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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2021.0000093054

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal nº


1500356-67.2019.8.26.0417, da Comarca de Paraguaçu Paulista, em que é apelante
ANDERSON MONTEIRO ODIM, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO
ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 15ª Câmara de Direito


Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram
provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator,
que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores CLÁUDIO


MARQUES (Presidente), GILDA ALVES BARBOSA DIODATTI E POÇAS
LEITÃO.

São Paulo, 15 de fevereiro de 2021.

CLÁUDIO MARQUES
Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO Nº 23642
Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Criminal
Apelação nº 1500356-67.2019.8.26.0417
Apelante: Anderson Monteiro Odim
Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo
Comarca: Paraguaçu Paulista

Apelação Latrocínio (artigos 157, § 3º, inciso II, do


Código Penal) Sentença condenatória Insurgência
defensiva - Materialidade e autoria delitivas
sobejamente comprovadas - Pretensão à isenção da pena,
pelo uso de entorpecentes - Impossibilidade Édito
condenatório mantido Dosimetria das penas
Necessária readequação Recurso parcialmente
provido.

Trata-se de recurso de Apelação interposto por Anderson Monteiro


Odim contra a r. Sentença, exarada a fls. 485/503, a qual julgou procedente a
pretensão punitiva estatal para o fim de condená-lo à pena privativa de liberdade de
22 anos e 02 meses de reclusão, em regime inicial fechado, além do pagamento de 10
dias-multa, cada qual em seu valor unitário mínimo legal, como incurso no art. 157,
parágrafo 3º, inciso II, do Código Penal.
Em suas razões (fls. 524/530), o acusado, preliminarmente,
postulou pela concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. No mérito,
argumentou em prol de sua absolvição, quer pela insuficiência das provas carreadas
aos autos, quer pela ausência de dolo, tendo em vista que teria atuado sob efeito de
entorpecentes, circunstância a qual o isentaria de pena, com apoio no art. 386, inciso
VI, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, requereu a redução da pena que
lhe fora imposta, eis que a capacidade de entendimento dos seus atos estaria
reduzida.
Regularmente processado o recurso interposto e ofertada
contrarrazões (fls. 539/541) a douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não
provimento do apelo, de acordo com o parecer juntado a fls. 560/568.

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É o relatório.
Depreende-se pelos autos que Anderson Monteiro Odim, vulgo
Chimbinha, fora processado e julgado por infração ao inciso II do parágrafo 3º do art.
157 do Código Penal, pois, na data de 19 de abril de 2019, por volta das 14h00, na
rua Uruguai n° 194, no município e comarca de Paraguaçu Paulista teria subtraído
para próprio proveito, o aparelho de telefonia celular, a motocicleta, descritos na
inicial acusatória, além de outros objetos pessoais, mediante violência contra Carlos
Antônio Bello, da qual resultou a sua morte.
Após o regular trâmite da Ação Penal, adveio a r. Sentença
condenatória contra a qual a combativa Defesa se insurge por meio do presente apelo
que se passa a analisar.
De início, no que se refere ao pleito de concessão dos benefícios da
assistência judiciária gratuita, tal não merece abrigo, posto que a gratuidade somente
poderá ser concedida na fase de execução, porquanto nela é que se aferirá a real
situação financeira do acusado, tendo em vista que poderá haver alteração da situação
econômica posteriormente à data da condenação.
Pois bem, quanto ao mérito, a prova da existência do crime
(materialidade) e os vestígios materiais daí decorrentes vêm comprovados por
intermédio do boletim de ocorrência (fls. 05/07), auto de exibição e apreensão (fls.
33/35), laudo necroscópico (fls. 225/227 causa mortis: hemorragia intracraniana
devido a traumatismo craniencefálico provocado por agente contundente), laudo
pericial (fls. 266/284), reforçados pela prova oral coligida aos autos.
Por sua vez, a autoria delitiva é extraída dos depoimentos prestados
pelas testemunhas.
Adota-se, transcrevendo, o resumo dos depoimentos realizado pelo
n. juiz sentenciante, a fls. 488/497, posto que bem compilada a prova oral registrada
nas mídias acostadas aos autos:

“(...) Em suas declarações na delegacia, Cintia Monteiro Bernardes disse que:


'É irmã do Anderson, vulgo "Chimbinha"; Na sexta-feira (19/4/2019) soube por
sua mãe que seu irmão estava andando com uma moto de cor preta, mas que
não sabe informar o modelo e que, se seu irmão fosse até sua casa pedir
dinheiro para abastecer a moto, que não desse, pois seu irmão não é habilitado;

