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Princípios Básicos da ética em pesquisa envolvendo seres humanos com base

na resolução 466 do Conselho Nacional de Saúde de 12 de dezembro de 2012.

Texto elaborado para fins didáticos para o PIN 2 pelas professoras: Adriana L. Soares
e Clisia M.Carreira

Por que a pesquisa com seres humanos deve ser regulamentada ?


O ser humano deve ser respeitado em sua dignidade, liberdade e autonomia.
No passado, algumas pesquisas realizadas com seres humanos cometeram
atrocidades com grande desrespeito a dignidade, liberdade e autonomia. Aqui
citaremos duas mais importantes delas:
1) Estudos realizados por Hitler na Alemanha nazista, no período de 1933 a 1945,
onde um grande número de pessoas (adultos, jovens, crianças e idosos) foram
mortas nos campos de concentração, vítimas das mais diversas experiências
humanas.
2) Estudos conduzidos no Alabama (EUA), conhecido como caso de Tuskegee,
onde 600 pessoas negras foram recrutadas para participar da pesquisa, sendo
399 homens portadores de sífilis que permaneceram sem tratamento para
verificar a evolução natural da doença e 201 pessoas não infectadas que
serviram de base para comparação. Os portadores da doença nunca
receberam diagnóstico de sua situação de saúde e nem qualquer tipo de
tratamento, mesmo a penicilina já tendo sido descoberta. Este estudo iniciou
em 1932 e só foi terminar 40 anos depois em 1972, neste período inúmeras
pessoas morreram, mulheres foram contaminadas por seus parceiros e várias
crianças nasceram com sífilis congênita.

Alguns documentos foram redigidos e estabelecidos para constituírem os


pilares do reconhecimento e da afirmação da dignidade, da liberdade e da autonomia
do ser humano, evitando que mais prejuízos fossem causados aos seres humanos
envolvidos em pesquisas. Os principais documentos foram: o Código de Nuremberg
(1947), a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), a Declaração de
Helsinque (1964 e suas versões de 1975, 1983, 1989, 1996 e 2000); o Pacto
Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), o Pacto
Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (1966), a Resolução nº 1996 (1996), a
Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos (1997), a
Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos (2003), e a Declaração
Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (2004), a Resolução nº 466 (2012).

