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Para concluir esta reflexão inicial pense sobre um questionamento bastante provocativo
feito por Mário Sérgio Cortella: “se você não existisse, que falta faria?3”. Esta pergunta
está na capa do livro intitulado o que a vida me ensinou. Segundo Cortella (2013), todos
nós partiremos deste mundo e só há um jeito de ficar, se fizermos falta.
Ressalta Yunus (2008, p. 37) que “um projeto com objetivos sociais que cobra um preço
ou uma taxa por seus produtos ou serviços, mas que não consegue pagar seus custos
completamente, não se qualifica como empresa social”. Para Yunus (2008, p. 37):
quando um projeto com objetivos sociais supera a força gravitacional da
dependência financeira, está pronto para o voo espacial. Um projeto desse tipo
é autossustentável e desfruta de potencial quase ilimitado de crescimento e
expansão. E, à medida que a empresa social cresce, crescem também os
benefícios que ela oferece à sociedade.
Ao chamar de “projeto com objetivos sociais” acredita-se que o autor se refira ao período
inicial em que o empreendimento social não alcançou o seu ponto de equilíbrio e
depende de apoio financeiro captado na forma de subsídios. A partir do momento que
as receitas geradas satisfazem todos os gastos incorridos na operação do
empreendimento e, por vezes, passa a gerar lucro, Yunus chama de empresa social.
Sendo assim, percebe-se que há a possibilidade de empreender socialmente, num
primeiro momento por meio de um projeto que ofereça benefícios sociais e,
posteriormente, quando atingir a maturidade financeira e gerar receita suficiente para a
sua autossuficiência, o projeto passe a ser uma empresa social.
Afirma Yunus (2008, p. 35) que “[...] precisamos de um novo tipo de empresa que não
tenha como objetivo apenas o lucro – uma empresa que seja totalmente dedicada à
solução de problemas sociais e ambientais”. No quadro 3 são apresentadas as
características que permitem reconhecer o que é uma empresa social.
4 Em 2010 Muhammad Yunus lançou um novo livro onde chama estas empresas de negócios sociais.
Quadro 3 – Características de uma empresa social
• Não maximizam o lucro.
• Não visam ganhos pessoais limitados.
• Buscam metas sociais específicas.
• Não ignoram a natureza multidimensional dos seres humanos.
• Dedicada à resolução de problemas sociais e ambientais.
• Possuem objetivos diferentes das EMLs (Empresa que Maximizam os Lucros).
• Possui uma estrutura organizacional basicamente igual as EMLs.
• Emprega seus funcionários.
• Cria bens e serviços e fornece-os aos clientes a um preço compatível com o seu propósito.
• Cria benefícios sociais para as pessoas cuja a vida ela afeta.
• A empresa pode obter lucro, mas os investidores não retiram o lucro da empresa.
• Os investidores podem fazer retirada de lucro equivalente à recuperação do valor investido,
originalmente.
• A empresa é movida por uma causa.
• Atua como agente de mudanças no mundo.
• Não é uma instituição de caridade.
• Tem de recuperar todas as suas despesas ao mesmo tempo que alcança seus objetivos sociais.
• Deve ser administrada de modo diferente de uma instituição de caridade.
• Não são organizações sem fins lucrativos.
• Não são organizações não-governamentais.
• É administrada segundo os mesmos princípios administrativos das EMLs.
• A empresa deve cobrar um preço ou uma taxa pelos produtos ou serviços que oferece.
• Os produtos ou serviços devem gerar receita e entregar benefícios aos pobres ou a sociedade
como um todo.
• É projetada e dirigida como um empreendimento, com produtos, serviços, clientes, mercados,
despesas e receita.
• O princípio da maximização do lucro é substituído pelo princípio do benefício social.
Fonte: Yunus (2008, p.35-37)
Note que o Sebrae passou a adotar outra nomenclatura para se referir aos
empreendimentos sociais. Muito provavelmente, considerando que a Yunus Negócios
Sociais (YNS) tem uma visão bastante particular do que é um negócio social, ela (YNS)
deve ter feito alguma intervenção junto ao Sebrae com o intuído de preservar a sua visão
particular do que deve ser um negócio social. Sendo assim, Para o Sebrae (2016, grifo
nosso)
um negócio social não pode ser uma organização do terceiro setor,
comumente chamada de ONG, que deseja gerar renda para sua
sustentabilidade sem considerar esta atividade como uma estratégia de
negócio que gere resultados financeiros que possam ser distribuídos a
seus proprietários/acionistas.
6Disponível em:
<https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/Anexos/Direcionamento%20Estrategico%202022.
pdf> - Acessado em: 07/maio/2017
Dando continuidade a apresentação dos conceitos, tem-se a seguir o quadro 4 que
apresenta as características de um negócio social. Tais características foram retiradas
do livro criando um negócio social escrito por Muhammad Yunus e publicado em 2010.