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Na mesma sexta-feira (19/04/2019) seu irmão foi até sua casa (por volta das
15h00min), com um telefone celular, o qual a Declarante reconhece como sendo
o mesmo apreendido pelos policiais desta Delegacia, dizendo que havia
comprado o telefone e precisava resetá-lo; Reconhece o telefone celular
apreendido como sendo o mesmo utilizado por seu irmã, pois se trata do mesmo
modelo e a capinha de cor rosa que está no aparelho agora, era de sua mãe e
seu irmão pegou para colocar no aparelho; Seu irmão utilizou o seu celular
para pesquisar na internet como resetar o aparelho, mas não conseguiu; Seu
irmão foi embora e apenas voltou a vê-lo no sábado, quando voltou à sua casa,
com a mesma moto preta que sua mãe havia visto; Seu irmão lhe disse que ele e
um amigo haviam recebido a moto como pagamento de uma dívida; Seu irmão
também estava com uma quantia em dinheiro (um pouco mais de trezentos
reais), que usaria para pagar uma dívida, ao que a Declarante lhe pediu para
tomar cuidado, pois não trabalha e se fosse abordado pela polícia, seria
questionado sobre a origem do mesmo; Seu irmão lhe pediu dinheiro para
abastecer a moto, pois precisava ir embora e estava sem combustível, ocasião
em que a Declarante lhe deu Dez Reais; No sábado a tarde, a sogra da
Declarante ligou informando que Carlos, que é primo do esposo da Declarante,
havia falecido tendo sido assassinado quando lhe roubaram a moto; A
Declarante, ficou receosa de que tivesse sido seu irmão, mas, ao questioná-lo, o
mesmo negou ter praticado o crime; Um primo de seu marido, de nome Jaime,
comentou que se visse a motocicleta, reconheceria; A Declarante mostrou a foto
no Facebook de seu irmão, na qual estava com a motocicleta e, pela placa, Jaim
reconheceu que era a moto roubada de Carlos; A Declarante telefonou para sua
mãe e contou a história, sendo que sua mãe afirmou que faria seu irmão
confessar e o entregaria na delegacia; Uma vizinha de sua mãe, de nome
Priscila, ligou para a Declarante, contando que alguém tinha ouvido barulho na
casa da mãe da Declarante, mas que não conseguiu ver o que era; Foi até a
casa de sua mãe para ver o que havia acontecido e, seu irmão Andrei, lhe
contou que Reginaldo e mais dois rapazes, tinham ido até lá com um facão,
entraram na casa atrás de Anderson, mas não conseguiram pegá-lo; Acredita

que Anderson tenha pulado o muro dos fundos e fugido pelo pasto; A
Declarante tentou ligar para seu irmão, mas quem atendeu foi Reginaldo, pois
este estava com o telefone usado por seu irmão (o mesmo apreendido nos autos)
e lhe disse que, quando Anderson adentrou no mato, deixou o telefone cair; A
Declarante afirma que, no sábado, perto da hora do almoço, viu Miqueias
próximo de sua casa, com a mesma moto que seu irmão estava usando;
Miqueias estava com a tia da Declarante, de nome Luciana, na garupa da moto;

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Que Miqueias é o único amigo que seu irmão Anderson tem e que, normalmente,
fazem tudo juntos; Seu irmão é usuário de maconha e acredita que Miqueias
também seja; Seu irmão sempre lhe pede dinheiro para comprar cigarro e,
como Anderson não trabalha, acaba dando' (fls. 12).
Em juízo, afirmou que o réu apareceu em sua residência com uma motocicleta e
que a família o indagou diversas vezes sobre a origem do bem, mas ele negava
ser fruto de roubo ou furto. Contudo, para a depoente teria dito que a
motocicleta era de um colega, ao passo que para a genitora dos dois teria
afirmado que o bem era oriundo do pagamento de uma dívida. Disse que soube
que três homens, incluindo o filho da vítima, teria ido à casa de sua mãe e
queriam matar seu irmão. Afirmou que a vítima é parente do seu esposo e diante
das suspeitas, resolveu mostrar para um parente da vítima uma foto da referida
motocicleta, sendo que esse parente de pronto reconheceu como sendo a
motocicleta da vítima. Ao ser-lhe apresentada a
fotografia de fls. 122 com a motocicleta já deteriorada, a depoente afirmou que
era semelhante a que estava na posse de seu irmão. Sobre o celular, afirma que
o aparelho apreendido nos autos é o mesmo que viu na posse de seu irmão.
Na delegacia, Daniela Aparecida Ramirio disse que: 'Na sexta-feira, dia 19 de
abril de 2019, Anderson, vulgo "Chimbinha", foi até a residência da Depoente,
entre as 18h30min e 19h00min, com uma moto, dizendo que havia ganhado a
moto do pai; O filho da Depoente, Miqueias, não estava em casa, razão pela
qual, Anderson foi embora; Miqueias chegou em casa por volta das 22h00min,
pois estava trabalhando, fazendo uma área, junto com seu amigo Maicon, em
uma residência três casas para frente da Depoente, ocasião em que Anderson
também retornou à residência da Depoente e, ele e Miqueias, saíram com a
motocicleta, mas não demorou para voltar; No sábado, dia 20 de abril de 2019,
soube da morte do senhor Carlos Bello e questionou Miqueias se o mesmo havia
feito alguma coisa, todavia seu filho afirmou que não havia feito nada;
Suspeitando de que seu filho pudesse estar mentindo, foi procurar Anderson,
vulgo "Chimbinha" e questionou-o sobre os fatos; Anderson lhe disse que
Miqueias não teve qualquer participação nos fatos e nem sabia de nada, que
havia feito tudo sozinho; Anderson afirmou à Depoente que foi até a casa da
vítima Carlos, por volta das 14h00min/14h30min entrou na residência e
encontrou a vítima dormindo, deu dois tapas no rosto da vítima, que acordou,
antes que a mesma reagisse, Anderson passou a faca no pescoço para tirar-lhe a
consciência e, depois, bateu com a barra de ferro na cabeça da vítima Carlos
para ter certeza da morte; Feito isso, Anderson informou à Depoente que foi
embora e voltou apenas a tarde para buscar os objetos (um pouco de dinheiro,

