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GIZ
Produto 2
(Contrato: 83100392)
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Sumário
9. Recomendações......................................................................................................33
10. Bibliografia.............................................................................................................35
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“Se o “povo da mercadoria” não quiser que o céu caia sobre ele, é
preciso que ajude a impedir a morte dos indígenas. O dia que o último
indígena morrer, será o fim do mundo” (Davi Kopenawa Yanomami).
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1. Introdução e Objetivos
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“A cooperação técnica no âmbito deste projeto focaliza o desenvolvimento de capacidades para a
implementação de políticas públicas voltadas à proteção e gestão sustentável das Terras Indígenas (TIs)
na Amazônia. Com este objetivo, o projeto almeja produzir os seguintes efeitos: aprimoramento das
estratégias e dos serviços governamentais e da sociedade civil voltados à proteção e gestão sustentável
das TIs; redução de ocorrências registradas (invasões e ameaças) em TIs selecionadas; gestão
sustentável das TIs; fortalecimento das organizações indígenas nas suas capacidades técnicas e de
articulação” (GIZ).
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A visita às outras macro-regiões localizadas em Roraima não ocorreu devido a uma outra agenda
existente na época da consultoria.
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consequentemente um gasto de combustível e com o pagamento do frete pela BR
307. Depois, o beneficiário e vários membros (senão todos os membros da família)
têm que se hospedar em São Gabriel da Cachoeira e há mais gastos com
alimentação. Quando conseguem sacar o dinheiro, compram as mercadorias de que
necessitam e começa a odisséia de retorno a Maturacá. Além de retornarem com
mercadorias, também estão levando lixo que pode não ter destino adequado.
Nesse interflúvio de idas e vindas ocorrem muitos contratempos como o
bloqueio da senha do cartão para ter acesso aos benefícios, a doença contraída na
cidade e levada por algum membro da família à terra indígena, acidentes com
automóvel, ingestão de bebida alcoólica, etc ... É no acompanhamento do cotidiano da
região, na conversa com as mulheres e idosos, que se percebe como se organiza o
“ciclo dos benefícios”. Devido à extensão da Terra Yanomami, é necessário se ter
posteriormente um diagnóstico mais apurado de cada região, que contemple o
cruzamento de dados populacionais, epidemiológicos compondo um panorama da
situação social.
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2. O povo Yanomami: contato com a população envolvente e luta pela
demarcação e garantia da terra
Na década de 70, houve outra fase de contato com o início dos projetos de
desenvolvimento do Governo Federal no âmbito do Plano de Integração Nacional
(PIN) como a construção da estrada Perimetral Norte e do Projeto RADAM - Brasil
revela a existência de um grande potencial mineral estratégico de cassiterita, nióbio,
ouro e vários outros metais (ALBERT, 1992). “Até abril de 1986, haviam sido
concedidos 537 alvarás de pesquisa sobre terras indígenas na Amazônia e outros
1.732 requerimentos que aguardavam deferimento, segundo pesquisa do Centro
Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI) e da Coordenação Nacional dos
Geólogos (CONAGE)” (AÇÃO PELA CIDADANIA, 1989:16).
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Comissão Pró-Yanomami, organização criada em 1979 com o objetivo de defender e garantir os direitos
do povo Yanomami.
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de sua população em Roraima tenham morrido principalmente por causa de doenças
como a malária. Se considerarmos que esse número se refere apenas aos cerca de
6.700 Yanomami que vivem no estado de Roraima, temos aí uma percentagem de
mais de 22% de mortes em menos de três anos” (RAMOS, 1993: 9).
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1990, novas denúncias foram trazidas pela Sociedade dos Povos Ameaçados da
Áustria, a Pax Cristi, Terre des homes e Survival International.
Além das trilhas, com base no uso da terra para sobrevivência, a área
suficiente para os Yanomami foi calculada em no mínimo 16 quilômetros ao redor de
cada aldeia para abastecer de carne de caça as suas populações. Portanto, a área
necessária para a sobrevivência desse povo só seria suficiente se estivesse de acordo
com a proposta de 1985.
