacha diante de mim,
colocando as mãos em minhas coxas nuas. Arrepios se espalham pela
minha pele pelo toque de sua pele na minha. Estou muito arrebatada por
ele para ficar constrangida com minha reação.
Ele está sempre me dando uma escolha. Sempre me coagindo a
expressar minha opinião e defender o que quero. Tive meu livre-arbítrio
e voz roubados de mim desde que me lembro. Billy foi o primeiro, como
uma criança arrancando a laringe de uma boneca. Ninguém nunca me
deixou tê-lo de volta até Mako. É como calçar botas novas - dói e é
desconfortável, mas quando me acostumar, eu me sentirei segura e
confortável me defendendo. Sabendo que não vou mais levar um tapa na
cara - ou pior - porque falei.
— Sim. − digo finalmente. Mako não parece surpreso com a minha
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resposta. Suponho que colocar um rótulo não muda realmente as coisas


entre nós. Nesses últimos dois meses, Mako e eu deixamos de ser
apenas namorado e namorada.
— Você quer estar aqui todas as noites? − ele pergunta novamente,
com seus olhos verde-esmeralda ficando mais intensos.
Com Um único aceno, eu digo. — Sim. − sussurro.
— E se for demais para você, então você pode ir embora. − ele
afirma sem rodeios. Eu não me ofendo. É exatamente o que preciso
ouvir. — Mas admito, não quero que você faça isso.
— Você vai tentar me convencer a ficar?
— Sim. − ele murmura, deslizando as mãos em direção ao meu
short. Minha respiração fica presa na minha garganta. — Na esperança
de que você puxe uma faca para mim novamente.
Reviro os olhos, com um pequeno sorriso aparecendo em meu rosto.
Suas palavras tiveram o efeito desejado, no entanto, fazendo meu sangue
esquentar, apesar dos meus esforços para ficar fria. Eu nunca sou fria
quando se trata de Mako, no entanto. Sua presença consome qualquer
aparência de controle que possuo e se alimenta dela como um homem
faminto. Estou desequilibrada perto dele e nunca me senti tão bem.
— Talvez eu deva tentar ir embora, então. − digo em meio a um
suspiro, quando ele se abaixa para dar um beijo casto, mas eletrizante no
meu joelho.
— Ou talvez você possa ficar. − Minha atenção é desviada de seus
olhos magnéticos quando sinto algo frio deslizando em meu dedo anelar.
Um suspiro se aloja em minha garganta quando olho e vejo um lindo
anel de diamante com corte princesa em meu dedo. Meus olhos se
arregalam e voltam para os de Mako. Seus olhos fixam nos meus quando
ele se inclina e dá outro beijo casto no meu joelho. — Talvez só por um
tempinho?
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— Juro por tudo que é sagrado, estou me divorciando de você,
David. Quando esse bebê sair de mim, acabou. − Amelia grita em sua
cama de hospital. — Isto é tudo culpa sua. Insistiu em me engravidar e
agora eu... ahhhhhh! − Seu discurso é interrompido por outra contração.
Ela mostra os dentes rangendo, com o rosto ficando vermelho de dor.
David apenas senta lá calmamente e observa. Nós dois sabemos que
Amelia não quer dizer nada que sai de sua boca. Ela estava sentindo isso
no caminho para o hospital antes que as contrações começassem a ficar
mais intensas e próximas.
Ela passou de carinhosamente acariciando seu pau para querer
arrancá-lo em questão de minutos. Depois que Amelia foi internada e se
instalou, as ameaças de Amelia começaram. Ri quando David sutilmente
inclinou sua metade inferior para longe dela.
Ela entrou em trabalho de parto bem rápido. Alison, Mako e eu
estávamos visitando eles, bebendo vinho - menos Amelia - e comendo
tacos quando a bolsa dela estourou. Alison e eu pegamos carona com
David e Amelia, para que pudéssemos fazer o possível para confortá-la
enquanto Mako seguia atrás de nós. Ele e Alison ficaram fora do quarto.
Amelia gritou que não queria que Mako visse sua ostra e saísse -
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palavras dela, não minhas - e Mako parecia que acabou de saber que
ganhou na loteria e saiu correndo do quarto. Alison corou e o seguiu,
aparentemente não querendo ver a ostra de Amelia também.
— Você está coroando. Vou fazer você começar a fazer força em
um minuto. − Anuncia a enfermeira. A médica de Amelia entra correndo
no quarto um segundo depois, já a examinando.
— Estamos prontos para conhecer um lindo bebê? − A médica
pergunta animadamente e com um sorriso largo, seus dentes brancos e
retos contrastam fortemente com sua pele escura. Dra. Ivy Jackson é
uma das médicas mais renomadas do país, e Amelia se recusa a deixar
qualquer outra pessoa tocá-la durante o parto. Tenho certeza de que se a
Dra. Jackson não tivesse conseguido fazer o parto de Amelia, ela teria
tentado se esconder na teimosia.
— Doutora, tire esse alienígena de mim. − Amelia resmunga, com o
suor brilhando em sua testa. Dra. Jackson ri e fica entre as pernas de
Amelia.
— Não se preocupe, querida, este lindo menino vai nascer em breve
e você não sentirá nada além de amor. Eu prometo isso a você.
Antes que Amelia possa pensar em uma resposta, ela está gritando
de novo.
— Comece a empurrar. − ordena a Dra. Jackson. Só posso presumir
que Amelia está ouvindo com base em seu rosto roxo contorcido e nos
gritos intensificados que saem de sua boca. David segura a mão dela,
não parecendo nem um pouco incomodado com o fato de que Amelia
está esmagando-a. Não, ele está muito ocupado olhando maravilhado
para baixo entre as pernas de Amelia.
Alguns minutos depois, pequenos gritos substituem os de Amelia.
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Lágrimas já estão escorrendo pelo meu rosto no momento em que a