Em que se baseia a Resolução nº 466 de 2012


A resolução baseia-se na ética, que tem uma definição muito ampla e envolve
os princípios básicos da bioética, sendo eles:
1) Princípio da Beneficência: que refere-se a ação de fazer o bem, maximizar
os benefícios; procurar sempre o bem-estar do doente; atender os interesses legítimos
do paciente e, na medida do possível, evitar danos. Obrigação moral de agir para o
benefício do outro.
2) Princípio da Não-maleficiência: o profissional de saúde tem o dever de,
intencionalmente, não causar mal e/ou danos a seu paciente; evitar ou reduzir os
eventos adversos nos procedimentos de diagnóstico e terapêutico.
3) Princípio da Autonomia: capacidade de uma pessoa para decidir fazer ou
buscar aquilo que ela julga ser o melhor para si mesma. Requer respeito a todas as
pessoas e as informações devem ser disponíveis para fundamentar a sua escolha. O
indivíduo dever ter a capacidade de pensar, decidir e agir de modo livre e
independente.
4) Princípio da Justiça: Quando há dúvidas se deve prevalecer o princípio da
beneficência ou o respeito pela autonomia, utiliza-se o princípio da justiça. Este
princípio exige equidade na distribuição de bens e benefícios no que se refere ao
exercício na área de saúde, sendo equidade a disposição de reconhecer igualmente o
direito de cada um a partir de suas próprias diferenças.
Segundo Tomanick (2008, p. 397) a ética pode ser definida como uma forma
de direcionamento das tomadas de decisões individuais diante de situações
específicas, ou mesmo um princípio direcionador do conjunto das ações do indivíduo.
Neste sentido, a ética é parte de processos individuais de reflexão e de ação e pode
estar presente na vida de qualquer ser humano.
Segundo a Resolução 466 (2012), a pesquisa envolvendo seres humanos pode
ser definida como sendo pesquisa que, individual ou coletivamente, envolva o ser
humano, de forma direta ou indireta, em sua totalidade ou partes dele, incluindo
manejo de seus dados, informações ou materiais biológicos.
Para uma pesquisa ser eticamente justificável precisa respeitar o participante
da pesquisa em sua dignidade e autonomia, reconhecendo sua vulnerabilidade,
assegurando sua vontade de contribuir e permanecer, ou não, na pesquisa, por
intermédio de manifestação expressa, livre e esclarecida; precisa ponderar entre
riscos e benefícios, tanto conhecidos como potenciais, individuais ou coletivos,
comprometendo-se com o máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos, e
garantindo que danos previsíveis serão evitados; precisa ter relevância social, o que
garante a igual consideração dos interesses envolvidos, não perdendo o sentido de
sua destinação sócio-humanitária; e, finalmente, precisa ser aprovada previamente por
um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP).
Os comitês de ética em pesquisa CEPs são cadastrados e credenciados pela
CONEP (Conselho Nacional de Ética em Pesquisa) do Ministério da Saúde, a
Plataforma Brasil (http://plataformabrasil.saude.gov.br/login.jsf) é o sistema oficial de
cadastro de pesquisas envolvendo seres humanos no Brasil, sendo obrigatório o seu
cadastro e avaliação pelos CEPs.
Os CEPs são colegiados interdisciplinares e independentes, de relevância
pública, de caráter consultivo, deliberativo e educativo, criados para defender os
interesses dos participantes da pesquisa em sua integridade e dignidade e para
contribuir no desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos.
A análise ética de uma pesquisa baseia-se na avaliação do projeto de pesquisa
e dos documentos exigidos pela resolução e apresentados pelo pesquisador
responsável. O pesquisador responsável deverá ter no mínimo concluído o ensino
superior (ser graduado) e possuir experiência na área da pesquisa a ser por ele
desenvolvida. Dentre os preceitos éticos avaliados no projeto, destacam-se os
apresentados a seguir:
1) Análise de riscos e benefícios da pesquisa: toda e qualquer pesquisa
apresenta riscos aos participantes, estes riscos podem variar de mínimos
(como cansaço ou constrangimento em responder a um questionário) até
riscos mais graves (como efeitos adversos em pesquisa de novos fármacos
ou novos procedimentos terapêuticos). É deve do pesquisador minimizar os
riscos, sempre que possível, e amparar o participante da pesquisa em
qualquer dano decorrente da sua pesquisa (dano este de ordem psíquica,
moral, intelectual, social, cultural e físico). Quanto maior o risco associado a
pesquisa, maior deverá ser o benefício. A realização de uma pesquisa sem
benefícios, sejam eles diretos ou indiretos ao participante da pesquisa ou a
sociedade não é ética e fere o princípio da beneficência.
2) Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) - toda pesquisa
realizada com dados primários deverá apresentar o consentimento livre e
esclarecido dos participantes, indivíduos ou grupos que, por si e/ou por
seus representantes legais, manifestem a sua anuência à participação na
pesquisa. O processo de elaboração do consentimento livre e esclarecido
está detalhado no capítulo IV da Resolução n.466/2012. Cabe destacar que
em pesquisas cujos convidados sejam crianças, adolescentes, pessoas
com transtorno ou doença mental ou em situação de substancial diminuição
em sua capacidade de decisão (vulneráveis), deverá haver justificativa clara
de sua escolha, especificada no protocolo e aprovada pelo CEP, e pela
CONEP, quando pertinente.
3) Instrumento de coleta de dados: são as perguntas ou questionários a serem
aplicados aos participantes, sua análise ética é muito importante para evitar
possíveis constrangimentos aos participantes, desequilíbrios emocionais,
sociais e comportamentais.
4) Orçamento e Financiamento: toda pesquisa tem custo e este é de
responsabilidade total do pesquisador. Os participantes da pesquisa não
poderão ter custos relacionados à sua participação na pesquisa, a
Resolução n° 466 (2012) no item II.21, define ressarcimento como
“compensação material, exclusivamente de despesas do participante e
seus acompanhantes, quando necessário, tais como transporte e
alimentação”. Ainda, o item IV.3.g orienta que o TCLE deve conter
obrigatoriamente “explicitação da garantia de ressarcimento e como serão
cobertas as despesas tidas pelos participantes da pesquisa e dela
decorrentes”. Cabe ainda salientar que o SUS não pode ser onerado pela
pesquisa proposta, ou seja, se em função da pesquisa o participante
precisar de atendimento médico de urgência ou emergência, cabe ao
pesquisador providenciar esse atendimento e financiar todo o tratamento
necessário para a recuperação do participante.

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