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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto

ESTUPEFACIENTE
CONSUMO DE ESTUPEFACIENTES
TRÁFICO DE MENOR GRAVIDADE
Sumário:
I - O comportamento daquele que detém 13,482 gramas de Canabis (Resina), quantidade essa
que resultou provado ser suficiente para 43 doses diárias, sendo destinada uma parte dela ao
seu próprio consumo e outra à cedência a um terceiro que estava consigo, não constitui uma
situação de consumo compartilhado atípico, integrando, antes, o tipo de ilícito de tráfico de
estupefacientes, embora de menor gravidade, atento o facto de a quantidade de
estupefaciente detida ser pouca, tratar-se de canabis, estupefaciente de menor danosidade, a
cedência não ser onerosa, e que, no fundo, do que se trata é dum tráfico de muito baixa
intensidade, ficando até já próximo do referido consumo atípico.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8eaa713e340e8736802585
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


HOMICÍDIO INVOLUNTÁRIO
TEORIA DA ADEQUAÇÃO
INCREMENTO DO RISCO

Sumário:
I - No domínio dos acidentes resultantes da circulação rodoviária levantam-se específicos
problemas de imputação, relativamente aos quais a teoria da adequação se revela por vezes
insatisfatória sendo, por isso, necessário complementá-la ou corrigi-la, em certa medida, com
a denominada por Stratenwerth “conexão ou relação de risco”, podendo assim afirmar-se que
“o resultado só deve ser imputável à acção quando esta tenha criado (ou aumentado, ou
incrementado) um risco proibido para o bem jurídico protegido pelo tipo de ilícito e esse risco
se tenha materializado no resultado típico”.
II - Aquilo que seria um problema para a teoria da adequação, quando estritamente aplicada
no domínio dos acidentes rodoviários, em caso de concorrência de culpa do lesado, deixa de o
ser no âmbito da teoria da criação ou potenciação de um risco não permitido, pois à sua luz, o
que importa fundamentalmente apurar é se a conduta do agente, por um lado, criou ou
potenciou no processo causal um risco que se materializou no resultado típico, e por outro se
a intervenção da vítima no processo causal teve ou não o efeito de o interromper, ou fazer
cessar esse nexo causal e assim também a imputação daquele resultado ao agente.
III – Se a intervenção da vítima for previsível pelo agente e a conduta deste tiver agravado ou
potenciado o risco para o bem jurídico violado, em termos tais que tal agravamento ou
potenciação do risco se concretizou no resultado típico, segundo um juízo “ex ante” (ou de
prognose póstuma), de molde a poder afirmar-se que aquele resultado, nas circunstâncias em
que o agente agiu, era concretamente possível e previsível, ou, usando as palavras de
Stratenwerth, “que o agente – comprovadamente! – frustrou as medidas que teriam afastado,
com uma certa probabilidade, sob certas circunstâncias mesmo mensurável, o resultado
jurídico-penalmente relevante”, o agente deverá ser punido jurídico-

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/03ee0c2536847a02802585
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


REINCIDÊNCIA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO

Sumário:
A mera existência da reincidência penal não pode justificar a efetividade de pena de prisão,
por serem diferentes os respectivos pressupostos e requisitos.

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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL
RESOLUÇÃO CRIMINOSA
CRIME CONTINUADO
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL
ESTADO DE NECESSIDADE DESCULPANTE
DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DA PENA
PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE

Sumário:
I - O valor da prestação tributária a atender para efeitos do preenchimento do crime de abuso
de confiança fiscal é aquele que consta de cada declaração a apresentar à administração
tributária e deve ser superior a €7500.
II - A realização plúrima do mesmo tipo de crime pode constituir um só crime, se ao longo de
toda a realização tiver persistido a resolução inicial, um só crime, na forma continuada, se toda
a actuação não obedecer à mesma resolução criminosa, mas as várias resoluções criminosas
estiverem interligadas por um factor externo que arrasta o agente para a reiteração de
condutas, e um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores.
III - Nos casos de crime continuado existe um só crime porque, verificando-se embora a
violação repetida do mesmo tipo legal ou a violação plúrima de vários tipos legais de crime, a
culpa está tão acentuadamente diminuída, que só é possível formular um único juízo de
censura e não vários.
IV - A diminuição considerável da culpa do agente deve radicar numa situação exterior que
facilite ao agente a prática dos actos delituosos e o impele à sua reiteração.
V - A instauração de impugnação judicial questionando a situação tributária de cuja definição
dependia a qualificação criminal dos factos referentes ao IVA e ao IRS faz suspender o prazo
prescricional até ao trânsito em julgado da respectiva sentença.
VI - Só poderá falar-se em estado de necessidade desculpante quando esteja em causa a
defesa de bens jurídicos eminentemente pessoais, do agente ou de terceiro, mas a defesa de
bens de outra natureza, verificados que estejam os demais pressupostos, pode levar à
atenuação da pena, ou, excepcionalmente, à própria dispensa da pena.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/3ca367519fff233f802585b
40050060d?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


CRIME DE FRAUDE FISCAL
LIQUIDAÇÃO
MÉTODO DE PROVA PROIBIDO
AVALIAÇÃO POR MÉTODOS INDIRECTOS
PRINCÍPIO NEMO TENETUR
PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA AUTOINCRIMINAÇÃO

Sumário:
I - Nada impede que a liquidação seja efectuada pela autoridade fiscal por avaliação indirecta,
pois que essa actividade está sujeita a tributação, conforme decorre do artigo 10º da LGT, sob
pena de se incentivar a prática de actos ilícitos, porque, por exemplo, o autor não tem
contabilidade organizada, e se incentivar os prevaricadores no não cumprimento das normas
legais e ainda serem exonerados dos impostos que seriam devidos.
II – E, portanto, é perfeitamente legítima e legal a avaliação indirecta, estando esta prevista e
regulada nos artigos 83º, 87º e 88º da LGT, quando ocorram anomalias na contabilidade ou
esta inexista, sendo que tal sistema de avaliação por métodos indirectos não é afastada pela
CRP.
III – A prova documental emergente do E-Fatura, se obtida com a colaboração do arguido que
permitiu o acesso ao mesmo, não constitui prova proibida, nem violação do princípio da
proibição da autoincriminação, o qual tem a ver primeiramente com a validade da prova.
IV – O principio "nemo tenetur”, apesar de não constituir um princípio constitucional, pois não
está previsto directamente na CRP, considera-se princípio implícito que se integra nas
garantias de defesa do arguido em processo penal, inscritas no artigo 32º CRP, e visa a
liberdade de declaração no sentido de não contribuir para a sua própria incriminação,
impedindo a transformação daquele em meio de prova por via de uma colaboração
involuntária obtida com recurso a meios coercivos e enganosos e tem como conteúdo material
a imposição de deveres de esclarecimento ou advertência ao mesmo e a nulidade, ou não
valoração, das provas obtidas em desconformidade com esse princípio.
V – Assim, a obtenção de documentos pré-existentes e independentes da vontade do arguido,
que não implicam a interferência na sua esfera pessoal/psíquica, e em obediência a um dever
de colaboração expressamente previsto na lei no âmbito de uma inspecção tributária, não
interfere com a validade dessa prova e o seu uso no processo crime subsequente, não
ofendendo o princípio da não autoincriminação.

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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


MEDIDAS DE COACÇÃO
CLÁUSULA
REBUS SIC STANDIBUS
ELEMENTOS CONSTANTES DO PROCESSO

Sumário:
I - Quaisquer medidas de coação aplicadas no processo estão sujeitas a modificação em face
das circunstâncias que em cada momento se verificam sobre a sua necessidade e adequação
[condição rebus sic standibus - art. 212º, n.ºs 1, b), e 3].
II - Não são imutáveis mas a sua alteração pressupõe variações do condicionalismo subjacente,
por isso, enquanto permanecerem as circunstâncias de facto e se mantiverem os fundamentos
de direito que justificaram a respetiva imposição, também as medidas de coação se devem
manter inalteradas.
III - Não sobrevindo qualquer actuação do arguido que apontasse no sentido da alteração das
exigências cautelares e a consequente necessidade do reforço das medidas de coacção a
aplicar-lhe, não pode esta ser modificada, ademais por recurso a elementos dos autos que
deles já constassem aquando da aplicação da medida de coacção.
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/031b7bac97fb4343802585
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
IMPUTAÇÕES VAGAS E GENÉRICAS
CRIME DE INCÊNDIO
PENA DE PRISÃO

Sumário:
I - A condenação pela prática de um crime de violência doméstica não pode basear-se em
alegações vagas e genéricas (como “comportamento agressivo” ou “clima de terror
psicológico”) ou reportadas a um período temporal muito longo.
II - No caso em apreço, relativo à prática de um crime de incêndio motivado por vingança,
justifica-se a não suspensão da execução da pena de prisão.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/fa0aff8a3e9e64ad8025859
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


CRIME DE ABUSO SEXUAL
CRIME CONTINUADO
CRIME HABITUAL
CRIME DE TRATO SUCESSIVO
ABUSO SEXUAL DE MENORES DEPENDENTES
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL

Sumário:
I – Não pode confundir-se o conceito de crime habitual, que supõe uma única resolução
criminosa, relativa a um comportamento reiterado e prolongado no tempo, com a pura e
simples repetição da prática do mesmo tipo de crime, que supõe várias resoluções criminosas.
II – Para que uma conduta possa ser considerada como integradora de um crime habitual é
necessário que o tipo de ilícito preveja, expressamente, a prática reiterada de um determinado
comportamento ou que a estrutura típica exija uma multiplicidade de actos que revelem uma
certa habituação por parte do agente.
III – Não encontra cobertura legal a figura do crime habitual como algo paralelo ao crime
continuado, que supõe a prática reiterada da mesma conduta, não tendo aplicação quando
está em causa a lesão de bens pessoais, tal como sucede nos crimes de abuso sexual de
menores dependentes.
IV – A jurisprudência tem qualificado condutas reiteradas não como crime habitual, mas como
crime de trato sucessivo, considerando que esse comportamento reiterado configura uma
única resolução criminosa.
V – Para além disso, aquela jurisprudência nunca abrange num único crime de trato sucessivo
condutas relativas a diferentes ofendidos.
VI – Será difícil considerar fruto de uma única resolução criminosa uma conduta reiterada que
se prolonga durante muito tempo.

