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O Brincar e o Desenvolvimento Infantil

1 - A importância do brincar
Muitas vezes os cuidadores preocupam-se em garantir alimentação e higiene para as crianças e
consideram a brincadeira como algo dispensável. Especialistas, no entanto, vêm descobrindo que o brincar
é fundamental para o desenvolvimento.
A brincadeira (que nesta unidade também vamos chamar de atividade lúdica) pode (e deve) ser
estimulada pelos pais e/ou cuidadores como uma forma essencial de estímulo para o desenvolvimento.
Aqui você vai aprender mais sobre a importância e as funções do brincar para o desenvolvimento
infantil. Ao final você vai saber mais sobre o direito de brincar, garantido a todas as crianças em vários
contextos legais. O objetivo é que você possa ressaltar aos cuidadores
o quanto essa atividade é necessária para que no futuro a criança se
torne uma pessoa autônoma, feliz e criativa. Vamos lá?

1.1 - O que é uma brincadeira?


Para começar, o que você acha que define uma brincadeira? Quais são suas características básicas?
Pense nas diferentes brincadeiras que crianças pequenas fazem, sozinhas ou acompanhadas.
Depois de você ter refletido, verifique se pensou nas características a seguir:
1) Comportamento autônomo
Um dos principais pontos é que a brincadeira é algo que a criança faz por fazer, sem ter um outro
objetivo por trás. A brincadeira traz satisfação apenas por brincar. E justamente por isso ela é um
comportamento autônomo da criança. Ela brinca por vontade própria, por prazer. Poder fazer isso dá
para a criança um sentimento de capacidade, autonomia e felicidade. Essas são as raízes dos sentimentos
de autoestima e autoconfiança, tão importantes para o desenvolvimento emocional no futuro.

2) Flexibilidade e criatividade
A brincadeira geralmente não tem uma conduta certa ou errada. Ela é flexível e estimula a criatividade.
A criança inventa algo que pode acontecer de formas diferentes, o que é um desafio.

3) Movimento
Nas brincadeiras de crianças de 0 a 3 anos, o brincar é geralmente acompanhado de movimento. Seja
explorando objetos ou o corpo, ou interagindo com outras pessoas, a criança dessa faixa etária se
movimenta bastante para se expressar e brincar. E isso é o esperado no desenvolvimento saudável!

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4) Possibilidade de compreender o mundo
As brincadeiras são muitas vezes uma maneira de a criança manipular objetos, mover o corpo ou brincar
com outros como forma de tentar entender como as coisas funcionam. Uma brincadeira típica acontece
quando o bebê joga objetos no chão buscando ver o que acontece depois: O brinquedo volta para sua
mão sozinho? Precisa ser recolhido por alguém? Faz barulho? Desaparece?

1.2 - Qual a função da brincadeira?


Por que será que a criança precisa brincar? Você já pensou que a brincadeira pode ter várias
utilidades? Vamos ver algumas a seguir.
Olhando as crianças brincarem, percebemos como essa atividade parece natural para os pequenos,
certo? É verdade, isso acontece porque a brincadeira pode ser considerada como um comportamento
instintivo das crianças. Estudos perceberam que ao longo de muitos anos e em diferentes idades, culturas e
condições de saúde, o brincar está sempre presente de forma espontânea, ou seja, a sua presença faz parte
da evolução da espécie humana, sendo considerado como um comportamento positivo para o nosso
desenvolvimento. Vamos conhecer agora um pouco mais sobre algumas áreas que podem ser estimuladas
com a brincadeira?

1.2.1. Contexto cultural e aprendizado


Os pesquisadores perceberam que as brincadeiras apresentam padrões comuns nas diferentes
comunidades e culturas onde o brincar é foco de estudo. Por meio das brincadeiras, as crianças reproduzem
e recriam aquilo que observam no seu dia a dia, incluindo os comportamentos dos adultos. Ou seja, podemos
considerar a brincadeira como um aspecto cultural do universo infantil.
Também é possível observar uma evolução nas atividades lúdicas que tende a se repetir de forma
relativamente parecida. Isso nos permite fazer estimativas sobre quais são os diferentes tipos de brincadeiras
esperados de acordo com cada faixa de idade.

1.2.2. Desenvolvimento motor


Não podemos pensar em desenvolvimento motor sem pensar em crescimento e estímulo ao
desenvolvimento físico. A criança desenvolve primeiro a capacidade de controlar movimentos da parte dos
seus membros que fica mais próxima ao tronco (superior). Ou seja, começa a ter mais capacidade de
movimentar a parte de cima dos braços e pernas (acima do cotovelo e do joelho). Aos poucos, a parte de
baixo desses membros (abaixo do cotovelo e joelho) se desenvolve mais e, por fim, os pés, mãos e dedos.
A brincadeira acompanha esse processo. Inicialmente, as crianças fazem brincadeiras que exigem
mais da parte de motricidade ampla, e seus movimentos são mais descoordenados e desajeitados.

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Movimentar-se até os brinquedos, segurar os objetos e brincar com os adultos usando o toque pode ajudar
a criança a coordenar os seus movimentos aos poucos, aumentando a agilidade e o equilíbrio.

ATENÇÃO
É necessário respeitar o tempo que cada criança leva para adquirir as habilidades físicas necessárias para
responder ao que estamos estimulando.

