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I Seminário
CASAS DE UNIÃO
Políticas Públicas e Regiões de Fronteira
Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE)
Rua 24 de outubro, 850/310
Bairro Moinhos de Vento
CEP: 90510-000
Porto Alegre, RS, Brasil
Fone: (51) 30846175
ISBN 978-85-65135-11-5
ISBN 978-85-65135-10-8 (e-book)
1
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Perfil dos
Municípios Brasileiros. Rio de Janeiro: Ministério do Planejamento, Gestão e
Orçamento, 2013.
participantes quase todos pertencentes ou representando órgãos
públicos. Dentre os presentes pode se destacar a representação estadual
do DNIT e da ANVISA, além do Ministério do Planejamento, da Polícia
Rodoviária Federal, da ADESG, da Petrobrás, entre outros.
A abertura do evento contou com participação de Pedro Brites,
Diretor-Geral do ISAPE; e Maria da Graça Hahn, idealizadora das Casas
de União e Procuradora da Fazenda Nacional em exercício na Escola da
Advocacia-Geral da União (AGU) em Santa Catarina. O seminário foi
constituído por duas mesas, que trataram das temáticas “Políticas
Públicas e Regiões de Fronteira em Debate” e “Os Desafios e as Ações
do Governo Federal nas Regiões de Fronteira”. A primeira foi moderada
pelo Prof. Dr. Carlos Arturi (CEGOV), incluiu as exposições do Ten.
Cel. Clynson de Oliveira (ECEME), da Profª Dra. Graciela Pagliari
(UFSC) e de Rodrigo Cardoso (CAPES). A segunda , moderada pelo
Prof. Dr. José Miguel Martins (UFRGS), incluiu as apresentações do
Prof. Dr. Lucas Kerr de Oliveira (UNILA) e de Fernando Sebben
(Senado Federal). Esses anais procuram relatar o conteúdo destas
palestras.
O artigo que abre estes anais, de autoria do Ten. Cel. Clynson,
reveste-se de uma importância especial: permite aos organizadores deste
volume reconhecer e homenagear o esforço daqueles brasileiros
pioneiros, civis ou militares, estadistas ou soldados, que zelaram (e
zelam) por nossas fronteiras. Seria impossível nomear a todos; talvez
caiba uma referência ao esforço do Marques do Pombal que, ainda no
seculo XVIII, pela primeira vez construiu uma rede de fortes ao longo
do Rio Amazonas, que permitiu o povoamento da região e que este
vasto território permanecesse em mãos luso-brasileiras. Mais
recentemente, temos o esforço sintetizado no projeto Calha Norte, do
qual, em mais de um sentido, as Casas de União sentem-se tributárias.
Isto se torna particularmente evidente quando o Cel. Clynson descreve
sua experiência pessoal junta aos Pelotões Especiais de Fronteiras, o
“Pavilhão de Terceiros” e o Barco PAI – Pronto Atendimento Itinerante
–, antecipações das Casas de União, que prestam assistência inestimável
às populações ribeirinhas e aos contingentes de brasileiros sediados ao
longo das regiões de fronteira. Como as regiões de fronteira são o tema
deste primeiro Seminário, nada mais natural que se reporte esta
experiência pregressa e, que na pessoa do Cel. Clynson, se homenageie
e preste-se tributo a todos aqueles, ilustres ou desconhecidos, que
mantém na fronteira o patrimônio de todos os brasileiros.
Se o artigo do Cel. Clynson nos fala sobre a importância da
cidadania para a manutenção da própria soberania, resultado da
experiência na região da Cabeça do Cachorro, o artigo seguinte, de
autoria da Prof. Dr. Graciela Pagliari (RI/UFSC), trata do desafio
representado pelo ilícitos transnacionais como afeto à todas fronteiras.
Trata-se do tráfico de armas, minerais, seres humanos e drogas, além da
lavagem de dinheiro e corrupção. A exposição da magnitude do
problema deixa evidente a impossibilidade de qualquer solução
simplificadora. Mais que um problema nacional, a região de fronteira
suscita a ação integrada não apenas de diferentes órgãos, mas também
de diferentes entes federados e requer, em igual amplitude, a cooperação
internacional. O artigo serve como fundamento acerca da importância do
emprego da imaginação institucional2 para a formulação de soluções
complexificadoras, multidimensionais, que envolvam todos níveis do
poder nacional para dar conta do enfrentamento aos ilícitos
transnacionais, já que seu reflexo é conhecido de todos: violência e
insegurança nos grandes centros urbanos. Caso não se possa despertar a
empatia com a questão dos ilícitos transnacionais, por razões de
segurança humana ou nacional, resta o argumento egoísta: trata-se de
perseguir o elementar autointeresse.
Rodrigo Bertoglio trata da fronteira norte, próxima a tríplice
fronteira: a que compartilham Brasil, Guiana e Venezuela. Trata-se do
resultado de uma pesquisa feita em campo e em arquivos, e que,
originalmente, permitiu ao hoje analista de Ciência e Tecnologia da
CAPES concluir seu mestrado com distinção. Trata-se de uma outra
fronteira; além das questões já levantadas por Clynson e Graciela,
2
GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Transição Tributária: Introdução à
Justiça Fiscal Consensual. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 15.
há — comparativamente ao conjunto da Amazônia — um intenso fluxo
humano que leva à Fronteira Norte situações as quais seriam em tudo
análogas às da Fronteira Oeste.
Este é o tema do artigo de Fernando Sebben, aqui o aspecto que
chama atenção, em plena era da globalização, da integração — ou talvez
devido precisamente devido a isto —, é o risco da guerra local. O hoje
analista legislativo do Senado apresenta e atualiza aquilo que foi seu
objeto de estudos durante os anos em que se debruçou sobre sua
dissertação de mestrado e de suas visitas a região. A magnitude do
problema da Meia Lua mostra que para além de soluções inovadoras e
multidimensionais, permanecem os “velhos” problemas de segurança
relacionados à preparação militar, à aquisição do material bélico e à
capacidade de projetar força além-fronteira; até mesmo como um
quesito para afiançar o processo de integração. O artigo de Fernando
traz à tona uma dimensão presente, porém subentendida nos artigos
precedentes. A importância do processo produtivo, da base industrial de
defesa, exposto no decreto 6.703/2008 que dispõe sobre a Estratégia
Nacional de Defesa (END) e o papel da mobilização nacional
(SINAMOB), exposto no decreto 6.592/2008. Em suma, vislumbra-se,
por inferência, a dimensão econômica e produtiva que, paradoxalmente,
está presente na reforma do Estado. Serve, portanto, para dar conta da
presença de formas inovadoras de parcerias e de financiamento que
integram a reforma do Estado para além do aspecto político.
Esta perspectiva fica mais visível na abordagem de Lucas Kerr,
que nos brinda com uma interessante e significativa associação: a
importância da reforma do Estado, da infraestrutura e da integração para
a construção da sustentabilidade energética. Lucas Kerr, que atualmente
é o Coordenador do curso de Relações Internacionais da UNILA,
desenvolveu este tema ao longo de sua tese de doutorado. Neste artigo,
explora com desenvoltura os aspectos normativos da questão energética
e sua interface com as políticas públicas de Estado. Naturalmente, entre
as conclusões do autor, a importância de mecanismos ad hoc, como
Casas de União, Consórcios e Convênios para servir como ferramentas
administrativas e institucionais que permitam uma ação integrada de
governo nos três níveis e, eventualmente, sirva como suporte adicional à
própria cooperação técnica internacional.
Por fim, deixamos os leitores com os artigos, na expectativa de
que, de algum modo, possa se ter contribuído no esforço de dar
continuidade à Reforma do Estado no Brasil.
Os Organizadores
Porto Alegre, novembro de 2014
Introdução
O presente artigo tem como objetivo geral expor alguns dos
principais desafios e oportunidades relativos à implementação e ao
sucesso de políticas públicas na Fronteira Amazônica, especialmente na
região da Cabeça do Cachorro, uma zona de difícil acesso e ainda pouco
explorada. Visa-se apresentar a atuação do Exército Brasileiro (EB)
como um dos principais representantes do Estado nessa região, a partir
da sua inserção nas políticas públicas, e, por fim, delinear algumas das
possibilidades de implementação do projeto Casas de União como uma
solução possível para a presença deficiente do Estado na área.
As Casas de União são fundamentadas na ideia de que deveria
existir uma infraestrutura compartilhada entre os distintos entes
federados. Esta infraestrutura abrigaria diversas agências (dos diversos
entes), que partilhariam dos mesmos recursos — servidores, materiais e
instalações prediais —, dando consecução ao princípio de gestão
associada contido no Art. 241 da Constituição de 1988, e na Lei
11.107/2005 e no Decreto 6.017/2007 — os quais regulamentam a
instituição de consórcios públicos no Brasil. O presente artigo
apresentará algumas iniciativas com propostas similares, que podem ser
vislumbradas como precedentes às Casas de União, com o intuito de
apontar oportunidades de inserção do projeto na região da Fronteira
Amazônica.
O texto está dividido em quatro seções. Na primeira, são
apresentadas as especificidades da região amazônica que interferem
diretamente na implementação das políticas públicas. Na segunda,
buscou-se clarificar a relação fundamental entre cidadania, soberania e
desenvolvimento, que perpassa todo o artigo. A terceira seção apresenta
a distribuição das unidades do exército no território amazônico. A quarta
e última sessão trata das principais iniciativas públicas com
envolvimento das unidades militares do EB na região, buscando-se
expor oportunidades para as Casas de União. Por fim, tem-se, na
conclusão, a retomada dos tópicos anteriores, relacionando-os mais
fortemente à temática das Casas de União.
1
Custeio x Investimento: Investimento é toda a aquisição que aumente o
capacitação para operar o sistema das Casas de União não podem ser
financiadas somente pelos programas e projetos de governo
supracitados. Uma possível solução para tal dificuldade, idealizada no
projeto Casas de União, é a realização de consórcios públicos e
convênios entre a esfera pública e privada que facilitem a gestão dos
projetos e diminuam os seus custos no médio e longo prazo. Assim, o
custeio de pessoal e a manutenção de estruturas utilizadas podem ser
gerenciados através de convênio com empresas prestadoras de serviços
ou por consórcios entre os entes federados. Neste sentido, as Casas de
União atuariam como promotoras de consórcios e convênios a fim de
desenvolver a capacidade estatal na região a partir da gestão associada
de recursos públicos.
Um mecanismo que minimizaria os problemas com o custeio para
a implementação das Casas da União seria o Convênio entre os
governos Federal, estadual e municipal e empresas privadas. Já existem
iniciativas viabilizadas por convênios, como o da erradicação do sub-
registro civil, do qual fazem parte o governo do estado do Amazonas e o
Ministério da Defesa por intermédio do Exército Brasileiro, cuja
materialização é o apoio prestado ao barco PAI. Um outro mecanismo
possível seria o Consórcio, em que a cooperação entre as esferas
constituiria uma pessoa jurídica que gerenciaria os recursos necessários
para a implementação das políticas públicas para a região.
Em qualquer uma dessas formas, a capacitação de Recursos
Humanos e a sua fixação, e a captação de pessoal na faixa de fronteira
são os fatores críticos de sucesso. Sem que isso ocorra não haverá
continuidade dos projetos propostos, nem padronização de seus
procedimentos, o que prejudicaria a qualidade dos serviços prestados à
população, o desenvolvimento socioeconômico e a própria soberania.
Sem infraestrutura de energia e comunicações também não haverá
sucesso na prestação dos serviços. Nesse sentido, as Casas de União
podem promover a parceria necessária pra que se estabeleça uma
1
Fonte: IBGE http://cod.ibge.gov.br/233XJ.
