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ATUAÇÃO DOS PSICÓLOGOS NO CAPS

O trabalho dos psicólogos no Centro de Atenção Psicossocial, é, em essência,


destinado a acolher pessoas em sofrimento psíquico, no sentido estimular a integração
social e familiar dos seus usuários; apoiar os usuários em suas inciativas de busca da
autonomia; oferecer aos usuários, em conjunto com equipe multiprofissional, cuidados
não somente no que se refere aos aspectos sintomáticos ou clínicos, mas, na busca pela
integração dos sujeitos a um ambiente social e cultural concreto (“território”), o espaço
da cidade onde se desenvolve a vida cotidiana, inclusive das suas famílias, de acordo
com o que afima o Ministério da Saúde (BRASIL, 2009).
Sob o aspecto histórico, a entrada do psicólogo no setor público de saúde, no
final da década de 70 e na década de 80, a deu-se em um cenário em que o modelo
médio-assistencial privatista estava no seu auge, conforme o texto da Referências
Técnicas para Atuação de Psicólogos no CAPS (DIMENSTEIN, 2009).
Paralelamente a esse quadro, segundo o texto mencionado acima, o Brasil
enfrentava um período de alta recessão, inflação galopante, e níveis assustadores de
desemprego, com importantes cortes nos programas sociais e de saúde, afetando as
condições de saúde de grande parte da população e pressionando ainda mais a frágil
assistência oferecida.
Esse período ficou caracterizado pela perda de eficiência e qualidade dos
serviços prestados, gerando um esgotamento no setor.
Na área de psiquiatria, o psicólogo começa a compor equipes multisciplinares –
alternativa em resposta às críticas feitas ao modelo asilar, que mantinha os pacientes
completamente isolados e em tratamento por tempo indeterminado, com claras
consequências iatrogênicas (DIMENSTEIN, 2012).
As Referências Técnicas para Atuação de Psicólogos no CAPS, discorre que, em
decorrência de um forte e perseverante movimento que combatia severamente o modelo
manicomial (luta antimanicomial) - negligente e ineficaz existente à época - que
inclusive aumentava a dívida pública do Brasil, além de todo o mal que perpetuava na
vida dos pacientes, surgiu a proposta de um novo modelo que enfatizaria a
desospitalização com ênfase nos serviços extra-hospitalares e de base territorial, já na
perspectiva de não retirar dos pacientes a liberdade de ir e vir, tampouco o convívio dele
em sociedade.
Ainda segundo as Referência Técnicas para Atuação de Psicólogos no CAPS, o
campo da saúde mental configurou-se como um grande campo que absorveu
profissionais da psicologia de todas as regiões do país, compondo um novo arranjo cuja
proposta era baseada na adoção de modos heterogêneos de cuidado e a singularização
da atenção, e que também pretendia respeitar e considerar a diversidade cultural e
subjetiva dos usuários.
Segundo Dimenstein (1998), o modelo clínico liberal que norteava o processo de
formação dos psicólogos mostrou-se insuficiente para “dar conta” do novo desafio que
se desviada dos parâmetros tradicionais, e, como consequência, iniciou-se diálogos com
as instituições de ensino superior, que, para ele, deveria ser uma atitude continuada.
A saúde mental, ao contrário do modo como era vista há décadas, não pode ser
reduzida à psicopatologia, ao diagnóstico e à medicação. Ela se apresenta tão complexa,
plural, intersetorial e com tanta transversalidade de saberes, a ponto de encontrarmos
dificuldades de delimitar seus limites, trazendo à tona a necessidade de diálogo entre a
psicologia e as ciências biológicas com outras áreas do conhecimento, como a
antropologia, a sociologia, a história e a arte (AMARANTE, 2007).

Ainda segundo Amarante (2007), não bastava reduzir a Reforma Psiquiátrica à
descontinuação dos manicômios, ou introduzir novas terapêuticas ou criar pontos de
atenção que reduzam o número de internações hospitalares. Para ele, o grande ensejo
era o de se ampliar o espectro do olhar do profissional nessa nova via. Um olhar para
além do sujeito, em direção ao seu grupo familiar, estimulando-o a seguir pelos novos
territórios, pela cidade e por todas as possibilidades que os encontros ofereçam.

