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EMILE DURKHEIM

SOGI()I.OGIA E III.OSOIIA
-l

PREFÁCIO DE C. BOUGTÊ
:l ProÍe$or da Sorbonne

FC,FlENSE
DE JANEBo SÃo PAULo
-
SOCIOI.OGIÂ É EII.OSOFI/I

de-fazer nê]es predominar, como dir,ia ainda Augusto Comte,


a humanidade sôbre a animaiidade.
Durkheim declara-o com tôda a clarez.a deseÍável: ,.A
sociedade é um sistema de órgãos e funções.. . e 'o naUitat
de uma vida moral", Êle observa ainda- que a sociedade é CAPÍruLo I
diminuída quando nela não se vê mais quê um corpo orga-
nizado para cumprir certas funções vitais. ,,Sua veidadeira
Íunçáo é a de criar o ideal.,, Ela constitui assim o meio ori_
ginal de onde a natureza só emerge para ultrapassar, de qual_
quer Íorma, â si mesma.
REPRESET{TÀ0õES IltDIvtDUÂtS E
Dêsse ponto de vista, a sociedade não aparece apenas
como uma fôrqa do pressão, ela é para o indiúduo um meio REPRESENTAqõES GoLETIYAS'
de elevação. Sua aima tira partido das discipiinas que the
,impõem as exigências da vida em comum. pãra retõmar e
transpor a imagem de Kant, sem essa atmosfera ela nunca
abriria sua,s asas, seria incapaz do voar. Até mesmo sua de- ArESAR de a analogia não ser um método de demoDstra-
pendência e libertadora. Nos primeiros capítulos dà Diüi-
sã,o d,o Trabalho, Durkheim recusava.se a admitir que o va- ção prôpriamente dito, é contudo um proeesso de ilustração
e de verificação subsidiáda que pode ter sua utilidade. Nunca
lor de uma regra moral, como a regra do d.ever profissional, deixa de ser interessante pesquisar se uma lei, estabeleci-
decorresse dessa finalidade predominante: promover a civi- da para uma ordem de Íatos, náo se encontra também alhu-
Ii2ação. Entretanto é visível-, pelos exemploi que citou, que res, nxutatis mutandis; essa semelhança pode mesmo servir
entendia então por civiiização a multiplcãção àos bens ma- para conÍirmá-la e pata melhor compreender sua amplitude,
terrars. Hecusava-se a medir a moralidade por essas utili- Em suma, a analogia é uma forma legítima de compara4ão
dades, mesmo as coletivas, Ás coisas mudam -se entendermos e a comparação é o único meio prático de que dispomos
por civilizaçáo o conjunto dos bens espirituais, que são ins_ para tornar as coisas inteligíveis. O êrro dos sociólogos bio,
trumentos_ de aperfeiçoamento pessoai, ao mesmo tempo que
logistas não é, pois, de tê-]a empregado mas de tê-Ia empre-
de comunhão social. Durkheim teria admitido então-que a gâdo nBl. ÊIes não quiseram apenas verificar as leis da so-
sociedade tem por Íunção manter a, civilizÃ,eào: seu panêl es_
ciolog,ia pelas da biologia, mas deduzir aquelas destas últimas,
sencial é o de tornar possível, preparando as condiçóes da Ora, tais ilações não têm valor, pois se as leis da vida são en-
vida espiritual, o advento de uúa humanidade. contradas na sociedade, aqui se apresentam sob nova.s for-
mas e com características específicas que a analogia não po-
**a de prever e que não se podem perceber senão pela obsewação
direta. Entretanto, se se tivesse eomeçado por determinar, com
Essas ligeiras observações são suficientes para que se a ajuda de processos sociológicos, cefias cond,ições da organiza-
perceba a que distância a fitosofia do Durkheim noi leva ção social, teria sido perÍeitamente válido examinar em segui-
das Íilosofias materialistas e organicistas, com as quais aque_ da se tais conüqões não apresentariam semelhanÇas parciais
la tem sido assimilada. Assim iompreendido, o sóciologismo com as condições da organização animal, como biologistâ de,
de .Durkheim é mais apropr,iadamente um esfôrço pari fun- termina. Pode-se mesmo prever que tôda organização deverá
daÍnentar e justifiear, de maneire noya, .as tenáên-ciâs espi_ ter caracteústicas comuns, que não será inútil deduzit.
ritualistas. . Será, porém, ainda mais natural buscar as analogias que
I»ssam existfu entre as leis soc ológicas e as leis psicológicas,
C. Eôucr,É uma vez que êstes dois campos sã,o mais próximos entre si.
ProÍestur dt Strbonne A vida coletiva, como a vida mental do ind,ivíduo, é feita
de representações; é pois presumível que representações in-
REPaESETÍTÀçõES rNDrvr!üArs 15
14 socÍolocrÁ E tÍLosoru

dividuais e representações sociajs sejam, de certa formâ, com- sui gerrcr8 e um tempo mais ou menos longo decorre antes
paráveis. Tentâremos, exatamente, demonstrar que âmbas que a função motora aparega. Essa indeterminação relati-
rnantêm a mesma relação com o respectivo substrato. Essa va não eÍste onde não exista consciência e aumenta com a
ligaçáq longe de justificar o conceito que reduz a sociolo. consciência; donde se conclui que a consciênoia não tem a
gia a mero corolár o da psicologia individual, porá, ao con- inércia que se lhe atribui. De que forma, aliás, poderia ser
trário, em relêvo a independência retativa dêsses dois mun- diferento? Ttrdo aquilo que existe, existe de maneira deter-
dos e dessas duas ciências. minada, tem propriedades características. Entretanto, tôda
propriedade se traduz por manifestações que não se produzi-
riam se tal propriedade náo existisse, pors é através dessas
manifestações que e1a se define. Ora, a consciência, qual-
I quer que §eja o nome que so the queira dar, apresenta ca-
racterÍsticas sem as quak não seria representável ao espírito.
O conceito psicológico de Huxley e de Maudsley, que re- Em conseqüência, uma vez que ela existe, as coisas não
duz a consciência a apenas um epifenômeno da vida física, poderiarn acontecer como se ela não existisse.
tem atualmente poucos defensores; mesmo os representantes A mesma obieção pode ainda ser apresentada de outra
mais autorizados da escola psicof,isiológica rejeitam-no for- Íorma. É um lugar-comum da ciência e da filosofia dizer que
malmente e esforçam-se para demonstrar que tal conceito tôda co sa é dependente do devir. Entretanto, mudar é pro-
não está contido no princípio que adotam. Realmente, a duzfu efeitos; mesmo o móvel mais passivo não deixa de par-
noção fundamental dêsse sistema é puramente verbal. Há fe.
nômenos cuja eficácia é Íestrita, isto é, não aÍetam senão ticipar ativamente do movimento que Íecebe, quaJrdo mais
fracamente os fenômenos ambientes; mas a idéia de um fe- não seja, em virtude da resistência que the opõe. Sua veloci-
nômeno adicional, que não serve para nâda, que I]ada faz, dade e sua direção dependem em parte do pêso, da consti-
que não é nada, é vazia de qualquer conteúdo positivo. Mes- tuição molecul , etc. Portanto, se qualquer mudança pres-
supõe, naquilo que muda, uma certa eficáeia causal e se, en-
mo as metáforas que os teóricos da escola mais freqüente- tretanto, a consciência, uma vez produzida, é incapaz de pro-
mente empregam para exprimir seu pensamento voltam-se
contra êles. Dizem que a consciência é um simples reflexo duzir qualquer coisa, é preciso afirmar que, a partfu do mo-
dos processos cerebrais subjacentes, um clarão que os acom-
mento em que ela existe está Íora do devir. Ficaria, portan-
panha rnâs que não os constitui. Mas um claráo náo é "na- to, ta.l como é; a série de transformações da qual faz parte
da": é uma realidade, que at€sta sua presença por efeitos se interromperia nela; além dela nada mais existiria. Seria,
especiais. Os objetos não são os mesmos e não têm a mes. em certo sentido, o têrn1o extremo do rcaL, Íinis ultirnus na-
ma ação quando €stão iluminados e quando não o estão; tur1,e. Nã"o é necessário ressaltar que tal noção é inadmissí-
ató mesmo suas caractêrísticas podem ser rnod,ificadas peia vel e contraria os princípios de qualquer ciência. A maneira
luz que recebem. Da mesma forma, o fato de conhecer, àin. pela qual extinguem as representações torna-se igualmente
da que imperfeitamente, o processo orgânico do qual se quer ininteügível sob êsse ponto de vista, pois um composto que
fazer a essência do fato psíquico, constitui novidade que náo se dissolve é sempre, sob certos aspectos, fator da própria
é destituída de importância e que se manifesta por sinais dissolução.
apreciáveis. Quanto mais se desenvolve essa faculdade de Parece-nos inútil discutir mais longamente sôbre um sis-
conhecel o que se pâssa em nós, tanto mais os movimentos tema que ao pé da letra é contraditório em sua própria ex-
do sujeito perdem êsse autoÍnatismo que é a característica pressão. Uma vez que a observaçáo revela a existência de Íe-
da vida física. Um agente dotado de consoiência não ss con- nômenos chamados representa{ões, que se distingue,m por
duz como um ser cuja atividade se reduzisse a um sistema características particulares dos demais fenômenos da natu-
de reflexos: êle hesita, tateia, delibera e é com essa parti- reza, contraria qualquer método o tratá-los como se não exis-
cularidade que êle se identifica. A exoitação exterior, em tissem. Êles, por certo, têm suas causas, mas são, por sua vez,
vez de se descarregar imediatamente em movimentos, é inter- causas de outros fenômenos. A vida não é senão combina-
rompida em sua passagem, submetida a uma elaboração ção de partículas minemis; ninguém pretende, entretanto;
SOCIOLOGIA E rILOAOTIA nEPRESTNTÂqôES rNDrvrDüÀrs

