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Direito Eleitoral.
Sumário
1. Apresentação
2. A desordem normativa eleitoral
3. A confusão das ações diferentes sobre fatos
idênticos
4. Chega de subsidiariedade processualística
5. O diabo mora nos detalhes
6. O fim do infindável rol de crimes
7. O ideal
8. O possível 61
Rev i st a d o Ad v o g a d o
1 Apresentação
as demandas propostas pelos outros legitimados, mativa e judicial – são confundidas e misturadas,
recorrendo quando a decisão dos Juízes ou Cortes sem método nem aviso.
Eleitorais não se mostrar a melhor. Muitos artigos do CE não resistiram à super-
A atuação nas diferentes ações eleitorais propi- veniente Constituição Federal de 1988, que apre-
cia ao órgão do Ministério Público Eleitoral uma sentou, com outro viés ideológico, numerosos dis-
oportunidade privilegiada de reflexão sobre o positivos de Direito Eleitoral. É até possível falar,
Direito Eleitoral. Se funcionar como Procurador em razão disso, de Constituição Eleitoral, que
Regional Eleitoral, órgão do Ministério Público traz inelegibilidades, condições de elegibilidade,
Federal, então serão centenas, se não milhares, regras sobre o sistema proporcional e majoritário,
de chances para a reflexão... Todas as ações que data de mandatos e eleições, regulamentação so-
tramitam no Tribunal Regional Eleitoral, originá- bre o número de deputados federais, estaduais e
rias ou em grau de recurso, receberão o parecer vereadores, etc.
do Parquet. A Lei nº 9.504/1997 procedeu à grande al-
O autor desse pequeno estudo teve a oportu- teração na normativa eleitoral, revogando tacita-
nidade de exercer, ao longo de quatro anos, as mente parte do CE. As recentes minirreformas
funções de Procurador Regional Eleitoral em eleitorais de 2006 (Lei nº 11.300) e 2009 (Lei
São Paulo, como substituto (2006/2008) e titular nº 12.034) mostram que, a despeito de suas virtudes,
(2008/2010). Ao término de seu mandato, em ju- esse diploma não está conseguindo ser o marco de
nho de 2010, soube da nomeação de uma comissão segurança jurídica que se podia esperar.
A Lei Complementar nº 64/1990, recentemente definições e o modo de aplicação da lei e dos
alterada pela Lei Complementar nº 135/2010, da institutos eleitorais.
“Ficha Limpa”, atendendo ao § 9º do art. 14 da A matéria restante viria em lei ordinária, em
Constituição, prestou relevantes serviços ao país, homenagem à reserva constitucional da lei comple-
mas sua redação confusa e a falta de exata deli- mentar, nos moldes da atual Lei nº 9.504/1997.
mitação de alguns de seus institutos colaboraram
para que a Justiça Eleitoral recebesse um sem-nú- 3 A confusão das ações diferentes
mero de processos, bem como para um grande sobre fatos idênticos
ativismo jurisprudencial do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE). A profusão de dispositivos normativos eleito-
Rev i st a d o Ad v o g a d o
tores, mostra que há uma urgente necessidade de de mandato eletivo.
consolidação do Direito Eleitoral. Não se está, evidentemente, sugerindo que
Então aqui vai o primeiro palpite: essa conso- graves ilicitudes eleitorais restem toleradas. O pro-
lidação poderia receber a forma de um novo CE, blema é a superposição de ações que podem ter
aprovado como lei complementar, orientado para idênticas hipóteses de proposição, ou cuja matéria
a unificação dos dispersos estatutos eleitorais. A contém ou se contém noutra, e estão, comumen-
Constituição, no art. 121, ao dizer que lei com- te, lastreadas no mesmo acervo probatório. Se há
plementar disporá sobre a organização e compe- ilicitudes eleitorais que justificam a imposição das
tência dos Tribunais, Juntas e Juízes Eleitorais, graves sanções de impugnação do registro, negati-
oferece considerável espaço para essas disposições va de registro ou cassação do mandato, mais con-
codificadas. O novo diploma poderia também veniente seria agrupá-las numas poucas ações, em
contemplar as inelegibilidades, para as quais há vez de em sete.