Aos poucos, a brincadeira pode ajudar a criança a aumentar os tipos de movimentos coordenados
que consegue fazer. Ela pode começar a andar, e, em seguida, correr, estimulando a motricidade ampla.
Segurar o giz de cera para riscar folhas a ajuda a firmar os dedos para segurar o objeto, promovendo a
motricidade fina, por exemplo. Ao perceber essas atividades lúdicas como divertidas, a criança passa a
repetir e, assim, melhorar suas capacidades físicas conforme se experimenta nelas.
A capacidade da criança de conseguir fazer os seus movimentos corporais alcançarem aquilo que
ela olha e deseja é uma das habilidades que ela precisa adquirir. E a brincadeira tem papel fundamental
nisso. Quando se sente curiosa e atraída por algo de seu interesse, a criança tende a explorar mais. Isso
permite que ela possa tentar segurar novos objetos, alcançar novos lugares e aumentar as formas como
consegue mexer nas coisas.

1.2.3. Desenvolvimento cognitivo


Conforme discutido anteriormente no curso, a cognição envolve funções que são necessárias para o
aprendizado. Algumas dessas competências são prestar atenção (focar no que é importante para
determinada situação sem ser distraído por estímulos menos importantes) e resolver problemas (ter
flexibilidade para ajustar suas ações e seus pensamentos de acordo com as situações que se apresentam).
Além disso, a regulação emocional (veremos mais sobre isso a seguir) também auxilia nos processos
cognitivos, pois o controle dos pensamentos e das ações ajuda a criança a se adaptar às diversas situações
que vive. Mas qual o papel do brincar no desenvolvimento dessas habilidades?
Quando a criança brinca explorando objetos, ela aprende sobre as propriedades físicas deles. Ao
fazer isso, ela compreende mais sobre aspectos sensoriais, ou seja, tato, visão, paladar, etc. Entendendo e
conhecendo mais as características físicas, aos poucos a criança pode passar a compreender essas
qualidades de forma mais complexa. Por exemplo: o que é maior, qual é essa cor, o que cabe ou não cabe
em um espaço? Essas noções serão importantes no futuro para o seu aprendizado. Seu estímulo começa nas
primeiras explorações sensoriais, que são a base para uma brincadeira espontânea e criativa, permitindo
que a criança possa brincar e criar histórias em cima dessas propriedades físicas dos brinquedos.
A brincadeira livre, ou seja, aquela que a criança faz do seu jeito, é ótima para o desenvolvimento
das habilidades cognitivas. A atividade lúdica permite que a criança vivencie uma variedade de situações
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diversas e tenha a oportunidade de experimentar-se como personagem principal. É na brincadeira que a
criança vai reproduzir aquilo que vivencia em seu ambiente (ao observar os adultos). Além disso, o brincar
também permite que ela possa usar sua criatividade para recriar de forma espontânea essas percepções do
seu ambiente. Ou seja, nem sempre o que a criança representa na brincadeira aconteceu de verdade. Ela
pode imaginar outras formas de resolver situações que assistiu ou participou. As brincadeiras oferecem
inúmeras possibilidades, de forma segura, de a criança aprender sobre suas preferências e testar seus limites.
Usar a imaginação estimula também o desenvolvimento cerebral. Como você já viu anteriormente,
o desenvolvimento cognitivo está associado com o desenvolvimento do cérebro. Quanto mais experiências
a criança tiver nesse contexto seguro que é o lúdico, maiores as possibilidades de amadurecimento de
funções necessárias para aquisições importantes e para os aprendizados. Assim, compreendemos que a
brincadeira é a base para estimular habilidades como atenção, memória, linguagem e raciocínio.

1.2.4. Desenvolvimento cerebral


A estimulação de funções como motricidade, cognição, linguagem, emoção e habilidades sociais
acontece por meio do contato da criança com o seu meio social. A brincadeira impulsiona esse processo e
permite que a criança possa reter as informações que recebe no dia a dia e transformá-las em conhecimentos,
podendo usá-los no seu dia a dia (como solução de problemas, criatividade e sociabilidade). Isso acontece
no longo prazo, já que a aquisição dessas capacidades acontece aos poucos. Ou seja, vamos perceber os
efeitos do brincar no desenvolvimento infantil apenas com o passar do tempo. Por isso, é importante garantir
que toda criança tenha possibilidade e seja incentivada a brincar.
A brincadeira livre na primeira infância é muito mais importante do que fazer atividades puramente
pedagógicas, como aprender a pintar dentro das margens ou decorar as letras. Só depois de ter adquirido
habilidades mais gerais, como falar, representar papéis (faz de conta), apresentar controle motor e
estabelecer relações sociais, será possível iniciar atividades de aprendizado formal. Isso quer dizer que, na
educação infantil ou no ambiente familiar, o foco deve ser nas atividades lúdicas, especialmente as
coordenadas pelas crianças. Isso será bem mais benéfico nesse momento do que ensinar a criança a
permanecer sentada, andar em fila ou ficar quieta.
Um estudo mostrou que crianças têm mais chance de ter sucesso na escola (a partir dos 6 anos)
quando elas têm maior acesso a atividades de brincar livre no período pré-escolar (de 0 a 6 anos). As
crianças que foram estimuladas em habilidades “formais”, como recitar o alfabeto, fazer tarefas de
memorização e atividades de preparação para provas têm chances menores de sucesso.