que ela seja um epüenômeno da matéria bruta. EÃtretanto, rar um estado dos centros nervosos (impressão) semelhante,
se essa propo§ção Íôr aceita, é preciso aceitax-lhe as conse- ainda que normalmente mais Íraco do que aquêle que pro-
qüênoias lógicas. Existe u.ma entretaJxto, e fundamental, que vocou o estado de consciência primitivo",3 Wiljiâm James
parece ter escapado a numerosos psicólogos e que nos estor- é ainda mais formal: o Íenômeno da retenção náo é abso-
qaremos para destacar. lutamente um fato de ordem mentâI (iú i.s twt lact oi the
Tornou-se quase clássico r€duzir a, memória a apenas um ,rlentdl ord,er of all). fr um puro fenômeno físico, um estado
Íato orgânieo. A representagão, dizem, não se conserva como morfológico que consiste na presença de certas v,ias de condu-
tat; quando uma sêr»agão, urYl4 imageE, uma idéia deixa ção na intimidade dos tecidos cerebrais".4 A representação
de nós estar presente, e.la simútàneamente deixa de existir, ocorre com a reexcitaçáo da região afetada, assim como ocor-
sem deixar nénhum vestígio. Isolada, a impressão orgânica reu com a excitação primeira: no intervalo, no entanto,
que precedeu essa representagão não desapareceria comp]e- deixou completamente de existir. Ninguóm insiste mais viva-
tamente: restaria ueâ certa modrficagáo do elernento ner- mente que James sôbre a dualidade dos dois estados e sôbre sua
voso que o predisporia a vibrar de nôvo, assim como vibrou da heterogeneidade. Nada há de comum entre êles, exceto o
primoira vez. Portânto, desde que uma causa qualquer ve, Íato de as marcas deixadas no cérebro pelâ experiênoia an"
nha a excitá-]o, essa vibração reproduzir-se-á e, como reper- terior tornarem a segunda mais fácil e imediata".s A con-
cussão, ver-se-á reaparecer na consqiência o e§tado psíqÚco seqüência, aliás, decorre Iôgicamente do próprio principio da
que já se prod.uziu, nas mesmas condições, quando da pÍimei- explicação.
rà eiperiêàcia. Eis aÍ de onde proviria e em que consistiria Como não perceber que se volta assim àquela teoria de
a lembrarça. Seria pois em decorrênoia de uma Yerdadeira Maudsley, que foi prêúamente rejeitada, mesmo com certo
ilusão que êsse estado repeüdo nos parece ser a revivescên- desdém? 6 Se, em cada momento, a vida psíquica consiste
cia do primeiro. Realmente, se a _teoda ê exzt'a, trata-se de exclusivamente nos estados atualmente dados à consciência
Íenômeno absolutameD.te nôvo. Não é a mesma sensação que clara, va.le dizer que ela se reduz a nada. Sabe-se, com efei-
sê desperta
se arl(is ter ficado como que
desnêrÍa apos oue adormecida
adormecida durante to, que o campo de observagão da consciência, como diz Wundt,
certo tempo; sensacão inteirâmente original, pois
temDo: é uma sensação I nada
é mu,ito pouco extenso; podem-se contar seus elementos. Se,
resta daquela que ocorreu iniciatmente. E nós creríamos portanto, êles são os únicos Íatôres psíquicos de nossa con-
realmente que nunca a tivéssemos experimentado se, por um duta, convém confessar que esta é inteiramente posta sob a
mecanjsmo bem conhecido, ela não viesse, por si própria, Io-
dependência exclusiva de causas físicas. Âquilo que nos diri-
ca.lizar-se no passado. A única coi§a que é & lnesfiut' nas dua,s ge não são as poucas idéias que ocupam presenternente nos-
experiências é o estado nervoso, condição tanto da segunda
representaçào como da primeira. sa atenção; são, isto sim, os resíduos deixados por nossa vi-
- Essa têse náo é apàas seguida pela escola psicofisiolô- da anterior; são os hábitos contraídos, os preconceitos, as
gica; é admitida explicitamente pof por numerosos
numero§os psicólogos tendências que nos movem sem que disso nos apercebamos,
que crêem na realidade da consciência e chegam mesmo a são, em umâ palavra, tudo aquilo que constitui nossa carac-
ver na vida consciente a forma eminente do real. Para terístÍca moral. Se, portanto, nada disso é mental, se o pas-
Léon Dumont: "Quando já náo pensamos em uma idéia, ela sado não sobrevive em nós sob forma material, é entáo o
não mais existe, nem úesmo em e§ta.do latente; mas há organismo que conduz o homem. Aquilo que a consciên-
apenas uma de suas cond,igões que permanece e que serve cia pode alcangar dêsse passado, em um dado instante, não
pãra explicar como, com o concurso de outras condições, o é nada, pois, em relação ao que dêIe permanece desaperce-
-mesmo bido e, por outro lado, as impresões inteiramente novas são
pensamento pode ocorrer de nôvo." Uma recorda-
çáo decõrre "da combinação de dois elementos: 1'â - Ma' uma ínfima exceção, Aliás, a sensação pura, na medida em
ireira de ser do organismoi 2." * Complemento vindo de Ío- que exista, é de todos o.s Íenômenos intelectuais, aquêle ao
ra".z Rabier escreve quase no§ mesmos têrmos: "A condi' qual menos imprôpúamente se aplicaria o têrmo de epife-
cão de revivescência é uma excitação nova que, somada às nômeno: é claro que ela depende intimamente da disposigão
ôondiçôes que constituíam o hábitb, tem por efeito restau- dos órgãos, a menos que outro fenômeno mental intervenla
18 socloLocl E rÍLosorlA ssPREsEsaÁçõEs rNDrvrDuÀrs

e a modifique e então não se tratará mais de uma sensaçã,o da consciência viesse intercalar-se entre aÍnbos? Poderíamos
pura. rotomar as expressões que empregamo§ há pouco e üzer que
Vamos eníretanto mais longe; vejamos aquilo que so pas- êsse eco tem sua realidade, que uma vibração molecular, acom-
sa na consciência atual. Poder-se-á dizer, pelo menos, que panhada de consciêÍrcia, não é idêntica à mesma vibração sem
os poucos estados que a ocupam tenham natureza específica, consciência e que, por conseguinte, algo de nôvo ocorreu?
que sejam submetidos a leis especiais
iais e que sua influência, em- Os defensores d.a concepçáo epifenomenista não mantêm ou-
bora seja
seia fraca em virtude
virtude de sua inferioridade
inferiori( numérica,
tro tipo de linguagem. Êles também sabem perfeitamente
possa ser original? Aquiio que viria dessa forma a se super- que a cerebração inconsciente difere do que chamam cerebra-
por à a4ão fôrqas vitais seria, sem dúvida, pouca
aaão das fôrças pouca coisa: ção consciente. Tratra-se apenas de saber se essa diferença
mas seria já alguma coisa. PoÍém, como sefia isso possíveI? decorre da ,)atuteza da cerebração, da intensidade maior da
A vida própria dêsses estados náo pode consistir senão na excitaçáo nervosa, por exemplo, ou então se ela é causada
maneira sui generis pela qual êles se agrupam. Seria neces- priÍrcipalmente pela adição da consciência. Ora, para que
sário que pudessem atrair-se e associar-se em Íunção das afi- tal adição náo constituísse uma simples superfetação, umÂ
nidades derivadas de suas carâcterísticas intrínsecas e nào espécie de luxo incomproensível, seria necessário que a cons-
das propriedades e disposições do sistema nervoso. Ora, se ciência, assim acrescentada, tlvesse maneira de agir que não
a memória é co,isa orgânica, essas associações não podem pertencesse senão a ela; que fôsse capaz de produzir efeitos
ser mais do que I eflexos de conexões igualmcntc orgànicas. que sem ela não ocorr,eriam; mas se, como se supóe, as leis
Se uma determinada representação não pode ser evocada se- às quais se submete sáo âpenas transposição das que regem
não por intermédio do estado físico antecedente, como êste a matéria neryosa, aquelas e estas são perfeitamente redun-
só pode ser restaurado por uma causa física, as icléias de- dantes. Não se pode nem mesmo supor: que a combinação,
vem ligar-se apenas porque os pontos correspondentes da onquanto apenas reproduz certos processos cerebrais, faça
massa cerebÍâI são também ligados e de forma material. É, apesar disso nascer um nôvo estado, dotado de relativa au-
aiiás, o que declaram expressamente os partidários da teoria. tonomia e que não seja simples sucedâneo de algum fenô-
Deduzindo tal corolário do princípio que defendem, estamos rneno orgâ.rrico. Pois, de acôrdo corn a hipótese, um estado
certos de não violentar seu pensameÍIto, pois nada thes atri- não pode durar se o que ête tem de essencial náo se conserva
buímos que não professem explicitamente, como a lógica o ntegralmente numa certa poiarizaçáo das cé1ulas cerebrais.
exige. A lêi psicológica da associaçáo, diz James, "não é se- Ora, que seria um estado de consciência que não tivesse
não a repercussão no espírito dêste fato perfeitamente psí- duração?
quico de que as coÍrentes nervosas se propagam mais fàcil- De maneira geral, se a representação só existe na medi-
mente através das vias de condução que já Íoram percorri- da em que o elemento nêrvoso em que se baseie se encontre
das".z E Rabier: " Quando se trata de uma associação, o es- em determinadas condições de intensidade ê qualidade, se de-
tado sugestivo (a) tem sua condição numa impressão nervo- saparece desde que tais condições náo se realizem no mesmo
sa (A); o estado sugerido (b) tem sua condição em outra grau, ela nada é por si mesma; sua única realldâde é a que
impressão nervosa (B). Isto pôsto, para explicar como essas conserva de seu substrato. É, como o disseram Maudsley e
duas impressões e, por conseguinte, êsses dois estados de sua escola, uma sombra projetada, da qual nada mais resta
consciência se sucedem não há mais que um passo a dar, quando se afasta o objeto cujos contornos e1a vagamente re-
bem Íaril verdadeiramente, quat seja o de admitir que a co- produzia. Donde se conciuiria que náo há vida que seia prô-
moçd,o neruosa se prow.çlou de A para B, isto porque, tendo priamente psíquicae nem, por conseqüência, materia para
o moviÍnentô já seguido uma primeira vez êsse percurso, o uma psicologia própria. Pois, nestas condições, se queremos
mesmo lhe é daí em diante mais Íáci1".8 compreender os fenômenos mentais, a mansira se$.rndo a
Mas se a ligação menta.l é apenas r]Ín eco da ligação fí- qual êIes se produzem, se reproduzem e se modificam, não
sica e não passa de uma repetição, ,então para que serye? são êstes que devôm ser aJralisado§ e considerados, mas os
Por que o movimento nervoso não poderia detüminar ime- fenômenos anatômicos dos quais sáo a imagem, mai§ ou
diatamente o movimento muscular, sem que êsse fantasma menos fiel. Não se pode nem mesmo dizer que ôIes reaiam
§OCIOLOCIÀ E FEO§OFIA
BEPRESENTÂçõÉa II{DÍVIDÜÁIS
entre_ si e se modiÍiquem eütua,mente, uma vez que suas
relações não passam ãe ,r-n ;par";üir;;;dàá. põe a todo aquêIe que deseja permanecer coerente consigo
tirr"o",
"* ,-
Í_13"99 ar. imagens que aparecim urphüà, ãir._o, mesmo.
g::9* 19 ltJaem, se r_eperem, se sucedem, et",.,
ÍJemos que tals exDressões sãO metafóricas: üà* .a_
nào "Oi
exprimem a
verdade, ao pé da- Ietra, senâo com re]a.ção aos II
produzem tais movimen[os. côrnos que
cp vatgr a essas manifestações _oe tato, nósãírinoj*oJã"o pou_
que i.ã. a i"- Mas ela se impõe também por outra razáo.
*gryao "Éãmos-;.ã'
sôbre. aquilo em qúe se transrormaim é ão_ío"orr" Acabamos de demonstrar que, se a memória é exclusi-
seu desaparecimento. Acliamos ansofuiãmente vamente propriedade da substância nervosâ, as idéias não
uma idéia, que.há. pouco ocupava nossa consciência, q""
iáTr"ràr
possa podem evocar-se umas às outras; a ordem pela qual retor-
tromar_se inexistente um instánte upO*; parã nam ao espírito pode apenas reproduzir a ordem em que
qrà-ãá porru
aniquilar tão ÍÊrcitmente, é preciso eviaeitemeirtã seus antecedentes Íísicos sáo reexcitados e até mesmo essa
tenha nunca tido mais d"" i*;;"";ü;'ãã^ãi^ieiJà. ã,r. ,rao
reexcitação se deve exclusivamente a causas apenas físicas.
Poúanto, se a memória é. exclus-ivamente uma proprie- Essa proposigão esta de tal foÍma incluída nas premissas
dage dos tecidos, a vida menl,al nada é, pois do sistema que é formalmente admitida por iodos que o pro-
úo ? naoa
além da memóriá. Não queremos oir", õbri'iir"'i"u"" fessam, Ora, não sôrnente essa idéia conduz, como o de-
atividade_.intelectual cons'ista exclusivamente em ,ro.." monstramos há pouco, a Í.azer da vida psíquica uma apa-
reprocluzir
sem modificações os estados oe consciénãiá á"L"iãr*."t" rência sem realidade, como ela é diretamente contestada pe-
los fatos. Há casos e são müto numerosos quais
experimentados. Mas para que êIes por"á-
a uma etaboração verdâdeiraàente.inôeiããiuãr,"ã. ."iirátiao. - nos pela
não parece possível- explicar dessa Íorma a maneira
conseguinte, da que resulta exclusiyamente Aâ" r*ãã pu
ãiiãiã"it, qual as idéias são evocadas. Certamente, pode-se bem ima-
_u-
téria. v,iva,_ é preiiso ainda que tenrram éxisten"iá"rãütiu._ ginar que duâs idéias não possam ocorler simultâneamente
rnente independente de seu substrato materiãr- -uJ-ãutra na corlsciência ou suceder-se imediatamente sem que os
forma, aquêtes estados de consciencia rÀunii].ã-iiÁ, pontos do encéfalo que lhes sirvam de substrato tenham
mo nascem e renascem, em Íunção de afinidades poir*a"t"ãr".ià .o- sido postos em cornunicação material. Em conseqüência,
nada impede a priori que qualquer nova excitação de um
Iturq*, À. vêzes, é veidade, áa",it"_-". rr'giiã"e"í"-rftii.*o
intelectual iÍnaginando uma substância * í"f"*ã dêsses pontos, seguindo a linha de meÍror resistência, se es-
ú oü ,o"_
às determinações fenomenaisJ iàra_." *àiente
tenda ao ouho e determine, assiÍr\ o reaparecimento de seu
l:-ra-sxperior
qe um pensamento, distinto do
mal,erial que o cérãbro the
conseqüente psíquico.
--Entretanto, não há conexóes orgâni-
cas conhecidas que possam fazer compreender de que ma-
Íomece e resultantê de uma etauoraçáo p;; iru;; j;'p."- neira duas idéias semelhantes se evoquem mütuamonte, pelo
ce&\os_ sü Mas que. seria peúamento
.getueris. um- que nao único fato de sua semelhança. Nada que saibamos sôbre o
p:.g.y* sistema e_ uma seqüência de pensamentos pairticuta_ mccanismo cerebral nos perúite concebér de que fo4ma uma
.": de.uma. abstração reatizada? A ciência nãô deve
to- vlbração que se produza em A possa ter tendência para se
mar-u19trt,
contrecimento de substâncias nem de forrnas puras,'exis- propagar para B, simplesurente porque entre as representa-
gl não. para o psicótoso, a viaa repã.eããt]vâ'nao qões a e b exista alguma semelhança. Eis por que qualquer
l"y^:1ry
e mars que um conjunto de representações .' porúúô, psicologia que veja na memória um fato puramente bioló.
replesentações de qualquer especte morrêm imediatamente se as
glco não podo explicâr as associações por semelhança, a me-
apos f,erem nascido, de que poderá ser constituÍdo nos que as assimile às associações por contigiüdade, isto é,
o espírito?
É neceqsa_ng escolh'er :
na yerdadeira ou bem se
;tii;i;;ni;;
bôm t
"i. aomite e" u*â'áirt.i _ Iregando-lhes qualquer realidade.
{ue -t
mente meotal. ora. nós r"m ,i-* úãã"ú piõori"- Esta assimilação loi tentada.lo. Se dois estados se asse-
"jã
o iúu"íeiüõr"â.#pri- melham, dizem, é porque têm ao Denos uma parto comum.
ineira soluçãô. Em conseqüênciu, ;;"g.u"ã-a;;üiãàã i*- Esta repetindo-se idênticàmente nas duas experiências tem,
nos dois caso6, o mesmo elemento nervoso como suporte.
BEPRE§ENTÂçõES INDWIDÜÁIS
AOCIOIôOIA E ÍIIôIiÚ|T!I