Dra. Jackson coloca o bebê nos braços abertos de Amelia.
Um amor indescritível brilha no rosto dela e de David enquanto eles
encaram o novo amor de suas vidas.
— Oi, bebê Beckham. − digo com a voz rouca e as lágrimas
entupindo minha garganta. Eu fungo e murmuro sobre seu rostinho fofo
e espremido.
Amelia olha para David antes de sorrir para mim.
— River Beckham. − Amelia diz. Eu paro de chorar e olho para
Amelia em estado de choque. — River é o nome do meio dele. E David
e eu ficaríamos muito honrados se você fosse a madrinha dele.
Um soluço sai da minha garganta. Eu coloco a mão sobre a boca e
aceno com a cabeça, oprimida pelo meu amor por meus dois amigos e
seu bebê.
Beckham é tirado de Amelia e em questão de segundos, a exaustão
toma conta de seu rosto. Ela se deita enquanto David vai ter seu próprio
tempo com Beckham.
— Eu te amo, River. − diz Amelia, cansada.
Pego a mão da minha melhor amiga. — Eu também te amo Amelia.

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— Estou tão feliz em ver vocês dois juntos. − Julie diz animada,
com as mãos entrelaçadas sob o queixo enquanto olha para Mako e
minhas mãos unidas com entusiasmo.
Um pouco exagerado, Julie.
Decidimos que era hora de vir jantar. Somos só nós três agora. Uma
grande diferença desde a última vez que estive aqui, há mais de um ano.
Ghost Killer não matou Ryan de verdade, nem Matt jamais sofreu
nenhuma consequência real por suas ações - além de perder sua esposa e
filho adotivo - mas ambos ainda são fantasmas para nós. Nenhum deles
está aqui, mas podemos sentir a presença deles de qualquer maneira.
Termino de comer a melhor torta de maçã de todos os tempos e
sorrio amplamente para ela, apreciando sua aceitação mais do que ela
jamais saberá. E também aprecio esta deliciosa torta de maçã.
Fiz Mako esperar para anunciar o nosso noivado depois que ele
colocou aquele anel no meu dedo há mais de oito meses. Achei
apropriado, considerando que não fazia nem um ano desde a morte de
Ryan e eu já havia superado ele. E Julie ainda estava se recuperando de
seu recente divórcio com Matt para completar. Esta mulher passou por
muita coisa no ano passado. Muita. Então, acho que se eu tivesse ficado
com outra pessoa, Julie poderia não ter ficado tão animada. Não que eu
fosse vê-la novamente de qualquer maneira.
Mako confessou o que sabia sobre Matt no dia em que seus pais o
visitaram no hospital. Deitado em uma cama de hospital, se recuperando
de um ferimento à bala. Mako culpa a morfina por deixar isso escapar
quando o fez, mas não se arrepende. Julie, é claro, entrou em negação.
Mas, eventualmente, Matt admitiu que tocou em Ryan.
Foi um turbilhão de drama depois disso. Julie queria que Matt fosse
para a prisão, mas não havia provas. Ryan está morto. A única
desvantagem desse fato, eu acho. Então, Matt se safou disso. Ele afirma
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que nunca tocou em nenhum outro garoto - apenas em Ryan. Mako e eu


