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Riscos ocupacionais em saúde.

Article · January 2004

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Riscos ocupacionais em saúde

RISCOS OCUPACIONAIS
CUPA EM SAÚDE
OCCUPATIONAL HEAL
CCUPA TH RISKS
EALTH

Maria Yvone Chaves Mauro *


Camila Drumond Muzi **
Raphael Mendonça Guimarães **
Carla Christina Chaves Mauro***

RESUMO: Este é um artigo de revisão que pretende discutir os riscos ocupacionais em saúde, apoian-
do-se em pesquisa bibliográfica referente ao período de 1976 a 2004. Objetiva-se discutir os riscos
ocupacionais em saúde a partir de elementos do contexto do trabalhador e analisar as condições gerais
do seu ambiente de trabalho e suas condições individuais e de saúde. Percebe-se que a desarmonia
entre saúde e trabalho é incontestavelmente um problema de saúde pública, que merece ser analisado
em todos os seus prismas, compreendendo assim a integralidade do trabalhador. Tal fato requer, do
enfermeiro, a atenção necessária para que, primeiramente, não sofra o desgaste gerado por essa desar-
monia e, depois, possa contribuir para minimizar os efeitos negativos gerados em outros trabalhadores.
Palavras-chave: Enfermagem; risco ocupacional; saúde; trabalho.

ABSTRACT
ABSTRACT:: This article intends to discuss occupational health risks, based on a bibliographic research
covering the period from 1976 to 2004. The objective is to discuss occupational risks from elements that
make part of the worker’s context, and to analyze related general environment conditions and personal
conditions. It is clear that the disharmony between health and work is an incontestable public health
problem that must be analyzed under its multiple facets. That fact demands attention of the nurse in order
to avoid suffering the effects generated by such disharmony, and to contribute to minimize the negative
effects generated upon other workers.
Keywords: Nursing; occupational risk; health; work.

I NTRODUÇÃO
A palavra trabalho e o qualitativo profissi- O trabalho desempenha uma função im-
onal são usados em psicologia para designar toda portante na vida do homem e preenche alguns
atividade realizada tecnicamente com a finalida- objetivos, tais quais: respeitar a vida e a saúde
de de conseguir um rendimento econômico. Em do trabalhador, priorizando o problema da segu-
nossa organização social, o ser humano dedica ao rança e da salubridade dos locais de atividade
trabalho aproximadamente 65% da sua vida pro- laboral; deixar-lhe tempo livre para o descanso
dutiva, incluindo-se jornada de trabalho e ativi- e lazer, destacando-se a questão da duração
dade propriamente dita, a locomoção e o atendi- dessa jornada e de sua coordenação para a
mento das necessidades relacionadas ao trabalho. melhoria das condições de vida fora do local da
Portanto, não é a terceira parte da vida, mas a atividade ocupacional; e deve permitir ao tra-
metade da sua existência que o homem dedica ao balhador sua própria realização pessoal, ao mes-
trabalho profissional. mo tempo em que presta serviços à comunida-
Hoje o trabalho constitui uma das práticas de, considerando o problema do tipo de ativi-
mais importantes da vida do ser humano, porque dade e da organização do trabalho.
é dessa atividade que o homem tira os elementos Quanto à Saúde do Trabalhador, ela é com-
para sua própria subsistência familiar. Entretanto, preendida como um conjunto de práticas teóricas
o homem não deve trabalhar apenas pelo salário interdisciplinares - técnicas, sociais, humanas - e
que recebe, mas também pela satisfação pessoal interinstitucionais, realizadas por diferentes ato-
que deve sentir na sua realização e pelos resulta- res situados em espaços sociais distintos e infor-
dos que colhe através do seu próprio esforço. mados por uma mesma perspectiva comum1.