No dia 24 de novembro, o Centro de Atenção Psicossocial


(CAPS) A Casa de Encantado promoveu uma atividade lúdica
na Praça da Bandeira. Intitulada “Nau pelos Cantos do Encanto:
uma intervenção em arte e saúde com a Nau da Liberdade”, a
atividade, realizada por meio do Projeto Percursos Formativos
do Ministério da Saúde, contou com a participação do grupo de
teatro Nau da Liberdade do Hospital Psiquiátrico São Pedro que
apresentou uma peça. Além da apresentação, o grupo realizou
oficinas e atividades em grupo com os usuários dos serviços de
saúde mental, seus familiares e profissionais da saúde que
atuam no Caps, tendo por objetivo trabalhar o protagonismo das
pessoas. Aproximadamente 80 pessoas participaram da
atividade que teve início de manhã e estendeu-se até a tarde.
(Texto: Portal Região dos Vales/Ascom Encantado)

O CAPS tem uma ação psicossocial porque o cuidado se dá no limite entre o


individual e o coletivo. Foi nesta experiência-limite que o Movimento de Reforma
Psiquiátrica fez sua aposta, e é aí que os serviços substitutivos ao manicômio devem
afinar os seus dispositivos de intervenção (PASSOS, 2004).
Ao contrário do olhar regulador, “domador” e segregador que os profissionais da
loucura exerceram durante anos, a essência da nova proposta está centrada no sujeito. A
patir do seu valioso conceito, a escuta (desejos, dores, sofrimentos, tristezas, angústias,
alegrias, medos, potencialidades, saberes, expectativas, planos) é capaz de tecer pontes
entre o sujeito cuidado e sua família e os diversos atores e territórios sociais. Surge o
conceito de Clínica Ampliada no CAPS (AMARANTE, 2007).
Desenvolvido por Gastão Wagner nos anos 1990, o conceito de Clínica
Ampliada utilizado pelo Ministério da Saúde nas políticas públicas de Atenção Básica e
de Humanização, consiste em resumo em uma clínica que compreende questões
coletivas e políticas; realiza encontros na forma de atendimento individual ou grupal,
que não são reduzidos a práticas padronizadas que veem o sujeito em uma dimensão
individualizante; e possui uma visão ampliada do processo saúde-doença como
resultado de um fenômeno complexo resultante da multiplicidade de fatores biológicos,
sociais, afetivos, subjetivos, culturais, que interferem na sua produção (BRASIL, 2009).
Uma das diretrizes de maior relevância na Política de Humanização, o
acolhimento pode ser compreendido como o primeiro contato do profissional de
psicologia, enquanto membro da equipe de saúde mental, com aquele que procura um
serviço orientado para funcionar com portas abertas (FRANCO, BUENO e MERHY,
1999).
De acordo com Franco, Bueno e Merhy (1999), em todo lugar em que ocorre um
encontro, enquanto trabalho de saúde entre um trabalhador e um usuário, operam-se
processos tecnológicos (trabalho vivo em ato) que visam à produção de relações de
escutas e responsabilizações, as quais se articulam com a constituição dos vínculos e
dos compromissos em projetos de intervenção. Estes, por sua vez, objetivam atuar sobre
necessidades em busca da produção de algo que possa representar a conquista de
controle do sofrimento e/ou a produção da saúde.
Responsável por recepcionar as pessoas que buscam o cuidado para os seus
sofrimentos psíquicos, o acolhimento pretende garantir que os serviços pratiquem a
acessibilidade universal, prevista no sistema de saúde, assumindo as funções de acolher,
escutar e dar respostas aos problemas demandados; reorganiza o processo de trabalho,
deslocando seu eixo central do médico para a equipe multiprofissional (equipe de
acolhimento), que se compromete com a escuta e os projetos terapêuticos elaborados
(AMARANTE, 2007).
Conforme as Referências Técnicas para Atuação de Psicólogos no Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS), o trabalho do profissional da psicologia no CAPS,
abrange três importantes dimensões, que são: a Dimensão Relacional, que consiste na
postura de receber, escutar e tratar de forma qualificada e humanizada o usuário e suas
demandas (facilita a construção de vínculos); a Dimensão Ética, que se refere à
alteridade, reconhecendo singularidades e subjetividades; a Dimensão Técnica, que
inclui a triagem burocrática e/ou avaliação psicopatológica, ao articular saberes e
tecnologias da equipe multiprofissional; e finalmente a Dimensão Política, que
potencializa nas relações a autonomia e o protagonismo do usuário (ajuda na construção
do seu processo de cuidado a partir da compreensão do contexto relacional e
comunitário onde esse sofrimento é vivenciado).
No bojo das Referências Técnicas para Atuação de Psicólogos no Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS), também é possível encontrar rica descrição sobre o
Projeto Terapêutico Singular (PTS), que consiste em um conjunto de propostas de
condutas terapêuticas articuladas, a partir da discussão de casos clínicos pela equipe
multidisciplinar, voltado para um indivíduo ou coletivo. Segundo o documento, o PTS
pode, em situações ou casos mais complexos, contar com o Apoio Matricial, através de
reuniões e encontros e pode se destinar para o usuário, para as famílias ou grupos,
podendo inclusive contar com a participação de apoio intersetorial e amigos dos
usuários e familiares, sendo caracterizado por uma especial soma de saberes, esforços e
experiências em prol de atitudes mais adequadas para o tratamento do caso em questão,
adotando um dos seus quatro pilares: Definição Situacional, Definição de Metas,
Definição de Responsabilidades, e Reavaliação.
Sobre o braço da Economia Solidária é indispensável ressaltar que existe o
Ecosol, cujo trabalho funciona no sentido da reabilitação psicossocial a partir do
reconhecimento do eixo do trabalho, conforme descritivo das Referências Técnicas para
Atuação de Psicólogos no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS).

