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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

CENTRO DE HUMANIDADES – UNIDADE ACADÊMICA DE HISTÓRIA


COMPONENTE CURRICULAR: ESTUDOS DE HISTÓRIA DO BRASIL IV
DOCENTE: JOSÉ LUCIANO QUEIROZ
DISCENTE: ADRIAN MARCELO PEREIRA DA SILVA

As interpretações marxistas e revisionistas de como as forças militares, à época de


abril de 1964 chegaram ao poder, em suma, colocam em evidência a construção de uma base
político-econômica cuja consequência imediata seria a de consolidação de uma frente
ideológica e política das classes dominantes que, em conluio com as Forças Armadas,
impuseram um regime ditatorial, ou que a sociedade brasileira estava imersa em um caldeirão
permeado pelo golpismo. Ambas, entretanto, se distanciam à medida que elementos como a
participação de empresários, a violência implícita do regime desde o seu surgimento e até
mesmo dos marcos finais da ditadura, se impõe nas análises dos diferentes autores que se
propuseram a interpretar o período em questão.

Com o intuito de ressaltar as principais características de ambas as vertentes serão


utilizados os textos de René Dreifuss e Argelina Figueiredo (2014) com a contribuição do
artigo do autor Caio Navarro de Toledo que tem em vista sintetizar os discursos mais recentes
acerca das interpretações do Golpe de 1964. O texto consistirá na apresentação breve de
ambas as posições teóricas e, finalizando, uma síntese de suas principais diferenças.
Começaremos com a interpretação marxista.

Longe de considerar o golpismo dos anos sessenta como ação de indivíduos ou grupos
isolados que, em campo comum e interesses mútuos, deram prosseguimento a um projeto
civil e militar de autoritarismo brasileiro. Dreifuss esboça um breve panorama da
consolidação de um grupo político muitas vezes deixado de lado pelos pesquisadores não só
do Golpe de 64, mas também da sua movimentação no interior da sociedade brasileira. A este
grupo, denominado de “bloco de poder orgânico”, ficaram a cargos a tarefa de desestabilizar
um regime democrático em nome dos interesses de políticos e empresariais.
João Goulart assumia o posto de presidente sob fortes impulsos conspiratórios por
parte de seus opositores, tanto é que só é aceito no poder quando se torna dependente de um
regime parlamentarista; contudo, ao retomar ao presidencialismo ainda em 1962, sua figura
erigiu posições cada vez mais radicais por parte dos políticos conservadores e, acima de tudo,
da classe empresarial que o enxergava como potencial inimigo de seus interesses de
acumulação de capital.

Sob a coordenação do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) este bloco de


poder estabelecia uma dura luta ideológica frente aos perigos que enxergavam no governo de
João Goulart. A disputa, contudo, não era justa. A utilização do medo e da mentira como
ferramentas de desestabilização criaram, na figura do presidente, um potencial desagregador
da unicidade do país que, em nome do comunismo, destituiria as terras dos grandes
proprietários para legá-las aos “invasores” camponeses e a destruição, no âmbito urbano, das
liberdades “individuais” próprias do sistema capitalista de produção.

Deste modo, o plano de ação do grupo de poder coordenado pelo IPES consistia em
ataques frontais ao Poder Executivo, exercendo uma verdadeira generalização do medo,
instituindo uma necessidade de retomar o que estava sendo perdido, a liberdade propagada
pelas classes altas e médias da sociedade. O golpe foi fruto de uma ação coordenada pelo
grupo de empresário que, em conjunto com a classe oligárquica-industrial e com as Forças
Armadas, tomaram de assalto o populismo de origem getulista e destituíram-no da
presidência, justificando uma ação democrática.

Em contraposição a esta interpretação, a corrente denominada de revisionista, um


movimento de caráter conservador, estimula a análise tendo como eixos a atuação conjunta de
grupos opostos e de possibilidades perdidas frente a uma conjuntura em que a conciliação era
a saída mais justa. Um dos aspectos que mais chamam a atenção neste tipo de interpretação é
a de que o posicionamento de alguns grupos de esquerda, considerados radicais, aproximam-
se de atos antidemocráticos, uma democracia calcada nos ideais burgueses de classe.

No pequeno texto da autora não há sequer menção explícita a luta de classes, mas de
constituição de uma sociedade imersa em conflitos entre reformistas e conservadores, com os
“radicais” colocados à margem das análises. Argelina Figueiredo analisa dois aspectos em que
as forças de esquerda ou reformistas deram vazão ao crescimento dos ideais golpistas: a
instituição do parlamentarismo e o presidencialismo no pós-plebiscito em meados de 1962.
Porque a ação de conciliação era o esperado para as forças comprometidas com a democracia
liberal-burguesa.

A autora não contrapõe, e sequer cita, os conflitos entre a classe dominante e as classes
dominadas. A conjuntura econômica é esvaziada e em seu lugar as ações de indivíduos e
grupos solitários se sobressaem nesta análise. O ponto forte de sua análise é, talvez, a
conciliação dos reformistas junto aos conservadores como ideal para frear o desmonte das
instituições democráticas materializada sob o governo de João Goulart.

Outrossim, ainda caberia às esquerdas o amplo apoio a um posicionamento


conciliatório que, consoante o pensamento da autora, seriam suficientes para arrefecer o
clamor do golpe. A via parlamentar deveria ser o palco cujas cenas deveriam ser de
conciliação e de condenação aos radicalismos, resultando em reformar moderadas e na
coalização de forças antagônicas.

Em suma, a vertente marxista e a reformista diferenciam-se entre si principalmente


pela consolidação e exclusão, respectivamente, da luta de classes no seio da sociedade
brasileira no período aqui discutido. Se um lado advoga pelo reconhecimento dos
acirramentos dos interesses da classe dominante frente a uma conjuntura favorável ao
desenvolvimento de um capitalismo tardio cujas bases assentavam-se na desigualdade, na
dependência externa e em um sistema industrial defasado que impedisse as forças operárias de
resistirem; o outro lado investiga a ação de grupos sociais, amorfos e sem personalidade,
como corresponsáveis pela quebra democrática do regime político brasileiro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DREIFUSS, René Armand. 1964, a conquista do estado: ação política, poder e golpe de
classe. Vozes, 1987.

FIGUEIREDO, A. C. Democracia & reformas: a conciliação frustrada. In: DE TOLEDO,


Caio Navarro. 1964: visões críticas do golpe: democracia e reformas no populismo. 2. Ed.
Campinas, São Paulo: Editora da Unicamp, 2014, p. 59-67.

TOLEDO, Caio Navarro de. Golpismo e democracia. As falácias do revisionismo. Crítica


Marxista, n. 19, p. 27-48, 1964.

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