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José Guilherme F.

de Campos

nas organizações
Sustentabilidade
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Jeane Passos de Souza - CRB 8a/6189)

Campos, José Guilherme F. de


Sustentabilidade nas organizações / José Guilherme F. de Campos.
– São Paulo : Editora Senac São Paulo, 2019. (Série Universitária)

Bibliografia.
e-ISBN 978-85-396-2361-7 (ePub/2019)
e-ISBN 978-85-396-2362-4 (PDF/2019)

1.Sustentabilidade – Conceito 2. Sustentabilidade organizacional 3.


Sustentabilidade empresarial 4. Gestão de empresas : Desenvolvimento
sustentável 5. Emergências socioambientais 6. Sistema de Gestão
Ambiental (SGA) 7. Análise de Ciclo de Vida (ACV) I.Título. II. Série.

19-927t CDD-658.408
BISAC - BUS072000

Índice para catálogo sistemático


1. Sustentabilidade organizacional 658.408
2. Sustentabilidade empresarial 658.408
3. Gestão de empresas : Desenvolvimento sustentável 658.408
SUSTENTABILIDADE NAS

José Guilherme F. de Campos


ORGANIZAÇÕES
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Sumário
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Capítulo 1 Capítulo 4
O mundo das organizações e a Conceito de sustentabilidade nas
sustentabilidade, 9 empresas, 71
1 Os três setores organizacionais da 1 Triple bottom line, 72
sociedade, 10 2 Sustentabilidade empresarial, 76
2 As emergências socioambientais, 13 3 Sustentabilidade global versus
3 O papel de cada setor frente às empresarial, 79
emergências socioambientais, 19 Considerações finais, 90
Considerações finais, 26 Referências, 91
Referências, 27
Capítulo 5
Capítulo 2 Novas ferramentas e modelos:
Conceito de sustentabilidade – atuação responsável, 93
evolução nas políticas, 29
1 Contexto de surgimento (programas
1 Do ecodesenvolvimento à de atuação responsável, ou
sustentabilidade, 30 Responsible Care), 94
2 Conceitos e dimensões da 2 Conceitos e práticas, 97
sustentabilidade, 38 3 Sustentabilidade e sistemas de saúde
3 O que é e o que não é e segurança no trabalho (SST), 100
sustentabilidade, 42 Considerações finais, 108
Considerações finais, 46 Referências, 109
Referências, 47
Capítulo 6
Capítulo 3 Novas ferramentas e modelos:
Conceito de sustentabilidade: ecoeficiência – Parte 1, 111
evolução nas organizações, 49
1 Contexto de surgimento, 112
1 Da postura reativa à postura 2 Recursos naturais e organizações, 116
estratégica, 50
3 Programas de eficiência no uso de
2 A inserção da sustentabilidade na recursos naturais, 120
óptica empresarial, 58
Considerações finais, 123
3 Novos modelos em direção à
sustentabilidade, 63 Referências, 124
Considerações finais, 66
Referências, 67
Capítulo 7 Capítulo 10

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Novas ferramentas e modelos: Novas ferramentas e modelos:
ecoeficiência – Parte 2, 127 análise de ciclo de vida, 175
1 Limites planetários e resíduos, 129 1 Contexto de surgimento e
2 Programas de eficiência no uso conceitos, 176
ou descarte de resíduos: reúso, 2 Etapas da ACV: definição do escopo,
reciclagem, etc., 135 análise de inventário, avaliação de
Considerações finais, 140 impacto e interpretação, 184
Referências, 140 3 Softwares e programas de ACV, 190
Considerações finais, 190
Capítulo 8 Referências, 191
Novas ferramentas e modelos:
sistemas de gestão ambiental, 143 Capítulo 11
Novas ferramentas e modelos:
1 Visão histórica dos sistemas ecodesign, 193
de certificação (da qualidade à
ambiental), 144 1 Contexto de surgimento e
2 Sistema de gestão ambiental conceitos, 194
(SGA), 148 2 Materiais e produtos de baixo
3 Sistema de gestão ambiental e a impacto ambiental, 199
ISO 14001 – NBR versões 2004 e 3 Características do ecodesign, 201
2015, 150
Considerações finais, 206
4 A estrutura da ISO 14001, 152
Referências, 206
Considerações finais, 155
Referências, 155 Capítulo 12
Sustentabilidade e
Capítulo 9 responsabilidade
Novas ferramentas e modelos: socioambiental, 209
Produção Mais Limpa (P+L), 159
1 Visão tradicional e moderna
1 Da abordagem reativa (fim de tubo) da responsabilidade social
à abordagem preventiva (P+L), 160 corporativa, 210
2 Conceitos e aplicações (mudanças 2 Níveis de responsabilidade social
no processo, equipamento, layout, (econômica, legal, ética e
etc.), 164 filantrópica), 216
3 Qualificação de pessoas como 3 Ética empresarial e responsabilidade
estratégia de P+L (competências, socioambiental, 220
treinamento), 168
Considerações finais, 223
4 Implementação, acompanhamento,
Referências, 223
revisão e melhoria, 170
5 Programas empresariais de P+L, 171
Considerações finais, 173
Referências, 173
Capítulo 13 Capítulo 15
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Sustentabilidade e gestão de Sustentabilidade e desempenho


stakeholders – visão externa, 225 organizacional, 265
1 Conceito de stakeholders e tipos 1 Relatórios de sustentabilidade e
(internos e externos), 226 sistemas de avaliação
2 Gestão de stakeholders e práticas (GRI/ETHOS), 266
sustentáveis, 230 2 Indicadores socioambientais, 273
3 Relacionamento com consumidores, 3 Sustentabilidade e
fornecedores e outros públicos, 233 competitividade, 274
Considerações finais, 240 4 Normas de avaliação do
Referências, 240 desempenho ambiental, 276
Considerações finais, 278
Capítulo 14 Referências, 278
Sustentabilidade e gestão de
stakeholders – visão interna, 243 Capítulo 16
Tendências em sustentabilidade
1 Sustentabilidade e relacionamento nas organizações, 281
com públicos internos: acionistas,
gerentes, funcionários, gestão de 1 Novos modelos organizacionais, 282
pessoas, 244
2 Conceito de modelos de negócios
2 Sustentabilidade e gestão sustentáveis, 289
financeira, 254
3 Outros conceitos emergentes, 292
3 Lideranças sustentáveis, 257
Considerações finais, 299
Considerações finais, 259
Referências, 300
Referências, 260
Sobre o autor, 305
Capítulo 1
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O mundo das
organizações e a
sustentabilidade

Esta obra tem como objetivo apresentar um panorama do conceito


de sustentabilidade e sua inserção nas políticas e nas práticas organiza-
cionais, fazendo relações com ferramentas da gestão socioambiental,
como ecoeficiência, produção mais limpa (P + L), análise do ciclo de
vida (ACV), entre outros, e também entendendo como pode se dar o
envolvimento de diferentes stakeholders nesse processo.

Neste capítulo, faremos uma contextualização geral necessária an-


tes de entrarmos no universo da temática da sustentabilidade. Assim,
abordaremos as principais emergências socioambientais enfrentadas
no mundo, expressas pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
(ODS) da ONU. Além disso, veremos a maneira como a sociedade se

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articula para responder a esses desafios representada pelo modelo dos

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três setores, primeiro (Estado), segundo (empresas) e terceiro (socie-
dade civil organizada) setores. Por fim, veremos o papel que cada um
desses setores geralmente desempenha, no sentido de contribuir para
a busca de um desenvolvimento sustentável.

1 Os três setores organizacionais da


sociedade
As organizações podem ser classificadas em três setores diferentes
segundo a origem dos recursos e sua finalidade. Primeiro, existe o Estado,
também conhecido como primeiro setor, que usa recursos públicos para
finalidades públicas. Os recursos públicos originam-se principalmente
dos impostos pagos pelos cidadãos e por outras organizações e são in-
vestidos em educação, saúde, meio ambiente, segurança, entre outras
finalidades de interesse da sociedade. Compõem o primeiro setor todos
os entes públicos que executam atividades de interesse público, incluindo
órgãos do Poder Legislativo, Executivo, Judiciário e do Ministério Público
das três esferas – municipal, estadual e federal.

Em segundo, existe o mercado, ou iniciativa privada, composto pelas


empresas e conhecido como segundo setor, que usa recursos privados
para finalidades privadas. São todas as organizações privadas que exis-
tem para gerar lucro aos proprietários ou aos acionistas. Os recursos
das empresas originam-se de pessoas ou outras empresas que dese-
jam investir e obter retorno do capital investido. Elas podem ser des-
de microempresas, compostas somente pelo dono e de atuação local,
como uma costureira que presta serviços de costura em seu bairro, até
grandes organizações multinacionais, como a Coca-Cola ou a Natura.

Por fim, temos a sociedade civil organizada, composta pelas cha-


madas organizações sem fins lucrativos (OSFLs) ou organizações não
governamentais (ONGs), que compõem o chamado terceiro setor e que

10 Sustentabilidade nas organizações


usam recursos privados para finalidades públicas. Os recursos privados
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originam-se de doações de pessoas ou empresas ou, ainda, de receitas


dos próprios serviços prestados. Quanto à finalidade, essas organiza-
ções destinam-se a desenvolver atividades que originalmente são atri-
buídas ao Estado, como educação e saúde pública.

IMPORTANTE

Devemos ressaltar que o fato de uma organização ser do terceiro setor


não significa que ela não possa ter excedentes financeiros ou lucros e,
sim, que ela não foi criada com essa finalidade, sendo que esses ex-
cedentes necessariamente são reinvestidos na própria organização ou
nas ações ou causas que ela apoia. Exemplos de organizações do ter-
ceiro setor incluem a internacionalmente conhecida Greenpeace ou a
brasileira GRAAC.

A figura 1 esquematiza os recursos e as finalidades que caracteri-


zam cada setor.

Figura 1 – Recursos e finalidades de cada setor

Finalidade pública

3o setor
(sociedade civil 1o setor
organizada) (Estado)

Recursos Negócios sociais Recursos


privados (setor 2,5)*
PPPs* públicos

2o setor
(empresas)

Finalidade privada
* Exemplos de modelos “híbridos”.

O mundo das organizações e a sustentabilidade 11


Os três setores da sociedade, cada qual composto por organizações

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de diferentes naturezas e finalidades, geram impacto na sociedade e
na natureza. Aliás, se pararmos para pensar, toda atividade humana ou
mesmo o ato de consumir produtos ou serviços gera algum impacto so-
cioambiental, seja ele positivo ou negativo. O fato de que praticamente
qualquer produto ou serviço que consumimos seja feito por um conjun-
to de pessoas que se agrupam para uma finalidade específica, esperan-
do obter determinado resultado – o que caracteriza uma “organização”
–, é o que torna esse ente tão importante no estudo da sustentabilidade.

Discutiremos, a seguir, alguns dos principais impactos socioambien-


tais gerados pela atividade humana e, por consequência, relacionados à
atividade organizacional.

PARA SABER MAIS

Nos últimos anos, vêm surgindo organizações que não se enquadram


perfeitamente em nenhum dos três setores, de um caráter híbrido. Po-
demos citar o caso das parcerias público-privadas (PPPs), em que há
a formação de uma organização híbrida entre o primeiro (Estado) e o
segundo (iniciativa privada) setores. Outro caso é o das organizações
que compõem o chamado setor 2,5 (dois e meio), organizações que fun-
cionam como empresas (comercializam produtos e/ou serviços), con-
tudo, utilizam todo o lucro ou parte dele em finalidades públicas. São,
portanto, organizações híbridas entre o segundo (iniciativa privada) e o
terceiro (ONGs) setor.
Saiba mais sobre PPPs no site do Ministério do Planejamento do Gover-
no Federal (BRASIL, 2018b).
O documentário Um novo capitalismo, lançado em 2017, aborda e
discute em detalhes o setor 2,5 e apresenta exemplos de empresas
(UM NOVO..., 2017).

12 Sustentabilidade nas organizações


2 As emergências socioambientais
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O Brasil e o mundo, a despeito de todos os esforços sendo feitos e


do desenvolvimento econômico alcançado ao longo do tempo, ainda
enfrentam importantes desafios, alguns deles persistentes historica-
mente, uma vez que a humanidade nunca conseguiu resolvê-los; outros
foram enfrentados total ou parcialmente; alguns, ainda, surgiram em de-
corrência justamente do desenvolvimento econômico.

O primeiro passo para enfrentá-los foi dado: reconhecê-los. Alguns


dos mais importantes atores, entre governos, empresas e sociedade ci-
vil organizada, têm se engajado em um processo de identificação e reco-
nhecimento público dos principais desafios socioambientais. No caso
das empresas, podemos identificar facilmente sua visão acerca dos de-
safios que observam como prioritários ao entrarmos nos websites ou ao
lermos seus relatórios anuais. No site da Petrobras (BIODIVERSIDADE,
2018), por exemplo, podemos observar que, por causa do impacto de
suas operações e de sua atuação sobre recursos hídricos (uso da água
nas atividades operacionais e lançamento de efluentes na água), as mu-
danças climáticas (impacto dos seus produtos no sentido de emissão
de gases de efeito estufa) e a proteção da biodiversidade (operação em
áreas protegidas e sensíveis) são destacadas como alguns dos aspec-
tos mais relevantes.

As organizações do terceiro setor, em geral, também elegem temas


específicos e, muitas vezes, de cunho local, desenvolvendo ações rela-
cionadas. Por exemplo, a SOS Mata Atlântica trabalha em prol da pre-
servação e da conservação de um bioma brasileiro específico, a Mata
Atlântica. O Instituto Sou da Paz atua com a promoção de políticas
públicas de segurança pública e a prevenção da violência, tendo como
pilares a democracia, a justiça social e os direitos humanos.

O poder público, por outro lado, coordena ações em diferentes ní-


veis, identificando prioridades e articulando, muitas vezes, uma atuação

O mundo das organizações e a sustentabilidade 13


conjunta com outros atores. Em geral, cada Secretaria, Ministério ou

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Conselho do Poder Executivo, por exemplo, tem uma atuação mais vin-
culada a determinada temática socioambiental. Em alguns casos, há
uma articulação transversal.

Como vimos, embora a visão acerca dos desafios socioambientais


mais relevantes varie de acordo com cada ator considerado, cada qual
com seus próprios interesses relacionados à sua missão e ao seu local
de atuação, tem havido um esforço coletivo multipartes no sentido de
identificar aqueles com maior potencial de impacto e maior urgência.
Historicamente, esse esforço tem sido coordenado pela Organização
das Nações Unidas (ONU).

2.1 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)

Primeiro, a ONU, com base em uma década de discussões em


suas diferentes conferências, estabeleceu, em 2000, os chamados
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM): oito objetivos que
deveriam ser cumpridos até o ano de 2015 por diferentes atores com
base nos principais desafios identificados à época. Posteriormente,
em 2012, durante a Rio+20, ou Conferência das Nações Unidades so-
bre Desenvolvimento Sustentável, iniciou-se uma discussão com a
intenção de atualizar os ODM e desenvolver novos objetivos e metas
para que, findo o prazo dos ODM, esses novos objetivos entrassem
em vigor. Assim, em agosto de 2015, foram aprovados e entraram
em vigor os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)
previstos para serem buscados nos 15 anos subsequentes, até o ano
de 2030 – razão pela qual também é chamada de “Agenda 2030”.
São um total de 17 objetivos, que se desdobram em 169 metas. A
figura 2 mostra todos os 17 ODS.

14 Sustentabilidade nas organizações


Figura 2 – Objetivos do desenvolvimento sustentável
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17 1
16 2

15 3

14 4

13 5

12 6

11 7
10 8
9

1 – Erradicação da pobreza
2 – Fome zero e agricultura sustentável
3 – Saúde e bem-estar
4 – Educação de qualidade
5 – Igualdade de gênero
6 – Água potável e saneamento
7 – Energia acessível e limpa
8 – Trabalho decente e crescimento econômico
9 – Indústria, inovação e infraestrutura
10 – Redução das desigualdades
11 – Cidades e comunidades sustentáveis
12 – Consumo e produção responsáveis
13 – Ação contra a mudança global do clima
14 – Vida na água
15 – Vida terrestre
16 – Paz, justiça e instituições eficazes
17 – Parcerias e meios de implementação

Fonte: adaptado de PNUD (2015b).

O mundo das organizações e a sustentabilidade 15


Por se tratar de um esforço internacional amplamente reconhecido e

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assumido pelos principais atores dos três diferentes setores, podemos
dizer que eles representam os principais desafios atuais relacionados
ao desenvolvimento sustentável.

IMPORTANTE

Os ODS propostos pela ONU são a mais ampla, abrangente e adotada


classificação dos principais desafios socioambientais atuais. No en-
tanto, existem outras organizações multipartes que mantêm uma lista
própria do que enxergam como os principais desafios de acordo com
a sua atuação. É dessa forma, por exemplo, que o Fórum Econômico
Mundial, organização internacional de terceiro setor que reúne represen-
tantes dos principais países e empresas do mundo, elege alguns temas
eminentemente econômicos, como a “crise financeira global” ou “futuro
do trabalho/desemprego” como os principais.

Vamos acompanhar descrições e exemplos de aspectos abor­dados


em cada um dos ODS (ONU, 2015):

•• Erradicação da pobreza (ODS 1): envolve acabar com a pobreza


extrema em todas as suas formas e em todos os lugares. Inclui
esforços para garantir que todos ultrapassem a chamada “linha
da pobreza”, tenham proteção social, tenham acesso a serviços
básicos e que ocorra a redução de vulnerabilidade a eventos ex-
tremos naturais, econômicos e sociais.

•• Fome zero e agricultura sustentável (ODS 2): representa o es-


forço para acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e
promover a agricultura sustentável. Inclui o combate à desnutri-
ção, a melhoria da produtividade agrícola e da renda de pequenos
agricultores e a promoção de sistemas sustentáveis de produção
de alimentos.

16 Sustentabilidade nas organizações


•• Saúde e bem-estar (ODS 3): envolve a garantia da promoção
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de uma vida saudável e bem-estar a todos, em todas as idades.


Inclui a redução da mortalidade infantil, a extinção de epidemias
de Aids, tuberculose e malária, por exemplo, e a promoção do
acesso universal a serviços de saúde por toda a população.

•• Educação de qualidade (ODS 4): representa a garantia de edu-


cação inclusiva e equitativa de qualidade e a promoção de opor-
tunidades de aprendizagem ao longo da vida a todos. Inclui a
erradicação do analfabetismo infantil, a garantia ao acesso a pro-
gramas de desenvolvimento na primeira infância por todos e a
promoção de uma melhor qualificação aos professores.

•• Igualdade de gênero (ODS 5): caracteriza a busca pela igualdade


de gênero e o empoderamento de mulheres e meninas. Inclui o
combate à discriminação e às formas de violência como tráfico e
exploração sexual e a garantia de igualdade de direitos e partici-
pação nas esferas política, econômica e social.

•• Água potável e saneamento (ODS 6): determina a garantia da


disponibilização e da gestão sustentável de água e saneamento
a todos, mesmo com a já presente ou iminente escassez de água
em diferentes regiões. Inclui a redução da poluição e o lançamen-
to de efluentes na água e o reaproveitamento e a reciclagem da
água.

•• Energia acessível e limpa (ODS 7): especifica a garantia do aces-


so confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia
por todos. Inclui o aumento da participação de energias renová-
veis no total de energia produzida e a promoção do desenvolvi-
mento de pesquisas e tecnologias relacionadas à energia limpa.

•• Trabalho decente e crescimento econômico (ODS 8): envolve


a promoção de crescimento econômico, inclusivo e sustentá-
vel e emprego pleno, produtivo e decente a todos. Inclui obter

O mundo das organizações e a sustentabilidade 17


crescimento econômico per capita razoável nos países de menor

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desenvolvimento e promover políticas que apoiem a geração de
emprego e a inovação.

•• Indústria, inovação e infraestrutura (ODS 9): descreve a neces-


sidade de construir infraestruturas resilientes, promover a indus-
trialização sustentável e o fomento à inovação. Inclui o apoio às
pequenas empresas e a modernização da infraestrutura das in-
dústrias para que elas se tornem mais sustentáveis.

•• Redução das desigualdades (ODS 10): articula a promoção da


redução da desigualdade entre os países e dentro deles. Inclui o
aumento da renda da população mais pobre e a promoção de leis
e políticas que visem aumentar a igualdade de oportunidades.

•• Cidades e comunidades sustentáveis (ODS 11): visa tornar as


cidades e as habitações humanas mais inclusivas, seguras e sus-
tentáveis. Inclui assegurar o direito à habitação segura, a um pre-
ço acessível, o acesso a serviços básicos como saneamento e
iluminação e a minimização do impacto ambiental relacionado a
aspectos como qualidade do ar e resíduos.

•• Consumo e produção sustentáveis (ODS 12): tem como diretriz


assegurar padrões de produção e consumo sustentáveis. Inclui o
alcance da gestão sustentável, o uso eficiente dos recursos natu-
rais, a redução do desperdício e da perda de alimentos e a condu-
ção do manejo sustentável de produtos químicos e resíduos ao
longo de seu ciclo de vida.

•• Ação contra a mudança global do clima (ODS 13): caracteriza


a tomada de ações que visem combater mudanças climáticas e
seus impactos. Inclui o reforço da resiliência e da capacidade de
adaptação aos riscos relacionados ao clima e a catástrofes natu-
rais e a criação de políticas e estratégias nacionais específicas.

•• Vida na água (ODS 14): envolve a conservação e o uso sustentá-


vel de oceanos, mares e outros recursos marinhos. Inclui a proteção

18 Sustentabilidade nas organizações


e o uso sustentável dos ecossistemas marinhos e dos recursos
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pesqueiros.

•• Vida terrestre (ODS 15): representa a proteção, a recuperação e


o uso sustentável dos ecossistemas terrestres. Inclui o manejo
sustentável de florestas, o combate à desertificação, à degrada-
ção do solo e à perda da biodiversidade.

•• Paz, justiça e instituições eficazes (ODS 16): determina a pro-


moção de sociedades pacíficas, o acesso à justiça por todos e a
construção de instituições eficazes. Inclui o combate à violência,
à exploração e ao tráfico infantil e à corrupção.

•• Parcerias e meios de implementação (ODS 17): caracteriza o


fortalecimento dos meios de implantação e revitalização de par-
cerias para alcançar os ODS. Inclui o aumento da arrecadação tri-
butária e o investimento dos governos, a melhoria da capacitação
e a implementação de novas formas de medir o desenvolvimento.

PARA SABER MAIS

O site da ONU sobre a Agenda 2030 (PNUD, 2015a) contém uma descri-
ção detalhada de cada um dos 17 ODS, das 169 metas, dos indicadores
para acompanhamento, bem como o histórico de como eles se origina-
ram e como o Brasil está se organizando para cumpri-los.

3 O papel de cada setor frente às


emergências socioambientais
Existem diferentes atividades e papéis a serem desempenhados no
enfrentamento das emergências socioambientais. Podemos resumir os
papéis em regulamentar, fiscalizar, executar, propor e contribuir, promo-
ver direitos e conscientizar. A atuação de cada setor normalmente está

O mundo das organizações e a sustentabilidade 19


associada ao desempenho de determinados papéis, embora, em vários

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deles, haja uma atuação conjunta e, por vezes, articulada de dois ou
mais setores.

A figura 3 resume os papéis e mostra que eles podem ser comparti-


lhados por atores dos diferentes setores, embora sejam desempenhados
de forma diferente. Vamos conhecer cada um deles em mais detalhes.

Figura 3 – Papéis dos setores frente às emergências socioambientais

1o setor
(Estado)
Regulamentar

Fiscalizar

Executar

2o setor 3o setor
Propor e
(empresas) contribuir (sociedade civil)

3.1 Primeiro setor (Estado)

O papel do primeiro setor no enfrentamento das emergências socio-


ambientais consiste em três ações principais: regular (criar leis), fiscalizar
(aplicar as leis) e executar ações.

Em relação à regulação, cabe ao governo criar leis que visem proteger


os capitais e os recursos socioambientais de determinado país ou região.
É importante ter claro que a finalidade maior do governo é manter o bem-
-estar geral da população, de modo que ele deve tomar medidas visando
assegurar que recursos importantes sejam preservados e possam ser

20 Sustentabilidade nas organizações


usufruídos de maneira sustentável por gerações futuras, que pessoas ou
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ecossistemas e regiões em situação de risco ou vulnerabilidade social


ou ambiental tenham suporte necessário para alcançar uma situação de
estabilidade a fim de deixar tal situação no futuro.

NA PRÁTICA

Por outro lado, o governo geralmente tenta antever como determinada lei
afetará outros atores da sociedade, que, algumas vezes, podem ter inte-
resses diferentes e até mesmo contrários. Por isso se fala em buscar o
“bem-estar geral”. As discussões sobre o Código Florestal (BRASIL, 2012)
são um exemplo de como o Estado está envolvido nessa busca.
O Código Florestal, também conhecido como Lei de Proteção da Vege-
tação Nativa, foi aprovado em 2012 pelo Governo Federal e, entre outras
coisas, determina que as propriedades privadas devem manter áreas de
preservação permanentes e que deve haver respeito a terras indígenas,
que podem ser exploradas apenas pelos próprios índios. No entanto, na
elaboração da lei, houve a influência de empresas e proprietários rurais,
estes diretamente afetados pelas consequências da lei. Por outro lado,
houve também ONGs, especialistas e a sociedade civil de modo geral
pressionando por uma regulação mais restritiva na exploração das áreas
de preservação. O Governo Federal e o Congresso, então, procuraram
mediar o interesse de ambos os grupos, de forma a se tentar chegar em
um equilíbrio que gerasse um “bem-estar geral”.

No que diz respeito à fiscalização, cabe principalmente ao Estado


verificar se as leis estão sendo cumpridas e, caso não estejam, apli-
car sanções e multas às organizações e aos indivíduos transgresso-
res. Destacamos, principalmente, a atuação do Poder Judiciário, do
Ministério Público e de algumas autarquias (órgãos do Poder Executivo)
que têm o chamado “poder de polícia”.1 Nesse sentido, podemos citar

1 O conceito de poder de polícia está explicitado no artigo 78 da Lei no 5.172, de 25 outubro de 1966 (Código
Tributário Nacional): “Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando
ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de
interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do

O mundo das organizações e a sustentabilidade 21


a atuação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos

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Naturais Renováveis (Ibama) e de órgãos especializados do Ministério
Público que fiscalizam ações relacionadas ao meio ambiente ou às con-
dições de trabalho.

Em termos de atividades de execução, podemos pensar em progra-


mas, projetos e políticas públicas que os governos desenvolvem. Eles
são a forma pelo qual o governo assume a responsabilidade por exe-
cutar ações que visem diretamente contribuir com as emergências so-
cioambientais mais relevantes. Podemos citar o Programa Bolsa Verde
do Ministério do Meio Ambiente (MMA), por meio do qual o governo dá
uma bolsa a famílias em situação de extrema pobreza que moram em
áreas relevantes de conservação ambiental, de modo a incentivá-las a
ajudar na preservação do meio ambiente ao utilizar os recursos da re-
gião de forma sustentável.

3.2 Segundo setor (empresas)

As empresas também têm sido convocadas a dar suas contribui-


ções ao enfrentamento das emergências socioambientais, consideran-
do seu grande poder econômico e consequente potencial de impacto,
seja ele positivo ou negativo. Para se ter uma ideia, muitos grupos em-
presariais têm receitas superiores à da maioria dos países. Em um le-
vantamento elaborado com base em dados da Agência Americana de
Inteligência (CIA, do inglês Central Intelligence Agency) e da eminente
revista Fortune, a ONG inglesa Global Justice Now (GREEN, 2016) iden-
tificou que, das 100 maiores economias do mundo, 69 representam gru-
pos econômicos e apenas 31 representam países, demonstrando o po-
derio econômico crescente das empresas. A Petrobras, única empresa

mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público,


à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos” (BRASIL, 1966).

22 Sustentabilidade nas organizações


brasileira da lista, ocupa a 87o posição no ranking, ficando à frente de
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países como Portugal (97o posição) em termos de receita.

As empresas, dessa forma, têm o potencial de desempenhar um


grande papel no sentido de executar ações visando ao enfrentamen-
to das emergências socioambientais, sejam elas decorrentes da sua
própria atuação ou não. A execução dessas atividades pelas empresas
pode ter duas motivações: primeiro, uma motivação classificada como
“reativa” ou “visando ao cumprimento da lei”, que é de cumprir a legis-
lação imposta pelo primeiro setor ou por pressões por melhores práti-
cas feitas pelo terceiro setor. É o caso, por exemplo, de uma empresa
da indústria de agronegócio que mantém uma área de preservação em
sua propriedade para atender à legislação aplicável do Código Florestal
ou o caso de uma grande rede de supermercados que sofre pressão
de ONGs para deixar de comprar carne oriunda de regiões onde ocorre
desmatamento para a criação de gado; segundo, por própria iniciativa
voluntária das empresas, que decidem ir além do que é exigido por lei e
contribuir de uma maneira mais abrangente.

Sobre as iniciativas voluntárias das empresas no sentido de execu-


tar ações visando ao enfrentamento das emergências socioambien-
tais, sempre que possível, é desejável que as empresas procurem ali-
nhar as ações para gerar, além de impacto social e ambiental, também
resultados financeiros. É o que propõe o conceito do triple bottom line,
ou “tripé de sustentabilidade”. Um exemplo de ação que as empresas
realizam adotando o conceito do triple bottom line é a ecoeficiência,
por meio da qual as empresas, além de gerarem menos resíduos ou
consumirem menos recursos naturais ou energia, reduzem os custos
das suas operações (em fábricas) ou da manutenção de suas instala-
ções (em escritórios).

Por fim, as empresas também podem propor e contribuir para a


discussão de novas leis e políticas públicas de interesse público e

O mundo das organizações e a sustentabilidade 23


que também afetem seus interesses. É muito comum representantes

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de empresas ou grupos de empresas integrarem ou participarem de
comissões temáticas no Congresso Nacional, por exemplo. Em uma
dessas comissões, a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável da Câmara Federal, ao tratar do “Debate sobre a situa-
ção dos resíduos gerados pelas construções e demolições” (BRASIL,
2018a), em maio de 2018, convidou representantes de entidades de em-
presas de construção civil (Sinduscon-RS) e de reciclagem de resíduos
da construção civil (Abrecon) como expositores.

NA PRÁTICA

Em relação à atuação de representantes de empresas no debate e


influência na criação de leis e políticas públicas, é muito comum falarmos
em “lobby empresarial”. Em realidade, diversas entidades, como movi-
mentos sociais, ONGs e representantes de instituições públicas também
participam do debate e da proposição de novas leis e políticas e tentam
influenciá-las. No Brasil, no entanto, a atividade de lobby, sobretudo o lo-
bby empresarial, na maioria das vezes, é vista de maneira pejorativa, dado
os escândalos associados aos chamados “lobistas”. Muitas vezes, os lo-
bistas tentam influenciar de maneira escusa a elaboração e a aprovação
de leis e outros atos do governo em favor exclusivamente do interesse de
determinadas empresas e em detrimento do interesse público. Nos EUA,
por exemplo, a prática do lobby é autorizada, profissionalizada e regula-
mentada por normas específicas, visando evitar abusos.

3.3 Terceiro setor

O envolvimento do terceiro setor no enfrentamento das emergências


socioambientais é caracterizado pelo desempenho de três papéis: fisca-
lizar o cumprimento de leis e a garantia da observância de direitos funda-
mentais, propor/contribuir com novas leis e executar algumas atividades.

24 Sustentabilidade nas organizações


Em relação à fiscalização, o terceiro setor atua verificando se a le-
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gislação e a promoção de direitos consolidados estão sendo seguidas


por outros atores, notadamente, empresas e o próprio poder público.
Diante do descumprimento dessas legislações ou da não observância
de direitos garantidos, as ONGs se utilizam de duas estratégias: fazem
campanhas públicas na mídia para chamar a atenção da sociedade e
expor o responsável a críticas ou prejuízos à imagem; fazem denúncias
ao Ministério Público ou entram com processos na Justiça. A fiscaliza-
ção, por exemplo, é a principal linha de atuação da ONG Repórter Brasil,
que investiga e denuncia empresas que mantém trabalhadores em regi-
me análogo à escravidão; e da ONG Transparência Brasil, que monitora
a atuação de agentes públicos dos três poderes, como andamento de
licitações e obras de escolas (Poder Executivo) e o desempenho de par-
lamentares (Poder Legislativo) e membros do Supremo Tribunal Federal
(Poder Judiciário).

No que tange à proposição de novas leis e à contribuição com elas,


o terceiro setor se mobiliza frequentemente para participar de fóruns
públicos e debates no Legislativo para fazer com que as demandas, di-
reitos, causas e públicos que representam se façam ouvir e serem con-
siderados. Utilizando o mesmo exemplo do Código Florestal promulga-
do pelo Governo Federal, o terceiro setor se mobilizou ativamente para
contribuir com sua discussão e redação final. Nesse sentido, a posição
de organizações da sociedade civil muitas vezes contrastou com algu-
mas pautas defendidas pela iniciativa privada, sobretudo proprietários
rurais e empresas com atuação no agronegócio. Algumas ONGs, como
o Greenpeace, posicionaram-se veementemente contra o que, na visão
deles, tratava-se de “anistia aos desmatadores ilegais” (GREENPEACE,
2018), uma das medidas que estava sendo discutida no âmbito da Lei.

Em relação às atividades de execução, podemos mencionar a promo-


ção de informações em grupos mais vulneráveis e em toda a sociedade
e ações de preservação e conservação de recursos naturais. Podemos

O mundo das organizações e a sustentabilidade 25


mencionar o caso da Pastoral da Criança, organização presente em to-

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dos os estados brasileiros, que, entre outras coisas, atua oferecendo
orientações e informações a gestantes e mães com filhos com menos
de 6 anos em relação à saúde materna e infantil e à prevenção e o com-
bate à desnutrição e à mortalidade infantil. Em termos de preservação
e conservação de recursos naturais, citamos o Instituto de Pesquisa
Ambiental da Amazônia (Ipam), que tem como um de seus eixos estra-
tégicos de atuação o trabalho com famílias de baixa renda da Amazônia
para a produção familiar sustentável, gerando simultaneamente renda,
segurança alimentar e prevenção ao desmatamento.

NA PRÁTICA

Embora cada setor da sociedade normalmente desempenhe algumas


atividades específicas, perceba que esses papéis não são rígidos. Por
exemplo, o terceiro setor pode, de certa forma, regular as atividades das
empresas quando propõe determinado código de conduta às empresas.
Também se pode mencionar o caso das organizações de terceiro setor
que certificam determinadas práticas das empresas, como a Fundação
Abrinq, que fornece o selo “Abrinq de Empresa Amiga da Criança”, que,
entre outros compromissos, certifica as empresas que não exploram mão
de obra infantil e que não permitem que seus fornecedores o façam.

Considerações finais
Conhecemos neste capítulo o que caracteriza cada um dos três se-
tores organizacionais da sociedade – primeiro (Estado), segundo (em-
presas) e terceiro (organizações da sociedade civil) – em termos de
finalidade (pública × privada) e recursos (públicos × privados). Embora
válida, essa classificação, nos últimos anos, tem sido desafiada, já que
têm surgido organizações de caráter híbrido, ou seja, que não se en-
quadram precisamente em nenhum dos setores. Essas organizações

26 Sustentabilidade nas organizações


têm surgido como forma de conseguir contornar alguns dos problemas
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enfrentados pelos diferentes setores.

Apresentamos, também, algumas das emergências socioambientais


mais significativas, expressas por meio dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável (ODS) desenvolvidos pela ONU e adotados pelo Brasil, cente-
nas de outros países e por organizações dos três setores da sociedade.
Os ODS representam o resultado de um esforço conduzido por diferentes
atores para identificar quais os aspectos mais urgentes e relevantes aos
quais o mundo deve prestar atenção e agir e inclui temas como mudan-
ças climáticas, erradicação da pobreza e redução da desigualdade.

Diante das emergências socioambientais, os três setores têm se arti-


culado para dar cada qual sua contribuição na busca por atingir o alme-
jado desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, mostramos que cada
setor geralmente desenvolve ou compartilha determinados papéis, dos
quais se destacam regular, fiscalizar, propor/contribuir e executar ações,
e como o envolvimento de todos eles é fundamental.

Referências
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www.petrobras.com.br/pt/sociedade-e-meio-ambiente/meio-ambiente/
biodiversidade/>. Acesso em: 1 maio 2018.

BRASIL. Câmara dos deputados. Comissão de Meio Ambiente e Desenvol-


vimento Sustentável. Brasília, 2018a. Disponível em <http://www.camara.leg.
br/internet/ordemdodia/ordemDetalheReuniaoCom.asp?codReuniao=51188>.
Acesso em: 1 maio 2018.

______. Lei 12.651, de 25 de maio de 2012. Diário Oficial da União, Brasília,


maio 2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2012/lei/l12651.htm>. Acesso em: 4 maio 2018.

O mundo das organizações e a sustentabilidade 27


______. Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966. Diário Oficial da União, Brasília,

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
out. 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.
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______. Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MPDG). Par­cerias


público-privadas. Brasília, 2018b. Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/
assuntos/desenvolvimento/parcerias-publico-privadas>. Acesso em: 2 maio 2018.

GREEN, Duncan. The world’s top 100 economies: 31 countries; 69 corporations.


From Poverty to Power, sept. 2016. Disponível em: <https://oxfamblogs.org/
fp2p/the-worlds-top-100-economies-31-countries-69-corporations/>. Acesso
em: 2 maio 2018.

GREENPEACE. STF julga Código Florestal e mantém anistia a desmatado-


res ilegais. São Paulo, mar. 2018. Disponível em: <http://www.greenpeace.org/
brasil/pt/Noticias/STF-julga-Codigo-Florestal-e-mantem-anistia-a-
desmatadores-ilegais/>. Acesso em: 3 maio 2018.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Transformando nosso mundo: a


Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável. Brasília, 2015. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/pos2015/agenda2030/>. Acesso em: 26 abr. 2018.

PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD).


Plataforma Agenda 2030. Brasília, 2015a. Disponível em: <http://www.agenda
2030.com.br/>. Acesso em: 27 de abril de 2018.

______. Acompanhando a agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável:


subsídios iniciais do Sistema das Nações Unidas no Brasil sobre a identificação
de indicadores nacionais referentes aos objetivos de desenvolvimento susten-
tável. Brasília: PNUD, 2015b. Disponível em <http://www.br.undp.org/content/
brazil/pt/home/library/ods/acompanhando-a-agenda-2030.html> . Acesso em
24/05/2018.

UM NOVO Capitalismo. Direção: Henry Grazinoli. São Paulo: Talk Filmes e Dois
e Meio, 2017. DVD (75 minutos).

28 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 2
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Conceito de
sustentabilidade –
evolução nas
políticas

Neste capítulo, traremos um panorama geral sobre o conceito de


sustentabilidade, mostrando sua inserção na agenda pública e na socie-
dade. Além disso, abordaremos suas origens históricas e conceituais,
ou seja, de que maneira ela surgiu como componente importante nas
discussões na busca por um novo tipo de desenvolvimento. Por fim, dis-
cutiremos o conceito e as dimensões da sustentabilidade, bem como
compreenderemos o que é e o que não é sustentabilidade.

29
1 Do ecodesenvolvimento à sustentabilidade

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Ao longo da história, o conceito sobre o que deve ser almejado en-
quanto sociedade evoluiu. Inicialmente, imaginava-se que a sociedade
deveria buscar o progresso como objetivo maior. Posteriormente, o
progresso deu lugar a uma ideia de busca do desenvolvimento, so-
bretudo em termos econômicos e materiais. Tempos mais tarde,
percebeu-se que somente buscar o desenvolvimento econômico era
uma ideia insuficiente. Assim, começaram a surgir questionamentos
sobre em que condições e para quem esse desenvolvimento deveria
ocorrer, abrindo uma perspectiva de um desenvolvimento com dife-
rentes faces, buscando-se um desenvolvimento sustentável. Vamos
compreen­der com mais detalhes essa evolução conceitual à luz de
alguns acontecimentos históricos.

1.1 “Progresso” como antecessor do conceito de


“desenvolvimento”

Historicamente, o conceito de desenvolvimento esteve associado e


se tratava quase como sinônimo de progresso em relação às condições
de vida, sobretudo em relação a questões científicas, tecnológicas e, so-
bretudo, econômico-materiais. Du Pisani (2006) debate a maneira como
o conceito de progresso evoluiu ao longo da história.

A ideia de progresso tem suas raízes no chamado período “clás-


sico” da história (do século XVIII a.C. ao século V d.C.), em que as ci-
vilizações greco-romanas se tornaram dominantes – e, futuramente,
viriam se tornar a base cultural da civilização ocidental. Nos períodos
posteriores, o conceito de progresso foi remodelado para atender di-
ferentes finalidades.

30 Sustentabilidade nas organizações


Durante a Idade Média, acompanhando o desenvolvimento do
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Cristianismo, o conceito de progresso foi retomado, passando a incorpo-


rar alguns elementos de moralidade e espiritualidade. Progresso passou
a representar uma evolução sucessiva de eventos ao longo do tempo.

Com o advento do Iluminismo, nos séculos XVII e XVIII, o progres-


so vinculou-se à ciência e se tornou uma das principais ideologias no
mundo ocidental. Conceitos característicos do período, como cientifi­
cismo, racionalismo e positivismo, contribuíram para isso.

Pouco mais tarde, durante a Revolução Industrial, já no fim do sécu-


lo XVIII, o progresso passou a ser associado com a noção de desenvol-
vimento econômico e material. O período marcou o grande domínio do
homem sobre a natureza, sendo que toda biosfera, composta pelos dife-
rentes ecossistemas, passou a ser extensamente explorada e transfor-
mada com a finalidade de se gerar a maior produção econômica possível.

Com o advento da Revolução Industrial, de fato, a natureza passou a


ser tratada como mero conjunto de “recursos” que entram na engrena-
gem industrial para gerar produtos para consumo e, consequentemen-
te, ganhos econômicos – tanto para o empresário quanto para a nação.
Consequentemente, embora tenha representado significativos ganhos
em termos de desenvolvimento econômico e aumento da oferta de pro-
dutos, a Revolução Industrial gerou significativos impactos ambientais
e sociais. Em relação a aspectos ambientais, não houve paralelo na his-
tória de tamanha degradação ambiental quanto no período. Isso incluiu
grande poluição do ar pela queima de carvão nas fábricas; extração de
minérios, como ferro e carvão; desmatamento; poluição das águas, com
o despejo de esgoto doméstico e resíduos industriais. Em termos so-
ciais, esse período contribuiu para o aumento da desigualdade socio-
econômica, condições de trabalho degradantes como longas jornadas
de trabalho, ambiente insalubre e trabalho infantil, urbanização e cresci-
mento populacional descontrolados.

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 31


PARA SABER MAIS

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No filme de Al Gore Uma verdade inconveniente (2006), o ambientalis-
ta e ex-candidato à presidência dos EUA apresenta dados e gráficos a
respeito da evolução da concentração de gases de efeito estufa na at-
mosfera, demonstrando um exemplo do significativo impacto ambiental
causado por atividades antrópicas (isto é, relativas a atividades huma-
nas), sobretudo após a Revolução Industrial.

1.2 Do conceito de desenvolvimento e as críticas geradas

A partir da Revolução Industrial, o índice de crescimento econômico


e populacional dos países, sobretudo os mais industrializados – conhe-
cidos como “desenvolvidos” – alcançou patamares elevados, gerando
também uma grande pressão sobre os recursos naturais. O desenvol-
vimento era considerado, então, resultado de um contínuo progresso
econômico-material alcançado pelos países. Essa mentalidade perma-
neceu até meados do século XX, logo após o fim da Segunda Guerra
Mundial, período em que o mundo experimentou a retomada de um
grande crescimento, após um certo período de baixa ou de estagnação
decorrente das duas grandes guerras mundiais. Com isso, esse cresci-
mento econômico atingiu o auge nas décadas de 1950 e 1960.

Contudo, diante do tamanho do crescimento econômico, do consu-


mo em massa e do aumento da renda – restrito a poucos, a partir da dé-
cada de 1960, começaram a surgir movimentos mais vigorosos ques-
tionando a possibilidade de se manter tamanhos níveis de crescimento
e uso de recursos naturais por tempo ilimitado. Constatou-se que o cla-
mor por desenvolvimento tampouco ajudava a reduzir as desigualdades
sociais entre o chamado mundo desenvolvido e os demais países do
globo, pondo em xeque o próprio uso do termo desenvolvimento.

Concomitantemente, gerava-se o embrião do movimento ecológico


nos EUA, sobretudo, após a publicação de obras como a Primavera

32 Sustentabilidade nas organizações


silenciosa, em 1962, de Rachel Carson, e Os limites do crescimento,
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em 1972, de Dennis Meadows e outros cientistas do Massachussetts


Institute of Technology (MIT). Em termos de atuação da sociedade
civil, organizações não governamentais como o World Wildlife Fund
(WWF) e o Greenpeace foram criadas, em 1961 e 1971, respectiva-
mente, visando concentrar esforços na defesa do meio ambiente. No
campo cultural, observava-se o florescer do movimento hippie. No
campo político, governos em nível nacional e multilateral se mobili-
zaram para criar instituições voltadas para discutir e proteger o patri-
mônio ambiental, como foi o caso da Agência de Proteção Ambiental
(EPA, do inglês environmental protection agency), criada em 1970 pelo
governo dos EUA, e a primeira grande conferência de países sobre o
meio ambiente, realizada pela ONU em 1972 em Estocolmo, na Suécia.

Entre os economistas, inevitavelmente, começaram a surgir tam-


bém questionamentos. Nesse sentido, destacaram-se dois grupos com
perspectivas opostas (CORAZZA, 2005). O primeiro grupo, apesar de
reconhecer as mazelas do crescimento econômico e populacional in-
discriminados e a degradação ambiental associada, acreditava que a
humanidade conseguiria acomodar esses desafios à medida que sur-
gissem novas tecnologias e que a ciência ofereceria respostas plausí-
veis a eles. Trata-se de uma visão essencialmente otimista e que con-
tinua vigente até hoje. Entre os maiores defensores dessa tese, estão
os chamados economistas da corrente “cornucopiana”,1 como revelam
Rogers, Jalal e Boyde (2008).

Um segundo grupo, com uma visão totalmente oposta à do primei-


ro, afirmava estar havendo um verdadeiro “ecocídio”, no sentido de que
o planeta estava sendo consumido pelo voraz apetite por crescimento.
Evidentemente, tratava-se de uma visão pessimista. Esse grupo, forte-
mente influenciado pelo relatório Os limites do crescimento, acreditava

1 A “cornucópia” é um símbolo da mitologia greco-romana representado por um vaso em forma de chifre


que simboliza riqueza e abundância. A imagem é pertinente para descrever a visão “cornucopiana”, que
remete, de certa forma, a uma despreocupação com a finitude de recursos e da natureza.

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 33


que medidas mais vigorosas deveriam ser tomadas para evitar uma

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catástrofe ambiental e social. Entre essas medidas, mencionavam, por
exemplo, a necessidade de se buscar uma condição de equilíbrio eco-
lógico e econômico, e de forma que cada pessoa possa ter condições
igualitárias de ter atendidas suas necessidades básicas (MEADOWS
et al., 1972).

Com isso, o mundo conseguiria alcançar um equilíbrio global sus-


tentável a longo prazo. Outra proposta central era limitar o crescimento,
também referenciada como a ideia de “crescimento zero”. A origem des-
sa corrente remonta também aos estudos, no fim do século XVIII, do
economista britânico Thomas Malthus, que estudava e alertava sobre
a influência do crescimento populacional sobre a capacidade da huma-
nidade de manter a população alimentada (DU PISANI, 2006). É dessa
forma que proponentes de teorias e teses que advogam pela necessi-
dade de limitar o crescimento da humanidade – seja em termos popula-
cionais, econômicos ou de uso de recursos, são atualmente conhecidos
como “neomalthusianos”. Entre os maiores defensores contempo­
râneos da tese de limitação de crescimento estão os chamados “econo-
mistas ecológicos”, como Georgescu-Roegen e Herman Daly.

PARA SABER MAIS

Du Pisani (2006) revela que, no século XIX, já havia questionamentos


de alguns visionários sobre o modelo praticado de desenvolvimento, na
tentativa de criar um embrião do que futuramente chamaríamos de “de-
senvolvimento sustentável”. É o caso do filólogo e diplomata norte-ame-
ricano George Marsh. Em sua obra O homem e a natureza: ou geografia
física modificada pela ação do homem,2 Marsh (1864) demonstra com
inúmeros exemplos colhidos ao longo de décadas de trabalho, como,
ao longo da história, o homem pôde interferir de maneira significativa na
natureza, gerando uma situação de consumo predatório dos recursos
que pode colocar em risco plantas, animais e a sua própria existência.

2 Man and Nature: or physical geography as modified by human action.

34 Sustentabilidade nas organizações


O autor menciona exemplos que remontam à Roma e à Grécia antiga,
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passando por exemplos contemporâneos à época em que escreveu o li-


vro, da salinização causada pelo excessivo uso da irrigação no Egito, ao
desmatamento de florestas para uso industrial, até a mecanização da
agricultura no interior dos EUA. No prefácio de sua obra, Marsh (1864,
p. 3) escreve que seu objetivo é, entre outras coisas, “apontar os perigos
da imprudência e da necessidade de cuidado em todas as operações
que, em larga escala, interferem no arranjo espontâneo do mundo orgâ-
nico e inorgânico”. Hoje em dia, Marsh é considerado por muitos como o
primeiro ambientalista e “conservacionista” norte-americano.

1.3 Sustentabilidade como um conceito conciliador


Resultado dessa efervescência de posições contrárias, mais e me-
nos otimistas sobre os rumos do planeta, da economia e da sociedade,
emergiu o conceito de sustentabilidade. Sustentabilidade atenderia à
necessidade de estabelecer uma ponte entre desenvolvimento (de co-
notação econômica) e conservação (com conotação ambiental/eco-
lógica), enxergando ambos como interdependentes (DU PISANI, 2006;
ROGERS; JALAL; BOYDE, 2008). Já citado no relatório Os limites do
crescimento, o termo sustentabilidade passou a ser também ampla-
mente adotado na Conferência de Estocolmo (1972).

Pode parecer que economia e ecologia se tratam de campos total-


mente desconexos. Mas, se analisarmos a etimologia de ambas as
palavras, constatamos que elas têm o mesmo prefixo, “eco”, que vem
do grego oikos, significando “casa” (KOUTANTOS, 2011). O desenvolvi-
mento sustentável conseguiu conceitualmente aproximar em definitivo
os dois campos.

Os termos sustentabilidade e desenvolvimento passaram, ao longo


das décadas de 1970 e 1980, a ser relacionados e vistos de maneira
interdependente, começando a surgir as primeiras definições do que se-
ria chamado “desenvolvimento sustentável”. A popularização do termo,

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 35


contudo, ficou cristalizada com base nos trabalhos de uma comissão

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formada pela ONU em 1983, conhecida como Comissão Mundial so-
bre Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidida pela médica e então
Primeira Ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland. Os trabalhos da
Comissão, também conhecida como Comissão Brundtland, foram pu-
blicados em 1987 no relatório Nosso futuro comum, ou simplesmente
Relatório Brundtland. Nesse relatório, foi cunhada a célebre definição de
desenvolvimento sustentável: “O desenvolvimento sustentável é aquele
que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibili-
dade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades”
(CMMAD, 1991, p. 46).

Podemos destacar, na definição proposta pelo Relatório Brundtland


(CMMAD, 1991), alguns pontos importantes. Primeiro, a questão das
“necessidades”. No relatório, são citadas necessidades básicas de ali-
mento, habitação, roupas e emprego, mas também necessidades diver-
sas de cada um que contribuem para uma melhor qualidade de vida.
O relatório trata de enfatizar também que o atendimento das necessi-
dades deve ser buscado sobretudo pelos países menos desenvolvidos,
inclusive por meio do crescimento econômico. Outra questão importan-
te é a questão intertemporal. Quando se fala em gerações presentes e
futuras, impõe-se claramente uma discussão sobre a exigência de que
o crescimento econômico respeite os meios ecológicos do mundo e
não se dê em função da perpetuação das desigualdades e da pobreza.

Percebe-se que, diplomaticamente falando, o conceito de desenvol-


vimento sustentável proposto pelo Relatório Brundtland não é radical
para nenhum dos lados do debate entre “preservação × desenvolvimen-
to”. Assim, não nega a possibilidade e a necessidade de crescimento,
contudo, reconhece a grave situação de limitação dos meios ecológicos
e que esforços devem ser envidados para que eles sejam preservados.
Além disso, o conceito foi relativamente bem-sucedido, em abarcar
também a problemática social da desigualdade e da pobreza e conside-
rar o abismo existente entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos
que muitas vezes ficava alijada da discussão.

36 Sustentabilidade nas organizações


IMPORTANTE
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Um engano conceitual relativamente comum que as pessoas e, em al-


guns casos, até alguns especialistas cometem é confundir desenvolvi-
mento sustentável com desenvolvimento sustentado. Como vimos, o
desenvolvimento sustentável envolve preocupações sociais e ambien-
tais, enquanto o desenvolvimento sustentado geralmente carrega um
significado associado à economia clássica, em que o crescimento eco-
nômico contínuo e cada vez maior é almejado, sem que haja uma maior
preocupação com a preservação do capital natural e humano. Associa-
-se, portanto, à ideia de “quanto mais crescimento, melhor”.
Daly (2004), célebre economista ecológico, aponta outro erro concei-
tual no emprego do termo crescimento sustentável como sinônimo de
desenvolvimento sustentável, apontando a questão do crescimento
econômico sucessivo incompatível com as possibilidades finitas dos
recursos do planeta.

Posteriormente, sucessivas conferências da ONU reafirmaram o


uso do conceito de desenvolvimento sustentável cunhado no Relatório
Brundtland, inclusive denominando-as como “Cúpulas para o desenvol-
vimento sustentável”, além de terem possibilitado diversos avanços prá-
ticos. Este foi o Caso da Rio 92 (ou Eco-92), em que ocorreu a formação
da Comissão para o Desenvolvimento Sustentável como resultado da
Rio 92 (Eco-92), realizada no Rio de Janeiro em 1992; da Cúpula Mundial
para o Desenvolvimento Sustentável (Rio+10), ocorrida em 2002 em
Joanesburgo, na África do Sul; da Conferência das Nações Unidas so-
bre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), ocorrida no Rio de Janeiro
em 2012; e da Cúpula Mundial de Desenvolvimento Sustentável da ONU
de 2015, em Nova York, em que foram estabelecidos os Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável (ODS), com prazo para serem alcançados
até 2030 (daí seu nome Agenda 2030).

Os principais marcos históricos e a evolução conceitual, de progres-


so, passando por desenvolvimento até culminar no desenvolvimento
sustentável estão resumidos na figura 1.

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 37


Figura 1 – Marcos históricos e evolução conceitual até o desenvolvimento sustentável

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Evolução conceitual até
Marcos históricos o desenvolvimento sustentável

Progresso como grande objetivo da


sociedade, sendo sinônimo de avanço
científico e tecnológico

Progresso como sinônimo de


1760- Início da Revolução Industrial desenvolvimento em termos de
-1820
crescimento econômico-material

Surgimento do movimento
1962 Publicação do livro ambientalista e primeiros
Primavera silenciosa questionamentos sobre o
significado do desenvolvimento

Criação e estabelecimento do
1972 Conferência de Estocolmo e Relatório
conceito de desenvolvimento
Os limites do crescimento
sustentável

1987 Relatório Brundtland Consolidação do conceito de


(Nosso futuro comum) desenvolvimento sustentável e
sustentabilidade
1992 Conferência Rio 92 da ONU e criação da
Comissão para o Desenvolvimento
Sustentável

2002 Cúpula Mundial da ONU sobre


desenvolvimento sustentável

2012 Conferência Rio+20

2015 Cúpula de Desenvolvimento Sustentável


da ONU e estabelecimento dos Objetivos
do Desenvolvimento Sustentável (ODS)

2 Conceitos e dimensões da sustentabilidade


Com a publicação do Relatório Brundtland (1987), reconheceu-se a
necessidade de buscar equidade social, crescimento econômico e pre-
servação do meio ambiente. Contudo, o conceito de desenvolvimento
sustentável apresentado naquele relatório já era uma construção que
se iniciou com a Conferência de Estocolmo e se desenvolveu e estava

38 Sustentabilidade nas organizações


na esteira das discussões sobre o ecodesenvolvimento proposto pelo
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economista polonês radicado no Brasil Ignacy Sachs.

