Você está na página 1de 23

RESUMO

TEMAS DE PSICOLOGIA: ENTREVISTA E GRUPOS


José Bleger

A ENTREVISTA PSICOLÓGICA – SEU EMPREGO NO DIAGNÓSTICO E NA INVESTIGAÇÃO


O autor destaca a entrevista como um instrumento fundamental no método clínico e uma
técnica de investigação científica em psicologia.
A entrevista é vista como uma ferramenta que não apenas amplia e verifica conhecimento,
mas também aplica conhecimento científico na prática.
A técnica da entrevista tem uma dupla face ao identificar e coexistir as funções de
investigador e profissional.
Destaca a entrevista como ponto de interação entre a ciência e as necessidades práticas,
possibilitando a aplicação de conhecimentos científicos na vida diária.
Enfatiza que a entrevista é um instrumento amplamente difundido com uma variedade de
objetivos em diferentes contextos, como jornalismo, empresas, escolas, etc.
O foco do autor está na entrevista psicológica, buscando objetivos específicos como
investigação, diagnóstico e terapia.
Argumenta que parte do que é desenvolvido na entrevista psicológica pode ser aplicado em
todo tipo de entrevista, devido à presença inevitável de fatores psicológicos em todas elas.
Divide a entrevista psicológica em dois aspectos: as regras práticas de execução e a
psicologia subjacente que fundamenta essas regras.
Destaca que a entrevista é o instrumento fundamental de trabalho não apenas para
psicólogos, mas também para outros profissionais.
Classifica a entrevista em aberta e fechada, onde a primeira permite flexibilidade de
perguntas, enquanto a segunda é mais padronizada.
Destaca a importância da liberdade na entrevista aberta para permitir que o entrevistado
molde o campo da entrevista de acordo com sua estrutura psicológica.
Distingue entrevistas individuais e grupais, ressaltando que, mesmo em casos individuais, a
dinâmica de grupo é relevante.
Identifica três tipos de entrevistas com base no beneficiário do resultado: para o
entrevistado, para pesquisa científica e para terceiros (instituições).
Cada tipo implica variáveis distintas que afetam a atitude do entrevistador e do
entrevistado, bem como o campo total da entrevista.
Conclui que, exceto na entrevista em benefício do entrevistado, os outros tipos de
entrevistas requerem que o entrevistador desperte interesse e participação, motivando o
entrevistado.

ENTREVISTA, CONSULTA E ANAMNESE


Bleger inicia ressaltando que a entrevista psicológica e a técnica clínica têm origens na
medicina, sendo importante reconhecer que, embora haja procedimentos médicos
semelhantes, estes não devem ser confundidos com a entrevista psicológica.
O autor destaca a diferença crucial entre consulta e entrevista. Consulta não é sinônimo de
entrevista; é apenas um dos procedimentos disponíveis para o técnico (seja psicólogo ou
médico) em resposta a uma demanda. A ênfase é na necessidade de evitar transformar a
entrevista em um mero "interrogatório".
Bleger explana sobre a anamnese, que envolve a compilação detalhada de dados
predefinidos. Nesse processo, o paciente muitas vezes é reduzido a um mediador entre sua
vida e o médico, sendo a preocupação principal a compilação de dados.
A entrevista psicológica, por sua vez, tem como objetivo estudar e utilizar o comportamento
total do indivíduo durante a relação com o técnico. Destaca-se que essa relação é única,
sendo caracterizada pela aplicação ativa do conhecimento psicológico pelo técnico por meio
de seu comportamento.
Bleger acentua que a entrevista é, acima de tudo, uma relação humana, onde o técnico
busca compreender ativamente o que está acontecendo para agir conforme esse
entendimento. Essa relação dinâmica é fundamental para alcançar os objetivos da
entrevista, como investigação, diagnóstico e orientação.
É enfatizado que o papel do técnico na entrevista não se limita a aplicar conhecimentos
psicológicos de forma estática, mas sim através de uma participação ativa durante toda a
entrevista. A dinâmica da relação é, portanto, uma parte crucial do processo.
O autor fornece orientações práticas, indicando que a regra básica não consiste em obter
dados completos da vida total de uma pessoa. Em vez disso, o foco deve estar no
comportamento total durante a entrevista, incluindo escuta ativa, vivência e observação das
três áreas do comportamento do entrevistado.
Bleger destaca a enorme influência de várias correntes psicológicas na teoria da entrevista.
A psicanálise contribuiu com o entendimento da dimensão inconsciente do
comportamento, transferência, contratransferência, resistência e repressão. A Gestalt
enfatizou a compreensão da entrevista como um todo, onde o entrevistador é um dos
integrantes, considerando seu comportamento como parte da totalidade. A topologia
ajudou a delinear o campo psicológico e suas leis, enquanto o behaviorismo trouxe a
importância da observação do comportamento.
Essas influências conduziram à transformação da entrevista em um instrumento científico,
onde a "arte da entrevista" foi substituída por uma sistematização das variáveis. Essa
sistematização possibilitou maior rigor na aplicação e na obtenção de resultados. A
entrevista deixou de depender exclusivamente de habilidades inatas, tornando-se algo que
pode ser ensinado e aprendido.
O estudo científico da entrevista, especialmente a pesquisa do instrumento, reduziu a
proporção de "arte" na prática, aumentando sua operacionalidade e utilidade como técnica
científica. Isso significa que, em vez de depender apenas da intuição e da habilidade do
entrevistador, a entrevista incorpora elementos do método experimental e se torna um
procedimento de observação em condições controladas ou, pelo menos, conhecidas.
Bleger usa uma analogia interessante ao comparar a entrevista ao tubo de ensaio para o
químico. Essa comparação sugere que, da mesma forma que um químico utiliza um tubo de
ensaio para observações precisas e controladas, a entrevista psicológica, quando embasada
na teoria da técnica, oferece um ambiente estruturado e conhecido para observações
psicológicas.
O autor enfatiza que as regras práticas ou empíricas da entrevista dependem diretamente
da teoria da técnica. Essa dependência é crucial para uma compreensão racional das regras,
sua aprendizagem, aplicação e aprimoramento ao longo do tempo. A entrevista, portanto,
evoluiu de uma prática intuitiva para uma técnica científica estruturada e passível de estudo
sistemático.

Procedimento Descrição

Proveniente da medicina, inclui procedimentos similares à entrevista


Método Clínico psicológica.

Solicitação de assistência técnica ou profissional, podendo envolver a


Consulta entrevista como um dos procedimentos.

Compilação detalhada de dados pré-estabelecidos sobre a situação,


Anamnese história, doença e saúde do indivíduo.

Diferenças entre Consulta, Entrevista e Anamnese:


Aspecto Consulta Entrevista Anamnese

Relação entre duas ou


mais pessoas para estudo Compilação detalhada
Assistência técnica e utilização do de dados pré-
Definição ou profissional comportamento total estabelecidos

Pode envolver a A entrevista não é a


Relação com entrevista como um Envolve a entrevista como ênfase; é uma
a Entrevista procedimento um dos procedimentos compilação de dados

Compilação de dados
para síntese sobre a
Estudo e utilização do situação presente e
Objetivo Assistência técnica comportamento total história do indivíduo

Influências Psicológicas na Teoria da Entrevista:

Corrente
Psicológica Contribuição

Dimensão inconsciente, transferência, contratransferência,


Psicanálise resistência, repressão, projeção, introjeção, etc.

