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O brincar tradicional é uma atividade não adultocêntrica, que pode envolver uma ou mais
pessoas, e pode ser definida de diversas formas. Durante este trabalho, o termo brincar tradicional está
associado ao conjunto de características definido pelo pesquisador Peter Gray:
“1. Ele é auto-escolhido e auto-dirigido: Uma atividade da criança e coordenada pela criança.
2. Intrinsecamente mobilizado: Brinca-se porque quer.
3. Guiado por regras: Através das brincadeiras, as crianças aprendem a seguir regras.
4. Permeando a imaginação: Mesmo com atividades físicas (como em esportes), sempre há
um grau de imaginação e fantasia envolvido na brincadeira.” (GRAY, Peter. 2013)
É importante notar que outras definidas como brincar do senso comum, como por exemplo,
jogos eletrônicos cooperativos, podem ser consideradas como tipos de brincadeira, mas são diferentes
do brincar tradicional mencionado acima, já que as regras são estritas e normalmente imutáveis, ou
seja, o conjunto de regras a ser seguido é definido por adultos. Por consequência, a interação com os
jogos acaba dependendo muitas vezes do quão eficiente os jogadores são no jogo, o que pode causar
frustração caso as regras não sejam seguidas e limitar as interações e a criatividade.
Muitas vezes, ao contemplar o ato de brincar não se leva em conta a produção cognitiva e
social que é gerada pelo ato, e ao invés disso, brincar é muitas vezes constatado pelos adultos como
perda de tempo ou apenas lazer sem utilidade alguma (muitas vezes adultos esses que são
responsáveis de alguma forma pela administração do tempo da criança, seja na escola ou em casa).
Porém, a brincadeira leva à criação de conexões sociais, psicológicas e até mesmo à exploração do
“eu”, da própria subjetividade através de suas ações. Ademais, é possível explorar e às vezes até
mesmo solucionar preocupações e vontades reais em formato de brincadeira. Como dizia Bruno
Bettelheim (1984, p. 105):
"Nenhuma criança brinca só para passar o tempo, sua escolha é motivada por
processos íntimos, desejos, problemas, ansiedades. O que está acontecendo com a
mente da criança determina suas atividades lúdicas; brincar é sua linguagem secreta,
que devemos respeitar [...]"
O psicólogo Lev Vigotski fala amplamente sobre como o brincar é importante para definir a
personalidade da criança, tanto quando está sozinha quanto quando no coletivo, interagindo com
outras pessoas. Isso se dá pois a forma como com pouca ou nenhuma consequência pode-se testar o
que a faz feliz, triste, irritada e como lidar com esses sentimentos, além de observar o que os causa, é
quase exclusiva ao ato de brincar, já que é a forma didática de mais fácil acesso de realizar essa
exploração de si enquanto interagindo com o outro e o mundo ao seu redor. Vale lembrar também que
isso vale não apenas para crianças, como também para adolescentes e até mesmo adultos, que
normalmente valorizam prioridades e brincadeiras diferentes em cada fase da vida, mas ainda podem
receber os benefícios psicológicos do brincar.
Donald Woods Winnicott, autor, pediatra e psicanalista, lembra a importância do brincar livre
de regras e espontâneo para o desenvolvimento da criatividade da criança em especial, já que esta cria
problemas e soluções, além de não estar restringida a regras criadas por adultos. Isso faz com que a
criança tenha a sensação de poder de decisão e liberdade que é especialmente rara na infância. Essa
liberdade de decisão e ação torna mais fácil exercer a criatividade em seu potencial máximo.
Referências Bibliográficas:
(GRAY, Peter. - Definitions of Play. Boston College, Boston, Estados Unidos, 2013)
(BETTELHEIM, Bruno - Uma vida para seu filho. Rio de Janeiro: Campus, 1988.)
(VYGOTSKY, L. S. - Play and its role in the mental development of the
child. International Research in Early Childhood Education Vol. 7, No. 2, 2016)
(DATA and Statistics on Children’s Mental Health, Centers for Disease Control and Prevention,
2023. Disponível em: <https://www.cdc.gov/childrensmentalhealth/data.html>. Acesso em 05 e dez.
de 2023)
(Winnicott, D. W. - O Brincar e a Realidade. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1975)