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EU ODEIO ESSE CARA

Por L. C. Almeida
Sinopse
Você acredita em ódio à primeira vista?!

Roxanne Reed é uma estrela do pop com uma certa propensão a se


meter em problemas. Quando não está no palco arrastando multidões, está
fugindo de todos os seus guarda-costas.

Isso até Drake Hill entrar na sua vida.


O ex-agente da CIA não tem a menor paciência para lidar com essa
Tampinha e só quer dar conta do trabalho que seu melhor amigo o obrigou a
aceitar - totalmente contra a sua vontade, diga-se de passagem.
Ah... esses dois não poderiam ser mais diferentes. Drake sempre faz
a coisa certa, sonha com uma vida pacata e adora regras. Roxy ama a sua
música, a sua liberdade e seguir regras está logo abaixo de "aprender a fazer
crochê" na sua lista de prioridades.

As únicas coisas que esse par improvável tem em comum são ódio
mútuo, as brigas em que se enfiam, o quarto que dividem e a vontade de se
verem livres um do outro.
Até que começam a se conhecer melhor...
Talvez as diferenças não sejam tão grandes assim. Talvez exista muito
mais por trás da Princesa e do Babaca do que eles imaginavam.
Acompanhe as aventuras desse casal cheio de química, antes que
eles se matem. Ou se apaixonem.
Ou os dois ao mesmo tempo.
Quando amo
Eu devoro
Todo o meu coração
Eu odeio
Eu adoro
Numa mesma oração

Chico Buarque
Capítulo 01 - Você me deve uma
Drake

- Não.
- Drake, você nem ouviu o resto da minha proposta ainda...
- Você chama isso de proposta?! - Aponto para a capa do jornal que

estou segurando e encaro meu melhor amigo com um olhar de descrença. A


foto mostra uma jovem de cabelos castanhos dançando em cima de uma
mesa, usando só uma pequena saia de couro e uma tarja preta de censura
onde deveriam estar sua blusa e seu sutiã. - Me pedir para ser babá da fedelha
que achou uma ótima ideia sair fazendo strip-tease num bar de motoqueiros?!
Até cinco minutos atrás, Justin Rezzo era um dos empresários mais
bem-sucedidos do mundo da música e alguém que eu admirava. Agora, para
mim, ele é só um lunático que perdeu completamente o juízo.

- Não estou te pedindo para ser babá, estou te pedindo para ser o
guarda-costas dela. - Fala como se fizesse muita diferença.
Nada como a boa e velha semântica: salvando políticos, advogados e
empresários desde o início dos tempos.
- Você está esquecendo de um pequeno detalhe, Jus. - Jogo o jornal na
mesa e cruzo os braços. - Não tenho experiência. Eu nunca fui guarda-costas.
- Não, mas foi um agente especial por 12 anos. O melhor de todos,
pelo que eu sei. E é por isso que preciso de você para esse trabalho. Não
consigo pensar em ninguém mais que conseguiria dar conta de Roxy. - Paro

para examiná-lo com calma pela primeira vez, desde que pisei no seu
escritório e ele jogou essa "bomba atômica seminua" em cima de mim.
Parece aparentar bem mais que os nossos 30 anos, suas têmporas começando
a ficar grisalhas e as rugas aparecendo embaixo dos seus olhos. Consigo

sentir daqui o peso da responsabilidade que carrega sobre os ombros. Um


peso que atende pelo nome de Roxanne Reed. - Estou desesperado, Drake.
Por qual outro motivo acha que eu estaria aqui, tentando argumentar
justamente com a pessoa mais teimosa que conheço?
Suspiro e passo as mãos pelo rosto, sentindo a barba que a
aposentadoria me permitiu deixar crescer. Não faz nem um mês, inferno!
Seria pedir muito ter um pouco de sossego?! Uma vez na vida?! - O que
aconteceu com o último segurança da pirralha?

- Tive de demiti-lo depois que Roxy conseguiu fugir pela sétima vez e
acabou nessa situação. - Ele aponta para o jornal e eu olho para a sua foto
mais uma vez.
O rosto da garota está banhado de diversão e eu me pego a invejando
por alguns segundos. Não lembro quando foi a última vez que me diverti.
Nem sei se já me diverti assim, nem quando tinha a sua idade. Pelo menos,
tenho certeza de que nunca tirei a roupa no meio de um bar de motoqueiros.
- Como uma coisinha desse tamanho conseguiu fugir SETE VEZES
de um agente treinado?! - A garota deve ter 1m50, 1m60 no máximo, e pesa

uns cinco quilos molhada. Não é possível que cause tanto estrago.
- Ele, e todos os outros que vieram antes, cometeram o mesmo erro
que você está cometendo agora. Subestimaram Rox. Escuta, Drake. - Ele se
inclina por cima da sua mesa para me olhar com a expressão grave. - Alguém

precisa protegê-la do mundo e dela mesma. Essa garota é importante para


mim. Ela é importante para metade do planeta. Você saberia disso, se não
vivesse embaixo de uma pedra.
- Eu não vivo embaixo de uma pedra, só não tenho a assinatura
mensal da "Sonhos Adolescente". - Resmungo de volta, voltando a cruzar os
braços.
- Roxy não é uma adolescente mais. - Jus revira os olhos para mim. -
Ela tem 22 anos, uma legião gigantesca de fãs, talento de sobra e uma grande

vontade de viver a vida ao máximo. No fundo, é uma mulher incrível, muito


mais do que deixa o mundo ver e...
Oh, scheibe.
Consigo ver a sua boca se mexendo, mas não ouço uma palavra do
que está dizendo. Só o que eu consigo ouvir é PROBLEMA.
Problema, problema e mais problema.
Dá para sentir o cheiro de problema a quilômetros de distância daqui.
Estou fora. Já tive minha cota de dor de cabeça nessa vida.
- Ela me parece uma criança mimada, que age como uma criança

mimada. Boa sorte para você e me liga quando puder tomar uma cerveja, sem
trazer estrelas pop de brinde. - Bato com as mãos nos joelhos e me levanto,
indo em direção à porta aberta o mais rápido que a etiqueta social me
permite.

- Você me deve uma, Drake. E eu estou cobrando agora.


Estanco no lugar antes mesmo de conseguir pisar para fora, dando um
olhar de cobiça para as portas do elevador se fechando e levando junto a
minha liberdade. - Você só pode estar brincando comigo, Justin.
- Eu preciso de você, cara. Juro que depois dessa ficaremos quites.
Malditas promessas de bêbado.
Suspiro, deixo meus ombros caírem e me viro para encará-lo. -
Escuta. Se ela foge de todos eles, quer dizer que não quer ter um segurança.

Como você espera que eu proteja alguém que não quer ser protegida?
- PIOR! COMO ELE ESPERA QUE EU SEJA PROTEGIDA POR
ALGUÉM QUE NÃO QUER ME PROTEGER?
O objeto da nossa discussão entra na sala como um pequeno furacão e
se posta na minha frente, me encarando com o queixo erguido e os braços
cruzados numa postura desafiadora.
Ótimo, era só o que me faltava.
A fedelha não parece nem um pouco intimidada por eu ser bem uns
30 centímetros mais alto do que ela, e nem que seu corpo inteiro seja da

grossura de um braço meu. Fúria pura brilha nos seus olhos castanhos,
marcados com uma maquiagem preta carregada. Fúria dirigida a MIM, o que
é o melhor de tudo.
Bufo e encaro Justin, apontando para o poodle Fifi raivoso parado

entre nós. - Está vendo?! Esse é o problema. A Tampinha não tem um pingo
de senso de autopreservação.
- Ah! Evoluí de criança mimada para Tampinha? Nossa. Vou ficar
emocionada com tantas palavras doces assim. - Se vira e esbarra no meu
ombro de propósito, com toda a força do seu pequeno corpo.
Além de tudo, a garota ainda estava ouvindo nossa conversa atrás da
porta. Consigo sentir uma enxaqueca começando a subir pela minha testa e
fecho os olhos por alguns segundos, respirando fundo. Esse dia só melhora...

- Meio minuto na sua presença e eu já estou com vontade de me atirar


pela janela mais próxima. Parabéns, acabou de acrescentar um novo recorde
para a sua gloriosa carreira.
Me olha com ódio puro, antes de apoiar as duas mãos na mesa do seu
empresário e se inclinar em direção a ele, tentando parecer ameaçadora mais
uma vez. - Justin. Eu odiei esse cara. O-DI-EI. Pode, por favor, pedir que ele
se retire? Não contrataria esse Babaca nem se fosse o último musculoso sem
cérebro da face da Terra.
Babaca?! Sério?! Aposto que seu próximo xingamento vai ser

"boboca-cara-de-paçoca".
Jus se reclina para trás na sua cadeira e fecha os olhos, massageando
as têmporas com as pontas dos dedos. - Eu não estou dando opção para
nenhum de vocês. Você... - Volta a nos encarar e aponta para mim. - Me deve

essa. E você... - Aponta para a Tampinha. - Precisa fazer o que eu mando.


Então, eu vos declaro segurança e segurada. Sejam muito felizes juntos e
tentem não matar um ao outro, porque eu amo os dois. Obrigado e sumam da
minha frente.
O traidor vira a cadeira de costas para nós, tira o telefone do gancho e
começa a gritar com alguém sobre reservas de um jatinho particular.
Sabia que não deveria ter saído de casa hoje... Não confie em dias
nublados, eles nunca trazem nada de bom.

Me viro para sair, precisando urgentemente socar alguma coisa, mas


acabo sendo interceptado pela minha nova "segurada" que decidiu se postar
na porta, os braços esticados no batente, impedindo minha passagem. Ergue
seu queixo em desafio mais uma vez e estreita os olhos para mim. - Eu não
gosto de você.
- Que bom. Quem diria que temos algo em comum? Eu também não
gosto de você. - Cruzo os braços com força contra o meu peito, para não
correr o risco de acabar estrangulando essa desmiolada.
Roxy se aproxima um pouco mais e um cheiro doce chega até o meu

nariz. Algo suave e delicado como... lavanda?! Não, isso não combina em
nada com ela. Não pode ser o seu perfume. Ela deve usar algo como "Chanel

No 666".
- Eu posso fazer da sua vida um inferno, Senhor Hill. - Ela fala isso

como uma ameaça real! Não é bonitinho?! Essa garota não sabe mesmo com
quem está lidando.
Não sou um dos cachorrinhos que saíram correndo no instante em que
a gatinha colocou as garras de fora.
Muito pelo contrário.
Dou um passo para frente, me aproximando ainda mais e quase
tocando seu nariz com o meu, deixando meus olhos passarem tudo que estou
sentindo.

Eu a vejo engolir em seco, parecendo um pouco intimidada pela


primeira vez.
- Eu conheço o inferno como a palma da minha mão, Tampinha.
Capítulo 02 - Não curto essa parada de masoquismo
Drake

Encaro meu próprio reflexo no espelho com um olhar de desdém...


voltei aos ternos pretos. Tudo o que eu tive foram 27 dias de jeans, antes de
voltar aos ternos pretos. Essa tem que ser a aposentadoria mais curta da

história. Vamos acrescentar mais esse recorde para a conta da brilhante e


astronômica carreira de Roxy Reed.
Passo as mãos pelo meu rosto só para me irritar ainda mais com a
sensação da pele lisa e dou um suspiro frustrado. A vida me colocou dentro
da piscina do The Sims e tirou a escadinha fora, sem dó, nem piedade. Um
leão com dor de dente, levando uma bolada no focinho e com uma farpa
embaixo da unha teria um humor melhor do que o meu hoje.
Não vi essa vindo na minha direção, confesso. Achei mesmo que Jus

tinha me chamado até lá para um inofensivo Happy Hour, não para cobrar
uma maldita promessa de bêbados feita doze anos atrás.
Tudo culpa da "Senhorita-Livin-La-Vida-Loca-Princesa-do-Pop".
A fúria nos seus olhos castanhos naquele dia me volta à mente e eu
dou um sorriso meio incrédulo, balançando a cabeça, enquanto procuro pela
minha carteira entre as bagunças da mudança. Ela merece ganhar alguns
poucos pontos pela coragem, tenho de admitir. Homens mais velhos, maiores
e mais fortes vacilaram por muito menos na minha presença.
O que só torna meu novo "trabalho" quase suicida, claro.

Pego o celular, minha mala, as chaves do carro e dou uma última


olhada no meu apartamento, sabendo que não vou vê-lo por um bom tempo.
As caixas com meus poucos pertences me encaram do fundo da parede como
se me repreendessem. Não, eu nem tive tempo de esvaziá-las depois de

comprar esse lugar. E nem vou ter pelo próximo mês, de acordo com o
cronograma que recebi junto com o meu contrato.
Eu ia criar raízes pela primeira vez...
Ao invés disso, vou criar uma úlcera.
Mais uma prova de que a vida tem mesmo o senso de humor de um
garoto da 5ª série, "The Worst Day Ever" começa a tocar assim que entro no
meu carro. Pior dia de todos? Jura? Se você não tivesse me contado, eu nem
teria percebido, Simple Plan.

Scheibe, nem eu estou me aguentando hoje. Preciso pensar nos lados


bons. Tudo tem um lado bom. Ou é o que dizem por aí, pelo menos. O salário
na proposta que Justin me enviou ontem, depois que deixei seu escritório
proferindo todos os xingamentos em alemão que conheço, é quase obsceno.
Aposto que metade desses “zeros” são adicional por insalubridade, mas
admito que serão um bom acréscimo à minha poupança. E eu vou viajar o
mundo, como sempre sonhei em fazer, sem ter de pagar por isso.
Estaciono na frente do endereço que Justin me deu, com a certeza de
que essa é mais uma parte dessa pegadinha de mau gosto. Aqui não é nada

como o lugar em que eu esperava que a Princesa morasse. Pensei em algo


como um condomínio moderno no centro, daqueles todos de metal e algo que
minha irmã chamaria de "Decoração Escandinava", talvez com bêbados
cambaleando para fora depois de uma noite de rave, ou-seja-lá-o-que os

jovens façam hoje em dia.


Mas não.
Aqui é um bairro residencial e calmo, onde você espera ver pais
ensinando uma menina de tranças a andar de bicicleta, enquanto
cumprimentam pelo nome o vizinho que está plantando hortênsias no jardim
da frente, todos usando roupas de tênis.
Para piorar, a casa de número 13 é uma das mais bonitas. Poderia
estar no meio de uma fazenda, com uma varanda que circunda toda sua

extensão e grandes árvores na frente. É o tipo de lar que eu escolheria para


mim...
Checo mais uma vez a mensagem com o endereço. Sim, estou no
lugar "certo". Ou ela mora com os pais, ou essa casa é um disfarce para os
paparazzi, ou essa menina é mais complexa do que eu esperava.
No momento em que desço do carro, a porta da frente se abre e Roxy
começa a arrastar uma mala que deve pesar mais do que ela para a varanda.
Aproveitando que ainda não reparou na minha presença, começo a estudar
minha nova "protegida". São oito da manhã e ela já está toda maquiada,

usando o que parece ser um coturno, mas numa versão cheia de brilhos, uma
calça rasgada e algo como uma blusa preta recortada na barriga. Diria que
está pronta para subir ao palco, se não tivesse visto o que ela usa de fato no
palco. Essa é quase uma roupinha de fazer faxina para os seus padrões.

Enfim, sempre achei que mulheres devem usar o que quiserem, do


jeito que quiserem. Se eu não gosto, é só eu não usar, oras. E,
definitivamente, coturno de brilhos não é algo que eu pretenda usar num
futuro próximo.
Sento na beirada do capô do meu carro e a vejo arrastar mala atrás de
mala para a varanda, ainda sem me notar. Quando começa a puxar a quarta,
eu não aguento mais ficar calado. - Você só pode estar de brincadeira.
Ela se vira para me olhar, sua expressão passando de surpresa para

desprezo em 0.3 segundos. - Olá para você também, Senhor Hill. Nossa,
como estou feliz em vê-lo aqui. Meu dia acabou de ficar ainda melhor e mais
reluzente.
Sarcasmo nível hard.
- Achei que estávamos indo para uma turnê, não que fosse fazer sua
mudança hoje, Senhorita Reed.
- O dia em que você for a maior estrela pop do mundo, você pode
opinar sobre a minha quantidade de bagagens. Até lá, mantenha suas valiosas
e queridas opiniões para você mesmo. Obrigada, de nada.

- Manterei com prazer. Só por garantia, podemos não falar mais nada,
inclusive. - Cruzo os braços. - Por que não espera no carro, enquanto eu
carrego todas essas suas pequenas e singelas malas?
Ela se vira para trancar a porta e joga a chave dentro da sua mochila

cheia de brilhos. - Não.


- Como é? - Estreito os olhos.
- Além de tudo é surdo! - Joga os braços para cima, numa pose
exagerada. - Eu disse NÃO. N. Ã. O. Eu mesma posso carregar as minhas
malas.
Ando até ela, tentando me lembrar de todas as aulas de controle de
raiva que tive no meu treinamento e que eu aprendi a dominar com perfeição
ao longo dos anos. Distancie suas emoções, saia do seu corpo, controle sua

respiração...
- Acredite, se tivesse de apostar em alguém para ganhar essa batalha,
apostaria em mim. - Falo baixo e com o mesmo tom de voz que usava para
coagir suspeitos em interrogatório. - Então, poupe os nervos de nós dois e
ENTRE. NO. CARRO.
Ela simplesmente me ignora e pega uma das malas, arrastando com o
queixo erguido pelo caminho de pedras da entrada, tentando esconder o
esforço que está fazendo. Reviro os olhos e pego duas numa mão, uma na
outra, e passo por ela com a maior tranquilidade, a ouvindo murmurar alto o

suficiente para que eu escute:


- Odeio esse cara.
Seu comentário me faz sorrir, talvez pela dose extra de ódio que
coloca em cada palavra. Abro o porta-malas e começo a brincar de Tetris,

tentando encaixar todas no pequeno espaço. Só então ela chega com a última,
limpando o suor da testa e fazendo questão de apoiá-la com tudo bem em
cima do meu pé.
- Oh! Que desastrada! - Faz uma expressão doce, mas seu sorriso de
escárnio e o brilho diabólico no seu olhar a entregam. - Me desculpe.
- Não. Foi. Nada. - Rosno entredentes, enquanto conto mentalmente
até dez em alemão.
Eins... Zwei... Drei... Vier...

É bem relaxante, vocês deveriam tentar.


Espremo mais um pouco as malas da madame, até que consigo
encaixar tudo e fecho com uma batida suave, encontrando Roxy parada ao
lado do carro, o encarando como se não entendesse alguma coisa. - O que foi
agora? - Pergunto já sem paciência.
- Seu carro não tem banco de trás. - Pelo seu tom de choque, isso é o
equivalente a dizer “seu carro é puxado por unicórnios mágicos importados
de Nárnia”.
- Não, ele não tem. É um esportivo de dois lugares, Princesa. - Tento

explicar.
Quem deu esse título de Princesa do Pop para ela, afinal?
Sério. Queria saber o que se passou na cabeça dessa pessoa.
“Tampinha Mimada do Pop” combinaria muito mais.

- Eu sempre ando na parte de trás dos carros. - Cruza os braços e faz


um biquinho de birra.
Sechs... Sieben... Acht...
- Bom, deve ter sobrado algum espaço no porta-malas. Se faz tanta
questão de ir na parte de trás assim, fique à vontade. - Dou de ombros e entro
no lado do motorista. Coloco o cinto e dou partida, cogitando quanto tempo
eu teria coragem de andar, antes de ter de voltar para buscá-la. Talvez meia
hora?

Só de imaginar a expressão no seu rosto se eu fizesse mesmo isso, já


dou outro sorriso.
Nos poupando de mais uma dose de drama, a Princesa finalmente
abre a porta e entra, olhando para mim de verdade pela primeira vez no dia.
Os olhos castanhos estão quase pretos com a maquiagem elaborada, seus
lábios num tom de vermelho que me faz lembrar a plantação de cerejas que vi
uma vez em Portugal... Estou começando a entender como conseguiu enrolar
tantos seguranças até agora. Ela poderia distrair facilmente alguém mais
suscetível.

Mas não a mim.


- Esse carro é seu? - Pergunta dando uma boa olhada no interior
impecável.
- Sim. - Não consigo evitar o tom orgulhoso na minha voz.

Dá outro sorriso maligno e bate a porta com toda a sua força, fazendo
o carro estremecer e eu fechar os olhos, só de imaginar o sofrimento que ela
acabou de infligir ao meu pobre bebê.
- Oh, me desculpe mais uma vez. Como eu estou desastrada hoje.
Neun... Zehn... Elf...
Respiro fundo, coloco a marcha no Drive e saio em direção ao
aeroporto.
São só 3 km, Drake. Só 3 km.

Ela liga o meu som, já se sentindo à vontade, e a vejo fazer uma


careta quando o som do Metallica sai dos autofalantes. Não se dá por
satisfeita e pula para a próxima, fazendo outra careta para o Slipknot. A
próxima vítima do seu julgamento foi o Stone Sour.
- Não vai achar canções da Disney aí, Princesa.
- Você não tem nada pop?
- Não.
- Nem eu mesma?
Começo a gargalhar, até ver sua expressão se fechar ainda mais. -

Espera. Isso não foi uma piada? - Seus olhos são só duas fendas agora. - Por
qual motivo eu teria você no meu rádio, se eu já tenho que te aturar no mundo
real? Não curto essa parada de masoquismo, mulher.
Ela não responde nada, só pega o seu celular e faz alguma

bruxaria bluetooth, substituindo meu Audioslave por... Isso é Britney Spears?


Sim, é.
"Oops, I did it again" vem junto com uma enxurrada de lembranças
dos anos TERRÍVEIS em que eu tinha de dividir o quarto com a minha irmã.
Pior. Dia. De. TODOS.
Fecho os olhos por mais alguns segundos, até que lembro que estou
dirigindo e que o meu contrato proíbe que eu me jogue de uma ponte, se a
"Miss Britney Cover" estiver comigo.

Então, me contento em encará-la e tento passar um pouco da minha


fúria por osmose. Ela só amplia mais o seu sorriso e se ajeita melhor no
banco, me olhando de volta sem vacilar. - Você percebe que teremos de
matar um ao outro mais cedo ou mais tarde, não é? - Fala com a maior
doçura.
Estamos na presença da psicopata do glitter, amigos.
Capítulo 03 - O infame Drake Hill se juntando ao nosso Bonde

do Pop
Drake

O pior é a Tampinha achar mesmo que eu sou esse tipo de cara.


Minhas mãos apertam o volante com força, até os nós dos dedos

ficarem brancos.
Raiva não é um sentimento saudável, Drake.
Úlcera é uma doença séria, Drake.
Não enfarte antes de comprar a sua fazenda, Drake.
- Eu nunca encostaria em uma mulher, Tampinha. NUNCA. Então,
fique à vontade para tentar me matar. Se eu posso dar uma sugestão, basta
continuar tocando Britney Spears que eu mesmo faço o serviço por você.
Pelo canto do olho, vejo seus lábios tremerem um milímetro. Ou está

fazendo uma careta de desgosto, ou está tentando segurar o riso, das duas
uma. - Você é sempre tão bem-humorado assim, Senhor Hill?
- Você é sempre tão sarcástica assim, Senhorita Reed? - Retribuo no
mesmo tom debochado.
- O que eu posso dizer?! Você desperta o melhor de mim.
- Se esse é o seu melhor, mal posso esperar para conhecer o seu pior. -
O celular pula para outra música da boa e velha Britney e eu consigo apertar
ainda mais o volante. Se começar a tocar Mariah Carey, eu não respondo por
mim.

- Pode deixar que eu te aviso quando estiver na presença do pior de


mim, querido. - Ela apoia os coturnos brilhosos no painel do meu bebê e se
recosta mais no banco, como se estivesse na poltrona da sua casa. - O que
aconteceu com aquela história de "podemos não falar mais nada, inclusive"?

Tinha gostado dessa ideia. Na verdade, de todas as coisas que falou até agora,
essa foi a única que eu gostei.
Antes que possa ralhar com ela por estar sujando meu carro e pelo
comentário espertinho, dou um suspiro resignado e me controlo, engolindo
em seco. Tecnicamente, apenas tecnicamente ela é a minha "chefe", e numa
coisa a Tampinha tem razão. Não falar, nem ter de ouvi-la falando, são
ótimas ideias.
Vamos todos ficar em silêncio e relaxar ao som maravilhoso da nossa

amiga Britoca.
Me concentro no tráfego a minha frente e, para o meu alívio, o
aeroporto surge no horizonte antes que mais uma canção "inesquecível"
comece. Paro na guarita de segurança em um dos portões laterais, como Jus
orientou, e passo as informações do voo para o guarda de plantão. O homem
desaparece por alguns segundos, provavelmente checando se nossa entrada
está liberada e eu tamborilo os dedos no volante, evitando encarar você-sabe-
quem.
- Tudo certo, senhor? - Pergunto quando ele volta para perto da minha

janela.
- Sim, tudo certo. Eu só... - Parece encabulado e eu ergo uma
sobrancelha.
- Você só...?

- É que minha filha é muito fã da Senhorita Roxanne e eu gostaria de


pedir, se não for muito incômodo, se estiver tudo bem para ela...
- Claro! - Roxy responde antes mesmo do homem conseguir concluir
a frase. Abre a porta e desce, sorrindo amplamente para o guarda. Um sorriso
verdadeiro, não a versão de escárnio. É chocante a diferença que faz no seu
rosto. Ela parece quase humana... - O senhor tem um celular? Posso gravar
um vídeo. Aposto que sua filha vai adorar postá-lo depois.
- Tenho, tenho. Claro. - Ele se atrapalha todo, tateando seus bolsos e

eu consigo entender sua confusão. Preciso analisar mais interações futuras,


mas acho que estou testemunhando algo que vou chamar de "Efeito Roxy".
Na sua presença, homens tendem a ficar ridiculamente patéticos.
Depois de vários segundos, ele entrega o aparelho com os dedos
trêmulos e ela aponta a tela para o seu rosto. - Como é o nome da sua filha,
senhor?
- Katherine, mas todos os seus amigos a chamam de Kiki.
- Ok. - Amplia seu sorriso e começa a gravar. - Hey, Kiki! Fiquei
muito feliz em saber que é minha fã. Obrigada pelo carinho! Um grande beijo

para você, garota. Continue arrasando! - Pisca para a tela e devolve o celular.
- Espero que ela goste.
- Gostar?! Ela vai amar e gritar por uns cinco minutos. Muito
obrigado, senhorita. Obrigado mesmo.

- Imagina. Foi um prazer. - Outro sorriso simpático e meu queixo bate


no chão do carro. Com um último aceno, volta para dentro como se nada
tivesse acontecido. Eu só balanço a cabeça e dou partida, tentando controlar o
meu choque.
Ela foi realmente legal com o cara.
Acho que tinha razão antes, eu desperto mesmo o seu pior lado.
Minhas suspeitas só se confirmam quando estaciono ao lado do
jatinho particular personalizado com uma grande foto sua e ela desce de um

pulo, cumprimentando todos com grandes abraços - desde o piloto, até o


moleque que está ali para ajudar a descarregar as bagagens.
- Fico feliz em ver que está vivo e que trouxe ela viva. - Jus se
materializa ao meu lado, abraçado com seu esposo, os dois com sorrisos
gigantes idênticos. Não posso deixar de reparar em como ele parece mais leve
agora com John ao seu lado, do que estava ontem no seu escritório.
Isso sim é relacionamento... a pessoa parece uma versão ainda melhor
dela mesma quando o outro está por perto.
- Não foi uma tarefa fácil, te garanto. John, quanto tempo que eu não

te vejo. - Aperto sua mão e sorrio. Gostei do homem desde a primeira vez que
o vi. Ele já merece ser canonizado só por aguentar Jus em tempo integral. E
ainda faz isso por vontade própria.
- Confesso que quando meu Tuquinho contou quem seria o novo

segurança, eu gargalhei por uma boa meia hora. O infame Drake Hill se
juntando ao nosso Bonde do Pop! Quem diria?
Jogo meu corpo para trás e dou uma gargalhada. Bonde do Pop... já
imagino uma versão da "Carreta Furacão" com Roxy Reed vestida de
Homem-Aranha. Ai, ai. Acho que é isso que as pessoas querem dizer com
"ver o lado bom das coisas".
- Seu marido tem um certo prazer doentio em me ver sofrer, Johnny.
Tem sido assim desde que eu ganhei o posto de representante da classe na

primeira série. O pobrezinho nunca superou. - Jus só revira os olhos para


mim. - Ou é isso, ou ele queria arranjar um jeito de ficar pertinho de mim. -
Dou de ombros.
- Oh, querido. Eu, com certeza, gostei dessa parte de ter você e esses
seus músculos todos bem pertinho de mim. - John pisca, falando em tom de
brincadeira. Sei que se amam mais do que tudo e acho que estão juntos faz
uns dez anos, mas nunca cansam de se provocar.
Decido entrar no jogo e o puxo do abraço de Jus, passando minha
mão pelos seus ombros. - Por que não se senta comigo e conversamos mais

sobre os meus músculos durante a viagem?


- Ok, ok. Eu sabia que iria me arrepender por ter te contratado, mas
não imaginava que seria tão rápido assim, Hill. - Justin pega a mão do seu
esposo e sai o arrastando. - Você precisa se comportar, Tuquinho. Não caia

nas gracinhas do imbecil...


Só então percebo Roxy me olhando com o queixo caído da porta do
jato, parecendo estar em choque completo. Acho que está passando pelo que
eu passei mais cedo... o espanto por descobrir que nem sempre falamos
latindo com as pessoas.
Nós despertamos MESMO o melhor um do outro.
Termino de descer suas malas do carro, entrego minhas chaves para o
carregador estacionar meu bebê no hangar particular e subo as escadas do

pequeno avião. O interior é ainda mais luxuoso do que eu esperava, mas


estranhamente... neutro. Estava contando que encontraria mais brilhos, talvez
um poste de pole dance, ou um bar havaiano com garçons sem camisa. Mas
não... tudo por aqui é bege, branco e com cara de aconchego, um cheiro suave
de lavanda pairando no ar.
- PESSOAL! - Justin bate palmas, chamando a atenção de todos. -
Esse é o novo segurança da Roxy, Drake Hill.
- Outro? Há-há. Boa sorte, cara. - Uma morena de olhos verdes sorri
debochada para mim de uma das poltronas mais próximas da porta. Parece

tão jovem quanto a Tampinha, mas não tem a nuvem de ódio pairando em
cima da sua cabeça.
- Obrigado, senhorita. Acho que vou precisar de toda sorte que puder
mesmo. - Não preciso nem olhar para Roxy. Sei que está revirando os olhos

onde quer que esteja.


- Essa espertinha é Sara, baterista da banda. - Jus apresenta. - Do lado
dela, a loira que já está dormindo é Emma, sua namorada e nossa baixista.
Essa senhorita adorável que já achou o frigobar é nossa guitarrista, Grace. - A
Princesinha tem uma banda de verdade? Achei que tinha só o cara para soltar
o playback. - John, que você já conhece e de quem vai manter distância,
cuida do marketing. Fora isso, temos os roadies que já viajaram na nossa
frente para Portugal.

- É um prazer conhecer todos vocês. - Respondo com um sorriso.


Parece um grupo divertido para se viver o próximo mês até. Bem diferente
dos agentes sisudos com quem eu estava acostumado a trabalhar. Olha só eu
vendo o lado bom! Quem diria?!
- O prazer é nosso, querido. Todo nosso, pode acreditar. - A tal Grace
me lança uma olhada que faria até o mais ousado dos homens corar. Quanto a
mim?! Só me remexo no lugar, desconfortável com a atenção.
- Será que podemos decolar logo, ou precisamos ficar aqui bajulando
o Babaca por mais um tempo mesmo? - Roxy cruza os braços na sua poltrona

e todos olham para a dona do “Bonde” com caretas que misturam espanto e
diversão. - Que foi?! Já estamos atrasados!
- Desde quando você liga para horários? E pior, desde quando você
tem pressa para DECOLAR?! - Jus revira os olhos para ela, mas vai para a

sua poltrona ao lado de John. - Sente-se, Drake. Como Roxy lembrou tão
docemente, precisamos decolar.
- Ok. - Olho ao redor, procurando uma poltrona vaga, até que meus
olhos caem no fundo do avião.
Eu dou um beijo em quem adivinhar qual o único lugar vazio.
O ÚNICO.
Droga de dia nublado.
Ando até o fundo do pequeno avião, resmungando xingamentos em

alemão. Espero que ninguém fale alemão aqui. Só um pequeno corredor


separa a poltrona vazia do seu lugar ao meu lado...
Saudade, espaço pessoal.
Saudade não ter vontade de estrangular quem está do meu lado.
Saudade, sanidade.
Tiro meu paletó e coloco no encosto para não amassar. Depois,
começo meu ritual metódico de dobrar as mangas da minha camisa social,
tentando ficar o mais à vontade que conseguiria para encarar essa tortura -
digo voo.

Sinto seu olhar me acompanhar durante todo o processo. - Perdeu


alguma coisa, Princesa? - Ela desvia o rosto na hora, como se tivesse sido
pega no flagra fazendo algo errado e alcança seu celular, ignorando minha
pergunta. Garota estranha...

Tiro meus fones da mochila, meus óculos, meu Kindle e me acomodo


na cadeira macia. Tenho de admitir que ela é confortável, até para alguém do
meu tamanho.
Olha o lado bom aí de novo! Estou ficando bom nisso.
Meus anos de treinamento me dizem que ela voltou a me encarar, sem
que eu precise virar para tirar a prova. Provavelmente, está pesquisando
formas medievais de tortura na internet e planejando como vai colocá-las em
prática comigo.

Seria bem divertido vê-la tentar.


Capítulo 04 - Meu pesadelo em forma de segurança
Roxy

Braços.
Eu sempre tive uma coisa com braços masculinos.
As ondulações da pele, as veias, a força que eles representam... Não é

espanto nenhum que eu esteja totalmente hipnotizada por esses braços em


questão. Eles são os maiores e mais definidos que já vi.
A parte espantosa é eu reagir assim, mesmo sabendo a quem
pertencem esses músculos em específico. Drake. Babaca. Hill. Também
conhecido como o meu pesadelo em forma de segurança.
Tudo bem, tudo bem.
Até eu preciso admitir que o homem é atraente... se você gosta do tipo
bruto, músculos e mau humor. Olhos verdes, cabelos loiros escuros e a barba

de ontem se foi, exibindo uma mandíbula forte no lugar.


Eu não gosto desse tipo, tenho certeza.
Só para deixar claro.
Não gosto.
Mas, pelo jeito, Grace gosta bastante. Não sei porque isso me
incomodou naquela hora. Seria ideal se ela se enrolasse com mais um dos
meus seguranças. Vou conseguir manter minha vida "normal" se ele estiver
distraído no quarto de hotel dela... Uma imagem desses braços fortes se
enroscando pela cintura da guitarrista me vem à mente e eu trato de afastá-la

mais que depressa.


Não. Grace não faz o estilo de Drake.
O Babaca deve gostar de alguém mais discreta, mais comedida, tão
rígida e careta quanto ele. Se bem que pareceu quase humano brincando com

Jus e John mais cedo. Até sorriu um pouco... Nunca imaginaria que os
músculos da face dele seriam capazes de fazer esse movimento!
Ok, já estou ficando obsessiva.
Me forço a parar de encará-lo e olho para o teto do meu jato. Meu
jato... Os tons suaves de bege e off-white que eu tanto gosto, os mesmos que
decoram a minha casa e me ajudam a sentir como se tivesse um pedacinho do
meu lar, mesmo estando longe.
Imagino o que meus fãs diriam se conhecessem minha casa de

verdade. Não acreditariam que é minha, provavelmente. Eles nem suspeitam


do meu lado meio Hannah Montana. Na verdade, ninguém suspeita, nem as
pessoas que estão nesse jato e que são a minha "família". Sou muito boa em
interpretar esse personagem que criei.
Só Jus sabe, claro. Meu empresário sabe TUDO sobre mim, desde que
bati na porta da gravadora que trabalhava e anunciei que ele estava olhando
para a próxima estrela da música.
Em minha defesa, eu estava certa.
Sem conseguir me controlar, dou mais uma espiadinha para o lado e o

vejo que meu novo segurança ligou seu Kindle, colocou óculos de grau e está
lendo compenetrado, com fones nos ouvidos.
Ok. Braços, óculos e livros são demais para mim. Até se o cara em
questão for - ECA! - Drake Hill.

O avião liga as turbinas, começa a taxiar e eu me viro para a janela,


tentando meditar um pouco, controlando meus nervos. Odeio voar, ainda
mais num tempo fechado como o de hoje. Fecho os olhos, respiro fundo,
limpo minha mente e seguro os braços da poltrona com força.
Odeio voar, odeio voar, ODEIO VOAR.
Droga, isso não é limpar a mente.
Se concentra, Roxy.
Mente limpa, mente limpa... Se eu estou pensando que a minha mente

está limpa, isso quer dizer que ela não está limpa, né?!
Quando sinto meu estômago subir e descer de volta para o lugar,
percebo que estamos no ar e relaxo um pouco. Acho que o pior já passou.
Abro os olhos e encontro Drake me encarando com o cenho franzido.
- Você está bem?
Inferno. Por que não continuou prestando atenção no seu livro?!
Tinha de presenciar isso?!
- Nunca estive melhor. E você, como está? A família vai bem?
Sua expressão preocupada se transforma em uma de impaciência. Ele

simplesmente me dá um olhar de desprezo por cima dos seus óculos e volta a


atenção para sua leitura. O meu piloto dá os avisos de sempre e comunica que
faltam seis horas para pousarmos em Lisboa.
Preciso pensar num plano bem elaborado para conseguir fugir de

Drake essa noite. Algo me diz que não vai bastar piscar os meus olhinhos
para ele, como fazia com os outros.
Uma aposta que você perde, uma única dança inofensiva de topless e
pronto, já mandam o James Bond para ser sua babá.
Já perdi as contas de quantas vezes tentei explicar para Jus o porquê
de eu fazer tudo isso. Eu só quero...
Um solavanco no avião me faz perder a linha de raciocínio e eu
agarro os braços da poltrona com todas as minhas forças. Ok, foi só uma

nuvem. Tudo bem.


Outro movimento brusco, dessa vez mais forte, e eu fecho os olhos. A
voz do meu piloto invade a cabine, junto com gritinhos das meninas e de
John. "Atenção passageiros. Estamos passando por uma área de turbulência e
nuvens de tempestade. Logo a situação se normalizará e..."
O som da cabine é cortado no momento em que as luzes se apagam e
outro solavanco ainda mais forte sacode o avião. O nervosismo começa a
levar a melhor sobre mim e minha respiração fica difícil, pesada dentro do
peito.

Eu não posso morrer hoje.


Será que eu deveria ligar para minha mãe e dizer adeus? Não, eu não
suportaria fazer isso.
- Roxy. - Uma voz me chama baixinho, logo antes de outra sacudida e

meus olhos caem em Drake. - Venha aqui.


- Eu estou bem. - Falo com a voz fraca e ergo meu queixo, não
querendo que ele perceba o quanto estou afetada, nem que estou prestes a
começar a chorar a qualquer instante.
Um novo movimento faz com que as máscaras de oxigênio caiam e eu
dou um grito desesperado, junto com todos na cabine.
Todos, menos Drake.
Nem um pouco abalado, ele continua me encarando com preocupação

óbvia nos seus olhos verdes. - Venha aqui agora, Roxanne.


Seu tom de voz é estranhamente tranquilizador, quase suave. Pela
primeira vez, eu não penso em contestar. Não estou nem aí para o sinal de
apertar os cintos. Não estou nem aí para o meu ódio por ele.
Engraçado o que a iminência da morte pode fazer por uma pessoa...
Solto a minha fivela e, com um pulo, me jogo em cima dele,
escondendo o rosto no seu pescoço e enrolando as pernas no seu colo.
Braços.
Seus braços fortes serpenteiam ao meu redor e ele me aperta contra o

seu peito. - Vai ficar tudo bem, Tampinha.


- Eu não posso morrer, Drake. - Murmuro contra sua camisa, sentindo
as lágrimas começarem a correr pelo meu rosto.
- Você não vai morrer. Eu juro. - Agarro o tecido entre os meus dedos

e ele sente meu desespero, me apertando mais forte. - Não no meu turno.
Se não estivesse totalmente em estado de choque, teria rido.
- Eu não quero morrer antes de realizar meu maior sonho... - Soluço e
mais lágrimas correm livres pela minha bochecha. - Eu não posso... Eu...
Sinto o avião dar outro pulo, mas ele me ergue bem na hora, me
ajudando a não sentir quase nada do movimento e começando a fazer carinho
nos meus cabelos, num movimento suave de vai e vem. - Qual é o seu maior
sonho? Me matar?

Agora sim eu não consigo evitar e dou um sorriso fraco.


- Esse é o segundo item da minha lista.
- Qual é o primeiro então, Princesa? - Pela primeira vez, o meu
apelido não vem carregado de uma dose extra de ódio e com pitadas de
desgosto. Sei que vou me arrepender das palavras assim que elas saírem da
minha boca, mas tudo bem. Vamos estar todos mortos em questão de
segundos mesmo...
- Eu não quero morrer antes de me apaixonar.
Capítulo 05 - Isso é uma promessa, Roxanne
Drake

Oh, merda. Eu esperava qualquer resposta, qualquer resposta mesmo,


menos essa.

"Eu não posso morrer antes de ganhar meia dúzia de Grammys."

"Eu não posso morrer antes de cantar com o Justin Direction, ou o One
Bieber. Ou seja lá de quem as pirralhas gostam hoje em dia."

"Eu não posso morrer antes de acabar com todo o estoque de glitter do
mundo."

Qualquer coisa serviria, menos isso. Eu... Eu... Não sei como
respondê-la.
Eu nem sei o que pensar.
Na verdade, eu sei.
Eu entendo perfeitamente o que está sentindo agora, mas não esperava
que isso viesse DELA. A Tampinha conseguiu me deixar ainda mais confuso.
O que tem por baixo de toda essa maquiagem pesada, afinal? Numa hora,
parece que tortura filhotinhos de coala por diversão. No segundo seguinte, ela
mesma parece um filhotinho de coala assustado.

O avião dá outra sacudida e começa a perder altitude. Ok, talvez seja


hora de me preocupar agora. Pelo menos, minhas contas estão pagas, minha
louça está lavada e eu não deixei cuecas no chão do meu banheiro. Minha
mãe ficaria possessa se entrasse no apartamento para fazer meu inventário e

achasse cuecas no chão e pratos na pia. Aposto que iria até o inferno me
caçar, só para puxar minha orelha.
Espero que ela deduza que o testamento está no cofre e que a senha é
a data do seu aniversário. E por que eu estou pensando nessas coisas?
Deveria estar pedindo perdão pelos meus pecados, isso sim. Pedindo para que
meu coração pare de bater tão acelerado, quanto está batendo agora. Pedindo
para que essa maldita turbulência acabe e Roxy volte a torturar filhotinhos de
coala em paz.