Dorto íorma, êsse elemento encontra_se relacionado com mite a$alisâr aquilo que nos é apresentado em um estado de
dotr grupos de cérulas, aqs quais os
complexidade indivisa. Ora, de acôrdo com a hipótese que dis-
oir._
r'ontcs das duas representações, urna "orrop;à;;;;ãJ"tã, cutimos, ê o cérebro, pelo contrário que deveriá efetuai tôdas
"-ôÃà" t*rto
vez'que êle
com uma quanto com as outras. nrn conseqtiê.ncã essas análises, visto que tôdas essas divisões teriam uma base
do ponte entre eras o que explica cÃ; ;-i-r;E;"iãLiu^, serve
anatômica. Sabe-se, aliás, com que dificuldade chegamos a dar
llgom entre si. por exerirplo, eg vejo uma Íôlha de papel bran- ". aos produtos da abstração uma espécie de Íixidez e de indivi-
co; a idéia que me vemtoúte- dualidlde, sempre múto precárias, graças ao artifício da pa-
Logo que uma causa qua.lquer venha "!rt"-iããg"ãã"u"íiàr1"r"u.
excltii particüi rurt" lavra. Falta muito para que essa dissociação esteja conforme
a^célula que, em suá uÉraçao,-piãa-uã,i"§f Hiiã!" a nat]uteza original das coisas!
côr, uma corrente nervosa ai- nasôerí ã tiruãii_r.ãt goi"_ a.
do,.entretanto, de preferência, r^s ú;-q;;;;;"ir? Mas a concepção fisiológicâ, que está na base da teoria,
ãLou._ é a,inda mais insustentáve]. Admitamos que as idéias sejam
ll:r§ 9: 1e1t
i;l cotocar_se nos outr'os pó"t""-qu.-ja *- assim fÍacionáveis. Será necessário, além disso, adaitir que
rrveram em comunicação com o pr,imeirol iMas ós pbnÍos a cada uma das partes que as constituem corresponda um
que.satisfazem a essa condiçâo ,.ao iáàu"* -áqiãrí"
qr. determinado elemento nervoso. Haverá, portanto, uma par-
y_f_itryq representações s"m.rirani"s, ãÀ u- íolrã, à pri_ te da massa cerebral qlle seria a sede áas sensaçôes do ver-
E_.$:s1-1 Íorma que a brancura do paper
*:r::
sar na orancura da neve. Duas idéias {uê seià._mála pen_ melho, outra das sensações do verde, etc. Mâs não ficariam
assemeliram as coisas apenas aí. Seriâ necessário um substrato especial
encontrar-se-ão pois associadas. ainoa quii-á ãi.*iu'çuã
o plgd}!g, não da semethança prôpriameirti dita,
."iu para cada matiz do verde,'do vermelho, etc, pois, de acôrdo
contigüidade puramente máte'riat'.
;;'ã; u_a com a hipótese, duas côres do mesmo matiz sômente podem
evocar-se uma à outra se os pontos pelos quais elas se asse-
,
Essa explicação, contud.o, baseia-se em uma série de melham corresponderem a um único e idêntico estado or-
postutados arbitrários. Antes de mais nada, na i-""0"_ gânico, visto que tôda semethanÇa psíquica implica em
Tent-o par? que se considerem as representaQões "áã formadas coincidência espacial. Ora, tal geografia cerebral parece
j^*inidos, espécie de âtomos dúí põã.iiu_,
1"-_".r^.1111§. idênticos
mais fantasia do que ciência. Nairualmente sabemõs que
mant€ndo-se a si mesmos, entrar nã côntextura certas funções intelectuais são ma-s intimamente ligadas
das mais divertsas reprrsentações. ffo.ró-'..tuao"--áãntals a certas regiões que a outras; mesmo assim essas localiza-
pag sa9 asst^m_ têitos de peças e pedaços que seriam permu_ ções nada têm de precisa nem de rigorosa, como o prova o
raoos oe acordo com a ocasião. A brancura dêste paiel fato das substituiç ies. Avançar mais que isso, supor que
da neve náo são as mesrnas e nos toram -Ãõ"tiiíu, e a cada representação resida em uma céIu1a determinada, é
representações diferentes. poder-se-á dizer quJ "*
,ã'.o"- já um postulado gratuito, cuja impossibilldade demonstra-
I"rquq na sensação de brancura em geral -que "iá. se enãontra remos no decorrer dêste estudo. Quo dizer então da hipótese
em ambas? Seria necessário então adiritir
àue ã iããú oa segundo a qual os elementos "úItimos" da representaqào
brancura em geral constitua u-a espéãie- aê-ã"ãaãà" (supondo-se que existissem e que essa palavra exprimisse
tinta que, associando-se com entidadeô airerãntes, -iiiã-nas_ oir-
uma realidade) seriam não menos precisá,mente localizados?
cer"tat sensâçâo deteminada de brancura. Or4 ;â;ú ur" Dessa forma, a representação da fôlha em que escrevo sct iil
possa j'rstificar tal hipótese. Tudo prova, peto literalmente dispersada por todos os desvãos do cór'cbro!
conErarro9r" e é curioso que James tenha contribuido' mais
::_r.1io-=
Não sõmente haveria de um lado a impressão da côr, rlt, orr..
que nrnguem - para demonstr.ar essa proposição _ que a vida tro a da foÍma, de outro ainda a da resistência, mas ainrliL:r
psíqúca é um curso contínuo ae rep^resêntaiú, a"=iat lo.-a idéia da côr em geral localizar-se-ia aqui, ali residil'itrnr os
que nunca se pode dizer onde uma começa e ôutia
acaba. EIas atdbutos distintivos de tal matiz em particular, acolíL tLs crr
il se rnterpenetram. por certo, o espfuito consegue pouco racterísticas especiais que tem êsse matiz no caso ;trr.slrrl,r.
a Douco
dJsLrnguir suas partes. Mas essas diferenciações são obra riossa; e ,individualizado que tenho sob os olhos, etc. Corrro rrrto rrr
gopos nQs que as introduzimos no continium piiqúiàã. ãu.o_ concluir, antes de mais nada, que so a vida mcntlrl r,rrl.lvr,lnr.
lutamente não as encontramos aí. É a at.traçaã'lirã-nóJp"r. de tal forma fracionada, se fôsse formada (lcssir lxx.lur (h:
;,4
SOCIOI.OCIÂ E FIÍ.OSOFIÁ AEPRESENTAçOE"9 INDIIITDI'AIS