“...a economia solidária – Ecosol – abre possibilidades para


novas contratualidades sociais, a partir de recursos materiais e
imateriais para trocas sociais e, por conseguinte, para a
cidadania social plena de sujeitos trabalhadores, que podem
assim exercer o papel de protagonistas de seu próprio fazer e de
sua própria história”.
(SANTIAGO e YASUI, 2015)

Segundo as Referências Técnicas para Atuação de Psicólogos no Centro de


Atenção Psicossocial (CAPS), a inserção ou reinserção do sujeito no mercado de
trabalho, apesar da preocupação que o CAPS possui com os enormes desafios por parte
do próprio mercado, que se dedica muito ao lucro, e pouco com o desenvolvimento
psicossocial do trabalhador, o Ecosol é uma estratégia que pode resgatar a cidadania, a
autonomia e a melhoria da autoestima do usuário.
O conteúdo das Referências Técnicas para Atuação de Psicólogos no Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS), detalha a composição e articulação da RAPS, Rede de
Atenção Psicossocial, que envolve outras redes de serviço no cuidado à saúde mental da
população, como a atenção básica, por exemplo, que necessita contar com apoio técnico
para potencializar o seu poder resolutivo na gestão de algumas situações/casos,
discorrendo sobre a ampliação da rede de serviços substitutivos; a melhora do
funcionamento destes; e a capacitação dos profissionais destes níveis de atenção, com o
objetivo de ampliar o acesso e os cuidados com a saúde mental.
De acordo com o termo que rege as Referências Técnicas para Atuação de
Psicólogos no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), as atividades grupais realizadas
pelo CAPS representam uma nova configuração dos serviços de saúde mental, e, como
o próprio nome sugere, tem nos atendimentos grupais o reconhecimento de um espaço
adequado para a exploração da subjetividade ao possibilitar que os membros
reproduzam neste ambiente os papéis que ocupam no dia a dia de suas relações.

Este novo modo de produzir saúde situa-se dentro da


perspectiva do pensamento construtivista que trabalha com a
hipótese de uma eterna reconstrução de pessoas e processos em
virtude da interação dos sujeitos com o mundo e dos sujeitos
entre si. Essa capacidade se desenvolve no matriciamento pela
elaboração reflexiva das experiências feitas dentro de um
contexto interdisciplinar em que cada profissional pode
contribuir com um diferente olhar, ampliando a compreensão e
a capacidade de intervenção das equipes.
(CHIAVERINE, 2011)

