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PROJETO DE EDIFÍCIOS – CONCEPÇÃO – CAPÍTULO 16

Libânio M. Pinheiro
Colaboradores:
Ana Maria S. Brandão; Bianca Ozório; Cassiane D. Muzardo; Sandro P. Santos;
Artur L. Sartorti

Fevereiro de 2016

2. CONCEPÇÃO ESTRUTURAL

A concepção estrutural, ou simplesmente estruturação, também chamada de


lançamento da estrutura, consiste em escolher um sistema estrutural que constitua a
parte resistente do edifício.

Essa etapa, uma das mais importantes no projeto estrutural, implica em


escolher os elementos a serem utilizados e definir suas posições, de modo a formar
um sistema estrutural eficiente, capaz de absorver os esforços oriundos das ações
atuantes e transmiti-los ao solo de fundação.

A solução estrutural adotada no projeto deve atender aos requisitos de


qualidade estabelecidos nas normas técnicas, relativos à capacidade resistente, ao
desempenho em serviço e à durabilidade da estrutura.

2.1 DADOS INICIAIS

A concepção estrutural deve levar em conta a finalidade da edificação e


atender, tanto quanto possível, às condições impostas pela arquitetura.

O projeto arquitetônico representa, de fato, a base para a elaboração do


projeto estrutural. Este deve prever o posicionamento dos elementos de forma a
respeitar a distribuição dos diferentes ambientes nos diversos pavimentos. Mas não
se deve esquecer de que a estrutura deve também ser coerente com as
características do solo no qual ela se apoia.

O projeto estrutural deve ainda estar em harmonia com os demais projetos,


tais como: de instalações elétricas, hidráulicas, telefonia, segurança, som, televisão,
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ar condicionado, lógica e outros, de modo a permitir a coexistência, com qualidade,


de todos os sistemas.

Os edifícios podem ser constituídos, por exemplo, pelos seguintes


pavimentos: subsolo, térreo, tipo, cobertura e casa de máquinas, além dos
reservatórios inferiores e superiores.

Existindo pavimento tipo, o que em geral ocorre em edifícios de vários


andares, inicia-se pela estruturação desse pavimento. Caso não haja pavimentos
repetidos, parte-se da estruturação dos andares superiores, seguindo na direção dos
inferiores.

A definição da forma estrutural parte da localização dos pilares e segue com


o posicionamento das vigas e das lajes, nessa ordem, sempre levando em conta a
compatibilização com o projeto arquitetônico.

2.2 SISTEMAS ESTRUTURAIS

Inúmeros são os tipos de sistemas estruturais que podem ser utilizados. Nos
edifícios usuais empregam-se lajes maciças ou nervuradas, moldadas no local, pré-
fabricadas ou ainda parcialmente pré-fabricadas.

Em casos específicos de grandes vãos, por exemplo, pode ser aplicada


protensão para melhorar o desempenho da estrutura, seja em termos de resistência,
seja para controle de deformações ou de fissuração.

Alternativamente, podem ser utilizadas lajes sem vigas, apoiadas


diretamente sobre os pilares, com ou sem capitéis. Com capitéis, elas são
denominadas lajes-cogumelo, e sem capitéis, lajes planas ou lisas. No alinhamento
dos pilares, podem ser consideradas vigas embutidas, com altura considerada igual
à espessura das lajes, sendo também denominadas vigas-faixa.

A escolha do sistema estrutural depende de fatores técnicos e econômicos,


dentre eles: capacidade do meio técnico para desenvolver o projeto e para executar

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a obra, e disponibilidade de materiais, mão de obra e equipamentos necessários


para a execução.

Nos casos de edifícios residenciais e comerciais, a escolha do tipo de


estrutura é condicionada, essencialmente, por fatores econômicos, pois as
condições técnicas para projeto e construção são de conhecimento da Engenharia
de Estruturas e de Construção.

Este trabalho tratará dos sistemas estruturais constituídos por lajes maciças
de concreto armado, moldadas no local e apoiadas sobre vigas. Posteriormente,
serão consideradas também as lajes nervuradas. Para as demais lajes, deverá ser
consultada bibliografia específica.

2.3 CAMINHO DAS AÇÕES

O sistema estrutural de um edifício deve ser projetado de modo que seja


capaz de resistir não só às ações verticais, mas também às ações horizontais que
possam provocar efeitos significativos ao longo da vida útil da construção.