a unidade e a continuidade que eta apre_ âdmite a sobrevivência e o estado psíquico agora considera-
:l:T-"it^1.-::c^1".,^":r,
§enLa rornar_so-ram incompreensíveis?
do. Se no momento em que vejo esta Íôlha, nada mais resta
. . +lép disso, se a semelhânça de dua.s representaqões é
devida à presença em amba^s
em meu espírito da neve que vi anteriormente, a primeira
pod€r-se-ia indagar como este .de ürn urico ã *.I_o ãj.l"""to, imagem não pode agir sôbre a segunda, nem esta sôbre
etemenio rinic" pãaàià ,p"- âquelâ; uma não pode, pois, evocar â outra pelo simples
recer duplamente. Se temos uma imagem esCõ-ã
eyocada pela primeirar i.:.
-po.-"ií.ãffitu,
;ma ou_ fato de com ela se assemelhar. Entretanto, o Íenômeno pas-
111 lEFg,.
processo totat pode ser repro-sentado peto'esquàmà-[nóo; o
sa a ser perfeitamente inteligÍvel se existir uma memóri.a
mental, se as representàções passadas persistirem na quali-
_(PIcl, o. que. man-eira poaeriamos'pãi..rài" àãi.'-e-: »t._a dade de representações, se a rememoração, enfim, conslstir,
se-a que essa distinçâo será feita por àeio dos elementos não em uma criação nova e original, mas simplesmente em
ferenciais que são simultàneamente fornecidos: dl-
incluído, ao mesmo tempo, no sistema Éõp 'e-rro como -.i.t.*.
A está nova manifestação perante a claridade da consciência. Sê
nossa vida psíquica não se anula à medida em que se desen-
EEG e como os dois siste'mâs são dii;;;nte;;ri àã.iiiro, volve, não há solução de continuidade entre os estados an-
llg::.- lS obriga a admiLir que A seja dupto. mas, ie po_" teriores e os atuais; não há pois nada que impeça que ajam
ffI:::
Luuno P^1a.9lflj9g
Í,at
no_rqu9 devamos' estabitecer
"o-.o
não chegamos com isso a compreender
por- uns sôbre os outros e que o resultado dessa ação mútua
possa, em determinadas condições, realçar de nôvo a inten-
^d.taltdade,
d" lato nós a percebenlos. Embora seja razoáivel con_
9^o.To sidade dos primeiros, de forma a que se tornem novamente
Jerurar que uma mesma imagem se ligue a dois conjuntos de conscientes .
cjrcunstàncias diferentes, não decorre-daí que nós à'oiiomo,
o momento,. eu mu_ .ep.".úto Ti-üitar,"áríu"t", Objeta-se, é verdade, qüe a semelhança não pode ex-
lyp.r_,yr:1. -y plicar como as idéias se associam pois que ola só pode ocor-
g-9 yp trg.o esta fôlha ds papet branco, de outro a neve es_
rer se as idéias já forem associadas. Se é conhec da, é por-
::::::?-:?!T-"- l9_lgt Há porranto em meu espírüo duas re_
!,rc,:crrüaÇoes oe orancura e nâo apenas uma. De fato, nós
que a ligação está feita; e1a não pode, pois, ser sua causa.
simplificamos artificialmente * .olir", q"u"ã; ;"d;;i;"" Mas o argumento confunde erradamente a semelhança com
semelhança a simplesmente uma identidade -pãrãüi.-'oru,u a percepção da semelhança. Duas representações podem ser
idéias semelhantes -sào dif erent." utã ;;;;iolãíirp"rpo- semelhantes, como as coisas quo elas exprimem, sem que o
' O. elementos que se consrderam comuns em ambas saibamos. As principais descobertas da ciência consistem pre-
:iglp
ex§tem- cisamente em perceber analogias igrroradas entre idóias que
conÍundimos -separadamente tanto numa como noutra; não os todos conhecem. Ora, por que não produziria essa seÍnelhan-
embora os comparemos. x a ielíçaõ-íà oineris
que se estabetece entre êles, combinaçao esileciáiffi ça insuspeitada efeitos que serviriam precisamente para ca-
mam em virtude dessa semelhanÇa, .a -caracferísticas for- ractetizá-la e fazê-la perceptível? As imagens e as idéias agem
as espe- entre si e essas ações e reações devem necessàriamente variar
ciâis dessa combinaçâo quo nos àai, a irp"...ãã-ãi ."*"_
lhança. Combinaçâo", enrlretant", pÃ*"p6à- com a natureza das representações; tais mudanças devem
ii"ráiããaã ocolrer na meüda em que as representações, que assim sào
Não se pode pois assimilar a semethánça à contisüidade
_-
sem menosprezar a natureza da semelhançâ e sem fãzor postas em confronto, se assemelhem, se diferenciem ou se
póteses. a um tempo Íisiotógicas pii"or-ogiã^i, hi- contrastem. Nada impede que a semelhança desenvolva uma
se. justificam: doride se co"ncrui "qire ; ;ft;ãiiá-;ào'e ã"ã .ã""rou propriedade sui generia pela qual dois estados, separados por
fato puramente físico, que as representaçôes como tais. "* um intervalo de tempo, estariam determinados a se unircm.
susceuvels de se conservar. Rea.lmente, se elas desapareces_ são Para admitir a realidade dessa afirmação, não é absoluta-
mente necessário imaginar que as representações sejam coi-
desde q-ue saíssem da'cànr"iã""iíã'tiãr, r"
::*^.1?jlT9lt9apenes
soorevrv,essem sob a forma de um vestígio orgânico,
sas concretas; basta admitir que elas não sejam incxistôn-
as semethanças que pudessem ter com uma iadJ aiuãi'nao cias, que sejam fenômenos, mas fenômenos reais, dot:rdos
tini_tas do nada, pois náo podô haver nenhuma si- de propriedâdes específicas e que so coÍqlortem dc mo(lo di-
PTe.]?m-
m arrdade, direta ou indireta, entre ꧧe vestígio, ferente entre si conforme tenham ou não propric(l[(kr.s co-
do qual §e muns. Poderíamos ,encontrar nas ciências da natulr.ztt inÍrmc.
SOCIÔLÔGIÀ E TD,OSÔFII rtqDrvrlrrAr§
nEFRESENTÂçõES

ros fatos onde a semelhança age dessa Íorms. Quando cor. to difercntes. sem que se modifique na mesma proporção; as-
pos de de,nsidades diferentes são misturados, aquêIes que têrn
iim lamuem'as imlressões que êle desperta sao sempre mru-
densidade semêIhante tendem a se agnrpar e a distinguir-sô io oerais. Dando-sé aos membros a posição conveniente' po-
dos demais. EDtre os sêres vivos os elementos semelhante§ Á.-8" or""rir a um indivíduo a idéia de prece, nao de uma
têm tal afinidade entre § que acabam por se imiscuírem iltãil;";ü ú"ã erc* drsso, se é cerio que.todo estado
uns nos outros e tornarem-se assim ,indistinguíveis. Natura). ãã ãonsoienciâ é cercado de movimentos, é preciso acrescen-
mente é possível crer que tais fenômenos de atração e d,e aglu^ [.r-oüe-quat to mais a representação se alasta da sensaçãoe
tinação se expl,iquem à luz de razões mecânicas e não por ;;;"1;;;;-*.is o elemerito motoi perde emsupenores importância
um atrativo mrsterioso que o sernelhante tenha pelo seme. íiÀiii.iao positivo. As funÇões intelectuais pres-
thante. Mas por que não explicar de forma análoga o agru iãr"ái"ao, it'ftiçoei oe movimentos' como o provam
pamento das representações similares no espírito? Por quc ;âá";il;;"fii;ãpitãr
"irTããã. +iã pu'" tanto desempenha a atençáo
não poderia haver um mecanismo mental (mas não exclu.
slvamente Íísico) que explicasse essas associações sem fazet íüu"to a-piop"id natuieza- da- tào
atençáo., to"- 991::q^::tt"-
coirpletã quanto po-ssíveI'
intervir nenhuma virtude oculta nem tampouco alguma e cialmente numa suspensâo,
áã ,iiriaua. fÍsica. ora, uma simples hegaçào. de motilidade
tidade escolástica? nâo ooderia servir para caracLerizar a infinita diversidade
para dei-
'Iabtez náo seja mesmo impossível aperceber-se desdé, ããJ tãiãiiã""ãa iáeaçao. o esÍôrço que lazem-os que- aque-
agora, pelo menos em largos traços, em que sentido poderiâ xai ae agir não é mais-Iigado a esta concepção do
ser buscada essa explicação. Uma repr.esentação não se pro. 'la se a íeeunda no§ exigiu o mesmo eslôrço de atençaopode que
duz sem agir sôbre o corpo e o espírito. Já, para nascer ela ;'*#.it;.'üã.-ã-raiã-"ntr" o presente ê o pas-sado
pressupõe certos movimentos. Para ver uma casa que esta. pu-
taàném ser estabeleciáo com a ajuda de 'intermediarlos no
no momento sob meus olhos, é necessário que eu contraia dê iãÀã"tó intelectuais. Realmente, qualquer representaqao'
uma certa Íorma os músculos ocúares, dê à cabeça certa. ;;;;i;;;ile ie proauz, areta àténi dos óigãos .o,P1op"io
inclinação de acôrdo com a a.ltura e as dimersões do pré" ;.;;irú. isto é. as reôresentações presentes e passada's que o
dio; aiém disso, a sensação, logo que comece a existir, de. có'nstitúem, desde que se admita, como nós, que as rep'resen-
termÍna, por sua vez, certos movimentos. Ora, se ela já ocor" ia"ães pasÁadas su-bsistem conosco' o quadro que reJo nes-
reu uma primeira vez, isto é, se a mesma casa foi vista an. ;;;;"i.;h;c"-ãe àeterrninada maneira sôbre tal ou qual
teriormente, os mesmqs movimentos foram executados nes^ put-
à; ;ilh* asfirações, tat ou qual dos. meus. desejg:t--t com
sa oportunidade, §ão os mesrnos músculos que Íoram mo- cencào oue me ocorre encontía-se pois solidária- êsses
vimentados e da mesma maneira, pelo menos em parte, quer ;;ífi;.";i;;;tãs mentais. Desde-que agora ela me seia
dizer nâ medida €m que as condições objetivas e subjetivas ;;õ;;;"ãü; agiia iaci',ticamente sôbre êsses mesmos ele-
da experiênc,ia se repitam idênticamente. Existe, pois, des- mêntos oue duram sempre, salvo quanto às moditicações que
de agora, uma ligação de conexidade entre a imagem desta o ternpo'lhes poderá têr acarretado' Ela os excitara' pots'
casa, tal como minha memória a conserva, e certos movimen- àa primeiira vez e por êsse canal esta excitaçáo comu-
ros; dado que êsses movimentos sáo os mesmos que acom- "o-o
iiàãi-."-a'"ó* áiepreseritaçào anterior com a quat ê]es p?s-
panham a sensação atual do objeto, atraves dêtres se estabo-
sam a ficar daqui por diante em ligação e que serapsÍqui-
asslm
rece um& ligação entre a pereepção presente e a percepção aos estados
passada. Suscitados pela primeira, êles suscitam de nôvo a ievivescida. Poi3, a-menos que se nãgüe
;;Aüiãú;, ética.ia, nâoas1.vê p9"
^que 9t19--êI-":.^?3"-f'1,* '
segunda, despertam-na; pois é Íato conheoido que imprimin- nronriedade de transmltrr vida iêles exista aos outros
do-se ao corpo uma determinada atitude, provocÍurLse as ';ríá;;.-;;* luais estão em lehção,
rdéias ou emoções correspondentes. .da Ír.Ieslna-Íorma
-movimento
ãiíã"i,r"ã *r"iu'poáe t,u"t*itir seu às células
mais
Todavia, êste prlmeiro Íator não poderia ser o mais im-
portante. Tão real quanto possa ser a ligaçáo entre as idéias
iui. fenômenos dã transferência
à
são
vida
mesmo.
"iriiri"..
fáceis de conceber
-àtt. ,ro q,,á co""trne representativa
e os movimentos, ela nada tem de muito preciso. O mesmo não é fornàda de átomos' separados uns se
dos
in-
sistema de movimentos pode servir para objetiva,r idéias mü- partes
üir;' ;:;;ãã;;"-;iã";, no quat
"o"ã". tôdas-as
TÍI