Para Dell’Acqua e Mezzina (1991), os dispositivos clínicos de atenção à crise no


CAPS são estratégias para sua consolidação como serviço substitutivo aos hospitais
psiquiátricos. Segundo eles, é importante se trabalhar com um conceito ampliado de
crise, em que o cuidado não se restrinja à remissão de sintomas.
Ainda segundo Dell’Acqua e Mezzina (1991) para definir-se uma urgência
psiquiátrica deve-se considerar a presença de no mínimo 03 (três) dos itens a seguir:
sintomatologia psiquiátrica grave ou aguda; grave ruptura das relações familiares ou
sociais; recusa de tratamento ou estima, mas aceitação do contato; recusa obstinada de
contato com equipes de tratamento psiquiátrico; situação de alarme e risco no contexto
familiar ou social, traduzindo-se em incapacidade de se defrontar com a crise.
Considerações Finais
Encerrando esse estudo realizado por grupo de alunos do quinto período do
Curso de Psicologia da Faculdade Pio Décimo, como parte do conteúdo programático
da disciplina Psicologia da Saúde, sob a orientação da professora Aline Rabêlo, convém
ressaltar-se que os membros do referido grupo observou que, de modo geral, os
profissionais da psicologia que atuam em CAPS, empreendem grandes esforços para
exercer a profissão de acordo com os recursos materiais e humanos disponíveis, apesar
de nem sempre conseguirem implementar todos os projetos por situações adversas
(orçamento, gestão...).
Para os membros do grupo, os CAPS, em geral, possuem alta demanda e
quantidade insuficiente de psicólogos e de outros profissionais da equipe
multidisciplinar, e, no tocante à remuneração e ao reconhecimento profissional dos
profissionais do CAPS, eles os consideram insuficientes e não condizentes com o
trabalho exercido.
Quanto às condições de trabalho, o grupo observou que não são totalmente
condizentes com o que prevê o projeto inicial do CAPS, faltando, por vezes, recursos
materiais e estrutura para a realização de um trabalho eficaz, já que nem tudo se resume
ao conhecimento, ao saber, à experiência e ao esforço dos profissionais.
Os membros do grupo consideraram que a elevada carga horária de 30 (trinta)
horas semanais pode, em muitos casos, sobrecarregar os psicólogos e causar neles o
esgotamento físico e/ou mental, além de outras situações incapacitantes.
O presente grupo de estudo não pode deixar de registrar que a ausência de alta
capacitação profissional específica para atuação no CAPS também se reflete, em alguns
casos, em dificuldade no cumprimento do papel que os profissionais deveriam exercer.
Ainda na opinião do presente grupo de estudo deve-se priorizar e fiscalizar a
implementação de uma política eficaz de saúde mental destinada aos profissionais da
equipe multidisciplinar, no sentido de garantir atividades laborais adequadas, como
consequência de profissionais realmente cuidados.
A exemplo do que ocorreu na década de 80, como vimos, a pandemia fez eclodir
um vasto repertório de casos em que a saúde mental foi pauta de discussões, estudos e
ações tripartites. No entanto, o correto é que os Governos Federal, Estadual e Municipal
concentrem, sob a gestão do Ministério da Saúde, através do SUS, esforços e priorizem
a saúde mental da maior parte da população, que a cada dia demanda mais cuidados em
decorrência do cotidiano estressante, exaustivo e, por vezes, vulnerável, observou o
presente grupo de estudo.
Finalmente, o grupo considera fundamental priorizar também os diálogos entre a
rede de cuidados psicossociais e as instituições de ensino superior em psicologia
(públicas e privadas), no sentido de, cada vez mais, aproximar a realidade das políticas
públicas de saúde mental das grades curriculares em prol do aprendizado científico dos
futuros profissionais.
Referências

https://crepop.cfp.org.br/wp-content/uploads/sites/34/2022/10/031-Crepop-Referencias-
Tecnicas-para-Atuacao-de-Psicologasos-no-Centro-de-Atencao-Psicossocial-CAPS.pdf

https://regiaodosvales.com.br/2016/12/01/caps-realiza-atividade-na-praca-da-bandeira/

AMARANTE, P. D. C. Saúde Mental e Atenção Psicossocial. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007.

BRASIL, Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização do SUS. Brasília (DF), 2003.

CHIAVERINE. D. H. (org) et al.: Guia Prático de Matriciamento em Saúde Mental. Brasília (DF)
Ministério da Saúde: Centro de Estudo e Pesquisa em Saúde Coletiva, 2011.

DELL’ACQUA, G.; MEZZINA, R. Resposta à Crise. In: Delgado, J. A loucura na sala de jantar. São
Paulo: Editora Resenha, 1991.

DIMENSTEIN, M. et al. O apoio matricial em unidades de saúde da família: experimentando


inovações em saúde mental. Saúde Soc. São Paulo, v 18, n. 1, 2009.

FRANCO, T.; MERHY, E. E. O acolhimento e os processos de trabalho em saúde: o caso de


Betim, Minas Gerais, Brasil. Cad. Saúde Pública (online). 1999, v.15, n 2.

SANTIAGO, E.; YASUI, S.. Saúde Mental e Economia Solidária: cartografias do seu discurso
político. Psicol. Soc., v. 27, n. 3, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-
03102015v27n3p700

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