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Davi Kopenawa é um porta-voz do povo Yanomami bastante conhecido internacionalmente por sua luta
pelo meio ambiente e pelo direito dos povos indígenas. Em 1988, recebeu o Global 500 Award das
Nações Unidas e em 1989 o Right Livelihood Award considerado o prêmio Nobel alternativo. Foi
condecorado em 1999 com a Ordem do Rio Branco pelo Presidente da República e em 2008 recebeu
uma menção honrosa especial do prestigiado Prêmio Bartolomé de Las Casas outorgada pelo governo
espanhol por sua luta em defesa dos direitos dos povos autóctones das Américas (Hutukara, 2011).
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“Faz parte do processo que instruiu a Medida Cautelar movida pelo Ministério Público, solicitando a
interdição e reconhecimento da posse imemorial de cerca de 9.400.000 há da área indígena Yanomami e
a retirada de mais de 40 mil garimpeiros invasores” (CCPY, 1990).
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A Ação pela Cidadania integrada pela Comissão Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação Brasileira de Imprensa
(ABI), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Central Única dos
Trabalhadores (CUT), Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) entre outras, viajou
para Roraima em junho de 1989. O grupo visitou a Casa do Índio e a região do
Paapiu, uma das mais atingidas pelo garimpo, e publicou posteriormente um
importante relatório sobre as condições de vida dos Yanomami (KRENAK, 1990; Ação
pela Cidadania, 1989). O Senador Severo Gomes sentenciou em um artigo publicado
na Folha de São Paulo em junho de 1989, que “nunca houve na história do infortúnio
dos índios brasileiros um genocídio com as características que cercam o fim do povo
Yanomami” (CEDI, 1991). Em 1990, a Ação pela Cidadania produziu um segundo
relatório que foi apresentado no auditório do Senado Federal com a presença de
jornalistas, parlamentares, índios, indigenistas, diplomatas do Itamaraty, e é claro, de
antropólogos. Davi Kopenawa e Raoni discursaram e a situação de saúde dos
Yanomami foi um dos pontos mais citados (Ação pela Cidadania, 1989).
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“Não-Yanomami”, o “outro” por excelência nas 4 línguas da família lingüística Yanomami. Faz-se uma
ressalva que apenas na Língua Sanuma, napö pö é como são chamados os Ye´kuana (povo Karib que
habita a Terra Yanomami). Os brancos que chegaram depois são denominados de setënapi töpö.
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É fundamental se atentar para essa diversidade e não mostrar uma falsa
homogeneização.
A história do atendimento de saúde para esse povo foi tão emblemática quanto
à história da demarcação da TY e é fundamental para se tentar entender a situação
social atual dos Yanomami.
Em 1991, no mesmo ano em que a Terra Yanomami (TY) foi demarcada, cria-
se o Projeto de Saúde Yanomami, que veio a dar origem ao Distrito Sanitário
Yanomami. A Funasa, então, começou a trabalhar em 80 % da TY. A CCPY, a
Diocese de Roraima, a Médicos do Mundo e a MEVA (Missão Evangélica da
Amazônia), que já trabalhavam com os Yanomami, atendiam as outras regiões com
recursos privados. O trabalho da cada organização era bem localizado e às vezes se
ampliava para outras áreas, como educação e religião.
Em 1994, com o decreto nº 1.141, a Funai assumiu o atendimento diretamente
nos postos de saúde. O Ministério da Saúde e a Funasa ficaram responsáveis pelas
ações de prevenção. Nessa época, muitos postos na TY ficaram abandonados. Então
a Funasa assinou pela primeira vez em sua história um convênio com uma
organização não-governamental para a assistência à saúde indígena - a CCPY.
No final da década de 90, com o Decreto nº 3156/99 e a Lei Arouca (n° 9.836),
o Ministério da Saúde voltou a ser o responsável pela execução do atendimento em
saúde. Discute-se então uma nova política em nível nacional de “Reestruturação da
Saúde Indígena”. Os 34 DSEIs foram implantados e os serviços de atenção básica à
saúde e prevenção passaram a ser executados através da descentralização via
convênios firmados com diversas organizações da sociedade civil - associações
indígenas e indigenistas - e alguns municípios.
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“É uma organização não governamental brasileira sem fins lucrativos, formada por profissionais e
intelectuais com uma larga história de defesa dos direitos dos índios Yanomami. A partir do ano 2000
assumiu, através de um convênio com a Fundação Nacional de Saúde, a assistência básica à saúde de
aproximadamente a metade dos 14.040 índios Yanomami residentes no Brasil” (URIHI, 2004).
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índios das aldeias e à compra de combustível. A não concordância com desses termos
levaram a Urihi a rescindir o convênio que mantinha com a Funasa.