Os novos desafios à segurança, em vista da variedade dos
potenciais de conflito, requerem uma combinação de medidas de âmbito
militar, financeiro, econômico, político e policial, além da coordenação
de esforços nacionais, regionais e internacionais. Neste sentido, são
importantes as medidas coordenadas, bilateral e regionalmente, adotadas
pelos países sul-americanos, que tem crescido nos últimos anos, embora
essas ações não possam ser consideradas como definitivas para a
solução do problema.
Tem-se como exemplo de cooperação em combate ao
narcotráfico o acordo assinado com a Bolívia em 2011, que objetiva a
formulação de uma estratégia regional contra as drogas para ações
conjuntas de polícias, com o suporte das forças armadas, para localizar e
destruir laboratórios e pistas de pouso clandestinas e trocar informações
acerca do tráfico.
Uma importante ação que deve ser destacada é o Plano
Estratégico de Fronteiras que foi implementado a partir de junho de
2011 a fim de reforçar a presença do Estado na fronteira terrestre e, com
isso, inibirem a incidência de ilícitos nas zonas fronteiriças e evitar
entrada de armas e drogas2. O Plano Estratégico de Fronteiras visa
produzir ações de modo integrado entre os diversos ministérios
envolvidos. Como uma das principais formas de ação do Plano
Estratégico de Fronteiras tem-se as Operações Ágatas, sendo que a
Ágata 7, realizada em 2013, foi a maior ação militar voltada para a
segurança pública nos últimos anos. Esse patrulhamento da fronteira
resultou num aumento de mais de 300% nas apreensões de drogas e
quase 500% nas apreensões de armas (sem contar os números da
Operação Ágata 7).
Esse tipo de operação está na linha do que acreditamos ser
necessário e um caminho indicado para combater os ilícitos
transnacionais: cooperação nas ações e operações entre os diferentes
Ministérios e agentes responsáveis ou que podem atuar para produzir
respostas positivas em termos de avanço ao combate dos ilícitos - pelo
2
Para maiores informações sobre o Plano Estratégico de Fronteiras ver:
http://agata8.defesa.gov.br/plano-estrategico-de-fronteiras.shtm.
Ministério da Defesa: as forças armadas (Exército, Marinha e
Aeronáutica); pelo Ministério da Justiça: Polícias Federal e Rodoviária
Federal e Força Nacional de Segurança Pública; e pelo Ministério da
Fazenda: Secretaria da Receita Federal.
Além disso, a operação Ágata 7 contou, por exemplo, com a
mobilização de tropas militares de Peru e Colômbia ao longo dos 11 mil
quilômetros da fronteira Norte e teve um volume de apreensões de
drogas recorde (25 toneladas de maconha e 657 kg de cocaína, crack e
haxixe).
3
Um exemplo é o financiamento que o FOCEM oferece a projetos no âmbito das
mercocidades.
da cooperação entre os diferentes níveis de governo e dos Estados
vizinhos através de consórcios públicos, existe a possibilidade de
ampliar consideravelmente a abrangência dessas iniciativas e tornar
permanente a presença do Estado nessas regiões. As Casas de União
podem replicar estes projetos bem-sucedidos nas regiões de fronteira
física também em centros urbanos, em conjunto com outros níveis da
administração pública com os demais entes federados. Fazendo com que
as iniciativas tomadas pelo Estado para reocupar territórios degradados
não se deem apenas com forças policiais, mas também com a inclusão
social.
Considerações Finais
Como foi analisado, o poder público enfrenta grandes desafios
nas regiões de fronteira, em especial na fronteira norte. Estes desafios
em grande parte são o reflexo de problemas advindos do narcotráfico. O
tráfico de drogas ampliou o seu efeito desestabilizador a partir dos anos
1990, devido a continuidade das políticas de combate à oferta de
entorpecentes promovida pela comunidade internacional através da
ONU e da promoção de uma nova agenda de segurança, que securitizava
questões antes consideradas ilícitos comuns, entre elas o tráfico de
drogas.
A América do Sul é uma das regiões mais afetadas por este
problema, por ser um dos principais produtores de cocaína e maconha
do mundo e ser uma importante escala da rota internacional do tráfico.
Esse problema é particularmente preocupante na região da fronteira,
onde a pouca presença do Estado, em parte incentivada pela própria
configuração geográfica desta região, facilita a ação de narcotraficantes
e agudiza ainda mais problemas sociais.
Entretanto, a solução para o problema não reside na securitização
do problema, esse modo de ação já se mostrou ineficaz e, geralmente,
acaba por disseminar a produção e os problemas advindos do tráfico por
toda região. O combate a esse problema passa por ampliar a presença do
Estado nas regiões de fronteira e, apesar das dificuldades, esse caminho
se torna viável a partir da cooperação entre os países vizinho e entre os
diferentes níveis de governo e de administração pública. Para isso,
propõe-se como um caminho possível as Casas de União. Esse projeto
se baseia na disseminação de consórcios públicos para a efetiva
cooperação entre os diferentes níveis de governo e os países vizinhos, a
exemplo do que já acontece na região sul com o incentivo do Mercosul e
do FOCEM.
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WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência: os jovens da América
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Introdução
O presente artigo tem o objetivo de informar o leitor acerca da
realidade da fronteira norte do Brasil, em particular em seus aspectos de
segurança, e sensibilizá-lo para a necessidade de políticas públicas,
como as Casas de União, que sejam eficientes e garantam a presença do
Estado em regiões lindeiras. O perfil do texto é predominantemente
descritivo e totalmente subsidiado de fontes oficiais, documentos
públicos e relatórios ostensivos. Esse estilo informativo, com
significativa base documental, permite caracterizar a vulnerabilidade em
dois segmentos da fronteira norte (Brasil/Venezuela e Brasil/Guiana) tão
precisamente quanto possível a um pesquisador acadêmico.
Apresentam-se, nas considerações finais, uma análise dos fatos expostos
e uma relação destes com novas e antigas ações da administração
pública na zona de fronteira. Busca-se, ainda, indicar a aplicabilidade
das Casas de União nas regiões analisadas.
1
Esse artigo é parte integrante, editada porém não modificada em seus
argumentos e dados, de pesquisa realizada para dissertação de mestrado do
Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (PPG-POL/UFRGS), financiada com recursos da CAPES.
Segurança na Fronteira com a República Bolivariana da Venezuela
Essa seção trata de algumas das principais questões de segurança
ocorridas na fronteira entre o Brasil e a Venezuela entre os anos de 2003
e 2008 e está dividida em (a) tráfico seres humanos, (b) tráfico de armas
e drogas e (c) mineração ilegal.
(a) O tráfico de seres humanos — Na fronteira, o tráfico de
seres humanos foi uma prática crescente durante todo o período em
estudo, levando principalmente mulheres e adolescentes brasileiras a
serem aliciadas para fins de exploração sexual na Venezuela. O perfil
médio destas mulheres indica origens humildes, baixa escolaridade e
residência em espaços urbanos periféricos com carência de saneamento,
transporte, educação e saúde (LEAL; LEAL, 2002). No mercado de
trabalho, estariam inseridas nos ramos de prestação de serviços e
comércio em funções “mal remuneradas, sem carteira assinada, sem
garantia de direitos, de alta rotatividade e que envolvem uma prolongada
e desgastante jornada diária, estabelecendo uma rotina desmotivadora e
desprovida de possibilidades de ascensão e melhoria” (LEAL; LEAL,
2002, p. 58). O recrutamento para o tráfico internacional ocorreria sob a
promessa de melhoria das condições de vida, especialmente através de
redes de entretenimento adulto, agências de modelo, serviços de
telessexo, agência de emprego, recrutamento para frentes de
assentamentos agrícolas, construção de rodovias, hidrovias, mineração
(garimpos) e outros (LEAL; LEAL, 2002, p. 62-70).
No caso específico da fronteira binacional, o problema envolveria
mais frequentemente adolescentes e mulheres adultas, oriundas de
capitais da região norte (Manaus, Boa Vista, Macapá, Rio Banco e
Belém) rumo à região de fronteira ou às cidades do litoral venezuelano
(Caracas, Porto La Cruz, Lechería). O aliciamento seria facilitado não
apenas pela falta de oportunidades nos locais de origem, mas também
pelo destacado envolvimento das redes de tráfico de pessoas em
território venezuelano. De acordo com relatório anual do Departamento
de Estado dos EUA, a Venezuela seria local de origem, destino e trânsito
de mulheres e crianças com o objetivo de trabalhos forçados e
exploração sexual, recebendo indivíduos da região (especialmente de
Peru, Colômbia e Brasil) e de países asiáticos. Em 2004, o país foi
rebaixado no ranking norte-americano de classificação para o combate
ao tráfico de seres humanos (Tier 3), indicando o não atendimento aos
requisitos mínimos de proteção às vítimas e a insuficiência dos esforços
governamentais para solucionar o problema (BRASIL, 2004a; USA,
2005, p. 226-7).
Pesquisas brasileiras também referem um intenso fluxo de
mulheres em direção à Venezuela para fins de exploração sexual,
indicando pelo menos dez rotas internacionais de tráfico de pessoas
(LEAL; LEAL, 2002, p. 78, 96):
Ações conjuntas para o combate ao tráfico de pessoas graçaram
durante todo o período. Em 2003, autoridades brasileiras e venezuelanas
firmaram o Pacto de Pacaraima, um acordo de cooperação bilateral para
o combate ao tráfico fronteiriço de pessoas. No ano de 2005, os países
do MERCOSUL e membros associados assinaram a Declaração de
Montevidéu contra o Tráfico de Pessoas, prevendo a cooperação policial
e o intercâmbio de informações sobre o tráfico humano, especialmente o
tráfico ligado à prostituição (USA, 2004, p. 249).
Em 2006, a Declaração de Montevidéu ganhou um significado
prático com a adoção de um Plano de Ação, que identifica pontos focais
dentro de cada governo responsável pela sua implementação e institui
campanhas informativas, troca de informações, capacitação de atores
governamentais e não-governamentais e assistência às vítimas do tráfico
de pessoas (MARREY; RIBEIRO, 2010). Em maio de 2008, realizou-se
a I Reunião de Autoridades Nacionais e Regionais entre a República
Bolivariana da Venezuela e a República Federativa do Brasil, em
Matéria de Tráfico de Pessoas, especialmente Mulheres, Adolescentes e
Crianças, primeiro encontro bilateral especificamente dedicado ao
assunto (BRASIL, 2008). Não há dados suficientes que permitam
afirmar o êxito ou o fracasso dessas iniciativas no combate ao tráfico de
pessoas.
(b) O tráfico de drogas e de armas — Na fronteira entre Brasil e
Venezuela, o tráfico de drogas e de armas está bem menos documentado
em artigos científicos, relatórios e arquivos públicos, tornando bastante
escassas e segmentadas as informações a esse respeito. Especula-se que
a natureza dessas atividades dificulte o levantamento de dados e requeira
dos agentes públicos envolvidos em seu combate um elevado grau de
sigilo. Apesar das contingências, é possível afirmar categoricamente que
ambas atividades possuem grande penetração na região. O tráfico de
armas na fronteira norte deslocaria principalmente fuzis, pistolas e
cartuchos com destino à Colômbia, passando por território brasileiro em
pelo menos três grandes rotas internacionais
(RoterdãSuriname Colômbia, PanamáParaguaiColômbia e
ChinaColômbia). Embora em menor volume, essas armas também
abasteceriam a Venezuela cruzando o território nacional (BRASIL,
2006a, p. 55-62). O tráfico de drogas na região teria como objetivo
primário a exportação de estupefacientes produzidos nos países andinos
(esp. Colômbia) para os grandes mercados consumidores dos Estados
Unidos e Europa.2 Os territórios brasileiro e venezuelano seriam
crescentemente utilizados como rota ou plataforma de exportação das
drogas, sobretudo cocaína e maconha, consolidando as redes do crime
organizado e aumentando a quantidade de drogas disponível
internamente.3
2
Sobre a origem e destino das drogas que circulam na América do Sul, o World
Drug Report da ONU argumenta que “Colombian cocaine dominates the
markets to the east of Colombia. In 2002, Venezuela reported that all cocaine
seized originated in Colombia. Brazil estimated that about 70% of the cocaine
originated in Colombia, 20% in Bolivia and 10% in Peru (2000). In Suriname
about 60% of the cocaine seized in 2002 could be traced back to Colombia, 20%
to Venezuela and 20% to Brazil. Suriname is one of the few countries in South
America where the bulk of the cocaine seized was not going to the USA (20%)
but to Europe (Netherlands 80%).” (UNODC, 2004, p. 106).