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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
CRIME DE CONDUÇÃO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
CRIME DE CONDUÇÃO PERIGOSA DE VEÍCULO RODOVIÁRIO
CRIME DE PERIGO ABSTRATO
CRIME DE PERIGO CONCRETO
CONCURSO APARENTE

Sumário:
I – A medicação não eleva a taxa de álcool no sangue, antes podendo potenciar os efeitos que
a sua ingestão causa (como sejam a descoordenação sensorial e motora, a diminuição da
acuidade visual, da atenção e da concentração e o aumento da confusão e do tempo de reação
a qualquer obstáculo ou imprevisto); é por isso que quando são receitados medicamentos
dessa natureza, o doente é advertido para não ingerir álcool e, se o faz e, de seguida, exerce a
condução, tal circunstância não constitui uma atenuante, mas antes uma agravante da sua
conduta, pela potenciação do risco de acidente ou da gravidade das consequências deste que
ele não pode ignorar.
II – O crime de condução perigosa de veículo, p. e p. pelo artigo 291.º do Código Penal,
configura um crime de perigo concreto e o crime de condução em estado de embriaguez, p. e
p. pelo artigo 292.º do mesmo Código, configura um crime de perigo abstrato, verificando-se
entre os respectivos tipos legais uma relação de concurso aparente, prevalecendo o primeiro
sempre que o agente se encontre embriagado e com o seu comportamento cause perigo para
os bens nele juridicamente tutelados.
III –A existência de perigo concreto depende da verificação cumulativa dos seguintes
requisitos:
- Existência de um objeto de perigo tipificado;
- A entrada do objeto do crime no círculo de perigo;
- A não ocorrência de dano por força de circunstâncias inesperadas ou de esforços
extraordinários e não objetivamente exigíveis de terceiros ou do ameaçado ou devido a
circunstâncias criadoras de hipóteses de salvamento incontroláveis e irrepetíveis, ou seja a
circunstância que possibilitou a não ocorrência da lesão não deve parecer ao homem médio
repetível, controlável, de fácil exercício ou normal.
IV – Se o arguido iniciou a ultrapassagem simultânea de dois veículos só não colidindo com a
viatura que seguia em primeiro lugar porque o condutor respetivo se apercebeu da manobra e
se desviou evitando assim a colisão (o que impõe a conclusão de que retomou a direita
antecipadamente quando ainda não o podia fazer sem perigo para tal utente da via), não só
violou a regra da ultrapassagem como, por força dessa violação, causou perigo, pelo menos,
para um dos veículos ultrapassados e para a integridade física do(s) seu(s) ocupante(s),
designadamente o condutor; a sua conduta integra, pois, a prática de um crime de condução
perigosa de veículo, p. e p. pelo artigo 291.º, n.º 1, b), do Código Penal

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/3dc55d5ee41e7e37802585
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


NULIDADES
ADIAMENTO DA AUDIÊNCIA
HOMICÍDIO QUALIFICADO
PREMEDITAÇÃO
Sumário:
I - Constitui nulidade relativa (dependente de arguição e sanável) a omissão posterior ao
inquérito e instrução de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da
verdade (artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal); a essencialidade da
diligência reporta-se à suscetibilidade de condicionar e perverter as finalidades do processo
penal e da sua decisão final, modernamente entendidas como a definição da punibilidade do
arguido, materialmente correta, obtida em conformidade com o ordenamento jurídico
processual, a realização da justiça e a descoberta da verdade material, a proteção dos direitos
fundamentais do cidadão perante o Estado e o restabelecimento da paz jurídica comunitária e
do arguido.
II - A repetição dos depoimentos por deficiente registo áudio não constitui adiamento da
audiência de julgamento (cfr. artigo 328.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).
III - Atualmente, após a reforma introduzida pela Lei n.º27/2015, de 14 de abril, o adiamento
da audiência superior a 30 dias não compromete a eficácia da prova produzida – artigo 328.º,
n.º 6, do Código de Processo Penal.
IV – No que se refere ao tipo de crime de homicídio qualificado, a cláusula geral da especial
censurabilidade ou perversidade (cfr. artigo 132.º, n.º 1, do Código Penal) exemplificada, de
forma padronizada, através de um elenco de circunstâncias não taxativas e indiciadoras (cfr.
artigo 132.º, n.º 2, do Código Penal) foi pensada para dela se excluir comportamentos que
formalmente as integrem e nelas se incluir outros comportamentos que materialmente se
assemelhem.
V- Através da inclusão no elenco dessas circunstâncias (na alínea a) do n.º 2 do artigo 132.º do
Código Penal) de laços familiares entre agente e vítima, pretende-se censurar reforçadamente
um comportamento que traduz uma maior capacidade criminosa pelo desrespeito dos motivos
inibitórios do crime que tais laços consigo transportam, uma superação das contra-motivações
éticas que esses laços criam.
VI - As culpas da separação do casal atribuídas à vitima/ofendido não têm virtualidade para
perverter, afastar ou mitigar a especial censurabilidade que o comportamento de um pai que
pretende suprimir a vida do seu filho traduz, a desinibição a que aquele laço familiar obsta.
VII – No caso em apreço, estamos também perante um outro crime de homicídio qualificado,
este p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 2, j), do Código Penal, pois o conjunto de factos
apurados permitiu concluir pela existência de uma rebuscada e persistente atitude refletiva no
propósito do arguido de suprimir a vida do visado, através da retenção de arma para o efeito
(os factos sucederam no dia 18 de Janeiro de 2019 e em 10 e 11 de Janeiro de 2019 indicou às
entidades policiais todas as armas de que seria detentor, não tendo deliberadamente entregue
a arma utilizada contra o ofendido) conjugada com o conhecimento das suas rotinas; o
comportamento do arguido revela uma conduta profundamente distante do quadro axiológico
que suporta a nossa existência enquanto comunidade.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/6af337266d550568802585
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


CONTRADIÇÃO INSANÁVEL
ERRO DE JULGAMENTO
CRIME DE VIOLAÇÃO DE REGRAS DE SEGURANÇA
REQUISITOS LEGAIS
CAUSALIDADE ADEQUADA
CONCEITO

Sumário:
I - Uma regra de segurança destinada a evitar o desabamento de terras numa vala compreende
(tem como objecto) todos os trabalhos que sujeitem os trabalhadores a esse risco, incluindo
aqueles trabalhos que busquem evitar outros perigos, para além do desabamento.
II - Contradição e causalidade são realidades muito diversas, pois que uma coisa é a causa do
acidente e a sua relação com o incumprimento de regras de segurança e outra, diferente, é a
existência de contradição nos factos dados como provados.
III - A contradição de factos provados é algo que emerge da incompatibilidade lógica entre os
factos provados, ao passo que a causalidade, enquanto matéria de facto, decorre da análise
dos meios de prova e das inferências feitas pelo julgador.
IV - No caso, o acidente ocorreu porque foi omitida a observância de regras de segurança, mais
concretamente, a entivação dos solos e rampeamento dos taludes com inclinação de 45º, e
ausência de um plano de higiene e segurança com fichas que prevenissem os riscos de
soterramento adequados à concreta tarefa desempenhada pela vítima, omissões essas que
colocaram em perigo o trabalhador da sociedade arguida, perigo que acabou por se
materializar com a respetiva morte.
V - Nestas condições, a morte deve resultar, em termos de causalidade adequada, da violação
das regras de segurança, pois é esta violação a acção típica.
VI - A pedra de toque da teoria da causalidade é a de que toda a condição do dano só deixa de
ser causa adequada quando essa condição seja totalmente indiferente ou irrelevante para a
produção do dano.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/97ec9cfc85af81968025859
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto


SENTENÇA PENAL
FUNDAMENTAÇÃO
NULIDADE
FACTOS RELEVANTES
FACTOS ESSENCIAIS
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
QUESTÃO NOVA COLOCADA EM SEDE DE RECURSO
TRIBUNAL COMPETENTE

Sumário:
I - A jurisprudência do STJ firmou-se há muito no sentido de que a decisão deve conter a
enumeração concreta dos factos provados e não provados, com interesse e relevância para a
decisão da causa, sob pena de nulidade, mas apenas desde que os mesmos sejam essenciais à
caracterização do crime em causa e suas circunstâncias ou relevantes juridicamente com
influência na medida da pena, isto é, desde que tenham efectivo interesse para a decisão.
II - Segundo tal jurisprudência, a decisão já não deverá conter factos inócuos, excrescentes ou
irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido,
mesmo que descritos na acusação e/ou na contestação, ou ainda a matéria de facto já
prejudicada pela solução dada a outra.
III - No caso vertente, na contestação apresentada a arguida limitou-se ou a infirmar a
factualidade constante da acusação, descrevendo uma realidade alternativa sem relevância
penal, ou a apresentar factos acessórios para a definição dos elementos constitutivos do crime
ou determinação da sanção, pelo que nenhuma omissão de pronúncia/nulidade existiu no caso
vertente ao não ser contemplada tal matéria.
IV - O tribunal de recurso não poderá analisar e decidir a questão da não transcrição da
decisão no registo criminal da arguida, uma vez que, pese embora requerimento apresentado
pela arguida nesse sentido, o tribunal recorrido não o apreciou, pois que nesse caso estaria a
decidir pela primeira vez uma exposição sobre esta matéria, funcionando como tribunal de 1.ª
Instância e não como tribunal de recurso.
V - Mesmo que a arguida não tivesse apresentado o mencionado requerimento, o recurso não
poderia ser apreciado por falta de interesse em agir, já que a arguida tinha a possibilidade de
solicitar ao tribunal de 1.ª Instância que decidisse, em despacho posterior à sentença, pela não
transcrição da decisão no registo criminal, e só depois, caso a decisão não fosse favorável,
poderia interpôs recurso do mesmo, impondo-se, pois que, após baixa dos autos, o tribunal
recorrido aprecie o sobredito requerimento apresentado pela arguida.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/d76cfde457d10b56802585
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Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


