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UNIVERSIDADE SAVE

REVISITANDO O “SUBALTERNIZADO” DEBATE SOBRE O DESENVOLVIMENTO


DO NIASSA.

Licenciatura em ensino de História com habilitações em Geografia

Elisio dos Santos Machava


Igila Machoco
Narciso Armando Mandlhate
Neusia Jose Magumane
Selma
Xavier Adolfo Sitoe

Massinga
2021
UNIVERSIDADE SAVE

REVISITANDO O “SUBALTERNIZADO” DEBATE SOBRE O DESENVOLVIMENTO


DO NIASSA.

Licenciatura em ensino de História com habilitações em Geografia

Docente: Prof. Dr. Manuel Henriques Matine

Elisio dos Santos Machava


Igila Machoco
Narciso Armando Mandlhate
Neusia Jose Magumane
Selma Momade
Xavier Adolfo Sitoe

Massinga
2021
Índice
Resumo..............................................................................................................................4

0.Introdução.......................................................................................................................6

CAPITULO I.....................................................................................................................7

1.Localização:................................................................................................................7

1.1.O contributo da operação produção para o desenvolvimento do Niassa.................7

1.2.A expulsão dos parrazitas nas cidades.....................................................................8

CAPITULO II..................................................................................................................11

2.Os campos de redução e a operação produção.........................................................11

2.1.Reenviar para nunca mais regressarem: porquê Niassa e Cabo Delgado?............11

2.2.Três, quatro vôos por dia para o Niassa.................................................................13

2.3.Abandonadas à sua sorte........................................................................................14

2.4.Governo autoriza regresso mas não dá meios........................................................14

3.Conclusão:....................................................................................................................15

4.Bibliografias:................................................................................................................16
5

Resumo:

O trabalho focaliza-se em abordar acerca do desenvolvimento de Niassa província de Moçambique,


localizada no norte do país, neste caso com ênfase em sociologia política e particularmente no processo
da produção social de políticas, este trabalho traz uma outra interpretação, das várias existentes, sobre a
Operação Produção (1983) que culminam com o desenvolvimento do Niassa. Longe do discurso político
que sugere uma ligação entre esta medida e a necessidade política e económica de tornar 'produtivo' e
úteis à sociedade os 'improdutivos' urbanos, sem menosprezar o aspecto racional (no sentido sociológico
do termo) e o valor do discurso político, aqui procurar-se-á mostrar que é mais a construção social, a
representação, a percepção e o sistema de referenciais sobre os 'improdutivos', partilhadas no seio da
Frelimo, nos anos 1980, que leva à Operação de Produção e ao desenvolvimento do país.
Palavras chave: produção, operação, improdutivos.
6

Abistrack

The work focuses on addressing the development of Niassa province of Mozambique, located in the north
of the country, in this case with an emphasis on political sociology and particularly on the process of
social policy production, this work brings another interpretation, from the various existing ones, on
Operation Production (1983) that culminated in the development of Niassa. Far from the political
discourse that suggests a link between this measure and the political and economic need to make the
urban 'unproductive' 'productive' and useful to society, without underestimating the rational aspect (in the
sociological sense of the term) and the value of the political discourse , here we will try to show that it is
more the social construction, representation, perception and system of references about the 'unproductive',
shared within Frelimo, in the 1980s, that leads to the Production Operation and development from the
country.

Keywords: production, operation, unproductive


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0.Introdução
O trabalho surge na cadeira de História de Moçambique IV do século XX-XXI,
com o foco o desenvolvimento de Niassa, para a compreensão do assunto em causa
entendamos que após a independência de Moçambique, o governo tentou implementar
um sistema económico marxista-leninista. Lançou em 1983 a Operação Produção que
obrigou milhares de pessoas a deixar as famílias e a ir para o Niassa. A escolha do
Niassa como regiões prioritárias para o envio de improdutivo é explicado pela crença no
potencial agrícola dessas regiões. Niassa possuía nessa época vastas florestas virgens
com uma boa qualidade de solo para a prática de agricultura de diversos produtos, assim
como era a província menos povoada do país e necessitava ser repovoada e
desenvolvida. Logo, o partido criou o mecanismo para exploração dessas regiões.