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Mauro MYC, Muzi CD, Guimarães RM, Mauro CCC

Discorrer sobre a Saúde do Trabalhador é, em mana tem significado tríplice: material, psicoló-
primeiro lugar, abordar um tema que ainda não gico e social3.
atingiu a adolescência, mas que precisa discutir os Quanto à satisfação material, é necessário
caminhos que levem a uma maturidade saudável que o trabalho proporcione o atendimento das
e duradoura2. Para tal maturidade, cabe discutir necessidades biológicas primordiais: alimentação,
os aspectos relacionados ao trabalho que garan- vestuário, habitação, saúde física e mental, re-
tam o bem-estar do sujeito e, ainda, abordar os creação e outras.
riscos inerentes a esse trabalho, de forma que sua No que se refere à satisfação psíquica indi-
prevenção possa trazer segurança ao indivíduo. vidual, ela se fundamenta no provimento das se-
Assim, são objetivos deste estudo: discutir guintes necessidades: afeto; noção de pertencer,
os riscos ocupacionais na área da saúde, a partir sentir-se uma peça da engrenagem empresarial;
dos elementos do contexto do trabalhador e ana- companhia dos outros; realização; experiências
lisar as condições gerais do seu ambiente de tra- novas; segurança; e fator de otimismo.
balho e suas condições individuais de saúde. Considerando a satisfação social, o trabalho
A pesquisa bibliográfica realizada abrange confere posição entre os membros do grupo, o que
produção científica de 1976 a 2004, recuperando é importante para a convivência social.
conceitos e achados de grande relevância para a Após a revisão desses significados, torna-se
especialidade Saúde do Trabalhador. imprescindível destacar as alterações no homem
determinadas pelo trabalho.
O SIGNIFICADO DO TRABALHO
O provimento das necessidades biológicas
AS ALTERAÇÕES PELO TRABALHO
básicas humanas é a função primordial do traba- No desempenho do trabalho, pode-se obser-
lho, entretanto, existem outras funções como: var alterações no organismo e na personalidade
propicia o aplauso social, uma vez que o individuo do trabalhador que se manifestam durante a jor-
que não trabalha é mal visto pela sociedade; ali- nada3, tais como: modificações fisiológicas – altera-
via a tensão emocional funcionando como uma ção do processo metabólico, aumento do ritmo
válvula de escape ou uma derivação para as emo- respiratório e cardíaco e alterações no teor físico-
ções acumuladas; estimula a imaginação e ativa químico do sangue e dos tecidos musculares, re-
a criatividade porque afeta poderosamente a ati- sultantes do esforço produzido; aquecimento – ou
vidade mental e estimula a inteligência, procu- seja, intensificação do rendimento do trabalho
rando obter melhores formas de expressão da pelo aumento da capacidade dos músculos e ner-
produtividade; condiciona o progresso e o bem- vos condicionados à atividade exercida; queda da
estar humano porque cada trabalhador é consi- velocidade e qualidade do rendimento – observáveis
derado parte do processo de melhoria de sua co- com o prolongamento forçado do trabalho, decor-
munidade3. rente do esforço muscular e intelectual que sur-
O significado do trabalho4,5,6 é elaborado como ge com a fadiga; reativação – é o súbito aumento
uma cognição subjetiva, histórica e dinâmica, do ritmo de trabalho, seja pelo estímulo do
caracterizada por múltiplas facetas que se articu- supervisor ou apelo nas ultimas horas de traba-
lam de diversificadas maneiras. É subjetiva, apre- lho; alterações no controle e coordenação motora –
sentando uma variação individual, a qual reflete observáveis na continuidade do esforço físico.
a história pessoal de cada um. É social, porque, É preciso estar atento para o início dessas
além de apresentar aspectos compartilhados por alterações no trabalhador: os movimentos se tor-
um conjunto de indivíduos, reflete as condições nam mais lentos e imprecisos e o trabalho se apre-
históricas da sociedade, na qual está inserido. É senta com menos rendimento e queda na produ-
dinâmica, no sentido de que é construto tividade; os bloqueios que se caracterizam por in-
inacabado, em permanente processo de constru- terrupções muito curtas, de fração de segundos,
ção. Decorrente disso, sua caracterização varia automáticas e inconscientes no decorrer da ati-
conforme seu próprio caráter histórico-social. vidade, que o trabalhador nem percebe, acredi-
O significado do trabalho, para o homem, tando-se ser reflexo de fadiga mental; e a fadiga
representa uma situação especial, que lhe traz que é a sensação de exaustão física e mental, re-
satisfação ou não, e ainda, como atividade hu- sultante do excesso de atividades, manifestada