LEI TEMPORÁRIA
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO

Sumário:
- A lei penal temporária nunca é aplicável retroactivamente, a não ser nos casos em que se
reconheça existir uma verdadeira sucessão de leis penais temporárias em que será aplicável a
mais favorável.
- Por conseguinte, a lei penal ainda que temporária aplica-se aos factos praticados na sua
vigência, tendo em conta o tempus delicti, nos termos do artigo 2.º, n.º1, do Código Penal.
- A causa de suspensão da prescrição estabelecida no artigo 7.º, n.º3, da Lei n.º 1-A/2020,
enquanto seja aplicada aos prazos de prescrição do procedimento criminal e de prescrição das
penas e das medidas de segurança, aplica-se aos factos praticados na sua vigência.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/20fcc4346223a057802585b
40036cdab?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


LEI TEMPORÁRIA
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO

Sumário:
- Independentemente de se tratar de uma lei temporária, ou não, a entrada em vigor da Lei
n°1-A/2020, ao prever no seu art.º 7º, a suspensão de todos os prazos para a prática de actos
processuais e procedimentais, sempre configurará uma situação de sucessão de leis penais no
tempo, pelo que a sua aplicação não pode afastar-se do princípio da não retroatividade da lei
penal, corolário do princípio da legalidade, nem sobrepor-se à aplicação do regime penal mais
favorável em bloco ao arguido.
- O regime em bloco mais favorável ao arguido é sem dúvida manter, como únicas causas de
suspensão da prescrição da pena, as previstas no artigo 125° do Código Penal, afastando-se a
aplicação ao caso concreto do artigo 7° da Lei n°1-A/2020, esta última sem dúvida mais
gravosa para o arguido.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/134708951c434be2802585
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Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
DIREITO DE PERSONALIDADE
LIBERDADE DE INFORMAÇÃO
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
DIREITO AO BOM NOME
DIREITO À HONRA E CONSIDERAÇÃO SOCIAL
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL

Sumário:
I – O direito de personalidade é um direito subjetivo e deve ser observado por todos. Ficam,
pois, abrangidos direitos que recaem sobre bens personalíssimos, como o direito à vida, à
integridade física, à imagem ou ao nome.
II – A liberdade de informação e de expressão está inscrita no quadro dos direitos, liberdades e
garantias pessoais e tem por fim último garantir a plenitude da democracia, a pluralidade de
opiniões e de pensamento.
III – Entre os limites à liberdade de expressão encontram-se os direitos da personalidade, mais
concretamente o direito à honra, à privacidade e à imagem, os quais, alicerçados no princípio
elementar da dignidade da pessoa humana, são, em regra, absolutos.
IV – O TEDH considerou que, estando em causa a liberdade de expressão em matéria científica
e portanto, em matéria de relevante interesse público, a liberdade de expressão goza de uma
ampla latitude, só se justificando uma ingerência restritiva do Estado, mesmo por meio dos
tribunais, desde que a restrição constitua uma providência necessária, numa sociedade
democrática, entre outros objetivos, para garantir a proteção da honra ou dos direitos de
outrem, em conformidade com o n.º 2 do art. 10.º da Convenção, sendo que essa exceção tem
de corresponder a uma “necessidade social imperiosa.
V – Os cidadãos em geral devem poder debater abertamente as questões de interesse público,
sem qualquer receio de serem acionados judicialmente, devendo evitar-se aqui o persistente
perigo de autocensura. Isto, independentemente do choque, da amargura, do trauma, ou
distúrbio emocional que daí possa resultar. A crítica pública deve ser um direito e não um risco
VI –Um determinado conteúdo expressivo só deixará de ser protegido se se demonstrar, e na
medida em que ficar demonstrado, que o mesmo atenta de forma desproporcionada contra
direitos e interesses constitucionalmente protegidos.
VII – À luz da Constituição, a liberdade de expressão e a honra têm o mesmo valor jurídico,
inviabilizando-se qualquer princípio de hierarquia abstrata entre si.
VIII – Sendo os direitos de liberdade de expressão e à honra e ao bom nome, de igual
hierarquia constitucional, o primeiro não pode, em princípio, atentar contra o segundo,
devendo procurar-se a harmonização ou concordância pública dos interesses em jogo, por
forma a atribuir a cada um deles a máxima eficácia possível, em obediência ao princípio
jurídico-constitucional da proporcionalidade, vinculante em matéria de direitos fundamentais
IX – Se é certo que a Constituição não traça uma hierarquia dos direitos fundamentais, não se
pode ignorar que a CEDH confere primazia à liberdade de expressão, em detrimento do direito
à honra e ao bom nome.
X – Os juízos de valor ou meras opiniões, enquanto manifestações do subjetivismo do
respetivo autor, cuja validade ou verosimilhança serão livremente avaliáveis por cada um,
estarão particularmente legitimados enquanto objeto do direito fundamental à liberdade de
expressão.
XI – Pressuposto para a responsabilização do agente nas situações previstas no art. 484º, do
CCivil, são a afirmação ou divulgação de factos, e já não os juízos de valor ou as opiniões.
XII – Tendo em conta a indemonstrabilidade da verdade dos factos no momento da sua
divulgação, bem como interesse público a esta associado, parece razoável excluir a
responsabilidade do agente, mesmo quando posteriormente se venha a apurar o caracter
inverídico daqueles.
XIII – As suspeições, presunções, hipóteses ou dúvidas oferecidas nas declarações de facto,
divulgadas pelo agente, não podem considerar-se propriamente como pressupostos de
aplicação do art. 484º, do CCivil.
XIV – Constitui obstáculo à aplicação do art. 484º, do CCivil, relativamente ao autor das
declarações a circunstância de os juízos de suspeição, as presunções, bem como as hipóteses
levantadas poderem não ser da autoria de quem divulgou os factos donde aquelas emergiram.
XV – Sendo proibida a afirmação ou divulgação de factos falsos, mas se proferidos dentro dos
limites aceitáveis da liberdade de expressão e com uma base factual sólida, e não havendo
uma ofensa gritante à honra e bom nome de outrem, o erro pode-se ter por admissível,
aceitável e justificável, atendendo, nomeadamente, à proporcionalidade e adequação das
expressões usadas.
XVI – A jurisprudência do TEDH, aponta para uma menor esfera de proteção da honra e
consideração de figuras públicas, face à de simples particulares, assim como quando estejam
em causa assuntos de interesse público ou geral.
XVII – Também é entendimento do TEHD que “não se exige aos cidadãos ou aos media que
corroborem factos injuriosas com o mesmo grau de certeza que o poder judicial, i.e., "em pé
de igualdade com o do processo criminal", mas apenas que "a base factual seja sólida".
XVIII – Como é entendimento do TEDH “a liberdade de expressão abarca tanto as “informações
ou ideias favoráveis, inofensivas ou indiferentes como aquelas que chocam, inquietam ou
ofendem” e que “contestam a ordem estabelecida”, pois é justamente nesses casos que “é
mais preciosa”.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/28abc159ae9cb361802585
ac002d3cad?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


DUPLO EMPREGO
DEVER DE LEALDADE
VIGILANTE

Sumário:
I– O dever de lealdade a que está sujeito o trabalhador não obsta a que o mesmo exerça
cumulativamente a sua actividade profissional ao serviço de dois empregadores, tão pouco
necessitando de autorização dos mesmos para tal, desde que não esteja vinculado por uma
cláusula de exclusividade, a vigorar durante a execução do contrato, ou mesmo
posteriormente, e/ou não concorra com a empresa, nem divulgue informações referentes à
sua organização, métodos de produção ou negócio, ou por qualquer forma lese interesses
patrimoniais sérios da empresa.
II– Assim, não viola o dever de lealdade para com a sua empregadora, empresa de transporte e
tratamento de valores, o trabalhador, vigilante de transporte de valores, que trabalha também
para outra empresa, a qual se dedica ao transporte e tratamento de valores e à vigilância
estática, exercendo para esta funções, como vigilante, na área da vigilância estática.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/c27bbe49cf6585ed802585a
c004719ff?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


LIBERDADE CONDICIONAL
TUTELA DO ORDENAMENTO JURÍDICO
EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA ACESSÓRIA DE EXPULSÃO
Sumário:
Nas penas mais longas, que corresponderão aos crimes mais graves, a liberdade condicional e
a execução antecipada da expulsão só em casos excepcionais devem ser concedidos a meio da
pena, porque a sua concessão generalizada poderia pôr seriamente em causa as exigências de
tutela do ordenamento jurídico.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/44433aa612c28312802585
a4003e6f47?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


MEDIDA CAUTELAR DE GUARDA
DECLARAÇÃO DE ESPECIAL COMPLEXIDADE
ESTADO DE EMERGÊNCIA - COVID 19

Sumário:
A situação de pandemia não constitui fundamento para a declaração de especial
complexidade, prevista no nº 1, "in fine", do artigo 60º da LTE, que permite a prorrogação do
prazo da medida cautelar de guarda de menor em centro educativo, prevista na alínea c) do
artigo 57º da LTE.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/eeb0c1683f9a78c1802585a
5002ae10b?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