nunca saberemos se isso é verdade, mas tenho a sensação de que Mako
vai ficar de olho em Matt enquanto ele viver.
Mako também está se recuperando daquele golpe. Eu pelo menos
tive o luxo de saber que minha mãe era uma merda desde o início. Mako
foi enganado por toda a sua vida, acreditando que Matt era um pai
incrível e um cara respeitável. Ele ainda está aceitando isso, mas está
melhorando.
Ele ainda tem Julie. Nós dois temos.
Cerca de três meses após o incidente com o Billy, Mako foi
promovido a sargento. Em sua cerimônia, finalmente enfrentei a mãe de
Mako. Depois de um sincero pedido de desculpas - o que eu realmente
quis dizer com minha alma, porque apesar de Ryan ser um agressor, não
é fácil para ninguém enterrar seu filho - ela me perdoou imediatamente.
Ela presumiu que eu estava muito perturbada com a morte de Ryan para
aceitar e obviamente tinha uma boa desculpa para não comparecer ao
funeral.
Mako e eu não anunciamos que estávamos juntos naquele dia - tirei
o anel do dedo antes de encará-la, mas quando a cerimônia de Mako
terminou e ele veio ficar ao meu lado, pude ver nos olhos escuros de
Julie um brilho de esperança.
Sentimos que hoje era finalmente o dia de anunciar nosso noivado.
Dissemos a Julie que nossa conexão floresceu quando ele me salvou do
Ghost Killer. Era fácil contar uma história de amor do cavaleiro que
salvou a princesa do covil do dragão. A mãe de Mako engoliu a história
e disse que era natural que nos sentíssemos atraídos um pelo outro.
— Só sei que Ryan adoraria ver vocês dois juntos. − ela continua.
Meu sorriso vacila e é preciso muita força para mantê-lo em meu rosto.
— Mãe. − Mako adverte. — Não torne isso estranho.
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Muito exagerado, Julie.


Ela acena com a mão, perplexa com suas palavras. Mencionar Ryan
ainda é... delicado. Julie ainda está de luto e, às vezes, até mesmo dizer o
nome dele a faz chorar. Toda vez que testemunho sua dor, a culpa se
aloja profundamente dentro de mim.
Não sou uma sociopata. Ela está vivendo com um buraco no peito
todos os dias porque matei seu filho. Ele merecia isso? Absolutamente.
Mas Julie? Ela não merecia nada que surgiu em seu caminho. Eu
gostaria que houvesse uma maneira de acabar com a dor dela sem voltar
atrás em minhas ações, mas estamos vivendo longe de um mundo
perfeito.
— Está tudo bem. − digo levemente. — Acho que ele teria ficado
feliz também.
Mako aperta minha mão em resposta. Ryan teria ficado furioso. Mas
o bom disso é que Ryan está morto.

— Ah, porra.
— O que?
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— Ahhhh, porra. − gemo. Meu marido entra no banheiro, com nada


além de shorts de basquete, quase caindo sobre mim em sua busca para
me salvar de... Não sei do que ele pensou que precisava para me salvar.
Ele para, inspeciona meu corpo perfeitamente intacto e então olha
para mim novamente com confusão. Eu inspeciono seu corpo também,
momentaneamente distraído de sua crise quando dou uma boa olhada em
seu tanquinho e tatuagens cobrindo ambos os braços.
Eu nunca vou me acostumar com o quanto delicioso ele é.
— O quê? − ele pergunta novamente, trazendo-me de volta à
realidade.
— Isso! − eu exclamo, empurrando o pauzinho em suas mãos.
Ele olha para ele com uma mistura de choque, admiração e horror.
De alguma forma, todas essas três emoções são igualmente destacadas
em seu belo rosto. Eu ainda estou sentindo essas mesmas emoções.
Grávida.
Apenas alguns anos atrás, eu olhei para um teste de gravidez e senti
que minha vida estava possivelmente acabando. Estava em um
relacionamento abusivo com um homem mau que estava tentando me
prender. Ele me drogou com antibióticos para que meu anticoncepcional
fosse desativado, só para que eu nunca pudesse deixá-lo. Felizmente, o
teste deu negativo.
Agora, meu marido olha para mim com apenas uma emoção. Amor.
Não estávamos planejando ter um bebê por mais alguns anos. Filhos
foi algo que discutimos e concordamos abertamente, mas nenhum de nós
estava pronto para dar o próximo passo. Temos aproveitado demais
nosso tempo juntos e nos contentamos em permanecer egoístas por
enquanto e apenas estar juntos.
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Além disso, Beckham também nos manteve nos afastando disso. O