Compreensão da entrevista como um todo, considerando o


Gestalt entrevistador como parte da totalidade.

Topologia Delinear e reconhecer o campo psicológico e suas leis.

Behaviorismo Importância da observação do comportamento.

Evolução da Entrevista como Instrumento Científico:

Fases Descrição

Contribuições da psicanálise, Gestalt, topologia e


Influências Teóricas behaviorismo.

Da "arte da entrevista" para uma sistematização de


Transformação variáveis.

Estudo científico reduzindo a dependência de


Diminuição da Arte habilidades inatas.

Comparação com Tubo de A entrevista como um ambiente controlado para


Ensaio observações psicológicas.
Dependência da Teoria da Técnica na Prática da Entrevista:

Aspecto Descrição

Relação com a Teoria da As regras práticas ou empíricas dependem diretamente da


Técnica teoria da técnica.

Evolução da Prática Da intuição para uma técnica científica estruturada.

A ENTREVISTA COMO CAMPO


O interesse em criar um campo distinto para explorar a personalidade impulsiona a
distinção entre entrevista e anamnese. Ambas estruturam campos, mas na entrevista, a
relação é configurada pelas variáveis dependentes do entrevistado.
Embora o entrevistador exerça controle sobre a entrevista, é o entrevistado quem a
direciona. A dinâmica entre ambos delimita e molda o campo da entrevista, sendo
imperativo permitir que o entrevistado predominantemente estabeleça esse campo.
A entrevista opera como uma situação de observação, onde uma parte da vida do paciente
se desdobra em relação ao entrevistador. Mesmo sem esgotar a totalidade da
personalidade, proporciona uma visão única e valiosa.
A entrevista não substitui, mas complementa outros métodos de investigação da
personalidade, como o tratamento psicanalítico mais extenso. Cada abordagem tem seu
papel único, sendo a entrevista insubstituível em seu contexto singular.
Para alcançar um campo específico na entrevista, é essencial ter um enquadramento rígido,
convertendo variáveis em constantes. Isso abrange não apenas a postura técnica e papel do
entrevistador, mas também objetivos, local e tempo da entrevista. Alterações no
enquadramento devem ser observadas como variáveis importantes.
O campo da entrevista não é estático; é dinâmico, sujeito a mudanças contínuas. Observar a
continuidade e contiguidade dessas mudanças é crucial para compreender a estrutura e o
significado de cada momento do campo. Cada campo representa um instante dessa
dinâmica total.
A sistematização do estudo do campo da entrevista se concentra em três elementos-chave:
A) O ENTREVISTADFOR - Incluindo atitude, dissociação instrumental,
contratransferência, identificação, etc.
B) O ENTREVISTADO - Abrangendo transferência, estruturas de comportamento, traços
de caráter, ansiedades, defesas, etc.
C) A RELAÇÃO INTERPESSOAL - Englobando interação entre participantes, processo de
comunicação, projeção, introjeção, identificação, problema da ansiedade, etc.

CONCORDÂNCIAS E DIVERGÊNCIAS
- ENTREVISTA: Parte do princípio de que cada indivíduo possui uma história de vida
organizada, na qual detalhes explícitos podem não ser conhecidos, sendo necessário
deduzi-los.
- ANAMNESE: Baseia-se na suposição de que o paciente conhece sua própria vida e está
apto a fornecer dados detalhados sobre ela.
- COMPORTAMENTO NÃO VERBAL: A entrevista considera que informações não explicitadas
podem emergir por meio do comportamento não-verbal do entrevistado, podendo
contradizer ou coincidir com expressões verbais conscientes.
Em diferentes sessões de entrevista, um indivíduo pode apresentar histórias ou esquemas
de vida atuais distintos, que podem complementar ou contradizer uns aos outros.
Certas lacunas, dissociações e contradições observadas na entrevista levam alguns
pesquisadores a questionar a confiabilidade desse método.
Dissociações e contradições refletem conflitos intrínsecos à personalidade do entrevistado,
proporcionando material valioso para análise clínica.
Conflitos apresentados pelo entrevistado podem não ser os fundamentais, e as motivações
declaradas frequentemente são consideradas como racionalizações.
Na entrevista, a simulação é encarada como uma parte dissociada da personalidade, não
plenamente reconhecida pelo próprio entrevistado.
Alguns entrevistados mantêm rigidamente uma história estereotipada e um esquema de
vida como meio de defesa contra a penetração do entrevistador.
Em entrevistas grupais (família, escola, fábrica), as divergências e contradições entre os
membros são mais evidentes, fornecendo insights valiosos sobre a dinâmica psicológica
individual em uma realidade compartilhada.
A técnica de entrevista está intrinsecamente entrelaçada com a teoria da personalidade,
sendo o grau de interação entre ambas determinante para a eficácia do entrevistador como
pesquisador.
A entrevista não se limita a "aplicar" instruções; ao contrário, envolve a investigação ativa
da personalidade do entrevistado, utilizando teorias e instrumentos de trabalho de maneira
integrada.

O OBSERVADOR PARTICIPANTE
A abordagem tradicional nas ciências naturais preconiza que a observação científica deve
ser objetiva, caracterizando-se pelo registro imparcial dos fenômenos externos, excluindo
as impressões subjetivas do observador. Esse modelo visa à verificabilidade por terceiros,
permitindo a reconstrução das condições da observação.
Contrapondo essa visão, o autor destaca que, na entrevista psicológica, o entrevistador não
é um observador passivo. Pelo contrário, ele se torna uma parte ativa do campo,
influenciando os fenômenos que ele mesmo registra. Isso levanta questionamentos sobre a
validade dos dados obtidos, uma vez que o observador condiciona o que observa.
O autor argumenta que a máxima objetividade é alcançada quando o sujeito observador é
incorporado como uma variável do campo em estudo. A crítica à observação em condições
naturais é rebatida, defendendo que a entrevista, ao ser uma situação "natural" para
estudar o fenômeno psicológico, não distorce as condições naturais, mas as representa.
Destaca-se que toda conduta humana ocorre em um contexto de vínculos e relações
humanas. A entrevista, portanto, não representa uma distorção das condições naturais;
pelo contrário, é considerada a situação "natural" na qual o fenômeno psicológico de
interesse se desenrola.
Embora cada situação humana seja única e original, o autor ressalta que isso não impede a
identificação de constantes gerais. Estas representam condições que se repetem com mais
frequência, permitindo a abstração e a criação de categorias de análise.
O autor rebate objeções à validade da entrevista como instrumento científico,
argumentando que as qualidades de qualquer objeto, inclusive na psicologia, são sempre
relacionais. As características derivam das condições e relações específicas em que o objeto
se encontra.
Critica-se o narcisismo subjacente ao campo científico da psicologia, onde cada indivíduo é
percebido como único. A entrevista é apresentada como uma oportunidade de confrontar
esse narcisismo, tanto por parte do entrevistado quanto do entrevistador, sendo um meio
para estabelecer abstrações e categorias de análise na pesquisa psicológica.

