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A igreja primitiva e o livre-arbítrio.

(A patrística e o livre-arbítrio)

Por muito tempo venho ouvindo que o determinismo, doutrina


calvinista da predestinação (que se contrapõe a doutrina do livre-
arbítrio), isto é, por eleição incondicional dos seres humanos, uns
para o bem e outros para o mal, sempre foi a doutrina
predominante na igreja desde o tempo dos apóstolos. Ouvi sempre
um “apelo à autoridade” de Lutero e Calvino (século XVI) e de
Agostinho de Hipona (século IV), que para nós é o “pai da
doutrina da predestinação”. Foi com base nos escritos deste que
Calvino formulou suas teses.

Certa feita tentaram “calvinizar-me”, fazer-me um calvinista, e


para tanto nos recomendaram assistir a um vídeo sobre a história
do livre-arbítrio (abaixo link), afirmando que a vontade livre,
historicamente, sempre foi combatido pelos líderes da igreja.

Este vídeo, do professor Augustus Nicodemus, traz muitas


informações históricas relevantes, mas comete, induz a alguns
erros, faltam detalhes, não ditos pelo professor no vídeo em
questão, que podem levar os ouvintes a deduções erradas, sobre a
história da igreja, e o sobre o(s) conceito(s) de livre-arbítrio.

O que penso ser necessário, a fim esclarecer bem a questão sobre


o livre-arbítrio na história da igreja, é fazermos as devidas
correções, incrementos ao que disse o ilustre professor. Vamos
pontuar dois equívocos que observamos na exposição do
palestrante, e esclareço que assim faço por já de ter sido
“evangelizado – para o calvinismo”, ou tentaram nos convencer
com base neste que o livre-arbítrio é uma heresia histórica,
sempre combatida. Recentemente, conversando com um amigo,
ele me informou que tornou-se um calvinista após assistir a este
vídeo.

Será que o calvinismo sempre foi a (sã) doutrina da igreja(como


sugerido no vídeo)? Será que a “eleição incondicional” ou a
“expiação limitada (doutrina que Cristo morreu apenas por
alguns, de antemão escolhidos)” foi pregada pelos pais
primitivos? E o que considero mais importante – Será que foi
Pelágio quem inventou o livre-arbítrio? Será?

Vamos aos 2 equívocos, que pontuaremos, do vídeo:

1. Os Patrísticos (pais da igreja, pós-apóstolos, até o século IV)


defenderam ou falaram sobre o livre-arbítrio.
2. Pelágio x Jacobus Armius.

1. Os Patrísticos (pais da igreja, pós-apóstolos, século I até


o século IV) defenderam ou falaram sobre o livre-
arbítrio?

Resposta: Quase que de forma unânime – pelo menos este


“curioso”, em suas muitas pesquisas, nunca encontrou nada que
possa sugerir o contrário – (a esmagadora maioria) DOS PAIS
PRIMITIVOS falaram sobre ou defenderam o livre-arbítrio, como
seguem textos abaixo. Isto põe por terra o argumento falacioso de
que (sobre o livre-arbítrio) “a história começa por Pelágio”.
Preparem-se para as descobertas:

Os pais primitivos e o livre arbítrio

JUSTINO MÁRTIR (100 à 160/165 d. C)

“Do que dissemos anteriormente, ninguém deve concluir que a


consequência do que afirmamos que se sucede ocorre por
necessidade do destino, pelo fato de que dizemos ser de antemão
conhecidos os acontecimentos. Para isso, vamos esclarecer
também esta dificuldade. Nós aprendemos com os profetas e
afirmamos que isto é a verdade: que os castigos e tormentos,
igualmente as boas recompensas, dão-se a cada um conforme as
suas obras, pois se não fosse assim e se ocorresse pelo destino,
não existiria em absoluto o livre-arbítrio. Com efeito, se está
determinado que este seja bom e aquele mau, nem aquele merece
louvor, nem este vitupério. E se o gênero humano não tem poder
para fugir por livre determinação daquilo que é vergonhoso e
optar pelo belo, é irresponsável por qualquer ação que faça.
Porém, que o homem é virtuoso e peca por livre escolha, o
demonstramos pelo seguinte argumento: vemos que o próprio
sujeito passa de um extremo a outro. Pois bem: se fosse
determinado ser mau ou bom, não seria capaz de fazer coisas
contrárias nem mudaria [seu comportamento] com tanta
frequência. Na verdade, não se poderia dizer que alguns são bons
e outros maus a partir do momento em que afirmamos que o
destino é a causa de bons e maus, e que faz coisas contrárias a si
mesmo; ou deve se ter por verdade aquilo que já anteriormente
insinuamos, a saber: que virtude e maldade são meras palavras e
que apenas por opinião [pessoal] se classifica algo como bom ou
mau – o que, como demonstra a verdadeira razão, é o cúmulo da
impiedade e da iniquidade. O que afirmamos ser destino
iniludível é que a quem escolher o bem, espera-lhes digna
recompensa; e a quem escolher o contrário, espera-lhes
igualmente digno castigo. Porque Deus não fez o homem da
mesma forma que as outras criaturas, por exemplo, árvores e
quadrúpedes, que nada podem fazer por livre determinação, pois
nesse caso não seria digno de recompensa ou louvor, nem mesmo
por ter escolhido o bem, mas já teria nascido bom; nem, por ter
sido mau, seria castigado justamente, pois não agiu livremente,
mas por não poder ter sido outra coisa do que foi” (1ª Apologia
43,1-8).