filho de Amelia e David é bastante complicado. Ele fica com Mako e eu
duas vezes por mês, e quando Amelia vem buscá-lo, temos um pouco de
novos cabelos brancos surgindo e olheiras sob nossos olhos. E todas as
vezes, Amelia vai embora gargalhando.
Depois que tudo sobre Ryan veio à tona, e eu admiti para Amelia
que Alison não é uma vadia sabotadora do mal como eu a levei a
acreditar, Alison se viu jogada em nossa pequena família. Ela é
considerada tia Ali para Beckham e provavelmente tão traumatizada
quanto Mako e eu depois que ela cuida dele.
E agora, Mako e eu não temos mais a opção de sermos egoístas.
Porque nós estamos tendo um maldito bebê.
— Como está se sentindo? − ele sussurra, com as suas mãos
deslizando em volta da minha cintura e me puxando para perto. Olho
para onde nossos peitos se encontram. Em cerca de oito meses, uma
barriga grande e redonda vai nos impedir de chegar tão perto. Porque vai
haver um bebê entre nós.
— Eu estou assustada. Aterrorizada, na verdade.
Ele acena com a cabeça, com o mesmo sentimento estampado em
seu rosto.
— Também estou com medo. Isso é mais cedo do que esperávamos,
mas estou pronto para isso.
Olho em seus olhos, tentando encontrar qualquer indício de mentira.
Alguma indicação de que ele está com medo da ideia de ter um filho
comigo. Mas tudo o que posso encontrar é devoção.
Meu peito se enche de calor. — Contanto que você esteja ao meu
lado, eu também estou pronta.
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Ele sorri amplamente, exibindo seus dentes brancos e retos e


fazendo com que a pele enrugue ao redor dos olhos. Mako tem o sorriso
mais lindo que já vi. É tão genuíno. Cada vez que o vejo, parece que
estou olhando diretamente para o sol. É lindo.
Eu gosto dessa palavra agora. Mako deu um novo significado a isso.
Assim como ele deu um novo significado à vida.
Meus olhos se fixam na cicatriz de seu ferimento à bala. É um
lembrete constante do quanto Mako fez por mim. Sacrificado por mim.
De aparecer na minha vida e tentar me fazer ver a luz e me ajudar, de
encobrir o assassinato de seu irmão para mim e depois vir para me salvar
de Billy e levar um tiro no processo.
Mako não me devia absolutamente nada quando nos conhecemos.
Eu era apenas mais uma mosca na teia de aranha de seu irmão. Assim
como Alison tinha sido. Ele era o único que conhecia a verdadeira
natureza de Ryan Fitzgerald. E em vez de deixar as moscas serem
comidas vivas, Mako saiu de seu caminho para desfazer a teia em que
estávamos tecidas e nos ajudar a fugir. Devo minha vida a este homem.
Até hoje, Alison compartilha o mesmo sentimento.
— Você acha que eu serei uma boa mãe?
— Acho que você viu o exemplo perfeito do que uma mãe não
deveria ser. Acho que você será perfeita.
Meus ombros caem de alívio. Mako está certo. Barbie fez tudo
errado comigo. E é exatamente por isso que não a vejo desde que a
presenteei com a casa em Shallow River. Barbie não merecia nenhuma
parte do presente, mas eu queria cortar todos os laços com ela. O que
acontece com ela e aquela casa não é mais uma preocupação para mim.
Mako admitiu que foi vê-la quando Billy me levou. Ele nunca disse
o que disse a ela, mas pela maneira como Barbie olhou para Mako com
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respeito relutante, e talvez um pouco de amargura, imagino que ele