ENTREVISTA E INVESTIGAÇÃO
Crítica à visão equivocada que separa a investigação como uma tarefa elitista, distante dos
fatos cotidianos. Enfatiza que a entrevista não é apenas uma técnica diagnóstica, mas um
campo de trabalho para investigar a conduta e personalidade humanas.
Destaca que a entrevista é, essencialmente, um ambiente onde a investigação é conduzida.
Argumenta que a eficácia da entrevista requer a integração entre prática profissional e
pesquisa, desmistificando a ideia de uma separação entre ambas.
Enfatiza a importância de unir pesquisa e prática. Sugere que a verdadeira significância do
trabalho profissional é alcançada quando o profissional atua simultaneamente como
pesquisador, integrando teoria e prática.
Aborda a interconexão entre a formulação de hipóteses e a observação durante a
entrevista. Destaca que observar corretamente envolve formular hipóteses durante o
processo, ajustando-as com base nas observações contínuas.
Explica que observar, pensar e imaginar são elementos inseparáveis durante a entrevista.
Ressalta a importância da imaginação na investigação, enfatizando que a verdadeira
pesquisa demanda a integração desses processos dialéticos.
Destaca a necessidade de integrar indagação (investigação) e atuação (tarefa profissional),
considerando-os partes intrínsecas de um único processo. Reflete sobre a humanização da
prática ao compreender e ajudar outros seres humanos.
Recomenda a realização de pelo menos uma entrevista bem feita, mesmo em situações de
falta de tempo. Aborda como essa prática revela a utilidade de não ter tempo e a facilidade
de racionalizar e negar dificuldades.

O GRUPO NA ENTREVISTA
O autor descreve a dinâmica da entrevista, enfatizando que o entrevistador e entrevistado
formam uma unidade inter-relacionada, distinguindo-se de outros grupos. O entrevistado
desempenha um papel específico, introduzindo uma dinâmica única.
Destaca-se a interdependência entre entrevistador e entrevistado, mediada pela
comunicação. O processo envolve estímulos mútuos, sendo a palavra fundamental, mas
também reconhecendo a importância de elementos pré-verbais na comunicação.
A ênfase recai sobre a relevância da comunicação na revelação da personalidade do
entrevistado, particularmente nas relações interpessoais. O modo como alguém se
comunica fornece insights valiosos sobre seu relacionamento com os outros.
O autor destaca a importância da observação na entrevista, enfocando como o
entrevistador percebe como o entrevistado influencia, muitas vezes sem perceber, os
resultados da entrevista. São ressaltados momentos de mudança na comunicação e
obstáculos.
Menciona-se a contribuição de Ruesch, que propôs uma classificação da personalidade com
base nos sistemas predominantes de comunicação de cada indivíduo. Isso adiciona uma
camada de compreensão à análise da entrevista.
O autor ressalta que a comunicação não é apenas um elemento observado, mas é
fundamental em toda a relação interpessoal. Além disso, destaca que o entrevistador pode
influenciar essa comunicação para direcionar a entrevista.

TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA
Ao adentrar a dinâmica da entrevista, destacam-se dois fenômenos intrínsecos e cruciais: a
transferência e a contratransferência. A transferência refere-se à atualização, no contexto da
entrevista, de emoções, atitudes e comportamentos inconscientes por parte do
entrevistado, remanescentes de modelos estabelecidos durante seu desenvolvimento,
especialmente em suas interações familiares.
Este fenômeno da transferência revela-se fundamental, desdobrando-se em duas vertentes:
a transferência negativa e a positiva. Ambas coexistem, oscilando em predomínio relativo,
estabilidade ou alternância, e integram a esfera irracional e inconsciente da conduta do
entrevistado. Esses elementos, não totalmente controlados pelo paciente, surgem como
aspectos adicionais, acrescentando uma dimensão crucial ao entendimento da estrutura de
sua personalidade e dos conflitos que a permeiam.
Na transferência, o entrevistado projeta papéis no entrevistador, moldando sua conduta
com base nesses cenários previamente estabelecidos. Essa transposição de situações e
modelos para a realidade presente configura a entrevista como um terreno onde o já
conhecido se torna repetitivo.
Durante esse processo, o entrevistado, muitas vezes inconscientemente, oferece aspectos
imaturos e irracionais de sua personalidade. Questões de dependência, onipotência e
pensamento mágico emergem, proporcionando ao entrevistador insights valiosos sobre as
expectativas do entrevistado em relação a ele, suas fantasias de ajuda e até mesmo
aspirações neuróticas de cura.
É importante salientar que a análise cuidadosa da transferência não apenas revela aspectos
fundamentais da personalidade do entrevistado, mas também oferece ao entrevistador uma
ferramenta para compreender e gerenciar as dinâmicas da entrevista. A capacidade de
interpretar essas projeções emocionais e utilizar esse conhecimento de forma terapêutica é
o que distingue um entrevistador experiente na exploração da complexidade humana.
Na contratransferência, englobam-se todos os fenômenos que surgem no entrevistador
como emergentes do campo psicológico configurado durante a entrevista. Esses fenômenos
representam as respostas do entrevistador às manifestações do entrevistado, refletindo o
impacto que estas têm sobre ele. Embora fortemente influenciados pela história pessoal do
entrevistador, sua manifestação em um determinado momento da entrevista decorre de
fatores específicos presentes nesse momento.
Por muito tempo, esses fenômenos foram considerados perturbadores da entrevista,
contudo, à medida que se reconheceu sua inevitabilidade, passaram a ser vistos como
elementos essenciais a serem registrados pelo entrevistador, configurando não apenas uma
observação externa, mas também uma auto-observação. A contratransferência não se limita
a uma percepção estrita; é um indício de grande significado, tornando-se uma ferramenta
valiosa para orientar o entrevistador em sua análise.
É essencial compreender que tanto a transferência quanto a contratransferência são
fenômenos inerentes a todas as relações interpessoais, sendo, portanto, também presentes
na entrevista. A distinção crucial é que, na entrevista, esses fenômenos devem ser utilizados
como instrumentos técnicos para observação e compreensão. A interação entre
transferência e contratransferência pode ser estudada como uma atribuição de papéis pelo
entrevistado e a percepção desses papéis pelo entrevistador.
Por exemplo, se a atitude do entrevistado irrita e causa rejeição no entrevistador, este deve
analisar e observar sua reação como resultado do comportamento do entrevistado. Isso visa
ajudar o entrevistado a corrigir uma conduta da qual ele mesmo se queixa, como a falta de
amizades ou o sentimento de não ser apreciado. A incapacidade do entrevistador em
objetivar e estudar sua reação, ou sua resposta com irritação e rejeição, indicaria uma
perturbação na manipulação da contratransferência, sugerindo dificuldades na condução
eficaz da entrevista.