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um telefone celular e a motocicleta); Anderson lhe mostrou o telefone celular, o


qual a Depoente reconhece como sendo o mesmo apreendido em poder de
Reginaldo (filho da vítima) e trazido para esta Delegacia; Anderson, ainda,
declarou para a Depoente, que estava de campana na casa da vítima já há
algum tempo e decidiu entrar na casa do senhor Carlos na sexta-feira porque,
com a venda da moto, iria pagar sua CNH; Após conversar com Anderson, no
domingo à noite (dia 21 de abril de 2019), por volta das 19h30min/20h00min,
não teve mais notícias de Anderson; Miqueias, nesta manhã, estava saindo de
casa, quando foi abordado pelo filho da vítima Carlos, de nome Reginaldo, o
qual chegou agarrar Miqueias, afirmando que Miqueias teria matado seu pai,
juntamente com Anderson e com Edileuza (mãe de Anderson); Miqueias
conseguiu se desvencilhar e saiu correndo, adentrando no meio do mato; Até o
momento em que dirigiu-se para esta Delegacia, Miqueias ainda não havia
voltado para casa; Soube que Anderson também havia adentrado no meio do
mato, porque ouviu os homens que estavam atrás de seu filho afirmar e
correrem para o local' (fls. 17).
Na delegacia, Edileusa Aparecida Monteiro disse que: 'Na sexta-feira
(19/04/2019) estava no Bar do Julião, por volta das 20h00min, quando seu filho
chegou com uma
moto de cor preta, Modelo Honda CG Titan; Que seu filho não trabalha, razão
pela qual questionou-o sobre a procedência da moto; Anderson lhe disse que um
colega havia lhe emprestado a moto e deixado para que usasse, mas a
Declarante não perguntou quem era o colega e nem Anderson lhe disse;
Quando voltou pra casa, Anderson já estava dormindo e a moto estava em sua
casa; No sábado a tarde, sua filha Cintia ligou, dizendo que o primo de seu
marido, havia falecido, pois sua casa havia sido roubada e quem roubou o
havia matado; Sua filha ainda lhe contou que haviam roubado a moto, uma
quantia em dinheiro, telefone celular e a carteira de
Carlos; No domingo de manhã (21/04/2019) um primo de seu genro, disse que a
moto de Carlos era a mesma que Anderson estava utilizando, pois haviam visto
uma foto postada por Anderson no facebook, na qual aparecia nitidamente a
placa da moto, e que era a mesma roubada de Carlos; Novamente questionou
seu filho e este negou totalmente ter praticado o crime; A Declarante,
preocupada, disse a seu filho que não queria a moto em sua casa, ocasião em
que, por volta das 8h00min, Anderson saiu de casa com a moto, passou o dia
todo fora e voltou a noite, sem a motocicleta, afirmando que havia devolvido
para seu colega; A Declarante viu também o telefone celular utilizado por seu
filho e, ao questioná-lo, este disse que um amigo havia comprado um Iphone e
lhe vendido o aparelho pela quantia de R$ 500,00 (Quinhentos Reais) e que
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daria um jeito de pagar, mesmo sem estar trabalhando; Neste ato, reconhece o
telefone celular apreendido pelos policiais civis junto com Reginaldo, como
sendo o mesmo que seu filho Anderson estava usando, pois, a capinha cor de
rosa que está nele é de sua propriedade, a qual seu filho perguntou se poderia
usá-la; Trata-se de um telefone celular marca LG, modelo K10; Que seu filho
lhe disse que a motocicleta pertencia a Miqueias, inclusive, a Declarante
informou que chegou a ver, no aparelho celular apreendido, fotos de seu filho
Anderson, junto com Miqueias, pois os dois estavam utilizando a moto;
Anderson é muito amigo de Miqueias e, inclusive, disse a sua Declarante que
estava namorando a irmã de Miqueias, de nome Letícia e, dormia lá todas as
noites; Não estava em casa quando Reginaldo foi até lá, estava apenas seu filho
Andrei, o qual lhe disse que alguns homens haviam estado lá, tentando matar
seu irmão; Um dos homens era Reginaldo; Andrei contou á Declarante também,
que Anderosn fugiu pulando o muro dos fundos, o qual dá para o pasto que
Anderson se refugiou; Reginaldo foi embora quando viu que Anderson havia
fugido; Quando soube do ocorrido, estava na casa de sua mãe; Voltou
imediatamente para casa e, ao chegar, ligou para Anderson, mas, quando este
atendeu, Reginaldo tomou-lhe o telefone das mãos e disse à Declarante, que já
havia matado Anderson e que também mataria a
Declarante, pois sabia que a mesma estava envolvida nos fatos; A declarante
respondeu que não sabia de nada e não tinha qualquer envolvimento com os
fatos, ao que, aparentemente, Reginaldo se acalmou; Reginaldo havia pensado
que a Declarante era amante de seu pai (a vítima Carlos), todavia isto não é
verdade e, quando a Declarante apresentou seu marido para Reginaldo, este
acreditou no que lhe disse' (fls. 21).
Na delegacia, Reginaldo Antonio Belo disse que: 'É filho da vítima Carlos; No
sábado, por volta das 16h00min, a senhora SUELI, a qual era namorada de seu
pai, foi até a casa de Marcelo, que é o proprietário da casa que Carlos morava;
Sueli afirmou a Marcelo que não tinha notícias de Carlos há dois dias; Marcelo
foi até a residência, abriu e entrou juntamente com Sueli; Marcelo e Sueli
encotraram seu pai, sentado em uma cadeira, próximo à porta de saída da
residência, encostado e com a cabeça caída para a frente; Marcelo e Sueli
acionaram o resgate; Soube do falecimento de seu pai através de seu primo
Juca, irmão de Marcelo; Avisou suas irmãs e foi até o local; A Funerária São
Vicente foi quem fez todo o serviço funerário; No local dos fatos falou com os
policiais, mas não entrou no local, pois estava sendo realizada aperícia e, logo
após, a funerária chegou para retirar o corpo; Enquanto estava no local, ouviu
Sueli afirmar que tinha avisado a vítima para que não guardasse dinheiro em
casa, pois Carlos havia feito um empréstimo de R$ 4.000,00 (Quatro Mil Reais)
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e guardado em casa; O Declarante e nem, ninguém da família sabia deste