As ações verticais são constituídas por: peso próprio dos elementos


estruturais; pesos de revestimentos e de paredes divisórias, além de outras ações
permanentes; ações variáveis decorrentes da utilização, cujos valores vão depender
da finalidade do edifício, e outras ações específicas, como por exemplo, o peso de
equipamentos.

As ações horizontais, onde não há ocorrência de abalos sísmicos,


constituem-se, basicamente, da ação do vento e do empuxo em subsolos.

O percurso das ações verticais tem início nas lajes, que suportam, além de
seus pesos próprios, outras ações permanentes e as ações variáveis de uso,
incluindo, eventualmente, peso de paredes que se apoiem diretamente sobre elas.
As lajes transmitem essas ações para as vigas.

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As vigas suportam seus pesos próprios, as reações provenientes das lajes,


peso de paredes e, ainda, ações de outros elementos que nelas se apoiem, como,
por exemplo, as reações de apoio de outras vigas. Em geral as vigas trabalham à
flexão e ao cisalhamento e transmitem as ações para os elementos verticais pilares
ou paredes estruturais.

Os pilares e as paredes estruturais recebem as reações das vigas que neles


se apoiam, as quais, juntamente com o peso próprio desses elementos verticais, são
transferidas para os andares inferiores e, finalmente, para o solo, através dos
respectivos elementos de fundação.

As ações horizontais devem igualmente ser absorvidas pela estrutura e


transmitidas para o solo de fundação. No caso do vento, o caminho dessas ações
tem início nas paredes externas do edifício, onde atua o vento. Esta ação é resistida
por elementos verticais de grande rigidez, tais como pórticos, paredes estruturais e
núcleos, que formam a estrutura de contraventamento. Os pilares de menor rigidez
pouco contribuem na resistência às ações laterais e, portanto, costumam ser
ignorados na análise da estabilidade global da estrutura.

As lajes exercem importante papel na distribuição dos esforços decorrentes


do vento entre os elementos de contraventamento, pois possuem rigidez
praticamente infinita no seu plano, promovendo, assim, o travamento do conjunto. É
o que se denomina efeito diafragma das lajes.

Neste trabalho, serão consideradas, apenas, as ações horizontais, visto que


se trata de um projeto didático. Nas atividades profissionais, os efeitos das ações
horizontais devem, obrigatoriamente, ser considerados.

2.4 POSIÇÃO DOS PILARES

Recomenda-se iniciar a localização dos pilares pelas áreas que geralmente


são comuns a todos os pavimentos (área de elevadores e de escadas) e onde se
localizam, na cobertura, a casa de máquinas e o reservatório superior. Em seguida,
posicionam-se os demais pilares, sendo recomendada a sequência: pilares de canto,
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de extremidade (também chamados laterais) e os internos. Sempre que for possível,


os pilares devem estar embutidos em paredes, procurando respeitar as imposições
do projeto de arquitetura.

Deve-se, também, dispor os pilares de forma que eles estejam alinhados, a


fim de formar pórticos com as vigas que os unem. Os pórticos, assim formados,
contribuem de modo significativo para a estabilidade global do edifício.

Usualmente os pilares são posicionados procurando-se respeitar que as


distâncias entre seus eixos resultem da ordem de 4 m a 6 m. Distâncias muito
grandes entre pilares podem acarretar vigas com dimensões que podem ser
incompatíveis, gerando maiores custos à construção (maiores seções transversais
dos pilares, maiores taxas de armadura, dificuldades nas montagens da armação e
das formas etc.). Por outro lado, pilares muito próximos podem causar interferência
nos elementos de fundação e aumento do consumo de materiais e de mão de obra,
afetando desfavoravelmente os custos.

Recomenda-se adotar, pelo menos, 19 cm para a menor dimensão do pilar.


Prescrições normativas prejudicam dimensões menores, gerando maiores taxas de
armadura. Por razões construtivas, devem-se evitar dimensões menores que 14 cm.

A outra dimensão da seção transversal deve ser adotada de modo que, no


dimensionamento, resultem taxas de armadura não elevadas, inferiores a 2% da
seção de concreto, por exemplo. A escolha da direção da maior dimensão das
seções deve ser feita de maneira a garantir adequada rigidez à estrutura, nas duas
direções. A NBR 6118:2014 ainda afirma que a área mínima da seção transversal
dos pilares não deve exceder 360 cm².

Posicionados os pilares no pavimento tipo, devem-se verificar suas


interferências nos demais pavimentos que compõem a edificação.

Assim, por exemplo, deve-se verificar se o arranjo dos pilares permite a


realização de manobras dos carros nos andares de garagem ou se não prejudica as
áreas sociais, tais como recepção, sala de estar, salões de jogos, de festas etc.