tenha feito o equivalente a atropelá-la com um caminhão e depois dar ré
sobre ela.
— Você vai ser um ótimo pai também. Se tivermos uma menina, sei
que ela será virgem até os trinta anos.
Ele ri. O som me enche de tanta felicidade. — Não. Recuso-me a
ser um desses pais que tentam controlar a vida sexual da filha. Sempre
achei assustador quando os caras fazem isso. A única coisa que tenho o
direito de fazer é mostrar a ela como um homem trata sua mulher, e ela
aprenderá isso nos observando juntos. E só espero que ela seja honesta
conosco, para que possamos garantir que ela saiba se está sendo tratada
corretamente.
Lágrimas inesperadas surgem em meus olhos. Eu não sabia o quanto
precisava ouvir que tipo de pai Mako planeja ser. Mas saber que ele vai
ser tão bom para a nossa filha está causando todos os tipos de emoções
dentro de mim. Tanto amor e felicidade. E definitivamente muito tesão.
Ele sorri com a minha reação. Minhas bochechas ficam vermelhas
de vergonha. Não costumo chorar.
— Hormônios. − murmuro.
Abafo sua risada com um beijo, fazendo-o rapidamente calar a boca.
Estou tão pronta para viver o resto da minha vida com este homem. E a
melhor parte é que estamos apenas começando. Eu me afasto e esfrego a
mão em meu abdômen.
— Já sei como vou chamá-la se for uma menina.
— Como, baby?
Eu sorrio, olhando para a minha barriga chapada. Já estou ansiosa
para ver minha barriga crescer.
— Camilla. Quero chamá-la de Camilla.
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Ele me dá um sorriso amplo. — Ele é lindo.


Filhos da puta.
Eu odeio os dois. Meu pai idiota é a única razão pela qual estou aqui
nesta merda de delegacia enfrentando um ser humano ainda mais idiota.
Se é isso que diabos você quer chamá-lo.
Benedict Davis está sentado na minha frente, se mexendo como um
verdadeiro viciado em crack. Esfregando os braços, cutucando o rosto
cheio de cicatrizes e acne.
Ele é nojento. Um desperdício de carne humana, se é que já vi um.
— Olá, Sr. Davis. − sorrio, exibindo um sorriso amplo quando me
sento em frente a ele. Estou tentado a ranger os dentes.
Benedict olha para mim. Eu deveria estar olhando em olhos
dilatados. Olhos vidrados com qualquer droga que esteja percorrendo
por seu sistema. E enquanto vejo a dilatação, o que realmente vejo sou
eu mesmo.
Um vazio de escuridão me encara. Seus olhos estão vazios. Este
homem não tem alma.
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O sorriso permanece em meu rosto, mas é como forçar um músculo


cansado a levantar pesos.
— Oi. − ele diz rapidamente, apressado. Forçado. Seus movimentos
são tão forçados. Com os olhos ardilosos e os dedos trêmulos.
Interessante.
O que possivelmente levaria um homem a entrar aqui com uma
personalidade falsa? Bato meus dedos na mesa, contemplando a situação
que estou enfrentando. Este não é apenas um viciado. Este é um homem
que esconde algo. Que está fingindo.
A única boa razão para alguém fazer isso é porque deseja
informações sobre a investigação.
Eu sorrio.
E a única razão pela qual alguém quer informações sobre a
investigação é porque tem uma conexão com o suspeito.
— Fui informado de que você é uma testemunha-chave. − eu
começo, abrindo meu caderno. Apenas uma formalidade. A conversa
que pretendo ter com esse homem não ficará anotada em meu caderno.
Será uma conversa que ninguém mais saberá.
— Do Ghost Killer. − eu anuncio. — O notório senhor do crime
matando dezenas de homens.
Benedict está sentado à minha frente, mantendo-se firme em seu
fingimento.
— Isso mesmo. − ele confirma, coçando o braço. — Eu testemunhei
um assassinato. Não quero ninguém vindo atrás de mim, cara. Aquele
grandalhão lá fora, o detetive, ele me prometeu proteção.
Eu aceno com a cabeça. Por fora, sou um advogado encantador,
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completamente à vontade. Por dentro, quero colocar minhas mãos em