SAIBA MAIS sobre a brincadeira e o desenvolvimento cerebral:

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Estudos experimentais com modelos animais identificaram que o
brincar promove a liberação de fatores de crescimento no cérebro.
Isso ocorre principalmente nas regiões da amígdala e frontais
dorsolaterais (responsáveis pelas emoções e pelo controle do
comportamento) e em outras regiões que auxiliam no combate à
ansiedade e à depressão.
O sistema dopaminérgico (onde atua a dopamina, um neurotransmissor
importantíssimo ligado ao prazer) também está envolvido no
comportamento de brincar, o que explica a disposição das crianças para
continuarem brincando por vontade própria.
Os estudos relatados aqui são:
GORDON, Nakia. BURKE, Sharon. AKIL, Huda. WATSON, Stanley. PANKSEPP, Jaak.
Fonte:
Socially- induced brain ‘fertilization’: play promotes brain derived neurotrophic factor
https://pixabay.com/vectors/brain-
human-anatomy-medicine-150952/ transcription in the amygdala and dorsolateral frontal cortex in juvenile rats. Neuroscience Letters,
8- A imagem mostra um encéfalo v. 341, n. 1, p. 17-20, 2003. Disponível em: DOI:10.1016/S0304-3940(03)00158-7. Acesso em:
com as áreas frontal dorsolateral e 31 mar. 2020.
amígdala em destaque.
BURGDORF, Jeffrey. KROES, Roger A. BEINFELD, Margery C. PANKSEPP, Jaak. MOSKAL,
JR. Uncovering the molecular basis of positive affect using rough-and-tumble play in rats: a role
for insulin-like growth factor I. Neuroscience, v. 168, n. 3, p. 769-777, fev. 2010. Disponível em: DOI: 10.1016/j.neuroscience.2010.03.045.
Acesso em: 03 abr. 2020.

1.2.5. Desenvolvimento socioafetivo


Logo no início da vida, as brincadeiras são consideradas sociais. Os adultos desempenham um papel
lúdico importante, já que as interações ocorrem especialmente com a mediação deles. As iniciativas das
crianças podem ser consideradas como brincadeiras, mesmo que ainda sejam muito pequenas. Por
exemplo, quando um bebê sorri, o adulto pode sorrir de volta e dar a esse comportamento um sentido lúdico.
Logo, os bebês passam a imitar ações dos adultos, e esse é considerado um comportamento social. Assim,
muitas das competências que necessitamos ao longo da vida não se apresentam prontas no momento do
nascimento, mas precisam ser estimuladas.
Muitas das coisas que aprendemos, nós apenas sabemos porque observamos o que as pessoas
semelhantes a nós fazem. As crianças percebem os outros seres humanos como alguém semelhante a elas.
Por se identificarem com essas pessoas, reproduzem alguns comportamentos delas. Desta forma, a imitação
e os comportamentos espontâneos que a criança faz durante a brincadeira contribuem para que seja
desenvolvido e aprimorado o seu papel social, enquanto parte do seu grupo. As crianças aprendem imitando
os adultos e encenando como fariam suas atividades, e isso é algo muito educativo!
É necessário enfatizar que o brincar é uma forma de expressão da criança. Por meio de sua
criatividade ela expressa seus desejos e necessidades. A brincadeira funciona como uma forma de
comunicação da criança com o mundo e com os adultos, auxiliando na sua expressão, que muitas vezes não

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ocorre de forma verbal no universo infantil. Por ainda não terem adquirido a habilidade de fala, ou de
reconhecimento de seus sentimentos, muitas vezes a comunicação por meio da brincadeira pode ajudar a
criança a lidar com suas sensações e percepções.

SAIBA MAIS sobre o prazer de brincar:


Você sabia que durante a brincadeira a criança tem uma sensação de bem-estar e de relaxamento?
A sensação prazerosa associada aos momentos lúdicos tem um efeito positivo no desenvolvimento. Além
de proporcionar benefícios, a brincadeira pode ajudar a reduzir comportamentos como agitação, tristeza,
ansiedade, problemas de sono, irritabilidade e apatia.
Além disso, muitas vezes a brincadeira é utilizada como método para auxiliar no tratamento de
dificuldades ou transtornos. Elas podem ser planejadas a partir das necessidades da criança em alguma área
específica em que ela apresente dificuldades (na linguagem, por exemplo). De qualquer forma, a brincadeira
geralmente tem efeitos sobre mais de uma dimensão do desenvolvimento, ainda que se coloque o foco em
uma área específica.
Na brincadeira com a criança, os adultos podem partir dos interesses dela para o fortalecimento de
uma relação. Os brinquedos podem servir como ponto de partida para as interações, conversas e
divertimento. Esse ponto será detalhado mais adiante. Já nas brincadeiras entre crianças, podem ser
compartilhadas descobertas próprias da idade. Ao dividirem um espaço lúdico ou brinquedos, as crianças
aprendem sobre relações onde estão em igualdade. Ou seja, podem aprender sobre cooperar umas com as
outras, e sobre definir e negociar regras próprias.
Por fim, ressalta-se que essas habilidades sociais desenvolvidas e estimuladas por meio da
brincadeira têm papel fundamental na aprendizagem. Por meio de um ambiente social facilitador (onde é
fornecido o suporte necessário dos adultos), a criança constrói confiança e autonomia para enfrentar novas
situações, o que é essencial nos processos de aprendizagem. Assim, o papel social da brincadeira reflete
também nos processos cognitivos.

1.2.6. Desenvolvimento da Linguagem


Quando falamos sobre o desenvolvimento socioafetivo vimos que a brincadeira é a forma de
expressão da criança. Por ser o jeito que ela utiliza para se comunicar, o brincar estimula e desenvolve
também a linguagem. A criança começa aprendendo a demonstrar seus desejos e aprendizados pela
brincadeira, e é por essa forma que podemos também nos comunicar com ela.
A brincadeira evolui, e a forma como a criança se comunica por ela também demonstra avanços. A
brincadeira de “faz de conta” é uma maneira de a criança representar objetos, propriedades, características
e histórias nas suas brincadeiras usando a imaginação, sem que esses elementos estejam presentes. Assim,
aos poucos a criança começa a compreender que as palavras são também representações, ou seja, cumprem