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Riscos ocupacionais em saúde

pela redução da força física e capacidade de rea- lhador, o qual deve ser protegido pela adoção de
gir ou executar tarefa3. medidas adequadas9.
Dando prosseguimento, inicia-se, a seguir, Assim, o estudo do ambiente de trabalho
o estudo da relação ambiente ocupacional/tra- deve compreender os seguintes aspectos: os dife-
balhador. rentes tipos (características); os fatores que o
condicionam; as alterações desses fatores e suas
O AMBIENTE DE TRABALHO E O causas; a técnica para exploração dessas altera-
ções; as medidas que devem ser adotadas para
T RABALHADOR evitar a agressão do ambiente sobre o indivíduo10.
Não é possível indicar todos os fatores de
A Saúde Ocupacional avança numa pro-
risco, contudo relacionam-se os mais comuns11:
posta interdisciplinar, com base na Higiene In-
muitas horas de trabalho; postura inadequada;
dustrial, relacionando ambiente de trabalho-
monotonia; meio físico inadequado; instalações
corpo do trabalhador 1. Incorpora a teoria da
sanitárias insuficientes; falta de salas de descanso
multicausalidade, na qual um conjunto de fato-
e assentos; saúde e higiene mental insatifatórias
res de risco é considerado na produção da doen-
e fadiga.
ça, avaliada através da clínica médica e de in-
dicadores ambientais e biológicos de exposição Entre os agravos à saúde do trabalhador, des-
e efeito. Os fundamentos teóricos do modelo da tacam-se os acidentes de trabalho que são men-
História Natural da Doença 7 são aplicáveis a cionados a seguir.
indivíduos ou grupos, e derivam da interação cons-
tante entre o agente, o hospedeiro e o ambiente, ACIDENTES
significando um aprimoramento da multicausali-
dade simples. Com uma perspectiva de superação da visão
Mesmo assim, se os agentes/riscos são assumi- do acidente de trabalho de uma forma inespecífica
dos como peculiaridades naturalizadas de objetos e e a-histórica, deve-se ter uma visão renovada
meios de trabalho, descontextualizados das razões desse tipo de evento, ou seja, olhar com cuidado
que se situam em sua origem, repetem-se, na prá- não só o acidente em si, mas também os fatores
tica, as limitações da Medicina do Trabalho. As que o predispuseram. Embora saiba-se que aci-
medidas que deveriam assegurar a saúde do traba- dentes com material biológico não acontecem
lhador, em seu sentido mais amplo, acabam por res- somente com enfermeiros ou técnicos de enfer-
tringir-se a intervenções pontuais sobre os riscos magem, há estudos que indicam a hegemonia
mais evidentes. Enfatiza-se a utilização de equipa- dessa categoria nos incidentes, especialmente em
mentos de proteção individual, em detrimento dos acidentes com material perfurocortantes12.
que poderiam significar a proteção coletiva; Recentes estudos13 evidenciaram que a re-
normatizam-se formas de trabalhar consideradas lação entre incidência de acidentes de trabalho
seguras, o que, em determinadas circunstâncias, e mortalidade não é tão baixa, o que significa que
conforma apenas um quadro de prevenção simbó- há um pequeno potencial de mortalidade e um
lica. Assumida essa perspectiva, são imputados aos grande potencial de morbidez, condição que de-
trabalhadores os ônus por acidentes e doenças, manda estratégias para minimizar esses agravos
concebidos como decorrentes da ignorância e da no ambiente de trabalho, tendo em vista suas re-
negligência, caracterizando uma dupla percussões para o indivíduo e para o Estado. Veri-
penalização8. A fórmula ideal para a vida humana ficou-se, ainda, que há diferenças brutais entre
consiste em manter em equilíbrio os componentes as mesmas taxas nacionais e por regiões, o que
biológicos e psíquicos da personalidade e os fatores sinaliza uma diferenciação no acesso aos serviços
sociais e do ambiente. Quando o equilíbrio persis- de saúde e, especificamente, na área da Saúde
te, o individuo conserva o seu estado de saúde e do Trabalhador.
mantém uma sensação de bem-estar. Neste contexto, os acidentes de trabalho
Desse modo, o ambiente de trabalho pode (AT) ocupam destaque, uma vez que se apresen-
converter-se em elemento agressor do indivíduo. tam como a concretização dos agravos à sua saú-
Qualquer que seja a origem do desequilíbrio, exis- de em decorrência da atividade produtiva, rece-
te a possibilidade de dano para a saúde do traba- bendo interferências de variáveis inerentes à pró-

