Você está na página 1de 72

DIREITO PROCESSUAL PENAL I

MATERIAL DIDÁTICO DE
ACOMPANHAMENTO DE
AULAS

Professor: Vinicius Cipriano

NATAL/RN
2020

1
AULA 01

ASSUNTO: INTRODUÇÃO AO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

1. Escorço Histórico

1.1. Código de Processo Penal e o seu ingresso em vigor.

A Primeira legislação codificada que tratava de direito


processual penal: Código de Processo Criminal de Primeira
Instância, de 1832, ressalvando-se algumas disposições previstas
na Constituição do Império, no ano de 1824.

No ano de 1941, surge o atual Código de Processo Penal,


com inspiração na legislação italiana de 1930 (regime totalitário de
governo – Mussolini), afeiçoando aspectos autoritários no modo de
viabilizar a aplicação da pena. A exposição de motivos elaborada
pelo Ministro de Justiça, o Senhor Francisco Campos (Governo de
Getúlio Vargas) demonstra com exatidão essa influência.

 P. ex.: o antigo art. 596 do Código de Processo penal


de 1941 – O dispositivo determinava que o grau de
severidade da pena era o fator de determinação para
estabelecer se o réu ficaria em liberdade enquanto
não julgado o recurso de apelação.

O Código de 1941 é proposto com base nas ideias de


Manzini (Jurista Italiano) que pregava a incoerência lógica no modo
de raciocinar que uma pessoa presumidamente inocente não deveria
responder a uma ação penal. O simples fato de existir uma
investigação e/ou figurar em um processo penal seria suficiente para
demarcar que a mesma detinha culpa no cometimento daquela
infração penal.

 Presunção de culpa (“Ninguém acusa quem é


inocente”).

Na redação originária do atual Código de Processo Penal,


existiam certas feições que nitidamente demarcavam esse caráter
autoritário, com a finalidade de perseguir criminalmente e coibir a
criminalidade, OU SEJA, de garantir a segurança pública:

a) liberdade provisória, em caso de flagrante, somente


para crimes afiançáveis, ou quando presente
2
presunção de inocência, que tinha conceito diverso
do que se tem hoje (possível e antevista causa de
justificação - estado de necessidade, legítima
defesa, etc.);
b) fase investigatória agressivamente inquisitorial;
c) legitimação de práticas autoritárias e abusivas,
tendo como justificativa a busca da “suposta
verdade”, por exemplo, a liberdade de iniciativa
probatória do julgador;
d) interrogatório como meio de prova, e não como
instrumento de defesa, existindo inclusive, a
possibilidade do juiz valorar negativamente o
silêncio do réu;
e) legitimação da condução coercitiva.

1.2. A legislação processual penal e o contexto democrático

Com a promulgação da Constituição de 1988, o modo de


efetivar o processo penal foi direcionado para o caminho oposto, ao
menos em tese, visto que que a norma fundamental prescreveu um
rol de direitos e garantias fundamentais, inclusive a presunção de
inocência (art. 5º, LVII, CF).

O processo penal deveria ser visto como um instrumento de


garantia do indivíduo em face do poder estatal, de modo a assegurar
um processo justo, realizado sob uma instrução contraditória, com a
presença de um juiz natural e de um defensor técnico, de maneira a
criar uma decisão baseada em um convencimento sólido.

Para o Estado, deve existir uma relação de importância para


o caso, independente da inocência ou da condenação do individuo

 Máxima efetividade das garantias fundamentais,


prescritas na Constituição Federal de 1988, de modo a
determinar que todos os atos pré-processuais ou
processuais sejam revestidos de compatibilidade.

 Proibição dos excessos por parte das autoridades


estatais.