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um papel de comunicar sobre objetos, eventos, etc., sem necessariamente estarem presentes quando a
criança se refere a eles. Em resumo, a brincadeira é a principal atividade que estimula a fala.
Falamos também anteriormente que durante as brincadeiras as crianças imitam os adultos, e isso faz
com que se sintam parte do seu grupo. Essa imitação tem um papel importante no desenvolvimento da
linguagem. A comunicação vai muito além de uma língua falada em certo local, ela envolve também outros
fatores, como gestos, olhares, postura corporal, entre outras formas de linguagem não verbal. Todas essas
características fazem parte de um conjunto de normas culturais que expressam como se dá a comunicação
em determinado local. Essas normas variam de acordo com características específicas de cada comunidade.
A criança aprende tudo isso imitando e utilizando esses aprendizados na sua brincadeira.
O contato com outras crianças também estimula a comunicação e a linguagem. As brincadeiras em
grupos possibilitam que a criança tenha a necessidade de dizer (verbalmente ou não) quais são as suas
vontades naquela interação. Além disso, podem se apresentar situações em que é necessário compreender
as regras de um jogo ou negociar as normas de uma brincadeira com outras crianças, o que é feito por meio
de uma comunicação dessas combinações.

1.3 - E agora vamos falar um pouco sobre o direito de brincar!


A seguir vamos apresentar algumas leis que tratam sobre o assunto, para que você perceba como o
brincar é importante.

1.3.1. Leis Brasileiras


O Marco legal da primeira infância (Lei 13.257), de 2016, estabelece diretrizes sobre as políticas
públicas para crianças, com foco especial nos seis primeiros anos de vida. Essa lei define a necessidade de
garantir os recursos básicos para um adequado desenvolvimento infantil. Essa Lei reforça que a criança é
um sujeito de direitos e deve ter suas necessidades específicas respeitadas, conforme já enfatizado pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069), de 1990. O Marco legal da primeira infância enfatiza,
ainda, a importância de garantir um acompanhamento do crescimento e desenvolvimento da criança, a fim
de fiscalizar se tais direitos estão sendo atendidos. Outro aspecto relevante acerca dessas leis é o respeito à
individualidade de cada criança. Suas características e necessidades pessoais devem ser observadas, bem
como compreendidas dentro de seu contexto sociocultural.

1.3.2. Quando se fala em direitos da criança, o que você pensa? Quais são esses direitos?
Além do que já tratamos até aqui, outros direitos que devem ser assegurados envolvem aspectos não
só do desenvolvimento físico, mas do desenvolvimento emocional e intelectual. A brincadeira tem um papel
importante na garantia desses direitos, conforme vimos anteriormente. Além dos direitos básicos de acesso

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(como educação, alimentação e assistência médica, por exemplo), no caso das crianças, compreende-se o
brincar também como um direito, em função do seu potencial facilitador para o desenvolvimento.
Além das leis que falamos anteriormente, a garantia da brincadeira como direito fundamental das
crianças também foi destacada pela Convenção sobre os direitos da Criança, um tratado da Organização
das Nações Unidas, visando garantir a proteção das crianças e adolescentes em todo o mundo.

Segundo o artigo 31:


“Parágrafo 1 - Os Estados Partes reconhecem o direito da criança ao descanso e ao lazer, ao
divertimento e às atividades recreativas próprias da idade, bem como à livre participação na vida
cultural e artística.
Parágrafo 2 - Os Estados Partes devem respeitar e promover o direito da criança de participar
plenamente da vida cultural e artística e devem estimular a oferta de oportunidades adequadas de
atividades culturais, artísticas, recreativas e de lazer, em condições de igualdade.”
Assim, nota-se que as políticas públicas voltadas para as crianças consideram a brincadeira como
uma atividade própria dessa população e como um direito essencial, que deve ser assegurado pela família,
pela sociedade e pelo Estado. Porém, sabemos que muitas vezes os direitos fundamentais das crianças não
são atendidos. Com isso, tornam-se necessárias ações a fim de buscar que todas as crianças tenham
oportunidade de brincar. A brincadeira deve ser reconhecida como uma atividade importante.
Compreendendo o brincar como um direito e uma ferramenta essencial para o desenvolvimento
infantil, foi criada em 1961 a International Play Association, uma associação internacional que busca
proteger e promover o direito da criança de brincar. No Brasil, as ações da IPA iniciaram em 1997 como
uma instituição sem fins lucrativos. O seu objetivo é a garantia do cumprimento do artigo 31 da Convenção
sobre os direitos da Criança da ONU.

1.4 - E como se pode orientar os cuidadores a incentivar a brincadeira?


Conforme foi explicado anteriormente, as brincadeiras livres tendem a ser mais positivas para a
criança. Esse ponto deve estar presente quando pensamos no papel que os adultos têm quando brincam com
a criança. Eles precisam pensar que estão entrando no universo infantil. Portanto, o papel principal nessa
atividade é da criança. Ela é a “líder” daquele mundo imaginário, e os adultos funcionam como seus
apoiadores. Assim, quem define os interesses é a criança. Os adultos, sempre que possível, seguem as
orientações do líder. Dessa forma, o adulto mostra-se sensível aos interesses da criança.
É esperado que os cuidadores possam sugerir coisas legais e interessantes, ou que possam ajudar a
criança quando ela apresenta dificuldades, mas a liberdade e autonomia deve ser incentivada. Ou seja,
devemos confiar no líder, seguir o caminho que ele nos mostra, incentivando a competência do líder em
atingir seus objetivos. Quando aparecerem desafios, os cuidadores podem oferecer ajuda. Em função disso,

