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Escolas de Perdão e Reconciliação/ Fundamentos de Justiça Restaurativa

Oficina 3- A Raiva e o rancor


Objetivo: Ampliar a consciência sobre as manifestações da raiva.
1. Ler o texto – A raiva e o rancor de Robin Casarjian.
2. Observar os falsos benefícios da raiva que têm mais a ver com você e tome nota do
que descobrir.

A raiva e o rancor
Robin Casarjian - O livro do Perdão. Rio de Janeiro: Rocco, 1994
O motivo mais óbvio para perdoar é nos libertarmos dos efeitos debilitantes da raiva e do
rancor crônicos. Ao que parece, essas emoções são as que mais convertem o perdão em um
desafio, que pode ser uma grata possibilidade para quem deseja uma paz maior.
A raiva e o rancor são emoções muito fortes, que desgastam nossa energia de várias formas.
Ao retirar as capas protetoras, provavelmente você descobrirá que a raiva, na realidade, é um
sentimento superficial. Não porque seja trivial ou falsa, mas porque existem muitos outros
sentimentos por debaixo dela. Quando nos perdemos na raiva, ficamos surdos aos nossos
sentimentos mais profundos. Aprendemos a escutar somente aqueles que gritam mais alto.
A raiva é uma intensa reação emocional temporal de alguém que se sente ameaçado de
alguma forma. Quando surge, a raiva pode se expressar aberta e diretamente ou se ocultar
dentro da pessoa, de um modo calado e persistente, em forma de um ressentimento crônico,
de uma sensação constante de ofensa ou de má vontade, que continua mesmo depois de
passada a situação que a provocou. O ressentimento foi comparado ao ato de se agarrar uma
brasa acesa com a intenção de passá-la a outro. A palavra ressentimento vem de ressentir, isto
é, voltar a sentir intensamente. Quando estamos ressentidos, sentimos a dor do passado com
intensidade e durante muito tempo, afetando nosso bem-estar físico e emocional.
Os falsos benefícios da raiva
Para muitos de nós, deixar a raiva e o ressentimento irem embora pressupõe um grande risco,
como se viver com eles nos trouxesse algum benefício. A raiva e o ressentimento são muito
poderosos até o momento em que tomamos consciência deles e descobrimos formas mais
saudáveis de reagir.
A. Você fica com raiva porque isso lhe dá a sensação de ter mais poder e domínio?
Algumas pessoas acreditam que ficar com raiva e agarrar-se ao rancor é sinal de poder,
energia, entrega e amor próprio. Na realidade, a raiva e o rancor costumam encobrir
sentimentos de impotência, desilusão, insegurança, aflição ou medo, e são muito usados para
substituir sentimentos de verdadeiro poder pessoal.
Se a pessoa foi maltratada na infância, por exemplo, e teve de negar e reprimir a raiva para
sobreviver, pôr para fora esses sentimentos pode ser de grande ajuda. Resgatar a raiva é uma
forma de aprender a se defender e recuperar a criança interior ferida, curando-a de males
passados. Entretanto, é preciso ter coragem de reviver a raiva porque é aí que reside a
possibilidade de cura.
B. Você usa a raiva de modo impulsivo e como combustível para fazer as coisas
acontecerem?
Algumas pessoas acreditam que a raiva impulsiona mudanças e isso tem seu fundo de
verdade. No entanto, não deveria ser a única nem a principal alavanca. Quando estamos em
contato com nossa verdadeira natureza, animados pela empatia e pelo sentido de justiça, com
frequência nos sentimos motivados a atuar com paixão e convicção, sem raiva. Quando a
raiva é o propulsor principal, costuma criar resistência à própria mudança que se tenta
conseguir, causando medo nas pessoas que queremos convencer e criando oposição no lugar
de união.
C. Você usa a raiva para controlar os outros?
Você já percebeu que quando alguém se enfurece as pessoas próximas sentem-se culpadas e
assustadas e acabam deixando-se manipular? Quando usamos a raiva como meio de
