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“Hermenêutica: “Princípios de Interpretação”

INTRODUÇÃO
A Bíblia Sagrada é diferente de qualquer outro livro secular. Ela contém o Livro e a
Mensagem. Como livro, ela contém 39 no Antigo Testamento, e 27 no Novo Testamento.
Como mensagem, ela é a Palavra de Deus. Suas escrituras são compostas de histórias,
profecias, poesias, enigmas, parábolas, romances, figuras e biografias.
O propósito da hermenêutica é nos levar à pregação da Palavra de Deus. Contudo, antes
de pregarmos, precisamos interpretar as Escrituras. Não é simplesmente abrir a Bíblia e dizer
o que ela está dizendo. Nem todo mundo se apercebe do fato de que a leitura de qualquer
texto sempre envolve um processo de interpretação. Ou seja, não é possível compreender um
texto, qualquer que seja, sem que haja antes um processo interpretativo, quer esse seja um
jornal, quer seja uma revista, quer seja a Bíblia. A leitura sempre envolverá este processo,
ainda que de forma inconsciente as pessoas o porão em andamento. A Bíblia é a Palavra de
Deus, mas também ela é um texto. Como tal, ela não foge a essa regra.

Fazer hermenêutica é saber que só existe elefante de quatro


pernas. Embora, muitos hermeneutas têm visto elefantes de
cinco ou mais pernas. Às vezes o que você pensa que vê
não condiz com a realidade. Todo cuidado é pouco.

1. SUSTENTAÇÃO AO ASSUNTO
• O meu povo foi destruído, porque lhe faltou o conhecimento; porque tu rejeitaste o
conhecimento, também eu te rejeitarei. (Oséias 4:6a).
• Jesus, porém, respondendo, disse-lhes: Errais, não conhecendo as Escrituras, nem o poder
de Deus. (Mateus 22:29).
• Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar,
que maneja bem a palavra da verdade. (2 Timóteo 2:15).
• Não se aparte da tua boca o livro desta Lei; antes, medita nele dia e noite, para que tenhas
cuidado de fazer conforme tudo quanto nele está escrito... (Josué 1:8).
2. DEFINIÇÕES
• HERMENÊUTICA: O termo "hermenêutica" deriva do grego hermeneuein, "interpretar". É a
ciência que cuida da reta compreensão e interpretação das Escrituras. Consiste num conjunto
de regras que permitem determinar o sentido literal da Palavra de Deus.
• EXEGESE: É a aplicação dos princípios da hermenêutica para chegar-se a um entendimento
correto do texto. O prefixo (ex) “para fora” refere-se à ideia de que o intérprete está tentando
derivar seu entendimento do texto, ao contrário da Eisegese, onde prevalece o bel prazer do
leitor.
3. OBJETIVOS PRINCIPAIS
3.1. Traduzir o texto original tornando-o compreensível em língua vernácula, sem sangrar o
sentido primário.
3.2. Compreender o sentido do texto dentro de seu ambiente histórico-cultural e léxico-
sintático.