ÀEPBESEN]TÀÇOES INDIVI'I]AIS 29
socloÍ.oaIÂ E rú"osoFiÀ

terpenetram. Nós submetemo,s, aliás, ao leitor êsse esbôco de cia, a difipuldade que possamos ter para fâzer uma idéia de
fenômeno tão desconcertante não será motivo suficiente para
explicação apenas a título de indióaeão. Nosso obietüo é que se possa contestaJ-lhe a realidade e teremos que admi-
sobr,etudo mostrar que não há nenhuma impossibiliáade em
que a. semelhanç?, por si mesma, seja causa- de associaQões. tir a existência de ondas de pensamento, cuja noçáo ultra-
passa e mesmo contradiz todos os nossos conhecimentos
Pois, tendo 6ido tevantada essa preiensa impossibilidadà co_
mo argumento para reduzir a similaridade á contiEüidade o atuais. Antes que fôsse demonstrada a existência de raios
a memória mental ,à memória fÍsica, impunha-se qu-.-e se mos_ luminosos obscuros, penetrando corpos opacos, ter-se-ia fà.
trasse que tal problema nada tem de irisolúvel. ' cilmente provado que tais raios seria"m inconciliáveis com a
I]atuteza" da luz. Poderíamoos fàcilmente multiplicar os exem-
plos. Assim, embora um fenômeno não seja claramente re-
presentáv€I ao espírito, não se tem o direito de negá-lo, des-
III de que se manifeste por efeitos def,inidcs, êstes representá-
veis e que para aquêles servem de indícios. Nós o imagina-
Dessa forma, não sômente o único meio de livrar_se da mos então, não por êIe próprio, mas em função dêsses efeitos
psicologia epifenomenista consiste €m admitir que as repre_ que o caracterizam. Aliás, não há ciência que não se veja
sentações sejam capazes de peÍsistir na qual dáde de repre_ obrigada a usar tal artiÍício para atingir as coisas de quo
sentações, como a existência de associacõe-s de idéias Dela se- cog,ita. Ela vai de Íora para dentro, de manitestações exterio-
melhança demonstra diretamente essa persistência. ^ nes e imediatamente sensíveis êrs características internas que
- Entretanto, observa-se que tais d,ificuldades apenas po- tais manifestações revelam. Uma corrente nervosa, um raÍo
dem ser evitadas em troca dà outra que não é meior. Real- luminoso são inicialmente já um "não sei o quê" do qual se
mente, qizem, as representações não pôdem conservar_se como reconhece a presença graças a êste ou aquêle de seus efeitos,
7
!
tais senão fora da consciência; pois hão temos nenhum sen_ e é justamente tarefa da ciência determinar progressivamen-
timento de tôdas as idéias, sensiações, etc, que possamos ter te o conteúdo dessa noção inicial. Se, portanto, nós pode-
experimentado em nossa vida passada e dás qüais seiamos mos constatar que certos fenômenos só podem ser causados.
capazes de nos recordar no futuro. Ora, está eslabeteciào co_ por representa4ões, ou seja, se êIes constituem os sinais ex-
mo princípio que a representação não pode ser definida se_ teriores da vida representaüiva e se, por outro lado, as repre-
não pela consciência; donde se conclüria que uma reDresen- sentações que assim se revelam sáo igD.oradas pelo sujeito
tação é inconcebivel, que sua própria noçãô e conÍ,raciitória. no qual se produzem, diremos que podem existir estados psí-
com que direito pode-se assim l,imitar a vida psíqui. quicos sem consciência, qualquer que seja a dificuldade que
ca? ^ _[4a!
Naturalmente, se se trata apenas de uma definiôão- de a imagj.nação possa ter €rn concebê-los.
palavra, ela é legitima pelo próprio fal,o de ser arbiÍrária;
mas com isso não se poderá concluir nada. Do fato de têr- Ora, os Íatos dêste gênero são inumeráveis desde que,
pelo m€nos se entenda por consciência a opressão de um deter.
mos convencionado de chamar psicológicos apenas os esta- minado estado por um dete,rminado indivíduo. O que se pas-
dos conscientes, não decorre a existênCia exclirsiva de Íenô- sa na realidade em cada um de nós é uma soma enorme de.
menos orgânicos ou físico-químicos onde não exista mais
fenômenos, que sáo psíqúcos sem que sejam apreendidos.
corxciência. É uma questão de Íato que apenas a observa. Dizemos que são psíquicos porque se traduzem externamen-
ção pode. resolver. Querer-se-á dizer que aeÀde que se retire te pelos ,indícios característicos da âtividade mental, isto é,
a- co_nsciência da Íepresentação, o qué resta não é represen-
pelas hesitações, pela indecisão, pela adaptação dos movi-
tável à imaginação? Mas, neste párticutar, há milhâres de mentos a um determinado fim. Se quando ocorre um ato
fatos autênticos que poderiam iguâlmente ser negad.os. Não em vista dô uma determinada finalidade, não estamos se-
sabemos o que seja um meio ma,teriâI imponderável e não guro.s de que ê1€ seja intêIigente, pergunta-se de que manei-
podemos do forma âlguma idealizá-lo; enfretanto tal hipó-
tese é necessária pâra o entendimento da transmissão ãas
ra a intel,igência pode se diferenciar daquiio que não é inte-
ondas luÍninosas. Quando fato.s bem estabelecidos vêm de- ligência, Ora, as experiôncias conheoidas de Pierre Janet
monstrar que o pensamento pode ser transmitido a distân- provaram que mútas ações apresentam tôdas essas caracte-
JO SOCÍOLOGIÁ E !'ILOSOFIÁ
T8PRESENTÁçóES ÍlrDrvrDuars

rÍsticas sem que, no entanto, sejam conscientes. Por exemplo, verá necessidade de recorrer aos processos compl,icados e ar-
um indivíduo que acaba de recusar.se a cumprir uma ordem, tificiosos que hoje se empregam. Náo estamos ma.is no pon-
conforma-se dôcilment€ €m cumpri-la desde que se tenhâ o to de considerar as leis dos fenômenos como superiores aos
cuidado de distrair sua atenção no momento em que a.s pala- própúos fenômenos, a êstes determinando do exterior; elas
vrâs imperativas são pronúnciadas. É evidentêmentd um lhes são imanentes, nã.o são ma,is que sua maneira de ser.
conjunto de representaçõ€s que dita sua atitude, pois a or- Se, portanto, os fatos psíqúcos não existem senão no quan-
dem não pode produzir seu efeito senão após ser ouvida e to são por nós conhecidos e da forma pela qual os conhece-
compreend,ida. Entretanto, o paciente náo suspeita daqülo mos (o que vem a ser a m,esma coisa) suas leis seráo obtidas
que ocorreu; nem mesmo sabe que obedeceu; e se, no mo- imediatamente. Para conhecê-las não será preciso mais que
mento em que está executando o gesto comandado, nós o fa- a observação. Quanto aos fatôres da. vida mental que, sendo
zemos nolá-lo, isso é para êle a mais surpreendente das des- inconscientes, não podern ser conheoidos por êsse caminho,
cobertas.ll Da mesma forma, quando se determina a um não seriam da alçada da psicologia e sim da fisiologia. Não
hipnotizado que náo veja ta,I pessoa ou tal objeto que está temos necessidade de expor as razões pelas quais esta psico-
sob seüs olhos, â proibição só pode agil se estiver represen- logia simpl,ista não é sustentável; é certo que o mundo in-
tada no espírito. Entretanto, a consciência não está de Íor- terior é ainda em grande parte inexplorado, que descober-
ma alguma prevenida quanto a isso. Citam-se igualmente tas nesse campo são realizada§ todos os dias, que muitas
casos de numeração inconsciente, cálculos bastante com- outras ainda estão por ser Íeitas e que, por conseguinte, não
I plexos feitos por inüvíduos que disso não tinham a menor basta apenas um pouco de atenção para dêle tomar conheci-
percepção.u Essas experiências, que se repetiram de muitas mento. Responde-se em vão que tais representações, que pas-
maneiras diferentes, foÍam realizadas na verdade sôbre es- sam por inconsci.entes, são apenas percebidas de maneira in-
i
tados anormais; entretanto, apenas reproduzem de forma completa e confusa. Pois essa confusão não pode derivar
I
ampliada aquilo que ocorre normalmente em cada um de senâo de unra causa: que nós percebemos tudo que essas re-
I
nós. Nossos julgamentos são a cada instante mutilados e presentações encerram e que nelas existem elementos, reads
deformados por julgamentos inconscientes; apenas vemos e atuante's, que, por conseguinte, náo sáo fatos puramente Íí-
I aquilo que nossos preconceitos permitem e ignoramos tais sicos e que entretanto não são conhecidos na sua intimida-
i
preconceitos. Por outro lado, estamos sempre em um certo de. Â consciênc,ia obscura de que se fala é apenas uma in-
estâdo de d stração, uma vez que a atenção, concentrando o consciência parcial, o que leva a reconhecer que os limites
espírito sôbre pequeno número de objetos, o desvia de um da consciência não são os mesmos da ativiidade psíquica.
número maior de outros; ora, tôda distração tem por efeito
manter fora da consciência estados psíquicos que não dei- Para evitar a pa.lavr? "inconsciência" e as dificuldades
xam de ser reais, uma vez que são atuantes. Quantas vêzes que expedmenta o espírito em concebor o que ela exprime,
mesmo há um verdadeiro contraste entre o estado realmente ser a preferível talvez vincuiar êsses fenômenos inconscien-
sentido e a ma.neira pela qual aparece em relação com a tes a centros secundários de consciência, dispersos pelo or-
t consciência; cremos que odiamos alguém, quando na ver- ganismo e ignorados do centro principal, ainda que normal-
dade o amamos e a realidade dêsse amor manifesta-se por mente a êste subordinados; ou mesmo, admitir.se-á que pos-
.atos cujo significado outras pesssoas percebem perfeitamen- sa haver consciência sem o "eu", sem apreensão do estado
I te, no mesmo momento em que nos julgamos sob a iníIuên- psíquico por um determinado indivíduo. Náo pretendemos no
cia do sentimento contrário.rs momento discutir essas hipóteses, multo plausíveis aliás,14 mas
que deixam intâcta a proposiçâo que desejamos estabclccel.
i Aiiás, se tudo que é psíquico fôsse consciente e tudo que Tudo que queremos dizer, com efeito, é que Íerrômenos ocol'lcm
é inconsciente fôsse psicológico, a psicologia deveria voltar em nós, que são de oÍdem psíquica e entretanto não são conhe-
ao antigo método introspectivo. Pois, se a realidade dos es- cidos do "eu" que nós somos. Quanto a saber se são perr:ebidos
tados mentais se confunde com a consciência que dêies te- por algum "eu" desconhecido ou o que podem ser ôlcs, se
i
mos, a consciência é suficiente para conhecer integralm€nte estão fora de qualquer apreensão, isso não nos importa. Ad-
€ssa realidade, visto que ambas são uma coisa só e nâo ha- mitamos apena.s que a vida representativa se estcnda além
T'
I

