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Aula 01
Prof. Pablo Stolze Gagliano
a) Título V – Dos contratos em Geral, subdividido em dois Capítulos (Capítulo I - “Das Disposições
Gerais” - e Capítulo 2 - “Da Extinção do Contrato”). Tais capítulos são ainda estruturados em Seções,
que versam sobre aspectos gerais da matéria contratual;
Nota-se, no estudo dessa disciplina, que o codificador inovou, ao tratar de temas não regulados pelo
Código anterior, a exemplo do contrato preliminar, do contrato com pessoa a declarar, da resolução
por onerosidade excessiva (aplicação da teoria da imprevisão), da venda com reserva de domínio, da
venda sobre documentos e do contrato estimatório.
Além disso, disciplinou contratos novos, como a comissão, a agência/distribuição, a corretagem e o
contrato de transporte, deixando de fazer referencia a alguns outros institutos, como, por exemplo, a
cláusula comissória na compra e venda (art. 1163 do CC-16).
Perdeu-se, todavia, a oportunidade de se regular, pondo fim a infindáveis dúvidas, algumas
importantes modalidades contratuais já de uso corrente, como o leasing, o franchising, o factoring, o
consórcio, os contratos bancários e os contratos eletrônicos.
Apesar dessas omissões, entretanto, devemos reconhecer que, no geral, o trabalho do codificador, na
seara contratual, foi razoavelmente bem desempenhado, sobretudo por haver realçado a necessidade
de imprimir sociabilidade à noção de contrato.1
Devemos, de logo, ressaltar que a função social do contrato traduz conceito sobremaneira aberto e
indeterminado, impossível de se delimitar aprioristicamente.
HUMBERTO THEODORO JR., citando o competente professor PAULO NALIN, na busca por delimitar as
suas bases de intelecção, lembra-nos, com acerto, que a função social manifestar-se-ia em dois
níveis2:
a) intrínseco – o contrato visto como relação jurídica entre as partes negociais, impondo-se o
respeito à lealdade negocial e à boa fé objetiva, buscando-se uma equivalência material entre os
contratantes;
1
Contratos em Espécie integram a grade de curso complementar do LFG.
2
THEODORO JR., Humberto. O Contrato e sua Função Social. Rio de Janeiro: Forense, 2003, pág. 43.
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b) extrínseco – o contrato em face da coletividade, ou seja, visto sob o aspecto de seu impacto
eficacial na sociedade em que fora celebrado.
A boa-fé objetiva, pois, é o principio ou norma reguladora desses deveres de proteção, cuja
enumeração não pode ser considerada taxativa3.
Em sala de aula, falamos da formação do contrato entre presentes, dando ênfase ao interessante
problema da quebra da boa-fé objetiva pré-contratual.
Complementaremos, aqui, a nossa matéria, analisando a formação do contrato entre ausentes.
Fundamentalmente, a doutrina criou duas teorias explicativas a respeito da formação do contrato entre
ausentes4:
a) teoria da cognição Æ para os adeptos dessa linha de pensamento, o contrato entre ausentes
somente se consideraria formado, quando a resposta do aceitante chegasse ao conhecimento do
proponente.
b) teoria da agnição (dispensa-se que a resposta chegue ao conhecimento do proponente):
b.1. Æ sub-teoria da declaração propriamente dita – o contrato se forma no momento em que o
aceitante ou oblato redige ou datilografa a sua resposta. Peca por ser extremamente insegura, dada a
dificuldade em se precisar o instante da resposta.
b.2. Æ sub-teoria da expedição - considera formado o contrato, no momento em que a resposta é
expedida.
3
“Entre os deveres com tais características encontram-se, exemplificativamente: a) os deveres de cuidado, previdência e
segurança, como o dever do depositário de não apenas guardar a coisa, mas também de bem acondicionar o objeto deixado em
depósito; b) os deveres de aviso e esclarecimento, como o do advogado, de aconselhar o seu cliente acerca das melhores
possibilidades de cada via judicial passível de escolha para a satisfação de seu desideratum, o do consultor financeiro, de avisar
a contraparte sobre os riscos que corre, ou o do médico, de esclarecer ao paciente sobre a relação custo/benefício do tratamento
escolhido, ou dos efeitos colaterais do medicamento indicado, ou ainda, na fase pré-contratual, o do sujeito que entra em
negociações, de avisar o futuro contratante sobre os fatos que podem ter relevo na formação da declaração negocial; c) os
deveres de informação, de exponencial relevância no âmbito das relações jurídicas de consumo, seja por expressa disposição
legal (CDC, arts.12, in fine, 14, 18, 20, 30 e 31, entre outros), seja em atenção ao mandamento da boa-fé objetiva; d) o dever
de prestar contas, que incumbe aos gestores e mandatários, em sentido amplo; e) os deveres de colaboração e cooperação,
como o de colaborar para o correto adimplemento da prestação principal, ao qual se liga, pela negativa, o de não dificultar o
pagamento, por parte do devedor; f) os deveres de proteção e cuidado com a pessoa e o patrimônio da contraparte, v.g., o
dever do proprietário de uma sala de espetáculos ou de um estabelecimento comercial de planejar arquitetonicamente o prédio,
a fim de diminuir os riscos de acidentes; g) os deveres de omissão e de segredo, como o dever de guardar sigilo sobre atos ou
fatos dos quais se teve conhecimento em razão do contrat ou de negociação preliminares, pagamento, por parte do devedor etc”
(COSTA, Judith Martins-. A Boa-Fé no Direito Privado. São Paulo: RT, 1999, p.439).