Justino Mártir (160 d.C): A fim de que alguns não presumam, a


partir do que temos dito, que tudo acontece por uma necessidade
fatal, pois é anunciado como conhecido de antemão, isso nós
também explicamos. Nós aprendemos dos profetas e sustentamos
ser a verdade, que as punições, castigos e boas recompensas são
concedidas de acordo com o mérito das ações de cada homem.
Agora, se isso não é desta forma, mas todas as coisas acontecem
por destino, então, nada está em nosso próprio poder. Porque, se
está predeterminado que este homem será bom e esse outro
homem será mau, nem é o primeiro digno de mérito nem o último
culpado. E novamente, a menos que a raça humana tenha o poder
de evitar o mal e escolher o bem por livre escolha, eles não são
responsáveis por suas ações. (A Dicitionary of Early Christian
Beliefs, editado por David W. Bercot, pg 285, publicado por
Hendrickson, 1998) (tradução Walson Sales)
“Deus, desejando que tanto homens quanto anjos seguissem a
sua vontade, resolveu criá-los livres para fazer a justiça. Mas se
a Palavra de Deus prediz que certos anjos e certos homens serão
certamente castigados, ela fez isso porque sabia previamente que
eles seriam irremediavelmente [ímpios], mas não por terem sido
criados assim. (DJ, 1.142).” (citado por Norman Geisler, T. S.
v.2, pg 77)

IRINEU (130 à 200 d. C)

“Esta frase: ‘Quantas vezes quis acolher os teus filhos, porém tu


não quiseste!’ (Mateus 23,37), bem descobriu a antiga lei da
liberdade humana, pois Deus fez o homem livre, o qual, assim
como desde o princípio teve alma, também gozou de liberdade, a
fim de que livremente pudesse acolher a Palavra de Deus, sem
que Este o forçasse. Deus, com efeito, jamais se impõe à força,
pois n’Ele sempre está presente o bom conselho. Por isso,
concede o bom conselho a todos. Tanto aos seres humanos como
aos anjos outorgou o poder de escolher - pois também os anjos
usam sua razão -, a fim de que àqueles que lhe obedecem possam
conservar para sempre este bem como um dom de Deus que eles
guardam. Ao contrário, não se encontrará este bem naqueles que
O desobedecem e por isso receberão o justo castigo, porque Deus
certamente lhes ofereceu benignamente este bem, mas eles não se
preocuparam em conservá-lo, nem o acharam valioso, mas
desprezaram a bondade suprema. Assim, portanto, ao abandonar
este bem e até certo ponto rejeitá-lo, como razão serão réus do
justo juízo de Deus, do qual o Apóstolo Paulo dá testemunho em
sua Carta aos Romanos: ‘Por acaso desprezas as riquezas de sua
bondade, paciência e generosidade, ignorando que a bondade de
Deus te impulsiona a arrepender-te? Pela dureza e impenitência
do teu coração, tu mesmo acumulas a ira para o Dia da Cólera,
quando se revelará o justo juízo de Deus’ (Romanos 2,4-5). Ao
contrário, diz: ‘Glória e honra para quem opera o bem’
(Romanos 2,10). Deus, portanto, nos deu o bem, do qual dá
testemunho o Apóstolo na mencionada Carta, e aqueles que agem
segundo este dom receberão honra e glória, porque fizeram o
bem quando estava em seu arbítrio o não fazê-lo; ao contrário,
aqueles que não agirem bem serão réus do justo juízo de Deus,
porque não agiram bem estando em seu poder fazê-lo. Com
efeito, se alguns seres humanos fossem maus por natureza e
outros bons por natureza, nem estes seriam dignos de louvor por
serem bons, nem aqueles condenáveis, porque assim teriam sido
criados. Porém, como todos são da mesma natureza, capazes de
conservar e fazer o bem, e também capazes de perdê-lo e não
fazê-lo, com justiça os seres sensatos – quanto mais Deus! –
louvam os segundos e dão testemunho de que decidiram de
maneira justa e perseveraram no bem; ao contrário, reprovam os
primeiros e os condenam retamente por terem rejeitado o bem e a
justiça. Por esse motivo, os profetas exortavam a todos a agir
com justiça e a fazer o bem, como muitas vezes explicamos,
porque este modo de nos comportar está em nossas mãos; porém,
tendo tantas vezes caído no esquecimento por nossa grande
negligência, nos fazia falta um bom conselho. Por isso o bom
Deus nos aconselhava o bem por meio dos profetas” (Contra as
Heresias 4,37,1-2) (textos dos pais da igreja primitiva podem ser
encontrados no sites indicados ao final)