manipulação, podemos até conseguir dominar os outros, mas acabamos provocando raiva e
ressentimento. Se em um primeiro momento temos a impressão de ganho, logo percebemos o
alto preço que temos de pagar por isso.
D .Você usa a raiva para evitar se comunicar?
Quando temos medo de expressar nossos próprios sentimentos ou tememos as possíveis
consequências de dizer a verdade, usamos a raiva como defesa, evitando a comunicação.
Nesse caso, a raiva parece ser mais segura do que a intimidade e a comunicação autênticas.
E .Você usa a raiva para se sentir a salvo? Acha que serve de proteção?
A raiva costuma manter as pessoas afastadas. Como não podem se aproximar muito, não nos
oferecem risco e, portanto, não temos motivos para nos sentirmos vulneráveis. Uma criança
ou um jovem até pode usar a raiva para se proteger, para compensar a pouca idade e o
tamanho. Já os adultos têm outros recursos e podem aprender a estabelecer limites e a reagir
de formas mais pacíficas.
F. Você usa a raiva como uma forma de impor sua razão?
Perdoar não significa que você deve reconhecer que a outra pessoa tem razão e que você está
errado. Outra forma de enxergar o mundo é perguntar a si mesmo, por exemplo, se deseja ter
razão ou ser feliz. Nem sempre é possível conseguir as duas coisas.
G .Você se prende à raiva para fazer com que os outros se sintam culpados?
Se você se aborrece com alguém, talvez deseje castigá-lo. Uma maneira de conseguir isso é
reforçar o sentimento de culpa do outro. O principal problema é que, ao fazê-lo, de modo
simultâneo, ainda que inconsciente, reforçamos nosso próprio sentimento de culpa, o que,
inevitavelmente, nos entristece e diminui nossa autoestima.
H. Você usa a raiva para evitar os sentimentos que esconde de si mesmo?
Às vezes, é muito mais cômodo sentir raiva do que o temor e a tristeza que se ocultam sob a
raiva. Uma das razões que tornam o perdão tão difícil é que, para perdoar, temos de pôr tudo
às claras e aceitar os nossos sentimentos. Isso pode ser doloroso para alguém que aprendeu a
conviver com a negação e a repressão. Contudo, é reconfortante lembrar que do outro lado da
dor está o alívio e maior paz mental.
I .Você usa a raiva para segurar uma relação?
Enquanto você se apoia na raiva, mantém a relação com a pessoa com a qual você se irritou.
Muitas vezes, as pessoas se divorciam para afastar-se de seu cônjuge. Mas, enquanto
guardarem o rancor, permanecerão ligados a essa pessoa. Muitos jovens saem de casa para
fugir da raiva e do ressentimento que sentem em relação aos pais. Entretanto, se a raiva
persistir, levarão consigo o problema não resolvido.
J. A raiva mantém você no papel de vítima?
Quando você passa grande parte da vida sentindo-se vítima, pode ter uma enorme resistência
a perdoar, porque, ao fazê-lo, renuncia a uma boa parte de sua identidade. Perdoar não
significa negar que você foi vítima. Perdoar quer dizer que o fato de ter recebido uma
agressão não domina a sua vida emocional atual.
K. Você continua sentindo rancor para não se responsabilizar pelo que sente ou pelo que
acontece atualmente em sua vida?
Este é, talvez, o ganho secundário que mais incita a manter o rancor, pois, enquanto ele
persiste, podemos culpar a outro pela nossa infelicidade. Embora o outro possa, de fato, dar
sua contribuição, nós somos os principais responsáveis pelo que sentimos.
Enquanto considerarmos que o problema é exclusivamente externo a nós, enquanto
pensarmos que não temos nada a ver com o que sentimos, continuaremos sendo impotentes.
A raiva crônica nos impede de compreender que, independentemente de nossa relação atual
com quem a provocou, a decisão de nos prendermos a ela ou de nos libertarmos é
exclusivamente nossa.

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