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COMO AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS PODEM

INFLUENCIAR A LEGISLAÇÃO DE SEUS PAÍSES?

Leonardo Henrique Fagundes

Resumo: As Organizações Internacionais vem se destacando no cenário mundial, como órgãos


mediadores e direcionadores do relacionamento firmado entre países. No entanto é
imprescindível, discutir os impactos destas no âmbito interno. Desta forma O Presente estudo
tem como principal objetivo demonstrar como as organizações internacionais podem
influenciar em políticas públicas dos países quando o final baseado nas teorias de transferência
e difusão de políticas públicas, foram analisadas ações da ONU, do Banco Mundial, da UE e
do Mercosul. Encontraram se diversos elementos que comprovam que esses atores podem ser
agências de transferência e difusão de políticas públicas, influenciando de certa forma a
legislação vigente no país.

Palavras-chave: Organizações internacionais. Legislação. Políticas Públicas. Influência.

Abstract: International Organizations have been standing out on the world stage, as mediators
and drivers of the relationship between countries. However, it is essential to discuss their
impacts internally. Thus, the main objective of this study is to demonstrate how international
organizations can influence public policies in countries when the end based on the ories of
transfer and dissemination of public policies, actions of the UN, banco Mundial, the EU and
Mercosur. Several elements were found to prove that these actors can be agencies for the
transfer and dissemination of public policies, influencing in a certain way the legislation in
force in the country.

Keywords: International organizations. Legislation. Public Policy. Influence.

INTRODUÇÃO

Segundo a imprensa internacional, soldados franceses, integrantes das Forças de Paz


homologadas pela Organização das Nações Unidas (ONU), submeteram crianças da República
Centro-Africana a assédio sexual em troca de alimentos. Esta situação tornou-se conhecida
dentro desta organização graças a um relatório oficial sobre o assunto, que não teve grande
repercussão, exceto quando um funcionário da entidade vazou para o Estado francês. Como
parte da resposta, a ONU abriu uma investigação disciplinar contra o burocrata que revelou
parcialmente essas informações, embora também tenha criado um painel independente para
analisar as denúncias.
Num campo menos extremo, organizações internacionais (OI) como o Banco Mundial
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(BM) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) têm sido questionadas sobre o impacto de suas
ações em termos de direitos econômicos e sociais, enquanto a Organização Mundial da Saúde
Organização Mundial da Saúde (OMS) a critica por sua política de promoção de vacinas; Por
sua vez, o movimento social das mulheres tem tornado a ONU mais comprometida com suas
demandas, o Mercado Comum do Sul (Mercosul) amplia seu espectro com a inclusão de novos
países e, por sua vez, a Organização Mundial do Comércio (OMC) vive uma crise como
resultado da geração de acordos bilaterais de livre comércio e investimento que tiram sua
centralidade.
Em meio aos papéis e abrangência de organizações como as já citadas, o que podemos
visualizar em comum em situações como as anteriores é o papel crescente e estratégico que as
OIs em geral vêm adquirindo no cenário internacional, de tal forma que hoje é fácil verificar
que ultrapassam numericamente os Estados; Além do mais, alguns deles realizam tarefas que
antes eram desempenhadas por aqueles, afetando, portanto, a vida das pessoas e de outros
atores; da mesma forma, indivíduos e grupos sociais buscam internacionalizar sua luta por meio