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pria pessoa, do ponto de vista físico ou psíquico, ras diárias, seguidas de 36 horas de descanso, com-
bem como do contexto social, econômico, políti- parou as durações dos episódios de sono, detec-
co e da própria existência. Decorrem da ruptura tando diferenças significativas entre sono diurno
na relação entre o trabalhador e os processos de e noturno. A qualidade dos episódios de sono diur-
trabalho, os quais interferem no processo saúde/ no após as noites de trabalho foi avaliada como
doença, algumas vezes de maneira abrupta e ou- pior do que a qualidade dos episódios de sono
tras de forma insidiosa, bem como no modo de noturno. Foram encontradas diferenças significa-
viver ou morrer dos trabalhadores14. tivas na percepção dos estados de alerta em três
Considerando o exposto, o trabalho notur- momentos diferentes do turno da noite. Os níveis
no pode ser outro fator de ruptura no equilíbrio percebidos de alerta à noite tornam-se piores à
saúde/doença, conforme é descrito na seção se- medida que aumenta o número de horas de tra-
guinte. balho. Isso é um indicativo de que a sonolência
no trabalho noturno se faz presente e pode preju-
TRABALHO NOTURNO dicar seriamente tanto trabalhadores quanto os
pacientes que estão sob seus cuidados.
As escalas de trabalho em turnos geralmen- A partir de estudos anteriores19, 20 realiza-
te adotadas são bastante variadas, e em uma mes- dos acerca do trabalho noturno, verificou-se uma
ma empresa pode haver várias escalas. Nas déca- série de alterações no ritmo biológico do traba-
das de 60 e 70, escalas de turnos em que predo- lhador (ciclo circadiano; temperatura corporal;
minava o rodízio semanal dos horários de traba- nível de glicose no sangue; grau de fadiga; adap-
lho eram bastante freqüentes. tação ao trabalho; rendimento; duração do sono;
Uma das análises mais divulgadas na litera- grau de retenção da informação). As conseqü-
tura sobre erros/acidentes relacionados ao traba- ências diretas foram: fadiga; desadaptação à ati-
lho em turnos foi publicada originalmente em 1979 vidade; baixo rendimento; baixa capacidade de
15
. A hipótese destacada pelo referido estudo é a conciliar o sono normal; maior índice de erros
de que provavelmente o pior desempenho obser- detectados; desequilíbrio nutricional; limite re-
vado em atividades em plantões ou regimes de duzido de responsabilidade; aumento ou apare-
trabalho noturnos estaria associado à queda ou cimento de patologia de natureza somática;
diminuição na expressão comportamental de al- estress.
guns ritmos biológicos, com especial ênfase ao da
temperatura corporal. CONDIÇÕES DE SAÚDE
Esse ritmo apresenta valores mais baixos du-
rante a noite, concomitante ao aumento da so- As medidas ergonômicas relacionadas à pos-
nolência e conseqüente queda de rendimento de tura no ambiente de trabalho, assim como as so-
algumas funções cognitivas. A falta de repouso luções implementadas de modo preventivo são mais
leva a riscos, decorrentes da privação de sono que positivas, especialmente quando associadas à se-
vão desde a irritação, ansiedade, insegurança, leção adequada do trabalhador e à utilização de
depressão, dificuldade de concentração e redu- técnicas corretas no processo de trabalho21. Essa
ção da capacidade crítica; o profissional de en- prática é comumente realizada inadequadamen-
fermagem se sente insatisfeito por não ter presta- te pelos profissionais de enfermagem, daí a fre-
do uma assistência de melhor qualidade ao qüência de problemas de saúde no trabalho.
paciente16.Diante das evidências de problemas Deve-se ainda considerar o trabalho senta-
gerados pela inversão do ciclo vigília-sono e con- do, no qual a incidência de hérnias de disco é três
seqüente privação do sono de trabalhadores, pode- vezes maior que no trabalho em pé, e os esforços no
se dizer que as estratégias individuais relaciona- sentido de ampliar os conhecimentos básicos de
das aos hábitos de sono são essenciais para permi- ergonomia dos profissionais da área de saúde.
tir a adaptação ao trabalho em turnos17. Cabe destacar aqui os principais fatores re-
Um estudo18 realizado entre auxiliares de lacionados às condições ocupacionais20,21, consi-
enfermagem e enfermeiros que trabalhavam em derando-se as novas tendências do mercado de
hospital público de São Paulo, cuja organização trabalho: remuneração; oportunidade de carrei-
dos turnos diurnos e noturnos fixos era de 12 ho- ra; garantia disciplinares; horas de trabalho; des-