O trabalho tem como objectivo Geral, compreender o desenvolvimento de Niassa.


Tem como objectivos específicos: 1 o conhecer geograficamente Niassa, 2 o descrever o
processo da operação produção, 3o analisar o desenvolvimento de Niassa.

Para a materialização deste trabalho recorreu-se selecção, leitura e crítica das


obras que melhor abordam o tema, nos reunimos como grupo e quando tivemos a
informação cada membro do grupo leu, depois discutimos sobre os conteúdos, em
concordância digitamos o importante e cada um foi se preparar particularmente em sua
casa. Tivemos como recurso a internet e outras fontes, sistematização das informações
obtidas e por fim a redição do resumo final cuja bibliografia consta devidamente da
última página do mesmo.
8

CAPITULO I

1.Localização:
Para DINERMAN (2009, p.187) A província do Niassa está localizada na região
norte de Moçambique, e tem fronteira, a norte com a Tanzânia, a sul com as províncias
de Nampula e Zambézia, com a província de Cabo Delgado a este e a oeste com
o Malawi, com o qual também divide o Lago Niassa, um dos Grandes Lagos
Africanos. Os grupos étnicos mais representados nesta província
são macua, ajaua e nianja, sendo que as respectivas línguas maternas são faladas por
43,6%, 37,2% e 10.0% da população.

Fonte:https://www.google.com/ província do Niassa

1.1.O contributo da operação produção para o desenvolvimento do Niassa


Segundo ARAUJO (2003, p.165-182), Em Moçambique, após a independência
o governo tentou implementar um sistema económico marxista-leninista, lançou em
1983 a Operação Produção que obrigou milhares de pessoas a deixar as famílias e a ir
para o Niassa.
A Operação Produção é interpretada de diferentes maneiras em função da natureza
das fontes, dos interesses políticos ou da corrente epistemológica. O partido-Estado
Frelimo apresenta-a como uma medida político-administrativa em nome da legalidade
revolucionária, de intervenção social para erradicar os males sociais (principalmente
criminalidade e prostituição) nas cidades, e para tornar úteis à sociedade os
'improdutivos' com vista a cumprir com os objectivos do desenvolvimento da época e
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para a formação duma nova sociedade moçambicana, despida dos valores do


colonizador. A Frelimo dos anos 1980 viu a migração do campo para cidade como um
fenómeno que colocava problemas para o desenvolvimento e para o modelo de
organização da cidade 'socialista'. Idem
DINERMAN (2009, p.195), fazendo referência a uma intervenção de Joaquim
Chissano , apresenta a criminalidade urbana e o massivo êxodo rural, que deviam
ser erradicados pela implementação da Operação Produção, como uma herança
colonial que devia ser erradicada.
JENKINS (2009: 97) funda seu argumento sobre elementos de urbanização
e de desenvolvimento para explicar a Operação Produção. Para este investigador, o
fracasso dos programas de desenvolvimento nos anos 1970-80 e a crise política
subsequente, reflectem a marginalização de Moçambique pela economia global e
particularmente na região austral de África. Isto levou a uma espécie de
discriminação urbana. Esta operação foi também uma forma de relaxar a pressão
demográfica nas cidades e em Carlos Quembo Operação Produção e a produção de
'improdutivos' particular na de Maputo, no contexto do plano de urbanização básica
dos anos 1980.
Fabrice Folio (2005) explica essa operação como uma resposta à necessidade de
gerir de forma racional as cidades moçambicanas, principalmente a de Maputo e da
Beira, num contexto de aumento da criminalidade e da violência. Lachartre (2000:125),
que utiliza frequentemente o termo cidade socialista (aqui emprestado), para falar de
Maputo dos anos 1970 e 1980, vê a Operação Produção como resultado da intolerância
crescente do regime da Frelimo face a uma situação de degradação da situação
urbana, atribuída à indisciplina das populações e da sua tendência ao parasitismo.

1.2.A expulsão dos parrazitas nas cidades


Para ARAUJO (2003, p.165-182) Samora Machel, primeiro Presidente de
Moçambique, tinha a braços uma difícil missão após a independência, em 1975, a
reorganização do novo país. A queda do regime colonial português abalou a estrutura do
Estado, uma vez que, até à data, os portugueses controlavam o aparelho produtivo,
económico e burocrático.