volta do pescoço desse cara e quebrar seu crânio no cimento. Ver o que
realmente está acontecendo dentro de sua cabeça.
Ele não é quem diz ser, disso tenho certeza. Ele está se esforçando
demais. Eu também sou um mestre da manipulação, sei como identificar
a manipulação a uma milha de distância. É incrível que ninguém possa
ver através das bobagens de Matthew Fitzgerald - quase rio que
Benedict Davis pensou que poderia me enganar.
E sei disso porque mentes semelhantes se reconhecem. Quando
você tem uma escuridão sugadora de almas residindo dentro de você,
você tende a se sentir atraído por aqueles que também têm um buraco
negro no lugar do coração.
Foi o que me atraiu para meu pequeno animal de estimação em casa.
Ela é sombria por dentro - um efeito colateral da cidade repulsiva em
que foi criada. Na maioria das vezes, só de olhar para ela me dá nojo.
Mas ela é um cachorrinho tão ansioso, esperando em casa que eu a use
até ficar entediado. Ela está sempre esperando por mim. Quase de
joelhos, implorando para chupar meu pau metade do tempo. Ela está tão
ansiosa para agradar que tive que mantê-la por perto.
Se não fosse por seus seios empinados e bunda redonda, e como sua
boceta é apertada, eu a teria descartado há muito tempo. Ela é chata fora
do quarto.
— Isso não será um problema, Sr. Davis. − eu respondo, afastando
meus pensamentos de River. — Primeira coisa primeiro. Vamos falar
sobre esse assassinato que você testemunhou.
— Bem... − ele começa lentamente. — Eu estava andando pela 1 st
Street.
— 1 st Street? − eu interrompo. Seus olhos brilham, com uma fúria
fria que combina com a fúria que se instalou dentro da minha própria
alma. A emoção se esvai, como óleo escorrendo do vidro.
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— Nã... não. Desculpe. − ele se desculpa, tossindo uma risada


nervosa. — 3rd Street é o que eu quis dizer. Eu estava andando pela 3rd
Street quando vi um homem encapuzado segurando uma faca
ensanguentada.
— Que tipo de faca? − pergunto, cruzando meus dedos.
— O que você é, um detetive ou a porra do meu advogado? − ele
diz.
Sorrio - um sorriso de verdade desta vez. — Como seu advogado, é
importante que eu tenha todos os detalhes, Sr. Davis. Preciso ter certeza
de que estou totalmente preparado para quando você testemunhar.
Eu quase engasgo com as palavras falsas. Na realidade, eu não dou
a mínima para ser advogado. Meu objetivo original era assumir a
empresa do meu querido pai e destruir tudo o que ele construiu de dentro
para fora. Eu queria que essa porra de empresa desmoronasse sob meus
pés enquanto meu pai se ajoelhava diante de mim, beijando os meus
sapatos e implorando por sua vida patética.
A única maneira verdadeira de ferir um sociopata como meu pai é
humilhá-lo. Ele é tão bom em fingir emoções reais, tão bom em bancar o
homem encantador que daria a qualquer um a camisa que estivesse
vestindo ou ajudaria uma criança indefesa e necessitada.
Sim, ajudar uma criança é o que ele adoraria fazer. Quanto mais
indefesas elas são, mais fracas, mais duro seu pau fica.
Agora? Agora vejo os benefícios nesta carreira. Algo em que até
meu pai tinha se envolvido várias vezes. Com uma profissão como essa,
surgem conexões. Grandes malditas conexões. Em um mundo como
este, posso fazer o que quiser. Aprendi essa lição com Alison. E agora,
sou imparável. Vou escalar essa cadeia alimentar, pisando na cabeça de
quem se meter no meu caminho.
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E vou começar com o Ghost Killer.


— Tudo bem. − ele bufa. Ele continua o resto de sua história, com
imprecisão após imprecisão. Meu irmão idiota já me deu um resumo de
sua história. E, no entanto, tudo o que ouço são mentiras saindo da boca
rachada e suja desse homem.
— Então, qual é a verdadeira história? − pergunto. O rosto de
Benedict fica sério. Minha máscara encantadora escorrega e eu mostro a
ele meu rosto real. — Vamos lá, nós dois sabemos que você está
mentindo. Testemunhar o assassinato do Ghost Killer? Se ele fosse
estúpido o suficiente para cometer assassinato em plena luz do dia, ele
com certeza não estaria fugindo.
— É Shallow Hill, cara. Assassinatos acontecem em plena luz do
dia o tempo todo.
— Então por que você está delatando? Se você está tão acostumado
a testemunhar assassinatos, por que denunciar este? Como você sabia
que ele era o Ghost Killer?
Benedict apenas olha para mim, com sua expressão suavizada em
uma tela cuidadosamente em branco.
Trago minha cadeira para mais perto, com o metal rangendo de
forma desagradável contra o piso de ladrilhos. Os olhos de Benedict
piscam com o som. Este homem provavelmente está drogado, com o
olhar dilatado e acne. Mas ele tem muito mais controle sobre isso do que
faz as pessoas pensarem.
— Aqui está a coisa, Sr. Davis. Acho que podemos nos ajudar
muito. Aquele detetive lá fora? Ele é meu irmão. E eu adoraria nada
mais do que tornar a vida dele miserável. Vou arriscar aqui e dizer que
você também não está aqui para facilitar a vida dele.
Página 492