Seu pequeno corpo se convulsiona contra o meu e eu a aperto ainda


mais. - Você não vai morrer nem hoje, nem antes de se apaixonar. Isso é uma
promessa, Roxanne. - Murmuro contra o seu cabelo e até eu me surpreendo
com a verdade em cada uma das minhas palavras.
Aqui, sentindo minha camisa ficar mais e mais molhada a cada
segundo e seu cheiro suave de lavanda concentrado, percebo que estou
levando essa coisa de segurança muito mais a sério do que pensava.
Eu vou morrer doze vezes antes de deixar algo acontecer com essa
garota.

Outra sacudida ainda mais forte e aquela velha de história de ver a


vida passando diante dos olhos começa a acontecer comigo. O momento em
que decidi ser um agente especial, logo depois que meu pai morreu baleado
numa missão... A expressão nos olhos da minha mãe quando contei o que iria

fazer... O dia em que Paul morreu... O casamento de Jus... A fama que ganhei
na CIA... O dia em que finalmente tomei coragem de pedir minha
aposentadoria... Os olhos castanhos de Roxy me encarando desafiadores...
Engraçado como dizem sempre que você só tem uma vida.
Não concordo com isso.
Cada dia é uma nova vida que se inicia, uma nova chance de
recomeçar e fazer diferente. O momento em que compreendi todo esse
conceito, foi o momento em que pedi minha aposentadoria.

Mais uma sacolejada e as unhas de Roxy se cravam na pele do meu


braço. Consigo sentir seu sofrimento dentro de mim...
Por favor, Deus, Buda, Alá, Cosmos, Jah, qualquer um que esteja de
plantão no momento, não deixe que nada aconteça com Roxanne.
Quer dizer. Não me mate antes que eu possa ver a cara de
constrangimento da Tampinha por ter se aninhado contra mim como uma
gatinha assustada. Não posso morrer sem ver isso.
Um outro movimento brusco parece nos jogar para frente e eu a ergo
em meus braços de novo. Sabia que esse trabalho acabaria me matando, mas

não imagina que seria assim. Nem que seria tão rápido.
Do mesmo modo como tudo começou, tudo cessa. Sinto o exato
momento em que deixamos para trás a zona de turbulência e a aeronave se
estabiliza.

Só então percebo como estava alheio ao resto das pessoas, isolado na


pequena bolha que ergui ao nosso redor. As outras meninas estão todas
chorando, Jus e John estão gritando que se amam e a aeromoça reza alto.
Deixo meus próprios ombros relaxarem, fecho os olhos e respiro fundo o
cheiro de lavanda, conseguindo restaurar minha calma.
Passou...
Passou mesmo...
A voz do piloto preenche a cabine num tom alegre, mas que permite a

mim e aos meus ouvidos treinados identificarmos todo o seu nervosismo.


"Senhores passageiros, deixamos a zona de turbulência para trás e o aviso
de apertar cintos foi desligado. Desfrutem o resto do seu voo."
SCHEIBE! Desfrutem o caral**.
Mesmo com o aviso, Roxanne continua agarrada em mim como se
sua vida dependesse disso. - Hey, Princesa. Está tudo bem agora. - O tom da
minha voz é baixo e surpreende até a mim. Mais um pouco e sou eu quem vai
virar um filhotinho de coala. - Está tudo bem, Tampinha.
Só então sinto seu corpo começar a relaxar. Primeiro os soluços vão

diminuindo, depois a pressão das suas unhas cravadas no meu antebraço se


alivia. Mais alguns segundos e sinto o exato momento em que sua crise de
pânico passa.
Roxy se levanta de um pulo, olhando ao redor como se só agora

tivesse entendido onde estava, e o que estava fazendo. Seus olhos estão
vermelhos, assim como suas bochechas, o desafio da sua expressão perdeu
espaço para a confusão. Ela olha para a mancha na minha camisa, depois para
o meu rosto e deixa escapar um suspiro.
- Obrigada por... isso. - Aponta para o meu colo, toda constrangida.
Ok, agora estou assustado para valer. Será que está em choque ainda? - Mas
se disser uma palavra sobre isso para alguém, eu faço steak tartare com uma
parte bem específica da sua anatomia, usando só o meu alicate de unha.

Eeeeee... voltamos ao normal.


Amém. Valeu, Jah.
Dou uma gargalhada na sua cara, sem nem tentar me controlar. Suas
ameaças são engraçadas demais. - Anotado, Princesa. - Pelo menos o tom da
minha voz voltou ao normal também.
Ninguém é mais um coala aqui, todos estão rosnando como deveria
ser.
Ela se senta na sua poltrona e mais que rapidamente tira algo como
um lenço da sua mochila, limpando a maquiagem borrada e passando algum

tipo de pó. Eu a vejo respirar fundo algumas vezes e plantar um sorriso no


rosto. Quando Jus se levanta para checá-la, ninguém poderia dizer que estava
totalmente descontrolada 30 segundos atrás.
- Rox, está tudo bem?

- Tudo tranquilo, Jus. - Se a carreira de cantora não der certo, a de


atriz está garantida.
Ele estreita seus olhos para sua resposta, parecendo preocupado. -
Mesmo?
- Não iríamos morrer hoje, Justin. Vaso ruim não quebra. - E lança
um olhar significativo para mim.
Ok, ela está 100% bem mesmo.
- Você não teria a sorte de conseguir me matar na primeira hora de

trabalho, Princesa.
- Eu quase morri dois minutos atrás, não estou disposto a lidar com
vocês dois agora. - Nosso chefe volta para a frente do avião balançando a
cabeça e nos deixando a sós.
Roxy tira os maiores óculos de sol que já vi e coloca no rosto, junto
com fones de ouvido também de glitter, numa clara mensagem de que quer
ignorar o mundo.
Tudo bem por mim.
Pego meu Kindle que acabou caindo no chão quando ela veio se jogar

em mim, e tento me concentrar em Dom Quixote, mas meu cérebro só quer


pensar em uma coisa.
Viro na minha poltrona e puxo um dos seus fones. - É verdade o que
falou mais cedo? Sobre se apaixonar? - Pergunto num murmuro e ela me

encara por vários segundos. Ao invés de me responder, se abaixa e procura


algo na sua mochila.
Mas hein?!
Depois de alguns segundos, acha o que quer que seja e joga para mim.
Apanho no ar e começo a gargalhar na hora.
Um alicate de unha.
Capítulo 06 - Boa tentativa, Princesa
Roxy

Que droga.
Que droga, que droga, que droga.
Eu e minha boca grande!

Por que eu não aproveitei e também já contei para ele o número do


meu cartão de crédito, o modelo de calcinha que uso, que ele tem ótimos
braços e um cheiro maravilhoso de musk?!
Droga, droga, droga!
Se eu tivesse falado sobre os braços e o cheiro, simplesmente pegaria
um paraquedas e me jogaria daqui agora mesmo. Talvez eu ainda faça isso, se
o imbecil não parar de rir da minha cara nos próximos 10 segundos.
DROGA. DROGA. MAS QUE DROGA.

Decido voltar a ignorá-lo e aumento o som dos meus fones, deixando


a batida pesada da Black Road no último volume abafar a gargalhada do
babaca. Aproveito para mandar uma mensagem para os meus pais, dizendo
que os amo. Por que, né?! Antes tarde do que nunca.
Depois, passo o resto do voo escrevendo cartões para a minha lista de
fãs especiais. Essa é uma das partes preferidas do meu dia. O Spotify sempre
me manda as pessoas que mais ouvem as minhas músicas e me fornece seus
endereços. Um belo dia, elas recebem um postal de agradecimento de
surpresa nas suas casas. Não é demais?! Melhor jeito de valorizar quem é fã

de verdade.
Só acho que seria um pouco mais fácil me concentrar no trabalho se
não sentisse um certo olhar de águia sobre mim, me queimando de dois em
dois minutos.

Estou começando a achar que fugir dele hoje vai ser mais difícil do
que pensava.
Tudo bem. Se tem alguém que dá conta, esse alguém sou eu.
Retribuo seu olhar com uma expressão que diz claramente “Desafio
aceito, Babaca”.

**

- Sairemos para a gravação do "Bom Dia, Portugal" amanhã, às 8h.


Quero todos prontos no café, às 7h30. Descansem. O dia de hoje não foi fácil
para ninguém.
Ah! Conte-me mais sobre isso, Jus.
Ele logo se despede e sobe com John, seguidos por Sara e Emma.
Enquanto isso, Grace está muito ocupada falando algo em voz baixa com
Drake que ri de leve, preparando um café na máquina de expresso do hall do
hotel.
Nem parecem ter ouvido o que Justin falou.

Ótimo. Simplesmente ótimo.


E eu nem estou sendo irônica dessa vez.
Quero dizer, é ótimo mesmo. Pelo menos para os meus planos.
A noite de Lisboa me aguarda!

Pego minha mochila, minha chave e marcho em direção ao elevador,


sem olhar para trás. Grace não perde tempo, tenho de admitir. A última coisa
que vejo, antes das portas se fecharem, são os olhos de Drake brilhando
desconfiados para mim, por cima do ombro da minha guitarrista. Dou uma
piscadinha e vejo sua expressão de desconfiança aumentar.
Ah, homem.
Você não perde por esperar.
Entro no meu quarto e ajo com rapidez, aproveitando sua distração.

Troco minha roupa do voo por um vestido curto e preto, coloco botas sem
salto que vão até o meio das minhas coxas e retoco minha maquiagem. Meus
olhos ainda estão inchados da minha crise de mais cedo, mas não quero
pensar nisso agora.
Ligo a TV no Disney Channel, deixo todas as luzes do quarto acesas e
coloco para rodar no sistema de som uma gravação da minha última ligação
com a minha mãe, seguida por uma gravação do meu secador de cabelo
funcionando e depois outra ensaiando com o violão.
Pego meu celular, meu cartão e escondo os dois no meu decote. Com

a agilidade adquirida em todos esses anos, abro as portas duplas da sacada


sem fazer barulho e sorrio para a noite escura que se estende na minha frente.
Ah, o doce cheiro da liberdade.
Passo as pernas pela grade e me equilibro por alguns segundos, antes

de alcançar a varanda ao lado num pulo. De lá, passo silenciosamente para a


terceira sacada, até chegar ao quarto que reservei pela internet com um
pseudônimo.
Sua porta dá para o corredor oposto ao meu, bem ao lado da escada de
funcionários, o que possibilita a rota de fuga perfeita. Uma ligação exigindo
que a varanda estivesse aberta, porque eu "quero que o vento circule as
energias do lugar" e voilá! Estou a um passo da noite que me espera.
Piso no carpete macio e as luzes se acendem instantaneamente, me

cegando por alguns segundos... Mas eu não preciso enxergar para reconhecer
a voz rouca que me recebe.
- Boa tentativa, Princesa.
- Ah, você só pode estar de brincadeira comigo. - Vejo Drake cruzar
aquelas toras que chama de braços e estreitar os olhos para mim.
- Eu avisei. Seus dias de bares de motoqueiros, capas de tabloide e
terrorismo contra pobres seguranças inocentes acabaram.
Dou um suspiro resignado e me jogo na cama macia, sentindo o meu
cheiro da liberdade voar para fora da sacada aberta, carregado pelo meu

"vento para circular as energias".


Ah, as ironias da vida...
- Vamos lá, me ajude a ser melhor na próxima. O que foi que me
entregou?

- É bem simples, Tampinha. - Ele não se mexe um milímetro, mas


consegue parecer mais assustador do que nunca, as rugas do seu rosto se
vincando mais a cada segundo e a desaprovação emanando do seu corpo
como ondas. - Você subestimou o seu oponente e deixou um rastro de
referências.
- Como é? Um rastro de referências? - Agora é minha vez de olhá-lo
como se tivesse enlouquecido. Do que o homem está falando?
- Minha irmã me fez assistir "Um Lugar Chamado Notting Hill" mais

vezes do que eu poderia contar, Roxanne. - DROGA, quem diria que o


brutamontes sem cérebro conheceria essa?!
Tento não deixar me abalar pela imagem desse homem gigante
assistindo uma comédia romântica, deitado no sofá com sua irmã, comendo
pipoca e usando calças de moletom... UGH!
Eu total tirei a minha ideia do filme, mas não vou entregar essa fácil
assim para ele.
- O que uma coisa tem a ver com a outra? - Finjo analisar minhas
cutículas, me fazendo de blasé e evitando encará-lo. E vou continuar assim

até as imagens de calças de moletom sumirem da minha mente.


- A primeira coisa que fiz quando chegamos aqui foi pedir a lista de
hóspedes do hotel. Sabe, para procurar ameaças em potencial. - Finalmente se
move, andando devagar para o lado da cama onde estou, o suspense do seu

caminhar combinando com o tom das suas palavras. - Imagina qual foi a
minha surpresa quando encontrei uma reserva em nome de uma Senhorita
Mulan?!
Pronto! Seu tom de deboche apaga as calças de moletom da minha
cabeça e eu consigo voltar a encará-lo com raiva, sustentando seu olhar e
erguendo o meu queixo. - Isso não quer dizer nada, Hill.
- Quer dizer tudo. Quando você dá uma olhadinha na planta do hotel e
repara na coincidência do quarto da Senhorita Mulan ser ao lado da escada de

funcionários, no corredor oposto ao seu e ao meu quarto, tudo faz sentido.


Chegou até a ser um momento bonito e emocionante, como quando você
termina de montar um quebra-cabeças de cem peças. Não, não. Eu teria
demorado mais se fosse de cem peças. Vamos dizer que é um de doze peças,
daqueles para criança.
O homem é inteligente. Mais inteligente do que todos os outros
juntos.
Droga, Justin. Tinha mesmo que contratar o James Bond?!
- Ótimo. Um oponente à altura só torna as coisas mais interessantes. -

Me levanto e paro na sua frente, cruzando os braços para imitar sua pose de
durão. - E para deixar claro, essa sua carinha de lobo mau não vai me parar.
A impaciência dos seus olhos perde espaço para outra coisa...
Curiosidade talvez? - Por que você faz essas coisas, Princesa? Por que essa

vontade toda de fugir?


Ninguém me perguntou isso antes.
Ninguém supôs que havia um motivo.
De todas as pessoas do mundo, tinha que ser ele a perceber?
Justo a ÚLTIMA pessoa para quem eu contaria...
Ah, as ironias da vida - Parte 2.
- Porque eu sou uma pirralha mimada, lembra?! É isso que pirralhas
mimadas fazem. Agora, se me der licença, vou para o meu quarto como a boa

menina não-comportada que sou e começar a bolar meu próximo plano


maléfico para devorar pobres seguranças inocentes. - Tento dar um passo
para o lado, mas ele se move mais rápido, entrando no meu caminho.
- Eu não acredito em você.
- Seria lindo se eu me importasse com o que acha, não é?! - Engulo
em seco e tento não me afetar pela sua intensidade. - Pode só me deixar ir de
uma vez? Você já ganhou esse round, ó Poderoso Chefão Babaca. - Passo por
ele e esbarro no seu ombro de propósito mais uma vez.
Quer dizer, meu ombro esbarra no seu cotovelo. Malditos 1m58.

- Vou te dar um voto de confiança dessa vez, Roxanne. - Sua voz me


alcança quando eu já estou quase na porta e eu me viro, voltando para perto
dele. - Mas na próxima tentativa de fuga, eu me mudo para o seu quarto.
- Isso é uma ameaça? - Estreito meus olhos, chegando ainda mais

perto, quase encostando nossos corpos.


- Não. - Ele abaixa o seu rosto, terminando de fechar o espaço entre
nós. - Isso é uma promessa.
- Você está blefando. - E não é que o cara até que tem um cheiro
bom... Não. Foco, Rox! Foco! - Tenho certeza que não conseguiria viver
cinco minutos no mesmo quarto que eu.
- Pague para ver então. Se não funcionar, meu próximo passo vai ser
comprar uma daquelas camisetas duplas. Sabe, para irmãos que brigam

demais?! Podemos até mandar estampar "Babaca e Princesa" na frente, se


quiser. - O IMBECIL capricha no desprezo ao falar o meu apelido e ainda me
dá um sorrisinho sacana.
ARGH!
- Eu te odeio, Drake Hill! Odeio! - Giro nos meus calcanhares,
fazendo questão de acertar meu cabelo bem na sua cara, e saio marchando
porta a fora. - Eu odeio esse cara. Eu odeio esse cara. EU ODEIO ESSE
CARA.
Grito alto o suficiente para que ele escute pelo corredor, antes de bater

a porta do meu quarto. O quarto real dessa vez. Me tranco e olho ao redor,
imaginando o Babaca dormindo no pequeno sofá ao lado da janela, usando
uma camiseta regata que deixe ver seus braços...
NÃO.

PÉSSIMA IDEIA.
PÉSSIMA. IDEIA.
Desligo a gravação do meu secador de cabelo e pego o cardápio do
serviço de quarto, me conformando com a noite enfadonha que terei pela
frente. Sei que não adianta tentar sair hoje de novo, mas amanhã é dia de
show.
Muita gente, muita muvuca, muitas distrações.
E muita liberdade para a Roxy.
Capítulo 07 - Você está tendo um aneurisma?
Drake

Desço para o café da manhã ainda sorrindo e balançando a cabeça,


impressionado com as ideias mirabolantes da Tampinha. A garota é mais
esperta do que muitos agentes com quem já trabalhei. Teria sido o plano

perfeito, se eu não fosse tão... Eu.


Preciso lembrar de agradecer minha irmã pelas 87 vezes em que tive
de assistir aquele maldito filme. Sinto que já vi a cara do Hugh Grant mais
vezes do que vi a minha própria, mas acabou sendo útil. Quem diria?!
No canto mais afastado do salão de café da manhã encontro o "Bonde
da Roxy" todo reunido. Meu olhar esquadrinha a mesa atrás da dona da festa,
mas ela não está à vista. Será que...
Não.

Tenho certeza que não.


Meus informantes teriam me avisado se ela tivesse colocado um
dedinho que fosse para fora do quarto.
- Bom dia, Drake. - Grace sorri e apoia seus cotovelos na mesa assim
que me vê, numa forma clara de destacar o seu decote. Nada contra, que fique
claro. Gosto de mulheres que sabem o que querem e vão atrás.
Do mesmo jeito que eu sei o que não quero e do que eu devo ficar
bem longe.
- Bom dia, Grace. Bom dia, Senhoritas. - Sara e Emma sorriem doces

para mim, antes de voltarem a conversar com as cabeças unidas. Gosto dessas
duas, parecem tranquilas. Não exalam cheiro de problema, como todas as
outras. - Bom dia, Justin. E John, você está radiante essa manhã. - Escolho
justo o lugar ao seu lado para me sentar, só pelo prazer de ouvir Jus rosnando.

- Queria muito saber porque eu só tomo péssimas decisões nessa


vida... - Ele olha para mim e balança a cabeça.
- Falando em péssimas decisões, sua querida e amada Princesinha do
Pop tentou fugir ontem de novo. - Me sirvo de uma xícara de café preto e sem
açúcar, que desce queimando do jeito que eu gosto.
- E conseguiu?
Reviro os olhos. - Assim você me ofende, Justin Rezzo.
- Ótimo, continue assim. Enquanto isso, pode fazer a gentileza de

levar o café da manhã para ela? Preciso definir o setlist com a banda antes de
irmos para a gravação.
Ergo uma sobrancelha para ele. - Além de babá, eu sou garçonete
agora? Qual vai ser a minha próxima atribuição adorável? Manicure?
- Desde que você tenha esmaltes de glitter em algum dos bolsos do
seu terno, não vejo porque não. - Seu sorrisinho de deboche é irritante.
Eu sei que seria besteira Roxanne descer aqui, com todas essas
meninas que obviamente descobriram onde a Tampinha está hospedada e
lotam as mesas do restaurante, mas não consigo evitar a frustração por ter me

enfiado nessa situação mais uma vez.


Não vou nem ficar surpreso se acabar virando manicure dela mesmo.
Pego a bandeja que o garçom trouxe, com o que eu imagino ser o café
da Princesa, pela quantidade de coisas integrais e sem graça. - Eu espero, pelo

menos, um aumento por isso, Justin. - Termino o meu expresso preto num
gole só e saio da mesa, não sem antes dar uma piscadinha para John, que sorri
para mim.
- E eu espero que você se comporte, mas nenhum de nós pode ter o
que quer, aparentemente. - Ele grita para mim e eu sorrio.
Olha aí o "lado bom" atacando de novo. É “bom” poder passar um
tempinho de qualidade com Jus e toda sua rabugice. Senti falta mesmo desse
cara nos últimos anos.

Equilibro a bandeja em uma mão e bato na porta do quarto de Roxy, o


verdadeiro, bem ao lado do meu, com a outra. Espero alguns segundos e
nada.
Bato mais uma vez...
Nada de novo.
- Princesa, está na hora do seu café da manhã real. - Anuncio, para o
caso dela estar achando que sou uma das suas fãs histéricas que fugiram
direto do recreio da 5ª série.
- Deixa aí na porta. - Olha que avanço, a Tampinha está no quarto e

sua voz não parece saída de uma gravação caseira.


Mas ainda assim algo não cheira bem.
- Não teste minha paciência tão cedo e abra de uma vez, Roxanne. -
Ordeno com a voz firme.

- É só um café da manhã, Babaca. Não vou me esconder dentro do


açucareiro.
- Tudo bem. - Coloco a bandeja no chão e dou um passo para trás,
cruzando os braços. - Seu desejo é uma ordem. Até mais. - Falo, mas não me
mexo. Não tem a menor chance de sair daqui antes de ter certeza que ela não
está aprontando nada.
Escuto as fechaduras sendo destrancadas e a porta se abre devagar...
Oh, scheibe.

Eu deveria ter ido embora.


Ela tinha razão.
Eu deveria mesmo ter deixado a bandeja ali e ido embora.
Roxy aparece na minha frente usando só um roupão, com os cabelos
molhados, e sem uma gota de maquiagem. Um som suave de música clássica
vem de dentro do quarto e a luz do sol brilha forte, iluminando ao redor do
seu corpo num cenário quase surreal.
Ela é...
É...

...
Linda.
- Você está tendo um aneurisma? - Ela pergunta com uma careta, me
arrancando à força dos meus pensamentos totalmente errados.

E assustadores.
E preocupantes.
Não, camarada. Não vá por esse caminho.
- Eu quase ficaria mais tranquilo se esse fosse o caso mesmo. -
Balanço a cabeça, tentando colocar meus pensamentos de volta num lugar
seguro. - Por que não queria abrir para mim? O que está escondendo aí?
- Não é óbvio, Babaca? - Ela abre os braços e dá um passo para mais
perto da porta, me deixando vê-la melhor e me obrigando a sufocar um

gemido de sofrimento. Ok, não adianta negar. Ela é linda e não tem nada que
eu possa fazer quanto a isso, além de reclamar. - Eu não estou pronta ainda.
- Realmente, foi até um pouco difícil te reconhecer sem a nuvem de
glitter ao redor. - E, pelo bem de todo mundo, espero nunca mais vê-la
assim. - Vamos sair em meia hora.
- Eu sei, mal posso esperar para passar meu dia todinho com você ao
meu lado. - Me dá um falso sorriso doce. - Nem sei como vou aguentar viver
essa meia hora, sem deixar a saudade me consumir.
Decido ignorar sua atitude, pego a bandeja do chão e entro sem dar a

chance dela me impedir. O sistema de som está mesmo tocando música


clássica, seu quarto é todo organizado e, para completar, uma vela com cheiro
de lavanda queimando na mesa deixa o espaço quase zen.
Não tem nada de errado aqui. Nenhuma bomba caseira, nenhuma

corda de lençóis pendurada na janela... Desisto.


Treze personalidades diferentes é muita coisa para um cara lidar.
Coloco a bandeja na mesa e me viro, a encontrando parada perto da
porta, sua postura totalmente contraditória. Os braços estão cruzados, num
claro sinal de nervosismo, mas o queixo está erguido em desafio, como
sempre.
- Meia hora e te encontro no corredor. - Rosno para ela quando passo
ao seu lado. - Não me faça voltar aqui, ok?

- Não posso prometer nada. Ter você invadindo meu espaço pessoal é
tudo que eu preciso para começar bem um dia. - Outro sorriso de escárnio e a
porta bate na minha cara, não atingindo meu nariz por milímetros.
MILÍMETROS!
Volto para a sala de café da manhã precisando urgente de mais uma
dose de cafeína. Uma dose cavalar de preferência.
Tudo bem. Eu sabia que Roxanne não era feia, mas nada poderia ter
me preparado para o que estava realmente por baixo da maquiagem pesada e
das roupas chamativas. É quase como se ela se escondesse... Ou usasse um

disfarce...
- E ele voltou inteiro. Aleluia, irmãos! - A mesa está vazia agora, a
não ser por Justin com seu notebook na frente e sua vitamina de frutas ao
lado.

- Já é o segundo dia e eu não me joguei na frente de um carro ainda.


Está orgulhoso de mim?
- Orgulho é tudo que eu sinto quando olho para você. - Acho que esse
negócio de sarcasmo é contagioso mesmo. Os sorrisinhos espertinhos
também. - Você viu como está lá fora?
- Sim. Centenas de garotas gritando e fazendo meus tímpanos
correrem sério perigo. - Sento ao seu lado e me sirvo de uma xícara com todo
o resto do café que sobrou na garrafa. - Só precisamos sair pela porta de trás e

tudo vai ficar bem.


- Roxy não gosta de sair por trás. Ela quer que as pessoas tenham a
oportunidade de vê-la, mesmo que não consiga conversar com eles, ou tirar
fotos. - Volta a digitar, sem olhar para mim. - Nós nunca saímos por trás.
Suspiro.
- Claro que não. Por que ela gostaria de qualquer coisa que pudesse
ser mais seguro e que ainda facilitaria minha vida, não é?!
- Lembre-se. Na lista de prioridades de Roxy, segurança está na
posição 37, logo depois de comer vagens e ler livros sobre física quântica.

- 37?! Melhor do que eu pensava, confesso. - Engulo uma torrada. -


Achava que segurança nem entraria na lista de prioridades de Roxanne Reed.
- Ha-ha. Muito engraçadinho. Preciso buscar o resto das minhas
coisas e te encontro na van. - Ele se levanta para sair, mas se vira e para na

frente da mesa, me encarando sério. - E Drake?


- Sim? - Respondo simplesmente, mais interessado em me servir de
bacon.
Ah, bacon... faz o mundo parecer tão mais fácil.
- Obrigado por tudo. - O tom da sua voz me obriga a olhá-lo e ele vem
colocar a mão no meu ombro. - Não faz ideia de como estou muito mais
tranquilo com você aqui.
Eu o encaro de volta e trocamos alguns segundos de comunicação

silenciosa.
"Sim, eu sou incrível. De nada. Também te amo."
- Tá, tá. Chega de melação. - Quebro nosso momento voltando a
mastigar meu bacon feliz e espetando algumas salsichas de brinde. - Você
sabe que se Roxy me matar, vai ter de acertar as contas com a minha mãe.
- É uma sorte que ela goste mais de mim do que de você então. -
Droga, Jus tem sempre resposta para tudo. Mostro o dedo do meio para ele,
que sai da sala gargalhando e balançando a cabeça.
Idiota.

Termino meu café, meus bacons, como uma banana e olho no relógio
pendurado na parede do restaurante. Está na hora de mais um pouco de
tortura. Levanto e aliso meu paletó, sentindo os olhares de todas as fêmeas
em mim.

Não, não senhoras.


Nada aqui para vocês.
Abro mão do elevador e subo as escadas num pique só, para já ir
aquecendo para o "jogo de rúgbi" que me aguarda, quando tiver que
atravessar a multidão lá fora com a Tampinha a tira colo.
Falando no diabo...
Encontro Roxy trancando a porta do seu quarto e é quase como se
estivesse vendo uma pessoa diferente. Vestido de couro, saltos de glitter,

maquiagem preta carregada...


É oficial.
Eu desisto de tentar entender esse ser humano.
Ela me vê e cruza os braços na hora, fazendo uma careta. - Outro
aneurisma? Ou minha nuvem de glitter está afetando seu cérebro?
Reviro os olhos e chamo o elevador. - Está pronta para ir?
- Não. Estou pronta para sair e ganhar o mundo, como eu faço todos
os dias. - Me dá um olhar esnobe, antes de colocar óculos de sol gigantes
também cheio de brilhos e sair desfilando pelo corredor até chegar a mim.

Descemos em silêncio e eu me distraio mais uma vez com a


fragrância de lavanda suave que sempre a acompanha.
Droga de cheiro.
Prendo a respiração pelo resto do caminho e pronto! Problema

resolvido.
Na entrada do hotel, suspiro ao ver que a multidão só aumentou e nem
consigo enxergar o final da aglomeração, que dirá a van que deveria estar nos
esperando. - Excelente, simplesmente excelente.
Ao meu lado, sinto o corpo de Roxy ficar tenso. - Não imaginava que
teriam tantas pessoas.
- Vamos lá. Quanto mais cedo começarmos, mais cedo terminamos. -
Tiro a mochila dos seus ombros e coloco nos meus, me postando bem ao seu

lado. - Tente não morder minha mão, por favor.


- Não posso prometer nada. - Ela nunca pode prometer nada! Sai
andando sem olhar para trás e eu a alcanço em dois passos, sem nem me
preocupar em esconder meu rosnado de descontentamento.
No momento em que a Tampinha aparece na porta, a multidão vai à
loucura e avança em sua direção, fazendo os pelos dos meus pescoços se
eriçarem. Justin vai na frente com John, tentando abrir espaço, enquanto eu
me aproximo mais dela, meus braços pairando tensos ao seu redor. As
garotas se espremem mais, tentando chegar até Rox e uma agonia se instala

no meu peito. Eu só consigo pensar em chegar a esse bendito carro logo, não
me sinto no controle da situação aqui e não tem nada que eu odeie mais.
Gritos, flashes e mais pessoas nos jogando de um lado para o outro,
como se estivéssemos nos afogando em um mar de gente.

"Não quero morrer antes de me apaixonar".

As palavras dela rondam a minha mente no exato momento em que


um paparazzo fura o corredor, logo após Jus passar e enfia a câmera na cara
da Princesa, a fazendo se desequilibrar nos seus saltos.
Mais que depressa, eu a seguro pela cintura e rosno para o homem. -
SE AFASTE AGORA.

Ao invés de entender o tom assassino da minha voz, o imbecil


continua parado no mesmo lugar. Eu intensifico o meu aperto na cintura fina
de Roxy e uso meu outro braço para afastá-lo com uma única cotovelada.
Leve até, para os meus padrões, e de um jeito que eu sei que não vai deixar
marcas, ou provas.
Só quando chegamos à van e John fecha a porta atrás de nós, é que
consigo voltar a respirar. Percebo que ainda estou com uma das mãos
segurando seu pequeno corpo e seus dedos estão cravados no meu braço, do
mesmo jeito que fez no avião.

Não estou acostumado a me afetar assim, scheibe! O que está


acontecendo?
Encaramos um ao outro por alguns momentos, os dois com os olhos
arregalados, até eu dar um último aperto leve na sua cintura e soltar minha

mão, me afastando. - Eu preferia enfrentar meia dúzia de traficantes


colombianos com as minhas mãos amarradas, do que passar por isso de novo.
História real.
Naquela vez eu nem suei. E, com certeza, não fiquei com o coração
acelerado.
- Por que não desiste então? - Rox me dá um falso sorriso doce,
aparentemente recuperada do choque.
Na verdade, seria isso que um observador menos atento pensaria, mas

ainda consigo ver o pavor brilhando por trás do seu olhar desafiador e o jeito
como seus dedos estão trêmulos.
- Porque já que estou aqui, vou levar esse Karma até o final. Não
quero correr o risco de te encontrar na próxima vida. Você, provavelmente,
vai voltar como barata e eu teria que voltar também.
Ela estreita os olhos para mim até virarem fendas. - Eu te odeio,
Drake Hill. - Sorrio feliz e aliviado, sentindo meu corpo relaxar. Agora sei
que está tudo bem. Então, se vira para Justin, que acabou de desligar o celular
depois de gritar a plenos pulmões com o gerente do hotel sobre as óbvias

falhas de segurança. - Eu odeio esse cara, Jus.


- Nossa, se você não tivesse me contado, eu nem teria percebido. - Ele
começa a conversar com John, nos ignorando de propósito e encerrando o
assunto.

Aproveitando a deixa, Grace se inclina por cima do banco para chegar


até mim, seu perfume doce me fazendo ter vontade de enrugar o nariz, mas
me controlo no último segundo. - Você está bem, bonitão?
Viro para ela e sorrio. - Acredite, já passei por coisas piores. Estou
ótimo.
- Que bom, fico tão aliviada. - Ela coloca sua mão no meu pescoço,
arranhando as unhas ali de leve. - Quer ir malhar comigo quando voltarmos
para o hotel?

- Ele não pode. - Roxy interrompe, se esticando por cima de mim para
lançar um olhar duro para a sua guitarrista. - Temos um compromisso.
Tento segurar uma gargalhada que está prestes a explodir da minha
garganta. - Nós temos?
- Sim, nós temos. - Ela fala com firmeza e minha diversão só
aumenta.
Ah, Tampinha. Se nós tivermos algum compromisso de verdade, eu
juro que uso tutu de balé por uma semana.
- Que compromisso vocês dois têm? - Grace pergunta desconfiada.

- É, Roxanne. Que compromisso nós dois temos?


- Nós temos... Temos... - Olha ao redor, procurando alguma desculpa
para dar, e seus olhos caem para os músculos do meu braço. - Aula de Defesa
Pessoal. Lembra, Babaca? Foi você que insistiu.

Fick Dich!
Acho que nunca quis tanto rir na vida!
- Lembro, claro que lembro. É minha cara insistir para dar... aulas
para você. - Viro para a pobre Grace, que está fazendo um biquinho de
decepção. - Podemos malhar amanhã.
- Combinado! - Ela responde antes que a Princesa consiga inventar
qualquer outro compromisso fictício e volta para o seu banco.
A van estaciona e eu desço na frente, estendendo minha mão e

sussurrando quando ela passa. - Você vai me explicar essa mais tarde,
Tampinha. Durante a nossa... "aula".
Ao invés de me responder, ela só crava suas unhas na palma da minha
mão, me fazendo sorrir ainda mais. Oh, cara. Esse papo vai ser, no mínimo,
divertido.
Para a minha sorte e para o bem da minha sanidade, a entrevista
transcorre sem percalços. Roxy sorri, é simpática com todos e não há
ninguém com atitude suspeita no estúdio. Antes dela começar a cantar com a
banda, eu me dou alguns minutos de sossego e tranquilidade no camarim

como recompensa. Me jogo no sofá e cubro o rosto com o braço...


- Preciso que vá com Roxy para o hotel, tenho que ir com a banda
para o estádio.
Minutos? Desculpe, eu quis dizer meio segundo.

- Claro que precisa.


- Mandei que o motorista buscasse o sedã. Pode dirigir?
- Claro que posso.
- Vão ficar bem?
- Claro que vamos.
- Está escutando o que estou falando?
- Claro que não.
- Ótimo. Vou pedir para ela encontrar você e seu bom humor aqui,

quando a gravação acabar.


- Claro que vai. - Ouço a porta bater e suspiro, pensando que o dia
está só começando. Ainda vamos embora sozinhos...
Preciso mesmo relembrar a parte do meu treinamento sobre se
distanciar das situações. Eu estou me deixando afetar muito por... todo esse
glitter. Eu nunca me deixo afetar. Nunca. Eu tenho uma missão, eu me
concentro na missão, eu cumpro essa missão.
Sempre assim.
Essa purpurina deve ser tóxica, só pode.

- Estou pronta para ir, Babaca. - Ela joga algo em cima de mim, que
eu descubro ser sua mochila.
O tempo passa mais rápido aqui na glitterlândia? Parece que faz dois
segundos que Jus saiu. Eles deveriam mandar todos os agentes especiais

terem as aulas de controle de raiva aqui, isso sim.


Me levanto, pego sua bolsa, e saio ainda sem encará-la. Entro no
elevador e ela me segue, digitando furiosamente em seu celular. Aperto o
botão do térreo e me recosto na parede de alumínio gelada.
15 andares.
14.
13.
12.

Um solavanco e as luzes se apagam, logo antes da caixa de metal


parar completamente e nós dois suspirarmos ao mesmo tempo.
- E bem quando a gente pensa que não dá para piorar...
Capítulo 08 - Ele é lindo
Roxy

- Princesa, estou começando a acreditar que sempre é possível piorar,


quando se trata de nós dois juntos.
A luz fraca de emergência só me deixa ver o contorno do seu corpo

gigantesco saindo do canto do elevador e pegando o telefone que fica ao lado


do painel de botões, seus dedos batucando com impaciência nas paredes
metálicas.
Primeiro, ele me viu toda desarrumada mais cedo e ficou fazendo
aquelas caretas que eu não faço ideia do que significam. Depois, teve aquele
treco do abraço enquanto me salvava da multidão e a maneira totalmente
incompreensível como meu corpo decidiu reagir ao contato.
A ferocidade com que me defendeu daquele paparazzo, o apertão na

minha cintura e o olhar que trocamos na van... tudo me deixou confusa. E


agora tem mais essa para eu lidar!
Qual é, Universo?
Que raios eu fiz para merecer todos esses castigos?
Foi por causa do chiclete que colei embaixo da carteira na 2ª série?
Eu já pedi desculpas por isso, poxa!
- Eles não estão atendendo. - Drake volta o fone no gancho com muito
mais força do que o necessário, antes de tirá-lo meio segundo depois para
tentar de novo.

- Pelo amor do que resta da minha sanidade, dá um jeito da gente sair


daqui logo. - Fecho os olhos e massageio as minhas têmporas, tentando
manter a calma.
- Estou tentando, Tampinha. - Parece tão desesperado quanto eu. -

Pensa só, em último caso, eles podem seguir seu rastro de glitter e nos achar.
Dou um gemido de sofrimento, me viro de costas para ele e começo a
bater com a testa na parede. - Eu preciso sair daqui! - Outra batida. - Eu
preciso sair daqui. - E mais uma, só para eu ter certeza de que isso não é um
pesadelo. - Não quero ir para cadeia por homicídio. Sempre pensei que minha
primeira passagem seria por "Atentado Leve ao Pudor".
- Tudo bem, eu deixo você alegar legítima defesa.
- Você não tem que deixar nada. Você vai estar morto, camarada.

O escuto batendo o fone mais uma vez, antes de tirá-lo de novo do


gancho.
Alivia o meu lado aí, entidades superiores. Eu juro que nunca mais
colo chiclete em lugar nenhum.
- Vai ser preciso mais do que uma coisinha de nada como a morte
para você se ver livre de mim, Princesa. Nunca ouviu falar de mesa branca,
tabuleiro ouija e... ALÔ?! - Me viro assustada. Ele conseguiu falar com
alguém? - Certo e qual a previsão? - Sim, ele conseguiu falar! - Não tem
como adiantar isso? - Oh, droga. Se tratando da gente, tenho certeza que a

resposta vai ser "com certeza, não". - Ok, então. Obrigado.


Ele desliga e fica olhando para a parede, os ombros caídos numa pose
derrotada.
- Vai, pode falar. Sou forte, eu aguento.

- A previsão é de uma hora para tirarem a gente. - É... Ainda bem que
fiz xixi antes de entrar aqui. - A luz precisou ser cortada de emergência por
uma suspeita de curto circuito. Não podem ligar o gerador, para não gerar
faíscas. Como sempre, a vida fazendo o que sabe fazer de melhor.
Se divertir às nossas custas.
É isso aí.
Bom, fazer o quê?! Sento no chão e cruzo as pernas, me conformando
com o fato de ter de esperar.

Aqui. Sozinha. Com Drake Hill.


Meu segurança continua parado no mesmo lugar, mas agora está
olhando para cima, parecendo rezar, ou praguejar, ou procurar uma saída de
emergência, ou tentar encontrar aquele lugarzinho de calma dentro dele, onde
os pássaros cantam, o sol brilha e ele não estrangula a sua protegida.
Decido deixá-lo quieto e pego meu celular, pronta para passar a
próxima hora respondendo fãs. Sem sinal... Ah, vá! Então teremos uma
horinha para jogar "Paciência" e... percebo que estou com 15% de bateria.
Se continuarmos nesse ritmo, vai aparecer uma barata voadora aqui,

ou esse treco vai despencar, ou os dois ao mesmo tempo. Desgraça pouca é


bobagem na "Glitterlândia". Largo o aparelho no chão e fecho os olhos. - Eu
vou morrer de tédio.
- E isso seria uma coisa ruim, certo?! - Ele resmunga todo rabugento e

eu me controlo ao máximo para não rir. - Por que não canta um pouco de
Britney Spears para o tempo passar mais rápido?
- Cuidado com o que deseja. Posso fazer todos os seus pesadelos
virarem realidade, Babaca.
Ele coloca minha mochila no chão com cuidado e tira seu paletó,
dobrando-o com perfeição. Não, o homem nem é metódico. Imagina.
- Mais alguns dias e vou acabar acreditando que meu nome é Babaca
mesmo, sabia?

- O que te faz pensar que ainda estará aqui daqui alguns dias?
- Aceita que dói menos, Princesa. Eu não vou a lugar nenhum. - Me
encara com seus intensos olhos verdes e a expressão grave. - Não sem você.
- Isso é o que nós vamos ver...
Ele senta na minha frente, encosta na parede e estica suas pernas
longas, que atravessam todo o espaço, chegando até o meu lado. Reparo nos
seus sapatos sociais caros, de bom gosto e, de brinde, consigo ver que calça
44.
Prometo para mim mesma que não vou pensar no que isso significa

sobre o tamanho de... você sabe o quê.


Espera aí.
Só de eu pensar que não vou pensar quer dizer que já estou pensando,
não?

- Temos mais 57 minutos aqui e duas opções, Tampinha. - Ele levanta


dois dedos para mim. - Ficarmos nesse adorável silêncio sepulcral rosnando
um para o outro, ou sermos adultos e conversamos civilizadamente para
tentar fazer essa experiência ser menos enlouquecedora. Qual vai ser?
- Uma trégua de 57 minutos? - Ergo uma sobrancelha para ele. -
Duvido que a gente consiga, mas podemos tentar.
- Ok. - Ele cruza os braços e se ajeita melhor no lugar. - Você
começa.

- Por que eu? - Faço uma careta.


- Porque você é famosa, dá doze entrevistas por dia, fala pelos
cotovelos e sabe brincar disso de conversar muito mais do que eu. Vamos lá,
me faça uma pergunta. De preferência uma de onde não escorra sarcasmo,
nem pingue ironia.
Penso por alguns segundos... O que eu gostaria de saber sobre ele?
Todos os seus pontos fracos, com certeza. Imagina se descobrisse que ele tem
medo de coelhinhos?! Minha vida estaria ganha. Mas acho que ele não me
responderia fácil assim.