SOCIOLOGII E I:ILOSOTIA REPaESENTÂçõEa rxDrÍrruÀrs

de nossa consciênc.ia atual e a concepção de uma memória Ora, quando dissemos alhurcs que os fatos sociàjs sã,o,
psicológica tornar-se-á inteligível. Ora, tudo o que nos pro- êm um certo sentido, independentes dos indivíduos e exte-
pomos a demonstrar é que esta memória existe, sem que se- riores em relagão às consciências individuais, apenas afir-
jamos obrigados a optar entre tôdas as maneiras possÍveis marnos no que tange ao reino social aquilo que a.cabamos de
de concebê-la. estabelecer a propósito do rcino psíqúco. A sociedade tem
por substrato o conjunto de ind,ivíduos associados. O siste-
ma que formam pela união e que va.ria de acôrdo com sua
IV disposiçáo sôbre a supedÍcis do teuitório, com a natureza e
o número das vias de comunicações, constitui a base sôbre
Estamos agora em condições de concluir. a qual se constrói a vida soc,ia.l. As representações que são
Se as representações, uma vez que existem, continuam a trama dessa vida, originam-se das relações que se estabe-
a existir por si, sem que sua existência dependa perpàtua- lecem entrê os indivíduos assim combinados ou entre os gru-
mente do estado dos centros nervosos, se são suscetíveis de pos secundários que se intercalam entre o indivíduo e a so-
agir diretamente umas sôbre as outras, de se combinar de ciedade total. Ora, se nadâ se vê de extraordinário no fato
acôrdo com leis que thes são próprÍas, é porque são rea"lida- de as representações individuais, produzidas pelas ações e
des, que mesmo mantendo íntimas rela4ões com seu subs- reações permutâdas entre os elementos nervosos não serem
trato, dêIe são entretanto, até certo ponto, independentes. inerentes a êsses elementos, que haverá de surpreendente no
Realmente, essa autonomia não pode ser mais do que rela- fato de as representações coletiva,s, produzidas pelas ações e
tiva, pois não há reino da natureza que nã,o se viricule aos reações permutadas entre as consciências elementares das
outros reinos; nada será, pois, tão absurdo quanto erigir a quais é feita a sociedade não derivarem diretamente destas
vida psíquica sôbre uma espécie de absoluto, que não viria ütimas e, por conseguinte, a elas extravasarem? A relação
de lugar nenhum e que não se ügaria ao resto do universo. que, nesss conceitq une o substrato social ,à vida social é,
É evidente que o estado do cérebro afeta todos os fenômenos em todos os pontos, anáIoga àquela que se deve admitir en-
intelectuais e que é fator iimediato de a.lguns dêles (sensa- tre o substrato fisiológico e a v da psÍquica dos indivíduo§,
ções puras). Mas, por outro lado, conclui-se do que foi dito desde que não se queira negar tôda a psicologia prôpriamen-
que a vida representativa náo é inerente à natureza intrínse- te dita. .â.s mesmas conseqüências devem pois se produzir de
ca da matéria neÍvosa, pois que subsiste em parte por suas uma parte e de outra. A independência, a exterioridade re"
próprias fôrças e tem maneiras de ser que lhe são peculiares. lativa dos fatos sociais em relaçáo aos indivíduos é mesmo
A representação não é um simples aspecto do estado em que mais imediatamente apafente que a dos fatos mentais com
i se encontra o elemento nervoso l1o momento em que ocorre, relação às células cerebrais; pois os primeiros, ou pelo me-
I
não só porque ela se mantém mesmo quando êsse estado não nos, os mais importantes dêles, trazem, de maneira visível a
mais existe, como porque as relações das representações são marca de sua origem. Com €feito, se se pode contestar tal-
de natureza diÍerente da.q relações dos elementos nervosos vez que todos os fenôrnenos sociais, sem exceção, se impo-
subjacentes. A representação é algo de nôvo, que certas ea- nham aos indivíduos vindos de fora, a dúvida náo parece pos-
racterísticas da célula naturalmente contribuem para que sível no que tange às crenças e práticas religiosas, as regras
se produzet, mas que não são súicientes para Íormá.la, uma da morai, os inumeráveis preceitos do direito, ou seja, pelas
vez que a elas sobrevive e manifesta propdedades diferentes. manifestações mais características da v,ida coletiva. Tôdas
i Mas dizer que o estâdo psíqúco não deriva dúetamente da são expressamente obrigatórias; ora, a obrigação é a prova
céIu-la quer dizer que êle não está inclúdo na célula, que se de que essas maneiras de agir e de pensar não são obra do in-
forma em parte fora delâ, e que, por isso mesmo, lho é exte- divíduo, mas emanam de uma potência morâI quo o ultra-
rior. Se o estado psíquico existisse por causa da célula, êIe passa, quer a imaginemos misticamente sob a forma de um
existiria nela, uma vez que swr realidade não the adviria de deus, quer delâ façamos uma concepção mais temporal e
outra pa,rte, científica.r,5 A mesmâ lei encontra-se portanto nos dois reino§.
34 SOCIOLOGIA E FIIO§OFIÀ Itf PRESENTÂçõES INDIVIDÜÂIS

Ela se explica, alias, da mesma maneira nos dois casos. finidas seÍúo com zonâs de ma.ior ou menor extênsâo, Tal-
Se se pode dizer, sob certos aspectos, que as representacões vez mesmo o cérebro todo participe da elabora4ão da qual
coletiyas são exteriores com relação às consciências indivi- resultam; é o que parece demonstrar o fato da.s substitui-
duais, é porque não derivam dos indivíduos considerados iso- gões. Enfim, é também, ao que parece, a única maneira, de
ladamente, mas de sua cooperação, o que e bastante diÍeren- se compreender como a sensação depende do cérebro, mes-
te. Naturalmente na elaboração do resultado comum, cada mo constituindo um fenômeno nôvo, Depende porque é
qual traz a sua quota-parte; mas os sentimcntos privadqs composta de modificações moleculares (de outra forma, de que
apenas se tornam socia.is pela sua combinaqáo, sob a açâo seria feitâ e de onde proviria?) ; mas é ao mesmo tempo
de Íôreas sui getueris, que a associação desenvolvc; em con- outra coisa, pois resulta de urna síntese nova e sui generis,
seqüência dessas combinações e das alteraçõcs mútuas que onde tais modificações entram como elementos, mas sáo
delâs decorrem , êles se transtmmarn ern ozdra corsa. Uma transformados pelo próprio fato de sua Íusão. Nâturalmen-
síntese química se produz que concentra e unilica os elemen- te ignoÍamos como os movimentos podem, ao se combinarem,
tos sintetizados e, por isso mesmo, os transÍot'ma. Uma vez dar origem a uma representação. Mas sabemos tampouco
que essa síntese é obra do todo, é o todo quc cla tem por como um movimento de tro,nÂÍeú a7 pode, quando é interrom-
ambiente. A resultante ultrapassa, portanto, cada espírl.to pido tmnsformar-se em calor ou reciprocamente. Entretan-
individuâ], assim como o todo ultrapassa a parte. Ela existe to não se duvida da realidade dessa tmnsforma,çáo; que se-
no conjunto, assim como existe por causa do conjunto. Eis rá então que a primeira pode ter de menos possível que essa?
aí em que sentido ela é exterior em relação âo particular. De maneira mais geral, se a obj eção fôsse válida, seria ne-
Por certo, cada um contém qualquer coisa dessa resultante; cessário negar a possib,ilidade de qualquer modificação; pois,
mas ela não está inteira em nen}Ium. Para saber o que é entre um efeito e suas causas, uma resultanto e suas com-
na realidade deve-se considerar o agregado em sua totali- ponentqs, há sempre uma distância. É do domínio da meta-
dade.16 É êste que peru;a, que sente, que quel', ainda que física encontrar uma concepção que torne essa heterogenei-
não possa querer, sentir ou agir senão por inter-rnédio de dade representável; para nós basta que sua existência náo
consciências particulares. Eis aí tambóm como o fenômeno possa ser contestada,
social não depende da natureza pessoal dos ,indivíduos. É Mas entáo, so cada idéia (ou, pelo menos, cada sensa-
que na Íusão da qual ê]e resulta, tôdas as características ção) é devida rà síntese de um certo número de estados celu-
individuais, sendo divergentes por definição, neutralizam-se lares combinados entre §, de acôrdo com leis e por meio de
e apagam-se mütuamente . Apenas as propriedades mais ge- fôrças ainda desconhecidas, é evidente que ela não pode ser
rais da natureza humana sobrenadam; e precisamente por prisioneira de nenb.uJÍra célula determinada. Ela ultrapassa
causa de sua extrema generalidade náo poderiam expücar porque nenhuma é súiciente para
cada uma Doroue para suscitá-la. A
as formas muito especiais e complexas que caracterizam os vida representâtiva náo pode se repartir de mane'ira
ma definida
fatos coletivos. Não se quer dizer que elas nada tenham com entre ú diversos elementos nervosos, uma vez que náo há re-
o resultado mas que são apenas suas condigões mediatas e para a qual
nresentacão Dâra
presentação ouâl não colaborem vá.rios
váxios dêsses elemen-
longínquas. O resultâdo não se produziriâ se elas não o tos; zras a oiila
i;os; oidn rryresenl.ati.oo só púe
rryresentatiDo só ed.stit rú tdo lotmn-
poil,e edstit
admitissem; não são elas entretanto que o determinam, ilo pln un ret nião, a.ssittu @tno a tiiln coletioa 3ó pod,e cris-
Ora, a exterior.idade dos fatos psíquicos em relação àrs tir no todo Íorm,onn pela rsunifu d,os irld,iaídu$. Ncnllurnir
céIulas cerebrais não tem outras causas nern é de natureza delas é compôsta de partes d'eterminadas que sejam vint:ttht.
diferente. Nada, com efeito, autoriza a supor que uma re- das a partes determiDadas dos respectivos substratos. (:lr(llr
presentação, por elementar que seia, possa ser diretamente estado psíquico se encontra dessa foma, em faco dil ('(nrlil,i
produzida por uma vibração celular, com intensidade e to- túção própria das céIulas Dervosas, nas mesmas condiqrx','i tI'
nâlidade determinadas. Mas não há sensagão para a qual independência relativa que têm os fenômenos socltls ('lr llr('r'
nã,o concorram um certo número d€ células. A maneira peia das naturezas inüviduais. Como êle não ss r«tttz rr tllttrr
qual se fazem as localizâções cerebrais náo permite hipó- simples modificação molecular, náo está à mctt:ê rltut tttrxll.
tese diferente, pois as imagons nunca mantêm xelações de- ficações dêste gênero que podem so produzil' lsolttr ltttttt't t l'tr
soclroLocl E EII,oêOlIll
RTPBEBEIrI ÀçõES tNDrVrDlrÂIA