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os pais ou cuidadores muitas vezes precisam conter a vontade de ensinar e dizer o que seria o “certo” na
brincadeira. Em termos práticos, sugere-se que o adulto não faça tudo pela criança, e sim incentive a criança
a tentar e experimentar, especialmente em atividades não estruturadas. Alguns estudos tratam sobre a
manipulação dos brinquedos. Dedicando tempo para brincar com as crianças, os cuidadores podem estar
atentos às formas como os pequenos pensam, interagem e se comunicam. Isso varia de acordo com cada
criança e, ao conhecer as características únicas de cada uma delas, o vínculo pode ficar fortalecido. Essa
conexão pode ajudar na comunicação com as crianças em outros momentos, como ao ensinar uma tarefa
ou ao solicitar o cumprimento de alguma regra. Isso pode ajudar a diminuir o estresse dos pais, já que sua
relação com a criança será mais tranquila.
Assim, além de todos os benefícios para as crianças, a brincadeira também pode trazer benefícios
para os cuidadores. Outra forma de perceber esses benefícios está ligada à oportunidade de os cuidadores
relembrarem brincadeiras, livros e momentos de sua própria infância, o que pode gerar sentimentos
positivos. Uma forma de incentivar que os cuidadores brinquem com as crianças é mostrar exemplos de
como diversas situações do dia a dia podem ser lúdicas. Por exemplo, durante uma visita domiciliar pode
ser feita a leitura de um livro, interagindo com a criança com base no material. Ou cantar enquanto conversa
com a criança.
Os pais ou cuidadores podem convidar as crianças para participar das atividades domésticas,
incluindo uma brincadeira naquele momento. Por exemplo, se o cuidador está cozinhando, pode ser
sugerido para a criança que ela cozinhe para seus bonecos, usando seus brinquedos. Isso demonstra que,
ainda que o tempo específico para brincadeira possa ser limitado por diversos fatores, pequenas brincadeiras
podem ser trazidas para atividades da vida diária.

REFLITA: pensando na realidade brasileira, você acha que todas as crianças têm igual
oportunidade de brincar? Ou existem fatores que podem influenciar o acesso à
brincadeira?
Fatores que podem influenciar o acesso à brincadeira:
1) Disponibilidade de tempo dos cuidadores: em famílias onde os cuidadores têm rotinas de trabalho
de muitas horas, pode ser difícil encontrar um tempo para brincar com as crianças. Você pode
sugerir aos responsáveis que tragam os momentos lúdicos para atividades rotineiras, conforme
discutido anteriormente.

2) Local de moradia: muitos cuidadores têm receio em deixar as crianças brincarem na rua ou irem
até a casa dos amigos por medo da violência no local onde moram. Nesse caso, é importante
incentivar o brincar dentro de casa.

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3) Individualidade da criança: os interesses da criança podem variar de acordo com características
individuais: elas podem preferir brincadeiras sozinhas, acompanhadas, mais ou menos agitadas. As
condições físicas e intelectuais (presença ou ausência de deficiências) também podem mudar a
forma como as crianças brincam. É necessária a sensibilidade para compreender quais os gostos e
as capacidades da criança para participar de cada atividade.

4) Disponibilidade de brinquedos e dispositivos eletrônicos: alguns cuidadores podem pensar que


precisam comprar os brinquedos mais caros para que as crianças sejam estimuladas. Isso não é
verdade, porque na brincadeira o mais importante é a interação e a criatividade. A presença de
eletrônicos como televisão, celular, tablet e computador pode fazer com que a criança se interesse
menos por atividades lúdicas com materiais diversos ou com interações diretas com adultos ou
outras crianças. A televisão não é considerada uma brincadeira. Quando as crianças assistem muita
televisão, têm menos tempo para brincar. Você vai saber mais sobre o uso de eletrônicos na aula 7
desta unidade.

RESUMO
Nesta aula você aprendeu sobre a importância do brincar para o desenvolvimento das crianças.
Vimos que a brincadeira é uma atividade natural e necessária para elas. A principal ocupação
das crianças pequenas deve ser o brincar. Isso acontece porque a atividade lúdica estimula funções do
desenvolvimento que ajudam nas aquisições de competências, como o desenvolvimento motor, cognitivo,
socioafetivo e da linguagem. Assim, essa atividade pode ajudar a desenvolver diversas habilidades
necessárias para a sua vida, como a autonomia, a criatividade e a compreensão de si e do mundo. Vimos
também que, por ter essa importância, o brincar é um direito da criança, e está garantido por diversas leis.
Por isso, os cuidadores têm papel fundamental para incentivar essa atividade no cotidiano infantil,
encorajando as crianças a construir seu universo de imaginação. Os visitadores podem auxiliar nesse
processo, estimulando os cuidadores a tornar a brincadeira parte importante da rotina!

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2 - Brincar é coisa séria
Aqui o assunto central será a importância do brincar para a criança e o papel dos cuidadores na
garantia do direito das crianças de brincar. Também discutiremos a importância das formas de cuidado e
estimulação da brincadeira para o desenvolvimento infantil.
Ao final você deve ser capaz de responder aos seguintes questionamentos:
1) Por que brincar é tão importante para o desenvolvimento da criança?
2) Como os cuidadores podem garantir o direito das crianças à brincadeira?
3) De que forma os cuidadores podem estimular a criança a
brincar?

Vamos lá?

2.1 - Por que brincar é tão importante para o desenvolvimento da criança?


As crianças pequenas desde muito cedo aprendem a brincar. Podemos não reconhecer como
brincadeira, mas, quando a criança sorri em resposta ao sorriso do cuidador, ou quando ela emite gritinhos
em resposta a uma gracinha feita pelo cuidador, podemos entender que está sentindo prazer nessa interação,
o que não deixa de ser uma brincadeira para ela.
À medida que a criança cresce, o jeito de brincar vai mudando. Por exemplo, ao redor dos dois anos,
as crianças já conseguem imitar várias coisas na brincadeira, como o barulho de uma ambulância ao
movimentarem um carrinho ou caixinha qualquer. Entretanto, é desde pequena que ela vai aprendendo essa

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forma de se relacionar com os objetos e as pessoas, que é a via do brincar. Por tudo isso, a brincadeira é
considerada um recurso importante de promoção do desenvolvimento infantil.