4
Cf. PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de Direito Civil, Contratos, vol. 3, 10. ed., Forense, pág. 25 e RODRIGUES, Silvio.
Direito Civil – Dos Contratos e Declarações Unilaterais de Vontade. vol 3. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 1997.
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b.3. Æ sub-teoria da recepção – reputa celebrado o negócio no instante em que o proponente recebe
a resposta. Dispensa, como vimos, que leia a mesma. Trata-se de uma sub-teoria mais segura do que
as demais, pois a sua comprovação é menos dificultosa, podendo ser provada, por exemplo, por meio
do A.R. (aviso de recebimento), nas correspondências.
Mas, afinal, qual seria a teoria adotada pelo nosso direito positivo?
CLÓVIS BEVILÁQUA, autor do anteprojeto do Código Civil de 1916 era, nitidamente, adepto da sub-
teoria da expedição, por reputá-la “a mais razoável e a mais jurídica”.5
Por isso, boa parte da doutrina brasileira, debruçando-se sobre o art. 1086 do Código revogado,
concluía tratar-se de dispositivo afinado com o pensamento de BEVILÁQUA:
Na mesma linha, se cotejarmos esse dispositivo com o correspondente do Código em vigor, teremos a
nítida impressão de que foi adotada a vertente teórica da expedição:
Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida,
exceto:
I - no caso do artigo antecedente;
II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;
III - se ela não chegar no prazo convencionado.
(grifamos)
Note-se, entretanto, que o referido dispositivo enumera situações em que o contrato não se reputará
celebrado: no caso do art. 433; se o proponente se houver comprometido a esperar a resposta (nesta
hipótese, o próprio policitante comprometeu-se a aguardar a manifestação do oblato); ou, finalmente,
se a resposta não chegar no prazo assinado pelo policitante.
Ocorre que se nós observarmos a ressalva constante no inciso I desse artigo, que faz remissão ao
art. 433, chegaremos à inarredável conclusão de que a aceitação não se reputará existente, se antes
dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante.
Atente para essa expressão: “se antes dela ou com ela CHEGAR ao proponente a retratação do
aceitante”.
Ora, ao fazer tal referência, o próprio legislador acabou por negar a força conclusiva da expedição,
para reconhecer que, enquanto não tiver havido a RECEPÇÃO, o contrato não se reputará perfeito,
pois, antes do recebimento da resposta ou simultaneamente a esta, poderá vir o arrependimento do
aceitante.
Dada a amplitude da ressalva constante no art. 433, que admite, como vimos, a retratação do
aceitante até que a resposta seja recebida pelo proponente, entendemos que o nosso Código Civil
adotou a sub-teoria da recepção, e não a da expedição
Fonte: Novo Curso de Direito Civil – Teoria Geral dos Contratos – vol. IV, tomo 01. Pablo Stolze
Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (Saraiva) (www.editorajuspodivm.com.br ou
www.saraivajur.com.br)
Mensagem
“Quando idealizamos um projeto do bem, que contribua com o nosso crescimento e o da humanidade,
o universo conspira a favor!”.
Um grande abraço, amigos!
Força e Fé, sempre!
Pablo.
5
BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Obrigações.São Paulo: RED, 2000, pág. 238.
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2. Teoria da Imprevisão
A presente teoria somente interessa aos contratos de execução continuada ou diferida, ou seja,
de médio ou longo prazo, uma vez que se mostraria inútil nos de consumação instantânea.
Podemos, nessa linha de intelecção, decompor essa importante construção dogmática, nos seguintes
elementos:
O novo Código Civil, todavia, preferiu afastar-se desta doutrina, exigindo “a extrema vantagem de uma
das partes” como condição para a aplicação da teoria:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das
partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude
de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do
contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente
as condições do contrato.
