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PANDEMIA
08/06/2020 09:20
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09/06/2020 A suspensão de acordos trabalhistas e a questão da coisa julgada - JOTA Info
Entende-se que a resposta deve ser positiva, e a solução deve ser encontrada na
própria teoria da coisa julgada, em sua perspectiva mais moderna.
Pode-se adiantar, de forma especí ca e direta, que, diante dessa questão, a hipótese
é no sentido de que a teoria dinâmica da coisa julgada – que trata da projeção desse
instituto no tempo, especialmente em relação às relações jurídicas continuativas e
também as de trato sucessivo – permite a suspensão da e cácia dos acordos
judiciais, pois o argumento utilizado nessa situação, desde que minimamente
comprovado pela parte que o invoca, é relativo a um fato posterior completamente
imprevisível no momento da celebração do acordo: a força maior decorrente da
pandemia.
Como o juiz deve decidir esse incidente? Naturalmente, outros detalhes do caso
poderiam conduzir a resultado diverso, mas, em tese, pelo que se narrou, é possível
a suspensão do acordo, por mero incidente processual.
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Sendo assim, para saber se há quebra na boa-fé objetiva e na proteção da con ança,
impõe-se aferir, quando houver pedido de revisão da coisa julgada, se o argumento
invocado pela parte interessada fazia parte da expectativa de debate no momento
do processo.
Observa-se, assim, que há, na própria teoria da coisa julgada, uma outra perspectiva
de discussão, que diz respeito à cadeia argumentativa utilizada no processo,
especialmente no momento da celebração do acordo judicial. Nesse aspecto, é fato
que, no aludido exemplo da banda de música, a imprevisibilidade da pandemia e de
seus efeitos sobre a economia é de evidência solar.
Na realidade, em plena pandemia, ainda não se tem certeza de nada. Por exemplo,
não se sabe até quando durará a situação da quarentena, ou se haverá lockdown em
determinadas cidades. Quando será fabricada a vacina contra o novo coronavírus?
Até quando o Estado terá disponibilidade nanceira, para socorrer os necessitados?
E a saúde pública entrará em colapso?
Vale observar que não se trata de uma mera análise inadequada do mercado e da
dinâmica da economia do país e do mundo. Em outros termos, não se trata de uma
mera “crise econômica”, que são cíclicas e inerentes ao regime capitalista.
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Não se pode esquecer de que a decisão judicial só mantém sua e cácia, enquanto
subsista a realidade que regula[5], e essa lição deve ser aplicada aos acordos
trabalhistas. Embora a proteção da con ança e a proibição de arbitrariedade sejam
inerentes à segurança jurídica[6], é certo que o abalo desta é tolerado pelo Direito
diante de fatos supervenientes absolutamente imprevisíveis, como a situação atual
de pandemia.
Por outro lado, no caso da suspensão do acordo, que pode ocorrer por mero
incidente processual, observa-se que não há ofensa frontal à coisa julgada, pois a
obrigação, em si, inclusive quanto ao valor estipulado, permanecerá intacta, o que
eventualmente pode mudar é o prazo de pagamento.
Vale ressaltar, entretanto, que as situações merecem uma análise pontual, dentro do
esperado bom senso, como consequência imediata dos princípios e cláusulas gerais
apontados.
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Se esse fato não for possível, cabe à Justiça do Trabalho observar a preservação de
vínculos de longa duração, a exemplo do pagamento de pensão alimentícia
decorrentes de acidentes ou doença do trabalho, além de outras situações que
envolvem conteúdo existencial, como a manutenção das obrigações relativas a
plano de saúde.
A despeito de tudo isso, vale enfatizar que o melhor caminho será sempre o
dialógico. Nesse sentido, é o momento de conclamar a sensibilidade dos advogados
e a dimensão ética da advocacia, para que, mediante o estímulo sincero às soluções
consensuais, contribuam, diretamente, para que a Justiça do Trabalho cumpra a sua
missão institucional, que é a realização da justiça social.
[1] CHEVALLIER, Jacques. O estado de direito. Tradução de Antonio Araldo Ferraz Dal Pozzo e
[2] CABRAL, Antonio do Passo. Coisa julgada e preclusões dinâmicas: entre a continuidade,
mudança e transição de posições processuais estáveis. 2. ed. Salvador: JusPODVIM, 2014, p. 40-
41 e 416.
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[3] CABRAL, Antonio do Passo. Coisa julgada e preclusões dinâmicas: entre a continuidade,
mudança e transição de posições processuais estáveis. 2. ed. Salvador: JusPODVIM, 2014, p. 413
e 510.
[4] CABRAL, Antonio do Passo. Coisa julgada e preclusões dinâmicas: entre a continuidade,
mudança e transição de posições processuais estáveis. 2. ed. Salvador: JusPODVIM, 2014, p. 96,
317-318 e 337.
[5] NIEVA-FENOLL, Jordi. “La cosa giudicata: la ne di un mito”. Rivista Trimestrale di Diritto e
procedura Civile, Milano, Giuffrè, Anno LXVIII, n. 4, dic. 2014, p. 1384.
[6] ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no direito
tributário. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 371 e 633.
SÉRGIO CABRAL DOS REIS – Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Mestre em Teoria Crítica en Derechos Humanos y Globalización pela Universidad Pablo de Olavide (Sevilla,
Espanha). Mestre em Direito Processual e Cidadania pela UNIPAR. Professor de Direito Processual Civil da
UEPB. Professor de Direito Processual do Trabalho da UNIFACISA. Coordenador pedagógico da pós-
graduação em Direito do Trabalho e Previdenciário da UNIFACISA. Professor da Escola Superior da
Magistratura Trabalhista da Paraíba (ESMAT XIII). Professor da Escola Superior da Magistratura do Estado
da Paraíba (ESMA-PB). Professor da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado da Paraíba
(FESMIP-PB). Professor da Escola Superior da Advocacia da Paraíba (ESA-PB). Membro da Associação
Brasileira de Direito Processual (ABDPro). Juiz do Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba (13ª Região).
Endereço residencial: Av. Ingá, 540, ed. Killie de Lamberti, apt. 2201, Manaíra, João Pessoa – PB, CEP
58038-250.
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buscam estimular o debate sobre temas importantes para o País, sempre prestigiando a
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