Após a independência, registou-se um forte fluxo de pessoas das zonas rurais para
as grandes cidades, à procura de melhores condições de vida mas sobretudo porque não
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se sentiam seguras nos campos com o início da guerra civil em 1976. Assim, o
desemprego disparou, os já frágeis serviços de educação e saúde entraram em rutura nos
centros urbanos diminuiu a capacidade de produção de alimentos nas zonas rurais. Idem

A ideia modernista da Frelimo imediatamente após a independência e de antes da


viragem liberal, na sua visão de progresso e de desenvolvimento não era
compatível com o 'desemprego', que era considerado resultado da preguiça ou de
falta de vontade. Idem

Assim, os desempregados eram vistos como pessoas que haviam livre e


deliberadamente escolhido não se dedicar a uma actividade produtiva, num país
recentemente independente, que tinha necessidade de dinamizar a sua produção. Estas
pessoas fomentavam uma mentalidade errada de desprezo pelo trabalho manual e
principalmente pelo trabalho agrícola no campo e queriam permanecer nas cidades,
beneficiando do trabalho dos outros. Sem um emprego remunerado, estes eram
potenciais criminosos e prostitutas, e deviam ser integrados num programa de produção.

Segundo MACHEL (1977, p.141). 'O Homem Novo' de Moçambique


recentemente independente devia produzir para a recuperação económica do país. Pelo
seu trabalho ele se tornava um homem útil a sua sociedade e menos susceptível ao
crime e a prostituição. O trabalho e a produção eram as forças motrizes do
desenvolvimento da sociedade. O drama do 'desemprego' (herança colonial) devia ser
eliminado, o que implicava o deslocamento da população no vasto território do país.
Segundo a ideologia modernista da Frelimo, o trabalho é unicamente aquele
considerado moderno e qualificado. Todos os que se dedicavam à vend no sector
informal, geralmente apelidado candonga não eram considerados trabalhadores ou
'produtores' e deviam assim ser conduzidos ao campo para se dedicar a uma actividade
'produtiva'. A este nível há uma proximidade, um paralelismo entre a ideologia da
Frelimo e ideologia colonial. Idem
Assim, longe do discurso político, não são o crime ou a prostituição,
ou ainda a vagabundagem que motivaram a Operação Produção, mas sim a
percepção sobre os 'improdutivos' e de todos os que não podiam provar a
sua condição de produtivos, pela apresentação dum cartão de trabalho
justificando a sua presença na cidade, e de todos os outros que não se
mostravam aptos a viver no meio urbano. Idem
11

NAROROMELE (1983) apresentam a Operação Produção como uma ofensiva


organizacional para além da abolição do desemprego: ela devia também purificar a
cidade dos parasitas que criavam espaço para infiltração do inimigo. Ela era uma
reedição da experiência da luta anticolonial, estreitamente ligada ao processo da
revolução nacional democrática-popular. Inspeccionando até as residências, a Operação
Produção difundia a ideia segundo a qual era necessário proteger e valorizar as
conquistas da Revolução contra a 'sabotagem' dos bandidos armados e os inimigos
dessa Revolução, e contra uma ameaça de infiltração dos bandidos armados até ao
centro urbano. É assim que foram criadas as brigadas de controlo do parque imobiliário
do Estado, constituídas pelo Ministério do Interior, Administração do Parque
Imobiliário do Estado e Organização da Mulher Moçambicana.

As conquistas da Revolução constituem propriedade do Estado sobre os


imóveis, que este pretende rentabilizar. Daí que era necessário expulsar todos aqueles
que não podiam pagar a renda ou que destruiam as casas. Nos finais dos anos 1970 e
sobretudo num contexto de conflicto armado, o modelo de ordem política que a Frelimo
pretendia impôr logo após a independência se ressente duma ameaça. A cidade era vista
como local de possíveis manobras dos inimigos da Revolução. Da mesma forma
que nas 'zonas libertadas' durante a luta anti-colonial, também era necessário
interiorizar nos habitantes das cidades a disciplina partidária e o trabalho
colectivo para fazer dos bairros uma das bases para o desenvolvimento das
'relações sociais socialistas'. Neste momento foi desenvolvido o conceito de bairros
comunais. ( MAVANGA, 1982)
Era necessário prestar uma atenção particular aos jovens, para que
estes pudessem desenvolver actividades produtivas: a cidade sendo um local
central de luta de classes, e os jovens potenciais consumidores de diversas
ideologias, podiam, sem o enquadramento político do partido, ser um perigo
à consolidação das conquistas da independência e um viveiro de tensões
latentes nas cidades. Idem
12