”Se não dependesse de nós o fazer e o não fazer, por qual motivo
o Apóstolo, e bem antes dele o Senhor, nos aconselharia a fazer
coisas e a nos abster de outras? Sendo, porém, o homem livre na
sua vontade, desde o princípio, e livre é Deus, à semelhança do
qual foi feito, foi-lhe dado, desde sempre, o conselho de se ater ao
bem, o que se realiza pela obediência a Deus. (Contra Heresias,
IV, 37. 1.4) (também citado por Norman Geisler em “eleitos, mas
livres”, pg 171)

Clemente de Alexandria ( 150-c. 215 d. C.)

“Nos que ouvimos pelas Sagradas Escrituras que a escolha


autodeterminada e a recusa foram dadas pelo Senhor aos
homens, descansamos no critério infalível da fé, manifestando
um espírito desejoso, já que escolhemos a vida e cremos em Deus
por intermédio da sua voz. (S, H2.4)” (citado na Teologia
Sistemática, Norman Geisler, v 2, pg 78)

“Não somente o crente, mas até mesmo o descrente, é julgado


mais retamente. Pois, desde que Deus soube em virtude de sua
presciência que essa pessoa não acreditaria, Ele, entretanto, a
fim de que ele possa receber a sua própria perfeição, deu-lhe a
filosofia antes da fé.” (A Dicitionary of Early Christian Beliefs,
editado por David W. Bercot, pg 284, publicado por
Hendrickson, 1998)

“A soberania e o livre-arbítrio são compatíveis, pois muitas


coisas na vida surgem no exercício da razão humana, tendo
recebido a faísca incandescente de Deus. [...] Agora, todas estas
coisas têm verdadeiramente origem e existência por causa da
providência divina — contudo, não sem a cooperação humana
também (5, 6.17, em ibid.).” (Citado em Teologia Sistemática
Norman Geisler, V 1, pg 1024).

Orígenes ( 185 a 254 d. C.)

“Está também definido na pregação da Igreja que toda alma


racional possui vontade e livre-arbítrio, e que há também para
ela uma luta a ser travada contra o demônio e seus anjos e forças
adversas, já que eles trabalham para onerá-la de pecados,
enquanto que nós, se vivermos retamente e com conselho,
devemo-nos esforçar em nos despojarmos deste jugo. Deve-se
entender, por conseguinte, que ninguém de nós

está submetido à necessidade, de tal modo que, ainda que não


queiramos, sejamos a qualquer custo obrigados a fazer coisas
boas ou más.” (De Principiis, cap 5) (Obs: seria uma citação, em
dias atuais, exatamente e diametralmente contrária ao que prega
o calvinismo)

“Isto também é claramente definido no ensino da igreja de que


cada alma racional é dotada de livre-arbítrio e volição.” (De
Principiis, prefácio) Há, de fato, inúmeras passagens nas
Escrituras que estabelecem com extrema clareza a existência da
liberdade de vontade.” (De Principiis, 3.1) (citado por Geisler,
em “Eleitos, mas livres, pg 173-174)”

Jerônimo ( 347-420 d. C.)