dessas plataformas, enquanto diversos agentes internacionais formais e informais dependem
cada vez mais da informação e da ação técnica das OIs.
A abordagem das OIs como atores de poder foi levantada de várias maneiras. Do ponto
de vista do direito internacional, tem-se argumentado que esses sujeitos são, antes de tudo,
entidades derivadas da vontade dos Estados e que, para julgá-los como tais, precisam ser
dotados de personalidade jurídica própria, o que lhes permite ter direitos e obrigações (Ridruejo,
2012). Embora desta forma se presuma que as OIs sejam substancialmente dependentes de seus
criadores, a discussão sobre os chamados poderes implícitos e inerentes tem permitido admitir
que elas possuem margem de atuação própria, partindo do pressuposto de faculdades que os
Estados não foram dados explicitamente e que, portanto, podem ser considerados como atores
de poder por direito próprio e parcialmente independentes dos Estados.
Por outro lado, a partir de uma leitura mais política, afirma-se que algumas OI são
instrumentos dos Estados ou poderes centrais, que os utilizam como mecanismos para mascarar
e transmitir suas agendas particulares no quadro das lutas e diferenças de poder nas esferas
geopolíticas. e geoeconômico (Foot, MacFarlane e Mastanduno, 2003). Argumenta-se então,
por exemplo, que o FMI e o Banco Mundial são meros apoiadores das agendas da Europa
Ocidental e dos Estados Unidos, com a lógica de manutenção de uma ordem econômica
mundial que os favorece e contra o chamado Sul ou periferia . Numa lógica mais estrutural,
autores como Juan Ramón Capella (1997) e Antonio Negri (2005) têm argumentado que certas
OIs fazem parte do Império ou de uma "soberania supraestatal difusa" que agencia e viabiliza
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a globalização do neoliberalismo .
A partir dessas e de outras abordagens, o debate que se coloca é até que ponto as OI são
entidades mais ou menos autônomas dos Estados, ou seja, se são meros instrumentos vazios nas
mãos daqueles e mesmo sob o controle dos mais poderosos. , ou se, pelo contrário, têm margens
de independência que lhes permitem ter vida própria, mas sobretudo ser atores de poder sobre
os Estados e outros atores. Tanto com argumentos jurídicos quanto com a teoria das
organizações e relações internacionais, pode-se argumentar que as OIs possuem um grau
variável de autonomia em relação aos Estados. Com base nisso, deve-se admitir que esses
organismos podem ser considerados atores de poder como tais e que, conseqüentemente,
estabelecem relações com diversos atores.
Diante do exposto, surgiu a seguinte questão que norteou este trabalho: como as
organizações internacionais podem influenciar a legislação de seus países?
A pesquisa teve como objetivo geral analisar de que forma as organizações
internacionais podem influenciar a legislação de seus países. Por se tratar de um tema atual
onde ainda há muito a ser pesquisado e explicado, este estudo ganha uma importância ainda
maior. Esse trabalho também será relevante para a comunidade cientifica porque disponibilizará
mais referenciais bibliográficos para trabalhos futuros acerca de sua temática principal.
Uma pesquisa pode ser compreendida como um processo formal e sistemático de
desenvolvimento do modo científico na qual são descobertas respostas ou são comprovadas
hipóteses para as quais foram formulados questionamentos e apresentados problemas. A
metodologia deste trabalho teve abordagem qualitativa exploratória. Desse modo, esse estudo
buscou relacionar autores que permeiam seus estudos nessa esfera. Além de livros, foram
examinados sites e artigos que fundamentam a clareza da temática.