CAPITULO II

2.Os campos de redução e a operação produção


Assim pode-se compreender a escolha dos locais mais distantes de Maputo e
Beira. É também este objectivo não assumido que permite explicar a diferença entre a
Operação Produção e os campos de reeducação. Nestes últimos os condenados, uma vez
terminado o período de reeducação, podiam retornar às suas zonas de origem, se
tivessem sobrevivido. Contrariamente, os afectados pela Operação Produção eram
enviados para se estabelecerem definitivamente em Niassa e Cabo Delgado,
apesar dalguns terem retornado. (FRELIMO, 1977)
O facto desta Operação ter abrangido também os Testemunhas de Jeová e os
curandeiros sugere que a questão central não era somente a produção, pois os
Testemunhas de Jeová e os curandeiros não careciam de meios para habitar nas cidades,
e não eram improdutivos. Mas a sua presença nas cidades podia ser uma ameaça para o
projecto político da Frelimo, mesmo que fossem socialmente úteis à população urbana,
que procurava as suas prestações. A mobilização de vários segmentos do Estado e
sobretudo das instituições de defesa e segurança, a exigência do cartão de trabalho, o
bilhete de identidade e o cartão de residência como condição para não ser enviado
às zonas rurais, num país onde as suas instituições tinham dificuldades para produzir
estes documentos, com um mercado de trabalho em crise, com uma forte taxa de
desemprego, a movimentação de pessoas (algumas das quais trabalhavam) do
extremo sul do país para se instalarem obrigatoriamente no extremo norte, e a total
falta de preparação na recepção destas pessoas para a sua integração nas supostas
actividades productivas, tudo isto torna difícil o estabelecimento do vínculo entre a
Operação Produção e a dinamização da produção e a ruptura com o legado
colonial. A Operação Produção é mais perceptível como uma medida que visava a
protecção das conquistas da revolução e da ideologia do 'Homem Novo'. Idem

2.1.Reenviar para nunca mais regressarem: porquê Niassa e Cabo Delgado?


ARAUJO (2003, p.177) sustenta que a decisão de reenviar os 'parasitas' à Niassa e
Cabo Delgado foi justificada de diversas maneiras. Para a Frelimo, a ideia segundo a
qual Niassa, concretamente o distrito de Unango (a 'cidade do futuro'), tinha um
potencial natural para o desenvolvimento da produção agrícola para todo o país, já
estava presente durante a luta anti-colonial, assim como os portugueses também
sonhavam uma colonização massiva dos altos planaltos de Lichinga, em Niassa.
13

O livro de Mondlane, intitulado Lutar por Moçambique mostra a percepção da


Frelimo sobre o papel de Niassa para o desenvolvimento da agricultura e víveres. Nas
decisões do 2° Congresso (Julho de 1968 durante a luta anti-colonial), que reelege
Mondlane à presidência da Frente, a produção nas zonas libertadas aparece como uma
prioridade para o avanço da luta contra a colonização e para de seguida reiniciar a
economia. Esta percepção é reproduzida no discurso de Samora Machel sobre o
potencial agrícola do país e levou à identificação de 400 000 hectares de terra para a
produção agrícola, no contexto dos esforços para a recuperação económica e da
Operação Produção. Para o partido-Estado a ideia mesmo de incitar a produção, era a
justificação central da implementação da medida, mesmo se os objectivos e as
motivações tenham sido diferentes. Para a então ideologia da Frelimo a produção é
percebida como um instrumento para a transformação da sociedade e do pensamento.
(Mondlane 1975, p.237).