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3.3. Explicar o verdadeiro sentido do texto, em todas as dimensões possíveis (autor, cultura,
condições políticas, sociais, religiosas etc.).
3.4. Tornar a mensagem das Escrituras inteligível ao homem moderno, conduzindo-o à Cristo.
4. POR QUE DEVO ENTENDER?
4.1. Devemos entender bem as palavras e os textos para não cometermos erros graves e
prejudiciais a nós e aos outros. Vejamos alguns exemplos dentro da própria Bíblia:
• Lucas 5:4-5 – Pedro teve um prejuízo pessoal
• João 6:5-7 – Filipe ia dificultando o trabalho do Mestre
• João 21:20-23 – O povo fez Jesus ficar em situação difícil
5. FERRAMENTAS INDISPENSÁVEIS
Uma Exegese perfeita requer algumas ferramentas indispensáveis, tais como:
• Diversas versões da Bíblia: Corrigida, Atualizada, Contemporânea, Bíblia de Jerusalém,
Bíblia Judaica, etc...
• Atlas Bíblico;
• Chave Bíblica;
• Dicionário Bíblico;
• Dicionário da Língua Portuguesa;
• Comentários Bíblicos diversos, como: História dos Hebreus de Flávio Josefo, Antigo e Novo
Testamentos interpretados, versículo por versículo, de R. N. Champlin.
6. OS DISTANCIAMENTOS
A Bíblia não caiu pronta do céu, embora se pensasse assim em determinada época. Ela foi
escrita por pessoas diferentes, em épocas diferentes, línguas e lugares distintos. Por isso, é
um texto distante de nós. Aqui é que entra o que os teóricos da hermenêutica chamam de
distanciamento. Esse distanciamento aparece em algumas áreas:
6.1. Distanciamento Temporal: A Bíblia está distante de nós há muitos séculos. Seguindo a
postura do cânon tradicional, o último livro foi escrito por volta do final do século I da Era Cristã.
Para os liberais, o último livro teria sido escrito no século II, mas normalmente a data que se
atribui é a do final do século I ― o que, portanto, nos separa temporalmente da Bíblia cerca
de dois milênios. Assim, não devemos pensar que um livro de 2000 anos pode ser lido como
quem lê a Revista Época, em que a última edição saiu no sábado passado. Há esse fenômeno
do distanciamento temporal, que precisa ser levado em consideração.
6.2. Distanciamento Contextual: Os livros da Bíblia foram escritos para atender a
determinadas situações. Várias delas já se perderam no passado. Por exemplo, o uso do véu
não é um problema nosso aqui no Brasil. O ataque do próprio gnosticismo nas igrejas da Ásia
Menor, o contexto de invasão do profeta Habacuque, o propósito de Marcos, a antipatia dos
judeus para com os ninivitas na época de Jonas, todas essas situações distintas produziram
a literatura que depois se tornou canonizada, e que nós chamamos de Escritura. Várias dessas
situações nos sãos estranhas, não existem hoje. Dessa forma, além de ser um livro que foi
escrito há 2000 anos, foi um livro escrito para atender a determinados problemas que não são
os mesmos enfrentados hoje.
6.3. Distanciamento Cultural: O mundo que os escritores da Bíblia viveram não existe mais.
Ele está em um passado distante, com suas características, sua cosmovisão, seus costumes,

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tradições e crenças. Nós vivemos hoje em um Brasil de tradição ocidental, influência europeia,
americana e uma série de outras influências de um mundo completamente estranho àquele
em que viveram os autores do Antigo Testamento e do Novo Testamento.
6.4. Distanciamento Linguístico: As línguas em que a Bíblia foi escrita também não mais
existem. Já não se fala mais o hebraico bíblico, o grego koiné (popular) ― mesmo nos países
onde a Bíblia foi escrita. Então, essas línguas já não são mais faladas ou conhecidas, a não
ser através de estudo.
6.5. Distanciamento Autoral: Nós devemos ainda reconhecer que teríamos uma
compreensão mais exata da mensagem se os autores da Bíblia estivessem vivos. Seria ótimo
se pudéssemos pegar o celular e ligar para Pedro e perguntar para ele o que ele quis dizer
quando afirma que Jesus foi pregar aos espíritos em prisão, ou ligar para Paulo e perguntar o
que ele quis dizer quando ele fala dos que se batizam pelos mortos, ou ainda o que Mateus
quis dizer quando registrou a frase em que Jesus afirma que não cessariam de percorrer todas
as cidades de Israel antes que viesse o Filho do homem. Eu gostaria de pegar o celular ou
mandar um e-mail para os autores da Bíblia e tirar algumas dúvidas. Isso não é possível.
Portanto, esse distanciamento faz com que os pregadores, antes de qualquer coisa, sejam
hermeneutas. Eles têm que ser intérpretes. Eles têm que estar conscientes de que estão
transmitindo o sentido de um texto antiquíssimo e distante de nós em uma realidade
completamente diferente. É nesse ambiente que nós afirmamos que interpretar é tentar
transpor o distanciamento em suas várias formas de chegar ao sentido original do texto ― à
intenção do autor ― com o objetivo de transmitir o significado para os dias de hoje. É aqui que
reside a tarefa hermenêutica.
6.6. Distanciamento Espiritual: O distanciamento espiritual existe porque somos criaturas
pecadoras, caídas, e o pecado impõe limites ainda maiores à nossa capacidade de
interpretação da Bíblia. É o que nós chamamos de limitações epistemológicas. O pecado
afetou não somente a nossa vontade, não somente os nossos desejos, a nossa capacidade
de decidir, mas também afetou a nossa capacidade de compreender as coisas de Deus. Isso
explica a grande diferença de interpretação que existe entre crentes verdadeiros que estão
salvos pela graça de Deus em Cristo Jesus, mas simplesmente não conseguem concordar na
interpretação de determinadas passagens.
6.7. Distanciamento Moral: Esse distanciamento é caracterizado pela distância existente
entre seres pecadores e egoístas, e a pura e santa Palavra de Deus que nós pretendemos
entender e pregar. Essa corrupção acabou introduzindo à interpretação da Bíblia motivações
incompatíveis com ela. Por exemplo, a Bíblia já foi usada para: justificar a escravidão; provar
que os judeus deveriam ser perseguidos; provar que os judeus deveriam ser defendidos;
provar que os protestantes brancos são uma raça superior; executar bruxas; impedir o
casamento de padres; justificar o aborto; justificar a eutanásia; justificar e promover os
relacionamentos homossexuais; proibir a transfusão de sangue. O catálogo é imenso do que
tem sido usado como motivação de agendas diversas e variadas. Por isso, devemos
interpretar as Escrituras com santa reverência, humildade e à sombra do Onipotente.
7. AS FALAS DA BÍBLIA
Apesar da Bíblia ser um livro Divino, não encontramos nela somente palavras dos Céus,
pois trata-se de relatos diretos e indiretos contados pelos seus autores. Nela encontramos
palavras de Deus, dos homens, de Satanás, dos anjos, etc. Logo, devemos observar no texto
quem está falando, para não cometermos o erro de crer em “promessas” que não vem de
Deus.