Assim como o Relatório de Brundtland faria posteriormente, Sachs


já reconhecia a necessidade de conciliar as duas posições extremas
presentes na década de 1970 que colocavam de um lado ferrenhos
defensores do crescimento econômico e de outro os economistas
neomalthusianos, que clamavam por zero crescimento populacional,
econômico e material como forma de proteção ao meio ambiente.
Sachs refletiu que o crescimento econômico é fundamental enquanto
houver pessoas em situação de pobreza no mundo, entretanto, deve-
-se tomar o cuidado de garantir a integridade do meio ambiente. Sachs
também já refletia que o crescimento econômico, mesmo que para
atender os mais pobres, tinha de considerar essa integridade ambiental
para não afetar negativamente gerações futuras (MONTIBELLER FILHO,
1993; OLIVEIRA; MONTEIRO, 2015).

Durante sua atuação profissional e intelectual, Sachs teve contatos


com uma grande diversidade de perspectivas ao realizar estudos em
países até então subdesenvolvidos, como Polônia, Brasil e Índia (onde
fez o seu doutorado), e com intelectuais renomados em Paris, onde
lecionou na Escola de Altos Estudos. Além disso, na figura de consul-
tor-especialista, participou de diversas conferências da ONU, como a
Conferência de Estocolmo, em 1972, sendo também consultor de orga-
nismos governamentais como o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD). Como resultado de sua ampla vivência inte-
lectual e profissional e com base em seu contato com planejadores de
empresas americanas durante sua estada em Paris, Sachs consolidou
sua visão de que planejamento deve estar intimamente associado a de-
senvolvimento (OLIVEIRA; MONTEIRO, 2015).

O planejamento, segundo Sachs, está envolvido no contexto de um


necessário “projeto civilizatório”, em que também um novo estilo de vida
e um renovado conjunto de valores devem ser buscados, razão pela qual
acredita na relevância de uma dimensão cultural (MONTIBELLER FILHO,

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 39


1993). Por outro lado, Sachs também tem a convicção de que a urbani-

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zação excessiva e desordenada é prejudicial e está associada à pobre-
za crescente, e que o ecodesenvolvimento deve ser pensado tendo em
vista a realidade e as particularidades de cada região (MONTIBELLER
FILHO, 1993; OLIVEIRA; MONTEIRO, 2015). Com efeito, Sachs propõe
uma quinta dimensão: a espacial, ou geográfica.

Assim, com base no desenvolvimento de seu entendimento sobre


o que caracteriza o ecodesenvolvimento, Sachs propôs cinco dimen-
sões de sustentabilidade:

1. Sustentabilidade social: qualquer perspectiva de desenvolvimen-


to deve considerar o abismo social existente entre as pessoas,
considerando a melhoria das condições de vida de toda a popula-
ção e também visando a uma maior equidade na distribuição de
renda.

2. Sustentabilidade econômica: devem-se buscar uma alocação


e um gerenciamento mais eficiente de recursos e a garantia de
um fluxo de investimentos públicos e privados. A eficiência deve
ser um objetivo tendo-se aspectos macrossociais em mente, não
apenas em termos de rentabilidade econômica.

3. Sustentabilidade ecológica: compreende o uso das potencia-


lidades inerentes à natureza para se atingir o desenvolvimento,
considerando-se também a necessária compatibilização com a
preservação dos ciclos dos ecossistemas. Além disso, abrange a
prudência no uso de recursos não renováveis, a adoção de medi-
das de estímulo ao desenvolvimento de tecnologias mais eficien-
tes e de processos produtivos que gerem menos resíduos e o uso
preferencial de recursos naturais renováveis.

4. Sustentabilidade espacial ou geográfica: pressupõe a busca por


uma relação mais equilibrada entre cidade-campo, evitando-se
uma concentração geográfica exagerada de populações, ativida-
des e poder.

40 Sustentabilidade nas organizações


5. Sustentabilidade cultural: é fundamental considerar as especifi-
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cidades históricas de cada ecossistema cultura e local na busca


da “tradução” e da aplicação do conceito de ecodesenvolvimento.

À medida que o contexto político e econômico macro criava uma


nova visão, compreendendo termos como ecodesenvolvimento e de-
senvolvimento, no lado empresarial, ainda que tardiamente, avanços
eram feitos.

Após a consolidação do termo desenvolvimento sustentável em


1987 e de algumas reflexões preliminares na década de 1980, a busca
por uma nova perspectiva empresarial começou a se consolidar na dé-
cada de 1990, também como forma de responder às críticas das quais
as empresas eram alvo, por também contribuírem com a situa­ção de
“insustentabilidade”. Nesse sentido, destaca-se como marco a criação
de um fórum com líderes das principais empresas de todo o mundo
para discutir as perspectivas dos negócios acerca do meio ambiente
e do desenvolvimento durante a Rio 92, movimento que seria embrião
da criação do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento
Sustentável (WBCSD, do inglês World Business Council For Sustainable
Development), também no ano de 1992. O mesmo economista e em-
presário que liderou a criação do fórum, o suíço Stephan Schmidheiny,
como resultado de suas reflexões nesse processo, escreveu o emi-
nente livro Mudando o rumo: uma perspectiva empresarial global sobre
desenvolvimento e meio ambiente (1992) em que, entre outras coisas,
desenvolve o conceito de “ecoeficiência”.

Posteriormente, diversos autores passaram a desenvolver e disse-


minar suas próprias visões acerca da sustentabilidade e do desenvol-
vimento sustentável na perspectiva empresarial, também mantendo
a noção de diferentes “dimensões”. Menciona-se o conceito de triple
bottom line, ou tripé da sustentabilidade, proposto por Elkington em
1997, composto pelas dimensões social, ambiental e econômica, e que
continua sendo um dos mais referenciados atualmente. E, para mencio-
nar um modelo mais recente, podemos mencionar a abordagem dos
cinco capitais de Porritt (2007), em que é descrita a necessidade de se

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 41


considerar cinco capitais diferentes na busca de um “capitalismo sus-

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tentável”: natural, humano, social, manufaturado e financeiro.

3 O que é e o que não é sustentabilidade


Embora não haja um amplo consenso acerca do significado de sus-
tentabilidade, fato é que o termo passou a ser amplamente utilizado.
Isso inclui o uso no cotidiano das pessoas (muitos praticam o chamado
consumo sustentável), no âmbito das organizações (quem nunca ouviu
empresas se gabarem de praticar moda sustentável, terem “selo de sus-
tentabilidade” ou serem “empresa sustentável”) e, em um âmbito mais
amplo, societário (objetivos do desenvolvimento sustentável, educação
para sustentabilidade). Essa indefinição a respeito dos conceitos de
desenvolvimento sustentável e sustentabilidade, de certa forma, pode
torná-los alvos de oportunismo, por exemplo, por parte de políticos e
empresas, como destaca Porritt (2007).

Veiga (2010), por exemplo, compara o conceito de sustentabilidade


com os conceitos de justiça social e de direitos humanos. O autor reflete
que, embora seja relativamente fácil definir o que é injustiça ou o que
é insustentável, a definição acerca do conceito é de difícil estabeleci-
mento por se tratar de um novo valor. Du Pisani (2006) chama atenção
também para o fato de que nenhum conceito é ideologicamente neutro,
carregando certos valores e deixando outros de lado.

NA PRÁTICA

Existem muitos casos de práticas que se dizem sustentáveis, mas que,


na prática, são propagandas enganosas. Essa prática é conhecida por
greenwashing (“lavagem verde” ou “maquiagem verde”), que é uma es-
tratégia de promover discursos, anúncios, ações, documentos, propa-
gandas e campanhas publicitárias sobre ser sustentável com a intenção
de melhorar a imagem de quem divulga essas informações. Mas de fato
a empresa não age efetivamente de forma sustentável, ou pelo menos
não da maneira como comunica.

42 Sustentabilidade nas organizações


Existe o caso célebre de uma marca de esponja de aço que afirmava
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em sua embalagem que o produto era ECO por ser “100% ecológico”,
quando, na verdade, ele seria apenas “biodegradável”. A empresa, dessa
forma, não poderia alegar, por exemplo, que o processo produtivo da
empresa seguia práticas sustentáveis. Uma associação de consumido-
res denunciou o caso para o Conselho Nacional de Autorregulamenta-
ção Publicitária (Conar), que confirmou que o anúncio era indevido e de-
terminou que deveria ser retificado. Posteriormente, a empresa acabou
alterando a embalagem, deixando apenas ECO.

Ao seguir as origens do uso da palavra sustentável, Veiga (2010)


argumenta que a qualificação de algo como “sustentável” começou a
ser utilizada no âmbito da discussão sobre desenvolvimento somente
a partir do final dos anos de 1970. Até então, era utilizado no campo
científico da física como jargão técnico associado ao conceito de re-
siliência – em termos simples, a capacidade de determinado sistema
de se manter firme mesmo sob efeito de pressão ou estresse. Rogers,
Jalal e Boyd (2008) compartilham da visão de Veiga (2010) e associam
a origem do conceito de sustentabilidade àquele da exploração de re-
cursos florestais, pesqueiros e hídricos segundo o qual a extração ou a
coleta desses recursos deve obedecer à capacidade de reposição dos
mesmos. Segundo os autores, isso significa explorá-los no limite de que
eles teriam a capacidade de se restaurar indefinidamente.

Porritt (2007) coloca essa ideia de capacidade de continuidade a lon-


go prazo no centro da definição do que é sustentável. Segundo ele, o de-
senvolvimento sustentável seria o processo por meio do qual o grande
objetivo da sustentabilidade seria alcançado.

Outra possibilidade interessante seria definir de maneira ampla-


mente consensual por que é necessário buscarmos uma sociedade
sustentável. É a proposta do The natural step (TNS) (ou, em tradução
livre, O passo natural), iniciativa de origem sueca liderada por Karl-Henrik

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 43


Robèrt, que procura definir, com bases científicas, o que a sociedade

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deve buscar para viver sustentavelmente dentro dos limites impostos
pela biosfera. O TNS estabelece que a sociedade deve atender a “qua-
tro condições sistêmicas” se quiser atingir o status de sustentável. São
condições sistêmicas, segundo Robèrt (2002):

•• Condição sistêmica 1: em uma sociedade sustentável, a nature-


za não está sujeita ao aumento sistemático de substâncias extraí­
das da superfície da terra. Isso inclui evitar que metais, minérios e
combustíveis fósseis que naturalmente são encontrados em me-
nores concentrações na natureza aumentem significantemente
sua concentração; substituir determinados minerais por outros
naturalmente abundantes na natureza; reduzir a dependência em
combustíveis fósseis. Como consequência, evita-se, por exemplo,
o aumento da concentração de metais pesados no solo, fosfato
em lagos e dióxido de carbono na atmosfera.

•• Condição sistêmica 2: em uma sociedade sustentável, a natu-


reza não está sujeita ao aumento sistemático de substâncias
produzidas. Isso inclui substituir as substâncias manufaturadas
atualmente, como compostos químicos (ex.: pesticidas e CFCs)
ou plástico, por outras que sejam mais facilmente decompostas
e retornadas à natureza; e reutilizar ao máximo todas as substân-
cias produzidas pela sociedade, por exemplo, por meio de progra-
mas de reciclagem.

•• Condição sistêmica 3: em uma sociedade sustentável, a nature-


za não está sujeita ao aumento sistemático da degradação por
meios físicos. Significa não degradar a natureza a ponto de ela
não conseguir se renovar continuamente e de modo a não haver
perdas em termos de biodiversidade. Exemplos de como atender
esta condição é evitar a pesca predatória, o desmatamento indis-
criminado de matas ou a superexploração de santuários naturais
pelo turismo.

44 Sustentabilidade nas organizações


•• Condição sistêmica 4: em uma sociedade sustentável, as neces-
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sidades humanas são atendidas em todo o mundo. Respeitando


as limitações das três condições sistêmicas anteriores, os recur-
sos têm de ser distribuídos de maneira justa e eficiente, de modo
a atender, no mínimo, às necessidades básicas de todos no mun-
do inteiro. Por todos entendem-se os que atualmente habitam o
planeta e aqueles que nascerão no futuro.

A perspectiva oferecida pelo TNS é de certa forma diferente porque


não procura delimitar o que é sustentável, reconhecendo a dificuldade de
se obter consenso sobre o conceito, mas procura apontar as condições
necessárias para tanto baseando-se em um amplo consenso científico
obtido junto a especialistas de diferentes disciplinas, como física, medi-
cina e biologia. Outro aspecto positivo é que, de certa maneira, responde
à provocação de Veiga (2010), segundo o qual é mais fácil estabelecer o
que não é “sustentável”. Em termos práticos, os princípios do TNS podem
ser aplicados por diferentes atores, como empresas e governos.

Em linha com a evolução do conceito sobre o que é desejável em


termos de desenvolvimento sustentável ou sustentabilidade global,
mantendo-se a prosperidade econômica, respeitando-se os limites do
ambiente e garantindo justiça e igualdade social, tem-se questiona-
do qual é a melhor maneira de medir o desenvolvimento de um país.
Atualmente, o conceito mais utilizado por diversos órgãos e até mesmo
pela ONU é o de produto interno bruto (PIB), que mede a produção eco-
nômica de um país em determinado período (mês, trimestre, ano, etc.).

Considerando-se o fato de que o PIB mede apenas a produção econô-


mica de um país em curto prazo, começaram a surgir questionamentos
se, de fato, essa seria a melhor maneira de mensurar o desenvolvimen-
to. Considerando as deficiências do PIB, foi criado o indicador índice de
desenvolvimento humano (IDH), em 1990, pelos economistas Amartya
Sen e Mahbub ul Haq, e vem sendo usado desde 1993 pelo Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em seu relatório
anual. Outra proposição nesse sentido é o conceito de felicidade interna

Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 45


bruta (FIB), tendo o Butão se notabilizado por ter sido o primeiro – e até

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agora, único – país a adotá-lo em substituição ao PIB. Outros índices
citados por Veiga (2010) incluem o “investimento genuíno de cada país”
e o “índice de progresso genuíno”.

Considerações finais
Apresentamos, neste capítulo, a evolução histórica do conceito
de desenvolvimento, partindo do conceito de progresso, desenvolvi-
mento econômico e, finalmente, incorporando o conceito de susten-
tabilidade, que culminou no conceito de desenvolvimento sustentável.
Particularmente, analisamos com mais profundidade os principais
acontecimentos históricos a partir da década de 1960, que tiveram
implicações significativas na criação e na consolidação do desenvolvi-
mento sustentável.

Complementando o entendimento do histórico do termo desenvol-


vimento sustentável, estudamos o conceito e as dimensões da sus-
tentabilidade. Discutimos que o conceito de sustentabilidade, tomado
emprestado de ciências como a física, começou a ser empregado no
contexto do desenvolvimento sustentável como forma de pacificar as
demandas até então vistas como conflitantes entre desenvolvimento e
conservação. As dimensões da sustentabilidade, por sua vez, passaram
a ser discutidas quando do estabelecimento do conceito de desenvolvi-
mento sustentável.

Diferentes autores apresentam visões diferentes sobre as dimen-


sões, contudo, há certa concordância de que eles devem incorporar as-
pectos econômicos, ambientais e sociais. Em alguns casos, há autores
que propõem que a sustentabilidade deve ser pensada de maneira ain-
da mais abrangente e complexa. É o caso de Sachs, autor que influen-
ciou profundamente a visão multidimensional da sustentabilidade, e
que propõe um total de cinco dimensões: ecológica, social, econômica,
espacial e cultural.

46 Sustentabilidade nas organizações


Por fim, debatemos sobre o que significa ser ou não sustentável. O
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conceito de sustentabilidade, apesar de ser cada dia mais empregado,


não apresenta amplo consenso entre especialistas. Assim, em vez de
empregar uma definição específica com base na proposta do The natural
step (TNS), falamos sobre as quatro condições sistêmicas que uma so-
ciedade deve observar para ser considerada sustentável.

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Conceito de sustentabilidade – evolução nas políticas 47


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48 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 3
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Conceito de
sustentabilidade:
evolução nas
organizações

Durante muito tempo, as empresas acreditavam que os únicos que


deveriam ser beneficiados pelos resultados gerados eram os proprie-
tários, investidores e acionistas. Isso significava, basicamente, que às
empresas caberia apenas seu papel econômico e obedecer às leis.
Quaisquer atividades que as empresas fizessem, independentemente
de estarem prejudicando comunidades, trabalhadores e o meio ambien-
te, desde que estivessem respeitando as leis, eram moral e juridicamen-
te aceitas. Trata-se do estágio de imobilidade.

Esse quadro passou a mudar quando as empresas começaram a


ser questionadas sobre qual seria o seu papel enquanto ator relevan-
te na sociedade. Entre as razões para isso, podemos mencionar o

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advento da articulação da sociedade civil organizada, que passou a

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questionar as ações das empresas, algumas grandes tragédias socio-
ambientais causadas pela atuação muitas vezes negligente delas e a
intensificação das ações do governo visando regulamentar a atuação
empresarial. Trata-se do estágio reativo, ou cumprimento da lei.

Posteriormente, algumas empresas passaram a perceber que, ao


se comportarem de maneira mais proativa, poderiam colher alguns
benefícios em termos econômicos, como os ganhos reputacionais
ou a ecoeficiência. Trata-se do estágio proativo, ou estratégico, da
sustentabilidade.

Por fim, mais recentemente, tem ganhado força um movimento que


discute de maneira mais crítica o papel da empresa enquanto ator rele-
vante para a sociedade. Isso inclui o debate se a empresa deve se preo-
cupar somente em reduzir o impacto socioambiental negativo das suas
atividades ou se deve também contribuir para gerar um maior impacto
socioambiental positivo. Esse estágio corresponde ao comunitário/inte-
grativo ou de sustentabilidade genuína.

Abordaremos neste capítulo o que caracteriza cada um desses está-


gios, bem como um panorama sobre a evolução histórica da inserção
gradativa da sustentabilidade na agenda empresarial, na medida em que
resgatamos os principais marcos e eventos importantes nesse processo.

1 Da postura reativa à postura estratégica


“Da heresia ao dogma.” É com essa metáfora religiosa que Hoffman
(2001) sintetiza a mudança da postura das organizações em relação à
questão ambiental ao longo dos anos. Para isso, fez uma extensa pes-
quisa histórica de dados de uma das indústrias que tem maior impac-
to ambiental no mundo: a indústria química. Hoffman descobriu que,
inicialmente, durante a década de 1960, as empresas eram totalmente
reticentes quanto a tomar medidas que iam além do que era legalmente

50 Sustentabilidade nas organizações


exigido de forma a não prejudicar sua margem de lucro, ainda que trou-
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xesse significativos ganhos ambientais. Por isso, as empresas viam es-


sas ações como uma heresia às práticas e aos costumes da indústria.
Por outro lado, com o passar dos anos, as empresas passaram a avan-
çar na adoção das práticas ambientais, indo, muitas vezes, além do que
a legislação exigia. Nesse momento, a adoção dessas práticas come-
çou a ser vista quase como dever e sinal de boa gestão das empresas,
razão pelo qual Hoffman fala na transformação em dogma.

Vamos, então, entender esse trajeto das empresas da heresia ao


dogma em relação às práticas de sustentabilidade. Autores fizeram
muitas divisões de estágios, variando de três a dez estágios diferentes
(KOLK; MAUSER, 2002). Contudo, para simplificar e melhor estudar essa
evolução, dividimos em três os estágios em que as empresas podem
estar em relação às práticas de sustentabilidade:

•• estágio de imobilidade;

•• estágio reativo, ou de cumprimento;

•• estágio proativo, ou estratégico.

1.1 Estágio de imobilidade

Empresas que se encontram no estágio de imobilidade em relação à


sustentabilidade tendem a apresentar dois tipos distintos de comporta-
mento: a ignorância e a inação.

Com relação à ignorância, pode-se dizer que algumas empresas


sequer conhecem os efeitos socioambientais negativos de sua cadeia
produtiva ou dos produtos e/ou serviços que comercializam. Podemos
citar os casos de donos de uma carvoaria e de uma olaria pequenas no
interior do país que não estão cientes dos problemas ambientais ge-
rados pelas emissões dos fornos ou dos problemas sociais relaciona-
dos à exposição dos trabalhadores à fumaça tóxica ou a um ambiente

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 51


insalubre. Em geral, isso costuma acontecer em negócios informais,

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pouco ou nada intensivos em tecnologia, e que demandam baixa ou
nenhuma escolaridade dos empregados.

Já o comportamento de inação faz com que as empresas conheçam


os efeitos socioambientais negativos que geram, mas não se mobilizem
ou não se manifestem a respeito, a fim de evitar a geração de eventuais
prejuízos econômicos, mesmo que, muitas vezes, estejam infringindo
alguma lei. Como argumentam Dunphy e Benveniste (2000), podemos
falar também em um estágio de rejeição. Esses prejuízos econômicos
podem decorrer, por exemplo, do aumento de custo produtivo decor-
rente da adoção de tecnologias com menores emissões de poluentes,
processo de tratamento de resíduos e práticas para reduzir a exposição
dos trabalhadores a determinado risco, ou, ainda, podem decorrer do
fato de os consumidores boicotarem os produtos da empresa caso as
péssimas práticas socioambientais sejam expostas publicamente.

Atualmente, as empresas que adotam essa postura estão sujeitas a


enormes riscos, além de, evidentemente, serem questionáveis do pon-
to de vista ético. Podemos identificar pelo menos dois riscos a que as
empresas estão sujeitas (e cientes). Primeiro, existe o risco de serem
questionadas por não estarem seguindo as leis e, portanto, serem con-
denadas criminalmente e/ou a sofrerem sanções e receberem multas.
Segundo, existe o risco de outros públicos, também conhecidos como
stakeholders, ou partes interessadas, questionarem publicamente ou
judicialmente suas ações, gerando danos ao caixa e à imagem da em-
presa. Em outros casos, a empresa pode se tornar menos competitiva,
uma vez que grandes empresas (como montadoras de veículos) estão
cada vez mais pressionando seus fornecedores a adotarem práticas
mais sustentáveis.

Por fim, podemos relacionar as práticas das empresas que se en-


contram no estágio de imobilidade àquela visão de “capitalismo preda-
tório, que observamos, por exemplo, em gravuras e fotografias antigas

52 Sustentabilidade nas organizações


de indústrias no início da Revolução Industrial. Segundo Dunphy e
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Benveniste (2000), essas empresas tendem a ver o meio ambiente e


as pessoas como simples recursos produtivos inesgotáveis a serem
explorados livremente. Por isso, podemos falar, efetivamente, na au-
sência de práticas ou de qualquer preocupação quanto a aspectos so-
ciais e ambientais.

NA PRÁTICA

A postura de ignorância ou, pior, inação de algumas empresas, frequente-


mente aparece nos noticiários do Brasil. Por exemplo, basta lembrarmos
de questionamentos feitos pelo Greenpeace em relação a grandes frigo-
ríficos que compraram carne de fazendas que realizam desmatamento
ilegal na Amazônia ou que invadem reservas indígenas – relatório conhe-
cido como A farra do boi na Amazônia (GREENPEACE, 2009).

1.2 Estágio reativo, ou de cumprimento da lei

Os esforços de empresas no estágio reativo da sustentabilidade se


concentram em cumprir os mínimos requisitos legais. Assim, as ações
socioambientais encampadas por elas são vistas simplesmente como
custos para fazer negócio. A responsabilidade das empresas é cumprir
a lei e, ao escolher fazer ou não determinada ação em relação a ques-
tões socioambientais, elas realizam uma avaliação sob a perspectiva de
potenciais riscos ao negócio.

Em alguns casos, as empresas têm uma postura reativa defensiva,


isto é, buscam questionar os requisitos legais já impostos ou que estão
em processo de implantação e/ou buscam brechas na lei para evitar
seu cumprimento. É o caso de empresas que patrocinam ou realizam
estudos científicos próprios para contrapor estudos feitos por entida-
des independentes, centros de pesquisa ou universidades que trazem

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 53


resultados comprobatórios dos danos socioambientais gerados por

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determinado processo produtivo, componente do produto ou mesmo
do produto final. Com isso, as empresas pretendem mobilizar a opinião
pública e de governos a seu favor ao oferecer contraprovas de que não
há riscos ao ambiente ou à saúde humana, justificando a manutenção
desses processos, componentes e produtos.

Em termos de práticas ambientais, as empresas buscam as cha-


madas soluções “controle fim de tubo” (PEREIRA, 2016), ou seja, solu-
ções que não buscam resolver as causas, por exemplo, de emissão de
poluentes, mas mitigar as consequências, ou seja, elas trabalham para
evitar que as emissões não ultrapassem o limite estipulado por lei.

A respeito de práticas sociais, a visão das empresas é de que elas


contribuem basicamente gerando empregos, seguindo a legislação
trabalhista e, também, pagando regiamente os impostos. Assim, as
empresas enxergam que sua função é, basicamente, gerar lucros aos
acionistas e cumprir a lei. Por outro lado, determinada questão social
ou ambiental que vá além do que é exigido por lei deve ser função úni-
ca e exclusiva do Estado.

Em geral, as decisões em relação à sustentabilidade corporativa


são tomadas de cima para baixo, com o envolvimento apenas da alta
liderança das empresas (CEO, presidente, conselho de administração
e/ou proprietários da empresa) e, basicamente, sem grande influên-
cia externa. Quaisquer questionamentos sobre a conduta da empre-
sa em relação a questões sociais ou ambientais por parte de algum
stakeholder externo é, portanto, uma questão jurídica. Com isso, os
esforços para responder ou agir em relação a esse questionamento
têm o departamento jurídico da empresa à frente. Assim, a respos-
ta da empresa passa, basicamente, por justificar que está cumprin-
do a lei. Em alguns casos, as empresas mantêm, em cada planta ou
fábrica, um departamento ou uma área que atua com saúde, segu-
rança e meio ambiente especializada em aspectos mais técnicos e

54 Sustentabilidade nas organizações


operacionais relacionados ao cumprimento de normas técnicas, de
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segurança e saúde específicas da indústria em que atuam (por exem-


plo, normas de meio ambiente para a indústria química).

Podemos citar o caso de algumas empresas que continuavam utili-


zando o amianto no Brasil até 2017, quando, finalmente, o uso desse ma-
terial foi proibido no país (graças à decisão do STF de 29 de novembro de
2017). Como descreve reportagem de Brum (2017), a indústria já conhe-
cia os efeitos deletérios do amianto à saúde dos trabalhadores e ao meio
ambiente desde o início do século XX. O material era, já há muito tempo,
proibido em diversos países e em alguns estados brasileiros. A despeito
disso, como o uso do material era autorizado na maioria dos estados,
algumas empresas continuaram a usá-lo por estarem dentro da lei.

NA PRÁTICA

Podemos imaginar que, como se trata do segundo estágio da sustenta-


bilidade corporativa, as grandes empresas já o abandonaram totalmen-
te, certo? Errado. Existem empresas que ainda têm uma visão reativa
em relação a determinados aspectos da sustentabilidade. Um exemplo
desse tipo de comportamento é a gigante petrolífera norte-americana
ExxonMobil. A empresa vem financiando, faz muitas décadas, pesquisas
que visam contrapor o que a maioria dos pesquisadores independen-
tes descobriram sobre os impactos das atividades humanas no grande
aumento da concentração de gases de efeito estufa e sua relação com
as mudanças climáticas globais.
Apenas em 2017, sob pressão de vários grupos, entre eles acionistas da
própria empresa, a ExxonMobil tem assumido que as mudanças climáti-
cas podem ter um risco, ainda que baixo, ao seu negócio (SCOTT, 2018).
Enquanto isso, outras grandes empresas petrolíferas assumem uma
postura contrária. Elas estão engajadas em investir fortemente em no-
vas tecnologias e recursos energéticos sustentáveis. A Petrobras, por
exemplo, tem adotado essa linha. Outro caso emblemático é o da em-
presa britânica BP – Beyond Petroleum, antes chamada BP – British
Petroleum (petróleo britânico).

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 55


1.3 Estágio proativo, ou estratégico

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O foco das empresas no estágio proativo, ou estratégico, é encontrar
maneiras de alinhar ações socioambientais com ganhos econômicos.
Diz-se, então, que a sustentabilidade é estratégica para a empresa e
justifica também o porquê de ela adotar uma postura proativa: por ser
economicamente vantajoso para ela. Essa vantagem decorre tanto da
possibilidade de evitar potenciais riscos, como para que eventuais opor-
tunidades sejam aproveitadas.

Em relação aos riscos, no estágio estratégico, reconhece-se que


existem riscos regulatórios ou de não cumprimento da lei, assim como
acontece com as empresas no estágio reativo. Contudo, as empresas
estendem essa visão de risco e começam a considerar outros riscos de
mercado ao não realizarem determinadas ações socioambientais. Entre
esses riscos, podemos citar, por exemplo, questionamentos públicos de
ONGs e de consumidores sobre determinadas práticas; a perspectiva
do surgimento de uma futura legislação mais restritiva, como no caso
da regulação da emissão de gases de efeito estufa; a exigência de em-
presas com quem farão negócio ou mesmo de bancos a quem solicita-
rão financiamentos.

Contudo, além de potenciais riscos, as empresas percebem opor-


tunidades a serem exploradas ao desenvolverem ações socioambien-
tais. É o que se convencionou chamar de estratégias, ou abordagem
“ganha-ganha”. Segundo essa estratégia, as empresas procuram ir
além do que a legislação especifica como padrão mínimo de desem-
penho social e ambiental. Conceitualmente, diz-se que as empresas
com o desenvolvimento de ações proativas, alinhadas com a estraté-
gia ganha-ganha, buscam desenvolver os três pilares da sustentabili-
dade ou o triple bottom line (ELKINGTON, 2011).

Ao se utilizarem dessa abordagem ganha-ganha, as empresas, por-


tanto, esperam contribuir mais para a sustentabilidade, ao aumentarem

56 Sustentabilidade nas organizações


seu impacto socioambiental positivo ou diminuírem o impacto negativo
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das suas operações para a sociedade como um todo, ao mesmo tem-


po em que geram ganhos econômicos para a empresa. Por isso, como
mencionam Kolk e Mauser (2002), alguns autores falam também em
estágio “competitivo”. Talvez, um dos casos mais emblemáticos dessa
estratégia é a adoção de práticas ou tecnologias que permitem a ecoe-
ficiência, em que as empresas conseguem, por exemplo, poupar custos
ao mesmo tempo em que promovem a redução do consumo de energia
ou água, incorrendo também em ganhos econômicos.

Em termos de orientação, as empresas procuram olhar mais para o


seu exterior. Com efeito, as empresas no estágio proativo ou estratégico
tendem a reconhecer um número maior de stakeholders como impor-
tantes para os negócios e têm a convicção de que é importante ter legi-
timidade não somente legal, mas também da sociedade para o negócio
prosperar. Assim, em suas decisões de negócio, essas empresas geral-
mente procuram prestar atenção e consultar, além de clientes e investi-
dores, outros públicos, como fornecedores, funcionários, comunidades
onde atuam, membros do governo e até mesmo ONGs e a população
em geral. Elas identificam como podem se relacionar harmoniosamen-
te com esses públicos e como eventualmente podem beneficiá-los ao
mesmo tempo em que geram ganhos econômicos.

No âmbito de práticas sociais desenvolvidas pelas empresas, po-


demos identificar programas de voluntariado corporativo em que seus
funcionários ajudam comunidades ou ONGs locais; programas para au-
mentar a diversidade entre os funcionários; oferecimento de certos ser-
viços visando ao desenvolvimento socioeconômico nas comunidades
locais onde a empresa atua, entre outros.

No estágio proativo, estratégico ou competitivo, além do depar-


tamento de saúde, segurança e meio ambiente, que, como explica-
do, tem um viés mais técnico e operacional, as empresas passaram
a ter departamentos e/ou comitês de sustentabilidade. Essa área de

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 57


sustentabilidade concentra os esforços e mobiliza os demais departa-

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mentos para integrar aspectos de sustentabilidade nas suas ações.

Em geral, a grande maioria das principais empresas do Brasil e do


mundo, sobretudo as de maior porte, encontram-se neste estágio (ain-
da que em diferentes graus). Podemos dizer que se tornou, efetivamen-
te, um dogma entre as empresas essa visão de ganha-ganha e do tripé
da sustentabilidade. No mínimo, a maioria das empresas se esforçam
por demonstrar que estão buscando uma perspectiva estratégica da
sustentabilidade, ainda que em alguns casos se trate de greenwashing.

2 A inserção da sustentabilidade na óptica


empresarial
Atualmente, como já mencionado, a adoção de práticas de susten­
tabilidade, ainda que em diferentes graus, tornou-se muito frequente
pela grande maioria das empresas. Para que chegasse até essa situa­
ção atual, podemos identificar diferentes eventos que contribuíram de-
finitivamente para isso e também influenciaram, gradativamente, na
evolução das práticas da sustentabilidade, da visão reativa até a visão
estratégica ou de liderança. Vamos acompanhar a evolução histórica
da inserção da sustentabilidade na óptica empresarial e alguns dos
principais marcos influenciadores desse movimento, desde a década
de 1970 até os anos mais recentes.

2.1 Década de 1970

No fim da década de 1960 e durante a década de 1970, acompanhan-


do a ascensão de movimentos ecológicos, as convenções internacio-
nais e publicações influentes como A primavera silenciosa e Os limites
do crescimento, as primeiras empresas começaram a desenvolver uma
percepção mais aguçada sobre a sustentabilidade, sobretudo acerca de

58 Sustentabilidade nas organizações


aspectos ambientais. Em termos institucionais, surgiram agências e as
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primeiras legislações que visavam controlar e regular especificamente


as atividades empresariais, sobretudo industriais. Nos EUA, em 1970, foi
criada a Agência de Proteção Ambiental (EPA, do inglês Environmental
Protection Agency) (HOFFMAN, 2001). No Brasil, começaram os primei-
ros esforços em temos de criação de legislação, políticas e órgãos de
proteção ambiental que afetavam diretamente as empresas. Entre elas,
podemos citar o Decreto-Lei 1.413, de 1975 (BRASIL, 1975), que “dispõe
sobre o controle da poluição do meio ambiente provocada por ativida-
des industriais” e a criação da Secretaria Especial de Meio Ambiente
(Sema), da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e da
Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA) no Rio
de Janeiro.

Na arena internacional, destaca-se a publicação das “Diretrizes


para Multinacionais” pela Organização de Cooperação para o
Desenvolvimento Econômico (OCDE). Nessa publicação, são apresen-
tadas diretrizes voluntárias para que as empresas direcionem sua con-
duta empresarial em temas socioambientais como direitos humanos
(ALIGLERI; ALIGLERI; KRUGLIANKAS, 2009).

2.2 Década de 1980


Durante a década de 1980, as empresas, de modo geral, intensifi-
caram suas ações em relação à sustentabilidade. Além do surgimento
de novas leis e políticas que as obrigavam a ter maior responsabilida-
de, começaram a surgir as primeiras iniciativas voluntárias das empre-
sas para se autorregularem em relação a uma atuação responsável e
que considerasse importante questões socioambientais. Portanto, as
empresas passaram a se comprometer a ir além do que a legislação
demandava.

Em âmbito coletivo internacional, duas dessas iniciativas empre-


sariais voluntárias merecem destaque, conforme trazido por Orsato

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 59


(2012), sendo que ambas surgiram como resposta a tragédias ambien-

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tais de enormes proporções. Primeiro, temos uma iniciativa da indústria
química chamada Responsible Care, ou cuidado responsável, lançado
no Canadá em 1985 e posteriormente adotado por empresas de outros
países. As empresas signatárias assumem voluntariamente diversas
responsabilidades relacionadas a saúde, meio ambiente e segurança.
Embora nem sempre as empresas reconheçam explicitamente essa
relação, fato é que esse compromisso foi lançado para responder a de-
sastres ambientais ocorridos que envolveram a indústria química e que,
consequentemente, trouxeram prejuízos à reputação das empresas
(KING; LENOX, 2000). Entre esses desastres, o mais importante foi o
episódio de vazamento de gás de uma fábrica de pesticida da empresa
Union Carbide, em Bhopal, na Índia, em 1984, em que milhares de pes-
soas morreram e tantas outras sofreram males de saúde decorrentes
dele, além de ter ocorrido uma grave contaminação do solo, do ar e da
água na região.

A outra iniciativa foram os Princípios Ceres, anteriormente conheci-


dos como Princípios de Valdez. Motivada pelo estrondoso desastre am-
biental ocasionado pelo derramamento de petróleo no Alasca pelo navio
petroleiro Exxon Valdez, uma coalização de fundos de investimento, em-
presas, organizações ambientalistas e da sociedade civil estabeleceu
princípios de atuação das empresas. Em linhas gerais, os princípios vo-
luntários assumidos pelas empresas reafirmavam sua responsabilida-
de em relação ao meio ambiente e se comprometiam a divulgar relató-
rios ambientais anualmente (SANYAL; NEVES, 1991).

Em termos institucionais, ocorreu o aprimoramento das legisla-


ções, políticas e órgãos de controle ambiental. No Brasil, destaca-se,
sobretudo, a promulgação da Lei no 6.938, em 1981, que criou a Política
Nacional do Meio Ambiente (PNMA) e, segundo Borges, Rezende e
Pereira (2009), inaugurou a era de consolidação do direito ambiental no
país. Além disso, após a redemocratização, os movimentos da socie-
dade civil passaram a ter um papel ainda mais ativo, importante até

60 Sustentabilidade nas organizações


mesmo na elaboração da Constituição de 1988, que tem um capítulo
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específico sobre questões ambientais (capítulo VI, artigo 225). Um pou-


co depois, em 1989, criou-se o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) (SILVA; LIMA, 2013).

2.3 Década de 1990

O início da década de 1990 foi marcado por um ambiente institucio-


nal e de grande repercussão na mídia sobre as questões ambientais,
graças à realização da Eco-92 (ou Rio 92). Nesse novo cenário, as em-
presas começaram a reagir, não aceitando somente o papel de “vilãs”
pelos graves problemas de poluição, desastres, etc. Entre essas rea-
ções, começam a despontar práticas socioambientais voluntárias.

Em termos de práticas corporativas, a década de 1990 consolidou a


adoção pelas empresas de práticas socioambientais voluntárias. Nesse
sentido, destaca-se a implantação de Sistemas de Gestão Ambiental
(SGA) pelas empresas, inspirada em programas de Gestão da Qualidade
Total (GQT), que vinham sendo muito utilizados pelas empresas nas
décadas de 1980 e 1990 (ORSATO, 2012). Esse movimento culminou
no lançamento da série ISO 14000, que dá início ao desenvolvimento
de diversas normas sobre gestão ambiental, como a ISO 14001, sobre
sistemas de SGA (RIEKSTIN, 2012). Outro fator que se destaca é o de-
senvolvimento da primeira versão do Global Reporting Initiative (GRI),
em 1999, que trata dos padrões de divulgação e transparência das em-
presas quanto a suas práticas socioambientais, entre outros elementos.

Houve também o surgimento e a disseminação, por meio de vários


canais influentes entre as empresas, de informações e manifestos con-
clamando para que as empresas inserissem a sustentabilidade em
suas agendas estratégicas. Entre eles, podemos mencionar a criação,
em 1992, do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento
Sustentável (WBCSD, do inglês World Business Council for Sustainable

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 61


Development), para discutir e disseminar boas práticas de sustenta-

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bilidade entre as principais empresas do mundo. Em 1997, ocorreu a
publicação da primeira edição do livro Canibais com garfo e faca, de
John Elkington, que muito contribuiu para a disseminação do con-
ceito de sustentabilidade empresarial, e dos três pilares da sustenta-
bilidade no meio empresarial. No Brasil, temos iniciativas semelhan-
tes, como a criação, em 1997, do Conselho Empresarial Brasileiro de
Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), versão brasileira do WBCSD; e a
criação do Instituto Ethos em 1998.

Em termos institucionais, observamos a assinatura do Protocolo de


Quioto em 1997, para o qual as empresas seriam chamadas a contribuir
ao seu efetivo cumprimento. No Brasil, Borges, Rezende e Pereira (2009)
destacam a criação do Ministério do Meio Ambiente (MMA), em 1992,
consolidando o reconhecimento da importância da questão ambiental
por parte do governo brasileiro; e, em 1998, destaca-se a promulgação
da chamada “Lei de Crimes Ambientais” (BRASIL, 1998), que passa a
considerar como crime, e não apenas contravenção penal, as transgres-
sões à legislação ambiental por parte de empresas e pessoas físicas.

2.4 A partir da década de 2000

A partir da década de 2000, podemos falar que, efetivamente, ques-


tões relacionadas à sustentabilidade consolidaram-se como “dogmas”
para as empresas. Se entrarmos nos websites das maiores e mais co-
nhecidas empresas no Brasil e no Mundo, é muito provável encontrar-
mos uma seção ou um relatório anual de atividades – inclusive seguin-
do as diretrizes do GRI – que descrevem as principais preocupações
socioambientais da empresa e as ações que desenvolve para respon-
der a essas preocupações. Outro ponto de destaque é a instituição da
ISO 26000, lançada em 2009, que estipula princípios e temas centrais
para práticas de responsabilidade social das empresas, incluindo as-
pectos como direitos humanos, meio ambiente e consideração dos

62 Sustentabilidade nas organizações


interesses de múltiplos stakeholders. No Brasil, tivemos a criação do
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índice de sustentabilidade empresarial (ISE), que caracteriza um con-


junto de grandes empresas que têm ações na Bolsa de Valores de São
Paulo (B3, antiga BM&F BOVESPA) e que são consideradas como as
mais sustentáveis.

Além de grupos e movimentos socioambientais que já o vinham fa-


zendo desde a década de 1970, outros stakeholders importantes para o
universo empresarial também passaram a pressionar as empresas para
adotar práticas mais sustentáveis. Apenas para mencionar dois deles,
podemos citar o surgimento dos princípios para o investimento respon-
sável (PRI, na sigla em inglês), por meio do qual grandes investidores
se comprometiam a avaliar critérios ambientais nos investimentos a
serem realizados, e os princípios do Equador, por meio dos quais gran-
des bancos se comprometeram a fazer o mesmo ao avaliar pedidos de
financiamento por parte de empresas.

No Brasil, em termos institucionais, podemos mencionar como des-


taque a instituição da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) em
2010 (BRASIL, 2010), a partir da qual, a responsabilidade pelo descarte
de resíduos e produtos passou a ser definida de maneira ampla, impli-
cando inclusive as empresas.

3 Novos modelos em direção à


sustentabilidade
A partir de 2010, principalmente, podemos observar o resultado da
definitiva inserção da sustentabilidade na óptica empresarial com o
surgimento de novos modelos e abordagens que aprofundam a visão
da sustentabilidade como aspecto estratégico. Por isso, podemos fa-
lar de um quinto estágio, que denominamos de comunitário/integrati-
vo de sustentabilidade corporativa ou, como apontam Kolk e Mauser

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 63


(2002), denominado por alguns autores como o estágio derradeiro de

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“negócio sustentável”.

3.1 Estágio comunitário/integrativo ou sustentabilidade


genuína

O estágio comunitário, ou integrativo, ainda muito recente, marca


a integração efetiva da empresa com a sociedade. A empresa passa
ser vista por seus gestores e proprietário como responsável pela solu-
ção de problemas importantes e interessada em atuar nisso. O foco é
contribuir com um impacto socioambiental positivo ou reduzir conside-
ravelmente o impacto negativo, em vez de se preocupar com apenas
reduzir o impacto socioambiental negativo (SCHALTEGGER; HANSEN;
LÜDEKE-FREUND, 2016). Com essa filosofia em mente, a sustentabili-
dade, embora possa gerar vantagens competitivas para as empresas,
é vista como uma responsabilidade inerente a elas enquanto parte da
sociedade.

Nesse sentido, temas que tendem a não gerar ganhos econômicos


para as empresas, por exemplo, via redução de custos ou ganhos de
imagem, também são abordados pela empresa como importantes.
Reconhece-se, portanto, que há dilemas e que nem sempre é possível
obter o alinhamento entre os três pilares da sustentabilidade (CRANE
et al., 2014).

Os aspectos socioambientais prioritários aos quais a empresa esco-


lhe se dedicar são definidos de “fora para dentro”, não de “dentro para
fora”. Isso significa que a empresa procura priorizar aspectos socioam-
bientais que são relevantes para o planeta, não aqueles que são conve-
nientes para si mesma ou que a ajudem a atingir o tripé da sustentabili-
dade (DYLLICK; MUFF, 2016).

64 Sustentabilidade nas organizações


Outro aspecto importante é o fato de as empresas se preocuparem
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em gerar um impacto socioambiental positivo diretamente por meio


dos seus produtos ou serviços. Nesse sentido, por exemplo, torna-se
impossível que uma empresa do setor de fumo que produz cigarros
faça diversas ações sociais junto a agricultores que plantam fumo,
reduza as emissões de gases de efeito estufa no seu processo produti-
vo, entre outras medidas, se o seu produto final, o cigarro, gera significa-
tivos problemas de saúde aos usuários. Essa tese, por exemplo, foi alvo
de calorosos debates em audiências e no conselho do índice de susten-
tabilidade empresarial (ISE), conforme retratado no livro de Marcondes
e Bacarj (2010) sobre o histórico do ISE. Empresas de cigarro, bebidas,
armas e pornografia e outras altamente impactantes, como de petróleo
e de mineração, deveriam ser, afinal, autorizadas a participar de um índi-
ce que mensura a sustentabilidade empresarial?

Empresas que se encontram ou nasceram sob a égide desse estágio


geralmente não têm um departamento ou uma área responsável pela
sustentabilidade, já que a sustentabilidade é inerente a elas e deve estar
imersa em todas as áreas da empresa e refletida em todas as decisões
e ações que a empresa toma.

NA PRÁTICA

Empresas que fazem parte do sistema B1 ou mesmo empresas classi-


ficadas como negócios sociais ou negócios de impacto são possíveis
exemplos de organizações que se encontram no estágio comunitário/
integrativo ou de sustentabilidade genuína. Fala-se também de modelos
de negócio sustentável.

1 O sistema B é uma iniciativa nascida nos EUA em 2006 e que atualmente congrega milhares de empresas
no mundo todo comprometidas a utilizar o mercado para ajudar a resolver problemas socioambientais. As
empresas que participam do movimento B são conhecidas como “empresas B”.

Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 65


Por fim, o quadro 1 traz um resumo da ocorrência dos estágios de

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sustentabilidade ao longo do tempo.

Quadro 1 – Ocorrência dos estágios de sustentabilidade ao longo do tempo

PERÍODO ESTÁGIOS DE SUSTENTABILIDADE NAS EMPRESAS

Até 1970 Ampla predominância do estágio de imobilidade

1970-1980 Reativo/cumprimento da lei

Reativo , com as primeiras amostras de um estágio proativo/


1980-1990
estratégico

1990-2000 Estratégico, com resquícios do reativo

2000-2010 Predominância do estratégico

Ampla predominância do estratégico, com o surgimento do


2010+
estágio de sustentabilidade genuína

Considerações finais
Compreendemos, neste capítulo, que a inserção da sustentabilidade
no universo empresarial foi um processo gradativo, que se estendeu e
vem se estendendo por décadas. Nesse período, diferentes eventos que
envolvem aspectos como legislação, tragédias ambientais e influên­
cias de importantes stakeholders contribuíram para que as empre-
sas avançassem em suas práticas e forma de enxergar a questão da

66 Sustentabilidade nas organizações


sustentabilidade. Esse avanço pode ser observado ao descrevermos os
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diferentes estágios em que as empresas se encontram em relação à


temática.

Esses estágios, embora sugiram uma evolução ao longo do tempo,


não necessariamente são acompanhados pelas empresas de modo
linear. Isso significa que existem empresas que nasceram ou operaram
em épocas em que a sustentabilidade não era sequer uma preocupa-
ção, mas, ao longo do tempo, evoluíram para um estágio mais estra-
tégico. Existem também empresas que já nasceram com uma postura
mais estratégica em relação à sustentabilidade e, mais recentemente,
empresas que apresentam novos modelos em que a sustentabilidade é
parte do cerne do negócio e de sua razão de ser. Por outro lado, existem
empresas que sequer se preocupam em atender à legislação mínima
que visa proteger o ambiente e garantir a justiça social.

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Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 67


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Conceito de sustentabilidade: evolução nas organizações 69


Capítulo 4
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Conceito de
sustentabilidade
nas empresas

As empresas estão buscando adotar uma perspectiva estratégica em


relação à sustentabilidade. Com isso, procuram gerar resultados que não
se restringem mais apenas a aspectos econômicos, mas procuram in-
tegrá-los com os aspectos sociais e ambientais, de modo a gerar valor
tanto para a empresa quanto para outros stakeholders com os quais se
relaciona.

Neste capítulo, abordaremos o conceito de triple bottom line, tam-


bém conhecido como “tripé da sustentabilidade”, que explora justamen-
te a necessidade de a empresa adotar uma perspectiva mais ampla e
estratégica na busca da sustentabilidade. Além disso, entenderemos
algumas das principais tendências que estão por trás dos esforços das

71
empresas na sustentabilidade empresarial. Por fim, analisaremos como

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as empresas se inserem e como podem contribuir para a mudança de
um sistema de produção e consumo linear predominante, para um sis-
tema circular em que a sustentabilidade seja a tônica.

1 Triple bottom line


O conceito de triple bottom line (TBL), cunhado pelo consultor e es-
pecialista inglês John Elkington, surge na esteira das discussões sobre
ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentável, quando se come-
çou a conceber uma visão de desenvolvimento que devia ir além do
simples desenvolvimento econômico.

Podemos apontar, contudo, que a diferença essencial entre o concei-


to de desenvolvimento sustentável e o de sustentabilidade baseado no
TBL está no nível de aplicação de cada um. Enquanto o conceito de de-
senvolvimento sustentável diz respeito à coletividade de indiví­duos, seja
de uma região, de um país, um continente ou mesmo de toda a huma-
nidade, o conceito de TBL se relaciona, essencialmente, a uma empresa
ou organização específica.

O TBL, tal como foi concebido, também surgiu como resposta à


crítica sobre o que deveria ser considerado sucesso dentro de uma or-
ganização ou empresa específica. Da mesma forma que as críticas ao
conceito de desenvolvimento enfatizavam que a questão do crescimen-
to econômico e o produto interno bruto (PIB) não deveriam ser sinônimo
de sucesso e bem-estar e que o conceito de “desenvolvimento” de um
país deveria ser expandido, o TBL apontava que os resultados econô-
mico-financeiros de uma empresa não deveriam ser tidos como único
indicador de seu sucesso.

Na linguagem financeira e de analistas de investimento, o chamado


bottom line, ou “linha-base”, refere-se à linha final de um demonstrati-
vo financeiro de uma empresa, que justamente corresponde ao lucro

72 Sustentabilidade nas organizações


líquido dela. Como mostra, de maneira simplificada e resumida, o qua-
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dro 1, a linha-base é obtida ao se deduzir das receitas com vendas de


produtos ou serviços os impostos e os custos. Sob o ponto de vista
estritamente econômico-financeiro, no final das contas, o lucro líquido é
o que mais importa para a empresa, pelo menos em curto prazo, porque
ele indica quanto dinheiro o investidor, acionista ou dono da empresa
está “colocando no seu bolso”.

Quadro 1 – Demonstrativo financeiro simplificado

RECEITAS (VENDAS DE PRODUTOS/SERVIÇOS)

(–) Custo de produtos vendidos

(–) Impostos

(–) Despesas operacionais e financeiras

= lucro líquido (bottom line ou linha-base)

O conceito de TBL, que pode ser traduzido como “linha-base tripla”,


ou, como é amplamente utilizado, “tripé da sustentabilidade”, portanto,
reconhece fundamentalmente que a empresa não deve buscar apenas
o resultado financeiro, mas outros dois resultados: o ambiental e o
social.

Além disso, o conceito de TBL reconhece a natureza intrínseca de


interdependência entre os três aspectos, econômico, social e ambiental.
Nesse sentido, talvez, a tradução “tripé da sustentabilidade”, frequente-
mente utilizada, seja ainda mais ilustrativa. Imagine um banco de três
pernas. Se você tirar qualquer uma dessas três pernas ou se qualquer
uma delas não estiver firme, o risco de o banquinho desequilibrar e

Conceito de sustentabilidade nas empresas 73


ocasionar a queda de quem está sentado é enorme. Seria o mesmo

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caso com as empresas.

NA PRÁTICA

Assim, de nada adianta a empresa fazer grandes investimentos em


ações socioambientais e deixar de ser viável economicamente e vice-
-versa. Isso ocasionaria a falência dela e, consequentemente, a perda
dos investimentos em ações ambientais. Podemos pensar no caso de
uma empresa que, para a elaboração de seus produtos, depende da co-
leta de frutos endêmicos de uma região em que a maioria da popula-
ção vive em situação de pobreza e que historicamente obtém renda da
madeira dessa mesma árvore cortada de maneira ilegal. Se a empresa
simplesmente ignorasse o problema social, ao longo do tempo, a quan-
tidade de árvores e consequentemente de frutos diminuiria e, com isso,
sua receita potencialmente também diminuiria ou a empresa chegaria
até mesmo à inviabilidade econômica. Qual seria uma possível solução?
Tentar conscientizar a população enquanto gera renda para ela, empre-
gando-a na coleta de frutos e pagando um valor considerado adequado
segundo princípios do comércio justo.

Portanto, existe naturalmente uma evidente tensão entre os pila-


res da sustentabilidade que devem ser equilibrados pela empresa.
Cabe a ela administrar e tentar encontrar junto a outros stakeholders
alternativas para gerar valor simultaneamente nos três pilares da sus-
tentabilidade. Ou seja, as empresas devem, sempre que possível, priori-
zar situações conhecidas como “ganha-ganha”.

Por fim, outro aspecto em que o TBL desafia a visão tradicional do


bottom line é que ele reconhece que as empresas devem assumir uma
visão de prazo mais longo em suas decisões. Isso porque, em algumas
decisões de investimento em ações socioambientais que as empresas
fazem, o retorno econômico não será observado em curto prazo, mas,
sim, em médio ou longo prazo. Ou mesmo a empresa deixaria de ganhar
em curto prazo, porém, teria benefícios duradouros, remetendo mais uma

74 Sustentabilidade nas organizações


vez ao conceito de sustentabilidade como algo viável em longo prazo.
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No exemplo citado da empresa que depende dos frutos para a produção


dos seus produtos, provavelmente, a empresa teria de investir recursos
durante algum tempo para fazer um trabalho de contato e comunicação
com as lideranças comunitárias e outras organizações que já atuam na
região, identificar o perfil da população, conscientizar e treinar, para so-
mente então passar a utilizar dessa mão de obra para a coleta dos frutos.
Se a empresa estiver preocupada apenas com o lucro em curto prazo,
provavelmente, essa alternativa seria descartada imediatamente.

A figura 1 resume a importância do TBL para a viabilidade da empre-


sa. Se ela tiver um desempenho socioambiental e econômico ruim, tende
a ser um fracasso total em curto prazo (situação 1). Se, por outro lado,
ela apresentar um bom desempenho em apenas um dos dois aspectos
– socioambiental ou econômico (situações 2 e 3) – a situação tende a
ser insustentável, embora a empresa possa ter algum sucesso em curto
prazo. A situação ideal é quando a empresa tem um bom desempenho
tanto socioambiental quanto financeiramente (situação 4). Essa empresa
tende a ser sustentável e é muito provável que seja duradoura.

Figura 1 – Sustentabilidade: desempenho financeiro e socioambiental


Desempenho econômico-financeiro

Situação 3: Situação 4:
insustentável sustentável
socioambientalmente (seguindo o TBL)

Situação 1: Situação 2:
fracasso insustentável
total financeiramente

Desempenho socioambiental
Conceito de sustentabilidade nas empresas 75
2 Sustentabilidade empresarial

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Na concepção de Elkington, utilizando-se do conceito do TBL, sus-
tentabilidade “é o princípio de assegurar que nossas ações atuais não
limitem o conjunto de opções econômicas, sociais e ambientais de ge-
rações futuras” (ELKINGTON, 1997, p. 20, tradução nossa).

Além da mudança de concepção sobre o que significa “sucesso”


ou, ainda, da mudança de objetivos que uma empresa deve ter, pode-
mos identificar uma alteração clara em alguns pilares ou tendências
da gestão empresarial e mercadológica nas empresas. Essa transição
corresponde a uma mudança dos chamados “negócios tradicionais”
ou “negócios como sempre foram feitos” – da expressão em inglês
business-as-usual – em direção a negócios mais sustentáveis. Algumas
dessas principais tendências estão sintetizadas no quadro 2.