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Riscos ocupacionais em saúde

canso e férias; segurança social; proteção à saú- saúde do trabalhador. Portanto, ações na área da
de; oportunidade de formação inicial e educação saúde do trabalhador têm como objetivo primor-
continua; efetivo de pessoal no serviço; organiza- dial mudanças nos processos de trabalho que con-
ção do trabalho; participação do pessoal na de- templem, em toda sua dimensão, as relações saú-
terminação de suas condições ocupacionais e de de-trabalho, por meio de uma atuação
vida e participação em tudo que contribui para multiprofissional, interdisciplinar e intersetorial.
sua satisfação no trabalho. Considera-se fator de risco para provocar um
No Brasil, existem inúmeros convênios e re- dano, toda característica ou circunstancia que
comendações da Organização Internacional do acompanha um aumento de probabilidade de
Trabalho(OIT) ratificadas pelas Portarias do Mi- ocorrência do fator indesejado, sem que o dito
nistério do Trabalho denominadas Normas fator tenha de intervir necessariamente em sua
Regulamentadoras (NR), além da Consolidação causalidade23.
das Leis de Trabalho (CLT), disciplinando essa Classicamente, os fatores de risco para a saú-
área. Os estudos sobre os riscos ocupacionais apon- de e segurança dos trabalhadores, presentes ou
tam que, quando eles não são submetidos a con- relacionados ao trabalho, de acordo com a Orga-
trole, levam ao aparecimento de acidentes e do- nização Pan-Americana da Saúde no Brasil, po-
enças profissionais e do trabalho. dem ser classificados em cinco grandes grupos22,24:
O Ministério do Trabalho, através das NR, físicos- agressões ou condições adversas de natu-
visa eliminar ou controlar tais riscos ocupacionais. reza ambiental que podem comprometer a saúde
São 32 NRs direcionadas para trabalhador urba- do trabalhador; químicos- agentes e substâncias
no, das quais foram selecionadas algumas de re- químicas, sob a forma líquida, gasosa ou de partí-
levância para o trabalhador de saúde: NR-1 Dis- culas e poeiras minerais e vegetais, comuns nos
posições Gerais; NR-4 Serviços Especializados em processos de trabalho; biológicos- microorganismos
Engenharia de Segurança e Medicina do Traba- geralmente associados ao trabalho em hospitais,
lho – SESMT; NR-5 Comissão Interna de Preven- laboratórios e na agricultura e pecuária;
ção de Acidentes – CIPA; NR-6 Equipamentos ergonômicos e psicossociais - que decorrem da or-
de Proteção Individual – EPI; NR-7 Programa de ganização e gestão do trabalho; de acidentes- liga-
Controle Médico de Saúde Ocupacional - dos à proteção das máquinas, arranjo físico, or-
PCMSO; NR-9 Programa de Prevenção de Ris- dem e limpeza do ambiente de trabalho, sinaliza-
cos Ambientais - PPRA; NR-15 Atividades e ção, rotulagem de produtos e outros que podem
Operações Insalubres; NR-16 Atividades e Ope- levar a acidentes do trabalho.
rações Perigosas; NR-17 Ergonomia; NR-24 Con- Os riscos ocupacionais têm origem nas ativi-
dições Sanitárias e de Conforto nos Locais de Tra- dades insalubres e perigosas, aquelas cuja natu-
balho; NR-26 Sinalização de Segurança; NR-31 reza, condições ou métodos de trabalho, bem como
Segurança e Saúde no Trabalho em Espaços Con- os mecanismos de controle sobre os agentes bio-
finados; NR-32 (em processo de implementação) lógicos, químicos, físicos e mecânicos do ambien-
Segurança e Saúde no Trabalho em Estabeleci- te hospitalar podem provocar efeitos adversos à
mentos de Assistência à Saúde 22. saúde dos profissionais.
Algumas delas estão envolvidas no controle Os técnicos especialistas em Higiene e Se-
das condições de risco para a saúde e melhoria gurança do Trabalho são unânimes em colocar que
dos ambientes de trabalho, visando: identifica- o importante não é gratificar o trabalhador com o
ção das condições de risco para a saúde presentes adicional de insalubridade ou de periculosidade,
no trabalho; caracterização da exposição e mas sim tornar o trabalhador e o ambiente abso-
quantificação das condições de risco; discussão e lutamente saudáveis.
definição das alternativas de eliminação ou con-
O quadro a seguir mostra a classificação dos
trole das condições de risco; implementação e
principais riscos ocupacionais em grupos, de acor-
avaliação de medidas a serem adotadas 22.
do com a sua natureza:
Os condicionantes sociais, econômicos,
Essas condições isalubres e perigosas na mai-
tecnológicos e organizacionais responsáveis pelas
oria das vezes se tornam rotina, freqüentemente
condições de vida e de trabalho e os fatores de
não percebidas pelos gerentes, nem pelo próprio
risco ocupacionais são também determinantes da
trabalhador de saúde, o qual se habitua com a

