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Olavo de Carvalho
Já me debrucei, anteriormente, sobre as problemáticas entre moral e ficção. É dever moral do artista –
afirmei no artigo “Arte Moral” – realizar uma obra bem-feita, residindo a moralidade justamente no
fazer bem, e a imoralidade no fazer mal. Também expus que a moral é parte constitutiva da própria
Arte, mais precisamente sua causa material: assim como a argila é a causa material do boneco de
argila; para ser sucinto, os temas, as ideias filosóficas, as percepções de mundo e cosmovisões são a
causa material de uma obra, seu conteúdo. Desse modo, toda a forma de uma obra de arte é
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28/04/2023, 16:28 A ARTE E A BUSCA DA VERDADE – Entender Ficção
arquitetada justamente para melhor conter esse “algo” que lhe serve de tema. Relembrando
novamente Aristóteles, a matéria prima para a narrativa é o deslizamento entre o vício e a virtude.
Contudo, pouco me alonguei sobre o tema “verdade e ficção”. Os ditos estudiosos de literatura e arte
sofrem de uma falsa dicotomia entre forma e conteúdo, beleza e moralidade e, principalmente, beleza
e verdade. Parece-me – e aqui não sei se estou certo disso – que toda confusão mental da modernidade
remete, em algum grau, à bifurcação cartesiana, ou, como diz o lugar-comum: “onde há emoção não
pode existir razão”. Porém, posso afirmar com total certeza que a maior parte dos erros filosóficos, ao
menos no que concerne meu campo de estudo, se dá por algum engano sobre as causalidades
aristotélicas, isso quando não é uma má compreensão de essência e acidente, gênero ou espécie.
Há coisas que não se separam na realidade, a não ser por motivos didáticos: ao confrontar forma e
conteúdo na Arte, podemos exaltar mais um aspecto, ora outro, para melhor examinar dialeticamente
as propriedades de uma obra. O problema ocorre justamente na premissa de que um anulará o outro,
ou o sobrepujará de modo antagônico. Ao nos depararmos com uma obra “bem escrita”, mas sem
conteúdo, feito carne sem sangue, estamos diante de beletrismo puro e simples; já quando nos
deparamos com uma obra com muito conteúdo e nenhuma estrutura decente que o comporte,
estamos diante de um tecido adiposo inútil, sem ossos ou músculos. Em ambos os casos, uma “sandice
tópica”, como diria Nabokov.
Dito isso, não podemos nos esquecer que o Esteta, ou todo aquele que pretenda sê-lo, deve ser um
filósofo em sua natureza, sendo a Filosofia, nas palavras do filósofo Olavo de Carvalho, é a “busca da
unidade do conhecimento na unidade da consciência, e vice-versa”. Enfatizo o verbo buscar, pois esse
processo nunca estará completo durante o tempo de vida de um filósofo, ou de qualquer ser humano.
A onisciência a Deus pertence, resta ao homem perambular pelo pó em busca de algum sentido que o
guie. Nossas percepções, memórias e mesmo instintos, são de natureza fragmentária; precisamos de
um esforço constante para mantermos o conhecimento do que sabemos, enquanto expandimos os
horizontes da consciência com novos dados adquiridos pela experiência, seja ela real ou imaginativa.
Tanto o Esteta, quanto o Crítico, quanto o Artista precisam ter esse ideal de busca pela verdade, que
se manifestará a seu próprio modo em cada um dos campos de estudo.
Não sou Esteta, ainda, no sentido que não atingi o patamar de oferecer alguma contribuição para o
campo da Filosofia Estética; o sou com E minúsculo, esteta, apreciador da Beleza, um dândi. Em
suma: este que vos fala não diz nada de novo nessa disciplina, e tem um longo caminho a trilhar para
construir “um pensamento próprio”, por assim dizer. Talvez na velhice meus leitores vejam algum
livro sobre o assunto, porém, no presente momento, limito-me a explicar as teorias que assimilei e que
mais me parecem explicar a realidade concreta, não as que servem a uma mera conveniência
dogmática. Primeiramente sou um Artista que busca explicar as coisas da maneira mais exata possível,
seguindo o exemplo de Flaubert, me valendo, ora ou outra, de alguma bagagem filosófica adquirida
no estudo da Estética, estudo esse muitíssimo benéfico e introdutório para outros campos da Filosofia.
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28/04/2023, 16:28 A ARTE E A BUSCA DA VERDADE – Entender Ficção
O estudo sério das obras de Arte e da Estética, com método, rigor e padrões objetivos, serve ao
intelecto como ponto de partida para campos mais profundos do conhecimento. Uma obra de arte,
por sua limitação, encerrada em si mesma, favorece exercícios analíticos e dialéticos durante sua
investigação. É preciso, primeiro, compreender filosoficamente o objeto, classificar-lhe gênero e
espécie, reconhecer-lhe as causalidades, enquanto avalia-se o objeto em si mesmo, recorrendo, em sua
última etapa, à Crítica para emitir um juízo de valor retoricamente, refinando também o apuro
linguístico do estudante sério. Em suma: a pedagogia da arte não se limita à educação moral dada para
crianças, pelo contrário, se estende a todo um emaranhado de disciplinas mais palpáveis que
abstrações metafísicas mais complexas.
Escolher uma abordagem para o estudo da Arte nos põe um problema metodológico ser resolvido,
logo a princípio: qual a delimitação do objeto que desejamos estudar, sob qual aspecto? Caso o
estudante escolha justificar as bases metafísicas de um gênero artístico, incorrerá para a Filosofia; caso
escolha investigar a evolução das obras ao longo do tempo, para a História da Arte; caso deseje
descobrir quais são os melhores ou piores artistas de uma época, para a Crítica. Obviamente esses
campos se mesclam, se complementam, mas é preciso distinguir muito bem os meios e fins utilizados
no trabalho intelectual.
Por isso, um estudante sério jamais parte de premissas preconcebidas, distorcendo os dados da
realidade àqueles dogmas convenientes de que falei: antes, é humilde e, diante de um novo fato que
refuta sua hipótese inicial sobre o assunto, reorganiza toda a estrutura de seu conhecimento na
consciência; e esta última exige total sintonia do senso moral, intelectual e mesmo estético do
indivíduo. É preciso que ela expanda e se adeque às novas percepções da realidade, do contrário
colapsa na tentativa de conciliar o inconciliável.
Um bom crítico ou esteta, por exemplo, revisará constantemente seus parâmetros em busca de falhas,
injustiças ou incoerências; deixará de sê-lo bom crítico a partir do momento em que, permitindo que
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a mentira venha ao mundo, ignorar sua consciência moral ao não admitir ter errado em seu juízo,
tendo se confrontado com o erro. Tendo falhado honestamente, o crítico age tão somente de acordo
com sua própria consciência, e pode até ser desculpado do equívoco em caso de arrependimento
eficaz, isto é, a autocorreção. A busca pela Beleza, na Arte, leva à busca da Verdade. Aquele que se
engana por mera ignorância, erra por falta de luz; quem permanece no erro por vaidade é cego para a
realidade.
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CAIO CESAR
15 DE MAIO DE 2022 EM 10:08
“A busca pela Beleza, na Arte, leva à busca da Verdade. Aquele que se engana por mera ignorância,
erra por falta de luz; quem permanece no erro por vaidade é cego para a realidade.”
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