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7.1. Palavra de Deus: E eis que uma voz dos céus dizia: Este é o meu Filho amado, em quem
me comprazo. (Mateus 3:17).
7.2. Palavra de Homem: Fui moço, e agora sou velho; mas nunca vi desamparado o justo,
nem a sua semente a mendigar o pão. (Sl 37:25).
7.3. Palavra de Satanás: Então o SENHOR disse a Satanás: Donde vens? E Satanás
respondeu ao SENHOR, e disse: De rodear a terra, e passear por ela. (Jó 1:7).
7.4. Palavra de Anjo: E disse-lhe o anjo: Cinge-te, e ata as tuas alparcas. E ele assim o fez.
Disse-lhe mais: Lança às costas a tua capa, e segue-me. (Atos 12:8).
8. REGRAS DE INTERPRETAÇÃO
As regras de interpretação se dividem em quatro categorias: Gerais, Gramaticais, Históricas
e Teológicas.
8.1. Regras Gerais: são as que tratam da matéria global da interpretação. São universais em
sua natureza, não se limitando a considerações específicas, incluídas estas nas outras três
seções.
8.2. Princípios gerais de interpretação
• Regra 1: Trabalhe partindo da pressuposição de que a Bíblia tem autoridade.
• Regra 2: A Bíblia é seu intérprete; a Escritura explica melhor a Escritura.
• Regra 3: A fé salvadora e o Espírito Santo nos sãos necessários para compreendermos e
interpretarmos bem as Escrituras.
• Regra 4: Interprete a experiência pessoal à luz da escritura, e não a Escritura à luz da
experiência pessoal.
• Regra 5: Os exemplos bíblicos só têm autoridade quando amparados por uma ordem.
• Regra 6: O propósito primário da Bíblia é mudar as nossas vidas, não aumentar o nosso
conhecimento.
• Regra 7: Cada cristão tem o direito e a responsabilidade de investigar e interpretar
pessoalmente a Palavra de Deus.
• Regra 8: A história da Igreja é importante, mas não decisiva na interpretação da Escritura.
• Regra 9: As promessas de Deus na Bíblia toda estão disponíveis ao Espírito Santo a favor
dos crentes de todas as gerações.
8.3. Regras Gramaticais: são as que tratam do texto propriamente dito. Estabelecem as
regras básicas para o entendimento das palavras e sentenças da passagem em estudo.
• Regra 1: A Escritura tem somente um sentido, e deve ser tomada literalmente.
• Regra 2: Interprete as palavras no sentido que tinham no tempo do autor.
• Regra 3: Interprete a palavra em relação à sua sentença e ao seu contexto.
• Regra 4: Interprete a passagem em harmonia com o seu contexto.
• Regra 5: Quando um objeto inanimado é usado para descrever um ser vivo, a proposição
pode ser considerada figurada.
• Regra 6: Quando uma expressão não caracteriza a coisa descrita, a proposição pode ser
considerada figurada.

