Você está na página 1de 8

TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I

(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

I
SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS

O processo é interpretado como um instrumento, o que significa que é


um meio através do qual se atinge alguma finalidade, no caso do processo essa finalidade
é o pleno exercício da jurisdição. Para que essa finalidade seja alcançada o processo se
estrutura através de personagens, pessoas contrapondo argumentos e pessoas imparciais
decidindo.

Tendo em vista essa perspectiva, quando se fala em sistemas


processuais penais o que a literatura processual penal tem em vista é a natureza dos
personagens no processo, como estão organizadas as suas funções na busca da verdade
processual.

Historicamente a doutrina costuma apontar três sistemas processuais


penais: a) inquisitório; b) acusatório; e c) misto.

SISTEMA INQUISITÓRIO

O que caracteriza o sistema inquisitório é a ausência de partes, nesse


sistema o acusado não é interpretado como parte, mas como objeto do processo. São
traços marcantes desse sistema a reunião da condição de acusador e julgador em uma
mesma pessoa, o caráter sigiloso e escrito da instrução e a iniciativa do juiz na produção
da prova (além desses existem outras características traçadas pela doutrina, mas essas são
essenciais).

SEISTEMA ACUSATÓRIO

Já o sistema acusatório é marcado pela presença de partes, o acusado


aqui deixa de ser objeto do processo para ser sujeito da relação processual. No sistema
acusatório as funções de acusar e de jugar são atribuídas a pessoas distintas. Sendo
também traços essenciais do sistema acusatório, além da separação entre julgador e
acusador, o igualdade entre acusação e defeso no processo, a publicidade e a oralidade
(existem outras características relatadas na literatura, inclusiva algumas históricas, mas
essas são as essenciais).

SISTEMA MISTO

O chamado sistema misto estaria ligado ao Código de Instrução


Criminal Francês de 1808, também conhecido como Código napoleônico, onde está
prevista uma fase inicial inquisitorial e uma fase processual posterior com características
acusatórias. Pelo fato dessa vinculação histórica, alguns autores também chamam o
sistema misto de napoleônico. É importante ressaltar que nem toda a literatura penal
aceita essa terceira categoria, muitos dizem que quando se avalia um sistema processual
é importante observar seu princípio unificador, ou seja, suas características marcantes, e
aí mesmo que ele tenha traços inquisitoriais ou acusatórios, sempre haverá um critério
prevalente que o vai definir como inquisitório ou acusatório.

1
TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I
(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

No caso do Brasil, muito em razão das normas da atual constituição


federal, com garantias típicas de um modelo acusatório (ampla defesa, contraditório,
acusador público com iniciativa própria e diferenciada do agente jurisdicional etc.), a
doutrina em sua maioria sugere que o sistema processual brasileiro é acusatório.

JURISPRUDÊNCIA QUANTO AOS SISTEMAS PROCESSUAIS

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE


VULNERÁVEL TENTADO. CONTRADIÇÃO INEXISTENTE. ABSOLVIÇÃO.
ÓBICE AO REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPROPRIEDADE DA
VIA ELEITA. EMBARGOS REJEITADOS. 1. A teor do disposto no art. 619 do Código
de Processo Penal, os embargos de declaração, como recurso de correção, destinam-se a
suprir omissão, contradição, ambiguidade ou obscuridade existente no julgado. Não se
prestam, portanto, para a revisão de julgado em caso de mero inconformismo da parte. 2.
Se as instâncias ordinárias, mediante valoração do acervo probatório produzido nos autos,
entenderam, de forma fundamentada, ser o réu autor do delito descrito na denúncia, a
análise das alegações concernentes ao pleito de absolvição demandaria exame detido de
provas, inviável em sede de writ. 3. A jurisprudência pátria é assente no sentido de que,
nos delitos contra a liberdade sexual, por frequentemente não deixarem vestígios, a
palavra do ofendido tem valor probante diferenciado. 4. No caso, a vítima afirmou não
ter havido a consumação do crime de estupro, mas não negou que o paciente tenha tentado
estuprá-lo. Por certo, ouvida em juízo, a criança teria sido firme ao declarar que o réu o
empurrou, tendo determinado que ele abaixasse a roupa e já estaria desabotoando a sua
bermuda quando foi interrompido pelo seu avô. Tais circunstâncias evidenciam o início
dos atos executórios do crime e permitem a condenação do réu na modalidade tentada
CP, art. 217 - A, c/c o art. 14, II). 5. Conforme precedentes desta Corte,
"o sistema processual pátrio não adota o sistema acusatório puro. Daí, não há
nulidade quando, diversamente do quanto requerido pelo Ministério Público, em
alegações finais, o magistrado reconhece a responsabilidade do réu, ou o faz por
infração penal mais grave do que aquela que, ao cabo da instrução, entendeu
o Parquet por ser a adequada ao comportamento do acusado" (HC 196.421/SP,
Sexta Turma, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 26/2/2014). 6. Não se
infere qualquer vício a ser integrado no acórdão proferido no julgamento do writ, pois, a
pretexto de sanar contradição interna do julgado, o embargante pretende, de fato,
rediscutir os fundamentos da condenação do réu, pugnando pela sua absolvição por
insuficiência probatória. 7. Embargos de declaração rejeitados. (STJ; EDcl-HC 324.762;
Proc. 2015/0121341-9; AL; Quinta Turma; Rel. Min. Ribeiro Dantas; Julg. 04/09/2018;
DJE 14/09/2018; Pág. 593)