empréstimo, aparentemente, apenas Sueli; Recebeu uma ligação de número
restrito, informando que foram Anderson e Miqueias que mataram seu pai; Na
manhã de segunda-feira (22/04/2019), quando foi até as casas de Anderson e
Miqueias, estava acompanhado de seu sobrinho Felipe; A intenção de ir até o
local era apenas saber os endereços de Anderson e Miqueias, mas não tinha a
intenção de machucar ninguém, o facão era para se defender, caso sofresse
alguma ameaça por parte dos dois; Quando chegou próximo à casa de Miqueias
o viu na esquina e ficou nervoso, por isso tentou correr atrás dele, mas Miqueias
conseguiu fugir; Anderson vinha saindo no portão de sua casa mas, quando viu
o Declarante, correu, pulou o muro do fundo e fugiu pelo pasto até se
embranhar no meio do mato; Na fuga, Anderson deixou o telefone celular cair e
Felipe pegou o telefone, entregando-o para o Declarante; O Declarante, no
mesmo instante, reconheceu que era o telefone de seu pai e entregou-o para a
polícia; Ouviu de Quatazinho, um mecânico que mora próximo de onde seu pai
morava, que na sexta-feira viu Sueli ir até a casa de Carlos; Algum tempo após
Sueli ter ido embora, Carlos o procurou pedindo o telefone celular de
Quatazinho emprestado para fazer umaligação, pois Sueli havia levado seu
telefone embora; Não sabe pra quem seu pai ligou quando
usou o telefone de Quatazinho' (fls. 26).
Em juízo, a testemunha disse que recebeu uma ligação no sábado a tarde de um
primo dizendo que o seu pai havia sido morto e estava lá na residência onde se
encontra um depósito de ferro velho. Indagado, afirma que foi subtraída uma
moto e dinheiro. Relata que após descobrir quem era o acusado, foi dar uma
volta no bairro Lina Leuzi, e encontrou o acusado. Afirma que o acusado
correu, e o celular caiu, e então levou o aparelho para a polícia civil. Indagado,
afirma que ficou sabendo quem foi o assassino do seu pai, pois no dia do
enterro, recebeu uma ligação anônima que havia dois rapazes andando com a
moto que era do seu pai.
Com isso, informou a polícia. Quando a polícia chegou próximo à casa do
acusado, não conseguiu fazer nada. Assim que a polícia saiu, o acusado saiu
com a moto, entrou em uma estrada de terra e colocou fogo na moto.
Na delegacia, Sueli Aparecida dos Santos disse que: 'Morou junto, em união
estável, com a vítima Carlos durante sete anos; Após a separação, voltaram a
conversar e a se relacionar, namoravam, mas não moravam juntos mais; Na
sexta-feira (19/04/2019), pela manhã, foi até a casa de Carlos para fazer o
almoço; Cozinhou para ele peixe e fez um curau de milho verde; Quando
terminou de cozinhar, por volta das 11h25min, foi embora; Por volta das
13h55min recebeu uma mensagem de Carlos dizendo que o curau que a
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Declarante havia feito estava uma delícia, mas que, após a Declarante ir
embora, a vítima fez uma polenta de milho
verde que ficou muito boa também; A Declarante, após chegar em sua casa,
deitou-se para descansar um pouco, acordou entre 18h00min e 19h00min, olhou
o telefone celular e não tinha nenhuma mensagem de Carlos; A declarante,
achou estranho, pois Carlos lhe mandava mensagens o dia todo; Escreveu uma
mensagem perguntando se estava tudo bem, mas a mensagem não foi vista;
Enviou várias mensagens, mas nenhuma delas chegou; Tentou ligar várias
vezes, mas as ligações caíam direto na caixa postal; No sábado, continuou sem
conseguir falar com Carlos e decidiu procurar Marcelo, que é primo da vítima e
proprietário da casa que Carlos morava; Contou a Marcelo que não tinha
notícias de Carlos desde a sexta-feira à tarde e foram juntos até o Ferro Velho
onde fica a casa que Carlos morava; Ao chegar no local, o portão estava aberto
e, acreditando que Carlos estava em casa, entraram no local; A porta de
entrada, que dá direto para a cozinha, estava meio aberta; Quando foram
entrar, se depararam com a casa toda revirada, arroz e outros produtos
alimentícios espalhados pelo chão; A Declarante, muito assustada com o que
viu, decidiu ficar do lado de fora, enquanto Marcelo entrou; Da porta, ouviu
Marcelo gritando por Carlos; Quando Marcelo percebeu que Carlos estava
morto, falou para a Declarante e saiu da casa, para acionarem a polícia; A
polícia compareceu no local, os peritos e a funerária São Vicente para a
retirada do corpo; Carlos lhe disse que havia feito um empréstimo para pagar
os impostos das residências que possui na Barra Funda, mas que,
aparentemente, não foram transferidas para o nome da vítima; Não perguntou o
valor que Carlos havia emprestado; Carlos não mencionou se estava com o
dinheiro em casa ou no banco; Carlos não costumava deixar dinheiro em casa;
Na data dos fatos, ainda nervosa, comentou com os policiais que Carlos havia
feito um empréstimo, mas que ele não costumava guardar dinheiro em casa;
