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O TEXTO HISTÓRICO COMO

ARTEFATO LITERÁRIO
Hayden White
O texto é resultado de uma conferência, dada pelo autor, no
Colóquio de Literatura Comparada da Universidade Yale, em
New Haven, Connecticut (EUA), em 24 de janeiro de 1974,
parte das discussões que chamamos de “virada linguística”
norte-americana.

O debate lançado por Hayden White, nesse texto, baseia-se


no conceito de meta-história, lançado por ele no livro
homônimo, e que busca observar quais são os tropos
discursivos em torno dos quais se estebelecem as bases
textuais de uma disciplina, nesse caso, a história.
Questões centrais para a meta-história

Qual a estrutura de uma consciência


peculiarmente histórica? Qual o status das explicações históricas,
quando comparadas a outros tipos de
explicações que poderiam ser oferecidas
para esclarecer a matéria de que se ocupam
comumente os historiadores?

Quais são as formas possíveis de


representação histórica e quais as suas
Que autoridade podem os relatos
bases?
históricos reivindicar como
contribuições a um conhecimento
seguro da realidade, em geral, e das
ciências humanas, em particular?
Segundo Hayden White, de um modo geral, houve uma
relutância em considerar as narrativas históricas como o que
elas manifestamente são: ficções verbais cujos conteúdos são
tanto inventados quanto descobertos e cujas formas têm mais
em comum com os seus equivalentes na literatura do que com
seus correspondentes na ciência.

Citando o historiador britânico Robin George Collingwood,


relembra sua afirmação de que o historiador era sobretudo um
contador de histórias, deixando claro que a sensibilidade
histórica se manifestava na capacidade de criar uma história
plausível a partir de uma congérie de “fatos” que, na sua forma
não processada, carecia absolutamente de sentido.
No entanto, Collingwood não logrou perceber que os
conjuntos de acontecimentos históricos, casualmente
registrados, não constituem, em si, uma estória,
entregando apenas os elementos para uma.

Assim como em um romance ou em uma peça de teatro,


é o realce ou a caracterização dada pelo historiador que
define o estilo de um texto histórico.

A Revolução Francesa, por exemplo, pode ser tratada


como um drama de transcendência romântica, como na
História da Revolução Francesa, de Jules Michelet, ou
como uma tragédia irônica, como em O Antigo Regime e
a Revolução, de Alexis de Tocqueville.
Nenhum acontecimento é intrinsecamente trágico, cômico,
dramático ou farsesco, uma vez que, em História, o que é trágico
em uma perspectiva pode ser cômico de outra, ou o que pode
ser trágico do ponto de vista de uma determinada classe social
pode ser uma farsa do ponto de vista de outra.

Hayden White cita O 18 Brumário de Luís Bonaparte, de Karl


Marx, para demonstrar seu argumento: é uma obra que aborda
como um personagem aparentemente medíocre desempenha um
papel de herói.

No entanto, ele também alerta: determinados acontecimentos


não seriam aceitos pelo público-leitor de história vinculados a
determinados gêneros - a exemplo do assassinato de Kennedy
ou do Holocausto, jamais podendo ser tratado como comédia, pr
exemplo.
Hayden White compara o processo de dar sentido aos
acontecimentos históricos ao processo de psicoterapia.

Na psicoterapia, o paciente conhece os fatos que


atravessam seu passado, a ponto de que esses
acontecimentos sejam a causa de suas neuroses, tornando-
se estranhas, misteriosas e ameaçadoras.

Não é função do terapeuta, então, exibir os “fatos reais” ao


paciente, visto que essa “verdade” já foi exposta por ele,
tampouco ministrar a ele um curso de teoria psicanalítica, e
sim ajudar o paciente a “retramar” toda a história de sua
vida, de maneira a mudar o sentido para ele daqueles
acontecimentos, atribuindo-lhes outras significações.
É esquecido muitas vezes ou, quando é lembrado é negado,
que nenhum conjunto de eventos atestado pelo registro
histórico compreende uma estória manifestamente acabada
e completa.

Não vivemos estórias, mesmo que confiramos sentido à


nossa vida moldando-a retrospectivamente na forma de
estórias - e o mesmo ocorre com nações ou com culturas
inteiras.

Os acontecimentos históricos são, portanto, construídos a


partir de uma narrativa que dá sentido a um conjunto de
acontecimentos passados, partindo de estruturas de sentido
que já existe - inclusive nas narrativas de ficção.

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