ANSIEDADE NA ENTREVISTA
A ansiedade desempenha um papel crucial no desenvolvimento da entrevista, sendo
essencial que o entrevistador a observe atentamente, tanto em si mesmo quanto no
entrevistado. O entrevistador deve não apenas identificar o surgimento da ansiedade, mas
também avaliar seu grau, pois, embora a ansiedade seja um impulsionador nas relações
interpessoais, seu excesso pode desestabilizar a interação. Portanto, é fundamental detectar
permanentemente o limite de tolerância à ansiedade.
A ansiedade surge quando entrevistador e entrevistado se deparam com situações
desconhecidas, ainda não estabilizadas em termos de reações apropriadas. Essa
desorganização é a ansiedade, e o entrevistado busca ajuda quando se sente ansioso ou
perturbado por mecanismos de defesa diante dela. Durante a entrevista, tanto a ansiedade
quanto os mecanismos de defesa do entrevistado podem aumentar, pois enfrentam não
apenas uma situação externa nova, mas também o desconhecido em sua própria
personalidade. Se esses fatores não estão presentes, é responsabilidade do entrevistador
motivar o entrevistado a expressar sua ansiedade durante a entrevista.
A ansiedade pode ser delegada ou projetada em outra pessoa que solicita a entrevista e
manifesta interesse em sua realização. No caso do entrevistador, sua ansiedade é um fator
desafiador devido ao seu papel de motor do interesse na investigação e no desconhecido.
Manipular a ansiedade do entrevistador é complexo, pois é essencial para a eficácia da
investigação, exigindo que o pesquisador a tolere e a instrumentalize.
Ao lidar com a ansiedade do entrevistado, não se deve reprimir ou dissimulá-la através de
apoio direto ou aconselhamento. A abordagem correta envolve compreender os fatores que
desencadeiam a ansiedade e agir de acordo com essa compreensão. Se os mecanismos de
defesa predominam, o entrevistador deve desarmá-los para permitir a expressão de certa
ansiedade, indicando a possibilidade de enfrentar conflitos subjacentes. A manipulação
técnica da ansiedade deve considerar a personalidade do entrevistado e o benefício
potencial da mobilização da ansiedade, evitando ser excessivamente ativo e oprimindo o
entrevistado com conflitos intoleráveis. A consideração do "timing" da entrevista, ou seja, o
momento adequado para o entrevistado enfrentar e resolver seus conflitos, é um aspecto
desafiador que depende do grau e tipo de organização de sua personalidade.

O ENTREVISTADOR
O autor destaca que o entrevistador utiliza sua própria personalidade como instrumento de
trabalho, ressaltando que este inevitavelmente se envolve na relação interpessoal. Ao
estudar outros seres humanos, o entrevistador é confrontado com a necessidade de
examinar sua própria vida, personalidade, conflitos e frustrações.
Ele menciona a complexidade da vida e da vocação de profissionais como psicólogos,
médicos e psiquiatras, que lidam diariamente com o submundo da doença, conflitos,
destruição e morte. A simulação e dissociação são apresentadas como ferramentas
necessárias para o exercício dessas profissões, permitindo que os técnicos ajam como se
estivessem lidando com não-humanos.
O autor comenta sobre o treinamento médico, destacando a tendência inconsciente e
defensiva de tratar a aprendizagem pelo contato com o cadáver. Ressalta que, ao lidar com
seres humanos considerados como tal, surge a necessidade de superar bloqueios e defesas.
Aborda a demora da psicologia em se desenvolver e infiltrar-se na medicina e psiquiatria,
atribuindo isso aos processos defensivos. Destaca que, na psiquiatria e na psicologia, o
contato direto com seres humanos coloca os técnicos diante de sua própria vida, saúde,
doença, conflitos e frustrações.
Destaca a importância da dissociação para o entrevistador, que deve agir com identificação
projetiva com o entrevistado, ao mesmo tempo em que permanece fora dessa identificação,
observando e controlando o que ocorre. O autor sugere a necessidade de estudos sobre
psicologia, psicopatologia, formação profissional e equilíbrio mental.
Explora a natureza dinâmica da dissociação, indicando que projeção e introjeção devem
atuar continuamente. Enfatiza a necessidade de uma dissociação plástica para manter-se
nos limites de uma atitude profissional.
Aborda a oscilação entre ansiedade e bloqueio durante a entrevista. Destaca que a
passagem do normal ao patológico ocorre de modo imperceptível e alerta para os riscos de
condutas fóbicas ou obsessivas caso a dissociação seja inadequada.
Discute a aflição do médico, que pode resultar em uma fuga fóbica aos doentes, e a defesa
obsessiva, que leva a entrevistas estereotipadas. O bloqueio é mencionado como o
elemento por trás dessas condutas repetitivas.
Explora a alienação do psicólogo e do psiquiatra quando incapazes de lidar com seus
próprios conflitos. Destaca o perigo da projeção dos conflitos do terapeuta sobre o
entrevistado e a necessidade de evitar condutas rígidas e projetivas.
Apresenta um exemplo ilustrativo de um médico em treinamento que projetou seus
próprios medos em um diagnóstico. Destaca a importância de observar e resolver reações
contratransferenciais para utilizá-las como informação durante a entrevista.
Aborda a necessidade de o entrevistador desempenhar papéis fomentados pelo
entrevistado, mas sem assumi-los totalmente. Destaca que a intensidade da projeção do
entrevistador pode levar a reações fóbicas no próprio campo de trabalho.
Explora diferentes tipos de reações contratransferenciais provocadas por entrevistados e
destaca a importância de observá-las e resolvê-las continuamente. Sugere que, ao assumir
papéis, pode ocorrer a ruptura do enquadramento da entrevista.
Destaca indícios contratransferenciais, como fastio, cansaço, sono, irritação, bloqueio,
compaixão, carinho, rejeição, sedução, etc., que o entrevistador deve perceber e resolver
durante a entrevista.
Discute o risco de psiquiatras inexperientes recorrerem a receitas medicamentosas para
evitar lidar com os dados da entrevista. Compara isso ao que os psicólogos fazem
frequentemente com os testes, enfatizando a importância de não trabalhar isoladamente.
Destaca a necessidade de psiquiatras e psicólogos não trabalharem isoladamente,
incentivando a formação de grupos de estudo e discussão para evitar estereotipias e
enfrentar as dificuldades profissionais. O isolamento é apontado como um fator que
encobre as dificuldades com a onipotência.