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela
pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar
a onerosidade excessiva.
Vale lembrar, finalmente, que no âmbito do Código de Defesa do Consumidor, a aplicação da teoria é
mais favorável ao consumidor, pois dispensa o requisito da imprevisibilidade, razão por que é
preferível o emprego da expressão “teoria da onerosidade excessiva”:
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Por fim, fique atento ao posicionamento do STJ a respeito de contratos cuja correção esteve atrelada
ao dólar, por conta da elevação inesperada da moeda e possível aplicação da teoria da imprevisão.
Tantas foram as demandas, instauradas especialmente por quem havia celebrado contratos de leasing,
e que sofreu com a elevação abrupta da moeda americana em 1999, que o STJ firmou o seguinte
entendimento:
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3. Contratos Atípicos
Por contratos típicos entendam-se aqueles que têm previsibilidade legal, ou seja, que são regulados
pelo Direito Positivo, como a compra e venda, a doação, a locação, o depósito, o seguro, o comodato,
o mútuo etc. São, portanto, figuras com assento na legislação em vigor.
Já os contratos atípicos, por sua vez, são aqueles não regulados em lei, como, por exemplo, os
contratos de hospedagem, factoring e ingeneering, dentre tantos outros.
Segundo doutrina do grande ORLANDO GOMES6, os contratos atípicos comportam uma sub-tipificação:
a) contratos atípicos propriamente ditos – são aqueles criados ou “inventados” pelas próprias
partes, que cuidam de celebrar um negócio jurídico inteiramente novo, com características específicas,
e sem similar no direito positivo. São fruto da autonomia privada, limitada, como vimos, pelos
princípios superiores de índole constitucional da função social do contrato e da dignidade da pessoa
humana (este último compreensivo da necessidade de observância da boa-fé objetiva na relação
negocial).
Veja esta situação:
b) contratos atípicos mistos – são aqueles formados pela conjugação de prestações típicas de
outros contratos existentes. Resultam, pois, da fusão de elementos de outros contratos positivados,
resultando em uma figura nova, dotada de autonomia jurídica e unidade sistêmica. É o caso do
contrato de hospedagem, que decorre da conjugação de elementos de outros contratos como a
locação, o depósito, a compra e venda etc.
No que tange à disciplina jurídica dos contratos atípicos, três soluções são sugeridas para a resolução
do problema:
a) teoria da combinação – neste caso, sugere-se que, ao interpretar o contrato atípico, deve o
intérprete decompô-lo, aplicando-se a cada uma de suas partes as regras legais correspondentes ao
contrato que lhe é similar;
b) teoria da absorção – aplicam-se as regras legais correspondentes à prestação que lhe seja
preponderante (assim, se em determinado contrato atípico prevalece a característica do depósito,
aplicam-se-lhe as regras deste último);
c) teoria da aplicação analógica – aplica-se ao contrato atípico as regras legais do contrato que
lhe seja mais próximo (por analogia).
6
GOMES, Orlando, Contratos, 15 ed., Contratos., págs. 102 e ss.
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“Nos contratos atípicos, o intérprete tem de contar mais com as estipulações negociais e pode contar
menos com o direito dispositivo”.
(VASCONCELOS, Pedro Pais de. Contratos Atípicos. Almedina: Coimbra, 1995, págs. 375-376).
O novo Código, por sua vez, posto não haja dedicado seção ou capítulo específico para a sua disciplina,
fez-lhe expressa menção em seu art 425:
Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas
neste Código.
OBS.:
Não devemos confundir os contratos atípicos com a união ou a coligação de contratos, situação em
que há pluralidade contratual. Imagine-se, por exemplo, a freqüente situação do dono do posto de
gasolina que celebra com a indústria distribuidora vários contratos coligados entre si: empréstimo das
bombas, venda do combustível, locação de equipamentos etc. Podem utilizar o mesmo instrumento
(documento), mas são pactuados vários negócios, juridicamente distintos, posto unidos entre si. Vale
dizer, vários contratos são celebrados, em coligação, não havendo, pois, um único negócio
celebrado, mas sim, vários.
Tais temas, pela sua importância teórica, e na preparação para concurso, serão minuciosamente
tratados na aula.
Relembremos, neste ponto, os seus conceitos e características:
Os vícios redibitórios, por definição, são defeitos ocultos que diminuem o valor ou prejudicam a
utilização da coisa recebida por força de um contrato comutativo (art. 441, CC-02; art. 1101, CC-16).
