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Referência bibliográfica. Cockburn, Patrick.

A Origem do Estado Islâmico: o fracasso da “guerra ao terror”


e a ascensão Jihadista. Tradutor Antonio Martins. 1ª Ed. São Paulo: Autonomia Literária, 2015. 179 p.
A COMPLEXIDADE DO TERROR

Capitão – Tenente Mattheus Bezerra Oliveira

Nesta obra o autor e repórter Patrick Cockburn se esforça, em seus nove capítulos, em
apresentar o Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIS), como uma força armada no Oriente
Médio que assustou o mundo em 2014. Ele explica como foi possível ocupar um território de
tamanho equivalente a Jordânia, em meio a uma complexa rede de conexões de atores
internacionais e regionais. Demonstra como foi propiciado as condições ideais para o inesperado
sucesso do ISIS, a subestimação, pelo EUA, do potencial dos Jihadistas até os últimos notáveis
sinais, a falha em impedir que os principais patrocinadores do 11 de Setembro prosseguissem no
apoio as jihads, e por último, faz uma autocrítica a mídia em geral a respeito de informações
erradas, geradas por notícias espetaculosas ou mesmo da falta de compreensão dos conflitos.
Cockburn identifica o ISIS como a Al-Qaeda Iraquiana. Sendo o produto da guerra no
Iraque desde 2003 e da guerra na Síria, desde 2011. Ele enfatiza durante todo o livro que o ISIS é
uma interpretação extremada do Wahabismo, a ideologia oficial do estado saudita, uma versão
fundamentalista do Islã, que enxerga os xiitas e sufistas como não muçulmanos que devem ser
perseguidos assim como cristãos e judeus. E que os maiores responsáveis pela difusão do
Wahabismo no mundo são os países árabes aliados dos governos ocidentais: Arábia Saudita, Catar e
Emirados Árabes. Neste contexto de aversão, estão o ataque ao jornal satírico Charlie Hebdo,
vídeos onde Jihadistas executam soldados e pilotos de avião e a luta de diversas comunidades para
sobreviver (cristãos, alawitas, curdos e até mesmo outros muçulmanos de vertentes distintas).
Ele ressalta a importância da tomada de Mosul - Iraque, em 10 de junho de 2014, e por isso
destaca um capítulo somente para isso, onde demostra o absurdo de uma tropa de 60 mil homens,
incluindo exército iraquiano e policias locais, caírem perante 1.300 combatentes do ISIS. Para ele
até aquele momento a impressa e o EUA não percebiam os fatos anteriores até aquele dia. O autor
cita, dentre outros exemplos, a corrupção e consequente fraqueza do exército iraquiano e lugares
que não havia mais segurança para que repórteres pudessem fazer seus registros, por causa do ISIS.
Outros pontos importantes que Cockburn revela são a oposição ocidental a Assad e a destinação de
centenas de milhões de dólares e dezenas de toneladas de armas a qualquer um disposto a lutar
contra Assad pela Arábia Saudita e que a Turquia e os Emirados Árabes podem não ter sido
suficiente para derrubá-lo, mas com certeza foi usado para desestabilizar o Iraque.
Segundo o autor mesmo diante de diversas evidências, os Estados Unidos mantinham a
tática de manter relações com países que financiavam de forma direta e indireta o terrorismo –
como Qatar e Arábia Saudita. Para ele a “Guerra ao Terror”, iniciada em 11 de setembro, fracassou
porque não entendeu o movimento jihadista como um todo e, além disso, não focou na Arábia
Saudita e Paquistão, os dois países que impulsionaram o jihadismo como um credo e um
movimento. Para ele os americanos não o fizeram porque esses países eram importantes aliados,
que não deveriam ser ofendidos. Ele deixa bem claro seu ponto de vista de que parte do que ocorre
no oriente médio, é fruto de uma política internacional americana errônea, e que pode ter, mais uma
vez criado algo ainda pior, à medida que permitiu ou ajudou a tentativa de derrubar o ditador Bashar
al-Assad, ao fazer “vistas grossas” aos repasses de verbas e armas para grupos considerados
moderado. Tais recursos caíram facilmente nas mãos do ISIS que, com isso, conseguiu tomar boa
parte do território Sírio e Iraquiano.
Ao decorrer da obra o repórter alerta sobre as diversas matérias dos tais “repórteres de
guerra” nos últimos 10 anos: informações completamente erradas, tendência a dramatizar os
eventos em prol da audiência, combinado com uma propaganda política dos governantes de resumir
tudo em uma batalha entre o bem e o mal, suprimindo toda e qualquer forma de nuances que
possam existir nessas situações e em prejuízo da complexidade e natureza da história. Ele ainda
critica que os jornalistas estrangeiros se juntaram à oposição na demonização dos governos de
Assad, na Síria, e Muammar Gaddafi, na Líbia, sem se preocupar em investigar quem eram os
opositores.
Enfim, o livro como um todo é bem feliz nas suas explicações e é muito bom para deixar
claro ao leitor iniciante sobre esse assunto como a história das guerras no oriente médio, a
ideologia, a religião, e interesses internos e externos permitiram a ascensão extraordinária do Estado
Islâmico, deixando claro um complexo jogo de xadrez daquela região, onde os interesses dos mais
diversos se correlacionam e que somente essa leitura não será o suficiente para compreender a
quantidade enorme de variáveis, mas ajudará a compreendê-la um pouco melhor.

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