Eu estou fazendo uma aposta. Uma grande aposta do caralho. Mas


este homem... eu sei disso profundamente em meus ossos. Ele é como
eu.
Sombrio. Depravado. Com uma fome de machucar.
Este não é um amigo do serial killer. Não, não. Ele é muito ousado.
O que deixa apenas uma outra opção. Ele é o serial killer.
Meu, meu. E aqui eu pensando que meu dia ia ser um inferno. Em
vez disso, posso falar com o próprio Ghost Killer.
É ridículo que Mako se considere um maldito detetive. O assassino
está na cara dele.
— Então, aqui está o que podemos fazer. Diga-me quem realmente
é, Sr. Davis. E vou garantir que você nunca seja pego.
Os tremores param. A inquietação. Toda a porra da fachada. E,
finalmente, fico cara a cara com o verdadeiro Benedict Davis. Um
assassino de sangue frio. Um homem que tem uma agenda. Uma que
vou arrancar de suas mãos e rasgar em pedaços. E ele vai rastejar
quando eu terminar.
Ele me observa de perto, com seu olhar astuto. Seus olhos glaciais
parecem o bico de um pássaro cutucando minha pele, abrindo buracos na
máscara até me expor completamente. A sensação me faz querer
envolver minhas mãos em seu pescoço, mas algo me diz que Sr. Davis
iria gostar.
— Você tem bolas de aço, eu vou dizer isso de você, Sr. Fitzgerald.
− Benedict responde depois de um momento. Levanto uma sobrancelha.
Esse idiota não me intimida. Em breve, também o terei ajoelhado diante
de mim. Terei o maldito mundo inteiro ajoelhado diante de mim.
O ato de cara durão é chato, mas vou jogar junto por enquanto.
Página 493

Benedict Davis pode ser um grande aliado. Ele ganhou meu respeito
apenas por escapar das garras de Mako por tanto tempo. Quem dificulta
a vida dele, facilita a minha vida.
— Entre outras coisas. − digo casualmente.
Benedict debocha, aparentemente contemplando algo. Ele está
tentando decidir se deve me matar ou não? Ele não irá muito longe.
— Chame-me de Billy. − Um sorriso surge em seus lábios e ele se
inclina para frente, entrelaçando seus dedos calejados e imitando minha
posição. Eu olho para suas mãos, notando as cicatrizes. Aposto que o
corpo desse homem está coberto por elas. Não dou a mínima para como
ele as conseguiu - é o que elas representam. Ele não tem medo de sujar
as mãos. Obviamente, pelos corpos que encheram minha cidade no ano
passado.
Eu poderia usar músculos assim. Eu serei o mentor, ele pode ser
meu cachorro leal e arrancar a cabeça de qualquer um que eu mandar.
— Diga-me, Ryan. O que você poderia ter para me oferecer que eu
gostaria?
Meu sorriso cresce.

Uma loira peituda enfia seus seios falsos na minha cara. Ela os
segura, pressionando-os juntos e beliscando um de seus mamilos. Eu
curvo meus lábios. Suas unhas rosa brilhante são mais longas do que o
pau do meu pai. É nojento.
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— Preciso de homens em quem possa confiar. − diz Billy ao meu


