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Não haverá distinção

Joaquim Roberto Neves Campos


Professor Coordenador de Graduação da Faculdade IBTA

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) aprovou, em 30/10/2007,


o parecer ao PL 3129/04, do relator, deputado Odair Cunha (PT/MG), pela constitucionalidade,
juridicidade e técnica legislativa, com substitutivo, ao PL 3129 de 20041. O projeto, de autoria
do deputado Eduardo Valverde (PT/RO), estabelece a não distinção entre o trabalho realizado
no estabelecimento do empregador e o realizado à distância, desde que sejam caracterizados
os pressupostos da relação de emprego.

A idéia do trabalho à distância tem instigado muitas pessoas, e este assunto sempre me
despertou interesse, estudo e experimentação. Lembro-me, a princípio, de momentos em que a
execução de um determinado relatório, projeto ou empreendimento requisitou o meu próprio
afastamento do escritório ou em concordar e autorizar o afastamento do responsável para
realizar o trabalho em casa.

Nessas situações, inicialmente, o argumento mais comum era a necessidade de


concentração e dedicação exclusiva a uma determinada tarefa e a busca do melhor espaço
para a sua execução. Em algumas situações, o trabalho em casa foi o espaço escolhido. Com
o passar do tempo, o argumento incontestável ficava por conta do recurso de infra-estrutura:
microcomputador / impressora não compartilhados e, posteriormente, também o acesso a
Internet.

Dessa forma, paulatinamente, os conseqüentes ganhos de produtividade comprovada


em função da maior concentração, dedicação, proteção do tempo e dos recursos de infra-
estrutura disponibilizados, passaram a se constituir importantes aliados dessa “liberdade”
administrativa.

Ao resgatar este histórico da minha experiência pessoal do trabalho à distância, vejo-me


em 1989 participando da experiência-piloto do projeto de Automação de Escritório, na empresa
em que trabalhei por mais de 20 anos. Usávamos um terminal de computador do tipo 3270 (
com monitor de tela verde ), ligado ao computador central e o Professional Office System –
Profs da IBM como recursos de correio eletrônico, editor de texto e agenda.

Para a época, estar conectado, acessar informações a partir de qualquer terminal da


empresa ou eventualmente de terminais – era, sem dúvida, uma sensação de estar
participando de um processo de mudança cultural irreversível, considerando as características
do negócio a nossa presença em todas as cidades do estado de São Paulo e a execução de
nossas atividades envolvia o deslocamento de nossos profissionais, para participar de reuniões
e grupos de trabalho no Rio – Brasília e por vexes o interior do estado de São Paulo. –

1
Disponível na internet em: http://www.camara.gov.br/Sileg/Prop_Detalhe.asp?id=155964
2  Internet: o encontro de 2 mundos

sentíamo-nos como desbravadores na selva organizacional em busca de uma nova linguagem


administrativa que sem dúvida, traria ganhos inquestionáveis em termos de produtividade,
eficiência, eficácia e qualidade de vida.

Alguns profissionais desejavam estender o acesso para a empresa como um todo


enquanto um grupo achava que era modismo e que essa febre iria passar! Mais tarde, com o
surgimento das redes locais e a substituição do correio eletrônico do Profs pelo e-mail e as
demais funcionalidades pelo pacote do Office da MS. Posteriormente complementado pela
intranet, as bases para a formação do novo ambiente corporativo levaram em conta todo esse
aprendizado.

Hoje, temos consciência que o Bill Gates2 estava correto ao afirmar em 1985, que não
existem mapas confiáveis para territórios inexplorados!

A década de 90 no Brasil iniciou com uma perspectiva favorável em função da abertura


econômica e o início do processo de privatização das telecomunicações que infelizmente só se
concretizou oito anos mais tarde!

Assim fomos obrigados a ver o mundo falando em globalização, em construção da infra-


estrutura global de comunicação, e da rede digital de serviços integrados enquanto
convivíamos com gap tecnológico e de serviços.

Neste cenário defasado em que vivíamos, em 1994, começou a veicular na TV


americana uma campanha publicitária3 da MCI, no qual a atriz Anna Paquin, na época com 11
anos recitava o texto:

“Uma estrada vai existir, que não vai ligar dois pontos. Vai ligar todos os pontos
à velocidade da luz. Não irá daqui até lá, pois não existirá mais lá. Todos
estaremos aqui”.