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Por meio do Decreto Presidencial nº 6.878, assinado em 18 de junho de 2009,
os DSEIs são transformados em unidades descentralizadas. No entanto, esse
processo se prolongou até 2011, quando o ministro da Saúde, Alexandre Padilha,
anunciou em Brasília que os DSEIs se tornariam Unidades Gestoras Autônomas. Na
prática, o DSY, assim como os outros DSEIs, ainda não alcançou a sua autonomia
plena.
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presença de um branco para ensiná-los” (ANDRADE, 2007). Os Ye´kuana geralmente
mantinham-se reservados dos missionários e somente em 1983 (depois de quase
vinte anos da chegada dos missionários em Auaris) uma missionária chegou e foi
aceita para ser a professora. “Os Ye´kuana não desejavam conhecer a religião dos
brancos, queriam sim um professor, alguém que ensinasse a língua e o sistema de
escrita” (ANDRADE, 2007).
A MEVA também atua em outras regiões da TY como Alto Mucajaí, Baixo
Mucajaí, Ericó, Uraricoera e Uxiu - todos Yanomami de fala Ninam. O trabalho de
tradução da bíblia é feito através do projeto Henahi – segundo a própria organização,
um “Projeto direcionado por Deus para que todos os ianomâmi de fala ninam sejam
alcançados com a Palavra de Deus já traduzida nessa língua” (MEVA, 2010).
O primeiro contato da MNTB com os Yanomami ocorreu em 1958, quando dois
missionários se instalaram para as proximidades do Posto Indígena Ajuricaba. Em
1964 oito missionários se instalaram com suas famílias na região do alto rio Toototopi.
Dois anos depois iniciaram uma escola com uma média de 15 a 25 alunos que tinha o
objetivo principal de catequização tendo como pano de fundo a mitologia Yanomami.
Depois em 1991, os missionários se mudaram para a região do Novo Demini, onde
ainda estão presentes, além das regiões de Marari e Aracá (SMILIJANIC, 1999).
Consideramos que são as regiões que sofreram mais com o impacto do prozelistismo.
A Diocese de Roraima atua em poucas regiões: Missão Catrimani e Xitei.
Diferente das outras organizações religiosas, dissocia o trabalho de alfabetização com
a evangelização, o que não é um objetivo no trabalho da escola. Inclusive, em seus
cursos, delineia algumas propostas mais inovadoras e ousadas, com objetivo mais
parecido com as outras organizações laicas. Por exemplo, trabalham temas como
“organização política”, incentivam a participação das mulheres em fóruns do
movimento indígena estadual como o OMIR (Organização das Mulheres Indígenas de
Roraima). Isso se deve à herança da Teologia da Libertação adotada por essa ala da
Igreja Católica.
Em seguida, abordamos o trabalho das organizações laicas, que possuem
motivações e objetivos diferentes das referidas instituições anteriormente citadas.
Essas outras organizações – URIHI–Saúde Yanomami, Comissão Pró-Yanomami
(CCPY), Instituto Socioambiental (ISA) e Serviço de Cooperação com o Povo
Yanomami (Secoya) - possuem algumas características comuns. Aqui destaco o
trabalho baseado no acompanhamento pedagógico às escolas in loco e na formação
de professores, com uma busca pela regularização e legalização desse processo.
Essas características, porém, adquirem diferenças de ênfase e de teor
influenciados por fatores geográficos e históricos. A análise do trabalho realizado pela
Comissão Pró-Yanomami será feita com mais profundidade por possuir mais
elementos etnográficos e por ter sido um projeto originado por uma idéia ou “sonho” de
Davi Kopenawa.
Desde 1994 o Serviço de Cooperação com o Povo Yanomami (Secoya) atua
com educação escolar nas regiões de Marauiá, Demini e Aracá (AM) em 7 escolas nas
quais os próprios professores Yanomami ministram as aulas com a supervisão de
assessores não-indígenas. A formação de professores é realizada a partir de três
eixos temáticos: Terra, Língua e Saúde. O Secoya também trabalha paralelamente
com a formação de agentes de saúde indígena (SECOYA).