3
Informações do World Drug Report 2008: “The territory of Brazil is increasingly
exploited by international organized crime groups looking for transit points for
cocaine shipments from Colombia, Bolivia and Peru to Europe. This is likely to
have brought more cocaine to the local market.” (UNODC, 2008, p. 87).
Por outro lado, tem sido frequentes as detenções de
brasileiros envolvidos com o narcotráfico na Venezuela,
país normalmente utilizado como trânsito para chegar a
Europa e aos Estados Unidos. Recentemente, os
brasileiros detidos no Aeroporto de Maiquetia, com
cocaína em seus estômagos, iam para a Espanha via
Lisboa ou Paris, configurando-se, possivelmente, uma
nova rota de comércio de estupefacientes. Recordo que,
em anos anteriores, vários brasileiros foram presos com
entorpecentes nos Países Baixos, procedentes de Caracas,
e, invariavelmente, eram deportados para esta capital, de
onde foram repatriados para o Brasil (BRASIL, 2007e,
grifo nosso).
4
Documentos do GT de Mineração Ilegal da COBAN situam os primeiros casos
de garimpeiros brasileiros em território venezuelano em fins da década de
1980.“Los antecedentes de este Grupo de Trabajo se remontan al año de 1989,
fecha en la cual se da a conocer a luz pública, las primeras denuncias del
descubrimiento de invasiones de mineros ilegales de nacionalidade brasileña a
território venezuelano, especificamente en el Cerro Delgado Chalbaud en las
cabeceras del río Orinoco” (COBAN, 1999). Poucos anos depois (1994),
documentos da diplomacia brasileira já referiam que “milhares de garimpeiros
brasileiros (...) ingressavam clandestinamente em território venezuelano” para o
exercício da atividade (BRASIL, 1999).
mineração ilegal em território venezuelano. Tal
constatação decorre da circunstância de que cabe ao
Brasil tomar iniciativa de exercer controle efetivo
daquelas atividades em seu território, impedindo, assim,
que a persistência de incidentes na região de fronteira
venha a contaminar a agenda diplomática bilateral, com
sérios prejuízos para o relacionamento futuro entre ambos
os países (BRASIL, 1994, p. 1).
5
Em novembro de 2000, o Grupo de Trabalho organizou uma missão às áreas
afetadas pela mineração ilegal em território venezuelano. A missão foi integrada
por autoridades e técnicos da administração pública de ambos os países e serviu
para averiguar in loco os prejuízos socioambientais decorrentes daquela
atividade (INSPECCIONAN..., 2000).
6
Um relatório do corpo diplomático brasileiro, escrito logo após a VI Reunião do
GT de Mineração Ilegal, avaliava que “o problema da mineração ilegal na região
fronteiriça era particularmente sério, em virtude da presença no local de milhares
de garimpeiros brasileiros, muitos dos quais ingressavam clandestinamente no
território venezuelano para a prática de tal atividade [...]. Diferentes medidas
tema, ainda eram conhecidos sítios ativos de mineração ilegal na região
de Serra Parima, na fronte binacional, em 2000.
Em 2003, o assunto retornou à pauta bilateral em função da
“suposta ampliação da área de mineração ilegal e da consequente
degradação ambiental, com a participação de garimpeiros brasileiros, da
cabeceira do rio Orinoco, (...) Estado Amazonas, para a região do rio
Caroní, no Estado Bolívar.” (BRASIL, 2003b). Na ocasião, não foi
possível comprovar a expansão das atividades de garimpo para o norte
da fronteira comum, porém ficou claro que a mineração ilegal ainda
representava um problema que não fora devidamente equacionado. 7 Em
2005, durante o julgamento de cidadãos brasileiros acusados de garimpo
ilegal e crimes correlatos, diplomatas brasileiros puderam ter uma noção
mais clara da gravidade da situação. Constatou-se, por meio dos
depoimentos, que a mineração ilegal estaria sendo “organizada por
grupos com atuação internacional (...) com ramificações na Colômbia,
na capital venezuelana e no Brasil” e que a atividade possuiria um
sistema de organização complexo, envolvendo mineradores,
supervisores e fornecedores de serviços (alimentos, remédios e artigos
de primeira necessidade) (BRASIL, 2005d). Além disso, esses grupos
teriam à disposição equipamentos modernos como telefones satelitais e
rádios de comunicação VHF de longo alcance e teriam capacidade para
8
O relatório final da CPI das Armas, já citado anteriormente, afirma que “Lá [na
fronteira norte do Brasil] a troca é constante e realizado qualquer tipo de câmbio.
Os índios são usados por traficantes para carregarem drogas e também são
usados para exploração sexual dos comandantes das quadrilhas que atuam
naquela fronteira. E algo que chama à atenção não somente na região da
do tráfico de drogas na região, porém há evidências de que foram
bastante frequentes as apreensões de cocaína proveniente da Guiana em
portos europeus e norte-americanos no período (ADDICTED..., 2009).
Um dos principais motivos mencionados para o agravamento da
situação é a falta de policiamento na extensa faixa de fronteira
(BRASIL, 2007b); porém, também devem ser considerados o crescente
papel da região como escoadouro de drogas após o Plano Colômbia e as
limitações de ambos os Estados em se fazerem presentes na região
(BRASIL, 2004d).
9
A Política de Defesa Nacional afirma que “A garantia da presença do Estado e a
vivificação da faixa de fronteira são dificultadas pela baixa densidade
demográfica e pelas longas distâncias, associadas à precariedade do sistema de
transporte terrestre, que condiciona o uso de hidrovias e do transporte aéreo
como principais vias de acesso. Essas características facilitam a prática de
ilícitos transnacionais e crimes conexos, além de possibilitar a presença de
grupos com objetivos contrários aos interesses nacionais. (...) O adensamento da
presença do Estado, e em particular das Forças Armadas, ao longo das nossas
fronteiras, é condição necessária para conquista dos objetivos de estabilização e
desenvolvimento integrado da Amazônia.” (BRASIL, 2005j).
10
A brochura institucional do Programa Calha Norte reconhece que “Entre os
principais problemas, figura o esvaziamento demográfico das áreas mais remotas
argumento principal é que a falta de controle sobre regiões isoladas, que
inclui desprovimento de serviços públicos 12, vigilância limitada do
espaço aéreo, fronteiras desguarnecidas, baixa densidade demográfica e
condições geográficas desfavoráveis (extensão do terreno, vegetação
cerrada e abundância de hidrovias), facilitam a atuação clandestina de
grupos criminosos. Com efeito, essa situação de vulnerabilidade
contribuiu para o florescimento de atividade ilegais na fronteira comum.
O tráfico de mulheres está bem estabelecido na região norte do
Brasil, e há rotas internacionais conhecidas que conduzem mulheres e
adolescentes brasileiras para a prostituição na Venezuela e na Guiana. O
tráfico de armas e de drogas também têm raízes profundas na região.
Embora o Brasil não seja o destino principal dos itens traficados, o
trânsito dessas mercadorias pelo território nacional resultou em aumento
da oferta interna de drogas e armas, corrupção policial e fortalecimento
do crime organizado. O tráfico de drogas, por exemplo, dá indícios de
penetrar progressivamente na região, não apenas para escoar a produção
de entorpecentes como também para aproveitar o potencial de consumo
Considerações Finais
Uma análise perspectiva dessa situação, considerando as
limitações materiais e políticas dos Estados em desenvolvimento para
investir recursos em vigilância territorial em sentido amplo, sugere que
uma abordagem exclusivamente militar para os problemas
13
O World Drug Report das Nações Unidas indica o Brasil como maior
consumidor de drogas da região, porém em níveis ainda inferiores a outros
mercados consolidados como Europa Ocidental e Estados Unidos. O relatório
refere, ainda, em vários anos da publicação, um aumento generalizado no
consumo de drogas na América do Sul. “While there are indications that the
expansion of cocaine consumption is losing some of the momentum it had in the
1990s, and while traditional markets such as the USA and Mexico are
stabilizing, new markets continue to emerge. According to UNODC's Drug
Abuse Trend Index, cocaine use has increased dramatically in Southern America,
Central America and the Caribbean since 1995. Abuse levels are high and
increasing in Brazil and Colombia. There are exceptions to this trend in Bolivia
and Peru.” (UNODC, 2004, p. 51).
14
De acordo com a CPI das Armas, do Congresso Nacional brasileiro, “A
Colômbia é sempre o destino final das rotas do tráfico internacional de armas e
munições. Isto se dá em conseqüência [sic] daquele país ter os melhores e
maiores compradores de armas e munições e de ser grande fornecedora de
cocaína. As organizações paramilitares e as chamadas Forças Armadas
Revolucionárias entraram no comércio ilegal de armas e munições e fazem esta
disputa usando a cocaína como moeda de troca e de pagamento. Um exemplo
disso é o que aconteceu no município de Cucu [...], onde militares brasileiros
prenderam em flagrante os colombianos: Justo Alexander Ramirez e William
Norbey Nagles Cespedes [...]. Estes colombianos são acusados de pertencerem
às FARC” (BRASIL, 2006a, p. 61).
supramencionados é pouco efetiva. As Forças Armadas são a principal
instituição nacional encarregada de dar expressão prática à soberania
brasileira nas regiões de fronteira. Entretanto, sua presença exclusiva é
insuficiente para garantir a continuidade da presença do Estado, e a
militarização de todos os aspectos da vida civil (abastecimento,
eletrificação, arbitragem de disputas particulares, etc.) não é uma
situação desejável. Como consequência, iniciativas que gerem economia
dos recursos públicos e, desse modo, viabilizem financeira e
logisticamente o provimento de serviços públicos em zona de fronteira
são essenciais para coibir a difusão de ilícitos fronteiriços. Nesse
ínterim, abre-se espaço para as Casas de União.
As Casas de União se propõem a aumentar a presença do Estado
no território nacional de forma flexível, uma vez que preveem a
elaboração de consórcios e convênios entre os diversos entes da
federação (municípios, estados e União), garantindo a capilarização da
administração das políticas públicas no médio e longo prazo. Isso busca
evitar que a cooperação internacional e/ou subnacional se perca no
decorrer do tempo. Ao mesmo tempo em que viabilizariam a
implementação de políticas públicas eficientes, as Casas de União
propõem uma atuação com economia de recursos, já que dentre seus
princípios incluem-se a gestão associada e o Federalismo Cooperativo.
Assim, maior presença do Estado se daria também pelo
compartilhamento de instalações físicas e servidores entre os entes da
federação brasileira.
As Casas de União facilitariam o controle das fronteiras
brasileira, seja com Venezuela, Guiana, ou qualquer outro Estado sul-
americano, tanto pela maior presença e atuação do Estado brasileiro,
quanto pela inclusão social. No decorrer da pesquisa, fez-se claro que as
regiões atingidas pelos diversos tipos de ilícitos transnacionais carecem
de serviços básicos como educação, saúde, saneamento e trabalho
formal. Implica entender que a baixa qualidade de vida das zonas de
fronteira assegura um ambiente propício à proliferação desses ilícitos.