DESENVOLVIMENTO

Todos os países enfrentam cada vez mais questões que transcendem as fronteiras
nacionais, e as organizações internacionais desempenham um papel importante em ajudar a
resolvê-las. As Organizações internacionais reforçam e complementam as instituições
nacionais ao promover e desenvolver soluções comuns em nível internacional. As Organizações
internacionais assumem diferentes formas: internacionais, regionais, grupos de países com
ideias semelhantes ou instituições que compartilham questões e prioridades comuns. Eles
sustentam a ação coletiva de diferentes maneiras, inclusive por meio do desenvolvimento e
gerenciamento de regras comuns por meio de uma ampla variedade de instrumentos
internacionais (GUIMARÃES, 2012).
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Em comparação com outras abordagens de cooperação em regras, como acordos


bilaterais entre países, as Organizações internacionais oferecem uma oportunidade para
cooperar em uma escala maior. Oferecem plataformas de diálogo contínuo e antecipação de
novos temas; ajudar a estabelecer uma linguagem comum; facilitar a comparabilidade de
abordagens e práticas; desenvolver instrumentos jurídicos e políticos internacionais; e oferecer
mecanismos de resolução em caso de disputas. O trabalho das Organizações internacionais
levou a importantes conquistas globais.
Na economia globalizada de hoje, as questões transfronteiriças estão se tornando cada
vez mais complexas e desafiadoras. Questões políticas multidimensionais e transnacionais
incluem lidar com as mudanças climáticas e outros problemas ambientais, gerenciar ameaças à
saúde, como pandemias e resistência antimicrobiana, combater a evasão e a evasão fiscal,
fortalecer o mercado financeiro e a estabilidade econômica, apoiar o comércio justo e abordar
os impactos de novas tecnologias que apagam distâncias e fronteiras, entre outros.
Tais questões não podem ser abordadas de forma eficaz apenas por meio de ações
domésticas, nem podem ser resolvidas por Organizações internacionais sem o envolvimento de
seus constituintes. Requerem abordagens concertadas, incluindo regras estabelecidas em várias
jurisdições para enquadrar comportamentos do governo, empresas e cidadãos. A consistência
nas regras entre os países também ajuda a reduzir custos e melhorar as condições para
transações internacionais.
Mesmo quando as soluções domésticas são mais apropriadas, uma ação concertada pode
ajudar a reunir informações essenciais e compartilhar práticas. O mundo das Organizações
internacionais é rico e variado, engajado em atividades normativas que diferem em escopo,
alcance e status. As Organizações internacionais compartilham muitas características em suas
práticas de regulamentação, modalidades operacionais, bem como nos desaforganizações
internacionais que enfrentam para permanecer relevantes, eficientes e transparentes.
A variedade em Organizações internacionais é acompanhada pela ampla gama de
instrumentos normativos que eles desenvolvem. Essas regras formam os pilares críticos de um
sistema de governança global eficaz. No entanto, a multiplicidade de instrumentos pode ser
difícil de navegar para os usuárorganizações internacionais, incluindo os formuladores de
políticas e legisladores que podem ter que implementá-los em suas próprias jurisdições. Assim,
é fundamental que essas regras sejam claras, coerentes e de alta qualidade.
Para tanto, a OCDE lançou em 2014 uma parceria voluntária reunindo cerca de 50
secretarias de OIs para promover e discutir as condições para maior qualidade, eficácia e
impacto das regras internacionais, independentemente de seu escopo substantivo. Esse esforço
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coletivo levou a uma coleta sem precedentes de informações sobre as atividades de


regulamentação das Organizações internacionais e ao intercâmbio de práticas e ferramentas
sobre implementação, engajamento de partes interessadas, avaliação e coordenação de
instrumentos internacionais.
O cenário global de regulamentação é dinâmico com múltiplos atores internacionais e
um corpo de instrumentos normativos em rápido crescimento. Ele evoluiu significativamente
ao longo dos anos para acomodar novos atores e formas de Organizações internacionais. Este
dinamismo mostra capacidade e flexibilidade para se adaptar a novos problemas, evoluções
geopolíticas e ao ritmo acelerado de inovação e mudança tecnológica.
Há uma diversidade significativa nos arranjos de governança de Organizações
internacionais e nas modalidades operacionais (OCDE, 2016). Organizações internacionais
variam em tamanho de associação. A associação é consideravelmente maior em Organizações
internacionais abertas e organizações privadas de definição de padrões (que buscam uma ampla
aceitação de seus padrões); e mais limitado para TGNs (que são focados em uma área específica
de interesse). Organizações internacionais também diferem na natureza de seus membros.
Embora com variações, as Organizações internacionais são compostas principalmente por
Estados; TGNs de agências reguladoras ou outras autoridades públicas; e organizações privadas
de normalização de entidades públicas, privadas ou mistas.
Organizações internacionais geralmente distinguem entre membros plenos que
desfrutam de toda a gama de direitos e obrigações e outros participantes com uma posição mais
limitada, por ex. sem direito a voto. Esses participantes podem ser Estados não membros, outras
Organizações internacionais, ONGs, acadêmicos ou, de maneira mais geral, todas as partes
interessadas nas áreas cobertas pelas Organizações internacionais. Podem ser membros
parciais, associados/afiliados ou observadores. Apesar de suas diferenças, Organizações
internacionais compartilham fortes características comuns.
Sua adesão foi estendida a novas zonas geográficas e a uma gama mais ampla de atores.
Atores não governamentais estão cada vez mais envolvidos em atividades de regulamentação.
A maioria das Organizações internacionais estabeleceu procedimentos para permitir que não
membros se comprometam (por adesão ou endosso) com seus instrumentos. A maioria das
estruturas de governança de Organizações internacionais também segue o mesmo modelo
básico. Um órgão supremo plenário decide sobre as principais questões políticas e operacionais.
Um órgão executivo se reúne com frequência para tomar decisões sobre a implementação das
principais políticas e decisões operacionais.
Os órgãos subsidiárorganizações internacionais auxiliam os órgãos superiores e
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executivos em áreas administrativas ou técnicas específicas. Um secretariado é responsável pela