Este é um dos pais, junto com Justino Mártir, são os que mais
apresentam semelhanças, em seus escritos, com as obras de
Jacob Arminius (http://www.arminianismo.com/index.php/o-que-
e-o-arminianismo) e os remonstrantes
(http://www.arminianismo.com/index.php/o-que-e-o-
arminianismo)(seguidores da teologia de Armínio), expressões
como “precisa de ajuda”, ou “carece de auxílio (da graça) de
Deus”, lembra e muito o que 1.300 anos depois repetiu Jacob
Arminius.

Vejamos:

“Em vão me deturpas e tentas convençer os ignorantes que eu


condeno o livre-arbítrio. Que aquele que condena, seja por si
mesmo condenado, pois fomos criados com o dom do livre-
arbítrio [...] E verdade que a liberdade da vontade traz consigo a
liberdade de decisão. Contudo o homem não age imediatamente a
partir do seu livre-arbítrio, mas precisa da ajuda de Deus, que e
o único que não precisa ser ajudado. (LSJ, II.VI. 1.33.10) (citado
em Teologia Sistemática, Geisler, v2, pg 79)

“Quando nós estamos preocupados com a Graça e misericórdia,


o livre-arbítrio é parte anulada; em parte, eu digo, porque tanto
depende dele, que queremos e desejamos, e damos consentimento
ao curso que escolhemos. Mas depende de Deus se temos o poder
em sua força e com sua ajuda para fazer o que desejamos, e para
o nosso trabalho e esforço darem resultado.” (Contra
Pelagianos, Livro III) (Eleitos, mas livres, pg 76)

Poderíamos citar muitos outros, Novaciano, Teófilo, Tarcianio,


Tertuliano, Metódio, Cirilo de Jerusalém…
Mas gostaríamos de comparar o que lemos, do pais primitivos,
com algumas palavras de Calvino e de Armínio, para que você
leitor possa verificar qual teólogo, em suas teses teológicas, se
aproximou mais do que pregaram os pais primitivos da igreja. Os
que crêem na predestinação ou os que pregam o livre-arbítrio?

Calvino

“Chamamos predestinação ao eterno decreto de Deus pelo qual


ele determinou consigo mesmo aquilo que ele quis que ocorresse
a cada ser humano. A vida eterna é preordenada para alguns e a
perdição eterna para outros, falando deles como predestinados
para a vida ou para a morte”. (Institutas, volume III, pg 388)

(para os predestinados a perdição) - “àqueles que Deus despreza


ele reprova, e faz isso não por outra razão senão porque ele quer
excluí-los da herança que Deus predestinou aos que escolheu por
seus filhos. Qual é a causa do decreto da reprovação de Deus? É
o soberano e bom prazer de Deus. Nenhuma outra causa pode ser
aduzida senão à sua soberana vontade. Quando, portanto,
alguém perguntar por que Deus fez assim, devemos responder:
porque ele quis.” (citado em KLOOSTER, Fred H. A doutrina da
predestinação em Calvino. p. 38).

Até Calvino reconhece que, em defesa do livre-arbítrio, os


patrísticos, assim são chamados os líderes, podem ser citados:

“Sei que eles podem citar a Orígenes e a Jerônimo como


partidários de sua exposição. Eu poderia, de minha parte, opor-
lhes também Agostinho. O que, porém, esses patrísticos tenham
opinado, em nada nos é relevante, se é evidente o que Paulo quis
dizer. Aí ele ensina que a salvação foi preparada exclusivamente
para aqueles a quem o Senhor julga dignos de sua misericórdia;
ruína e desolação subsistem a quantos ele não escolheu. Sob o
exemplo de faraó, ele mostrara a sorte dos réprobos [Rm 9.17];”
(intitutas, II, pg 101)
Por óbvio, que as declarações de Jean Calvino, sobre o assunto
em questão, em nada lembram ou se parecem com o que
pregaram os primeiros líderes da igreja, pós era apostólica.

Outros Calvinistas, como Alister E. McGrath, reconhecem o fato


de que os líderes da igreja primitiva pregaram o livre-arbítrio.
Veja site:
http://www.arminianismo.com/index.php/categorias/diversos/artig
os/89-v-paul-marston-e-roger-t-forster/1197-a-igreja-primitiva-e-
o-livre-arbitrio

O que um calvinista atual pode fazer é dizer algo como Calvino


“em nada nos é relevante”, contudo consideramos relevante
saber os que aqueles que ouviram as pregações dos Apóstolos (e
dos posteriores primeiros discípulos apostólicos) sobre estas
doutrinas. Criam na predestinação incondicional ou no livre-
arbítrio? Como vimos, criam (todos, ou no mínimo quase todos)
no livre-arbítrio.