Quadro 2 – Tendências e paradigmas corporativos em relação à sustentabilidade

TENDÊNCIA ANTIGO PARADIGMA NOVO PARADIGMA

Realinhamento das Medidas tradicionais Medidas mais amplas baseadas


expectativas de mercado sobre financeiras e de produto como no TBL como indicativo de
o que é sucesso único indicativo de sucesso sucesso

Investidores/acionistas e Reconhecimento da importância


Relacionamento com
clientes como os stakeholders do diálogo e engajamento com
stakeholders
fundamentais múltiplos stakeholders

Aberta, informando tanto


Fechada, informando apenas o aspectos positivos quanto
Transparência
que é legalmente exigido aspectos a melhorar para
diferentes stakeholders

Fonte: adaptado de Elkington (1997) e Werbach (2010).

Um aspecto fundamental que moldou o comportamento das empre-


sas e tem ajudado a impulsionar a sustentabilidade são as mudanças

76 Sustentabilidade nas organizações


nas expectativas de stakeholders da empresa, sobretudo aqueles que,
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de alguma forma, influenciam no fluxo de recursos que a empresa re-


cebe. Entre esses stakeholders, mencionamos quatro dos principais:
fornecedores, investidores, financiadores e clientes. Segundo Elkington
(1997), a adoção da perspectiva do TBL também passou a ser vista
como forma de atender essa mudança de expectativas.

Primeiro, tendo em vista a integração cada vez maior da cadeia


produtiva, com o estreitamento de laços entre fornecedores e empre-
sa compradora, temos a busca por um melhor desempenho ambiental
como um todo. Por exemplo, de nada adianta uma fabricante de veí-
culos afirmar que é sustentável se seus fornecedores – de aço, vidro e
componentes elétricos, apenas para citar alguns – não estiveram tam-
bém comprometidos com processos que gerem menores impactos so-
cioambientais. O paradigma que se passou a adotar então é o de avaliar
o produto como um todo, desde a origem de seus componentes, e não
somente a empresa que produz o produto final.

Segundo, temos os consumidores finais cada vez mais interessados


em questões de sustentabilidade. Com o aumento significativo do aces-
so da informação, ficou muito mais fácil para os consumidores terem
acesso a dados sobre o desempenho socioambiental das empresas.
Com isso, muitos consumidores passaram também a levar em conta
fatores socioambientais das empresas quando estão escolhendo pro-
dutos ou serviços.

Terceiro, os investidores. Diversos fundos de investimento têm


estabelecido regras de investimento segundo as quais determinada
empresa receberia investimento somente se tivesse determinado de-
sempenho socioambiental. Muitos deles seguem os princípios para o
investimento responsável (PRI), criados pela ONU em 2006 com o apoio
de alguns dos maiores investidores institucionais do mundo. No Brasil,
por exemplo, alguns dos maiores fundos de investimento, como o Previ
do Banco do Brasil, são signatários do PRI.

Conceito de sustentabilidade nas empresas 77


Quarto, as instituições financeiras que oferecem financiamento para

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as empresas, como os bancos, criaram um conjunto de regras para fi-
nanciar projetos levando-se em conta aspectos socioambientais. São
os chamados “Princípios do Equador”, criados em 2002 por iniciativa de
alguns dos maiores bancos do mundo. As empresas que desejam obter
recursos financeiros dessas instituições devem atender em seus proje-
tos aspectos como avaliação dos impactos socioambientais, respeito
aos direitos humanos, gestão do risco socioambiental, entre outros.

Portanto, como se pode perceber, no que tange ao relacionamento


com todos esses stakeholders, a sustentabilidade empresarial exige uma
mudança quanto ao paradigma de transparência da empresa, de fecha-
da para aberta. Como resume Elkington (1997), as empresas não podem
mais simplesmente responder “não é da sua conta” quando questionadas.

Werbach (2010) considera a transparência um dos primeiros passos


para a empresa construir uma estratégia de sustentabilidade. Isso por-
que, com o advento da internet e das tecnologias de informação e co-
municação (TIC), tornou-se muito mais fácil ter acesso a qualquer tipo
de informação. Quando a informação é sonegada por uma empresa,
instrumentos como câmeras e gravadores fazem o trabalho de expô-la
ao mundo, muitas vezes, com consequências gravíssimas à reputação
da empresa em caso de atividades insustentáveis flagrantes.

IMPORTANTE

Algumas empresas adotam uma estratégia de “transparência radical”


quanto ao acesso à informação. Hoje, embora ainda incomum, vemos
algumas delas abrindo suas estruturas de custo, dando informações so-
bre quem são os seus fornecedores e até mesmo reconhecendo pontos
fracos de suas operações em termos socioambientais.

78 Sustentabilidade nas organizações


Cientes da necessidade de transparência, algumas empresas to-
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mam a iniciativa de avaliar o impacto socioambiental de suas atividades


e produtos e de divulgar as informações. Primeiro, como passo inicial
no gerenciamento do problema. Segundo, para construir um diálogo
franco com os diversos stakeholders e transmitir a mensagem: “ainda
temos alguns problemas, porém, estamos engajados em resolvê-los”.
De acordo com Werbach (2010), um esforço proativo de transparência
contribui para engajar diversos stakeholders na busca de soluções para
o processo de construção de uma empresa mais sustentável.

Como resultado desse processo de busca por transparência, as em-


presas têm buscado diferentes canais e ferramentas para divulgar suas
informações. Entre esses padrões, podemos mencionar a realização dos
relatórios de sustentabilidade, como no modelo do relatório de sustenta-
bilidade da GRI1 (Global Reporting Initiative) e a busca por certificações e
auditorias independentes dos produtos e processos da empresa.

3 Sustentabilidade global versus empresarial


Segundo Leonard (2011), podemos classificar a atividade humana
em cinco grandes sistemas: extração, produção, distribuição, consu-
mo e descarte. Esses cinco sistemas são os responsáveis pelos prin-
cipais impactos socioambientais gerados pela humanidade na relação
com dois sistemas mais amplos e fundamentais: a sociedade e o meio
ambiente.

A figura 2 ilustra a relação linear entre os cinco sistemas predomi-


nantes. Esse fluxo linear começa com a extração de recursos e termina
com o descarte.

1 O GRI é uma organização pioneira global criada em 1997 que estabelece diretrizes para uma comunicação
efetiva das iniciativas de sustentabilidade feitas pela empresa, abrangendo o TBL.

Conceito de sustentabilidade nas empresas 79


Figura 2 – Fluxo linear da extração ao descarte

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Extração Produção Distribuição Consumo Descarte

Fonte: adaptado de Leonard (2011).

As empresas, por sua vez, não somente estão envolvidas como são,
em grande parte, as principais responsáveis por moverem a engrena-
gem desses sistemas. Portanto, cabe a elas uma participação ativa e
determinante na busca por uma maior sustentabilidade desses siste-
mas. Idealmente, a alternativa seria um fluxo circular entre os sistemas,
como ilustrado na figura 3.

Figura 3 – Fluxo circular: da extração ao reaproveitamento

Reaproveitamento Extração

Consumo Produção

Distribuição

Fonte: adaptado de Leonard (2011) e Braungart; McDonough (2009).

80 Sustentabilidade nas organizações


Com base no fluxo circular, a concepção altera-se do modelo "do
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berço ao túmulo” para um modelo "do berço ao berço”2 (BRAUNGART;


MCDONOUGH, 2009). Segundo a proposta “do berço ao berço” de
McDonough e Braungart, apresentada em seu livro-manifesto pela
primeira vez em 2002, o que seria descarte em um sistema com fluxo
linear, deixa de sê-lo com a realimentação do sistema, evitando
que haja maior pressão sobre os recursos naturais. Vejamos maio-
res detalhes sobre os cinco sistemas e também alternativas para a
mudança de uma lógica linear para uma lógica circular.

PARA SABER MAIS

O projeto Story of Stuff (história das coisas), coordenado por Annie


Leonard, explica, em vídeos bastante didáticos e cheios de informação,
o ciclo de vida e os fluxos de diferentes produtos muito consumidos no
mundo, como eletrônicos, cosméticos e água engarrafada.
Para saber mais, pesquise sobre Story of Stuff na internet.

3.1 Sistema de extração

O sistema de extração refere-se à obtenção de matérias-primas da


biosfera para a fabricação de produtos ou a prestação de serviços para
atender às necessidades humanas. Esses recursos incluem água, mi-
nerais do solo e subsolo e materiais vegetais. Leonard (2011) exempli-
fica a magnitude da exigência desses recursos, mencionando o caso
da água. Para cultivar o algodão de uma camisa, são necessários em
média 970 litros de água. Para produzir pó de café equivalente a uma
xícara, 136 litros de água.

2 Os autores referem-se a uma analogia para explicar o conceito. O “berço” refere-se ao “nascimento”, isto
é, o processo de fabricação/criação do produto. O “túmulo”, por outro lado, refere-se à “morte”, isto é, o
descarte do produto após o consumo.

Conceito de sustentabilidade nas empresas 81


No caso dos recursos minerais, o grande problema é que eles não

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são renováveis. Pelo menos não numa escala minimamente compatível
com a existência humana: eles levaram milhões de anos para se for-
mar a partir de complexos processos físicos inorgânicos, como calor e
pressão. Como descreve Leonard (2011), os processos de mineração
são dos mais danosos também, envolvendo, muitas vezes, a remoção
de montanhas, resultando em pilhas enormes de dejetos do tamanho
de arranha-céus e gerando a contaminação de solos e mananciais. Do
ponto de vista social, os trabalhadores são expostos a toxinas e sofrem
frequentemente acidentes relacionados a explosões, deslizamentos e
manuseio de equipamentos pesados.

3.1.1 Alternativas mais sustentáveis e rumo a um fluxo circular

As empresas têm de buscar soluções de design, pesquisa e desen-


volvimento para descobrir novos materiais que possam ser usados para
substituir os materiais atualmente utilizados que não são renováveis
e/ou que não podem ser reaproveitados ou reabsorvidos pela nature-
za (não biodegradáveis) de maneira segura e a um menor período de
tempo.

Além disso, é necessário reduzir radicalmente a demanda por esses


recursos aumentando a eficiência e a produtividade do uso, estimulan-
do programas de reutilização e reciclagem e reduzindo a demanda dos
materiais na fabricação dos produtos, o que inclui rever o design dos
produtos.

3.2 Sistema de produção

O sistema de produção relaciona-se à maneira como as matérias-pri-


mas são transformadas para gerar produtos. Incluem produtos finais,
mas também matérias-primas sintéticas como plásticos, poliés­ter e li-
gas metálicas produzidas pela combinação de outras matérias-primas

82 Sustentabilidade nas organizações


existentes naturalmente. De acordo com Leonard (2011), muitos desses
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materiais ainda não foram objetos de estudos sistemáticos para avaliar


os impactos em longo prazo na saúde, inclusive das gerações futuras.

Para além dos componentes dos produtos fabricados, temos de


olhar também para o processo produtivo: qual é a exigência em termos
de energia e água, por exemplo, para a produção da unidade de um pro-
duto? Qual o tratamento pelo qual o produto tem de passar durante sua
produção? Leonard (2011) menciona o caso de um item básico e sim-
ples como o papel: uma das formas de produzi-lo é utilizando o cloro,
elemento químico que auxilia no processo de polpação e branqueamen-
to. O problema é que o cloro, quando combinado a outros componen-
tes, gera certas toxinas com extremo potencial carcinogênico e tóxico.
Outros exemplos de materiais tóxicos utilizados são os metais pesados.

Além da questão ambiental, há o aspecto social. Trabalhadores e


comunidades ao redor de fábricas também estão expostos a toxinas,
seja pelo contato direto, seja por inalação. É comum as fábricas mais
poluentes e que geram maiores impactos ambientais serem instaladas
em comunidades pobres e em países menos desenvolvidos, onde geral-
mente a legislação ambiental é menos rigorosa. Por isso, há quem fale
em “racismo ambiental” (LEONARD, 2011).

3.2.1 Alternativas mais sustentáveis e rumo a um fluxo circular

Algumas empresas estão engajadas em mudar seus sistemas pro-


dutivos de forma a gerar economia de recursos como água, eletricidade
e outras matérias-primas, ao mesmo tempo em que geram menos re-
síduos no processo ou de forma que os resíduos sejam reaproveitados
em outros subsistemas ou sistemas. É o que chamamos de ecoeficiên-
cia (AMATO NETO, 2015).

Um modo de fazer isso é investir em novos processos e em tecnolo-


gias produtivas, que economizem recursos, e desenvolver produtos que
demandem menos recursos e sejam mais sustentáveis. Para ficarmos

Conceito de sustentabilidade nas empresas 83


no exemplo da produção de papel, Leonard (2011) cita que indústrias

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estão empregando alternativas mais sustentáveis ao cloro, que in-
cluem a utilização de oxigênio e ozônio, para obter o mesmo efeito de
branqueamento.

O projeto do produto também é fundamental. Leonard (2011) sinte-


tiza em quatro as características de design que devem ser levadas em
conta pelas empresas ao criarem produtos:

•• Duráveis: não é preciso descartá-los ou substituí-los rapidamente.

•• Reparáveis: fáceis de consertar.

•• Recicláveis: caso não haja mais possibilidade de uso, que possam


voltar para o ciclo inicial e seus componentes sejam reaproveitados.

•• Adaptáveis: fáceis de trocar peças em caso de surgimento de


versões mais modernas/avançadas de componentes.

Outra possibilidade é desenvolver produtos e processos inspirados


na natureza, conceito conhecido como “biomimética”. Esse conceito par-
te do pressuposto de que microrganismos, fauna e flora passaram por
inúmeras evoluções ao longo de milhões de anos, de modo a se adap-
tarem e terem um funcionamento otimizado na biosfera (BRAUNGART;
MCDONOUGH, 2009). Portanto, analisar alguns aspectos desse proces-
so poderia beneficiar o design de soluções mais sustentáveis.

PARA SABER MAIS

O Biomimicry Institute enumera diversos exemplos de soluções desen-


volvidas com inspiração em processos da natureza. Entre eles, pode-
mos citar o desenvolvimento de sistemas de comunicação subaquáti-
cos extremamente eficientes para a detecção e o alerta de tsunamis
inspirados no estudo da forma de comunicação dos golfinhos feito por
uma empresa chamada Evologics. Para saber mais, pesquise sobre o
tema e encontre mais exemplos no site do instituto na internet.

84 Sustentabilidade nas organizações


3.3 Sistema de distribuição
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O sistema de distribuição envolve o transporte, a logística e a comer-


cialização, levando os produtos do local onde foram produzidos até o
consumidor final. É por meio do sistema de distribuição articulado glo-
balmente que, hoje em dia, produtos produzidos em diferentes partes
do mundo vindos via água, terra e ar estão facilmente disponíveis em
prateleiras de quaisquer supermercados aos consumidores.

À medida que várias empresas deixaram de fabricar seus próprios


produtos, terceirizando a produção para países menos desenvolvidos
de mão de obra barata e abundante, elas passaram a se tornar geren-
ciadoras de cadeias. As empresas passam a focar o design do produto,
o gerenciamento das marcas e a distribuição. Com esse movimento,
vieram significativas críticas em termos das práticas, sobretudo de tra-
balho, envolvendo os empregados das fábricas terceirizadas que produ-
zem os produtos.

A empresa cujo logo estampa o produto final deveria ser responsa-


bilizada pelas práticas da sua cadeia produtiva? De forma geral, muitas
pessoas e organizações sem fins lucrativos entendem que sim. E mais:
começou-se a pressionar as empresas para que passassem a fiscali-
zar seus fornecedores. Como resposta, muitas delas atualmente fazem
auditorias em fábricas terceirizadas para atestar as boas práticas. Em
algumas, com práticas mais avançadas, é possível rastrear todo o pro-
cesso produtivo, desde a colheita da matéria-prima, passando pela pro-
dução e a distribuição até o descarte.

Também se tem como objetivo tornar os sistemas de fabricação e


distribuição “enxutos”. Isso significa que a produção e os estoques são
armazenados para atender à demanda imediata. Embora seja interes-
sante do ponto de vista econômico (menores custos de estocagem) e
ambiental (redução de desperdícios), pode ser prejudicial sob o ponto
de vista do trabalhador. Isso porque, como Leonard (2011) explica, o

Conceito de sustentabilidade nas empresas 85


trabalhador perde certa estabilidade ao ter empregos temporários e

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cada vez mais informais, já que seria chamado apenas quando houves-
se demanda para produção nas fábricas.

Em termos de transporte propriamente dito, há as emissões de po-


luentes, como gases de efeito estufa, derivadas do deslocamento de
produtos ao longo do globo e as consequências associadas a ele. No
caso do Brasil, por exemplo, extremamente dependente do modal rodo-
viário de transporte, as emissões de transporte são muito significativas
em relação às emissões totais.

3.3.1 Alternativas mais sustentáveis e rumo a um fluxo circular

Medidas para enfrentar esse grande volume de emissões origina-


das pela distância entre a fabricação de produtos e seu consumidor
incluem a adoção de modais mais limpos, a substituição dos combus-
tíveis empregados por outros energeticamente mais eficientes e que ge-
ram menos emissões, e compensação das emissões, por exemplo, por
reflorestamento.

Outra medida seria privilegiar e incentivar o consumo de produtos


produzidos localmente, o que tenderia a reduzir as emissões logísticas
e facilitaria o contato com o consumidor e o monitoramento das en-
tregas, além do efeito adicional com potenciais impactos de desenvol-
vimento comunitário de manter a renda gerada no local. Esse último
aspecto é muito relevante em países e comunidades de menor renda.

3.4 Sistema de consumo

O consumo move toda a engrenagem do sistema. Todos os siste-


mas de extração, fabricação e distribuição são mobilizados, de certa
forma, pela demanda, os desejos e as preferências dos consumidores.
Por exemplo, se o consumidor tiver como principal demanda o acesso
a produtos a um preço mais baixo, isso pode refletir no esforço das

86 Sustentabilidade nas organizações


empresas em reduzir custos em detrimento de processos e produtos
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menos impactantes ambientalmente, produtos menos duráveis e tam-


bém, de certa forma, do esforço por melhores condições de emprego
aos trabalhadores.

Segundo Leonard (2011), o consumo enquanto símbolo de status e


forma de atendimento de desejos sociais e aspiracionais dos consumi-
dores para além de suas necessidades reais também pode ser um pro-
blema, ao gerar um consumismo exagerado. A relação do consumidor
com os produtos, portanto, também deve ser repensada.

O planeta, atualmente, não comporta o nível de consumo global,


uma vez que a pegada ecológica já está muito além da capacidade re-
generativa do planeta.3 A propósito desse fato, Abramovay (2012, p. 35)
argumenta que é necessário fazer o seguinte questionamento: “produzir
para que e para quem?”. Com efeito, é necessário reduzir o nível de con-
sumo dos países desenvolvidos e abrir possibilidades para que a popu-
lação mais pobre tenha possibilidades de consumo que visem atender
às suas necessidades básicas.

3.4.1 Alternativas mais sustentáveis e rumo a um fluxo circular

As empresas podem educar os consumidores a adquirir os produtos


de maneira mais consciente, de modo a reduzir o impacto do consu-
mo ou a quantidade dele. Nesse sentido, podemos citar o exemplo de
empresas de água e esgoto que fazem campanhas para as pessoas
economizarem água e não descartarem óleo usado na pia para não
contaminar a água.

Outro conceito fundamental é o pós-consumo. As empresas de-


vem oferecer informações aos consumidores sobre como descartar
de maneira segura e correta os produtos, de modo a reduzir o impacto

3 Segundo cálculos do WWF (2013), com metodologia criada pela Global Footprint Network, atualmente, a
humanidade precisa de 1,5 planeta para manter seu estilo de vida atual.

Conceito de sustentabilidade nas empresas 87


ambiental do produto. Em muitos casos, cabe também à empresa ofe-

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recer aos consumidores a opção de devolverem os produtos a ela, para
que dê a destinação adequada a ele. Isso é relevante sobretudo quando
se trata de produtos mais complexos.

PARA PENSAR

A questão da chamada logística reversa é mais relevante quanto mais


complexa for a composição dos produtos. Leonard (2011), em suas
pesquisas sintetizadas no livro A história das coisas, revela, por exem-
plo, que um simples microchip de computador pode conter mais de dois
mil materiais diferentes. Isso indica a complexidade inerente a um pro-
cesso de reciclagem e reaproveitamento de componentes de determina-
dos produtos, o que, certamente, requer cuidados especiais.

Outra mudança mais profunda envolve a proposição por parte das


empresas de uma mudança na relação do consumidor com o produto
ou serviço. Como já explicado, uma das tendências fundamentais é as
pessoas verem no produto ou serviço uma forma de atender suas ne-
cessidades básicas, não como um objeto de status ou algo que deve ser
acumulado desnecessariamente. Soluções baseadas em serviços, em
vez de produtos, começam a se destacar. Por exemplo, existe o clás-
sico caso de lavar roupas em uma lavanderia em vez de adquirir uma
máquina de lavar para a casa, até sistemas modernos, baseados em
tecnologia de informação e comunicação, de compartilhamento de fer-
ramentas e até de carros por várias pessoas.

3.5 Sistema de descarte


Do ponto de vista ambiental, o simples descarte de produtos, rele-
gando-os ao “túmulo”, evidentemente não se trata da melhor escala. Do
ponto de vista econômico, contudo, nem sempre a perda de valor é
consciente.

88 Sustentabilidade nas organizações


Braungart e McDonough (2009) propõem um exercício: se visitás-
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semos um aterro sanitário, encontraríamos uma infinitude de produtos


valiosos que estão sendo desperdiçados, como móveis, tecidos, eletrô-
nicos, plástico, papel e comida. Desses materiais, uma grande parte é
feita de componentes valiosos e requereram grande investimento para
serem extraídos. Outra parte é orgânica e biodegradável e, como tal, po-
deria ter sido utilizada como composto para devolver nutrientes ao solo.

Portanto, o que muitas vezes chamamos de “lixo” ou “descarte” na


verdade são recursos desperdiçados. Idealmente, deveríamos conside-
rar como lixo apenas aqueles resíduos que não podem ser reutilizados
sob nenhuma hipótese. Nessa seara, podemos incluir resíduos conta-
minados (como lixo hospitalar) e metais pesados.

3.5.1 Alternativas mais sustentáveis e rumo a um fluxo circular

As soluções em relação ao sistema de descarte podem ser resumi-


das em torno dos 4 Rs, de acordo com Amato Neto (2015):

•• Reduzir: diminuir a quantidade de matéria usada nos produtos e


serviços, adotando uma mentalidade enxuta.

•• Reutilizar: dar uma nova utilidade para o produto, sem ter de


reprocessá-lo.

•• Reciclar: aproveitar a matéria-prima do produto para processá-


-lo e empregá-lo mais uma vez em outros produtos. Caso não
seja possível reempregá-lo em um produto, uma solução é rein-
tegrá-lo à natureza.

•• Remanufaturar: surge como uma terceira alternativa relacionada


à reciclagem e pode ser considerada em produtos mais comple-
xos. Envolve triagem de material, desmontagem e remontagem
de produtos para aproveitar alguns de seus componentes.

Conceito de sustentabilidade nas empresas 89


NA PRÁTICA

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Existe um número cada vez maior de empresas que estão ganhando di-
nheiro com a destinação certa ou o reaproveitamento de resíduos. Ape-
nas para citar dois exemplos, temos a empresa B2Blue, que tem uma
plataforma para conectar empresas que geram resíduos que podem ser
utilizados por outras empresas. De acordo com Pereira (2016), esse pro-
cesso se insere dentro da chamada Ecologia Industrial, em um processo
de comensalismo industrial.

A abordagem desses sistemas é apenas exemplificativa dos desa-


fios encontrados e dá conta de uma ínfima parte de toda a complexida-
de envolvida na produção de centenas de milhares, talvez milhões de
produtos que consumimos. De fato, cada produto, tecnologia e proces-
so produtivo deve ser entendido a fundo e considerado em relação a sua
respectiva particularidade. No entanto, é preciso ter em mente que as
empresas, juntamente dos mais diversos stakeholders, devem ter uma
visão abrangente e sistêmica na busca por soluções para enfrentar a
insustentabilidade atual das atividades humanas.

Considerações finais
Neste capítulo, compreendemos que a sustentabilidade empresarial
pode ser caracterizada pela busca equilibrada de três resultados, o cha-
mado triple bottom line (TBL), ou tripé da sustentabilidade: o social, o
ambiental e o econômico. Assim, as empresas devem sempre dar prefe-
rência às chamadas situações de “ganha-ganha”, em que os três pilares
da sustentabilidade sejam contemplados.

Abordamos também importantes mudanças pelas quais as organi-


zações passaram e estão passando que apontam para a sustentabilida-
de empresarial como uma tendência crescente e sem volta. Atualmente,
a busca pela sustentabilidade passou a ser vista como parte do manual
de boas práticas sobre como gerenciar negócios.

90 Sustentabilidade nas organizações


Enquanto algumas soluções empresariais relacionadas à busca por
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uma sustentabilidade global tendem a trazer resultados óbvios quanto


ao TBL – como é o caso da ecoeficiência –, há outras situações mais
desafiadoras, que requerem e requererão respostas mais complexas
e menos óbvias por parte das empresas – é o caso do sistema de
extração.

Essa situação remete a duas mudanças fundamentais que devem


ser feitas. A primeira delas é a proposição sobre como transformar um
sistema linear de extração-produção-distribuição-consumo-descarte
para um sistema circular, em que o sistema de descarte deixa de ser
o fim do sistema para se tornar o recomeço de um fluxo baseado em
um sistema circular.

A segunda mudança é como propiciar a pessoas que não estejam


tendo acesso a muitos dos produtos e serviços que geram bem-estar
comecem a ter acesso a eles. Essa é uma necessidade imperativa e
deve ser feita considerando-se um mundo em que o uso dos recursos
naturais já está acima da capacidade de regeneração. Portanto, há uma
evidente necessidade de mudança de valores em relação a um sistema
de produção e consumo mais consciente, sobretudo por parte das em-
presas e dos consumidores mais afluentes.

Referências
ABRAMOVAY, Ricardo. Muito além da economia verde. São Paulo: Editora Abril,
2012.

AMATO NETO, João. A era do ecobusiness: criando negócios sustentáveis.


Barueri: Manole, 2015.

BRAUNGART, Michael; MCDONOUGH, William. Cradle to cradle: re-making the


way we make things. London: Vintage Books, 2009.

ELKINGTON, John. Cannibals with forks: the triple bottom line of 21st century.
Oxford: Capstone, 1997.

Conceito de sustentabilidade nas empresas 91


LEONARD, Annie. A história das coisas: da natureza ao lixo – o que acontece

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
com tudo o que consumimos. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

PEREIRA, Alessandro Sanches. Ecologia industrial. São Paulo: Senac, 2016.

WERBACH, Adam. Estratégia para sustentabilidade: uma nova forma de plane-


jar sua estratégia empresarial. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

WORLD WIDE FUND FOR NATURE (WWF). Pegada ecológica: nosso estilo
de vida deixa marcas no Planeta. Cartilha Brasil. Brasília: WWF-Brasil, 2013.
Disponível em: <https://d3nehc6yl9qzo4.cloudfront.net/downloads/cartilha_
pegada_ecologica.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2018.

92 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 5
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Novas ferramentas
e modelos: atuação
responsável

O desenvolvimento de um comportamento proativo das empresas


quanto à sustentabilidade, sobretudo a partir da década de 1980, tem
como um de seus componentes principais o desenvolvimento de diver-
sas iniciativas voluntárias por parte delas, indicando maior responsabi-
lidade quanto à conduta empresarial.

Neste capítulo, conheceremos os principais conceitos, estruturas e


práticas empresarias relativas à atuação responsável (Responsible Care),
explorando o contexto de seu surgimento e principais práticas, com
ênfase nos sistemas de saúde e segurança do trabalho (SST).

93
1 Contexto de surgimento (programas de

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atuação responsável, ou Responsible Care)
Por décadas, apenas seguir as leis era suficiente para a empresa ser
considerada responsável em termos de sua atuação em relação à te-
mática socioambiental. Contudo, na década de 1980, após passarem
a ser questionadas frequentemente sobre sua conduta por diversos
stakeholders, como governos, ONGs, instituições de pesquisa, consumi-
dores, empregados, entre outros, muitas empresas passaram a adotar
normas que visam regular o comportamento coletivo em direção a uma
atuação responsável (HOWARD; NASH; EHRENFELD, 2000). Segundo
Orsato (2012), isto marca uma mudança na conduta das empresas de
uma posição reativa e defensiva, para uma posição mais proativa. Essa
atuação materializa-se no desenvolvimento das chamadas iniciativas
socioambientais voluntárias por parte das empresas, conhecida tam-
bém como sendo uma forma de “regulação privada”, sobretudo por en-
volverem uma coletividade de empresas (PRAKASH, 2000).

As empresas perceberam que iniciativas individuais de determina-


das empresas teriam o efeito de prejudicar a totalidade das empre-
sas, seja em termos de prejuízos reputacionais, seja em termos de
exigências legais mais severas impostas à indústria como um todo
(BARNETT; KING, 2008). Esta situação ficou clara no caso da criação
do programa de atuação responsável, ou Responsible Care, por parte
do conjunto das principais empresas da indústria química – primeiro
no Canadá em 1985 e depois nos EUA em 1988, como destaca Prakash
(2000). Esta iniciativa foi feita em parte como resposta à grande piora
na imagem das empresas do setor. Segundo pesquisas mencionadas
por Howard, Nash e Ehrenfeld (2000), a indústria química tinha a pior
imagem em termos ambientais e a segunda pior em termos de saúde.
Esta imagem foi gradativamente deteriorando após sucessivos aci-
dentes ambientais em que empresas químicas estiveram envolvidas.
Dentre esses acidentes, destaca-se o desastre de Bhopal, na Índia em

94 Sustentabilidade nas organizações


1984, que vitimou centenas de milhares de pessoas, ocasionando em
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mortes e danos duradouros à saúde de empregados e comunidade do


entorno após episódio de vazamento de gás de uma fábrica de pesti-
cida da empresa Union Carbide.

O Responsible Care foi estruturado em torno de dez princípios e seis


códigos de conduta que, por sua vez, se desdobram em mais de 100
práticas de gestão. Os códigos de conduta foram desenvolvidos gra-
dativamente entre 1989 e 1992 e se estruturam em torno da preocupa-
ção das empresas em termos de práticas de Saúde, Meio Ambiente e
Segurança (SMS) (PRAKASH, 2000).

Acompanhe um breve resumo dos seis códigos de conduta do


programa de Responsible Care (PRAKASH, 2000; SCIC, s. d.):

•• Consciência de comunidade e resposta à emergência: as empre-


sas se comprometem a se comunicar de maneira transparente
com a comunidade sobre aspectos de SMS nas suas plantas (ou
fábricas); também garantem que cada planta possui um plano de
emergência preparado para responder de maneira eficaz e rápida
a quaisquer emergências.

•• Prevenção da poluição: as empresas se comprometem a reduzir


ou mesmo eliminar resíduos derivados de suas operações.

•• Segurança de processo: as empresas se comprometem a preve-


nir acidentes e situações de risco ao assegurar instalações ade-
quadas e que sejam frequentemente reavaliadas.

•• Distribuição: as empresas se comprometem a minimizar ris-


cos derivados do manuseio, armazenagem e de químicos para
transportadores, clientes, prestadores de serviços, empregados
e meio ambiente.

•• Saúde e segurança do empregado: as empresas se compro-


metem a identificar e avaliar riscos e prevenir situações de

Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 95


insegurança aos trabalhadores e prover informações e treina-

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mento para protegê-los.

•• Proteção/segurança do produto (product stewardship): as em-


presas se comprometem a desenvolver novos produtos e pro-
cessos que sejam saudáveis, seguros e ambientalmente cons-
cientes desde a produção, passando por transporte, manuseio,
venda e descarte.

Desta forma, além de um clamor por uma atuação mais proativa das
empresas quanto à preservação do meio ambiente, que diz respeito à
sociedade como um todo, ocorreu em paralelo também a busca pela
saúde e segurança de públicos mais próximos e mais diretamente afeta-
dos pelas operações das empresas: os empregados e a comunidade no
entorno das instalações das empresas (HOWARD; NASH; EHRENFELD,
2000). No Brasil, a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim)
lançou o programa Atuação Responsável em 1992, desenvolvido com
base no modelo americano.

O Responsible Care lançou essa tendência do cuidado responsá-


vel, que, gradativamente, foi se espalhando para inúmeras outras in-
dústrias. Por exemplo, em 2008, a Federação Brasileira dos Bancos
(Febraban) lançou um conjunto de normas de autorregulação do qual
19 bancos são signatários, incluindo os maiores bancos do Brasil. Em
2013, a Associação Brasileira de Indústrias Têxteis e de Confecção
(Abit) também lançou seu próprio código de conduta. Outra forma
de regulação voluntária são as certificações, mecanismos em que
as empresas se comprometem a seguir certas práticas em troca de
reconhecimento público de seus produtos. Nesse sentido, podemos ci-
tar o caso do Conselho de Manejo Florestal (FSC – Forest Stewardship
Council), criado em 1994 e destinado a empresas do setor florestal e de
papel e celulose.

96 Sustentabilidade nas organizações


NA PRÁTICA
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Prakash (2000) discute algumas dificuldades e limitações das iniciati-


vas socioambientais voluntárias assumidas coletivamente pelas em-
presas. Primeiro, em alguns casos, determinada empresa participante
de uma dessas iniciativas pode assumir um comportamento oportunis-
ta. Isso ocorre quando ela não cumpre os compromissos assumidos,
sobretudo quando não há acompanhamento e auditoria próximos por
parte da coletividade das empresas e, a despeito disso, se aproveita de
uma eventual reputação ou ganho de imagem adquirido por estar parti-
cipando dessa iniciativa coletiva. Outras críticas possíveis são a falta de
monitoramento efetivo se as empresas estão desenvolvendo ou não as
práticas e potenciais dificuldade de implantação das práticas por parte
de pequenas empresas, já que muitas vezes há demanda de um volume
considerável de recursos.

2 Conceitos e práticas
Na esteira do desenvolvimento de programas de atuação responsá-
vel, destacam-se particularmente as iniciativas ambientais voluntárias
coletivas, que consistem em normas de conduta construídas conjun-
tamente e assumidas por diferentes empresas, geralmente das mes-
mas indústrias – por entidades setoriais, como o caso da Atuação
Responsável, coordenado pela Abiquim. Essas iniciativas ocorreram
e ainda ocorrem em grande parte para lidar com as críticas sofridas
após episódios considerados de má conduta ou negligência em relação
a aspectos socioambientais, seja por empresas específicas de deter-
minada indústria, seja pela indústria como um todo (BARNETT; KING,
2008), como abordamos no caso do Responsible Care. Diferentemente
da legislação convencional, elas se caracterizam por não implicarem
penalização para as empresas em caso de não realização das práticas
com as quais se comprometeram. Por isso, podem ser consideradas
uma forma de “regulação suave” (ORSATO, 2012).

Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 97


De fato, algumas empresas passam a efetivamente assumir uma

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atuação responsável até mesmo como forma de evitar que os governos
tomem a iniciativa de impor regulações mais restritivas. Orsato (2012)
menciona o exemplo da criação do Conselho Empresarial Mundial para
o Desenvolvimento Econômico (WBCSD – World Business Council For
Sustainable Development), uma das primeiras iniciativas voluntárias
empresariais que envolvem empresas de diferentes indústrias, surgida,
entre outros motivos, como resposta à ameaça de regulações mais exi-
gentes por parte dos governos que haviam participado recentemente
da Eco-92 (ou Rio 92). Isso evidencia outra característica desse tipo de
iniciativa, notadamente o fato de não terem um controle centralizado,
mas, sim, terem seu conjunto de regras estabelecido por uma coletivi-
dade de atores.

Outra característica desse tipo de iniciativa como o Responsible


Care, conforme relatam Howard, Nash e Ehrenfeld (2000), é que não
são estabelecidos padrões de desempenho, isto é, o que importa é o
compromisso por parte da alta gestão quanto à adoção de determina-
das condutas, não a prática específica que cada empresa conduz ou
mesmo qual padrão de desempenho a empresa precisa atingir que seja
considerado adequado.

A despeito de o objeto dessas iniciativas voluntárias direcionar-se


para a atuação das empresas, diferentes atores podem ser responsáveis
por sua construção e proposição. Orsato (2012) aponta que há iniciati-
vas que são propostas apenas por empresas, iniciativas propostas por
ONGs e até mesmo iniciativas voluntárias propostas por governos. No
entanto, destacam-se as iniciativas voluntárias do tipo multistakeholders,
isto é, aquelas propostas por mais de um ator ou parte interessada.

Das iniciativas socioambientais voluntárias construídas apenas por


empresas, podemos citar o WBCSD, o Responsible Care e códigos de
conduta de algumas indústrias. Como já abordado, esses códigos têm
um forte apelo por construir uma reputação positiva e evitar reputação

98 Sustentabilidade nas organizações


negativa para a indústria pela atuação de empresas individuais e tam-
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bém como forma de a indústria como um todo se mostrar proativa para


evitar regulações mais restritivas a serem impostas pelo governo.

Quanto a iniciativas voluntárias propostas apenas pelo governo para


as empresas, podemos mencionar dois exemplos brasileiros. Uma de-
las é a instituição do IPTU verde por prefeituras de diferentes estados
do Brasil. Por exemplo, como cita Dafné (2017), a prefeitura de Salvador
oferece desconto de até 10% no valor do Imposto Predial Territorial
Urbano (IPTU) para empresas que construírem ou adaptarem edifica-
ções com tecnologias consideradas mais sustentáveis, como captação
de água das chuvas, telhado verde, sistema de captação de energia
solar, entre outras. Outra iniciativa semelhante é o Programa Empresa
Cidadã, do Governo Federal, que oferece redução no imposto de renda
às empresas que estenderem em 60 dias o tempo de licença materni-
dade às suas empregadas (BRASIL, 2016).

Em termos de iniciativas propostas por ONGs, podemos citar o


Balanço Social lançado em 1997 pelo Instituto Brasileiro de Análises
Sociais e Econômicas (Ibase), que tem como objetivo esta­
belecer
um padrão de divulgação pública de informações sobre os inves-
timentos e o desempenho das empresas em relação a questões
socioambientais (LOUETTE, 2008).

Em termos de iniciativas propostas em conjunto entre empresas


e governo, podemos citar o caso de código de conduta em relação à
segurança e à saúde no trabalho. É o caso do Código de Práticas em
Segurança e Saúde em Minas Abertas, aprovado em 2017 e destinado a
empresas do setor de mineração (ILO, 2017). Como se encontra escrito
no referido código, ele não é legalmente vinculante e não substitui leis
e tratados nacionais. Antes, serve como guia de princípios gerais e re-
comendações sobre as melhores práticas. Ele foi construído por uma
comissão composta por oito especialistas apontados pelo governo, oito
por empresas e oito por entidades representativas de funcionários.

Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 99


Outra iniciativa multistakeholder é o protocolo GHG de emissões, que

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define padrões para o levantamento e o relato das emissões de gases
de efeito estufa. Sua criação e gestão é feita pelo Instituto de Recursos
Mundiais (WRI – World Resource Institute), contando com a colaboração
de ONGs, empresas, governos, associações de empresas, universidades,
entre outros stakeholders relevantes. No Brasil, a versão nacional é coor-
denada pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade (CES) da Fundação
Getúlio Vargas (FGV).

Por fim, Paton (2000) reconhece que muitas vezes iniciativas


socioam­bientais voluntárias por parte das empresas, com todas as suas
limitações, tendem a ser menos eficazes do que regulações por parte do
governo. No entanto, o autor aponta que essas iniciativas podem ser im-
portantes como complemento a regulações governamentais, sobretudo
em temas emergentes sobre o qual ainda estão ocorrendo discussões
sobre qual é a melhor forma de regular e/ou instituir políticas públicas.

3 Sustentabilidade e sistemas de saúde e


segurança no trabalho (SST)
Iniciativas como o Responsible Care serviram e ainda servem como
referência a sistemas de saúde e segurança no trabalho (SST). Com o
surgimento dessas iniciativas, o cuidado com o bem-estar do trabalha-
dor, em termos de segurança e saúde, passou a ser visto como impor-
tante e de responsabilidade compartilhada entre trabalhador e empresa.

Isso porque, como apresenta a Organização Internacional do


Trabalho (OIT, 2009), acidentes ou doenças relacionadas à SST podem
trazer graves consequências negativas para ambos. Para o empregado,
entre os prejuízos, por exemplo, há a possível perda do emprego ou da
capacidade de trabalhar e os custos com os cuidados de saúde. Para o
empregador, podem-se citar as despesas médicas e as indenizações, a

100 Sustentabilidade nas organizações


interrupção da produção e uma possível deterioração das relações com
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diversos stakeholders, como empregados, clientes e comunidades.

Assim, para evitar essas ocorrências, diversas normas e procedi-


mentos de SST passaram a ser criados de acordo com o tipo de in-
dústria da empresa – seja química, de construção civil ou turismo – e
também de acordo com a natureza do trabalho e com a área em que
o empregado atua. Assim, empregados que trabalham no escritório,
por exemplo, são objetos de preocupação com questões relativas à
ergonomia em relação a mesa de trabalho, cadeira, computadores,
entre outros, ao passo que trabalhadores da área produtiva que ope-
ram máquinas são objetos de cuidados geralmente mais extensos,
que vão desde equipamentos de proteção individual (EPIs), como
luvas e capacetes, uniformes, circulação nas áreas, entre muitos ou-
tros aspectos. Existem casos ainda mais específicos, por exemplo,
de trabalhadores com deficiência que requerem ajustes para a aces-
sibilidade ao cargo, que incluem adaptações no mobiliário, prediais
(como rampas de acesso) e tecnologias assistivas1 (como softwares
para operação de microcomputadores). Portanto, para fins de saúde e
segurança no trabalho, cada cargo e até mesmo trabalhador deve ser
analisado individualmente.

Vamos ao histórico da evolução das políticas e práticas de SST no


Brasil, bem como a forma como pode ser implementada ao estudarmos
uma das principais ferramentas de SST no mundo, a Série de Avaliação
da Saúde e da Segurança do Trabalho (OHSAS – Occupational Health
and Safety Assessments Series).

1 Segundo Bersch (2017), tecnologia assistiva é um termo ainda novo utilizado para identificar todo o arsenal
de recursos e serviços que contribuem para proporcionar ou ampliar habilidades funcionais de pessoas com
deficiência e consequentemente promover vida independente e inclusão (BERSCH, 2017, p. 2).

Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 101


3.1 Breve histórico: dos primórdios até a consolidação

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No Brasil, Chaib (2005) traça um breve histórico das normas de saú-
de e segurança do trabalho. Essa preocupação começou a ocorrer a
partir da década de 1970, quando ocorreram as primeiras pesquisas
sobre saúde e segurança ocupacional sob a coordenação de órgãos
ligados ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)2 criados especifica-
mente para esse fim, notadamente, a Fundacentro.3 Houve também a
publicação das primeiras legislações, portarias e regulamentações rela-
tivas à temática que contribuíram para melhores condições de trabalho.
O foco ainda era mais na fiscalização dos acidentes ocorridos do que na
prevenção de ocorrências.

Nas décadas de 1980 e 1990, Chaib (2005) relata que ocorreu uma
significativa evolução em termos de práticas e normas, sobretudo com
o advento do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA)
(norma regulamentadora no 9), que visa reconhecer, antecipar, avaliar
e controlar potenciais riscos no ambiente de trabalho; e com o advento
do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) (nor-
ma regulamentadora no 7), que visa promover e preservar a saúde dos
trabalhadores. Outro importante fato também foi a criação da chamada
Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa) (norma regulamen-
tadora no 5), que visa alçar aos trabalhadores a corresponsabilidade por
conscientizar e promover um ambiente de trabalho com menores riscos
e mais saúde. De fato, como argumenta Ponte Júnior (2014), originou-
-se o termo saúde, meio ambiente e segurança (SMS) ou, em alguns ca-
sos, adicionando-se o “Q” de qualidade, o termo QSMS. Nesse sentido,
como destacam Howard, Nash e Ehrenfeld (2000), o Responsible Care

2 A partir de 2019, após a eleição presidencial de Jair Bolsonaro, o MTE foi extinto, ficando suas atribuições
a cargo da Secretaria de Trabalho, criada pelo governo federal e vinculada ao Ministério da Economia.

3 Presente em todo o Brasil, a Fundacentro foi criada em 1966 para ser um órgão governamental focado
exclusivamente na temática de saúde e segurança ocupacional. Ele está alinhado com as recomendações
propostas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

102 Sustentabilidade nas organizações


trata-se de uma das iniciativas voluntárias precursoras na direção da
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integração de aspectos de SMS.

No final da década de 1990, mais especificamente em 1999, Chaib


(2005) aponta que, após uma grande demanda e mobilização por
parte das empresas, foi finalmente consolidada uma norma interna-
cional destinada especificamente à criação de sistemas de gestão
de saúde e segurança no trabalho. Trata-se da série de avaliação da
saúde e segurança do trabalho, do inglês occupational health and
safety assessement series (OHSAS 18001). Dada sua importância para
as organizações enquanto ferramenta de SST, veremos em maiores
detalhes algumas de suas características.

IMPORTANTE

A Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2009, p. 2) lista alguns


dos riscos aos quais os trabalhadores podem estar sujeitos:

• poeiras;

• gases;

• ruídos;

• vibrações;

• temperaturas extremas.

Ponte Júnior (2014) argumenta que há a tendência de que a temá-


tica de SST se torne mais abrangente e completa. Isso inclui, na visão
do autor, uma possível tendência da migração da abordagem de SMS e
QSMS para uma abordagem mais ampla, de gerenciamento de riscos.
Ao gerenciar riscos, as empresas reconhecem uma maior variedade
de especialidades envolvidas na temática e reconhece que o objetivo
da empresa não seria garantir a segurança – por não ser efetivamente
possível –, mas ter uma atuação cuidadosa, de forma que haja uma

Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 103


minimização dos riscos e de suas consequências. Entre as especialida-

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des envolvidas nessa nova abordagem, a engenharia passa a ser acom-
panhada por outras especialidades diversas, como saúde, tecnologia,
comportamento humano, biologia e meio ambiente. Algumas dessas
preocupações multidisciplinares mencionadas por Ponte Júnior (2014)
incluem:

•• análise de riscos biomecânicos;

•• análise de riscos do trabalho repetitivo;

•• demanda de trabalho psicológico – estresse e fadiga;

•• estresse ambiental – temperatura, ambiente visual, sons, ruídos


e vibrações;

•• processamento humano da informação e carga de trabalho mental;

•• erros humanos;

•• análise de acidentes e segurança;

•• projeto de painéis e controles operacionais.

3.2 A OHSAS

A OHSAS foi desenvolvida de forma a ser compatível com outras


normas relacionadas, como a ISO 9001 – voltada ao sistema de qua-
lidade como um todo – e a ISO 14001 – voltada ao sistema de gestão
ambiental (SGA). Isso ocorre em grande parte pelo fato de elas serem
muitas vezes implementadas em conjunto e se basearem nos princí-
pios de qualidade e melhoria contínua.

Em termos de objetivos, a OHSAS 18001 serve a empresas que te-


nham interesse em (OHSAS, 2007, p. 1):

104 Sustentabilidade nas organizações


• estabelecer um sistema de gestão de SST destinado
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a eliminar ou minimizar o risco para os trabalhadores e


outras partes interessadas que possam ser expostos a
riscos para a SST associados às atividades da empresa;

• estabelecer, implementar, manter e melhorar um


sistema de gestão da SST;

• assegurar-se da sua conformidade com a política de SST.

Destacam-se, nesses objetivos, a menção não somente aos traba­


lhadores, como também às partes interessadas, reconhecendo-se o
papel das empresas como ente importante e responsável pelo meio
ambiente e a comunidade ampla em que estão inseridas.

Quanto aos componentes da OHSAS 18001, destacamos alguns


dos principais (OSHAS, 2007):

•• Política de SST: é necessário definir e instituir uma política de


SST na empresa, caracterizada por ser um conjunto de intenções
e orientações gerais. Ela deve ser discutida, documentada, imple-
mentada e revisada periodicamente, além de estar disponibiliza-
da aos stakeholders.

•• Identificação de perigos, avaliação de riscos e determinação de


medidas de controle: a empresa deve implementar, manter e atua­
lizar procedimentos proativos para a identificação de perigos e
avaliação de riscos. Esses perigos e riscos estão relacionados a:
atividades rotineiras ou não dos empregados; pessoas que visi-
tam ou circulam pela área esporadicamente; procedi­mentos de
trabalho, infraestrutura, equipamentos e materiais manipulados
pela empresa; perigos criados na vizinhança das instalações das
empresas por atividades da empresa. Além disso, a empresa pre-
cisa implementar medidas de controle dos perigos e riscos. Isso

Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 105


inclui atividades como: eliminar e substituir procedimentos, equi-

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pamentos, materiais ou instalações; instituir controles de enge-
nharia; desenvolver sinalização/advertência e/ou controles admi-
nistrativos; fornecer equipamentos de proteção individual (EPIs)
aos empregados.

•• Objetivos de SST: a empresa deve implementar e manter objeti-


vos de SST consistentes com a política de forma a abranger diver-
sos níveis e funções relevantes e documentá-los. Esses obje­tivos
podem incluir: prevenção de lesões, ferimentos e danos à saúde,
cumprimento de requisitos legais e outros voluntários assumidos
pela empresa. Eles também devem ser mensuráveis (quantitativa-
mente, de preferência) e prever responsabilidades (por exemplo, do
supervisor operacional ou da engenharia de segurança), meios (em
termos de recursos humanos, financeiros, tecnológicos e operacio-
nais) e prazos de realização.

•• Implementação: trata-se de colocar em prática políticas e proce-


dimentos de SST. Deve contar com o apoio fundamental da alta
administração da empresa (diretoria e presidência), de forma a
assegurar os recursos necessários e também instituir e comu-
nicar responsabilidades, obrigações e autoridades. Relatórios
sobre o desempenho de SST também devem ser elaborados e
compartilhados com a alta administração para que eventuais
mudanças necessárias sejam feitas, visando a uma melhoria
contínua.

•• Competência, formação e sensibilização: todos os funcionários


envolvidos em atividades de risco ou perigosas e/ou impactados
por elas devem receber adequado treinamento e desenvolver
competência suficiente para executar suas atribuições de modo
a ter consciência sobre a importância de sua atuação e a manter
um desempenho individual que contribua para controlar esses
riscos e perigos.

106 Sustentabilidade nas organizações


•• Comunicação, participação e consulta: a empresa deve comu-
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nicar os riscos relacionados à SST internamente (para os vários


níveis e diferentes funções) e externamente (para subcontrata-
dos e visitantes nos locais de risco). No que tange a stakeholders
externos, a empresa deve receber, documentar e responder comu-
nicações relacionadas a esses riscos. Além disso, a empresa deve
consultar e chamar empregados e subcontratados para participar
de todos os assuntos relacionados à construção e à revisão de
aspectos relacionados à SST.

•• Preparação e resposta a emergências: refere-se à tomada de


medidas pela empresa para identificar o potencial para situações
de emergência e a forma como responderá a essas situações.

•• Auditoria interna: consiste em realizar procedimentos com base


em frequência e seguindo critérios previamente definidos para
verificar se a política e o sistema de gestão de SST estão sen-
do implementados conforme planejado e se estão sendo bem-
-sucedidos sem atender às políticas e aos objetivos da empresa.
Posteriormente, de acordo com os resultados da auditoria, mu-
danças podem ser propostas, visando a um aprimoramento.

Por fim, como iniciativa socioambiental voluntária, a OHSAS, embora


abranja alguns requisitos legais, não substitui e não é sinônimo de um
estrito cumprimento da lei. Em realidade, ela foi construída para dar di-
retrizes suficientemente abrangentes a todas as empresas. Com isso,
as empresas, a depender, por exemplo, da indústria de atuação, da com-
plexidade das operações, do porte e de outros fatores, devem adaptar
seus próprios sistemas às suas particularidades.

IMPORTANTE

Embora a OHSAS 18001 seja ainda a norma internacional mais utilizada


pelas empresas e profissionais de SST, em março de 2018, foi lançada
a norma ISO 45001, que veio para, gradativamente, substituí-la. A ISO

Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 107


45001, de fato, caminha em direção a uma visão de gerenciamento de

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riscos, seguindo a tendência apontada por Pontes Júnior (2014).

Considerações finais
Neste capítulo, estudamos iniciativas socioambientais voluntárias
desenvolvidas pelas empresas, práticas que começaram a expressar
a busca por atitudes mais proativas em termos de cuidados com o
meio ambiente, a saúde e a segurança. Especificamente, abordamos
o Responsible Care, desenvolvido pela indústria química na década de
1980, que, por ser uma das precursoras, influenciou o desenvolvimento
de iniciativas surgidas posteriormente.

Sobre as iniciativas socioambientais voluntárias, exploramos algu-


mas de suas principais características, como o fato de servirem como
um sistema de autorregulação por parte das empresas, geralmente
serem feitas coletivamente, não haver prescrições estabelecidas so-
bre como as empresas devem se comportar e também o fato de o
controle não ser feito de maneira muito estrita, até mesmo por não se
tratar de uma regulação governamental. Além disso, citamos exem-
plos para mostrar que as iniciativas socioambientais voluntárias dire-
cionadas à atuação empresarial podem ser propostas por diferentes
stakeholders, como as próprias empresas, governos, ONGs, institui-
ções de pesquisa, entre outros.

Por fim, exploramos em maior profundidade práticas e políticas de


saúde e segurança de trabalho (SST), iniciativas muitas vezes voluntá-
rias focadas na atuação responsável das empresas, sobretudo, para
dois públicos principais: os trabalhadores e as comunidades ao redor
das empresas. Sobre os sistemas de SST, exploramos em maiores

108 Sustentabilidade nas organizações


detalhes a OHSAS, principal norma mundial existente e adotada por em-
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presas de diferentes indústrias.

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Novas ferramentas e modelos: atuação responsável 109


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110 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 6
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Novas ferramentas
e modelos:
ecoeficiência –
Parte 1

O sucessivo crescimento econômico e o aumento populacional e de


renda experimentados sobretudo a partir do século XX evidenciaram o
desafio cada vez mais presente que a humanidade vem enfrentando
para sustentar e ampliar a produção e o consumo de produtos e servi-
ços ao mesmo tempo em que enfrenta um contexto de limitações dos
recursos naturais. Diante desse desafio, soluções aludidas desde a dé-
cada de 1970, de limitação de crescimento econômico e populacional,
até as mais recentes, que propõem um aumento radical da produtivida-
de no uso dos recursos naturais, têm surgido. Nessa esteira, o conceito
de ecoeficiência têm se destacado, principalmente quando se trata do
âmbito empresarial.

111
Neste capítulo, conheceremos os principais conceitos, estruturas e

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práticas empresarias relativos à ecoeficiência, com enfoque na con-
servação de recursos naturais, partindo da exploração do seu históri-
co de surgimento.

1 Contexto de surgimento
Na esteira das discussões sobre desenvolvimento sustentável e
sustentabilidade, sobretudo com base em debates sobre os limites do
crescimento, a questão da limitação da quantidade e da disponibilidade
dos recursos naturais para sustentar uma população crescente e com
um padrão de consumo e renda também crescentes tornou-se patente.
Nesse contexto, como estamos em um planeta finito e com recursos
exauríveis, para conseguir atender esse grande aumento de demanda
por recursos naturais, soluções que proponham uma maior produção,
com consumo igual ou menor de recursos, estão se tornando cada vez
mais relevantes.

À medida que os recursos se tornam gradativamente limitados, tan-


to mais custoso é para as empresas produzirem os produtos e serviços
que consumimos. É a incontornável “lei da oferta e demanda”: quanto
menor é a oferta de recursos disponíveis, maior é o seu preço. Portanto,
seja por consciência ambiental, seja por uma questão puramente eco-
nômica, as empresas passaram a se preocupar com a eficiência ou pro-
dutividade1 dos recursos que utilizam para a produção dos produtos ou
serviços. Ser mais eficiente, portanto, é sinônimo de ser mais econômi-
co para as empresas. É o que propõe o conceito de ecoeficiência.

1 Em linhas gerais, no contexto empresarial, a produtividade, ou eficiência, refere-se à quantidade de recursos


(horas de trabalho, máquinas e matérias-primas, etc.) necessária para a produção de uma unidade de produto/
serviço. Lehni (2000) faz referência ao entendimento da OCDE segundo a qual ecoeficiência pode ser calculada
pela divisão entre as saídas, ou outputs (o valor dos produtos e serviços produzidos por uma empresa, setor
ou economia), e as entradas, ou inputs (a soma das pressões ambientais geradas pela empresa, o setor e a
economia).

112 Sustentabilidade nas organizações


De acordo com Lehni (2000), a ideia por trás do conceito de ecoefi­
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ciência remete à década de 1970, quando algumas empresas come-


çaram a perceber que, ao reduzirem desperdícios, geravam economia
de recursos. Nesse sentido, destaca-se o programa 3P (Prevenção da
Poluição se Paga ou Pollution Prevention Pays, em inglês), da empresa
norte-americana 3M, que comprovava a relevância do conceito ao pro-
porcionar uma economia de cerca de 800 milhões de dólares anuais.