Nunca teve um bom relacionamento com os filhos de Carlos; A filha da
Declarante também não aceitava o seu relacionamento com a vítima; Tentou ir
ao velório, mas foi expulsa pela família de Carlos e preferiu não permanecer no
local; Carlos era uma pessoa sempre sorridente e, ao que a Declarante saiba,
era muito querido por todos que o conheciam, não tinha inimigos; Conhece
Edileusa, mãe de Anderson, pois trabalharam juntos na roça; Não conhece
Anderson e nem Miqueias; Também não conhece a mãe de Miqueias; Não
conversou com ninguém sobre os fatos e nem teve notícia alguma sobre o
ocorrido' (fls. 28).
Na delegacia, Marcelo dos Anjos Belo disse que: 'É primo da vítima Carlos;
Carlos morava numa casa, de propriedade do Declarante, que fica no ferro
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velho, também de sua propriedade; No sábado, por volta das 16h00min, Sueli,
namorada de Carlos, foi até a casa do Declarante afirmando que, desde a sexta-
feira (19/04/2019) por volta das 11h30min, última vez que esteve com Carlos,
não tinha mais notícias; Sueli lhe disse, ainda, que mandou mensagem para
Carlos, aproximadamente, 13h55min, e não teve resposta; Sueli lhe pediu que
fosse com ela ao ferro velho, já que o Declarante é o proprietário do local, pois
estava com um pressentimento ruim de que algo poderia ter acontecido; Sueli
foi até sua casa de
bicicleta e, disse ao Declarante que havia caído com a bicicleta em um buraco e
machucado a costela, razão pela qual, o Declarante levou Sueli em seu carro
até o local; No local, o portão estava meio aberto e o Declarante e Sueli
entraram; Quando entrou na cozinha, o Declarante se deparou com a casa toda
revirada e encontrou Carlos em posição de quem estivesse sentado, corpo
inclinado para frente, com dois cortes na cabeça e, aparentemente, já sem vida;
Sueli não entrou na casa, ficou parada na porta; Não sabe afirmar se Sueli teve
coragem de olhar para a cena, mas, de onde ela ficou parada era perfeitamente
possível ver como a vítima estava; Quando constatou a situação, contou para
Sueli e acionaram a polícia; A polícia foi até o local, bem como a Perícia; Não
escutou Sueli comentar aos policiais que havia pedido para Carlos não guardar
dinheiro em casa; Carlos nunca comentou nada sobre guardar dinheiro em
casa; No local dosfatos, ouviu em uma roda de conversa, que Carlos havia feito
um empréstimo no valor de R$ 4.000,00 (Quatro Mil Reais) para Sueli, mas não
sabe precisar quem foi que disse isso, pois haviam várias pessoas participando
da conversa e o declarante não estava no meio, ficando impossibilitado de
identificar quem teria feito esse comentário; Sueli e Carlos brigavam muito mas,
ultimamente, se relacionavam melhor; Carlos parou de beber há dois anos e
Sueli ainda bebia; Depois que reataram, não viu mais brigas entre Sueli e
Carlos; Quando disse para Sueli que acreditava que Carlos estava morto, Sueli
ficou um pouco nervosa, chorou, disse que Carlos era sua vida, mas logo se
acalmou; Sueli queria pegar uma caixa azul contendo cerveja e levar, mas o
declarante não permitiu, pois disse que nada deveria ser mexido enquanto a
perícia não viesse; Ainda não mexeu na casa e nem arrumou as coisas; Não viu
Sueli no enterro, mas sabe que ela esteve no velório; Não sabe afirmar como
Sueli foi recebida no velório pela família de Carlos, pois os filhos da vítima não
se relacionavam bem com Sueli' (fls. 31).
Em juízo, disse que chegou na casa da vítima e estava tudo revirado, e que
Carlos estava caído no chão, todo ensanguentado. Afirma que no momento não
reparou se haviamsubtraído algo, apenas posteriormente percebeu que a moto
não estava mais lá. Ficou sabendo que a moto apareceu na casa do acusado.
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Indagado, afirma que o local dos fatos era um ferro velho, e a vítima estava no
quartinho.
Na delegacia, Miqueias Henrique Ramiro disse que: 'foi procurado por policiais
militares e indagado sobre a sua eventual participação no crime de latrocínio
cometido contra a vítima Carlos Antonio Bello, porém nega qualquer
participação no referido delito. Afirma que é colega de Anderson Monteiro
Odim e, inclusive, moram no mesmo bairro, mas na ocasião dos fatos o
declarante estava trabalhando na casa de seu vizinho Maicon, ajudando-o a
entelhar uma área de lazer. Esclarece que há algum tempo atrás, em data que
não recorda, em companhia de Anderson Monteiro, cometeu crime de roubo na
Rua Bulgária, ocasião em que subtraíram 800 reais de um casal de idosos. Por
esse motivo, a mãe de Anderson se confundiu e acabou dizendo aos policiais que
o declarante estivesse envolvido no latrocínio ora investigado, mas isso não é
verdade. O declarante apenas soube do ocorrido por comentários que viu na
internet. No domingo de manhã, encontrou-se com Anderson em um jogo de
futebol e este lhe disse que tinha 'feito uma fita' e que estava com um amoto,