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Mauro MYC, Muzi CD, Guimarães RM, Mauro CCC

Fonte: Ministério do Trabalho (MTE) Norma Regulamentadora – NR 9 – Riscos ambientais25


FIGURA 1: Classificação dos Principais Riscos Ocupacionais.

situação ou mantém um autocontrole dos sinto- os hospitais com mais de 500 empregados são
mas, sem procurar esclarecer as causas verdadei- obrigados a incorporar um Enfermeiro do Traba-
ras. Das observações feitas, e com base na litera- lho no seu quadro, de modo que esse profissio-
tura estudada9,14,17,24-27, evidenciam-se as conse- nal além de participar das atividades especifi-
qüências dessas condições: queda da produção, cas, deverá estar atento aos fatores de riscos para
maior vulnerabilidade aos acidentes de trabalho, combatê-los 28.
afastamento do trabalho por motivo de saúde, Atualmente, conta-se com a Norma
causa mais freqüente do elevado absenteísmo. Regulamentadora do Ministério do Trabalho nº
A combinação desses fatores leva a enfer- 32/2002, ainda em fase de homologação, que se
magem, principalmente, a uma condição que os destina à proteção dos trabalhadores de estabe-
peritos da OIT caracterizam como de penúria lecimentos de saúde 29.
crônica. Os centros de estudos dos hospitais e outros
Com o conhecimento desses fatores de ris- serviços de saúde, também deverão discutir essa
cos e a identificação da população exposta (os problemática e buscar a assessoria necessária com
próprios profissionais de enfermagem, seus cole- os técnicos competentes, principalmente em re-
gas de trabalho e os clientes), cabe aos gerentes lação a novos riscos.
encetar uma luta para orientar o trabalhador so- Resultados de pesquisas sobre condições de
bre tais riscos ocupacionais e as medidas necessá- trabalho e aspectos ergonômicos mostram que há
rias ao seu controle. necessidade de difundir-se entre os enfermeiros
Um programa de educação continuada, com o conhecimento desses estudos e de outros sobre
treinamento específico para profissionais de saú- a higiene, biossegurança e segurança do traba-
de, pode favorecer o entendimento desses pro- lho, visando a proteção de sua própria saúde e de
blemas e de sua gravidade para combatê-los. seus clientes26. É imperativa a implementação de
A criação de Comissões Internas para Pre- medidas ergonômicas e de biossegurança para a
venção de Acidentes27 (CIPAS), nas Unidades proteção dos enfermeiros e demais profissionais
de Saúde, também, facilitará a discussão dos pro- de saúde, assim como de medidas de higiene
blemas com a direção das instituições, assim mental para a garantia de um ambiente saudável
como as Comissões de Saúde. Vale ressaltar que e obtenção do equilíbrio emocional do grupo.