Este texto tornou-se ícone da visão da indústria de telecomunicações, da convergência


tecnológica e da mobilidade. Nisto se trabalhou, trabalha-se e continuará trabalhando na busca
permanente da evolução e do aprimoramento desta visão.

A indústria da Internet também em muito contribuiu e se destacou nesse período como


a principal infra-estrutura de conexão capaz de tornar viável a idéia de conectividade universal,
da interatividade e do trabalho cooperativo. E foi através do crescimento exponencial da
internet, a partir de 1995, que as perspectivas para as teleatividades, do trabalho à distância e
das novas formas de trabalho tomaram impulso para sair da informalidade, da experiência
empresarial autorizada, para se colocar de fato como formas alternativas de trabalho e geração
de renda.

Diante destes fatos, importante destacar que vivemos em uma época muito interessante
de se viver, com transformações aceleradas, muito rica em oportunidades, em que as idéias
têm prazo de validade o conhecimento é o nosso maior patrimônio e o talento o maior
diferencial. Este é o contexto ideal para encubar o trabalho à distância de uma forma madura e
vigorosa, pois a tecnologia-suporte ao teletrabalho e as tele-atividades ainda não é uma
tecnologia madura, é recente e o acesso às redes de alta velocidade ainda restrita às grandes
cidades e a uma pequena parcela da população, principalmente no Brasil em que estes
serviços começaram a ser ofertados recentemente.
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Bill Gates – A Estrada do Futuro
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Disponível da internet em:
http://video.google.com/videoplay?docid=-7162885888885677843&q=anna+paquin&total=222&start=20&num=10&so=0&type=search&plindex=4
não haverá distinção  3

Da mesma forma que muitas empresas estão convencidas – somente depois de


tropeçar em erros no seu processo de fazer negócio através da internet e hoje, conscientes dos
equívocos e fortalecidas pela experiência adquirida – de que ficar fora da Web significa estar
fora do mercado, em breve, também entenderão que as teleatividades e o teletrabalho deverão
fazer parte da arquitetura dos processos dos seus negócios.

Quando isto acontecer, o desenho do processo dos negócios contemplará as


teleatividades e o teletrabalho de forma natural e integrados à sua cadeia produtiva como parte
coerente e significativa da linha de produção.
Dessa forma, à medida que um determinado processo requerer um perfil profissional específico
para executar uma atividade, dentro de um prazo preestabelecido, uma comunicação ( e-mail )
será enviada à rede ( internet, intranet ou extranet ) e o profissional habilitado requisitará para
si a responsabilidade pela execução desta atividade.

O profissional habilitado desenvolverá este trabalho e será remunerado de acordo com


as suas habilidades certificadas e em função de sua produtividade. Neste novo contexto
empresarial, tanto o processo de certificação das habilidades, como todo o processo de
capacitação para uma nova atividade poderão ser feitos à distância, pela internet.

Quando isso acontecer, o teletrabalho deixará de ser um corpo estranho ao


empreendimento, ou à organização e se constituirá um importante elo da cadeia produtiva.

Estará inserido em um contexto maior, onde passará a ser co-responsável pela contínua
evolução dos processos dos negócios de seus parceiros e do seu próprio desenvolvimento e
crescimento profissional e pessoal. E tudo se fará de forma cooperativa e colaborativa.

É bem provável que, quando isso acontecer, o trabalhador à distância já não seja mais
chamado de teletrabalhador, ou algo como e-worker (trabalhador ou operário da economia
digital). Não haverá necessidade de novos rótulos, esperar por mudança na legislação para o
seu efetivo reconhecimento e assegurar direitos adquiridos.

O mais interessante desta visão é que, quando isso ocorrer de fato, a denominação que
for usada já não será o mais importante, pois o espaço para valorizar as novas formas de
trabalho terá sido conquistado, os esforços para abolir os antigos rótulos da descrição de
cargos, e os mais diversos tipos de preconceitos terão sido superados e o respeito, e a
dignidade profissional resgatados e a história desta conquista, com certeza, estará registrada;
sobretudo, nos corações daqueles que, de alguma forma, deram a sua contribuição para isso
acontecer.

Difícil imaginar um mundo sem internet! E são varias as possibilidades que ela, aliada
aos aparelhos tecnológicos, pode nos proporcionar para nos facilitar a correria do dia-
a-dia...

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