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Microbiologia das doenças periodontais

Lindhe – capitulo 8 e 10
Atual classificação das doenças periodontais (2017):
• Saúde periodontal clínica Em nível subclínico sempre há inflamação, por
• Gengivite isso diz-se que a saúde periodontal é clínica.
• Periodontite
• Doenças periodontais necrosantes
• Abscessos periodontais
A periodontite severa (com perda de inserção mais grave) afeta em torno de 12% da população.
- Qualidade de vida. Condições associadas à halitose, por exemplo.
- Custo econômico.
❖ Aspectos moleculares da patogenia da periodontite
A transição de saúde para gengivite e de gengivite para periodontite envolve dois caminhos ou
duas vias:
1. Microbiologia
2. Resposta do hospedeiro frente ao acúmulo de microrganismos
Em estado de saúde, a resposta imunológica do hospedeiro é proporcional ao biofilme. Via
células do sistema complemento e polimorfonucleares (células da imunidade inata dos
indivíduos).
Quando se tem um cenário de desbiose incipiente (ou semi-desbiose), inicia-se o processo de
gengivite, em que também se terá uma resposta proporcional ao biofilme. Tem maior acúmulo
de polimorfonucleares. as células do sistema complemento dão lugar para células da imunidade
adaptativa (linfócitos B e T). E tem-se a resolução crônica da inflamação. Ou seja, essa
inflamação de alguma forma se resolve. Tem-se o controle do processo inflamatório, que se
mantem confinado à gengiva marginal.
Entretanto, quando por algum motivo esse individuo progride de gengivite para periodontite
(vários fatores atuando para isso acontecer – suscetibilidade) ele entra em um estado de desbiose
franca, que incita uma resposta inflamatória desproporcional do hospedeiro, que atinge um
estado hiper inflamatório. É essa resposta inflamatória exacerbada que causa a perda de inserção
e as sequelas da periodontite (reabsorção do osso alveolar e do ligamento periodontal,
culminando com a migração apical do epitélio juncional).
Modelo de inferência causal da doença periodontal: mecanismo causal (pizza).
▪ Causa necessária – Causa necessária para o desenvolvimento da doença. Ex: um vírus
específico para causar uma doença específica.
▪ Causa suficiente – Causa suficiente, mas não necessárias para a doença acontecer. Ex:
desbiose incipiente entre inflamação e biofilme em gengivite.
▪ Causa componente – Pedaços da pizza. Juntas, formam um mecanismo causal.
Algumas condições (condição socioeconômica, habito de tabagismo, doenças crônicas,
dificuldade motora, acesso a educação, relações sociais, acesso ao dentista...) tem
impacto grande em muitas condições de saúde, sobretudo doenças crônicas não
transmissíveis. Essas causas componentes formam um mecanismo causal, que em geral
está associado à uma resposta imuno-inflamatoria aumentada/desproporcional e a um
desequilibrio entre biofilme e hospedeiro.
Gengivites e periodontites (assim como as demais doenças periodontais) não tratadas devem
ser reconhecidas atualmente como infecções crônicas com impacto na saúde geral do indivíduo.
O biofilme associado à outras condições do individuo pode agravar a condição geral do
mesmo.
1) As doenças periodontais podem ser consideradas doenças infecciosas?
2) Quais são as principais propriedades do biofilme?
3) Como o conceito de desbiose se aplica às diferentes condições periodontais?
Histórico
• Louis Pasteur – desenvolveu a pasteurização
• Robert Koch – postulados de Koch
• Willoughby Miller – infecção focal
1964 e 1966 → induziram a periodontite em um grupo de ratos (um grupo germ-free e um grupo
com DP induzida). Concluíram que a destruição dos tecidos periodontais de suporte poderia ser
transmitida.
1965→ Gengivite experimental em homens. Estudantes de odontologia. Verificaram que, frente
ao acumulo de biofilme, sem higiene oral, de 10 a 21 dias tem-se o desenvolvimento de
gengivite. Os autores observaram:
o Inicio – Cocos gram-positivos
o Meio – Flora de filamentosos e fusobacterias
o Por fim – Cocos gram-negativos, vibrios e espiroquetas (bactérias associadas à
gengivite).
Frente ao retorno da higiene bucal, em torno de 7 a 14 dias essa gengivite vem a remessão.