Importante destacar o jurista Luigi Ferrajoli, com o


movimento ideológico do “Garantismo penal”, cuja tese central é
caracterizar o processo como uma manifestação de saber e não
expressão de poder, viabilizando, de maneira ampla, oportunidades
das partes exaurirem a respectiva discussão, e por consequência, a
prolação de uma sentença justa.
O direito processual penal se configura a partir de uma
intervenção estatal com uma grande repercussão na vida do
3
indivíduo, o que levou FERRAJOLI a determinar que a legitimidade de
um caso criminal quando contiver o mais amplo conhecimento dos
fatos e a mais ampla possibilidade de argumentação jurídica.
Considerando tais pontos, a probabilidade de condenação de
um inocente deve ser muito mais acautelada do que uma possível
absolvição de um culpado, isto porque a reconstrução de fatos postos
como realidade na instrução processual é caracterizada como uma
precarização das normas que conduzem o conhecimento humano.

1.2.1. Princípios Constitucionais e Informadores do Processo


Penal.

Nesse modelo de processualística penal, surgem então os


Princípios que norteiam a prática processual penal – normas
generalíssimas com o efeito de democratizar a relação jurídica entre
os envolvidos.

1.2.1.1 Juiz Natural

Trata-se do princípio que determina um órgão julgador,


previamente constituído, para o processamento e julgamento de fatos
supostamente criminosos.

A existência e a designação do órgão judicante deve ser


anteriores ao cometimento do objeto de investigação e instrução
criminal (fatos supostamente criminosos).

Nessa senda, a premissa é estatuída como uma vedação em


face do Estado, de maneira que este não se configure como um órgão
jurisdicional exclusivo/casuístico para o processamento e julgamento
de determinados crimes.

 É consubstanciado na proibição do Juiz “pós-fato”


(Tribunal ou Juiz de exceção)

 De forma análoga, temos a existência do Promotor


natural (fiscal da ordem jurídica).

1.2.1.2 Vedação a autoincriminação

Esta premissa se reveste na garantia do indiciado/acusado


de não produzir provas contra si mesmo, de modo a permanecer em
silêncio ou não colaborar com a formação dos elementos probatórios
que venham a se contrapor com a sua posição enquanto réu.

4
O silêncio não é um fator que identifica culpa ou inocência.
(nemo tenetur se detegere)

 Reconstituição do crime (possibilidade de recusa);

 Direito constitucional de mentir (Exceções:


cometimento dos crimes de falsa identidade – art.
307, CP e denunciação caluniosa – art. 339, CP) e de
não comparecer a atos processuais.

 Previsão do art. 186 do Código de Processo Penal


(tanto para o interrogatório judicial, quanto para o
policial).

 O Supremo Tribunal Federal, por intermédio das


ADPF’s nº. 395 e 444, decidiu não recepcionar o art.
260 do CPP e a Lei Federal nº. 13.869/2019 (Abuso de
autoridade), ou seja, determinou que o ato de
condução coercitiva para fins de interrogatório é
incompatível com a CF.

1.2.1.3 Contraditório

A premissa do contraditório se constitui como a garantia que


viabiliza a participação no processo, de maneira a viabilizar iguais
oportunidades de contribuição para ambas as partes influirem no
convencimento do julgador. (art. 5º, inciso LV, CF)

• Contraditório para a prova ou real: atuação contemporânea à


produção da prova, cuja sequência corresponde a oportunização da
outra parte para manifestar-se na defesa de seus interesses.

• Contraditório sobre a prova ou diferido: consiste na ciência


posterior a parte para manifestação de seus interesses em virtude de
prova anteriormente produzida, visto a necessidade de antecipação
de sua realização.

1.2.1.4 Ampla Defesa

Refere-se ao Princípio que assegura a vulnerabilidade da


defesa daquele que está sendo perseguido criminalmente pelo
Estado, ou seja, podendo ser subdividido em:
a) Autodefesa: execução de defesa pelo próprio réu,
optando em enunciar a sua versão dos fatos ou permanecer em
silêncio;
b) Defesa Técnica: o corolário técnico da ampla defesa,
visto que seria a presença de profissional habilitado (capacidade

5
postulatória) para defender os interesses do acusado. (Art. 5º, inciso
LV, CF)

• Plenitude da defesa (Tribunal do Júri) – art. 5º, inciso XXXVIII, CF


(Plus).