idêntica exigência constitucional de lei comple- Poder-se-ia sugerir uma ação de impugnação
mentar, art. 14, § 9º. Esse Código de competên- do registro na qual fossem discutidas todas as con-
cias e inelegibilidades poderia tratar de todas as dições de elegibilidade e inelegibilidade, em face
ações eleitorais e dos respectivos recursos. de atos anteriores ao pedido de registro, incluídas
E, quem sabe, não será considerado imperti- ilicitudes como captação de sufrágio ou condutas
nente sugerir que o futuro CE traga uma parte vedadas. Outra ação, uma aprimorada Investiga-
geral, que estabeleça os princípios básicos, as ção Judicial Eleitoral, traria, como pressupostos,
as ilicitudes que hoje são objeto de representações, acima teriam o papel de definir regras para o pro-
Ação de Investigação Judicial Eleitoral e Ação de cessamento das ações, com ênfase nos prazos e
Impugnação de Mandato Eletivo. Seus pressupostos nos recursos cabíveis. A aplicação subsidiária do
seriam as irregularidades ocorridas entre o pedido Código de Processo Civil traz para o Direito Elei-
de registro e a diplomação. Se o candidato fosse toral um inadequado ambiente privatístico, inun-
diplomado, ela assumiria a nomenclatura de Ação dando de recursos e dúvidas processos que devem
de Impugnação de Mandato Eletivo. Em qualquer ser muito céleres. Nada de recursos adesivos, de
caso, seria proposta no prazo de até 15 dias da recorribilidades de decisões interlocutórias, de
diplomação. Ambas as ações exigiriam um começo cautelares que se concedem para suspender deci-
de prova, admitindo, outrossim, dilação probatória sões que devem ser executadas imediatamente,
S u g e s tõ e s p a ra a re fo rm a d o Dire ito E le itora l.
expedita. Elas teriam prazo para o primeiro julga- sem prazo para pautar o recurso.
mento: uns 15 dias antes das eleições, na primeira O Direito Eleitoral merece o seu processo elei-
ação; uns dez dias antes da posse, na segunda. toral (cível), garantidor da ampla defesa, mas com-
patível com a realidade de que, a cada dois anos,
há eleições no Brasil.
A aplicação subsidiária do Código E, por gentileza, Exmos. Srs. Membros da
de Processo Civil traz para o Comissão de Reforma do Direito Eleitoral: os pra-
Direito Eleitoral um inadequado zos, para tudo, ações e recursos, devem ser fixados
por lei. No terms without law! A jurisprudência
ambiente privatístico. fixadora de prazos, não raro retroativos, é sempre
uma grande surpresa para os jurisdicionados.
64 O julgamento recorrível da ação de impugna- Quanto às regras de processo penal, o Código
ção de registro seria o último dia para substituição do processo comum poderia ser adotado no
Re vis t a d o Ad v o g a d o
Rev i st a d o Ad v o g a d o
da Justiça Eleitoral por sua referência aos pleitos representação do ofendido”, não sendo razoável
eleitorais. O resto deve ser descriminalizado. que o Ministério Público, como hoje, seja o tutor
Não se pode deslembrar de que, em Direito da honra particular de alguém.
Eleitoral, a sanção penal não tem o caráter dissua- Da atual Lei nº 9.504/1997, remanesceriam os
sório que assume noutros lugares, pois o que mais crimes de divulgar pesquisa eleitoral sem registro
temem candidatos e partidos é a decisão que os ou fraudulenta, art. 33, § 4º, com a pena majorada,
impede de se candidatar, invalida o diploma que neste último caso, para atender à gravidade desse
tenham obtido ou lhes casse o mandato. Somente comportamento. Também o art. 72 deve ser pre-
condutas intoleráveis devem, portanto, permanecer servado, ainda que com limites mais adequados
criminalizadas. de pena, pois uma pena mínima de cinco anos
Crimes como a corrupção eleitoral, art. 299 do dificulta sua aplicação.
CE; a inscrição fraudulenta de eleitores, art. 289; Somos pela descriminalização das condutas de
a coação para o voto, arts. 300 e 301; a votação “boca de urna”, art. 39, § 5º, da Lei das Eleições,
mais de uma vez ou em lugar de outrem, art. 309; bem assim como do uso de alto-falantes ou divul-
a violação do sigilo do voto, art. 312; a violação gação de propaganda no dia das eleições: a apreen-
do sigilo da urna, art. 317; a divulgação dolosa de são e perdimento dos materiais, bem como multas
fatos inverídicos, art. 325, deveriam ser mantidos. administrativas, seriam suficientes para assegurar a
A conduta do art. 346, uso da máquina pública ordem e o respeito aos eleitores no dia da eleição.
para fins eleitorais, hoje crime de menor potencial O único crime da Lei Complementar nº 64/1990,
a arguição temerária ou dolosa de inelegibilidade Nessa imaginada shangri-lá eleitoral, que
ou impugnação de registro deve ser descriminali- implicaria, na verdade, uma reforma política,
zada: poderia ser substituída por uma multa agra- ousaríamos propor o financiamento público das
vada pela litigância de má-fé. campanhas, o voto distrital, ainda que misto, com
Até o transporte de eleitores, hoje conduta gra- listas fechadas, a possibilidade de candidaturas
víssima, prevista na Lei nº 6.091/1974, poderia ser independentes para os cargos legislativos, a fideli-
revisto. dade partidária, um quinto constitucional para o
Ministério Público nas Cortes Eleitorais, tempos
7 O ideal iguais de acesso à rádio e TV para os partidos po-
líticos, sem depender do desempenho nas eleições
S u g e s tõ e s p a ra a re fo rm a d o Dire ito E le itora l.