“A brincadeira é universal! O brincar facilita o


crescimento e, portanto, a saúde. O brincar
conduz aos relacionamentos grupais e é uma
forma de comunicação. ”
Donald W. Winnicott

Donald W. Winnicott foi um pediatra e psicanalista inglês que estudou profundamente o


desenvolvimento dos bebês e as relações com cuidadores. Retomando a nossa conversa sobre a importância
da brincadeira para o desenvolvimento infantil, os três próximos tópicos vão auxiliar a organização desse
conhecimento. Vamos lá?

2.1.1. A brincadeira promove a interação da criança com os cuidadores e com outras crianças
Embora a criança aos poucos vá aprendendo a brincar sozinha, em geral ela brinca acompanhada
por outras crianças e/ou por seus cuidadores. Com isso, a brincadeira se mostra um recurso importante para
promover a interação e o vínculo da criança com essas pessoas. A partir dessa interação, a criança
desenvolve a sua capacidade de se relacionar com os outros, de se comunicar, de pensar, etc. Quando brinca
acompanhada, a criança é ainda mais desafiada a pensar sobre os objetos com os quais brinca e sobre como
o mundo funciona.
Se um bebê está sozinho e pega um brinquedo na mão (por exemplo, uma bola com um chocalho
dentro), ele poderá sentir a sua textura, gosto, cheiro e verificar que produz sons. Mas talvez não consiga
explorar todas as funções que o brinquedo pode ter. Se um adulto apresentasse essa bola com o chocalho,
ele poderia, por exemplo, ver que é possível jogarem a bola um para o outro e se divertirem com essa
brincadeira a dois. Da mesma forma, brincando com os coleguinhas ou com os irmãos ou primos, a criança
pode descobrir uma função diferente para os objetos que ela já conhece.
Vamos pensar em um exemplo! Muitas crianças têm contato com aqueles brinquedos de encaixe,
em que há um buraquinho com o formato de uma peça específica. Uma criança bem pequena pode não
saber que há uma conexão entre as peças do brinquedo. Nesse caso, ao ver uma criança mais velha
encaixando as peças no lugar certo, ela pode tentar imitar esse gesto e começar a tentar encaixar por si
mesma! A partir do que vimos, é possível concluir que a brincadeira é importante para o desenvolvimento
motor, socioafetivo, cognitivo e da linguagem da criança.

2.1.2. A brincadeira desafia a criança


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Brincar pode ser um ótimo momento de aprendizagem e criatividade para a criança, e não apenas
de lazer! Quer ver como podemos observar isso? Brincando, as crianças são desafiadas a conhecer objetos
(cor, formato, textura, cheiro, sons, etc.), a ver como funcionam e para que servem, a se organizar com os
seus parceiros de brincadeira, a se comunicar, etc.
Vamos supor que um bebê ganha um brinquedo novo de seus pais, como aqueles de encaixe. Com
ele, o bebê vai aprender sobre cores, formas, texturas. Se ele tiver um cuidador que o ensine, também vai
poder aprender sobre os nomes dessas formas geométricas.
Com brinquedos de montar, a criança pode aprender sobre a necessidade de encaixar as peças umas
nas outras e essa tarefa vai ser, em si, a brincadeira. Ela pode aprender também que existem peças que
cabem em espaços específicos, dependendo da sua forma, e que pode construir outras várias formas a partir
do encaixe das peças. Isso tudo é um grande desafio! Se ela não conseguir encaixar todas as peças, talvez
queira pedir ajuda para os cuidadores. Para isso, vai precisar se comunicar de alguma forma.
Outro desafio pode ser o cuidador ou outra criança apresentarem um brinquedo novo, ou um jeito
novo de usar um brinquedo já conhecido. Ou mesmo propor que ela imagine algo diferente em relação a
esse brinquedo que já conhecia. Ainda, se duas crianças estão interessadas e disputando o mesmo
brinquedo, elas precisarão se organizar em relação a essa situação de “conflito”, o que também é importante
para aprender sobre competição, cooperação, tomada de decisão, solução de problemas, etc.

2.1.3. A brincadeira estimula a imaginação e a criatividade


Como estamos vendo até agora, a brincadeira é um instrumento muito poderoso. Brincar estimula
o desenvolvimento infantil de muitas maneiras, dentre elas, proporcionando oportunidades de imaginar e
criar! Quando a criança brinca, ela pode se permitir modificar a realidade, fazendo com que objetos
conhecidos ganhem outras funções. Por exemplo, uma boneca pode virar um bichinho ou um bebê.
Se a brincadeira envolve história ou música, a criança pode inventar roteiros e finais diferentes a
cada leitura, ou mesmo criar uma história ou música própria. Se a criança for muito pequena, o adulto pode
fazer isso por ela. Por exemplo, ler uma história e, no meio da leitura, inserir perguntas novas sobre os
personagens. Perceber uma história diferente vai estimular a curiosidade da criança e ajudar a desenvolver
a sua linguagem. Se a brincadeira se relacionar com uma música, o cuidador pode iniciar uma melodia e
propor que eles pensem juntos em uma letra nova para essa música. Ou mesmo, inventar novos ritmos ou
danças que combinem com essa música. Tudo isso desafia a criança a repensar os estímulos já conhecidos.