REFERÊNCIA A SER OBSERVADA NA DECISÃO: grifei esse trecho, que considero


importante na decisão. Veja que o relator disse que o sistema processual pátrio não adota
o sistema acusatório puro, e aí a decisão citou precedentes da própria corte.

2
TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I
(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

II
PRINCÍPIOS PROCESSUAIS PENAIS

Princípios são normas caracterizadores do sistema, os princípios ao


preverem os valores essenciais do sistema normativo, estabelecem comandos que devem
ser levados em consideração quando outras normas que compõem o sistema são
interpretadas.

A seguir registrarei alguns princípios processuais penais fundamentais


para o estudo da disciplina.

PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL

Por esse princípio o acusado deve ser julgado por um juiz com
competência definida no sistema legal.

Esse princípio se encontra estruturado na constituição federal no artigo


o
5 , LIII: ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente,
bem como no XXXVII: não haverá juízo ou tribunal de exceção;

O princípio do juiz natural envolve a garantia para as partes de que serão


julgadas por um juiz imparcial, evitando que se escolha um juiz especificamente para
resolver o litígio, o que seria considerado um juízo de exceção.

Ainda, a Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como


Pacto de São José da Costa Rica, reconhecido e internalizado no sistema legal brasileiro,
também desenha o princípio em seu artigo 8.1:

Artigo 8º - Garantias judiciais

1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e


dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente,
independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na
apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na
determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista,
fiscal ou de qualquer outra natureza.

(...)

PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

O princípio do devido processo legal se encontra previsto no texto


constitucional no art. 5o, LIV: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o
devido processo legal.

A ideia do devido processo legal é a de que todo acusado tem a garantia


de que as decisões sobre a intervenção em sua liberdade terão sempre por instrumento um
processo que respeite o sistema legal vigente.

3
TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I
(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

A doutrina costuma atribuir a esse princípio duas dimensões, o devido


processo legal formal e material. O formal seria o cumprimento do quadro normativo do
processo, ou seja, o cumprimento das disposições de lei que garantem um processo
íntegro, e aí se inclui também o respeito ao contraditório e a ampla defesa. O material
seria o conteúdo da decisão, o devido processo legal material envolve compreender que
a decisão deva ser a mais justa possível, adotando critérios de razoabilidade e
proporcionalidade.

Existem dois princípios associados ao devido processo legal, o do


contraditório e o da ampla defesa.

PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO

Esse princípio envolve a chamada bilateralidade da audiência. Ele se


caracteriza por ser um direito da parte contradizer o que é pedido ou o que é alegado pela
parte contrária, a ideia é tornar isonômico o direito de manifestação das partes dentro do
processo.

PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA

Por esse princípio, o acusado tem o direito de se utilizar de todos os


instrumentos legais colocados a sua disposição para se opor ao que lhe está sendo
imputado. A ampla defesa envolve a defesa técnica, realizada por advogado, e a pessoal,
feita pelo próprio acusado em seu interrogatório.

PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Esse princípio é fruto do texto do art. 5o, LVII: ninguém será


considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Alguns
autores chamam de princípio da não culpabilidade. A ideia é a de que só é possível atribuir
ao condenado a consequência penal quanto ao crime que ele realizou, pós a decisão
condenatória transitar em julgado, ou seja, quando não couber mais recurso.

JURISPRUDÊNCIA SOBRE OS PRINCÍPIOS PROCESSUAIS PENAIS

Superior Tribunal de Justiça - STJ

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO


PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DECISÃO DE
PRONÚNCIA. IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. POSSIBILIDADE DE
RELATIVIZAÇÃO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. PAS DE NULLITÉ SANS
GRIEF. EXCESSO DE PRAZO. MATÉRIA NÃO ANALISADA PELA CORTE DE
ORIGEM. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal
Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do
recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da

4
TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I
(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial


impugnado 2. A República Federativa do Brasil, fundada, entre outros, na dignidade da
pessoa humana e na cidadania, consagra como garantia "aos litigantes,
em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, (...) o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes" (art. 5º, LV, da Constituição
Federal). Refletindo em seu conteúdo os ditames constitucionais, o art. 261 do Código
de Processo Penal estabelece que "nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será
processado ou julgado sem defensor". 3. "O devido processo legal, amparado pelos
princípios da ampla defesa e do contraditório, é corolário do Estado Democrático de
Direito e da dignidade da pessoa humana, pois permite o legítimo exercício da persecução
penal e eventualmente a imposição de uma justa pena em face do Decreto condenatório
proferido", assim, "compete aos operadores do direito, no exercício das atribuições e/ou
competência conferida, o dever de consagrar em cada ato processual os princípios
basilares que permitem a conclusão justa e legítima de um processo, ainda que para
condenar o réu". 4. O reconhecimento de nulidades no curso do processo penal reclama
uma efetiva demonstração do prejuízo à parte, sem a qual prevalecerá o princípio da
instrumentalidade das formas positivado pelo art. 563 do CPP (pas de nullité sans grief).
5. O acórdão recorrido está em conformidade com a orientação desta Corte Superior, no
sentido de que, não há falar em nulidade do processo, uma vez que, o princípio da
identidade física do juiz não é absoluto, podendo ser relativizado, e, na hipótese dos autos,
não restou demonstrado prejuízo ao impetrante, pronunciado por juiz distinto do que
presidiu as audiências em razão de férias. 6. Em relação ao pedido de relaxamento de
prisão, por excesso de prazo, verifica-se o Tribunal de origem não se manifestou sobre a
questão, circunstância que impede sua apreciação diretamente pelo Superior Tribunal de
Justiça, sob pena de indevida supressão de instância. 7. Habeas corpus não
conhecido. (STJ; HC 403.182; Proc. 2017/0139122-4; PE; Quinta Turma; Rel. Min.
Ribeiro Dantas; Julg. 12/11/2019; DJE 04/02/2020)

Supremo Tribunal Federal - STF

HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. FURTO SIMPLES


TENTADO (ART. 155, CAPUT, C/C O ART. 14, II, CP). ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA
(ART. 397, III, DO CPP). CRIME IMPOSSÍVEL (ART. 17, CP). REFORMA DESSA
DECISÃO, EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL, PARA O FIM DE SE CONDENAR,
DESDE LOGO, A PACIENTE. INADMISSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DOS
PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA
AMPLA DEFESA (ART. 5º, LIV E LV, CF). ANULAÇÃO DESSA CONDENAÇÃO
EM SEDE DE HABEAS CORPUS. IMPOSSIBILIDADE DE O WRITAGRAVAR A
SITUAÇÃO JURÍDICA DA PACIENTE. PRECEDENTE. VEDAÇÃO DA
REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA. PRESCRIÇÃO QUE PASSA A SER
REGULADA PELA PENA CONCRETAMENTE APLICADA, UMA VEZ QUE NÃO
MAIS PODERÁ SER MAJORADA. ORDEM CONCEDIDA. 1. O Superior Tribunal de
justiça, ao prover o Recurso Especial do ministério público para cassar a decisão que
absolveu sumariamente a paciente e condená-la desde logo, determinando o retorno dos
autos “ao tribunal a quo para a fixação da dosimetria da pena”, violou os princípios
do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, cf). 2. A
proibição da reformatio in pejus, princípio imanente ao processo penal, aplica-se