Um determinista, pesquisando muito encontrará textos


defendendo a doutrina da corrupção da natureza humana,
fragmentos que falam de “Eleição”, “Eleitos”, “escolhidos”, em
alguns textos de Hilário de Poitiers[315-367], Gregorio
Naziazeno[329-389], Cirilo de Jerusalém, Ambrósio de
Milão[340-397], mas nenhum deles defendendo ou apoiando a
predestinação calvinista. Por outro lado, não é necessário
pesquisar muito para encontrarmos textos dos quatro primeiros
séculos da era cristã, e em toda a história da igreja, em defesa do
livre-arbítrio.

Vejamos agora o que diz Jacob Armínio, vez que no vídeo foi
apontado como aquele que reviveu as doutrinas do herege (assim
foi considerado) Pelágio. (compare com o que diz Justino e
Jerônimo, será interessante)

(O homem e o livre-arbítrio, carecem da graça, da ajuda de Deus)

“Em seu estado caído e pecaminoso, o homem não é capaz, de e


por si mesmo, pensar, desejar, ou fazer aquilo que é realmente
bom; mas é necessário que ele seja regenerado e renovado em
seu intelecto, afeições ou vontade, e em todos os seus poderes,
por Deus em Cristo através do Espírito Santo, para que ele possa
ser capacitado corretamente a entender, avaliar, considerar,
desejar, e executar o que quer que seja verdadeiramente bom.
Quando ele é feito participante desta regeneração ou renovação,
eu considero que, visto que ele está liberto do pecado, ele é capaz
de pensar, desejar e fazer aquilo que é bom, todavia não sem a
ajuda contínua da Graça Divina.”

“Com referência à Graça Divina, creio, (1.) É uma afeição


imerecida pela qual Deus é amavelmente afetado em direção a
um pecador miserável, e de acordo com a qual ele, em primeiro
lugar, doa seu Filho, “para que todo aquele que nele crê tenha a
vida eterna,” e, depois, ele o justifica em Cristo Jesus e por sua
causa, e o admite no direito de filhos, para salvação. (2.) É uma
infusão (tanto no entendimento humano quanto na vontade e
afeições,) de todos aqueles dons do Espírito Santo que pertencem
à regeneração e renovação do homem – tais como a fé, a
esperança, a caridade, etc.; pois, sem estes dons graciosos, o
homem não é capaz de pensar, desejar, ou fazer qualquer coisa
que seja boa. (3.) É aquela perpétua assistência e contínua ajuda
do Espírito Santo, de acordo com a qual Ele age sobre o homem
que já foi renovado e o excita ao bem, infundindo-lhe
pensamentos salutares, inspirando-lhe com bons desejos, para
que ele possa dessa forma verdadeiramente desejar tudo que seja
bom; e de acordo com a qual Deus pode então desejar trabalhar
junto com o homem, para que o homem possa executar o que ele
deseja.”

“Desta maneira, eu atribuo à graça o começo, a continuidade e


a consumação de todo bem, e a tal ponto eu estendo sua
influência, que um homem, embora regenerado, de forma
nenhuma pode conceber, desejar, nem fazer qualquer bem, nem
resistir a qualquer tentação do mal, sem esta graça preveniente e
excitante, seguinte e cooperante. Desta declaração claramente
parecerá que de maneira nenhuma eu faço injustiça à graça,
atribuindo, como é dito de mim, demais ao livre-arbítrio do
homem. Pois toda a controvérsia se reduz à solução desta
questão, “a graça de Deus é uma certa força irresistível”? Isto é,
a controvérsia não diz respeito àquelas ações ou operações que
possam ser atribuídas à graça, (pois eu reconheço e ensino
muitas destas ações ou operações quanto qualquer um,) mas ela
diz respeito unicamente ao modo de operação, se ela é irresistível
ou não. A respeito da qual, creio, de acordo com as escrituras,
que muitas pessoas resistem ao Espírito Santo e rejeitam a graça
que é oferecida.” (Extraído de As Obras de James Arminius Vol.
I)