tendo o declarante desconfiado porque pelos comentários da internet havia
ocorrido o roubo de uma moto e que a vítima tinha sido morta pelo assaltante.
Por fim, deseja colaborar com as investigações e voluntariamenteautoriza a
colheita de amostra de sangue para eventual confronto' (fls. 43). Em outro
momento, reiterou as suas declarações prestadas anteriormente (fls. 44).
Na delegacia, Lucinda Monteira disse que: 'É tia do Indiciado ANDERSON
MONTEIRO ODIM; No sábado (20/04/2019), estava em sua residência, quando
seu sobrinho chegou, acompanhado de MIQUEIAS, em uma moto preta, Honda
Titan; Miqueias era quem estava pilotando a moto e Anderson estava na
garupa; Perguntou a Miqueias onde eles tinham conseguido a moto, ao que
Miqueias respondeu que os pais de "Chimbinha" (Anderson) havia lhe dado;
Questionou, ainda, sobre o documento da moto, mas Miqueias prontamente
respondeu que o pai de Anderson entregaria o documento apenas se Anderson
se comportasse; Seu sobrinho lhe pediu R$ 5,00 (Cinco Reais) para fumar um
baseado, mas a Declarante não tinha; A Declarante vendeu uma geladeira para
sua sobrinha Cintia (irmã de Anderson) pela qual iria ser paga na segunda-
feira (22/04/2019); Ligou para Cintia e falou com o esposo dela (Juliano)
perguntando se ele não poderia adiantar o pagamento; Juliano lhe disse que
também estava sem dinheiro, ao que a Declarante pediu se ele não poderia lhe
conseguir ao menos R$ 50,00 (Cinquenta Reais), pois iria dar dinheiro para
Anderson; Juliano lhe disse que conseguiria os R$ 50,00 (CinquentaReais), mas
que aí a dívida ficaria quitada; A Declarante aceitou, pois afirma que preferia
perder os outros R$ 50,00 (Cinquenta Reais) e ter algo para dar à Anderson, do
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que vê-lo fazendo besteiras para conseguir dinheiro; Juliano disse, então à
Declarante que podia ir buscar o dinheiro; A Declarante sempre se utiliza de
moto táxi mas, como os dois estavam lá, de moto, perguntou se Miqueias
possuía Habilitação, pois sabia que Anderson não tinha, e se o mesmo não a
levaria para buscar o dinheiro; Anderson ficou na casa da Declarante e
Miqueias a levou para buscar o dinheiro, isso por volta das 14h30min;
Miqueias parou a moto em frente a casa de Cintia e a Declarante desceu da
moto, pegou o dinheiro, passou na casa de seus pais para lhes cumprimentar e
voltou para sua casa com Miqueias; A Declarante deu R$ 10,00 (Dez Reais)
para Anderson e este lhe disse que ele e Miqueias iriam para casa; Soube por
seus pais do que havia acontecido, pois sua mãe ficou nervosa e estava
passando mal; Não sabe quem pediu, mas um mototáxi foi lhe buscar porque
sua mãe estava passando mal; Foi até a casa de sua mãe, ocasião em que soube
que "Chimbinha" estava desaparecido e estavam falando que o mesmo havia
sido morto; A Declarante veio até a Delegacia, onde soube que seu sobrinho
estava apenas desaparecido; Não viu mais nem Anderson e nem Miqueias;
Anderson sempre lhe pedia dinheiro e, sempre que tem, a Declarante lhe dava;
Seu sobrinho Anderson e Miqueias nunca andam separados, tudo fazem juntos;
Miqueias e Anderson são usuários de maconha; Não sabe se os doiscostumam
roubar para conseguir dinheiro, mas sabe que a mãe e a irmã de Anderson
sempre lhe dão dinheiro para comprar drogas, para que o mesmo não precise
roubar; Soube apenas aqui na Delegacia, por sua irmã, que a moto que
Miqueias pilotava e Anderosn estava na garupa, era roubada do senhor Carlos;
Não conhecia a vítima Carlos, não se recorda do mesmo e, também, não sabe
afirmar se o mesmo era próximo de seu sobrinho Juliano (marido de Cintia);
Anderson lhe dizia que só fumava maconha, mas que não traficava' (fls. 51).
Na delegacia, a testemunha Neliton Souza Martins, policial militar, disse que:
'Estava em serviço, junto com seu colega de farda SDPM Madson, quando foi
acionado via Copom para atender a uma ocorrência em um ferro velho; Dirigiu-
se até o local onde encontrou o sobrinho da vítima, o qual é proprietário do
ferro velho onde morava a vítima e sua companheira; Os parentes da vítima
informaram que Carlos Bello estava sentado e todo cheio de sangue e que a
casa estava toda revirada; Chegou até a porta, mas não adentrou no local;
Após poucos minutos, o Corpo de Bombeiros chegou ao local, viram a situação
e saíram; Acionou a perícia e ficou até o término da perícia; A vítima já estava
em situação de óbito quando chegou ao local; Não ouviu quaisquer comentários
sobre suspeitas de que a vítima tivesse feito empréstimo e guardadodinheiro em
casa. A única coisa que os familiares comentaram foi a falta da moto' (fls. 203).
Em juízo, declarou ter sido acionado para comparecer no local dos fatos, onde
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encontraram a vítima já sem vida e a residência toda revirada. Alegou que os