O ENTREVISTADO
O autor destaca que explorar os aspectos de uma entrevista é desafiador dada a extensa
gama de tópicos nas áreas de psicologia, psiquiatria e psicopatologia. Ele opta por focar em
situações específicas na psicologia clínica, onde as preocupações, percepções de mudanças
ou ansiedades pessoais levam as pessoas a buscar entrevistas. O autor ressalta que, em
certos casos, as ansiedades intensas podem levar os entrevistados a negar e resistir
ativamente durante a entrevista, assegurando que nenhum problema anormal seja
percebido pelo profissional.
O autor apresenta a definição ampla de "doente" como qualquer pessoa que busca uma
consulta. No entanto, ele ressalta que essa definição pode carecer de validade real. Mesmo
assim, ele destaca que o entrevistador deve aceitar esse critério como um estímulo para
investigar minuciosamente o que está subjacente às resistências, negações ou ocultações do
entrevistado. Essa abordagem sugere que, embora o rótulo de "doente" possa ser amplo, é
um ponto de partida que motiva a exploração mais profunda das preocupações e problemas
do indivíduo durante a entrevista.

Classificação de Schilder: cinco grupos de indivíduos que procuram médico:


1. Problemas corporais: Indivíduos que buscam ajuda devido a questões físicas ou de
saúde.
2. Problemas mentais: Aqueles que enfrentam desafios relacionados à saúde mental.
3. Falta de êxito: Pessoas que procuram assistência devido a falhas ou insucessos em
suas vidas.
4. Dificuldades na vida diária: Indivíduos que enfrentam obstáculos ou desafios em suas
atividades cotidianas.
5. Queixas de outras pessoas: Aqueles cuja busca de ajuda é motivada por
preocupações ou queixas apresentadas por outras pessoas em relação a eles.

Divisão de Pichon Rivière – áreas de conduta


1) Predomínio de inibições, sintomas, queixas ou protestos: Classificação com base na
prevalência de diferentes manifestações na conduta do paciente.
2) Áreas da mente, do corpo ou do mundo exterior: Divisão com base nas áreas
predominantes afetadas, destacando mente, corpo e ambiente externo.
Manifestações do paciente: dois tipos de ansiedade: depressiva, caracterizada por queixas,
lamentações ou acusações, sugerindo um estado emocional mais voltado para a tristeza ou
melancolia; paranoide, com predominância de sintomas, inibições ou protestos, indicando
um estado de ansiedade mais voltado para a paranoia ou desconfiança.
Esses agrupamentos não tendem a diferenciar os doentes orgânicos dos doentes mentais,
nem as doenças orgânicas das funcionais ou psicogenéticas. Aplicam-se a todos os tipos de
entrevistados que procuram um especialista e tendem mais a uma orientação sobre a
personalidade do sujeito, pela forma com que procura reduzir suas tensões, aliviar ou
resolver seus conflitos.
Podemos identificar e diferenciar entre aquele que busca a entrevista por iniciativa própria e
aquele que é trazido ou enviado por outros. Essas atitudes proporcionam um indicador de
importância, embora não sejam sistemáticas ou patognomônicas.
O indivíduo que procura a entrevista devido a uma percepção ou insight sobre sua condição
corresponde ao paciente neurótico, enquanto o psicótico é encaminhado por terceiros.
Aquele que comparece sem uma razão pessoal, mas porque foi instruído a fazê-lo, está
associado à psicopatia, agindo como intermediário que delega suas preocupações e
desconfortos aos outros. Um exemplo é o caso da pessoa que busca a consulta em nome de
um familiar.
Nesse cenário, conduzimos a entrevista com o acompanhante, explorando sua
personalidade e comportamento, transcendendo assim o indivíduo entrevistado para
abranger o contexto familiar. Se o entrevistado é precedido por um informante, é crucial
comunicar que as informações compartilhadas serão repassadas, visando "limpar o campo"
e romper com divisões difíceis de abordar posteriormente.
Aquele que procura a consulta emerge sempre dos conflitos familiares, e é importante
distinguir entre aquele que vem sozinho e aquele que vem acompanhado, representando
diferentes dinâmicas familiares.
O indivíduo que busca sozinho representa um grupo familiar esquizoide, caracterizado por
uma comunicação precária entre os membros, vivendo de forma dispersa ou separada, com
um notável bloqueio afetivo. Frequentemente, diante desses casos, os profissionais tendem
a questionar com quem podem dialogar ou informar.
Outro grupo familiar, oposto ao esquizoide, é o epileptóide, caracterizado pela presença de
vários membros na consulta. Nesse contexto, o profissional precisa questionar quem é o
entrevistado e por quem eles estão lá. Este grupo é viscoso, aglutinado, com uma falta ou
déficit na individuação de seus membros e um alto grau de simbiose ou interdependência.
Enquanto no grupo esquizoide o doente está isolado e abandonado, no epileptóide ele está
excessivamente cercado por um cuidado exagerado ou asfixiante. Esses dois tipos polares
podem se manifestar em suas formas extremas, menos caracterizadas ou mistas.
Outro tipo é aquele em que o entrevistado vem acompanhado por uma pessoa, seja um
familiar ou amigo. Este é o caso do fóbico que necessita da presença do acompanhante. Um
exemplo adicional são os casais cujos membros se culpam mutuamente por neuroses,
infidelidade, entre outros. Nesse cenário, a entrevista abrange todos os que compareceram,
agindo como um grupo diagnóstico que, como veremos, é sempre em parte terapêutico. O
profissional atua como observador participante, intervindo em momentos de tensão,
quando a comunicação é interrompida ou para destacar entrecruzamentos projetivos.
Nos grupos que buscam consulta, o psicólogo não deve necessariamente aceitar o critério
da família sobre quem é o doente, mas sim considerar todos os seus membros como
envolvidos, tratando o grupo como um todo doente. Nesse contexto, a análise do interjogo
de papéis e da dinâmica do grupo orienta para que todo o grupo obtenha uma
compreensão da situação. O equilíbrio da doença em um grupo familiar é de extrema
importância.
Por exemplo, em um casal onde um é fóbico e o outro atua como acompanhante, quando o
primeiro apresenta melhora ou se cura, a fobia pode surgir no segundo. O acompanhante
do fóbico torna-se, também, um fóbico, distribuindo os papéis entre o casal. Em outras
situações, a família pode aparecer apenas quando o tratamento de um paciente está
avançado e ele está melhorando ou prestes a se recuperar. A normalização do paciente faz
com que a tensão no grupo familiar não seja mais descarregada através dele, revelando
assim desequilíbrios ou doenças no grupo familiar.
Esse fenômeno destaca um aspecto crucial na dinâmica familiar: a culpa, um elemento que
deve ser cuidadosamente considerado para ser valorizado e abordado adequadamente. Essa
dinâmica é ainda mais evidente no caso de doenças mentais em crianças ou em deficientes
intelectuais. Relaciona-se também com o fenômeno conhecido como "a criança errada", em
que os pais inicialmente trazem o filho mais saudável para a consulta, mas, após garantirem
que o profissional não os culpa nem acusa, passam a falar ou consultar sobre o filho mais
doente.
Aqui, e em relação a todos estes fenômenos, a psicologia grupal tem uma importância
fundamental, não somente para as entrevistas diagnósticas e terapêuticas, mas também
para avaliar as curas ou decidir sobre a alta de uma internação, etc.