Esse estudo replicou em uma analise bacteriológica um pouco mais acurado. Constatou-se uma
mudança de perfil microbiano (de biofilme) ao longo do desenvolvimento da periodontite
(sucessão microbiana). Esse estudo foi fundamental para o desenvolvimento da hipótese da
placa inespecífica (qualquer microrganismo poderia contribuir para a destruição tecidual – o
acúmulo de placa por si só é responsável por incitar uma resposta imunoinflamatória, que, com
o passar do tempo, gera a perda dos tecidos de suporte do dente).
No estudo em questão, qualidade e quantidade de placa eram as mesmas entre sítios e
indivíduos.
FRP – diz o quão difícil é de se fazer a higiene bucal.
1980 - Historia natural da doença periodontal em humanos: identificou três grandes grupos
1. 10% acumula placa e não desenvolve nenhum tipo de perda de inserção.
2. 10% acumula placa e desenvolvem perda de inserção incompatível com o acumulo de
placa (muito superior ao acumulo de biofilme).
3. 80% desenvolvem periodontite de forma compatível ao acumulo de biofilme.
Ou seja
1. A grande maioria dos indivíduos desenvolve perda de suporte periodontal de forma lenta
a moderada.
2. Poucos apresentam rápida progressão.
3. Poucos não desenvolvem periodontite, mesmo na presença de biofilme.
Se alguns indivíduos frente ao acúmulo de biofilme desenvolvem respostas inflamatórias
diferentes, talvez a resposta esteja em que bactérias estão nesse biofilme.
Hipótese da placa específica – (1980) “único culpado” ou “múltiplos culpados”.
Aggregatibacter actinomycetemcomitans como fator etiológico da periodontite agressiva
localizada (A.a. como causa necessária para desenvolver a PAL).
Possível atividade em comunidade.
Uso de antibióticos pode interferir tanto em clusters associados à doença quanto em clusters
associados à saúde.
Hipótese da placa ecológica (1994) – a microbiota em intimo contato com o hospedeiro.
Quando em homeostase, tem-se saúde periodontal. Entretanto, quando em desbiose, tem-se
doença periodontal. Primeira vez que considerou-se a manutenção da microbiota como fator de
saúde (talvez não fosse preciso remover toda a microbiota, apenas manter o equilíbrio entre a
microbiota e a capacidade do hospedeiro se defender).
Hipotese de patógenos-chave (2011-2012) – postula que determinados microrganismos
constituintes da microbiota periodontal podem orquestrar a resposta inflamatória. Ex. P.
gingivalis (bactéria associada à doença periodontal). O aumento da quantidade de P. gingivalis
(dieta, estresse, questões psicológicas...) torna a resposta imune do hospedeiro deficiente, que
aumenta a desbiose da microbiota bucal.
A P. gingivalis é capaz de piorar a resposta imune via sistema complemento (tornar a ação do
sistema complemento ainda mais inespecífica), aumentando a desbiose do biofilme, que incita
mais liberação do sistema complemento e inicia um ciclo.
❖ Propriedades e formação do biofilme
As bactérias inicilamente planctonicas, passam a viver em uma comunidade imersa em uma
matriz, ao que chamamos de biofilme.
Propriedades do biofilme:
1. Proteção microbiana
2. Arquitetura aberta – facilitar a entrada de nutrientes para as camadas mais profundas do
biofilme.
3. Ampla variação no habitat – diferentes gradientes de pH, de oxigênio e de acesso à
nutrientes (sacarose, por ex).
4. Metabolismo eficiente
5. Comunicação com o hospedeiro – hipótese da placa ecológica (frente a homeostase,
tem-se uma resposta proporcional. Frente a uma desbiose, tem-se uma resposta
exacerbada e desenvolvem-se as DP).
6. Heterogeneidade ambiental e estrutural – camadas com matriz extracelular maior e
outras menor (o que também impacta na ampla variação do habitat).
7. Tolerância aumentada a antimicrobianos
8. Neutralização de agentes inibidores
9. Virulência aumentada
10. Expressão gênica singular
11. Respostas gênicas coordenadas – após a perda da simbiose, algumas bactérias morrem
para que outras possam aumentar em proporção. Permutação do material genético das
bactérias que morrem para as que continuarão a replicação.
PROCESSO DE FORMACAO DO BIOFILME
1. Formação da película adquirida
Composta basicamente por glicoproteínas salivares.