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• Regra 7: As principais partes e figuras de uma parábola representam certas realidades.


Considere somente essas principais partes e figuras quando estiver tirando conclusões.
• Regra 8: Interprete as palavras dos profetas no seu sentido comum, literal e histórico, a
não ser que o contexto ou a maneira como se cumpriram indiquem claramente que têm sentido
simbólico. O cumprimento delas pode ser por etapas, cada cumprimento sendo uma garantia
daquilo que há de seguir-se.
8.4. Regras Históricas: são as que tratam do substrato ou contexto em que os livros da
Bíblia foram escritos. As situações políticas, econômicas e culturais são importantes na
consideração do aspecto histórico do seu estudo da Palavra de Deus.
• Regra 1: desde que a Escritura se originou num contexto histórico, só pode ser
compreendida à luz da história bíblica.
• Regra 2: Embora a revelação de Deus nas Escrituras seja progressiva, tanto o VT como o
NT são partes essenciais desta revelação e formam uma unidade.
• Regra 3: Os fatos ou acontecimentos históricos se tornam símbolos de verdades
espirituais, somente se as Escrituras assim os designarem.
8.5. Regras Teológicas: são as que tratam da formação da doutrina cristã. São, por
necessidade, regras “amplas”, pois a doutrina tem de levar em consideração tudo que a Bíblia
diz sobre dado assunto. Embora tendam a ser regras um tanto complicadas, nem por isso são
menos importantes, pois desempenham papel de profunda relevância na obra de dar forma
aquele corpo de crenças.
• Regra 1: Você precisa compreender gramaticalmente a Bíblia, antes de compreende-la
teologicamente.
• Regra 2: Uma doutrina não pode ser considerada bíblica, a não ser que resuma e inclua
tudo o que Escritura diz sobre ela.
• Regra 3: Quando parecer que duas doutrinas ensinadas na Bíblia são contraditórias, aceite
ambas como escriturísticas, crendo confiantemente que elas se explicarão dentro de uma
unidade mais elevada.
•Regra 4: Um ensinamento simplesmente implícito na Escritura pode ser considerado bíblico
quando uma comparação de passagens correlatas o apoia.
9. FIGURAS DE LINGUAGEM
9.1. O que são Figuras de Linguagem?
São estratégias literárias que um escritor pode aplicar em determinado texto com o objetivo
de fazer um efeito determinado na interpretação do leitor, são formas de expressão que
caracterizam formas globais no texto. Elas podem se relacionar com aspectos semânticos,
fonológicos ou sintáticos das palavras afetadas. Vejamos alguns exemplos:
9.1.1. HEBRAÍSMO: Por hebraísmos entendemos certas expressões e maneiras peculiares do
idioma hebreu que ocorrem em nossas traduções da Bíblia, que originalmente foi escrita em
hebraico e em grego. Alguns conhecimentos destes hebraísmos são necessários para poder
fazer uso devido de nossa primeira regra de interpretação.
 Exemplos:
1°) Era costume entre os hebreus chamar a uma pessoa filho da coisa que de um modo
especial a caracterizava, de modo que ao pacífico e bem-disposto se chamava filho da paz;
ao iluminado e entendido, filho da luz; aos desobedientes, filhos da desobediência, etc. (Lc
10:6; Ef 2:2; 5:6 e 5:8.).
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2°) As comparações eram expressas às vezes, mediante negações, como, por exemplo, ao
dizer Jesus: "Qualquer que a mim me receber, não recebe a mim, mas ao que me enviou", o
que equivale à nossa maneira de dizer: O que me recebe, não recebe tanto a mim, quanto ao
que me enviou; ou não somente a mim, mas também ao que me enviou”.