“Quanto graça e livre arbítrio, isto é o que eu ensino, segundo as


Escrituras e o consentimento ortodoxo: o livre-arbítrio é incapaz
de iniciar ou aperfeiçoar qualquer verdade e o bem espiritual,
sem graça. Que eu não possa dizer, como Pelágio, para a prática
de ilusão em relação à palavra “graça”, eu quero dizer com isso
que é a graça de Cristo e que pertence à regeneração. Afirmo,
portanto, que essa graça é simplesmente e absolutamente
necessária para a iluminação da mente, a ordem de vencimento
das afeições, e a inclinação da vontade para o que é bom. É esta
a graça que opera sobre a mente, os afetos e da vontade, o que
infunde bons pensamentos na mente, inspira bons desejos em
ações, e dobra a vontade de continuar em execução pensamentos
bons e bons desejos. Esta graça precede, acompanha e segue;
excita, assistências, opera que iremos, e coopera para não irmos
em vão. Ele evita tentações, assistências e subsídios socorrer no
meio das tentações, sustenta o homem contra a carne, o mundo e
Satanás, (…). Ela levanta-se novamente aqueles que foram
conquistados e caíram(…). Esta graça começa a salvação,
promove e aperfeiçoa e consuma. Confesso que a mente de um
homem natural e carnal é obscura e escura, que as suas afeições
são corruptas e desordenado, que sua vontade é teimosa e
desobediente, e que o próprio homem está morto em pecados.”
(Obras de James Arminius, volume II)
É muito claro que Armínio era contrário as idéias de Pelágio e dos
pelagianos, assim como Jerônimo, falou do livre-arbítrio e ao
mesmo tempo combateu os pelagianos. Assim como fizera
Agostinho, em seu livro “O Livre-arbítrio”.

(mas) O que fez então, no século IV, Pelágio?

Pelágio, ao contrário dos pais primitivos que pregavam o livre-


arbítrio juntamente com a doutrina da corrupção da natureza
humana, doutrina que posteriormente foi chamada pelos
reformadores de “depravação total”, pregou uma doutrina do
“homem puro”, que o pecado original, de Adão, afetou apenas
ele. Que “o homem nasce puro”, e “pode permanecer puro, se
quiser, independente do auxílio de graça”. James Arminius, e os
pais da igreja nunca disseram isso.

O que Pelágio fez não foi apenas modificar a soteriologia


(doutrina da salvação), mas toda cosmovisão cristã e antropologia
humana, dizendo que todo homem nasce puro. O que é um
tremendo equívoco, mas não é propósito deste artigo demonstrar
os erros de pelágio, o vídeo do professor já fez isso bem.

O que nos importa, é separar as idéias de Pelágio dos pais


primitivos e de Jacob Armínio. Pelágio trouxe uma inovação
antropológica, e não é o pai do livre-arbítrio, como por muitos é
sugerido. O que ele ensinou foi outra coisa, infelizmente, também
nomeada de “livre-arbítrio”, mas totalmente diferente do que os
pais primitivos ensinaram.

Quando alguém falar novamente sobre o livre-arbítrio, você já


sabe que esta história (defendida pelos patrísticos) começa muito
antes de Pelágio, e sempre foi predominante na igreja, como ainda
é hoje, até o século XVI. Somente no período da reforma, e
séculos posteriores, as doutrinas calvinistas ganharam destaques
de doutrinas da igreja “reformada”, e nem todos concordavam
com ela (Ex: Anabatistas, remonstrantes), esta doutrina nunca foi
unânime, nunca ficou sem oposição de homens notáveis, como
Menno Simons, Baltasar Hubmaier (anbatistas), Armínio, Simon
Epicopus, Hugo Grotios (remonstrantes), John Wesley, John
Fletcher (metodistas)… incontáveis nomes.

O que nos importava neste artigo era demonstrar duas coisas.

1. O livre-arbítrio foi a doutrina pregada pelos pais da igreja, e


não nasceu com Pelágio;
2. James Arminius não pregou ou reviveu as doutrinas de
Pelágio, pelo contrário, as combateu, revivendo as doutrinas
de igreja primitiva.

Espero que tenha ficado claro para todos.

“Se, pois, o filho vos libertar, verdadeiramente, sereis livres.” Jo


8.36

Um forte abraço. E que a Graça e Paz de nosso Senhor Jesus


Cristo seja convosco.

Sites (ou artigos) indicados para consultas dos textos citados ou


informações históricas adicionais. Obs: os sites católicos são os
que possuem mais documentos dos pais primitivos, a igreja
católica é que detém os documentos.

http://www.portalvalegospel.com/2012/02/os-pais-da-igreja-
crista-apostolicos.html

http://www.arminianos.com/o-livre-arbitrio-e-a-ignorancia-de-
nicodemus/

http://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/
estudos-patristicos/571-a-qsola-fidesq-a-igreja-primitiva-e-os-
pais-da-igreja

http://sumateologica.wordpress.com/download/

Autor: Flavyo Henrique

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