Poderíamos, assim, elencar os seguintes elementos caracterizadores ou requisitos do vício redibitórios:
4.2. Eviccção
Consiste a evicção na perda7, pelo adquirente (evicto), da posse ou propriedade da coisa transferida,
por força de uma sentença judicial ou ato administrativo que reconheceu o direito anterior de terceiro,
denominado evictor.
Em nosso Código Civil, a evicção é disciplinada a partir do seu art. 447 (art. 1107, CC-16):
Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta garantia
ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.
A primeira parte do dispositivo deixa bem claro quem responde pelos riscos: o alienante.
E para que a sua responsabilidade se manifeste, três requisitos devem se conjugar:
7
Lembra a dica de memorização que demos na aula? Evicção = Perda...
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a) aquisição de um bem;
b) perda da posse ou da propriedade;
c) prolação de sentença judicial ou execução de ato administrativo.
5. Arras
Em um primeiro sentido, as arras significam princípio de pagamento, é o sinal dado por uma das
partes à outra marcando o início da execução do negócio.
As denominadas arras confirmatórias tornam firme a avença, não assistindo às partes direito de
arrependimento algum. Caso deixem de cumprir a sua obrigação, serão consideradas inadimplentes,
sujeitando-se ao pagamento das perdas e danos.
O Código Civil de 2002, aprimorando o tratamento da matéria, cuida de disciplinar o destino das arras
confirmatórias após a conclusão do negócio, nos termos do seu art. 417 (art. 1096, CC-16):
“Art. 417. Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma parte der à outra, a título de arras, dinheiro
ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de execução, ser restituídas ou computadas na
prestação devida, se do mesmo gênero da principal”.
E o que aconteceria se, não obstante as arras dadas, o contrato não fosse cumprido?
Neste caso, responde-nos o art. 418, CC-02 (art. 1097, CC-16), se a parte que deu as arras não
executar o contrato, poderá a outra considerá-lo desfeito, retendo as arras dadas; se, entretanto, a
inexecução obrigacional for de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por
desfeito, e exigir a sua devolução mais o equivalente (perdas e danos), com atualização monetária,
segundo os índices oficiais, juros e honorários de advogado.
É cabível, outrossim, indenização suplementar:
“Art. 419. A parte inocente pode pedir a indenização suplementar, se provar maior prejuízo, valendo as
arras como taxa mínima. Pode, também, a parte inocente exigir a execução do contrato, com perdas e
danos, valendo as arras como o mínimo da indenização”.
As arras penitenciais, por sua vez, diferentemente das confirmatórias, garantem o direito de
arrependimento, consoante podemos observar da leitura do art. 420:
“Art. 420. Se no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as
arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em
benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos
não haverá direito a indenização suplementar”. (grifos nossos)
Finalmente, cumpre-nos observar ainda que o art. 420 do CC-02 proibiu, no caso das arras
penitenciais, a indenização suplementar, além daquela correspondente à perda das arras.
Esse entendimento, aliás, já havia sido sufragado pelo excelso Supremo Tribunal Federal para as
promessas irretratáveis de compra e venda, consoante assentado na sua Súmula 412:
“No compromisso de compra e venda com cláusula de arrependimento, a devolução do sinal, por quem
o deu, ou a sua restituição em dobro, por quem a recebeu, exclui indenização a maior, a títulos de
perdas e danos, salvo os juros moratórios e os encargos do processo”.
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Com a entrada em vigor do novo Código Civil, importantes problemas referentes ao Direito
Intertemporal poderão ser suscitados, exigindo do magistrado redobrada cautela. Um desses
problemas diz respeito à possibilidade de incidência da lei nova em contratos celebrados antes de 11
de janeiro de 2003.
Tentando dirimir eventual conflito de normas, o Código Civil, em seu art. 2035, dispõe que:
“A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor
deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus
efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se
houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução.
Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública,
tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e
dos contratos”.
Segundo esta regra, os negócios jurídicos celebrados antes da entrada em vigor do novo Código
continuarão regidos pelas leis anteriores (Código Civil de 1916, Código Comercial), no que tange aos
seus pressupostos de validade (nulidade e anulabilidade).
Destarte, tomando como exemplo um contrato de mútuo (empréstimo de coisa não fungível) celebrado
em 2000, não poderá o intérprete invocar os pressupostos de validade do art. 104 do CC-02, eis que
continuará a ser aplicada a regra anterior do código revogado (art. 82 – agente capaz, objeto lícito,
forma prescrita ou não defesa em lei).