Decido seguir por um caminho neutro e inofensivo, pelo menos para


começar. - Qual é sua música preferida?
- Nothing Else Matters, do Metallica. - É a cara dele, tenho de
concordar. - Qual é a sua música preferida, Princesa? Por favor, não diga

Britney Spears.
O homem tem um caso sério de aversão à Santa Brit, coitada. - Não.
A minha música preferida é Iris, do Goo Goo Dolls. - Ele estreita os olhos
para mim, como se estivesse tentando me decifrar. Não vai achar nada aqui,
amigo. Falei a verdade dessa vez. - Me conta, por que Nothing Else Matters é
sua música preferida?
- Gosto da letra. A parte da confiança, de não se importar com o que
os outros dizem, de não se abrir e de se sentir perto das pessoas que gosta,

não importa quão longe estejam. - O encaro um pouco em choque, refletindo


sobre esse lado interessante de Drake Hill. Esses são ótimos motivos... Eu o
vejo se mexer um pouco desconfortável no lugar, sob o meu olhar de
inspeção. - Eu sei porque Iris é sua música preferida.
- Sabe, é?! - Dou um risinho de deboche, cruzando os braços para
imitar sua postura. Eu apostaria meus coturnos preferidos que ele não faz
ideia do porquê eu amo tanto Iris.
- É bem óbvio, na verdade. - Seu olhar assume um brilho de desafio. -
"Eu não quero que o mundo me veja" foi uma das primeiras coisas que saquei

sobre você.
Ok. Ainda bem que não apostei meu coturno preferido.
Como ele faz essas bruxarias de sempre descobrir TUDO sobre mim,
inferno?!

Sorte que todos os anos treinando minha poker face em entrevistas me


prepararam bem para esse momento, e eu consigo manter minha expressão
neutra sem nem vacilar - Essa é uma teoria interessante. Por que acha que eu
não quero que "o mundo me veja"? Meio que não combina com a coisa de ser
uma popstar, Babaca.
Ele dobra as pernas gigantes na frente do seu corpo, se inclinando na
minha direção para sussurrar com seu tom grave. - Meu trabalho é te
observar, Tampinha. Sua casa toda tradicional, Debussy tocando no quarto do

hotel, vela e perfume de lavanda, suas roupas meticulosamente dobradas em


cima da cama hoje cedo... Você não me engana. A Rainha do glitter
destrambelhada não é nada mais que um personagem.
Engulo em seco, sentindo cada uma das suas palavras baterem bem
dentro de mim.
FILHO DE UMA... Pobre senhora que não tem culpa do filho que
tem.
Eu me recupero a tempo, me inclino mais para frente e o encaro bem
de perto, quase tocando os nossos narizes. - Parabéns pela criatividade. Essa é

uma teoria da conspiração e tanto.


- Teoria da conspiração? - Ainda consegue se aproximar mais. Oh,
droga. Está ficando quente aqui... - Aposto que se pegar seu celular agora,
vou achar música clássica, e-books de romance, aplicativos de meditação e

algum joguinho bem de gente velha, tipo Mahjong ou Paciência. E sabe o que
é pior? - Ergue uma sobrancelha para mim. - Nem seu papel de parede deve
ser de glitter.
Não é.
É a foto de um coala bebê e ele nunca vai saber disso.
- Você é uma pessoa estranha e perturbada. Para de usar tóxicos, cara.
Vão acabar com a sua vida.
- Vamos tirar a prova então. - Ele se estica por cima de mim e pega o

aparelho do meu lado num movimento ágil, antes mesmo que eu pense em
impedi-lo.
- O quê?! Não! Me devolve isso, Hill. - Me jogo por cima do seu
corpo gigante e tento recuperar o pobre IPhone. - ME DÁ AGORA.
- Só depois que eu jogar algumas partidinhas de Paciência. - Ele
continua se esquivando e eu continuo atacando, sem sucesso.
- ME DÁ LOGO, IMBECIL!
Rolamos juntos pelo pequeno espaço por alguns segundos, até que eu
acabo embaixo do seu corpo, nossos rostos próximos e as respirações

ofegantes. Consigo ver os pontinhos dourados na sua íris verde, o cheiro da


sua loção pós barba nubla meus pensamentos e eu engulo em seco...
Drake passa a língua de leve pelos lábios, atraindo minha atenção
para a sua boca desenhada, para a sua mandíbula esculpida, para os seus

traços fortes...
Ele é lindo.
Droga...
Ele é MUITO lindo.
O ar fica pesado entre nós e eu o sinto se inclinar mais em minha
direção. - Roxy... - Meu nome sai da sua boca em um sussurro fraco, que
reverbera dentro do meu corpo na forma de um arrepio.
Levanto um pouco a minha cabeça, sentindo alguma força me puxar

para ele e fecho os olhos.


Eu... Eu...
Acho que quero beijá-lo.
Capítulo 09 - Eu quero beijá-la
Drake

Eu quero beijá-la.
Com Roxy assim, embaixo de mim, de olhos fechados, totalmente
entregue, só consigo pensar em como eu queria muito beijá-la. Descobrir se é

tão doce quanto acho que é... Ouvi-la sussurrar meu nome... Sentir seu corpo
reagir ao meu toque...
Me inclino mais para perto do seu rosto, esquecendo de todos os meus
motivos, todos os meus argumentos, todos os meus poréns.
Eu vou beijá-la.
Minha boca resvala de leve nos seus lábios, sinto sua respiração fazer
cócegas no meu nariz e quase consigo sentir seu gosto... quando a luz volta
com tudo e um solavanco coloca o elevador para funcionar.

Fecho meus olhos com mais força e suspiro.


Claro.
De todas as coisas ruins que poderiam acontecer nesse elevador, com
essa eu não contava.
Seu corpo continua relaxado embaixo de mim, como se estivesse tão
envolvida no nosso momento que nem percebeu o que acabou de acontecer.
Oh, eu gosto disso.
Ao invés de me afastar, deslizo minha boca de leve para o seu ouvido
e sussurro com a voz rouca. - Eu também queria muito isso, Princesa, mas

não seria uma decisão inteligente para nenhum de nós. - Continuo minha
exploração e dou um beijo no seu pescoço, sentindo o cheiro de lavanda
concentrado ali por alguns segundos e vendo sua pele se arrepiar.
Linda...

Antes que eu continue com essa loucura, saio de cima dela e fico em
pé, alisando as minhas roupas. Enquanto trabalho na minha respiração e
coloco meu cérebro de volta dentro da minha cabeça, Roxy continua deitada,
de olhos fechados. - A gente quase se beijou. - Não sei se falou comigo, ou
com ela mesmo.
- Sim. Acho que esse é um bom resumo da situação. - Já estamos no
oitavo andar, é bom que decida se levantar num futuro breve.
- Por que, Babaca? - Não, ela ainda não se mexeu. Acho que quebrei a

Tampinha... - Por que nós faríamos algo tão estúpido assim?


- Eu não iria por esse caminho, se fosse você. - Algumas perguntas
foram feitas para não serem respondidas. - Que tal se levantar agora?
Ela ignora minha sugestão. 5º andar... Vou ter algumas explicações
para dar, quando as portas se abrirem e todos verem um corpo cheio de glitter
estirado no chão.
- Por que você não começou a gritar e colocou a culpa em mim,
quando percebeu o que estava acontecendo? - Ela parece brava agora. Acho
que esse é um bom sinal.

- Porque eu sou um adulto, Roxanne. Assumo o que eu faço, ao invés


de fugir como um adolescente assustado, ou ficar fazer charminhos
desnecessários. - Terceiro andar... Desisto de esperar, a pego pelos braços e a
coloco em pé com facilidade, olhando bem nos seus olhos que ainda estão

meio nublados. - Nada aconteceu. Nada, Princesa. Não tem porque sofrer
com isso. Podemos voltar ao normal agora? Chega de trégua. Esse negócio
não é para a gente.
Me encara de volta de um jeito engraçado, como se estivesse me
vendo pela primeira vez. - Nós dois separados já somos estranhos, mas juntos
é quase como assistir um acidente de carro daqueles bem feios.
- E tem quem diga que você não é fofa ainda. - Tento segurar uma
gargalhada e ela faz o mesmo, o ar entre nós voltando a ficar pesado, meus

olhos caindo para os seus lábios... até as portas do elevador se abrirem e ela
sair andando sem olhar para trás, o celular orgulhosamente firme em uma das
mãos.
Tampinha esperta.
Balanço a cabeça, pego sua mochila, meu paletó e me viro para sair,
dando de cara com Justin me olhando com um sorrisinho esperto. - Eu queria
ser uma mosquinha para ver o que aconteceu aí dentro nos últimos minutos.
- Acredite em mim. Você não ia querer ver NADA que aconteceu
aqui nos últimos minutos. - Passo reto por ele, em direção às saídas do fundo

do prédio e para o estacionamento.


Espero que nunca mais tenha uma entrevista aqui. Esse lugar deve ser
amaldiçoado, construído em cima de um cemitério indígena, ou algo do tipo.
Chego na porta externa e vejo o motorista da Princesa me esperando

ao lado de um sedã preto. Ele vem ao meu encontro e estende um chaveiro


para mim, todo eficiente. - A chave está aqui, senhor, e a senhorita Roxy já
está aguardando no veículo.
- Obrigado, amigo. - Dou um tapinha nas suas costas e passo para o
lado do motorista, dando partida sem olhar para o banco de trás.
Boa sorte para mim!
Nós dois ficamos perdidos em pensamentos por vários minutos, mas
sei que ela vai falar algo, mais cedo ou mais tarde. É quase como ver uma

tempestade se formando, quando você sente a eletricidade no ar, o cheiro da


umidade...
- POR QUE, DIABOS, A GENTE SE BEIJARIA? A GENTE NEM
SE TOLERA! - Ela se inclina para me encarar pelo vão entre os bancos, não
satisfeita em gritar apenas.
Eu não falei?! Tempestade.
Suspiro e respondo sem desviar minha atenção do trânsito. - Porque
estávamos no escuro, sozinhos e um por cima do outro. Se você colocar uma
faísca perto da palha, as chances de tudo pegar fogo são grandes, não acha?

Pelo retrovisor, a vejo voltar para o seu banco e cruzar os braços. -


Não se a palha ficar chamando a faísca de "Tampinha", e dedicar todos os
segundos do seu dia a fazer da vida dela um inferno.
- Tecnicamente, quem falou que iria fazer da minha vida um inferno

foi você. - Começo a apertar o volante. Preciso manter a calma, preciso


manter a calma. Calma, calma, calma. Vivi doze anos de controle perfeito.
Onde está ele quando eu mais preciso?! - Eu só estou fazendo meu
trabalho, Tampinha.
Sim, ênfase especial para o seu apelido.
- Beijar o meu pescoço não faz parte do seu trabalho, Babaca!
Sim, ênfase especial para o meu apelido.
- Ficar de olhos fechados implorando para eu beijá-la também não é

"fazer da minha vida um inferno". - Retruco no mesmo tom e isso é suficiente


para deixá-la quieta pelo resto do caminho.
Aleluia.
Entro no estacionamento lateral do hotel, fugindo da entrada
principal, sem nem pedir sua autorização. Não vou colocá-la em risco pela
segunda vez no mesmo dia, não importa o que ela diga.
Mal estaciono na vaga e Rox desce de um pulo, saindo pisando duro e
fazendo eco pelo espaço vazio. Respiro fundo por alguns segundos, ainda
segurando o volante com força e acalmando a minha mente. Calma, calma,

calma.
Hora de deixar o que aconteceu para trás.
Pego a sua mochila, andando em direção ao saguão e a encontro
entrando na porta que leva para as escadas. Acho que alguém ficou

traumatizada com elevadores...


Como esse não é o meu caso, subo tranquilamente e a encontro toda
ofegante, destrancando o seu quarto com o cartão chave. - Então, te espero na
academia daqui uma hora para a nossa aula de defesa pessoal.
- O quê? - Se vira para me encarar com uma careta e eu aproveito para
colocar a mochila nas suas mãos. - Nós vamos fazer isso mesmo?
- E por que não faríamos? A menos que tenha falado aquilo só para
que eu não fosse malhar com Grace. - Cruzo os braços. - Por acaso você

estava com ciúmes, Princesa?


Seus olhos viram fendas, como sempre faz quando está perdendo a
paciência. - MORRA, BABACA. - Ela grita e bate a porta na minha cara
mais uma vez.
Sempre errando por milímetros.
Acho que linhas tênues são a nossa coisa particular.
**

Já estou chegando nos 12 km de corrida, quando Roxy finalmente


entra na academia. Usando leggings brilhantes, uma camiseta pink neon e
tênis com... Isso são luzes?
- Por que os seus tênis piscam quando você anda? - Ela encara meu

rosto com desdém, depois deixa seu olhar descer para o meu peito e sua
expressão de desprezo dá uma deslizada sutil.
- Por que você não veste uma camiseta? - Dou um sorriso. Ela pode
até estar rosnando, mas ainda não desviou o olhar.
- Porque estou com calor. - Aproveito para tomar um gole da minha
garrafa de água. - Algum problema com isso?
- Se você não colocar sua camiseta, eu vou tirar a minha. - Os olhos
estão se estreitando de novo... Isso vai ser divertido.

- Eu não poderia me importar menos com o que usa, ou deixa de usar,


Tampinha. - Continuo correndo sem me abalar.
- Ok, então. - Ela larga seu celular e sua chave num canto e tira
mesmo sua camiseta, ficando apenas com um pequeno top dourado.
Engulo em seco e uso todos os meus anos de treinamento para
continuar correndo. Seu corpo é lindo, muito mais natural do que eu
esperava. A curva da sua barriga fazendo uma dobrinha no elástico da
legging, que vai ser exatamente o lugar onde eu vou segurar, quando a beijar.
Não, não.

Pensamento errado.
SE eu a beijasse, não QUANDO a beijar.
SE. Apenas um SE.
Acho que já corri demais, está faltando oxigenação no meu cérebro.

- O que olha tanto, Babaca? Perdeu alguma coisa aqui?


- Achei que você fosse do tipo tatuada. - Preciso agradecer aos céus
pelo meu talento em criar assuntos do nada. - Carpe Diem, estrelinhas e uma
fada na barriga. Sabe, o pacote básico.
- O quê? Está louco? - Ela coloca as mãos na cintura, parecendo
insultada. - Você já viu alguém colar adesivos numa Ferrari? - Mordo meu
lábio para segurar uma gargalhada e paro na sua frente. A Princesa cruza os
braços, mudando para uma pose protetora, e vejo sua luta interna para

continuar olhando nos meus olhos. - O que está falando? Não vejo nenhuma
tatuagem em você também.
- Tenho medo de agulhas. - Dou de ombro e respondo sem me abalar.
- Está falando sério?! - Agora parece um misto de chocada, com
incrédula.
- Talvez sim, talvez não. Viva com esse mistério. - Saio andando para
o grande tatame no centro do espaço. - Então, vamos começar com alguns
alongamentos. Se puder se deitar no chão, eu vou esticar seus músculos da
perna.

Ela me obedece, se deitando e levantando a perna de um jeito em que


seu pé passa bem perto das minhas... partes íntimas. Milímetros perto... Um
sorrisinho inocente brinca nos seus lábios carnudos. - Acha que consegue
fazer isso sem tentar me beijar?

- Acho que teremos de descobrir.


Capítulo 10 - Acabo acertando em cheio os seus... babaquinhas
Roxy

"Teremos de descobrir".
Não, não teremos.
Por mais reações estranhas que eu tenha quando ele me olha assim,

sei que a última coisa que quero é descobrir qualquer coisa envolvendo Drake
Hill.
Acho que foi pensando em nós que inventaram aquela expressão
"Deus me livre, mas quem me dera."
Vamos focar no Deus Me Livre.
- Há-há. Muito engraçado, Babaca. - Ele segura minha perna e a força
para trás, esticando os músculos por alguns segundos. Outch!
- Me dê a outra, de preferência sem me deixar estéril no caminho. -

Ele pede com um sorriso espertinho e eu reviro os olhos.


- Seria um grande prejuízo para o mundo se não pudessem existir
mais mini babaquinhas por aí, não é?
Estica minha outra perna um pouco mais do que o necessário. Nada
que fosse me machucar, só causar um leve desconforto. Dou um chute para
afastá-lo, passando perigosamente perto das "suas partes" mais uma vez.
- Que tal se você mesma se alongasse? - Acho que alguém está
perdendo a paciência comigo... Ou está com medo do que eu possa fazer...
Ótimo!

- E que tal esquecer essa história de aula? - Sugiro toda esperançosa.


Assim, teria tempo de planejar minha fuga dessa noite com cuidado.
Tenho um plano, mas preciso bolar uma estratégia cuidadosa e perfeita. Não
posso falhar de novo, não depois do fiasco de ontem.

Tenho uma reputação a zelar, oras.


- Depois de ver a multidão que você encara todos os dias, acho que
essa ideia pode ser útil. Quero dizer, útil além de servir como pirraça para
você fazer ciúmes na Grace. - Eu já disse hoje que eu odeio esse cara? Eu
odeio esse cara. Muito.
- Ah, por favor! Eu não quero fazer ciúmes na Grace. - Volto a me
alongar, puxando meu joelho de encontro ao meu corpo, para me ocupar e
conseguir não o esganar. - Se quiser tentar algo com ela, você tem a minha

benção. Posso até ser a madrinha desse lindo casamento.


Começo a imaginar Drake como noivo... O homem fica muito bem
em ternos, por causa de todos esses ombros e esses bíceps, tenho de admitir.
Seria uma visão e tanto.
- Então, você não se importaria mesmo se eu a chamasse para sair?
O Babaca se deita ao meu lado e começa a fazer abdominais com as
pernas suspensas no ar. Não conseguiria fazer igual nem se minha vida
dependesse disso. Acho que entendi de onde veio esse tanquinho
bizarramente definido que decidiu exibir hoje.

Ufa.
Que calor...
Onde será que eu ligo o ar condicionado desse lugar?
- Não me importaria nem um pouco. Saia com quem quiser, se case e

peça demissão. É um plano perfeito, todo mundo sai feliz. Pense com carinho
na ideia, querido.
Isso aí.
Ele que se ocupe com Grace e me dê sossego.
Me sento de costas para o imbecil, aliviada por não ter de encará-lo e
alongando meus braços com tranquilidade.
- Muito bem, então. Vou falar com ela no show de hoje.
- Está falando sério? - Viro para encará-lo de volta, esperando ver o

Babaca com um daqueles sorrisinhos de deboche, mas o encontro tranquilo e


pleno.
- Claro. Pensa que teremos o dia livre amanhã, depois que chegarmos
em Madri. Podemos aproveitar juntos, ouvi dizer que é uma cidade linda.
Muito romântica...
O pior é que ele não parou os abdominais para me responder, e nem
está ofegante. UGH! Eu odeio esse cara. Odeio mesmo. Odeio mais do que
eu odeio ovo cozido.
-Lindo! E depois, quando chegar do seu encontro, venha direto para o

meu quarto. Podemos trançar os cabelos um do outro e assistir Keeping Up


With the Kardashians, enquanto me conta todos os detalhes. - Volto a olhar
para frente, alongando meu pescoço de um lado para o outro, sentindo a
tensão ali.

- Ótimo, eu levo o sorvete para nós também. - Engatinha pelo tatame


e se deita com o peito no chão ao meu lado. Alguém não consegue ficar longe
de mim, pelo jeito.
- Sorvete de chocolate, por favor.
- Sorvete de abacaxi, certo. Anotado. - Apoia as palmas da mão no
tatame e começa a fazer flexões curtas e rápidas, segurando seu corpo todo na
ponta dos pés.
FLEXÕES!

- Ah, qual é?! Agora você está só se exibindo.


Nem se abala e continua fazendo uma atrás da outra, os músculos das
suas costas ondulando, as veias do seu braço se destacando e o suor fazendo
sua pele brilhar.
- Isso se chama "parte do meu trabalho", Tampinha. Deus me livre de
não ter forças o suficiente para proteger Vossa Alteza Real.
Sarcasmo e ironia: duas artes que nós dois dominamos como
perfeição.
- Tá, tá. Que seja! Vamos começar essa palhaçada de aula logo, antes

que eu faça um dos seus testículos subirem até a sua garganta. Por acidente,
claro.
Fico em pé, sendo imitada por ele, que está ocupado rindo da minha
ameaça e balançando a cabeça.

Idiota.
Se coloca bem na minha frente com toda a sua altura e apoia as duas
mãos na cintura, mudando sua expressão para uma versão séria. Lá vem... Ou
vai brigar comigo, ou reclamar de algo.
- Você já assistiu Miss Simpatia?
Mas hein?! Definitivamente não era isso que estava esperando.
- Acho que não entendi a sua pergunta.
- Além de tudo é surda. - Usa minhas próprias palavras contra mim e

começa a gritar como seu eu tivesse 97 anos. - VOCÊ. JÁ. ASSISTIU. MISS.
SIMPATIA?
Sim, eu sei.
Vou ter que estrangular esse cara.
Mas antes, preciso entender qual o seu ponto aqui.
- Claro que eu já assisti Miss Simpatia. O chocante é você ter
assistido, cara.
- Minha irmã, lembra? Já te contei sobre isso. Acompanha o
raciocínio, mulher! - Estala os dedos no meu rosto e eu avanço, quase

conseguindo mordê-los. Pena que desviou a mão no último segundo... - O


que interessa para nós é a parte da defesa pessoal. Consegue se lembrar de
como era?
- Lembro. - Me concentro para acabar com isso logo. - Barriga, peito

do pé, nariz e... virilha. - Dou um sorriso maligno e ele engole em seco.
- Exato. Gracie Hart estava certa em tudo que ensinou. Vou
demonstrar em você para que entenda os pontos, e depois pode repetir em
mim.
- Você vai me agredir? - Faço uma careta.
- Não, Tampinha. Vou demonstrar. Tem uma grande diferença aí.
- E eu vou poder te agredir? - Fico subitamente animada com essa
história.

- Claro. Vamos ver quanto estrago seus cinco quilos podem causar. -
Com um alicate de unha na mão? Muito estrago. - Para começar, me dá um
enforca leão.
- Muito engraçado. Qual a chance de eu alcançar o seu pescoço?!
- Tá boooooooom. - Vira de costas e se abaixa um pouquinho, me
deixando enrolar o braço na sua nuca. Acho que é mais larga do que as
minhas coxas...
- Muito bem. Agora precisa bater com o cotovelo aqui. - Toca de leve
minha barriga, na linha do umbigo. - Com o pé aqui... - Pisa com suavidade

no meu tênis. - Depois nariz. - Nem chega a me tocar, só imita o movimento -


E, por último, basta bater perto dos babaquinhas.
Não consigo segurar a gargalhada dessa vez e me apoio no seu ombro
para rir. Babaquinhas é MUITO bom.

- Entendi. Minha vez!


Oh, isso vai ser divertido.
Ele se coloca atrás de mim, envolvendo seu braço gigante no meu
pescoço, mas sem força suficiente para que eu me sinta ameaçada. Sei que
poderia me quebrar no meio se quisesse, mas sei que não faria isso nem se
quisesse.
- Vamos lá. Faça seu estrago, Tampinha. - Ele murmura no meu
ouvido e eu me arrepio.

Droga, seu suor cheira bem...


Foco, Roxy!
Foco!
Foco!
Foco!
Dou uma cotovelada na sua barriga dura, um pisão no seu pé e o soco
acerta mais sua boca do que o nariz, mas Drake parece nem sentir meus
golpes.
Me preparo melhor para o último, calculando minha força e minha

mira para acertá-lo bem na parte interna da coxa. Só que ele decide se mexer
exatamente nesse momento e eu acabo acertando em cheio os seus...
babaquinhas.
Vejo seu corpo gigante cair no tatame com um estrondo e ele começa

a se contorcer de dor.
Oh-oh.
Acho que alguém não vai ficar muito feliz comigo...
Capítulo 11 - QUERO MORFINA E VINGANÇA
Drake

- FICK DICH!
Essa mulher está decidida a me matar.
No começo, até achei que estava blefando. Aquele história de "cão

que ladra, não morde", sabe? Igualzinho ao poodle da minha mãe, Fifi. Ele
até tentou me morder um dia, mas só o que conseguiu foi quebrar seu dente e
causar um micro arranhão nas minhas juntas.
Foi bonitinho vê-lo tentar se defender com tanta bravura.
Nunca mais vou comparar o pobre Fifi com essa criatura sem
coração.
Fifi lutava justo, mas Roxanne Reed joga sujo e tenho certeza de que
não vai descansar até me ver estéril e morto. Não necessariamente nessa

ordem.
Rolo pelo chão, tentando achar uma posição em que a dor me permita
respirar pelo menos. Aquela vez em que fui torturado pelos mafiosos na
Itália? Fichinha perto disso aqui... Maldita guarda baixa. Nunca subestime
um oponente numa luta, Drake. Nem que esse oponente seja a Tampinha.
- Me desculpa, Babaca. Juro que não era a minha intenção. - Roxy se
desculpando? Agora tenho certeza de que morri e já fui direto para o inferno.
Pelo menos, eu a trouxe para cá comigo.
Não consigo responder nada, só continuo rolando no chão e

agonizando, sentindo meu corpo se partir ao meio. Pobres Drake-Júnior... e


pensar que minha mãe queria tanto ser avó. As esperanças da família estarão
todas nos ombros da minha irmã agora.
- Aguenta aí que eu vou pegar gelo para você.

NÃO QUERO GELO.


QUERO MORFINA E VINGANÇA.
A escuto sair correndo e, quando volta, ainda estou na mesma
posição, ainda sofrendo pelos meus herdeiros perdidos e ainda a
amaldiçoando. Até que a DOIDA acha que seria uma boa ideia voltar à "cena
do crime" e coloca suas mãos bem... lá.
- O QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO? - Dou um grito e
começo a rolar para longe dessa maníaca da virilha.

- Como assim o que estou fazendo? Estou colocando gelo em você,


oras. - Ela me ignora e volta a ameaçar encostar nas minhas partes. Mas nem
por cima do meu cadáver!
- Você nunca mais vai chegar perto dessa área, mulher. - Continuo me
arrastando pelo chão, indo o mais longe possível da maluca.
- Que foi? Está com medo da sua reação a mim, Babaca? - Contorna o
meu corpo só para conseguir me encarar com um sorriso espertinho e um
olhar malicioso. Não existe uma única gota de amor à vida circulando nesse
corpinho cheio de glitter.

- Estou com medo de que você acabe com o que sobrou aqui, isso
sim. Me joga esse gelo e some daqui. Rápido, de preferência.
Para a minha surpresa, ela me obedece e joga o saco no meu peito, só
vejo as luzinhas dos seus tênis piscando em direção à saída. Rox para quando

chega na porta, voltando a me encarar, dessa vez sem malícia. - Desculpa


mesmo, Drake. Eu juro que não foi a minha intenção. Estava mirando na sua
coxa.
Vejo pelo seu rosto que está sendo sincera.
Scheibe! Não sei o que é pior.
- Vamos treinar sua mira na próxima aula então, Princesa. E talvez
um pouco de anatomia, para ver se você descobre onde fica a coxa e onde
ficam as "outras coisas" de um homem.

- Eu conheço bem onde ficam "as coisas" de um homem, Hill. - Sei


poucas coisas nessa vida, mas sei que essa é uma conversa que não quero ter
com ela.
- Sério, Roxanne. Suma da minha frente.
- Saindo! - Ela ri e dessa vez vai embora mesmo, para o meu alívio.
Coloco o gelo bem em cima dos Babaquinhas e suspiro, sentindo o
frio começar a amortecer a região.
Ainda bem que sempre quis adotar uma criança mesmo...

**

Eu não sabia o que esperar do meu primeiro show ao vivo de Roxy


Reed.

Mas, com certeza, não esperava que fosse tão... bom.


Ok, vou ser justo aqui. É mais do que bom. Ela é inacreditável!
Quando saímos do hotel, a Tampinha ainda era a mesma coisinha
irritante de sempre e se encolheu quando me viu, provavelmente se remoendo
de remorso pelo sofrimento que me causou. Ótimo. Espero que se remoa por
mais 100 anos, no mínimo.
Só que no momento em que saiu do camarim, pronta para o show,
tinha se transformado em uma pessoa completamente diferente. Vestida com

uma espécie de macacão dourado e decotado, com brilhos da cabeça aos pés,
os cabelos castanhos arrumados em cachos, os retornos nos ouvidos e uma
atitude de quem está prestes a dominar o mundo.
Enquanto a escolto até o palco, ouvindo a multidão gritar seu nome,
sinto algo se revirar dentro de mim. Tem alguma coisa diferente emanando ao
seu redor, alguma aura de poder hipnotizante.
Paramos lado a lado na coxia, olhando para a frente, enquanto sua
banda toca a música de introdução. Eu estaria uma pilha de nervos se fosse
ela, mas Roxy parece calma, só observando sua banda com tranquilidade.

Grace anda até perto de nós, piscando para mim e dando uma rebolada na
minha direção, enquanto toca sua guitarra com destreza.
Escuto Roxy bufar e me viro para encará-la, com um sorriso de
deboche ao ver seu biquinho de birra.

- Nem ouse falar nada, Babaca.


Ela começa a andar em direção ao palco, mas eu seguro seu pulso, a
impedindo de prosseguir. A Princesa olha para os meus dedos enrolados no
seu braço fino, depois ergue seu rosto para mim, parecendo confusa com a
minha atitude.
Eu sei, também estou chocado.
- Boa sorte, Roxanne. - Murmuro com honestidade e ela me examina
em busca de sarcasmo, ou qualquer indício de ironia. Acho que passei no

teste, porque dá seu pequeno sorriso verdadeiro para mim.


- Se prepare para ficar de queixo caído, Hill. - Pisca, pega o
microfone que um roadie oferece e sai correndo, aparecendo para a multidão
e fazendo todos surtarem.
Agora eu entendi de onde veio o seu título de "Princesa".
Roxy Reed é uma Prinzessin no palco e a plateia são seus súditos
leais, prontos para adorá-la. Ela dança o tempo todo, ela canta ao vivo
durante duas horas, ela anima cada um que está ali e ainda continua... Linda.
Droga.

É impossível não a admirar como artista.


Talvez eu até procure algumas das suas músicas no Spotify mais tarde.
Quando a apresentação acaba, eu ainda estou de queixo caído ao lado
do palco, a vendo se despedir do público e agradecer várias vezes pelo

carinho. Sai correndo e se joga nos braços de Jus, que a abraça comemorando
pelo sucesso da apresentação. A alegria dos dois é palpável e acaba me
contagiando.
Na verdade, todos estão eufóricos.
Os roadies a cumprimentam com grandes sorrisos, enquanto lhe
entregam toalhas, garrafas e um roupão branco macio. A multidão continua
gritando e a banda também está com a adrenalina a mil, todos se abraçando
alegres.

Gosto dessa sensação... Será que vai ser assim todas as noites?
Poderia me acostumar com as boas vibrações.
Só depois de uns quinze minutos é que consigo acompanhá-la de volta
para o camarim. Nós dois estamos "sozinhos" e eu realmente queria falar
alguma coisa, algo como o quanto ela me impressionou dessa vez.
Paro na porta e abro a boca, só para fechá-la em seguida. Ela olha
para mim com expectativa, acho que também esperando que eu diga algo.
Quando as palavras fogem uma segunda vez, Rox perde a paciência e entra
no seu camarim, batendo a porta na minha cara.

É só uma questão de tempo até que consiga quebrar o meu nariz.


Fico de braços cruzados, plantado no mesmo lugar, esperando para
escoltá-la de volta para a van e remoendo todos os últimos acontecimentos do
dia. Saudade da época em que eu lembrava o significado de sossego e

tranquilidade...
Cinco minutos se passam.
Depois dez.
Quinze.
Estou escutando sua voz "cantando" lá dentro, mas todos sabemos que
isso não significa nada no universo da Glitterlândia. Algo não está cheirando
bem aqui.
Ao invés de entrar para confrontá-la, chamo um dos roadies e mando

que fique de plantão na porta. Saio pelo corredor, reparando em todas as


pessoas que cruzam comigo, até a porta externa. Nem sinal dela.
Do lado de fora da arena, calculo qual é a janela do seu camarim e
vejo uma lixeira alta posicionada estrategicamente embaixo da abertura.
A coisa está começando a ficar divertida...
Antes que eu possa ir até lá para examinar melhor, um Uber entra
pelo portão de serviços e encosta na grade de isolamento, se camuflando com
a escuridão da noite.
Ora, ora. Outro belo plano.

Ao invés de ir até a janela, saio das sombras e caminho calmamente


até o carro, entrando no banco de trás. - Boa noite, moça. Minha
namorada Mulan já está vindo aí. - Se eu bem a conheço, tenho certeza de
que usou seu pseudônimo favorito.

- Sem problemas, Senhor. - A motorista busca meus olhos pelo


retrovisor sorrindo e vejo que acertei em cheio. - Esse é o nome dela de
verdade? Mulan?
- Sim. - Dou uma risadinha. Eu vou mesmo para o inferno, mentindo
para essas almas inocentes. - Meus sogros são pessoas muito criativas.
- Ah! De pais criativos eu entendo bastante. Os meus acharam que
seria uma boa ideia me batizar de Madeinusa.
- Madeinusa? - Não consigo esconder minha careta. Acho que prefiro

até Mulan.
- Sim, Madeinusa. É como em Made In Usa, só que tudo junto. Fui
concebida durante uma viagem deles aos Estados Unidos.
- Scheibe, senhorita. Que falta de sorte! - Tem mãe que gosta de
sacanear o filho, não é possível. Por isso, se tiver uma bebê um dia, ela vai
chamar Violet. Delicado, forte e NORMAL. Se for menino, Drake Júnior
resolve bem.
Rimos juntos por uns bons momentos, até que a porta de trás se abre e
Roxy entra. Agora está usando uma peruca loira platinada, o traje chamativo

trocado por calças e blusas pretas, junto com seus infames coturnos de glitter.
- Que bom que chegou, amorzinho. - Seu queixo cai quando percebe
que estou ali, sentadinho esperando por ela e seus olhos se estreitam até
virarem fendas, daquele jeito que eu adoro.

Sim, eu sou muito bom no meu trabalho.


- Para onde vamos, senhorita Mulan? - Minha nova amiga pergunta
com um sorriso, sem perceber a tensão circulando no banco de trás.
- Vamos para o Hotel Radisson, por favor. - Rox responde.
O hotel em que estamos hospedados.
Boa garota.
- Maravilha! Em cerca de dez minutos estaremos lá. - Volta a sua
atenção para o trânsito e eu relaxo contra o banco, sentindo o doce gosto da

vitória.
- Como você sabia? - Rosna entredentes.
Balanço a cabeça. - Não importa como, só espero que se lembre do
que eu disse que faria, se você tentasse fugir de novo.
Ela fica pálida na hora. - Você não pode estar falando sério.
- Oh, mas eu estou. - Deixo meu sorriso ficar gigante... - Vamos ser
colegas de quarto. Não é incrível?!
Capítulo 12 - Eu não vou dormir no chão
Roxy

- Ah, vai ser ótimo... Podemos mesmo assistir Keeping Up With the
Kardashians, enquanto eu faço tranças no seu cabelo e comemos sorvete de
abacaxi direto do pote. - Ele bate palmas animado, fingindo uma voz afetada.

- Podemos até fazer uma daquelas máscaras de Pepino Albino do Himalaia.


Deus sabe que minha cútis está precisando de um pouco de hidratação, depois
de todo o estresse dos últimos dias.
Só estreito mais e mais meus olhos para ele, pensando em quanta
bagunça eu faria, se decidisse mesmo fazer steak tartare com seus
babaquinhas bem aqui e agora. Droga, isso acabaria com a minha pontuação
na Uber.
Acho que vou ter de esperar chegar no hotel.

- Claro. Ou poderíamos brincar de manicure! Esmalte, lixa, alicate de


unha... - Tento dar o meu melhor olhar ameaçador, combinado com meu
sorriso diabólico, mas só o que consigo é fazer sua expressão ficar ainda mais
divertida.
ARGH!
Como soube o que eu ia fazer? Como soube do Uber? COMO?!
Será que hackeou meu IPhone? Impossível, cada centímetro dele é
criptografado. Odeio admitir, mas acho que o Babaca é simplesmente
inteligente e tem um ótimo instinto para fugitivos.

Mais uma noite de planos fracassados... Onde a minha reputação vai


parar desse jeito?! Daqui a pouco, vou ter mais fama de boa moça que a
Taylor Swift. Deus me “dibre”!
Isso não vai ficar assim.

Me inclino para o seu lado e murmuro baixinho para que a motorista


não nos escute. - Eu não vou desistir.
- Muito bem. Já vou mandar fazer nossa camiseta dupla, só por
garantia então. - Pisca para mim e se recosta no banco, todo arrogante. Não
acredito que vou ter de passar o resto da noite olhando para essa expressão
convencida, de quem sabe que ganhou mais um round.
Eu já quis matá-lo.
Eu já quis beijá-lo.

E agora vou dormir no mesmo quarto que ele.


A única certeza que eu tenho é que nada de bom pode sair desse
arranjo.
Só espero que ele mantenha seus braços cobertos e que não venha
com Kindle e óculos de grau para o meu lado.
- Mande fazer em pink, com os escritos em glitter, para combinar com
o resto dos meus looks, por favor. - Sussurro de volta e vejo seus olhos
verdes brilharem com desafio.
- Cuidado com o que deseja, Tampinha. Eu posso fazer seus pesadelos

se tornarem realidade.
- Usando minhas próprias palavras contra mim? Muito maduro, Hill.
- Você está atualizando com sucesso o meu repertório de birras. Valeu
por isso, a propósito. - Murmura de volta, deixando seus lábios resvalarem no

meu ouvido. Ignoro o arrepio que subiu pela minha espinha e dou uma
cotovelada nas suas costelas para afastá-lo.
- O próximo passo é atualizar a sua carteira profissional. - Me afasto
ainda mais, indo para a outra ponta do banco. - Vou te mandar uns avisos de
emprego com vagas para “Babaca Profissional Com Experiência”.
- Você é tão boa para mim, Princesa. O que seria da minha vida sem
você? - Ele só sorri mais e se inclina para falar com a motorista. - Pode parar
na entrada de trás, por favor? Tem algum famoso hospedado no hotel e está

tudo uma loucura.


- Sem problemas. Deve ser aquela cantora Roxanne que ia fazer show
aqui hoje. Adoro suas músicas e suas roupas. Tão coloridas e brilhantes! -
Meu coração se aquece e eu me controlo para não a abraçar.
- Sim, ela é ótima. Tão boa quanto a Britney Spears. - Drake responde
e eu me imagino segurando a sua cabeça... e batendo ela com toda força
contra o vidro da janela. Várias e várias vezes... Ah, seria tão relaxante.
- Chegamos! - Ela avisa toda feliz e se vira para sorrir para nós. - Foi
um prazer conhecê-los e desejo que tenham uma boa noite.

Ufa, acho que não me reconheceu.


- Oh, nós teremos. Obrigado, Madeinusa. - Esse é o nome da garota
mesmo?
Antes que eu tenha a chance de perguntar, ele desce e corre pela

frente do carro, abrindo a porta para mim e estendendo a mão para me ajudar
a sair. Eu pego seus dedos nos meus e ele aperta com força, encaixando meu
braço na dobra do seu cotovelo, como um cavalheiro antigo.
- Com medo que eu fuja de novo? - Pergunto em tom de deboche.
- Não. Apenas desfrutando da agradável sensação de ter você ao meu
lado. - Dá um sorrisinho espertinho e eu cravo as unhas na sua pele. Mesmo
por cima do terno, ele faz uma careta.
Ótimo.

Subimos para o nosso andar e paramos primeiro no seu quarto. Ainda


sem soltar meu braço, ele pega a sua mala que já estava arrumada e só então
seguimos para o meu.
Eu o vejo tirar outro cartão do bolso interno do paletó e destrancar a
minha porta. Como é que é?! - Você tem a minha chave?
- Liberdade é um privilégio que se conquista, Tampinha. - Dá de
ombros e nem se abala. - Pode ir tomar banho primeiro, se quiser. - Solta o
meu braço e vai guardar sua mala no armário, como se estivesse se sentindo
super à vontade.

- Ah, Drake? - Chamo com um falso tom meigo. - Se eu esquecer de


dizer mais tarde, eu realmente te odeio. - Sorrio com doçura.
Ele me sorri do mesmo jeito e faz uma voz falsamente fina, como se
estivesse falando com um filhotinho de cachorro, ou um bebê fofinho. - Awn!

Eu também te odeio, Tampinha.


ARGH!
Bato a porta do banheiro ainda resmungando, sentindo toda a
exaustão do dia caindo sobre os meus ombros. Guardo a peruca, tomo um
banho rápido, lavo meu cabelo e tiro toda a maquiagem. Ele já me viu assim
mesmo, não adianta tentar mudar nessa altura do campeonato. Me enrolo em
um dos roupões macios e, quando volto para o quarto, encontro a mesa posta.
- A comida acabou de chegar. Vou tomar um banho. - Ele passa reto

sem me olhar, carregando o que parece ser um pijama e uma nécessaire.


Ótimo, pelo menos o idiota não dorme nu.
Levanto a tampa e vejo um prato fumegante de risoto de funghi. Eu
falo em todas entrevistas que esse é o meu prato preferido. Será que ele
sabia? Ou será que perguntou para Justin? Com certeza deve ter perguntado.
Espio embaixo da outra e vejo que pediu frango grelhado e salada.
Está explicado de onde vem todo aquele corpo. Essas pessoas saudáveis...
Nunca vou entender.
Nem estou na metade do meu prato quando ele volta para o quarto e

eu levanto o rosto para encará-lo. Grande erro.


GRANDE ERRO.
Drake anda descalço, enxugando o cabelo na toalha e vai guardar a
nécessaire na sua mala. Tudo isso SEM UMA CAMISETA.

Não vou me abalar. Não vou dar esse gostinho a ele. Continuo
comendo sem encará-lo e SEM OLHAR PARA OS SEUS BRAÇOS.
Eu NÃO estou olhando para os seus braços pelo canto da minha visão
periférica.
Não estou.
Ele começa a comer com calma, mastigando devagar, também sem
me encarar. Ok, acho que estamos mais estranhos do que o “normal”.
Nenhum risoto e nenhuma salada são tão interessantes assim...