2.1.4. A brincadeira permite que a criança expresse seus pensamentos e sentimentos


Em qualquer brincadeira, para além dos estímulos cognitivos e de linguagem, a criança também
consegue expressar o que sente, pensa e o que vive no seu dia a dia. Por exemplo, um bebê que brinca com
uma boneca pode entender essa boneca como seu bebê e reproduzir cenas de cuidado, como alimentar,

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trocar fralda e fazer dormir. Essa brincadeira pode ser acompanhada de diálogos simples que ele costuma
ter com seus cuidadores.
As brincadeiras que simulam a vida real são importantes e organizadoras para a criança e se tornam
ainda mais importantes quando ela enfrenta situações difíceis ou ameaçadoras. É bem comum vermos
crianças que precisaram de algum tratamento médico depois reproduzirem esse evento nas suas
brincadeiras. Após a vacinação, por exemplo, muitas crianças brincam de “dar injeção” em suas bonecas.
O mesmo acontece quando a criança fica doente ou quando vivencia uma situação de violência na rua onde
mora. Então, a brincadeira pode ser uma “válvula de escape” para essas angústias. Nesses casos, estar atento
aos conteúdos das brincadeiras infantis pode ser útil para perceber algum tipo de angústia que a criança está
passando. Você pode perguntar aos cuidadores como tem sido os momentos em que as crianças brincam
sozinhas!

2.2 - Como os cuidadores podem garantir o direito das crianças à brincadeira?


Agora vamos conversar um pouco sobre o que os cuidadores podem fazer para garantir que a criança
tenha a oportunidade de brincar. Precisamos ter em mente que a criança não sabe que precisa ter um tempo
para brincar no seu dia a dia. Ela brinca quando tem oportunidade! Tudo pode se transformar em brincadeira
para uma criança, dependendo da forma como vamos apresentar a ela os estímulos necessários. E quem
precisa oferecer essa oportunidade de brincar são os cuidadores, seja por meio de brinquedos ou materiais
para iniciar as brincadeiras, seja pela promoção de um ambiente adequado para isso (limpo, estável, seguro).
Como falamos anteriormente, cuidadores sensíveis e responsivos conseguirão oferecer estímulos
adequados às habilidades da criança e de forma a respeitar o ritmo dela. Por exemplo, se a criança está
olhando um livrinho, a cuidadora sensível e responsiva acompanhará o ritmo e o interesse da criança em
explorar o livro. Além disso, ela entenderá que uma criança de dois meses recém está começando a tentar
agarrar objetos, por isso seria mais produtivo mostrar um brinquedo para ela e movimentá-lo do que
oferecer algo que ela precisasse segurar sozinha para brincar.
Provavelmente, um cuidador não responsivo não estaria atento ao interesse e ao ritmo da criança e
poderia, por exemplo, apressá-la, para que ela olhasse logo o livro até o final. Ou ele ofereceria um outro
brinquedo (chamamos isso de intrusividade), ignorando o interesse da criança, desviando a atenção dela e
interrompendo as suas descobertas. Como já mencionamos, a criança deve ser a “líder” da brincadeira, já
que é o cuidador que está entrando no mundo infantil. Por isso, um cuidador sensível e responsivo consegue
oferecer os estímulos adequados no tempo da criança! Não se trata de oferecer brinquedos, livros e histórias
prontas apenas. Podemos dizer o mesmo dos celulares, tablets e programas de televisão. Esse tipo de
estímulo não incentiva a criatividade da criança.

Relembrando…

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Estamos enfatizando bastante até agora que é importante que o cuidador saiba acompanhar o ritmo
e o interesse da criança. Por isso, é super importante salientar outra coisa bem importante sobre o
comportamento do cuidador durante a brincadeira. Para poder perceber o interesse da criança, o cuidador
precisa estar conectado com o momento da brincadeira. Isso quer dizer: não dividir a atenção com celular,
TV, com outras atividades da casa… Sabemos que isso é difícil no dia a dia, pois existem as exigências da
casa, do trabalho e de cuidado de outros filhos. Se for esse o caso, garantir ao menos por um pequeno tempo
essa disponibilidade já é valioso para a criança. Não é preciso brincar o tempo todo, mas sim ter momentos
de muita qualidade nessa interação divertida. Vamos aprofundar um pouco mais essa discussão, certo?

Tópico 1 - Sobrecarga dos cuidadores


A gente sabe que muitos cuidadores ficam sobrecarregados com a rotina que é exigida dos adultos
hoje em dia. Além de cuidar da casa e dos filhos, precisam trabalhar e garantir o sustento dessa família.
Assim, nem sempre no terceiro turno de trabalho (aquele tempo para cuidar de todo o resto), os cuidadores
vão ter a energia necessária para promover as melhores brincadeiras para as suas crianças. Por isso, você
pode demonstrar aos cuidadores como um pequeno tempo de qualidade brincando com a criança já faz toda
a diferença para o desenvolvimento dela e a relação deles.

Tópico 2 - Tornando as brincadeiras mais simples


Pensando nessa realidade das famílias, alguns programas têm sido desenvolvidos para tentar auxiliar
os cuidadores a promoverem brincadeiras simples (mas efetivas para as crianças) enquanto eles cozinham
ou lavam roupa, utilizando os objetos disponíveis em casa. Ou seja, não é preciso muito para promover
uma brincadeira saudável e estimulante para crianças pequenas. Você poderá ver, para cada família
acompanhada, que recursos estão disponíveis e poderiam ser usados nesses momentos de brincadeira. Da
mesma forma, ajudar a pensar, dentro da rotina e dos recursos da família (de espaço e tempo), que atividades
poderiam ser propostas/inventadas para as crianças pequenas.

Tópico 3 - Integrando a brincadeira às tarefas domésticas


Brincar não precisa necessariamente ser um PESO para os cuidadores. Não precisa ser um “algo a
mais” na rotina já atribulada das famílias. Enquanto tomam conta da casa e das tarefas de cuidado, é possível
interagir com a criança e garantir uma brincadeira estimulante e saudável. As crianças podem ser
incentivadas a fazer uma torre de potes, por exemplo, enquanto os cuidadores organizam a cozinha.

