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COF – aula 9

Durante o primeiro ano curso, o foco estará em recolher toda a


bibliografia necessária sobre os assuntos de interesse de cada aluno,
determinando em cada etapa da ida intelectual os temas de estudo, e, assim,
“cavando onde se está” (Jean Guiton).
Dentro do escopo do estudo, na vida intelectual, existem dois tipos
de atitude a se tomar:
1. Quando a pessoa se coloca a cima da realidade, como se não
participasse do fluxo de emoção e de impulsos humanos, se retira,
imaginariamente, do raio das desgraças e das ações emocionais que
assola qualquer ser humano, e analisa esse ideal como sendo superior
a todos, sobe a “suprema beatitude do conhecimento” (Jacob
Burckhardt). Há ainda os que vão além, que se colocam em um
patamar superior, e querem moldar a sociedade a partir desta visão
superior, moldar a sua imagem e semelhança, do jeito que eles
querem e não como de fato as coisas deveriam ser, nesse andar mais
baixo, encontram-se os marxistas. (É importante ressaltar, que, para
um bom proveito da vida intelectual, é preciso, em alguns
momentos, se colocar a cima dos sentidos, mas saber que é uma
condição temporária e que, na realidade a vida acontece em terra
firme)
2. A atitude mais aceitável do estudo, é reconhecer a nossa posição na
realidade, saber onde está (e para onde se vai), e então, aceitar a
submissão a um observador onisciente, pois é apenas Ele que está a
cima de tudo, e enxerga as coisas como realmente são, nós
enxergamos como que um espelho que esteja sujo, não se é possível
ver realmente quem somos, por isso, o diálogo deve ser sincero com
esse observado, para aprendermos mais sobre nós mesmo, e,
consequentemente, sobre a realidade. Como exemplo desta atitude,
temos Santo Agostinho, que faz a sua confissão como forma de
reconhecer as suas atitudes, desde as que mais agradaram a Deus, até
as que mais O desgostaram, conhecendo, assim, mais de se.
Quem introduziu no pensamento moderno essa ideia de se colocar a
cima, foi René Descartes, com a teoria da “consciência da consciência”,
assumindo como sendo isso o próprio Ser, mas a “consciência da
consciência” é apenas um papel que o Eu, histórico e real, assume
temporariamente, portanto, essa condição de Descartes é meramente
ilusória, já que o único Ser que possui, de fato, a “consciência da
consciência” de forma permanente, é o próprio Deus. Esse papel que
assumimos é temporário, pois, o nosso lugar é na realidade, em meio ao
fluxo de experiências, boas e más, e a verdade, é entender que estamos
onde sempre estivemos (como Minas). E este sim é o “solo duro da
realidade” (Louis Lavalle), é aqui que devemos cavar, como diz Jean
Guitton. Aquilo que fez Agostinho: reconhecer a sua posição diante de um
Observador Onisciente, a superioridade Dele, e a sua posição concreta e aí
cavar.
Eis, então, a grandeza do pensamento de Agostinho, reconhecer aquilo
que é a sua vida, quem você é, não algo que foi inventado por você ou pelo
seu pensamento, mas aquilo que é. E a partir disso, tudo aquilo que for
estruturado pelo pensamento é real, e o que não for, é falso. Isso dá um
ponto de apoio na realidade que é fundamental para a prática filosófica.
Quando a pessoa sobe a “beatitude do conhecimento”, acaba por
confundir a ideia idealizada do mundo, que ela mesmo inventou, pelo
mundo de verdade, e isso é exatamente o oposto do que faz Santo
Agostinho, ela faz uma anticonfissão. Isso acontece porque a pessoa não foi
forte suficiente para encarar a realidade como ela é, e acaba entrando nesse
teatro mental, e coloca os seus planos como a solução para todos os
problemas da humanidade. E quando esse teatro mental, que a princípio era
pessoal, se torna público e iludi outras pessoas, se torna um crime do
pensamento.
“O movimento ideológico de massas é exatamente isso: é uma pessoa
maligna, doente, incapaz de suportar a realidade de sua própria miséria, que escapa
para um mundo idealizado, teatral, e desempenha aquele papel com tal intensidade,
com tal devoção, que faz os outros representarem aquilo mesmo, fugindo, portanto,
da realidade de suas vidas”.

O cenário atual da vida intelectual brasileira, sobretudo nas


universidades, convida as pessoas a serem arrebatadas ao sétimo céu da
beatitude do conhecimento, fazendo com que a classe intelectual dominante
do país tenha a mesma linguagem, todos padronizados, nada do mundo
real, mas sempre em um mundo hipotético do que deveria ser.
Quando o sujeito acredita que o eu real dele está a cima da realidade
ele está delirando, no suprassumo da beatitude, ele nega a própria
substância da sua história pessoal. A recusa da condição real da pessoa, é
uma inspiração gnóstica, ela sai de onde ela está, e se coloca a cima, ela
quer apagar aquilo que ela é de verdade e se colocar em outro patamar.

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