Cabe relembrar que em seu livro um mundo sem pobreza, lançado em 2008, Yunus
denominava os empreendimentos sociais de empresas sociais. E, agora em 2010,
chama de negócios sociais.
Quadro 4 – Características de negócios sociais
• Se baseia no altruísmo das pessoas.
• Dedicado à solução de problemas sociais, econômicos e ambientais.
• Tudo é para o benefício dos outros e nada é para os proprietários, exceto o prazer de servir à
humanidade.
• Objetivo do investidor é dar ajuda a outros sem obter qualquer ganho financeiro pessoal.
• Tem que ser autossustentável (gerar renda para cobrir as despesas; parte do excedente
econômico é investido na expansão e outra parte é mantida como reserva).
• Não envolve perdas e não paga dividendos.
• Dedicada à realização de um objetivo social.
• Tem como objetivo acabar com um problema social.
• Dedica-se a uma causa social.
• A ideia de lucros pessoais está ausente do negócio.
• O proprietário pode recuperar, depois de certo tempo, apenas o montante investido.
• Tem como propósito mudar o mundo.
• Deve produzir mudanças significativas na vida das pessoas.
• A decisão de investimento não se baseia no lucro potencial.
• A decisão de investir se baseia na causa social.
• Dá a todas as pessoas a oportunidade de participar da criação do tipo de mundo que todos
queremos ser.
• Seu objetivo é resolver um problema social.
• Utiliza métodos de negócios, inclusive a criação e venda de produtos e serviços.
• Tem receitas e despesas equilibradas, sem perdas e sem dividendos.
• Os proprietários são investidores que reinvestem os lucros na expansão e melhoria do negócio.
• Tem fins lucrativos.
• Conta com investidores e proprietários.
• A noção de vantagem financeira pessoal não tem lugar no mundo do negócio social.
• Trata seus beneficiários com dignidade pessoal e lhes confere mais autonomia.
• Possuir uma atividade socialmente benéfica.
• Dedicado a mudar a situação econômica e social dos pobres.
• Dedicada a criar alguma melhoria social no mundo.
• Dedica 100% de seus recursos para tornar o mundo um lugar melhor.
• Destina-se, exclusivamente, a fornecer benefícios sociais.
• De forma alguma gera lucros para nenhum investidor.
• Sua atenção concentra-se, exclusivamente, na causa social à qual se dedica.
• Exclui a busca do lucro ou o pagamento de dividendos aos proprietários.
Fonte: Yunus (2010, p. 1-31)
Faz, neste momento, uma pausa para uma breve reflexão sobre a complexidade e por
vezes a confusão que existe ao se buscar quais expressões existem no âmbito dos
empreendimentos sociais, os respectivos significados e quem utiliza qual forma de se
expressar. Conforme já apresentado, o Sebrae, entre 2013 e 2016, passou a adotar outra
terminologia, deixando de se usar o termo Negócios Sociais e adotando o termo
Negócios Sociais Inclusivos. Com a Artemisia, parece que não foi diferente.
Atualmente, no site da Artemisia, ao apresentar a nova Artemisia, há a seguinte
afirmação: “a nova plataforma foi desenvolvida para inspirar talentos, educar líderes,
gestores e empreendedores, engajar empresas e acelerar startups, sempre com o foco
de mobilizar pessoas e organizações para trabalharem na geração de negócios de
impacto social (Artemisia, 2013, grifo nosso). E inclusive na sua missão “Inspirar,
capacitar e potencializar talentos e empreendedores para a geração de negócios de
impacto social” (Artemisia, 2013 – grifo nosso) a entidade novamente usa a
nomenclatura negócios de impacto social.
Nas palavras de Naigeborin em 2010, segundo a Artemisia ([20??] apud Naigeborin,
2010, p. 2) os negócios sociais são “iniciativas economicamente rentáveis que através
da sua atividade principal brindam soluções para problemas sociais e/ou ambientais,
utilizando mecanismos de mercado”. Para a Artemisia (2013) os negócios de impacto
social “são empresas que oferecem, de forma intencional, soluções escaláveis para
problemas sociais da população de baixa renda”. É nítido que a Artemisia, a partir de
8 http://artemisia.org.br/conteudo/negocios/nosso-conceito.aspx
9 http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/presscenter/articles/2017/01/30/aberta-inscri-es-para-a-
chamada-de-casos-iniciativa-incluir-2017/
menciona Negócios Inclusivos e/ou Sociais. No documento elaborado por Viviane
Naigeborin ela credita ao PNUD a expressão Negócios Inclusivos. Sendo possível
interpretar como uma definição o que consta na seção 2.2 Público-Alvo, ao definir quais
entidades são elegíveis ao edital, para o PNUD (2017, p. 3) os Negócios Inclusivos são
modelos de negócios: “comprometidos com o desenvolvimento de soluções capazes de
gerar impacto social positivo para a sociedade e também de oferecer oportunidades de
inclusão socioeconômica para cidadãs e cidadãos de menor renda”. Sendo diferente do
que traz Naigeborin (2010, p. 3) “negócios que envolvem os pobres no processo de
desenvolvimento econômico no âmbito da demanda, como clientes e consumidores e,
no âmbito da oferta, como empregados, produtores e donos de negócio em vários pontos
da cadeia de valor” creditado ao PNUD. Isto tudo só demonstra que surgem novos
termos e, consequentemente, novas definições a medida que novos atores passam a se
envolver com o empreendedorismo social.