Com base na percepção estabelecida de que era possível economi-


zar recursos naturais ao mesmo tempo em que se gerava economia
financeira, cunhou-se e estabeleceu-se o conceito de ecoeficiência. O
conceito citado pela primeira vez por pesquisadores suíços, em 1990, foi
expandido em 1992 a partir da publicação do livro Mudando o rumo: uma
perspectiva empresarial global sobre o desenvolvimento e meio ambien-
te (1992), de autoria do empreendedor, filantropo e estudioso de desen-
volvimento sustentável suíço Stephan Schmidheiny no âmbito da sua
atuação World Business Council of Sustainable Development (WBCSD)
e da chamada Agenda 21. Segundo Lehni (2000), o conceito surgiu
como resposta ao clamor para que as empresas dessem uma resposta
mais efetiva aos desafios ambientais impostos à humanidade e que es-
tavam sendo discutidos na Rio 92.

Após discussões com diversos stakeholders, chegou-se a uma defi-


nição específica sobre ecoeficiência em 1993:

Ecoeficiência é alcançada ao se desenvolver produtos e serviços


economicamente competitivos e que satisfaçam as necessidades
humanas e tragam qualidade de vida enquanto que progressi­
vamente reduzem os impactos ecológicos e a intensidade de
recursos ao longo do ciclo de vida para um nível minimamente
compatível com a capacidade de sustentação da Terra. (LEHNI,
2000, p. 9, tradução nossa)

Posteriormente, outras instituições importantes que congregam


vários governos nacionais reconheceram a relevância do conceito ao

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 1 113


apresentarem suas próprias definições. Lehni (2000) revela, por exemplo,

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que a Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico
(OCDE) define ecoeficiência como “a eficiência com que recursos ecoló-
gicos são usados para satisfazer necessidades humanas” (LEHNI, 2000,
p. 9, tradução nossa); e a Agência Ambiental Europeia, por sua vez, rela-
ciona ecoeficiência com “a geração de mais bem-estar com menos uso
de recursos naturais” (LEHNI, 2000, p. 9, tradução nossa). Essas defini-
ções mostram, conforme sugere Heijungs (2007), que o conceito pode
ser usado ora como ferramenta a ser empregada, ora como objetivo a
ser alcançado ou, ainda, como indicador para mensuração.

Em 1994, com base na iniciativa do químico alemão Friedrich Schmidt-


-Bleek, que liderou um grupo de 16 pessoas de diversos países entre cien-
tistas, economistas, membros do governo e empresários, foi lançada a
Declaração de Carnoules. Tal documento expressava a preocupação com
o impacto social e ecológico do uso de materiais e energia e propôs como
solução um grande aumento na produtividade do uso de recursos. O gru-
po passou a ser conhecido como o “Clube Fator Dez”, porque propunha
alcançar um patamar de redução de 90% do consumo de recursos na-
turais. Vários países, assim como a OCDE e mesmo grandes empresas
multinacionais passaram a adotar metas “fator X”, como fator 4 (redução
de 75% do consumo de recursos) e até fator 100 (redução de 99% do
consumo de recursos) (HAWKEN; LOVINS; LOVINS, 2010).

PARA PENSAR

Uma das críticas mais comuns ao conceito de ecoeficiência é que ele


não necessariamente contribui para uma redução do consumo global
de recursos por parte de uma empresa. Isso porque, ao aumentar a efi-
ciência no uso dos recursos por uma unidade do produto ou serviço
gerado, pode-se, por exemplo, gerar um preço menor do produto final,
o que poderia fazer, por sua vez, com que a quantidade de vendas au-
mentasse e, consequentemente, houvesse um aumento ou igualdade no
nível total de consumo de recursos por parte da empresa. É o chama-
do efeito “ricochete” ou “bumerangue”, ou, como é mais conhecido em

114 Sustentabilidade nas organizações


inglês, rebound effect (HERTWICH, 2008). Por isso que as discussões
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mais críticas acerca da sustentabilidade ressaltam que é necessário tra-


balhar também o lado da demanda dos consumidores.

Para além dos ganhos ambientais, Côté, Booth e Louis (2006) men-
cionam potenciais direcionadores que impulsionaram as empresas a
adotar práticas e princípios de ecoeficiência. Os direcionadores internos
são:

•• redução de custo;

•• aumento na qualidade dos produtos e serviços;

•• inovação;

•• aumento na motivação dos empregados;

•• comprometimento dos empregados;

•• responsabilidade perante a comunidade;

•• aumento ou manutenção da participação no mercado.

Os direcionadores externos, por sua vez, são:

•• demanda dos consumidores por produtos com menor impacto


ambiental;

•• influência dos acionistas;

•• acesso a linhas de financiamento que valorizam questões ambientais;

•• competitividade;

•• regulação governamental;

•• pressão da opinião pública;

•• riscos ao negócio.

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 1 115


2 Recursos naturais e organizações

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Nas organizações, a mensuração da ecoeficiência geralmente ocor-
re de acordo com o tipo de recurso considerado, seja água, carbono,
energia elétrica ou quaisquer outros recursos naturais utilizados no
processo produtivo ou que compõem os produtos produzidos e/ou são
utilizados nos serviços prestados.

Para mensurarem a ecoeficiência ou mesmo o consumo geral das


operações das empresas, foram estudadas e desenvolvidas diversas
metodologias. Seu desenvolvimento invariavelmente ocorreu e vem
ocorrendo com base em amplas discussões de especialistas que visam
estabelecer certos padrões que possibilitem comparações seguras en-
tre o desempenho de diferentes atores.

De fato, essas metodologias permitem que as empresas verifiquem


o quão ecoeficientes estão ao se compararem com alguma referência.
Essa referência pode ser o seu passado – verificando como evoluíram
ao longo do tempo – ou outras empresas com melhor desempenho, o
que também é conhecido como benchmark. Além disso, as empresas
podem utilizar essas metodologias para avaliar certas decisões, por
exemplo, para verificar o quão mais ou menos ecoeficientes se torna-
rão ao investirem em mudanças como novas máquinas e processos
produtivos.

De modo geral, semelhantemente à eficiência convencional, a men-


suração da ecoeficiência se dá pela divisão de aspectos relacionados
à produção da empresa, como planta produtiva, produto específico ou
mesmo segmento de mercado; pelo atributo ambiental avaliado como
emissão de carbono, água ou uso de energia (LEHNI, 2000; CÔTÉ;
BOOTH; LOUIS, 2006). Assim, teríamos, por exemplo, um indicador
como “para produzir cada unidade de produto produzido, são consumi-
dos 2 litros de água”.

116 Sustentabilidade nas organizações


O primeiro passo para as empresas definirem o quão próximo estão
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de determinado padrão de referência é identificar o uso total (ou absolu-


to) de recursos ou de um recurso específico em suas operações e pro-
dutos ou serviços produzidos. Esse uso de recursos é conhecido como
“pegada”, por indicar que deixou algum rastro ou impacto no planeta que
pode ser avaliado e rastreado. Vejamos dois dos mais conhecidos tipos
de pegada: a pegada de carbono e a pegada hídrica.

2.1 Pegada e eficiência hídrica

De acordo com Hoekstra et al. (2011), da organização Pegada Hídrica


(Water Footprint), uma das principais organizações de referência na te-
mática, a pegada hídrica de uma empresa refere-se ao volume de água
usado para produzir mercadorias e produtos considerando toda a ca-
deia produtiva, da extração de matéria-prima, passando pela produção
do produto e pela entrega dele ao consumidor final.

Hoekstra et al. (2011) explicam que, ao calcular a pegada hídrica,


uma empresa tem de definir o escopo de cálculo. Dentro desse escopo,
a empresa pode considerar o período de cálculo, o local de abrangência,
bem como decidir se considerará distintos tipos de água e se incluirá
ambos os consumos, direto e indireto. Quanto aos tipos de água, os au-
tores distinguem três: primeiro, existe a chamada “água azul”, referente
à quantidade de água da superfície e de água subterrânea utilizada para
produzir determinado produto; segundo, existe a “água verde”, que se re-
fere à quantidade de água captada diretamente da chuva que é utilizada
para produzir determinado produto; por fim, existe a “água cinza”, que se
refere à quantidade de água fresca demandada para diluir resíduos ge-
rados a partir da produção de produtos, de forma a manter a qualidade
da água de acordo com os padrões estabelecidos.

Quanto ao uso direto ou indireto, fica mais fácil entender quando


se fala em responsabilidade direta ou indireta. Imagine que a pegada

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 1 117


hídrica direta de um consumidor é somente o que ele consome de água

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na sua casa para atividades como tomar banho e lavar roupas. No caso
das empresas, a pegada hídrica direta diz respeito apenas ao consumo
de água relativo às operações mantidas pela empresa. Não considera,
portanto, o volume de água demandado para a produção de matérias-
-primas por parte dos fornecedores, que entra no cálculo da pegada hí-
drica indireta.

Para se avaliar a eficiência hídrica, podemos considerar alguns indi-


cadores sugeridos pelo principal padrão de relato de informações em-
presariais sobre sustentabilidade mundial, o Global Reporting Initiative
(GRI). Por exemplo, o GRI adota como um dos indicadores relacionados
à água o percentual de água reciclada ou reutilizada em relação ao total
de água consumido pela empresa (GRI, 2013).

2.2 Pegada e eficiência de carbono

O conceito de pegada de carbono é muito semelhante ao concei-


to de pegada hídrica, referindo-se ao volume de emissão dos chama-
dos gases de efeito esfufa (GEE)2 necessários para a empresa manter
suas operações e/ou produzir seus produtos, considerando toda sua
cadeia produtiva.

A questão do escopo também é bastante semelhante à da pegada hí-


drica, conforme as especificações do Programa Brasileiro GHG Protocol
(FGV EAESP; WRI, [s.d.]. Dessa maneira, há uma necessária definição do
local e do período considerado, assim como há possibilidade de calcular
as emissões diretas (das operações mantidas pela empresa) e as emis-
sões indiretas (de operações mantidas por terceiros, mas que fazem

2 Geralmente, utiliza-se a nomenclatura de carbono-equivalente (ou, como é conhecido em inglês, GWP –


global warming potential) para comparar o poder de cada um dos gases de efeito estufa (como dióxido de
carbono, metano, hidrofluorcarboneto, etc.) na contribuição para o aquecimento global. Utiliza-se o dióxido
de carbono (CO2) como referência, sendo que seu valor carbono-equivalente é 1 (GRUBB, 2003).

118 Sustentabilidade nas organizações


parte da cadeia produtiva do produto comercializado pela empresa, como
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fornecedores e distribuidores ligados a ela).

Como padrão de comparação de diferentes produtos e de diferentes


empresas ou mesmo para comparar a evolução de determinada em-
presa em termos de eficiência de carbono, Hoffmann e Busch (2008)
apontam que é comum se falar em “intensidade de carbono”. A intensi-
dade de carbono diz respeito à quantidade de emissões geradas por de-
terminada empresa considerando-se determinada métrica empresarial,
como unidade do produto e vendas efetuadas. Por exemplo, considere
duas empresas produtoras de cimento. Se a empresa A emite 1 tonela-
da de carbono para produzir o equivalente a 1 quilograma de cimento e
a empresa B emite 10 toneladas para produzir o mesmo 1 quilograma
de cimento, quer dizer que as atividades e o produto da empresa B são
muito mais intensos em carbono.

Em termos de medidas para aumentar a eficiência de carbono vi-


sando reduzir a pegada de carbono, pode-se citar medidas de mudança
de modais de transporte (por exemplo, de rodoviário para ferroviário)
e otimização das rotas de distribuição da empresa, troca de fontes de
energia que alimentam as operações da empresa por outras fontes com
menos emissões (por exemplo, compra de energia oriunda de usinas
eólicas em vez de troca de termoelétricas baseadas em carvão), mu-
danças de processos produtivos ou investimento em novas tecnologias
que não gerem emissões ou que demandem menos gasto de energia.

IMPORTANTE

Vários sistemas de avaliação e reporte do desempenho de sustentabilida-


de de empresas consideram indicadores relacionados à “pegada” empre-
sarial, como uso de água, emissão de carbono, energia elétrica, entre ou-
tros, incluindo o mais conhecido deles, o Global Reporting Initiative (GRI).

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 1 119


3 Programas de eficiência no uso de

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recursos naturais
Hitchcock e Willard (2008) consideram a ecoeficiência um dos pri-
meiros passos da empresa em direção à sustentabilidade após o cum-
primento (obrigatório) da legislação, uma vez que tende a gerar ganhos
econômicos ao reduzir o consumo de recursos naturais. Outro aspecto
relevante é que todas as empresas, independentemente do porte – pe-
queno, médio ou grande –, podem investir em programas de ecoeficiên-
cia (LEHNI, 2000).

A WBCSD estabelece sete pilares que as empresas podem seguir


para aprimorar a ecoeficiência, conforme apresentado no quadro 1.

Quadro 1 – Sete pilares da ecoeficiência

PILAR EXPLICAÇÃO

Diminuição da quantidade de material utilizado na


Redução da intensidade material
composição dos produtos

Diminuição da quantidade de energia utilizada na


Redução da intensidade energética
produção dos produtos

Redução da dispersão de substâncias Diminuição da quantidade de substâncias tóxicas


tóxicas originadas do processo produtivo

Extensão da reciclabilidade Aumento da possibilidade de reciclagem dos produtos

Maximização do uso de recursos Substituição de fontes não renováveis por fontes


renováveis renováveis, por exemplo, a produção

Extensão da durabilidade dos


Aumento do tempo de vida útil dos produtos
produtos

Fornecimento de solução ou serviço em vez de


Aumento da intensidade dos serviços
produtos para o consumidor final

Fonte: adaptado de Lehni (2000).

120 Sustentabilidade nas organizações


Segundo Lehni (2000), esses sete pilares têm como meta alcançar
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três objetivos. Primeiro, o objetivo de reduzir o consumo de recursos,


significando menor pressão na natureza por recursos como água, ma-
teriais e energia. Segundo, o objetivo de reduzir o impacto das ativida-
des empresariais na natureza, incluindo a redução da geração das emis-
sões e de resíduos tóxicos e o aumento do uso de recursos renováveis.
Terceiro, o objetivo de aumentar o valor dos produtos e serviços, impli-
cando menor necessidade de uso de recursos na produção de produtos e
em menor necessidade de trocas frequentes de produtos, por exemplo.

Em termos práticos, conforme descreve Lehni (2000), as empresas


podem implementar ações de ecoeficiência relacionadas a design de
produtos, reengenharia de processos, reaproveitamento de resíduos e
remodelamento da oferta aos clientes.

Primeiro, quanto ao design de produtos, as empresas podem fazer


o design de acordo com processos da natureza (o biomimetismo), de-
senvolver produtos de menor tamanho, usar menos materiais e optar
por aqueles menos tóxicos e fazer produtos que sejam mais facilmente
desmontados para reaproveitamento ou substituição de peças.

Segundo, quanto à reengenharia de processos, as empresas podem


rever seus processos para reduzir o consumo de recursos, reduzir a polui-
ção e evitar riscos ao mesmo tempo em que geram economia financeira.

Terceiro, o reaproveitamento de resíduos pode ser incorporado


pelas empresas ao passarem a perseguir uma política de “zero resí-
duos”, em que os resíduos de determinado processo produtivo pode-
riam ser reempregados pela própria empresa ou por outras empresas
parceiras por meio de um processo de ecologia ou simbiose industrial
(PEREIRA, 2016).

Quarto, o remodelamento da oferta aos clientes, as empresas bus-


cam mudar seu modelo de negócios e a forma como se relacionam com
os clientes. Uma dessas formas é focar na necessidade do consumidor

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 1 121


em vez de focar no produto, passando a fornecer o serviço em vez de

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vender produtos (ORSATO, 2012).

NA PRÁTICA

São inúmeros os exemplos de empresas que estão mudando sua forma


de atuação ou modelo de negócio, de forma a fornecer serviços em vez
de produto. Entre esses exemplos, podemos citar o de empresas de fo-
tocopiadoras e máquinas de café, que alugam esses equipamentos para
escritórios, incluindo o serviço de manutenção, em vez de os venderem;
e o de empresas de compartilhamento de automóveis (car sharing), em
que usuários pagam por um serviço de assinatura em que podem usar
carros disponibilizados pela empresa quando necessitarem, em vez se-
rem proprietários do veículo.

Portanto, a implementação de programas de ecoeficiência envolve


não somente fazer pequenos aprimoramentos em práticas, operações
e instalações das empresas, como pode ir além dos limites organizacio-
nais, expandindo-se para fornecedores e clientes da empresa, e envol-
ver intenso investimento em inovação.

Por fim, outro aspecto relevante operacionalmente é de as empresas


integrarem as ações de ecoeficiência com ferramentas como o sistema
de gestão ambiental (SGA), a ISO 14001 (LEHNI, 2000) e a norma es-
pecífica para a a avaliação do desempenho ambiental empresarial por
meio de indicadores específicos, a ISO 14031 (JASCH, 2008).

Tecnologias mais ecoeficientes, frequentemente, têm um custo de


aquisição maior do que outras tecnologias que têm a mesma finalidade.
No entanto, além de gerar menor impacto ambiental, essas tecnologias
tendem a trazer um retorno do investimento feito após certo período. Um
caso clássico disso no cotidiano das famílias é o investimento em pai-
néis solares para gerar energia elétrica a partir da energia solar. Embora
a tecnologia requeira investimentos muitas vezes significativos para a

122 Sustentabilidade nas organizações


instalação e a eventual adaptação da residência, o fato de gerar energia
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gratuitamente faz com que a família não tenha gasto ou tenha gasto
bem menor com a conta de energia do que se consumisse a totalidade
da energia oriunda da distribuidora de energia elétrica. Com o passar do
tempo, o valor economizado compensaria o investimento inicial.

Considerações finais
Neste capítulo, estudamos as origens, a evolução e o significado do
conceito de ecoeficiência e sua aplicação desde seu surgimento, no iní-
cio da década de 1990, como resposta à necessidade de se adaptar à
limitação dos recursos naturais e como forma de gerar ganhos econô-
micos para as empresas.

Além disso, demonstramos a aplicabilidade do conceito ao discutir


alguns indicadores relacionados a duas das mais prementes e urgentes
temáticas ambientais da atualidade: a questão do carbono e a questão
da água. Para cada uma dessas temáticas, verificamos que há especi-
ficidades na forma de cálculo e nos respectivos indicadores para men-
surar a ecoeficiência, assim como apontamos exemplos de estratégias
que as empresas podem empregar visando aumentar a eficiência.

Por fim, discutimos os sete pilares da ecoeficiência e seus três


objetivos relacionados, conforme aponta a WBCSD, uma das organi-
zações precursoras e promotoras do conceito no âmbito empresarial.
Particularmente, vimos que a ecoeficiência pode ter um escopo bas-
tante amplo, que abrange ações relacionadas ao design de produtos,
à reengenharia de processos, ao reaproveitamento de resíduos e ao re-
modelamento da oferta aos clientes.

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 1 123


Referências

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
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col: contabilização, quantificação e publicação de inventários corporati-
vos de emissões de gases de efeito estufa. São Paulo: FGV EAESP; WRI,
[s.d]. Disponível em: <http://www.ghgprotocolbrasil.com.br/especificacoes
-do-programa-brasileiro-ghg-protocol?locale=pt-br>. Acesso em: 18 jul. 2018.

GLOBAL REPORTING INITIATIVE (GRI). G4 sustainability reporting guidelines:


reporting principles and standard disclosures. Amsterdam: GRI, 2013. Disponível
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a próxima revolução industrial. São Paulo: Cultrix, 2010.

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124 Sustentabilidade nas organizações


LEHNI, Markus. Eco-efficiency: creating more value with less impact. World
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PEREIRA, Alessandro Sanches. Ecologia industrial. São Paulo: Senac São


Paulo, 2016.

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 1 125


Capítulo 7
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Novas ferramentas
e modelos:
ecoeficiência –
Parte 2

A ecoeficiência, além de empreender o máximo aproveitamento pos-


sível dos recursos naturais e, com isso, gerar ganhos econômicos para
a empresa, também se mostra fundamental para manter a humanidade
operando dentro dos limites impostos pelo planeta.

127
Neste capítulo, nosso foco será entender a questão dos limites pla-

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netários, que se coloca como uma questão urgente para o presente e o
futuro da humanidade, e a questão das limitações crescentes do aces-
so aos recursos naturais e suas consequências para as empresas. Além
disso, exploraremos de que modo programas de ecoeficiência, sobretu-
do no que diz respeito à coleta, ao reaproveitamento dos resíduos e a
um eventual descarte adequado de resíduos, podem atuar como impor-
tantes ferramentas tanto para a competitividade das empresas quanto
para manter a sustentabilidade planetária.

A importância da ecoeficiência tornou-se mais evidente a partir do


relatório Os limites para o crescimento, ainda na década de 1970, e de
estudos de economistas ecológicos que ressaltam a necessidade de
que o crescimento econômico se dobre às limitações físicas que a na-
tureza impõe.

Nesse sentido, como expõe Abramovay (2012), é necessário com-


bater o mito do crescimento verde, que defende ser possível crescer
ininterruptamente desde que sejam adotadas inovações tecnológicas.
O autor argumenta que, em vez disso, o crescimento geral não deve ser
visto como objetivo, mas sim como a busca pela produção material que
se destina a atender às necessidades básicas humanas, respeitando-se
os limites dos ecossistemas, e também debate a necessidade do cha-
mado “descasamento” (ou decoupling em inglês) entre o aumento de
produção e o aumento dos insumos e dos recursos necessários para
essa produção.

Esse aumento, além de ser por unidade produzida (o chamado


“descasamento relativo”), deve ser almejado pelo total produzido, isto
é, não adianta falar que se usa, comparativamente, ao longo do tempo,
menos carbono para plantar e colher uma tonelada de soja, mas que
o volume total colhido de soja, mesmo que aumentando, não implique
aumento do total de carbono emitido. Essa última hipótese é conheci-
da como “descasamento absoluto” (ABRAMOVAY, 2012, p. 113).

128 Sustentabilidade nas organizações


Primeiramente, estudaremos a relevância de se respeitar os limites
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ecossistêmicos ao buscar o descasamento absoluto, seja sob o ponto de


vista da sociedade e do planeta em geral, seja do ponto de vista empre-
sarial. Além disso, analisaremos programas de ecoeficiência que as em-
presas estão adotando, tanto para que consigam caminhar em direção a
esse objetivo, quanto para se manterem economicamente competitivas.

1 Limites planetários e resíduos


Em 2009, o pesquisador sueco Johan Rockström, junto de mais de
20 outros cientistas de vários países, publicaram na prestigiosa revista
científica Nature o estudo intitulado “Um espaço seguro para a humani-
dade operar”. Nesse trabalho, Rockström et al. (2009) defendem que, se
a humanidade desejar evitar potenciais cataclismos ambientais irrever-
síveis em escala continental e global, como o derretimento da calota po-
lar e extinções em massa da biodiversidade, deve estabelecer um nível
seguro para operar dentro de determinados limites planetários.

Segundo Rockström, Klum e Miller (2015), mantendo-se dentro des-


ses limites, a humanidade conseguiria que o planeta Terra apresentasse
certa resiliência biofísica ao se adaptar aos distúrbios gerados. É o caso
das emissões de gases de efeito estufa, que, até determinado nível, o
planeta e seus sistemas naturais conseguem naturalmente absorver.
Os autores explicam a ideia por trás dos limites planetários usando uma
analogia: se estivermos dirigindo à noite por uma estrada com muito
vento e localizada à beira de um abismo, desejaremos que haja um
guard-rail, uma mureta de proteção, para evitar nossa queda. Os limites
planetários seriam esses guard-rails cuja ultrapassagem seria perigosa.

PARA SABER MAIS

Por causa do enorme impacto ambiental que a atividade humana vem


causando no planeta, sobretudo a partir da Revolução Industrial, no

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 2 129


século XVIII, o pesquisador Paul Crutzen (2002) propôs que estamos

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em uma nova era geológica, não mais o Holoceno (iniciada por volta do
século XII a.C.), mas o Antropoceno. Esse período inclui sensíveis alte-
rações, como o crescimento de mais de 10 vezes a população mundial,
a ampla ocupação da superfície terrestre para uso de atividades huma-
nas, o uso maciço de recursos naturais como a água, o aumento da
concentração de gases de efeito estufa, para mencionar apenas alguns
aspectos que geram impactos profundos na natureza.

Os limites planetários são um total de nove, sendo que sete deles


foram quantificados por Rockström et al. (2009) com base no que havia
de mais avançado em termos de pesquisa científica, embora os autores
reconheçam que se trata de estimativas aproximadas e que, em alguns
casos, são necessários mais estudos. Os limites planetários são as mu-
danças climáticas, a acidificação dos oceanos, a destruição da cama-
da de ozônio, os ciclos biogeoquímicos do nitrogênio e do fósforo, uso
global da água, uso da terra, integridade da biodiversidade, concentra-
ção de aerossóis na atmosfera, poluição química (incluindo poluentes
orgânicos persistentes, metais pesados e resíduos nucleares). Esses
dois últimos ainda não estão quantificados (ROCKSTRÖM et al., 2009;
STEFFEN et al., 2015).

Dos nove limites planetários, Rockström et al. (2009) reuniram evi-


dências para afirmar que a humanidade provavelmente já ultrapassou
pelo menos três deles: as mudanças climáticas, as mudanças nos ci-
clos de nitrogênio e a integridade de biodiversidade (figura 1). De acordo
com Steffen et al. (2015), entre os nove limites planetários, talvez os
mais relevantes sejam as mudanças climáticas e a integridade de biodi-
versidade, dado que operam em escala global e estão conectados a to-
dos os demais limites planetários, ou seja, a humanidade não somente
está ultrapassando os limites planetários como está ultrapassando os
dois mais relevantes deles.

130 Sustentabilidade nas organizações


Figura 1 – Representação dos limites planetários
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Limites planetários (LPs)

Mudanças climáticas – Mais relevantes: operam


em escala global e afetam
Integridade da biodiversidade todos os demais LPs
Mudanças do ciclo biogeoquímico do nitrogênio

Mudanças do ciclo biogeoquímico do fósforo

Uso global da terra

Uso global da água

Destruição da camada de ozônio

Concentração de aerossóis na atmosfera

Poluição química

Fonte: adaptado de Rockström et al. (2009) e Steffen et al. (2015).

1.1 Os limites planetários e as organizações

Quando falamos que a humanidade está ameaçada por ultrapassar


certos limites planetários, podemos certamente estender essa ameaça
para o conjunto das empresas. O relatório anual da Carbon Trust (2014)
revela que, seja pelo impacto ambiental (como no caso dos combustíveis
fósseis e dos resíduos), seja pela escassez propriamente dita (como nos
casos da água, de terras utilizáveis e de recursos materiais como miné-
rios), seja por causa de ambos, as empresas estão propondo ou terão de
propor novas soluções sustentáveis para fazer frente a esses desafios.

Nesse sentido, a Carbon Trust (2014) cita pelo menos quatro desa-
fios fundamentais que as empresas enfrentam atualmente:

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 2 131


•• Problemas com o suprimento dos recursos: empresas podem

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enfrentar uma interrupção no suprimento de recursos fundamen-
tais para suas operações e produtos em uma situação em que
materiais, água ou mesmo terras disponíveis se tornem escas-
sos em determinada região. Recursos tão básicos como a água
podem se mostrar fundamentais somente no momento em que
faltarem. Diversas pousadas, hotéis, restaurantes e marinas lo-
calizadas à beira de represas do sistema Cantareira enfrentaram
uma grave crise e até mesmo falência em razão da escassez de
água gerada pela crise hídrica que se abateu sobre o estado de
São Paulo entre 2014 e 2016, segundo reportagem da revista Veja
(HOTÉIS..., 2014).

•• Impacto da regulação: governos ao redor do mundo estão im-


pondo legislações que limitam a quantidade produzida ou sim-
plesmente a fabricação de certos produtos que eventualmente
usem recursos escassos de determinada região ou país. É o caso,
por exemplo, da indústria de mineração. Enquanto, atualmente,
muitas empresas desenvolvem suas atividades em países sub-
desenvolvidos e em desenvolvimento da África, América Latina
e Ásia, com padrões ambientais e sociais precários, existe um
esforço internacional de se criar um padrão internacional de regu-
lação para garantir um padrão socioambiental adequado mínimo
para as atividades das empresas (VIDAL, 2015).

•• Aumento dos custos e volatilidade: primeiro, quanto à questão


dos custos, se a demanda por determinado recurso aumentar e/
ou se a oferta reduzir, os preços tendem a subir. Quanto à vola-
tilidade, à escassez e à regulação, o comportamento de alguns
agentes como o governo a respeito dos recursos gera incertezas
quanto aos custos e consequentemente aos preços que as em-
presas podem praticar. Isso pode dificultar investimentos em lon-
go prazo, já que traz muita incerteza. Tanto o aumento do custo
quanto a volatilidade são enfrentados por indústrias eletrônicas e

132 Sustentabilidade nas organizações


que empregam novas tecnologias “verdes” (como a produção da
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bateria de carros híbridos e de lâmpadas de LED), que enfrentam


limitações por trabalharem com metais escassos extraídos dos
chamados elementos químicos raros, conforme discutem Golev
et al. (2014).

•• Mudanças no modelo de negócio: algumas limitações de recur-


sos podem acabar por ameaçar a viabilidade do modelo de ne-
gócios de determinadas empresas. Portanto, empresas devem
considerar mudanças relacionadas à ecoeficiência, adaptando-se
a uma resiliência em longo prazo e a novas formas de criar valor.
Pode-se citar o caso das empresas atuantes no ramo petrolífero
que investem não somente em expandir suas fontes de extração
de petróleo como realizam investimentos em fontes alternativas
de energia, como o biodiesel. Por exemplo, a Petrobras, em seu
plano de negócios e gestão, apresenta em sua visão que se con-
sidera uma empresa de energia, e não somente de petróleo: “uma
empresa integrada de energia com foco em óleo e gás que evolui
com a sociedade, gera alto valor e tem capacidade técnica única”
(PETROBRAS, 2016).

1.2 As organizações e os resíduos

As empresas geram resíduos seja na produção de suas mercadorias


ou na prestação de serviços, seja no pós-consumo, quando o produ-
to precisa ter uma destinação final adequada. Estimativas feitas pela
Academia Nacional de Engenharia dos Estados Unidos mencionadas
por Willard (2014) revelam que cerca de 93% dos materiais que as em-
presas compram e utilizam nas suas operações acabam não sendo
incorporados aos seus produtos. Consequentemente, apenas 7% dos
materiais são utilizados efetivamente no produto.

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 2 133


Por um lado, esses dados dão uma dimensão da ineficiência do pro-

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cesso de aproveitamento material e ao mesmo tempo mostram a rele-
vância do volume de resíduos gerados e, por outro lado, ressaltam que
existe muito espaço para as empresas implementarem e aprimorarem
seus programas de ecoeficiência.

Quando se fala em resíduos, é importante ter clareza ao que se faz


referência e, principalmente, destacar a diferença em relação aos re-
jeitos. Segundo a PNRS (BRASIL, 2010), rejeitos referem-se a resíduos
sólidos que não podem ser reaproveitados dadas as alternativas tec-
nológicas disponíveis e a viabilidade econômica, sendo que têm de ser
direcionados para uma disposição final ambientalmente adequada. Os
resíduos, por sua vez, podem ser reaproveitados e/ou reciclados, dadas
as alternativas tecnológicas e economicamente viáveis existentes.

Especificamente quanto aos resíduos, Willard (2014) esclarece que


eles são de diferentes tipos, tendo também valores econômicos e im-
pactos ambientais diversos, que acabam por influenciar em um menor
ou maior investimento das empresas no gerenciamento de resíduos. No
quadro 1, são relacionadas algumas das principais fontes de resíduos
oriundas de atividades empresariais, divididas em comerciais, indus-
triais e agrícolas.

Quadro 1 – Resíduos gerados em atividades empresariais

LOCAIS OU ATIVIDADES EM QUE SÃO


FONTES TIPOS DE RESÍDUO
GERADOS

Lojas, restaurantes, mercados, prédios de Papel, papelão, plástico, madeira,


Comerciais escritórios, hotéis, prestadores de serviço alimentos, vidro, metais, resíduos
(hospitais, postos de gasolinas), etc. perigosos e especiais

(cont.)

134 Sustentabilidade nas organizações


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LOCAIS OU ATIVIDADES EM QUE SÃO


FONTES TIPOS DE RESÍDUO
GERADOS

Resíduos de processos industriais,


Construção, fabricação, processos de
sucatas, resíduos não industriais (restos
produção de itens leves e pesados,
Industriais de alimentos, lixo comum, cinzas,
refinarias, indústrias químicas,
resíduos de demolição e construção,
termoelétricas, etc.
resíduos especiais e perigosos.

Restos de colheita, pomares, produção de Alimentos estragados, resíduos agrícolas,


Agrícolas
laticínios, pastagens e fazendas, etc. lixo comum, resíduos perigosos.

Fonte: adaptado de Davis e Masten (2016, p. 656).

PARA SABER MAIS

Para reduzir a geração e também para promover a reutilização de resídu-


os, as empresas podem lançar mão de programas e estratégias relacio-
nadas à ecoeficiência. No entanto, nem todos os resíduos empresariais
são passíveis de reutilização e, sendo assim, precisam ter uma destina-
ção especialmente adequada. É o caso, por exemplo, do lixo hospitalar,
que geralmente é incinerado (CERRI, s.d.); e dos resíduos nucleares (ou
“rejeitos radioativos”), como as pastilhas de urânio utilizadas nas usinas
de Angra dos Reis, que têm de ser armazenadas em locais muito se-
guros especialmente desenvolvidos por tempo indeterminado dado seu
caráter radioativo (QUAL É..., 2011).

2 Programas de eficiência no uso ou


descarte de resíduos: reúso, reciclagem, etc.
Os programas de eficiência no uso e descarte de resíduos pelas
empresas têm dois pilares fundamentais: a reciclagem e a reutiliza-
ção. Segundo a PNRS (BRASIL, 2010), a reciclagem consiste em alte-
rar as propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas dos resíduos,

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 2 135


transformando-os em insumos ou novos produtos. Ainda segundo a

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PNRS, a reutilização ou o reúso, por outro lado, envolve o aproveitamen-
to do resíduo sem que seja necessário alterar suas propriedades físicas,
físico-químicas ou biológicas.

Esses pilares implicam, evidentemente, a participação das empre-


sas, mas também podem envolver a participação de outros atores da
cadeia da empresa. Isso inclui a cadeia produtiva tradicional de uma
empresa, geralmente composta por seus fornecedores diretos, por suas
próprias operações e por aqueles que comercializam diretamente os
produtos fornecidos por ela. Mas também tem ganhado força, contudo,
o conceito de “cadeia produtiva estendida”, que inclui todas as ativida-
des envolvidas, desde a extração da matéria-prima até a destinação do
produto final pós-consumo.

Com efeito, as empresas também buscam como ganhos de eco-


eficiência podem ser alcançados dentro da sua cadeia estendida.
Michelsen (2007) propõe que as empresas busquem soluções respon-
dendo a quatro perguntas:

•• É possível alterar os materiais ou a quantidade de materiais utili-


zados na fabricação do produto? Qual seria a melhor composição
do produto em termos de economia de materiais ou de mudança
de materiais?

◦◦ Exemplo: a Coca-Cola desenvolveu uma garrafa cujo material


é 30% composto de cana-de-açúcar, substituindo o petróleo
utilizado na produção de plásticos; em 2018, um cientista in-
glês lançou uma garrafa de água feita 100% de papel, a Choose
H2O, que é atóxica e biodegradável em até 3 semanas, reduzin-
do o impacto do descarte de garrafas plásticas, sobretudo no
oceano.

•• É possível alterar os processos produtivos? Como as empresas po-


deriam reduzir os insumos usados na produção das mercadorias?

136 Sustentabilidade nas organizações


◦◦ Exemplo: uma empresa que tenha adotado uma nova tecnolo-
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gia que demande muito menos água ou energia para operar as


máquinas que produzem os produtos.

•• É possível alterar o uso do produto? Qual seria a melhor maneira


de o consumidor usar o produto de modo a economizar recursos?

◦◦ Exemplo: uma grife de calças jeans orienta o consumidor so-


bre qual é a melhor maneira de lavar seu produto de forma a
mantê-lo conservado e, com isso, aumentar o tempo de vida
útil dele, reduzindo a demanda por matérias-primas ao mesmo
tempo em que economiza água.

•• É possível alterar a destinação após o fim de vida útil do produto?


O que fazer após o consumidor ter usado o produto e não encon-
trar mais finalidade em seu uso?

◦◦ Exemplo: um fabricante de celulares que recebe aparelhos an-


tigos quando não tiverem mais serventia para os consumido-
res para que os materiais utilizados no aparelho possam ser
reaproveitados e para que os metais não contaminem o solo
de aterros sanitários.

2.1 Ecoeficiência e responsabilidade direta da empresa

Seja por terem uma visão integrada de sua cadeia produtiva estendi-
da, seja por exigências de legislações mais restritivas, algumas empre-
sas estão assumindo a frente de iniciativas que vão além de seu escopo
direto de atuação, de forma a conseguir obter maior ecoeficiência no
uso e no descarte do produto.

Diversas distribuidoras de energia elétrica, como a Companhia


Elétrica de Goiás (Celg), mantêm ou mantiveram programas que incenti-
vam os consumidores por meio de subsídios a trocar seus eletrodomés-
ticos antigos por eletrodomésticos novos mais eficientes em termos

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 2 137


de consumo de energia. Segundo reportagem de Santana (2017), os

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consumidores que entregassem suas geladeiras e aparelhos de ar con-
dicionado antigos em lojas conveniadas receberiam 50% de desconto
na compra de novos eletrodomésticos.

Em termos de resíduos propriamente ditos, a Política Nacional de


Resíduos Sólidos (PNRS), promulgada em 2010, impulsionou o surgi-
mento de uma série de iniciativas. Um dos destaques da PNRS foi insti-
tuir que as empresas sejam corresponsáveis pela destinação adequada
de seus produtos ou da embalagem de seus produtos após o consumo.
Com esse objetivo, as empresas estão envidando esforços para promo-
ver programas de reciclagem, conscientizando os consumidores sobre
a importância de separar o lixo, por exemplo, mas, principalmente, por
meio do suporte ao desenvolvimento de comunidades e de cooperati-
vas de catadores como recurso para o aprimoramento de uma estrutura
local destinada à logística reversa.1 Nesse sentido, destaca-se o papel
do Compromisso Empresarial de Reciclagem (Cempre), associação
brasileira sem fins lucrativos fundada em 1992 e dedicada à promoção
da reciclagem que congrega grandes empresas nacionais e internacio-
nais. O Cempre teve papel fundamental nas discussões da PNRS, repre-
sentando as empresas congregadas.

A PNRS, em seu artigo 3o, inciso XVII, define responsabilidade com-


partilhada pelo ciclo de vida dos produtos como:

Conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabri-


cantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumi-
dores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de
manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos
sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos

1 A PNRS (BRASIL, 2010) define logística reversa como “instrumento de desenvolvimento econômico e
social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e
a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros
ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”.

138 Sustentabilidade nas organizações


causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes
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do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei. (BRASIL, 2010)

Além de atores centrais como governo, empresas e consumidores,


ela prevê que também deve ser apoiado o desenvolvimento de iniciati-
vas sociais que atuem na cadeia dos resíduos sólidos, como cooperati-
vas de catadores. Uma dessas cooperativas é a Coopermiti, que surgiu
em São Paulo em 2010 com o objetivo de trabalhar com recuperação,
reutilização, reciclagem e comercialização de resíduos de equipamen-
tos eletroeletrônicos, também conhecidos como lixo eletrônico.

Não somente cooperativas estão trabalhando para ajudar as em-


presas na destinação adequada dos resíduos como têm surgido, so-
bretudo a partir da PNRS, empresas que atuam com a reciclagem e a
destinação dos resíduos ou materiais de outras empresas. Nesse sen-
tido, pode-se citar o caso da Retalhar, empresa de São Paulo que dá a
destinação adequada de uniformes de funcionários descartados por
empresas. Segundo reportagem da Folha de S.Paulo (POMBO, 2016),
a Retalhar utiliza mão de obra de uma rede de cooperativas e transfor-
ma os uniformes corporativos, após um processo de trituração e des-
fibramento, em matérias-primas para outros produtos têxteis e para
indústrias como a de construção civil ou, ainda, produzindo brindes
corporativos.

Grandes empresas também têm desenvolvido novos negócios e so-


luções próprias com a finalidade de gerar rentabilidade em programas
de reaproveitamento e reciclagem dos produtos produzidos pela em-
presa. É o caso da HP, empresa que produz equipamentos eletrônicos
como computadores e impressoras, que, em 2012, investiu na criação
da Sinctronics, empresa que faz a coleta, o processamento e a transfor-
mação de produtos eletroeletrônicos para serem reinseridos na cadeia
produtiva como matéria-prima, evitando ao mesmo tempo a demanda
pela extração de mais recursos por parte da HP e a geração de resíduos.
Essa matéria-prima, como o plástico granulado extraído da reciclagem

Novas ferramentas e modelos: ecoeficiência – Parte 2 139


de impressoras, é utilizada para a produção de novas impressoras da

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HP, em um processo de fechamento de ciclo da cadeia, ou fluxo circular
(AMCHAM, 2016; SINCTRONICS, 2016).

Considerações finais
Neste capítulo, abordamos a questão dos limites planetários, esforço
relativamente recente que tem tentado quantificar objetivamente em que
medida a humanidade está atuando dentro das possibilidades dos prin-
cipais sistemas e ecossistemas de suporte à vida de se manterem fun-
cionando adequadamente. Compreendemos que, dos nove limites pla-
netários, a humanidade já ultrapassou três deles, inclusive dos dois mais
importantes: as mudanças climáticas e a integridade da biodiversidade.

Exploramos também que as organizações podem ser afetadas se-


veramente pela limitação crescente da disponibilidade de recursos na-
turais e pela necessidade de a humanidade operar dentro dos recursos
planetários, seja, por exemplo, pelos riscos operacionais de ficarem sem
matéria-prima, seja pelo aumento iminente de preços em razão da re-
dução da oferta de insumos. Portanto, para além de motivações éticas
e de cumprimento da lei, as empresas também podem ter motivações
eminentemente econômicas para investirem em ações de ecoeficiência.

Por fim, estudamos alguns possíveis programas e ações de ecoefi-


ciência que as empresas podem investir com a finalidade de aprimora-
mento próprio e de dar conta dos desafios planetários impostos. Essas
ações envolvem tanto as operações da própria empresa quanto a cha-
mada cadeia produtiva estendida, via fornecedores de matérias-primas,
clientes, cooperativas de catadores e também por meio da criação de
novas empresas.

Referências
ABRAMOVAY, Ricardo. Muito além da economia verde. São Paulo: Abril, 2012.

140 Sustentabilidade nas organizações


AMCHAM BRASIL. Um novo ciclo de vida para aparelhos eletrônicos. Estadão,
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VIDAL, John. How developing countries are paying a high price for the global
mineral boom. The Guardian, 15 ago. 2015. Disponível em: <https://www.
theguardian.com/global-development/2015/aug/15/developing-countries-
high-price-global-mineral-boom>. Acesso em: 2 ago. 2018.

WILLARD, Bob. Como fazer a empresa lucrar com sustentabilidade. São Paulo:
Saraiva, 2014.

142 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 8
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

Novas ferramentas
e modelos: sistemas
de gestão ambiental

O maior engajamento em questões ambientais por parte das em-


presas é um fenômeno relativamente recente, tendo sido mais difundi-
do sobretudo a partir da década de 1980. No entanto, um lado positivo
dessa adoção tardia por parte das empresas é que a gestão ambiental
acabou por se beneficiar de ferramentas de gestão que as organizações
já vinham adotando. Entre essas práticas beneficiadas está a criação de
sistemas de gestão ambiental, inspirados em ações que vinham sendo
adotadas pelas empresas, notadamente, com base no movimento da
gestão da qualidade total (GQT).

Neste capítulo, conheceremos os principais conceitos, estruturas e


práticas empresariais relativos aos sistemas de gestão ambiental, com
enfoque no histórico e na estrutura da ISO. Daremos ênfase, ainda, ao
estudo da principal norma de gestão ambiental, a ISO 14001, e faremos
uma comparação entre as duas versões dessa norma, de 2004 e de 2015.

143
1 Visão histórica dos sistemas de

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
certificação (da qualidade à ambiental)
A década de 1980 assistiu à intensificação de um apelo por práti-
cas empresariais que levassem em conta o meio ambiente, movimen-
to iniciado a partir da década de 1960. Com efeito, nos anos 1980,
ocorreram desastres ambientais de grande magnitude, o surgimento
de legislações mais restritivas, a intensificação das pressões de vários
grupos de stakeholders, – investidores, governo, ONGs e consumido-
res –, e a adoção de uma série de iniciativas ambientais voluntárias
por parte das empresas, como o Responsible Care (atuação responsá-
vel) (ANDREWS et al., 2001), abordado anteriormente.

Paralelamente a essa pressão externa, Andrews et al. (2001) rela-


tam que, na década de 1980, a questão ambiental passou a ser obje-
to de atenção não somente operacional e visando ao cumprimento da
lei, mas também de gestão, muito porque, a partir da década de 1970,
percebeu-se que os impactos ambientais podiam significar ineficiên-
cia econômica para a empresa. Nessa direção, incluem-se o aumento
do uso de auditorias ambientais por parte das empresas para garantir
o cumprimento da legislação e a criação de departamentos de meio
ambiente, saúde e segurança do trabalho para cuidar das temáticas de
maneira integrada.

Em paralelo a esse movimento pela crescente profissionalização da


gestão ambiental e pela adoção de uma perspectiva mais proativa no
tratamento das questões ambientais nas empresas, começaram a ser
observadas sinergias entre a gestão ambiental e o movimento da ges-
tão da qualidade total (GQT).1.

1 O termo gestão da qualidade total (GQT) foi cunhado em 1969 por especialistas em qualidade japoneses e
começou a ser implementado amplamente por empresas japonesas na década de 1970 e, posteriormente,
por empresas norte-americanas e de outros países, principalmente a partir da década de 1980 (QMS, 2018).

144 Sustentabilidade nas organizações


O movimento da qualidade começou, no entanto, muito antes da
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GQT, no início do século XX, com a administração científica, e se es-


tendeu por diferentes “eras da qualidade”, conforme descreve Carvalho
(2012). Inicialmente, o foco da qualidade era a inspeção, verificando-se
se os produtos fabricados tinham conformidade com as especificações,
já que a produção em massa privilegiava a quantidade produzida e a
padronização.

Na década de 1920, Shewart criou os gráficos de controle, incorpo-


rando conceitos de estatística à produção, e também desenvolveu o ci-
clo PDCA,2 como forma de analisar e solucionar problemas.

Na década de 1930, as ferramentas estatísticas foram ainda mais


empregadas, desenvolvendo-se um controle estatístico do processo e
a introdução da inspeção por amostragem. Nessa década nasceram
também as primeiras normas – britânicas e americanas – de controle
estatístico de qualidade.

Nas décadas de 1940, a questão da importância da participação do


trabalhador começou a ser considerada no movimento da qualidade
com base na influência da chamada Escola das Relações Humanas e de
alguns experimentos. Nesse período também surgiram as primeiras
associações de profissionais da área da qualidade, primeiro com os
norte-americanos e depois com os japoneses.

Entre os anos 1950 e 1960, a qualidade começou a ser associada


mais diretamente com as questões de planejamento e apuração de
custo nas empresas. Nesse sentido, contribuiu especialmente Joseph
Juran, com o lançamento de sua influente publicação Planejamento e
práticas de controle da qualidade. Armand Feigenbaum, por sua vez, lan-
çou as bases do controle da qualidade total (CQT), sendo o primeiro a

2 A melhoria contínua é baseada no ciclo conhecido como PDCA (plan, do, check e act), que envolve o
engajamento da organização em um fluxo contínuo entre as atividades de planejamento (P), execução (D),
avaliação do desempenho (C) e ação (A) para a melhoria (RIBEIRO NETO et al., 2017).

Novas ferramentas e modelos: sistemas de gestão ambiental 145


vislumbrar a qualidade de maneira sistêmica, e tendo grande influên­

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cia no desenvolvimento futuro da ISO. Enquanto o Japão se recons-
truía após a Segunda Guerra Mundial, especialistas norte-americanos
de qualidade estiveram no país: Juran e Deming. Durante esse período,
houve um intercâmbio muito grande entre os dois principais sistemas de
qualidade, o japonês e o norte-americano. Deming, por exemplo, levou
aspectos de controle da qualidade e aspectos estatísticos da qualidade
ao modelo japonês e nesse acabou aprendendo a importância do en-
volvimento dos trabalhadores. No modelo japonês, inspirado fortemen-
te nas ideias de Taichi Ono, da empresa Toyota, destaca-se também: a
produção enxuta em que se procurava reduzir ao máximo o desperdício;
o conceito de melhoria contínua (chamado de kaizen), defendido pelo
teórico Masaaki Imai; os famosos círculos de controle de qualidade de
Ishikawa, em que os trabalhadores se reuniam voluntária e periodica-
mente para debater questões relativas à qualidade na empresa.

Na década de 1970, o controle de qualidade passou a se dar por de-


feitos por partes por milhão (p.p.m) e houve a reinserção da importância
de atender as demandas dos clientes e da customização em massa.
Culminou-se então, na década de 1980, a chamada era da GQT, quando
o conceito se consolidou e se tornou predominante dentro do movimen-
to da qualidade.

Empresas perceberam a relevância da filosofia e das técnicas de


GQT, por exemplo, para ajudar a direcionar a gestão ambiental de forma
a gerar menos custos e atender às expectativas dos clientes (ou do mer-
cado) (BERRY; RONDINELLI, 1998). Além disso, enquanto a GQT enfati-
za a questão do “zero defeito”, há um claro alinhamento com a questão
da redução de resíduos da gestão ambiental (MATIAS; COELHO, 2002).

Ora, na medida em que a GQT preconiza que a qualidade não deve


ser função de um departamento específico, mas ser perseguida por
toda a organização, porque não a relacionar também às questões
ambientais? Afinal de contas, como explicam Karapetrovic e Willborn

146 Sustentabilidade nas organizações


(1998), a organização pode ser vista como um sistema composto por
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um conjunto de sistemas (por exemplo, os sistemas de qualidade, re-


cursos humanos, financeiro e ambiental) inter-relacionados e que se
influenciam mutuamente.

Assim, na década de 1980, a relação entre o sistema de gestão am-


biental (SGA) e os sistemas de qualidade começou a ganhar contornos
mais formais, tendo como pano de fundo a GQT. Como importante mar-
co, há o ano de 1987, quando ocorreu a publicação da ISO 9001, que
passou a estabelecer um padrão sobre como as empresas deveriam
implementar e gerenciar de maneira sistematizada suas práticas de
GQT. No começo da década de 1990, inspiradas pela ISO 9001, começa-
ram a surgir as normas específicas de SGA, sendo que esse alinhamen-
to foi marcado especialmente pela publicação da ISO 14001 em 1996.
Sinal desse alinhamento entre a GQT e o SGA, não por acaso a grande
maioria das empresas que têm a ISO 14001 (relativa à SGA), também
possuem a ISO 9001 (MATIAS; COELHO, 2002). Por exemplo, Matias e
Coelho (2002) mencionam que ambas as normas compartilham termos
e abordagens que enfatizam o papel da liderança e a melhoria contínua
(incluindo o ciclo PDCA).

PARA SABER MAIS

A International Organization for Standardization, ou simplesmente ISO,


foi criada em 1946 como forma de facilitar a coordenação internacional
e unificar os esforços pela criação de padrões industriais. Com isso, ela
possui atualmente normas que cobrem praticamente todos os tipos de
manufaturas e tecnologias industriais empregadas por empresas das
mais diferentes indústrias. Atualmente, a ISO se encontra sediada em
Genebra, na Suíça, conta com membros de 161 países e possui 782
comitês e subcomitês técnicos. Entre esses comitês, temos o comitê
técnico 207 (TC 207), subcomitê 1 (SC1), responsável pela ISO 14001
(ISO, 2018).

Novas ferramentas e modelos: sistemas de gestão ambiental 147


2 Sistema de gestão ambiental (SGA)

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Segundo Barbieri (2011), um sistema de gestão ambiental (SGA)3
serve para promover uma gestão integrada, contínua e sistemática das
ações ambientais da empresa, atuando para sanar problemas atuais e
evitar que venham a ocorrer problemas futuros. É diferente, portanto, de
uma abordagem em que a empresa executa uma série de ações pon-
tuais e isoladas para resolver problemas episódicos. Por meio de dire-
trizes formuladas, objetivos definidos, atividades coordenadas e cujos
resultados são avaliados, um SGA coordena os esforços da empresa
em relação às ações ambientais. Esse esforço coordenado tem como
objetivo envolver efetivamente todos na empresa – não somente pes­
soas do departamento ou área responsável pelo meio ambiente, inte-
grar as questões ambientais às demais questões da empresa e, em
última medida, alcançar melhores resultados com menos recursos.

Genericamente falando, Barbieri (2011) explica que o SGA abrange


a política ambiental, a avaliação dos impactos ambientais, os objetivos,
as metas e os planos de ação e os instrumentos para acompanhar e
avaliar as ações e o desempenho ambiental da empresa em relação
ao que foi planejado. Um SGA, embora também incorpore aspectos de
cumprimento da legislação, de forma geral, acaba por levar a empresa a
superar as exigências legais.

IMPORTANTE

Quando do desenvolvimento e da implantação de um SGA, a empresa


pode seguir uma estrutura concebida pela própria empresa ou adotar
uma estrutura sugerida por outros órgãos especializados. A busca por

3 Segundo Morin (2005, p. 131), um sistema é “uma interrelação de elementos constituindo uma entidade
ou uma unidade global”. Um exemplo clássico de sistema é o corpo humano, constituído por diversos
elementos, que, por sua vez, são sistemas (por exemplo, os sistemas respiratório, digestório e circulatório).

148 Sustentabilidade nas organizações


essa estrutura faz parte de uma tendência empresarial nascida na época
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da Revolução Industrial de padronização dos procedimentos produtivos


para facilitar a produção em massa e a redução de custos, e que, a partir
da década de 1970, teve seu uso intensificado também para a gestão das
empresas, quando ocorre uma maior globalização e a integração dos
mercados. Nesse sentido, as normas de qualidade, como a ISO, materia-
lizam a busca por essa estrutura (HERAS-SAIZARBITORIA et al., 2018).

Em termos de normas de SGA, existem diversas normas, como a


Eco-Management and Audit Scheme (Emas), outras deixaram de existir,
caso da BS 7750. No entanto, a norma ISO 14001 de gestão ambiental,
como as outras normas da família ISO, se notabilizou por ser a estrutura
internacionalmente mais utilizada. Estimativas mencionadas por Heras-
Saizarbitoria et al. (2018) dão conta de que houve um crescimento anual
mundial de certificação significativo: em 1999, foram quase 14 mil cer-
tificações outorgadas; em 2015, pouco mais de 319 mil, representando
um crescimento de 22 vezes em um período de 16 anos.

As razões que levam as empresas a utilizar a ISO 14001, segundo


clientes de uma importante consultoria que implementa sistemas ISO,
a BSI, são (BSI, 2015a):

•• tornar-se um competidor mais sólido no mercado;

•• melhorar o gerenciamento dos recursos e a redução do desperdí-


cio, ao mesmo tempo em que gera ganhos econômicos;

•• cumprir a legislação, evitando o pagamento de multas e prejuízos


à reputação;

•• aprimorar a responsabilidade social corporativa, cumprindo os re-


quisitos exigidos por empresas parceiras;

•• motivar e engajar os funcionários com processos mais eficientes.

Novas ferramentas e modelos: sistemas de gestão ambiental 149


3 Sistema de gestão ambiental e a ISO

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14001 – NBR versões 2004 e 2015
A ISO 14001 não foi a primeira norma de SGA a ser criada, conforme
explica Whitelaw (2004). Sua origem remonta à criação, em 1992, da
norma BS 7750 pela British Standard Institution (BSI). Ocorre que, após
a criação da BS 7750, diversas organizações que cuidam da normaliza-
ção em diferentes países4 criaram suas próprias normas – outra bas-
tante conhecida que continua em vigor e foi criada em 1993 é a euro-
peia Eco-Management and Audit Scheme (Emas). Isso poderia, na visão
da ISO, criar obstáculos para o comércio internacional. Antecipando-se
a esse problema, a organização já vinha discutindo, desde 1991, a partir
do estabelecimento de um grupo de assessoria sobre o meio ambiente
e, em 1992, de um comitê, com membros de diversos países, para a
elaboração de um padrão internacional de normas destinadas aos sis-
temas de gestão ambiental. Em 1996, após a publicação da primeira
versão da ISO 14001, a BSI cancelou a norma BS 7750 de forma a con-
tribuir para a adoção de um único padrão.