Acabo de comer primeiro e corro para a minha mala, pegando meu


pijama e resmungando algo sobre me trocar no banheiro. Tranco a porta atrás
de mim e respiro fundo. Preferia mil vezes que estivéssemos discutindo,
gritando e tentando matar um ao outro.
Esse silêncio é estranho demais.
Quer dizer, eu sei porque estou evitando encará-lo, mas porque ELE
está me evitando? Olho para o espelho e faço uma careta. Será que eu fico tão
feia assim sem maquiagem? Visto meu pijama de algodão simples, só um
shorts xadrez e uma regata azul e me dou outro olhar desanimado. Agora sim

estou parecendo mais “blé” ainda. Bom, é o único pijama que eu tenho.
Paciência.
Volto para o quarto e o encontro já na cama. Deitado. De óculos de
grau. Lendo seu Kindle. AINDA SEM CAMISA. AH, QUAL É?! Deuses dos

hormônios, tenham compaixão de mim!!


Preciso dormir. Preciso que esse pesadelo acabe logo.
- Pode me dar licença, por favor?
- Licença para o quê? - Me encara com os óculos de grau e faz a
maior careta de sofrimento que já o vi dar até agora. Devo estar um desastre
mesmo... Me remexo no lugar, sentindo sua inspeção. Estando um desastre
ou não, seu olhar faz um arrepio muito estranho subir pela minha espinha.
- Licença para eu dormir, oras.

Ele ergue uma sobrancelha, como se não tivesse entendido o que eu


falei. - É só deitar e dormir. O que te impede?
- Você está na cama. - Aponto como se fosse óbvio.
- E vou continuar na cama.
Ah não.
NÃO.
NÃO.
NÃO.
- VOCÊ VAI DORMIR NO CHÃO!

- Eu não vou dormir no chão. - Coloca seu Kindle de lado e responde


com toda a calma.
- SIM, VOCÊ VAI.
- Eu não vou. Tem espaço para doze pessoas dormirem nessa cama,

Roxanne. - Ele fecha os olhos e parece começar a contar em... Isso é alemão?
Não importa.
- EU DORMIRIA COM DOZE PESSOAS TRANQUILAMENTE
AQUI, MAS NÃO DORMIRIA COM VOCÊ. - Ando até o seu lado, o pego
desprevenido e puxo sua coberta com todas as minhas forças, o fazendo rolar
para o chão com tudo. No meio do caminho, acabo tropeçando nas cobertas
também e me desequilibro. Ao invés de me deixar cair de cara no chão, ele
rola seu corpo e se coloca embaixo de mim, amparando a minha queda.

Sentindo os pelos do seu peito embaixo das minhas mãos, seu coração
acelerado, seu cheiro de banho recém tomado... tomo mais uma das minhas
decisões impulsivas. Aquelas pelas quais eu sou tão famosa...
Eu o beijo.
Capítulo 13 - Esses-dois-estão-ainda-mais-estranhos-que-o-

normal
Drake

Antes que eu consiga entender o que está fazendo, a Tampinha puxa


minha coberta com uma força que eu nem imaginava que tinha. Descarga de

adrenalina... estudamos isso no treinamento. É a única explicação.


Não tem nada a ver com o fato de que eu estava distraído com o
movimento suave dos seus quadris, nem com a parte macia da sua barriga
fazendo uma curvinha para fora do elástico dos shorts.
Nada a ver.
Acabo indo parar de bunda no chão, mas nem tenho tempo de proferir
as dúzias de xingamentos em alemão que passam pela minha cabeça. Não
contente em me derrubar, ela ainda faz o favor de tropeçar nas cobertas e me

obriga a sair rolando pelo chão para evitar que sua Alteza Real quebre o
pescoço. Seu corpo pequeno cai em cima do meu peito, me fazendo perder o
ar por um segundo. Ugh!
Eu a seguro pela cintura e seu rosto paira a milímetros do meu, sua
respiração fazendo cócegas nos meus lábios, meu olhar caindo para a sua
boca de cereja. Oh-oh... Isso não vai acabar bem.
Engulo em seco e sinto um calor subir pelo meu peito, enquanto
examino seus traços delicados.
Linda.

Tão linda.
E assim, sem me preparar antes e sem aviso prévio, me atropelando
como faz desde o dia que a conheci... ela me beija.
Ela me beija com a mesma intensidade com que faz tudo na vida.

Segura meu rosto com as duas mãos, crava suas unhas na minha pele e me
reivindica com a sua língua. Não é só a cor, seus lábios têm gosto de cereja e
eu estou no paraíso. Bem aqui e bem agora, estou na minha própria versão
particular de paraíso. Meus dedos apertam a carne macia da sua barriga,
como sonhei fazer tantas vezes, e a puxo mais contra mim, querendo senti-la
por completo. Querendo matar uma fome que nem sabia que tinha. Um
desespero que nem imaginei que sofria.
Rox passa uma das mãos para a base do meu pescoço, como se todo o

contato ainda não fosse suficiente, e enrosca suas pernas entre as minhas.
Não é só sua boca que está me beijando - é o seu corpo todo.
Scheibe, a garota tem pegada.
E esse cheiro de lavanda... Esqueço de todo o resto e só retribuo com a
mesma paixão. Retiro o que disse antes, eu não estou no paraíso. Estou no
inferno e quero ficar aqui para sempre.
Eu poderia ficar aqui para sempre.
Eu poderia...
Isso foi a campainha?

FOI!
Melhor dizendo, foi a realidade dando um tapa na nossa cara.
Fick Dich...
Roxy se levanta de um pulo e me olha assustada, seu peito subindo e

descendo ofegante, seu rosto todo vermelho. Eu me sento e passo as mãos


pelo rosto, ao mesmo tempo em que a campainha toca de novo. - Roxy? Você
está aí?
JUSTIN.
Scheibe. Scheibe. Scheibe.
- JÁ VOU! - Do mesmo jeito que fez no avião, seu comportamento
muda quase como se outra pessoa possuísse seu corpo. Ela corre para ajeitar
seu cabelo no espelho, sumindo com a vulnerabilidade e a entrega de

segundos atrás, voltando as muralhas de proteção no seu olhar. Eu me levanto


também e jogo a coberta em cima da cama, dando uma esticada sutil, como se
tivéssemos acabados de levantar de um sono puro, inocente, comportado e
distante.
Distante é uma ótima palavra, eu deveria me esforçar mais para aplicar
o seu significado no meu dia-a-dia. Ser distante, manter-se distante - tudo que
eu precisava agora.
Paramos lado a lado na porta, inspecionando um ao outro. Eu abaixo
sua blusa que subiu até o meio da barriga em algum momento do nosso

amasso, e ela abaixa meu cabelo com uma mão, a outra esfregando minha
bochecha como se quisesse apagar alguma marca ali.
Nos encaramos, respiramos fundo e um entendimento mútuo flui por
nós.

“Nenhuma palavra sobre seja-lá-o-que-aconteceu.”


Paro logo atrás do seu corpo, tentando esconder minha... ahn...
“empolgação” e a Tampinha abre a porta, cruzando os braços e erguendo o
queixo. Vejo o olhar de Jus passar dela para mim, para o meu peito nu, e de
volta para ela e seu pijama minúsculo - o pijama minúsculo que quase me
causou um aneurisma.
- Eu sei que deveria perguntar, mas não sei se quero saber a resposta

para... isso. - Faz um gesto mostrando nós dois e nossos trajes precários.
Dou de ombros. - Ela tentou fugir de novo, então decidi aplicar uma
estratégia mais “próxima” de vigilância, digamos assim. - Bem próxima. Tão
próxima que sua língua se apresentou pessoalmente às minhas amigdalas.
Roxy engasga um pouco, sacando o duplo sentido nas minhas palavras.
Garota esperta.
- Entendo. - Não. Pelo seu tom e sua expressão “esses-dois-estão-ainda-
mais-estranhos-que-o-normal”, ele não entende nada. - E você está sem
maquiagem? Na frente de alguém? - Franze o cenho ao examinar o rosto da

Tampinha, como se o estivesse vendo pela primeira vez.


- Já estou sacrificando minha paz de espírito, não vou sacrificar minha
pele também por causa dessa loucura toda que me enfiou, Justin. - Ergue o
queixo um pouco mais. - Só espero que saiba que se eu acabar com rugas, a

culpa é toda sua por ter contratado esse... esse... esse...


- Acho que a palavra que está procurando é Babaca. - Me inclino e
sussurro no seu ouvido, o cheiro de lavanda fazendo despertar todas as
sensações de alguns segundos atrás. Rápido, Drake. Pense em... tortura de
filhotinhos de coalas. Salada de chuchu com jiló... Justin pelado...
Ugh!
Pronto.
Passou.

- Isso mesmo. Obrigada. - Me dá um dos seus falsos sorrisos doces e


volta a encarar Jus. - A culpa é sua por ter contratado esse Babaca que se
acha no direito de ficar grudado em mim. - Usa o mesmo tom de malícia que
eu e agora é minha vez de dar uma risadinha.
Cara, esse é um jogo perigoso...
- Desde que você esteja em segurança, por mim ele pode ficar grudado,
do lado, em cima, embaixo, o que for. - Ah, Justin. Não explode os nossos
cérebros assim, homem... Foi um milagre divino nós dois não termos caído
na gargalhada bem na sua frente. - Enfim. Só queria saber se estava bem,

porque não te vi depois que saiu para o camarim.


- Claro que não estou bem. Estou brincando de casinha com o
Schwarzenegger aqui. - Dá um soco no meu ombro. - Como eu estaria bem?
- Não está se divertindo? Eu estou adorando minha temporada de férias

na glitterlândia. É tão prazeroso aqui, com uma companhia tão doce e


agradável quanto você...
Droga. A mulher pode não ser doce, mas sua boca com certeza é.
- Ah, não. Se vocês vão começar com isso, eu vou aproveitar a deixa
para voltar para o aconchego do meu Tuquinho. - Dá as costas e começa a
andar pelo corredor. - Não façam nada que eu não faria, crianças.
Posso estar enganado, mas acho que sua voz tinha um toque de...
diversão?

- Você esganaria esse cara, certo Jus? - Ela pergunta dando um passo
para fora do corredor e eu sorrio com a sua ousadia.
- Claro, Roxy. Mas sempre dou um beijinho para sarar depois. -
Responde sem se virar e continua seu caminho, sua risada ruidosa ecoando
pelas paredes.
Ponto para ele. Sacou na hora que alguma coisa rolou...
Acho que teremos uma conversinha particular amanhã.
Roxy fecha a porta com uma batida e se vira já cutucando meu peito
com o dedo, seus olhos em fendas. Antes que ela fale qualquer coisa, eu a

corto. - “Uma palavra sobre isso e dou um jeito de encontrarem esse seu
corpinho musculoso afogado numa poça de glitter. Blá-blá-blá meu alicate
de unhas. Blá-blá-blá steake tartare.” Já sei. Já sei de tudo. - Pego seu dedo
com os meus dentes e dou uma mordidinha de leve, seguida por um sorriso,

antes de dar as costas para ela e voltar para a cama. - Rosne o quanto quiser,
Princesa. Nada vai mudar o fato de que você me beijou. E estaria me beijando
até agora, se Justin não tivesse interrompido tão rudemente.
- ARGH! EU TE ODEIO. - Quase posso ver a fumaça saindo pelas suas
orelhas. - Com todas as minhas forças!
- Pode me odiar, mas adorou me beijar.
- Cale a boca. Só cale a boca. - Começo a responder, mas agora é ela
que me corta. - SE VOCÊ DISSER “VEM CALAR”, JURO QUE TE

DEVOLVO PARA O JUSTIN DENTRO DE UMA CAIXA DE SAPATO!


Como adivinhou que era justamente isso que eu ia falar? Tsc, tsc. Estou
ficando previsível.
Eu a vejo cruzar o quarto pisando duro e se deita na ponta mais afastada
da cama, se enfiando debaixo do edredom e virando de costas para mim,
encerrando todo e qualquer assunto.
Só balanço a cabeça e fico em silêncio, secretamente aliviado que ela
não queira falar mais sobre isso. Eu mesmo não saberia o que dizer desse
beijo... Apago as luzes, vou para o banheiro e escovo meus dentes, olhando

no espelho e sorrindo para as marcas de unha ainda visíveis nas minhas


bochechas.
A Tampinha é selvagem...
Louca, mimada e tem sarcasmo correndo nas veias ao invés de sangue,

mas beija bem para cara***.


Volto para o quarto, deito do meu lado da cama e suspiro. Imagens dela
aparecendo perfeita sem maquiagem e só de roupão voltam a passear pela
minha mente. Jus ficou chocado por estar de cara lavada na minha frente, mas
ela só devia andar sem maquiagem por aí, isso sim. Precisei usar todos os
anos de autocontrole militar para me segurar e não a beijar em cima da mesa
naquela hora.
Ou quando apareceu com aquele pijama... Aquele inferno de pijama...

Fick Dich... Nós nos beijamos.


Scheibe... Isso é tão erado.
Suspiro e me viro para ficar de frente para as suas costas, vendo seus
cabelos espalhados pelo travesseiro e o sobe-desce suave da sua respiração.
Nós nos beijamos mesmo.
- Eu gostei, Princesa. - Murmuro para o quarto escuro, sem saber se ela
está acordada ou não para ouvir.
Fecho os olhos e adormeço.
Capítulo 14 - Eu gostei, Princesa
Roxy

“Eu gostei, Princesa”.


Três palavrinhas.
Como podem três palavrinhas inocentes fazerem o meu coração bater
no ritmo de uma bateria desafinada? Mil perguntas diferentes passam pela

minha cabeça, junto com mais mil comentários e mais mil apertos no meu
coração, mas eu decido ignorar tudo e continuo fingindo que estou dormindo.
Drake gostou...
Eu também gostei.
Muito.
Nunca vou ter coragem de admitir o quanto esse maldito beijo mexeu
comigo, nem para mim mesma e MUITO MENOS PARA ELE. Mas sim, eu
senti tudo o que sempre quis sentir e tudo que sempre tive curiosidade para

saber se era real mesmo. Ficar sem chão, arrepios, fogos de artifício, estrelas,
o mundo se encaixando...
Tenho SÉRIOS problemas, não é possível.
Como eu posso inventar de sentir tudo isso justo com Drake Hill?! O
cara que mais me deixa doida, que mais desperta meus instintos assassinos e
que parece gostar ainda menos de mim, do que eu dele. Com todos os
homens do mundo - todos os quatro bilhões ou sei lá - tinha que ser ele?
Devo estar sofrendo um caso grave de carência aguda, só pode.
Ele nem é TÃO atraente assim.

Escuto sua respiração se regularizar e imagino que tenha pegado no


sono. Viro de lado devagar, tentando fazer o mínimo de movimento possível
para não correr o risco de acordar o Babaca.
Um gemido de sofrimento escapa dos meus lábios assim que meus

olhos caem sobre ele. Pensei que iria encontrá-lo de costas para mim e não
com o seu rosto a milímetros do meu.
Droga, ele é atraente para danar.
Acho que é a primeira vez que o vejo de perto e sem ter vontade de
agredi-lo. Fica tão jovem assim... Algumas pequenas cicatrizes marcam seu
rosto e vejo alguns pelos já nascendo na sua mandíbula. Deve ter que raspar
todo dia. Sua barba selvagem foi uma das primeiras coisas que reparei
naquela primeira manhã no escritório de Jus. Ele deveria deixar crescer de

novo, combina bem com todo esse negócio de masculinidade latente.


ARGH!
Isso eu tenho de admitir que tem de sobra. Se tudo que senti embaixo
de mim cinco minutos atrás for o que eu acho que é... masculinidade de sobra
MESMO.
Seus lábios carnudos estão entreabertos e uma das mãos enormes
descansa debaixo da sua bochecha, os braços que tanto me atraem dobrados
ao lado do seu corpo.
Braços.

Ele merecia ganhar um prêmio pelos seus. Sério.


Me mexo mais um pouco, como se o seu corpo estivesse me puxando
para perto. Respiro fundo, absorvendo o cheiro do seu sabonete masculino e
dou um beijo suave na pele do seu antebraço, sentindo seus pelos fazerem

cócegas no meu nariz.


Não importa o quanto eu seja louca, nada parece assustá-lo. Nada
parece abalá-lo. Tudo bem que perde a paciência de três em três minutos e
adora rosnar para mim, mas não parece... me julgar. Isso está mexendo
comigo.
Mas, com certeza, não justifica o meu comportamento inaceitável,
inapropriado, indecente e tarado! Amanhã eu volto ao normal e deixo esse
momento de insanidade para trás.

Eu juro.
Com meu rosto encostado de leve na sua pele quente, consigo relaxar e
pego no sono na hora...

**

- Sério, Roxanne. Você precisa parar de testar os limites do meu


autocontrole. - Algo me desperta do meu sonho tranquilo. Eu estava andando
por uma praia de areia branca, chutando as ondas que quebravam aos meus

pés, de mãos dadas com... O DONO DESSA VOZ.


Abro os olhos assustada e vejo músculos embaixo de mim. Me mexo
no lugar e sinto mais um pouco de músculos. DRAKE! Não é como se eu
tivesse jogado uma perna casualmente por cima dele durante a noite. Não. Eu

escalei o homem. Não tem uma parte do meu corpo que esteja tocando o
colchão. Estou toda e inteirinha em cima de Drake Hill.
Volto a fechar os olhos. - Por favor, que isso seja um pesadelo. Por
favor, que isso seja um pesadelo. Por favor, que isso seja um pesadelo.
- Bom, acho que não deixa de ser um tipo de pesadelo. Estou sofrendo
aqui, Princesa. Isso eu te garanto. - Se mexe um pouco embaixo de mim e eu
sinto exatamente o tamanho do seu sofrimento.
- Oh, eu quero morrer. - Escondo meu rosto na primeira coisa que

encontro - que por coincidência é o seu pescoço cheiroso.


Sinto seu grande corpo chacoalhar embaixo de mim, enquanto ele ri e
descansa suas mãos casualmente nas minhas costas. - Achei que quisesse me
matar, na verdade.
- Também serve. - Ergo o rosto e apoio o queixo no seu peito, tentando
ignorar sua mandíbula esculpida e os olhos verdes brilhando com diversão. -
Ou podemos simplesmente fingir que as últimas doze horas não aconteceram.
Eu basicamente tive um surto psicótico de carência, aquela sua história da
palha e do fogo. Blá-blá-blá. Não vai acontecer de novo, pode confiar. Não

vai.
Acho que nunca falei tão sério na minha vida.
Ele dá um sorriso de canto e ajeita um fio de cabelo atrás da minha
orelha. - Eu aceito “fingir que nada aconteceu” com uma condição.

Dou um gemido de sofrimento em resposta. - Por que estou sentindo


que não vou gostar disso?
- Porque você não vai, tenho certeza. É o que torna tudo mais divertido.
O trato é o seguinte... - Pega outra mecha e começa a enrolá-la em torno do
seu dedo, num gesto íntimo, quase um carinho. Ah, cara. Isso é errado de uns
cinquenta jeitos diferentes. - Eu esqueço do beijo, do amasso e de você me
usando como saco de dormir, se me contar porque tenta tanto fugir.
- Fechado. - Concordo rapidamente, querendo resolver isso de qualquer

jeito, antes que essas vontades que estão crescendo dentro de mim saiam para
fora do meu corpo e eu acabe fazendo outra loucura... como beijá-lo de novo.
Eu posso mentir na minha resposta e ele nunca saberia.
- Eu vou saber se você mentir. - Estreita seus olhos para mim. Droga,
eu esqueci desse pequeno detalhe. O homem consegue me ler como se eu
fosse um livro aberto.
- Não vou mentir. Não mais. - Abre um sorriso torto. Quero só ver
como vou escapar dessa agora.
- Muito bem então. “A Saga da Tampinha Em Fuga” vai ser a nossa

historinha de dormir essa noite.


- O quê? Você vai continuar aqui? - Arregalo os meus olhos. Ah não.
Não, não, não.
- Não. - Ufa! - Vou continuar no seu quarto de hotel de Madri. Você

planeja sair de cima de mim em algum momento do dia? Achei que tínhamos
uma avião para pegar.
MERDA! Eu ainda estou em cima dele mesmo!
QUAL É O MEU PROBLEMA?!
Jogo as cobertas de lado e levanto de um pulo. - Eu só me distraí. Não
fique pensando coisas. Isso quer dizer, no máximo, que você é confortável.
Só isso. Mais nada.
- Concordo com você. - Cruza os braço atrás da cabeça, exibindo todos,

todos, todos os seus músculos. Bíceps, trapézios e mais alguns que eu não sei
como se chamam, porque eu nem sabia que existiam. ME INTERNEM. - Não
pensei nem por um segundo que você estava adorando ficar deitada em cima
de mim, toda aconchegada feito uma gatinha, se esfregando no meu pescoço
e ronronando. Como isso passaria pela minha cabeça?
Raiva nubla minha visão e só consigo pensar que preciso tirar o
sorrisinho esperto da cara desse imbecil. Pego um travesseiro e jogo bem no
seu rosto, subindo em cima do seu corpo e tentando sufocá-lo. Só tentando
mesmo, porque ele está rindo sem parar da minha tentativa de babaquicídio. -

EU. TE. ODEIO. EU. TE. ODEIO. EU. TE. ODEIO. - E só ri mais e mais.
Desisto do sufocamento e começo a bater nele com o travesseiro, em
todas as partes que consigo alcançar. - HEY! Cuidado com os babaquinhas. -
Ele coloca as duas mãos na frente do corpo, parecendo assustado. Paro o meu

ataque e respiro fundo. Machucar os babaquinhas de novo seria sacanagem


demais até para os meus padrões. - Vou tomar banho. Só faça um favor para
nós dois e desapareça até a hora de sairmos para o aeroporto. Juro pelo meu
coturno de glitter preferido que não vou fugir. Não agora, pelo menos.
Ele se recosta na cabeceira e arregala os olhos ao me encarar. Deve ter
sentido minha fúria... ou não, porque o sorriso espertinho volta ao seu rosto. -
Oh, eu acredito que não vai tentar fugir agora. Todos os bares de motoqueiros
estão fechados.

Continua me encarando sem nem piscar e seu sorrisinho só fica maior a


cada segundo. - Que foi agora? Por que essa cara de besta?
- Porque sua blusa está fora do lugar e eu estou quase vendo uma das
suas... princesinhas.
Olho para baixo e vejo que um dos meus peitos está quase escapando
pela regata. ERA SÓ O QUE ME FALTAVA HOJE. A ajeito mais que
depressa no lugar. - Nunca viu peitos antes, Babaca?
- Vários. Os seus inclusive, quando comprei as fotos originais que
aquele paparazzo tirou no bar. Mas confesso que parecem ser bem mais

impressionantes ao vivo.
- Você... comprou? Por quê? - Esqueço até da minha vontade de matá-
lo.
- Porque meu trabalho não é só proteger seu corpinho coberto de glitter,

Tampinha. Meu trabalho é me certificar que você seja tratada com o respeito
que merece e que se sinta segura, de todas as formas. - Seus olhos queimam
com determinação e meu coração queima com alguma coisa que eu nem sei o
que é.
Fico olhando para ele, sentindo minha cabeça rodar. - Foi Justin quem
te pediu para fazer isso?
- Justin não sabe e agradeceria se continuasse assim, ou vou ter que
ouvir três horas de sermão sobre tomar “decisões conjuntas”. Só te contei

para te tranquilizar. - Dá de ombros, como se não fosse grande coisa. Como


se não fosse uma das coisas mais legais que já fizeram por mim.
- Me diga o valor que gastou, eu insisto em te reembolsar. Uso a minha
conta pessoal, não se preocupe. - Ele se levanta e anda até onde estou,
parando na minha frente com todo o seu tamanho impressionante. Eu engulo
em seco, antes de olhar para cima para encará-lo. Preciso admitir que o
“Tampinha” até que faz sentido nesse contexto.
- Não quero dinheiro pelos meus serviços prestados. - Fala tão perto do
meu rosto que eu sinto sua respiração a cada palavra. Nem para ter mau hálito

o imbecil serve, inferno.


- O que quer então? - Pergunto com medo da resposta.
- Na hora certa você vai saber. - Pisca para mim e se inclina para me
dar uma mordidinha de leve na ponta da orelha.

PAGE CARDIO!
PAGE CARDIO!
Então, anda até sua mala, veste uma camiseta preta, calça seus tênis de
corrida e sai do quarto, me deixando sozinha para digerir essa avalanche de
informações.
E de sensações.
Capítulo 15 - HÁ! Como eu queria acreditar nisso
Drake

Dez quilômetros de corrida depois e eu ainda estou pensando na


Tampinha.
Pensando no seu corpo em cima do meu, em como ela se encaixou

naturalmente contra mim, como se meu peito fosse o seu lugar no mundo.
Balanço a cabeça e aumento mais a velocidade da esteira, passando para uma
corrida quase desumana.
Um pouco de atração física é normal, somos os dois jovens e atraentes,
convivendo 24 horas por dia. Vai ser só uma questão de tempo até
aprendermos a controlar esses “impulsos carnais”. Eu sei tudo sobre
autocontrole, fui treinado para isso e sou conhecido por ser perfeito nisso.
Caramba, eu ganhei um apelido que me persegue faz doze anos por conta

desse maldito controle perfeito.


Vou respeitar os limites daqui para frente, antes que eu acabe ainda
mais confuso do que já estou.
Me permito pensar uma última vez no beijo da noite passada, em como
acordamos enroscados hoje, na “fuga das princesinhas” e na sua expressão
quando contei sobre as fotos.
Meu problema é quando abaixa a guarda, aí sim ela me quebra. Porque
sei que preferia ter de usar um terninho cinza sem graça pelo resto da vida, a
deixar que eu veja sua vulnerabilidade. Acho que na hora em que aparecer

toda maquiada, cheia dos glitters e gritando comigo, vai ser mais fácil colocar
minha cabeça no lugar.
Preciso bolar uma estratégia... Nada mais de beijos, nem na bochecha.
Nada mais de mordidas. Nada mais de desejar vê-la sorrindo. E sair correndo

caso ela apareça sem maquiagem na minha frente de novo.


Sim, é isso.
Corro até a exaustão e decido que já dei tempo suficiente para Roxanne
conseguir me amaldiçoar - e se amaldiçoar - o suficiente. Entro no elevador
enxugando o rosto com a minha camiseta e me sentindo mais tranquilo, até
que dou de cara com Justin.
- Era você mesmo que eu queria.
Reviro os olhos e aperto o botão para o meu andar. - Bom dia para você

também.
- Vai me contar o que está acontecendo entre vocês, ou prefere que a
minha imaginação criativa continue funcionando a pleno vapor?
- Acredite, nem a mais criativa das imaginações daria conta de criar as
situações que eu e Roxy nos enfiamos nos últimos dias. - Ainda bem que tudo
ficou no passado. Daqui para frente, seremos estritamente profissionais,
cordiais e educados.
HÁ! Como eu queria acreditar nisso.
- Drake... - Sua voz tem um tom de aviso.

- Eu sei, eu sei. Não precisa dizer nada. - “Você trabalha para ela. É
pago para protegê-la. Mantenha os limites”. Meu cérebro sabe de tudo isso,
só precisa se lembrar de explicar para o resto do meu corpo.
- Ótimo. Saímos em quinze minutos. O café da manhã será servido no

avião. - As portas se abrem e eu saio, balançando a cabeça. - Ah, e Drake?


Paro no lugar e me viro, o vendo segurar o elevador e sorrir para mim. -
Que foi?!
- Grace está te procurando e ela parece bem determinada essa manhã. -
Volta para dentro rindo e se divertindo com o caos que ele instaurou na
minha vida.
Ótimo. Vou dar um jeito de sentar do lado de John no jato, só para ver
se meu ex-melhor-amigo continua com esse sorrisinho ridículo no rosto.

Entro no quarto e respiro aliviado ao ver Roxy sentada na cama,


terminando de amarrar seus coturnos de brilhos. Calça de couro, maquiagem
preta, batom pink e o cabelo preso em dois coques no topo da sua cabeça -
com isso eu posso lidar.
Pego a calça de um terno, uma camisa limpa, minha nécessaire e passo
reto para o banheiro, sem trocar uma palavra com ela. Isso! Distanciamento.
Parabéns, Drake. Continue assim, homem. Continue assim pelo próximo mês.
Tomo um banho rápido, faço a barba que já começou a crescer e me
visto, tudo em cinco minutos. De volta para o quarto, Rox está de olhos

fechados, sentada com as pernas cruzadas no chão, parecendo meditar.


Arrumo minha mala sem fazer barulho, passo perfume, coloco meu
relógio - herança do meu avô e o único bem material a que sou apegado - e
me sento na cama para calçar os sapatos.

Meu movimento chama a sua atenção e ela abre os olhos. Encara meus
pés sem falar nada e a vejo engolir em seco. Visto a meia em um e a
Tampinha acompanha o movimento sem nem piscar. Essa é a mesma
expressão que estava em seu rosto ontem, antes de me atacar.
Scheibe, isso é sexy.
Alguém tem uma coisa com pés...
Fazendo mais devagar dessa vez, cruzo a perna e apoio meu tornozelo
no joelho, massageando meu pé por alguns segundos e a vendo morder os

lábios. Estou torturando Rox e me torturando de brinde - como sempre.


Meu corpo começa a reagir ao seu olhar e eu acho melhor encerrar meu
showzinho. E acho melhor começar a procurar ajuda, porque devo ter
enlouquecido de vez. Meu “distanciamento” não durou nem 10 minutos.
Visto meu sapato e fico de pé, dando as costas para ela e colocando
meu paletó. Não posso nem pensar em vestir uma gravata hoje, ou vou acabar
me enforcando com ela. - Vamos?
- Vamos. - Responde baixinho. Pego duas das suas malas numa mão, a
minha na outra e deixo a menor para trás. Sei que quer carregar alguma coisa,

para manter o seu orgulho intacto. E, droga, eu a respeito ainda mais por isso.
- DRAKE! - Nem piso no corredor e Grace se materializa na minha
frente, se jogando no meu pescoço. - Como está o meu segurança preferido
nessa manhã?!

- Deixa o homem respirar, mulher. - A voz tranquila de Emma me salva


do segundo sufocamento do dia. Cada segundo tenho mais certeza de que
essa banda vai me matar. - Bom dia, Drake.
- Bom dia, meninas. - Uso o coletivo, para evitar ter de falar direto com
Grace. - Tudo bem com vocês?
- Muito bem. - Sara responde, sorrindo para mim com doçura. - Quer
uma ajuda aí?
- Não precisa, obrigado. - Começo a andar com elas e só então percebo

que Roxy sumiu. Desapareceu na sua nuvem de glitter. - Pisquei por um


segundo e já perdi a chefe de novo?
- Ela desceu pelas escadas quando ahn... nós aparecemos. - Emma me
dá um olhar significativo, indicando Grace.
Ah.
Scheibe.
Minha Tampinha mimada... não quer ter nada comigo, mas não quer
que ninguém mais tenha. Não que eu queira também. Com nenhuma das
duas. Só estou apontando a ironia da situação.

- Certo. - Descendo com a mala pela escada... essa garota não tem jeito.
Só falta cair e quebrar o pescoço. Tenho certeza que alguma cláusula no meu
contrato me culparia, se isso acontecesse.
Chamo o elevador e espero que todos estejam dentro para entrar

também. Elas começam a tagarelar sobre o show de Madri e eu foco minha


mente na multidão que vou ter de encarar para sair desse hotel.
Chegando no térreo, já começo a ouvir os gritos e, para o meu alívio,
vejo Roxy e seu pescoço intactos ao lado de Justin e John. Entrego as malas
para um carregador e vou ao encontro deles.
- Pronta para encarar mais uma rodada de Roxettes? - Sim, os fãs dela
têm nome.
- Você vai me deixar sair pela frente? - Seu queixo cai pela segunda vez

no dia.
- Achei que isso fosse importante para você. - Ergo uma sobrancelha. -
Não seja confusa uma hora dessas da manhã, Roxanne. E desde quando eu
tenho o poder de “deixar” ou “não deixar” você fazer qualquer coisa?
- Desde que se mudou para o meu quarto contra a minha vontade. - Ela
fala entredentes, me dando um olhar ameaçador de quem poderia me rasgar
em pedacinhos. - Não seja irritante uma hora dessas da manhã, Drake.
- Eles são tão fofinhos juntos. Awnt! - John aperta as minhas
bochechas. - Poderia passar o dia todo vendo essa novela.

- E eu poderia passar o dia todo com essas suas mãos em mim. - Faço
minha melhor expressão maliciosa e ele gargalha, ao mesmo tempo em que
Jus me dá uma cotovelada.
- Juro que eu entendo a parte do “Eu Odeio Esse Cara” às vezes, Roxy.

Vamos embora. O jato já está nos esperando. - Só de mencionar a palavra


“jato” os ombros da Princesa já ficam tensos.
Não gosto disso. Talvez devêssemos ir de trem na próxima. Preciso
lembrar de dar essa sugestão para Jus.
- Vamos logo. - Coloco minha mão na base da sua coluna e a guio porta
afora, saindo para o corredor de fãs histéricas. Até escuto algumas gritando o
meu nome! Vai entender.
Sinto como se estivesse num jogo de futebol americano, a Princesa é a

minha bola de glitter, a van é a linha do Touch Down e nada vai me impedir
de chegar até lá.
Só quando já está acomodada com segurança no banco e eu passo o
cinto pelo seu corpo é que volto a respirar. - Não foi tão ruim dessa vez.
- Não é ruim quando tem só fãs. O problema é a imprensa. - Ela alonga
os músculos do seu pescoço e meus dedos coçam de vontade de apertar os
nervos ali.
Uma olhadinha para o céu e eu entendo tudo. Outro dia nublado... outro
dia que não tem como dar certo. - Podemos malhar juntos hoje, Drake?

Viu só? Nada certo.


Grace me encara com expectativa do banco da frente, um sorriso sacana
entregando que quer tudo, menos malhar. Agora, a tensão emana como ondas
do corpo da Tampinha. Como se eu fosse dar trela para qualquer mulher,

depois do “acontecimento-que-não-deve-ser-nomeado” que rolou entre a


gente. Não, eu não sou desses.
- Sinto muito, mas eu já fui malhar hoje cedo.
- Que pena. - Faz um biquinho. - Ah, Roxy! Você viu quem estará no
festival hoje? A Four Dragons.
- Quem? - Pergunto, fazendo uma careta e Justin se inclina para me
responder, parecendo se divertir com algo.
- A nova banda de Guy Forrester.

Não, nada ainda. - A nova banda de quem?!


- Você vive mesmo embaixo de uma pedra, cara. - Ele balança a
cabeça. - Four Dragons é uma banda pop incrível da qual todos somos fãs,
mas Roxy tem um apego especial a um dos membros.
- E por apego especial você quer dizer... - Agora minha pergunta é
dirigida diretamente a ela.
Um suspiro, um revirar de olhos e um biquinho foram necessários antes
que se dignasse a me responder.
- Quer dizer que Guy Forrester é meu ex-namorado.

Ok.
Eu poderia ter vivido sem essa informação.
Capítulo 16 - Não do jeito que você espera que seja esse negócio

de amor
Roxy

- Então, qual deles é o seu ex? - Drake me pergunta assim que paramos
ao lado do palco, vendo a Four Dragons arrasar com seu som pop puro. Eles

ficam melhores a cada dia e estão bem mais maduros do que a última vez que
os vi se apresentando. - Não, não precisa me dizer. Você não namoraria o
baterista, então só pode ser o cara do baixo.
- Por que eu não namoraria o baterista? - Viro para encará-lo com
curiosidade e dou uma risadinha ao ver a sua pose contrariada. Braços
cruzados, sobrancelhas franzidas e a expressão de quem preferia estar em
qualquer lugar do mundo, menos aqui.
- Porque ele não faz seu estilo. É parecido demais com essa sua versão

tresloucada que usa quando está em público. - Dá um passo para o meu lado e
se inclina para falar próximo ao meu ouvido. - Digamos que existam a Rox e
a Anne. A Rox, sua personagem, sairia com aquele cara. Mas a Anne, você
de verdade, escolheria exatamente um mauricinho como o baixista de camisa
rosa. Estou certo?
- Você e todas essas teorias da conspiração - Reviro os olhos, afogando
toda a verdade das suas palavras bem fundo no meu peito. Babaca maldito. -
Eu pegaria Nico fácil, ele parece que sabe exatamente o que fazer com uma
mulher. - Parece mesmo. O olhar malicioso com que encara a multidão

gritando seu nome, ao mesmo tempo em que castiga sua bateria com força,
tudo isso sem uma camisa... Começo a me abanar. - UFA!
- Ah, por favor. Se é para escolher alguém, fique com seu ex. -
Examina Guy com atenção. - Ele parece um cara decente.

- Sim, ele é um cara muito decente mesmo. - Sorrio com carinho para o
meu ex preferido. Terminar com esse lindo foi uma das coisas mais difíceis
que já fiz na vida, mas não tínhamos como continuar do jeito que estávamos.
Não era justo para nenhum de nós... - Foi um grande namorado.
- E por que terminou então? - Mais uma vez não parece estar me
julgando, só parece curioso. Não sei porquê, mas isso só me deu vontade de
arrancar um sapato e tacar na sua cabeça, mandando que seja pelo menos um
pouco desagradável.

- Como sabe que não foi Guy quem terminou comigo?


- Se ele tivesse terminado com você, não estaríamos aqui
tranquilamente discutindo sobre o cara. Aposto que estaria tentando me
convencer a quebrá-lo no meio e sumir com o corpo.
- Você faria isso? Tem um cara que se recusou a ir comigo no baile de
formatura. O nome dele é Tommy Samson. Não precisa quebrá-lo no meio,
um braço já resolve bem a situação.
- Cuidarei disso com prazer, assim que tiver uma brechinha na agenda
entre todas as fugas, as brigas e os amassos. - Tenta segurar uma risadinha e

se vira de costas para o palco, parando bem na minha frente, irradiando


intensidade pelos olhos verdes. - Eu sei porque terminou com esse
mauricinho.
- Oh, tenho certeza que sabe. Você sempre sabe tudo. Mal posso

esperar para ouvir outra teoria adorável e nada fantasiosa. - Me inclino mais,
sem me deixar abalar pela sua proximidade, erguendo o queixo para encará-
lo.
- Você não estava apaixonada pelo cara. Não o amava. Não do jeito que
você espera que seja esse negócio de amor.
Bingo.
Para a minha sorte, o show acaba e os quatro integrantes da banda
começam a sair do palco, justamente para o lado onde estamos. Quando me

vê, Guy amplia ainda mais o seu sorriso doce e corre na minha direção,
passando seu baixo para trás do corpo e me pegando num abraço de urso.
- Ora, se não é a minha ex-namorada preferida. - Me aperto mais contra
ele, sentindo seu cheiro familiar... o cheiro que já foi meu num passado
distante.
- Olha se não é o meu ex-namorado preferido. - Me afasto apenas o
suficiente para olhá-lo. - Você está lindo.
- E você está maravilhosa, como sempre.
- TAMBÉM QUERO ABRAÇO. - Lexy, a vocalista deslumbrante e

seu cabelo pink chegam ao nosso lado, envolvendo nós dois nos seus braços.
- SANDUÍCHE DE ROXY!
Nunca conheci alguém com uma energia tão boa quanto ela. A não ser
talvez...

- EU OUVI SANDUÍCHE?! - Sim, a não ser o dono dessa voz.


Antes que eu entenda o que aconteceu, estamos todos no chão e com
um Daniel Potter em cima de nós, sorrindo um sorriso gigante e luminoso.
Dan é marido de Lexy, baterista da Black Road - banda de rock fenômeno
mundial e headliner de hoje - e o ser humano mais hiperativo que já
caminhou sobre a terra.
- Oi, Dan. - Consigo falar quando seu rosto entra em foco e ele se baixa
para me dar um beijo na bochecha. Um beijo que mais parece uma lambida

de cachorro.
- Me diga uma coisa, Princesa do Pop, Rainha do Glitter e Soberana do
meu Coração. Por que tem um cara gigante ali me olhando como se quisesse
usar minha pele perfeita para fazer um tapete de sala?
- Porque ele é o meu segurança e você acabou de me atacar, homem. -
Nem imagino a expressão assassina que deve estar no rostinho feio de Drake
agora.
- Ops! Foi mal. A Lexy já me explicou que eu preciso avisar antes de
atacar as pessoas. - Ele sai de cima de mim e Guy me ajuda a levantar,

aproveitando para dar um beijo na minha mão. Sempre carinhoso. - Pode


relaxar, grandão. Sou inofensivo. - Dan dá tapinhas nas costas de Drake, que
continua olhando para todos nós como se fôssemos um bando de loucos.
- Você é tudo, menos inofensivo. - Ivy, a guitarrista maravilhosa dá um

tapa na cabeça ruiva dele, antes de vir me abraçar também. - Roxy, estou
apaixonada pelo seu novo álbum.
Nico concorda entusiasmado, se postando ao seu lado e enxugando o
rosto perfeito com uma das toalhas que os roadies estão distribuindo. -
Estávamos ouvindo juntos ontem à noite e caramba, mulher, você está
mandando muito bem nos vocais.
- Ouvindo juntos, hein? Contem-nos mais sobre isso. - Dan desvia a
atenção do grupo para os dois e todos saem numa discussão sobre o fato de

Nico e Ivy estarem ou não “Afogando o ganso em segredo”.


- Ah, olá. Acho que não fomos apresentados. Eu sou Guy Forrester. -
Sempre educado, ele me solta para cumprimentar Drake. Por um, momento
acho que meu segurança vai rosnar e esmagar os dedos do cara, mas só dá um
sorriso do tipo gentil e aceita o aperto com educação.
- É um prazer conhecê-lo. Eu sou Drake Hill, aquele que é fã de
qualquer um que decida estar na vida de Roxanne Reed por livre e
espontânea vontade. - Trocam um daqueles olhares de compreensão típicos
masculinos.

- Você tem de admitir que nunca é entediante estar na vida de Roxanne


Reed.
Reviro os olhos. - HEY. EU ESTOU PARADA BEM AQUI.
- Vamos lá, gatinha. - Ele me abraça pela cintura. - Você sabe que é

intensa.
- Intenso é o “Jeito Guy” de dizer que alguém é louco. Aposto que
chama Dan de intenso também. - Dou um beijo na sua bochecha macia,
sentindo uma avalanche de recordações. Não do tipo que dá vontade de
reviver, só do tipo que deixam o coração quentinho. - Deus abençoe a sua
fofura.
Drake franze as sobrancelhas para nossa intimidade natural. Sempre foi
assim entre nós, desde que nos conhecemos quatro anos atrás em uma

premiação. Ele deu seu sorriso de bom-moço para mim e eu soube que queria
tê-lo. Guy pediu meu número de telefone e foi questão de dias até o pedido
de namoro.
Depois, levamos um ano para perceber que funcionávamos muito
melhor como amigos, do que como amantes. Ele sempre me tratou bem, mas
nunca me fez ver estrelas. Compartilhávamos a mesma vontade de nos
apaixonar, só não foi um com o outro, então conversamos e decidimos
terminar. Como é cavalheiro demais, fez questão de dizer que eu tinha
acabado tudo.