CRIME DE CONDUÇÃO PERIGOSA DE VEÍCULO
PROVA PRESUNTIVA
ERRO DE JULGAMENTO
CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DA MOTIVAÇÃO

Sumário:
I– O erro de julgamento, ocorre quando o tribunal considere provado um determinado facto,
sem que dele tivesse sido feita prova pelo que deveria ter sido considerado não provado ou
quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido
considerado provado. Ou seja, pressupõe este erro, que perante a prova produzida e valorada,
o Tribunal não podia ter concluído como o fez, da matéria que considerou provada;
II– Na valoração daquilo que foi concretamente dito, haverá ainda que ter em conta que as
provas válidas não são apenas as provas que resultam do conhecimento directo dos factos
pelas testemunhas. Muitas vezes o julgador, alicerçando-se em factos certos, pode fazer apelo
às denominadas presunções materiais ligadas à normalidade da vida e às regras da
experiência, para daí retirar um outro facto “desconhecido”. Ou seja, a prova presuntiva. Estas
presunções, como é evidente, não são presunções de culpa. Constituem, antes, parcelas de um
processo de pensamento lógico de que o julgador não pode prescindir, sob pena de não ser a
prova apreciada e valorada em toda a sua extensão;
III– Ora, não sendo as presunções judiciais um meio de prova proibido por lei, pode o julgador,
à luz das regras da experiência e da sua livre convicção, retirar dos factos conhecidos as ilações
que se ofereçam como evidentes ou como razoáveis e firmá-las como factos provados. E,
exemplo comum deste meio ocorre precisamente com a prova da intenção criminosa (o
chamado elemento subjectivo do tipo) que, enquanto acontecimento da vida psicológica, não
permite prova directa, podendo no entanto ser inferido a partir de outros factos que tenham
sido directamente provados, desde que os parâmetros da experiência, a chamada “experiência
comum”, assente na razoabilidade e na normalidade das situações da vida, não sejam postos
em causa, desde que através de um raciocínio lógico e motivável seja possível compreender a
opção do julgador, nada obsta ao funcionamento da presunção judicial como meio de prova,
observadas que sejam as necessárias cautelas.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/0e10e5db1f184d30802585
a5003b6576?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


CRIME DE AMEAÇA AGRAVADA
CRIME DE NATUREZA PÚBLICA

Sumário:
I– Sendo o legislador quem define, de modo explícito, quais são os crimes de natureza
particular (referindo, expressamente, que o impulso processual depende de queixa e de
acusação particular) e os crimes de natureza semi-pública (mencionando, explicitamente, que
o procedimento depende de queixa), na aplicação da aludida regra, o legislador é preciso e
criterioso, dizendo expressamente, quanto a cada tipo legal de crime, se o mesmo depende de
queixa, ou de acusação particular, ou, então, nada diz. E nada dizendo, o crime é de natureza
pública;
II– O crime de ameaça simples depende do direito de queixa, conforme prevê,
expressamente, o n.º 2, do artigo 153.º, do Código Penal.
No que respeita ao artigo 155.º do C.P., nada é dito a tal respeito, pelo que, a conclusão a tirar
será, inevitavelmente, de que estamos, neste caso, perante um crime de natureza pública;
III– De facto, no artigo 153.º, n.º 1, permaneceu o tipo simples, tendo sido mantida a natureza
semi-pública, no n.º 2 do referido normativo. E o tipo qualificado passou a estar previsto no
artigo 155.º, onde se prevêem as circunstâncias e os resultados que qualificam, tanto o tipo
simples de ameaça, como o tipo simples de coacção e as penas que cabem a cada um dos
tipos, em função da sua verificação;
IV– Acontece que, o artigo 155.ºdo C.P. não contém uma norma que estabeleça a natureza
semi-pública dos tipos qualificados de ameaça e de coacção, pelo que, na falta dessa expressa
consagração, e em face do que supra se expendeu, é forçoso concluir que os crimes de ameaça
e de coacção qualificados, em função das circunstâncias elencadas nas alíneas do n.º 1 ou em
função do resultado previsto no n.º 2, têm a natureza de crimes públicos;
V– Não existindo disposição que preveja de forma expressa a necessidade da queixa para o
crime agravado previsto no artigo 155.º, do Código Penal, o silêncio da lei - consubstanciado
na ausência de disposição que preveja a necessidade de queixa - aponta, indubitavelmente, no
sentido de que, actualmente, o crime de ameaça na forma agravada tem natureza pública.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/0b4f5ef3fcc16485802585a6
002b8246?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


CONDUÇÃO PERIGOSA DE VEÍCULO RODOVIÁRIO
HOMICÍDIO POR NEGLIGÊNCIA
BEM JURÍDICO PROTEGIDO
CONSUMPÇÃO
SUBSIDIARIEDADE
Sumário:
I – Sendo protegidos no crime de condução perigosa, além da segurança das comunicações, os
bens jurídicos individuais vida e integridade física, postos em perigo pela conduta do agente,
ainda que estes reflexamente, se ocorrer uma lesão destes últimos como resultado daquela
conduta, os referidos bens jurídicos de natureza pessoal passam a ser protegidos não só pelas
disposições combinadas dos artigos 291.º, 294.º e 285.º, mas também, de forma genérica,
pelos crimes dos arts. 137.º e 148.º, do CP.
II – Todavia, na descrita situação, verificada a morte da vítima, estamos em presença de um
concurso aparente entre o crime de condução perigosa de veículo rodoviário e o de homicídio
por negligência, sendo a norma do artigo 137.º, n.º 1, do CP, subsidiária da norma do artigo
291.º do mesmo diploma (conjugada com os artigos 294.º e 285.º).

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/4aac63565c1d04ab802585
9d00374fad?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


REINCIDÊNCIA
PRESSUPOSTOS
PRAZO RELEVANTE
LIBERDADE CONDICIONAL

Sumário:
O tempo durante o qual o condenado beneficiou da liberdade condicional não é computado
no prazo de 5 (cinco) anos referido no artigo 75.º, n.º 2, do CP.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/6f2dbdbc2d0b70f2802585
9d0037cd9c?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


APREENSÃO DE VEÍCULO
FALTA DE SEGURO OBRIGATÓRIO
CESSAÇÃO
DESOBEDIÊNCIA

Sumário:
I – Por força das disposições, conjugadas, dos n.ºs 2 e 6 do artigo 162.º do Código da Estrada, a
apreensão nelas prevista, fundada em falta de seguro, apenas cessa quando for efectuada,
perante a administração, prova da transferência da responsabilidade civil decorrente da
utilização do veículo.
II – Sem que tal aconteça, a ordem de não circulação dada ao condutor e depositário
constituído do veículo continua legalmente válida, sendo a sua violação adequada ao
preenchimento do crime de desobediência p. e p. pelo artigo 348.º, n.º 1, al. b), do CP, se
verificados os demais elementos do tipo.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/0eedf6b2c41aac5b802585
96005267a9?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


CONTUMÁCIA
MANDADOS DE DETENÇÃO
NOTIFICAÇÃO POR EDITAIS
COMPETÊNCIA
TRIBUNAL DE EXECUÇÃO DAS PENAS
TRIBUNAL DA CONDENAÇÃO

Sumário:
I – Cabe ao Tribunal de Execução das Penas a emissão dos mandados de detenção previstos no
artigo 337.º, n.º 1, do CPP, visando o cumprimento, pelo condenado, da pena de prisão que
lhe foi imposta, excepto nos casos em que os ditos mandados já tenham sido emitidos, para o
referido fim, por determinação do tribunal da condenação.
II – Quanto à realização das diligências prévias à declaração da contumácia – este acto é da
competência do TEP, nos termos do disposto no artigo 138.º, n.º 4, al. x), do CEPMPL –
importa distinguir duas situações: aquelas em que o condenado se eximiu ao cumprimento da
pena após o seu ingresso no estabelecimento prisional, e aqueloutras em que o condenado
ainda não iniciou o cumprimento da pena.
III – inscrevem-se no circunstancialismo apontado em primeiro lugar o caso de evasão ou
ausência não autorizada do condenado do estabelecimento prisional, no qual a competência
para a emissão dos editais referidos no artigo 335.º, n.º 1, do CPP, pertence ao TEP.
IV – Nas restantes situações, ou seja, nas quais ainda não ocorreu o início do cumprimento da
pena, a prática da referida diligência processual inclui-se no círculo de competências do
tribunal da condenação.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/2842bcbceac1abbd802585
960052d745?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


HOMICÍDIO POR NEGLIGÊNCIA
IMPUTAÇÃO OBJECTIVA DO RESULTADO
CRIME COMISSIVO POR OMISSÃO
NEXO CAUSAL ENTRE A CONDUTA E O RESULTADO
IN DUBIO PRO REO
VIOLAÇÃO DAS LEGES ARTIS

Sumário:
I – Para haver imputação do resultado à conduta do agente é necessário que exista entre a
conduta (acção ou omissão) e o resultado um nexo causal concreto, ou seja, é indispensável
que tenha sido a conduta a causa efectiva do resultado.
II – Sendo esta efectiva relação causal um elemento do tipo nos crimes de resultado, ele tem
de ser objecto de prova. Donde que, havendo dúvida razoável sobre se efectivamente a
conduta foi causa do resultado, ter-se-á, por força do princípio in dubio pro reo, de considerar
como não provada a imputação.
III – Consequentemente, é de excluir a verificação do nexo de imputação objectiva do
resultado (no caso, morte de determinada pessoa) à conduta omissiva do arguido, quando,
perante os indícios revelados, e mesmo configurando eles a violação das lexis artis – não foi
equacionada, podendo tê-lo sido, a doença determinante do decesso da vítima e foi omitida a
realização de um exame de diagnóstico fundamental para a detecção do distúrbio funcional
orgânico –, existia comprovadamente a alta probabilidade de ocorrência do fim da vida da
paciente.
http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/926ef9a103c2c1ec802585
8b00532f00?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