NA PRÁTICA

Prova de que a ISO 14001 se tornou uma importante referência para as


empresas é que algumas grandes multinacionais passaram a exigi-la
como pré-requisito para a seleção de seus fornecedores. É o caso das
grandes montadoras da indústria automobilística (AMATO NETO, 2015;
CAMPOS; MELLO, 2017). Na prática, porém, conforme Campos e Mello
(2017) discutem, como o processo de obtenção da certificação é relati-
vamente complexo e custoso, pequenas empresas, muitas vezes, aca-
bam tendo dificuldades de se qualificarem como fornecedores.

4 No Brasil, por exemplo, quem faz isso é a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Por essa razão,
a tradução e homologação da versão brasileira da ISO 14001 é denominada como ABNT NBR ISO 14001.

150 Sustentabilidade nas organizações


De acordo com Whitelaw (2004), geralmente, os padrões e as nor-
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mas da ISO são revisados entre três e cinco anos. No caso da ISO
14001, além da versão originalmente publicada em 1996/1997, temos
a versão consolidada de 2004 e a versão mais atualizada, de setembro
2015. O período de transição entre as versões de 2004 e 2015 para as
empresas e os usuários é de três anos, tendo acabado, portanto, em
setembro de 2018.

Segundo documento da consultoria BSI, a revisão da ISO 14001 de


2015 em relação à versão de 2004 foi orientada a partir de uma pesqui-
sa com usuários da norma (BSI, 2015a) e teve como objetivo os seguin-
tes aspectos (ISO, 2015; BSI, 2015a):

•• Integração com outros sistemas de gestão – adaptação a uma


estrutura uniforme segundo as demais normas da ISO (como
ISO 9001), facilitando uma abordagem integrada (a chamada
estrutura de alto nível – EAN).

•• Foco mais estratégico – preocupação de que a gestão ambiental


reflita as estratégias de negócio da organização, estabelecendo
prioridades, gerenciando melhor os riscos e procurando gerar
sinergias que levem à ecoeficiência.

•• Liderança – envolvimento maior da alta liderança (i.e., nível de di-


retoria, presidência e conselho de administração).

•• Ampliação do escopo ambiental – a definição de proteção do


meio ambiente deixou de ser usada e passou a ter um foco mais
amplo e de acordo com o contexto da organização, podendo
abranger temas muito diversos, como prevenção da poluição,
mudanças climáticas, biodiversidade, entre outros.

•• Perspectiva da cadeia como um todo – a organização deve con-


siderar não apenas o produto, mas todo seu ciclo, que inclui o de-
sign, a aquisição de matérias-primas, a produção, a distribuição, o
uso e a destinação adequada ao fim do seu ciclo de vida.

Novas ferramentas e modelos: sistemas de gestão ambiental 151


•• Responsabilidade ampliada – a organização deve considerar no

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seu SGA os processos próprios terceirizados para outras empre-
sas. Isso significa que, quando parte das operações da empresa
é executada por outras empresas, isso não a isenta da responsa-
bilidade por eventuais impactos ambientais gerados.

•• Comunicação – a organização deve procurar comunicar seus


resultados com base em informações consistentes e comprova-
das, tanto para o público externo quanto para o público interno. A
organização deve oferecer oportunidades de participação e aber-
tura a sugestões de aprimoramento por parte dos funcionários.

PARA SABER MAIS

A ISO 14001 faz parte da chamada família ISO 14000, porque, embora
a ISO 14001 seja a mais famosa, existem diversas outras normas rela-
cionadas à gestão ambiental. Podemos citar, por exemplo, a 14020, que
aborda a questão da rotulagem ambiental, e a ISO 14040, que discorre
sobre avaliação de ciclo de vida.

4 A estrutura da ISO 14001


Em 2015, a ISO atualizou uma estrutura genérica que passou a ser
seguida por todas as normas ISO que foram revisadas e publicadas a
partir daquele ano. A BSI (2015b) credita essa mudança à necessidade,
diante de diversos sistemas de gestão que a empresa tem para implan-
tar, de economizar tempo e recursos e facilitar a integração entre eles.
Até então, as diferentes normas apresentavam cada qual sua estrutura,
requisitos e terminologias, o que, por vezes, gerava duplicação de esfor-
ços, conflitos e confusão.

Essa estrutura desenvolvida é denominada estrutura de alto nível


(EAN), ou high level structure, em inglês (HLS) e foi apresentada no

152 Sustentabilidade nas organizações


chamado Anexo SL. A EAN dispõe que todos os sistemas de gestão
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terão a mesma estrutura (chamada de cláusulas), texto principal idênti-


co e definições comuns. No caso de algumas indústrias e da natureza
da norma, respeitada a estrutura de alto nível, subcláusulas podem ser
adicionadas para se adequarem melhor às especificidades.

O quadro 1 traz uma explicação sintética de cada cláusula da SL e a


correspondente especificidade da ABNT NBR ISO 14001, em sua versão
de 2015.

Quadro 1 – Estrutura de alto nível, cláusulas e subcláusulas da ISO 14001:2015

CLÁUSULAS SUBCLÁUSULAS
(ESTRUTURA DE ALTO NÍVEL) (ESPECÍFICAS APENAS À ISO 14001)

Cláusula 1: Escopo
Estabelece os resultados que a organização deseja
obter com o sistema de gestão, resultados estes que Não há
devem ser alinhados com o contexto da organização
(cláusula 4).

Cláusula 2: Referências normativas


Apresenta os detalhes das normas de referência ou Não há
publicações pertinentes para cada norma.

Cláusula 3: Termos e definições


Discute os termos e as definições que são aplicáveis Não há
a cada norma.

Cláusula 4: Contexto da organização 4.1 Compreensão da organização e seu contexto


Trata-se da base do sistema de gestão, já que 4.2 Compreensão das necessidades e expectativas
identifica as situações interna e externa da das partes interessadas
organização, incluindo os stakeholders, avaliando o
4.3 Determinação do escopo do sistema de gestão
impacto que podem ter nos resultados desejados e de
acordo com os objetivos do negócio. 4.4 O sistema de gestão

Cláusula 5: Liderança
5.1 Liderança e comprometimento
Aponta que a alta liderança deve ter responsabilidade
5.2 Política
e participação no sistema de gestão da organização,
5.3 Papéis organizacionais, responsabilidades e
inclusive para ressaltar a importância para toda a
autoridades
organização.

(cont.)

Novas ferramentas e modelos: sistemas de gestão ambiental 153


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CLÁUSULAS SUBCLÁUSULAS
(ESTRUTURA DE ALTO NÍVEL) (ESPECÍFICAS APENAS À ISO 14001)

Cláusula 6: Planejamento
Representa os planos da organização para aproveitar 6.1 Ações para abordar riscos e oportunidades
as oportunidades e mitigar os riscos identificados 6.2 Objetivos do sistema de gestão e planejamento
na cláusula 4. O foco é ser mais proativo em vez de para alcançá-los
preventivo.

7.1 Recursos
Cláusula 7: Suporte
7.2 Competência
Consiste no suporte necessário para cumprir o
7.3 Conscientização
planejamento da organização e, assim, alcançar seus
7.4 Comunicação
objetivos.
7.5 Informações documentadas

Cláusula 8: Operação
Representa a maneira como a organização executará
o planejamento para alcançar seus objetivos, 8.1 Planejamento e controle operacional
incluindo a maneira de gerir e controlar as mudanças
planejadas e também as não intencionais

Cláusula 9: Avaliação de desempenho 9.1 Monitoramento, medição, análise e avaliação

Determina o que, como e quando os planos serão 9.2 Auditoria interna


monitorados, medidos, analisados e avaliados. 9.3 Revisão da gestão

Cláusula 10: Melhoria


Dispõe que a organização deve identificar 10.1 Não conformidades e ações corretivas
e determinar oportunidades de melhorias 10.2 Melhoria contínua
continuamente.

Fonte: adaptado de BSI (2015b) e BSI (2016).

Pela análise do quadro 1, podemos verificar que, até a cláusula 3, não


há especificidades na ISO 14001:2015. Da cláusula 4 até a cláusula 10,
por sua vez, a ISO 14001:2015 traz especificidades, representadas por
suas subcláusulas.

154 Sustentabilidade nas organizações


Considerações finais
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Neste capítulo, estudamos sobre sistemas de gestão ambiental.


Conhecemos o histórico do surgimento dos sistemas de gestão am-
biental (SGA), muito influenciados por práticas de gestão, sobretudo da
gestão da qualidade total (GQT), e que, posteriormente, foram se con-
solidando com base na criação de normas que visassem orientar as
empresas em sua elaboração.

Das diversas normas internacionais de sistema de gestão ambien-


tal, a ISO 14001 acabou por se tornar a mais popular. Nesse sentido,
acompanhamos um pouco da evolução dessa norma, explicitando as
mudanças entre duas principais versões, a de 2004 e a última versão, de
2015. A última versão ISO 14001:2015 representa, de certa forma, uma
maturidade nos sistemas de gestão ambiental e da temática ambiental
no contexto empresarial como um todo, sobretudo, por se tratar de um
esforço por fazer uma gestão ambiental integrada de maneira estratégi-
ca e integrada com as principais áreas da empresa.

Referências
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Barueri: Manole, 2015.

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______. Apresentando o anexo SL: a nova estrutura de alto nível para todas
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Marly Monteiro; PALADINI, Edson Pacheco (Coord.). Gestão da qualidade total:
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HERAS-SAIZARBITORIA, Iñaki; BOIRAL, Olivier; ALLUR, Erlantz. Three decades


of dissemination of ISO 9001 and two of ISO 14001: looking back and
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MATIAS, João Carlos de Oliveira; COELHO, Denis A. The integration of the


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Production Research, v. 40, n. 15, p. 3857-3866, 2002.

156 Sustentabilidade nas organizações


MORIN, Edgar. O método 1: a natureza da natureza. Porto Alegre: Sulina, 2005.
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QUALITY MANAGEMENT SYSTEM (QMS). All about the history of quality


management. 2018. Disponível em: <https://qualitymanagement.co.uk/quality/
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WHITELAW, Ken. ISO 14001: environmental systems handbook. Oxford:


Elsevier, 2004.

Novas ferramentas e modelos: sistemas de gestão ambiental 157


Capítulo 9
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Novas ferramentas
e modelos:
Produção Mais
Limpa (P+L)

Seguindo a emergência de uma postura proativa das empresas


quanto à questão ambiental ocorrida a partir da década de 1980, pas-
saram-se a estruturar sistematicamente programas que visam não
somente à implementação de tecnologias e processos, mas implicam
uma verdadeira mudança em termos de filosofia ou abordagem. Essa
mudança, na verdade, tem um escopo muito mais amplo, incluindo
design de produto, práticas de gestão e até mesmo o comportamento
e a formação dos funcionários. Essas práticas se consolidaram no
que ficou conhecido Produção Mais Limpa.

Neste capítulo, conheceremos os principais conceitos, estruturas e


práticas empresariais relativos à Produção Mais Limpa, contemplando
seus diversos processos e aplicações. Além disso, estudaremos como
nasceu o conceito e o compararemos com a abordagem anterior em
relação à qual evolui.

159
1 Da abordagem reativa (fim de tubo) à

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abordagem preventiva (P+L)
Os sistemas industriais, historicamente, adotavam uma abordagem
reativa, ou seja, respondiam às questões ambientais somente quando
e se elas surgissem. Segundo essa concepção, não havia problema em
gerar resíduos, efluentes e emissões, desde que suas consequências
fossem tratadas: instala-se um filtro para evitar que a poluição escape
pelas chaminés, reduzir sua emissão ou procura-se o que fazer com
os resíduos gerados e dar destinação a eles. Essa abordagem, por ter
uma natureza reativa e cujas soluções são pensadas após as conse-
quências serem observadas, ficou conhecida como “fim de tubo” (ou
end-of-pipe, em inglês) (AMATO NETO, 2015) e foi predominante entre
as décadas de 1970 e 1980 (UNIDO, 2002).

Em geral, o foco dessa abordagem está restrito a ações localizadas


ou tecnologias específicas que não são articuladas entre si e visam aten-
der os requisitos mínimos legais impostos por legislações e outros me-
canismos de controle e também a eventuais pressões de stakeholders.
Em geral, compreende dois tipos de tecnologia (BARBIERI, 2011):

•• Tecnologias de remediação: atuam na resolução de algum proble-


ma ambiental que já tenha ocorrido, como a aplicação de técnicas
para resolver um vazamento de um produto químico no solo, a con-
taminação de um rio ou quaisquer outros tipos de acidente.

•• Tecnologias fim de tubo: visam capturar e tratar a poluição e os


resíduos gerados antes que sejam lançados ao meio ambiente,
atuando como ação de filtro ou tratamento.

Do ponto de vista econômico, a abordagem fim de tubo não traz


qualquer ganho econômico para a empresa. Pelo contrário, gera custos
para o tratamento das consequências ambientais depois de ocorridas
(tecnologias de remediação) e um custo de instalação e manutenção

160 Sustentabilidade nas organizações


dos equipamentos (tecnologias de fim de tubo). E a tendência é que os
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custos gradativamente cresçam à medida que a legislação ambiental


se torna mais rigorosa. Outros custos relacionados ao controle de polui-
ção podem ser mencionados, como captação, segregação, armazena-
mento, transporte, elaboração de inventários, inspeções e realização de
laudos laboratoriais (BARBIERI, 2011).

Em meados da década de 1980, com a disseminação de novos mé-


todos de reciclagem de resíduos e recuperação de energia, a abordagem
reativa passou a ser mais questionada, sendo que, ao fim da década,
tanto empresas quanto governos passariam amplamente a reconhecê-
-los como boas práticas (UNIDO, 2002).

NA PRÁTICA

Barbieri (2011) ressalta que algumas soluções fim de tubo podem re-
solver o problema dos resíduos industriais apenas temporariamente ou
parcialmente. O autor menciona alguns exemplos, entre eles, o de pro-
cessos de incineração de resíduos industriais sólidos perigosos, que,
em geral, geram gases e cinzas que precisam, mais uma vez, ser objeto
de atenção para que seja dada uma adequada destinação.

Como contraposição à abordagem de fim de tubo, portanto, no fim


da década de 1980, surgiu a abordagem preventiva, que tinha um ca-
ráter de prevenção à poluição. Como abordagem preventiva, as ques-
tões ambientais devem ser foco de atenção das empresas não apenas
quando ocorressem ou apenas no fim dos processos industriais, mas
antes que ocorressem e ao longo de todo o processo industrial (AMATO
NETO, 2015). Esse processo industrial passa a incluir não somente a
produção, mas também aspectos como o design do produto, as maté-
rias-primas empregadas, o uso do produto e sua destinação no pós-uso
(BAAS, 1995). Com isso, as empresas buscam evitar, reduzir ou modifi-
car a poluição ou os resíduos gerados.

Novas ferramentas e modelos: Produção Mais Limpa (P+L) 161


Comparando as duas abordagens, Amato Neto (2015, p. 99) sintetiza

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de maneira bastante coloquial: enquanto a abordagem de controle da
poluição consiste em tratar o problema com a mentalidade “depois trato
disso”, a abordagem de prevenção apresenta a mentalidade “é melhor
prevenir do que remediar”. O quadro 1 sintetiza as diferenças entre as
duas abordagens.

Quadro 1 – Síntese das abordagens de controle e prevenção da poluição

ABORDAGENS

CARACTERÍSTICA
CONTROLE DA POLUIÇÃO
PREVENÇÃO DA POLUIÇÃO (P+L)
(FIM DE TUBO)

Cumprimento da legislação
Preocupação
e atendimento das pressões Uso eficiente dos insumos
básica
dos stakeholders

Postura Reativa Reativa e preventiva

Corretivas e preventivas
Corretivas Conservação e substituição de insumos
Uso de tecnologias de Substituição de tecnologias, mudanças
Ações típicas
remediação e de controle ao fim de processo
do processo (“fim do tubo”) Qualificação e envolvimento de
funcionários de diversas áreas

Diversas outras áreas da empresa, como


Áreas envolvidas Áreas geradoras de poluição produção, compras, desenvolvimento de
produto, marketing, recursos humanos

Fonte: adaptado de Barbieri (2011).

A abordagem de prevenção da poluição, portanto, consiste em evitar


a geração de agentes poluidores em vez de controlá-los após serem
gerados, que consistia no paradigma antigo, reativo, de controle fim do
tubo. Ela também preconiza maiores cuidados quanto à prevenção, à
redução ou à eliminação de acidentes e à exposição a materiais tóxi-
cos e perigosos. Muitas vezes, a abordagem de prevenção à poluição

162 Sustentabilidade nas organizações


é tomada como sinônimo de uma Produção Mais Limpa (P+L), dada a
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similaridade entre os conceitos e as práticas (GLAVIC; LUKMAN, 2007).

IMPORTANTE

O fato de a abordagem de prevenção da poluição ser preferível à abor-


dagem de controle da poluição não significa que essa última não seja
mais necessária. Barbieri (2011), Zwetsloot e Geyer (1996) ressalvam
que, por mais eficiente e avançado que sejam alguns processos, quase
sempre não é possível eliminar 100% a poluição e os resíduos. Portan-
to, em muitos casos, tecnologias fim de tubo continuam tendo que ser
usadas pelas empresas.

O termo Produção Mais Limpa (P+L) foi criado em 1989 pelo Pro-
grama das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), por meio
da sua divisão de Tecnologia, Indústria e Economia, e também pela
Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial, a
Unido (ROBÈRT et al., 2002; GLAVIC; LUKMAN, 2007). As origens do ter-
mo remontam a propostas feitas desde a Conferência de Estocolmo de
1972, sobretudo quanto ao conceito de “tecnologias limpas”, ou seja,
tecnologias que possibilitem a redução da poluição e a economia de
recursos.

Para o PNUMA, em uma definição apresentada em um seminário de


1990, a P+L significa a contínua aplicação de uma estratégia preventiva
para processar produtos e serviços de modo alinhado com a eficiência
no uso de matérias-primas, recursos naturais (como energia e água),
menores emissões de poluentes e de resíduos, além de reduzir riscos
para as pessoas e para o meio ambiente (ROBÈRT et al., 2002).

Novas ferramentas e modelos: Produção Mais Limpa (P+L) 163


2 Conceitos e aplicações (mudanças no

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processo, equipamento, layout, etc.)
As estratégias de P+L podem englobar diversas estratégias de ges-
tão ambiental, incluindo o aumento da produtividade de materiais e da
eficiência energética, melhoria da gestão do fluxo de materiais, aborda-
gens de proteção ambiental preventiva, uso sustentável do capital natu-
ral e cumprimento da lei (GLAVIC; LUKMAN, 2007).

Segundo o Centro Nacional de Tecnologia Limpa (CNTL, 2003), que


coordena os esforços de P+L entre empresas brasileiras, são três níveis
de atuação e de estratégias que abarcam ações de P+L. O nível 1 constitui
modificações no processo e no produto. O nível 2 se constitui na recicla-
gem interna, e o nível 3 em reciclagem externa e ciclos biogênicos. Ao se
pensar as ações de P+L na empresa, os primeiros níveis sempre devem
ser privilegiados em detrimento dos níveis posteriores. Assim, o nível 1
deve ser priorizado em relação ao nível 2 e este em relação ao nível 3.

Vamos acompanhar algumas ações para cada um dos três níveis.

2.1 Opções de redução e controle de emissões e


efluentes (níveis 1 e 2)

As mudanças no nível 1 visam eliminar ou minimizar os resíduos no


processo produtivo no local onde são gerados, compondo ações deno-
minadas de minimização de resíduos (CNTL, 2003). Por isso, trata-se
do nível mais prioritário. Elas basicamente envolvem modificações nos
produtos e nos processos da empresa.

As modificações nos produtos ocorrem pela revisão de suas especi-


ficações, visando reduzir a geração de resíduos durante o uso e o pós-
-uso do produto e também como forma de facilitar sua produção, vi-
sando à redução de resíduos durante o processo (BARBIERI, 2011).

164 Sustentabilidade nas organizações


Além disso, incluem mudanças de especificações, que podem se rela-
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cionar com a substituição das matérias-primas (como de fibra de vidro


para plástico reciclável), mudanças no design, redução do número de
componentes, entre outros. As modificações de produto tendem a ser
de complexa implementação, uma vez que envolvem muitas vezes a
aceitação pelos consumidores de um produto novo ou renovado (CNTL,
2003).

As mudanças nos processos, por sua vez, visam reduzir perdas no


sistema de produção do produto. As mudanças nos processos, segun-
do Barbieri (2011) e CNTL (2003), incluem:

•• Boas práticas operacionais: procedimentos administrativos e


operacionais como planejamento, programação e controle da
produção, gestão de estoques, limpeza, manutenção de equipa-
mentos, treinamento de pessoal, elaboração de materiais de boas
práticas, entre outras.

•• Substituição de matérias-primas e insumos auxiliares: substi-


tuição de materiais (matérias-primas e insumos auxiliares) por
outros menos perigosos para o meio ambiente e para a saúde
dos trabalhadores ou que gerem menos resíduos como subpro-
dutos do processo produtivo. Por exemplo, a substituição de sol-
ventes químicos por solventes à base de água.

•• Mudanças tecnológicas: inovações diversas que visem reduzir os


resíduos, as emissões e os efluentes, podendo envolver pequenas
modificações como especificações no processo, até mudanças
mais significativas, como uso de novos equipamentos e insta-
lações, mudanças de layout da fábrica e incorporação de novos
subprocessos.

As mudanças no nível 2 estão englobadas na chamada recicla-


gem interna, que se refere a todos os processos de recuperação de

Novas ferramentas e modelos: Produção Mais Limpa (P+L) 165


matérias-primas, materiais auxiliares e insumos feitos dentro da planta

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da empresa. Os processos de reciclagem interna incluem a reutilização
de matérias-primas para o propósito em que foram originalmente utili-
zadas (por exemplo, na confecção do mesmo produto) ou para um pro-
pósito diferente do original (por exemplo, na confecção de outras linhas
de produtos) ou ainda para um propósito inferior ao propósito original
(utilização de sobras de matérias-primas para o preenchimento de em-
balagens dos produtos) (CNTL, 2003).

PARA SABER MAIS

Um tipo de tecnologia de reciclagem interna que foi muito bem-suce-


dida são os chamados biocombustíveis de 2a geração, como o etanol
feito a partir da cana-de-açúcar. Com o etanol de 2a geração, empresas
como a brasileira Raízen passaram a utilizar não somente o açúcar da
cana-de-açúcar para a produção do etanol (que consiste na 1a geração),
como também sua palha e bagaço, permitindo incrementar a produção
do etanol, utilizando a mesma área produzida, e reduzir a geração de
resíduos.

2.2 Opções de reciclagem, reúso e recuperação (Nível 3)

Quando a empresa não conseguir realizar as ações de nível 1 ou


nível 2, ela então deve recorrer, como última instância, às ações de
nível 3, sintetizadas como ações de “reúso de resíduos” (CNTL, 2003).
Elas incluem ações de reciclagem externa, reúso e recuperação.

A reciclagem externa consiste em utilizar resíduos do processo pro-


dutivo fora da empresa – em geral, por outra organização. Assim, geral-
mente, a empresa encaminha esses resíduos para outra organização
que seja especializada em atividades de reciclagem ou que podem uti-
lizar esses resíduos em suas próprias operações. A empresa que gera
os resíduos precisa acondicioná-los e estocá-los até juntar o suficiente

166 Sustentabilidade nas organizações


para que seu transporte até a organização recicladora seja economica-
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mente mais viável. Por esses custos adicionais, a reciclagem interna


geralmente é preferível à reciclagem externa (BARBIERI, 2011).

Outra prática é o reúso interno, o que significa empregar os resíduos


no mesmo estabelecimento ou local onde foram gerados. Pode envol-
ver práticas de reaproveitamento de matéria-prima ou de aparas de
matéria-prima, o aproveitamento do calor gerado por máquinas ou pro-
cessos produtivos no próprio processo, a reutilização da mesma água
várias vezes no ciclo produtivo, por exemplo, para resfriamento de má-
quinas, realização da remanufatura de equipamentos ou peças a serem
reempregadas nos mesmos equipamentos, entre outras ações.

Por fim, há também a reintegração ao ciclo biogênico, em que, após


um processo natural, os materiais podem ser recuperados e reutiliza-
dos (CNTL, 2003). É o caso da compostagem de resíduos da agricultura
para a produção de adubo ou da produção de biogás a partir do metano
de dejetos animais (como porcos e animais ruminantes).

NA PRÁTICA

Atualmente, existem diversas empresas que intermedeiam o comércio


de resíduos entre as empresas geradoras e as empresas que os utilizam
como matérias-primas para os seus próprios produtos ou processos.
Com isso, a empresa vendedora consegue gerar uma receita adicional
ao passo que a empresa compradora consegue comprar matérias-pri-
mas a um custo mais baixo, sendo economicamente bom para ambas.
Outro exemplo, este de iniciativa pública, é o programa Feiras e Jardins
Sustentáveis (PROTEGEER..., 2018), introduzido pela Secretaria de Ser-
viços da Prefeitura de São Paulo em 2015, que consiste em coletar os
resíduos das feiras livres da cidade e levá-los para uma central de com-
postagem, que, por sua vez, transforma os resíduos em adubo e o reme-
te à prefeitura para a utilização na jardinagem de praças.

Novas ferramentas e modelos: Produção Mais Limpa (P+L) 167


3 Qualificação de pessoas como estratégia

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de P+L (competências, treinamento)
A Unido (2002) pondera que a P+L é mais do que apenas uma ferra-
menta ou a mera adoção de tecnologias mais limpas. Ela consiste em
uma filosofia ou uma forma de pensamento e, como tal, precisa ser dis-
seminada para as pessoas. Stone (2000), no entanto, chama a atenção
para o fato de que essa constatação ficou relegada a um segundo plano
durante muito tempo por especialistas, que preferiam ressaltar o papel
de aspectos relacionados a materiais, tecnologias e modificações nos
processos e produtos. Sem a dimensão humana e o envolvimento dos
funcionários, pondera o autor, as chances de sucesso de programas de
P+L ficam reduzidas.

O treinamento e o desenvolvimento de competências, portanto, as-


sumem papel central, já que é necessário comprometimento, novas
atitudes, conhecimentos e habilidades específicas para a implementa-
ção de programas de P+L. Entre os aspectos que podem ser aborda-
dos no treinamento, há (SATURNINO NETO; JABBOUR, 2010):

•• informações sobre o uso efetivo de novas tecnologias e novos


processos mais limpos;

•• disseminação de melhores práticas;

•• informações sobre as principais problemáticas ambientais en-


frentadas pela empresa;

•• sensibilização sobre os potenciais ganhos ambientais e econômi-


cos da implementação de novas medidas de P+L;

•• principais aspectos das legislações ambientais.

Como boas práticas para a execução do treinamento, Saturnino Neto


e Jabbour (2010) citam as recomendações feitas por Wehrmeyer:

•• focar em fornecer as informações mais relevantes e simples;

168 Sustentabilidade nas organizações


•• conduzir sessões curtas e informais;
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•• estimular a participação ativa dos funcionários, não se concen-


trando somente na transmissão de informações;

•• identificar potenciais líderes entre os participantes, que, no fu­turo,


po­deriam estar à frente das práticas de P+L a serem implementadas;

•• abordar e destacar os resultados práticos da implementação de


programas e práticas de P+L em outras empresas ou mesmo em
outras áreas da mesma empresa;

•• avaliar os efeitos do treinamento na rotina dos funcionários.

Outra opção que as empresas têm é recorrer a treinamentos e de-


senvolvimento de competências em cada Centro Nacional de Produção
Mais Limpa (CNPML),1 entidades presentes nos diferentes países.
Segundo Shenoy (2016), no Brasil, as primeiras práticas de P+L come-
çaram a ser implementadas em 1995, com a criação do CNPML brasi-
leiro, coordenado pelo Senai do Rio Grande do Sul, por meio do Centro
Nacional de Tecnologias Limpas (CNTL).

Segundo a Unido (2002), os CNPML podem ajudar as empresas não


somente oferecendo treinamentos como ajudando a desenvolver pro-
jetos iniciais para transferir tecnologia, a conduzir estudos de impactos
ao longo do ciclo de vida do produto da empresa, a realizar auditorias
ambientais educativas, a obter certificações ambientais, entre outras
questões.

Outro aspecto relevante é que os programas de P+L do PNUMA, do


qual o CNPML é o maior representante, servem para disseminar o con-
ceito e outros relacionados (como ecoeficiência), contribuindo, sobretu-
do, para estimular o desenvolvimento de políticas públicas em diferen-
tes países (ROBÈRT et al., 2002).

1 Em inglês, National Cleaner Production Center (NCPC).

Novas ferramentas e modelos: Produção Mais Limpa (P+L) 169


PARA SABER MAIS

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Parte do grande esforço para a disseminação do conceito de P+L no
começo da década de 1990, destaca-se também na criação do perió-
dico acadêmico denonimado Journal of Cleaner Production (ou Revista
de Produção Mais Limpa) em 1993. A publicação concentra até hoje
muitas das informações e conhecimentos mais relevantes produzidos
sobre a temática.

4 Implementação, acompanhamento, revisão


e melhoria
Existem diferentes possibilidades de implementar programas de
P+L. Van Berkel (1994), em seu estudo de cinco programas diferentes,
constatou que as empresas utilizaram métodos que variam de três a
seis passos ou estágios. Na mesma linha, Amato Neto (2015) propõe
que as empresas passem por por seis estágios durante a implementa-
ção de um programa de P+L. São eles:

•• Estágio 1 – Planejamento: consiste na definição da equipe que


cuidará da implementação, da realização do treinamento e da
sensibilização de todos os envolvidos, procurando-se identificar
as barreiras e estabelecer metas.

•• Estágio 2 – Diagnóstico: consiste na identificação dos problemas


a serem objetos de atenção por parte da empresa, elaborar fluxo-
gramas dos processos produtivos como exercício para identificar
os fluxos de materiais (matérias-primas, energia, água, produtos,
etc.) e os pontos críticos de geração de resíduos e poluição.

•• Estágio 3 – Avaliação: consiste na elaboração de uma avaliação


quantitativa para procurar estabelecer possíveis alternativas de
ações de P+L.

170 Sustentabilidade nas organizações


•• Estágio 4 – Estudo de viabilidade: consiste no estudo mais de-
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talhado das possíveis soluções de P+L elencadas, analisando-


-se sua viabilidade segundo aspectos técnicos, econômicos e
ambientais.

•• Estágio 5 – Implementação: uma vez que as soluções possíveis


foram estudadas e se verificou quais eram as mais viáveis, este é
o momento de colocá-las em prática.

•• Estágio 6 – Monitoramento: durante a implementação das so-


luções, é necessário ocorrer um monitoramento contínuo, alte-
rando-se o que for identificado como necessário em relação ao
que foi programado. Posteriormente, as soluções implementadas
devem ser sempre revisitadas, visando a sua melhoria contínua.

5 Programas empresariais de P+L


As empresas, ao perceberem os resultados promissores em termos
econômicos e ambientais que a P+L pode trazer, passaram a criar e
manter seus próprios programas, independentes dos programas nacio-
nais de promoção do conceito (como o CNPML).

Em geral, para começar a implementar programas de P+L, as empre-


sas podem eleger um problema ambiental específico como custos de
destinação dos resíduos, baixa eficiência material ou energética, entre
outros, e começar a pensar soluções e tecnologias para resolvê-los. Em
alguns casos, as empresas começam por introduzir um sistema de ges-
tão ambiental. Em termos de competências, elas utilizam os próprios
funcionários, quando minimamente capacitados, ou consultores e es-
pecialistas externos. É essencial também para o sucesso do programa
o comprometimento da alta gestão e o treinamento, a comunicação e a
participação dos funcionários (ZWETSLOOT; GEYER, 1996).

Novas ferramentas e modelos: Produção Mais Limpa (P+L) 171


De modo geral, a implantação de práticas de P+L podem ser feitas

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por qualquer tipo de empresa, de pequeno a grande porte, ou de diferen-
tes indústrias. Como vimos na descrição dos três níveis de atuação, as
práticas de P+L têm um escopo bastante amplo, o que faz também com
que haja diferentes níveis de complexidade e refinamento. Assim, a de-
pender da prática a ser implementada, haverá requerimentos diferentes
em termos de recursos necessários – tecnológicos, técnicos, financei-
ros, organizacionais e de pessoal.

Por essa razão, Barbieri (2011) sugere que as empresas iniciem seus
programas de P+L com práticas que não exijam investimentos eleva-
dos e que tenham potencial de reduzir um volume maior de resíduos.
Algumas delas, pondera o autor, são de baixo custo e podem ser feitas
com relativa facilidade. É o caso das boas práticas operacionais, como
organização do local de trabalho, limpeza e arrumação sistemática, revi-
são do layout da fábrica, manutenção preventiva, entre outras. Para ou-
tras práticas (como o investimento em novas tecnologias e equipamen-
tos), que frequentemente exigem um montante significativo de recursos
e cujo retorno tende a ocorrer em um prazo maior, o autor ressalta que é
fundamental o apoio do governo por meio de políticas públicas e fontes
de financiamento facilitadas.

NA PRÁTICA

No caso do desenvolvimento do etanol de 2a geração pela empresa


Raízen, mencionada anteriormente como exemplo de prática de P+L,
dos 250 milhões de reais gastos em pesquisa e desenvolvimento pela
empresa ao longo de anos, cerca de 208 milhões foram financiados
pelo governo federal por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento
(BNDES) (TECNOLOGIA..., 2014).

De forma semelhante, a CNTL (2003) sugere que as modificações nos


processos, de modo geral, são preferíveis em relação a modificações nos
produtos, dado o risco significativo de mercado ao fazer um produto que

172 Sustentabilidade nas organizações


os clientes podem não gostar, ao passo que as modificações de proces-
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so, teoricamente, não afetam as características do produto final.

Considerações finais
Neste capítulo, estudamos o conceito de Produção Mais Limpa
(P+L). Entendemos como ele se fundamenta em uma nova abordagem,
de prevenção da poluição, surgida em oposição à abordagem de con-
trole, e quais os conceitos e as aplicações que compõem um programa
de P+L. Ressaltamos também que o conceito não tem uma orientação
somente técnica, focando apenas na adoção de tecnologias ou proces-
sos produtivos mais limpos, mas consiste em uma mudança em vários
aspectos da empresa, podendo envolver mudanças no design do produ-
to, passando pelo envolvimento amplo dos funcionários e o suporte do
sistema de gestão ambiental da empresa, até o envolvimento de outros
parceiros externos para contribuir com a destinação dos resíduos re-
manescentes que a empresa não conseguir eventualmente eliminar ou
reaproveitar e reusar internamente.

Por causa dsse escopo amplo, observamos que é necessário um pla-


nejamento cuidadoso por parte das empresas para a implementação de
um programa de P+L que compreenda desde o diagnóstico inicial, pas-
sando pelo treinamento dos funcionários, até o acompanhamento e o
aprimoramento contínuo da sua implementação.

Referências
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instrumentos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

Novas ferramentas e modelos: Produção Mais Limpa (P+L) 173


CENTRO NACIONAL DE TECNOLOGIAS LIMPAS (CNTL). Implementação de

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174 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 10
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

Novas ferramentas
e modelos: análise
de ciclo de vida

Ao buscar amplos objetivos de sustentabilidade ou ambientais,


como “zerar o desmatamento”, “reduzir as emissões”, “dobrar a eficiên-
cia energética”, entre outros, as organizações devem, operacionalmen-
te falando, adotar medidas para identificar qual a melhor decisão a ser
tomada visando ao alcance desses objetivos e, ao longo do tempo, se
a decisão está, de fato, levando ao resultado esperado. É a máxima da
administração: “o que é medido, pode ser mensurado”.

Neste capítulo, vamos abordar um dos recursos fundamentais para


as organizações conseguirem identificar e mensurar objetivamente os
impactos de suas atividades: a análise de ciclo de vida (ACV). Com isso,
o capítulo tem como objetivo apresentar os principais conceitos, estru-
turas e práticas empresarias relativas à análise de ciclo de vida, focali-
zando suas etapas e ferramentas, como softwares.

175
1 Contexto de surgimento e conceitos

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As primeiras abordagens de análise do ciclo de vida (ACV)1 do pro-
duto surgiram no fim da década de 1960, quando se começou a ma-
nifestar de maneira mais sistemática a preocupação com a poluição
ambiental e com a escassez de material e energia. Iniciado nos EUA,
ganhou posteriormente maior corpo no norte da Europa com base em
esforços conjuntos de universidades e empresas. Naquele momento,
o foco era encontrar uma forma de contabilizar a energia e o uso de
recursos (como petróleo, aço, etc.), as emissões e os resíduos gerados
de cada processo industrial. Não por acaso, os primeiros métodos eram
denominados “análise do perfil ambiental e de recursos” ou “ecobalan-
ços”, nomes pelos quais ficaram assim conhecidos até a década de
1990, quando o termo passou a ser substituído pelo ACV (BJORN et al.,
2018a; KLÖPFER; GRAHL, 2014).

Até a década de 1990, os métodos e os aspectos que eram foco


de mensuração mudavam frequentemente, conforme a opinião públi-
ca sobre o que era mais ou menos relevante. Por exemplo, quando a
questão dos resíduos se tornava mais importante, os métodos de ava-
liação focavam esse aspecto. Quando os preços do petróleo subiam,
passava-se a considerar mais a questão da energia. Foi, então, a partir
dessa década, que os métodos começaram a se consolidar de forma
a mensurar os impactos ambientais relevantes, independentemente de
serem objeto de maior ou menor atenção momentânea da opinião pú-
blica (BJORN et al., 2018a).

1 Também frequentemente mencionada como LCA, do inglês Life Cycle Analysis ou Life Cycle Assessment.

176 Sustentabilidade nas organizações


IMPORTANTE
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Não somente empresas fazem análises para considerar o impacto am-


biental das suas atividades. Com base no trabalho do economista rus-
so Wassily Leontief na década de 1970, foi desenvolvido um método
para estimar o impacto ambiental das atividades econômicas agrega-
das de um país ou de uma indústria baseadas em estatísticas nacio-
nais de transações comerciais, a chamada EIO-LCA (sigla em inglês de
economy input-output life cycle assessment) (ECONOMIC..., 2018).

Como marco importante dessa mudança, foi publicada em 1992, pelo


centro de ciência ambiental da Universidade de Leiden, na Holanda, Life
Cycle Assessment (LCA): a guide to best practice (Análise de ciclo de vida [ACV]:
um guia para a boa prática, em tradução livre). Outro evento relevante nesse
período foi a organização do primeiro workshop sobre ACV, em 1990,
promovido pela Sociedade de Toxicologia e Química Ambiental (Setac,
na sigla em inglês), organização com atuação global. A esse primeiro
workshop, que tinha como objetivo discutir uma estrutura comum e os
princípios que deveriam nortear as pesquisas, seguiram-se outros nos
anos seguintes. Esse movimento da Setac culminou na publicação, em
1993, do primeiro guia oficial de ACV (BJORN et al., 2018a; KLÖPFER;
GRAHL, 2014).

No começo da década de 1990, à medida que os métodos se tor-


navam mais complexos e novos dados começavam a ser incorpora-
dos nas ACVs realizadas, os primeiros softwares de suporte para a
realização das análises foram criados, o SimaPro e o GaBi (BJORN
et al., 2018a).

Com base nesse movimento, a ACV, gradativamente, passou a se


consolidar como uma importante ferramenta de gestão ambiental e de
sustentabilidade. Podemos destacar como marcos, em 1996, a criação
de um periódico específico para debater a ACV, o International Journal of

Novas ferramentas e modelos: análise de ciclo de vida 177


Life Cycle Assessment.2 Em 1997, como parte da família ISO 14000, foi

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
lançada uma norma específica sobre a estrutura e os princípios da ACV,
a ISO 140403 – seguida posteriormente por outras derivadas, como a
ISO 14041 (em 1998), a 14042 e a 14043 (ambas em 2000) (BJORN et
al., 2018a; KLÖPFER; GRAHL, 2014).

Enquanto os métodos e as estruturas para a realização da ACV


continuavam a ser desenvolvidos e a se consolidarem, a questão da
confiabilidade e consistência dos dados que alimentavam a ferramenta
continua­va sendo um problema. Existiam diferenças significativas no
padrão e na qualidade dos dados (por exemplo, de emissões de poluen-
tes) para um mesmo processo industrial, dependendo da base de dados
considerada. Diferentes bases de dados eram administradas por dife-
rentes organizações e cobriam diferentes processos industriais.4 Em
2003, então, foi lançada a primeira base de dados global, a Ecoinvent,
que se propôs ao esforço de juntar diferentes setores e processos in-
dustriais, de forma a obter dados consistentes e com qualidade (BJORN
et al., 2018a).

NA PRÁTICA

A Ecoinvent, uma organização sem finalidade lucrativa baseada na Suíça,


mantém a principal base global de dados utilizada pelas empresas, go-
vernos e até consumidores para a realização da ACV. É um total de mais
de 14.700 conjuntos de dados de processos e produtos. A base de dados
é atualizada praticamente todos os anos, sendo que em 2018 estava em
sua sétima versão, a “Versão 3.4” (ECOINVENT..., 2018).

2 Diário Internacional da Análise de Ciclo de Vida.

3 Atualmente, em sua segunda versão, a ISO 14040:2006, ou, na versão brasileira, ABNT NBR ISO 14040:2009.

4 O problema de não se ter bases de dados consistentes para realizar a ACV, na prática, é que, por exemplo,
torna-se difícil comparar diferentes empresas, produtos ou processos industriais para saber qual tem um
menor impacto ambiental.

178 Sustentabilidade nas organizações


Em 2008, refletindo o clamor por uma visão mais ampla da susten-
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tabilidade, que não envolvesse somente a questão ambiental, foi desen-


volvida a Life Cycle Sustainability Assessment5 (LCSA), que incorporou
também questões sociais e econômicas ao se basear no chamado “tri-
pé da sustentabilidade”. Ainda na década de 2000, ocorreu um cresci-
mento vertiginoso no uso de ACVs pelas empresas, sobretudo a partir
de 2005 (BJORN et al., 2018a).

A figura 1 resume alguns dos principais marcos históricos no desen-


volvimento da ACV, desde o seu surgimento até sua consolidação.

Figura 1 – Marcos históricos na evolução conceitual e no uso da ACV

Década
de 1960 1990 1995 2005

Desenvolvimento Expansão do
Surgimento dos
da ISO 14040 escopo do uso para
softwares (Sima
(1997) e de a sustentabilidade
Marcos Nascimento do Pro e GaBi) e de
(LCSA) (2008) e
bases de dados
históricos conceito métodos mais
internacionais crescimento da
sistemáticos para
amplas utilização por parte
realizar a ACV
(ECOINVENT, das empresas
2003)

Desenvolvimento
Consolidação do
de diferentes
conceito de
Evolução métodos e Consolidação e
esforço para o Estabelecimento
adaptação dos expansão do uso
conceitual desenvolvimento de padrões
indicadores da ferramenta
de ferramentas
conforme a
consistentes
opinião pública

Fonte: adaptado de Bjorn et al. (2018a).

Como resultado dos anos de desenvolvimento do conceito e de


suas ferramentas, chegou-se a uma definição razoavelmente aceita so-
bre o que é a ACV, com base no que traz a ISO 14040: “A ACV estuda os
aspectos ambientais e potenciais impactos ao longo do ciclo de vida

5 Análise de Ciclo de Vida e Sustentabilidade.

Novas ferramentas e modelos: análise de ciclo de vida 179


do produto (i.e., do berço-ao-túmulo), da aquisição da matéria-prima

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até a produção, uso e destinação final” (KLÖPFER; GRAHL, 2014, p. 1).

1.1 Conceitos e características da ACV

Para conceituar a ACV é preciso também considerar suas caracte-


rísticas básicas, conforme discutido por Bjorn et al. (2018b). A primeira
delas é que a ACV traz uma perspectiva total desde o “nascimento de
um produto (de onde vêm suas matérias-primas) até a fase do pós-
-consumo, que pode ser sua “morte” (quando o produto se transforma
em rejeito e não há mais possibilidade de aproveitamento) ou “ressur-
reição”, quando o resíduo desse produto pode ser reciclado e voltar à
cadeia produtiva. Para isso, uma outra característica da ACV é ter um
escopo ambiental amplo. Por fim, ela precisa ser compreendida como
um método quantitativo, com métricas e indicadores, e ter embasa-
mento científico.

1.1.1 Perspectiva de ciclo de vida

O conceito da ACV remete a todo o ciclo de vida de um produto, sis-


tema ou até atividade humana sob uma perspectiva “do berço ao tú-
mulo”. Isso significa considerar desde a extração da matéria-prima, a
produção do bem ou da atividade, o uso de energia, e toda a movimen-
tação e transporte, em todas as etapas (do suprimento à distribuição),
chegando até a destinação final do produto no pós-uso (KLÖPFER;
GRAHL, 2014). A figura 2 traz um exemplo simplificado de diferen-
tes etapas do ciclo de vida de um produto a serem consideradas em
uma ACV.

180 Sustentabilidade nas organizações


Figura 2 – Exemplo simplificado de ciclo de vida para uma ACV
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Distribuição
(aos varejistas)

Manufatura Vendas (aos


e montagem consumidores)

Transformação Uso e
de matéria-prima estoque

Extração de
Reciclagem
matéria-prima

Descarte

Fonte: adaptado de Ciambrone (1997).

Bjorn et al. (2018b) explicam que a razão principal pela qual a ACV
considera todo o ciclo de vida é que esforços para reduzir o impacto am-
biental em determinada etapa de um ciclo podem levar, não intencional-
mente, ao aumento do impacto ambiental em outras etapas. Portanto,
é necessária uma visão sistêmica. Por exemplo, os autores comparam
combustíveis fósseis como a gasolina com os biocombustíveis. Por um
lado, usar biocombustível reduz as emissões de gases de efeito estufa
no consumo do combustível quando comparados com combustíveis
fósseis; por outro lado, pode gerar emissões superiores na colheita das
safras dos gêneros agrícolas (como a cana-de-açúcar) usados na pro-
dução e na extração do biocombustível.

Novas ferramentas e modelos: análise de ciclo de vida 181


1.1.2 Escopo ambiental amplo

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A ACV considera um amplo número de aspectos ambientais em
sua análise, totalizando cerca de 15 diferentes temáticas, que, por sua
vez, apresentam suas próprias subdivisões (Bjorn et al., 2018b). Essas
temáticas consideradas estão em constante evolução, porém é possí-
vel apontá-las como as prevalecentes na maioria das ACVs. São elas
(ROSENBAUM et al., 2018):

•• mudanças climáticas;

•• destruição da camada de ozônio estratosférico;

•• acidificação (terrestre e da água doce);

•• eutrofização (terrestre, da água doce e do mar);

•• formação fotoquímica de ozônio;

•• ecotoxicidade (terrestre, da água doce e da água do mar);

•• toxicidade humana (cancerígena, não cancerígena);

•• formação de material particulado;

•• radiação ionizante (saúde humana, ecossistemas aquáticos e


terrestres);

•• uso da terra (produtividade biótica, reabastecimento de aquíferos,


sequestro de carbono, albedos, erosão, capacidade mecânica e
química de filtragem, biodiversidade);

•• uso da água (saúde humana, ecossistemas aquáticos, terrestres


e serviços ecossistêmicos);

•• recursos abióticos (fósseis e minerais);

•• recursos bióticos (diversos, como peixes e madeira);

•• barulho;

•• patógenos.

182 Sustentabilidade nas organizações


Essas 15 temáticas são consideradas indicadores intermediários,
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que contribuem mais ou menos para indicadores fins, classificados ge-


ralmente em três: saúde humana, qualidade do ecossistema ou ambien-
te natural e recursos naturais ou serviços ecossistêmicos (ROSENBAUM
et al., 2018).

Por fim, percebe-se que, embora tenha um escopo ambiental amplo,


a ACV exclui aspectos sociais e econômicos da análise, diferencian-
do-se de outros métodos – como o LCSA, já mencionado (KLÖPFER;
GRAHL, 2014).

1.1.3 Método quantitativo

O método quantitativo caracteriza-se essencialmente em respon-


der à seguinte questão: quanto um produto potencialmente impacta o
meio ambiente? O fato de originar como resultado um número, assu-
mindo-se que o método utilizado e as fontes de dados estejam con-
sistentes, permite a comparação de impactos ambientais entre diferen-
tes produtos ou processos (BJORN et al., 2018b), como ocorreria com
o exemplo mencionado da comparação entre combustíveis fósseis e
biocombustíveis.

Portanto, a ACV, em termos de método, não entra no mérito de uma


discussão crítica sobre a sustentabilidade: baseia-se em uma avalia-
ção quantitativa dos parâmetros estabelecidos como objeto de análise
(KLÖPFER; GRAHL, 2014).

1.1.4 Embasamento científico

A quantificação dos resultados da ACV baseia-se nas ciências na-


turais e exatas. A forma de mensurar, assim como os relacionamentos
entre as variáveis utilizadas para mensurar o impacto, é baseada em
resultados comprovados cientificamente (BJORN et al., 2018b).

Novas ferramentas e modelos: análise de ciclo de vida 183


A despeito de sua base científica e quantitativa, opcionalmente, há

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certo espaço para julgamentos de valor por parte dos responsáveis pela
ACV. Isso porque é possível atribuir uma ponderação sobre qual a rele-
vância dos diferentes impactos ambientais e dos seus efeitos ao longo
do tempo. Por exemplo, pode-se atribuir uma ponderação maior para as
emissões em comparação com a eutrofização.

2 Etapas da ACV: definição do escopo,


análise de inventário, avaliação de impacto e
interpretação
Segundo a ISO 14040,6 a ACV possui quatro etapas distintas, po-
rém que se relacionam e se influenciam mutuamente: a definição de
objetivo e escopo, a análise de inventário, a avaliação de impacto e
a interpretação.

2.1 Definição de objetivo e escopo


Ao começar uma ACV, deve-se perguntar qual o seu objetivo e o es-
copo. A definição do objetivo consiste em uma declaração da organiza-
ção que explicite as razões pelas quais está conduzindo a ACV. Assim,
geralmente, as seguintes perguntas devem ser respondidas (KLÖPFER;
GRAHL, 2014):

•• Qual é o objetivo da ACV?

•• O que justifica a realização da ACV?

•• A quem se destina a ACV?

•• Há a intenção de utilizar a ACV para fins de comparação?

6 Embora a ISO 14040 estabeleça a estrutura e os princípios para a realização da ACV, é a ISO 14044:2006
que detalha os procedimentos para sua realização.

184 Sustentabilidade nas organizações


A resposta a essas perguntas ajudará a empresa a determinar qual
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a profundidade e o nível de acurácia (ou detalhamento) a ser busca-


do durante a condução da ACV, o que, por sua vez, ajuda a delimitar
o escopo dela (KLÖPFER; GRAHL, 2014). O escopo delimita os limites
como a análise será conduzida (HORNE; VERGHESE, 2009). Ao anali-
sar o escopo, busca-se responder a perguntas como: “Serão todos os
processos em torno do produto ou apenas aqueles com maior impacto?
Quais deles?”. Às vezes, uma decisão de reduzir o escopo e simplificar o
processo pode tornar o processo de realização da ACV muito mais rápi-
do e menos complexo, embora se percam maiores detalhes em relação
ao impacto total.

Os limites de escopo mencionados por Horne e Verghese (2009)


se dão em função de alguns fatores, entre os quais podemos destacar
(HAUSCHILD, 2018; ISO, 2006):

•• Definição da unidade funcional: descrição quantitativa e mensu-


rável da função ou do serviço cuja análise será realizada. Isso é
necessário, por exemplo, para estabelecer parâmetros de desem-
penho, e comparar, se houver a intenção, sistemas com função
parecida. Por exemplo, um litro de biodiesel permite a um auto-
móvel determinado rodar quantos quilômetros em comparação
com um litro de diesel tradicional?

•• Limites do sistema (ou escopo do sistema de produto):7 defini-


ção e explicação de quais atividades e processos fazem parte do
ciclo de vida estudado e em que nível de detalhe. Por exemplo,
para análise de um biodiesel feito de cana-de-açúcar, será incluída
a avaliação do impacto dos fertilizantes utilizados nas plantações?

7 O sistema de produto abrange todas as atividades e os processos que estão envolvidos com a produção
de um produto, desde a extração até a destinação final, considerando a limitação de escopo do sistema
estabelecida. Além disso, ele considera a função que o produto executa (KLÖPFER; GRAHL, 2014).

Novas ferramentas e modelos: análise de ciclo de vida 185


•• Seleção dos parâmetros de avaliação: escolha de quais tipos de

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impacto a serem considerados. Esses impactos podem ser bas-
tante amplos, tendo em conta os 15 que apresentamos acima,
ou mais restrito a alguns, notadamente, os considerados mais
relevantes.

•• Dados necessários e nível de qualidade: os dados podem ser


mensurados e calculados diretamente pela empresa com base
na análise cuidadosa de seus processos, operações e produtos
ou serem estimados em fontes externas. Em geral, todas as ACVs
fazem uso de um misto desses dois tipos de dados. Além disso,
respeitando-se sua característica científica, é importante registrar
explicitamente as fontes dos dados coletados e as eventuais in-
certezas (quanto aos dados, modelos e premissas) da ACV. De
fato, a qualidade da ACV pressupõe que todos os dados:

◦◦ apresentem um grau razoável de precisão;

◦◦ sejam representativos, isto é, que as amostras colhidas repre-


sentem adequadamente o total dos dados avaliados, em ter-
mos de região, período e tecnologias empregadas;

◦◦ sejam consistentes, isto é, que haja a garantia de que sejam


utilizados e tratados de maneira uniforme durante todo o
processo;

◦◦ sejam reproduzíveis, isto é, que, com base em informações so-


bre os dados e a metodologia utilizada, seja possível a tercei-
ros independentes conduzir a ACV apresentando resultados
iguais ou muito parecidos.

•• Limites geográficos e temporais: os limites geográficos de-


terminam em que área geográfica os dados devem ser coleta-
dos considerando-se o limite do sistema e os objetivos da ACV.
Quanto aos limites temporais, deve-se considerar qual o máximo

186 Sustentabilidade nas organizações


de tempo que os dados podem ter e em qual periodicidade devem
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ser coletados para serem considerados válidos.

•• Realização de revisão crítica (opcional): determinação se será


realizada ou não uma revisão crítica da ACV realizada, de qual
tipo, como será conduzida e por quem.

•• Perspectiva do estudo: determinação se terá natureza compa-


rativa (isto é, se haverá comparação com outros sistemas) ou se
o estudo será apenas realizado com a finalidade de identificar os
impactos do sistema estudado.

NA PRÁTICA

A revisão crítica de uma ACV pode ser de diferentes tipos. A escolha do


tipo será realizada em relação ao objetivo estabelecido para a ACV. Ele
pode ser realizado por um especialista interno (funcionário da empresa)
ou externo (independente), sendo que suas conclusões devem ser in-
corporadas ao relatório final da ACV da empresa. Ele também pode ser
feito por uma comissão de especialistas de stakeholders da empresa
(por exemplo, ONGs, agências do governo, membros de uma comuni-
dade, etc.), e a presidência dessa comissão deve ficar necessariamente
com um especialista externo. Em geral, a escolha por uma comissão de
especialistas para realizar a revisão crítica geral­mente é feita para dar
mais credibilidade ao relatório divulgado publi­camente (ISO, 2006).

Por fim, é importante mencionar que, se o objetivo e o escopo forem


alterados ao longo da execução da ACV, essas mudanças devem ser
devidamente documentadas e justificadas (KLÖPFER; GRAHL, 2014).

2.2 Análise de inventário


Após a definição do objetivo e do escopo da ACV, parte-se para
a fase de análise de inventário. Segundo a NBR ISO 14040:2009
(ABNT, 2009, p. 14), a análise de inventário “envolve a coleta de dados

Novas ferramentas e modelos: análise de ciclo de vida 187


e procedimentos para quantificar as entradas e saídas relevantes de

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um sistema de produto”.

Ao se realizar a análise do inventário, dados são coletados, tratados,


e devidamente alocados para cada uma das unidades de processo (ISO,
2006; HEIJUNGS; GUINÉE, 2012).8 Os dados coletados podem ser men-
surados, calculados ou estimados, de acordo com sua disponibilidade.
Cada uma dessas escolhas deve ser registrada, documentada e ter a
fonte citada.