Assim, uma política para a região demanda não somente a cooperação
entre os Estados sul-americanos, mas também a administração dessa
cooperação pelos entes subnacionais, o que garantiria maior acesso das
populações locais a serviços fundamentais. De tal forma que as Casas de
União podem somar-se aos esforços do Estado para fazer frente aos
desafios das regiões de fronteira: a permeabilidade das fronteiras, a falta
de policiamento em sua extensão, a escassez de dados sobre os ilícitos
transnacionais, a percepção de omissão do Estado brasileiro, a falta de
controle sobre as zonas de fronteira e o desprovimento de serviços
públicos à população local.
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Introdução
Este trabalho apresenta um panorama econômico, político e
social da Bolívia com especial ênfase no movimento separatista
nucleado no país. Destaca condicionantes históricos bem como as
principais características do separatismo boliviano. A seguir, analisa as
principais implicações que esse movimento pode gerar para o Brasil em
caso de uma escalada do conflito. Por fim, evidencia a iniciativa das
Casas da União e seu potencial como uma ferramenta institucional capaz
de aumentar eficácia, eficiência e efetividade das ações governamentais.
O Separatismo Boliviano
A Bolívia é um dos países mais pobres da América do Sul, o que
pode ser observado a partir do exame de alguns indicadores
socioeconômicos. Por exemplo, embora a porcentagem de pobreza
apresente tendência de queda desde 2004, quase dois terços da
1
Este artigo é baseado na dissertação de mestrado apresentada em 2010:
SEBBEN, Fernando D.O. Bolívia: Logística Nacional e Construção do Estado.
PPG em Ciência Política. UFRGS, 2010.
população ainda vive abaixo da linha da pobreza.2 Ademais, cerca de
70% do trabalho ocorre em condições de informalidade (CUNHA, 2004,
p. 13).3 Um terço da população vive em comunidades com 250 pessoas
ou menos, ao passo que metade da população está concentrada nas
cidades de La Paz, Cochabamba e Santa Cruz (VAN COTT, 2000, p.
333).4 Estima-se que três milhões de bolivianos não têm acesso à
eletricidade e, no inverno, usam lenham para aquecer-se. Também é
notável a ausência de infraestrutura e de saneamento básico, como rede
de esgotos e de água tratada.5 Verifica-se que a pobreza e a indigência
são de 50 a 100% maiores entre a população rural (CUNHA, 2004, p.
14). Segundo Gustavo Saavedra, ex-embaixador da Bolívia no Brasil,
“no mundo andino, viver nas zonas rurais equivale a viver na miséria.
Na Bolívia, 95% da população rural sobrevive abaixo da linha da
pobreza” (SAAVEDRA, 2004:99).
Em termos políticos, a Bolívia apresenta-se historicamente
marcada por violência social e instabilidade. Durante o século XX, teve
a média de um presidente a cada dois anos. Segundo Hofmeister (2004,
p. 273), foram mais de 200 golpes e trocas de governo com uso da força.
A pesquisadora Donna Lee Van Cott registra mais de 190 tentativas de
golpe desde a independência (VAN COTT, 2000, p. 331). Houve
intervenções militares frequentes durante a segunda metade do século
XX. De 1952 a 1982, por exemplo, houve 20 governos, apenas seis
constitucionais (SANTORO, 2007, p. 32). Para Guimarães, Domingues
e Maneiro (2005, p. 11), “A história da Bolívia independente evidencia
uma instabilidade quase sem paralelo internacionalmente. A república
conheceu mais golpes militares que aniversários em sua existência”.
2
Segundo Taborga, a pobreza afeta 76% da população e a extrema pobreza 50%
(TABORGA, 2005, p. 9). Ainda segundo o autor, um a cada quatro bolivianos
reside no exterior (TABORGA, 2005, p. 17).
3
Alguns autores chegam a afirmar que cocaína é a principal fonte de renda do
país, sendo responsável por uma renda anual de mais de meio bilhão de dólares
(VAN COTT, 2000, p. 346).
4
População total da Bolívia: nove milhões. La Paz (incluindo El Alto) —
1.4436.000. Santa Cruz de la Sierra a — 1.135.00. Cochabamba — 517.000.
Somando a população das três cidades, tem-se um total de cerca de três milhões,
ou seja, cerca de um terço da população nacional (cf. JANE'S, 2008).
5
Além disso, a Bolívia não é autossuficiente em comida (JANE'S, 2008).
Para além desse quadro social, econômico e político crítico,
existe na Bolívia um movimento separatista com diversas implicações
estratégicas. No país, os anos 2000 foram marcados por uma ampliação
da desigualdade de renda entre uma elite exportadora das terras baixas e
os indígenas pobres do altiplano (VAN COTT, 2000, p. 348).
Impulsionado pelo crescimento econômico do período, o movimento
separatista da região da Meia-Lua ressurgiu com força. Trata-se de uma
reemergência, visto que o movimento tem suas raízes na própria origem
do Estado boliviano. A clivagem étnica, econômica e social adquiriu
contornos políticos. As diferentes demandas regionais polarizaram-se e
os grupos sociais passaram a “se enfrentar cara a cara”, nos termos de
Huntington (1975, p. 208). Proliferam-se as demandas por maior
autonomia, seja ela de indígenas ou dos cambas6. Instaurou-se uma crise
de hegemonia e o Estado fragmentou-se, processo galvanizado pela
inédita chegada à presidência de um indígena, Evo Morales, em 2006.
A reemergência do separatismo foi protagonizada pela região da
Media Luna. A Meia Lua é composta pelos departamentos de Santa
Cruz de la Sierra, Beni, Pando e Tarija. A região é responsável por 80%
do PIB boliviano, corresponde a quase dois terços do território e abriga
cerca de 58% dos quase dez milhões de bolivianos (MALAMUD;
ENCINA, 2008). A região da Meia Lua, além de sediar a produção de
gás, também conta com recursos madeireiros e uma pujante produção de
soja, liderada tanto por grandes produtores do oriente boliviano quanto
por ruralistas brasileiros, os quais aproveitam o relativo baixo preço do
hectare e uma oferta de terras pouco explorada. 7 Outros departamentos
bolivianos, como La Paz, Oruro e Potosí apresentam condições muito
mais precárias. Potosí e Chuquisaca apresentam níveis de renda e
desenvolvimento humano semelhantes aos da África Subsaariana
6
Camba é o termo utilizado para se referir à população da Meia-Lua, situada no
Oriente boliviano. Trata-se de uma construção sociológica, baseada em aspectos
culturais da região. Para mais detalhes, conferir a descrição a seguir.
7
Cerca de 200 mil brasileiros residem na Bolívia, a maior parte envolvida na
produção de soja da região oriental (SANTORO, 2007, p. 15). Não obstante, a
maior comunidade de emigrantes bolivianos no mundo está na Argentina
(VIZENTINI, 2004, p. 378).
(Cunha, 2004:14). Por outro lado, na região da Meia-Lua vivem aqueles
que se autodenominam cambas; no altiplano, residem os kollas.8
É comum a crença de que Evo Morales constitui um fator de
desestabilização na Bolívia e na América do Sul. Todavia, foi eleito com
53,7% dos votos em dezembro de 2005, na eleição com maior
participação eleitoral da história boliviana (84,51% dos eleitores
habilitados) (CÂMARA, 2007, p. 65). Morales foi referendado em 2008
por mais de 67% dos eleitores que o confirmaram no cargo, em um
processo cuja correção e legitimidade foram ressaltadas pelos
observadores internacionais e pela Organização dos Estados Americanos
(OEA). Ademais, em 2009 não só logrou aprovar o projeto Constituição
da coalizão que representava, com cerca de 60% dos votos, como
também venceu o opositor Manfred Reyes com 63% dos votos.
Portanto, o veredicto do próprio povo boliviano parece contrastar com
aquele conferido a Evo pelo senso-comum brasileiro e até mesmo por
parcelas da mídia nacional.
Além dos quatro departamentos da Meia-Lua, Chuquisaca e
Cochabamba também somaram vozes nos pedidos por mais autonomia
por algum tempo. Cochabamba ensaiou um alinhamento às demandas
autonômicas por meio da figura de seu ex-prefeito Cap. Manfred Reyes
Villa 9, um dos principais opositores de Evo Morales, derrotado nas
eleições de 2009. A pressão de movimentos sociais, todavia, acabou
resultando na perda do mandato de Villa no referendo revogatório de
8
A população boliviana é formada por 35% de indivíduos descendentes do grupo
Quéchua e 25% do grupo aymara (VAN COTT, 2000, p. 333), o que resulta em
mais de 50% do total da população como descendente de indígenas. De uma
população de cerca de 10 milhões, 2,1 milhões falam quéchua e dois milhões
aymara; porém, a grande maioria também fala espanhol. A pluralidade de grupos
sociais tem sido utilizada pelas elites para justificar uma “fraqueza originária”,
um “defeito congênito” que impediu a Bolívia de ganhar guerras contra seus
vizinhos (cf. WASSERMAN, 2004, p. 320).
9
Manfred Reyes Villa é ex-militar formado na Escola das Américas, no Panamá,
quando era chefe de segurança na ditadura do general Luís Garcia Mesa Tejada
(1980-1981) (cf. BANDEIRA, 2007). Destaque na política boliviana, em 2002
obteve o terceiro lugar nas eleições presidenciais, com 20% dos votos
(HOFMEISTER, 2004, p. 301).
2008.10 De Chuquisaca, a governadora Savina Cuellar exerceu forte
oposição ao governo. Ex-membro do MAS, elegeu-se com apoio dos
votos da capital (Sucre), posto que nas áreas rurais o candidato
governista teve votação superior.
A elite de Santa Cruz de la Sierra, centro político do separatismo,
depende historicamente dos incentivos governamentais da Bolívia 11.
Desde a década de 1950, parte significativa dos excedentes tributados a
partir das atividades de mineração, comércio e indústria foram aplicados
no desenvolvimento do Oriente boliviano. Tanto regimes autocráticos
quanto democráticos investiram na infraestrutura da região, construindo
ferrovias, rodovias e investindo maciçamente no agronegócio
(BARRIENTOS, 2008). Isenções tributárias e facilidade de crédito
impulsionaram o crescimento da região.
Segundo Bernardo Barrientos (2008), o montante de subsídios à
atividade de soja representa 40% do valor total das exportações do
produto que, segundo o autor, foram de cerca de 470 milhões de dólares
em 2007. Ainda de acordo com o economista boliviano, “enquanto a
superfície dedicada à produção de soja cresceu 94% entre os triênios
1994-1996 e 2004-2006, registrou-se simultaneamente um declínio de
14% no rendimento da produção” (BARRIENTOS, 2008). Verifica-e,
portanto, que a expansão da produção é acompanhada de uma queda da
produtividade da commodity.
Ademais, é preciso ressaltar que a produção de soja do Oriente
boliviano é extremamente dependente das preferências tarifárias da
Comunidade Andina. Não fosse o mercado do bloco (Peru, Equador,
Colômbia)12, a economia local dificilmente resistiria à competição das
10
Antes da consulta, ocorreram vários choques entre manifestante pró-MAS,
revoltados contra a ideia de Villa promover separatismo, e a favor do prefeito, o
que resultou em alguns mortos e centenas de feridos.
11
A cidade de Santa Cruz de la Sierra é a capital do departamento Santa Cruz.
12
A Venezuela anunciou sua formalmente sua saída da Comunidade Andina em
2006, passando a pleitear seu ingresso no Mercosul, do qual se tornou parte em
2012. Todavia, firmou naquele mesmo ano, juntamente com Bolívia e Cuba, o
Tratado de Comércio dos Povos (TCP), pelo qual se comprometeu a comprar
regularmente a soja boliviana. Por meio da adesão a este tratado, a Bolívia
passou a fazer parte também da ALBA (Alternativa Bolivariana para as
produções da Argentina e do Brasil, com melhores solos e maior nível
de mecanização (BARRIENTOS, 2008).