gestão administrativa da organização, nomeadamente apoio a reuniões, ligação de áreas de
trabalho entre órgãos, realização de consultas e outras atividades de construção de consenso.
Frequentemente, o secretariado também realiza funções substantivas, como redigir propostas
para consideração dos membros, fornecer coleta, pesquisa e análise independentes de dados e
monitorar e revisar a implementação dos instrumentos da organização.
Organizações internacionais geralmente buscam o consenso na tomada de decisões para
assuntos substantivos. O consenso permite que as Organizações internacionais adotem uma
proposta na ausência de objeções e sem uma votação formal. Ele fornece às Organizações
internacionais flexibilidade para adotar seus instrumentos com mais facilidade, mas não é isento
de desaforganizações internacionais. A maioria dos votos é geralmente usada quando todos os
esforços razoáveis para chegar a um acordo foram feitos, mas falharam.
As OI são, do ponto de vista do direito internacional, sujeitos deste e geralmente fruto
da criação de Estados por meio de tratados internacionais, dotados de personalidade jurídica
direta ou indiretamente, o que lhes permite cumprir mais ou menos objetivos. específico,
conforme o caso. Dentro da terminologia desta disciplina, as OI são sujeitos derivados, ou seja,
produto de decisões estatais, e neste sentido assume-se de uma forma ou de outra que sua
existência e funcionamento repousam sobre os atores que as originaram (RIDRUEJO, 2012 ).
Com base nisso, construiu-se a teoria dos poderes das OI como poderes dos Estados.
É assim que se argumenta que os poderes das OIs podem ser identificados como
implícitos, inerentes e atribuídos. Estes últimos são aqueles que seus criadores entregaram
expressamente à organização e que, portanto, são relativamente claros e determináveis. Os
implícitos são aqueles necessários para cumprir os propósitos da organização e, como se pode
deduzir, não são totalmente claros, além de serem produto da maneira como a organização e
seus mecanismos interpretam seu mandato. Por outro lado, os inerentes são aqueles que não são
expressamente proibidos ao organismo e que, portanto, pode-se deduzir que os possui. Esta
seria uma clara diferenciação com a própria ideia do estado de direito, segundo a qual os poderes
do Estado são apenas aqueles expressamente conferidos por regulamentos anteriores, ao menos
idealmente (QUEREJAZÚ, 2013).
Poderes não expressos podem ser exemplificados na condicionalidade dos empréstimos
do Banco Mundial ou do FMI, ou na capacidade do Conselho de Segurança da ONU de definir
o conteúdo da noção de intervenção humanitária. No entanto, por não serem proibições
expressas nos estatutos dos referidos órgãos, podem acarretar uma sobreposição entre os
poderes implícitos e inerentes, o que tornaria obscura a diferenciação.
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Em outro aspecto analítico, Jean d'Aspremont (2017) afirma que os Estados delegam
poderes às OIs de pelo menos três formas: primeiro, há a relação de agência, na qual os estados
entregam certas atribuições à organização, mas mantendo certas capacidade de controle e
decisão sobre ela; em segundo lugar, os poderes delegados, que correspondem a eventos em
que os Estados não exercem controle sobre o que a OI faz ou deixa de fazer em decorrência
dessa delegação; finalmente, a transferência de poderes, que não só é difícil de controlar como
também implica a entrega dos poderes do Estado a uma organização que os exerce de forma
exclusiva, isto é, monopolista. Um exemplo deste último pode ser o Banco Central Europeu
(BCE), como parte da União Europeia (UE), e seu poder de emitir o euro.
Duas ideias se destacam da breve revisão acima. Por um lado, em sentido formal, parece
claro que os poderes das OIs vão além das atribuições expressas dadas pelos Estados e incluem
aqueles que são considerados —em geral, internamente e sem maior controle— poderes
inerentes ou implícitos. Em outras palavras, seria preciso admitir —mesmo na discussão
estritamente jurídica— que os poderes das OIs sobre os Estados vão além daqueles oficialmente
conferidos por eles. Por outro lado, para além da leitura jurídica, há um crescente debate
analítico sobre como caracterizar as esferas de poder que essas organizações possuem, o que
passa necessariamente por abordar o que tem sido a análise da real materialidade de tais
atribuições.
Dentro da Ciência Política, o poder tendeu a ser definido a partir dos termos de sua
posse, da lógica de acesso e posse de certos recursos e, finalmente, como um tipo especial de
relação social. Sob a ótica do poder como holding, as OIs têm os poderes delegados pelos
Estados de alguma forma e por isso tendem a ser consideradas como meros representantes, com
base em uma legitimidade de fins e meios. Por outro lado, desde a lógica clássica dos recursos
de poder -conhecimento, capital e coerção-, eles podem ser estimados como variáveis contendo
os dois primeiros, sendo a força inicialmente um campo, antes de tudo.
Essas duas abordagens do poder têm sido questionadas de várias maneiras e de maneira
geral. Em primeiro lugar, sustentar que o poder é algo que se detém, pelo acesso a certos
recursos ou delegações, encarna o poder, de certa forma o materializa, algo que não é totalmente