Outro trabalho de alfabetização e educação em saúde foi desenvolvido pela
URIHI – Saúde Yanomami na maioria das regiões da TY. A URIHI iniciou em 1999
cursos de capacitação de microscopistas indígenas para aprimorar o trabalho de
detecção e tratamento da malária. Os próprios Yanomami foram formados para serem
capazes de coletar e ler lâminas em suas próprias aldeias. Essa experiência foi muito
bem sucedida e foi reconhecida mundialmente.
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Após a formação de um certo número de microscopistas, a URIHI iniciou em
2000 um projeto de educação em várias regiões onde também fazia atendimento de
saúde criando escolas e começando a alfabetizar jovens para exercerem o papel de
professores. Esses jovens alfabetizariam outros Yanomami que pudessem se tornar
Agentes Indígenas de Saúde (AIS), ampliando assim o treinamento em saúde. Esse
processo de escolarização foi subitamente interrompido com a não pactuação da
URIHI com a Portaria 70 de 20048, levando ao encerramento das atividades dessa
organização na TY. Essas regiões ficaram sem nenhum tipo de atividade em
educação escolar e permanecem da mesma maneira.
A CCPY é a instituição que teve o trabalho em educação mais abrangente
atendendo o maior número de regiões da. Como citado anteriormente, Davi Kopenawa
foi o idealizador do Projeto de Educação da CCPY. Depois de concluída a demarcação
da TY, Davi continuou a sua luta pelo mundo contra a invasão garimpeira na TY. Com
o apoio de outras organizações ele propôs a criação de escolas em sua terra9.
Davi conheceu a escola nos outros povos do lavrado, onde as línguas foram
proibidas e atualmente são pouco faladas, por isso sempre teve a preocupação com a
salvaguarda da língua Yanomami. Para Kopenawa, a escola serviria principalmente
para “resguardar” a cultura Yanomami e preparar as novas gerações a “enfrentarem”
os brancos. Em sua própria fala:
“Nós queremos a escola para aprender a escrever a própria língua Yanomami,
para não perder a nossa língua, para garantir a história dos Yanomami. Se não, os
napë vão continuar invadindo e ensinando só a língua deles, estragando a nossa, e
isso nós não queremos. Nós queremos que nossa língua permaneça com o jeito dos
Yanomami. Queremos aprender a trabalhar com o papel. Para nós isso é importante
porque ajuda a preservar a nossa língua. E também queremos escola para aprender a
escrever a língua portuguesa, queremos ser bilíngües e aprender a contar os
números, para aprender a falar com os napë e não sermos enganados” (CCPY, 2009).
Portanto, um dos objetivos do Programa de Educação Intercultural (PEI) é
“garantir a perenidade e o dinamismo das línguas yanomami, dotando-as de uma
grafia e de um acervo de textos próprios (cartilhas escolares, jornais, livros, etc.),
favorecendo sua apropriação de novos conhecimentos conforme seu sistema de
conceitos e lógica cultural específicos” (CCPY, 2009). Na proposta curricular existe um
predomínio do uso das línguas Yanomami em detrimento à língua portuguesa, onde se
espera que os conteúdos sejam abordados preferencialmente nas línguas Yanomami.
O início do trabalho de alfabetização foi realizado por professores não-
Yanomami na região onde vive Davi Kopenawa, o Demini ou Wathoriki, em 1995. Em
seguida, alguns alunos Yanomami foram escolhidos pela comunidade para serem os
professores e os brancos passaram a ser apenas “assessores pedagógicos”. Depois o
Programa de Educação Cultural (PEI) ampliou a sua atuação para as regiões de
Toototopi e Parawau, onde havia postos de saúde criados pela CCPY. E assim, já em
2002, o trabalho foi ampliado também para as regiões de Papiu, Kayanau e Catrimani
I. Em 2005, a CCPY incluiu também a região de Auaris no trabalho de
acompanhamento às escolas. Em 2009, há a incorporação da CCPY e
conseqüentemente do Programa de Educação Intercultural (PEI) pelo ISA (Instituto
Socioambiental).
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Portaria 70 de 20 de janeiro de 2004 do Ministério da Saúde, “Aprova as Diretrizes da Gestão da Política
Nacional de Atenção à Saúde Indígena”.
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Primeiro o projeto foi financiado pela Unesco e depois o projeto foi apoiado pela Organização de
estudantes noruegueses OD (Operação Um Dia de Trabalho) com o apoio da Rain Forest Foundation da
Noruega.