 Devemos interpretar da mesma maneira quando lemos: "Não procuro (somente) a minha
própria vontade, e, sim, a daquele que me enviou; trabalhai, não (só) pela comida que perece
mas pela que subiste para a vida eterna; não mentiste (somente) aos homens, mas a Deus;
não me enviou Cristo (tanto) para batizar, mas (quanto) para pregar o evangelho, etc. (Mc
9:37; Jo 5:30; 6:27; At 5:4; 1 Co 1:17; Ef 6:12.).
 O amar e aborrecer eram usados para expressar a preferência de uma coisa a outra; assim
é que ao ler, por exemplo:
• "Amei a Jacó, porém me aborreci de Esaú",
• Devemos compreender: preferi Jacó a Esaú. (Rm 9:13; Dt 21:15; Jo 12:25; Mt 10:37).
9.1.2. PARADOXO: É uma afirmação aparentemente absurda ou contrária ao bom senso. Um
paradoxo não é uma contradição; é simplesmente algo que parece ser o oposto do que em
geral se sabe. Jesus disse: “... quem perder a vida por causa de mim e do evangelho, salvá-
la-á...” (Mc. 8:35). Geralmente, quando alguém perde alguma coisa, não a salva ao mesmo
tempo. É claro que Jesus falou desse modo para enfatizar que, quando alguém faz sacrifícios
por ele, de fato experimenta uma vida mais completa e agradável.
9.1.3. IRONIA: É uma forma de ridicularizar indiretamente sob a forma de elogio. Com
frequência vem marcada pelo tom de voz de quem fala, para que os ouvintes a percebam. Por
isso, às vezes é difícil saber se uma declaração escrita deve ser considerada ironia. Mas
normalmente o contexto ajuda a mostrar se é ou não uma ironia. Mical, a filha de Saul, disse
a Davi: “... Que bela figura fez o rei de Israel...” (2 Sm 6:20). O versículo 22 indica que o sentido
pretendido era o oposto, ou seja, que ele havia se humilhado ao agir de maneira indigna, no
entender de Mical. Às vezes a ironia vem acompanhada de humor, como no caso em que
Elias zombou dos profetas de Baal: “... Clamai em altas vozes, porque ele é deus!” (1 Rs
18:27). É claro que Elias não acreditava que o falso deus Baal realmente existisse. Ele fez um
elogio a Baal em tom de ironia para incitar os profetas a orarem ainda mais alto. Isso reforçou
o fato de que aquele deus falso, ao contrário de Javé, o Deus verdadeiro, não ouvia seus
adoradores.
9.1.4. SÍMILE: É uma comparação em que uma coisa lembra outra explicitamente (usando
como, assim como, tal qual, tal como). Pedro usou um símile quando escreveu: “... toda carne
é como a erva...” (1 Pe 1:24). As palavras do Senhor em Lucas 10:3 são um símile: “... Eis
que eu vos envio como cordeiros para o meio dos lobos...”. Também existem símiles no salmo
1: “Ele é como árvore plantada junto a corrente de águas” (v. 3) e "são [...] como a palha” (v.4).
A dificuldade dos símiles é descobrir as semelhanças entre os dois elementos. Em que
aspecto o homem é como a erva? Em que sentido os discípulos de Jesus eram como
cordeiros? De que forma o cristão é como uma árvore e o ímpio como a palha?
9.1.5. EUFEMISMO: Consiste na substituição de uma expressão desagradável ou injuriosa por
outra inócua ou suave. Falamos da morte mediante eufemismo: “ele passou para o outro lado”,
“bateu as botas” ou “foi para uma melhor”. A Bíblia fala da morte dos cristãos como um
adormecimento (At. 7:60; 1 Ts. 4:13-15).
9.1.6. HIPOCATÁSTASE: Esta figura de linguagem, não tão conhecida, também faz uma
comparação em que a semelhança é indicada diretamente. Quando Davi disse: “Cães me
cercam...” (Sl 22:16), estava referindo-se a seus inimigos, chamando-os de cães. Os falsos
mestres também são chamados cães, em Filipenses 3:2, e lobos vorazes, em Atos 20:29. As
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“Hermenêutica: “Princípios de Interpretação”