Da mesma forma, não se deve pretender aplicar as regras da lesão e do estado de perigo (defeitos do
negócio jurídico), inauguradas pelo Código de 2002 (art. 156 e 157), restando ao hermeneuta recorrer
a outros meios de colmatação, eventualmente aplicáveis, e à luz da disciplina normativa anterior.
Por tais razões, um contrato celebrado por um menor de 18 anos, antes de 11 de janeiro (data da
entrada em vigor do novo Código), continua sendo anulável (art. 147, I, CC-16), a despeito da redução
da maioridade civil (18 anos), eis que, à época da celebração do negócio, segundo a lei então vigente,
o ato seria considerado inválido.
Aliás, esta impossibilidade de retroação dos efeitos da lei nova para atingir a validez dos negócios já
celebrados apenas consubstancia a observância da regra constitucional que impõe o respeito ao ato
jurídico perfeito (art. 5°, XXXVI, CF).
No entanto, se, por um lado, não pode a lei nova atingir a validade dos negócios jurídicos já
constituídos, por outro, se os efeitos do ato penetrarem o âmbito de vigência do novo Código, deverão
se subordinar aos seus preceitos, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de
execução.
Esta parte final do caput deverá causar polêmica, e abrir margem à insegurança jurídica. Para melhor
entendê-lo, cumpre-nos marcar, neste ponto, um divisor de águas: quanto ao aspecto de sua validade,
não poderá o Código de 2002 atingir negócios celebrados antes da sua vigência; no entanto, quanto ao
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Artigo que publicamos no www.novodireitocivil.com.br e desenvolvido em nosso volume IV – Teoria Geral dos Contratos.
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seu aspecto eficacial, ou seja, de executoriedade ou produção de seus efeitos, caso estes invadam o
âmbito temporal de vigência da nova lei, estarão a esta subordinados.
Um exemplo.
Imaginemos um contrato de financiamento celebrado em 1999, de execução repetida no tempo (trato
sucessivo), em que o financiado se obrigou a pagar, mensalmente, prestações pecuniárias à instituição
financeira pelo prazo de 5 anos. Pois bem. Entra em vigor o novo Código Civil. Este, por expressa dic-
ção legal, não poderá interferir na validade do negócio celebrado, embora os efeitos do contrato – de
execução protraída no tempo – se sujeitem às suas normas (art. 2035).
Com isso, regras como as relativas à “resolução por onerosidade excessiva” (arts. 478 a 480), à
“correção econômica das prestações pactuadas” (art. 317), ao “aumento progressivo de prestações
sucessivas” (art. 316), ou às “perdas e danos” (arts. 402 a 405), para citar apenas alguns exemplos,
poderão ser imediatamente aplicadas aos negócios jurídicos já constituídos, por interferirem, apenas,
em seu campo eficacial ou de executoriedade.
Entretanto, nos termos da parte final do art. 2035, se as partes houverem previsto outra forma de
execução, a exemplo da execução instantânea (que se consuma imediatamente, em um só ato), ou se
afastaram a incidência de determinadas regras consagradas na lei nova – que não tenham substrato
de ordem pública – a exemplo do aumento progressivo das prestações sucessivas, poderá ser evitada
a incidência da nova lei.
Mas observe: determinadas normas, como a que prevê a resolução por
onerosidade excessiva ou a correção econômica das prestações pactuadas, em nosso pensamento, por
seu indiscutível caráter publicístico e social, não podem, a prioristicamente, ser afastadas pela vontade
das partes.
Finalmente, o parágrafo único do artigo sob comento, utilizando linguagem
contundente, determina que “nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem
pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social dos contratos e da
propriedade”.
Utilizando a expressão “nenhuma convenção”, o legislador impõe a todos os negócios jurídicos, não
importando se celebrados antes ou após a entrada em vigor do novo Código, a fiel observância dos
seus preceitos de ordem pública, especialmente a função social da propriedade e dos contratos.
Assim, contratos que violem regras ambientais ou a utilização econômica racional do solo, assim como
as convenções que infrinjam deveres anexos decorrentes da cláusula de boa fé objetiva (lealdade,
respeito, assistência, confidencialidade, informação), expressamente prevista no art. 422 do novo
Código, não poderão prevalecer, ante a nova ordem civil.
Fonte: Novo Curso de Direito Civil – Teoria Geral dos Contratos – vol. IV, tomo 01. Pablo Stolze
Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (Saraiva) (www.editorajuspodivm.com.br ou
www.saraivajur.com.br)
Mensagem
“Ainda que eu haja elaborado um plano detalhadamente e todos os preparativos estejam em ordem,
não o ponho logo em prática; aguardo o tempo certo”
(MOKITI OKADA)
Um abraço, meus amigos!
Pablo.
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