Tópico 4 - Crianças gostam de participar das atividades de casa


As crianças gostam de participar e de imitar o que os cuidadores estão fazendo. Isso tornará o
momento muito mais divertido para a criança e menos estressante para o cuidador. Assim, eles estabelecem
uma conexão muito mais segura e afetiva do que se a criança estivesse somente sendo distraída por um
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vídeo no celular, por exemplo. Obviamente as tarefas a serem realizadas dependerão da idade e das
habilidades da criança e não podem oferecer riscos a elas. Pensando em crianças de até 3 anos, existem
tarefas simples que elas podem fazer, por exemplo, ajudar a lavar os alimentos, arrumar a cama, dobrar
roupas, colocar as roupas no cesto de roupas sujas, recolher objetos espalhados pela casa...
Agora que já sabemos um pouco mais sobre como os cuidadores podem interagir com as crianças para
promover brincadeiras que se encaixem na rotina da família, vamos pensar um pouco mais…
Ao realizar as visitas, você provavelmente vai ver cuidadores estressados com todas as tarefas de
que precisam dar conta. Porque é mesmo difícil dar conta de tudo que se exige hoje dos adultos (trabalhar,
ganhar dinheiro, cuidar da casa, cuidar das crianças, etc.), principalmente daqueles com filhos pequenos.
Agora queremos que você mesmo pense um pouco…

2.3 - De que forma os cuidadores podem estimular a criança a brincar?


O mais importante que os cuidadores podem fazer em um primeiro momento é aceitar que brincar
gera bagunça. Muitas vezes eles têm receio de deixar a criança muito livre para a brincadeira, porque vai
dar muito trabalho arrumar tudo depois. De fato, pode aumentar um pouco o trabalho, mas é importante
que a gente pense que a bagunça não é só bagunça, é uma oportunidade de aprendizagem.Brincar com água
e algodão, por exemplo, proporciona à criança conhecer diferentes texturas, temperaturas e pesos dos
objetos. Pode fazer uma bagunça a mais? Claro que sim! Mas é importante que os cuidadores possam
conversar com a criança e limitar o espaço em que ela pode brincar com água e algodão, por exemplo.
Você também pode orientar os cuidadores para que façam esses combinados antes de começar a
brincadeira. Mais ou menos assim: “Bom, filho(a), agora a gente vai brincar com tinta. Mas eu gostaria que
você brincasse nesse espaço aqui que eu estou forrando com jornal. Podemos combinar assim?”. Dessa
forma, fica mais fácil para o cuidador arrumar tudo depois, e a criança vai ter um momento de brincadeira
divertido e diferente do habitual, utilizando materiais que estimulam a coordenação e a criatividade.
À medida que a criança cresce, ela também pode ser ensinada a ajudar o adulto a recolher os
brinquedos ao final da brincadeira. Isso é outra coisa que pode ser combinada com a criança desde o início:
“Bom, filho(a), agora a gente vai brincar, mas quando acabar a nossa brincadeira, todo mundo vai ajudar a
organizar a bagunça, tá?”.

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Existem até músicas infantis que tratam disso, que podem ser usadas pelos cuidadores para estimular
a criança a ajudar a organizar as coisas ao final da
brincadeira.
Uma música dessas bastante famosa diz assim:
“Guarda, guarda, guarda...
Para conseguir aceitar a bagunça que a Bem direitinho.
brincadeira pode causar, e para garantir que mesmo Quem guardar direito.
com essa preocupação os cuidadores vão conseguir se Encontra tudo arrumadinho. ”

conectar afetivamente com a criança durante esse


momento, pode ser importante que eles se lembrem das
suas próprias vivências como crianças. Você também pode ajudar os cuidadores mostrando para eles que
ninguém precisa ser um apresentador de programa infantil para estabelecer uma brincadeira. Basta deixar
a imaginação livre e estar atento aos sinais da criança. Todos sabemos como brincar e temos condições de
melhorar essa habilidade na gente; basta ter disponibilidade para aprender e, principalmente, para estar com
a criança.
Os cuidadores também não precisam se cobrar tanto em relação ao tipo de brincadeira a ser proposta
para as crianças pequenas. O importante é que eles possam ter algumas cartas na manga! Diferentes opções
de estímulos! É isso que você pode reforçar com eles. Por exemplo, uma brincadeira mais mecânica e
repetitiva pode ter uma função importante por um tempo para o bebê e, aos poucos, pode ser substituída
por brincadeiras mais criativas. Pense em um bebê que está aprendendo a jogar objetos no chão e que, ao
cair, se diverte com o barulho que eles fazem. Ele vai repetir isso por muitas vezes, provavelmente, por
achar interessante; por estar aprendendo o quanto de força precisa fazer para arremessar o brinquedo ao
chão; porque vê que, desse jeito, o cuidador precisar parar o que está fazendo e lhe dar atenção para pegar
o brinquedo e lhe devolver, etc.

RESUMO
Antes de finalizar, queríamos reforçar que a brincadeira é um recurso poderoso para fortalecer
os vínculos da criança com seus cuidadores e com seus pares (outras crianças, irmãos, primos,
vizinhos, etc.) e para estimular o seu desenvolvimento nas diferentes dimensões. Para além
de todas as habilidades que o brincar promove, a expressão de afeto da criança para os cuidadores e dos
cuidadores para a criança talvez seja o aspecto mais importante e mais reconfortante desses momentos. Por
isso, estimular a brincadeira nas famílias que você acompanha é estimular a saúde e o bem-estar de cada
um e de todos!

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