FUNCIONAMENTO DA ENTREVISTA
O funcionamento da entrevista é fundamentalmente configurado pelas variáveis da
personalidade do entrevistado, conforme destaca o autor. Isso implica que o que o
entrevistador oferece deve ser suficientemente ambíguo para permitir um engajamento
mais profundo da personalidade do entrevistado. No entanto, há uma área delimitada em
que a ambiguidade não deve existir, envolvendo os fatores que afetam o contexto da
entrevista: tempo, lugar e papel técnico do profissional.
O tempo refere-se a um horário e a um limite na extensão da entrevista, enquanto o espaço
abrange o ambiente no qual a entrevista ocorre. O papel técnico exige que o entrevistador
não se apresente como um amigo em um encontro casual, evitando compartilhar suas
próprias experiências de vida ou entrar em relações comerciais ou de amizade. O único
benefício pretendido deve ser o recebimento de honorários e o interesse científico ou
profissional.
A entrevista não deve ser usada como uma gratificação narcisista para demonstrar
onipotência. A curiosidade do entrevistador deve ser limitada ao necessário para o benefício
do entrevistado. Reações contratransferenciais, como rejeição, rivalidade ou inveja, não
devem ser respondidas ou abordadas, mas sim consideradas como dados da entrevista.
O autor destaca a importância de reconhecer e distinguir diferentes tipos de silêncio
durante a entrevista, trabalhando com base nesse conhecimento. Além disso, enfatiza que a
"descarga" emocional intensa e a catarse não são ideais, pois podem resultar em uma
relação persecutória.
O fim da entrevista deve ser respeitado, e a reação à separação é um dado importante.
Avaliações sobre o estado do entrevistado ao partir e a contratransferência do entrevistador
são cruciais. O autor sugere que, mesmo em instituições com restrições de tempo, seja
reservado um período para realizar pelo menos uma entrevista diária em condições ideais,
evitando estereotipias e racionalizações de evitação fóbica. Além disso, destaca a
importância do trabalho em grupo, enfatizando que psicólogos e psiquiatras não devem
trabalhar isolados para evitar alienação no trabalho.

A INTERPRETAÇÃO
O autor aborda a questão crucial de saber se a interpretação deve ser empregada em
entrevistas com propósitos diagnósticos. Existem diversas posições sobre isso, e uma delas,
exemplificada por Rogers, sugere não apenas evitar interpretações, mas também limitar
perguntas, encorajando o entrevistado a continuar por meio de técnicas como repetir a
última palavra dita ou estimular com gestos ou olhares.
A entrevista, sendo uma experiência vital significativa para o entrevistado, desempenha um
papel normativo ou de aprendizagem. Mesmo em entrevistas diagnósticas, o autor
argumenta que ela é, em parte, terapêutica. O primeiro fator terapêutico destacado é a
compreensão do entrevistador, que deve comunicar elementos dessa compreensão ao
entrevistado. O autor defende a interpretação, especialmente quando a comunicação está
prestes a ser interrompida ou distorcida. Além disso, a intervenção interpretativa é
necessária para relacionar o que o próprio entrevistado expressou.
A interpretação deve ser orientada pelo nível de ansiedade que está sendo resolvido e
criado durante a entrevista. A principal diretriz para a interpretação é sempre o benefício do
entrevistado, evitando que o entrevistador descarregue suas próprias ansiedades. O autor
ressalta que as interpretações são hipóteses que devem ser verificadas no campo de
trabalho pela resposta que mobilizam.
Ele aconselha que o iniciante na entrevista se concentre inicialmente na compreensão do
entrevistado antes de se aventurar na interpretação. O objetivo ideal de uma entrevista é
operativo, buscando compreender e esclarecer um problema ou situação trazida pelo
entrevistado como o motivo central. O autor alerta para a necessidade de evitar
interpretações fora de contexto e de timing, destacando que, em alguns casos, o silêncio é
mais apropriado do que interpretar. Ele enfatiza que a formação do psicólogo inclui
aprender a discernir quando é necessário ficar em silêncio, especialmente quando há uma
compulsão excessiva para interpretar.

INFORME PSICOLÓGICO
O informe psicológico desempenha o papel crucial de condensar e resumir conclusões
relacionadas ao objeto de estudo, com foco neste contexto no estudo da personalidade.
Este tipo de informe pode ser aplicado em diversos campos da atividade psicológica, e sua
elaboração deve ser orientada pelos objetivos específicos do estudo em questão.
O autor esclarece que, no campo da medicina, um estudo abrangente pode envolver três
diagnósticos distintos: médico, psiquiátrico e psicológico. Por exemplo, um paciente pode
apresentar um surto esquizofrênico (diagnóstico psiquiátrico), associado a insuficiência
cardíaca (diagnóstico médico) e uma personalidade obsessiva (diagnóstico psicológico). Esse
exemplo ilustra a diferenciação entre os três tipos de informes, que nem sempre ocorrem
simultaneamente.
A ordem de redação do informe não necessariamente reflete a ordem de coleta de dados ou
de deduções. O autor sugere uma estrutura organizada, abordando os seguintes pontos:
Dados pessoais: informações como nome, idade, sexo, estado civil, nacionalidade, domicílio
e profissão.
Procedimentos utilizados: detalhes sobre entrevistas, testes, jogos de desempenho de
papéis, registros objetivos, questionários, entre outros.
Motivo do estudo: quem solicitou o estudo e quais são os objetivos. Considerações sobre a
atitude do entrevistado e suas motivações conscientes.
Descrição do grupo familiar: informações sobre a família, incluindo status socioeconômico,
constituição, dinâmica, saúde dos membros, e como a família se relaciona com a
comunidade.
Problemática vital: um relato sucinto da vida do entrevistado, conflitos atuais,
desenvolvimento, perdas, mudanças, temores, aspirações e como ele enfrenta essas
situações.
Padrões de conduta: descrição dos padrões predominantes e acessórios, além de mudanças
observadas.
Traços de caráter e de personalidade: avaliação dos traços, incluindo dinâmica psicológica,
ansiedade, defesas, organização patográfica, maturidade da personalidade, entre outros.
Resultados detalhados: em informes mais rigorosos, incluir os resultados de cada teste e
exame complementar realizado.
Conclusão: diagnóstico e caracterização psicológica do indivíduo e seu grupo, respondendo
aos objetivos específicos do estudo.
Possibilidade prognóstica: fornecer uma perspectiva psicológica para o futuro,
fundamentando-se nos elementos abordados.
Orientação possível: indicar se são necessários novos exames e qual seria a forma possível
de remediar, aliviar ou orientar o entrevistado, de acordo com os objetivos do estudo ou as
necessidades da instituição solicitante.
Esse guia, ressalta o autor, não é um formulário preenchível, mas sim uma estrutura flexível
que deve ser adaptada conforme os objetivos e contexto de cada estudo.