Na prática, configura-se uma elite rentista (dependente dos
incentivos governamentais), com latifúndios de produção pouco
competitiva e uma estrutura de poder oligárquica.13 A ascensão desta
elite acabou resultando na polarização do país, marcada por conflitos
entre grupos sociais, notadamente a referida elite oriental e partidários
do governo do MAS (movimentos indígenas, sindicatos, operários, etc.).
No Oriente boliviano, encontra-se, pois, um setor rural pré-
moderno que apresenta uma elite tradicionalmente dependente do
Estado mais um sem número de camponeses sem-terra e miseráveis, o
que contribui para que o país seja um dos mais pobres da América do
Sul. Como resposta à ideia de Estado plurinacional, a elite da Meia Lua
lançou mão de uma estratégia bidimensional: tentou aumentar seu poder
de barganha enquanto consolidava o separatismo. Língua e etnicidade
são critérios mutáveis, opacos, vazios (HOBSBAWM, 1991:15), mas,
no caso da Meia Lua, foram instrumentalizados de acordo com o
interesse econômico do gás. O critério de abrangência da nação foi
moldado de acordo com o interesse da elite local. Neste caso,
manipulou-se e projetou-se a identidade em torno de um conflito, o que
também contribuiu para aumentar a coesão social do grupo reclamante.
Ser cruceño tornou-se um privilégio de poucos escolhidos.
Na arena legislativa, o governo parece disposto a negociar e fazer
concessões. Todavia, caso a negociação fracasse e ocorram novos atos
de violência, pode ter início uma espiral de violência de difícil
estabilização. Há, na Bolívia, uma inversão da expressão de O’Donnell.
Na concepção do cientista político argentino, havia nos EUA manchas
14
Fenômenos que indicam, em geral, a ausência de governo, tanto em termos de
proteção legal como de prestação de serviços. Por exemplo, o desemprego
estrutural, a subclasse, as minorias excluídas, as migrações, os riscos de anomia.
15
Segundo Carra (2008, p. 120), “O aproveitamento das reservas (ou introdução)
de gás natural na matriz energética faz parte dos planos de todos os países da
América do Sul. Ainda segundo o autor, o Chile importa quase todos os
hidrocarbonetos de que necessita” (CARRA, 2008, p. 132).
aliás, a defesa universal dos movimentos separatistas.16 Entretanto, há
uma clara deturpação da ideia. Aqui vale retomar o estudo de Charles
Tilly, demonstrando a diferença entre Estado nacional e Estado-nação e
ressaltando a real existência de poucos casos deste último:
16
No Brasil, por exemplo, há o Movimento Pampa (que busca a restauração da
República Rio-Grandense) ou, em uma versão mais “includente”, abrangendo
Santa Catarina e Paraná, o movimento “o Sul é o meu país”. Outros movimentos
separatistas no Brasil são o Movimento São Paulo Independente (MSPI), e o
Movimento República de São Paulo (MRSP). Cf. http://www.patria-sulista.org/;
http://www.pampalivre.info/; http://www.mspi.cjb.net/; http://mrsp.110mb.com/
(Último acesso para todos: 29/07/2009).
A reemergência do movimento separatista gera problemas de
segurança regionais. Grupos mais radicais, como o Nación Camba,
deixam de formular suas preferências por meio de instituições e passam
a usar a coerção. O fenômeno guarda alguma semelhança com o
pretorianismo (HUNTINGTON, 1975): há uma politização geral da
sociedade, cujos agentes passam a atuar de forma direta, não mediada,
em um contexto de sobrecarga de demandas. Entretanto, o conceito não
se aplica simetricamente ao caso boliviano: o descompasso entre
modernização econômica e política não trouxe como resultado, no
contexto atual, intervenção das Forças Armadas. Ademais, não se
verifica na Bolívia ausência de instituições ou incapacidade para criá-las
(características típicas da sociedade pretoriana).
Na Bolívia, há instituições políticas e elas continuam a surgir. Há
intensa participação, seja no altiplano seja no oriente, mas reduzido grau
de intermediação e de moderação entre as demandas dos grupos. “As
forças sociais se enfrentam cara a cara” (HUNTINGTON, 1975, p. 208).
Entretanto, algumas delas (os grupos radicais) recorrem ao uso da força
e, até mesmo, à contratação de mercenários estrangeiros. Estes grupos
possuem poder de conexão com outros Estados e grupo sociais de outros
países, o que impacta diretamente na questão da segurança regional.
Conforme ressalta Antonio Mitre (2008, p. 82), “[e]sse quadro,
assombrado pelas eclosões de racismo, pode degenerar em conflito
aberto e guerra”. Não tendo suas demandas atendidas, recorrem à
destruição do Estado boliviano (tomadas de prédios públicos, greves,
manifestações violentas). Existe, portanto, um problema se segurança
regional que pode afetar o Brasil e, em especial, a região de fronteira
com a Bolívia.
17
Cerca de 80% da produção boliviana de narcóticos passa pelo Brasil e vai para a
África, chegando, finalmente, até a Europa, seu mercado final (JANE'S, 2008).
18
Os dados referem-se ao período de 2002 a 2006. As cidades são: Colniza (2º),
Itanhangá (3º) e Juruena (8º). Suas taxas de homicídio são, respectivamente:
106,4; 105,7; 91,3 (número por 100 mil habitantes) (cf. WAISELFISZ, 2008).
Restaria a Brasil e Argentina o papel de mediadores. Nesse
sentido, a hipótese de guerra local representa tanto uma ameaça à
unicidade da Bolívia quanto ao projeto de integração regional
pretendido pelo Brasil. A possibilidade de divisão da região boliviana
poderia levar à conflagração alianças rivais entre os países sul-
americanos: em síntese, liberais e separatistas de um lado, e
desenvolvimentistas e integracionistas de outro. Ademais, conforme se
afirmou, o separatismo da região da Meia Lua traz várias implicações à
segurança da América do Sul, dado o risco do estabelecimento do tráfico
de drogas, armas e pedras preciosas.
Este ponto de vista é corroborado por Francisco Teixeira da Silva
(2008, p. 53), para quem, “o movimento autonomista denominado
Nación Camba representa, ao nosso ver, o maior risco real e concreto
para a segurança hemisférica no momento” (TEIXEIRA DA SILVA,
2008, p. 53).
O problema do separatismo na Bolívia, embora tenha passado à
resolução institucional, não parece de todo solucionado. Em abril de
2009, a polícia boliviana efetuou uma operação em que matou três
mercenários e prendeu outros dois em Santa Cruz de la Sierra.19 Em
uma entrevista à televisão húngara (BOLÍVIA OPINA, 2009) antes de
viajar à Bolívia, o líder do grupo, Eduardo Flores, sabendo que sua vida
estaria em risco, contou que fora chamado por bolivianos para
estabelecer um sistema de milícias a fim de defender a região Oriental
da Bolívia. Por mais que Flores tenha argumentado que o propósito
19
Seu líder, Eduardo Rózsa-Flores, boliviano nascido em Santa Cruz de la Sierra,
serviu na Guarda Nacional Croata durante a década de 90 em meio à guerra civil
na Iugoslávia. Os outros dois óbitos foram Árpád Magyarosi, húngaro, e
Michael Martin Dwyer, irlandês. Foram presos Mario Tadic, croata, e Előd
Tóásó, húngaro. Dentre as várias acusações, descobriu-se que os cincos tinham
um plano para assassinar o presidente Evo Morales. Seriam apenas uma célula
de um grupo muito maior que envolveria, por exemplo, dois generais; o
governador da província de Santa Cruz, Rubén Costas; o ex-presidente do
Comitê Cívico, Branco Marinkovic; Guido Nayar, pecuarista da mesma região e
ex-ministro de Governo do ditador Hugo Bánzer.
dessas milícias era estritamente defensivo, é sempre preocupante que a
política continue por outros meios, neste caso, a guerra — segundo a
máxima de Clausewitz (2003, XCI).
De um modo geral, verifica-se que as diversas ameaças
ocasionadas pelo separatismo boliviano impactam o Brasil, em especial
suas regiões de fronteira. Portanto, faz-se necessário ampliar a presença
do Estado na região Centro-Oeste e na Amazônia, para o que a
iniciativa das Casas da União tem papel fundamental.
1
Estes processos são extremamente úteis para assegurar a segurança alimentar em
regiões que dependem, muitas vezes, da pesca de peixes cuja disponibilidade
varia enormemente ao longo das estações do ano, em função das grandes
oscilações do clima e do fluxo dos rios.
dos quais 46 países apresentam mais de 50% da população sem
eletricidade e 38 países tem mais de 80% sem acesso à energia elétrica
(UNDP; WHO, 2009, p. 13-14).
A disponibilidade de energia elétrica abundante e barata é, neste
contexto, vital para viabilizar o desenvolvimento de atividades
industriais, que vão desde a industrialização de produtos primários
típicos de determinada região até a produção de bens intensivos em alta
tecnologia. As implicações para o Brasil, assim como para a América do
Sul e América Latina são significativas: infelizmente, a realidade de
grande parte das fronteiras brasileiras com seus vizinhos sul-americanos
é de profundas deficiências ou mesmo a completa ausência de
infraestruturas críticas essenciais, como saneamento básico, energia
elétrica e de comunicação. Ao todo o Brasil tem mais de 15 mil
quilômetros de fronteiras, sendo que temos 588 municípios localizados
em 11 estados diferentes, especificamente na faixa de fronteira (de 150
quilômetros a partir da linha de fronteira).
Nota-se no Mapa 2 que, na faixa de fronteira, a maior parte das
cidades e aglomerações urbanas estão concentradas próximas às
fronteiras do Brasil na Região Sul. Essa é a região fronteiriça mais
desenvolvida e integrada aos países vizinhos, onde destacam-se
fronteiras com países membros-fundadores do Mercosul.
Comparativamente, rumo ano norte, na região Centro-Oeste, nota-se que
a malha urbana vai tornando-se progressivamente mais rarefeita. No
norte da Amazônia, temos uma densidade urbana ainda mais reduzida,
com o número de cidades próximas à faixa de fronteira tornando-se
perigosamente rarefeito. Consequentemente a infraestrutura que integra
estas cidades à malha urbana nacional é, em muitos casos, insignificante
ou até mesmo, inexistente.
Algumas dessas cidades de fronteira têm cidades gêmeas, o que
se sobressai também nas fronteiras com os países membros-fundadores
do Mercosul, onde temos várias cidades gêmeas, algumas das quais
parcialmente ou totalmente conurbadas. Essas regiões conurbadas estão
entre as mais estratégicas do ponto de vista do aprofundamento da
integração regional; muitas vezes, as cidades de fronteira são separadas
apenas por ruas ou pontes sobre rios. Estas são fronteiras extremamente
porosas; na prática, temos cidades funcionando como efetivas áreas de
livre circulação de pessoas e de livre comércio no nível local. Os
moradores dessas cidades gêmeas muitas vezes trabalham ou estudam
em um lado da fronteira e são residentes no outro, fazendo compras e
utilizando serviços públicos dos dois lados da fronteira. Apesar de todas
as deficiências de infraestrutura, os residentes dessas regiões muitas
vezes vivenciam a integração regional no dia a dia como algo real e
consolidado. São áreas críticas para a ampliação da infraestrutura da
integração regional, para o aprofundamento do turismo e da livre
circulação de pessoas, e, especialmente, para a consolidação de cadeias
produtivas integradas, com capacidade para gerar emprego e renda de
ambos os lados da fronteira.
O Brasil tem ao todo 15.179 km de fronteiras, sendo que as
maiores fronteiras, algumas das quais consideradas as mais críticas,
estão ligadas à Amazônia sul-americana, onde estão 11 mil km das
fronteiras brasileiras. Nossa maior fronteira, a Brasil-Bolívia, tem 3,4
mil km e é uma fronteira vital para o Brasil e para a Integração Sul-
Americana (SEBBEN, 2010; 2014).