verificável empiricamente, e também veicula que se alguns têm o poder como algo corpórea,
outras não a possuem ou a possuem em menor proporção ou quantidade, o que também não é
verificável; além disso, há aqui uma visão unilateral e superficial do poder na medida em que é
visto por quem o exerce e não por quem diz ou não obedece.
Tal unilateralismo, aliás, transmite a ideia muito limitada de que a obediência só se
obtém com poder ou recursos de poder, quando é fácil constatar que o acesso a determinados
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recursos ou competências nem sempre conduz a ser obedecido, mas também — e ainda mais
claro — desconhece que nem sempre é obedecido, pois há resistência e questionamento de
quem supostamente detém o poder. Segundo essas abordagens, o poder deve implicar na
conquista da obediência nas relações sociais para existir e, como acabamos de afirmar, não por
ter um suposto poder se obedece, mas, ao contrário, se resiste (BURGOS, 2018).
Outro verbete aplicável afirma que as OIs se encontram em uma posição estratégica
frente a outros atores no quadro de relações em transformação, onde diversos recursos são
utilizados:”O poder não é uma instituição, não é uma estrutura ou uma força que alguns teriam
ao seu dispor. disposição. : é o nome dado a uma situação estratégica complexa numa dada
sociedade” (MONTBRUN, 2020, p. 1).
Em outras palavras, o poder é antes de tudo um tipo especial de relação social que,
embora tenha sido definido em termos negativos, isto é, afirmando que é algo que não pode ser
retido, implica levar em conta vários elementos analíticos: primeiro, se O poder é algo
relacional, tem a ver com interações sociais entre seres humanos ou sujeitos por eles criados —
Estados, empresas e OI—, aspecto em que determinado imperativo, mecanismo ou mensagem
pode ser obedecido ou não. Uma vez que estamos na presença de relações, estas podem ocorrer
no sentido de obedecer ou desobedecer de forma fluida e mutável, de acordo com diferentes
esferas de poder (BURGOS, 2018).
Isto implica, em segundo lugar, admitir que nos encontramos perante múltiplas relações
de poder à escala social, sejam elas a família, a empresa e as organizações, dentro e fora do
Estado. O poder encontra-se então disperso nas relações sociais, pelo que existe um variado
tipo de atores de poder, de tal forma que não é fácil afirmar a sua centralização em algum local,
como costuma acontecer com o Estado (BURGOS, 2018).
Em terceiro lugar, parafraseando Max Weber, todas as qualidades imagináveis de um
homem e toda sorte de constelações possíveis podem colocar alguém na posição de impor sua
vontade em determinada situação. Assim, sexo, altura, uniformes, beleza e capacidade retórica,
entre outros, são recursos que em determinado momento nos permitem exercer poder sobre os
outros, de forma que, adicionalmente, estes são históricos, ou seja, mutáveis no tempo
(BURGOS, 2018).
Em quarto lugar, vale reiterar que certos recursos são considerados mais adequados para
o exercício do poder por serem escassos e valiosos para um grupo, como conhecimento,
informação, dinheiro ou força. Finalmente, as relações de poder tendem a ser assimétricas, uma
vez que, pelo menos temporariamente, nos encontramos na situação de decisões que podem ser
imperativas ou manipuladoras para obter obediência. Aqui parece claro que deve ser destacada
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a relação entre poder como o acesso a determinados recursos e seu exercício. Com efeito, não
são os próprios recursos que geram a obediência, mas o seu uso, que é dinâmico e mutável.
Reconhecer que o poder não é algo que se detém, mas que se exerce, permite levar em
conta que dentro de certos atores do poder existem lutas em torno dele. Com efeito, desde o
liberalismo clássico propõe-se que para evitar abusos do poder do Estado, por exemplo, este
deve ser dividido no seu exercício através do clássico sistema tripartido executivo, legislativo
e judicial, o que implica pesos e contrapesos entre eles, ou seja, tensões e conflitos potenciais e
reais devido aos controles mútuos existentes. No entanto, além dessa clássica divisão que
acarreta tensões no interior do poder estatal, existe outra classe de tensões e disputas de poder,
que ocorrem entre órgãos de controle com relação a outras esferas estatais, entre entidades
descentralizadas e órgãos centrais, e entre organizações que foram apropriados por setores de
partidos políticos, universidades, representantes regionais, corporações burocráticas sindicais
ou não, bem como atores ilegais que cooptaram o Estado. Devido à existência de vários atores
de poder, o Estado aparece em si mesmo como um campo de luta e não como um ator
homogêneo (BURGOS, 2018).
Aplicado ao caso de algumas OIs —como o Banco Mundial—, historicamente houve
debates internos entre a noção de desenvolvimento iniciada por engenheiros e agrônomos, e
aquela proposta posteriormente por economistas. Mais recentemente, há disputas entre estes
últimos e advogados sobre, por exemplo, a legitimidade e o alcance de se engajar em uma
agenda de direitos humanos como um conjunto de obrigações legais e não como resultado do
processo de desenvolvimento, questão que será abordada no terceira parte deste texto
(SARFATY, 2012; ELLIOTT, 2015).