ENSAIO DE CATERGORIZAÇÃO DA ENTREVISTA


O Centro de Orientação e Investigação E. Racker, vinculado à Associação Psicanalítica
Argentina, estabeleceu, desde sua fundação, um propósito social distintivo. Suas linhas de
atuação incluíam diversas iniciativas, como oferecer tratamento psicanalítico limitado a
Candidatos do Instituto de Psicanálise, admitir pacientes com recursos econômicos
limitados e envolvidos em profissões com contato interpessoal, visando indiretamente
beneficiar aqueles que estivessem em contato profissional com eles, como professores e
enfermeiros. Os honorários eram acessíveis, e os tratamentos eram conduzidos pelo Centro
Racker, proporcionando aos Candidatos supervisão semanal gratuita.
Durante minha gestão como diretor do Centro Racker, propus uma avaliação dos resultados
do tratamento psicanalítico sob essas condições particulares. Esse esboço de categorização
foi elaborado durante o estudo das entrevistas e protocolos, buscando entender os critérios
subjacentes à aceitação ou recusa de pacientes nas entrevistas. No entanto, a experiência
foi interrompida abruptamente devido a uma decisão da Assembleia da Associação
Psicanalítica que optou por encerrar essa atividade, o que frustrou a conclusão do estudo.
O esboço apresentado aqui, embora inconcluso e não submetido a uma avaliação completa,
é compartilhado na esperança de que possa servir como um guia para a seleção de
pacientes em psicoterapia de curto prazo ou analiticamente orientada. Este trabalho visava
a desenvolver um instrumento que permitisse compreender o que aconteceu durante a
seleção de pacientes e a realização do tratamento psicanalítico de tempo limitado.
A proposta envolveu a criação de vetores, parâmetros ou indicadores, como neurotismo e
psicotismo, para avaliar a personalidade dos pacientes. O neurotismo indicaria um melhor
prognóstico para a terapia de tempo limitado, enquanto o psicotismo e a rigidez indicariam
o oposto. Os indicadores incluíam sintomas neuróticos, transferência neurótica, insight e
comunicação simbólica para neurotismo, enquanto para psicotismo incluíam transferência
psicótica, falta de insight e comunicação pré-verbal, entre outros.
A elaboração do esquema envolveu uma cuidadosa análise, e os indicadores foram
representados graficamente em várias tentativas, incluindo gráficos que associavam
intensidade, flexibilidade e estereotipia. O objetivo final era transformar a avaliação em uma
representação algébrica para facilitar análises estatísticas. Infelizmente, essas possibilidades
não foram plenamente desenvolvidas, e o projeto de um "Manual do Tabulador" para
consolidar esses métodos também ficou pendente.
É importante notar que este esboço foi baseado em uma amostra específica de pacientes e
excluiu aqueles com psicose, vício em drogas, perversões e outras condições graves. Apesar
de suas limitações, o esboço pode ainda ser útil para a seleção de pacientes em terapias de
tempo limitado e, eventualmente, para a avaliação desses tratamentos.

A PARTIR DAQUI, O CONTEÚDO É MENOS IMPORTANTE – A AULA PODE SER MUITO


OBJETIVA E BREVE

GRUPOS OPERATIVOS NO ENSINO: O Grupo Operativo, segundo Enrique J. Pichon-Riviere, é


formado por indivíduos com um objetivo comum, colaborando de maneira conjunta. A
estrutura de equipe é alcançada por meio da operação, com ênfase no treinamento para a
eficácia no trabalho em equipe. No contexto educacional, o grupo se prepara para aprender
enquanto trabalha, concentrando-se em um tópico específico e desenvolvendo aspectos do
fator humano. Objetivos, problemas, recursos e conflitos são estudados internamente,
relacionando-se com a tarefa proposta. A atividade do grupo vai além da execução da tarefa,
considerando o elemento humano como crucial.
ENSINO OU APRENDIZAGEM: O autor destaca a interligação entre ensino e aprendizagem,
desafiando a dicotomia convencional entre quem ensina e quem aprende. A aprendizagem
eficaz ocorre ao incorporar integralmente o ser humano no processo educacional,
rejeitando a ideia de que a exclusão de fatores subjetivos melhora o desempenho. O
conceito de "ensinagem" nos grupos operativos reflete a solidariedade entre ensino e
aprendizagem. O autor enfatiza a importância de desarmar estereótipos que bloqueiam o
processo dialético, promovendo uma abordagem transparente.
O ENSINO GRUPAL: A técnica operativa no ensino propõe uma mudança substancial na
organização e administração, problematizando o próprio ensino. A informação científica
deve ser um instrumento para a ação, não apenas acumulada sem propósito. É fundamental
estudar e investigar o ensino em grupos operativos, promovendo um clima de liberdade e
incentivando a busca por desconhecido e novos problemas. Romper com estereótipos é
crucial, permitindo avanço científico.
O QUE É APRENDER? A aprendizagem não se limita à captação intelectual, mas é uma
modificação estável de linhas de conduta em qualquer área. A técnica operativa busca
incorporar toda informação como instrumento para continuar aprendendo, criando e
resolvendo problemas.
O SER HUMANO NA APRENDIZAGEM: A técnica operativa busca reintegrar o ser humano ao
processo de aprendizagem, reconhecendo que qualquer impedimento na aprendizagem
afeta a personalidade. A dissociação entre teoria e prática é um obstáculo a ser superado. O
grupo operativo enriquece tanto a personalidade quanto a tarefa, promovendo uma
correção de padrões estereotipados. A aprendizagem bem realizada e a educação são
terapêuticas implicitamente, apesar da distinção entre terapia e ensino.
PENSAR E APRENDIZAGEM: No contexto dos grupos operativos, a aprendizagem está
centrada no pensar, buscando envolver ativamente o pensamento. O autor destaca a
dissociação entre o que se faz e o que se pensa, comum na cultura industrial, e a
necessidade de eliminar essa dissociação para um aprendizado eficaz. Ele ressalta que
muitas formas de pensar são influenciadas por padrões culturais e pela lógica formal, que
fragmenta o processo de pensamento. O pensamento dialético é reprimido pela lógica
formal, e o grupo operativo oferece a oportunidade de aprender a agir, pensar e fantasiar
com liberdade. O processo de aprendizagem no grupo funciona como uma verdadeira
maiêutica, criando objetivos e descobertas pela ativação da riqueza de cada indivíduo.
ESQUEMA REFERENCIAL: O esquema referencial é o conjunto de experiências,
conhecimentos e afetos que molda a maneira como um indivíduo pensa e age. No contexto
dos grupos operativos, a estratégia é focada na constante revisão desse esquema,
sujeitando-o a questionamentos contínuos. O esquema referencial consciente e
inconsciente é crucial, representando o a priori irracional do conhecimento racional e do
trabalho científico. A revisão do esquema referencial é fundamental para controlar tensões,
prevenir situações traumáticas e possibilitar a aprendizagem. O esquema referencial grupal
é construído gradualmente, permitindo sua atuação como uma equipe coesa. O confronto e
a revisão das ideologias ocorrem naturalmente durante as atividades do grupo operativo.
A TAREFA COMO OBJETIVO: A aprendizagem em grupos operativos envolve a atenção
simultânea à tarefa e aos participantes, analisando a relação entre objetivo e membros do
grupo. O conteúdo manifesto e latente é trabalhado continuamente, reconstruindo a
informação fragmentada pelos membros e enriquecendo-a no processo. A ansiedade
desempenha um papel crucial, mantendo uma distância ótima do objeto de conhecimento
para evitar aprendizagem prejudicada por ansiedade excessiva ou insuficiente. O respeito ao
emergente do grupo e a abordagem de "tornar estranho" o cotidiano são essenciais para
explorar aspectos desconhecidos. A aprendizagem é aprender a indagar, e a investigação
requer uma certa angústia diante do desconhecido.
A APRENDIZAGEM COMO PROCESSO GRUPAL: A aprendizagem é um processo composto por
momentos que se sucedem, alternam, isolam-se ou estereotipam-se, podendo causar
perturbações. Existem oito formas típicas desses momentos, como o paranóide, fóbico,
contrafóbico, obsessivo, confusional, esquizóide, depressivo e epileptóide. Cada momento
implica condutas ou papéis assumidos pelos integrantes do grupo, podendo resultar em
bloqueio no processo de aprendizagem se estereotipado. O treinamento do grupo como
equipe depende da inserção oportuna de cada papel no processo total, visando alcançar
uma aprendizagem de alto nível. A alternância maciça de papéis pode resultar em "viradas
totais" que se retificam gradualmente.
INFORMAÇÃO E AÇÃO: No grupo operativo, a aprendizagem envolve a interação entre
informação e ação. A ansiedade gerada pela informação pode levar à atuação, uma primeira
introjeção do tema. A atuação não apenas dramatiza a informação, mas também a reação à
ansiedade. No entrelaçamento de papéis, pensar, falar e agir coexistem, se sucedem e se
potencializam. Cada membro aprende a apreciar diferentes abordagens, promovendo uma
aprendizagem que envolve modéstia e humildade. O ato de falar é uma terceira
manifestação crucial no grupo operativo, representando a comunicação mais integrada. A
comunicação pode ser bloqueada por distorções narcisistas ou neuróticas. No grupo, pensar,
falar e agir coexistem, enriquecendo a aprendizagem.
FUNCIONAMENTO DO GRUPO OPERATIVO: Cada grupo é único e deve ser respeitado em
suas características. O coordenador foca nos membros como indivíduos, integrando funções
instrumentais e normativas. O processo de conhecimento opera no grupo e em cada
membro individualmente. A dinâmica do grupo varia devido à sua organização, podendo
tanto adoecer quanto curar. O coordenador desempenha um papel crucial ao facilitar o
diálogo e respeitar os silêncios produtivos. A oscilação entre coesão e dispersão é
necessária, assim como variações entre homogeneidade e heterogeneidade. O coordenador
estimula o diálogo entre os membros, evita confrontos estereotipados e promove a
participação ativa. As qualidades essenciais do coordenador são arte, ciência e paciência.
O TEMPO: O grupo operativo opera em sessões regulares, preferencialmente com duração
superior a uma hora. O melhor desempenho geralmente ocorre após os primeiros 50 ou 60
minutos. Grupos eficientes demonstram resistência à fadiga, e o trabalho acumulativo ao
longo de várias horas é eficaz.
ALGUNS PROBLEMAS FREQUENTES: Compulsão para se afiliar a uma escola sem julgamento
adequado representa uma estereotipia prejudicial à aprendizagem. A postura constante de
ser "do contra" também configura uma perturbação. A discrepância entre a forma de
ensinar e o formato dos exames leva à frustração dos alunos. A coincidência de exames
parciais com momentos de elaboração prejudica a integração plena dos temas. Os desafios
enfrentados pelos estudantes estão mais relacionados à estrutura educacional do que à
matéria em si. A abordagem dos problemas deve considerar a relação com a estrutura
educacional, mantendo em mente a máxima de Freud de não fugir quando os fantasmas são
invocados.