2. Colonização primária
2.1 Transporte passivo
2.2 Ligação reversivel
Cocos gram-positivos (colonizadores primários) ligam-se à película adquirida via forças
de van der Walls fracas e de longo alcance

3. Receptores de adesina
Irreversível, específico e de curto alcance.

4. Coadesão
Colonizadores secundários.
Ex: F. nucleatum.
5. Maturação do biofilme
Interações metabólicas
Modificação do ambiente
Formação de gradiente
Síntese de matriz extracelular
Sinalização célula-célula
Crescimento bacteriano

6. Desprendimento

Microbial complexes in subgingival plaque – existem algumas bactérias que podem causar
mais prejuízo ao periodonto (placa especifica).

Base da pirâmide (complexos azul, rosa, verde e laranja) – complexo bacteriano associado à
saúde.
Complexo laranja – associadas à doença.
Complexo vermelho – associadas à doença de maior gravidade.
Frente à desbiose observa-se não só um aumento nas bactérias do complexo vermelho e
laranja (P. gingivalis, por exemplo), mas também uma diminuição das bactérias
associadas à saúde.

Eubiose e simbiose Desbiose


• Equilibrio funcional dentro dos e entre os • Diminuição da diversidade
ecossistemas, bem como entre o ecossistema • Expansão dos patobiontes
e o hospedeiro (respectivamente). • Diminuição das espécies benéficas
• Diversidade • Atuação das bactérias chave (keystones)
• Resistência • Alterações nas capacidades metabólicas
• Resiliência
Em um cenário de saúde periodontal (periodonto intacto e saudável):
✓ Streptococcus (oralis, mitis) – colonizadores primários
✓ Fusobacterium – colonizadores
✓ Prevotella
✓ Rothia
✓ Neisseria
Estabilizadas pela ação da saliva (IgA, IgG, lisozimas, ...) e qualidade da dieta. Fatores relativos
ao hospedeiro.
Em cenário de gengivite:
✓ Estado de semi desbiose instável – resposta proporcional do hospedeiro (por isso não
há perda de inserção; NIC = 0)
✓ Após 8 horas sem higiene – aumento da carga
✓ O biofilme supragengival modula o biofilme subgengival
Em cenário de periodontite:
✓ Toda comunidade desbiótica age de maneira colaborativa
✓ Maior carga de espécies inflamofílicas
✓ Self-feeding (sistema de retroalimentação – os produtos das células inflamatórias do
próprio hospedeiro fornecem suporte nutricional para as bactérias inflamofilicas)
✓ Uma parte do biofilme dentário em contato com o dente e outra em contato com o
epitélio de bolsa, podendo liberar toxinas para dentro do epitélio conjuntivo que já está
ulcerado (aumentando ainda mais a permeabilidade do mesmo), aumentando a
possibilidade da interação entre produtos da resposta inflamatória e as espécies
inflamofilicas e propiciando a entrada de LPS bacteriano (por ex) para o tecido
conjuntivo, aumentando a destruição do tecido conjuntivo (sobretudo, pela
desorganização das fibras colágenas, que culmina na perda de osso e ligamento
periodontal e na migração apical do epitélio juncional).
Indivíduos fumantes com periodontite tendem a desenvolver um perfil microbiano subgengival
diferente daqueles indivíduos que nunca fumaram.
Não podemos considerar as doenças periodontais como infecção. Precisa-se da oportunidade.

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