lado, fumando um charuto que custa mais do que meu carro e olhando
para a mulher que está chupando seu pau. O batom vermelho mancha
seu pau enquanto a garota baba em cima dele. Ela está se esforçando
muito, e não parece que o idiota ao meu lado vai gozar tão cedo.
Ele permite que ela se divirta de qualquer maneira. Eu sorrio. Que
deixe seu queixo cair. Então, pelo menos, ela estaria proporcionando
entretenimento de verdade.
— Esses são difíceis de encontrar. − eu concordo. A loira na minha
frente abre minhas pernas e fica de joelhos diante de mim. Meu pau
endurece em minha calça enquanto ela abre o zíper e tira meu pau. Ela
masturba meu pau algumas vezes antes de colocar a boca quente em
torno da ponta e depois me engole inteiro.
Engulo um gemido enquanto ela me chupa. Tiro meu celular do
bolso e abro meu aplicativo de rastreamento. Normalmente me esqueço
de River quando a boca ou a boceta de outra garota está no meu pau,
mas essas vadias burras estão agindo como se estivessem em um set
pornô. Com todos os gemidos falsos e movimentos exagerados.
Quase jogo o celular pela sala quando vejo que minha garotinha má
não está onde deveria estar. Ranjo os dentes, com a raiva crescendo em
meu peito. Ela está na porra da casa da prostituta - Amelia. Eu disse a
ela para ficar longe daquela vadia. Parece que River gosta de ser punida.
Ainda bem que eu amo machucá-la.
Por enquanto, vou machucar a vadia estúpida que tem a audácia de
chupar meu pau como um aspirador quebrado. Eu envolvo minha mão
em seu cabelo descolorido e a forço para baixo. Ela engasga e pressiona
as mãos nas minhas pernas para tentar me afastar. Eu a seguro firme e,
finalmente, sinto meu orgasmo crescendo.
Billy ri da garota. E quando vejo lágrimas escorrendo por suas
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bochechas pintadas, eu a solto. Ela se afasta, ofegante. Mantenho minha


mão firmemente em seu cabelo, não a deixando ir muito longe. Ela
respira fundo antes de eu forçá-la a descer. Leva mais um minuto de seu
engasgo antes de eu gemer, com o meu orgasmo destruindo minha
espinha. Gozo quente desce por sua garganta. No segundo em que ela
arranca a última gota de mim, eu a afasto. Ela se afasta, com lágrimas
escorrendo pelo rosto e um soluço se libertando.
Sorrio e Billy bufa. — Foda doente. − ele murmura. Billy está
contente em soltar a garota antes dela cortar seu pau.
Enfio o meu celular no bolso enquanto Billy continua. — Quero
expandir meus negócios globalmente. Não apenas nos estados, mas
quero meu produto em toda a América do Sul para começar. A partir daí
começaremos a cruzar mares.
Grandes aspirações para alguém que continua matando sua equipe.
Ele não está apto para ser um líder, mas vou deixá-lo pensar assim por
enquanto. Vou ter que ser esperto sobre isso. Billy é viciado em seu
próprio produto e deixou claro que tem um pavio curto quando está
chapado.
— Eu sei exatamente como fazer isso acontecer. − eu respondo.
Billy se inclina para mais perto de mim, com a bebida forte em seu
hálito fazendo meu nariz arder. — Isso é ótimo, garoto, mas você fala
demais. Você sabe o que eu exijo de meus homens? Apólice de seguro.
Se eu já não tivesse controle, teria enfiado meu punho na garganta
desse idiota e arrancado sua laringe. Com quem diabos ele pensa que
está falando? Eu engulo as ameaças, com minhas promessas não ditas
parecendo pedras descendo pela minha garganta. Mantenho meu rosto
inexpressivo enquanto encontro seu olhar.
— Que tipo de apólice de seguro?
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— O tipo que anda e fala. − Quando não respondo, ele esclarece:


— Sua linda namoradinha. Ela é minha apólice de seguro. Se você me
trair, garoto, ela morre. Você entendeu?
Ele me investigou. Não é surpreendente. Eu teria feito o mesmo.
Eu quase rio. Ele quer River? Isso é como entregar um tostão sujo.
Posso encontrar muitas Rivers. Ela é substituível.
Eu não deixo Billy saber disso, no entanto. Ele precisa pensar que
está me controlando.
Eu franzo minha sobrancelha, e me certifico de parecer descontente.
— Essa é minha garota, cara. − eu argumento, forçando a hesitação
em meu tom. Ele encolhe os ombros, se endireita e dá uma tragada no
charuto.
— Essa é a nossa garota agora, Ryan. Tudo o que você possui,
agora é meu. Não me faça vir cobrar.
Concordo com a cabeça, parecendo ceder às suas exigências. Por
dentro, a excitação substitui a raiva persistente. O tempo com River é
limitado, isso eu já sabia. Não preciso me preocupar com Billy
colocando as mãos nela. Minha florzinha será quebrada muito antes
disso. Se Billy a tocar, será porque eu a joguei fora, como um osso para
um cachorro faminto. Ele não terá nada além de uma casca quebrada de
garota e eu estarei sentado no meu trono.
Bem onde eu pertenço.

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