O GRUPO COMO INSTITUIÇÃO E O GRUPO NAS INSTITUIÇÕES: O autor busca reavaliar o


conceito de grupo em uma instituição, questionando a definição convencional. Ele introduz
o termo "sociabilidade sincrética" para descrever a não-individualização presente em todo
grupo, contrastando com a sociabilidade por interação. Há uma clivagem entre estratos
sincréticos e mais integrados da personalidade, crucial para o trabalho terapêutico. O autor
examina grupos institucionalizados, destacando padrões, normas e estruturas organizadas.
Ele ressalta a importância da sociabilidade sincrética, presente mesmo na falta de interação
verbal, crucial para compreender fenômenos grupais e individuais. O medo em grupos
terapêuticos é abordado como receio de perder identidades individuais para uma
sociabilidade sincrética. A identidade grupal se manifesta em dois níveis: integração e
sociabilidade sincrética, com a dependência desta última em grupos terapêuticos.
O autor aborda diferentes tipos de grupos e indivíduos, destacando o Grupo Simbiótico, que
busca dependência e identidade grupal, o Grupo Neurótico ou Normal, caracterizado pela
individuação e sociabilidade de interação, e o Grupo de Personalidades Psicopáticas,
Perversas, etc., que tende à sociabilidade sincrética. O foco terapêutico recai em grupos
neuróticos, com alertas sobre o risco antiterapêutico na organização e transformação do
grupo terapêutico em antiterapêutico. A discussão abrange a análise do grupo como
instituição e organização, enfatizando a tendência à burocratização.

O autor ressalta a importância da análise dos níveis de sociabilidade sincrética e destaca a


clivagem entre interação e sociabilidade sincrética nos grupos. As organizações tendem a
reproduzir problemas semelhantes aos que buscam resolver, exibindo uma tendência à
burocratização. A clivagem entre saudável e doente na sociedade é discutida, apontando
para a necessidade de abordar a sociabilidade sincrética em grupos terapêuticos para
combater a segregação.

A dinâmica interna das equipes técnicas e administrativas em organizações é abordada,


evidenciando conflitos que se refletem em diferentes níveis. O autor questiona a concepção
tradicional de que os indivíduos existem isolados, argumentando que o ser humano é
sempre um grupo, e a dissolução de uma organização é equiparada à desagregação da
personalidade. A relação entre instituições, organização e sociabilidade sincrética é
explorada.

O autor propõe uma revolução na administração dos recursos relacionados à terapia de


grupo, destacando a importância de reconhecer a interconexão entre administração,
teorias e práticas. Há ênfase na necessidade de sair de uma prática limitada e abordar
atividades em grupos naturais de maneira respeitosa. A mudança na administração é vista
como uma crise na estrutura da personalidade dos profissionais, requerendo compreensão
da psicologia de grupo.

O texto aborda desafios e implicações na prevenção primária, defendendo a


interdisciplinaridade e a necessidade de compreender a psicologia do ócio, do trabalho e da
organização. O autor destaca a complexidade ao intervir em organizações que replicam
modalidades do problema que tentam resolver, alertando sobre a estabilização
antiterapêutica e o momento crítico quando o grupo terapêutico se estabiliza. O
reconhecimento da complexidade e a abordagem correta dos problemas são enfatizados.

Você também pode gostar