De forma geral, é de praxe criar uma tabela contendo todos os dados


coletados para as diferentes unidades de processo, já com as devidas
medidas de unidade funcional padronizadas (por exemplo, em termos
de peso: usando o exemplo, “2 toneladas de gás carbônico geradas pela
utilização de fertilizantes para cada litro de biocombustível produzido”).
Isso facilita a compilação final dos dados para cada impacto ambiental
a ser considerado (HEIJUNGS; GUINÉE, 2012).

É importante ressaltar que, no processo de realização da análise do


inventário, na medida em que se amplia o conhecimento sobre o siste-
ma sendo avaliado, pode-se resultar na identificação de novos requi-
sitos, dados relevantes ou mesmo limitações, requerendo mudanças
nos procedimentos de coleta, no objetivo e/ou escopo da ACV. Por isso,
mais uma vez, destaca-se que as etapas são relacionadas e se influen-
ciam mutuamente (ABNT, 2009).

2.3 Avaliação de impacto


Uma vez que os resultados da análise do inventário estejam parcial-
mente finalizados, a fase de avaliação de impacto consiste em estudar

8 As “unidades de processo” são as menores unidades para as quais os dados são coletados (ISO, 2006).
Um sistema de produto, por sua vez, é composto por diferentes unidades de processo (HEIJUNGS; GUINÉE,
2012). Por exemplo, no exemplo do biodiesel (o sistema de produto), pode-se considerar uma unidade de
processo a produção dos fertilizantes a serem utilizados na produção da cana-de-açúcar ou o processo de
colheita da cana-de-açúcar.

188 Sustentabilidade nas organizações


a significância dos impactos ambientais potenciais (ABNT, 2009). Como
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argumentam Heijungs e Guinée (2012), ele objetiva trazer maior racio-


nalidade para a análise, considerando que o inventário gerado na fase
anterior, de modo geral, é enorme e traz muitos dados individuali­zados;
também requer conhecimento mais especializado para interpretá-los
em termos de importância. Outro aspecto importante é que ajuda a
agregar os resultados para gerar análises determinadas segundo cate-
gorias de impacto identificadas como mais relevantes.

Por essa razão, segundo Heijungs e Guinée (2012), na avaliação de


impacto, o foco de interesse é na categoria de impacto, não mais na uni-
dade de análise – como ocorria na fase de análise do inventário. A título
de exemplo, se pegarmos as mudanças climáticas como categoria de
impacto, devemos agregar os resultados da emissão de diferentes ga-
ses, como o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4) ou o óxido nitroso
(N O), em uma categoria única (como carbono equivalente). Feito isso,
2

então, devemos identificar o impacto desse volume de carbono equiva-


lente do sistema de produto (em termos de potencial de aquecimento
global, ou global warming potential – GWP) em aspectos que influen-
ciam as mudanças climáticas, por exemplo, alterações de temperatura
ou na biodiversidade.

Operacionalmente, a ISO 14040 estabelece três ações obrigatórias


que devem ser conduzidas pelas empresas: primeiro, a seleção das ca-
tegorias de impacto; segundo, a classificação dos indicadores levanta-
dos na análise do inventário dentro das categorias de impacto selecio-
nadas; terceiro, a caracterização do impacto, ao agregar, por meio de
modelos ambientais, os resultados dos indicadores para cada categoria
de impacto, chegando a indicadores agregados (HAUSCHILD, 2018).

2.4 Interpretação

A interpretação consiste na avaliação dos resultados oriundos das


etapas anteriores, de forma a verificar se e como responderam aos

Novas ferramentas e modelos: análise de ciclo de vida 189


objetivos e ao escopo estabelecidos na primeira etapa (HAUSCHILD,

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2018). Com efeito, busca-se interpretar os aspectos identificados mais
significativos, avaliar a completude e a consistência dos resultados, te-
cer conclusões e recomendações, bem como ponderar limitações da
ACV realizada (ISO, 2006).

3 Softwares e programas de ACV


Uma breve apresentação das principais etapas que compõem uma
ACV bem executada já é suficiente para mostrar sua complexidade, seja
em termos de volume e diversidade de dados, seja em termos dos limi-
tes do escopo considerado. Diante dessa complexidade, começaram a
surgir desde o início da década de 1990 ferramentas que visam facilitar
o processo de elaboração da ACV para as organizações.

Ciroth (2012) ilustra a complexidade ao afirmar que um processo de


ACV requer informações de centenas, quando não milhares de proces-
sos diferentes, cada qual com seus próprios indicadores, métodos de
cálculo e formas de agregação. Por essa razão, o autor conclui que é
praticamente impossível conduzir uma ACV sem um devido software.

De modo geral, esses softwares contêm bases de dados gerais


atualizadas periodicamente, como as da Ecoinvent, e também permi-
tem a integração nos sistemas e servidores das empresas, facilitando
o processo de uso por múltiplos usuários (CIROTH, 2012). Existem deze-
nas de diferentes softwares, tanto gratuitos como comercializados por
empresas, no entanto, dois deles dominam o mercado: GaBi e SimaPro.

Considerações finais
Neste capítulo, abordamos de maneira introdutória os principais
conceitos e ferramentas empregados na ACV. Como mencionamos,
a ACV tem evoluído consideravelmente ao longo dos anos, mais

190 Sustentabilidade nas organizações


especificamente, desde a década de 1960. Nesse período, metodolo-
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gias e ferramentas evoluíram consideravelmente, criando-se até mes-


mo padrões internacionalmente aceitos (vide ISO 14040 e derivadas),
desenvolveram-se bases de dados internacionais (como a Ecoinvent) e
softwares, a fim de orientar e facilitar o processo de análise.

Todos esses avanços de décadas são com certeza muito promis-


sores e indicativos da relevância da ACV como ferramenta para a sus-
tentabilidade organizacional. No entanto, ao mesmo tempo, revelam a
complexidade e o universo bastante amplo que abrange a temática, o
que faz com que as organizações sempre recorram à ajuda de organi-
zações ou especialistas externos.

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192 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 11
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

Novas ferramentas
e modelos:
ecodesign

O fundamento do ecodesign, também conhecido como design para


o meio ambiente (em inglês, design for environment – DfE), ou design
para a sustentabilidade (em inglês, design for sustainability – D4S), é coe­
rente com a abordagem preventiva, segundo a qual é melhor “prevenir do
que remediar”. No ecodesign, no entanto, a prevenção é levada em conta
antes mesmo do início do processo empresarial, ainda na etapa de con­
cepção e planejamento, estendendo-se até o pós-consumo do produto.

Este capítulo tem como objetivo apresentar os principais conceitos,


estruturas e práticas empresarias relativas ao ecodesign, mostrando
sua aplicação em materiais e produtos, bem como algumas caracterís­
ticas fundamentais.

193
1 Contexto de surgimento e conceitos

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As raízes históricas do ecodesign têm certa relação com conceitos
como ecoeficiência e ecologia industrial, sendo todos eles gestados em
um contexto de questionamento sobre os “limites de crescimento” e en­
durecimento da legislação ambiental a partir dos anos 1970 e também
de adoção de um comportamento mais proativo e preventivo por parte
das empresas e do crescimento da consciência ambiental por parte dos
consumidores a partir da década de 1980. Tendo em vista justamente
uma abordagem proativa, como esclarecem Vezzoli e Manzini (2008),
seria natural pensar alternativas ambientalmente mais conscientes des­
de o início do processo produtivo e do ciclo de vida do produto: o design
e a produção.

Outro aspecto que chama atenção mencionado por McDonough e


Braungart (2002) é que a ecoeficiência por si só não se mostra o sufi­
ciente para resolver a crescente pressão por recursos naturais: apenas
reduzir o consumo de recursos por unidade produzida não contribui,
por si só, para a redução absoluta do impacto ambiental. Isso, segundo
os autores, em vez de reduzir o problema, apenas o torna menos pior.
A preocupação da ecoeficiência, dessa forma, consistiria em “fazer as
coisas da maneira certa”, sem questionar se o que está sendo feito é
a melhor opção. Propõem, então, que deveria ser buscada, no lugar, a
ecoeficácia, que consiste em “fazer as coisas certas”, propondo uma
reflexão mais aprofundada sobre o “propósito”. Uma vez que se faça a
coisa certa (com eficácia), um segundo passo seria “fazer da maneira
certa (com eficiência)”.

O design de produtos com baixo ou menor impacto ambiental emer­


giu efetivamente a partir de meados da década de 1990, benefician­
do-se da popularização e da consolidação da análise do ciclo de vida
do produto (ACV), que se constituiu em seu alicerce, segundo Hübner
(2012). Na verdade, no começo da década de 1990, já se falava em
design verde (ou green design), porém, tendo uma preocupação em

194 Sustentabilidade nas organizações


reduzir o impacto em apenas uma dimensão – por exemplo, economia de
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energia. O ecodesign, então, alinhado com a análise do ciclo de vida


do produto, começou a se preocupar com uma visão mais sistêmica,
considerando uma multiplicidade de temáticas ambientais simultanea­
mente, e não somente o produto em si, assim como a consideração
de todo seu ciclo de vida, da pré-concepção à destinação final (CHICK;
MICKLETWAITE, 2011).

Em termos de marcos, a publicação, em 1992, dos 12 fatos sobre o


design ecológico, pela Sociedade dos Designers Industriais da América
(ISDA, na sigla em inglês), deu o pontapé inicial para o desenvolvimento
do conceito, assim como a competição europeia sobre ecodesign, que
começou a ser realizada a partir de 1993. Conforme o conceito de ACV
avançava, o conceito de ecodesign também mostrava mais sinais de
consolidação. Em 1999, no Japão, ocorreu o primeiro congresso de eco­
design. Em 2002, a ISO lançou a ISO 14062,1 que integra aspectos am­
bientais no projeto e no desenvolvimento de produtos (HÜBNER, 2012).

A ISO 14062 lista potenciais benefícios que a organização pode ter


ao adotar o ecodesign, entre os quais podemos destacar (ISO, 2002):

•• menores custos ao otimizar o uso de materiais e energia, otimizar


processos e reduzir o desperdício;

•• estímulo à criatividade e à inovação;

•• criação de novos produtos;

•• atender ou ultrapassar as expectativas dos clientes (por um


produto mais sustentável);

•• aprimorar sua imagem ou marca;

•• atrair financiamento e investimento de fundos ambientalmente


responsáveis;

1 No Brasil, a norma correspondente é a ABNT NBR 14062:2004.

Novas ferramentas e modelos: ecodesign 195


•• aumentar a motivação do funcionário;

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•• aumentar o conhecimento sobre o produto (por exemplo, por
meio da análise do seu ciclo de vida);

•• redução dos riscos (incluindo multas ambientais e de uso e ma­


nuseio do produto ou de seus componentes).

Ao longo dos anos, diversos conceitos relacionados expandiram o


escopo do conceito do ecodesign para além do desenvolvimento dos
produtos e passando a incluir também serviços e soluções sustentáveis
diversas (HÜBNER, 2012). Outros conceitos derivados também passa­
ram a ser desenvolvidos e se popularizarem. Entre eles, pode-se citar
dois principais: a biomimética e a abordagem “do berço ao berço”.

1.1 Biomimética

Em relação à biomimética, ou biomimetismo2 (ou biomimicry), termo


cunhado em 1982 mas popularizado em 1997 com a publicação do livro
de Janine Benyus Biomimética: inovação inspirada pela natureza, propõe­
-se que o design e os processos sejam inspirados ou se baseiem na natu­
reza, que, por sua vez, é fruto de um processo evolucionário aperfeiçoado
ao longo de milhões de anos (COHEN; REICH, 2016).

NA PRÁTICA

No website do Biomimicry Institute, fundado por Benyus, é possível en-


contrar diversos materiais e exemplos de aplicação do conceito. Para
citar apenas dois exemplos: o velcro, utilizado em roupas e acessórios,
foi inspirado em uma planta do gênero Arctium, que gruda em roupas e
pelos por conta de minúsculos ganchos que possuem e que são visíveis
apenas com microscópio; e o trem-bala japonês, cujo design foi inspira-

2 O termo biomimética é originado de duas palavras de origem grega: bio, que significa “vida”, e mimesis, que
significa “imitação”, portanto, “imitação da vida” ou “imitação da natureza”.

196 Sustentabilidade nas organizações


do em um pássaro de nome martim-pescador. O objetivo desse design
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era conseguir resolver o problema do ruído emitido e também consumir


menos energia durante sua operação (ARRUDA, 2011).

A biomimética pode ser considerada uma abordagem tecnológica


(PEREIRA, 2016), já que considera uma ampla gama de tecnologias e o uso
significativo de ciência como seus fundamentos (COHEN; REICH, 2016).

1.2 Do berço ao berço

A abordagem “do berço ao berço” (ou cradle-to-cradle), por sua vez,


foi desenvolvida inicialmente no livro-manifesto de 2002, Cradle-to-
-cradle: remaking the way we make things, pelo arquiteto norte-ameri­
cano William McDonough e o químico alemão Michael Braungart. O
conceito tem em seu fundamento que é necessário seguir o pródigo
exemplo da natureza, fazendo com que não haja desperdício ao longo
do ciclo de vida do produto.

Na verdade, os autores utilizam a expressão “resíduos = nutrientes”.


Na natureza, de fato, tudo se transforma e se metaboliza em um pro­
cesso cíclico. Exemplo disso é a árvore, que nasce de uma semente,
cresce e depois “morre”, sendo que seus resíduos viram matéria or­
gânica para ser reutilizada pela natureza. As empresas e as organi­
zações, de modo geral, deveriam atentar para o design de produtos e
processos a fim de atender dois tipos de metabolismos que se inter-re­
lacionam: o biológico e o técnico. Assim, os produtos e os processos
devem ser criados de modo que todos os materiais, mesmo aqueles
criados sinteticamente, possam ser formulados de maneira que pos­
sam retornar de forma segura à natureza no pós-uso. Outros materiais
raros, que não sejam renováveis ou que sejam potencialmente tóxicos,
caso tenham de ser inevitavelmente utilizados, devem ser pensados
para que sejam continuamente reutilizados dentro de um metabolismo

Novas ferramentas e modelos: ecodesign 197


técnico, sem contaminações e sem que se percam suas características

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(MCDONOUGH; BRAUNGART, 2002).

Essa abordagem “do berço ao berço” é orientada para um “design do


ciclo de vida do produto”. Nesse contexto, as diferentes fases do ciclo
produtivo são consideradas no processo de design, incluindo pré-produ­
ção, produção, distribuição, uso e destinação final do produto. Nessas
diferentes fases, são considerados para a tomada de decisão no proces­
so diferentes aspectos. São eles (GIUDICE; LA ROSA; RISITANO, 2006):

•• Utilização de recursos: otimização do uso de materiais e energia.

•• Planejamento da fabricação: otimização dos processos produtivos.

•• Custos ao longo do ciclo de vida: otimização do custo ao longo


de todo o ciclo de vida).

•• Diretrizes da empresa: estratégia e grandes objetivos.

•• Propriedades do produto: não basta apenas ter um desempe­


nho ambientalmente superior; têm de ser considerados também
aspectos como facilidade produtiva, funcionalidade, segurança,
qualidade, estética, entre outros.

•• Conduta ambiental: controle e minimização de impactos


ambientais.

NA PRÁTICA

Em 2005, McDonough e Braungart, por meio de sua empresa de consulto-


ria MBDC, desenvolveram uma certificação para atestar que os produtos
estavam sendo desenvolvidos segundo os princípios cradle-to-cradle. Em
2012, uma organização sem fins lucrativos, a Cradle to Cradle Products
Innovation Institute, passou a controlar o processo como certificadora in-
dependente. Desde o surgimento do certificado em 2005, mais de 200 em-
presas de 15 países já certificaram mais de 6 mil produtos (MBDC, 2018).

198 Sustentabilidade nas organizações


2 Materiais e produtos de baixo impacto
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ambiental
Os materiais são os blocos menores por meio dos quais construí­
mos os produtos e, consequentemente, movemos a economia. Por
essa razão, a seleção do material a ser utilizado na produção do produto
é fundamental em termos de design. De uma maneira ou de outra, todos
os materiais têm origens biológicas ou geológicas, podendo também
ser classificados como de origem orgânica ou inorgânica. Os orgânicos
se originam de organismos vivos (por exemplo, algodão, madeira e cou­
ro), sendo renováveis por serem considerados de relativa rápida regene­
ração; os inorgânicos, por sua vez, são obtidos a partir de um processo
de extração da crosta terrestre (vide caso de minerais e petróleo), sendo
considerados não renováveis (FIKSEL, 2009).

De modo geral, os materiais orgânicos são preferíveis em relação aos


materiais inorgânicos, por serem biodegradáveis ou recicláveis. Contudo,
é necessário recorrer a uma análise de ciclo de vida (ACV) para conside­
rar quais desses orgânicos são preferíveis, já que seu processo de ob­
tenção também gera impactos ambientais. Na mesma lógica, há alguns
materiais inorgânicos que são preferíveis em relação a outros, como
os metais que são recicláveis3 (FIKSEL, 2009). Esses materiais seriam
preferíveis porque, na linguagem de McDonough e Braungart (2002),
estariam sujeitos ao metabolismo biológico (para o caso dos materiais
orgânicos) ou técnico (no caso dos metais sem moléculas complexas).
De qualquer maneira, materiais recicláveis e reaproveitáveis são sempre
preferíveis em relação àqueles materiais virgens (FIKSEL, 2009).

Outros aspectos importantes na escolha de materiais seriam os efei­


tos deles em outras etapas da cadeia produtiva, como o transporte e o

3 São passíveis de reciclagem apenas aqueles metais que não possuem moléculas complexas (FIKSEL,
2009).

Novas ferramentas e modelos: ecodesign 199


pós-uso. Nesse sentido, por exemplo, materiais que permitem que o pro­

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duto fique menor, mais fino ou mais leve, mantendo-se as mesmas ca­
racterísticas do produto, tendem a ser preferíveis, porque economizam
espaço ou gastam menos energia no transporte. Em termos de pós-uso,
a empresa deve ter consciência de em que medida é economicamente
compensador e tecnologicamente viável reciclá-lo (FIKSEL, 2009).

À parte desses materiais orgânicos e inorgânicos existentes, com o


avanço da inovação tecnológica, tem ocorrido o design de novos mate­
riais, inclusive com grandes contribuições da biomimética. No começo
do século XX, o desenvolvimento dos materiais era feito de modo quase
artesanal e pouco científico, por tentativa e erro. A partir de meados
do século XX, ocorreu o desenvolvimento da ciência dos materiais e o
surgimento de novas tecnologias, como o design computacional e as
nanotecnologias (ASHBY, 2016). A biomimética, por sua vez, se benefi­
ciou da convergência entre biologia e engenharia, a partir de novas dis­
ciplinas como biônica, biotecnologia, biofísica, dentre outras (COHEN;
REICH, 2016).

Embora a biomimética seja uma solução promissora para desenvol­


ver novos produtos e materiais, ela frequentemente está sujeita a algu­
mas barreiras, das quais se destacam:

•• Escalabilidade: alguns processos biológicos funcionam em mi­


croescala, porém, falham quando são transplantados para uma
escala maior. Um exemplo disso são os mecanismos de fixação
biológicos utilizados pela lagartixa para se prender à superfícies
lisas e verticais, que não conseguiram ser reproduzidos em uma
escala maior, de modo a poderem ser utilizados em aplicações.

•• Disponibilidade de materiais: às vezes, não é possível sintetizar


artificialmente materiais orgânicos. Um exemplo disso é a teia de
aranha, cuja estrutura molecular é conhecida, mas ainda não con­
seguiu ser sintetizada.

200 Sustentabilidade nas organizações


•• Manufatura: processos industriais muitas vezes não conseguem
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produzir materiais com as mesmas propriedades dos materiais


da natureza em que a biomimética se inspirou. Um exemplo são
os produtos criados artificialmente com base na folha de lótus
em comparação com a flor de lótus original (planta extremamen­
te rara e exótica).

3 Características do ecodesign
Para conseguir desenvolver o ecodesign, é necessário estabelecer
os princípios que o compõem. Isso inclui não somente o desenvolvi­
mento do produto em si como aspectos relacionados, por exemplo, em­
balagem, logística e processo produtivo.

Tendo em vista essa perspectiva mais ampla, Behrendt et al. (1997)


apontam 13 princípios fundamentais do ecodesign:

•• P1 – Atingir eficiência ambiental/função ótima: consiste não so­


mente em conseguir aprimorar a eficiência ambiental como em
repensar a forma como as necessidades dos consumidores po­
dem ser atendidas. Isso significa, por exemplo, reduzir o volume
de carros em uso ao redefinir a necessidade do consumidor “de
ter um carro” para a necessidade de se “locomover de maneira
autônoma”, propondo, em vez de mais venda de carros, o uso de
táxis ou sistemas de carros compartilhados em que o consumi­
dor usa o carro quando precisar.

•• P2 – Economia de recursos: consiste na redução do uso de ma­


terial e energia na produção do produto ou na prestação de um
serviço, gerando menor impacto ambiental e menor volume de
resíduos. Pode ser alcançado com um design de produto que
demande menos insumos, reaproveitamento de materiais já

Novas ferramentas e modelos: ecodesign 201


utilizados (também conhecido como up-cycling)4 ou emprego de

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insumos reciclados.

•• P3 – Uso de recursos renováveis e disponíveis em quantida-


de suficiente: consiste em utilizar na composição de produtos
materiais renováveis e que não sejam escassos, substituindo
materiais não renováveis e mais raros. Entre as vantagens dessa
substituição, podemos citar a disponibilidade maior e a biodegra­
dabilidade dos materiais após o uso. O bioplástico é um exemplo
disso, já que substitui o petróleo (não renovável) utilizado em sua
fabricação por outros compostos vegetais biodegradáveis.

•• P4 – Aumento da durabilidade do produto: consiste em aumen­


tar o tempo de vida útil de um produto, de forma que demore mais
tempo até que ele precise ser substituído. Se um produto tiver
o tempo de vida útil dobrado, grosso modo, podemos dizer que
a necessidade de determinado consumidor poderia ser atendida
demandando-se metade dos recursos em comparação com um
produto tradicional. A durabilidade pode ser pensada com base
em diversas práticas:

◦◦ Produtos com maior resistência a calor, frio e umidade, de


modo a facilitar e estender seu estado de conservação.

◦◦ Produtos que não sejam passíveis de tendências passageiras


(vide caso de “marcas de roupa”, que (re)lançam suas cole­
ções a cada estação ou mesmo mensalmente de acordo com
as tendências de moda).

◦◦ Produtos que sejam modulares, ou seja, cujas partes, confor­


me sejam necessárias substituições ou reparações, podem

4 O reúso de materiais de maneira criativa e agregando valor é conhecido como upcycling. É o oposto
do downcycling, que consiste em transformar os materiais a serem reutilizados em insumos de menor
qualidade. Ambos são considerados “duas faces” da reciclagem.

202 Sustentabilidade nas organizações


ser feitas facilmente, sem a necessidade de descartar todo o
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produto (pensemos no caso de computadores);

◦◦ Produtos que tenham fácil conserto e manutenção, evitando­


-se a necessidade de comprar produtos novos.

•• P5 – Design para o reúso do produto: consiste em desenvolver


o produto de forma a facilitar que ele seja reutilizado múltiplas
vezes, o que inclui o design modular, acesso facilitado aos seus
componentes, proteção contra corrosão, padronização de com­
ponentes e outros elementos.

•• P6 – Design para a reciclagem do material: consiste em desen­


volver o produto de forma a facilitar a reciclagem de seus compo­
nentes quando eles não puderem ser reutilizados. Isso inclui: uso
de materiais recicláveis na composição do produto; uso de menor
variedade de materiais na composição do produto, facilitando ou
evitando um processo de separação dos componentes quando
da reciclagem; escolha de material para a composição com com­
patibilidade garantida;5 indicação clara do tipo e da composição
do material, para facilitar a reciclagem posterior (por exemplo, in­
dicando a composição e o tipo de plástico).

PARA SABER MAIS

Além dos tradicionais símbolos de reciclagem de vidro, papel, alumínio


e aço encontrados nas embalagens, muitas vezes achamos que exis-
te apenas um quinto símbolo representando o “plástico”. No entanto,
o que entendemos por plástico, na verdade, é um termo muito amplo e
que tem diferentes subdivisões, de acordo com a composição química
(ABRE, 2012; CEMPRE, [s.d.]):

5 Um exemplo relevante da questão da compatibilidade é o plástico. Embora, de modo geral, ele possa
ser reciclado, também pode ser composto de diferentes materiais, o que pode tornar a reciclagem mais
ou menos difícil e, em alguns casos, até impraticável. Isso porque o material resultante da reciclagem de
diferentes plásticos incompatíveis pode perder significantemente suas características, como a resistência
(Behrendt et al., 1997).

Novas ferramentas e modelos: ecodesign 203


• PET (polietileno tereftalato);

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• PEAD (polietileno de alta densidade);

• PVC (policloreto de vinila);

• PEBD (polietileno de baixa densidade);

• PP (polipropileno);

• PS (poliestireno);

• Outros (produtos à base de policarbonato).


Existe inclusive uma norma específica da ISO que regulamenta a classi-
ficação de plásticos: a ABNT NBR 13230:2008.

•• P7 – Design para a desmontagem: consiste em desenvolver


produtos cujos componentes sejam facilmente desmontáveis
sem que sofram avarias, para que sejam facilmente reutilizados
ou reciclados.

•• P8 – Minimização do uso de substâncias prejudiciais: consiste


em eliminar ou reduzir a utilização de materiais que sejam poten­
cialmente perigosos à saúde humana ou ao meio ambiente na
composição dos produtos. Exemplos desses materiais perigo­
sos cujo uso deveriam ser evitados são os compostos orgânicos
voláteis (ou VOCs), os metais pesados (como mercúrio, chumbo
ou cádmio) ou substâncias sintéticas que têm efeitos prejudiciais
(como o CFC, que comprovadamente causa danos à camada
de ozônio).

•• P9 – Produção ambientalmente amigável: consiste em repensar a


produção dos produtos de forma a otimizar os processos e, dessa
forma, prevenir a geração de resíduos e emissões e reduzir o uso
de insumos como energia e água. Além disso, recursos que não
podem deixar de ser utilizados devem idealmente ser reutilizados
em um esquema de produção circular ou, ainda, serem reutilizados
em outros processos ou como insumos em outros produtos.

204 Sustentabilidade nas organizações


•• P10 – Minimização do impacto ambiental no uso do produto:
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consiste em desenvolver o produto de forma que minimize o re­


querimento de recursos (como água, energia e outros materiais
diversos) durante seu uso. Por exemplo, podemos pensar em ele­
trônicos que consomem menos energia.

•• P11 – Uso de embalagens ambientais amigáveis: consiste em


desenvolver embalagens para os produtos que ofereçam prote­
ção a eles ao mesmo tempo em que não gerem significativos
impactos ambientais ou que minimizem esses impactos. Pode
incluir quatro abordagens diferentes:

◦◦ Não uso da embalagem: verificar se é possível eliminar a em­


balagem ao mesmo tempo em que se assegura a proteção ao
produto.

◦◦ Uso de embalagens reutilizáveis: verificar se é possível em­


pregar a embalagem para outros usos além do transporte do
produto.

◦◦ Embalagens retornáveis: verificar se é possível reutilizar a


embalagem para o mesmo uso original para a qual foi desen­
volvida. Requer um bom sistema e planejamento para alcan­
çar um “ciclo fechado”.

◦◦ Composição da embalagem: verificar se é possível usar me­


nos materiais e/ou usar materiais recicláveis, biodegradáveis
ou ambientalmente menos impactantes.

•• P12 – Descarte ambientalmente amigável de materiais não


recicláveis: consiste em garantir que substâncias e materiais que
não podem ser reciclados ou reutilizados possam ter uma desti­
nação adequada.

•• P13 – Implementação de logística ambientalmente amigá-


vel: consiste em desenvolver a logística do produto de forma a
minimizar o impacto ambiental gerado durante seu transporte,

Novas ferramentas e modelos: ecodesign 205


armazenagem e distribuição. Medidas relacionadas incluem se­

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leção dos meios de transporte mais adequados, gerencia­mento
adequado da frota de veículos (garantindo adequada manuten­
ção e opção por veículos mais ecoeficientes), seleção dos forne­
cedores de acordo com critérios ambientais, entre outras.

Considerações finais
Neste capítulo, estudamos o histórico e a evolução do ecodesign, os
principais conceitos relacionados, os materiais sustentáveis utilizados
e que passaram a ser desenvolvidos principalmente com base na abor­
dagem da biomimética e do “berço ao berço” e também suas principais
características, baseadas em 13 princípios.

Compreendemos que o escopo do design também se ampliou bas­


tante, tornando central a participação de profissionais de diferentes
disciplinas e de áreas de dentro da empresa. Nesse sentido, podemos
ver que, para além do foco inicial de desenvolvimento de produtos, o
ecodesign passou a ter um universo ampliado de aplicações, incluin­
do aspectos como embalagens, logística, uso do produto e destinação
pós-uso.

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Capítulo 12
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Sustentabilidade e
responsabilidade
socioambiental

As empresas têm um papel central em nossa vida: fornecem pro-


dutos e serviços que consumimos em nosso dia a dia, pagam salários
para os funcionários e recolhem impostos para o governo reaplicar em
áreas importantes para a sociedade. Como atores relevantes para a so-
ciedade, isto seria suficiente? Há algo mais que deva ser responsabili-
dade das empresas? O movimento em prol da responsabilidade social
corporativa propõe esses e outros questionamentos.

Neste capítulo, aprofundaremos essa discussão, com o objetivo de


abordar um painel sobre as linhas de responsabilidade social corpora-
tiva (da tradicional à moderna), explorando seus níveis e sua conexão
com ética empresarial e sustentabilidade.

209
1 Visão tradicional e moderna da

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responsabilidade social corporativa
As origens do termo “responsabilidade social” remontam a um longo
período passado, quando já se discutia o papel da iniciativa empresa-
rial na sociedade. Contemporaneamente e de modo formal, contudo, o
termo começou a ser discutido apenas no século XX, mais especifica-
mente a partir da década de 1950 (CARROLL, 1999). Nessa década, pes-
quisadores e professores da área de direito, administração e economia
passaram a discutir os limites do capitalismo, pensando na emergência
de um Estado de bem-estar social (BANSAL; SONG, 2017).

Essa visão derivava da constatação de que os negócios, sobretudo


os mais importantes e maiores da época, detinham grande poder econô-
mico e afetavam a vida de muitas pessoas. Dessa forma, as responsa-
bilidades morais dos gestores deveriam orientar suas decisões quanto
a questões importantes para a sociedade, como os trabalhadores, as
comunidades onde atuam e os produtos que comercializam. O primei-
ro trabalho que lançou as bases para o conceito foi a obra de Howard
R. Bowen Responsabilidades sociais dos homens de negócio,1 em 1953
(CARROLL, 1999). Em sua obra, Bowen questiona: “Quais são as respon-
sabilidades que o homem de negócios deve assumir para com a socie-
dade?” (BOWEN, 1953 apud CARROLL, 1999, p. 270).

PARA SABER MAIS

Quando o formato moderno das empresas surgiu no começo do século


XIX nos EUA sob o termo “corporação”, enfatizava-se seu papel em pro-
mover o interesse comum da sociedade. Tanto era assim que as empre-

1 Em inglês, na versão original de 1953 e relançada múltiplas vezes posteriormente, Social responsabilities of
the businessman. Conforme Carroll (1999) menciona, businessman não seria a terminologia mais adequada
atualmente, já que há muitas mulheres, de maneira crescente, ocupando cargos de liderança ou mesmo
proprietárias de empresas.

210 Sustentabilidade nas organizações


sas poderiam perder esse status legal caso fosse identificada má con-
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duta dos seus gestores ou atuação contrária ao interesse público. Isso


acabou mudando no final do mesmo século, com base em mudanças
na lei que excluíram essas restrições, dando origem ao formato atual
de empresas como “pessoas” (no Brasil, “pessoas jurídicas”), com direi-
tos equivalentes a pessoas físicas (ou cidadãos). Esse fato atribuiu um
poder muito maior às empresas, gerou menos restrições e legitimou o
acionista/proprietário, não mais a sociedade em geral, como principal
interessado nos resultados dos negócios (BANERJEE, 2008).

Na década de 1960, o interesse pela responsabilidade social cres-


ceu. Os trabalhos de Keith Davis, por exemplo, propuseram uma relação
clara do termo com o poder econômico: quanto maior o poder econô-
mico,2 maior é a responsabilidade social esperada do empresário. Além
disso, mais tarde, o mesmo Davis estendeu sua visão sobre responsa-
bilidade social, incorporando a concepção ética de que a ação de um
indivíduo (no caso, o gestor ou empresário) pode trazer consequências
aos interesses de outros indivíduos (CARROLL, 1999).

O trabalho de Joseph McGuire, por sua vez, conforme explica Carroll


(1999), começa a explorar quais seriam as responsabilidades sociais
– segundo ele, aquelas que iam além de obrigações econômicas ou le-
gais. Por fim, temos o trabalho de Clarence C. Walton, que defende que
há certo componente de voluntariedade no comportamento socialmen-
te responsável do gestor/empresário, não se tratando necessariamente
de alguma resposta a certas pressões e que essas ações podem não fa-
zer necessariamente sentido em termos econômicos, isto é, poderiam
gerar custos adicionais para as empresas.

Na década de 1970, pesquisas de opinião pública nos EUA mostraram


que a maior parte da população esperava que as empresas assumissem
uma obrigação moral para com a sociedade, além de se observarem

2 Quando falamos em “poder econômico”, poderíamos associar sobretudo com o porte da empresa, seja em
termos de faturamento, número de empregados, dentre outros fatores.

Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental 211


maiores formas de ativismo espontâneo da população em temas caros à

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sociedade, tais como o ativismo ambiental, pela segurança dos trabalha-
dores pelos direitos dos consumidores (CARROLL, 1999).

Nesse sentido, durante a década de 1970, intensificaram-se ainda


mais as discussões sobre responsabilidade social das empresas. Carroll
(1999) destaca o trabalho de Harold Johnson, que deu duas importantes
contribuições. A primeira foi a noção de que uma empresa responsável
deveria balancear múltiplos interesses de diferentes públicos, como em-
pregados, fornecedores, comunidade onde atua e seu país. Essa noção
seria antecessora da visão de stakeholders desenvolvida posteriormente.
Uma segunda contribuição do trabalho de Johnson foi a visão de que, por
meio de ações que beneficiassem a sociedade como um todo, em longo
prazo, as empresas poderiam gerar ainda mais lucros. Essa visão antece-
deria a responsabilidade social corporativa estratégica.

Por fim, nesse mesmo período, começou-se a questionar o argumen-


to de que as empresas deveriam perseguir apenas o objetivo econômi-
co. Em vez disso, propôs-se a noção de um horizonte ampliado em que
deveria existir múltiplos objetivos. A esses múltiplos objetivos conven-
cionou-se chamar de “desempenho social corporativo”, conforme discu-
tido por autores como Prakash Sethi e Archie B. Carroll. Nessa década,
começaram a ser realizadas também as primeiras pesquisas aplicadas
em empresas sobre a temática de responsabilidade social (CARROLL,
1999).

A década de 1980 viu a consolidação da temática e o desenvolvi-


mento de conceitos e termos correlatos como “ética de negócios”, “ges-
tão de stakeholders”, entre outros. A conceituação feita por Thomas
Jones, em particular, segundo Carroll (1999), parece ser central, porque
adota explicitamente dois aspectos importantes que já vinham sendo
debatidos desde a década anterior. Primeiro, a noção de voluntariedade,
considerando que a visão de ser socialmente responsável implica que
a empresa deve fazer além do que ela é obrigada por lei e que não deve
ser motivada a agir por pressão de certos grupos. Segundo, que o dever
da empresa não deve ser somente com seus acionistas/proprietários,

212 Sustentabilidade nas organizações


senão também para diversos outros grupos da sociedade, como consu-
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midores, fornecedores e comunidades locais.

Na década de 1990, não houve muitos avanços ao tema, apenas


refinamentos dos conceitos já desenvolvidos nas décadas anteriores
(sobretudo a de 1980) e uma maior conexão com outras temáticas re-
lacionadas, como ética nos negócios, desempenho social corporativo,
gestão de stakeholders e cidadania corporativa (CARROLL, 1999).

Até onde deve se estender a responsabilidade de uma empresa?


Podemos imaginar que ela deve se responsabilizar somente pelo em
que está diretamente envolvida no presente e perante a lei, certo? Não
é bem assim.

NA PRÁTICA

Schrempf (2012) relata que as empresas estão sendo responsabiliza-


das cada vez mais não somente por suas ações, como pelo simples
fato de terem algum envolvimento com determinada questão. A pesqui-
sadora cita exemplos de grandes empresas multinacionais que estão
sendo alvo até mesmo de processos legais por atuarem em países que
violaram direitos humanos (como a África do Sul), empresas que forne-
cem tecnologias utilizadas indevidamente por violar direitos e até mes-
mo por comprarem de fornecedores localizados em zonas de conflito
(como no caso dos minérios do Congo).
Além disso, em alguns casos, estão ocorrendo movimentos críticos em
relação a algumas empresas por ações realizadas no passado, inclusive
há muitas décadas.
É o caso da IBM, acusada de fornecer tecnologia para o regime nazista,
durante as décadas de 1930 e 1940, ou da Monsanto, acusada de for-
necer para os EUA componentes para fabricação de herbicida (o cha-
mado “agente laranja”) usado durante a guerra do Vietnã, na década de
1960, que causou danos graves ao meio ambiente e à saúde da popu-
lação local e de veteranos da guerra (SCHREMPF-STIRLING; PALAZZO;
PHILLIPS, 2016).

Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental 213


A partir dos anos 2000, começou a ocorrer uma grande confluência

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com o tema da sustentabilidade, sendo que, em alguns casos, os auto-
res até mesmo passaram a tomar os termos como sinônimos (BANSAL;
SONG, 2017). Nesse período, entre outros trabalhos, podemos desta-
car o de Zadek (2004). O autor afirma que as empresas não podem ser
simplesmente classificadas como socialmente responsáveis ou não.
Tampouco se pode esperar que uma empresa se torne socialmente
responsável de um dia para o outro. Na verdade, ele argumenta que as
empresas se encontram em um processo evolucionário de aprendizado
sobre responsabilidade social que se estende por cinco estágios.

O quadro 1 traz cada um dos estágios de responsabilidade social


discutidos por Zadek, apresentando uma síntese das suas ações e um
exemplo aplicado no caso da Nike, a empresa fornecedora de material
esportivo estudada pelo autor.

Quadro 1 – Estágios de responsabilidade corporativa

ESTÁGIO AÇÕES EXEMPLO

Início dos anos 1990 – ao se deparar com denúncias


públicas quanto às práticas de trabalho de seus
Não assume responsabilidade
Defensivo fornecedores em países subdesenvolvidos, a Nike
por suas ações e práticas
questionou por que as críticas se
concentravam apenas a ela

Meados da década de 1990 – a Nike implanta


Cumprimento da lei/acordos
Cumprimento códigos de conduta das suas operações e estabelece
como parte do “custo” de se
da lei/acordos auditoria externa em seus fornecedores. As ações não
fazer negócios
convenceram e as críticas continuaram.

1996 – estabelece-se um departamento responsável por


Inserção de aspectos de
fiscalizar e auditar as condições de
interesse da sociedade nos
Gerencial trabalho nos fornecedores.
principais processos
1998 – estabelece-se um departamento de
de negócio
responsabilidade social corporativa (RSC).

(cont.)

214 Sustentabilidade nas organizações


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ESTÁGIO AÇÕES EXEMPLO

Início dos anos 2000 – mesmo após ter estruturado


um departamento grande de RSC e ter promovido a
fiscalização das condições de trabalho, as críticas
continuaram. Apesar de ter estabelecido códigos de
conduta, pressões do departamento de compras da
Nike por prazo e custo acabavam por fazer com que
Inserção de aspectos de
os fornecedores tentassem burlar esses códigos e as
interesse da sociedade nas
Estratégico auditorias realizadas.
principais estratégias
A solução, portanto, foi mudar uma estratégia central
de negócio
do negócio: deveria haver mudanças nas práticas de
compra da empresa, para reforçar o compromisso
da empresa contra essas práticas condenadas. Por
exemplo, assumindo o compromisso de fazer contratos
de prazo mais longo com os fornecedores e mudar a
cultura da empresa.

A partir dos anos 2000 – a Nike percebeu que seria


necessário mudar as práticas de toda a indústria,
incluindo competidores e fornecedores, até mesmo para
não ficar em desvantagem competitiva.
Promoção do envolvimento de A empresa passa a apoiar e liderar iniciativas de
Civil outras empresas com ações legislações internacionais mais exigentes quanto às
de responsabilidade social práticas trabalhistas e a outras políticas públicas junto
à ONU, reunindo-se com membros da sociedade civil,
políticos e outras empresas da indústria do vestuário.
Transformou-se, então, de alvo a parceira
de organizações ativistas.

Fonte: adaptado de Zadek (2004).

Os estágios da responsabilidade social descritos por Zadek (2004)


também representam um histórico da evolução do conceito de respon-
sabilidade social. No estágio defensivo, praticamente, não existe uma
responsabilidade social clara. Podemos dizer que, ao contrário, seria
irresponsabilidade social. No estágio de cumprimento da lei, embo-
ra haja responsabilidade legal, não se pode falar de “responsabilidade
para com a sociedade”. É a partir do estágio gerencial que se podem
identificar traços do conceito de responsabilidade social tradicional,

Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental 215


surgidos a partir da década de 1950. O estágio estratégico surgiu a

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partir das décadas de 1980 e 1990, com base no reconhecimento por
parte das empresas de que se tratava não somente de algo desejável
eticamente, mas que também poderia trazer resultados econômicos
positivos e que deveria ter um alinhamento com as estratégias da em-
presa. Essa é a visão moderna e predominante atualmente, embora
ainda hoje se encontrem empresas nos diferentes estágios. Por fim,
o estágio civil emergiu a partir da década de 2000, e geralmente é al-
cançado por um número menor de empresas, notadamente, aquelas
que estão à frente das demais e conduzem as principais mudanças,
tentando mobilizar toda a indústria a agir de maneira mais socialmen-
te responsável, até mesmo fornecedores, competidores e contando
com uma colaboração próxima de outros stakeholders, como ONGs
e ativistas.

2 Níveis de responsabilidade social


(econômica, legal, ética e filantrópica)
Tendo entendido como se deu a evolução histórica da responsabilida-
de social, em termos conceituais e práticos, o próximo passo lógico seria
questionar: responsabilidade social do que ou sobre o quê? Carroll (1979,
1991) oferece uma resposta a isso ao propor seu modelo de responsabi-
lidade social corporativa. O pesquisador explica que existem quatro tipos
de responsabilidade que a sociedade espera de uma empresa, que são
complementares e formariam o que ele chama de “responsabilidades
sociais totais”. São elas: a responsabilidade econômica, a legal, a ética e
a filantrópica (ou discricionária). Carroll (1991) explica que há certa pre-
cedência da responsabilidade econômica e legal sobre as demais res-
ponsabilidades, conforme mostra a figura 1.

216 Sustentabilidade nas organizações


Figura 1 – Pirâmide das responsabilidades sociais da empresa
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Responsabilidade filantrópica
(ser um bom cidadão)

Responsabilidade ética
(fazer o que é justo e evitar causar danos aos demais)

Responsabilidade legal
(cumprir a lei)

Responsabilidade econômica
(ser lucrativo)

Fonte: adaptado de Carroll (1991).

Essa precedência ocorreria porque, sem a obtenção de lucros (res-


ponsabilidade econômica), não haveria incentivo para abrir a empresa e
mesmo condições de mantê-la aberta; e, uma vez que não se obedeça à
lei (responsabilidade legal), a empresa ficaria impedida de simplesmen-
te existir e atuar. Portanto, para as demais responsabilidades (ética e
filantrópica) ocorrerem, a base da pirâmide (composta pelas responsa-
bilidades econômica e legal) precisa estar sólida. Vamos verificar mais
detalhes sobre cada um dos tipos de responsabilidade.

2.1 Responsabilidade econômica

Segundo a perspectiva da responsabilidade econômica, as empresas


têm como objetivo central a produção de bens e serviços úteis à socie-
dade, sendo a maximização dos lucros do negócio a motivação central
para o ato de empreender. Sem a expectativa de lucro, para que abrir o
negócio e como mantê-lo competitivo e, assim, sempre procurar apri-
morar suas práticas, produtos e processos? (CARROLL, 1991). Também
se pode apontar como parte da responsabilidade econômica o cumpri-
mento de compromissos com fornecedores (pagar corretamente pelos

Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental 217


insumos ou serviços fornecidos), com os funcionários (pagar os salá-

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rios pelo trabalho realizado) e com os clientes (entregar o produto com
a qualidade esperada e de maneira segura).

2.2 Responsabilidade legal

Manter uma responsabilidade legal significa que as empresas de-


vem se adequar e cumprir as leis em todos os níveis governamentais,
do federal ao municipal. A lógica é que essas leis foram promulgadas
como parte de um “contrato social” sobre o que se entende por ser o
certo e o errado segundo a sociedade em que a empresa está inserida
(CARROLL, 1991).

Junto da responsabilidade econômica, a responsabilidade legal tem


sido predominante desde o início do que é conhecida como a “corpora-
ção” do modo que é conhecida hoje.

2.3 Responsabilidade ética

A responsabilidade ética consiste em um conjunto de padrões de


comportamento, normas e expectativas sociais que, mesmo que não
previstas em lei, são esperados da empresa, já que elas são vistas como
importantes e legítimas por um conjunto variado de atores da sociedade,
como consumidores, empregados, acionistas e a comunidade. De certa
forma, a mudança de valores e normas da sociedade geralmente leva
a alterações também na legislação. É o caso, por exemplo, da inclusão
gradativa e mais abrangente de práticas ambientais e direitos humanos
na legislação, o que foi somente possível após uma forte pressão e mo-
vimentação da sociedade civil organizada e de grupos ativistas.

A responsabilidade ética e a responsabilidade filantrópica têm sido


as duas mais promovidas recentemente pelos negócios.

218 Sustentabilidade nas organizações


2.4 Responsabilidade filantrópica (ou discricionária)
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A responsabilidade filantrópica inclui engajar-se efetiva e ativamen-


te nas questões que a sociedade julga relevantes para se promover o
bem-estar social. A diferença entre responsabilidade ética e filantrópica
é que organizações que não têm responsabilidade filantrópica não são
vistas de maneira negativa e antiética; ao passo que se possuem res-
ponsabilidade filantrópica são vistas de maneira positiva, praticantes de
boa cidadania corporativa. Exemplos de ações são doações de recursos
financeiros ou engajamento de funcionários ou gerentes da empresa/
executivos em atividades que visem beneficiar a comunidade, como ar-
tes, educação e meio ambiente.

A responsabilidade filantrópica está no topo da pirâmide, portanto,


porque ela é aquela responsabilidade sobre a qual se tem menos expec-
tativa, por parte da sociedade de forma geral, de que a empresa deva
assumir. Nesse sentido, tende a ter um caráter mais discricionário3 ou
voluntário do que a responsabilidade ética.

IMPORTANTE

No Brasil, destaca-se o papel fundamental do Instituto Ethos na promo-


ção da responsabilidade social. O Instituto Ethos foi fundado em 1998
por um grupo de executivos de empresas com o intuito de gerar conhe-
cimento, trocar experiências e promover iniciativas relacionadas à res-
ponsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável, tendo sido uma
das primeiras entidades no Brasil a tratar do tema. Destaca-se também
o papel desse instituto no desenvolvimento de legislações e políticas
públicas importantes, como o Pacto Nacional pela Erradicação do Tra-
balho Escravo e a Política Nacional de Mudanças Climáticas, o estabe-
lecimento de importantes iniciativas como o comitê do Global Reporting

3 Em seu modelo original, Carroll (1979) fala em responsabilidade “discricionária” em vez de “responsabilidade
filantrópica”. O termo discricionário é usado na administração para referir-se a decisões ou ações que podem ser
tomadas por um administrador ou funcionário de uma organização com certa liberdade e baseadas em suas
convicções e julgamento, sem que seja limitado por lei ou por uma norma interna da organização, por exemplo.

Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental 219


Initiative (GRI) no Brasil, a participação no desenvolvimento do índice

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de sustentabilidade empresarial (ISE) e do Fórum Amazônia Sustentá-
vel, entre muitas outras iniciativas. Essas atividades são desenvolvidas
por seus membros empresariais (conta com mais de 500 empresas as-
sociadas) em parceria com a academia (universidades e institutos de
pesquisa), outras entidades da sociedade civil e o governo (INSTITUTO
ETHOS, 2017).

3 Ética empresarial e responsabilidade


socioambiental
O conceito de “responsabilidade social corporativa”, até a década de
1990, era associado a questões sociais, ao passo que o conceito de “sus-
tentabilidade corporativa” era associado majoritariamente a questões
ambientais. Entretanto, a partir da década de 2000, ambos os concei-
tos convergiram, passando a tratar tanto de questões sociais quanto de
questões ambientais, sendo que chegaram a ser considerados equivalen-
tes por muitos autores e especialistas (BANSAL; SONG, 2017).

Embora venham sendo usados como equivalentes, as origens dos


conceitos de responsabilidade social corporativa (RSC) e sustentabili-
dade corporativa (SC) são diferentes. Segundo Bansal e Song (2017),
essas diferenças devem ser explicitadas, porque cada um deles pode
dar uma contribuição única e relevante para as questões importantes
para a sociedade. A RSC nasceu da discussão acerca da moralidade
dos gestores e a SC nasceu da discussão sobre quais são os limites
do planeta, entre os quais todos (inclusive as empresas) devem atuar.
Portanto, enquanto a RSC tem um fundo ético, baseado na moralidade,
a SC possui um fundo científico, baseado em fatos e evidências.

No entanto, os conceitos possuem origens diferentes. O conceito de res-


ponsabilidade social nasceu essencialmente fundamentado em um ques-
tionamento ético sobre o porquê de as empresas terem de se comportar

220 Sustentabilidade nas organizações


de acordo com determinados valores.4 Refere-se, com efeito, a significa-
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dos que os gestores atribuem a determinadas ações que a empresa fez ou


deve fazer (BANSAL; SONG, 2017). Quando não se é obrigado por lei ou não
se tem uma evidência forte baseada em fatos de que determinada ação
socioambiental trará resultado econômico positivo para a empresa, no cur-
to, médio ou longo prazo, o que explica a decisão da empresa de investir
nessa ação? Provavelmente, uma moral de que é a coisa correta a se fazer
com base no que os valores da empresa ou dos gestores dizem que é uma
sociedade justa ou na percepção de que a empresa é um ator importante
na sociedade e, como tal, deve dar sua contribuição. É uma questão ética.

NA PRÁTICA

Um exemplo muito interessante e importante sobre a relevância da con-


duta ética nos negócios é o caso de escândalos célebres que envolvem
a remuneração de grandes executivos empresariais que trouxeram sig-
nificativos prejuízos à sociedade. Pode-se citar a grande crise de 2008
(chamada de subprime) como um deles, que teve um efeito devastador
por muitos anos em todo o mundo. A crise foi gerada, em grande medida,
por uma ganância muito grande de executivos de grandes bancos e fun-
dos de investimento, que, por buscarem resultados econômicos significa-
tivos às suas empresas e, consequentemente, ganharem maiores bônus
salariais, cometerem práticas irresponsáveis. O governo dos EUA teve
que injetar dinheiro em muitos bancos para que eles não quebrassem e
gerassem ainda mais prejuízo para toda a economia e, consequentemen-
te, para a sociedade. Ainda assim, mesmo tendo participação direta na
crise de 2008 e gerado significativos prejuízos, os bônus dos executivos
foram muito grandes. O presidente dos EUA, Barack Obama, em 2009, fez,
então, um discurso duro e instituiu uma lei para controlar os ganhos dos
principais executivos (CEOs) de grandes empresas: “O que escandaliza as
pessoas é que dirigentes sejam premiados por seus fracassos, sobretudo
quando estes prêmios são pagos pelos contribuintes” (OBAMA..., 2009).

4 Interessante observar que Howard Bowen, um dos precursores da responsabilidade social, produziu seu
livro a pedido de um conselho de igrejas cristãs dos EUA, a propósito de buscar um aprofundamento dos
valores cristãos e da vida econômica (BANSAL; SONG, 2017). Esse fato demonstra o papel dos valores e da
moral no movimento e no debate sobre responsabilidade social.

Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental 221


O conceito de sustentabilidade corporativa, por sua vez, nasceu

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como resposta, inicialmente, a questionamentos sobre que impacto os
limites do ecossistema e sua degradação poderiam gerar na empresa e
vice-versa. Posteriormente, outros aspectos mais abrangentes, inclusi-
ve com forte fundo social, como crescimento populacional e segurança
alimentar, foram incorporados à agenda. Baseando-se em evidências
e articulações lógico-racionais, a conclusão a que se chega é que es-
sas questões, se agravadas, poderiam causar significativos prejuízos
à capacidade de sobrevivência da organização. Baseia-se na lógica da
ciência dos sistemas, segundo a qual todas as partes (empresas, meio
ambiente, sociedade) estão interligadas, se influenciam e se moldam
(BANSAL; SONG, 2017).

Essa discussão sobre a origem de ambos os termos é central e serve


como pano de fundo quando se fala em sustentabilidade e questões socio-
ambientais. Isso porque nem sempre os gestores têm um direcionamento
claro sobre como agir, seja baseando-se em leis ou fiscalização, seja por
uma evidência factual-racional (com base em uma visão de sustentabilida-
de) do que seria bom para os negócios. Nesses casos, a conduta do gestor
ou a sua discricionariedade pode ter como bússola apenas a questão éti-
ca ou os valores morais sobre o que parece ser justo e correto a se fazer
considerando-se um bem-estar amplo. Será que grandes tragédias socio-
ambientais, como o caso do rompimento da barragem de Mariana (2015)5
e de Brumadinho (2019)6 não poderiam ser evitadas se as empresas e os
gestores pautassem suas decisões não somente pela cumprimento estrito
da lei ou do atendimento a pressões explícitas da sociedade, mas também
pela busca genuína de uma conduta ética e responsável?

5 O rompimento da barragem de Mariana, cidade de Minas Gerais, em 5 de novembro de 2015, é considerado


o maior acidente ambiental da história do Brasil, tendo gerado profundos impactos socioambientais. Por trás
do rompimento da barragem, acusações feitas pelo Ministério Público Federal (MPF) atribuem como causa
central da tragédia não uma fatalidade, mas a negligência por parte de gestores da empresa e de outras
empresas subcontratadas responsáveis pela fiscalização e pela operação da barragem. Investigações dão
conta de que os responsáveis, mesmo cientes do risco de rompimento da barragem, decidiram continuar as
operações e até mesmo apresentaram laudo ambiental falso para respaldar a decisão (MENDONÇA, 2016).

6 Até a conclusão do livro, no início de 2019, as consequências ainda não tinham sido completamente
identificadas. Avaliações preliminares, contudo, já apontavam a perda de centenas de vidas.

222 Sustentabilidade nas organizações


Considerações finais
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O que significa as empresas se comportarem de maneira social-


mente responsável? Por que elas deveriam se comportar dessa forma?
Essas são apenas algumas das perguntas que o conceito de respon-
sabilidade social veio tentar responder, quando surgiu como forma de
orientar a conduta das empresas considerando o significativo papel que
elas têm na sociedade, seja fornecendo produtos e serviços usados por
todos e pagando salários e impostos, seja interagindo com a comuni­
dade em que estão inseridas.

Neste capítulo, exploramos as raízes e a evolução histórica do con-


ceito de responsabilidade social, destacamos sua visão contemporânea
e seus componentes principais. Por fim, mostramos que a ética funda-
menta o conceito de responsabilidade social e refletimos sobre como
ele pode (e deve) ajudar a pautar as ações socioambientais responsá-
veis das empresas.

Referências
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bad and the ugly. Critical Sociology, v. 34, n. 1, p. 51-79, 2008.

BANSAL, Pratima; SONG, Hee-Chan. Similar but not the same: differentiating
corporate sustainability from corporate responsibility. Academy of Management
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CARROLL, Archie B. A three-dimensional conceptual model of corporate


performance. Academy of Management Review, v. 4, n. 4, p. 497-505, 1979.

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management of organizational stakeholders. Business Horizons, v. 34, n. 4, p.
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Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental 223


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Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
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224 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 13
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Sustentabilidade
e gestão de
stakeholders – visão
externa

Nenhuma empresa consegue sobreviver e se desenvolver plenamen-


te apenas tendo como foco atender os interesses de seus proprietários
e acionistas. Afinal de contas, para ser lucrativa, ela precisa entender e
se relacionar com seus consumidores; para fabricar e vender produtos,
precisa de funcionários motivados e bem remunerados e de fornecedo-
res que entreguem matérias-primas dentro do prazo, com qualidade e
preço adequado; para se financiar e conseguir recursos para aumentar
sua expansão, precisam de financiamentos de bancos e outras empre-
sas. Esses são apenas alguns dos stakeholders com os quais as empre-
sas também precisam se relacionar.