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O Magistério Yarapiari de Formação de Professores Yanomami, desenvolvido
pela CCPY/ISA formou, depois de 12 cursos em 2009, a primeira turma de 16
professores yanomami foi formada e alguns passaram no vestibular da Universidade
Federal de Roraima (UFRR) em 2011, mas o reconhecimento desse curso ainda é
uma luta que parece que se estenderá ao longo da burocracia engessada e da falta de
vontade política do Estado de Roraima.
Existe uma grande disparidade em relação à situação educacional nas
diferentes regiões da TY. Existem regiões que receberam o trabalho de mais de uma
instituição, como por exemplo, Auaris. Nos anos setenta, foi a MEVA, em 2000, a
URIHI e em 2005 a CCPY e em 2009, o ISA.
No entanto, existem outras regiões que receberam quase ou nenhuma
atividade de educação escolar, como por exemplo, Parahuri, Aratha u e Surucucu,
regiões de conflito. A demanda pela criação de novas escolas é cada vez mais
crescente por parte dos Yanomami. Em todas as Assembléias da Hutukara
Associação Yanomami e até nas reuniões de Conselho Distrital de Saúde, as escolas
são solicitadas pelas lideranças Yanomami.
A demanda pela contratação de professores também é grande, pois a “carreira”
de professor ente os Yanomami ganhou muito prestígio depois dos processos
seletivos, pois o salário compra mercadorias que são levadas para as aldeias. Muitos
jovens almejam ser professores para receberem esses salários. O professor também
se tornou uma figura de destaque na relação com os não-Yanomami, principalmente
por possuir mais conhecimentos da língua portuguesa.
As escolas da CCPY/ISA, URIHI e Secoya são reconhecidas pelos Yanomami
como fundamentais no processo de formação política de jovens lideranças e
influenciam toda a comunidade. É visível que a maioria dos Yanomami percebe a
diferença de abordagem dada às escolas dos missionários, que em geral não
fomentam discussões e a inclusão de temas “políticos” na escola. Os programas de
educação das organizações laicas certamente implementam uma forma diferente de
educação, fomentando elementos e discussões para que o povo Yanomami uma
conquista de autonomia, como por exemplo, o ensino das legislação sobre os direitos
dos povos indígenas, elaboração de projetos, produção de material didático, etc.
Atualmente existem escolas Yanomami e Ye´kuana no censo das escolas
indígenas de 2010 (INEP/MEC) conforme a tabela abaixo.
RR 33 1.718
AM 11 1.045
TOTAL 44 2.763
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5. Dados populacionais
Sub-
Estado Município Pólo Base Língua Aldeias População
Total
Alto Mucajai Ninam 6 497
Aratha u Yanomae 5 487
Baixo Mucajai Ninam 2 144
Hakoma Yanomae 10 422
Haxiu Yanomae 16 854
Palimiu Ninam 7 603
Alto Alegre 6.913
Parahuri Yanomae 8 419
Surucucu Yanomae 20 1.425
Uraricoera Ninam 1 69
Waikas Ye´kuana 5 136
Waputha Yanomae 4 466
RR Xitei Yanomae 30 1.391
Auaris Sanuma 32 2.681
Amajari Ericó Ninam 6 209 3.132
Saúba Ninam 5 242
Ajarani Yawaripë 2 120
16
Marari Yanomamö 5 968
Médio Padauiri Yanomamö 2 208
Novo Demini Yanomae 2 329
Toototobi Yanomae 10 654
2 8 37 269 19.338
Por sua vez, com uma quantidade de alimentação insuficiente para uma
população que cresce vertiginosamente, são as regiões que mais procuram
alternativas econômicas como os benefícios sociais como forma de suprir essa
demanda.
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6. Caracterização das regiões
Como já foi dito anteriormente, por causa da extensão da TY, uma maneira
viável de se ter um diagnóstico completo é considerar a características próprias de
cada região. Em geral, as regiões são identificadas com a mesma abrangência dos
pólos-base do DSY, apenas com alguns ajustes.
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Brasil em busca de atendimento, remédios e vacinas, mas também trazendo doenças
como malária, infecções respiratórias graves, verminoses entre outras.
Escolas estaduais sem apoio de ONGs Ericó, Uraricoera, Ye´kuana (Auaris e Waikas)
19
Ainda existem outras duas organizações - Rios Profundos e Pró-Amazônia -
que desenvolvem trabalhos na região de Marauiá.