INVESTIGAÇÃO DA PATERNIDADE
PROVA PERICIAL
TESTES DE ADN
CONSTITUCIONALIDADE

Sumário:
I – Nos processos de averiguação de paternidade, os testes de ADN, feitos através da recolha
de sangue ou saliva, equivalem a uma prova plena, do ponto de vista científico, no que
concerne à filiação biológica.
II – Não se justifica alegar que a determinada realização de tal meio pericial probatório viola a
liberdade e a integridade física do Réu, pretenso pai, pois, para além do carácter cada vez
menos intrusivo de tais exames periciais, que muitas vezes apenas necessitam de uma mera
recolha de saliva ou de um fio de cabelo, de forma a determinar o DNA , tal meio probatório,
atenta a matéria em equação, mostra-se necessário, proporcional e adequado à finalidade
prosseguida com os intentados autos de investigação de paternidade.
III – Mas mesmo que se considere ocorrer por força desse exame uma “ofensa corporal” do
pretenso pai (o que é duvidoso), tal eventual violação da sua integridade física não surgiria
como arbitrária ou gratuita, tendo, nomeadamente, em consideração o objetivo das normas
da legislação ordinária que consentem expressamente os exames de sangue como meios de
prova neste tipo de ações, a fiabilidade inerente a este meio de prova que permitirá com outra
exigência à A. ver realizado o seu direito à identidade pessoal e o grau diminuto de “ofensa
corporal” em que se traduzia esse mesmo exame, donde, não ocorrer, nesta vertente, com a
admissão da perícia determinada, qualquer desproporção.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/6c02f7792e4871e2802585
8b005700c1?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


FALSIDADE DE TESTEMUNHO
RECUSA A DEPOR
JUSTA CAUSA
ILICITUDE
CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO

Sumário:
I – A referência normativa “sem justa causa” constante do n.º 2 do artigo 360.º do CP não
integra o tipo objectivo do crime de “recusa a depor”, constituindo a “justa causa” dessa
recusa uma circunstância dirimente da ilicitude.
II – Tendo presente o carácter geral e abstracto dos tipos justificadores, bem como o leque de
situações passíveis de consubstanciar causas de justificação, não é exigível que a acusação
tenha de narrar factos destinados a demonstrar a inexistência de qualquer causa de exclusão
da ilicitude.
III – A recusa de o arguido prestar, enquanto testemunha, perante um agente da PSP,
declarações em processo no qual se investigava a prática de um crime de ofensa à integridade
física e onde então era arguido um recluso, sob invocação de se ter de “proteger no
estabelecimento prisional” onde também estava preso, não legitima (justifica) a referida
omissão.
IV – Não obstante as dificuldades acrescidas na vivência no interior de estabelecimento
prisional, designadamente quanto aos “diferendos” que se podem gerar, compete às
instâncias formais, designadamente à Direcção daquela instituição e, afinal, ao Estado, prover
à segurança/protecção dos reclusos.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/356ef6652986acfd802585
7b0048af85?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


CONVERSÃO DA MULTA NÃO PAGA EM PRISÃO SUBSIDIÁRIA
SUSPENSÃO DA PRISÃO SUBSIDIÁRIA

Sumário:
I – A suspensão da prisão subsidiária prevista no n.º 3 do art. 49.º do CPP surge como tentativa
de resolução do conflito existente entre a necessidade de realização das finalidades da punição
e a preservação da liberdade dos mais carentes economicamente.
II – Daqui decorre que, ao condenado só deve ser negado qualquer meio substitutivo da pena
de prisão alternativa se não for permitido concluir, tendo por base os elementos constantes
dos autos, que a falta de pagamento da multa não lhe é imputável.
II – Consequentemente, para aferir da adequação ao caso concreto da suspensão da prisão
subsidiária, deve o tribunal proceder às diligências requeridas pelo recorrente para prova das
suas condições económicas.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/ccadb134e7ebd9a6802585
7b0048e7a9?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


CÚMULO JURÍDICO DE PENAS
CONHECIMENTO SUPERVENIENTE DO CONCURSO
PASSADO CRIMINAL DO ARGUIDO

Sumário:
I - Se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou,
anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, é condenado numa única pena,
nos termos dos Artºs. 77º e 78º do Código Penal.
II - Na determinação da pena única devem ser considerados, em conjunto, os factos e a
personalidade do agente, em consonância com o estabelecido no Artº 78º do Código Penal,
devendo também o tribunal ter em consideração os critérios gerais contidos no Artº 71º do
mesmo diploma legal.
III - As condenações sofridas pelo arguido, não incluídas no cúmulo jurídico, devem ser tidas
em consideração na determinação da pena única, pois que relevam enquanto elementos
demonstrativos do percurso criminal do agente, com manifesto interesse para a correcta
apreensão da evolução da sua personalidade, designadamente quanto à sua propensão
criminosa, sendo elemento necessário e até imprescindível para a apreciação das exigências de
prevenção especial.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/d9b47cf9a03188d780258
5af0045d20d?OpenDocument
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
PROVA PERICIAL
DILIGÊNCIAS REQUERIDAS PELO ARGUIDO
APURAMENTO IMPUTABILIDADE DIMINUIDA
DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO

Sumário:
I. A prova pericial prevista nos arts. 151º a 163º do CPP deve ser produzida quando o processo
e a futura decisão se defrontam com um “plus” de conhecimentos especializados que, por
estarem para além das possibilidades de constatação e/ou percepção, efectivas ou
presumidas, do tribunal nos campos técnicos, científicos e artísticos, demandam a coadjuvação
de quem reúna tais conhecimentos e credibilidade necessários para apreender, com
neutralidade, em linguagem comum, a referida complexidade e emitir um juízo especializado.
II. Porém, o perito apenas contribui para a decisão sobre os factos, não decide nem substitui o
juiz no julgamento sobre os mesmos, em cujo âmbito este é o “perito dos peritos” e pode
desvincular-se das conclusões periciais, apesar do seu valor reforçado – cujo juízo técnico,
científico ou artístico às mesmas inerente se presume subtraído à livre apreciação do julgador
–, desde que fundamente a sua divergência (cf. art. 163º do CPP).
III. A possibilidade de o arguido, aquando do cometimento dos factos em causa, sofrer de
incapacidade da avaliação da ilicitude da sua conduta ou de agir de acordo com o direito
acarreta, em princípio, a necessidade de realização de uma perícia que, conforme o seu
resultado, poderá servir para a determinação da sua culpa ou a determinação da sanção, a
coberto do art. 351º do CPP.
IV. Contudo, a questão da inimputabilidade ou imputabilidade diminuída «não se basta com a
simples suspeita ou sequer a mera probabilidade assente na sua aparência», devendo
«perspectivar-se em razão de circunstâncias concretas que apontem para a forte possibilidade
de o arguido, aquando do cometimento dos factos em causa, sofrer de anomalia psíquica
incapacitante da avaliação da ilicitude da sua conduta ou da auto-determinação para poder
agir de acordo com o direito»: não basta, pois, a mera alegação pelo arguido da sua
inimputabilidade ou imputabilidade diminuída quanto a um dos crimes pelos quais se encontra
acusado – neste caso, omissão de auxílio – para que o julgador se deva determinar de acordo
com essa alegação.
V. É ao tribunal que compete tomar posição sobre a matéria, em função do juízo global que
faça sobre a prova produzida, formando-se a convicção, sempre a final, pelo escrutínio
rigoroso e cuidado de cada um dos elementos probatórios individualmente considerados, mas
também de todas eles no seu conjunto, directos e indirectos, lançando mão das regras da
experiência, da lógica das coisas e do normal suceder.
VI. E daí que a apreciação da necessidade da realização da mencionada perícia também deva
ser enfrentada em função do apuramento de circunstâncias concretas que apontem para a
forte possibilidade de o arguido ter sofrido de anomalia psíquica incapacitante da avaliação da
ilicitude da sua conduta, aquando da sua verificação.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/989c7b29a3af478d80258
5af0046cd12?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


CRIMES TRATO SUCESSIVO
ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS
PENA
Sumário:
1. Os crimes de trato sucessivo não estão previstos na lei. Tal designação resultou da
dificuldade, com que muitas vezes os tribunais se deparam, em concretizar o número de
crimes ocorridos num determinado período de tempo.
O Supremo Tribunal de Justiça vem ultimamente, de forma reiterada, afirmando a necessidade
de abandonar tal conceito quando estão em causa crimes de natureza sexual.
2. Não é correto dizer-se que um arguido está bem integrado familiarmente se, apesar de ter
constituído família e de nela viver de forma aparentemente harmoniosa, abusa sexualmente
da irmã da sua mulher.
3. Não é correto dizer-se que não é uma conduta grave a de um arguido de 33 anos que tem
um relacionamento de cópula completa com uma criança de 13 anos e o mantém ao longo da
adolescência da vítima.
4. A pena de 6 anos de prisão imposta pela prática, sobre uma mesma vítima, de 11 crimes de
abuso sexual de criança p.p. art. 171 nº 1 e 2 e de 14 crimes de atos sexuais com adolescentes,
agravados, p.p. art. 173 nº 2 e 177 nº 1 a) todos do código penal, basta - dados os sérios
reflexos na sua vida profissional e pessoal - para sancionar o comportamento delituoso do
arguido (que é casado, que trabalha e é pai de um menor) e para salvaguardar as necessidades
de prevenção, não obstante a falta de juízo crítico sobre o comportamento adotado,
evidenciada pelo arguido.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/e9c6e9cb2d6e203d80258
5b20039ec8a?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