225
Este capítulo tem como objetivo compreender o que significa a gestão

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de stakeholders como estratégia de sustentabilidade nas organizações.
Particularmente, estudaremos o papel e o relacionamento da empresa
com alguns dos principais stakeholders externos.

1 Conceito de stakeholders e tipos (internos


e externos)
A perspectiva dos stakeholders tem duas faces complementares.
A primeira é que a empresa, enquanto agente detentor de poder eco-
nômico, pode influenciar muitos outros atores com suas ações. A
segunda é que os outros agentes, com os quais a empresa interage,
podem influenciar significativamente os rumos e as decisões da em-
presa. Essa é a lógica fundamental por trás da chamada “teoria dos
stakeholders”.

O conceito inicial de stakeholders surgiu em 1963 com base em um


relatório do centro de pesquisa associado da Universidade de Stanford,
nos EUA. Nesse relatório, apontava-se explicitamente a necessidade de
as empresas terem atenção de outros públicos além de seus acionistas/
proprietários, sob pena de terem ameaçada sua própria sobrevivência.
Esses públicos incluiriam também empregados, clientes, fornecedores,
credores e a sociedade como um todo. Essa concepção tinha, de certa
forma, tanto um viés estratégico, baseando-se, entre outros conceitos,
na concepção de administração estratégica e teoria de sistemas, sobre
como é a melhor forma de administrar uma empresa; e também um
viés ético, baseando-se em conceitos de ética empresarial e responsa-
bilidade social corporativa sobre qual é ou qual deve ser o papel da em-
presa na sociedade (FREEMAN, 1984).

Após seu surgimento inicial, o conceito de stakeholders não foi muito


explorado dentro da administração até que, em 1984, Edward Freeman
publicou seu influente livro Administração estratégica: uma abordagem

226 Sustentabilidade nas organizações


de stakeholders.1 Este foi um importante marco, uma vez que o autor
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passou a ser principal referência na temática e assinalou o início da po-


pularização do termo e da expansão de pesquisas e estudos a respeito
(PARMAR et al., 2010).

O conceito de stakeholders, tal como definido por Freeman (1984,


p. 46), é relativamente simples: “qualquer grupo ou indivíduo que pode
afetar ou é afetado pelo atendimento dos objetivos da organização”. O
autor propõe que a gestão da empresa deveria se fundamentar no en-
tendimento de como gerenciar os relacionamentos da empresa com
esses atores ao longo do tempo. O conceito tem como pressuposto que
os stakeholders detêm, legalmente ou não, uma “parte” da organização.
Segundo Carroll e Buchholtz (2014), essa “parte” pode se derivar tanto
de um interesse nas atividades da organização, passando por uma con-
cepção de “direito moral” até chegar a um “direito legal”. Por exemplo,
embora não necessariamente previsto em lei, é de interesse da comuni-
dade saber dos impactos da instalação de uma fábrica em um determi-
nado local. Pode também ser um “direito moral”, porque a comunidade
será afetada de modo direto, positiva ou negativamente. Agora, em ter-
mos de “direito legal”, a comunidade pode ser protegida por leis locais
que exijam reparações por impactos das atividades da empresa ou os
empregados da empresa, membros da comunidade, têm o direito legal
de receber salário em troca do trabalho fornecido.

PARA SABER MAIS

O termo stakeholders, em uma tradução literal do inglês, seria algo como


“detentor (da palavra inglês holder) de uma parte (da palavra stake)”.
A palavra é uma corruptela do termo inglês stockholder, que significa
“detentor de uma ação (da palavra inglês stock)”, usada no mercado
financeiro para representar o acionista da empresa. Esse fato mar-

1 Tradução livre da obra original de Freeman de 1984, sem tradução para o português, Strategic management:
a stakeholders approach.

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 227


ca, de maneira significativa, a posição dos proponentes da teoria dos

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stakeholders de que a empresa deve manter em vista não somente os
interesses do acionista durante a gestão da empresa.

Essa concepção de “detentor de partes” e a própria definição de


Freeman (1984) podem nos levar a determinar praticamente qualquer
indivíduo ou grupo como stakeholder da organização, dificultando um
gerenciamento objetivo. Freeman (1984), por exemplo, aponta nada
menos que 11 stakeholders: governo; organizações comunitárias locais;
proprietários (ou acionistas); entidades de defesa dos consumidores;
consumidores; competidores; mídia; empregados; ambientalistas; for-
necedores; grupos de interesse especial.

Esses 11 stakeholders, por sua vez, poderiam ser desdobrados em


muitos subgrupos, cada qual com interesses próprios e com capacidade
própria de influenciar na organização (FREEMAN, 1984). Posteriormente,
essa classificação foi revista, como forma de esclarecer melhor o termo
e facilitar a gestão do conjunto de stakeholders.

Uma das classificações mais importantes foi a de Clarkson (1995),


que propunha que os stakeholders fossem classificados como primá-
rios ou secundários. Os stakeholders primários seriam aqueles com os
quais a empresa possui grande interdependência e sem os quais a em-
presa não poderia sobreviver. É o caso de acionistas/investidores, em-
pregados, consumidores, fornecedores, governos e comunidades em
que a empresa está inserida. Esses grupos, portanto, seriam os mais
importantes para a empresa considerar em suas decisões (FREEMAN;
HARRISON; WICKS, 2007).

Os stakeholders secundários, por sua vez, seriam aqueles grupos


que influenciam/afetam e são influenciados/afetados pelas atividades
da organização, mas que não realizam transações (financeiras) com a
organização e que não são essenciais à sobrevivência dela. Entre esses

228 Sustentabilidade nas organizações


grupos, se pode mencionar a mídia e outros grupos de interesse espe-
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cial (CLARKSON, 1995).

PARA PENSAR

Alguns autores, como Driscoll e Starik (2004), defendem que o meio am-
biente pode ser considerado um stakeholder. Se pensarmos que o meio
ambiente afeta e é afetado pela organização, faz todo sentido. Contudo,
pensando por outro lado, não é claro se ele pode ser considerado uma
“parte interessada”, pois ele não tem voz própria. Em vez disso, tende a
ser representado por outras partes interessadas em sua defesa, como
organizações ambientalistas, governos e, em alguns casos, até outras
empresas ou stakeholders internos (departamento do meio ambiente).

Cabe afirmar que não há plena concordância sobre quais seriam os


stakeholders primários ou secundários. Por exemplo, Freeman, Harrison
e Wicks (2007) colocam o governo como stakeholder secundário, além
dos competidores e da mídia. Em verdade, os autores argumentam que
essa classificação seria genérica e defendem que cada empresa seja
analisada individualmente para determinar quais são os primários e
quais são os secundários. Por exemplo, ao analisar uma empresa do
setor farmacêutico brasileiro, veremos que o governo é um stakeholder
extremamente importante, porque é ele que, por meio da Anvisa, aprova
a comercialização de medicamentos no Brasil.

Outra classificação possível de stakeholders é entre internos e exter-


nos. Os stakeholders internos fazem parte, de alguma forma, da empre-
sa e influenciam direta e imediatamente a empresa. Eles dizem respeito
basicamente a funcionários, gestores e investidores/proprietários da
empresa. Os stakeholders externos, por sua vez, embora se relacionem
com a empresa, não estão envolvidos diretamente com ela. Eles dizem
respeito a todos os demais stakeholders, incluindo-se consumidores,
fornecedores, comunidade e governo (CARROLL; BUCHHOLTZ, 2014).

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 229


É importante também levar em consideração que os stakeholders in-

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ternos, sobretudo os funcionários, podem ser subdivididos em diferen-
tes grupos, e cada qual pode ter interesses diversos e afetar a empresa
de maneira diferente, além de interagir de vários modos com os diferen-
tes stakeholders externos (FREEMAN, 1984; WEISS, 2009). O quadro 1
explora essas diferenças entre objetivos e responsabilidades dos dife-
rentes departamentos.

Quadro 1 – Possíveis diferentes stakeholders internos

DEPARTAMENTO OBJETIVOS E RESPONSABILIDADES

Maior diversidade de produtos, aumento das vendas (receitas) e


Marketing e vendas
da satisfação do consumidor.

Inovação, lançamento de novos produtos ou de produtos


Pesquisa e desenvolvimento (P&D)
aprimorados.

Controle de qualidade, aperfeiçoamento contínuo de produtos


Produção e operações e processos existentes, redução do tempo de produção e da
quantidade de recursos empregados na produção (eficiência).

Redução dos custos e aumento das receitas, para maximizar o


Financeiro retorno aos investidores/proprietários, principalmente em curto
prazo.

Sustentabilidade Minimização do impacto ambiental dos produtos e da empresa.

Fonte: adaptado de Weiss (2009).

2 Gestão de stakeholders e práticas


sustentáveis
O que significa fazer uma gestão de stakeholders? Pode-se dizer,
de maneira simples e prática, que é perseguir os objetivos da empresa
tendo em vista também os interesses dos stakeholders. Em outras pa-
lavras, significa balancear os interesses dos stakeholders ao longo do

230 Sustentabilidade nas organizações


tempo de forma que traga benefícios a todos e que todos caminhem
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para a mesma direção (FREEMAN; HARRISON; WICKS, 2007). Isto é


necessário porque muitas vezes os stakeholders têm objetivos que
não somente diferem como podem ser conflitantes entre si.

Pelo quadro 1, por exemplo, é possível observar a existência desses


múltiplos objetivos conflitantes entre os diferentes stakeholders inter-
nos. Se analisarmos o departamento de marketing e vendas, observare-
mos que ele tem como interesse aumentar a diversidade dos produtos
e as vendas. Porém, se considerarmos os interesses do departamento
de produção e operações, um maior número de produtos pode significar
maior dificuldade em gerenciar estoques e aprimorar os processos, o
que pode gerar desperdícios. O departamento de sustentabilidade, por
sua vez, pode defender que a empresa compre matérias-primas mais
sustentáveis de fornecedores que tenham práticas sustentáveis mais
avançadas, o que pode elevar o custo dos produtos (ruim para as ven-
das) e tornar mais complexa sua produção (ruim para as operações),
afetando os objetivos dos departamentos anteriores.

Assim, desenvolver uma forma de conciliar os múltiplos objetivos


que uma empresa e seus stakeholders têm torna-se fundamental. A
forma de conduzir a chamada “gestão de stakeholders” começou a
ser desenvolvida por Freeman (1984) e foi aprofundada por obras
posteriores. O objetivo final da gestão dos stakeholders é gerar lucros
e remuneração para seus proprietários/acionistas (responsabilida-
de econômica) ao mesmo tempo em que se atende da melhor for-
ma possível os objetivos dos demais stakeholders. O que se espera
é chegar a uma situação em que todos sejam beneficiados, o que se
convencionou chamar de uma situação de “ganha-ganha” (CARROLL;
BUCHHOLTZ, 1999).

O processo de gestão de stakeholders é descrito de maneira diferen-


te por diferentes autores, mas pode-se dizer, de modo geral, que segue
alguns princípios (FREEMAN; HARRISON; WICKS, 2007):

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 231


•• Buscar convergência dos interesses dos stakeholders ao longo

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do tempo: nem sempre é possível encontrar uma convergência
imediata dos interesses dos stakeholders, mas o objetivo deve
ser buscar a maior convergência possível em uma perspectiva de
longo prazo e duradoura.

•• Privilegiar o atendimento a questões que interessem múltiplos


stakeholders simultaneamente: buscar atender, por meio de pro-
gramas, políticas, ações, estratégias e produtos, aquelas ques-
tões que interessam a múltiplos stakeholders simultaneamente,
tornando a gestão deles menos complexa e eficaz.

•• Manter um propósito mais amplo do que enriquecer os acionis-


tas/proprietários: a empresa não deve ter como razão de existên-
cia apenas o enriquecimento dos acionistas/proprietários, mas
também gerar benefícios a múltiplos stakeholders.

•• Engajar-se ativamente no estabelecimento de uma comunica-


ção intensiva e de diálogo com stakeholders: é fundamental à
empresa estar aberta a ouvir os stakeholders, sobretudo aqueles
que trazem uma visão mais crítica – embora não necessaria-
mente tenha de atender a todos os interesses manifestados. Isso
pode servir como forma de identificar oportunidades de gerar
benefícios mútuos. Estar aberto ao diálogo também traz maior
possibilidade de um relacionamento genuíno e duradouro da em-
presa com stakeholders.

•• Monitorar constantemente e rever processos de forma que eles


sempre atendam da melhor forma o interesse dos stakeholders:
o contexto em que a empresa está inserida atualmente evolui
cada vez mais rápido, portanto ela tem de manter um monito-
ramento constante, sempre procurando formas de aprimorar os
processos e a comunicação.

232 Sustentabilidade nas organizações


3 Relacionamento com consumidores,
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fornecedores e outros públicos


Segundo a visão da gestão de stakeholders, uma empresa pode ser
vista como um conjunto de relacionamentos com diferentes stakeholders
(FREEMAN; HARRISON; WICKS, 2007). Então, por analogia, a gestão da
empresa pode ser resumida como a gestão de um conjunto de relaciona-
mentos com seus diversos stakeholders. Acompanhe alguns dos aspec-
tos mais críticos do relacionamento das empresas com alguns dos prin-
cipais stakeholders externos no que tange à temática da sustentabilidade.

3.1 Relacionamento com consumidores

Segundo uma visão tradicional dos consumidores, podemos vislum-


brá-los como tendo os detentores de interesses fundamentais: a obten-
ção de produtos da melhor qualidade, com a maior diversidade possível
e ao custo mais baixo possível. No entanto, não bastassem esses atri-
butos, os consumidores passaram a exigir da empresa e dos produtos
e serviços que comercializa um impacto ambiental e social menor e
maior atenção às questões da sustentabilidade.

Em pesquisa internacional denominada Barômetro da biodiversida-


de, realizada em vários países, essa tendência de consumo consciente
se mostrou forte. Entre os consumidores brasileiros entrevistados na
pesquisa de 2017 (UEBT, 2017), 89% acreditam que as empresas têm
a obrigação moral de gerar impactos positivos para a sociedade e para
o meio ambiente; por outro lado, esse fato contrasta com a percepção
de 54% dos entrevistados brasileiros, que acreditam que as empresas
prestam pouca atenção nisso.

Além de um bom desempenho socioambiental das empresas, é es-


perada delas também uma transparência cada vez maior. As empresas
passaram a ter preocupação em divulgar de maneira clara suas ações

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 233


em termos de sustentabilidade. Em alguns casos, as empresas che-

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gam até mesmo a evidenciar suas fragilidades e reconhecer que ainda
podem melhorar em muitos aspectos. Essas informações podem ser
fornecidas por meio de relatórios anuais, em que as ações das empre-
sas relativas à sustentabilidade em determinado ano são descritas. No
Brasil, é cada vez mais comum que as empresas, sobretudo as gran-
des, façam isso. Segundo relatório divulgado pela B3, a antiga Bolsa de
Valores de São Paulo (Bovespa), cerca de 75% das maiores empresas
brasileiras de capital aberto (i.e., empresas com ações na bolsa de va-
lores) publicam relatórios tendo como base os objetivos de desenvolvi-
mento sustentável (ODS) (B3, 2018).

IMPORTANTE

Grande parte das mais importantes empresas e organizações do mundo


utilizam-se em seus relatórios de atividades (chamados muitas vezes
de “relatórios de sustentabilidade”) as diretrizes do Global Reporting
Initiative (GRI), o padrão mais importante e difundido do mundo. Seguin-
do essas diretrizes, as empresas são estimuladas a comunicar as ações
de sustentabilidade desenvolvidas e a explicar eventuais pontos que
precisam ser aprimorados e fragilidades de sua atuação. Dependendo
do grau maior ou menor de profundidade do relatório, elas podem divul-
gar apenas informações mais básicas e essenciais (correspondentes à
modalidade “essencial”) ou informações mais detalhadas (correspon-
dentes à modalidade “abrangente”) (GRI, 2018).

Outra forma que se consolidou para as empresas se comunicarem de


maneira simples e ao mesmo tempo com credibilidade com os consumi-
dores é a adoção de certificações e outros tipos de selo em seus produtos.
Essas ferramentas normalmente são gerenciadas por entidades indepen-
dentes (em geral, organizações sem fins lucrativos) que desenvolvem cer-
tos critérios a serem observados pelas empresas para que elas consigam
ser certificadas. Assim, grande parte da credibilidade está na credibilida-
de da certificadora. Existem certificações mais ou menos abrangentes;

234 Sustentabilidade nas organizações


algumas delas são voltadas apenas para determinada temática, determi-
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nada atividade ou região geográfica. Por exemplo, há certificações como o


Forest Stewardship Council (FSC), de caráter internacional, voltada apenas
para a indústria de papel e celulose; a certificação da Fundação Abrinq, vol-
tada a empresas brasileiras de diferentes indústrias que se comprometem
a combater o trabalho infantil; a Rainforest Alliance,2 voltada a empresas do
setor agropecuário que se comprometam a atuar em temas como mudan-
ças climáticas, manutenção da vida selvagem e preservação de florestas.
No Brasil, destaca-se o papel do Instituto Akatu de Consumo Consciente
na divulgação de informações e promoção do consumo sustentável. Eles
desenvolvem esse trabalho, entre outras coisas, por meio de palestras e pu-
blicações em que divulgam princípios e práticas de consumo consciente.

IMPORTANTE

No entanto, há que se fazer uma ressalva. Uma pesquisa realizada


pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) mostra que apenas um
em cada quatro brasileiros percebe ativamente as mensagens rela-
cionadas à sustentabilidade divulgadas pelas empresas em suas em-
balagens de produtos (IDEC, 2013). Esse fato mostra que, embora os
consumidores tenham valores e intenções sustentáveis, nem sempre a
intenção se transforma em comportamento efetivo. Algumas das bar-
reiras a um consumo mais sustentável podem ser o preço dos produ-
tos, a praticidade e a falta de informação (YOUNG et al., 2009).

3.2 Relacionamento com fornecedores

Como resultado da pressão de diferentes grupos, como consumido-


res e investidores, sobre o desempenho socioambiental da empresa e

2 No Brasil, a certificação do Rainforest Alliance está a cargo do Instituto de Manejo e Certificação Florestal
e Agrícola (Imaflora), sediado em Piracicaba.

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 235


de seus produtos e serviços, as empresas passaram a trabalhar em co-

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laboração com seus fornecedores com o intuito de estes aprimorarem
seu próprio desempenho socioambiental.

Como esclarece Amato Neto (2015), atualmente, além dos critérios


tradicionais de preço, prazo e qualidade, a sustentabilidade se tornou
um critério fundamental na seleção de fornecedores. Isso porque, mui-
tas vezes, as empresas passaram a ser vistas como corresponsáveis
pelo desempenho socioambiental de seus fornecedores.

Com efeito, muitas vezes, as empresas passaram a ser con-


denadas e verem sua reputação ameaçada quando surgem de-
núncias de desempenho socioambiental insatisfatório de seus
fornecedores (VON HAARTMAN; BENGTSSON, 2018). Essa di-
nâmica está associada a três fatores fundamentais. Primeiro, a
questão da terceirização, também conhecida como outsourcing.
Desde a década de 1980, passou a ser cada vez mais comum que as
empresas busquem contratar outras empresas para desempenhar
atividades produtivas, que geralmente eram de sua responsabilidade
(KOTABE; MURRAY; MOL, 2009). Isso inclui etapas como distribuição,
produção e montagem de equipamentos, prestação de serviços entre
muitas outras. Com esse movimento, as empresas tinham interesse
em reduzir custos e aumentar a eficiência produtiva. Porém, passou ao
questionamento fundamental: a empresa contratante tem sua parcela
de responsabilidade por eventuais más condutas ou baixo desempenho
socioambiental das empresas terceirizadas? Segundo, com a emergên-
cia da perspectiva de ciclo de vida dos produtos, sobretudo a partir da
década de 1990, o desempenho do produto passou a ser visto como o
conjunto do desempenho dos seus componentes (i.e., matérias-primas)
e de todas as atividades que são realizadas para produzi-los, distribuí-los
e dar a destinação adequada (SCHALTEGGER; BECKMANN; HANSEN,
2013). Terceiro, com o incremento das tecnologias de informação e co-
municação, torna-se cada vez mais fácil monitorar e descobrir as ativida-
des das empresas, fazendo com que, agora, não somente especialistas, o

236 Sustentabilidade nas organizações


governo e grupos ativistas possam ter acesso e investigar a conduta das
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empresas, mas qualquer pessoa com um computador. Por outro lado,


empresas como a Natura estão criando voluntariamente canais de divul-
gação para facilitar a disseminação da informação. Inaugura-se a era da
transparência radical (MOSHER; SMITH; WICKER, 2014).

3.3 Relacionamento com governos

Em geral, questões de meio ambiente historicamente foram tratadas


de maneira conflituosa entre empresas e governo. O governo, garantidor
do interesse público, passou a estabelecer, sobretudo a partir da década
de 1970, restrições às atividades das empresas que gerassem impac-
tos significativos na sociedade. De parte da empresa, argumentava-se
que ela fazia sua parte gerando empregos, renda e produtos e serviços
para a comunidade, além de pagar impostos ao governo, e que leis que
aumentassem as exigências sociais e ambientais para elas poderiam
resultar em prejuízo.

À medida que as empresas passaram a adotar perspectivas mais


proativas e menos defensivas e reativas em relação a questões socio-
ambientais, elas e o governo se aproximaram a fim de contribuir para
o desenvolvimento de legislações mais eficazes, pensando no bem-
-estar da sociedade (inclusive da empresa). Foi assim, por exemplo,
na discussão sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos, em que o
Compromisso Empresarial pela Reciclagem (Cempre), formado por um
conjunto de empresas, teve papel central; e nas políticas relacionadas
às mudanças climáticas, em que se destacou o papel de empresas em
iniciativas como o Fórum Brasileiro de Mudança do Clima (FBMC).

De fato, os governos dos países perceberam que o processo deve


ser gradual e que as empresas, como principais atores diretamente afe-
tados por leis e políticas, devem ser convidadas a participar dele. Nessa
direção, Porter e Van der Linde (1995) defendem que os governos criem

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 237


leis e regulações que estimulem a inovação, direcionadas a melhorar o

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desempenho ambiental das empresas. Algumas das principais medi-
das que os governos deveriam tomar, segundo os autores:

•• Focar nos resultados, não na tecnologia: em vez de o governo


determinar que as empresas passem a utilizar a tecnologia A ou
B, devem ser apontadas metas específicas que as empresas de-
vem alcançar.

•• Estabelecer legislações bastantes rígidas: o que ajuda a estimu-


lar as empresas a buscar soluções mais radicais e inovadoras,
em vez de fazer apenas pequenas mudanças.

•• Definir estágios para o alcance de melhorias: em vez de colocar


metas muito restritivas de aprimoramento do desempenho am-
biental das empresas a curto prazo, criar diversos estágios que
devem ser alcançados gradualmente pelas empresas.

•• Usar incentivos de mercado: criar incentivos positivos, como re-


dução de impostos e criação de linhas de financiamento, em vez
de apenas taxas e impostos punitivos (incentivos negativos).

•• Atentar para as leis que outros países mais competitivos es-


tão criando: para que as empresas nacionais não sejam even-
tualmente prejudicadas no comércio internacional, é importante
buscar identificar como estão as legislações ambientais seme-
lhantes em outros países.

•• Contar com a participação das empresas: empresas devem


participar, direta ou indiretamente, da discussão de potenciais
legislações a serem desenvolvidas, já que são as principais
beneficiadas.

238 Sustentabilidade nas organizações


3.4 Relacionamento com ONGs e organizações ativistas
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Historicamente, o relacionamento entre empresas e organizações


ativistas – como ONGs ambientalistas – ocorria de maneira turbulenta.
De um lado, as organizações ativistas viam as empresas como grandes
vilãs da degradação ambiental e de má vontade para a realização de
ações que reduzissem seu impacto ambiental. Do outro lado, as em-
presas viam as organizações ativistas como radicais, rebatendo que a
degradação ambiental seria inevitável para o desenvolvimento e a pro-
dução de produtos e serviços.

Atualmente, tanto ONGs e organizações ativistas quanto as empre-


sas têm se mostrado mais abertas ao diálogo, encarando ambas as
partes importantes para a resolução de problemas ambientais. Temos,
a título de exemplo, o caso de organizações ativistas na temática do
meio ambiente, como a WWF, uma das maiores ONGs ambientais do
globo. Na filial da WWF no Brasil, é possível ver essa mudança de pos-
tura. Ao descrever sua atuação, a WWF Brasil aponta que trabalha em
parceria com empresas em diferentes temáticas, como é o caso das
mudanças climáticas. Em seu website, é descrita da seguinte maneira a
relação com as empresas: “Trabalhar com empresas ajuda a impulsio-
nar mudanças na escala e no ritmo que nosso planeta precisa. Os desa-
fios que enfrentamos atualmente são grandes demais, interconectados
demais e urgentes demais para qualquer organização resolver sozinha”
(WWF, 2018).

Além disso, empresas utilizam o chamado marketing relacionado


a causas (MRC) (BIGLIONE; WOODS, 2007). De um lado, o MRC ajuda
as empresas a incrementar suas vendas associando a marca e o pro-
duto da empresa a causas ou ONGs reconhecidas. Por outro lado, as
ONGs e/ou causas se beneficiam, ganhando parte ou a integralidade
das receitas advindas das vendas dos produtos. Dois exemplos brasilei-
ros nesse sentido são a parceria entre a marca Havaianas e o Instituto

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 239


de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), em que os chinelos da empresa são es-

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tampados com motivos de fauna e flora brasileiros e parte da receita
das vendas vai para a ONG; e a parceria entre a Fundação SOS Mata
Atlântica e o Banco Bradesco, em que parte da anuidade do cartão do
banco estampado com os motivos da ONG é revertida para ela mesma.

Considerações finais
Neste capítulo, apresentamos e explicamos o surgimento do concei-
to de stakeholders. Além disso, discutimos especificamente a gestão de
stakeholders, atualmente utilizada pelas empresas para planejar suas
estratégias e estabelecer como desenvolverá suas ações de forma a
construir um bom relacionamento com as mais variadas partes interes-
sadas nos resultados da empresa e procurar atender seus interesses.

Vimos também que existem diferentes tipos de stakeholders, que


podem ser, por sua vez, agrupados de acordo com diferentes classi-
ficações. Uma dessas classificações é entre stakeholders internos e
externos. Abordando os stakeholders externos, apresentamos como
o relacionamento e as expectativas das empresas com consumido-
res, fornecedores, governo, ONGs e organizações ativistas mudaram e
estão se desenvolvendo atualmente.

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Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão externa 241


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242 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 14
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Sustentabilidade
e gestão de
stakeholders – visão
interna

Entender como ocorre a implementação e a manutenção da sus-


tentabilidade nas organizações envolve compreender que a temática
é complexa e tem diversas faces que requerem um profundo envolvi-
mento das mais diferentes áreas da empresa. Cada uma dessas áreas,
embora tenha uma função específica dentro da busca pela sustentabi-
lidade organizacional, precisa atuar de maneira interdependente e com
visão sistêmica de toda a organização.

Neste capítulo, procuraremos compreender a gestão de stakeholders


ou partes envolvidas como estratégia de sustentabilidade nas organiza-
ções, com enfoque para os públicos internos.

243
1 Sustentabilidade e relacionamento com

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
públicos internos: acionistas, gerentes,
funcionários, gestão de pessoas
Quando falamos em stakeholders internos, consideramos acio-
nistas, gerentes e funcionários de diversas áreas (FREEMAN, 1984).
Contudo, esse grupo de “stakeholders internos”, como se pode esperar,
está longe de ser homogêneo. De fato, cada um dos stakeholders que
compõe esse grupo têm interesse em um bom desempenho global da
empresa, mas também tem interesses próprios e legítimos que levam
em conta na hora de tomar decisões e realizar ações. Da mesma forma,
cada um desses atores tem o potencial de oferecer contribuições para
aprimorar a sustentabilidade da empresa (SAVITZ; WEBER, 2006).

1.1 Funcionários e gestores

Os diferentes departamentos e funcionários, como stakeholders


internos, têm diferentes papéis e variadas expectativas em relação
aos resultados da sustentabilidade. De fato, quando se fala em ações
socioambientais de determinada empresa, percebe-se que quem as im-
plementa de fato são esses gestores e funcionários da chamada média
gerência (ESTY; WINSTON, 2006) e que é necessário envolver pessoas
com diferentes atribuições nela (HITCHCOCK; WILLARD, 2008). Vejamos
alguns dos principais departamentos e áreas1 cujos funcionários e ges-
tores desempenham funções e papéis relacionados à sustentabilidade.

1 Importante ressaltar que nem sempre essas funções são estruturadas em departamentos dentro das
empresas. Muitas vezes, pode-se falar em áreas com estruturas enxutas, de poucos funcionários e que
interagem com diferentes áreas. Mesmo no caso da sustentabilidade, por exemplo, Savitz e Weber (2006)
defendem que o ideal para algumas empresas é que não exista um “departamento de sustentabilidade”,
com estrutura fixa e papéis formais, mas, sim, um “departamento virtual”, sem estrutura formal e sem
orçamento próprio, composto por pessoas de diferentes departamentos.

244 Sustentabilidade nas organizações


1.1.1 Marketing e vendas
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Em geral, à área de marketing e vendas cabe o papel de comunicar


aos consumidores atuais e potenciais da empresa as ações e o posicio-
namento da empresa em relação à sustentabilidade. Isso é fundamen-
tal para a empresa, sobretudo pelo fato de os consumidores, com seu
poder de compra, serem, em última medida, os responsáveis por gerar
a receita necessária para a sobrevivência da empresa.

Dessa forma, as empresas se esforçam para comunicar suas ações


de sustentabilidade a clientes e outros stakeholders como forma de
construir ou manter sua reputação positiva de “empresa sustentável”
e comprometida com ações socioambientais. Em alguns casos, isso
é feito para que a empresa recupere ou reduza uma reputação negati-
va.2 Em ambas as situações, como consequência dessa alteração de
reputação (seja aumentando a positiva, seja reduzindo a negativa), a
empresa pode esperar diferentes resultados, seja no incremento da dis-
posição do consumidor de pagar um valor superior pelo produto comer-
cializado, seja na fidelização do cliente (DAHLSTROM, 2010).

IMPORTANTE

Esty e Winston (2006) ressaltam que a empresa deve procurar desenvol-


ver uma comunicação sincera com os stakeholders por meio de seus
relatórios. Isso inclui, evidentemente, divulgar os resultados positivos
que a empresa vem obtendo e apontar os aspectos nos quais a empresa
precisa melhorar.

Quando da comunicação de seus produtos e serviços junto aos


consumidores, é importante que a empresa tome cuidado para não

2 As certificações de sustentabilidade ou participação em iniciativas voluntárias também ajudam as


empresas a construir uma reputação em relação à sustentabilidade.

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 245


incorrer na chamada “miopia do marketing verde”. Esse conceito, de-

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senvolvido por Ottman, Stafford e Hartman (2006), consiste no erro
que algumas empresas cometem de tentar comercializar produtos
que, embora tenham um forte apelo de sustentabilidade, não satisfa-
zem as necessidades básicas dos clientes. Contra isso, os autores su-
gerem que as empresas explorem pelo menos uma das cinco necessi-
dades básicas ao desenvolverem e divulgarem produtos sustentáveis:

•• Custo e eficiência: embora os consumidores estejam muitas ve-


zes dispostos a pagar um preço superior por um produto com
atributos de sustentabilidade, existe um limite para isso. Portanto,
os atributos de sustentabilidade não podem servir como pretexto
para a comercialização dos produtos por um preço muito eleva-
do. Em alguns casos, um valor superior de compra pode ser com-
pensado pela economia de recursos durante o uso do produto. É
o caso clássico do sistema de energia solar, que requer um custo
inicial relativamente elevado para a instalação, mas que faz o con-
sumidor economizar posteriormente com as contas de energia.

•• Saúde e segurança: como os produtos com apelo mais susten-


tável geralmente são feitos sem a presença ou com a presença
bastante reduzida de agentes tóxicos ou prejudiciais à saúde, os
produtos podem ser direcionados para consumidores que bus-
cam por uma vida mais saudável. É o caso, por exemplo, dos
alimentos orgânicos produzidos sem agrotóxicos.

•• Desempenho: existem alguns produtos sustentáveis que apre-


sentam um desempenho superior ao dos produtos tradicionais.
Para ficar no exemplo dos alimentos orgânicos, podemos desta-
car seu sabor e textura diferenciados, que tornam seu consumo
uma experiência gastronômica mais interessante.

•• Simbolismo e status: o consumo de produtos sustentáveis


pode ser associado a certos benefícios imateriais, como a

246 Sustentabilidade nas organizações


imagem de consumidor mais “moderno”, “sofisticado” ou “sus-
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tentável”. O típico exemplo disso é a posse de carros elétricos.


No Brasil, por exemplo, em 2018, carros elétricos ainda custam
muito mais do que carros tradicionais equivalentes,3 o que torna
o produto acessível para um número ainda reduzido de pessoas,
e, portanto, pode conferir certo status e exclusividade aos seus
proprietários.

•• Conveniência: alguns produtos sustentáveis apresentam uma


vantagem competitiva ao oferecerem maior conveniência aos
usuários. Pode-se pensar em computadores que economizam
bateria e, portanto, têm maior autonomia para funcionar antes de
precisarem ser recarregados. Outro exemplo interessante, con-
forme aparece na Revista Galileu (EMPRESAS..., 2018), são os ca-
nudos comestíveis e biodegradáveis que vem sendo criados para
substituir os canudos convencionais de plástico, cuja proibição
está cada vez mais comum.4

Além de buscar divulgar o produto, visando realizar vendas, um as-


pecto importante em relação à comunicação da empresa com os consu-
midores desempenhado pelo marketing é a função de educá-los quanto
à melhor maneira de interagir com seus produtos e serviços. Isso inclui
explicar como usar novos produtos desenvolvidos pela empresa, como
usar os produtos existentes de uma maneira mais ecoeficiente ou, ain-
da, como dar a adequada destinação pós-uso (DAHLSTROM, 2010).

Por fim, outro papel que geralmente cabe ao departamento de marke-


ting, sobretudo no que se refere a grandes empresas, é a responsabilidade
por elaborar os chamados “relatórios de sustentabilidade”, que incluem

3 Em 2018, todos os sete veículos elétricos comercializados no Brasil custavam a partir de R$ 120 mil
(CONHEÇA..., 2018).

4 No Brasil, em julho de 2018, o município do Rio de Janeiro se tornou a primeira capital brasileira a aprovar
uma lei banindo o uso de canudos plásticos. A capital fluminense seguiu o caminho do município de Cotia,
no interior de São Paulo, que sancionou lei semelhante em junho do mesmo ano (BARBOSA, 2018).

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 247


informações sobre o desempenho econômico, social e ambiental e se

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direcionam para o conjunto de stakeholders da empresa (HITCHCOCK;
WILLARD, 2008). Dessa forma, os profissionais desse departamento
circulam pelas diferentes áreas coletando e posteriormente relatando
os dados apurados segundo um conjunto de indicadores definidos pela
empresa, que, em geral, baseiam-se em referências consolidadas como
o padrão do Global Reporting Initiative (GRI).

1.1.2 Produção e operações

O Departamento de Produção e Operações das empresas frequen-


temente é aquele cujas atividades (por exemplo, transporte e processa-
mento de matérias-primas) e instalações (por exemplo, fábricas) geram
o maior impacto ambiental nas empresas. Por essa razão, geralmente,
esse departamento é o primeiro a se envolver na busca de soluções que
ajudem a promover a sustentabilidade dentro das empresas (DUNPHY;
BENVENISTE, 2000). Ao mesmo tempo, algumas dessas ações têm
o potencial de reduzir custos, como é o caso de ações envolvendo a
ecoeficiência (WILLARD, 2014).

Dentre as ações sob sua responsabilidade, podemos mencionar


a implementação de processos segundo os princípios de Produção
Mais Limpa, melhoria da ecoeficiência produtiva, aplicação do ecodesign
para os novos produtos, adoção de novas tecnologias, e estabeleci-
mento de diretrizes de sustentabilidade que fornecedores devem se-
guir para se tornarem aptos a fornecer para as empresas (DUNPHY;
BENVENISTE, 2000).

NA PRÁTICA

Alguns órgãos do governo, a exemplo das empresas, também passaram


a exigir como um dos critérios de seleção que seus fornecedores ou
potenciais interessados em fornecer adotassem ou mantivessem um
bom desempenho em termos socioambientais. Essas práticas têm sido

248 Sustentabilidade nas organizações


conhecidas como “compras públicas sustentáveis”. No Brasil, movimen-
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tos liderados por organizações, como o Governos Locais pela Sustenta-


bilidade (ICLEI) e o Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação
Getúlio Vargas (GVCes), resultaram na implantação da prática por diver-
sos órgãos públicos (CLEMENT et al., 2015). Esses órgãos incluem a
Advocacia Geral da União (AGU), Ministério Público (MP), universidades
e governos estaduais, dentre outros, conforme pode ser acessado no
portal do Ministério do Planejamento (BRASIL, 2018).

1.2 Gestão de pessoas

Muitas vezes, o desenvolvimento de ações socioambientais por par-


te da empresa deve ser precedido da criação de uma cultura em relação
à sustentabilidade e o recebimento de um devido treinamento. Afinal de
contas, de nada adianta um presidente ou CEO da empresa ou os dire-
tores e chefes de determinados departamentos apenas determinarem
que, daquele momento em diante, a empresa começará a adotar uma
política e uma visão de sustentabilidade se, primeiro, os funcionários
não compreenderem a importância da temática; e, segundo, uma vez
cientes da importância, não tiverem conhecimento para efetivamente
implementar ações (GOLLAN, 2000).

Em termos de gestão de pessoas, outro aspecto importante aponta-


do por algumas pesquisas é o fato de que as empresas que investem
e estão genuinamente engajadas em promover a sustentabilidade ten-
dem a ser mais eficazes na atração e retenção dos funcionários. Willard
(2014) cita especificamente que o desenvolvimento por parte de ações
e um comprometimento genuíno com a sustentabilidade pode ajudar a
empresa a melhorar o desempenho do funcionário5 ao mantê-lo mais
engajado na empresa.

5 Mencionando outros autores, Willard (2014) cita que o desempenho do funcionário está diretamente

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 249


PARA PENSAR

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Enquanto muitas empresas desenvolvem ações sociais direcionadas a
stakeholders externos, como ONGs e comunidades no entorno da em-
presa, é importante que a empresa também não se esqueça do aspecto
social interno: os funcionários. Isso inclui, por exemplo, oferecer oportu-
nidades de os funcionários se desenvolverem, promover a diversidade,
democratizar a participação na tomada de decisões, ter critérios trans-
parentes e objetivos para a promoção, entre muitos outros aspectos.

Em termos de ações efetivas, existem diferentes aspectos nos quais


a área de gestão de pessoas pode contribuir para promover a susten-
tabilidade dentro das empresas. São três dos principais: treinamento;
recrutamento e seleção; remuneração e avaliação de desempenho.

1.2.1 Treinamento

A temática da sustentabilidade está em constante evolução


(HITCHCOCK; WILLARD, 2008) e requer, muitas vezes, significativo co-
nhecimento técnico e aprendizagem por parte dos gestores da empre-
sa (ORSATO; BARAKAT; CAMPOS, 2017). Além disso, uma vez que os
funcionários estejam não somente informados, mas convencidos da
importância da sustentabilidade para a empresa e para a sociedade de
forma geral, a possibilidade de se comprometerem a buscar os resulta-
dos é muito maior.

Por isso, é importante que a empresa desenvolva programas de trei-


namento e sensibilização para funcionários e gestores. Esty e Winston
(2006) apontam três tipos de programa de treinamento que as empre-
sas podem desenvolver:

relacionado à aptidão para o trabalho e à motivação intrínseca para desempenhar a função e as tarefas que
lhe foram atribuídas.

250 Sustentabilidade nas organizações


•• Educação informal: abordar tópicos gerais sobre aspectos de
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

sustentabilidade para desenvolver conhecimento amplo e sensi-


bilização sobre sustentabilidade.

•• Treinamento em temas específicos: desenvolver seminários


sobre temas técnicos e que impactem no dia a dia da empresa,
por exemplo, sobre inventários de emissões ou o Novo Código
Florestal, que ajudariam diretamente no desempenho da função.

•• Programas para a alta liderança da empresa: focar em aspectos


estratégicos sobre o impacto de longo prazo da sustentabilidade
no negócio e vice-versa.

1.2.2 Recrutamento e seleção

O recrutamento e a seleção são relevantes, uma vez que permitem


que a empresa contrate funcionários que contribuam para os esforços
de sustentabilidade tendo dois objetivos em mente. Primeiro, contratar
funcionários que tenham conhecimentos e habilidades que funcionários
atuais não possuem e que são necessários para desenvolver determina-
das ações socioambientais (JABBOUR; SANTOS; NAGANO, 2009). Por
exemplo, digamos que a empresa quer desenvolver um projeto para de-
sassorear um rio do qual capta água e não possui nenhum profissional.
A solução seria ou buscar uma consultoria externa ou contratar um enge-
nheiro hídrico ou com competência semelhante para atuar na temática.

Segundo, o recrutamento e seleção é relevante na medida em que


é fundamental para a empresa selecionar profissionais que tenham
um adequado grau de conhecimento e/ou comprometimento com a
questão ambiental (JABBOUR; SANTOS; NAGANO, 2009), ajudando
a empresa na manutenção e na expansão dos seus esforços presentes
e futuros em relação à sustentabilidade.

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 251


1.2.3 Remuneração e avaliação de desempenho

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Um programa de remuneração baseado em metas ou bônus de
acordo com o desempenho dos funcionários em relação a determina-
das metas e objetivos pode ser um importante aliado das empresas no
sentido de incentivá-las a aprimorar a sustentabilidade em suas áreas
(JABBOUR; SANTOS; NAGANO, 2009). Dessa forma, parte da remunera-
ção variável do funcionário é vinculada ao atingimento de metas como
redução da quantidade de emissões de gases de efeito estufa ou da
toxicidade dos produtos.

Outra forma de incentivo é o reconhecimento não financeiro para


os funcionários que derem uma contribuição significativa à questão
da sustentabilidade. Por exemplo, oferecendo placas e outros prêmios,
como jantares ou viagens (ESTY; WINSTON, 2006).

IMPORTANTE

Diversas pesquisas procuraram explorar a relação entre motivação do


empregado e ações socioambientais por parte das empresas. A relação
tende a ser positiva nos dois sentidos: um empregado mais motivado
contribui para o sucesso das ações socioambientais (RAE; SANDS; GA-
DENNE, 2015); e as ações socioambientais da empresa contribuem para
uma maior motivação dos funcionários (HUR; MOON; KO, 2016).

1.3 Acionistas

Na visão tradicional sobre qual deve ser o papel da empresa, cabe


retomarmos que o acionista sempre ocupou o papel de destaque como
– senão o único – o principal ator, cujos interesses a empresa deveria
buscar. Segundo essa visão, uma vez cumpridas as leis, qualquer ação

252 Sustentabilidade nas organizações


que não levasse à maximização da riqueza e do lucro dos acionistas era
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ilegítima e não deveria ser seguida pelas empresas (SOPPE, 2004).

Eis que, na evolução da discussão de diferentes linhas teóricas e de


pensamento sobre responsabilidade social, sustentabilidade e gestão
de stakeholders, sobretudo a partir da década de 1980, começou-se a
perceber que, na verdade, as ações socioambientais voluntárias toma-
das pelas empresas poderiam, sim, estar diretamente alinhadas com o
interesse dos acionistas. Não se tratava de uma conduta tão somente
altruísta por parte da empresa junto a outros stakeholders, mas tam-
bém de um cálculo estratégico de que a empresa poderia se beneficiar
financeiramente (CARROLL; BUCHHOLTZ, 2014).

Essa percepção foi confirmada nos últimos anos, por diversas de-
monstrações por parte dos acionistas de que passaram a se preocupar
com ações ambientais das empresas e valorizá-las. Entre os acionistas
com esse novo posicionamento, destacam-se, sobretudo, os chamados
“investidores institucionais”, isto é, fundos que administram investimen-
tos de pessoas físicas e de empresas e que têm políticas específicas
para determinar a maneira como o dinheiro deve ser investido.

De fato, diversos fundos de investimento têm estabelecido regras


segundo as quais determinada empresa estaria a receber investimento
somente se tivesse determinado desempenho ambiental. Muitos deles
seguem os princípios para o investimento responsável (PRI), criado pela
Organização das Nações Unidas (ONU) em 2006 com o apoio de alguns
dos maiores investidores institucionais do mundo (UNEP-FI).6 No Brasil,
alguns dos maiores fundos de investimento, como o Previ (fundo de
pensão dos funcionários do Banco do Brasil) e do Banco Bradesco, são
signatários dos PRI.

6 Dados dão conta de que mais de 1.400 investidores de mais de 50 países, representando valores de quase
59 trilhões de dólares, sejam signatários dos PRI (UNEP-FI, 2016).

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 253


Outra iniciativa brasileira relacionada aos investidores foi condu-

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zida pela Associação Brasileira de Mercado Financeiro e de Capitais
(Anbima), que criou uma categoria de fundo de investimento em ações
denominado “sustentabilidade/governança”, em que classifica os fun-
dos que “investem em empresas que apresentam bons níveis de go-
vernança corporativa, ou que se destacam em responsabilidade social
e sustentabilidade empresarial no longo prazo” (ANBIMA, 2016, p. 20).
Bancos como Itaú e Santander, com histórico na área de sustentabilida-
de, por exemplo, têm fundos dessa natureza.

Os acionistas, por sua vez, embora possam (e, idealmente, devem)


se interessar pelo bem-estar e por atender aos interesses dos demais
stakeholders, em última medida, estão interessados na resposta às se-
guintes perguntas: a empresa está sendo lucrativa? As ações realizadas
estão levando a empresa a ser mais lucrativa ou a valer mais? Aqui,
entram as discussões sobre se ações relacionadas à sustentabilidade
levam a um melhor desempenho financeiro.

2 Sustentabilidade e gestão financeira


Conforme discutido, há evidências de que a adoção da sustentabili-
dade e de uma visão alinhada ao atendimento de diferentes stakeholders
traz benefícios de diferentes naturezas para a empresa. Isso pode incluir
funcionários mais motivados, maior fidelidade dos clientes e disposi-
ção por parte deles de pagar mais por produtos e serviços da empresa,
acesso privilegiado a recursos, etc.

Todos esses aspectos certamente trazem benefícios para a em-


presa, porém, também podem gerar custos adicionais. Nesse sentido,
estritamente pensando em termos financeiros, compensa ou não in-
vestir em sustentabilidade? Pesquisas extensas que procuram avaliar
se há uma relação direta entre investimentos em sustentabilidade ou
responsabilidade social corporativa são inconclusivas: ora estabelecem

254 Sustentabilidade nas organizações


uma relação positiva, ora uma relação negativa, ainda que na média
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penda para uma relação positiva entre os dois (SILVA; BOAVENTURA;


BANDEIRA-DE-MELLO, 2018; GUENTHER et al., 2018). O que torna claro,
porém, é que existe uma série de fatores que influenciam nessa avalia-
ção, como a indústria em que a empresa atua, a própria estratégia da
empresa e os aspectos em que se está investindo (ORSATO, 2012).

Independentemente de o investimento em sustentabilidade compen-


sar ou não, a gestão financeira pode ter um impacto significativo nos
esforços da empresa na temática. Para isso, é necessário que a em-
presa e seus gestores financeiros adotem tanto uma nova mentalidade
quanto novas práticas. Em termos de mentalidade, é necessário que a
gestão financeira reconheça que não somente os acionistas e os pro-
prietários devem ser considerados partes interessadas nos resultados
da empresa, mas, sim, todos os stakeholders (SCHOENMAKER, 2017),
e que se busquem resultados de longo prazo7 em vez de se centrar em
resultados de curto prazo (BANSAL, DESJARDINE, 2014).

Essa tendência de buscar o lucro de curto prazo pode ter várias mo-
tivações, mas a principal talvez seja o interesse em aumentar o valor
das ações de uma empresa de capital aberto.8 Dentro desse contexto, é
preciso entender que a composição do salário dos principais diretores e
executivos das empresas, embora tenha uma parte fixa, é em sua maior
parte variável, em formato de bônus, ou seja, varia de acordo com o de-
sempenho da empresa em alguns fatores, dentre os quais os lucros, e o
preço da ação tendem a ser o principal (SCHOENMAKER, 2017).

7 É interessante relembrar que a célebre definição de desenvolvimento sustentável presente no relatório


“Nosso futuro comum”, ou “Relatório Brundtland”, também considera a questão temporal ao se falar em
“gerações presentes e futuras”, remetendo a uma ideia de justiça intergeracional.

8 Empresas de capital aberto são aquelas empresas que têm ações (isto é, pequenas partes da propriedade
da empresa) em bolsas de valores (no caso do Brasil, a principal é a B3 – antiga Bovespa) que podem ser
compradas e vendidas pelos acionistas segundo o preço pelo qual são avaliadas diariamente pelo mercado.
O somatório do valor das ações, em última medida, é usado por muitos analistas como indicador do valor
da empresa no mercado.

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 255


IMPORTANTE

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
Quando da decisão em termos de investimentos em sustentabilidade, é
importante considerar na equação, de um lado, os impostos e as taxas
evitados (que evitam aumento de custos); e, por outro lado, incentivos
públicos disponíveis (que geram menor necessidade de investimento)
(SUKHDHEV, 2013). Com isso, pode-se ter uma maneira mais realista de
avaliar o custo-benefício financeiro.

Essas mudanças de mentalidade são a base para a implantação de


novas práticas, que é o que produzirá mudanças efetivas. Essas novas
práticas incluem a apresentação de relatórios financeiros em interva-
los mais longos,9 a mudança dos sistemas de incentivos financeiros
por desempenho e a adoção de novos tipos de relatórios, em que os
dados financeiros estejam integrados a dados sociais e ambientais
(SCHOENMAKER, 2017).

Conforme se avança na discussão sobre finanças sustentáveis, ocor-


re também o desenvolvimento de novas ferramentas e metodologias,
por exemplo, as que contabilizam os impactos sociais e ambientais ne-
gativos da atividade da empresa, como custos (SCHOENMAKER, 2017),
e também formas de se quantificar e avaliar o retorno do investimento
em questões socioambientais (FGV-EAESP, 2018).

9 Bansal e DesJardine (2014) falam da decisão relativamente ousada da Unilever de publicar relatórios
financeiros semestralmente, indo contra a expectativa do mercado financeiro de ter acesso a relatórios
financeiros quadrimestrais. Segundo os autores, isso ajuda a combater o “curto-prazismo”, pois, mesmo em
investimentos em sustentabilidade com retorno praticamente certo, como os de ecoeficiência, o prazo de
retorno pode ser longo – chegando a diversos anos ou mesmo mais de década. Na prática, isso significa
que a empresa tem de aumentar seus custos no presente (para poder investir) com a expectativa de gerar
maiores lucros/menores custos ao longo do tempo.

256 Sustentabilidade nas organizações


3 Lideranças sustentáveis
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A sustentabilidade definitivamente atraiu a atenção da alta lideran-


ça das empresas, que passou a ver a questão como fundamental para
o negócio. É o que mostra, por exemplo, uma pesquisa realizada pela
consultoria Accenture em parceria com o Pacto Global das Nações
Unidas (2016) com mais de mil CEOs (presidentes) de grandes em-
presas em mais de 100 países de todo o mundo. A pesquisa mostrou
que 87% dos CEOs entendem que os objetivos do desenvolvimento
sustentável (ODS) podem significar oportunidades de repensar a for-
ma de fazer negócio, enquanto 80% deles observam que o comprome-
timento com a sustentabilidade pode diferenciar a empresa em relação
aos competidores.

No Brasil, iniciativas das empresas mostram que a temática tam-


bém faz parte da preocupação das principais lideranças. Em 2011, a
consultoria Ideia Sustentável, com a coordenação de Ricardo Voltolini,
lançou a Plataforma Liderança Sustentável, integrada por cerca de 90
presidentes e executivos de grandes empresas brasileiras envolvidos
com a temática da sustentabilidade. A plataforma visa desenvolver
conteúdo e realizar eventos como forma de estimular e debater prá-
ticas sustentáveis com a alta liderança de empresas (PLATAFORMA
LIDERANÇA SUSTENTÁVEL, 2018). Uma pesquisa do Instituto Brasileiro
de Governança Corporativa (IBGC) mostrou que várias grandes empre-
sas brasileiras já estão incluindo atribuições relacionadas à sustentabili-
dade ao seu conselho de administração, órgão mais importante de ges-
tão da empresa (IBGC, 2013). Com efeito, assim como outras temáticas
que envolvem mudanças profundas na organização, um compromis-
so significativo em relação à sustentabilidade requer uma liderança10
que sinalize claramente o compromisso dela com a temática (SAVITZ;
WEBER, 2006).

10 Nas empresas, geralmente considera-se liderança ou alta liderança os cargos de presidente (ou CEO), os
diretores e os membros do conselho de administração.

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 257


Por que a liderança faz tanta diferença? Em geral, é a liderança que

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determina os objetivos que a organização assumirá para um futuro não
somente de curto prazo, mas também de longo prazo, e qual estratégia
a organização adotará para conseguir atingi-los, apresentando uma vi-
são de longo prazo. Como consequência prática, a organização destina-
rá recursos e tempo significativos para atingir esses objetivos, integrará
a temática na tomada de decisões e valorizará esforços daqueles que
contribuírem para o sucesso (SAVITZ; WEBER, 2006).

NA PRÁTICA

Ray Anderson aponta que sua liderança desempenhou um papel funda-


mental para que sua empresa, a Interface, reconhecida como uma das
maiores referências em sustentabilidade, avançasse definitiva e gra-
dativamente em suas práticas. O empresário aponta que cabe ao líder
desenvolver a visão da empresa e “manter o tambor tocando o tempo
todo” para mostrar que o compromisso da empresa com a sustentabi-
lidade não se trata de algo passageiro, mas de algo definitivo (ANDER-
SON; WHITE, 2011).

Assim, uma vez que a alta liderança sinalize uma trajetória em rela-
ção à busca constante do aprimoramento da sustentabilidade, todos
os demais funcionários – por definição, subordinados diretos ou indi-
retos – terão incentivos para desenvolver ações e comportamentos
que aprimorem a sustentabilidade dentro da empresa. Primeiro, serão
recompensados por isso. Segundo, terão recursos para que consigam
desenvolver as ações necessárias. Um terceiro aspecto é que tendem a
ser inspirados a fazer isso.

Contudo, a despeito da grande relevância da sustentabilidade na


gestão e nos rumos da organização, é preciso reconhecer que ela é
uma das muitas questões que a alta liderança tem de monitorar todos
os dias para garantir que o planejado saia como esperado. Uma das

258 Sustentabilidade nas organizações


formas de manter um monitoramento efetivo das ações de sustentabi-
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lidade é desenvolver e acompanhar um conjunto de indicadores-chave


em relação a cada área, conforme sugerem os exemplos do quadro 1.

Quadro 1 – Exemplos de indicadores-chave de sustentabilidade por área

Gestão de pessoas Marketing


• Horas de treinamento sobre a temática da • Volume de vendas de produtos com atributos
sustentabilidade sociais e ambientais em relação ao total de vendas
• Porcentagem de empregados com remuneração • Cobertura da mídia sobre as ações de
vinculada ao desempenho em sustentabilidade sustentabilidade da empresa
• Nível de consciência e informação dos funcionários • Percepção do consumidor sobre as ações de
sobre temáticas de sustentabilidade sustentabilidade da empresa

Financeiro
Produção e operações • Gasto com multas ambientais evitado
• Quantidade de resíduos gerados • Valorização das ações da empresa em
• Redução da quantidade de embalagem consequência da melhoria da reputação quanto à
• Porcentagem de materiais comprados de sustentabilidade
fornecedores com a ISO 14001 • Economia de recursos decorrente da tomada de
medidas de ecoeficiência

Fonte: adaptado de Epstein e Wisner (2001).

O quadro 1 evidencia também que líderes de diferentes áreas podem


e, idealmente, devem ser envolvidos também na gestão das questões
de sustentabilidade, atuando em conjunto com a alta liderança e com
os gestores da área de sustentabilidade/meio ambiente.