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Riscos ocupacionais em saúde

C ONCLUSÃO Washington (DC): Secretaria de Trabalho; 1994.


12. Braga, D. Acidente de trabalho com material biológico
Existem medidas especificas de proteção à em trabalhadores da equipe de enfermagem do Centro de
saúde do trabalhador que são quantitativa e qua- Pesquisas Hospital Evandro Chagas [dissertação de
litativamente satisfatórias, embora de circulação mestrado]. Rio de Janeiro:Escola Nacional de Saúde Pú-
blica; 2000.
ainda limitada, e, devem ser implantadas como
13. Guimarães RM, Mauro MYC. Potencial de
norma obrigatória do Ministério do Trabalho. É morbimortalidade por acidente de trabalho no Brasil – pe-
uma questão de cidadania a conquista desse di- ríodo de 2002: uma análise epidemiológica. Epístula ALASS
reito do trabalhador. (Espana) 2004; 55 (2): 18-20.
A enfermagem ainda não está mobilizada o 14. Guimarães RM, Mauro MYC. Riesgo de accidentes de
suficiente para aplicar as medidas em favor de sua trabajo: uma propuesta de indicadores ergonômicos de
evaluación. Proceedings of the 3rd Conference on
própria saúde, da produtividade do serviço, do seu
Occupational Risk Prevention; 2004. Santiago de
melhor desempenho e satisfação no trabalho. Compostella, Espanha. Santiago de Compostella (Es):
Destaca-se como elemento de grande efici- Asociación del Trabajador; 2004.
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balho e medidas de controle, especialmente no 16. Monk TH. The relationship of chronobiology to sleep
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po ideal para difundir esses conhecimentos por trabalhador na sociedade 24 horas. São Paulo Perspec 2003;
ser o sujeito e o objeto do problema em questão. 17(1): 34-46.
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RIESGOS OCUPACIONALES
CUPA EN SALUD
ALUD
RESUMEN: Esto es un artículo de revisión que intenta discutir los riesgos ocupacionales en salud,
apoyándose en investigación bibliográfica referente al período de 1976 a 2004. Se objetiva debatir los
riesgos ocupacionales en salud a partir de elementos del contexto del trabajador y analizar las condiciones
generales de su ambiente de labor y sus condiciones individuales y de salud. Se percibe que la desarmonía
entre salud y trabajo es incontestablemente un problema de salud pública, lo cual merece ser analizado
en todos sus prismas, comprendiendo así la integralidad del trabajador. Tal hecho requiere, del enfermero,
la atención necesaria para que, primeramente no venga a sufrir el desgaste generado por esa desarmonía
y, después, pueda contribuir para minimizar los efectos negativos generados en otros trabajadores.
Palabras clave: Enfermería; riesgo ocupacional; salud; trabajo.

Recebido em: 06.05.2004


Aprovado em: 14.10.2004

Notas
*
Doutora em Enfermagem e Professora Titular do Departamento de Enfermagem em Saúde Pública da FENF/UERJ. Sanitarista, Enfermei-
ra do Trabalho e Ergonomista. Pesquisadora do CNPq. Rio de Janeiro/RJ.
**
Interno da Faculdade de Enfermagem UERJ. Bolsista IC do CNPq.
***
Mestranda do Programa de Engenharia de Produção do GENTE/COPPE/UFRJ. Arquiteta, Ergonomista e Engenheira de Segurança do
Trabalho

R Enferm UERJ 2004; 12:338-45. • p.345

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