Logo depois, sua antiga banda acabou... Ainda bem que a Four Dragons
surgiu porque se tem alguém que merece ser feliz nesse mundo, esse alguém
é Guy Forrester.
- Guy! Te achei. O Josef está te procurando e... - Uma mulher de cabelo

azul aparece no corredor e faz uma expressão idêntica à de Drake, um misto


de desconfiança e irritação. - Desculpa, não sabia que estava acompanhado.
Esse olhar de desprezo foi para mim?
O que eu fiz dessa vez, gente?!
Tô quieta aqui!
- Roxy, essa é Lizzie, a irmã da Lexy. Liz, essa é...
- Roxanne Reed. Eu sei. É um prazer conhecê-la. - Seu tom é educado,
mas não faz nenhuma menção de me cumprimentar. Não sei o que fiz para

essa garota, mas sei que ela não é uma Roxette.


- O prazer é todo meu, Lizzie. Bom, acho que preciso subir ao palco. -
Me desvencilho dos seus braços, dando um último beijo no seu rosto. - Foi
muito bom te ver, gatinho. - Não resisto em usar o nosso antigo apelido.
- Vou assistir ao seu show, gatinha. - Ele pisca para mim e me puxa
para mais um abraço, até que Drake pega minha mão na sua, me arrastando
pelo corredor.
- Vou cantar “Thinking Of You” para você! - Grito para ele e ouço sua
gargalhada ruidosa mesmo à distância.

Drake bate a porta do meu camarim vazio e cruza os braços, franzindo


as sobrancelhas para mim. - Tem certeza de que não gosta mais dele?
- Foi você quem disse que eu não gostava dele. - Checo minha
maquiagem no espelho, fugindo da sua pergunta.

Pego o retorno que alguém deixou na minha penteadeira e começo a


tentar passá-lo por dentro da blusa de tecido fino, todo bordado, que escolhi
para hoje. Na primeira tentativa, já faço o fio se enroscar todo nos cordões
trançados das costas. Drake bufa impaciente e vem me ajudar, erguendo
minha blusa e tocando minha pele de leve com seus dedos ásperos.
- A menina de cabelo azul gosta dele, então escolha outro cara para me
fazer ciúmes. Não arraste inocentes para o seu joguinho. - Ele termina de
passar o fio pela minha gola e prende o receptor no cós da minha calça toda

bordada em tons de rosa, da cor do cabelo de Lexy.


- O dia em que eu me preocupar em fazer ciúmes em você, por favor,
me interne na clínica psiquiátrica mais próxima. E como sabe que a garota
está a fim dele?
- Você não percebeu?! Por isso vocês namoravam, eram dois lerdinhos.
- Ele me vira pelo quadril para encará-lo. - Meu trabalho é observar as
pessoas, Tampinha. Aprenda isso de uma vez. Sei que ela está apaixonada, do
mesmo jeito que sei que você não está.
- Não?

- Não. Sei que foram próximos, mas não rola tesão mais.
- E como você observou isso? - Ignoro a malícia nos seus olhos e a
reação do meu corpo quando ele disse “tesão”.
- Simples. Você não olha para ele como olha para mim. - Dessa vez,

decidiu dar uma mordida no meu ombro, deixando seus dentes passarem de
leve pela minha pele, deixando um rastro de arrepios.
- E depois sou eu que não tenho um pingo de autopreservação no corpo.
- Dou uma cotovelada no seu diafragma, como ele mesmo ensinou e o
Babaca dá um passo para trás, como se tivesse perdido o ar. Bem feito. -
Claro que não olho para você do mesmo jeito que olho para ele. Eu não quero
matá-lo.
Drake dá uma gargalhada, balançando seu grande corpo. - Ah, Princesa.

Nós vamos ter uma conversa séria mais tarde.


Me arrepio só de pensar em outra noite com ele. - Pare de ser imbecil
por cinco segundos, mantenha esses dentes longe de mim e me ajude. Se o
que falou sobre Lizzie é verdade, nós vamos ajudá-los e vamos acelerar as
coisas. Guy merece um empurrãozinho.
- Como? - Está me olhando com desconfiança, mas não rechaça minha
ideia de cara.
- Vamos fazer Lizzie pensar que eu ainda estou interessada. Quem sabe
assim ela não marca território de vez? - O plano já está todo bolado na minha

mente.
- E como eu me encaixo nessa história?
- Vamos fazer com que ele venha ao meu camarim depois do show e
você vai se certificar de que Lizzie veja. - Drake ergue uma sobrancelha.

- Não sei se gosto dessa ideia.


- Ciúmes por me deixar sozinha com Guy? - Eu rio tanto da sua
expressão enfezadinha que meu retorno até se solta da calça.
- Nos seus sonhos, Tampinha. E nem pense em usar esse plano como
desculpa para escapar. Temos um compromisso depois do show, você fez
uma promessa e eu espero que cumpra.
- Eu sei, eu sei. - Resmungo de volta, tentando prender o receptor de
volta na calça. - Posso ser muitas coisas, mas sou uma mulher de palavra.

Drake se aproxima de novo para me ajudar, suas mãos lutando com a


trava e os dedos esbarrando mais uma vez na minha pele nua. - Vai dedicar
uma música para mim no show de hoje também?
- Claro. Se chama “Oops, I Killed You Again.” - Me viro para dar um
sorriso de deboche para ele. - Admite, você ficou com ciúmes quando Guy
me abraçou.
- O dia que você admitir que não gosta de ver Grace ao meu redor, eu
admito o que sinto ao ver outro cara te dando beijinhos e se fazendo de
íntimo com você. Pronto. - Dou uns pulinhos para ver se está tudo no lugar,

mas ainda não sinto o aparelho firme como gosto.


- No dia em que o inferno congelar e a gente passar mais de 10 minutos
sem rosnar um para o outro, eu admito tudo o que quiser. Pode colocar mais
para o meio, por favor?

- Não tem alguém para fazer isso por você, não? - Claro que precisa
reclamar, ou não seria o bom e velho Drake.
- Sua mão não vai cair, Babaca. Anda logo, tenho cinco minutos para
estar no palco. - Ele prende do jeito que pedi e, sem aviso, se inclina para me
dar outra mordida suave, agora na curva lateral da minha barriga. Ao invés de
me afastar, fecho os olhos e suspiro, sentindo a pressão aumentar um pouco,
sua língua fazendo uma carícia suave...
- E mais essa agora?! - Justin entra bem nesse momento, flagrando meu

segurança com os dentes cravados na minha pele e a minha expressão...


atordoada. - Mal posso esperar para ouvir a explicação de vocês.
Capítulo 17 - Você conseguiria qualquer coisa, Anne
Drake

É oficial.
Eu perdi o juízo.
Completamente.

Eu mordi a Tampinha mais uma vez, mesmo depois de todo aquele blá-
blá-blá de autocontrole. Tudo culpa dessa maldita curvinha na barriga. Solto
sua pele devagar e encaro meu melhor amigo. Pelo seu olhar, acho que
concorda plenamente com a minha conclusão de que enlouqueci de vez.
- Não é nada do que está pensando, Jus.
- Oh, eu aposto que não mesmo. Porque não consigo pensar em nada
que explique isso. - Aponta com o dedo para nós. Ficamos os dois em
silêncio, mil histórias passando pela minha cabeça, uma menos plausível que

a outra. “Tropecei e cai de cara na cintura gostosa dela” não me parece muito
realístico. - Caramba, seja lá o que for, se fez os dois ficarem quietos,
continuem fazendo pelo tempo que for preciso. Mas agora, preciso que vão
para o palco. A banda já está entrando.
Sem falar mais nada e sem nos olharmos, saímos do camarim e
andamos pelos corredores escuros até as coxias. Um roadie entrega o
microfone para a Tampinha e ela agradece com um sorriso doce.
Do tipo que nunca daria para mim.
A multidão começa a gritar assim que a banda toca os primeiros

acordes da música de abertura e eu consigo sentir o nervosismo tomando


conta do seu corpinho pequeno. - Festivais sempre me deixam nervosa. - Ela
confessa com a voz fraca.
- Por quê? - Pergunto baixinho, para que todos os técnicos ao nosso

redor não escutem e entro na sua frente, desviando sua atenção da plateia
gigantesca.
- Porque não tem só fãs meus ali fora. Tem fãs da Carcass, que se
apresentou mais cedo. E eles são uma banda de metal, Drake! - Esses eu
conheço. Grande som, mas acho que não seria esperto da minha parte falar
isso para ela agora. - Depois de mim vem a Black Road, rock puro. E se me
vaiarem? E se jogarem coisas em mim?
- Princesa, eu não sou seu fã, nem fã do seu tipo de música.

Suas sobrancelhas delicadas se franzem para mim. - Espero que tenha


um “mas” vindo aí.
Dou um sorrisinho e balanço a cabeça. - Mas... eu achei seu show
muito bom. Você é incrível, talentosa, tem uma banda foda e não faz
playback. Todo mundo vai respeitar isso.
Dá um suspiro profundo, fecha os olhos por alguns segundos e parece
se acalmar. - Certo. Eu consigo.
- Claro que consegue. Você conseguiria qualquer coisa, Anne. - Me
olha com a expressão surpresa e eu mesmo preciso me controlar para não

fazer cara de chocado, nem dar um tapa na minha própria testa.


Anne?
De onde saiu essa agora?! Estão drogando minha água nesse lugar, só
pode.

Para a minha sorte, a banda chega na deixa de ROXY, TAMPINHA,


PRINCESA, ROXANNE - nada de Anne - e ela é obrigada a sair correndo e
invadir o palco numa explosão de luzes e energia. - BOA NOITE, MADRI.
Estão prontos para a melhor noite das suas vidas? - As pessoas respondem no
mesmo tom, mas ela não se dá por satisfeita. - Eu não ouvi. ESTÃO
PRONTOS, MADRI?
A multidão dá um verdadeiro rugido de animação e a bateria começa a
batida acelerada da primeira canção, junto com o riff animado da guitarra e a

voz rouca de Rox. E assim, ela tem todas as 50 mil pessoas na palma da sua
mão.

**
- Hora de colocar nosso plano em ação. - Ela murmura para mim assim
que volta para a coxia, toda ofegante e suada. Ainda estou sentindo minha
cabeça girar por assistir à mais esse show. Droga, a Tampinha é boa. Como
pôde duvidar do seu talento, por um segundo que seja, é um mistério para
mim.

- Tem certeza de que quer fazer isso? - Roubo sua garrafa de água e
tomo um longo gole. Um banho frio também viria bem a calhar agora.
- Tenho. Guy merece um final feliz. Das duas últimas garotas de quem
gostou, uma disse que não o amava e a outra se casou com um dos melhores

amigos dele. - Ela aponta sua unha cheia de glitter para o outro lado do palco,
onde uma ruiva estonteante este ajeitando um retorno na cintura de um cara
que está... usando saia?! Legal.
- Aquela é Chloe Hunter, ao seu lado está Axl, seu marido e baixista da
Black Road. Guy era alucinado por ela e acho que teve uma quedinha por
Lexy também, sem contar o fiasco que eu fui. Acho que todas as mulheres de
quem gosta, acabam não ficando com ele. Se existe uma chance de ajudá-lo a
desenrolar as coisas com Lizzie, eu vou ajudar, Drake.

A ferocidade com que fez esse discurso me surpreendeu. Se é verdade


que o homem passou por tudo isso, eu quase fico grato por todos esses anos
trancafiado em missões especiais intermináveis. Ninguém merece ter o
coração pisoteado tantas vezes.
- Certo. A garota do cabelo azul está ali, do lado do loiro com cara de
modelo, ou de mafioso. Ainda não decidi. - Como se soubesse que estávamos
falando dele, vira seu rosto para onde estamos e dá um aceno charmoso para
Roxy.
- O mafioso é Malcolm Black, vocalista da banda. Lindo, não é? - Dá

um suspiro sonhador e eu reviro os olhos.


- Sim, um espetáculo de homem. Se prepara, Guy está vindo. - Ele
corre pelo palco, desviando dos roadies que estão acabando de montar a
estrutura da Black Road e chega até o nosso lado.

- Você foi incrível, Roxy! - A abraça e gira com ela no ar.


Precisa abraçar tão apertado assim?!
Aposto que está tirando uma casquinha das princesinhas.
- Obrigada, gatinho. Vamos no meu camarim um minuto? Quero sua
opinião profissional sobre o show. - Ela enrosca seus braços nos dele e dá um
olhar sensual que faz meu estômago revirar.
Só encenação, Drake. Só encenação.
Do outro lado da “fronteira”, o tal de Malcolm-Espetáculo-de-Homem

dá uma olhada na nossa direção que poderia fazer alguns dos meus imediatos
mais experientes se encolherem no lugar. Desaparece nas sombras por alguns
segundos e volta com Daniel - o baterista insano que atacou Rox mais cedo.
Juntos, começam a conversar e gesticular com Lizzie.
Perfeito.
Eles conversam por um tempo até que o ruivo a empurra - empurra de
verdade - para o palco, ao mesmo tempo em que grita. - VAI BUSCAR O
QUE É SEU, MULHER
Talvez ser segurança de Roxy não seja a pior coisa do mundo.

Poderia ter acabado como segurança desse doido, do cara mafioso e do


menino de saia, tudo ao mesmo tempo. Acho que tem outro integrante ali
com eles, mas aquele parece normal. Pobre homem. Queria poder chegar
perto o bastante para dizer “pisque três vezes se estiver sendo mantido

refém.”
Lizzie chega ao meu lado, mas não me encara, só sussurra olhando para
baixo, torcendo os dedos na frente do corpo. - Preciso falar com o Guy, por
favor.
- Acho que não será possível. - Cruzo os braços. - Ele está ocupado.
- Eu preciso mesmo falar com ele. - Sua voz se eleva um pouco e me
encara com chamas nos olhos azuis. Boa menina! Isso aí! Não deixe nenhum
Babaca como eu dizer que não pode fazer algo que quer fazer.

E desculpe pelo que virá pela frente, mas é para o seu próprio bem.
- Olha, moça. Eu não quero ficar traumatizado com seja lá o que os dois
estiverem fazendo lá dentro. Se eu bem conheço minha patroa, uma hora
dessas ninguém tem roupa mais. Ouvi dizer que ela gosta de... - Abaixo
minha voz e sussurro como se fosse um absurdo. - ...morder!
Agora consigo ver o fogo crepitando por baixo da sua superfície
contida. Sem se importar com o fato de que eu poderia impedi-la mesmo se
estivesse com as mãos amarradas nas costas, ela passa por mim e segue reto
para o camarim.

Há! A Tampinha estava certa.


Eu a sigo, tentando disfarçar um sorriso divertido. Não faz nem menção
de bater na porta e já chega abrindo com tudo. Nós damos de cara com Roxy
e Guy sentados no sofá, com as cabeças juntas, olhando algo no celular da

Tampinha, dividindo um fone e parecendo íntimos. Inocentes, mas ainda


assim íntimos.
Assim que percebe sua presença, o cara se levanta de um pulo,
passando o maior atestado de culpa. Tsc, tsc. Amador...
- Lizzie! A Roxy estava me mostrando o novo som que está
trabalhando. - Se engasga todo. Pobre coitado, está caidinho por essa fêmea.
- A Four Dragons decidiu fazer uma participação no show da Black
Road. Precisam de você para definir a música. - Uhum, claro. Se isso não for

uma desculpa para mandá-la até aqui, eu mudo meu nome para Babaca Hill.
Ele franze o cenho para a expressão irritada da garota, ainda sem fazer
ideia do que está acontecendo. - Está tudo bem com você?
Eu reviro os olhos e vejo Roxy fazer o mesmo. Lerdinhos, dois
lerdinhos.
- Estou bem. Só preocupada porque o show já vai começar e nós ainda
estamos aqui, sabe?!
- Claro, claro. - Parece convencido de que é só isso mesmo. Como
podem não enxergar o que está bem debaixo do nariz deles?! - Gatinha, foi

bom te ver.
- O prazer foi todo meu, gatinho.
Tenho que admirar a classe de Lizzie agora. Ela está vendo uma mulher
sensual ronronando para o seu homem e consegue manter a fachada calma.

Se fosse a Tampinha no seu lugar, alguém já teria perdido um olho. Ou dois.


- Drake, bom te conhecer. - Me dá outro aperto de mão firme e eu
decido que gosto mesmo dele. Por isso vou fazer o que estou prestes a fazer.
- Boa sorte, cara. E senhorita, é uma pena que não tivemos chance de
nos conhecer melhor. - Dou uma de Roxy e decido colocar meu “dons” em
uso. Pego a mão de Lizzie e dou um beijo nela, combinando com uma
piscadela maliciosa e um sorriso que já me tirou de várias enrascadas no
passado.

A jovem para no lugar olhando para mim com algum tipo de


encantamento, o queixo levemente caído. Não estou tão enferrujado assim,
quem diria?!
Como esperado, vejo Guy franzir as sobrancelhas, pegar sua mão livre
e sair andando sem olhar para trás, parecendo emburrado. Ótimo, era a
cartada que faltava. Fecho a porta discretamente e nós dois caímos na risada
ao mesmo tempo. - Quem apostaria que faríamos um bom time para alguma
coisa, não é?
- Essa sua olhadinha no final foi certeira. - Ela balança a cabeça,

limpando as lágrimas de diversão dos olhos. - Quase achei você atraente,


Drake Hill.
- Quase? Quer dizer que você faz aquilo-que-não-deve-ser-nomeado
com caras por quem não se sente atraída? - Ela tira o retorno do cós da calça,

ao mesmo tempo em que pega uma almofada do sofá e joga direto na minha
cara.
Nem me dou ao trabalho de desviar, só a pego com uma mão e atiro de
volta, errando seu corpo de propósito, mas ganhando um franzir de
sobrancelhas como resposta.
- Não pode deixar a paz durar cinco minutos, não é? Tem que despertar
minha vontade de te fazer acordar com a boca cheia de formigas.
- Gosto de viver perigosamente, Princesa. Podemos ir? - Pego seu

casaco e seguro aberto. - Temos muito que conversar hoje ainda.


- Vou precisar de álcool para lidar com isso. - Resmunga toda
rabugenta, enquanto entra no seu sobretudo preto.
- Com certeza, porque álcool e nós dois juntos é uma combinação
muito sábia.
Coloco sua mochila no ombro e saímos juntos pelos corredores, o som
da Black Road ecoando no fundo. Parecem ser muito bons...
- Se continuar com todo esse sarcasmo, Drake Hill, vai morrer sozinho.
- Que diferença faz? Caixão só cabe um mesmo.

Ela se apoia no meu ombro e gargalha, gargalha para valer, fazendo seu
cheiro de lavanda flutuar até o meu nariz.
- Primeiro a mordida e agora isso? Devo ter acordado em uma realidade
paralela hoje. - Justin balança a cabeça e segue pelo corredor sem dar uma

segunda olhada para nós.


É Jus.
Posso dizer que essa é uma realidade paralela e assustadora.
Muito assustadora.
Capítulo 18 - No banheiro da Grace
Roxy

Mais uma noite com Drake Hill... que Santa Mariah Carey me proteja.
Meta para a Roxanne: manter minha boca longe do Babaca e manter meu
corpo longe dos dentes desse canibal tarado.
Com esse pensamento firme na mente, destranco a porta com o cartão

que John entregou - não sem antes me dar um sorrisinho malicioso - e jogo
minha mochila num canto, vendo nossas malas já nos esperando lado a lado,
cuidadosamente arrumadas na frente da cama de casal. A única cama de
casal.
- Se Jus sabe que nós estamos ficando no mesmo quarto, porque
DIABOS ele não pediu um com camas separadas? - Drake rosna atrás de
mim.
- Das duas uma. Ou ele esqueceu de alterar a reserva, ou quer botar

fogo no parquinho mesmo.


- Conhecendo bem o meu velho amigo?! Opção B. Com certeza, opção
B. - Ele suspira, entra e vai direto para o telefone. - Boa noite. Eu gostaria de
pedir dois filés mal passados com fritas e uma garrafa de Syrah, por favor.
Não sei o que me choca mais. Ele saber outro dos meus pratos
preferidos, ou pedir o vinho que harmoniza exatamente com a carne. O
Babaca e suas surpresas...
- Quer mais alguma coisa? - Ergue uma sobrancelha ao me ver de
queixo caído e eu só balanço a cabeça, negando. - Sim, vai ser só isso.

Obrigado.
- Você entende de vinhos? - A minha curiosidade leva a melhor sobre
mim.
- Sim. - É a sua resposta simples e objetiva, enquanto caminha até o

armário para pendurar seu paletó em um dos cabides. - Tem muitas coisas
sobre mim que você não sabe, Tampinha.
- Vamos torcer para que continue assim, não é?! - Abro minha mala,
pego meu pijama e faço uma careta para todas as recordações que ele traz.
Mais uma meta para a minha lista: ter certeza de que as duas “princesinhas”
estão bem guardadas onde deveriam. - Não se importa se eu tomar banho
primeiro, não é?! Não?! Obrigada, muito gentil da sua parte.
Entro e bato a porta, sem esperá-lo responder. Quando saio, depois de

enrolar o máximo possível, o encontro já arrumando a mesa, com os cabelos


molhados, usando seus óculos de grau, uma calça de moletom cinza e... sem
camiseta.
- Onde você tomou banho? - Faço uma careta para o cheiro de sabonete
masculino que tomou conta do ambiente.
- No banheiro da Grace.
Paro de andar a meio caminho da minha mala.
- E você saiu de lá assim? - Aponto para o seu peito nu e o vejo dar de
ombros, como se não fosse grande coisa. - Só posso imaginar quanto a minha

querida guitarrista ficou... tentada.


Ele termina de servir o vinho nas taças e me encara. - Não estou
interessado na Grace, Princesa. Entenda isso de uma vez. Eu só queria tomar
banho antes da comida chegar porque estou morrendo de fome. Na próxima,

me deixe usar o chuveiro primeiro ou me convide para tomar banho com


você. Assim evitamos esses problemas. Que tal?!
- Eu já disse que te odeio hoje? - Parece refletir seriamente sobre a
minha pergunta e eu tento afogar todas as imagens de água caindo pelo corpo
nu de Drake que surgem no fundo da minha mente. Gotas escorrendo pelo
seu peito, seus braços fortes descendo pela barriga de tanquinho para
ensaboar o seu...
Pé.

- Sabe que eu não me lembro?! Depois da 234ª vez a gente realmente


para de escutar. - Puxa a cadeira e faz um gesto indicando que eu sente. - Por
favor, senhorita.
- Vai puxar ela de volta assim que eu for sentar, para me fazer cair de
bunda no chão? - Estreito os olhos para o Babaca, que só faz uma fingida
cara de inocência.
- Nunca faria algo assim com você. - Não acreditei em uma palavra do
que disse.
- Sei, sei. - Dou uma cotovelada para afastá-lo e sento sozinha mesmo.

Ele também vai para o seu lugar e eu tomo um longo gole do meu vinho, me
deliciando com o sabor da uva que escolheu, junto com uma mordida do filé
macio. Estou no paraíso... - Ok, te odeio um pouco menos agora. - Falo ainda
de boca cheia e o vejo rir, antes de dar a sua primeira garfada.

- Então, pode começar a tagarelar.


- O quê? - Humm... batatas fritas. As grandes culpadas pela minha
barriga não ser sequinha como deveria.
- Lembra do que combinamos, Tampinha. Você vai explicar
sinceramente, e com toda a boa vontade do mundo, qual é o motivo por trás
de tantas fugas.
- Por que te interessa tanto? - Tento distraí-lo para ganhar tempo. Não
quero nem pensar na sua reação quando eu contar... Se ele rir, juro que

quebro o seu nariz em cinco lugares diferentes.


- Porque eu quero entender exatamente onde estou me metendo.
- Tenho certeza absoluta de que você já tem uma teoria sobre isso. Por
que não me conta e eu digo se acertou ou não?! - Mais um pedaço do bife e
eu já estou sofrendo, só de pensar que vai acabar. Ah... comida. O maior
prazer que a pessoa pode ter sem tirar a roupa.
- Tudo bem. - Ele concorda, limpando a boca no guardanapo, antes de
apoiar seu queixo na mão e me encarar com os olhos verdes faiscando.
Malditos óculos de grau... - Eu acho que você faz isso porque quer conhecer

alguém. Já passeou o suficiente pelo mundo dos famosos para saber que o seu
Príncipe não está lá, então decidiu buscar no mundo dos reles mortais. Tudo
parte do plano “não morrer antes de se apaixonar”.
Continuo mastigando e olhando para baixo, incapaz de encará-lo. Eu

odeio essa sua capacidade bizarra de me decifrar, eu odeio que tenha deixado
escapar essa informação naquele dia do avião, eu odeio que preste tanta
atenção em mim, EU ODEIO ESSE CARA.
- E então? Estou certo? Pelo silêncio, pela força com que está
segurando o garfo e pela expressão de quem está imaginando minha boca
cheia de formigas, eu diria que acertei em cheio. - Drake pega meu rosto nas
mãos e me obriga a encará-lo. - É um ótimo motivo, Anne. Não se
envergonhe dele.

- Está falando sério? - Pergunto baixinho, sentindo minha pele formigar


onde seus dedos estão, ao mesmo tempo em que o “Anne” faz meu estômago
se revirar.
- Estou falando tão sério que vou até te ajudar. Amanhã, nós vamos
procurar uma balada para irmos quando chegarmos em Milão. Desde que
você prometa me obedecer e usar um disfarce, claro.
Devo ter alergia ao Babaca, só pode. Essa é a única explicação para a
minha pele continuar formigando assim.
Foco, Roxy.

- Uhum. Porque todos os homens vão querer falar com uma garota
acompanhada por um cara de três metros de altura, estalando as juntas e
rosnando para qualquer um que se aproxime.
- Eu me disfarço também e prometo que estarei no meu melhor

comportamento.
Reviro os olhos, escapo do seu toque e me afasto, tentando controlar
meus nervos e começando a andar de um lado para o outro do quarto para me
acalmar.
Eu não acredito que ele entendeu e não me julgou.
Mais do que isso! Ele vai me ajudar...
- Por que, Drake? Por que você me ajudaria?
- Porque sei que fará isso de qualquer forma. Então, vai facilitar minha

própria vida se tiver a supervisão de um adulto. Se chama caos controlado. -


Termina de comer o seu prato e começa a atacar o que restou no meu. - Sabe,
no começo achei que só usava essa história de fugir para chamar a atenção.
- Como a boa pirralha mimada que sou. - Estreito os olhos para ele.
- Exato! Assunto resolvido. Mal posso esperar para ir na “balada”. Vai
ser a minha primeira vez em... sempre. - O imbecil nem tenta esconder a
diversão na sua voz, largando os talheres e se levantando. - Então, chegou a
hora da segunda parte do nosso papo e vamos precisar de bastante vinho para
isso.

Pega a garrafa e anda até as portas duplas da varanda, abrindo e


deixando o ar suave da noite tomar conta do quarto.
Se senta de pernas cruzadas no chão e toma um gole direto do gargalo,
fazendo seus músculos das costas ondularem. Então, estica o braço para mim,

como se estivesse me oferecendo para beber também. Suspiro e ando até o


seu lado, pegando o vinho e tomando mais do que deveria, antes de sentar e
deixar o vento me acalmar.
- É o seguinte, Tampinha. Obviamente, tem algum tipo de atração
rolando entre nós. - Antes mesmo que eu consiga bufar, ele me encara. - Se
você negar, vou começar a falar do beijo, dos ciúmes e da Grace.
- Tá bom, tá bom. Uma pequena atração de nada, coisa mínima, só a
história do fogo, da palha e blá-blá-blá.

- Sim, blá-blá-blá. E acho que concordamos que nada de bom sairia


disso. Então, precisamos pensar em uma forma de resolver essa situação. De
minimizar esse “blá-blá-blá” todo.
- Ótima ideia. Para começar, você poderia usar camisetas na minha
presença e não usar óculos de grau, nem me chamar de Anne. E, claro, nada
de mordidas. Nem de Kindle! Não quero ver você lendo. - Se alguém ouvisse
esse papo, acharia que piramos de vez.
- Fechado. Para mim, preciso que use mais maquiagem, cubra a barriga,
nada de gargalhadas no meu ombro e não seja fofa. Preciso que seja o mais

desagradável que puder. Seja 100% “Rox”, nada “Anne” e ficaremos bem.
Sim, totalmente pirados.
Faço uma careta e tomo outro longo gole. - Você me prefere sem
maquiagem?

- Sem dúvidas. Já se olhou no espelho? Você é linda. Acho que todas as


mulheres do mundo matariam para acordar como você. - Rouba a garrafa de
mim e toma mais um pouco. - Um dia, espero que me conte o porquê de todo
esse personagem glitterizado que decidiu inventar.
- Quando esse dia chegar, promete me contar como conhece tanto sobre
vinhos? - Estendo a mão e ele aceita, apertando com força.
- Negócio fechado.
- Posso perguntar mais uma coisa? - Olha o álcool falando...

- Podemos brincar de “uma pergunta, uma resposta”. Se fizer uma


pergunta, vai ter de responder uma das minhas.
- Negócio fechado. - Respondo igual a ele, me inclino na sua direção,
querendo o vinho e ele segura a garrafa nos meus lábios, me dando de beber.
Oh, caramba.
Uma gota escorre pelo meu lábio e eu limpo com a ponta dos dedos,
vendo seu olhar acompanhar meu movimento e ele engolir em seco. - Acho
que devemos acrescentar uma cláusula de nada de dar bebidas na boca um do
outro.

- Não sei. Preciso testar sua teoria antes. - Pego a garrafa da sua mão e
encosto nos seus lábios carnudos, deixando que beba devagar. Seus olhos
assumem um brilho predatório e não desviam de mim nem por um segundo.
Do mesmo jeito que aconteceu comigo, uma gota escorre pelo seu queixo e

eu vejo passar a língua devagar para limpar. Sexy... - É, definitivamente nada


de bebidas na boca. - Balanço a cabeça. - Uma pergunta por uma resposta,
vamos lá.
- Damas e Tampinhas primeiro. - Dou uma cotovelada na sua barriga
dura, o fazendo gargalhar. O idiota já voltou ao normal.
Respiro fundo uma vez e solto minha pergunta sem pensar
muito. - Você já se apaixonou, Drake?
Capítulo 19 - O “Rei do Glitter”
Drake

Não preciso nem pensar para responder essa.


- Não, Princesa. Eu nunca me apaixonei. - Ela não parece acreditar
muito na minha resposta, me encarando com desconfiança. - Estou falando

sério. Minha vida não deu nenhum espaço para isso até agora. Eu entendi
quando me contou sobre o seu sonho. Eu realmente entendi.
Esse era um dos motivos pelos quais a aposentadoria era tão
importante. Eu vi como a minha mãe sofreu por ser casada com alguém que
tinha essa carreira e eu não teria coragem de fazer o mesmo. Mas agora, nada
me impede de deixar para trás tudo que me prendia, toda a minha fama, e só
me abrir para o que a vida tem de melhor. Encontrar a garota certa e sossegar
o facho - uma mulher inteligente, divertida, sexy e autêntica, com quem eu

me sinta bem.
Ela parece pensar no que falei, me encarando de um jeito engraçado,
como se estivesse me vendo pela primeira vez. Me remexo no lugar,
desconfortável com toda a atenção. Acho que é hora de desviar o assunto... -
Uma pergunta por uma resposta. Me conta como seria o seu “Príncipe” dos
sonhos? O seu “Senhor Tampinha”? O “Rei do Glitter”?
- Te garanto que ele não seria um Babaca. - Minha tática funciona e ela
parece voltar ao normal, revirando os olhos e fazendo sua expressão de tédio
para mim. - O “Rei do Glitter” seria alguém sólido e confiável, mas que ao

mesmo tempo faça meu coração bater acelerado. Que não se sinta intimidado
por quem eu sou e com quem eu possa conversar sobre tudo.
- É uma boa lista. - Sempre me surpreendendo. Bem melhor do que o
“AIN. QUERO UM GATINHO IGUAL AO JUSTIN DIRECTION” que eu

tinha imaginado. - Você quer o “Inteligente e Sensual” então.


- Como é? - Faz uma cara de confusão para mim e tento tomar mais um
gole do vinho antes de explicar, mas nada sai da garrafa.
Scheibe, devia ter pedido duas. Ou três.
- Sabe aquele filme “Ele Não Está Tão A Fim De Você”? Diz que
precisamos categorizar os futuros parceiros em pelo menos dois tópicos da
lista “Inteligente, Divertido, Sensual e Fofo”.
- Essa sua relação com comédias românticas é bem assustadora. - Ela ri

e balança a cabeça. - Mas essa parte da lista tem uma certa lógica. Quais
tópicos será que as pessoas escolheriam para mim?
- Eu diria que Rox é Sensual e Divertida, enquanto Anne é Fofa e
Inteligente. Então, pode dizer que é tudo no fim das contas. - Dou de ombros.
Estranho pensar nisso, mas ela é mesmo. - E quanto a mim? O que acha que
eu sou?
Fica em silêncio mais uma vez, só me encarando com uma expressão
que poderia significar tanto que quer me matar, quanto me beijar. É sempre
difícil saber quando se trata dela.

- Rox? Agora é você que está tendo um aneurisma? - Ela se recupera e


pisca várias vezes, mudando de posição e esticando as pernas por cima das
minhas.
- Tenho certeza que Grace te acha sexy, Jus parece te achar hilário, até

eu preciso admitir que é inteligente e acho que poderia ser fofo, se quisesse.
Com pitadas de sarcasmo e altas doses de “ser irritante”, claro.
- Se esse é o seu jeito de tentar ser agradável, obrigado.
- Sempre que precisar de alguém para ser agradável, pode contar
comigo. - Pisca marota.
- E depois eu que sou o cara do “pitadas de sarcasmo”. - Deito para trás
no tapete, encarando o teto. Por incrível que pareça, estou me sentindo
relaxado, bem, tranquilo... Deve ser o vinho. Sim, sim. Só pode ser o vinho. -

Uma pergunta por uma resposta. Por que o topless naquele bar?
- Perdi uma aposta com Grace e me odiei logo em seguida, mas não
poderia deixar de cumprir. Sou uma mulher de palavra. - Ela me imita e deita
também, ficando cara a cara comigo. - Por que topou esse emprego?
- Justin cobrou uma dívida antiga. Por que ser cantora?
- Cantar é parte de mim, nunca pensei em fazer outra coisa. Por que ser
agente secreto?
- Porque era o que o meu pai fazia e eu sempre quis seguir seus passos.
Queria deixá-lo orgulhoso e terminar sua missão. Ele morreu em serviço.

- Sinto muito, Drake. - Ela resvala seus dedos de leve nos meus, a
expressão de pesar nublando seus belos traços. Como se viesse junto com a
brisa da noite, o ar começa a ficar pesado ao nosso redor. A conexão que flui
entre nossos corpos dando as caras mais uma vez, querendo nos arrastar para

mais uma rodada de amassos.


Acho já abusamos demais da sorte por hoje.
- Conseguimos conversar de verdade. Deveríamos ir dormir enquanto
ainda estamos por cima e antes de voltarmos a rosnar um para o outro. -
Levanto e estendo a mão para ajudá-la a ficar em pé. - Faça o possível para
não abusar do meu corpinho dessa vez.
Scheibe! Ela me dá uma cotovelada bem na boca do estômago.
- Vou me esforçar ao máximo para resistir a sua deliciosidade, ó

gostosão Babaca. - Ela anda até o banheiro, mas deixa a porta a aberta
enquanto escova os dentes. Aproveito a deixa e entro atrás para escovar os
meus também.
- Tudo isso é medo que eu vá usar o banheiro da Grace de novo? Vai
que eu acabo não voltando, não é?! Fick Dich, Rox. Isso dói mesmo, sua
doida. - Dessa vez, ela achou que seria uma boa ideia pisar com tudo no meu
pé.
- Foi você quem quis me ensinar auto defesa. Não tenho culpa de nada.
- Fala com a boca cheia de pasta, numa fingida expressão de inocência, me

fazendo sorrir.
Começo a escovar os meus também e a intimidade do momento é, no
mínimo, enervante. Enquanto eu enxaguo a boca, ela passa um creme com
cheiro de lavanda no rosto e... acho melhor sair daqui antes que meu cérebro

comece a ter ideias erradas.


Como combinamos, pego uma camiseta na minha mala e visto, antes de
deitar na cama.
- Bom garoto. - Ela apaga as luzes do quarto e vem se deitar ao meu
lado, o silêncio parecendo pesar sobre nós, mas ninguém ousa falar nada.
Fico encarando o teto, até que ouço sua respiração se regularizar e me viro
para encará-la dormindo tranquila.
Eu disse que não a deixaria morrer sem se apaixonar.

Queria que alguém também fizesse essa promessa por mim.


Espero que eu não morra antes de me apaixonar... seria uma vida muito
triste essa.
Dou um beijo suave na sua bochecha e me entrego ao sono.

**
Acordo no momento exato em que a Tampinha se mexe, tentando
escapar do meu corpo. - Acho que alguém não resistiu a minha deliciosidade

de novo. - Falo com a voz rouca e recebo apenas um gesto obsceno como
resposta, enquanto se levanta e se tranca no banheiro.
Antes que eu consiga pensar em levantar também, ela já sai. - Liberado.
- Pega sua nécessaire e senta na escrivaninha, começando a se maquiar.

Acho que minha teoria do “medo que eu vá para o banheiro da Grace”


não estava tão errada afinal. Eu pego uma calça de terno, uma camisa, meias
e entro no banheiro, fazendo uma careta para o cheiro de lavanda que sinto ao
meu redor.
Ergo minha camiseta e percebo que o cheiro está vindo de mim mesmo.
Tiro na hora e a amasso bem, para lembrar de colocá-la junto com as roupas
sujas no fundo da mala. Tomo um banho rápido, faço a barba e me visto.
De volta ao quarto, a encontro já maquiada, usando um vestido pink

curto e seus coturnos indefectíveis. Dessa vez, escolheu usar os cabelos numa
espécie de trança que sai do alto da sua cabeça.
Parabéns para nós, estamos todos cumprindo nossas partes no trato.
Ainda em silêncio, terminamos de arrumar as nossas coisas e descemos
para o hall, encontrando os outros membros da equipe já prontos. Grace abre
um sorriso gigante ao me ver, mas Just pula na sua frente. - Não, não. Nem
comecem com essa coisa estranha de triângulo entre os três. A situação não
está tão caótica lá fora, Rox. Tem uns 30 fãs e nada de imprensa. Quer
atendê-los?

Seus olhos brilham na hora. - QUERO! Posso? - Ela me encara cheia de


expectativa, quase dando pulinhos no lugar.
Falar “não” nem passa pela minha cabeça. Ela parece tão feliz... -
Claro.

- YAY! - Joga sua mochila na minha barriga e sai correndo porta afora.
Reviro os olhos para Jus, passo a bolsa para ele e a sigo de perto.
Espero pacientemente ela tirar selfies com todas as garotas, conversar,
autografar e tudo mais. Tinha razão no que me disse aquela vez - quando são
apenas fãs de verdade é bem mais tranquilo.
Já sentado dentro da van, Justin faz um sinal indicando seu relógio.
Peço desculpas para as meninas e escolto a Tampinha até o carro. No
caminho, engato um papo animado com Emma e Sara sobre os lugares que

elas conhecem da Itália, já que estou proibido de tirar meu Kindle para ler.
Enquanto isso, Rox fica de fones o tempo todo, depois continua do
mesmo jeito no jato. Até consegue manter sua poker face durante a
decolagem e o pouso suave. Me pergunto se trocamos de piloto depois
daquele dia fatídico. Parece que sim, tudo está mais suave agora.
Continuando nossa maré de sorte, acho que não descobriram o hotel
onde está hospedada, porque a entrada está totalmente livre quando
chegamos. Deus abençoe a privacidade.
- Aproveitem o dia de folga. - John mal acaba sua frase e todo mundo já

dispara pelos elevadores, inclusive ele e Just.


Eu e Rox reviramos os olhos juntos, como se tivéssemos ensaiado. -
Então, o que quer fazer? - Pergunto, seguindo em direção às escadas.
- Você quer dizer juntos?! - Faz uma careta para mim.

- Você ainda não sacou como funciona esse negócio de guarda-costas,


não é? Basicamente, eu preciso de “costas” para guardar. Para eu ter
“costas”, precisamos estar juntos.
- Você ainda não sacou como funciona esse negócio de espaço pessoal,
não é?! Basicamente, eu preciso de espaço para respirar. - Antes que eu
perceba, ela sai correndo pelos degraus e nós dois acabamos apostando
corrida pelas escadas. Fico chocado quando percebo que ela quase consegue
acompanhar o meu ritmo com perfeição.

- Por que não me contou que corria?


- Já percebeu o quanto eu como?! É claro que eu preciso fazer alguma
atividade física. - Paramos na frente do quarto, as respirações ofegantes.
- Então, vamos correr na academia e depois podemos sair para comer
alguma coisa, antes de ir para balada. - Destranco a porta e brigamos para ver
quem vai entrar primeiro, os dois entalados no batente.
- Sabe, você não precisa falar “balada” como se fosse um palavrão toda
vez.
- Só estou exprimindo meus sentimentos. - Eu a deixo ganhar e ela

entra, só para parar em seguida. Mais uma vez, o quarto só tem uma cama... -
É. Jus quer mesmo tacar fogo no parquinho.
Outra noite de overdose de lavanda para o Drake.
Oba! Mal posso esperar!

- Você se troca aqui, eu me troco ali. Saímos em cinco minutos. - Ela


comanda, entrando no banheiro e batendo a porta.
Não ousaria desobedecer a “Sua Alteza Real”, então me troco no
quarto, colocando bermuda, tênis e uma camiseta limpa. Em um minuto,
Roxy sai já pronta, com seus tênis que piscam luzinhas na sola, shorts
dourados e... - Essa camiseta é minha?!
- Ué. Você me mandou não mostrar a barriga. Esse foi o único jeito que
encontrei. - Só balanço a cabeça e saio para o corredor, evitando pensar em

como vê-la com uma roupa minha está me afetando. - Cara estranho. -
Murmura baixinho quando entramos no elevador.
- Sim, eu normalmente sou. Mas vou adorar saber qual motivo em
específico chamou sua atenção nesse momento.
Ela arregala os olhos, acho que não estava contando que eu fosse
escutar. Ouvidos treinados, Tampinha. Consigo captar qualquer murmúrio
num raio de 20 metros.
- Nada demais, deixa para lá.
Espero o elevador se fechar e paro na sua frente, colocando um braço

de cada lado do seu corpo. - Desembucha.


- Não. - Ergue o queixo e cruza os braços. - Não quero.
- Desembucha logo.
- Não.

Me aproximo ainda mais, quase tocando nossos narizes. - Desembucha,


Princesa.
- Minha nossa, como é irritante! - Fúria mal contida começa a borbulhar
pelo seu rosto. - Estranho porque você parece gostar exatamente das coisas
que eu não gosto em mim. Cara lavada, minha barriga... É como se você visse
além de tudo e isso me deixa perturbada. Satisfeito?!
Nada satisfeito.
DROGA!