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7. Estudo de caso: a região de Maturacá
1956 150
1961 220
1969 287
1978 381
1980 500
1985 517
1995 644
1998 794
2006 1.250
2010 1.396
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Cachoeira. Depois essa prática foi impedida pelas lideranças tradicionais pois as
crianças não estavam retornando para Maturacá.
“O Sr. Júlio lembra que o avanço da civilização faz com que se perca os
conhecimentos tradicionais, as danças espirituais, as brincadeiras, etc. Diz que os
antepassados cederam espaço para os Salesianos, mas que tudo o que há na
comunidade foi feito pelos Yanomami, por exemplo: a pista, a casa da missão e a
capela” (AYRCA, 2011).
Em 1979 é criado o Parque Nacional do Pico da Neblina através do decreto nº
83.550 de 05/06/79, com extensão de 22.000 km. Em 1987 é instalado, através da
portaria presidencial nº 1.203/87, um posto da FUNAI em Maturacá.
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Atendimento à Pessoa São Gabriel da 2.200 pessoas – várias 269 pessoas
Idosa Cachoeira sem documentação
Certidão de
182 30 60 1.000 272
Nascimento
Carteira de Trabalho e
Previdência Social 228 30 200 1.000 458
(CTPS)
Cadastro de Pessoa
338 35 202 1.000 575
Física (CPF)
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dirigiram à São Gabriel da Cachoeira. Famílias extensas completas sem comida e nem
dinheiro, ficaram se acumulando na FUNAI sem saber para onde ir, já que a Casa de
Apoio era insuficiente para abrigar tanta gente. O técnico Luiz Pereira foi procurado, A
maioria dos Yanomami não tinha nem sequer RANI e nem certidão de nascimento. A
equipe do INSS também iria permanecer apenas uma semana em São Gabriel da
Cachoeira e anunciaram que atenderiam apenas 40 pessoas por dia. Fazendo umas
contas rápidas podemos verificar que essa ação foi ineficiente para atender uma
população esidente em São Gabriel da Cachoeira.
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25
26
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É uma demanda muito grande que se amplie e reforme a Casa de Apoio de
acordo com o projeto elaborado pela FPEY (PEREIRA, 2010). Os Yanomami ainda
sugerem que a Funai construa um outro terreno próximo à ponte do 5º Batalhão de
Infantaria de Selva (BIS), em frente ao Ginásio Arnaldo Coimbra, próximo a um
igarapé. A atual Casa de Apoio não é vista pelos usuários como um patrimônio e por
isso os Yanomami não cuidam dela, como explicitado pela liderança Yanomami Júlio
Góes durante a X Assembléia Ordinária da AYRCA.
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Outra atividade econômica realizada pelos Yanomami na região do Pico da
Neblina e na Serra do Padre é o garimpo “manual”, ou seja, sem utilização de
maquinário ou materiais contaminantes como o mercúrio. Também existem balsas de
não-Yanomami que, segundo relatos, pagam um taxa de 20 gramas de ouro a cada
comunidade para subirem o rio Cauaburis. Essa rota também é utilizada pelos
garimpeiros com destino à Venezuela. A FUNAI ainda não possui dados precisos para
mensurar o grau da atividade, mas é sabido que vêm crescendo a cada dia.
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8. Os benefícios sociais e os Yanomami: desafios e possibilidades
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Segundo o Artigo 4º do Estatuto do Índio, são considerados índios isolados os que “vivem em grupos
desconhecidos ou de que se possuem poucos e vagos informes através de contatos eventuais com
elementos da comunhão nacional” (Lei 6.003 de 1973).
11
A expressão utilizada é "integração harmoniosa" dos povos indígenas à "comunhão nacional” e ainda
está presente no Estatuto do Índio.
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As FPEs são unidades executivas da FUNAI, subordinadas a Diretoria de Proteção Territorial (DPT)
através da Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato.
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outras situações, praticamente todas as atribuições próprias da CR foram transferidas
para a FPEY, como por exemplo a emissão de RANIs e o trabalho de promoção
social. Essa situação também foi provocada pelo TAC do Ministério Público Federal
assinado em pelos compromissários Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP), a Secretaria de Educação e Desporto de
Roraima (SECD/RR) e a FUNAI determinando que esse último realizasse o Registro
Administrativo de Nascimento Indígena (RANI) de todos os indivíduos em idade
escolar no prazo de 18 meses contando da data da assinatura - 19 de agosto de 2010.