ARAUJO (2003, p.179) O discurso sobre a intenção de redistribuir de forma


equilibrada a população por todo o país também teve o seu papel, dentre as razões que
levaram à escolha de Niassa e Cabo Delgado. Esta foi concebida como uma das
prioridades desde os primeiros anos da independência. Niassa e Cabo Delgado, eram
as zonas menos povoadas e com um potencial agrícola quase não explorado: não
podiam se não ser os locais privilegiados para a Operação Produção.
A redistribuição equilibrada da população no vasto Moçambique, a exploração do
potencial agrícola de Niassa e de Cabo Delgado como solução para a recuperação da
economia, tiveram sem dúvida seu lugar na escolha dos locais de reassentamento, é o
que mostra o discurso que legitima a Operação Produção. Mas a análise doutros
elementos sugere outras razões que participaram nesta escolha. Impedir o retorno
à cidade dos afectados era outro objectivo que pode ser considerado. Esta ideia
era partilhada no seio da elite política da época. Em Niassa e em Cabo Delgado,
os districtos de Pemba, de Montepuez e de Mocímboa da Praia para além de
terem um potencial agrícola e de serem as zonas menos povoadas do país, estavam
suficientemente longe (pelo menos de Maputo e Beira) para dissuadir os afectados
de regressarem. Idem
14

Lichinga, capital de Niassa e Pemba, capital de Cabo Delgado, estão a


2.807 e 2.578 quilómetros de Maputo e a 1.447 e 1.676 quilómetros da
Beira. Os afectados, transportados em avião, chegavam nos aeroportos
destas capitais provinciais antes de serem conduzidos aos seus destinos. Num
contexto de conflito armado, onde os meios de transportes eram poucos acessíveis,
onde havia o risco de ataque permanente, onde as estradas e caminhos-de-ferro,
por onde as viaturas e os comboios deviam passar, estavam destruídas, era
quase que impossível para os afectados regressarem a Maputo ou mesmo a Beira.
ARAUJO (2003, p.180)

Pode-se medir a vontade política que preside a estas expulsões tão distantes
do facto que, mesmo num contexto de crise económica e endividamento
acentuado do Estado, aviões foram requisitados para o transporte de
'improdutivos', enquanto que a província vizinha de Maputo, Gaza, tinha também
um forte potencial agrícola. A maior grande fama estatal o Complexo Agrícola e
Industrial de Limpopo estava aqui. Mas contrariamente àqueles afectados pelos campos
de reeducação, os da Operação Produção não deviam regressar. Eles deviam se
instalar definitivamente em Niassa e Cabo Delgado, numa verdadeira operação
autoritária de colonização interna. Inútel de dizer que as populações não foram nem
consultadas, nem preparadas para a recepção desta massa neo-urbana sulista, que
não podia lhes perceber se não como perfeitos estrangeiros. Idem

2.2.Três, quatro vôos por dia para o Niassa


DONALDO (1983) cita Maria, nome fictício de uma ativista moçambicana, que
pediu anonimato à DW África e que acompanhou de perto a Operação Produção,
recorda a chegada das pessoas à província do Niassa, a partir de junho de 1983: a partir
das quatro horas, os aviões chegavam ao Niassa com essas pessoas. E daqui eram
encaminhadas imediatamente para vários centros. Esses centros não eram na aldeia,
eram mato, completamente mato.

Cada um recebia os seus instrumentos, enxada, catana, foice, quando chegasse lá,
cortava pau, fazia a sua casa para viver, não posso precisar o número, só sei que passou
um tempo e que eram três, quatro vôos por dia. Era muita gente 0:00 Apanhadas de
surpresa nas ruas deixando tudo para trás, muitas pessoas chegavam ao Niassa apenas
com a roupa que levavam no corpo. Idem
15

Foi muito difícil porque faz muito frio aqui, e eles como eram apanhados na rua,
de qualquer maneira, sem agasalhos nem cobertores, viviam assim mesmo, muitos deles
perderam a vida, não só por causa do frio, mas lá no mato, nos centros onde eram
colocados, pelos animais. Uns foram comidos pelos animais e outros doentes morriam
pelo caminho, talvez na tentativa de fugir, recorda a ativista Maria. Idem