ACUSAÇÃO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE
REJEIÇÃO
IDENTIFICAÇÃO ARGUIDO
REVOGAÇÃO DESPACHO RECORRIDO

Sumário:
I) - A razão de ser da exigência legal de a acusação conter a identificação mais completa
possível do arguido, incluindo, para além do seu nome, outros elementos identificativos
essenciais, como os que são referidos no art. 141º, n.º 3, do CPP, prende-se com as garantias
constitucionais dos seus direitos de defesa, de modo a não deixar dúvidas sobre a pessoa
concreta que está a ser acusada e que poderá vir ser sujeita a julgamento. O que se pretende é
uma identificação que garanta que a pessoa acusada é precisamente aquela que o devia ser e
não qualquer outra.
II) - Em situações de insuficiente identificação do arguido na acusação, unicamente pelo nome,
com ou sem remissão para outras peças do processo, estamos perante uma mera
irregularidade, que deve considerar-se sanada se não for invocada por quem tem legitimidade
para isso e no momento próprio (art. 123º do CPP).
III) - A acusação só será manifestamente infundada, para efeitos de rejeição, por omissão total
da identificação do arguido ou indicação insuficiente de sinais tendentes ao reconhecimento
inequívoco do mesmo, designadamente quando nem sequer o seu nome é mencionado,
gerando a nulidade do libelo acusatório.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/6a3b9529cc3fd405802585
b2003c481b?OpenDocument
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
NÃO PRONÚNCIA
CRIME DE DIFAMAÇÃO
JUÍZOS ATÍPICOS
DIREITO DE CRÍTICA OBJETIVA

Sumário:
I) O direito fundamental ao bom nome e reputação de qualquer pessoa, consagrado no art.
26º, n.ºs 1 e 2 da CRP, tem de ser compatibilizado com o direito fundamental da liberdade de
expressão e informação, com idêntica consagração constitucional (art. 37º da CRP), bem como
a nível de mecanismos de direito internacional, como a Convenção Europeia dos Direitos
Humanos (art. 10º) e a Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 19º).
II) Uma das manifestações da liberdade de expressão é precisamente o direito que cada
pessoa tem de divulgar a opinião e de exercer o direito de crítica.
III) A temática do conflito entre a liberdade de expressão e de opinião e o direito à honra e
reputação tem sido frequentemente objeto de decisões por parte do TEDH, dando
sistematicamente prevalência à primeira e frisando que a liberdade de expressão constitui um
dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e vale não somente para as
“informações” ou “ideias” favoráveis, inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas
que ofendem, chocam ou inquietam.
IV) Como resulta do parágrafo 2º do artigo 10º da CEDH, a liberdade de expressão está sujeita
a exceções que devem ser interpretadas restritivamente, devendo a necessidade de qualquer
restrição ser demonstrada de maneira convincente.
V) Assim, o direito de crítica tem necessariamente limites mais apertados quando o visado é
um simples particular do que em relação a pessoas que exercem funções públicas, atuando
nessa qualidade, na medida em que os atos destas estão necessariamente sujeitos a um
controlo atento, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum da comunidade na
qual exercem as funções, devendo, por isso, os visados demonstrar muito maior tolerância,
sobretudo quando produzem declarações públicas que se prestam à crítica.
VI) Daí que se devam considerar atípicos os juízos que, como reflexo necessário da crítica
objetiva, acabam por atingir a honra do visado, desde que a valoração crítica seja adequada
aos pertinentes dados de facto e agente não incorra na crítica caluniosa ou na formulação de
juízos de valor que têm subjacente o exclusivo propósito de rebaixar e de humilhar.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/64bb9c78561b504e80258
5b2003cc8ee?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO
INJUNÇÕES IMPOSTAS
AVERIGUAÇÃO DE INCUMPRIMENTO
OMISSÃO AUDIÇÃO ARGUIDO
IRREGULARIDADE PROCESSUAL

Sumário:
I) A certificação do cumprimento efectivo ou não das injunções impostas no âmbito da
suspensão provisória do processo não tem que passar obrigatoriamente pela
colaboração/audição do arguido para tais efeitos. Um mero ofício dirigido à segurança Social e
um outro à Associação Portuguesa de Leucemias e Linfomas (APLL) eram bastantes para aferir
do cumprimento, ou não, das mencionadas injunções.
II) E, caso se viesse a concluir pelo seu incumprimento, então sim, importaria avançar para um
segundo momento, o qual passaria por averiguar as causas do mesmo, aferindo da sua
censurabilidade, à semelhança do que acontece com a suspensão da execução das penas
(arts.55º e 56º do C.Penal), garantindo ao arguido o direito de ser ouvido e se pronunciar
sobre os motivos do incumprimento, dando cumprimento ao exercício do direito do
contraditório.
III) Mas, em momento prévio, no qual se averigua do cumprimento ou incumprimento das
injunções, não se estando perante um dever fundamental de audição do arguido, o vício
atinente à omissão de tal desiderato pode ser atingido por outros meios, não se verifica pois a
nulidade invocada, mas antes, uma irregularidade processual, nos termos do artigo 123º,nº2
do C.P.P. .

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/a2f35567524eae4c802585
b2003d708e?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


PRINCÍPIO ACUSATÓRIO E VINCULAÇÃO TEMÁTICA
GARANTIAS DE DEFESA DO ARGUIDO
INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTºS 358º E 359º DO CPP
UTILIZAÇÃO DE PROVA PROIBIDA
INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARRºS 61, Nº 1, AL. D), 125º E 126, Nº 2, AL.A) DO CPP

Sumário:
1. Todo o direito - muito especialmente o direito penal - lida mal com surpresas, não as aceita.
E não as aceita, porque não é um jogo onde cada um dos intervenientes, com habilidade,
esconde trunfos para usar mais tarde, aproveita falhas, ou executa malabarismos jurídicos.
Cada processo existe para se alcançar a verdade de uma atuação e, uma vez encontrada,
aplicar-lhe o direito.
2. É na acusação que fica plasmado o pedaço de vida destacável do comportamento de um
indivíduo que vai ser sujeito a um juízo de subsunção jurídico-penal. E é neste pedaço de vida
que, perfeitamente delimitado, se encontra o objeto do processo, sendo na impossibilidade de
o ultrapassar que radica o princípio da vinculação temática.
3. Quando os factos aditados à acusação servem para esclarecer, para esmiuçar, para
concretizar o que já constava da acusação (mas sem o pormenor necessário) e quando com o
aditamento o arguido não é traído, nem sequer surpreendido, não pode dizer-se que os limites
de uma alteração não substancial foram ultrapassados.
4. O princípio nemo tenetur se ipsum accusare é a pedra de toque que permite diferenciar o
modelo processual de estrutura acusatória, do modelo processual de estrutura inquisitória.
Não há violação do referido princípio, projetado nos art. 32º e 20º nº 4 da Constituição da
República Portuguesa, quando não se identifica em qualquer fase do processo que tenha sido
posta em causa a tutela jurídico-constitucional de direitos fundamentais como a dignidade
humana, a liberdade de atuação ou a presunção de inocência que constituem a matriz juridico-
constitucional do mesmo princípio.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/992b1061be65376b80258
5b30036b71a?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


RECOLHA AMOSTRAS CONDENADOS
REGIME LEGAL
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
APLICAÇÃO DA LEI ANTIGA

Sumário:
I- No âmbito da aplicação da lei no tempo em direito processual penal rege o nº1 do artigo 5º
do CPP, pelo que constitui princípio geral de que a lei, como qualquer lei, só dispõe para o
futuro - artigo 12º do C. Civil - mas, sendo assim, a lei nova é de aplicação imediata aos
processos e aos atos processuais que sejam praticados após a sua entrada em vigor, ainda que
o processo tenha iniciado antes. Acresce que, ainda dentro do mesmo principio, ficam
ressalvados os atos praticados e as situações ocorridas no domínio da lei antiga.
II- Na ausência de norma transitória que resolva os termos da aplicação da lei no tempo aos
processos pendentes funciona aquele princípio geral de aplicação imediata da lei nova (tempus
regit actum), o qual tem três limites, a saber: 1º- Manutenção da validade dos atos realizados
na vigência da lei anterior; 2º- Não aplicação imediata da lei nova se da sua aplicação resultar
agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido; 3º- Não tem lugar se
da sua aplicação resultar quebra da harmonia e unidade dos vários atos do processo.
III- No caso vertente está em causa saber qual a versão da Lei nº Lei 5/2008 de 12.02 - diploma
que aprovou a criação de uma base de dados de perfis de ADN para fins de identificação civil e
criminal - deverá ser aplicada, a saber: a versão vigente no momento em que o processo foi
instaurado e que se encontrava em vigor no momento em que poderia ou deveria ter sido
aplicada, ou a lei nova atualmente em vigor (Lei nº 90/2017, de 22.08) cuja vigência coincide
ainda com o tempo processual antes de o processo findar.
IV- Para efeito de recolha de amostra de ADN, no caso sub judice, é de aplicar a lei antiga,
porquanto da aplicação da lei nova resultariam efeitos retroativos, ou seja, a aplicação a atos
já praticados antes do inicio da sua vigência, quando o princípio geral é antes a da aplicação
imediata da lei nova aos processos pendentes, mas com expressa salvaguarda da validade dos
atos praticados na vigência da lei anterior.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/fe336138610a08c980258
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Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


RELATÓRIO SOCIAL
MEIO PROBATÓRIO FACULTATIVO
OMISSÃO DA SUA SOLICITAÇÃO
CONSEQUÊNCIAS LEGAIS
REGIME PERMANÊNCIA HABITAÇÃO