A profusão de nomenclaturas e definições ajuda e, ao mesmo tempo, atrapalha. Ajuda
ao demonstrar que há diferentes formas de empreendimentos envolvidos nas causas
sociais e que o empreendedorismo social é multifacetado. Atrapalha, quando o que se
quer é algo mais objetivo e se faz uma leitura superficial buscando uma simplificação da
causa social. Isto, com certeza não se obtém ao se aprofundar no estudo do
empreendedorismo social.
O quadro 5 traz outras nomenclaturas e definições encontradas. Estas nomenclaturas
estão devidamente associadas às definições e às entidades que as adotam.
Quadro 5 – Outras nomenclaturas e definições
Nomenclatura Definição Autor
São modelos de negócios “comprometidos com o
desenvolvimento de soluções capazes de gerar impacto
Negócios Inclusivos
social positivo para a sociedade e também de oferecer PNUD (2017, p. 3)
(e sociais)
oportunidades de inclusão socioeconômica para cidadãs
e cidadãos de menor renda”.
São “iniciativas financeiramente sustentáveis, geridas por
pequenos negócios, com viés econômico e caráter social
Negócios de e/ou ambiental, que contribuam para transformar a
Sebrae (2016)
Impacto Social realidade de populações menos favorecidas e fomentem
o desenvolvimento da economia nacional”.
Segundo Stamp ([20--] Apud Dornelas, Timmons e Spinelli (2010, p. 161 “todas as
empresas precisam de investimentos; todas as empresas exigem retorno. A questão
social é quem paga e qual é o horizonte de retorno. A decisão é uma decisão de valor
social”. Portanto,
o resultado do empreendedorismo social não é diferente, mas ajuda a esclarecer
o conceito de valor. Especificamente, o valor social deriva de atividades
empreendedoras que buscam resolver problemas relacionados a pessoas e
problemas relacionados ao planeta – independentemente de orientação para o
lucro. Em outras palavras, o empreendedorismo social busca soluções criativas
e valiosas para questões como educação, pobreza, saúde, aquecimento global,
escassez global de água e energia. (DORNELAS; TIMMONS e SPINELLI, 2010,
p. 161)
Fonte: Neck; Brush e Alien (2008 Apud Dornelas; Timmons e Spinelli, 2010, p. 161)
Explicam Dornelas; Timmons e Spinelli (2010) que a área acinzentada da Figura 9.2
representa o território dos empreendimentos sociais. Afirmando que “a principal
diferença entre o empreendedorismo tradicional e o empreendedorismo social é a
missão pretendida. Os empreendedores sociais desenvolvem empreendimentos com a
missão de resolver um problema social premente” (DORNELAS; TIMMONS e SPINELLI,
2010, p. 161).
Na visão de Dornelas; Timmons e Spinelli (2010, p. 162)
para agravar a confusão sobre o empreendedorismo social existe uma ideia
preconcebida de que todo o empreendedorismo em curso nos setores sociais é
reservado às organizações sem fins lucrativos. [...]. Além disso, nem todas as
organizações sem fins lucrativos são empreendedoras. É por isso que o termo
“organizações sem fins lucrativos empreendedoras” é utilizado [...].
Para Dornelas; Timmons e Spinelli (2010, p. 161) as organizações sem fins lucrativos
empreendedoras podem ser divididas em 2 tipos:
• o primeiro tipo utiliza atividades de receita recebida, uma forma de capital de
risco, para gerar a totalidade ou parte da receita total. Em muitos aspectos,
as organizações sem fins lucrativos empreendedoras aplicam princípios do
empreendedorismo para gerar receita para sustentar suas organizações
voltadas para uma missão; e
• o segundo tipo tem foco no crescimento e na sustentabilidade econômica.
Essa organização sem fins lucrativos empreendedora pode incorporar o
investimento externo, sob a forma de filantropia de risco, para escalonar de
forma significativa a organização para gerar um impacto maior em direção à
mudança social sistêmica.
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