sôbre Gs üferentes pontos do encéfâlo; ünicâmente as fôrças mo papel que o carbono nem âpre§entar as mesmas proprie-
físicas que afetam o grupo inteiro de células que lhe serue dades. Não é menos iladmissível que cada aspecto da vida
de basê podem assim afetá-lo. Mas nâo há necessida.de, para se encarne em um grupo diferente de átomos. A vida não se
poder durar, de ser pe4Êtuanente sustentado e como que fraciona dessa forma: é una e, por consegu.inte, só pode ter
recriado sem interrupção por um contínuo aÍluxo de errergia por sede a substância viva em sua totalidade. Existe no todo
nervosa. Para reconhecer ao espírito essa autonomia ümita- e não nas partes. Se, portanto, para bem fundameÍrtá-la,
da, que é, no fundo, tudo que nossa noção de espiritltúli- não é necesúrio dispersá-la entre ás fôrças elementares das
dnle cont'ém de positivo e de essencial, não é pois necessário quais é resultante, por que haveria de ser de outra forma
imaginar uma alma, separada de seu corpo e levando, em para o pensamento individual com relação às células cere-
não se sabe qual o meio ideal, uma existênoia sonhadora e brais, e para os fatos sociais em relação aos indivíduos?
solitária, A à]ma está no mundo; ela mkture sua vida à
vida das coisas e pode-s€, desdo que se queira, dizer que to- Na realidade, a sociologia individualista apenas aplica
dos os nossos pensamentos €stáo no cérebro. É preciso acres- à vida social o pdncípio da velha metaÍisica matorialista:
centar apenas que, no inierio! do cérebro, ê1es náo são rigoro- pretende, realmente, explicar o complexo pelo simples, o su-
samente localizáveis, que não são situados em pontos definidos,
perior pelo inferior, o todo pela parte, o que é contraditório
em sua própria expressão. Certamente, o princípio oposto não
ainda que estejam mais relacionados com certas regiões do que
com outras. Apenas o fato dessa diÍusão basta para provar que nos parece menos insustentável; não se poderia melhor, com
os pensarnentos são alguma coisa de especíÍico; pois, para a metafísica ,idealista e teológica, derivar a parte do todo,
que sejam assim difusos, é de âbsoluta necessidade que sua porque o todo nada é sem as partes que o compõem e nâo
pode tirar do nada âquilo de que necessita para existir.
maneira de composição não seja a mesma da massa cerebÍal
e que, por conseguinte, tenham uma maneira de ser que lhes Só resta, pois, explicar os Íenômenos que se produzem no
seja peculiar. todo pelas propriedades características do todo, o complexo
pelo complexo, os fatos sociais pela sociedade, os fatos vitais
Aquê]es, portanto, que nos acusam de deixar a vida so- e mentais pelas combinações sui generis de que resultam. É
cial inaefinida porque nos recusamos a assimilá.la à cons- êsse o único percurso que pode seguir a ciência. O que não
ciência ind,ividual, não se aperceberam realmente de tôdas as signif ca que, entle os diferentes estádios do real, haja so-
conseqüências de sua objeção. Se fôsse fundamentada, ela lução de continuidade. O todo não se forma senão pelo agru-
poderià igualmente ser aplicada às relações do espírito_ e do pamento das partes e êste agrupamento não se faz em um
óérebro; ém conseqüência, ser a necessário, para ser lógico, instante, por um milagre repentino; há uma série infinita de
assimilar também õ pensamento à céIula e retirar da vida intermediários entre o estado de isolamento puro e o estado
mentat tôda a especificidade. Mas nesse caso cairíamos nas de associação caracterizada. Mas, à medida em que a asso-
inextricáveis dificuldades que já indicarnos. Mai§ que isso, ciação se constitui, ê14 dá origem a fenômenos que não deri-
partindo-se do mesmo princípio, dever-se"ia dizer igualmente vam diretamente da natureza dos elementos assoeiados; esta
que as propriedades da vida residem nas partículas de oxi. independência parcial é tanto mais acentuada quanto maÍs
gênio, hidrogênio, carbono e azôto que compõem o protoplas- numerosos são êsses elementos € mais enêrgicamente sinteti-
ma vivo, pois êste não contém nada além dessas partícula§ zados. É daí, seguramente, que se originam a sutileza, a
minerais, assim como a sociedâde não contém nada mais do tlexibilidade, a contingência que as formas superiores do
que indivíduos.18 Ora, aqu,i, talvez a impossibilidade do con- real manifestam em comparação com as Íormas inferiores,
ceito que combatemos apareça com êvidência ainda rnaior do no seio das quai,s, entretanto, elas mergulham suas raízes.
que nos casos precedentes. Inlcialmente, como poderiãm qs Realmente, quando uma maneira de ser ou de fazer depende
movimentos vitàis ter como s€de elementos que não tivessem de um todo, sem depender imediâtamente das partes que o
vida? E também, como se repaÉiriâm as propdedades carâc- compóem, ela goza, graças a essa diÍusão, de uma ubiqü-
terísticas da vida entre tâis elementos? Náo poderiam se re- dade que a libera até certo ponto. Como não está prêsa a
partir igualmente entre todos, uma vez que êstes são de di- um ponto determinado do espaço, não está sujeita a condi-
ferentes espécies; o oxigênio não pode desempenhar o mes. ções de existência que sejam rig,idamente limitadas. Se algu.
REPRESENaÂçõES rNDrlaDUArs
socloloct E rrLosoua

ginou-se que se formava em grande parte sob a influência de


nur causa a levâ a, modificar.se, as modificações encontrarão causas extra-sociológicas, porque não se via vínculo imediato
menor resistência e se produzirão mais fac,ilmente, uma vez entre a maior parte das crenças religiosas e a organização da.s
que ela tem, de certa maneira, maior campo para se movi- sociedad€s. Mas, com êsse tipo de raoiocínio, seria necessá"
mentar. Se essa ou aquela parte a,isso se recusa, outrâs po- rio deixar fora da psicologia tudo o que extravasa da pura sen-
d.erão fornecer o ponto de apoio necessário à nova disposi- sação. Pois se as ser»ações, peças iniciais da consciência in-
ção, sem que sejam obrigadas, por lsso, a também se reajus- dividual, não podem ser explicadas senão pelo estado do cére-
tarem. Eis aí, pelo mÍnimo, como se pode conceber que um bro e dos órgãos de outra forma, de onde proviria?
mesmo órgão possa se sujeitar a funções üferentes, que as desde que existem -passam a se combinar entre si, de acôrdo -
d.iversas regiões do cérebro possam se substituir uma às ou- a
com lek que nem a Ínorfologia nem fisiologia cerebral são
tra.s, que uma mesma ,instituigáo social possa sucessivamen- suficientes para explicar.
te cumprir âs mais variadas finalidades .
Dai decorrem as imagens e estas, agrupando-se por sua
Da mesma forma, a vida coletiva, embora residindo no yez, yêm a ser qs conceitos; à medida em que novos estados
substrato coletivo, pelo qual se liga ao resto do munda, nêIo se acrescentam aos antigos, como sáo separados por numero-
ii não vive de modo á ser por êle absorvida. Ela é simultânea- sos intermediários dessa base orgânica, sôbre a qual, entre-
mente dêle dependente e distintâ, assim como a função o é tanto, repousa tôda a vida mental, êles dela são menos ime-
do órgão. Naturalmente, urna vez que ela dêIe se origina diatamente independentes. Entreta[to, êsses estados não dei-
pois de outra Íorma, de onde proviiria? -
as formas que apre- xam de ser psíquicos; é alias nêIes que melhor se observa-
iil -
senta no momento em que se cria e que são, por conseguinte, rão os atributos caracterÍsticos da mentalidadeJo
fundamentais, levam a marca de sua origem. Eis por que a Talvez essas correlações sirvam para que melhor se com-
I
matéria primeira de tôda consciência social está em relação preenda porque nos preocupamos com tanta insistência em
estreita óom o número dos elementos sociais, com a maneira distinguir a sociologia da psicologia ind,ividual.
ll pela qual se agrupam e se distribuem, etc, isto é, com a na-
Trata-se simplesmente de introduzir e de aclimatar na
tureza do substrato. Mas, uma ltez qtTe uma primeira base sociologia um conceito paralelo daquele que tende cada vez
de representações assim se consüitua, elas se tornam, pelas mais a prevalecer em psicologia. Há uma dezena de anos,
lt razões que apresentamos, realidades parcialmente autôno-
mas, que vivem uma vida própria. Têm o poder de se atrair, com efeito, uma grande novidade ocorreu nesta última ciên-
de se repelir, de formar en e si sínteses de tôda estrÉcie, que cia: foram feitos interessantes esforços para se chegar a
constituir uma p§cologia que fôsse verdadeiramente psico- ,.,
são determinadas por suas afinidades naturais e não pelo es-
tado do meio em que evoluem. Em conseqüência, as repre- lógica, sem nenhum outro epíteto. O antigo introspeccionis- /
sentações novas, que são o produto dessâs sínteses, são da
mo contentava-se em déscrever os fenômenos mentais sem !,
mesma natureza: têm como causas próximas outras repre- explicá-los; a psicofisiologia explicava-os, mas pelo fato de /
sentações coletivas, e não tal ou qual característica da es- deixar de lâdo, como negligenciáveis, seus traços distintivos,
trutúa social. É na evolução religiosa que se encontram, I il uma terceira escola começou a se formar que pretende ex- /
püca-los guardando sua especificidade. Para os primeiros ,..
talvez, os exemplos mais expressivos dêsse fenômeno. Real-
ilLl merrte, é impossÍvel d€ se compreender como o panteão grego a vida psíquica tem realmente uma natureza própria mas
il que, colocando-a completamente ,à parte no mundo, deixa-a
ou rornano se formou se não conhecermos a constituiçáo da
cidade, a maneira pela qual os c]ãs primitivos pouco a pouco à margem dos processos habituais dá ciênoia; para os segun-- L
se confundirarn uns nos outros, o modo pelo qual a família dos, pelo contrário, ela nada é por s mesma, e o papel do
lri sábio consiste em afastar essa camada superficial para atin-
patriarcal se organizou, etc. Mas, por outro lado, essa vegeta-
g1r imediatarnente as realidades que e1a encobre; mas os
çáo luxuriante de mitos e lendas, todos êsses sistemas teo- dois lados concordam em ver na vida psíquica nada mais que
gônicos, cosmológicos, etc, que o pensamento religioso cons-
truiu, não se ligam diretamente a pârticularidades determina- uma delgada cortina de Íenômenos, transparente em rela-
dâs da morfologia social. É essa a causa de que se tenha fre- çáo rà consciência, segundo uns, despida de qualquer consis,
qüentementé desconhecido o caráter social da religiáo: ima- tência, de acôrdo com os outros. Ora, recentes extr)eriências.. (:
40 sOCIOLOGIÂ E FÍ,OSOTIÂ REPAEAEI{TÂçOTS INDIVIDUAIS

nos mostraram que seria preferível imagináJa como um vas- palavra não designa nada mais que um conjunto de fatos na-
to sistema de realidades sui generiÂ, feito de grande númeÍo turais, que devem ser explicados por causas igualmente na-
de camadas mentais superpostas, demasiado profundo e com- turais. Mas ela nos previne que o mundo nôvo que assim se
ptexo para que a simples reflexão possa penetrar-lhe os mis- abre à ciênoia ultrapa.ssa todo,s os outros em complexidade;
térios, muito especial para que as considerações puramente que não é simplesmente uma forma ampüada dos reinos in-
Ílsiotógicas possam expl,icá-lo, É assim que essa $piritudli. feriores, mas quê há fôrças que nêle agem que são ainda in-
d,aale coI,J que se caracterizam os fatos intelectuais e que pa- suspeitadas e cujas leis não podem ser descobertas exclusiva-
recia antes colocá-Io.s ora acima, ora debaixo da ciência, tor- mente pelos processos da análise interior.
nou-se, ela própria, o objeto de urna ciência po§tiva; entre
a ideologia dos introspeccionistas e o naturalismo biológico, NorAs Do CapÍrur,o r
fundou-se um natura"lismo psicológico, cuia legiitimidade ês- 1. Publicâdo nà Reuue d)e Métaphusique et de Morale,t. VI, número
te artigo talvez contribua para demonstrar. de maio de 1898.
2. 'De l'habitude",ln Reoue philosophi4ue, f, póg§ 350 e 351.
Uma transformação semelhante deve ocorrer em socio- 3. Legons de philosophie, I, 164.
togia e é justamente para êsse objetivo que tendem todos nos- 4. Principles oÍ Psachology, Í, 655 .