A título de comparação, 3 mil quilômetros de comprimento
equivale à fronteira dos Estados Unidos com o México. Contudo, apesar
de os Estados Unidos serem a maior potência militar e econômica do
mundo, estes têm tido algumas dificuldades para controlar efetivamente
esta fronteira com o México, mesmo sendo formada por vastos desertos
e rios com perigosas corredeiras; é uma fronteira extremamente
militarizada, com uma verdadeira muralha de paredes, muros, sensores,
câmeras eletrônicas, vigilância via satélite vigiando em toda a região e
uma elevada densidade de diferentes tipos de forças policiais dos dois
lados da fronteira.
Em comparação, a fronteira dos Estados Unidos com o Canadá
que tem mais de 6,4 mil km contínuos, equivalendo à soma das
fronteiras do Brasil com a Bolívia, o Peru e a Guiana Francesa.
Somando-se a fronteira do Canadá com o Alasca temos mais 2,4 mil km,
quase o tamanho da fronteira BrasilVenezuela (2,2 mil km). Enquanto
a fronteira EUA-México tem 3.141km, a soma das fronteiras
descontínuas dos EUA com o Canadá totalizam 8.891km. Apesar disso,
a fronteira dos Estados Unidos com o Canadá não é militarizada, não
apresenta muros, nem alta densidade de forças policiais, posto que não é
considerada um problema de segurança para os Estados Unidos: não
apresenta problemas de tráfico de drogas e armas do Canadá para os
Estados Unidos, nem fluxos de imigrantes ilegais canadenses.
Estes são alguns dos indícios de que o tamanho das fronteiras não
é necessariamente fonte de problemas, e que a insegurança advém de
outros fatores. Essa é uma constatação importante, pois a economia
canadense é extremamente integrada à economia estadunidense: 90% do
comércio do Canadá é com os Estados Unidos, as cadeias produtivas
dos dois países são altamente integradas, assim como suas
infraestruturas logística e energética. O Canadá é o maior fornecedor de
energia para os EUA, somando-se combustíveis, petróleo, gás e
eletricidade. A migração predominante é no sentido inverso, pois os
americanos migram mais para o Canadá do que os canadenses para os
EUA. Isto ocorre porque as condições de vida são melhores no Canadá,
os indicadores sociais são melhores, os índices de violência são
menores, o sistema de previdência pública e os serviços públicos básicos
(saúde e educação), são muitas vezes melhores do que os similares nos
EUA, e, até mesmo o consumo de energia per capita no Canadá é
superior ao dos EUA.
Este é um ponto crítico, pois demonstra duas estratégias
diferentes que os EUA adotaram ao longo do século XX para suas
fronteiras. A estratégia foi de integração com o Canadá e fechamento da
fronteira com o México, visto como um risco ou ameaça histórica.
Enquanto a integração com o Canadá vem se aprofundando ao longo do
século XX, e os EUA aparecem como os maiores investidores no país
desde a II Guerra Mundial, a estratégia para o México foi de integração
econômica mínima, adotando-se uma política de isolamento e
recrudescimento da fronteira, percebida historicamente como fonte de
problemas. O resultado destas duas estratégias é bastante claro: a
fronteira com o México é percebida como um problema geopolítico e
fonte de insegurança, enquanto a fronteira com o Canadá é cada vez
mais aberta e integrada.
Esta comparação é relevante, pois apresenta implicações bastante
complexas para a Grande Estratégia Brasileira e, especificamente para a
Política Externa brasileira para a América do Sul e para a Integração
Regional sul-americana. A sociedade brasileira e os tomadores de
decisão ainda não têm uma visão clara sobre o perfil de entorno
estratégico que queremos ter, nem sobre como trataremos nossas
fronteiras e nossos vizinhos. Ainda não é consensual a importância da
integração regional sul-americana, nem a disposição do Brasil para arcar
com seus custos no presente momento. Afinal, que perfil de fronteiras o
Brasil pretende constituir nas próximas décadas?
Se considerarmos as projeções do Goldman Sachs (O’NEILL,
2001; 2012), o Brasil será a 4ª maior economia do mundo até 2050.
Entre 2040 e 2050, o país estará disputando com o Japão o posto de 4ª
ou 5ª maior economia do mundo. Assim, considerando um cenário para
2050, por exemplo, podemos imaginar basicamente dois tipos de
fronteiras, dependendo dos rumos da Integração Regional Sul-
Americana. Caso a integração regional não tenha prioridade, corremos o
sério risco de crescer desconectados dos países vizinhos; de chegarmos
em 2050 como uma espécie de “ilha de riqueza” cercada de Estados
pobres e desiguais ou países com grandes e problemáticos bolsões de
pobreza. Neste cenário, esses países tornar-se-ão progressivamente
instáveis, podendo se tornar fontes de todo tipo de insegurança para o
Brasil.
Os riscos tornam-se elevados considerando a instabilidade
internacional e a competição inter-regional, tendo em vista que grandes
potências extrarregionais poderão explorar a pobreza e as desigualdades
dos nossos vizinhos para dividir e desestabilizar toda a região, com
impactos seriamente negativos para o Brasil – o risco que representará
uma guerra civil em um ou mais países vizinhos, com o surgimento de
facções de insurgentes armados ou terroristas financiados e armados por
potências extrarregionais é evidenciado por Sebben (2009; 2010; 2014).
Se hoje tal cenário se mostra “altamente” indesejável, dentro de poucas
décadas suas consequências poderiam inviabilizar definitivamente as
perspectivas de integração regional e de uma inserção internacional mais
soberana e autônoma do Brasil e da América do Sul no cenário
internacional.
No cenário inverso, o Brasil poderá priorizar a integração
regional nas próximas décadas, irá ver seus vizinhos como aliados, arcar
com os custos da integração da infraestrutura, de cadeias produtiva e
comercial que favoreça esses vizinhos. Neste cenário o Brasil poderá
integrar progressivamente esses países a sua economia, suas cadeias
produtivas; o crescimento brasileiro poderá favorecer a expansão do
mercado de trabalho, através da geração de emprego e renda e,
subsequentemente, ampliar o mercado consumidor dos nossos vizinhos.
Esta estratégia, apesar de representar custos no curto prazo, tem o
benefício de incalculáveis retornos no longo prazo, posto que a melhoria
das condições de vida e do poder aquisitivo dos países sul-americanos
significará ganhos para todos, inclusive para o Brasil.
Destarte, o Brasil enfrenta hoje um problema prático para
resolver no curto prazo, na medida em que temos fronteiras onde a
presença do Estado é bastante reduzida, a infraestrutura é insuficiente e
a integração com os vizinhos é insignificante. São fronteiras que
mostram-se absolutamente porosas, muitas das quais estão se tornando,
lentamente, fontes de problemas e insegurança. É inviável que a
militarização dessas fronteiras, por si só, resolva algum problema de
longo prazo.
Nas nossas fronteiras do Centro-Oeste e da Amazônia, muitas
vezes, os marcos de fronteiras estão dentro de vilas ou pequenas
aglomerações urbanas, ou dentro de propriedades rurais em que o
proprietário é dono de terras de ambos os lados. Neste contexto destaca-
se que o Brasil tem tido dificuldades reais para controlar, por exemplo,
até mesmo o fluxo de gado nas suas fronteiras com a Bolívia, ao longo
das últimas décadas. A solução para controlar a febre aftosa,
inicialmente adotada pela Secretaria da Agricultura e Pecuária do Mato
Grosso, e hoje adotada pelo MAPA, Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento, foi de vacinar gratuitamente o gato boliviano.
Vacinamos o gado boliviano para controlar a febre aftosa do lado
brasileiro da fronteira, pois o gado transita o tempo todo entre os
dois lados. Se não conseguimos controlar o fluxo de gado com países
vizinhos, é possível imaginar o quão catastrófico podem vir a ser os
efeitos de uma possivelmente longa, sangrenta e fratricida guerra civil
em um de nossos vizinhos.
A principal lição que podemos tirar da análise destes cenários é
que a estabilidade social, política e econômica dos nossos vizinhos
interessa, e muito, ao Brasil. No curto e médio prazos, tal estabilidade é
fundamental para evitar cenários de guerra civil ou de guerra entre dois
ou mais países vizinhos, que nos afetariam diretamente. No longo prazo,
é central para garantir a questão da estabilidade do continente sul-
americano e as perspectivas de crescimento e desenvolvimento
socioeconômico do Brasil e de toda a região, progressivamente mais
integrada.
O planejamento desta integração precisa levar em consideração as
diferenças regionais,pois enquanto em alguns lugares as fronteiras são
quase desabitadas, em outros, identificamos formações urbanas que
permitiram caracterizar essas fronteiras como zonas metropolitanas
fronteiriças. Considerando, por exemplo, a região da tríplice fronteira
Foz de IguaçuCiudad Del EstePorto Iguaçu, que tem quase 800 mil
habitantes, mais as cidades próximas, num raio de 150 km, pode ser
considerada uma zona metropolitana em formação, com mais de 1
milhão de habitantes. A tríplice fronteira conta com a maior ponte entre
Brasil e Paraguai, a Ponte da Amizade, além de três aeroportos
internacionais. Nela também está localizada a maior hidrelétrica do
mundo; a primeira hidrelétrica binacional e marco símbolo da integração
energética regional, assim como um dos maiores polos turísticos do
Brasil: a Hidrelétrica de Itaipu, em Foz do Iguaçu. Essa região possui
um potencial enorme de desenvolvimento, está localizada no centro da
Bacia do Paraná e no centro do Aquífero Guarani – se os cálculos
estiverem certos a respeito do Aquífero, não é só um dos maiores do
mundo em volume de água potável, mas também pode ser uma das
maiores reservas mundiais de deutério2. Contudo, mesmo com toda a
infraestrutura de pontes, aeroportos, hidrelétricas e portos secos, existe
2
O deutério é considerado um dos mais prováveis combustíveis para viabilizar,
no futuro, a fusão nuclear, caso esta se torne técnica e economicamente viável.
uma imensa demanda reprimida por outras formas de infraestrutura; de
portos, canais e eclusas, passando pelo saneamento básico, o transporte
público, a habitação, até serviços públicos federais de saúde e educação.
Só muito recentemente, em 2010, foi instalada a primeira Universidade
Federal nessa região3. Também verifica-se grande demanda por novos
hospitais na região, na medida em que, muitas vezes a população de um
lado atravessa a fronteira para ser atendida em hospitais do outro lado.
Observando retrospectivamente, nota-se o quão central foi até
agora a construção de infraestrutura para o desenvolvimento desta
região. Antes da construção da Ponte da Amizade, Foz do Iguaçu e
Ciudad del Leste, tinham cerca de 30 mil habitantes cada uma.
Cinquenta anos depois, a região tem 1 milhão de habitantes e é um polo
econômico e comercial significativo. Nesse sentido, a visão que
estabelecemos de uma fronteira mostra-se crítica: se vista como uma
barreira, vai continuar sendo uma fronteira tradicional; mas, se for
tratada como um vetor da integração regional pode tornar-se fonte de
riqueza e desenvolvimento. Para que isso se concretize, é necessário
também superar a visão tradicional e simplista da integração regional,
entendida apenas como integração comercial. É fundamental repensar a
integração regional e incorporar os desafios da integração na esfera da
política e das instituições; da integração da infraestrutura ou da
integração no campo da segurança e da defesa.