5
TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I
(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

ao habeas corpus, cujo manejo jamais poderá agravar a situação jurídica daquele a quem
busca, exatamente, favorecer. (HC nº 121.907/AM, primeira turma, de minha relatoria,
dje de 28/10/14). 3. Anulada, em habeas corpus, a decisão do Superior Tribunal de justiça
que condenou a paciente, a pena concretamente fixada não mais poderá ser agravada,
razão por que passa a constituir o referencial para o cálculo da prescrição da pretensão
punitiva. 4. Ordem de habeas corpus concedida para cassar o acórdão que proveu o
Recurso Especial e julgar extinta a punibilidade da paciente, pela prescrição da pretensão
punitiva. (STF; HC 126869; Segunda Turma; Rel. Min. Dias Toffoli; Julg. 23/06/2015;
DJE 21/08/2015; Pág. 63)

Supremo Tribunal Federal - STF

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DECISÃO TERMINATIVA


QUE APRECIA O MÉRITO, PROFERIDA MONOCRATICAMENTE PELO
MINISTRO RELATOR DO WRIT NO STJ.
INADMISSIBILIDADE. DEVIDO PROCESSO LEGAL. INOBSERVÂNCIA. NÃO
CONHECIMENTO DA IMPETRAÇÃO. I. Como a decisão impugnada foi proferida
monocraticamente pelo relator, o pleito não pode ser conhecido, sob pena de indevida
supressão de instância e de extravasamento dos limites de competência do STF descritos
no art. 102 da Constituição Federal, que pressupõe seja a coação praticada por Tribunal
Superior. II. Habeas corpus não conhecido. (STF; HC 121.701; SP; Segunda Turma; Rel.
Min. Ricardo Lewandowski; Julg. 12/06/2014; DJE 16/06/2014; Pág. 58)

III
LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO E NO ESPAÇO

LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO

Quanto a aplicação da lei processual penal no tempo utiliza-se o


princípio da aplicação imediata da lei processual penal, o que a doutrina costuma designar
como tempus regit actum1.

A disciplina da aplicação imediata da norma processual penal é fruto


do texto do art. 2o do Código de Processo Penal:

CPP
Art. 2º A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da
validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

1
Locução latina que significa que o tempo rege o ato, ou seja, o ato processual se submeterá à disciplina
normativa em vigor e não a que estava em vigor na data em que o crime foi praticado, e nem será
modificado por lei processual posterior que de alguma forma possa trazer algum benefício.

6
TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I
(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

JURISPRUDÊNCIA SOBRE A APLICAÇÃO DO PRINCÍO DO TEMPUS REGIT


ACTUM

Aqui estão algumas decisões, bem didáticas, sobre o princípio da


aplicação imediata da lei processual penal

Tribunal Regional Federal – TRF2ªR.

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 261 DO CP. NULIDADE NÃO


CONFIGURADA. FEITO ANTERIOR À LEI Nº 11.719/2008. OPORTUNIDADE DE
NOVO INTERROGATÓRIO. EXPOSIÇÃO A PERIGO DE EMBARCAÇÃO DO
IBAMA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO INCONTESTE. INOCORRÊNCIA
DE CAUSA DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE. CONDENAÇÃO MANTIDA.
APELAÇÃO CRIMINAL DESPROVIDA. 1. Há que ser afastada a alegação de nulidade
pela ausência de renovação do interrogatório do réu, uma vez que é pacífico na
jurisprudência dos Tribunais Superiores que é válido o interrogatório do réu realizado
antes da vigência da Lei n. 11.719/2008, que alterou o art. 400 do CPP, e a falta de
renovação do interrogatório como último ato de instrução processual não implica
nulidade do processo, pois houve o cumprimento da legislação anterior, à luz da regra
tempus regit actum (art. 2º do CPP). Ademais, houve intimação da defesa para informar
se existia interesse na repetição do interrogatório, não havendo qualquer manifestação
nesse sentido. 2. Os depoimentos das testemunhas, fiscais que participaram da abordagem
ao barco de pesca utilizado pelos acusados, permitem concluir que o réu, para evitar
abordagem dos fiscais, realizou manobra arriscada a fim de desestabilizar a lancha do
IBAMA. 3. Irrelevante que não tenha havido dano efetivo à integridade física dos fiscais
ou mesmo ao patrimônio do IBAMA, já que basta a configuração do perigo, da ameaça
aos bens jurídicos tutelados. 4. Afastada a alegação de legitima defesa como exclusão da
ilicitude. Os fiscais do IBAMA usavam coletes de identificação e, na lancha, havia um
adesivo, itens que evidenciavam que se tratava de atuação do órgão ambiental, de maneira
que não seria razoável supor que o réu, pescador experiente, tenha confundido os agentes
públicos com criminosos. 5. Apelação criminal desprovida.