Sumário:
1.A junção de relatório social a um processo é facultativa, na medida em que só se for
entendido “necessário à correta determinação da sanção” ( art. 370º do CPP) é que o tribunal
deverá diligenciar por obter tal meio de prova. Tal significa, portanto, que a necessidade da
sua junção tem de ser casuística e concretamente avaliada.
2 O nosso processo penal, que consagra um sistema mitigado de cisão (“césure”) entre a
decisão sobre a culpa e a decisão sobre a sanção a aplicar (artigos 368º e 369º do CPP), -
havendo até a possibilidade de reabertura da audiência (artigo 371º do CPP) e de produção de
prova suplementar, caso tal se revele necessário - distingue, além de outros, entre meios ou
diligências de prova “essenciais para a descoberta da verdade” e meios de prova “necessários
para a correta determinação da sanção”, sendo que a diferença não está só no conteúdo e
força das expressões “essenciais” e “necessários”, mas está no momento processual a que tal
meio de prova se dirige: a omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade
respeita à primeira parte, isto é, à decisão sobre a culpa, enquanto que a falta de relatório
social, quando necessário à correta determinação da sanção, respeita à segunda parte, isto é, à
decisão sobre a sanção a aplicar.
A omissão da prova do primeiro tipo constitui uma nulidade sanável, nos termos do artigo
120.º nº 2 al. d) do CPP; a omissão da prova do segundo tipo constitui uma irregularidade, nos
termos do art.º 123º do CPP.
3. Se um arguido entende que há determinadas circunstâncias da sua vida que o favorecem e
que deveriam ser tidas em conta pelo tribunal, circunstâncias que o tribunal desconhece,
então é razoável esperar que as leve ao conhecimento de quem julga e é irrazoável criticar o
tribunal quando este as não foi procurar. Este direito e dever de colaboração em nada colide
com o facto de qualquer arguido beneficiar da presunção de inocência e, portanto, não estar
obrigado a fazer prova da sua inocência, nem estar obrigado a colaborar com o tribunal na
descoberta da verdade ou a prestar declarações, sem que tal o possa desfavorecer.
4. O cumprimento de pena privativa de liberdade em regime de permanência na habitação,
previsto no art. 43º do CP, vai além da privação da liberdade, porque contém a possibilidade
de promover uma mudança na vida de quem deixou de poder viver em liberdade, mas não
apresenta uma perigosidade tal que tenha de ser encarcerado em estabelecimento prisional.
É, portanto, uma norma destinada a arguidos que tenham de cumprir penas curtas de prisão e
com a qual se pretende evitar o desenraizamento social, familiar, profissional, e, assim,
conseguir que a reintegração social não passe de um arquétipo, de um conceito inatingível.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/f4b2498722b6ded880258
5b40034c2eb?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


PENA DE MULTA
SUBSTITUIÇÃO PRESTAÇÃO TRABALHO
PRAZO LEGAL

Sumário:
1 - Tendo sido requerida a substituição da multa por dias de trabalho, o Tribunal entendeu que
o requerimento não era intempestivo e pediu relatório à D.G.R.S.P., a fim de concretizar o
trabalho a prestar, o que não é uma decisão final de deferimento ou indeferimento.
2 - Porém, o Tribunal referiu já que considerava o requerimento tempestivo, não indeferindo
liminarmente o requerido como propunha o M.P., pelo que nesta medida tem conteúdo
decisório e é recorrível.
3 - O requerimento para substituição de pena de multa por prestação de trabalho só pode ser
feito no prazo de pagamento voluntário que é de quinze dias ou no prazo concedido para o
pagamento da multa em prestações.
4 - A isso leva a interpretação do disposto nos arts.° 490°/1 e 489°/2 e 3), C.P.P., que em passo
algum remetem para o art.° 49°/2 C.P.
5 - Com efeito, este dispositivo apenas trata da possibilidade de evitar o cumprimento da
prisão subsidiária, não se podendo dizer que prolongue o prazo para pagamento.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/98ed4e063de175ed80258
5b4004810f5?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
CONDIÇÃO SUSPENSÃO PENA PRISÃO
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Sumário:
I- As questões de natureza jurídica são de conhecimento oficioso do tribunal de recurso, sem
prejuízo naturalmente da proibição da reformatio in pejus do artigo 409º do CPP
II- Por isso, é de conhecimento oficioso do tribunal a legalidade da imposição de trabalho a
favor da comunidade como condição da suspensão da pena de prisão em que o arguido foi
condenado;
III- O cumprimento da obrigação de prestar trabalho comunitário, ainda que com o
consentimento do condenado, como regra de conduta a que ficaria condicionada a suspensão
da execução da pena de prisão, aplicada ao abrigo do disposto no artigo 52º do C. Penal
representa a aplicação de uma duplicidade de penas, ou se se quiser, uma mistura de penas
pela prática do mesmo crime, que a lei não permite.
IV- A aplicação da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade nas sobreditas
condições é violadora do princípio da legalidade da pena, cfr. artigo 29º, nº 1 da CRP e artigo
1º, nº 1 do CP.

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/16b3cdcd61f3aee1802585
b40048c325?OpenDocument

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE
CADUCIDADE DA ACÇÃO
INCONSTITUCIONALIDADE
DIREITO AO CONHECIMENTO DA PATERNIDADE BIOLÓGICA
DIREITO À IDENTIDADE PESSOAL
DIREITO A CONSTITUIR FAMÍLIA

Sumário:
I- Da conjugação da alínea b) com a alínea c) do n.º 3 do art.º 1817.º do C.C. resulta que a
segunda se reporta às situações em que a paternidade não está determinada e a primeira às
situações em que a paternidade consta do registo do nascimento, pelo que, havendo uma
paternidade já estabelecida, a lei exige um maior grau de certeza nos “factos” e
“circunstâncias” que justifiquem a investigação, enquanto que relativamente à alínea c) os
“factos” e “circunstâncias” são todos os que tornem possível a investigação, e de que o
investigante tenha tido conhecimento em momento posterior ao termo final do prazo-regra de
10 anos, estabelecido no n.º 1, e justifiquem que tenha sido apenas nesse momento e não
antes que o investigante tenha lançado mão da acção com vista a exercer o seu direito de ver
estabelecido o vínculo da filiação.
II- O direito ao conhecimento da paternidade biológica, enquanto decorrência dos direitos de
identidade pessoal e ao direito de constituir família, assumem a natureza de direitos
fundamentais, consagrados nos art.os 26.º, n.º 1 e 36.º, n.º 1 da Constituição da República
Portuguesa.
III- O estabelecimento de prazos limitadores da possibilidade de intentar acção de investigação
da paternidade, como o estabelecido no n.º 3 do art.º 1817.º, aplicável por força do disposto
no art.º 1873.º, ambos do C.C., é materialmente inconstitucional por violar os suprarreferidos
art.os art.os 26.º, n.º 1 e 36.º, n.º 1 da C.R.P..

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/04ca06d947c4b78480258
5ab002ec219?OpenDocument
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS; AFASTAMENTO COERCIVO DO TERRITÓRIO
NACIONAL; FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO; NULIDADE; ARTIGO 1º, N.ºS 1 E 2, DO DECRETO-LEI
N.º 252/2000, DE 16.10;
N.º 1 DO ARTIGO 163º DO CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO;
DISCRICIONARIEDADE TÉCNICA; AUDIÊNCIA PRÉVIA; ARTIGO 148º DA LEI Nº 23/2007, DE
04.07; FALTA DE NOTIFICAÇÃO AO MANDATÁRIO; VALIDADE; EFICÁCIA.

Sumário:
1. Por regra, a falta de fundamentação apenas conduz à anulação do acto e não á declaração
de nulidade, tendo em conta o princípio geral de invalidade dos actos consagrada no n.º 1 do
artigo 163º do Código de Procedimento Administrativo.
2. Um acto está devidamente fundamentado sempre que um destinatário normal possa ficar
ciente do sentido da decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe optar
conscientemente entre a aceitação do acto ou a sua impugnação.
3. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é um órgão de polícia criminal que tem como um dos
“objectivos fundamentais controlar a circulação de pessoas nas fronteiras, a permanência e
actividades de estrangeiros em território nacional” – artigo 1º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º
252/2000, de 16.10.
4. No exercício das funções que a lei lhe atribui, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras averigua
a situação de facto que invocam os pretendentes, como é aqui o caso, à concessão de asilo ou
de residência por protecção subsidiária. Essa averiguação de facto, enquanto órgão de polícia
criminal, faz parte daquilo a que se costuma designar por “discricionariedade técnica”.
5. E no campo da “discricionariedade técnica” é entendimento pacífico o de que a conduta da
Administração é insindicável, salvaguardados os casos de erro grosseiro, uso de critérios
manifestamente desajustados ou desvio de poder.
6. No caso de estrangeiro em situação irregular o direito de audiência prévia, em processo
movido pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, não se concretiza da forma genérica prevista
nos indicados preceitos do Código de Procedimento Administrativo, mas na forma especial
prevista no artigo 148º da Lei nº 23/2007, de 04.07.
7. Esta formalidade cumpre-se quando o visado é ouvido no procedimento administrativo,
lavrando-se o correspondente “Auto de Declarações”.
8. A falta de notificação da decisão de afastamento coercivo ao mandatário da visada neste
procedimento não afecta a validade do acto, menos ainda constitui nulidade por preterição de
direito fundamental, porque a notificação é externa e posterior ao acto, afectando apenas a
sua eficácia.

http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/95efd073e880b34f80258
5a0003d34b9?OpenDocument

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte


PROCESSO DISCIPLINAR; PROVA; INJURIA; LIBERDADE DE EXPRESSÃO.