Portanto é pertinente destacar as peculiaridades dos desafios e
perspectivas de desenvolvimento e integração de cada região e sub-
região das nossas fronteiras. Afinal, se o acesso à energia elétrica está
praticamente resolvido na fronteira sul do país, na fronteira norte ainda é
um desafio a ser superado. Enquanto algumas regiões têm potencial para
sustentar atividades industriais complexas e centros de pesquisa,
gerando empregos qualificados para técnicos, engenheiros e
pesquisadores de todo tipo, outras regiões não possuem qualquer tipo de
infraestrutura; encontram-se sem acesso adequado a eletricidade, sem
internet e, portanto, sem bancos ou serviços públicos modernos; as
3
A Universidade Federal da Integração Latino-Americana, UNILA.
comunidades locais vivem em uma situação de absoluta subsistência,
muitas vezes dependendo essencialmente dos gastos locais do soldo da
tropa de um pelotão de fronteira.
No entanto, quando debatemos um macroprojeto de
desenvolvimento para a imensa região da Amazônia, é necessário
incorporar a diversidade de realidades das fronteiras e das zonas do
interior, muitas vezes isoladas de grandes metrópoles como Manaus ou
Belém. Para efetivamente implementar projetos de desenvolvimento e
integração regional que incorporem as fronteiras amazônicas, é
necessário, por exemplo, considerar a necessidade de constituir
mecanismos de desenvolvimento sustentável que favoreçam a
urbanização e industrialização, em sinergia com o combate ao
desflorestamento e desmatamento predatórios. Por isso, compreender as
causas do desmatamento pode se mostrar central para debater as
soluções de desenvolvimento mais sustentáveis para cada região da
Amazônia. Por exemplo, se considerarmos os dados das últimas
décadas, podemos verificar que a construção de cidades, estradas,
hidrelétricas e atividades de mineração e indústria, somadas,
corresponderam a apenas 0,8% das causas de desmatamento. Em
contrapartida, cerca de 75% das terras já desmatadas da Amazônia são
utilizadas para diferentes formas de pecuária, agricultura (comercial e de
subsistência) ou agropecuária (TERRACLASS, 2011). Portanto, para
que atividades como a agropecuária extensiva e o extrativismo
madeireiro tornem-se economicamente secundárias nesta região, é
fundamental priorizar projetos urbanos e industriais, que concentram os
impactos ambientais em uma região geograficamente reduzida e de mais
fácil controle.
Destarte, é necessário consolidar alternativas de
desenvolvimento, para que a população local não precise atuar em
atividades ilegais, como o desmatamento. Mesmo no setor da
agropecuária e silvicultura pode-se adotar medidas simples, como
priorizar projetos para o financiamento da produção de culturas vegetais
típicas da Amazônia em vez de culturas agrícolas exóticas. É possível
financiar projetos de reflorestamento com silvicultura de plantas típicas
amazônicas, de elevada produtividade de alimentos, biocombustíveis ou
outras matérias-primas – a produção de látex, castanhas, cupuaçu,
guaraná e cacau; até palmáceas de alta produtividade para o setor
alimentício, de cosméticos e de biocombustíveis, como o açaí, o babaçu
e a macaúba. A macaúba, por exemplo, produz cerca de 10 vezes mais
óleo por hectare/ano do que a soja, podendo sustentar vastas regiões
produtoras de biocombustíveis de elevada produtividade.
Também é necessário viabilizar meios de transporte de baixo
custo para tornar tais projetos economicamente sustentáveis. Nesse
sentido, a região amazônica já conta com a maior rede de rios
navegáveis do país, muitos dos quais podem tornar-se navegáveis a
baixos custos, com projetos de eclusas, canais, ou hidrelétricas com
eclusas, que podem viabilizar a navegação plena destes rios a custos
bastante reduzidos. Temos projetos para a construção de novas
hidrelétricas binacionais; por exemplo na fronteira Brasil-Bolívia, uma
hidrelétrica com eclusa pode viabilizar a navegação do Madeira desde a
Bolívia até o Amazonas e, portanto, dar à Bolívia o acesso ao Atlântico
através do meio de transporte mais barato que existe, o hidroviário.
Devido a redução dos custos logísticos, as hidrovias têm um
grande potencial para viabilizar o desenvolvimento local. Por isso, o
transporte hidroviário também se mostra basilar para reduzir os custos
da integração regional, consolidando a integração de cadeias produtivas
e reduzindo os custos logísticos, econômicos e ambientais do comércio e
transporte de pessoas. Mais precisamente, as hidrovias podem ser
essenciais para tornar possível a integração de cadeias produtivas
complexas, desde a agroindústria até setores intensivos em tecnologia.
Tais setores, mostram-se fundamentais para que o Brasil e a América do
Sul possam enfrentar uma transição tecnológica energética profunda,
que provavelmente afetará não apenas o setor energético, mas os
transportes e a indústria.
É importante, também, permitir a geração de emprego e renda de
maior qualidade nestas regiões, o que só será assegurado ao agregar
valor aos produtos locais, industrializando-os na região em que são
produzidos. Hoje, produtos como a castanha-do-pará e o guaraná em
estado bruto têm um valor médio de mercado situado em torno de 20 a
25 vezes o da soja. Quando industrializados, o valor destes produtos
pode ser multiplicado dezenas de vezes, no setor alimentício, ou até uma
centena de vezes, nas indústrias de cosméticos e farmacêutica. Contudo,
para industrializar esses produtos na Amazônia, é necessário dispor de
meios de transporte de baixo custo e de energia abundante e barata.
Novamente, o uso combinado de meios de transporte e fontes de energia
renováveis pode ser determinante para assegurar a sustentabilidade
ambiental e econômica de iniciativas desta natureza. O uso combinado
de hidrovias como meio de transporte principal, e de hidroeletricidade e
biomassa (bioeletricidade) como fontes de energia primária para as
indústrias pode viabilizar cadeias produtivas mais eficientes e
sustentáveis, que agregam maior valor à produção e geram empregos e
renda na região.
4
Importa destacar que a indústria eletrometalúrgica do alumínio pode ser
considerada central para outras indústrias desenvolvidas na Terceira Revolução
Industrial, especialmente a aeroespacial. O processo de produção de alumínio
depende basicamente de energia elétrica abundante e barata, necessária para
produzir o derretimento das ligas de alumínio, processo que corresponde a cerca
de 1/3 do custo da produção deste metal. Neste sentido é interessante notar que o
uso da eletricidade como insumo energético na metalurgia representa uma
transformação tecnológica substancial quando comparada à metalurgia e a
siderurgia tradicionais, que durante milhares de anos utilizaram basicamente a
queima de combustíveis sólidos para produzir a energia necessária para derreter
e moldar as ligas metálicas.
Destaca-se que essas cadeias produtivas podem ser facilmente
integradas e compartilhadas com os países vizinhos da América do Sul,
caso se consolide a construção de redes de hidrovias e outros modais,
além de outras redes de energia e comunicações regionalmente
integradas. Neste sentido, podemos ter, no futuro, várias modalidades de
indústrias integradas regionalmente, que viabilizem um
desenvolvimento menos desigual na América do Sul, com maior geração
de emprego e renda, especialmente através de empregos mais
qualificados no interior do continente. Para consolidar esses projetos,
será necessário avançar na cooperação técnica e no desenvolvimento
científico e tecnológico de setores críticos para a integração regional,
como a área de comunicações. Em sinergia com a infraestrutura de
energia, a infraestrutura de comunicações é essencial, não apenas para
conectar as redes de Internet e telecomunicações dos países sul-
americanos sem a necessidade de intermediários extrarregionais 5, mas,
também, para viabilizar que o interior do continente, incluindo as
regiões de fronteira, tenha acesso a troncos de fibra ótica de grande
velocidade.
A infraestrutura de comunicações pode ser considerada
determinante para a integração nacional (HERZ, 1987; 1994) e regional
(CEPIK; ARTURI, 2011), assim, como para a segurança nacional na Era
da Digitalização da Guerra (MARTINS, 2009), ou ainda para a
estruturação da política industrial de um país (CHANDLER, 2002;
CASTRO; SCHRÖDER, 2009; HERZ, 1996; 2003). Conclui-se que
estas redes podem ser utilizadas para acelerar sensivelmente os
processos de integração regional, dando sustentação para o processo de
criação e estruturação de novas instituições transnacionais,
intergovernamentais ou supranacionais (MANTOVANI, 2006). Pode-se
dizer, que, sinteticamente, essa modalidade de infraestrutura é
absolutamente básica para trazer as regiões mais pobres do país e do
continente para a “Era da Informação”.
5
Atualmente a infraestrutura de fibra ótica que liga o Brasil ao Peru ou ao
Equador, por exemplo, passa antes pelo Caribe, vai até a Flórida e volta pelo
litoral do Pacífico até esses países, ampliando os custos e aumentando a
insegurança destas comunicações.
Esta seria uma contribuição bastante significativa para consolidar
a cidadania em muitas das regiões de fronteira hoje abandonadas. Isto
porque a interiorização da infraestrutura de comunicações moderna é um
pré-requisito básico para levar serviços públicos essenciais: acesso a
cartórios, tabelionatos e ao Judiciário, ou a serviços bancários, à
educação a distância e a universalização do acesso à internet. Embora
nem sempre seja viável construir a infraestrutura de troncos de fibra
ótica de alta velocidade até as pequenas cidades e comunidades de
fronteira, esta infraestrutura se torna viável quando pensada como parte
de uma rede muito maior, voltada para a integração regional. Construir
troncos de fibra ótica integrando o continente do Atlântico ao Pacífico,
implica na construção de uma infraestrutura que vai, necessariamente,
passar pelas regiões de fronteira do interior. Assim, estas deixam de ser
regiões isoladas, para se tornarem centros, partes essenciais de um
processo de desenvolvimento integrado continental.
O desafio de incluir as regiões de fronteira e as regiões mais
pobres e isoladas do interior da América do Sul na Era da Informação,
passa pela necessidade de construção de outras formas de
infraestruturas estratégicas, como, por exemplo, centros de pesquisa e
universidades federais. Na última década, o Governo Brasileiro voltou a
criar novas universidades federais nas regiões de fronteira, como, por
exemplo, a UFGD, a UFFS, a UNIPAMPA, e a UNILA, a Universidade
Federal da Integração Latino-Americana. Este último caso destaca-se
pela localização na Tríplice Fronteira Brasil-Paraguai-Argentina, e por
ser um projeto voltado para assegurar o acesso de um grande
contingente de alunos dos países vizinhos da América do Sul e da
América Latina e Caribe.
Isoladamente, estas iniciativas podem parecer pequenas, mas em
conjunto e no longo prazo podem contribuir não apenas para a
segurança das nossas fronteiras do interior, mas para consolidar uma
integração regional pacífica, mais harmoniosa e menos desigual. É nesse
contexto que importa destacar a relevância de instituições regionais
como o MERCOSUL e a UNASUL, que podem aprofundar e
impulsionar a integração regional, colaborando para a interiorização do
desenvolvimento nas regiões em que este é mais crítico: as de fronteira.
Para isso, é necessário criar e operacionalizar novos mecanismos e
instituições capazes de viabilizar a cooperação nos diferentes níveis da
federação, e, ainda, entre os diferentes tipos de governos nacionais e
subnacionais, permitindo que a cidadania seja ampliada no nível local,
especialmente nas faixas de fronteira.
Dentre os mecanismos de engenharia institucional inovadores que
vêm sendo pensados e discutidos na atualidade, destaca-se o projeto das
Casas de União. O projeto mostra elevado potencial para complementar
e produzir sinergia entre os diferentes processos aqui debatidos, tanto
para a integração regional no nível interestatal quanto para a integração
local, nas faixas de fronteira. No nível interestatal, o papel das Casas de
União seria o de fomentar a cooperação técnica internacional e a
integração das burguesias nacionais a partir da contratação de empresas
sul-americanas no âmbito dos consórcios estabelecidos. Já no nível local
(regiões de fronteira), as Casas de União têm o potencial de manter a
soberania através da garantia da cidadania nessas regiões críticas. Se por
um lado é central o papel das organizações regionais, como a UNASUL
e MERCOSUL, também é essencial construir mecanismos
institucionalizados para lidar com problemas locais, especialmente nas
regiões fronteiriças, que precisam de políticas e instituições específicas.