(TRF 2ª R.; ACr 0000961-36.2004.4.02.5002; Segunda Turma Especializada; Relª Desª


Fed. Simone Schreiber; Julg. 17/04/2018; DEJF 10/05/2018)

Superior Tribunal de Justiça - STJ

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. NOVOS ARGUMENTOS


HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. INEXISTÊNCIA.
CONDENAÇÃO POR HOMICÍDIO QUALIFICADO. APELAÇÃO DESERTA. RÉU
FORAGIDO. ARTIGOS 594 E 595 DO CPP. EXIGÊNCIA DE RECOLHIMENTO AO
CÁRCERE. JURISPRUDÊNCIA ATUAL. ILEGALIDADE.
INCONSTITUCIONALIDADE. ENUNCIADO SUMULAR N. 347/STJ. TRÂNSITO
EM JULGADO EM 2005. NORMA DE CUNHO PROCESSUAL. TEMPUS REGIT
ACTUM. ART. 2º DO CPP. REVISÃO CRIMINAL. INCABÍVEL. ART. 621 DO CPP.
AGRAVO DESPROVIDO. I - Esta Corte Superior de Justiça possui entendimento

7
TEXTO COMPLEMENTAR ÀS AULAS DE PROCESSO PENAL I
(MATERIAL 1)
PROF. CAUPOLICAN

sedimentado de que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar
o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada
pelos próprios fundamentos. II - A atual jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é
firme no sentido de que é ilegal e inconstitucional a exigência de recolhimento ao cárcere
do réu condenado para poder interpor apelação. (Precedentes). III - O entendimento
outrora esposado por esta Corte Superior restou definitivamente superado com a edição
do Enunciado Sumular n. 347/STJ ("O conhecimento de recurso de apelação do réu
independe de sua prisão").IV - In casu, contudo, no momento da interposição do recurso
de apelação, em março de 2005, vigente ainda o art. 594 do Código de Processo Penal e
válido verbete sumular n. 9/STJ ("A exigência da prisão provisória, para apelar, não
ofende a garantia constitucional da presunção de inocência"), de modo que, não tendo o
paciente se recolhido à prisão, era juridicamente sustentável a decisão que não conheceu
da insurgência. V - As normas de cunho processual regem-se pelo princípio do tempus
regit actum, não retroagindo para alterar o curso dado ao processo penal à época em que
estava em tramitação. Com efeito, "As normas de direito processual têm aplicação
imediata e não possuem efeito retroativo. Incidência do princípio tempus regit actum (HC
n. 203.360/DF, Quinta Turma, Rel. Min. Campos Marques - Desembargador convocado
do TJ/PR, DJe de 9/4/2013).VI - A revisão criminal não se presta a modificar o
convencimento que embasou o juízo de condenação à época, sem a existência de
elementos mínimos a demonstrar a ocorrência de qualquer das hipóteses do art. 621 do
Código de Processo Penal. (Precedentes). VII - No presente caso, verifica-se das razões
vertidas na origem que não se enquadram em nenhuma das hipóteses legais previstas
no art. 621 do Código de Processo Penal, em virtude da r. decisão que declarou deserta a
apelação estar em consonância com a legislação vigente à época, conforme o princípio
do tempus regit actum e o art. 2º do Código de Processo Penal ("A Lei Processual penal
aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da
Lei anterior").Agravo regimental desprovido. (STJ; AgRg-HC 521.974; Proc.
2019/0208823-0; CE; Quinta Turma; Rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo; Julg.
15/10/2019; DJE 22/10/2019)

LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO

Quanto a aplicação espacial da lei processual penal, é seguido o


princípio da territorialidade, que define que é a lei do território que é utilizada no
julgamento dos crimes ocorridos nos limites territoriais da nação. Esse princípio está
consagrado no artigo 1o do Código de Processo Penal.

Você também pode gostar