CONCLUSÃO

O crescimento das OIs após a Segunda Guerra Mundial tem sido inquestionável, a ponto
de ultrapassarem numericamente os Estados existentes hoje. Além disso, eles se encarregam de
um número crescente de tarefas que em alguns casos nascem com eles, mas em outros
constituem delegações recebidas dos Estados que os criam e, em certa medida, os mantêm
financeiramente e os administram.
O aumento dessas redes interestaduais tem sido associado a diferentes explicações,
desde aquelas que sustentam que sua criação obedece a interesses particulares de curto e longo
prazo dos Estados, especialmente dos mais fortes, entre aqueles que afirmam que elas
incorporam bens públicos de carácter internacional que ultrapassam os interesses imediatos
daqueles, mesmo daqueles que vêem nas OI infraestruturas institucionais com jogo e autonomia
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próprios.
Neste texto, adotou-se a tese de que as OI possuem um grau variável de autonomia em
relação aos Estados que as criam, o que depende do alcance de sua personalidade jurídica, do
ethos burocrático que constroem e do tipo de informação e conhecimento que geram . Pelo
exposto, pode-se afirmar que são organizações de poder, ou seja, com capacidade de atingir
algum grau de obediência com relação aos Estados e demais atores do poder social.
Depois de localizar as OIs como atores de poder, este artigo de reflexão questionou
quais são os recursos de poder que algumas delas utilizam para buscar ou conseguir algum nível
de obediência dos Estados. Esta preocupação assentou no paradigma teórico de que o poder se
refere a uma posição estratégica no campo das relações entre os atores e que depende da forma
como são utilizados determinados recursos em torno da obediência coletiva; portanto, alinhou-
se sob uma abordagem sociopolítica do poder.
Em resposta, argumentou-se que, dependendo do caso, determinadas OI possuem
recursos de poder normativo, atrelados a constructos jurídicos que compõem um misto entre
hard e soft law; informativo, relacionado à geração e uso de certos tipos de informação e
conhecimento que permitem estabelecer uma agenda e criar escalas a partir das quais são
avaliadas as ações do Estado; coercivo, correspondendo ao uso da força e à condicionalidade
econômica; e, finalmente, o simbólico, vinculado à capacidade assumida e concedida a
determinadas OIs de determinar o que é correto, de cumprir o papel de atores neutros e técnicos,
formando uma espécie de marca do que é desejável em determinadas áreas da política pública.
Esses recursos não existem em todas as OIs, por isso um dos desafios que abre essa
proposta analítica é visualizar quando e como eles são produzidos ou não em casos específicos.
Por outro lado, deve-se levar em conta que os referidos recursos podem operar simultaneamente
—e em alguns casos se sobrepondo—, o que não significa ignorar as diferenças em sua
contribuição para o estudo específico de cada um.

REFERÊNCIAS

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