Eu quero mais.
Muito mais.
Deixo meu rosto se abaixar um pouco mais... depois mais... meus lábios
quase encostando nos seus... até que o elevador se abre e ela passa por baixo
dos meus braços, saindo pisando duro.
Scheibe, Roxanne.
Essa mulher vai enlouquecer e não vai demorar nada.
Subo na esteira ao lado dela e começo uma caminhada rápida, pensando
nas suas palavras. Essa fragilidade que mostra de vez em quando é... UGH.

Enlouquecedora.
Mantemos distância o resto do tempo, os dois evitando olhar um para o
outro, uma tensão estranha entre nós. Depois de uma hora, voltamos suados e
em silêncio para o quarto. Vou direto para o frigobar e tomo uma garrafa de

água inteira, sentindo mais do que sede, sentindo um caroço empelotado na


minha garganta.
- Pode ir tomar banho primeiro hoje, preciso resolver algumas coisas
ainda. - Ela fala baixinho, sentando no chão e mexendo no seu celular sem
me encarar.
Aproveito a deixa e fujo para o banheiro, sem ânimo nem para fazer
piadinhas sobre o seu medo que eu fuja para o quarto de Grace e ainda
pensando no elevador.

Eu quero mais.
De onde veio isso?!
Saio uns minutos depois enrolado no roupão e sinto seu olhar sobre o
meu corpo, quando pensa que não posso ver sua inspecionada nada discreta.
Viro para pegá-la no flagra e ela se atrapalha toda, antes de murmurar que vai
tomar banho.
Confuso... Tudo está tão confuso...
Pego os únicos jeans eu trouxe, preto com rasgados nos joelhos, uma
camiseta preta justa nos braços e meus adidas brancos. Ao invés de pentear

meu cabelo para o lado como todo dia, esfrego a toalha e deixo que fique do
jeito que quiser.
Sento na cama e começo a assistir a um jogo de futebol, enquanto a
espero, sentindo essa sensação de agonia crescer dentro de mim. Ela sai do

banheiro depois de meia hora, usando um micro vestido preto e a peruca


platinada do outro dia.
Está maravilhosa.
Suspiro só de pensar na quantidade de caras que vão comer na sua mão
essa noite.
- E então?! Disfarce o suficiente para você? Nenhuma gota de glitter
dessa vez.
Não mesmo.

Scheibe.
- O disfarce está bom. - Engulo em seco e olho para baixo, querendo
desviar do seu rosto, mas acabo reparando nas sandálias de tiras que são tão
sensuais quanto todo o resto.
Limpo a garganta e ando para o frigobar, precisando de outra água. Ou
de uma dose de absinto. O mais forte que encontro é uma cerveja, então abro
a latinha e tomo um longo gole. Depois de respirar mais um pouco, acho que
já é seguro voltar a olhar para ela, que está jogando algumas coisas numa
pequena bolsa.

- E quanto ao meu disfarce? - Chamo e Rox me encara. Abro os braços,


dando uma voltinha e vejo seu rosto formar uma careta que eu não consigo
decifrar. Sofrimento talvez?
- Só espero que a gente não encontre a Grace. - Resmunga e eu rio,

colocando minhas mãos nos bolsos.


- E eu só espero que a gente sobreviva a essa noite, não matemos um ao
outro e nem façamos nada pior.
- O que seria pior? - Pergunta, ainda me encarando sem piscar, fazendo
com que eu me sinta quase... cobiçado.
Mandando minha determinação às favas por alguns segundos, eu me
permito analisá-la desde os dedos dos pés pintados de pink, subindo pela pele
macia das pernas, na curva suave do quadril e no decote profundo, até chegar

aos lábios de cereja.


- Pior seria eu fazer tudo que está passando pela minha mente agora,
Anne.
Capítulo 20 - Drake Mulan
Roxy

Pior seria eu fazer tudo que está passando pela minha mente agora,
Anne.
Não.

Pior é eu saber tudo que está passando pela sua mente, sem que ele
precise me dizer. Por quê?! Porque eu estou pensando as mesmas coisas.
Bendita hora que ele decidiu usar esse “disfarce”. Tem braços para
todos os lados, caramba! E esse cabelo?! ARGH! E os jeans então... Ele
parece quase “normal” agora. Parece um cara que eu paqueraria. Quero só ver
como vou conseguir olhar para os outros homens que chegarem em mim essa
noite.
- Pare de pensar essas coisas, pare de olhar para mim assim e queime

essa camiseta assim que chegarmos no hotel de volta. Vamos lá, antes que o
seu “pior” aconteça mesmo e eu seja cúmplice ainda. - Passo reto por ele,
ouvindo sua gargalhada ruidosa e um cheiro de perfume masculino nubla
ainda mais meu cérebro já confuso.
Ao invés de descer pelo elevador, vamos pelas escadas, saindo pela
porta dos fundos, onde um esportivo vermelho nos espera. O homem tem
uma coisa com esses carros sem banco de trás. Pelo menos, não tem ninguém
a vista e isso me deixa mais tranquila.
- Sua carruagem real para hoje, Princesa. - Ele faz um gesto galante e

abre a porta para mim, parecendo muito mais animado do que eu esperava.
Prendo a respiração para não ter perigo de sentir o seu perfume de novo e me
acomodo no banco de couro, sem encará-lo.
O Babaca contorna a frente do carro assobiando e sobe no lado do

motorista, fazendo um carinho no volante antes de dar partida e fazer o motor


potente rugir. - Por que, diabos, você está tão animadinho?!
- Porque fazer suas vontades é meu único desejo nessa vida. Se você
está feliz, eu estou feliz. - Dá um sorrisinho de escárnio. Queria saber o que
passou pela cabeça do Universo ao decidir juntar as duas pessoas mais
irônicas e sarcásticas que já caminharam pela terra. - Além disso, eu prometi
que estaria no meu melhor comportamento.
- Seu melhor comportamento é tão irritante quanto o pior, sabia?! -

Minha barriga ronca de fome e eu suspiro. - Onde vamos jantar?


- Li uma reportagem sobre um restaurante especializado em risotos e fiz
uma reserva. Espero que não se importe. - Dá uma olhadinha para mim,
enquanto manobra para o trânsito do início da noite.
Sim, o maldito sabe que risoto é minha comida preferida.
Sei que deveria ficar grata pela atenção, juro que minha mãe me deu
educação, mas só consigo ficar ainda mais irritada. E eu nem sei porquê!
- Tudo bem. - Fico em silêncio, olhando para as construções antigas
que passam pela janela. Milão é uma das minhas cidades preferidas no

mundo, parece que as paredes são pintadas com história. Como seria poder
andar por essas ruas de mãos dadas com alguém, tomar um gelatto numa
tarde quente, passear pelo Duomo...
Quando decidi que seria cantora e bati na porta da minha gravadora,

sabia que teria de abrir mão de algumas coisas, mas não fazia ideia de que
teria de abrir mão de tudo. Tudo mesmo. Por mais que eu faça o possível para
ainda manter uma parte de mim preservada...
- Você ficou quieta de repente. - Sua voz suave faz uma sensação
engraçada percorrer meu estômago.
- E isso é uma coisa ruim? - Pergunto, ainda olhando para fora.
- É uma coisa estranha, rara e preocupante. Se for fome, pode relaxar.
Nós já chegamos. - Ele vira o carro e entra em uma ruela de pedras, toda

iluminada com pequenas luzes que atravessam de um lado ao outro, fazendo


parecer que são parte do céu.
Uau...
Um manobrista abre a porta para mim e eu mantenho o rosto abaixado,
mesmo com o disfarce. Força do hábito, acho.
- Boa noite. Tenho reservas em nome de Mulan. Drake Mulan. - Ele
fala para o senhor que nos recebe com um sorriso simpático, logo na entrada.
- Boa noite, Senhor Mulan. Pode me acompanhar, por favor. - Não sei
se foi a sua brincadeira idiota, ou a atmosfera intimista do lugar, mas sinto a

irritação perdendo espaço para a excitação.


O restaurante é pequeno e aconchegante, com uma iluminação suave e
plantas pendendo de todas as paredes. Nossa mesa fica num canto afastado,
escondido do resto do salão, perfeita para um casal apaixonado que não

consegue manter as mãos longe um do outro, ou para uma figura pública


disfarçada.
Só para deixar claro, nós somos o segundo caso.
Drake puxa a cadeira para eu sentar e lanço um olhar de ameaça para
ele que diz claramente “Faça uma gracinha e seus babaquinhas já eram”. Só
me dá um sorriso de canto e me faz um gesto com um queixo que diz
“Melhor comportamento. Pode confiar”.
Sim, estamos ficando bons nisso de comunicação não-verbal.

- Gostariam de pedir algo para beber?


- Uma garrafa de Carménère para a senhorita e uma água com gás para
mim.
- Muito bem, senhor. Volto já com as bebidas e o cardápio.
- Carménère? Jura?
- Você vai gostar, confie em mim. - Dá uma piscadela marota e começa
um papo sobre as coisas que ele e Justin aprontavam quando eram crianças.
O Babaca tinha razão.
Na verdade, ele tinha razão em duas coisas.

1 - Eu adorei o vinho, principalmente harmonizado com meu risoto de


funghi.
2 - Ele está mesmo em seu melhor comportamento. Eu diria até...
agradável.

Conversamos o jantar todo e ele me fez rir mais vezes do que poderia
contar. Deve ser culpa do Carménère. Só pode ser culpa do Carménère.
Além de tudo, nem me deixou pagar a conta e ainda fez questão de me
comprar um pequeno bombom de cereja. Devo estar ficando doida, porque
ainda o ouvi murmurar algo como “cerejas me lembram você.”
Se tivesse que chutar algo que o faz se lembrar de mim, chutaria
sessões de tortura, Britney Spears, ou uma overdose de glitter nas veias. Não
cerejas.

De volta para o carro, estou quase saltitando no banco de empolgação


com a noite que nos espera. - BALADA!
- Sim, vamos para a balada.
- Quase conseguiu evitar o tom de desprezo dessa vez. Muito bem. -
Dou tapinhas no seu ombro e ele só sorri mais.
- Eu treinei no espelho antes de sairmos.
- Você treinou uma nova personalidade também? - Não consigo evitar a
pergunta.
- Prometi que estaria no meu melhor comportamento e eu cumpro todas

as promessas que faço, Tampinha.

“Você não vai morrer nem hoje, nem antes de se apaixonar.


Isso é uma promessa, Roxanne.”

Suas palavras voltam à minha mente nesse momento.


Quero mesmo ver como vai cumprir essa.
Chegamos num clube no centro da cidade, que parece uma espécie de
armazém desativado. Ele manobra até a parte de trás, estaciona numa vaga ao
lado da porta e dá uma olhada no seu relógio de pulso. - Timing perfeito.
Nem espero por ele e já desço de um pulo, o fazendo rir. - Timing para
quê?
Outro segurança tão mal encarado quanto ele abre a porta de ferro nesse

momento e dá um aceno de cabeça respeitoso para o Babaca. - Senhor Hill. É


uma honra revê-lo.
Estranho. O homem está com o mesmo brilho nos olhos dos fãs quando
me conhecem. - Feliz em revê-lo também, Matthew. Obrigado por organizar
tudo.
Eles trocam tapinhas masculinos nos ombros. - Sem problemas.
Venham comigo, por favor.
Sai andando pelos corredores escuros e nós vamos atrás. - Então, você é
alguma espécie de celebridade entre os agentes?

- O senhor Hill é um dos agentes mais condecorados da história. Uma


lenda viva. - O tal Matthew responde por ele e eu não estou sabendo lidar
com toda essa cota de choques num dia só.
- Não é nada demais. - Responde parecendo encabulado. - Todos os

agentes são condecorados.


- Não cinquenta e sete vezes. - UAU. Até eu sei que isso é muito. - A
Senhorita tem sorte de tê-lo como seu segurança. Ele estava cotado para ser
parte da equipe pessoal do Presidente.
- É. Tenho muita... sorte. - Faço uma careta.
Por essa eu não esperava.
Se eu sou a Princesa do Pop, Drake é o Rei dos Agentes.
O corredor escuro nos leva direto para a pista de dança, que já está

bombando, apesar do horário. A batida frenética parece que está dentro de


mim e eu olho animada para os lados, pronta para dançar até esquecer meu
nome.
- Tem certeza de que não querem um camarote privado? - O tiete de
Drake está claramente achando que enlouquecemos por querermos nos enfiar
nessa muvuca.
- Tudo bem, vamos nos misturar. Obrigado.
- Qualquer coisa, estou à disposição. - Faz uma espécie de continência
para o Babaca e nos deixa a sós, próximos ao bar.

- Quer beber alguma coisa? - Ele me pergunta.


- Não. Quero dançar!
- Vá em frente. - Se acomoda em um dos bancos altos e se inclina para
pedir uma água ao barman. Está me dando espaço, como pedi.

Ótimo.
Eu não queria que ele viesse dançar comigo. Não mesmo.
Decido esquecer do Babaca e me jogo pela próxima meia hora,
mexendo meu corpo música atrás de música, sentindo a energia das pessoas
ao meu redor, todos deixando o som levá-los para um lugar melhor. Lembro
de todas as vezes que invejei meus fãs por estarem “do outro lado”. Agora
aqui, consigo sentir um gostinho disso.
Sinto o suor escorrendo pelas minhas costas e decido que é hora de dar

uma pausa e tomar uma água. Nada mais de álcool para a Roxy por hoje. Vou
desviando das pessoas em direção ao bar e logo avisto Drake no mesmo lugar
em que o deixei, com os olhos pregados em mim. Ao seu redor, uma mini
plateia feminina tenta chamar sua atenção de todas as maneiras possíveis.
Uma está molestando o morango do seu drink, numa tentativa de fazer um
biquinho sensual. Outra dança como se tivesse sido possuída pelo espírito de
uma Shakira bêbada. Fora as que estão ao seu redor como urubus farejando
carniça da melhor qualidade.
Reviro os olhos e ando direto até ele, parando ao seu lado e fazendo um

sinal para o barman, que não me vê.


- Então, está se divertindo?
- Não tanto quanto você e o seu fã clube. - Respondo sentindo uma
emoção estranha crescendo pelo meu peito. Hora de repensar a ideia de não

beber mais por hoje. Dou meu assobio mais alto, chamando a atenção do
atendente. - Eu quero uma dose de whisky. Sem gelo.
Sinto seu olhar questionador ao meu lado. - Whisky?
- Me deixa.
- Alguém está tentando afogar as mágoas. - Cantarola, dando mais um
gole na sua garrafa de água.
ARGH!
Eu odeio esse cara.

Pego o copo que o garçom colocou na minha frente e tomo tudo de uma
vez, sentindo o líquido descer queimando a minha garganta, me fazendo
engasgar um pouco. - Afogue as mágoas sem se matar, por favor?!
Antes que eu consiga respondê-lo, um homem lindo para ao meu lado
no bar, desviando das “Drakettes” e sorrindo para mim. - Com licença,
senhorita. Posso te oferecer outra dose?
Uma inspeção rápida desde os seus sapatos sociais de sola de madeira,
passando pelas camisas com os primeiros botões abertos, chegando até os
seus olhos azuis, me diz que ele é exatamente o meu tipo.

Me viro e retribuo o sorriso. - Claro! Seria um prazer. - Estendo a mão.


- Meu nome é Mulan.
Ele ri e eu quase consigo sentir Drake revirando os olhos atrás de mim,
sem nem precisar encará-lo. - O prazer é meu, Mulan. Eu sou... o Príncipe

Encantado da Mulan.
- Ah, por favor. - Drake murmura alto o bastante para eu ouvir e dou
uma cotovelada nas suas costelas, enquanto finjo estar me ajeitando no lugar.
- Príncipe encantado, que tal nós dançarmos um pouco antes da nossa
bebida?
- Acho ótimo. - Me oferece o braço e eu saio com ele, sentindo o aperto
no meu peito aumentar, como se tivesse algo errado.
Só não sei o quê.
Capítulo 21 - Quanta bagunça eu faria aqui se decidisse matá-

lo?
Drake

Mi mi mi Eu sou Mulan.
Mi mi mi Eu sou o Príncipe Encantado.

Mi mi mi ACHO QUE VOU VOMITAR.


Não gosto desse cara, não gosto nada. Tem alguma coisa muito errada
com ele, se os meus instintos estão certos. E eles sempre estão certos.
Mudo de posição no banco para conseguir vê-los melhor e os encontro
grudados um no outro, Roxy está com as costas coladas na frente do corpo
dele, rebolando ao som da batida hipnótica. Faço uma careta e quase desejo
poder virar um whisky como ela fez aquela hora.
Maluca...

Maluca cachaceira...
Decido confiar que ela pode se cuidar por alguns minutos e me levanto
para ir ao banheiro, desviando do bando de corpos suados. Nessas horas eu
lembro BEM porque nunca vim numa balada antes.
O pior é essa sensação de que estou sempre vivendo no meio de uma
multidão - mais um dos “lados bons” de ter me mudado para a Glitterlândia.
Penso na imagem de uma fazenda afastada, calma e tranquila que tinha
sonhado para a minha aposentadoria. Um apartamento na cidade só para
quando precisasse resolver alguma coisa e, no resto do tempo, uma vida

simples e ISOLADA.
Sim, sim. Idêntica à que eu tenho agora.
Uma última olhada por cima do ombro e confiro que a Tampinha ainda
está dançando com seu novo Toy Boy, então entro correndo no banheiro,

torcendo para que ela não exploda tudo na minha ausência. Nem dê um jeito
de fazer outro topless.
Já estou lavando as mãos quando vejo o próprio Príncipe Encantado
entrar com um amigo, parecendo nem notar a minha presença.
- Estou falando, cara. É ela mesmo. Roxanne Reed em pessoa. - Eu
congelo com as mãos embaixo da torneira, olhando para os dois pelo espelho.
- Mandou bem, cara. - Eles trocam uma espécie de cumprimentos com
uma dancinha, que faz a minha vontade de vomitar voltar com tudo. - O que

vai fazer agora?


- Vou chamá-la para o meu apartamento, deixar as coisas rolarem e,
quando ela estiver no ponto, vou dar um jeito de tirar umas fotos e vender
pelo melhor preço. Talvez role até esconder a Go Pro em algum lugar para
gravar tudo. - Mais uma rodada de cumprimentos imbecis que eu quase não
enxergo, concentrando todas as minhas forças em fechar a torneira com
calma deliberada. - Estava achando que teria só uma boa fo** essa noite, mas
acabei encontrando meu pote de ouro.
Ok, quanta bagunça será que eu faria aqui se decidisse matá-lo?

Talvez ele e o seu amigo junto?


- Como tem tanta certeza de que é ela?
- Nos encontramos numa festa ano passado, reparei numa pinta que ela
tem no pescoço e... - E eu não consigo ouvir mais nada.

Preciso sair daqui, antes que acabe mesmo tendo de limpar sangue de
imbecil dos meus tênis. Uso todo o meu autocontrole para contornar o
desgraçado e voltar para o corredor. Me permito pensar um pouco na
satisfação que teria em fazê-lo engolir todos os dentes e depois obrigá-lo a se
arrastar para pedir perdão por ter ousado pensar em fazer algum mal para a
minha Princesa.
Marcho direto para onde está, parada no bar tomando outra dose de
whisky como se fosse Toddynho. - Estamos indo embora. - Eu praticamente

cuspo as palavras.
- Não, não estamos. - Ela bate seu copo, cruza os braços e ergue o
queixo para mim.
- Nós estamos sim. Agora. - Tento puxá-la pelo braço, mas a Tampinha
se solta e desvia das minhas mãos.
- Me larga, Drake! Você prometeu que teríamos uma noite boa!
Prometeu que estaria no seu melhor comportamento! - Ela cutuca o meu peito
com seu dedo e parece mais brava do que nunca, seus olhos virando fendas. -
Agora quer ir embora justo quando eu encontro um cara legal?! Típico! Não

pode me ver feliz que já quer ir logo estragando tudo.


- Roxanne, por favor, só vamos sair daqui. - Tento puxá-la mais uma
vez, ignorando sua fúria.
- NÃO! - Dá as costas para mim e sai andando em direção ao corredor

dos banheiros. Só de imaginá-la chegando perto de novo daquele... daquele...


Hurensohn! Raiva nubla meu cérebro, eu me abaixo e a jogo nos meus
ombros, apoiando minha mão na sua bunda para impedir seu vestido de subir.
- AHHHHH! SEU INSANO! ME PÕE NO CHÃO! ME PÕE NO
CHÃO!
- Claro! Assim que estivermos dentro do carro. - Sigo pelo mesmo
corredor onde entramos, sentindo seus pequenos punhos batendo com todas
as suas forças na minha bunda.

- ME SOLTA, ME SOLTA, ME SOLTA! - Eu a ignoro e saio para a


noite fria, pegando a chave no meu bolso, destravando a porta e a colocando
no banco do carona.
- Não ouse sair de dentro desse carro. Juro que te alcanço antes que
consiga falar “Babaca”. - Lanço meu melhor olhar ameaçador para ela,
contorno a frente o mais rápido que posso, entrando no lado do motorista e
saindo cantando pneus.
Depois que já estamos longe o suficiente para eu voltar a raciocinar,
espio para o lado e vejo Roxy de braços cruzados e uma expressão que diz

claramente “estou planejando qual será a morte mais dolorida possível para
você.” - Tudo isso por ciúmes, Drake? Sério?
Aperto o volante até meus dedos doerem, mas não a respondo. Não vou
contar a verdade. Ela não precisa saber que o “cara legal” só queria se

aproveitar dela, violar sua privacidade e ainda lucrar com isso.


- RESPONDE, BABACA! - Ela dá um soco com toda a sua força no
meu ombro e mesmo assim eu mantenho a minha boca fechada. - VAMOS
LÁ, ADMITA!
Anos e anos de treinamento.
Eu não vou ceder.
Eu prefiro que fique com raiva de mim, do que com raiva de ser quem
ela é. Com raiva da sua vida e da sua carreira.

- ARGH! EU TE ODEIO! - Ela se afasta o máximo possível de mim


que o banco permite, tira a peruca loira e solta os cabelos, olhando para a
janela.
Maldita hora que Justin me enfiou nessa bagunça. A noite estava indo
bem, é uma scheibe que tenha acabado assim. Estava disposto mesmo a
deixar que ela aproveitasse, estava conseguindo lidar bem com tudo, até com
as minhas reações ao seu pequeno corpo dançando e rebolando - por mais
difícil que fosse.
Entro pela porta de trás do hotel e ela mal espera eu desligar o carro

para descer batendo a porta com toda sua força. Eu a sigo correndo e puxo
sua mão indicando a escada de serviço. Não seria inteligente da minha parte
deixar que fosse vista em público assim, tão abalada.
Ela solta o seu braço num movimento brusco, mas me obedece e sobe

os degraus.
- Roxanne, acredite em mim. - Dou um suspiro frustrado. - Foi
necessário.
Rox não reponde, só continua subindo com seus saltos ecoando na
escada. Acelero o passo e entro na sua frente, bloqueando sua passagem. - Dá
para me ouvir por um segundo?
- NÃO! Não dá! Você me envergonhou, me carregou como uma
criança mimada e nem me deu um motivo para isso! - Seus olhos têm um

brilho quase demoníaco. - Pode ter certeza de que isso vai ter volta. Ninguém
trata Roxanne Reed assim e sai ileso.
A Tampinha desvia de mim e sai para o corredor de braços cruzados,
andando até o nosso quarto. Destranco a porta e a deixo entrar primeiro,
fechando todas as travas com cuidado atrás de mim.
Roxy entra direto para o banheiro e eu suspiro, passando ao mãos pelo
cabelo exasperado. Talvez eu devesse ter contado para ela e conversado como
os dois adultos que somos... Só não quero mesmo ver a tristeza nos seus
olhos que a verdade traria. Sai do banheiro já de pijamas e passa por mim

sem me olhar, indo direto para cama.


- Eu não posso te contar o motivo, mas eu juro que havia um.
Nada. Estou sendo ignorado.
- Princesa? - Continua deitada encarando a parede, sem esboçar

nenhuma reação. Desisto e escovo meus dentes, apagando as luzes e me


deitando na cama. Espero que esteja mais calma amanhã e que me escute.
Com a sua raiva eu posso lidar.
Mas não sei se estou pronto para lidar com a sua indiferença.

**

Acordo assustado, sentindo o sol direto na minha cara. Droga, demorei

tanto para pegar no sono noite passada que devo ter perdido a hora. Só então
reparo que o lugar ao meu lado está vazio e olho preocupado ao meu redor,
procurando pela Tampinha.
Para o meu alívio, ela está sentada na escrivaninha, se maquiando. -
Bom dia, Roxanne.
- Bom dia, Drake! - Me responde com um sorriso animado e um arrepio
percorre a minha espinha. Oh-oh. Algo não cheira bem.
Olhando desconfiado para ela, entro no banheiro correndo, sem nem
lembrar de separar a minha roupa, tomo um banho rápido e faço minha barba.

Pego a minha loção, esfrego na pele como faço todos os dias e só depois que
espalho uma quantidade generosa é que percebo que está com uma textura
diferente.
Olho para as minhas mãos e as encontro cheias de glitter colorido,

assim como o meu rosto.


“Pode ter certeza de que isso vai ter volta”.
Claro.
Tampinha vingativa.
Lavo minha pele e a meleca melhora um pouco, mas tem uma parte do
glitter que decidiu se agarrar às minhas bochechas. Os pequenos brilhos não
saíram nem esfregando com toda força.
Desisto, enrolo a toalha na cintura e volto para o quarto. Abro o

armário e suspiro com o que vejo, precisando fechar os olhos por alguns
segundos para não surtar. Todas as minhas camisas brancas foram
substituídas por camisas cor de rosa e todas as minhas gravatas foram
trocadas por gravatas douradas de brilho.
- Bem jogado, Princesa.
Capítulo 22 - Diablo
Roxy

Na noite anterior...
Ufa!
Estou sozinha, finalmente.

Meu cérebro começa a funcionar a todo vapor, querendo aproveitar os


segundos de liberdade. Essa é a única chance que vou ter para conseguir
algumas respostas, para tentar resolver o mistério que é Drake Hill e para
matar a minha curiosidade. Mesmo que eu não entenda de onde está vindo
todo esse comichão para saber tudo sobre o Babaca.
Meus olhos esquadrinham o ambiente escuro, procurando por Matthew.
Para a minha sorte, ele está logo atrás de mim, perto de uma das saídas de
emergência. Pego meu copo de Jack Daniel’s e caminho casualmente até

onde está parado, parecendo ameaçador como sempre, de braços cruzados.


- Olá de novo! - Dou meu melhor sorriso inocente e o vejo abaixar um
pouco a guarda, os cantos da sua boca se erguendo um milímetro.
Começamos bem.
- Olá, Senhorita Reed. Posso ajudá-la? - Oh, eu espero que sim.
- Então, Matt querido. Estava pensando sobre o que falou mais cedo. -
Passo o dedo pela beirada do copo, fingindo estar distraída. - Drake é uma
lenda mesmo? Ele nunca tinha me contado essa história.
- Sim! - Seus olhos brilham de empolgação mais uma vez. Como eu

suspeitava... fãs amam falar sobre os seus ídolos. Mesmo que o ídolo em
questão seja um Babaca completo. - Todos queríamos ser como ele e todos
nos mandavam ser como ele. Drake é uma inspiração.
- Como assim? O que ele tinha de tão especial? De tão diferente? - Ele

faz a melhor cara de ameaçador? Rosna mais alto? Fica melhor de terno?
Ugh. Esse prêmio ele levaria mesmo. E com louvor.
- Sabe como o cara era conhecido, senhorita?! Drake Diablo Hill. Seu
parceiro foi morto na bem sua frente, logo na primeira missão. Desde então,
começou a trabalhar sozinho e ganhou fama pelo seu autocontrole perfeito,
por nunca se deixar abalar com nada. - Sussurra baixinho, como se estivesse
contando um segredo. - Por esse motivo ele acabou condecorado tantas vezes.
Era o único que topava as missões mais perigosas, era o único a quem

algumas facções temiam. Ele não tem coração, como o próprio Diabo.
“Eu conheço o inferno como a palma da minha mão, Tampinha.”
Foi uma das primeiras coisas que ele me disse.
Caramba, isso é loucura!
- Ele basicamente bloqueou todas as suas emoções?
- Exato! - Matt está quase saltitando no lugar de tanta empolgação. -
Não é incrível?!
- É... é... assombroso. - Viro meu copo todo de uma vez, chocada com
essa história. - Acho que preciso de mais uma dose. Foi um prazer mais uma

vez, querido. Obrigada pela história. - Tento manter a pose blasé enquanto
me despeço e espero que tenha conseguido disfarçar um pouco do meu
espanto.
Ando desnorteada até o bar, sentindo minha cabeça girar.

Diablo? Uma vida sem emoções? O meu Drake?


Pensando agora, faz muito sentido. Tive provas mais que suficientes do
seu auto controle perfeito, da sua calma deliberada e da sua racionalidade
extrema. Nem a iminência da morte naquela turbulência o abalou. Ele
construiu uma represa dentro de si! Isso é insano. E zero saudável.
Se for tudo verdade mesmo, alguém precisa fazer alguma coisa.
O cara é um Babaca, todos concordamos com essa parte, mas é óbvio
que tem um coração gigante. Eu sempre vejo emoções passarem pelos seus

olhos. Como ele se preocupa, como ele cuida de mim... Uma imagem de um
coração envolto numa grossa camada de gelo me vem à mente, com uma
pequena chama brilhando dentro. Ele já se aposentou, precisa deixar essa
vida para trás... Deixar os fantasmas para trás...
Alguém precisa incendiar essa faísca, antes que ela perca a batalha para
o gelo.
Incendiar...
O fogo e a palha.
Eu posso ajudá-lo com isso!

Seu autocontrole é perfeito, mas eu sou perfeita em deixar as pessoas


descontroladas. Seus muros podem ter resistido a mafiosos, traficantes,
guerrilhas e facções, mas não vão resistir a Roxanne Reed.
Eu viro mais uma dose de whisky que o barman colocou na minha

frente e estou pronta para começar a colocar meu plano em prática. Como se
tivesse ouvido meus pensamentos, o Diablo em pessoa se materializa ao meu
lado, os olhos em chamas e a expressão mais grave do que nunca.
Começamos bem de novo.
- Estamos indo embora.
Ufa! Mais cinco minutos com aquele “Príncipe da Mulan” paraguaio,
com suas tentativas ridículas de sedução e eu acabaria nas manchetes de
todos os jornais amanhã.

“Princesa do Pop manda idiota para hospital com os sapatos entalados na


garganta.”
Há! Como se eu fosse sair com alguém que nem sabe o nome do Li
Shang.
Droga, não posso deixar transparecer meu alívio. Rápido, Roxy. Pense
em todas as aulas de atuação que fez ao longo da vida e encarne a “Pirralha
Mimada” que habita feliz dentro de você. Bato o pé, faço birra e grito sem
parar, até que ele me joga por cima do seu ombro, perdendo um pouco da

paciência.
Enquanto dou socos no seu bumbum durinho, aproveitando para tirar
uma casquinha, me pergunto o que o “Príncipe Paraguaio” fez para irritar
tanto Drake. Provavelmente algo relacionado a mim...

Sim, sim. Com certeza foi isso. Percebi que ficou ainda mais sério
quando joguei verde sobre ele ter ficado com ciúmes. Preciso lembrar de
explorar mais essa opção.
Enquanto seguimos pelas ruas da cidade, eu tento de tudo. Grito, xingo,
bato nele, faço bico, finjo chorar, o acuso de ciúmes de novo e o máximo de
reação que consigo é um apertar de volante. Bato a porta do carro, faço mais
um pouco de chilique nas escadas e nada!
ELE NÃO REVIDA, ELE NÃO GRITA COMIGO, ELE NÃO XINGA

DE VOLTA, NÃO SOCA UMA PAREDE, NÃO ME DEIXA FALANDO


SOZINHA, NÃO FAZ NADA!
Não está dando certo.
Talvez porque eu já seja um pouquinho assim normalmente e o Babaca
esteja desenvolvendo uma certa resistência ao meu “charme natural”. Talvez
eu devesse mudar um pouco a abordagem. Entro no quarto e vou direto para
o banheiro, pensando enquanto escovo os meus dentes. O que eu não sou
normalmente? Calma, quieta... indiferente!
É ISSO.

Sempre funciona com cachorros e homens - quanto mais você ignora,


mais desesperados eles ficam.
Pelo resto da noite, o ignoro com todas as minhas forças, mas também
parece não surtir nenhum efeito. A exaustão logo toma conta de mim e eu

durmo pensando no que posso fazer amanhã.


Não sei porquê, mas tenho a impressão de estar deixando escapar
algum detalhe importante...
Sei que ele sempre cumpre as suas promessas.
Acontece que eu também sempre cumpro as minhas.
Vou colocar fogo no inferno até o Diabo pegar fogo, ou não me chama
Roxanne Tampinha Reed.

**
A manhã seguinte
Fico o observando dormir por um bom tempo e pensando como deveria
ser quando ainda era agente... Concentrado, feroz, letal. Sim, posso imaginá-
lo sendo assim. Esses músculos todos não foram parar aí só para abrir potes
de palmito.
Me pergunto quantas pessoas ele teve de matar ao longo dos anos. Por
incrível que pareça, não me afeto com esse pensamento. Tenho certeza de que
todas foram necessárias. Já o conheço bem o suficiente para saber que nunca

faria mal a uma mosca por vontade própria.


Nem imagino como deve ser difícil lidar com essa carreira... Sempre
alerta, sempre com a vida em risco, sempre tenso.
Ele é o exemplo da compostura, mas relaxa um pouco perto de Jus.

Também é diferente perto de mim. Pode rosnar, reclamar e causar, mas tenho
certeza de ter visto algo mais por baixo dessa superfície toda.
Quando nos beijamos... definitivamente ele sentiu.
Que contradição! Que peça rara Justin trouxe para minha vida. Me
pergunto se ele sabe sobre a fama do seu melhor amigo e... Sento na cama
com tudo, a verdade caindo como uma bigorna na minha testa.
DROGA.
Como não percebi isso antes?

Levanto de um pulo e saio para o corredor ainda de pijamas, batendo


direto no quarto ao lado do meu. - JUSTIN REZZO, SEU MALDITO!
ABRA ESSA PORTA OU EU JURO QUE DESÇO NO HALL E FAÇO UM
TOPLESS AGORA MESMO.
Um segundo depois, John abre sonolento, usando só uma cueca samba-
canção de corações e com a cara toda amassada. Só então percebo que nem
amanheceu direito ainda. - Garota, você tem um problema com topless. Sua
mãe não te amamentou?
Ignoro seu comentário, passo reto por ele e paro ao lado de Justin que

está me encarando com os olhos meio abertos, meio fechados, parecendo não
saber nem em que planeta está. - Por que você trouxe Drake para trabalhar
para mim, Justin?
- Ahn. - Passa as mãos pelo cabelo e pelo rosto, tentando acordar. - Por

que você precisava de um segurança??


- Só isso? Não tem mais motivo NENHUM? - Estreito os olhos e seus
ombros caem, uma expressão de derrota dominando suas feições.
- Eu avisei que eles iriam descobrir. - John cantarola, voltando para o
lado do seu esposo na cama. - Você me deve vinte pratas. Ela descobriu antes
dele.
Como eu suspeitava, tem caroço nesse angu.
- Vamos lá. - Suspiro e me jogo no colchão ao lado do meu empresário,

preparada para confirmar todas as minhas suspeitas. - Comece explicando


tudo bem direitinho, desde o começo.
Ele olha para baixo, como se não conseguisse me encarar. - Desde o
início, meu plano era juntar vocês. Eu tinha esperanças de que pudessem
salvar um ao outro...
Capítulo 23 - Um cupido de meia tigela
Roxy

- Você vinha numa espiral negativa, cheia de comportamentos


destrutivos e eu estava realmente preocupado que acabasse virando a próxima
“Britney em 2007”. A primeira vez que encontrei Drake depois da sua
aposentadoria, percebi que ele era só uma casca do homem que um dia tinha

sido. Você precisava de ordem para o seu caos, ele precisava de caos na sua
ordem. Os dois estavam desesperados para sentir alguma coisa, cada um do
seu jeito. Eu só dei uma forcinha extra... - Dá de ombros.
- Quando você diz forcinha extra, você diz só ter contratado ele, certo?
- John começa a rir e eu vejo que a história é ainda pior do que eu imaginava.
- Quero saber de tudo, Justin Rezzo. TUDO.
- Tá bom, tá bom. - Ele começa a contar nos dedos. - Talvez eu tenha
parado o elevador naquele dia, ou talvez eu tenha convencido Grace a fazer

parte do meu plano. Talvez eu tenha me certificado que você se apresentasse


no mesmo dia que a Four Dragons. Talvez o resto da banda tenha me
ajudado, deixando vocês sempre sozinhos, deixando os lugares ao seu lado
sempre vazios. Talvez eu tenha esquecido de pedir camas separadas nos
quartos... Bom, você entendeu a ideia central. Sou um cupido de meia tigela.
- Uma tia casamenteira. - John concorda e eles sorriem um para o outro.
- Você achava que a gente daria certo juntos? Como um... casal? - Ugh.
Acho que vou vomitar.
- HÁ. Agora me deve quarenta pratas, Tuquinho. - John parece que

ganhou na Megasena e Jus me encara como se não acreditasse no que vê.


- Jura que não percebe o que está rolando entre vocês, Roxy? - Me
lança um olhar significativo.
Eu e Drake? NÃO.

NÃO. NÃO. NÃO.


- Bom, mais cedo ou mais tarde vai perceber. Eu só preciso te pedir
uma coisa. - Se ajoelha na cama e anda até a beirada, pegando as minhas
mãos nas suas. - Continue fazendo o que está fazendo. Não deixe Drake
voltar ao que era antes, por favor.
Saio do quarto sentindo como se tivesse corrido uma maratona. Não
consigo ficar brava com Jus, tenho certeza de que me ama e fez o que achava
melhor para mim. E para Drake.

Eu e Drake... Não sei como isso poderia dar certo.


Nem sei se quero pensar nisso agora.
“Continue fazendo o que está fazendo”.
Essa parte eu posso fazer. Eu quero mesmo ajudá-lo.
Volto para o quarto e, para o meu alívio, o encontro ainda dormindo na
mesma posição que o deixei... Ontem eu prometi uma vingança, hoje eu
preciso entregar uma vingança. Então, olho ao redor em busca de inspiração e
meus olhos caem no seus ternos.
Perfeito.

Santa Cher abençoe minha mente maléfica.


Ligo para a recepção e faço minha encomenda. O concierge me garante
que consegue entregar tudo que pedi em meia hora. Ah, os benefícios da
fama... Tomo um banho fazendo o mínimo de barulho possível e, em exatos,

23 minutos, tudo que preciso é entregue mesmo.


Pego a sacola que separei com todas as suas camisas e peço que o
entregador doe para alguma instituição de caridade. Arrumo as peças novas
com carinho no seu armário, despejo o glitter na sua loção pós barba e mal
posso esperar para ver sua reação quando descobrir todas as minhas
surpresinhas.
Espero que ele grite pelo menos uma vez.
Já estou fazendo minha maquiagem quando o Babaca acorda, os

cabelos todos bagunçados e uma carinha de quem foi atropelado na noite


passada. Droga, o desgraçado é bonito.
Faço questão de cumprimentá-lo com a maior alegria e ele saca na hora
que tem algo errado. Corre para o banheiro e eu rio por uns bons minutos,
imaginando como vai ficar bem vestido de fúcsia.
Volta para o quarto só com uma toalha enrolada nos seus quadris
estreitos e eu engulo em seco. Braços e músculos se esticam para todos os
lados, enquanto ele abre a porta do seu armário. Para um segundo olhando
para frente e eu prendo a respiração aguardando...

- Bem jogado, princesa.


Droga, seu tom ainda é baixo e comedido, talvez até um pouco...
orgulhoso.
- Obrigada. Confesso que foi divertido. - Termino de prender meu

cabelo num rabo de cavalo alto e o encaro pelo espelho, dando outro sorriso
inocente.
- Tem certeza de que quer jogar esse jogo? - Ele ergue uma sobrancelha
para mim e cruza os malditos bíceps gigantescos, como se me desafiasse.
Levanto e cruzo os braços também, erguendo o queixo. - Faça suas
melhores jogadas, Drake Hill.
- Lembre-se que foi você quem pediu. - Ele aponta o dedo para mim. -
Bom, não me resta outra opção, além de me trocar.

O Babaca se vira de costas para mim e começa a desenrolar o nó que


prende a pequena toalha branca.
- É bom que tenha uma boxer aí debaixo. - Falo em tom de aviso.
Ele me olha por cima do seu ombro e dá um sorriso sacana. - Não.
Dá um último puxão e seu bumbum firme e redondinho aparece em
plena exibição para mim.
PORR*!
Pega uma das camisas cor de rosa do cabide e veste, ainda sem parecer
se preocupar com seu nudismo.

Agora eu entendo o lance da mordida.


Eu morderia essa bunda.
Sim, sim. Eu admito.
Eu morderia MUITO essa bunda.

Como se não bastasse o espetáculo até agora, ele pega a calça do seu
terno e veste.
SEM A PORR* DE UMA CUECA.
Meu corpo reage de um jeito que eu não estava preparada. Caramba,
essa é a coisa mais sexy que já presenciei nos meus 22 anos de vida. Uma
necessidade começa a crescer dentro de mim, quase um desespero, que me
faz levantar e andar até onde está.
Preciso fazê-lo sentir coisas...

Fazê-lo sentir o que eu estou sentindo...


Viro seu corpo e o jogo contra a parede, ficando na ponta dos pés e
grudando meus lábios nos seus. Aproveito que sua camisa ainda está aberta e
cravo minhas unhas no seu tanquinho, ao mesmo tempo em que deslizo
minha língua dentro da sua boca, sentindo seu gosto bom de menta e
aspereza.
Ele sobe uma mão para o meu cabelo e deixa a outra segurar o meu
rosto firme no lugar, esfregando toda a sua frente contra mim. O cheiro do
seu sabonete ainda está fresco, seu cabelo úmido e meu coração se acelera

como se quisesse sair de mim e passar para dentro do peito dele.


Nos afastamos depois de um tempo curto demais, os dois com as
respirações ofegantes, nossas testas encostadas. Me perco nos seus olhos
verdes enquanto faz um carinho suave na minha bochecha com a ponta dos

dedos.
- Anne... - Minha imagem mental muda para um coração congelado
começando a derreter, gotas pingando levemente. - Por que tudo tem que ser
tão intenso entre nós? Eu não... Eu não sei lidar com isso. - Ele fala baixinho
e eu suspiro.
Maldita hora que Jus falou sobre a história de sermos um casal.
Estou começando a achar que isso poderia dar tão errado, quanto
poderia dar certo.