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Na impossibilidade de compatibilizar a distribuição dos pilares entre os


diversos pavimentos, pode haver a necessidade de um pavimento de transição.
Nesta situação, a prumada do pilar é alterada, empregando-se uma viga de
transição, que recebe a carga do pilar superior e a transfere para o pilar inferior, na
sua nova posição.

Nos edifícios de muitos andares, devem ser evitadas grandes transições,


pois os esforços na viga podem resultar exagerados, provocando aumento
significativo de custos.

2.5 POSIÇÕES DE VIGAS E LAJES

A estruturação segue com o posicionamento das vigas nos diversos


pavimentos. Além daquelas que ligam os pilares, formando pórticos, outras podem
ser necessárias, seja para dividir um painel de laje com grandes dimensões, seja
para suportar uma parede divisória e evitar que esta se apoie diretamente na laje.

É comum, por questões estéticas e com vistas às facilidades no acabamento


e ao melhor aproveitamento dos espaços, adotar larguras de vigas em função da
largura das alvenarias. As alturas das vigas ficam limitadas pela necessidade de
prever espaços livres para aberturas de portas e de janelas.

Como as vigas delimitam os painéis de laje, suas disposições devem levar


em consideração o valor econômico do menor vão das lajes, que, para lajes
maciças, é da ordem de 3,5 m a 5,0 m. Outros tipos de lajes podem ter vãos
maiores. O posicionamento das lajes é definido pelo arranjo das vigas.

2.6 DESENHOS PRELIMINARES DE FORMAS

De posse do arranjo dos elementos estruturais, podem ser feitos os


desenhos preliminares de formas de todos os pavimentos, inclusive cobertura e
caixa d’água, com as dimensões baseadas no projeto arquitetônico.

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As larguras das vigas são adotadas para atender condições de arquitetura


ou construtivas. Sempre que possível, devem estar embutidas na alvenaria e
permitir a passagem de tubulações. O cobrimento mínimo das faces das vigas em
relação às das paredes acabadas variam de 1,5 cm a 2,5 cm, em geral. Costuma-se
adotar para as vigas no máximo três pares de dimensões diferentes para as seções.
O ideal é que todas elas tenham a mesma altura, para simplificar o cimbramento. A
NBR 6118:2014 estabelece que a largura mínima para as vigas é de 12 cm sendo
que em casos especiais nos quais é garantido o cobrimento e o alojamento das
barras a largura pode ser reduzida até 10 cm.

Em edifícios residenciais, é conveniente que as alturas das vigas não


ultrapassem valores de 60 cm a 70 cm, para não interferir nos vãos de portas e de
janelas.

A numeração dos elementos (lajes, vigas e pilares) deve ser feita da


esquerda para a direita e de cima para baixo.

Inicia-se com a numeração das lajes –L1, L2, L3 etc.–, sendo que seus
números devem ser colocados próximos do centro delas. Abaixo das lajes deve ser
colocada a sua espessura – ex: H=10 cm. Em seguida são numeradas as vigas –V1,
V2, V3 etc. Seus números devem ser colocados no meio do primeiro tramo. As vigas
devem ter suas dimensões e nível expressas no final de seu comprimento ou no final
de cada tramo. Finalmente, são colocados os números dos pilares –P1, P2, P3 etc.
–, posicionados embaixo deles para o lado direito, na forma estrutural. Devem ser
indicadas as dimensões base x altura dos pilares próximo de sua nomenclatura. A
Figura 2.1 ilustra estas situações.

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V1 (+4,35) Invertida 15cm 20/35

20/45

20/75
P1 20/20 P2 20/20

(+4,35) Invertida 15cm

(+4,35) Invertida 15cm

5
5
V2 (+4,40) V3 (+4,40) 20/60
Invertida 20cm 20/60 Invertida 20cm (+4,40) Invertida 20cm 45/60 (+4,40) Invertida 20cm 20/60
20/60

P3 20/20 P4 20/30

20/60
20/30

20/60
P5 40/45 (morre) P6 40/45 (morre)
40/20 (segue) 40/20 (segue)

+ 4,20 + 4,20

V4 (+4,20) 20/30

P8 20/30 P9 20/30
+ 4,20

V5 (+4,20) 20/30

P10 20/30 P11 20/30

V19 (+4,40) Invertida 20cm


V15 (+4,40) Invertida 20cm

V6 (+4,40) (+4,40) Invertida 20cm 45/60


Invertida 20cm 20/60 V7 (+4,40) 20/60 (+4,40) Invertida 20cm 20/60

Invertida 20cm
P13 20/20 P15 40/45 (morre) P16 40/45 (morre)
5

P14 20/40 40/20 (segue) 40/20 (segue)


V16 (+4,20)

V18 (+4,20)

LEGENDA DOS PILARES

PILAR QUE NASCE


PILAR QUE CONTINUA
V8 (+4,20) 20/30 PILAR QUE MORRE

P17 20/20 P18 20/20

Figura 2.1 – Exemplo de forma estrutural sem cotas.