Sumário:
Tal como sumariado no Acórdão deste TCAN, proferido no Processo nº 257/15.2BEMDL, de
13.03.2020:
1- A decisão disciplinar constitui o culminar de um procedimento próprio e autónomo pelo
qual, no exercício do poder disciplinar, se visa, na sequência de uma tramitação legalmente
prevista, apurar a responsabilidade disciplinar do trabalhador e aplicar, quando seja o caso,
uma sanção disciplinar pela prática da infração disciplinar.
2- A condenação disciplinar para se dar determinado facto como provado, não exige uma
certeza absoluta, sendo admissível à Administração usar de presunções naturais, desde que as
mesmas sejam adequadas.
3- Demonstrado que o agente da GNR estava na linha da frente de uma manifestação, entre
manifestantes que gritavam palavras de ordem contra o Ministro da Administração Interna,
que incluíam as expressões “Gatuno, Gatuno”, dos quais não se apartou antes permanecendo
no local próprio daqueles que detêm uma posição de liderança, comando ou de destaque, não
é credível, também perante as regras da lógica e da experiência comum, que nesse contexto, o
mesmo fosse proferir outras expressões que não as palavras de ordem que estavam a ser
verbalizadas pelos manifestantes e que foram captadas pelos vários canais de televisão.
4- Um militar da GNR não pode ignorar que, se como cidadão em geral, não pode proferir as
expressões “Gatuno, gatuno” contra terceiros, muito menos o poderia fazer enquanto agente
da autoridade a quem se impõem particulares deveres funcionais, nomeadamente, o da
manutenção da ordem democrática, do estado de direito e da paz, segurança e tranquilidade
públicas.
5- As expressões “Gatuno, gatuno” são injuriosas, provocam o achincalhamento público e o
rebaixamento do titular do departamento governamental a quem são dirigidas.
6- A previsão constitucional e o consequente reconhecimento do direito à liberdade de
expressão a qualquer pessoa (artigo 37.º da CRP) não é ilimitado perante o respeito que a
todos se impõe pelo bom nome e reputação da pessoa visada (artigo 26.º da CRP), o que
reclama contenção relativamente ao uso de expressões ofensivas e inaceitáveis no contexto
em que são proferidas *

http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/b40fe36966e0e9d280258
5a0003ef5cc?OpenDocument

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte


SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS; DIREITO DE ASILO; AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA
POR PROTECÇÃO SUBSIDIÁRIA; PROVA; DEPOIMENTO DE PARTE; DISCRICIONARIEDADE
TÉCNICA;
NOS N.ºS 1 E 2 DO ARTIGO 3.º, O N.º 1 E A AL. B), DO N.º 2 DO ARTIGO 7.º E O N.º 3 DO
ARTIGO 18.º, TODOS DA LEI 27/2008,
DE 30 DE JUNHO, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI 26/2014 DE 05 DE MAIO (LEI
DO ASILO).

Sumário:
1. Os factos e elementos de prova não colhidos no procedimento não podiam ter sido tidos em
conta pelo acto impugnado, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, pelo que não se pode
aferir a validade do mesmo por fundamentos e elementos de prova que não podia ter em
conta.
2. Isto sendo certo que o tribunal não é uma segunda instância administrativa, nem tem
condições, designadamente de recursos humanos, para o ser, mas uma instância jurisdicional
que averigua, no caso concreto da acção de impugnação judicial, a validade do acto de acordo
com os pressupostos de facto e de direito que, no momento da prática do acto, poderiam e
deveriam ser tidos em conta, bem como avalia a razoabilidade dos juízos emitidos com base
nos elementos colhidos em sede administrativa, salvo omissão ou preterição de formalidades
essenciais.
3. Acresce que, no caso, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é um órgão de polícia criminal
que tem como um dos “objectivos fundamentais controlar a circulação de pessoas nas
fronteiras, a permanência e actividades de estrangeiros em território nacional” – artigo 1º, n.ºs
1 e 2, do Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16.10.
4. No exercício das funções que a lei lhe atribui, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras averigua
a situação de facto que invocam os pretendentes, como é aqui o caso, à concessão de asilo ou
de residência por protecção subsidiária. Essa averiguação de facto, enquanto órgão de polícia
criminal, faz parte daquilo a que se costuma designar por “discricionariedade técnica”.
5. E no campo da “discricionariedade técnica” é entendimento pacífico o de que a conduta da
Administração é insindicável, salvaguardados os casos de erro grosseiro, uso de critérios
manifestamente desajustados ou desvio de poder.
6. Este entendimento em nada fere o direito de acesso à tutela jurisdicional efectiva, nem os
artigos 20.º da Constituição da República Portuguesa e os artigos 2.º e 5.º, alíneas a) e b), do
Código de Processo Civil. Pois apenas circunscreve a função jurisdicional ao que a Lei, incluindo
a Constitucional, define como função jurisdicional, distinguindo-a da actividade administrativa,
com respeito pelo princípio da separação de poderes – artigos 212º, n.º 3, e 268º, n.º 4, ambos
da Constituição da República Portuguesa).
7. Pelo que o depoimento de parte, no que vai para além do que a requerente quis declarar,
em sede administrativa, mostra-se alheio à apreciação da validade do acto, sendo, portanto,
inadmissível tal prova.
8. Não se justifica conceder o direito de asilo ou, alternativamente, uma autorização de
residência por protecção subsidiária, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 3.º, o n.º 1
e a al. b), do n.º 2 do artigo 7.º e o n.º 3 do artigo 18.º, todos da Lei 27/2008, de 30 de Junho,
com as alterações introduzidas pela Lei 26/2014 de 05 de Maio (Lei do Asilo), no caso de não
ter sido feita a prova de que a requerente tenha sido alvo de perseguição em consequência de
actividade por ela exercida em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz
entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, ou de que tenha o fundado
receio de ser perseguida ou morta em resultando de um clima de perseguição sistemática
contra um grupo de pessoas a que a requerente pertença ou de violação sistemática dos
direitos humanos contra os cidadãos da Serra Leoa, de onde é natural, ou, finalmente, de que
tenha fundado receio de perseguição em virtude de raça, religião, nacionalidade, opiniões
políticas. *

http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/90099347d2eb21b780258
598003b8509?OpenDocument

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte


SEF; EXPULSÃO DE TERRITÓRIO NACIONAL; PROVIDÊNCIA CAUTELAR;

Sumário:
1 – Tendo a cidadã brasileira entrado regularmente no espaço Schengen em 11 de novembro
de 2019, tendo ingressado em território nacional ao abrigo da isenção de visto de que
beneficiam os cidadãos brasileiros, poder-se-ia manter-se no mesmo regularmente por 90
dias, em face do que a sua detenção em 20 de dezembro em Portugal se mostra irregular.
2 - Independentemente das razões subjacentes à permanência da cidadã brasileira em
estabelecimento de diversão noturna, encontrando-se a mesma, de acordo com o próprio SEF,
sozinha e a beber café, não estão preenchidos os necessários pressupostos para que a mesma
pudesse ser detida e expulsa de território nacional com base em provas meramente
circunstanciais e indiciárias.
3 – A execução do determinado “afastamento coercivo do território nacional da Requerente,
por um período de três anos e de abandono do território nacional no prazo de 10 dias…”, são
naturalmente consequências lesivas que se consubstanciam em factos consumados que
inspiram um fundado receio de que, se for caso disso, se tornará, em momento ulterior,
impossível proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade,
mormente perante a eventual efetivação da determinada expulsão da Recorrida.
4 – A ausência de suspensão do ato requerido, determinará certamente para a cidadã
brasileira um prejuízo de “difícil reparação” constitutivo e determinante de uma situação “de
facto consumado” de consequências irreparáveis e não reversíveis (Artº 120º nº 1 CPTA),
mormente no que concerne à expulsão, pois que mesmo que a decisão venha a ser revertida,
as consequências entretanto verificadas, seriam já insuscetíveis de ser integralmente
corrigidas.

http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/6faed1bb73020ce480258
598003ddc42?OpenDocument

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte


PEDIDO DE RENOVAÇÃO DA LICENÇA DE USO E PORTE DE ARMA TIPO B1, ARTIGO 14º, Nº 1,
C), DA LEI 5/2006, DE 23 DE FEVEREIRO, COM A REDACÇÃO CONFERIDA PELA LEI Nº 12/2011,
DE 27/04

Sumário:
I-A Administração limitou-se a indeferir o pedido de renovação de licença tendo por base os
processos crime pelos quais o Autor vinha indiciado, sem sequer haver sido condenado,
concluindo que por tal razão o Autor não possui temperamento, serenidade e ponderação;
I.1-discricionariedade não é sinónimo de arbítrio, pois, constituindo ela, embora, uma peculiar
maneira de aplicação de normas jurídicas, encontra-se vinculada a regras de competência, ao
fim do poder concedido, a variados princípios jurídicos como a igualdade, proporcionalidade,
justiça e imparcialidade, a regras processuais e ao dever de fundamentação, sem excepção, ao
princípio da legalidade, mesma na vertente de reserva de lei;
I.2-de igual forma, o erro sobre os pressupostos de facto subjacentes à decisão é relevante no
exercício de poderes discricionários, pois que a livre apreciação pretendida pelo Legislador ao
conceder aqueles poderes pressupõe a veracidade dos factos em que a decisão se baseia;
I.3-é o que se entende por momento vinculado do acto discricionário - a constatação dos
factos realmente ocorridos e/ou relevantes.
II-A sentença não atendeu a factos relevantes para a boa decisão da causa, apesar de os
mesmos serem parte fulcral do petitório e argumentação do aqui Recorrente;
II.1- a sentença recorrida foi proferida sobre a informação do processo nº 25011/2009 do
Comando Distrital de Braga, Polícia de Segurança Pública e concordando com o seu teor, nela
se louvou, recolhendo os seus termos e fundamentos, tendo tal decisão se baseado em
pressupostos insuficientes já que ignorando e desprezando a posição do Autor.

http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/95f0201b72b7402380258
58b003868b2?OpenDocument

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