- Porque nós dois somos intensos, acho. Eu também não sei como lidar
com isso, Drake. Com nada disso. Então, vamos simplesmente não fazer
nada. Que tal? - Pelo menos por enquanto, essa é a única opção.
Ele suspira e deixa seus braços caírem. - Tem razão. Acho melhor nós
descermos e darmos a chance de Justin e John tiraram sarro do meu novo
visual glitterizado, tendência do verão.
- Mal posso esperar. - Dou um sorriso sincero e meu olhar cai para a
frente da sua calça... Uow. - Acho que é melhor você... ahn... dar um
tempinho aqui antes.

Ele olha para sua virilha e ri. - Você vai ser a minha morte, Roxanne
Reed.
De certa forma, espero que eu seja mesmo.
- Essa é minha missão de vida, Babaca. - Pisco para ele e pego minha

mochila. - Te vejo lá embaixo.


Encontro todo o resto da equipe reunido no saguão, prontos para saírem
para o estádio onde será nosso show de hoje.
Me jogo no sofá ao lado de Justin e ele sorri para mim. - Então, devo
supor que Drake está descendo, ou você finalmente o matou e usou o corpo
para fazer purpurina? Ou melhor ainda! Finalmente acabaram com a novela
mexicana e ele está lá em cima se recuperando de uma sessão de sexo
selvagem?

Ugh. Sexo selvagem combinaria com Drake...


NÃO! Não vá por esse caminho, Rox.
Não vá.
- Ele está descendo, não se preocupe. Não te deixaria sem o seu BFF
que você ama tanto a ponto de enganar sua própria galinha dos ovos de ouro.
- Hey, nem vem. Eu falei desde o primeiro dia que amo os dois e que
esperava que não se matassem. - Dá um peteleco no meu nariz, como faria
com uma criança. - A propósito, meus informantes me disseram que saíram
ontem.

- Sim. Fomos para a balada.


- Drake foi para a balada?
- Sim. Foi assim que descobri todo seu joguinho. - Dessa vez, eu dou
um peteleco no seu nariz. - Um dos seguranças era um ex-agente e me contou

tudo sobre a história do Diablo.


- Mulher, você é lacradora mesmo. Drake na balada... Eu vivi para ver
isso!
- Beijaram muitas bocas ou só um do outro mesmo? - John se estica por
cima de Justin para perguntar e eu reviro os olhos.
- Eu não beijei a boca de ninguém ontem. - Porque o Príncipe
Encantado não me fez sentir nada. Absolutamente nada, além de preguiça
eterna e uma sensação e que tinha algo muito errado com ele.

Hoje, em compensação, senti, causei, beijei e ainda são 10 da manhã.


Tudo culpa de quem? Drake.
O que vou fazer com Drake...
Como se tivesse decidido responder aos meus pensamentos, ele sai do
elevador já perfeitamente composto, ainda parecendo maravilhoso mesmo
com a camisa pink e a gravata dourada. Para na nossa frente, abre os braços e
dá uma voltinha, como se quisesse que Justin desse uma boa olhada em todo
seu... brilho.
Ele, John, e todo o resto da banda caem na gargalhada, rindo

descontrolados, até saírem lágrimas dos seus olhos. - Eu sei que deveria pedir
uma explicação, mas acho que não tenho forças para isso. - Nosso chefe não
faz nenhum esforço para se controlar e só continua rindo. - Ai, ai. Você se
superou dessa vez, Roxy. E você está um arraso, Drake. Acho que

deveríamos instituir esse como o seu novo uniforme oficial.


- Claro, claro. Concordo. Não acha que rosa ressalta a cor dos meus
olhos, Johnny? - Drake se inclina chegando bem perto dele, que sorri e se
abana.
- Eu diria que você nasceu para esse visual, querido.
- Ok, ok. Hora de ir. - Justin se levanta, puxando John pela mão.
Ciumento!
- Drake, tudo bem se eu atender os fãs hoje? - Pergunto fazendo meu

melhor esforço para não rir também e vários pares de olhos me encaram em
choque. - Que foi agora?
Eles se entreolham e é Sara quem responde. - Você não o chamou de
Babaca, o chamou de Drake.
- Nossa. E eu que jurava que esse era o seu nome. - Reviro os olhos e
saio andando em direção à porta sem esperar por uma resposta, cansada de
toda esse auê em volta de nós dois.
Atendo os poucos fãs presentes ali, sentindo o olhar do Babaca em
cima de mim o tempo todo e sigo direto para a van. Sento no último banco e

encosto a cabeça no vidro, olhando para fora distraída.


- Que bom que superou a sua braveza de ontem. - Drake fala baixinho
ao meu lado. Minha atuação foi bem mais convincente do que eu imaginava.
Ótimo.

- Como se você se importasse com o que eu sinto, ou deixo de sentir. -


Me assusto ao perceber que queria que ele dissesse que se importa. Queria
mesmo.
Ele se inclina e sussurra no meu ouvido, deixando seus lábios
resvalarem na minha orelha de leve. - Eu me importo. Não sei porquê, mas eu
me importo mais do que imagina.
Ah... Cuidado com o que você deseja, Rox.
- A propósito, desculpe por tudo. - Seu queixo cai na hora. Se eu não

estivesse tão afetada pela sua presença, teria achado engraçado.


- O que você disse?
- Eu disse “DESCULPE”. Lave esse ouvido, cara. - Dou uma
cotovelada no seu braço e ganho um pequeno sorriso. Sei que vai achar que
estou falando sobre ontem, mas é um ótimo momento para me desculpar pela
maneira que o tenho tratado desde... sempre. - Eu sou humana, eu erro e não
sou perfeita. Sou esquentada, passional e impulsiva. Enfio os pés pelas mãos
e atiro para depois perguntar. Sei que é errado e eu me policio para controlar
isso, mas você desperta mesmo um lado de mim que eu não entendo na maior

parte do tempo. Só o que importa é que você já provou por A + B que eu


posso confiar em toda a sua babaquice. - Aponto o dedo para ele. - Só para
constar, eu não sou o tipo de mulher que é carregada para fora de um lugar
conta a sua vontade e vai achar isso lindo, sorrir e falar amém. Os tapas na

bunda foram merecidos.


E deliciosos.
- Acho que esse é o discurso mais longo que já te vi fazer. - Olha a
emoção nos olhos aí! Sabia que não tinha sonhado todas as vezes em que a
vi. Arrasou, Roxanne.
- Não é todo dia que eu preciso implorar pelo perdão de alguém. - Dou
de ombros e a chama se intensifica.
- Percebeu que não pediu desculpas pelas minhas camisas, não é? - Ele

fala com a voz grave e eu sorrio, dando uma piscadela marota.


- Considere o beijo de mais cedo como o meu pedido de desculpas.
Ele gargalha alto e eu ouço Justin falando à distância. - Meu Deus! Eles
estão rindo! É o Armageddon! Rápido, corram para os colinas.
- Não! É um milagre! Rápido, chamem o Papa. - John completa.
Nós dois reviramos os olhos em conjunto e eu grito de volta. - Rápido,
cuidem das suas vidas!
Idiotas.
Decido botar para fora uma curiosidade que está na minha cabeça desde

que descobri toda essa história de Diablo. Será que ele tem consciência de
que é assim?
- Você conseguiu manter muito a calma ontem, apesar do meu chilique.
Como pode?

Nem pensa para responder.


- Eu entendi a sua reação. A maneira com que eu te tirei de lá não foi a
mais justa. Eu só conseguia pensar em te proteger e isso me deixou cego. Me
desculpe.
Não, ele não tem consciência.
Qualquer outra pessoa teria sentido, no mínimo, vontade de me matar
pela malcriação. Ou me largaria lá para enfrentar seja lá o que o Príncipe
Paraguaio queria fazer comigo.

O problema não é que Drake não sente as coisas.


O problema é que ele sente uma vontade de proteger tudo e todos,
acima de qualquer coisa.
Olho para os seus olhos verdes por um bom tempo, vendo esse homem
tão irritante, tão enlouquecedor, tão lindo, tão quebrado e tão... maravilhoso.
Talvez Justin estivesse certo.
Talvez eu pudesse me apaixonar por ele.
Capítulo 24 - Eu só quero que você saiba quem eu sou
Drake

Eu a vejo pegar seu violão do case ao lado do palco, passar a correia de


glitter pink pelo seu ombro e caminhar devagar, surgindo entre as sombras.
Que estranho... isso não é parte do show e eu nunca a vi tocar em público.
Também não lembro de tê-la visto falando com ninguém sobre uma mudança

no setlist.
O que a Tampinha está tramando?!
Ela coloca o microfone dourado no pedestal e eu vejo pelo monitor seus
olhos encararem a multidão com uma expressão meio melancólica, um
sorriso torto se esticando no canto da sua boca.
Começa a dedilhar as cordas, tocando acordes aleatórios. Um arrepio
percorre a minha espinha só de observar a beleza dessa cena. Acho que
poderia ouvi-la tocando pelo resto da vida.

- É impressionante a rapidez com que julgamos o outro, não é?! - Sua


voz rouca ecoa pela imensidão do estádio. - Na maior parte da vezes, nem
paramos para pensar na história que aquela pessoa carrega. Não nos
colocamos no lugar do outro. Por conta disso, acabamos criando máscaras e
ganhando rótulos que não nos representam de verdade.
Scheibe, Roxanne. Acho que está falando sobre ela, mas poderia muito
bem estar falando de mim. Parece que está falando direto para mim.
Diablo.
Eu nunca mereci a fama que ganhei.

Eu nunca gostei da fama que ganhei.


Sempre odiei esse apelido maldito que me traz as piores lembranças.
Lembranças daquele dia nublado em que tudo mudou na minha vida...
Será que ela descobriu sobre essas histórias?! Não, não teria como.

Rox recomeça a falar, me trazendo de volta para a terra.


- Quem o mundo diz que somos, não é quem somos realmente. Só
aqueles que nos amam conseguem nos enxergar de verdade. Só aqueles que
nos amam conhecem nosso interior. Eu queria pedir licença essa noite para
dividir uma das minhas músicas preferidas com vocês. Uma que diz muito
sobre o que estou sentindo hoje.
A multidão vai à loucura com a surpresa, enquanto eu só consigo ficar
encafifado. O que ela está sentindo? Será que está bem? Alguém fez algo a

ela?
- Cantem comigo! And I’d give up forever to touch you… - Ah! Iris, do
Goo Goo Dolls, sua música preferida. Acho que nada de grave aconteceu
então.
Puxo uma das caixas de equipamento e me sento, mantendo os olhos
fixos na garota abrindo seu coração na minha frente. Essa versão só com
violão e sua voz suave é demais para mim.
Cause I know that you feel me somehow

Porque eu sei que você me sente de alguma forma


You're the closest to heaven that I'll ever be
Você é o mais perto do Paraíso que eu vou chegar
And I don't want to go home right now

E eu não quero ir para casa agora

Meu cérebro começa a refletir sobre as palavras doces que está


cantando. Eu a sinto. E sei que ela me sente de alguma forma... Ao invés de
fazer da minha vida um inferno, ela está fazendo com que eu me sinta de um
jeito que não sentia faz anos - rindo, me divertindo e em paz, como se eu
estivesse me curando, como se eu estivesse mesmo no Paraíso.

Uma versão de Paraíso enlouquecedora e cheia de glitter, claro.


No começo eu só queria ir embora, agora uma agonia sobe pelo meu
peito só de pensar em ficar longe dela. Quem iria protegê-la?!

And all I can taste is this moment


E tudo que eu posso sentir é esse momento
And all I can breathe is your life
E tudo que eu posso respirar é sua vida
Cause sooner or later it's over

Porque mais cedo ou mais tarde acabará


I just don't want to miss you tonight
Eu só não quero sentir sua falta essa noite

Ao invés de cantar junto com ela, a plateia está tão impactada quanto
eu, envolvidos pelo sentimento que Roxanne está derramando bem aqui na
nossa frente.
Não é Roxy quem está no palco.
Estamos todos tendo uma rara visão de Anne, pura e simples...
Maravilhosa.
Me pergunto de quem ela não quer sentir falta essa noite... Será que tem
algo que eu não sei? Algum amor não correspondido?

And I don't want the world to see me


E eu não quero que o mundo me veja
Cause I don't think that they'd understand
Porque eu acho que eles não entenderiam
When everything's made to be broken
Quando tudo está prestes a ser quebrado
I just want you to know who I am
Eu só quero que você saiba quem eu sou

Essa parte parece que foi escrita por ela. Me lembra que até hoje não
explicou porque criou esse personagem... De algum lugar das profundezas do
meu peito, cresce uma vontade de invadir esse palco, abraçá-la e exigir que

me conte tudo. Os segredos que nunca dividiu com ninguém, suas angústias e
seus sonhos.
Scheibe.
Que besteira piegas.
O que está acontecendo comigo?
Ela continua cantando e eu sinto como se estivesse sendo hipnotizado,
como se suas notas estivessem entrando dentro de mim e aquecendo as
minhas entranhas. Essa garota irritante, mimada, inesperada, corajosa, esperta

e talentosa... Preciso tomar cuidado, ou poderia acabar gostando dela.


Gostando de verdade.
E eu ainda tenho uma promessa a cumprir. Não posso me dar ao luxo
de acabar com um coração destroçado quando ela finalmente se apaixonar
por outro cara.
A música acaba, as luzes se apagam e a multidão reage como se tivesse
acabado de acordar de um sonho bom, gritando e aplaudindo em pé. Ela
agradece, joga o violão para um roadie e logo emenda em uma das suas
canções agitadas, deixando a “Roxy” voltar a possuir o seu corpo.

- De onde veio isso? - Justin se senta ao meu lado na caixa, olhando


embasbacado para a sua protegida, que agora faz uma coreografia
complicada, enquanto canta sem perder o fôlego.
- Se você não sabe, quem dirá eu. 95% do tempo eu não faço ideia do

porquê ela faz as coisas que faz. - Ainda estou digerindo seu beijo e seu
pedido de desculpas de hoje cedo.
- Sabe uma coisa que vocês têm em comum? - Jus pergunta e eu dou de
ombros.
- Nós dois sempre perdemos a paciência com você?
- Não. - Revira os olhos. - Independente da besteira ou da loucura que
fazem, sempre fazem pelos motivos certos. - Dá tapinhas nas minhas costas e
sai para gritar com um carregador que está quase deixando cair uma guitarra

cor de rosa que eu imagino ser de Grace.


Por falar em Grace, hoje ela está tocando sem nem reparar na minha
presença. Nem piscou sedutora para mim quando passei ao seu lado no
corredor dos camarins. Não que eu esteja reclamando, só é estranho...
Mas ele tem razão.
Aprendi que sempre há um motivo ridiculamente nobre por trás de
todas as loucuras da Princesa. Ouvi os roadies dizendo que o dinheiro que
ganhou com a aposta daquele topless foi todo para o dono do bar de
motoqueiros. O cara estava prestes a perder o lugar que é o sustento da sua

família.
Enquanto isso, prefere deixar todos achando que é essa garota
inconsequente e louca. Não que ela não seja um pouquinho essas duas coisas
também.

- DRAKE! - Um grito de Emma chama minha atenção e eu olho para


onde está apontando. Uma fã invade o palco, se joga em cima de Roxy e eu
corro para frente, vendo tudo em vermelho.
Pego a doida pela cintura e a tiro de cima da Tampinha com facilidade.
- Você está bem? - A ajudo a se levantar com uma mão, enquanto seguro a
invasora com o outro braço.
- Estou ótima. - Ela fica em pé e ajeita a sua roupa. - Por favor,
certifique-se de que a garota esteja bem e deixe que se acalme antes de liberá-

la, ok?!
Mesmo depois de ser atacada, Roxy ainda tem o sangue frio de me
pedir para ser gentil com a insana que está tentando com todas suas forças se
soltar do meu aperto e voltar a agarrá-la?
Tá bom, tá bom.
- Ok.
Me agradece com um sorriso e volta para a frente do palco, acalmando
a todos.
Eu levo a pirralha para o seu camarim, sirvo um copo de água, dou um

dos cartões postais que Roxy sempre escreve para os fãs e uma das suas
toalhinhas com estampa de unicórnios. Pela alegria da menina, parece que
acabou de ganhar seis Lamborghinis e oito Ferraris.
- Ain! Hoje é o melhor dia da minha vida. Posso tirar uma foto com

você também? - Ela me pergunta saltitando de empolgação no lugar e eu


reparo que não deve ter mais de dezoito anos.
Essa juventude está perdida...
- Por que você iria querer uma foto comigo? - Faço uma careta de
confusão para ela.
- Está brincando?! Você é Drake Hill! Todos nós shippamos você com
a Roxy.
- Shippamos? - Agora estou confuso mesmo. - Isso é alguma gíria?

- Sim! - Ela ri da minha cara. - Achamos que, no fundo, você é o crush


secreto dela.
- Crush? Isso não é o nome de algum chocolate?
- Ain, você é tipo o malvadão mais adorável. Já te disseram que é a cara
do Stephen Amell?!
Stephen quem?
Ok.
Justin estava certo.
Eu passei os últimos anos vivendo embaixo de uma pedra.

Melhor eu concordar com essa foto logo, antes que eu me sinta ainda
mais velho. Me abaixo e ela cola o seu rosto no meu para tirar uma selfie -
sim, isso eu sei o que é - e me agradece vinte vezes, antes de sair abraçada
aos seus presentes.

- Você é um fofo, Drake! - Ela grita da porta.


- Já vi te acusarem de muitas coisas, mas de fofo é a primeira vez. -
John passa pelo corredor balançando a cabeça.
Isso é verdade.
Glitterlândia está mudando minha reputação.
Mas não acho que isso seja uma coisa ruim, afinal.
Ouço a última música começar a tocar, pego o seu roupão dourado de
um gancho no camarim e saio pelos corredores para encontrá-la. Antes que

eu perceba, estou cantarolando a letra da sua canção de maior sucesso até


agora - “Only Girl In The World”.
Cantarolando uma letra de música pop... Acho melhor eu ir comprar um
coturno de glitter assim que acordar amanhã para completar o combo. Aposto
que ficaria um arraso com meu novo uniforme.
Viro no corredor e vejo Roxy se despedir do público e abraçar Justin.
Eles conversam baixinho, com as cabeças juntas, e parecem nem perceber
minha aproximação.
- Não. Drake não vai lidar bem com isso. - Ela sussurra baixinho, mas

meus ouvidos treinados ouvem com perfeição.


- Drake não vai lidar bem com o quê?
Capítulo 25 - Está dentro?
Roxy

Não, não importa o que Justin diga.


Tenho certeza que Drake não vai gostar nada da ideia de ter sido
manipulado todo esse tempo. E vai gostar menos ainda se descobrir que eu

sabia e não disse nada.


Eu não vou mentir.
Percebi, enquanto cantava minha música preferida e tentava colocar
meus sentimentos em ordem, que estava fazendo tudo errado. Não é com
vinganças, chiliques e indiferença que vou chegar até ele. Eu não quero que o
mundo me veja, porque não acho que entenderiam...
Mas Drake me entendeu desde o começo.
Rox sai de cena, e entra Anne no lugar.

E Anne sempre faz o que é certo.


- Nós precisamos conversar. - Dou as costas para Jus e olho direto
dentro dos olhos verdes que aprendi a conhecer tão bem nos últimos tempos.
- Roxanne, por favor. - Meu empresário implora atrás de mim, com
uma nota de desespero na voz. Tudo bem que fez isso pensando no que seria
melhor para nós dois, mas eu só consigo me colocar no lugar do Babaca.
Se ele tivesse descoberto todo esse plano casamenteiro e não tivesse me
contado, eu já estaria afiando o meu alicate de unha uma hora dessas.
Entendo que Jus tenha medo de que ele vá ficar possesso, mas eu devo isso a

Drake.
- Estávamos falando que você não lidaria bem com ter de ir numa festa
comigo essa noite. - Tento mandar um olhar significativo para ele, usando da
nossa recém descoberta comunicação não-verbal.

“Não é isso, mas entre na minha. Juro que te conto tudo depois.”
Um movimento mínimo no seu queixo e vejo que entendeu na hora, ao
mesmo tempo que Justin suspira aliviado. - Sim, é isso mesmo. Tem razão,
Roxy. Deixa esse negócio de festa para lá. Podem voltar para o hotel e
descansar. Amanhã temos um voo logo cedo mesmo.
- Tem certeza? - Drake consegue deixar de lado sua expressão
desconfiada, entrando no meu jogo com perfeição. - Se faz parte do meu

trabalho, eu posso ir numa... festa. Mesmo que prefira ter toda minha perna
depilada por uma Roxanne bêbada com uma pinça cega.
Eu me seguro muito para não rir da cena que a minha mente imaginou.
Preciso anotar essa para usar contra ele no futuro.
- Claro. Vou mandar as meninas da banda no lugar. Sabem como Grace
adora essas coisas. Bom, então é isso. Boa noite, comportem-se. Amo os
dois, nunca se esqueçam disso. JOHN! ALGUÉM VIU O JOHN? - Sai
gritando pelos corredores, nos deixando a sós.
- No hotel você me conta, vamos lá. - Drake segura o roupão dourado

aberto e eu entro nele. Com carinho, tira meus cabelos para fora e arruma a
gola, deixando seus dedos fazerem uma carícia leve no meu pescoço.
Eu engulo em seco, tentando abafar mais uma vez as reações do meu
corpo à sua presença e tentando abafar o que senti ao vê-lo emocionado com

a minha canção essa noite. Nunca vou esquecer de como me olhou com
admiração pura...
Com sua figura impressionante ao meu lado, saímos para a noite aberta
e eu aceno para os meus fãs, antes de entrar direto no banco da frente do sedã
preto que nos aguarda.
- Eu sempre ando no banco de trás dos carros. - Ele imita meu tom de
voz naquele primeiro dia, subindo no lado do motorista. Parece que já faz
uma eternidade...

- Eu também devorava seguranças com molho barbecue no jantar, mas


parece que as coisas mudam. - Mostro a língua para ele e o vejo sorrir. -
Tenho muitas coisas para te contar, Drake.
- Algo me diz que vamos precisar de vinho para isso.
- Ah, pode ter certeza que sim. - Uma ideia começa a se formar na
minha cabeça. Eu posso fazer melhor do que só um vinho! - Você toparia ir
num lugar comigo? Juro que não é uma balada, nem um bar de motoqueiros.
- Claro. - Responde sem nem pestanejar e é a minha vez de sorrir.
- Resposta errada. Eu poderia estar te levando para uma emboscada e te

assassinar lentamente com o meu alicate, enquanto Britney Spears toca num
repeat eterno. - Faço minha melhor expressão maléfica.
- Você teria de me pegar primeiro. - Ele mostra os dentes e ergue uma
sobrancelha numa pose que deveria ser ameaçadora, mas eu só consigo

enxergar como totalmente sexy. - Para onde vamos então, serial glitter?
- Para o hotel mesmo. - Ele me olha confuso. - Você vai entender.
Conecto meu celular no sistema de bluetooth do carro e passo o dedo
pela minha playlist de Divas Pop. Não... acho que consigo um meio termo
para nós. Escolho o novo CD do Ethan Carter, o astro do rock que faz as
melhores baladas românticas que o mundo já viu. Nada tão pesado quanto seu
Slipknot, nem tão água com açúcar quanto a minha Santa Britney.
- Isso é outra trégua, Roxanne? - Pergunta com um sorriso de canto.

- Tréguas não são para nós. - Tento não pensar em como acabou a
nossa última. - Considere isso como parte do meu pedido de desculpas de
mais cedo. Estou tentando ser uma protegida melhor.
- Ok, estou começando a acreditar mesmo naquela história de
emboscada agora. - Finge uma expressão apavorada.
- Besta! - Dou um soquinho no seu ombro, curtindo o clima leve entre
nós enquanto ele estaciona na frente do hotel. Espera que eu atenda todos
com a maior paciência do mundo e até tira algumas selfies.
DRAKE ESTÁ TIRANDO SELFIES.

Pensando bem, se estivesse no lugar dessas garotas, pediria uma foto


com o segurança sexy e mal encarado também.
- Você sabe o que é crush?! A fã que invadiu o palco hoje falou algo
sobre eu ser o seu. Também disse algo como shitamos, shivamos, shippamos,

ou sei lá. - Balança a cabeça, sem fazer ideia do que está dizendo, enquanto
me escolta até o lobby do hotel.
Até as minhas fãs estão nessa campanha?
Caramba, tem alguém que não está torcendo para gente ficar juntos?
- Crush é sinônimo para “segurança babaca”, não sabia?! Agora me
espere aí, bonitinho e comportadinho. - O empurro pelos ombros com força
para que caia sentado no sofá do hall e vou conversar com o gerente de
plantão.

Ele libera o meu acesso ao terraço do hotel na hora e promete que não
deixará mais ninguém acessar o espaço essa noite. Sorrio em agradecimento,
tiro meu roupão, autografo e entrego para ele, como presente para sua filha de
oito anos.
Uma mão lava a outra.
- O que está tramando? - Me pergunta franzindo os olhos quando volto
para a sua frente usando só a roupa do show.
- Nada que vá me fazer acabar na capa de um tabloide, juro. Só pedi
que a gente possa usar a piscina no terraço sem sermos incomodados.

Também vão entregar nosso jantar lá em cima. Risoto, filé, uma garrafa de
Syrah e uma de Carménère.
- Eu vou morrer mesmo, não vou? - Estreita os olhos desconfiado para
mim. - Preciso ligar para a minha mãe antes. E para a minha irmã. Saiba que

não vai te perdoar por não ter tido a chance de me obrigar a assistir todas as
comédias românticas novas do Netflix com ela.
- Para de ser bobo e anda logo. - Antes que eu comece a pensar muito
em você assistindo comédias românticas mais uma vez.
Pego suas mãos, tentando colocá-lo em pé e saio o arrastando até o
elevador. Só quando as portas se fecham e ele olha para baixo é que percebo
ainda estar segurando seus dedos com firmeza.
Faço menção de soltar, mas ele não me deixa, só segura com mais força

e brilha seus olhos verdes para mim.


Essa noite nós dois estamos jogando um jogo perigoso.
Um jogo que talvez não aceite vencedores.
As portas se abrem e eu sorrio para verdadeira floresta que esse hotel
tem no seu terraço, vendo a mesa já posta num canto com as garrafas de
vinho, exatamente como pedi. Esse espaço não é igual a nada que eu já tenha
visto. Sua piscina, na verdade, é uma imitação perfeita de um pequeno lago,
cercado de grama macia.
Essa noite nós vamos acampar sob as estrelas.

- Scheibe, Princesa. - Ele resmunga admirado olhando ao redor, ainda


sem soltar a minha mão.
- Isso me lembra que eu tenho uma condição, antes que eu te deixe
entrar aqui comigo.

Me dá um sorriso divertido. - Vá em frente, dê as cartas.


- Essa noite não tem Princesa, não tem Babaca. Não tem segredos entre
nós. Eu vou te contar tudo. O que eu descobri sobre Justin, porque eu criei
esse personagem e tudo mais que quiser saber. Mas, em contrapartida, você
vai ter que me contar tudo também. Desde porque sabe tanto sobre vinhos,
até qual foi essa promessa que Jus cobrou para te obrigar a vir trabalhar
comigo. Uma pergunta por uma resposta, versão 2.0. Está dentro?
Sem esperar por uma resposta, me solto do seu aperto e dou alguns

passos para frente, ficando de costas para ele. Tiro meus sapatos, minha blusa
toda bordada, desço minhas calças pelas pernas, ficando apenas com a minha
calcinha simples de algodão e meu top. Prendo o cabelo num coque alto e
saio correndo até o lago, me jogando lá com tudo.
Deixo a água morna me acalmar, enquanto nado de um lado para o
outro, até que trombo em algo sólido no caminho. Volto para a superfície e
dou de cara com um par de olhos verdes, cabelos molhados, um peitoral
musculoso e braços fortes que me pegam pela cintura.
- Estou dentro, Anne.
Capítulo 26 - Você começa ou eu começo?
Drake

ELA TIROU A ROUPA!


NA MINHA FRENTE!
Tudo bem, Drake. Não pense na intimidade desse ato. Pense que ela

está de biquíni... Não é nada demais. Nada demais...


Só preciso encontrar um jeito de explicar isso para o meu sangue, que
decidiu entrar em ebulição no instante em que viu todas as suas curvas na
frente. Scheibe! E que curvas...
Eu a vejo correr pelo gramado sem se preocupar com nada e se jogar
com uma bomba na água. Nada de mergulho delicado, nada de molhar a
pontinha do pé, ela pulou com tudo - do mesmo jeito como encara a vida.
Tenho certeza de que essa noite tem muito mais chances de dar errado,

do que de dar certo, mas ainda assim eu tiro o meu terno em tempo recorde e
a sigo com um sorriso no rosto.
Só por hoje, vou me permitir fingir que não existe mesmo Babaca e
Princesa.
Somos apenas Drake e Anne.
E Drake pode admitir que sente uma atração do cara*** por Anne.
Ando devagar até a beirada da piscina, a vendo dar braçadas vigorosas
de um lado para o outro. Me jogo no canto oposto ao que está e espero que
chegue até mim. Volta para a superfície sorrindo ao trombar comigo e minhas

mãos vão direto para a parte que mais gosto do seu corpo. Sério, eu tenho
alguma coisa com a sua barriga macia. Aperto com suavidade a pele ali e a
puxo de encontro a mim, sentindo seu corpo quente contra o meu. - O que
estamos fazendo, Anne?

- Nós só vamos conversar, Drake. - Passa as mãos pelos meus braços,


subindo até o meu pescoço e esfregando ali. - Estamos sozinhos, nada de
ruim vai acontecer. Pode relaxar.
Solto o ar dos meus pulmões, sem nem perceber que estava segurando,
e seus pequenos dedos varrem a tensão dos meus ombros. Para a minha
surpresa, eu relaxo mesmo, relaxo completamente pela primeira vez em anos.
Ela sobe e desce na minha frente e eu percebo que seus pés não
alcançam o fundo na piscina. Mas é uma Tampinha mesmo... Desço minhas

mãos para as suas coxas e enrosco suas pernas ao redor da minha cintura,
deixando nós dois boiando com suavidade pela água morna. - Confortável
assim?
- Mais do que deveria. - Sorri de leve e balança a cabeça, como se não
acreditasse no que está acontecendo entre nós. Tudo bem, eu também não
estou acreditando. - E então? Você começa ou eu começo?
- Pode começar, sou do tipo cavalheiro. - Mordo de leve a curva entre
seu pescoço e seu ombro, para provar o meu ponto.
- Uhum, estou vendo. Um cavalheiro canibal. - Revira os olhos para

mim, mas parece estar feliz. Leve e relaxada, como eu. - Por que você sempre
xinga em alemão?
- Meu pai era alemão e eu cresci sabendo as duas línguas. Meu nome
completo é Drake Hill Schäfer. Antes que pergunte, uso o sobrenome da

minha mãe como uma homenagem, por tudo que fez para nos criar depois
que meu pai morreu. Eu o honrei assumindo sua carreira e a honrei
assumindo seu nome.
Seus olhos castanhos brilham com emoção e vejo algumas lágrimas
começando a se formar. - Isso é lindo, Senhor Schäfer.
- Para resumir, na verdade é só um jeito que encontrei para xingar sem
as pessoas entenderem o que estou dizendo. - Dou de ombros, ansioso para
mudar de assunto e fazer a minha pergunta logo. - Por que criou esse

personagem, Anne?
Suspira e chega mais perto de mim, deitando o rosto no meu ombro. -
Porque eu queria fazer o que amo, mas não queria correr o risco de perder
quem eu sou. Cansamos de ver esses casos de estrelas adolescentes que
cresceram e surtaram. Esse foi o jeito que encontrei para me manter sã. -
Brinca com os cabelos na minha nuca, falando sem me encarar. - Enquanto
estou em público sou uma, mas quando estiver “no mundo real” sou apenas
eu. É mais fácil fazer essa diferenciação quando você tem um uniforme,
quase como o super homem e o Clark Kent. Deixo todos pensarem que sou

esse ser espalhafatoso e extrovertido, com as roupas e a maquiagem pesada,


mas quando estou sozinha, só quero me enroscar num pijama e ler romances
água com açúcar. - Só então se afasta e volta seus olhos castanhos para mim,
dando um sorrisinho de canto. - Mas aposto que já sabia de tudo isso.

- Dei uma suspeitada de leve quando vi sua casa e seu quarto de hotel.
Só Justin sabe sobre esse seu desejo, certo? - Afasto um fio de cabelo do seu
rosto.
- Certo e gostaria muito que continuasse assim. Um pedaço de mim que
ainda é só meu e que eu não tive de abrir mão, junto com a minha privacidade
e a minha liberdade.
- É um pedido justo. - Mesmo que eu já suspeitasse, foi bom ouvir tudo
da sua boca. - Como me contou isso, imagino que precise te contar sobre os

vinhos agora.
- SIM! E vamos aproveitar essa deixa para abrir os trabalhos. - Desce
do meu colo e nada até a borda. Eu a sigo, nem tentando esconder o quanto
estou cobiçando descaradamente seu corpo molhado. - Vê algo de que gosta,
Drake Hill?
Ela se senta numa das espreguiçadeiras e começa a se enxugar,
enquanto ri do meu queixo caído.
- Vejo algo que queria para mim, isso sim. - Meu apoio com um braço e
iço meu corpo para fora num movimento só. Agora é sua vez de ficar de

queixo caído. Para de se enxugar no meio do movimento, olhando para mim


com uma verdadeira expressão de luxúria.
Nunca mais vou me esquecer desse olhar.
- Vê algo de que gosta, Roxanne Reed? - Roubo a toalha da sua mão e

passo pelo meu peito.


- Se eu disser que sim, o que acontece? - Me pergunta com um sorriso
sacana.
Scheibe, essa mulher sexy...
- Me pergunte isso de novo no fim da noite. - Pisco para ela e vou
servir uma taça de Syrah para cada um. - Como eu conheço tanto sobre
vinhos então? - Viro o rosto para trás e a vejo balançar a cabeça em
concordância, ainda sem desviar os olhos da minha boxer. - Hey, psiu. Meus

olhos estão aqui em cima.


- Seus olhos eu vejo todo dia, sua bunda não. - Quase derrubo a garrafa
de tanto rir. Senhor, o que eu faço com essa mulher?! Dou as duas taças para
ela segurar, sento atrás do seu pequeno corpo na espreguiçadeira e a puxo
contra o meu peito. Rox se aconchega em mim, jogando as pernas por cima
das minhas coxas e dando um longo gole. - Vamos lá, cara, ainda estou
esperando minha resposta.
Eu também bebo metade da minha taça de uma vez, enquanto brinco
com o elástico da sua calcinha comportada, vendo fascinado sua pele se

arrepiar com o meu toque. - Uma das únicas coisas que fiz por mim nos
últimos anos foi um curso de culinária e harmonização de bebidas. Eu só
realmente gosto de cozinhar.
- Então, você é um agente secreto que já deve ter matado algumas

dúzias de mafiosos e traficantes, mas que assiste comédias românticas, lê


clássicos da literatura e adora cozinhar?
- Acho que essa é uma definição. - Nunca vou me acostumar com a
naturalidade com que encara a minha carreira passada. É como se não se
importasse com o peso de tudo que fiz. A Tampinha daria uma boa agente
com todo esse seu sangue frio. - Sua vez. O que descobriu sobre Justin hoje
mais cedo? - Ela bebe o resto do seu vinho e se levanta para servir mais,
numa tentativa óbvia de fugir de mim. - É tão ruim assim?

- Não é ruim, só preciso que prometa não ficar bravo com Justin.
- Eu acho que não seria capaz de ficar bravo com Justin. Nem se eu
quisesse.
- Muito bem. - Toma um gole e respira fundo, fazendo seu peito subir e
descer, chamando a minha atenção para o seu sutiã. Engulo em seco e forço
meus olhos a voltarem para o seu rosto, enquanto xingo baixinho pelas
reações do meu corpo. O que eu tenho? Quinze anos? - Jus fez várias coisas
nos últimos tempos para tentar nos juntar como um casal. Um casal do tipo
casal mesmo, beijo na boca, amorzinho, cotchoquinho e cotchoquinha. Esse

era o seu plano desde o início.


Estreito os olhos. - Várias coisas como o que, por exemplo?
- Como parar o elevador, como as camas de casal no quarto, como o
interesse falso de Grace. - Ah! Por isso ela não me deu bola hoje. - Como me

fazer tocar no mesmo dia que o Guy e por aí vai. Na cabeça dele, nós somos
alguma espécie de par perfeito.
- Aquele imbecil vive achando que sabe o que é melhor para todos. -
Penso por alguns segundos, olhando para o horizonte de Milão. Fui
descaradamente manipulado e não, eu não gosto nada disso.
Amanhã vou ter uma séria conversinha com o senhor Rezzo.
Muito séria.
- Nem me fale. - Ela volta a se sentar na espreguiçadeira, dessa vez de

frente para mim, me encarando com os seus olhos castanhos gigantes. - Faz
quatro anos que manda e desmanda na minha vida como bem entende.
- Então, ele não queria que você me contasse sobre essas manipulações
todas, mas você insistiu que queria me contar?
Por isso o “Drake não vai lidar bem com isso”.
- Exato. Você não me parece do tipo que toleraria mentiras.
Esvazio o resto da minha taça todo. - Tem razão, ficaria realmente
bravo se tivesse escondido de mim. Acho que você também é boa em me
sacar, Senhorita Reed. - Sorrio para ela. - Como descobriu tudo isso?

- Não, não. Uma pergunta por uma resposta e agora é a minha vez. - Me
entrega a sua taça cheia e se levanta para encher a outra rapidamente. - O que
Justin fez por você que o deixou com essa dívida tão grande a ponto de ter
que me aturar?

Voltando para o meu lado, ela empurra as minhas coxas até que fiquem
juntas e se senta em cima delas. Minha mente já imagina 28737824 cenários
diferentes para essa posição.
- Anne... - Falo em tom de aviso, mas ela só me dá um falso sorriso
inocente e bebe mais do seu vinho, sem fazer menção de se mexer. - Você
está brincando com fogo, garota. - Bato minha taça na dela, como se
brindasse à sua loucura e tomo outro gole. - Depois que meu pai morreu, eu
passei por um período complicado. Uma bela noite, entrei numa briga de bar

e os covardes chamaram a polícia. Mas eu já sabia que queria seguir carreira


como agente e não poderia ser fichado. Então, Jus levou toda a culpa por
mim, disse que ele tinha socado o valentão, quando na verdade tinha sido eu.
Ele foi preso, fichado e seus pais quase o mataram, mas nunca me entregou.
- Caramba! Drake Hill já foi um bad boy! Agora sim estou chocada. -
Ela gargalha da minha cara e eu só dou de ombros. Todo mundo tem um
passado. Um bem conturbado, no meu caso. - Bom, acho que aprendemos
hoje que Justin é realmente um bom homem.
- Sim, ele é. - Concordo sorrindo, lembrando de algumas passagens da

nossa infância e adolescência. Scheibe, nunca conseguiria ficar bravo com ele
mesmo. E acho que sabe disso. O que faz a sua reação de hoje com Roxy ser
bem estranha... - Agora posso perguntar como descobriu as armações dele? -
A vejo desviar o olhar, parecendo relutante e quase com medo. Oh-oh. Lá

vem bomba. - Pode contar, Anne. Não vou me zangar.


- Ah, não teria tanta certeza se fosse você. Drake, eu... - O apito do
elevador avisando que alguém chegou a salva de responder. - Olha só, deve
ser o nosso jantar!
É.
Bomba das grandes.
Capítulo 27 - Minha teoria estava certa
Roxy

Visto a camisa rosa de Drake, que cai até o meio das minhas coxas e
corro para pegar os nossos pratos, antes que o entregador possa entrar e
vender a história de que eu estava sozinha com um cara seminu.

Um belo cara seminu, diga-se de passagem.


- Boa noite, senhorita. - Seu sorriso educado vira uma versão
impressionada ao me ver. - Eu... Eu.. Trouxe... O...
- Meu jantar. - Termino por ele, achando graça da sua confusão.
- Onde... Eu... Posso... Posso...
- Deixa comigo. - Assino a comanda e pego as duas bandejas. - Muito
obrigada e boa noite. - Ele entra no elevador aos tropeços e eu dou outra
risadinha.

Sempre acho graça das pessoas ficarem impactadas comigo! Sou só


mais uma garota... Talvez uma com um gosto meio psicótico por glitter, mas
ainda assim uma garota.
Volto para a mesa ao lado da nossa espreguiçadeira, equilibrando as
duas bandejas.
- Esse “Efeito Roxy” ainda vai matar algum pobre homem desavisado
por aí.- Seus olhos verdes queimam meu corpo, de cima até embaixo, e eu
quase derrubo tudo. - Gosto de você com a minha camisa.
- Droga, Drake. Não seja sensual enquanto eu carrego comida, cara. -

Ele ri e se levanta para me ajudar. - Pedi um prato de cada para gente dividir,
espero que não se importe.
- De jeito nenhum. - Destampa as embalagens e minha barriga ronca em
resposta. - Já que estamos nos divertindo com o Syrah, vamos começar com o

filé.
- Acho justíssimo. - Nham, nham! Syrah, filé e Drake.
Nos sentamos lado a lado na pequena mesa, ele corta um pedaço
generoso da carne suculenta, espeta no garfo e oferece para mim. Eu mastigo
feliz enquanto Drake se serve e comemos o prato todo assim, com ele me
alimentando na boca. E quando falei que comida era o maior prazer que a
pessoa poderia ter sem tirar a roupa, nem era nessa cena que estava pensando.
Um homem desse tamanho, com esses músculos todos, fazendo algo

tão doce, quase foi o meu ponto de ruptura. Quem o vê de fora, nunca
imaginaria... Eu mesma NUNCA imaginaria que poderíamos dividir um
momento tão íntimo.
Pena que logo tudo isso vai por água a baixo, quando eu contar que
andei me intrometendo na sua vida.
- Antes de passarmos para o Carménère e o risoto, você vai me contar
tudo que está te fazendo franzir as sobrancelhas desse jeito. - Coloca um dedo
na minha testa, aliviando as rugas de preocupação que fiz ali.
- Queria que aquele negócio de não conseguir ficar bravo valesse para

mim também. - Faço uma careta, me levanto, viro de costas e decido despejar
tudo de uma vez, sem nem pensar. - Eu aproveitei uns minutos que fiquei
sozinha naquele clube e fui perguntar para Matthew sobre você. Ele me
contou sobre sua fama, sobre a história do Diablo. Então, decidi que queria

arrancar emoções de você, o que levou à toda aquela birra. Desculpa por isso
mais uma vez, a propósito. - Dou uma pausa e respiro fundo. - Enquanto eu
refletia sobre o que descobri na manhã seguinte, me perguntei se Justin sabia
desse seu passado. Se ele sabia, como poderia não ter feito nada para tentar
ajudar? Não é do feitio do Jus não se intrometer. Daí foi só juntar 1+1. Ele
fez algo para te ajudar! Ele te trouxe para perto da pessoa que tinha certeza
que te deixaria insano. Bati na porta do quarto dele enquanto você dormia e o
confrontei. Ele contou tudo. John faturou quarenta pratas. Fim da história.