Devem ser colocadas as cotas parciais e totais em cada direção,


posicionadas fora do contorno do desenho, para facilitar a visualização.

Ao final obtém-se o anteprojeto de todos os pavimentos, inclusive cobertura


e caixa d’água, pode-se prosseguir com o pré-dimensionamento de lajes, vigas e
pilares.

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2.7 QUALIDADE DA ESTRUTURA

As estruturas de concreto devem atender requisitos mínimos de qualidade,


com relação a capacidade resistente, desempenho em serviço e durabilidade,
durante sua construção e ao longo de toda sua vida útil.

Para atender esses requisitos, providências devem ser tomadas em todas as


fases da construção: projeto, execução e uso.

2.7.1 Projeto

O projeto deve levar em conta as condições arquitetônicas e funcionais da


obra. Na sua concepção deve-se escolher um sistema estrutural que seja adequado
ao solo e às condições de uso da obra.

Deve-se verificar a capacidade resistente da estrutura e o seu desempenho


em serviço. Durante toda a fase de projeto, deve-se considerar o processo
construtivo e a durabilidade da obra.

2.7.2 Execução
Durante a execução da obra, deve-se garantir a qualidade dos materiais, da
mão de obra e dos equipamentos utilizados. Deve-se verificar a correta execução do
projeto, pois alterações sem prévia avaliação podem acarretar problemas durante as
fases de execução ou de uso.

2.7.3 Uso

A estrutura deve ser usada conforme a finalidade para a qual ela foi
projetada, sendo que uma mudança de uso deve ser precedida por um estudo da
capacidade da estrutura de resistir às novas solicitações.

A manutenção da obra também é fundamental para garantir a sua qualidade.

Recomenda-se a leitura das seções 5 a 7 da NBR 6118:2014.

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2.8 QUESTIONÁRIO

1 – O que é concepção estrutural? O que se deve considerar?


2 – Quais os requisitos que devem ser atendidos em uma solução estrutural?
3 – O que o projeto estrutural deve prever e considerar?
4 – O projeto estrutural deve estar em harmonia outros projetos. Quais?
5 – Como se procede a estruturação de um edifício?
6 – Como é definida a forma estrutural da edificação?
7 – Qual o sistema estrutural usual dos edifícios?
8 – Do que depende a escolha de um sistema estrutural?
9 – Como o sistema estrutural de um edifício deve ser projetado?
10 – Quais são as ações verticais que podem estar presentes em um edifício? E
quais são as ações horizontais?
11 – Qual o percurso das ações no sistema estrutural usual dos edifícios?
12 – No caso da ação de vento, qual seu percurso no sistema estrutural dos
edifícios?
13 – Para as lajes, o que é efeito diafragma?
14 – Como podem ser posicionados os pilares nos edifícios?
15 – Qual o intervalo sugerido para a distância entre seus eixos?
16 – Quais as consequências de distâncias muito grandes entre pilares? E de
pilares muito próximos?
17 – Qual a dimensão mínima sugerida para pilares? Por quê?
18 – Qual o critério para escolha da outra dimensão da seção transversal do pilar?
19 – E da direção em que deve ser posicionada a maior dimensão das seções?
20 – Posicionados os pilares do pavimento tipo, quais as principais interferências
que devem ser verificadas, nos demais pavimentos?
21 – O que se pode fazer no caso de não ser possível compatibilizar a distribuição
dos pilares entre os pavimentos?
22 – O que são vigas de transição? Por que devem ser evitadas grandes
transições?
23 – Quais os critérios para posicionamento das vigas nos pavimentos do edifício?
24 – Como se escolhe a largura das vigas? E suas alturas?
25 – Qual o critério para se definir o valor do menor vão das lajes maciças?
26 – Como deve ser realizada a numeração dos elementos estruturais?
27 – Quais os requisitos que as estruturas de concreto devem atender?
28 – O que deve ser garantido durante a execução da obra?
29 – Que cuidados devem ser tomados durante o uso da construção?

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