diferenças entre um símile, uma metáfora e uma hipocatástase podem ser identificadas nas
seguintes frases: Símile: “Vocês, ímpios, são como cães”. Metáfora: “Vocês, ímpios, são como
cães”. Hipocatástase: “Seus cães”. Em João 1:29, João Batista fez uso de uma hipocatástase:
“... Eis o Cordeiro de Deus...”. Se ele tivesse dito: “Jesus é como um cordeiro” estaria usando
um símile. Mas se tivesse dito: “Jesus é um cordeiro”, estaria usando uma metáfora. Quando
Cristo disse a Pedro: “... Apascenta as minhas ovelhas...” (Jo 21:17), ele chamou seus
seguidores de ovelhas, usando uma hipocatástase. O contexto precisa ser avaliado para saber
o que a hipocatástase representa. Por exemplo, Jeremias disse: “um leão subiu da sua
ramada” (Jr 4:7).
9.1.7. METÁFORA: É uma comparação em que um elemento, imita ou representa outro (sendo
que os dois são essencialmente diferentes). Numa metáfora, a comparação está implícita, ao
passo que num símile é visível. Uma pista para identificar uma metáfora é que os verbos “ser”
e “estar” sempre são empregados. Temos um exemplo disso em Isaías 40:6: “Toda a carne é
como a erva”. (Um símile sempre traz a conjunção como ou outras). O Senhor disse para
Jeremias: “O meu povo tem sido ovelhas perdidas” (Jr 50:6). O Senhor comparou seus
seguidores ao sal: “Vós sois o sal da terra” (Mt 5:13). Eles não eram sal de verdade; estavam
sendo comparados ao sal. Quando Jesus afirmou: “Eu sou a porta” (Jo 10:7-9). “Eu sou o bom
pastor” (v.11-14) e “Eu sou o pão da vida” (6:48), ele estava fazendo comparações. Em certos
aspectos, ele é como uma porta, como um pastor e como um pão. O leitor é levado a pensar
de que forma Jesus assemelha-se a tais elementos.
9.1.8. METONÍMIA: Consiste em substituir uma palavra por outra. Quando dizemos que o
Congresso tomou uma decisão, estamos referindo-nos a deputados e senadores.
Substituímos os deputados e os senadores pela estrutura política que dirigem. Na Bíblia temos
a seguintes declaração: “...e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. (Mateus 16:18).
9.1.9. HIPÉRBOLE: É uma afirmação exagerada em que se diz mais do que o significado literal
com o objetivo de ênfase. Quando 10 dos espias israelitas apresentaram o relatório da
incursão à Canaã, disseram: “... as cidades são grandes e fortificadas até aos céus...” (Dt
1:28). É claro que eles não estavam afirmando que as muralhas das cidades de Canaã
realmente chegavam aos céus; estavam apenas dizendo que eram bastante altas. O salmista
valeu-se da hipérbole para acrescentar ênfase quando escreveu: “... todas as noites faço
nadar o meu leito, de minhas lágrimas o alago...” (Sl 6:6).
9.1.10. LITOTES: Consiste numa frase suavizada ou negativa para expressar uma afirmação.
É o oposto da hipérbole. Quando dizemos “Ele não é um mau pregador”, queremos dizer que
ele é um pregador muito bom. A atenuação confere ênfase. Quando Paulo disse “... Eu sou
judeu, natural de Tarso, cidade não insignificante...” (At 21:39), quis dizer que Tarso era na
realidade uma cidade importante. Às vezes uma litotes é uma frase de depreciação, como
vemos em Números 13:33: “Éramos aos nossos próprios olhos gafanhotos, e assim também
o éramos aos seus olhos”, Lucas empregou esse recurso várias vezes. Ele comentou que
“houve não pouco alvoroço entre os soldados” (At 12:18), “não pouco lucro” (19:24) “não
pequena tempestade” (27:20), e que Paulo e Barnabé permaneceram em Antioquia “não
pouco tempo” (14:28). Paulo depreciou a si mesmo com uma litotes, em 1 Co 15:9: “Porque
eu sou o menor dos apóstolos”. Essa declaração de autêntica humildade foi feita para salientar
a graça de Deus em sua vida, como pecador que não a merecia.
9.1.11. PERGUNTA RETÓRICA: Uma pergunta retórica é aquela que não exige resposta; seu
objetivo é forçar o leitor a respondê-la mentalmente e avaliar suas implicações. Quando Deus
perguntou para Abraão: “Acaso para Deus há cousa demasiadamente difícil?”... (Gn 18:14),
ele não esperava ouvir uma resposta. A intenção era que o patriarca a respondesse
mentalmente. O mesmo aconteceu quando o Senhor perguntou a Jeremias: “... acaso haveria
cousa demasiadamente maravilhosa para mim?” (Jr 32:27). Paulo fez uma pergunta retórica
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“Hermenêutica: “Princípios de Interpretação”