Não ouço nada ao nosso redor, só os barulhos da noite e da cidade que


se estende embaixo da gente, parecendo uma continuação do céu estrelado.
Depois de vários minutos ainda sem coragem de encará-lo, ouço sua voz
fraquinha falando logo atrás de mim, sua mão serpenteando pela minha
cintura, por baixo da minha camisa roubada. - Matthew te contou como
surgiu a história do Diablo?
Ele estar me tocando assim e não me estrangulando é um bom sinal,
certo?
- Sim. Também contou sobre o seu antigo parceiro... - Não aguento

mais o suspense. Me viro e pego seu rosto nas minhas mãos, o forçando a me
encarar. Os olhos verdes têm uma sombra pesada sobre eles, que faz o meu
coração se rachar um pouquinho. - Eu não sei o que aconteceu, mas tenho
certeza absoluta de que não foi sua culpa. Nem imagino como tenha sido

difícil lidar com tudo isso e você se proteger é uma reação mais que
compreensível. Mas eu realmente gostaria de te ajudar. Você merece mais,
Drake. - Me encara por vários segundos sem dizer nada, só fica me olhando
com toda a sua intensidade. - Fala alguma coisa, por favor. - Peço baixinho.
- Estava nublado no dia em que tudo aconteceu. - Sua voz ainda é só
um fiapo. - Cada dia que amanhece assim, eu me lembro de tudo. Da dor, do
desespero, dos gritos de Paul e do sentimento de impotência. Foi uma
emboscada organizada por um grupo de traficantes e hoje eu consigo ver que

não tinha nada que eu pudesse ter feito. - Balança a cabeça e fecha os olhos. -
Por que foi perguntar para o Matt sobre mim, Anne?
- Porque eu precisava saber mais sobre você, Drake. - Respondo no
mesmo tom baixo, íntimo. É como se uma bolha tivesse se erguido ao nosso
redor e só existíssemos nós dois no mundo naquele momento. Dois
orgulhosos revelando partes que nunca imaginaram que contariam para o
outro.
- Por que, Roxanne? Por que queria saber mais sobre mim? - Dá um
passo para frente, acabando de colar os nossos corpos. - Você nem gosta de

mim.
- Porque estava começando a suspeitar que talvez os meus preconceitos
pudessem estar um pouquinho errados sobre você. - Ugh! Não acredito que
estou admitindo isso em voz alta. - Só um pouquinho.

- Acho que nenhum de nós esperava se surpreender tanto com o outro. -


Admite também meio a contragosto. Como somos fofos!
- E eu acho que é minha vez de perguntar. - Solto o seu rosto, pego uma
das suas mãos e dou uma mordidinha de leve no seu dedo, como ele sempre
faz comigo, querendo descontrair um pouco o clima intenso entre nós. - Você
está bravo comigo?
- Não. - Se desvencilha de mim, volta para perto da mesa e abre a
garrafa de Carménère. - Você me faz sentir muitas coisas, mas não raiva.

- Eu te faço sentir coisas? - Eu o sigo, ainda experimentando a


intensidade que flui entre nós, como se fôssemos atraídos um pelo outro de
alguma forma. Polos opostos se atraem! Questão de física, lembro disso das
minhas aulas.
Não dá para ir contra a Física.
- Você me faz sentir coisas o tempo todo. - Serve uma taça para cada e
já começa dando um grande gole. Quero nem ver a ressaca que nós dois
vamos nos enfiar amanhã.
Espero que seja só do tipo alcoólica e não do tipo moral também.

- Mas eu pensei que aquela história de Diablo...


- Eu consigo me controlar com perfeição, ou conseguia, já que você
anda me deixando louco desde que apareceu na minha frente erguendo esse
queixo e me desafiando. - Entrega a minha taça. - Mas não quer dizer que eu

não sinta. Eu sentia tudo, Roxy. Tudo. A diferença é que eu me concentrava


no que precisava ser feito e mais nada. Fosse resgatar uma menina de oito
anos que estava sendo mantida como refém no meio de um tiroteio, ou me
infiltrar na máfia italiana e presenciar um esquartejamento. Precisava ser
feito, eu fiz.
Minha teoria estava certa.
Sinto meu corpo se arrepiar todo.
Ele sentiu tudo que passou, mas sempre se colocou em último lugar na

sua lista de prioridades. Drake é o tipo raro de pessoa 100% altruísta e que
consegue se colocar no lugar do outro. Nem imaginava que ainda fabricassem
seres humanos desse modelo.
Dou um gole no vinho, sentindo o gosto doce descer pela minha
garganta ao mesmo tempo em que engulo uma conclusão inevitável.
Eu gosto desse cara.
Gosto para valer.
Como é que isso foi acontecer, DROGA?!
Ando até a beira da piscina/lago, precisando colocar alguma distância

entre nós e tiro sua camisa pelo caminho, seu cheiro bom começando a me
sufocar. Sento na borda e deixo meu pés balançarem na água calma.
Gostar é uma coisa... Mas não quer dizer que eu esteja apaixonada,
certo?! Ugh, era só o que me faltava. Jogo meu corpo para trás na grama e

fecho os olhos, sentindo a brisa suave contra minha pele.


- Acabaram as perguntas? - Abro os olhos e o encontro deitado ao meu
lado, quase nariz com nariz. O homem se move como um gato, credo.
- Tenho muitas perguntas e muito medo das respostas que poderia me
dar para todas elas. - Dou um sorriso fraco e passo o dedo por uma pequena
cicatriz em cima do seu lábio superior, imaginando como ele a ganhou.
- Estilhaço de granada. - Responde aos meus pensamentos e pega meu
dedo entre seus dentes, como eu sabia que faria. - Não quer comer seu risoto?

- Não consigo pensar em comer agora.


- No que está pensando então? - Ele chega ainda mais perto e esfrega
seu nariz de leve na minha bochecha, fazendo um carinho sensual.
Ah, cara.
Eu bem que me avisei que essa noite não daria certo.
“O que eu estou pensando?” Argh! Seria impossível pensar em
qualquer outra coisa com um homem desses respirando na minha pele, seu
cheiro invadindo meus sentidos, seu toque quente deixando um rastro de
arrepios por onde passa...

- Estou pensando se você acha que eu deveria te beijar.


Sua mão aperta os lados da minha barriga mais uma vez e eu fecho os
olhos, só curtindo a sensação. Do nada, Drake me pega num movimento ágil
e me coloca toda em cima do seu corpo, me encarando com o maior sorriso

que já o vi dar.
- Se eu disser que sim, o que acontece? - Repete minhas palavras de
mais cedo e eu sorrio junto.
- Aí eu vou ser obrigada a te beijar mesmo, oras. - Colo nossas testas,
sentindo meu coração acelerar de ansiedade. Isso aí, Roxy. Se não for para
fazer burrada, você nem sai de casa, né garota?!
- E o que a gente faz amanhã? - Ele resvala seus lábios de leve nos
meus, me provocando.

- O amanhã a gente deixa para amanhã.


Foda-se.
Acabo com o blá-blá-blá entre nós e grudo nossas bocas, ao mesmo
tempo em que cravo minhas unhas na sua pele e me esfrego ao seu corpo,
dando início ao que depois viria a ser a noite mais perfeita da minha vida...
Capítulo 28 - A sua tão amada aposentadoria

Drake

Puxo seu lábio inferior entre os meus dentes, ao mesmo tempo em que
ela dá um gemido suave. - Você é um canibal, Drake Hill.

- E você é gostosa demais para resistir. - Sorrio como um predador,


antes de virá-la com as costas no chão e prender seus braços em cima da
cabeça, liberando meu caminho para morder onde mais eu quiser. Sua orelha,
seu pescoço, seu colo... Com um movimento rápido, arranco o seu sutiã do
meu caminho e continuo minha exploração sem pressa.
Quero marcar cada pedaço da sua pele com a minha boca.
Seu pequeno corpo se contorce embaixo do meu, querendo mais,
querendo me alcançar inteiro, e eu fecho suas pernas juntas, gostando da
ideia de torturá-la um pouquinho. - Droga, Drake. Tira essa cueca logo, ou eu

juro que dou um jeito de tirar eu mesma, nem que seja pela sua cabeça.
- Sempre tão mandona. - Desço um pouco mais, até chegar na sua
calcinha e respiro fundo ali. Scheibe. Já não saberia dizer nem o meu nome
mais. Esqueço a minha exploração, prendo o tecido entre os dentes e a rasgo
num puxão.
É hora de descobrir a única coisa que ainda não sei sobre Roxanne
Reed.
Seu gosto.

**

Acordo com o sol brilhando no meu rosto e dou um sorriso


instantâneo ao ver a confusão de cabelos castanhos na minha frente. Roxy

dormindo profundamente no meu peito, usando só a minha camisa e seu


cheiro de lavanda me fazendo companhia.
A noite de ontem foi... FODA. Canalizamos toda a nossa tensão, toda
a nossa química da melhor maneira possível. Fick Dich, a garota é explosiva
em todos os sentidos. Tenho certeza de que vou achar alguns roxos pelo meu
corpo.
Olho no meu relógio e percebo que preciso acordá-la logo, por mais
que eu não queira. Não faço ideia de como vai reagir ao peso da realidade.

Nem eu sei bem como reagir ainda.


Só sei que enquanto eu a ouvia falar sobre como eu merecia mais,
sobre como queria me ajudar, ter descoberto que ficou ao meu lado contra
Jus, junto com tudo que me fez sentir com seu pequeno corpo e sua língua
esperta... cheguei a uma terrível conclusão.
Estou apaixonado pela Princesa.
In der Liebe.
Parabéns para mim! Me superei no absurdo dessa vez. Sei que curto
esse negócio de adrenalina e tudo mais, só não imaginava que já estava

desenvolvendo um lado puramente masoquista e suicida.


Apaixonado pela Tampinha.
Seria trágico, se não fosse cômico.
Já estou imaginando Justin falando "Eu te avisei" por um mês sem

parar.
Respiro seu cheiro de lavanda uma última vez, querendo gravá-lo na
minha mente, e começo a mexer suavemente no seu cabelo. - Anne? - Ela
nem se mexe, só continua com a respiração profunda, alheia a todo drama
que a minha cabeça já criou.
- Anne, Princesa. Está na hora de acordar. - Nada.
Dou um beijo na sua bochecha e começo a me mexer, colocando nós
dois sentados, minhas costas reclamando da noite passada na grama. Estou

velho para essas coisas...


- Roxy. Precisamos acordar, antes que alguém venha atrás da gente e
descubra que você dormiu de conchinha com o seu Babaca preferido.
Seus olhos se abrem com tudo e ela me encara assustada, pulando
para longe de mim. Eu observo suas expressões oscilarem desde choque
completo, passando por luxúria ao olhar para o meu peito nu, até chegar num
sorriso doce. - Caramba, Babaca. A gente botou para quebrar noite passada.
ERA DESSA REAÇÃO QUE EU ESTAVA COM TANTO MEDO?
Não consigo evitar e começo a gargalhar na sua cara. - Você não

cansa de me surpreender, Tampinha. - Fico em pé e saio a procura das nossas


roupas, abandonadas desde que a Senhorita Problema se jogou na piscina,
levando toda nossa racionalidade junto com ela.
- Pelo que eu me lembro da noite passada, você também não se cansa

fácil. - Dá um sorriso sacana ao jogar a camisa na minha cara.


- Vamos dizer apenas que eu tive um bom incentivo para me manter
animado. - Jogo sua blusa para ela, respirando aliviado pelas coisas estarem
normais entre nós. Normais dentro dos nossos padrões estranhos, pelo menos.
Nos vestimos em silêncio e ela faz uma careta para o que sobrou da
sua calcinha. Risco operacional... Sempre pode acontecer.
Antes de sairmos, eu a puxo pela cintura, não resistindo em roubar um
selinho ao vê-la fazendo bico para o seu reflexo nas portas do elevador. - Eca,

Drake! Eu nem escovei os dentes ainda.


Rio da sua bobice, a jogo contra o alumínio gelado, separo suas
pernas com os meus joelhos, colo nossos corpos, puxo seu cabelo para erguer
o seu rosto e tasco um beijo de verdade, fazendo questão de deixar minha
língua invadir sua boca.
- Pode acreditar, seu gosto é delicioso em todos os lugares. - Sussurro
contra os seus lábios ao mesmo tempo em que o elevador apita avisando que
chegou. Ela entra resmungando, mas sorrindo e se abanando com as mãos.
Acho que nunca vou me cansar de ver como seu corpo reage ao meu.

Com um raro olhar tímido, ela dá um passo para o lado e enlaça seus
dedos nos meus. Eu controlo o calor que se instalou no meu peito e aperto de
volta.
Estamos juntos nessa. Seja lá o que for "essa".

Assim que as portas se abrem no nosso andar, nos separamos e


andamos para o nosso quarto olhando preocupados para os lados. Não
precisamos falar em voz alta para saber que ainda não estamos prontos para
encarar Justin, John, a banda e muito menos o resto do mundo.
Acho o cartão-chave num dos bolsos do meu terno e destranco a
porta, olhando no relógio ao mesmo tempo. - Droga, acho que não vai dar
tempo dos dois tomarem banho.
- Juro que se você sequer pensar em tomar banho no banheiro da

Grace, eu finalmente vou cumprir minha promessa do steak tartare. - Pega o


alicate de unha de dentro da sua nécessaire aberta e aponta para mim. Tiro a
arma muito letal da sua mão com a maior facilidade e a jogo em cima da
cama.
- Sempre soube que você era uma ciumentinha. - Eu a puxo pela
cintura e mordo o lóbulo da sua orelha. - Estava pensando em sugerir um
banho juntos, a menos que não consiga resistir ao meu corpinho e acabe
atrasando mais a gente.
- Nos seus sonhos, Babaca. - Rosna em resposta, mas me puxa pela

mão até o banheiro. Tomamos banho em tempo recorde, com apenas uns
beijos roubados e uma pausa muito necessária quando Roxy derrubou seu
sabonete e achou que sairia impune do showzinho particular que fez para
pegá-lo.

Não no meu turno, Princesa.


Ajoelho na sua frente, jogo uma das suas pernas por cima dos meus
ombros e só me dou por satisfeito depois que ela gritou meu nome pela
terceira vez.
- Quem não resistiu ao corpinho de quem? - Tenta reclamar ao se
enrolar na toalha, mas seu discurso não combina em nada com a sua
expressão saciada.
Dou um tapa na sua bunda, a fazendo pular e me lançar outro olhar

enfurecido. - Continue assim e não vamos mesmo sair desse quarto hoje,
Roxanne.
- E isso seria uma coisa ruim, não é? - Nem disfarça a cobiça ao me
encarar colocando a calça justa do terno, sem cueca por baixo.
- Aposto que Justin diria que sim. - Visto outra das minhas novas
camisas rosas e vejo sua expressão mudar de luxúria para deboche total. -
Uma risadinha que seja e eu juro que troco todos esses seus micro vestidos
brilhosos por terninhos cinza sem graça.
- Faça isso e eu troco seus sapatos italianos por coturnos de brilho. -

Responde no mesmo tom, enquanto passa sua maquiagem pesada nos olhos.
- Faça isso e eu troco seu coturno de brilho por sapatos como os meus.
Uma batida na porta interrompe nossa briguinha ridícula e nós
olhamos assustados. - Quem é? - Pergunto, já imaginando a resposta.

- Justin.
- Scheibe!
- Droga!
Xingamos em conjunto, enquanto trocamos olhares culpados e
corremos para bagunçar a cama, fingindo que dormimos ali. Depois de nos
certificamos que estamos minimamente apresentáveis, andamos até a porta e
usamos mais uma vez da nossa comunicação não verbal para trocar um
acordo silencioso.

"Muito cedo para falar qualquer coisa para alguém."

Eu abro num movimento só e continuo amarrando a minha gravata


dourada, enquanto Roxy faz sua típica cara de "tédio com o mundo". - Estão
prontos para ir? - Jus pergunta com as mãos nos bolsos e uma expressão
tensa.
- Nasci pronta. - A Tampinha responde, revirando os olhos.
- Claro, claro. E como foi a noite de ontem? Descansaram?

- Você bateu na nossa porta só para jogar papo fora? - Ela pergunta,
numa tentativa clara de desconversar e desviar sua atenção.
- Me perdoe por querer saber o que está acontecendo com meus
amigos. - Faz uma expressão ofendida, colocando a mão no peito. - Então, o

que andou acontecendo com vocês?


- NADA! - Respondemos em coro e ele nos olha assustado.
- Bom, não digam que eu não tentei. Drake, será que eu poderia
conversar um momento com você?
Oh-oh. Estou sentindo cheiro de problema de novo...
- Tudo bem. - Ele olha para a nossa cama recém bagunçada, mas não
consigo decifrar o que vejo no seu rosto. Será que percebeu alguma coisa?
- Roxy, pode deixar as malas que eu peço para alguém vir buscar.

- Ok. - Ela dá de ombros, pega sua mochila e finge que vai sair, mas
para no batente e aproveita que Jus está de costas para me dar uma piscadinha
sensual, antes de desaparecer pelo corredor.
Meu melhor amigo não percebe nada e se joga sentado no colchão,
me encarando por alguns segundos. Termino de calçar meu sapato e percebo
que o assunto deve ser sério mesmo, pelo tanto de voltas que está dando. -
Desembucha logo, homem.
- Drake, eu estive pensando e essa situação não é justa para você.
- Só agora percebeu isso? - Resmungo de volta, sem entender onde

quer chegar com esse papo.


- Sim e peço desculpas por isso. Acho que já fez uma grande
diferença na vida de Roxanne. Ontem ela me provou que se preocupa com
alguém, além dela própria. E foi um verdadeiro avanço.

Deve estar falando sobre ela querer me contar sobre os planos


casamenteiros furados, mesmo contra a vontade de Jus. Então, tudo foi só
mais um teste dele! Anne vai ficar furiosa quando souber.
- Se você diz... - Tento desconversar, vestindo meu paletó de costas
para ele.
- Você não entendeu o que isso significa? Seus serviços não são mais
necessários. Pode voltar para casa e curtir a sua tão amada aposentadoria.
- O QUÊ? - Me jogo na poltrona no canto do quarto e o encaro como

se ele tivesse enlouquecido. - Do que está falando?


Jus nem se abala, só coloca o que parece ser uma passagem de avião
em cima da cama, levanta e começa a andar para a porta - Já exigi muito de
você e serei sempre grato pelo tempo que me ajudou. Foi bom tê-lo por perto
de novo. Seu voo sai daqui uma hora e John está vindo para se despedir.
Imagino que seja o único para quem faça questão de dizer adeus, não é?
Enfim, assim que voltar para os Estados Unidos, eu te ligo. - Me dá uma
última olhada antes de sair pela porta. - Valeu mesmo, cara.
Acabou? Assim?

Minha mãe sempre disse "cuidado com o que deseja."


Desejei tantas vezes me ver livre da Tampinha que o universo decidiu
me atender.
Fick Dich.

O que eu faço agora?


Capítulo 29 - Entendeu finalmente?
Roxy

- Ué. Cadê o Babaca? - Pergunto assim que vejo Justin chegar no


saguão sozinho, seguido por dois carregadores do hotel trazendo as minhas
malas.

- Drake e eu decidimos que ele não fará mais parte da equipe Roxanne
Reed. Daqui, ele seguirá direto de volta para casa. Vamos indo? Não quero
atrasar nosso voo. - Meu queixo cai, junto com o de todo o resto da banda.
Até meus roadies que estavam por perto pareceram chocados.
- Como é que é?! - Pergunto com uma voz esganiçada, quase
histérica.
- Achei que estaria dando pulinhos de alegria, não com esse olhar de
quem está a um segundo de atacar a minha jugular. Acabou se afeiçoando ao

musculoso sem cérebro, foi? - Jus fala em tom de deboche e eu me amaldiçoo


mentalmente por não andar com o meu alicate no bolso.
Ao invés de lhe infligir todo o sofrimento que eu gostaria, o deixo
falando sozinho e sigo direto para a frente do hotel, precisando de um pouco
de contato com os meus fãs para recarregar minhas energias, antes de tentar
entender direito o que aconteceu.
Depois de uma rodada de selfies, autógrafos e muitas perguntas sobre
Drake que são como uma facada no meu coração ("Drake está ocupado".
Ocupado fugindo de mim, para ser mais precisa.) me sinto pronta para

digerir toda essa história.


Se esse Babaca fugiu mesmo por pura covardia, vou caçá-lo até o
quinto dos seus infernos "que ele conhece como a palma da mão". ARGH! Se
não, é bom que venha com uma explicação mais do que satisfatória para essa

história de não trabalhar mais comigo.


Entro na van, coloco meus fones de ouvido, meus óculos escuros e
pesco meu celular do fundo da mochila, esperando muito que tenha uma boa
justificativa do meu querido segurança me esperando...
Uma mensagem não lida.
É BOM MESMO.

"Confie em mim"

O quê? Só isso?
Três palavrinhas?
Três fucking palavrinhas?
Se depender de mim, alguém vai passar o próximo ano usando ternos
cor de rosa, com o cabelo tingido de cor de rosa e com coturnos de brilho de
brinde.
Decido não responder nada e respiro fundo, pensando racionalmente.
Nossa noite foi perfeita e nossa manhã continuou ainda mais perfeita. Achei

que surtaria, mas bastou olhar para aqueles malditos olhos verdes que tudo se
acalmou dentro de mim.
E, caramba, ele me fez sentir coisas. Ele me fez sentir tudo! Tudo que
eu sempre sonhei em viver... Para acabar assim? Não, não, não. Não deixo!

Com quem eu vou implicar? Quem vai rosnar para mim? Quem vai ser meu
parceiro de sarcasmo? Quem vai me chamar de Tampinha?!
Continuo ruminando minhas sofrências ao chegar no aeroporto e
enquanto embarcamos no jatinho com destino a Budapeste. Estou tão
atazanada, que nem consigo ficar nervosa na decolagem.
A gente avançou tanto no nosso relacionamento ontem... Nós tivemos
uma conversa real, do tipo que nem eu, nem ele, temos sempre por aí.
Nós temos uma conexão profunda.

O sexo foi digno de romance hot da Sylvia Day.


E O HOMEM É UM MARAVILINDO DA PO... XA.
Eu não quero imaginar minha vida sem ele. Eu quero ele ao meu lado.
É bom que dê um jeito de voltar para mim e...
Espera aí.
- SCHEIBE! - Dou um grito e todos que estão no avião me olham
assustados.
- Pelo menos uma coisa ela aprendeu. - John cutuca Jus e aponta para
mim.

Ao invés de me olhar com repreensão, meu empresário me olha com


um sorriso cúmplice. - Entendeu finalmente?
Fico em pé e ando até a sua poltrona, apontando um dedo na sua cara.
- VOCÊ ARMOU MAIS ESSA, JUSTIN REZZO.

- Meio dramático, eu sei, mas nem depois de passar a noite juntos


vocês tomaram uma providência! Então, precisei interferir de novo. Vocês
são muito lerdos, docinho. Se dependesse só de mim, já tinha me ordenado
pastor pela internet e casado os dois no primeiro dia.
- Ahn. Nós perdemos alguma coisa? - Emma pergunta da sua poltrona
e eu bufo impaciente, cruzando os braços.
- Eu estou fodidamente apaixonada pelo Drake e o Justin acabou de
demiti-lo de propósito, arruinando o meu "Felizes para Sempre".

- Awn. Só ouvi a parte do "apaixonada". - John suspira e fica em pé


para me abraçar como um pai orgulhoso. - Um pouco de distância era tudo
que precisavam para colocar as coisas em perspectiva. A gente só dar valor
quando perde, não é?!
Reviro os olhos e volto para a minha poltrona, os deixando para
contabilizar quem venceu a aposta "Quanto tempo a Roxy vai levar para
admitir que está caidinha pelo Babaca".
Prefiro pensar que não percebi porque nunca tinha me apaixonado
antes, não porque sofro de um sério caso de lerdeza crônica. E não é que

Drake cumpriu sua promessa mesmo? Não me deixou morrer sem me


apaixonar...
Só não contava que me faria ficar caidinha por ele mesmo. Poupou
um belo trabalho, o preguiçoso.

Assim que o avião pousa, eu tento falar com o imbecil pelo telefone,
mas o celular cai direto na caixa postal. Droga! Droga! Droga!

"Precisamos conversar"

Mando pelo WhatsApp, mas a mensagem nem chega para ele. Será
que está no avião voltando para os Estados Unidos? Se for isso, só tem um
coisa que eu posso fazer. Só tem uma decisão digna de Roxanne Reed.

Ir atrás do meu homem.


Isso aí, atirar para depois perguntar.
Espero que eu consiga ir e voltar a tempo do meu show de amanhã.
Ai, minha Santa Madonna! Estou mesmo prestes a fazer um desses grandes
gestos românticos?
É, acho que sim.
Espero, no mínimo, ganhar outra noite igual a de ontem como
agradecimento.
A imigração demora quase uma hora para nos liberar e eu quase tenho

um treco de ansiedade enquanto olho para a tela da nossa conversa,


esperando que um milagre aconteça e Drake me responda.
Nada...
Eita homem para me deixar doida, caramba!

Sem querer mais ninguém se intrometendo nos meus planos (Beijo,


Jus!), vou para o hotel em silêncio, atendo os fãs normalmente, faço o check-
in como a boa menina que sou e subo para o meu quarto. Nenhum terno...
nenhum cheiro de sabonete masculino... não é essa a vida que eu quero mais.
Troco minha roupa rapidamente colocando jeans, moletom, tênis e
escondo o meu cabelo num boné. Pego só o meu passaporte, meu cartão e
algum dinheiro. Destranco a sacada e começo a descer escalando as treliças
que enfeitam uma das paredes laterais e que vai dar direto numa pequena

viela vazia para fora do hotel.


Ao meu lado, só vejo uma parede de tijolos velhos que vão render uns
bons ralados se eu cair. Ainda bem que tenho experiência em fugas. E ainda
bem que gatas sempre caem em pé. Há!
Assim que piso no asfalto e limpo as mãos sujas de limo na minha
calça, ouço uma voz rouca falar atrás de mim. - Não posso te deixar sozinha
por cinco minutos, não é?
Não.
Não pode ser.

Me viro devagar, com medo de descobrir que minha cabeça insana


está me pregando alguma peça...
Só que dessa vez é real.
Drake Hill Schäfer está paradinho aqui na minha frente, com um terno

cinza, a camisa com alguns botões abertos, as mãos nos bolsos e encostado
num esportivo laranja... que eu aposto que só tem os bancos da frente.
- Você só pode estar de brincadeira comigo. - Cruzo os braços, mas
não consigo evitar o sorriso gigante que explode no meu rosto.
ELE ESTÁ AQUI.
ELE VEIO ATRÁS DE MIM!
FOI ELE QUEM FEZ O GRANDE GESTO ROMÂNTICO!
Todas as comédias românticas que a irmã fez ele assistir serviram

mesmo para alguma coisa.


- Tsc, tsc. Bem que algo me dizia que tentaria fugir para encontrar o
Babaca por quem está apaixonada. - Balança a cabeça e finge uma expressão
de repreensão.
- E claro que você tentaria me impedir de cometer uma burrada
dessas. - Vou me aproximando devagar, sentindo nosso campo magnético me
puxar de encontro a ele. - Como chegou aqui tão rápido? E por que, diabos,
não atendeu as minhas ligações?
- No momento em que Jus saiu do quarto, precisei de quinze minutos

para perceber que não poderia aceitar essa história de ficar longe de você.
Então, peguei a passagem que tinha me dado e troquei por uma no primeiro
voo para cá. A vida é bem mais rápida quando não se tem centenas de fãs
para atender pelo caminho. - Dá de ombros, seu sorriso charmoso pendurado

no canto da boca. - E meu celular está sem bateria, porque eu fui sequestrado
por uma certa cantora pop noite passada, que me manteve refém para abusar
do meu corpinho.
- Garota esperta essa. Devia fazer isso mais vezes. - Paro na sua
frente, quase encostando no seu corpo. - Então, veio até aqui só porque já
imaginava que eu tentaria fugir?
- Claro. Aqui missão dada é missão cumprida. - Passa as mãos pela
minha cintura, me puxando de encontro ao seu peito. - E para dizer que

percebi que não estou a fim de ir para lugar nenhum sem você. E que eu
passaria o resto da vida sendo irritado por você. E que eu estou apaixonado
por você.
Meu coração se esquenta tanto que eu preciso fechar os olhos por
alguns segundos. Está acontecendo! Está acontecendo mesmo! - Então, o
Babaca se apaixonou pela Princesa?
- E a Princesa se apaixonou pelo Babaca.
Acho que até quem está no inferno viu o sorriso do Diablo.
- E agora, o que fazemos? - Pergunto.

- Agora contamos para o mundo, esperamos para ver as repercussões,


eu exijo meu emprego de volta e aguentaremos Justin falando "eu avisei".
Mas, por enquanto, você só vai fugir comigo mesmo. - Dá um último apertão
na minha cintura, antes de me soltar e abrir a porta do carro. - No banco da

frente ainda.
- Só para constar, você é meu namorado a partir de agora. - Aviso
antes de entrar.
- Acho que estou meio velho para esse negócio de namorado, Anne. -
Faz uma careta adorável para mim.
- O que quer ser então? - Me sento no banco de couro e ele se abaixa
para continuar com o rosto na mesma altura que o meu. Pensa por alguns
segundos na minha pergunta, antes de se inclinar e dar uma mordida de leve

na minha orelha.
- Eu quero ser o homem da sua vida. - Murmura com a sua voz rouca
sensual, antes de bater a porta e ir para o lado do motorista.
Droga.
Eu acho que amo mesmo esse cara.
Capítulo 30 - O felizes para sempre
Drake

Um mês depois
Roxy suspira no meu colo e eu a aperto mais contra mim. Afundo
meu nariz no seu cabelo e sinto seu cheiro de lavanda que me enlouqueceu

desde o primeiro dia. Uma olhadinha pela janela do jato particular, enquanto
iniciamos a descida em Los Angeles, e vejo o céu azul claro, quase sem
nuvens. Engraçado, faz tempo que não temos um dia nublado. Para ser mais
preciso, desde aquela manhã em Budapeste que chocamos NINGUÉM ao
aparecermos juntos.
Quando eu digo ninguém, digo ninguém mesmo. Nem seus fãs, que
de alguma forma já estavam torcendo para ficarmos juntos, nem a banda,
nem a minha própria mãe que só se dignou a falar algo como "Jus me disse

que ela é boa para você e eu confio em Jus".


De algum jeito que está além da minha compreensão, as coisas entre
nós se alinharam no momento em que decidimos que ficaríamos juntos.
Ainda brigamos, reclamamos e já aconteceram alguns sequestros de camisas
e coturnos de brilhos, mas tudo isso só fez com que as últimas semanas
fossem as melhores da minha vida.
Acho que é isso que o amor faz pelas pessoas... deixa a vida melhor.
Por isso, preciso fazer o que estou prestes a fazer.
- Princesa, eu estava pensando... - Ela abre os olhos, despertando do

seu cochilo como uma gatinha preguiçosa. - Você ainda me deve uma por
aquelas fotos que eu comprei do paparazzo. O famigerado topless das
princesinhas no bar de motoqueiros.
Ela apoia seu queixo no meu peito e me olha desconfiada. - Eu não

vou usar terninhos cinza sem graça, não adianta nem tentar.
Uma risada escapa de mim só de imaginar a cena e eu mordo a ponta
do seu nariz. - Nunca te pediria para abrir mão do seu glitter, Tampinha.
Passa o dedo pela minha gravata dourada, me puxando para roubar
um beijo rápido. - Eu sei que você tem uma paixão secreta por brilhos
escondida em algum lugar por baixo de todos esses músculos, bonitão.
- Claro, claro. Já encomendei meu coturno de strass, inclusive. Ele
deve chegar a qualquer momento agora. - Reviro os olhos. - Enfim, como eu

ia dizendo, você me deve uma e eu estou pronto para cobrar a minha dívida.
- Vai me pedir para ser segurança de alguma princesa do pop pirralha
mimada tampinha? - Dá um sorrisinho esperto e ergue uma sobrancelha para
mim, deixando claro que está tirando uma com a minha cara.
- Com certeza seria uma ideia genial. Tão genial quanto deixar o lobo
cuidando do galinheiro, ou John vigiando uma caixa de bombons.
- HEY! - O John em questão reclama do banco da frente, me lançando
um olhar aborrecido.
- Contra fatos não há argumentos, querido. - Dou uma piscadinha para

ele, antes de continuar. - Agora me deixa falar sério, garota.


- Tá bom, tá bom. Vá em frente. - Faz um gesto como se tivesse
passado um zíper na sua boca e jogado por cima do seu ombro.
Bobinha.

- Como eu ia dizendo, pela TERCEIRA vez, estava pensando no que


deveríamos fazer agora que a turnê acabou.
Roxy se senta de pulo e passa para a poltrona ao lado da minha,
começando a mexer no bolso da sua mochila cor de rosa. - Vou deixar isso
aqui como quem não quer nada, só para o caso de você estar pensando em
terminar comigo. - Abaixa a bandeja do assento e bate seu alicate de unha
nela, fazendo sua expressão maléfica.
Minha Princesa é perfeita.

- Ameaças, só o que eu escuto são ameaças... - Balanço a cabeça e


tento segurar um sorriso.
Perfeita para mim.
- Continue fazendo essas caretas, que eu te faço engolir essas ameaças
goela a baixo, sem nem um gole d'água. - Dá um soquinho de leve no meu
braço.
- DEIXA O HOMEM FALAR LOGO, ROXANNE. - Jus sobe na sua
poltrona para nos encarar. - ESTAMOS TODOS CURIOSOS AQUI.
- Obrigado, Justin. Eu acho... - Viro de frente para ela. - Como agora

não estaremos mais em turnê, não vamos nos ver todos os dias. Então, como
retribuição pelo que fiz por você, eu queroooo... - Faço uma pausa de
suspense e ela começa a me dar tapinhas no ombro por um lado, enquanto Jus
começa a bater do outro.

- FALA LOGO, FALA LOGO, FALA LOGO.


- FICK DICH, TÁ BOM! - Me desvio dos dois e falo tudo de uma
vez. - Roxy, eu quero que a gente more juntos. Na sua casa, na minha casa,
numa cabana, numa barraca, não importa. Só quero que fiquemos juntos.
PRONTO!
Ela para de me bater na hora e me encara em choque, enquanto o resto
do avião solta um sonoro "Awn" e começam a trocar dinheiros por mais
alguma aposta que fizeram às nossas custas.

Quem precisa de fundo de investimentos, quando se tem nós dois à


disposição, não é?!
- Tem certeza disso, Drake? - Ela pergunta baixinho, ainda parecendo
um pouco chocada.
- Certeza absoluta. - Pego suas mãos nas minhas e aperto suavemente.
- Então, o que me diz?
Fica em silêncio alguns segundos, antes de abrir o seu maior sorriso
maléfico, os olhos brilhando de empolgação e de alegria pura e simples. -
Mal posso esperar para morar no mesmo lugar que você, com todos os seus

ternos ao meu alcance. - Me rouba outro selinho, ignora o aviso de apertar os


cintos e volta para o meu colo. - O que acha de comprarmos uma fazenda
juntos?
- Está falando sério? - Agora é minha vez de ficar chocado. Uma

fazenda... como eu sempre quis! Nunca tinha comentado isso com ela, nem
com ninguém.
- Muito sério. Imagina que sonho morar num lugar afastado, quieto, o
oposto dessa vida?! Onde eu pudesse recarregar as minhas energias, sem ter
paparazzi acampados na porta... O que me diz? - Pergunta animada.
Difícil acreditar que eu, logo eu, mereço tudo isso que está
acontecendo. Faço um carinho de leve na sua bochecha e olho bem nos seus
olhos castanhos. - Digo que eu te amo, Princesa.

- Acho bom mesmo, porque eu também te amo para caramba. - Ela


me abraça e morde meu lábio de leve, antes de cravar suas unhas no meu
rosto e me beijar desse seu jeito louco que me deixou aos seus pés.
Exatamente onde eu quero estar pelo resto dos meus dias.
Epílogo
Roxy

Dez anos depois


- Eca! Papai e Mamãe estão se beijando de novo.
Minha pequena Violet, do alto dos seus sete anos, já tem toda a

sutileza de um tanque de guerra. Também, tendo pais como a gente, não tinha
como ser diferente. Me desvencilho dos braços do meu marido gato e sorrio
para ela.
- Não seja por isso. Agora, Papai e Mamãe vão beijar a Vi então. -
Drake a pega no colo e nós dois distribuímos beijos pelas suas bochechas
rosadas, todos jogados no sofá da nossa sala aconchegante.
- Chega! Chega! Eu preciso dizer o que quero de aniversário! - Ela se
contorce pedindo para descer e ajeita o seu vestido rosa, com pequenos

coturnos de glitter combinando.


Quem diria que do nosso ódio à primeira vista sairia uma coisinha tão
lindinha e esperta.
Nossa Princesa...
Um ano depois de finalmente darmos o braço a torcer, nos casamos na
nossa fazenda, numa pequena cerimônia celebrada por Jus, com a presença
apenas da minha banda, das nossas famílias e de alguns amigos mais
próximos. Entre eles a Black Road e a Four Dragons, que fizeram questão de
cantar para nós.

Foi um dia inesquecível...


Achei que seria o momento mais feliz da minha vida, até que dois
anos depois eu dei à luz a Violet Reed Hill Schäfer, a garotinha que consegue
ser uma mistura perfeita minha e de Drake. Seu cabelo é idêntico ao meu,

mas seus olhos são tão verdes quanto os do pai. É apaixonada por artes
marciais, mas não abre mão de um bom glitter.
Sua presença na nossa vida serviu para nos aproximar ainda mais
como casal e eu nem imaginava que isso fosse possível.
Não estou dizendo que é fácil criar uma criança entre turnês mundiais,
jatinhos e tapetes vermelhos, mas nós estamos fazendo nosso melhor e Vi
está levando uma vida relativamente normal. Quer dizer, o máximo de
normal quando se tem pais como eu e meu Babaca.

- Mãe, presta atenção! - Ela reclama, cruzando os pequenos bracinhos


e fazendo um biquinho de repreensão.
- Desculpa, Princesa. Pode continuar. - Mas é uma figura mesmo.
- Eu preciso, preciso mesmo, de uma guitarra para mim e de uma
bateria para o Connor. Nós vamos começar uma banda. A Tia Grace já
concordou em me ensinar!
Olho para o meu marido e vejo que, como eu, está tentando manter a
expressão séria e não rir na frente da nossa filha quando, obviamente, o
assunto é tão sério para ela. Só espero que não vire uma cantora de metal, ou

Drake nunca vai me dar sossego.


- O Tio John e o Tio Jus já sabem que Connor quer uma bateria, meu
bem? - Ele pergunta e eu consigo ver que seu cérebro está se deliciando com
a perspectiva de torturar seus melhores amigos desse novo jeito.

- Eu não sei, papai. - Faz uma adorável careta confusa.


- Ótimo. Não precisa contar, nós vamos fazer uma surpresa. - Reviro
os olhos. Quem é a criança aqui agora?!
- Isso quer dizer que eu vou ganhar então?! - Os olhinhos verdes
brilham de animação.
- Vai sim, mas só se se comportar direitinho no primeiro dia na escola
nova. - Tento fazer minha expressão de mãe responsável.
- Tudo bem. - Seus pequenos ombrinhos caem. - Vão ter meninos lá?

Não gosto de meninos, eles são bobos.


- Promete para o papai que vai continuar pensando assim até fazer 40
anos?
- Drake! - Dou um soco no seu braço, como fiz tantas vezes ao longo
dos anos. Se não estou agarrando seu corpo perfeito, que só fica melhor com
o tempo, estou socando. O que se pode fazer? - Terão meninos lá sim, meu
bem, mas eles podem ser iguais ao Connor. Você gosta do Connor, não é?
- Eu adoro o Connor. - Fala e abre um grande sorriso. Algo me diz
que minha filha e o filho do meu empresário ainda vão nos deixar de cabelos

brancos daqui alguns anos... - Acho que pode ser legal então.
- Vai ser a escola mais legal de todos, papai promete. Agora, por que
não coloca o seu pijama de brilhos da Barbie e daqui a pouco nós vamos te
contar uma história?

- Oba! Pode ser a história da Princesa e do Babaca de novo? - Pede


batendo palminhas.
- Mas você ouviu essa ontem. - Tento negociar. - Que tal " A Bela
Adormecida"?
- Eca, não! Ela só dorme o tempo todo. - Faz uma cara de nojinho. -
Quero a da Princesa e do Babaca.
- Muito bem. Se troque então e nós já vamos te encontrar. - Seus
pezinhos correm pelo corredor e antes que eu entenda o que está

acontecendo, meu marido me joga de costas no sofá e começa a distribuir


mordidas pelo meu corpo, me fazendo suspirar e gemer ao mesmo tempo,
despertando as mesmas sensações de dez anos atrás.
- Anne... - Ele murmura no meu ouvido com sua voz rouca e meu
coração se aquece.
Ahh...
Eu amo esse cara.
Fim
Agradecimentos
Obrigada a todos que acompanharam essa história pelo Wattpad e me

aguentaram terminando os capítulos sempre nas melhores partes. (Desculpa


por isso!)
Obrigada aos meus leitores que estão ao meu lado todos os dias, que me
enchem de carinho pelas Redes Sociais e que me permitem viver fazendo o

que eu amo. Adoro nossos papos, adoro saber mais sobre vocês, adoro nossas
trocas de livros e adoro cada um, mesmo quando brigam comigo!
Obrigada Ermelinda por ter encontrado uma brechinha nos seus dias
para ler e revisar cada um desses capítulos antes deles irem ao ar. Sei que não
foi fácil e serei eternamente grata pelo seu apoio ao meu trabalho. Ah! E
pelos áudios empolgados também!
Obrigada Alê por ser a maior apoiadora da minha carreira, a maior
amiga que eu poderia ter, a maior companheira de rolês e aquela que eu

nunca vou cansar de dizer que amo com todo o meu coração.
E obrigada a você! Por ter chegado até aqui e por ter dado uma chance
ao meu livro. Espero que tenha passado bons momentos ao lado de Drake e
Roxy. Por favor, venha me contar o que achou. Vou adorar saber! Você me
encontra aqui:
Facebook: https://www.facebook.com/autoralcalmeida
Instagram: https://www.instagram.com/autoralcalmeida
E-mail: contodefadasrocknroll@gmail.com

Com carinho,
L.
Conheça meus outros livros!

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