O aprofundamento da integração regional dependerá da
capacidade do Brasil de arcar com seus custos. Por conseguinte, a
consolidação de uma liderança regional brasileira só será possível e
legítima se conseguirmos resolver problemas básicos de cidadania
dentro do nosso próprio território, especificamente, assegurar a
cidadania plena para todos os seus cidadãos, mesmo nas regiões de
fronteira mais isoladas. Estas demandas não são concorrentes nem uma
é pré-requisito temporal para a outra, pois, como foi discutido, é
necessário estabelecer uma estratégia abrangente, que produza sinergia
entre a interiorização do desenvolvimento e da cidadania até as nossas
fronteiras, com a integração regional e a consolidação de um bloco
regional sul-americano.
Considerando a dimensão continental desses desafios, pode
parecer difícil estabelecer uma estratégia operacionalizável para
transformar esses projetos em uma realidade palpável, que
concretamente leve mais cidadania para os rincões do Brasil e
corroborem, simultaneamente, a integração regional sul-americana.
Destarte, a proposta das Casas de União aqui debatida é mais do que um
mecanismo de operacionalização de cooperação para políticas públicas
nas faixas de fronteira; é uma estratégia de longo prazo, pensada para
que possamos superar nossos desafios internos em sinergia com as
perspectivas de construirmos uma integração regional, que seja,
progressivamente, mais segura e estável, e que assegure o
fortalecimento da cidadania também nos países vizinhos. É uma visão
de longo prazo para viabilizar a sinergia entre a estratégia voltada para
busca por soberania, democracia e cidadania e, simultaneamente, para
fazer frente ao continental desafio da integração regional com nossos
vizinhos, partindo da realidade de que ambas passam, necessariamente,
pelas nossas fronteiras.
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Estes anais procuraram oferecer ao leitor um panorama do estágio
inicial do debate acerca das Casas de União. Seus textos traduzem o
estado da arte do debate na ocasião, em que ainda tateávamos no escuro,
procurando conectar nossas diferentes experiências intelectuais e
administrativas com o tema em tela. É fácil compreender este momento
pela ligação, às vezes ainda precária, que as temáticas desenvolvidas e
as Casas de União guardam entre si.
Como se pode constatar, antes de pretender representar qualquer
tipo de panaceia — longe disso — as Casas de União procuram apenas
sistematizar e generalizar a experiência administrativa já existente.
Trata-se de uma proposta de inovação cautelosa perfeitamente
enquadrada dentro do marco legislativo e legal brasileiro.
O artigo do Cel. Clynson serve para mostrar o quanto, mesmo
com recursos escassos e atuando praticamente sozinho, o Exército faz
pela cidadania nas regiões de fronteira e, ao mesmo tempo, a pouca
adesão dos próprios órgãos federais frente ao apelo representado pelo
Pavilhão de Terceiros.
Evidencia-se a necessidade de mediações administrativas para
que os programas (eg. Bolsa Família) efetivamente cheguem aos confins
do Brasil ou às regiões de fronteira. Como referido, em muitos locais,
inexistem municípios ou, mesmo onde estes se fazem presentes, falta o
material humano e os recursos administrativos para a execução de ações
que permitam ao cidadão ter acesso aos programas da União.
Esta dimensão, de obter-se a necessária sinergia entre órgãos do
próprio Poder Público Federal para atuar em regiões de fronteira em
parceria com estados e municípios, fica evidente — e sua necessidade é
ricamente ilustrada — através da situação retratada nos artigos de
Graciela Pagliari e Rodrigo Cardoso. O mesmo pode ser dito acerca da
demanda por soluções multidimensionais que envolvem diferentes
órgãos e até governos.
Fernando e Lucas, de seu turno, ainda que partindo de
perspectivas diversas (defesa e energia), trazem a dimensão econômica e
produtiva: a possibilidade de constituir-se as Casas de União em uma
espécie de facilitador — incubadora, diriam alguns — de convênios e,
quando for o caso, consórcios públicos, encarregado de oferecer know
how e segurança jurídica para a construção desses mecanismos. Mais
que modernização administrativa, trata-se de uma nova interface;
relacionada à possibilidade de alavancar a produção e, com ela, a
geração de emprego e renda.
Importa que se entenda a importância destas tecnologias não-
físicas, de alternativas modestas, como a encarnada na proposta do
Casas de União. A despeito de seu aspecto despretensioso, soluções
incrementais como esta entram no âmago de questões axiais como é o
caso do Pacto Federativo, da Reforma Fiscal e Tributária, do
atendimento ao cidadão, da presença do Estado no território nacional.
Em suma, o artifício aplica-se a temas que vão desde a prestação de
serviços à cidadania, passando pelo processo produtivo, pelo
federalismo cooperativo, enfim, procura-se criar alternativas ad hoc para
a conciliação administrativa entre entes federados e uma dinâmica
informal para resolver dívidas de estados, sobretudo municípios com o
aumento — e não a redução —, da prestação de serviços e da promoção
da cidadania.
Neste sentido, apesar dos Seminários Casas de União
constituírem-se em uma experiência recente e estreitamente ligado ao
impulso juvenil dos acadêmicos de Relações Internacionais da UFRGS,
nós, os Organizadores deste volume, somos gratos a toda a influência
benfazeja, oriunda de elementos que constituíram o Brasil no passado e
que, temos certeza, graças a sua generosidade e amplitude de horizonte,
irão continuar — juntamente com as novas gerações — sendo
imprescindíveis ao Brasil no presente e futuro.
No curso destes anos, obteve-se avanços significativos. Contudo,
ainda estamos longe de termos elucidado completamente o problema.
Importa mencionar que, entre as regiões de fronteira e as zonas urbanas
— que será tema dos próximos anais —, conseguiu-se conectar as Casas
de União como parte integrante do processo de reforma administrativa.
Trata-se de uma resposta a ideia de propriedade pública não-estatal,
apresentada pelo então Ministro Bresser-Pereira em sua exposição ao
Senado em 1997. As Casas de União ajustam-se à ideia de uma esfera
pública não-estatal um elemento de emulação às parcerias entre o setor
público e o privado e a própria formação de um terceiro setor. A
ampliação do debate, igualmente, permitiu uma aproximação maior com
o estado da arte da reforma administrativa: as parcerias público-
privadas, convênios e consórcios.
Hoje o debate está mais uniforme e objetivo do que é retratado no
âmbito desses anais. Entretanto, há ainda um longo caminho a ser
percorrido. É preciso estudar, discutir e sistematizar a já rica experiência
brasileira em convênios e consórcios. Segundo o Portal da
Transparência (2014), entre 1996 e 2014, foram celebrados 452.543
convênios pelo Governo Federal; ainda, segundo Caldas e Cherubine,
em 2013, já havia 637 consórcios públicos ativos no Brasil.1
Sem dúvida, todos gostariam de poder ter feito mais. Mas
procurou-se obter o possível deste processo coletivo e multifacetado
com experiências tão diversas como a suscitada pelos órgãos e entidades
que integram os Seminários Casas de União.
Esperamos, ainda, que estes anais, como os próximos, cumpram a
função de informar mais os brasileiros a respeito das realidades do
1
CALDAS, Eduardo de Lima; CHERUBINE, Marcela Belic. Condições de
Sustentabilidade dos Consórcios Intermunicipais. In: CHERUBINE, Marcela;
TREVAS, Vicente (orgs.). Consórcios públicos e as agendas do Estado
Brasileiro. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2013, p. 62.
Brasil — ainda hoje são poucos os que tem presente que os maiores
bolsões de miséria encontram-se nas regiões de fronteira.
Do mesmo modo, esperamos despertar a suscetibilidade entre
acadêmicos, professores e funcionários de carreira (tanto civis quanto
militares) sobre a importância da iniciativa e da atitude pró-ativa do
serviço público. Do papel tanto da inovação, do empreendedorismo,
quanto da importância em se pensar a inclusão e a participação social a
partir de uma perspectiva relacionada ao incremento do processo
produtivo.
Sem dúvida, as Casas de União traduzem tanto do ponto de vista
intelectual quanto material pluralidade e ecletismo. Mas, acima de tudo,
uma visão ecumênica que procura congregar sob as cores do Brasil
diferentes visões, perspectivas ou filiações partidárias.
Os Organizadores.
Clynson Silva de Oliveira é Doutor e coordenador da área de pesquisa
de especialização em Operações Militares da Escola de Comando e
Estado-Maior do Exército. Atualmente está nomeado pelo
Comandante do Exército para comandar o 3º Batalhão de Infantaria
de Selva em Barcelos-AM no biênio 2015-16.
Graciela De Conti Pagliari é professora de Relações Internacionais da
Universidade Federal de Santa Catarina. Possui graduação em
Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (1994),
especialização em Integração e Mercosul (1999) e em Direito
Internacional (2001) e mestrado em Relações Internacionais (2004)
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutorado em
Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (2009). É
autora do livro O Brasil e a Segurança na América do Sul (2009).
Rodrigo Bertoglio Cardoso é analista de Ciência e Tecnologia da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior
CAPES; possui graduação em Relações Internacionais pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e mestrado em
Ciência Política pela mesma instituição.
Fernando Dall'Onder Sebben é analista Legislativo do Senado Federal
e Doutorando em Estudos Estratégicos Internacionais no PPGEEI-
UFRGS. Possui mestrado em Ciência Política e bacharelado em
Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul. Membro associado ao Instituto Sul-Americano de Política e
Estratégia (ISAPE).
Lucas Kerr de Oliveira é professor adjunto da Universidade Federal da
Integração Latino-Americana (UNILA), onde atualmente exerce a
Coordenação do curso de Relações Internacionais e Integração.
Doutor em Ciência Política, com ênfase em Política Internacional, e
mestre em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS). Graduação em Psicologia pela
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Pesquisador
colaborador no Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia
(ISAPE) e no Centro de Estudos Internacionais sobre Governo
(CEGOV).
Maria da Graça Hahn é procuradora da Fazenda Nacional, em
exercício na Escola da Advocacia-Geral da União de Santa Catarina
(EAGU/SC). É Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Possui Pós-
Graduação em Política e Estratégia pela ADESG/RS, especialização
em Processos Regionais de Integração e Mercosul pela UFRGS e
Mestrado em Relações Internacionais pela mesma instituição.
José Miguel Quedi Martins é professor adjunto da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e doutor em Ciência Política
pela mesma instituição. Possui mestrado em História pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e
especialização em Integração Regional e Mercosul pela UFRGS. É
pesquisador do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia
(ISAPE), do Núcleo de Estratégia e Relações Internacionais
(NERINT-UFRGS) e do Grupo de Trabalho de Políticas de Defesa,
Inteligência e Segurança do Centro Estudos Internacionais Sobre
Governo (CEGOV/UFRGS), com ênfase nos temas Integração
Regional, Conflitos Internacionais, Guerra Local e Digitalização.
O Lançamento dos Anais do I Seminário Casas de União: Políticas Públicas e Regiões de Fronteira
é um marco importante na reflexão sobre o pacto federativo, desenvolvimento e segurança no Brasil.
Realizado em setembro de 2013 na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o evento do qual
resultam estes anais discutiu a aplicação das Casas de União como política pública em regiões de fronteira
e apresentou a sua relevância em diversas frentes, como na economia de recursos dos estados, dos municípios
e da União; na redução da dívida de estados e municípios; na redução da litigiosidade; no controle de
fronteiras; na segurança energética; na segurança pública; no combate à fome e à miséria; na proteção à
indústria nacional e na possibilidade de reforço à segurança pública para eventos de grande porte, como as
Olimpíadas de 2016.
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