Considerações finais
Neste capítulo, discutimos os diferentes papéis que algumas das prin-
cipais áreas da empresa, caracterizadas como stakeholders internos, po-
dem desempenhar para que a sustentabilidade seja implementada e/ou
expandida de maneira efetiva. Especificamente, abordamos o papel das
áreas de marketing, gestão de pessoas, produção e operações e da ges-
tão financeira, responsáveis diretas pelas ações.

Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 259


De maneira complementar, discutimos também os movimentos que

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acionistas e investidores estão tomando para incentivar o desenvolvi-
mento da sustentabilidade nas organizações. Por fim, coordenando os
esforços, refletimos sobre o papel da liderança da organização no sen-
tido de apresentar uma visão sobre aonde a empresa quer chegar em
termos de sustentabilidade e dar os incentivos e recursos suficientes
para que todos se mobilizem nessa direção.

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Sustentabilidade e gestão de stakeholders – visão interna 263


Capítulo 15
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

Sustentabilidade
e desempenho
organizacional

As empresas não atuam em um mundo vazio e de maneira isolada.


Ao contrário, encontram-se em um ambiente cada vez mais interconec-
tado e cuja expectativa de transparência em relação à conduta delas é
crescente. Dessa forma, elas precisam interagir com diferentes atores,
seja o público externo, por quem estão sendo requisitadas, cada vez
mais, a prestarem conta de suas atividades, seja o público interno, a
quem a circulação de informações é essencial para uma boa gestão.

Neste capítulo, considerando esse contexto, teremos como objetivo


compreender a importância do uso de indicadores e relatórios de de-
sempenho socioambiental nas práticas empresariais.

265
1 Relatórios de sustentabilidade e sistemas

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
de avaliação (GRI/ETHOS)
As razões pelas quais as empresas desenvolvem relatórios de sus-
tentabilidade variam. Algumas das principais razões que podem ser
mencionadas são: necessidade de construir confiança com stakeholders-
-chave como ONGs e comunidades, sobretudo quando a empresa tem
atividades de alto impacto ambiental; influenciar formadores de opinião
sobre a reputação e as ações da empresa; diferenciar-se em relação a
competidores, ou, no caso das empresas que não estejam na vanguar-
da, seguir os competidores; além de facilitar o acompanhamento do de-
sempenho socioambiental ao longo de toda a empresa (ADAMS; FROST,
2008; KOLK, 2010).

Os relatórios de sustentabilidade são uma forma de as empresas


divulgarem de maneira sistematizada seu desempenho em relação à
sustentabilidade em determinado período – em geral, um ano. O rela-
tório de sustentabilidade, contudo, é apenas um dos resultados finais
da operação de um sistema de avaliação de resultados da empresa.
Dessa forma, um bom sistema de avaliação é condição essencial para
um bom relatório de sustentabilidade.

1.1 Sistemas de avaliação

Sistemas de avaliação são parte importante do sistema de ges-


tão ambiental (SGA) da empresa (BARBIERI, 2011). Na estrutura da
ISO 14001, a norma da ISO relativa ao SGA, o penúltimo item refere-se
a “9.1 Monitoramento, medição, análise e avaliação”, e vem imediata-
mente antes dos procedimentos de melhoria contínua (BSI, 2015).

Os sistemas de monitoramento e avaliação também devem se


pautar na estratégia e nos planos da empresa. Uma vez colocada em
funcionamento, a operação de um sistema de avaliação basicamente

266 Sustentabilidade nas organizações


consiste em alimentá-lo e utilizar os resultados para avaliar o desempe-
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

nho e ajudar na tomada de decisão visando ao aprimoramento contínuo


da empresa (JOHNSON; WALCK, 2004). A figura 1 resume a relação en-
tre o sistema de avaliação e a gestão da empresa.

Figura 1 – Sistema de avaliação do desempenho ambiental e a gestão da empresa

Melhoria contínua
Políticas da empresa
Definição da missão, visão
e estratégia global

Planejamento
Objetivos e metas
Plano de ação

Revisão
Implementação e operação
Execução do planejamento,
procedimentos e processos

Monitoramento e avaliação
Acompanhamento dos indicadores
Comparação com padrões de referência
Retroalimentação Realização do diagnóstico

Fonte: adaptado de Johnson e Walck (2004).

Como resultado auxiliar do processo de monitoramento e avaliação,


os indicadores facilitam o processo de divulgação do desempenho da
empresa, por meio dos chamados relatórios de sustentabilidade, na
medida em que resumem e tornam mais fácil a divulgação dos aspec-
tos mais importantes, além de permitir que se comparem diferentes
empresas e também a mesma empresa em relação a seu desempenho
passado (ADAMS; FROST, 2008; HITCHCOCK; WILLARD, 2008).

Sustentabilidade e desempenho organizacional 267


Existem diversos possíveis sistemas e padrões de relato do desem-

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
penho baseados em sustentabilidade. Por exemplo, em seu levanta-
mento, Blass et al. (2015) encontraram mais de 17 tipos diferentes que
podem ser usados por organizações no Brasil. Eles variam de mais ou
menos detalhados, e entre princípios, objetivos e indicadores, podem
variar de 7 a mais de 150 tópicos a serem relatados. Vejamos dois dos
mais importantes sistemas de relato sobre o desempenho em sustenta-
bilidade utilizados por empresas no Brasil: o GRI e o Ethos.

NA PRÁTICA

No Brasil, cerca de 85% das 100 maiores empresas publicam algum tipo
de relatório sobre suas práticas de responsabilidade corporativa (KPMG,
2017). Das 62 maiores empresas com ações na bolsa de valores de São
Paulo (B3), a maior e mais importante bolsa do Brasil, 41 delas publicam
relatórios de sustentabilidade com base nos objetivos do desenvolvi-
mento sustentável (ODS) (B3, 2018).

1.2 Relatório GRI

O Global Reporting Initiative (GRI) é uma organização da sociedade


civil internacional criada em 1997 e com sede na Holanda. Em 2000, a
partir do engajamento voluntário de diversos stakeholders entre ONGs,
empresas, investidores, auditorias, agências da ONU, lançou sua primei-
ra versão do padrão do relatório de sustentabilidade. Desde sua criação,
o GRI tem sido o principal padrão de normas de publicação de relatórios
de sustentabilidade em todo o mundo, adotado por empresas de mais
de 100 países (GRI, 2018a; LOUETTE, 2008). Outro indicativo dessa rele-
vância é que, das 250 maiores empresas do mundo, 75% usam o padrão
GRI para a elaboração dos seus relatórios (KPMG, 2017).

268 Sustentabilidade nas organizações


O padrão dos relatórios GRI está em sua quarta geração, o chamado
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

G4, lançado em 2013. A ênfase dessa versão é na materialidade, ou seja,


as organizações que relatam segundo o padrão devem fornecer informa-
ções que sejam críticas para o negócio e para os seus stakeholders. Além
disso, definiu a existência de dois “níveis de aplicação”, que se referem ao
nível de profundidade do relatório: o “essencial”, com os aspectos básicos
e alguns indicadores; e o “abrangente”, que traz um relato mais detalhado.

Os relatórios do GRI são compostos por 37 padrões. São três pa-


drões universais: fundamentos (foundation – GRI 101), divulgação geral
(general disclosure – GRI 102) e abordagem de gestão (management
approach – GR 103), aplicáveis a todas as organizações. Além disso,
existem 33 padrões específicos, organizados em torno de três conjun-
tos: econômico (economic – GRI 200), ambiental (environmental – GRI
300) e social (social – GRI 400) (BUCK; REINHARDT, 2016).

Outro aspecto importante do GRI G4 é a mudança da terminologia


em relação aos aspectos a serem relatados. O que era conhecido como
indicadores, como ocorre no Ethos, passou a ser chamado de disclo-
sure1 (BUCK; REINHARDT, 2016). Esses disclosures totalizam mais de
150 itens e se estruturam em torno dos 37 padrões. O quadro 1 traz os
padrões que compõem os conjuntos ambiental, econômico e social.

Quadro 1 – Padrões social, ambiental e econômicos do GRI

• Desempenho econômico
• Presença de mercado
• Impactos econômicos indiretos
ECONÔMICOS (GRI 200)
• Práticas de compras
• Práticas anticorrupção
• Comportamento anticompetitivo

(cont.)

1 Os padrões do GRI em sua versão G4 não têm tradução para o português, embora tenham uma
representação no Brasil.

Sustentabilidade e desempenho organizacional 269


Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
• Materiais
• Energia
• Água e efluentes
• Biodiversidade
AMBIENTAL (GRI 200)
• Emissões
• Resíduos e efluentes
• Cumprimento da legislação ambiental
• Avaliação do desempenho ambiental dos fornecedores

• Emprego
• Relação entre o trabalhador e a administração
• Saúde e segurança ocupacional (do trabalho)
• Educação e treinamento
• Diversidade e igualdade de oportunidades
• Não discriminação
• Liberdade de associação e negociação coletiva

SOCIAL (GRI 300) • Trabalho infantil


• Trabalho forçado ou compulsório
• Práticas de segurança
• Direitos de populações e comunidades tradicionais (ex.: indígenas)
• Avaliação do desempenho social dos fornecedores
• Políticas públicas
• Direitos à privacidade dos consumidores
• Cumprimento da legislação social e econômica

Fonte: traduzido e adaptado de GRI (2018b).

Por fim, embora o padrão G4 do GRI seja feito para organizações


de todos os tipos, portes e setores, existe também versões adaptadas
mais simples para empresas pequenas e médias.

1.3 Relatório Ethos

Criado em 2000 pela organização da sociedade civil brasileira


Instituto Ethos, o Relatório Ethos, ou os “indicadores Ethos”, refere-se
a uma ferramenta de autodiagnóstico que as empresas fazem para

270 Sustentabilidade nas organizações


gerenciar os impactos socioambientais de suas atividades (LOUETTE,
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2008). Segundo o Instituto Ethos, os indicadores servem para integrar a


sustentabilidade e a responsabilidade social empresarial às estratégias
de negócio, sendo uma ferramenta de gestão. Dessa forma, permite
que as organizações se planejem, compartilhem dados com as partes
interessadas sobre seu desempenho e ajudem no desenvolvimento da
sustentabilidade em sua cadeia de valor (INSTITUTO ETHOS, 2017).

Os indicadores Ethos são revisados e têm suas novas versões publi-


cadas periodicamente. A partir de 2015, foram ocorrendo também a pu-
blicação de diversos guias que aprofundam temáticas abordadas nos
relatórios, como combate à corrupção, equidade de gênero, mudanças
climáticas e inclusão de pessoas com deficiência (INSTITUTO ETHOS,
2017).2 Há também o desenvolvimento constante de guias com dire-
trizes para setores específicos como petróleo e gás, construção civil e
varejo (INSTITUTO ETHOS, 2017; LOUETTE, 2008).

Na versão ciclo 2017/2018, o relatório é organizado em quatro gran-


des estruturas hierárquicas: dimensões (4), temas (7), subtemas (17) e
indicadores (47). A dimensão é bastante abrangente, reunindo diversos
temas, que, por sua vez, agregam diversos subtemas, os quais, finalmen-
te, se desdobram em diversos indicadores. Por exemplo, a dimensão
social abrange o tema “direitos humanos”, que pode se desenvolver no
subtema “ações afirmativas” e no indicador “promoção da diversidade
e da equidade”. Para cada indicador, então, há a descrição de diferentes
práticas segundo cinco diferentes estágios de evolução das empresas3
(INSTITUTO ETHOS, 2017). O quadro 2 traz um resumo das dimensões,
temas e subtemas que compõem os indicadores Ethos.

2 Os guias temáticos podem ser acessados no website do Instituto Ethos.

3 Estágio 1: cumprimento e/ou tratativa inicial; estágio 2: iniciativas e práticas; estágio 3: políticas,
procedimentos e distemas de gestão; estágio 4: eficiência; estágio 5: protagonismo.

Sustentabilidade e desempenho organizacional 271


Quadro 2 – Síntese dos indicadores Ethos

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DIMENSÃO GOVERNANÇA E GESTÃO
Tema: governança organizacional
DIMENSÃO VISÃO E ESTRATÉGIA Subtema: governança e conduta
Indicadores*: Subtema: prestação de contas
1. Estratégias para a sustentabilidade Tema: práticas de operação e gestão
2. Proposta de valor Subtema: práticas concorrenciais
3. Modelo de Negócios Subtema: práticas anticorrupção
Subtema: envolvimento político responsável
Subtema: sistemas de gestão

DIMENSÃO SOCIAL
Tema: direitos humanos
Subtema: situações de risco para os direitos
humanos
Subtema: ações afirmativas DIMENSÃO AMBIENTAL
Tema: práticas de trabalho Tema: meio ambiente
Subtema: relações de trabalho Subtema: mudanças climáticas
Subtema: desenvolvimento humano, benefícios e Subtema: gestão e monitoramento dos impactos
treinamento sobre os serviços ecossistêmicos e a biodiversidade
Subtema: saúde e segurança no trabalho e qualidade Subtema: impactos do consumo
de vida
Tema: questões relativas ao consumidor
Subtema: respeito ao direito do consumidor
Subtema: consumo consciente

*Observação: a dimensão “visão e estratégia” não tem divisão em tema e subtema, apenas os três
indicadores mencionados.

Fonte: adaptado de Instituto Ethos (2017)

O relatório do Ethos também é bastante flexível,4 de forma a permitir


que organizações com diferentes níveis de conhecimento e profundida-
de na temática consigam utilizá-lo (INSTITUTO ETHOS, 2017).

4 A respeito dessa flexibilidade, as organizações podem escolher preencher quatro formatações


padronizadas do relatório: a básica (apenas 12 indicadores), a essencial (24 indicadores), a ampla (36

272 Sustentabilidade nas organizações


PARA SABER MAIS
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O Instituto Ethos também disponibiliza para as empresas associadas


um sistema on-line para o preenchimento dos indicadores. Segundo o
próprio Ethos, algumas das vantagens desse preenchimento on-line se-
ria facilitar a elaboração de relatos de sustentabilidade, direcionamento
no preenchimento e integração da informação com alguns dos sistemas
de relato mais importantes, como o GRI.

2 Indicadores socioambientais
Os indicadores de desempenho ou performance,5 de modo geral, são
utilizados para avaliar qual é a situação da empresa segundo alguns as-
pectos considerados como mais importantes (JAMOUS; MÜLLER, 2013).

Os indicadores socioambientais, especificamente, são utilizados


para mensurar o desempenho da empresa em aspectos relacionados
a questões sociais e ambientais. Eles permitem resumir informações
relevantes acerca do desempenho socioambiental da empresa de for-
ma que se possibilite o monitoramento, o estabelecimento de metas, o
acompanhamento da evolução, a comparação e a divulgação (JASCH,
2008; JAMOUS; MÜLLER, 2013). Além disso, ele é fundamental para que
tanto a alta liderança da organização quanto as pessoas que estão na
operação das empresas tenham informações para tomar uma melhor
decisão (JASCH, 2008).

indicadores) e a abrangente (47 indicadores).

5 Também conhecidos no cotidiano organizacional como key performance indicators (que podem ser
traduzidos como indicadores-chave de desempenho) ou simplesmente pela sigla KPI.

Sustentabilidade e desempenho organizacional 273


IMPORTANTE

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Os indicadores de desempenho, ou KPI, são utilizados pela empresa
para comparar seu desempenho em determinado período com seu pró-
prio desempenho no passado, comparar o desempenho de diferentes
unidades da empresa com funções e atuações parecidas ou mesmo
com concorrentes e outras empresas. Essa comparação com empresas
externas é conhecida como benchmarking.

Como vimos, existem indicadores que as empresas podem adotar – e


frequentemente o fazem – com base em padrões referendados e am-
plamente discutidos com especialistas, casos do GRI e do Ethos. As
empresas podem também desenvolver seus próprios indicadores, de
acordo com suas próprias particularidades, estratégia e necessidade.
Inclusive, conforme defendem Epstein e Roy (2001), idealmente, as em-
presas devem ter indicadores para acompanhar cada iniciativa de sus-
tentabilidade desenvolvida.

3 Sustentabilidade e competitividade
Epstein e Wisner (2001) defendem que não basta haver uma rela-
ção entre o desempenho socioambiental da empresa e seu desempe-
nho econômico. Os gestores responsáveis pelas iniciativas socioam-
bientais devem estar aptos a comprovar essa relação objetivamente.
Uma das formas de fazer isso, sugerem os autores, é por meio da
construção de um conjunto de indicadores que consiga estabelecer
uma relação entre os aspectos socioambientais e a estratégia da em-
presa e também que permita que esses aspectos sejam desdobra-
dos de forma a serem controlados pelas diferentes áreas da empresa,
como marketing, finanças e operações.

Em última medida, esse procedimento de controle e evidenciação


pode levar a empresa a comprovar a relação entre desempenho econô-
mico e socioambiental de diferentes formas (EPSTEIN; WISNER, 2001),

274 Sustentabilidade nas organizações


como: financeira (redução dos custos operacionais e administrativos,
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aumento do valor das ações da empresa); desenvolvimento do merca-


do consumidor (inovações de produto, aumento das vendas, melhoria
da reputação e novas oportunidades de mercado); operacionais (inova-
ções e melhorias nos processos produtivos, ganhos de produtividade e
redução de resíduos).

Apesar de indicadores terem o potencial de alinhar aspectos socio-


ambientais com a estratégia da empresa e também com os resultados
financeiros da empresa, Hahn e Figge (2018) alertam que muitas vezes
eles apresentam limitações que não devem ser desprezadas. Essas li-
mitações seriam:

•• Caráter instrumental: reconhecem apenas as iniciativas que tra-


zem retorno econômico para a empresa, não identificando as-
pectos importantes da sustentabilidade que podem não trazer
retornos econômicos. Por exemplo, algumas ações relacionadas
à promoção e à proteção de direitos humanos, embora extrema-
mente relevantes, podem não trazer retorno econômico.

•• Confiança excessiva na relação entre causa e efeito: muitas ve-


zes, nem sempre é possível estabelecer uma relação de causa-
-efeito direta em determinada ação de sustentabilidade em razão
da complexidade inerente a determinadas temáticas. Por exem-
plo, investimentos relacionados à redução das emissões de gases
de efeito estufa tendem a beneficiar a sociedade de modo geral,
embora nem sempre de maneira clara uma empresa específica.

•• Reforço e justificativa de práticas insustentáveis: às vezes, uma


prática considerada sustentável e que traga retorno econômico
em curto prazo pode não ser sustentável em longo prazo. Por
exemplo, investir somente em ações de ecoeficiência que gerem
ganhos econômicos e ambientais em curto prazo, porém, se esse
investimento gerar aumento geral do consumo de produtos, a ten-
dência é que se gere maior impacto ambiental geral (não relativo)
ou a manutenção do mesmo impacto ambiental.

Sustentabilidade e desempenho organizacional 275


4 Normas de avaliação do desempenho

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ambiental
A ISO também conta com uma norma de avaliação do desempenho
ambiental das organizações dentro da chamada “família ISO 14000”, a
ABNT NBR ISO 14031:2015, cuja primeira edição foi lançada em 1999.
Atualmente, vigora a 2a edição, traduzida da versão em inglês de 2013.
Embora a ISO 14031 seja restrita apenas a aspectos ambientais, ela
sugere um número significantemente maior de indicadores ambientais
quando comparada a outros sistemas de indicadores de sustentabili-
dade, como o GRI. Assim, esses indicadores podem ser usados de ma-
neira complementar, visando trazer maior transparência a respeito do
desempenho da empresa (MORHARDT; BAIRD; FREEMAN, 2002).

Assim como as demais normas ISO, a ISO 14031 é baseada na


qualidade e utiliza o ciclo PDCA como modelo gerencial de referência.
Seguindo o ciclo PDCA, o processo de avaliação do desempenho am-
biental (ADA) da ISO 14031 (ISO, 2004) segue algumas etapas:

•• Planejar: conduzir o planejamento da ADA e selecionar seus


indicadores.

•• Fazer: utilizar os dados, coletar os dados segundo os indicadores


selecionados, analisar os dados e convertê-los em informações,
avaliar as informações e compará-las com critérios de desempe-
nho ambiental estipulados no planejamento, relatar e divulgar as
informações sobre o desempenho ambiental.

•• Checar e agir: analisar criticamente as informações sobre o de-


sempenho e agir para melhorá-lo.

Em termos de indicadores, a ISO 14031 diferencia-os em duas cate-


gorias diferentes: 1) indicadores de condição ambiental (ICA); 2) indica-
dores de desempenho ambiental (IDA) (ABNT, 2004).

276 Sustentabilidade nas organizações


Os ICA fornecem informações sobre as condições do ambiente onde
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a empresa atua, seja em nível local, regional, nacional ou global, con-


dições estas que podem mudar ao longo do tempo ou em situações
específicas. Um ICA pode ajudar a organização a entender melhor o seu
impacto e ajudar na implementação do ADA. Um exemplo do ICA pode
ser o nível de desmatamento (ou de vegetação) de determinado municí-
pio ou área onde a empresa atua (ABNT, 2004).

Os IDAs, por sua vez, dizem respeito diretamente aos impactos gera-
dos pela organização e sob os quais a organização tem controle direto. Os
IDA podem ser de dois tipos. Os Indicadores de Desempenho Gerencial
(IDG), que avaliam o desempenho de ações gerenciais com o potencial
de impactar o desempenho ambiental da empresa. Um exemplo de IDG
é o valor gasto com pesquisas para aprimorar a eficiência energética dos
processos produtivos da empresa. E os indicadores de desempenho ope-
racional (IDO), que avaliam o desempenho ambiental das operações da
empresa. Um exemplo de IDO é a quantidade de água consumida na pro-
dução de uma unidade de produto da empresa (ABNT, 2004).

IMPORTANTE

Além da ISO 14031, existem outras complementares que também dizem


respeito à mensuração do impacto ambiental, como a ISO 14064, que
traz informações acerca da mensuração e da quantificação dos chama-
dos gases de efeito estufa e a própria ISO 14001, sobre SGA.

Cabe também esclarecer que, conforme cita Delmas (2002), a ISO


14031 não estabelece quais indicadores as empresas devem escolher,
apenas menciona exemplos de mais de 100 possíveis indicadores.6
Tampouco estabelece critérios de desempenho ou benchmarkings que
as empresas devem obter, sendo tão somente um documento orientador.

6 Nesse sentido, diferencia-se da GRI ou do Ethos, que, embora deem alguma liberdade para as empresas,
determinam que elas façam escolhas entre um conjunto de indicadores/critérios predeterminados.

Sustentabilidade e desempenho organizacional 277


Por fim, a ISO 14031, embora não diga respeito à questão da comuni-

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cação das informações, recomenda que as informações e os indicado-
res sejam relatados e comunicados internamente. Menciona também
a possibilidade de a organização relatar voluntariamente seu desempe-
nho ambiental aos stakeholders externos, tendo, nessa hipótese, o de-
vido cuidado de manter um embasamento de dados, mas procurando
adaptar a linguagem técnica ao nível de conhecimento dos principais
interessados nas informações (ISO, 2004).

Considerações finais
Neste capítulo, apresentamos as motivações e o contexto que vêm
levando as empresas a adotar sistemas de reporte de informações so-
bre a sustentabilidade, especialmente no que tange ao seu desempenho
socioambiental.

Apresentamos, ainda, algumas das principais ferramentas para a es-


truturação de sistema de indicadores de desempenho e divulgação das
informações, com destaque para o GRI, principal ferramenta utilizada
no mundo por grandes empresas; o Ethos, desenvolvido especificamen-
te para o contexto brasileiro; e a ISO 14031, direcionada apenas aos
indicadores ambientais e derivada da chamada família ISO 14000.

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278 Sustentabilidade nas organizações


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280 Sustentabilidade nas organizações


Capítulo 16
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Tendências em
sustentabilidade
nas organizações

Pelo menos desde a década de 1960, especialistas têm chamado


atenção para a problemática das questões socioambientais. Argu­
mentava-se que, a despeito do progresso econômico acelerado obtido
pela humanidade, sobretudo a partir da Revolução Industrial, não ocor­
reu a correspondente melhoria das condições sociais da população e a
preservação do meio ambiente. Ao contrário, em muitos casos, houve
uma piora significativa.

Como resultado, esforços têm sido feitos para expor o problema e pro­
por soluções. Esforços seja por acadêmicos, como foi o caso do estudo
Os limites do crescimento, no início da década de 1970; seja por empre­
sas, caso da Criação da Comissão Empresarial Conselho Empresarial
Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD – World Business
Council For Sustainable Development), seja por organismos multilaterais,
como a ONU e seus órgãos, que criaram convenções importantes como
a Rio 92 ou as convenções do clima, e propuseram os objetivos de desen­
volvimento sustentável (ODS) em 2015.

281
Diante desses desafios, este capítulo final discutirá o que as empre­

Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.
sas têm feito ou estão se engajando para fazer visando à mudança des­
se quadro. Assim, o objetivo é conhecer as principais tendências em
termos de conceitos, ferramentas e práticas relacionadas à sustentabi­
lidade nas organizações.

1 Novos modelos organizacionais


As discussões sobre responsabilidade social corporativa (RSC) intro­
duziram o questionamento sobre quais devem ser o papel e as respon­
sabilidades das empresas. É o caso de um dos mais célebres modelos
de RSC, a “pirâmide das responsabilidades sociais das empresas” pro­
posto por Carroll (1991). Segundo esse modelo, é legítimo e desejável
que a empresa assuma responsabilidades que vão além de gerar lucro
para o proprietário e cumprir a lei. Contudo, o modelo deixa claro que
a geração de lucro e o cumprimento da lei têm precedência sobre as
demais responsabilidades.

Eis que começaram a surgir outras denominações de tipos de orga­


nização que questionam os dogmas das responsabilidades fundamen­
tais das empresas. Clama-se que o propósito dos negócios deve ser
repensado, criando-se “organizações com propósito”. De fato, a finali­
dade do negócio não necessariamente precisa ser gerar lucro de forma
responsável. Diferentemente, admite-se a possibilidade de gerar lucro,
porém, este se torna meio para o propósito final de gerar um impacto
positivo na sociedade (HOLLENSBE et al., 2014).

Esses modelos de empresa fogem da clássica divisão dos três seto­


res da sociedade, ou seja, primeiro setor (governo), segundo setor (em­
presas privadas) e terceiro setor (organizações sem fins lucrativos ou
ONGs). Por essa razão, esses modelos são parte do que se convencio­
nou chamar de setor 2,5, ou também organizações híbridas, abrangen­
do tanto uma lógica de mercado quanto uma lógica de organizações
sem fins lucrativos. Dentro do chamado setor 2,5 existe uma grande
diversidade de conceitos. Vamos conhecer alguns deles.

282 Sustentabilidade nas organizações


1.1 Negócios sociais, de impacto e inclusivos
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De acordo com Comini, Barki e Aguiar (2012), dependendo da loca­


lidade, existem conceitos específicos que representam algumas varia­
ções dessas “organizações com propósito” ou, como genericamente
são chamados, “negócios sociais”. Os negócios sociais podem abran­
ger e às vezes serem abrangidos por denominações específicas, como
“negócios de impacto”, “negócios inclusivos”, “negócios de impacto”.

Primeiramente, temos o conceito de negócio social segundo a vi­


são do economista de Bangladesh e ganhador do prêmio Nobel da
Paz em 2006, Muhammad Yunus. O empreendedor criou, em 1976, em
Bangladesh, país muito pobre da Ásia, o banco Grameen. Esse banco
tinha como objetivo fazer pequenos empréstimos – trata-se da primeira
iniciativa de microcrédito que visa estimular o desenvolvimento de mi­
croempreendimentos para a população de baixa renda. O Grameen se
notabilizou por cobrar taxas de juros muito baixas e não exigir quaisquer
garantias formais ou documentos de quem busca os empréstimos, ba­
seando-se em uma relação de confiança. Em resumo, os resultados do
Grameen foram excelentes, tanto para o banco (taxa de inadimplência
baixíssima) quanto para os microempreendedores, e passaram a ser
estudados e replicados por todo o mundo (YUNUS; JOLIS, 2000).

NA PRÁTICA

Muito das discussões sobre negócios sociais e afins começaram a se


intensificar com base na proposição de que as grandes empresas deve-
riam prestar mais atenção nas pessoas de renda mais baixa, a chamada
“base da pirâmide”, equivalente às classes D e E no Brasil. Isso porque,
embora individualmente elas não tenham uma renda muito alta, essas
pessoas somam um grande número de pessoas, gerando um enorme
potencial de consumo conjunto. Chamou-se de “a riqueza na base da
pirâmide” (PRAHALAD, 2005), o que seria uma verdadeira oportunidade
de negócio que as grandes empresas deveriam se ocupar em explorar
mais. Um caso de muito sucesso mencionado é o da rede varejista bra-
sileira Casas Bahia.

Tendências em sustentabilidade nas organizações 283


A experiência do banco Grameen e Yunus é relatada em seu livro O

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banqueiro dos pobres, cuja primeira edição é de 1999. Posteriormente,
Yunus publicou um segundo livro, Um mundo sem pobreza: a empresa
social e o futuro do capitalismo (YUNUS; WEBER, 2008), lançando a base
para o conceito de “negócios sociais”, construído com base em sua ex­
periência no Grameen Bank e em outras empresas. Posteriormente,
em 2011, lançou também a organização internacional Yunus Negócios
Sociais, que tem uma filial no Brasil, e visa disseminar o conceito e
apoiar organizações dessa natureza.

O conceito de negócios sociais se baseia em alguns princípios que


os ajudam a se diferenciar de outros conceitos. Primeiro, o objetivo é
reduzir a pobreza ou atuar com outros problemas relevantes, como edu­
cação, saúde e acesso à tecnologia. Segundo, é financeiramente viável,
não necessitando de aportes externos, como doações. Terceiro, inves­
tidores recebem o valor investido de volta ao longo do tempo, porém,
sem juros. Quarto, todo o lucro das operações da empresa deve ser rein­
vestido na própria empresa para que ela cresça, desenvolva novos pro­
dutos e serviços, entre outros objetivos (YUNUS; WEBER, 2008; YUNUS
NEGÓCIOS SOCIAIS, 2018).

Outro conceito relacionado bastante usado na América Latina é o de


“negócios inclusivos”. O conceito remete ao fato de trazer as pessoas de
renda mais baixa para atuar dentro do contexto do negócio. Com isso,
propõe-se que eles se tornem não apenas os destinatários dos produ­
tos vendidos, como também fornecedores (ou empregados) ou mesmo
empreendedores, visando o incremento de sua renda (COMINI; BARKI;
AGUIAR, 2012).

NA PRÁTICA

Em alguns países, conforme explica Bornhausen (2017), há regimes jurí-


dicos diferenciados (em relação a organizações puramente com e sem
fins lucrativos) para organizações que se enquadram nos chamados

284 Sustentabilidade nas organizações


“negócios sociais” ou se assemelham a eles. Esses regimes jurídicos
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incluem diferenças, por exemplo, no que tange à possibilidade de capta-


ção e remuneração do investimento. É o caso dos EUA, com as B-corp
(ou benefit corporations), regime criado em 2010; e do Reino Unido, com
as community interest companies (CIC), regime criado em 2005. No Bra-
sil, não existe um regime jurídico específico, sendo que os assim cha-
mados negócios sociais podem se formalizar como empresa com fins
lucrativos, organização sem fins lucrativos (na forma de associação ou
fundação) ou, ainda, como cooperativas.

Por fim, há os chamados “negócios de impacto”, cuja denominação


passou a ser a mais utilizada pelas principais organizações que atuam
com a promoção de negócios com propósito no Brasil. Essa denomina­
ção foi construída e estabelecida com base na formação da chamada
Força Tarefa de Finanças Sociais (FTFS) em 2014, composta por repre­
sentantes dessas organizações e especialistas. Em 2015, a FTFS lan­
çou a “Carta de princípios para negócios de impacto no Brasil”, em que
a definição de negócios de impacto é proposta: “negócios de impacto
são empreendimentos que têm a missão explícita de gerar impacto so­
cioambiental ao mesmo tempo em que produzem resultado financeiro
positivo de forma sustentável” (FTFS, 2015, p. 5).

Interessante observar que esse movimento de promoção de negó­


cios de impacto (e outros termos mencionados e relacionados) acabou
por criar uma rede de organizações que atuam com o suporte e/ou a
complementaridade às empresas em si. É o chamado “ecossistema de
impacto”.1 Na figura 1, colocamos uma representação simplificada so­
bre o ecossistema de impacto brasileiro.

1 O termo “ecossistema” no contexto organizacional apropria-se do conceito da ecologia para referir-se a


áreas geograficamente limitadas em que coexistem componentes mutuamente dependentes (ALVEDALAN;
BOSCHMA, 2017).

Tendências em sustentabilidade nas organizações 285


Figura 1 – Ecossistema de impacto brasileiro

286
Ofertadores de recursos financeiros
Organismos nacionais e Pessoas jurídicas Instituições
Governo Pessoas físicas
internacionais de fomento (fundações e empresas) financeiras

Aplicam recursos Conectam, facilitam


por meio de e certificam

Mecanismos Intermediários
Financiamento Contrato de Monitoramento, Produção e disseminação de
Doações Fundos coletivo performance avaliação e certificação conhecimento e informação

Investimento de Comercialização Recursos e serviços Aceleradoras, incubadoras,


Empréstimos impacto social de bens e serviços financeiros espaços físicos

Conectam, facilitam
Utilizados por
e certificam
Negócios/organizações de impacto
ONGs sem Negócios sociais com Negócios sociais sem Empresas
ONGs com ONGs com
geração de Cooperativas restrição à distribuição restrição à distribuição puramente
geração de receita negócio social
receita de lucros de lucros comerciais

Fonte: adaptado de FTFS (2015).

Sustentabilidade nas organizações


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Pela figura 1, constatamos que existem entes (pessoas físicas ou
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organizações) que ofertam recursos financeiros por meio de determi­


nados mecanismos (como doações, fundos, empréstimos, etc.), que
são então utilizados pelas organizações e negócios de impacto (de di­
ferentes naturezas). Para o apoio desses atores, há os intermediários,
constituídos por organizações que conectam, facilitam e certificam am­
bos os ofertadores de recursos financeiros, como as organizações e
os negócios de impacto, pela produção de conhecimento, certificação,
avaliação, etc.

1.2 Organizações e negócios regenerativos

Outra tendência importante que está surgindo em paralelo com a


discussão dos negócios sociais e de impacto, porém com foco maior
na questão ambiental, é a de organizações ou negócios regenerativos.
Outras denominações possíveis são “empreendimentos inspirados na
natureza” (HOFSTRA, 2015) ou “bioempreendedorismo” (FREDERICK,
2018). Organizações regenerativas são aquelas que trabalham segundo
um padrão sistêmico e cíclico inspirado na natureza.

Entre as características principais dessas organizações, podemos


citar (HOFSTRA, 2015; FREDERICK, 2018):

•• o reconhecimento de oportunidades com base na observação, na


descoberta e na admiração da natureza. É o caso, por exemplo,
do uso do biomimetismo;

•• utilizar ciclos para retroalimentação nos quais as “saídas” (como


resíduos) de um sistema são reutilizadas nesse sistema ou em
sistemas associados. É o caso de princípios “do berço ao berço” e
mesmo da Produção Mais Limpa (P+L);

•• a perspectiva ecocêntrica, em que se reconhece que os negócios


são parte da natureza, não que a natureza se encontra disponível
para ser explorada a serviço dos negócios;

Tendências em sustentabilidade nas organizações 287


•• respeito à capacidade de carregamento2 da natureza, ou seja, a

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capacidade da natureza e dos recursos naturais de se regenerar
continuamente. Em uma analogia financeira, é você viver da ren­
da (juros) em vez de consumir a reserva total;

•• uso de serviços:3 comercialização de serviços em vez de produtos;

•• gera um impacto positivo à medida que cresce.

Essas organizações estão inseridas dentro de um conceito mais amplo


de estudos sobre regeneração ou desenvolvimento regenerativo, que as­
sume que até aqui a humanidade vem expondo um padrão degenerativo
de desenvolvimento (HOFSTRA, 2015), padrão esse que pode ser observa­
do em estudos como o relatório Os limites para o crescimento (MEADOWS
et al., 1972) ou os limites planetários (ROCKSTROM et al., 2009).

Os negócios regenerativos também são apontados como possível


abordagem empresarial para ajudar a enfrentar as mudanças climá­
ticas (FREDERIK, 2018), que frequentemente são apontadas como
uma das mais urgentes questões socioambientais enfrentadas pela
humanidade.

NA PRÁTICA

A empresa brasileira Juçaí é um exemplo de negócio com várias das


características de negócios regenerativos descritas. Ela produz uma
polpa semelhante ao açaí a partir da palmeira Juçara, típica da Mata
Atlântica. A empresa, por meio do seu instituto Projeto Amável, distri-
bui mudas e sementes da palmeira juçara para quem quiser plantá-la
visando reflorestar e preservar áreas da Mata Atlântica e se compro-

2 Mais conhecido em inglês pelo termo “carrying capacity”.

3 Também conhecido como servitização (ORSATO, 2012). Envolve pensar o negócio de modo a atender
a necessidade do cliente que consome o produto em vez de focar em vendê-lo. Um caso típico foi o da
Interface, que passou a alugar o serviço de carpete em vez de comercializar carpetes para a empresa,
ou o caso da Xerox, que passou a alugar as máquinas de Xerox às empresas, sendo responsável pela
substituição e manutenção delas.

288 Sustentabilidade nas organizações


mete a comprar os frutos gerados. Com isso, estimula o reflorestamen-
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to da Mata Atlântica e, quanto mais a empresa cresce, mais palmeiras


tendem a ser plantadas. Outro aspecto interessante é que a empresa
orienta os produtores a não colherem todos os frutos, de forma a man-
ter parte deles nas palmeiras, permitindo a disseminação das sementes
naturalmente e a alimentação dos animais.

2 Conceito de modelos de negócios


sustentáveis
Conceitualmente falando, podemos dizer que essas organizações
emergentes, como os negócios de impacto/sociais e as organizações
regenerativas, se organizam para oferecer produtos e serviços buscando
um modelo de negócio sustentável. O conceito de modelo de negócio
surgiu na década de 1990 (SILVA; TRKMAN, 2014), passando a se popu­
larizar mais dentro do universo da administração empresarial a partir da
década de 2000, sobretudo com a publicação do livro Geração de mode-
los de negócio, de Alexander Osterwalder e Yves Pigneur em 2009.4

Um modelo de negócios trata-se de uma descrição sintética da orga­


nização de um negócio no que tange à criação e à distribuição de valor
(BADEN-FULLER; MORGAN, 2010). Entre outros aspectos, ele sintetiza
resposta para perguntas como: “Quem é o cliente da empresa? Como a
empresa ganhará dinheiro? Como a empresa pode entregar valor a um
custo apropriado?” (MAGRETTA, 2002).

Um modelo de negócios abrange quatro atividades diferentes rela­


cionadas ao valor, como (ROOME; LOUCHE, 2016):

4 Versão em português publicada em 2011.

Tendências em sustentabilidade nas organizações 289


•• Criação e entrega de valor: atividades, processos centrais, recur­

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sos e tecnologias mantidos pela empresa que contribuem para
gerar e entregar valor.

•• Rede de valor: colaboração e relacionamentos externos man­


tidos pela empresa com diversos atores, formando sua rede e
contribuindo para o processo de criação de valor. Inclui clientes,
fornecedores, parcerias, entre outros.

•• Captação de valor: estrutura de custos da empresa incorridos


para criar e entregar valor, assim como as receitas oriundas da
comercialização dos produtos e serviços com base em um méto­
do de precificação adotado.

•• Proposição de valor: valor contido no produto ou serviço da em­


presa que tem como objetivo atender às necessidades daqueles
consumidores definidos pela empresa como prioritários, de modo
a fazer com que fiquem satisfeitos e sejam fidelizados.

Com base nessa concepção geral sobre modelos de negócios e tam­


bém na evolução da discussão sobre sustentabilidade corporativa, pas­
sou-se a propor que as organizações tivessem um modelo de negócio
sustentável. Nesse sentido, um modelo de negócio sustentável:

Contribui para a descrição, análise, gerenciamento e comunica­


ção (I) da proposição de valor sustentável de uma empresa para
os seus consumidores e todos os outros stakeholders; (II) como
a empresa cria e entrega este valor; (III) e como ela captura o va­
lor econômico ao mesmo tempo em que mantém ou regenera
o capital natural, social e econômico além dos limites organiza­
cionais. (SCHALTEGGER; LÜDEKE-FREUND; HANSEN, 2016, p. 4,
tradução nossa)

Chamam atenção na definição de modelos de negócio sustentável


quatro pontos. Primeiro, ela fala em valor não somente para os con­
sumidores, mas para todos os stakeholders. Segundo, ela reconhece
a importância dos capitais não somente econômico, mas também

290 Sustentabilidade nas organizações


natural (ou ambiental) e social. Terceiro, ela indica que a empresa
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com tal modelo não se preocupa somente em reduzir seu impacto


negativo, mas, sim, em neutralizá-lo ou, ainda, gerar impacto positivo.
Quarto, recomenda atenção não somente em aspectos que influen­
ciam ou são influenciados diretamente pela empresa, mas, também
“além dos limites organizacionais”, indicando um papel consciente e
cidadão da empresa.

Quanto aos dois últimos pontos, principalmente, essa definição


guarda grande relação com o conceito de negócios regenerativos. Aliás,
a Juçaí, usada como exemplo de empresa com modelo de negócio re­
generativo, também pode ser considerada um modelo de negócio sus­
tentável. Acompanhe:

•• Criação e entrega de valor: as atividades centrais da sua ca­


deia de valor é a expansão do reflorestamento da Mata Atlântica
centrada na plantação de palmeiras juçara. Essas palmeiras, por
sua vez, originam o fruto juçaí, colhido por moradores locais, aos
quais paga-se um preço justo. Posteriormente, o fruto é utilizado
para a produção do alimento, juntamente com outros componen­
tes orgânicos, como o açúcar orgânico.

•• Rede de valor: a empresa faz parcerias com potenciais produtores


interessados em serem fornecedores ao mesmo tempo em que
mantêm e expandem a Mata Atlântica. Treina também a popula­
ção local para coletar os frutos. Portanto, coletores se beneficiam,
assim como a sociedade de modo geral, do fato de a empresa esti­
mular o reflorestamento, regenerando o ambiente natural.

•• Captação de valor: considerando todo seu processo de criação e


entrega de valor superior, possui um custo produtivo superior ao
do açaí tradicional. Portanto, acaba por cobrar um valor também
superior (cerca de 20%).

Tendências em sustentabilidade nas organizações 291


•• Proposição de valor: oferece um alimento orgânico, com valor

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nutricional superior ao do açaí tradicional e por meio do qual os
consumidores podem ajudar a gerar renda para a população local
que coleta os frutos e ajudar a manter e expandir o reflorestamen­
to da Mata Atlântica no Brasil.

PARA SABER MAIS

Existem diferentes modelos de negócio que estão se consolidando


como referência em sustentabilidade para empresas. Entre eles, é pos-
sível citar a “servitização” (a empresa passa a vender serviços em vez
de vender produtos) e modelos de cadeia produtiva fechada (em que a
empresa consegue reutilizar o próprio produto pós-uso como matéria-
-prima para a produção de novos produtos). Esses e outros modelos de
negócio passaram fortemente a se beneficiar da chamada indústria 4.0,
considerada a “quarta revolução industrial” quando a indústria começou
a se utilizar de automatização, tecnologia de informação, inteligência
artificial, entre outras tecnologias, para aprimorar sua produção. Com
isso, tem-se gerado, por exemplo, otimização nos processos produtivos
e redução do desperdício.

3 Outros conceitos emergentes


Os termos e os conceitos estudados até aqui tratam de orientações
gerais pelas quais as empresas e outras organizações do ecossistema
se orientam. Portanto, eles orientam a missão, a razão de ser das em­
presas, e, consequentemente, acabam por influenciar também suas es­
tratégias e operações.

Existem outros conceitos e ferramentas que também têm contri­


buído atualmente para ajudar as empresas a operacionalizar mudanças
em direção a uma atuação mais responsável, apoiando a implementa­
ção de negócios de impacto/social, as organizações regenerativas e/ou

292 Sustentabilidade nas organizações


de empresas com modelos de negócio sustentável. Vejamos três deles:
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adaptação às mudanças climáticas, serviços ecossistêmicos e relato


integrado.

3.1 Adaptação às mudanças climáticas

Uma das questões ambientais mais importantes e mais abordadas


pelas empresas é a questão da redução das emissões de gases de
efeito estufa, passo necessário para evitar, ou de modo mais realista,
reduzir os efeitos das mudanças climáticas. Portanto, trata-se de uma
medida proativa para evitar certas consequências. Contudo, o fato é
que as mudanças climáticas já estão ocorrendo, sobretudo quando se
fala na frequência e na intensidade dos chamados eventos climáticos
extremos (LINNENLUECKE, GRIFFITHS; WINN, 2013).

Portanto, seja para as mudanças nos padrões climáticos ou para a


ocorrência dos eventos climáticos extremos, é necessário também uma
resposta reativa das empresas, ou seja, uma vez que ocorra, as empre­
sas têm que agir de forma a tentar reduzir o impacto das mesmas em
suas atividades. É o que chamamos de adaptação às mudanças climá­
ticas (BERKHOUT, 2012).

NA PRÁTICA

Um exemplo de adaptação às mudanças climáticas feito por uma em-


presa atuante no Brasil é o caso da empresa de distribuição de energia
EDP descrito por Orsato, Campos e Barakat (2017). A EDP desenvolveu
um sistema chamado ClimaGrid, em que previa com mais de 24 horas
de antecedência, por meio de modelos computacionais sofisticados
que cruzam um grande volume de dados de diferentes fontes, a ocor-
rência de raios em determinada localidade. A relevância da informação
sobre os raios para uma empresa de distribuição de energia é que eles
são um dos principais responsáveis pelas interrupções do fornecimen-
to de energia. E, para uma empresa de energia, interrupção do forneci-
mento de energia significa deixar de vender energia para o consumidor.

Tendências em sustentabilidade nas organizações 293


Portanto, o ClimaGrid ajuda a empresa a programar com antecedência

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onde serão alocadas suas equipes de manutenção para que, uma vez
interrompido o funcionamento por conta de uma queda de energia, elas
consigam resolver mais rapidamente o problema.

3.2 Serviços ecossistêmicos

Serviços ecossistêmicos consistem no fluxo de materiais, energia


e informação oriundos do estoque de capital natural, que, combinado
com capital humano e capital manufaturado, produzem bem-estar para
a humanidade. Portanto, mudanças na qualidade e na quantidade do
capital natural e de serviços ecossistêmicos podem ter impacto signifi­
cativo nesse bem-estar (CONSTANZA et al., 1997).

De Groot et al. (2012) utilizam em sua pesquisa 22 tipos de serviços


diferentes para avaliar o valor total dos serviços ecossistêmicos em uni­
dades monetárias, são eles:

•• Serviços provisionais: alimento; água; material virgem; recursos


genéticos, medicinais e ornamentais.

•• Serviços regulatórios: regulação da qualidade do ar, do clima e


do fluxo de água; tratamento de dejetos; prevenção da erosão;
manutenção da fertilidade do solo; polinização; controle biológico.

•• Serviços do habitat: condições de sobrevivência da população


jovem de espécies e proteção do patrimônio genético (i.e., a varia­
bilidade genética de determinada população ou espécie).

•• Serviços culturais: informação estética; recreação; inspiração para


cultura e arte; experiência espiritual; desenvolvimento cognitivo.

Os serviços ecossistêmicos beneficiam a humanidade de muitas


maneiras diferentes, desde servindo ao propósito de gerar remédios

294 Sustentabilidade nas organizações


(serviços provisionais), passando por propiciar condições básicas de
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vida, ajudando a regular a qualidade do ar e a polinização (serviços re­


gulatórios), até aspectos subjetivos como recreação e experiência espi­
ritual (serviços culturais).

Em termos práticos, a discussão sobre serviços ecossistêmicos


também evoluiu para o desenvolvimento de metodologias que visem à
atribuição de valores monetários a eles. Avaliar os serviços ecossistêmi­
cos em valores monetários, defendem os pesquisadores, contribui para
aumentar a consciência e expressar a importância dos ecossistemas e
da biodiversidade para os responsáveis pelas políticas públicas. Ajuda
também na tomada de decisão sobre qual é o melhor uso de recursos
limitados e também para determinar qual é a melhor forma de compen­
sação que deveria ser paga por aqueles que tiveram responsabilidade
pela degradação de ecossistemas (DE GROOT et al., 2012). Estimativas
feitas por Constanza et al. (2014) dão conta de que o valor econômico
global dos serviços ecossistêmicos chega a um valor entre 125 e 145
trilhões de dólares em 2011, cerca do dobro do produto interno bruto
mundial no mesmo ano.

NA PRÁTICA

O rompimento da barragem da empresa Samarco em Mariana-MG, em


2015, teve profundas consequências socioambientais não somente nas
imediações da barragem como ao longo de todo o curso do rio Doce, do
ponto da barragem na cidade de Mariana, passando por uma extensa
parte do estado de MG e estendendo-se até a foz do rio, que deságua
no mar, já no estado do Espírito Santo (ES). Além da mortandade de pei-
xes e da contaminação do rio, houve diversos outros serviços ecossis-
têmicos afetados, como o desalojamento de comunidades ribeirinhas
que viviam de atividades econômicas como pesca e também tinham
manifestações culturais associadas com a região, a impossibilidade de
realização de atividades de turismo (sobretudo no litoral do ES), entre

Tendências em sustentabilidade nas organizações 295


muitos outros prejuízos (PoEMAS, 2015). Estimativas apontam que pelo

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menos 317 mil pessoas foram afetadas (MACHADO, 2015).5

Além de ser calculada em relação a países ou a ecossistemas intei­


ros, a valoração de serviços ecossistêmicos passou também a ser utili­
zada por empresas. Isso porque as empresas têm uma relação muito in­
trincada com os serviços ecossistêmicos, sobretudo, de duas maneiras:
utilizam os serviços ecossistêmicos para suas atividades (por exemplo,
ao consumir matérias-primas extraídas da natureza); e contribuem para
significativas mudanças nos ecossistemas. No Brasil, destaca-se a ini­
ciativa chamada tendências em serviços ecossistêmicos (TeSE), criada
em 2013 pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade (GV-Ces), em que
é apresentada uma metodologia própria para a valoração dos serviços
ecossistêmicos (FGV-EAESP, 2014). Diversas grandes empresas bra­
sileiras, como Beraca, Copel e Braskem, já participaram ou participam
do TeSE.

Na definição do Conselho Empresarial Mundial Empresarial para o


Desenvolvimento Sustentável (WBCSD), a valoração dos serviços ecos­
sistêmicos consiste no processo de tomar decisões mais bem informa­
das ao se atribuir valor monetário à degradação do ecossistema e aos
benefícios providos pelos serviços ecossistêmicos (WBCSD, 2011).

5 Em janeiro de 2019, ocorreu outro rompimento de barragem de resíduos de mineração em Minas Gerais.
Dessa vez no município de Brumadinho, a barragem da empresa Vale (que também é dona da empresa
Samarco) rompeu-se, deixando um grande rastro de destruição cujas consequências ainda seriam
contabilizadas na época da elaboração desse material. Estimativas preliminares dão conta de que, embora
os prejuízos ambientais tenham sido menores comparados aos da barragem de Mariana, a perda de vidas
foi maior, provavelmente na casa de centenas de pessoas.

296 Sustentabilidade nas organizações


3.3 Relato integrado
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As primeiras diretrizes do modelo de relato integrado surgiram para


discussão em 2011. Em 2013, após diversas rodadas de discussão,
foi publicada a estrutura internacional (traduzida para o português em
2013). Segundo o presidente do Conselho Internacional para o Relato
Integrado (IIRC na sigla em inglês), o relato integrado surgiu como uma
metodologia que visava aperfeiçoar a comunicação corporativa e mudar
a mentalidade dos gestores. Ele não veio necessariamente para subs­
tituir os padrões dos relatórios financeiros ou dos relatórios de susten­
tabilidade como o GRI, mas integrar ambos os blocos (BNDES, 2017).

Segundo o International Integrated Reporting Council (IIRC), o relato


integrado visa (IIRC, 2014):

•• melhorar a qualidade da informação disponível para os investido­


res, otimizando a aplicação dos recursos financeiros;

•• comunicar de maneira mais objetiva e eficiente os aspectos


mais relevantes e diversos que contribuem para a geração de
valor para a empresa ao longo do tempo;

•• aperfeiçoar a gestão e assegurar responsabilidade por diferentes


tipos de capitais6 (financeiro, manufaturado, intelectual, humano,
social, de relacionamento e natural), estimulando-se também o
entendimento de suas interdependências;

•• facilitar o pensamento sistêmico, a tomada de decisão e as ações


considerando a geração de valor em curto, médio e longo prazo.

Como se percebe, o relato integrado tem um foco ampliado, que vai


além de aspectos financeiros e manufaturados, explorando a relação

6 Segundo o IIRC (2014, p. 11), os capitais são definidos como “repositórios de valor que aumentam,
diminuem ou se transformam por meio de atividades e produtos da organização”. O estoque desses capitais
varia ao longo do tempo e os capitais se influenciam entre si.

Tendências em sustentabilidade nas organizações 297


destes com outros tipos de recursos não financeiros (sociais, humanos

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e naturais, por exemplo). Ele tem também uma perspectiva futura e es­
tratégica (PWC, 2015).

Em termos de conteúdo, são oito os elementos que devem ser repor­


tados em um relatório integrado (IIRC, 2014), a saber:

•• Visão geral organizacional e ambiente externo: apontamen­


to das principais características da organização (como missão,
composição acionária, receita, número de empregados, etc.) e do
ambiente em que atua (fatores econômicos, comerciais, políticos,
legais, sociais, etc.) e de seus principais stakeholders.

•• Governança: identificação da estrutura de gestão (tomada de


decisão, responsabilidades, sistemas de incentivo, entre outros) e
perfil dos responsáveis pela liderança (diversidade em termos de
gênero, formação, competência, etc.)

•• Modelo de negócio: descrição de qual é o modelo de negócio


da organização.

•• Riscos e oportunidades: descrição dos riscos e das oportunida­


des do negócio que afetam a capacidade da organização de gerar
valor ao longo do tempo e apontamento de como a organização
faz para geri-los.

•• Estratégia e alocação de recursos: identificação dos objetivos


estratégicos da organização, as principais estratégias e planos de
alocação dos recursos.

•• Desempenho: caracterização dos principais indicadores estraté­


gicos quantitativos (financeiros e não financeiros) utilizados para
acompanhar a implementação dos objetivos e da estratégia da orga­
nização; estado de relacionamento com os principais stakeholders;
efeitos da atuação da organização sobre os diversos capitais.

298 Sustentabilidade nas organizações


•• Perspectiva: descrição sobre os desafios e incertezas que a or­
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ganização provavelmente enfrentará ao perseguir sua estratégia


e as prováveis implicações para o seu modelo de negócio e seu
desempenho futuro.

•• Base de preparação e apresentação: descrição sobre como a


organização determina os temas a serem incluídos no relatório
integrado e a maneira como eles são quantificados ou avaliados.

No futuro, a expectativa é que o relato integrado se torne o padrão


dos relatos corporativos, uma vez que as empresas tenderão a abando­
nar comunicações diversas, que não se integram e que têm como foco
o passado ou o curto prazo (IIRC, 2014).

Considerações finais
Neste capítulo, discutimos algumas das principais tendências rela­
cionadas à sustentabilidade nas organizações, apresentando conceitos,
ferramentas e estruturas que as organizações estão adotando como
forma de expandir ainda mais a sustentabilidade em suas atividades.

Apresentamos os novos modelos organizacionais em que as frontei­


ras entre primeiro, segundo e terceiro setor estão ficando menos claras,
originando-se as organizações do setor 2,5. Estudamos também como
as empresas estão buscando ir além de simples ações socioambientais
ao estruturar sua atuação em torno de modelos de negócios susten­
táveis. Por fim, vimos novas ferramentas e conceitos adotados pelas
organizações visando, de um lado, estender seu desempenho como um
todo, e, de outro, ampliar sua contribuição à sustentabilidade: adaptação
às mudanças climáticas, serviços ecossistêmicos e relato integrado.

Tendências em sustentabilidade nas organizações 299


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Sobre o autor
Material para uso exclusivo de aluno matriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo.

José Guilherme F. de Campos é bacharel, mestre e doutor em


administração pela Faculdade de Economia e Administração da
Universidade de São Paulo (FEA-USP). Desenvolve trabalho de pesqui­
sa e publica no Brasil e no exterior sobre diversas temáticas relacio­
nadas à sustentabilidade nas organizações. Tem também experiência
profissional atuando em empresas, organizações do terceiro setor e
no setor público. Link para o Currículo Lattes: <http://lattes.cnpq.br/
1590341934665343>.

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Sustentabilidade nas organizações
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