familiares perceberam a falta de uma moto.
Na delegacia, a testemunha Madson Danilo Silva, policial militar, manteve
integralmente a versão narrada pelo seu companheiro de farda Neliton Souza
Martins (fls. 204).
Em juízo, declarou que quando chegou ao local dos fatos foi constatado que a
casa estava revirada e o falecido estava em um canto com várias marcas de
sangue e machucados na cabeça. Indagado sobre alguma coisa que teria sido
subtraído no local, respondeu que ficou sabendo de uma moto e que havia sido
recuperado, mas alguém teria colocado fogo nela.”

Acrescente-se que tais relatos estão em consonância com a


confissão do réu.
Tem-se que, ao ser interrogado em solo extrajudicial, o acusado
afirmou ter procurado espontaneamente a Policia Militar local, acompanhado de sua
genitora, para admitir a autoria do crime de latrocínio que lhe fora imputado,
conforme noticiado no Boletim de Ocorrência n° 111/2019; o interrogando assim
agiu, atendendo ao pedido de sua mãe e também por temer por sua integridade física,
uma vez que parentes e amigos do ofendido souberam que ele seria o autor da
infração penal e o estariam procurando com o possível objetivo de vingança; acerca
dos fatos, o interrogando asseverou que na última sexta-feira (19/04/2019), por volta
das 14h00min, com o intuito de roubar a motocicleta da vítima, a qual tinha notado
no ferro velho, pertencente à vítima e que ficava no mesmo local dias antes, quando
ali esteve para vender alumínio; o interrogando pulou o muro dos fundos e ingressou
na residência da vítima pela porta da cozinha, a qual estava aberta; o interrogando se
dirigiu diretamente ao quarto do ofendido e notou que ele estava na cama, ocasião na
qual, imediatamente, colocou no pescoço da vítima uma faca que levava consigo; a
vítima acordou assustada e o interrogando anunciou assalto; o ofendido tentou se
levantar e acabou sendo esfaqueado no pescoço, no lado esquerdo, porém esse
primeiro golpe foi sem intenção; atordoada pelo golpe, a vítima caiu e o interrogando
novamente colocou a faca no pescoço dela, oportunidade em que a vítima agarrou a
lâmina da faca com as duas mãos; para puxar a faca, o interrogando pisou no rosto da
vítima para que ela soltasse a lâmina e, em seguida, desferiu outro golpe com a faca
da cabeça do ofendido, tendo inclusive entortado a lâmina; como não conseguia mais
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utilizar aquela faca, o interrogando foi até o quintal, apoderou-se de uma barra de
ferro e voltou para “terminar o serviço” e, após concretizar o seu plano de subtrair a
motocicleta, voltou e encontrou a vítima caída próxima à porta do banheiro, quando
começou a golpeá-la com a barra de ferro, somente na cabeça; posteriormente ao
desmaio do ofendido, o interrogando apanhou um aparelho celular e carteira, que
estavam sobre um pequeno baú, bem como a chave da motocicleta e o capacete que
estavam sobre a mesa da cozinha, fugindo, ato seguinte, do local a bordo da referida
moto; o interrogando se dirigiu diretamente para a sua residência; no mesmo dia, por
volta das 18h30min, como já estava anoitecendo, pegou a motocicleta e saiu para dar
umas voltas pela cidade; no sábado de manhã, logo que acordou, a mãe do
interrogando viu a motocicleta e perguntou de quem era; o interrogando disse à
genitora que havia pego como pagamento de dívida; no sábado a tarde, o
interrogando foi com a motocicleta até uma cachoeira que ficava em área rural de
Paraguaçu Paulista, local em que tirou uma fotografia ao lado do referido veículo e
em seguida postou na rede social “Facebook”; na fotografia, apareceu a placa da
motocicleta, motivo pelo qual rapidamente o interrogando passou a ser procurado
como suspeito do crime; na madrugada de segunda-feira, aproximadamente às
00h30min, o interrogando levou a motocicleta até uma estrada de terra, que ficava
nas proximidades do posto Truks, e ateou fogo nela, usando a própria gasolina que
estava no tanque; pela de manha, o interrogando foi procurado em sua casa por um
parente da vítima, todavia conseguiu sair correndo pelos fundos e se escondeu na
mata; cerca de meia hora depois, aquele mesmo individuo, acompanhado de outros
dois, encontrou o interrogando na mata e tentou lhe dar um golpe com facão,
atingindo-lhe o braço esquerdo, apenas de raspão, mas conseguiu fugir deles,
momento em que deixou cair o celular subtraído da vítima, o qual foi recuperado por
um daqueles indivíduos; o interrogando desconhecia a vítima e praticou o crime
sozinho; Miquéias era seu colega, todavia não estava envolvido no delito; visando
auxiliar as investigações, o interrogando voluntariamente autorizou a colheita de
amostra de sangue para eventual confronto.
Diante da Autoridade Judicial, o apelante aduziu que cometeu o
crime sob efeito de droga; quanto aos fatos, o interrogando mencionou ter pulado o
muro da residência da vítima e, ao adentrar no imóvel, encontrou uma faca na