sos esforços. Se quase não existem mâis pensadolcs que ou- 5. rbid.,656.
sem colocar abertamente os fatos sociais à margcm da na- 6. Ibid., 138-745.
tureza, muitos crêem ainda que pala fundamentá-los basta" 7. Op. cit., Í, 563.
A. Op. cit., Í, L95.
que se thes dê como base a consoiência do indivíduo; alguns,, L Nbs originais consultados (ediçào de 1951 e posieriores), consta
chegam mesmo a reduzi-los às propriedadcs gcrais da maté- "...vie qui soit proprement physique...". Supõe-§e que tenha
ria oÍganizada. Para uns e outros, cm con.seqiiência, a socie- havido êim de imprensa, dado que a palavra "psíquica" comple-
dade nada é por si própria; não é rnais quc um cpifenômeno
ta melhor o sentido. (Nota do tradutor).
10. Ver JÂn4ES, op. ciô.,Í,690.
da vida individual (orgânica ou mcntal, Pouco importa) a§- 11. ver ? outo,rtu0,ti,ffiLe psucholngtque, págs. 237 e seguinte§.
sim como a representacão individual, scgundo Maudsley e 12- Ibid-. Íjé\8. 225 .

seus discípulos, náo ó mais quc um cpilcnÔmcno da vida fí- 13. De ácôrdo com JÁMES, náo haveda âí nenhu]na prova de uma
sicâ. A pfimeila não teriia outla I calidado que âquela que real inconsciência. Quando tomo por ódio ou indiferença o amor
que experi.nento, náo fâço mai§ do que dar um nome erràdo a
lhe comunica o indivíduo, ussim como a segunda não teria um estado do qüal estou plenamente consciente. confessamos
outra existência que aqucltr quo lho dá a célula nervosa e a náo compreendê-lo. se nomeio erradamente o estâdo é porque a
sociologia não passalià do unra Psicologia ") aplieada. Mas consciênciâ que dêle tenho é também erradâ, uma vez que náo
o próprio excmplo da psir:ologia dcmonstra que essa concep- exprime tôdas as câra,cterísticas dêsse estado. Etrtretânto, e§§as
caia,cterísticas que náo sáo conscientes, sáo atuantes. Sáo, pois,
ção da ciôncia devc scr ultlal)assada. Âlém da ideologia dos de cerLa maneira, inconscientes. Meu s€ntimento tem os elemen-
psicossociólogos, como iLlóm do naturalismo matedalista da tos constitutiyos do âmor, uma vez que determina em conseqüén-
sócio-antropologia, há lugal par'à um naturalismo socioiógi- cia, minha condutâ; ora, eu náo os peÍcebo tânto que minha pai-
co, quo consiclcrc os lcnômenos socais como fatos especifi- xáo me incUna em uma direçáo e â consciência que tenho de
minha pa,ixáo em outro. Os dois fenômenos náo sáo poúanto,
cos e que se empcnhc cm explicá-los respeitando retrigiosa- coincidentes. Entretarto, parece bem difíciI de se ver em uma
mente suas pecuiiar-idadcs. Nada pois de mais estranho que lrxslinaçáo como o amor coisa diferente de um fenômeno psíquico
o desprêzo com que nos censuraram, algumas vêzes, por um (ver JÂMES, r, pá9. 1?4).
certo materialismo. Muito pelo contrário, do ponto de vista 14. Fundamentâtlnente as noçóes de representâgáo inconsciente e de
consciêncie sem o "eu" que apreenda sáo equivalentes. Pol§,
em que nos colocamos, se chamamos de espiritualidade a quadrdo dizemos quê um fato psÍquico é inconsclente, entendemoa
propriedade distintiva da vida representativa no indivÍduo, apenas que náo é apreendido. Todo o problema consiste em sâ-
deyeremos dizer, com relação à vida social, que ela se define ber que êxpressáo deve ser preferlda. Do ponto de viste da lma-
por uma hiperespiritualidadz.,' entendemos com isso que o§ ginaçáo, ambas têm o Besmo inconveniente. É táo dlfÍcll lma-
atributos da vida psíquica aí se eÍrcontram, mas elevados a árnai uma representaçáo sem o suielto que se represente quanto
ulna representaçáo sem consciência.
uma potência bem mais alta e de maneir& a constituir algo 15. Se o saráter de obrtgação e dê constrângimento é tão essenclal a
de inteiramente nôvo. Apesar de seu aspecto rÍretafísico, a tais fatos, que são eririnentemente sociais, quanto é plausivel, a,n-
tes d€ qualquer examg que êIe se encontre igualmente, elnda que
menos úsivel, nos demais fenômenos sociológlcos ! Pois náo é pos-
sível que os fenômenos dê mesma natureza sejam tâo dlferentes,
a ponto dê que uDs penetreB no lDdivlduo a !'artir do exterlor, ao
pâsso que os outros resültem de processo contrário.
Á propóslto dlsso retiÍicamos uma tnterpretâçáo inexata, que CAPÍTTTLO II ':l
foi felta de nosso pensamento. Quando dissemos & Íespeito dâ
obrigaçáo ou do constrangimento que êlas eraJÍI a carârteristica
dos fatos ôociais, náo pensamos absolutamente em dar com isso
uma expllcâgão sumáriâ dêsses fato.s; qüsemos táo-sômente indi-
car um siDal sünples p€lo qual o soclôlogo pode reconhecer os fatos
que pertencem ao domÍnio de sua clência.
16. ConÍotm€ nosso livro sôbre o sulcidio (Le Suicíd,e, págs. 345-363) . DETERiltilÀoÃo D0 FATo il0RÂL1
I
n . nw8Íert ltansposiçáo de um lado parâ outro ou de uma pes-
soa doente - para lndiúduo sensível de a.cldentes câusados por
distúrbios do sistema nervoso c€ntral, graças à lnfluência de
agentes estesiogênicos, especialmente o imá. Descob€rto por
BúBa. Fbi realmente ohservado que em certos casos de histeria
tinha o eÍeito de sugesiâo e, por conseguinte, melhorava parâli- TbsEs
sias, contraçôes e adornecimentos. (Nota do Tradütor).
18. Pelo menos os individuos sáo os seus únlcos elementos ativos. A nEAUDADE MoRÁL, como qualquer espécie de realidade,
Pâra Íalâr com exatidáo, a sociedade compreende também coisa§. pode ser estudada de dois pontos de vista diferentes. Pode-se
19. Vê-se daí o inconveniente que há em definir os latos sociais como
os fenômenos que se produzem na socledade a pela' srciêdnd,e. A' tentar conhecê-la e compreendê-la; ou então, dispor-se a jul-
expressáo náo é exa,ta, pois há Ía,tos sociológicos e náo destituÍ- gá-ta. O primeiro dêsses problemas, que é nitidamente teóri-
dos de importância que náo sáo produtos da sociedade m⧠de pro- co, deve necessàdamente preceder o segundo. É o único de
d,utos socia,is já formados. Í como se deftníssemos os fatos psíqui- que aqui se tratará. Mostraremos apenas, ao terminar, de
cos como aquêles que sáo produzidos pela açâo combinada de que Íorma o método seguido e as soluções adotadas nos abrem
tôdas as célulâs cerebrâls ou dc rün certo número delas. Ern todo
caso, tal deÍiniçáo nã.o pode servlr para determlnal e circuns- o caminho para que abordemos o problema práLieo.
crever o objetivo dâ sociologia. Pols essas relações de derivaqeo Por outto lado, para poder estudar teôricamente a rea-
ll não podem ser estâbelecldas senáo à medida em que a ciência, lidade moral, é indispensável que se determine prêviamente
pmgúde; quaÍrdo se começa um& pesqursa, náo se sa.bem quais
sáo âs causas dos fenômenos que se pretende estudar el nunca em que consiste o fato moral; pois, para que possa ser obser-
mesmo se os conhece s€náo parcialrnente. É preciso, pois, lilÍli- vado, é necessário saber o que o caracteriza, a partir de que
tar, de acôrdo com outro critério, o campo de lnvestigagáo se iudícios poderemos reconhecê-lo. Esta questáo será tratada
náo se deseja delxá-lo indeterÍrinado, ou seja, se se quer saber em primeiro lugar. Em seguida tentaremos, se isso é possÍ-
dê que se trata.
QuaDto ao processo pelo qual se formam tals produtos sociais vel, encontrar explicação satisfatória para tais característi-
de segundo grâu, se tem alguma anâlogia com o que se observa cas.
na consciência individuql, náo deixa de ter fisionomia que lhe
é peculiar- Âs combinaçôes dâs quai,s resultâm os mitos, as teogo-
nias, as cosÍrrogonias populares náo sáo idênticas às associaqões
I
de idéiâs que se formam nos indiúduos, aindâ qtre ambas possam I
se êsclarecer mütuamente. I{á tôda uma paúe da, sociologia, que
deveria pesquisar a,s leis da ideaçáo coletiva e que esüá ainrla ln- Quais são as cãracterísticas distintivas do fato moral?
teirâmente por ser feita.
il 20. Quândo dizenos slnplesmente psicologia, ent€ndemos que sejâ â Tôda moral se nos apresenta como um sistema de regras
psicologia lndiyiduat e seria convenlente, para clar€za, das dls- de conduta. Entretanto, tôdas as técnicas são igualmente
cussóes, âsstn se restúngir o sentido ila pa.lavra. A psicologia regidas por máximas, que prescrevem ao agente a forma
coletlva é â sociologla, de uma Íomra integral; por que náo em- pela qual deve conduzir-se em determinadas circunstâncias.
pregar exclu§ivamente est8 última e4)re§são? InversâÍreutê, a
pa.lavra, "psicologia" sempre deslgnou a clêDcia da m€Àtalldade Que é, pois, que diferencia as regras morais das outras regras?
' no l.ndivÍduo; por que náo lhe conservar êste stgrúficado? Evi- 1.o Mostraremos que as regras morais são investidas
tar-se-iam dessa Íorma Eútos eqúvocos, de uma -autoridade especial em v,irtude da qual são obedeci-

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