em Romanos 8:31: “... Se Deus é por nós, quem será contra nós?”. Essas perguntas retóricas
são formas de transmitir informações. As primeiras duas perguntas indicam que nada é
impossível para Deus, e a indagação de Paulo em Romanos 8:31 diz que ninguém pode
vencer o cristão, pois Deus o defende.
9.1.12. ANTROPOMORFISMO: Consiste na atribuição de qualidades ou ações humanas a Deus,
como ocorre nas referências aos dedos de Deus (Sl 8:3), a seus ouvidos (3:2) e a seus olhos
(2 Cr 16:9).
9.1.13. ZOOMORFISMO: Se o antropomorfismo atribui características humanas a Deus, o
zoomorfismo atribui características animais a Deus (ou a outros). São maneiras expressivas
e originais de salientar certos atos e qualidades do Senhor. O salmista disse: “[Deus] Cobrir-
te-á com as suas penas, sob suas asas estarás seguro”. (Sl 91:4). A imagem que vem à mente
dos leitores é de pintinhos ou passarinhos protegidos debaixo das asas da galinha ou do
pássaro-mãe. Jó descreveu o que considerou ser a ira de Deus contra ele quando disse:
“[Deus] contra mim rangeu os dentes” (Jó 16:9).
9.1.14. ANTROPOPATIA: Esta figura de linguagem atribui emoções humanas a Deus, como
vemos em Zacarias 8.2: “Tenho grandes zelos de Sião”. Também em Gn 6:6: “Então
arrependeu-se o Senhor”.
9.1.15. PERSONIFICAÇÃO: O que ocorre aqui é a atribuição de características ou ações
humanas a objetos inanimados, a conceitos ou a animais. A alegria é uma emoção atribuída
ao deserto, em Isaías 35:1: “O deserto e a terra se alegrarão”. Isaías 55:12 fala de montes e
outeiros entoando cânticos e de árvores batendo palmas. A morte personifica-se em Romanos
6.9 e em 1 Co 15:55.
9.1.16. PARÁBOLA: é uma narração alegórica na qual o conjunto de elementos evoca, por
comparação, outras realidades de ordem superior (Novo Dicionário Aurélio).
→ Uma definição de parábola: Ao se buscar uma definição de parábola temos definição
bem simples, que é esta: "Parábolas são histórias não-literais que se destinam a ensinar uma
verdade ou lição" (VOELZ, 1997, p. 303). Outra, um pouco mais completa, diz que parábolas
são histórias tiradas do dia-a-dia das pessoas, que têm uma lição moral ou religiosa
transmitida de forma indireta, e que se destinam a convencer ou persuadir, levando o ouvinte
a tomar uma decisão ou agir (BOUCHER, p.15).
Talvez a definição mais comum seja esta: "Uma história terrena com sentido celestial". Não
é de todo má, embora seja melhor colocá-la de ponta cabeça: "uma mensagem celestial na
forma de uma história terrena". Isto porque o "sentido celestial", aquilo que se quer dizer, vem
antes, e só então se formula a história terrena. Disso resulta, por vezes, uma "deformação" da
história terrena, algo que pode ser descrito como "presença de elementos atípicos".
Detalhando um pouco mais, pode-se dizer que a parábola tem quatro elementos
importantes:
1) É uma narrativa, pois conta uma história. Além disso, é tirada da vida real, sendo verossímil.
É também simples, pois se trata de literatura popular.
2) É mais do que uma simples história ou narrativa, pois opera em dois níveis de significado:
o literal e o figurado.
3) Tem como propósito maior, não apenas entreter ou captar a atenção, mas levar à mudança
de pensamento e sentimento.
4) Fala do reino de Deus, num dos seguintes aspectos: sua vinda; a graça do reino ou a
misericórdia de Deus; discipulado; a crise trazida pela iminência do reino.