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cozinha, tendo dado voz de assalto, quando o ofendido reagiu e ambos acabaram
entrando em luta corporal; a vítima pegou a faca da mão do interrogando, motivo
pelo qual saiu da casa, pegou uma barra e golpeou o ofendido na cabeça; após, o
interrogando subtraiu a motocicleta e o aparelho celular, e ato seguinte, evadiu-se do
local; três dias após o corrido, o interrogando ficou sabendo que a família do
ofendido estava atrás para matá-lo, o que o levou a atear fogo na moto; após, na
companhia de sua genitora, o interrogando foi até a Delegacia e confessou a prática
delitiva; indagado, disse desconhecer a vítima e que ingressou em uma casa aleatória;
o interrogando matou a vítima porque ela reagiu.
Desse modo, a materialidade e autoria do delito de latrocínio
atribuído ao réu resultaram cabalmente demonstradas pelo arcabouço probatório
amealhado ao feito criminal, não sendo o caso de absolvição, tal como almeja a
Defesa.
Isso porque, o agente agiu dolosamente, verificando-se a tipicidade
pela conduta do agente ao desferir golpes contra a vítima, o que caracteriza o
latrocínio; a despeito das alegações deduzidas pelo denunciado, nada há nos autos
que permita raciocínio diverso daquele circunscrito na denúncia que narra a prática
de um frio, calculista e atroz crime com claras intenções patrimoniais.
Na hipótese em tela, ao vislumbrar a vítima dormindo, o acusado
optou por colocar a faca em seu pescoço, acordando-a, quando poderia prosseguir
com o seu intento. Em seguida, ele a golpeou no pescoço, o que fez com que ela
caísse ao solo. O réu lesionou novamente o ofendido, com a faca. Além disso, armou-
se com uma barra de ferro e golpeou a vítima varias vezes até matá-la. Ato seguinte,
o apelante subtraiu carteira, celular e motocicleta, bens de propriedade do ofendido,
deixando o local.

Tem-se que, na posse da motocicleta, o denunciado esteve na casa


das testemunhas Cintia, Daniela, Edileusa e Lucinda, as quais, ao prestarem
depoimentos, confirmaram que logo após o crime, o acusado foi visto em poder do
referido veículo.
A testemunha Reginaldo, filho da vítima, informou ter suspeitado
do envolvimento do réu com a morte de seu genitor, motivo pelo qual foi procurá-lo.
No momento em que o acusado se deparou com o depoente, saiu correndo, quando
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deixou cair o celular subtraído do seu pai. O denunciado fugiu e, em seguida, pôs
fogo no veículo roubado. Após, entregou-se à polícia, assumindo a prática delitiva.
Nessa toada, o requerimento de reconhecimento de circunstância
que isentaria o réu de pena (ação sob efeito de drogas) não comporta acolhimento,
porquanto não resultou evidenciado que ele não possuía plena consciência ou que
tinha parcial compreensão de que cometia infração penal.
Portanto, inviável a isenção da pena, pois reservada somente
àqueles totalmente inimputáveis (art. 26 do Código Penal).
Isto posto, passa-se à análise da dosimetria das penas.
Na primeira fase do cálculo, o MM. Juízo “a quo”, com base nas
diretrizes do artigo 59 do Código Penal, majorou a pena-base em 1/3 acima do
mínimo legal, sopesando duas circunstancias judiciais negativas (personalidade do
agente - crime praticado de forma extremamente violenta, tendo o réu, ainda, passado
a ostentar um dos bens roubados em suas redes sociais, de modo a não demonstrar
arrependimento, embora tivesse tirado a vida da vítima; e a circunstância do crime -
ao esfaquear a vítima, deixando-a ao solo, saiu e retornou armado, em poder de uma
barra de ferro, para golpeá-la com tal arma até a morte).
Com efeito, não obstante a necessidade de se fixar a pena-base
acima do mínimo legal, em razão das aludidas circunstâncias judiciais
desabonadoras, corretamente reconhecidas, esta relatoria entende que o referido
aumento aplicado se mostra excessivo. Dessa forma, exaspera-se a reprimenda
básica em 1/5, resultando em 24 anos de reclusão mais o pagamento de 12 dias-
multa, cada qual em seu valor unitário mínimo legal.
Na etapa intermediária, incidiram as circunstâncias agravantes do
meio cruel e da pessoa maior de sessenta anos, bem como as atenuantes da
menoridade relativa e da confissão espontânea, sendo que as últimas (circunstâncias
atenuantes) foram preponderantes, de modo que a sanção foi reduzida em 1/6.
Tendo em vista o redimensionamento efetuado na etapa inaugural,
as reprimendas, na segunda fase, passam a alcançar 20 anos de reclusão, com 10
dias-multa.
Na derradeira fase, ausentes causas de aumento ou diminuição de
pena, as reprimendas ora arbitradas na etapa intermediária se tornam definitivas.

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Observa-se, tal como consignado alhures, não ser o caso de


redução da pena por incidência do art. 26 do Código Penal, porque não há nos autos
qualquer prova de que o recorrente, no momento do crime, era incapaz de entender
e se autodeterminar diante da ilicitude dos fatos.
Por fim, de rigor a manutenção do regime inicial de cumprimento
de pena fechado, eis que, de fato, é o único necessário e suficiente para a reprovação
e prevenção do grave delito.
Por todo o exposto, dá-se parcial provimento ao apelo defensivo,
tão somente para se readequar a pena corporal imposta para 20 anos de reclusão,
além do pagamento de 10 dias-multa, no piso legal, mantendo-se, no mais, a r.
sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Cláudio Marques - relator

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