Desde 2010, a FPEY vem fazendo as RANIs e outros documentos auxiliando
os yanomami em todas as ações de promoção social, o que, associado ao número
insuficiente de servidores, acaba por desviar o foco de sua atenção para o verdadeira
atribuição da FPEY, de localização de grupos isolados, da proteção e monitoramento
territorial, entre outros... Nesse sentido, é fundamental que a CR de Boa Vista e a CR
do Rio Negro sejam fortalecidas para fazerem essas ações novamente, respeitando é
claro, as especificidades dos povos Yanomami e Ye´kuana.
O sub-registro da população yanomami é enorme, sendo uma das maiores
preocupações externalizadas nas reuniões e fóruns de discussão. Sem
documentação, os professores e agentes de saúde não podem ser contratados, ficam
também impossibilitados de abrir uma conta no banco, os pacientes de serem
atendidos e internados em hospitais, os representantes políticos de poderem viajar
para outros estados para participar de reuniões e ficam impedidos de acessar os
benefícios previdenciários e do Bolsa Família.
Ao contrário da necessidade de documentação, que é um consenso entre os
yanomami, existem muitas divergências quanto o acesso aos benefícios sociais e
previdenciários. Percebemos vários blocos de convergência de interesses. Os
yanomami do estado do Amazonas, em geral, desejam receber todos os benefícios e
acreditam que a FUNAI deve auxiliá-los com o transporte e acesso ao cadastro. A
maioria dos ye´kuana já possui documentação e vários já acessam os benefícios
sociais e previdenciários, os quais buscam esse acesso de forma mais autônoma que
os seus vizinhos yanomami. Outras regiões da TY que possuem um acesso mais fácil
à cidades mais próximas e aquelas com grande densidade populacional também têm
apresentado interesse em acessá-los. Por último, existe um contingente bastante
grande de yanomami que está completamente alheio a esses direitos.
As três associações representativas desses povos – Associação Yanomami do
Alto Rio Cauaburis e Afluentes (AYRCA), Associação do Povo Ye´kuana do Brasil
(APYB) e Hutukara Associação Yanomami (HAY) também apresentam divergência
sobre esse tema. Enquanto a AYRCA verifica a necessidade de atingir a todos os
yanomami das regiões do Amazonas, a HAY acha que deve existir uma discussão
ampla previamente à qualquer ação de cadastramento.
O Presidente da HAY Davi Kopenawa Yanomami se refere à Bolsa Família
como “Bolsa Preguiça” e alerta para os prejuízos que isso pode trazer aos yanomami
no futuro. Ele acredita que com o passar do tempo, os yanomami deixariam de realizar
as suas atividades produtivas como o cultivo das roças, as atividades de caça e coleta.
Segundo as suas próprias palavras, “para mim o Bolsa Família é a nossa terra
demarcada. Tudo o que nós queremos é a nossa terra protegida de invasores como os
garimpeiros que atualmente praticam o garimpo ilegal e dos fazendeiros que ainda
estão em nossa terra. Na nossa terra, não falta alimento, o que realmente precisamos
é de ferramentas de metal para derrubarmos as roças. O costume dos brancos é forte,
a comida dos brancos é como doença, deixa a gente fraco. Se os Yanomami ficarem
dependentes dela, vão correr apenas para o rastro do dinheiro e não mais dos animais
de caça. Os yanomami não podem ficar dependentes da Funai e do Governo. O que
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os políticos vão pensar ? Que os yanomami são preguiçosos, primitivos, não querem
plantar. E aí depois vão questionar o tamanho da nossa terra ”.
Consideramos que o maior desafio quando se discute o acesso aos benefícios
sociais na TY é dimensionar todas as diferentes configurações sociais e de contato. É
extremamente necessário que todas essas questões levantadas aqui devem ser
discutidas em um grande seminário na TY com uma participação maciça de
representantes yanomami e ye´kuana envolvendo também outras instituições (MDS,
SESAI, INSS, etc), oportunidade também que deverão ser formuladas propostas
alternativas para a configuração dos referidos benefícios.
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9. Recomendações
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documentação, considerando as atribuições da FPEY, das CR de Boa Vista e do Rio
Negro, da Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato
(CGIIRC/FUNAI) e da Coordenação Geral de Promoção e Desenvolvimento Social
(CGPDS/FUNAI) para as atividades determinadas.
34
11. Bibliografia
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