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sociedade?
Marc Ferro
Nome da terceira geração da Escola dos Annales (fase entre
1968 e 1989), direcionada para a chamada “Nova História”
e para a amplitude das fontes e objetos de pesquisa.
No contexto em que o texto é escrito, o cinema não era considerado uma fonte histórica, de
forma que o autor questiona por que esse documento não faz parte do universo mental do
historiador.
O cinema ainda não era nascido quando a História se constituiu como campo do
conhecimento.
Não é incomum, até hoje, que muitos historiadores categorizem os documentos, definindo
fontes que seriam mais importantes ou confiáveis e fontes com as quais deveriam ter “mais
cuidado” (ou seja, um eufemismo para alertar aquelas com as quais têm mais preconceito).
Para as pessoas que se achavam “cultas”, no início do século XX, o cinematógrafo era
visto como uma “máquina de idiotização”, que entretinha os iletrados.
Os historiadores e o cinema
Para muitos historiadores, o filme seria meramente um acontecimento, uma anedota, uma
ficção, da qual a direita tem medo e a esquerda desconfia.
Marc Ferro observa o filme não como uma obra de arte, mas como um produto cujas
significações não são apenas cinematográficas, mas também histórico-sociais.
Nesse sentido, não seria suficiente uma compreensão do filme pelo filme, mas sim do
filme e de sua relação com o mundo no qual ele se insere.
O filme não tem como objetivo comunicar diretamente a realidade, como na verdade, nada
tem.
Um filme “sem objetivos ideológicos”: Po
Zaconu (Dura Lex) (1925)
Para analisar um filme que se pretende não como uma representação clara do real, mas sim
como um exemplo de método de montagem cinematográfica, o autor escolhe Po Zaconu
(Pela Lei, em uma livre tradução para o português), de Lev Kushelov.
Por que escolher um filme de Kushelov e não de outros diretores russos, como Eisenstein e
Podovkin?
Por que eles se preocupavam em mostrar o nascimento da União Soviética, eram filmes
claramente ideológicos (a exemplo de O Encouraçado Potemkin, de Eisentein).
Um filme “sem objetivos ideológicos”: Po
Zaconu (Dura Lex) (1925)
O objetivo de Kuleshov era “fazer um filme que fosse uma obra de arte, com uma
montagem exemplar”.
Storyline: Um grupo de garimpeiros encontra uma jazida de ouro, cuja exploração dura
todo o inverno. Um deles (um irlandês), no entanto, tomado pela cobiça, mata dois
companheiros para tornar-se o único dono da mina. Um casal de mineradores o prende
para impedi-lo de seguir nesse intento, e, no processo em que decidem julgá-lo na forma
da lei, ficam à beira da loucura.
Um filme “sem objetivos ideológicos”: Po
Zaconu (Dura Lex) (1925)
A pergunta que podemos fazer é: ainda que Kuleshov tentasse fazer um filme não-
ideológico, isso é possível?
Po Zaconu foi recebido sem entusiasmo da crítica soviética, pois, ao contrário dos demais,
não era uma propaganda revolucionária.
No entanto, há alguns elementos curiosos no filme que mostram que, ainda que não fosse
sua intenção, essas questões atravessam toda a sua obra.
Um filme “sem objetivos ideológicos”: Po
Zaconu (Dura Lex) (1925)
O protagonista do filme é um personagem que tem uma posição de inferioridade com
relação aos seus companheiros, que têm uma origem social mais elevada.
A princípio, ele não tem uma obsessão pelo ouro, como os demais possuem.
No entanto, ao afrontar toda e qualquer lei, ele terminava não afetando apenas o modelo de
justiça burguesa, mas também o modelo de justiça soviética, o que terminou causando
incômodo entre os próprios soviéticos.
Um filme “sem objetivos ideológicos”: Po
Zaconu (Dura Lex) (1925)
Em geral, o cinema soviético optava por um caminho mais “claro”: uma batalha entre os
burgueses (amorais, apegados aos bens materiais) e os russos (honestos, ordenados,
partidários da equidade).
Desse modo, podemos compreender que os filmes, sejam eles quais forem, sempre vão
além do próprio conteúdo. Mesmo os que não aparentam ter interesse de dar ênfase a
certas visões de mundo, sempre terminam o fazendo.