2.3.Abandonadas à sua sorte


Em vez de encontrarem centros organizados da Operação Produção, as pessoas
eram praticamente abandonadas no mato denso, terra de ninguém. “Eles eram deixados
lá, nos centros para produzir. Mas muitos saíram da cidade, não conseguiam capinar. E
depois essa retirada compulsiva retirou um bocado moral de fazer alguma coisa e de
viver num sítio sem as mínimas condições para um ser humano. Então, no dia-a-dia, a
preocupação era a de procurar comida para poder sobreviver”, relata Maria.
DONALDO (1983, p.137)

2.4.Governo autoriza regresso mas não dá meios


MATUSSE (1983, p. 176) Após a morte de Samora Machel, em 1986, Joaquim
Chissano sucede na Presidência da República. Em 1988, Chissano autorizou o regresso
para as zonas de origem das pessoas que tinham sido forçadas a ir para o Niassa.

Praticamente deixadas à sua sorte, no Niassa, as pessoas puderam contar apenas


com o apoio da Caritas, organização humanitária ligada à Igreja Católica quando o
governo autorizou, a Caritas foi assistir com mantas, comida. E foi nessa altura que
víamos esqueletos humanos, pedaços dos corpos humanos, quando íamos para o terreno
distribuir, diz a ativista moçambicana Maria. (DONALDO, p. 144)
16

3.Conclusão:
Findo o trabalho concluímos que a migração campo-cidade, de desemprego
acentuado, não somente nas cidades, mas como também no campo, durante um conflito
armado, que mexia com a produção camponesa, a agricultura e todas as outras
actividades económicas as quais esta população se dedicava para sobreviver. Os anos
1980 também foram marcados pelas calamidades naturais (seca e inundações), que
associadas ao conflito e à crise económica já presente, logo após a independência,
pioraram as condições da produção camponesa. Como consequência, uma parte dessa
população vai procurar meios de sobrevivência nas cidades.
A produção, elemento fundamental por detrás da legitimação da Operação
Produção, tinha importância para Samora Machel, entanto que presidente da República
e para a ideologia do partido no seu conjunto. No imediato tratava-se de restabelecer
os níveis de produção dos últimos anos da colonização, de recuperar o défice
económico e de reduzir o índice da pobreza. a produção não era somente necessária
para satisfazer as necessidades biológicas fundamentais, mas também necessária para
a formação política e para o desenvolvimento da consciência de classe. O importante
é o trabalho moderno, modernizador e modelador do 'Homem Novo'. A ideia segundo a
qual 'o trabalho constroi o homem', recorrente no discurso official de Machel se
tornou a palavra de ordem da época.
17

4.Bibliografias:
1. DINERMAN, Alice (2009), 'Regarding totalities and escape hatches in
Mozambican politics and Mozambican studies', in Politique Africaine, 113: 187-
209.
2. ARAUJO, Manuel G. Mendes (2003), 'Os espaços urbanos em Moçambique',
Espaço e Tempo, Saint Paulo- GEOUSP, 14: 165-182.
3. JENKINS, Paul (2009), 'African cities: competing claims on urban land', in
Francesca Locatelli & Paul Nugent, African cities: competing claims on urban
spaces, Boston: Brill.
4. FOLIO, Fabrice (2005), La criminalité à Maputo, Mozambique: origine,
distribution et répercussions spatiales, http://www.cybergeo.eu/index7492.html.
5. MACHEL, Samora, (1997), Le processus de la révolution démocratique
populaire au Mozambique. Paris: L’Harmattan.
6. MONDLANE, Eduardo (1975), Lutar por Moçambique [s.l]: Terceiro Mundo.
p.237
7. NAROROMELE, Albano, 'Operação produção: GDs avaliam utilidade social de
trabalhadores em regime livre', Notícias, 02 de Julho de 1983.
8. MAVANGA, Bernardo, 'Quem tem direito ao cartão de residente',
Noticias, 14 de Agosto de 1982.
9. FRELIMO (1977), Troisième Congrès du Frelimo: rapport du Comité
Central, Paris: L’Harmattan.
10.DONALDO, Naftal, 'Na Operação Produção: cresce capacidades das
estruturas do Bairro', Notícias, 04 de Julho de 1983. P.144
11. MATUSSE, Hilário, 'Uma experiencia para valorizar', Tempo, 21 de Agosto de
1983. P.176

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