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“Hermenêutica: “Princípios de Interpretação”

10. ALGUMAS DICAS DE EXEGESE


Se quisermos entender o real sentido das passagens bíblicas, devemos fazer alguns
questionamentos ao texto lido. Vamos tomar por exemplo a primeira carta aos Coríntios:
1. Quem escreveu? – Paulo
2. Onde escreveu? – Em Éfeso
3. Em que data escreveu? – Primavera de 55 ou 56 d.C.
4. Para quem escreveu? – À igreja estabelecida alí
5. Por que escreveu? – A fim de resolver problemas da igreja e orientar sobre diversas
doutrinas.
10.1. OUTRAS DICAS DE EXEGESE
Exegese é o trabalho de exposição de um texto bíblico.
1 - Leia o texto em voz alta, comparando com versões diferentes para maior compreensão.
2 - Reproduza o texto com suas próprias palavras. (Fale sozinho)
3 - Observe o texto imediato e remoto.
4 - Verifique a linguagem do texto (história, milagre, ensino, parábola, profecia, etc.)
5 - Pesquise o significado exato das principais palavras;
6 - Faça anotações;
7 - Pesquise o contexto (época, país, costumes, tradição, etc.)
8 - Pergunte sempre onde? Quem? O que? Por que?
9 - Organize o texto em seções principal e secundárias;
10 - Resuma com a seguinte frase: “O assunto mais importante deste texto é...”

Cuidado!
Não confunda Exegese com Eisegese
Enquanto a Exegese consiste em extrair o significado
de um texto qualquer, mediante legítimos métodos de
interpretação; a Eisegese consiste em injetar em um
texto, alguma coisa que o interprete quer que esteja
ali, mas que na verdade não faz parte do mesmo. Em
última instância, quem usa a eisegese força o texto
mediante várias manipulações, fazendo com que uma
passagem diga o que na verdade não se acha lá.

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“Hermenêutica: “Princípios de Interpretação”

 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo de nossa carreira cristã, temos que aprender todos os dias sobre as passagens
da Bíblia. Observando que existem muitas interpretações errôneas circulando pelas igrejas.
Por isso, decidamos então fazer como os crentes Bereanos: “Ora, estes foram mais nobres
do que os que estavam em Tessalônica, porque de bom grado receberam a palavra,
examinando cada dia nas Escrituras se estas coisas eram assim”. (Atos 17:11).
 BIBLIOGRAFIA
• ERKHOF, Louis. Princípios de Interpretação Bíblica. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
2004.
• FEE, Gordon D. e STUART, Douglas. Entendes o Que Lês? São Paulo: Editora Vida Nova,
1982.
• GEISLER, Norman. e HOWE, Thomas. Manual Popular de Dúvidas Enigmas e
“Contradições” da Bíblia. São Paulo: Editora Mundo Cristão, 2001.
• LOPES, Augustus Nicodemus. A Bíblia e Seus Intérpretes. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2004.
• VANHOOZER, Kevin. Há um Significado Neste Texto? São Paulo: Editora Vida, 2005.
• VIRKLER, Henry. Hermenêutica Avançada: Princípios e Processos de Interpretação
Bíblica. São Paulo: Editora Vida, 2001.
• SCHOLLZ, Vilson - Princípios de Interpretação Bíblica - Editora da ULBRA.
• E. LUND, P. C. NELSON - Princípios de Interpretação das Sagradas Escrituras – Editora
Vida
• Bíblia Digital

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