1.2.1.5 Paridade de armas

A garantia de equivalência dos meios de atuação processual


ou pré-processual para os envolvidos. Trata-se, pois, da definição do
equilíbrio na procedimentalização do processo penal.

1.2.1.6 Presunção de inocência ou não culpabilidade

É a fixação da condição jurídica de inocente para aqueles


indiciados/acusados que estejam se submetendo a persecução
criminal.

Tão somente, com o trânsito em julgado da sentença penal


condenatória, é legítima a atribuição de culpa aquele sujeito que foi
condenado, até então, presume-se inocente (art. 5º, LVII, CF)

• Observar posicionamentos jurisprudenciais: ADC nº. 43 e 44 todos


no Supremo Tribunal Federal.

1.2.1.7 Devido Processo Legal

Trata-se da existência de um processo regular, perante


autoridade competente, respeitando-se o contraditório e a ampla
defesa, em face de uma reprimenda severa, a privação da liberdade.

Em suma, o processo é um instrumento de garantias em


face da possibilidade de excessos estatais. (art. 5º, inciso LIV, CF)

• Perspectiva procedimental (procedural due process): A adequação


do procedimento com a tutela que se pretende resguardar
determinados bens jurídicos.

• Perspectiva material (substantive due processo of law), visa uma


atuação substancialmente adequada, razoável, sem intervenção
arbitrária do Estado.

6
1.2.1.8 Verdade Real (Processual)

O processo penal tem como finalidade, a reconstrução da


verdade, porém, nem sempre, trata-se da exata situação concreta.
Exige-se que se dê a prevalência da verdade debatida por alegações
e pelo cenário probatório construído nos autos do processo.

Alguns doutrinadores, referem-se a essa premissa como a


verdade processual, visto que se trata de uma tentativa de
reconstrução de um fato controverso partindo de posições, muitas
das vezes, antagônicas.

Não se pode embasar simplesmente a atuação do órgão


julgador de forma impulsiva, com base na suposta construção da
verdade real. A verdade é construída nos autos do processo.

1.2.1.9 Publicidade

Trata-se da regra generalíssima que garante do acesso, em


regra, irrestrito aos autos processuais aos respectivos interessados.

Excepcionalmente, se admite o sigilo se da divulgação dos


fatos incorrer escândalo ou perigo da perturbação da ordem. (art.5º,
inciso LX, CF e art. 792, §1º, do CPP).

1.2.1.10 Favor Rei

Refere-se ao resguardo do direito de liberdade envolvido,


em virtude de possíveis riscos de uma condenação equivocada.

O Estado deve justificar a punição, de forma contundente.


Por sua vez, o indivíduo não precisa motivar o seu direito de
permanecer livre, pois trata-se de garantia fundamental, que em
regra, não deve ser subjugada com um viés dúbio.

Em caso de dúvida, existe o favorecimento legal, no âmbito


da prolação da sentença, para o acusado. (Exemplo: art. 386, inciso
VII, do CPP)

1.2.1.11 Duplo Grau de Jurisdição

Esta regra exige que as decisões judiciais sejam submetidas


a uma possibilidade de revisão por outro órgão judicial, geralmente,
de caráter hierárquico superior.

Por sua vez, é possível, de acordo com o nosso sistema


judicial, a mitigação desse princípio devido a uma condição subjetiva,
como é o caso da prerrogativa de foro.
7
1.2.1.11. Persuasão Racional do Juiz

Refere-se a premissa que exige do juiz a livre formação do


seu convencimento a partir elementos da instrução processual,
consubstanciando fundamentos próprios e razoáveis.

• Artigo 158 e 167, do Código de Processo Penal – mitigação na


legislação processual penal.

1.2.1.11. Identidade física do juiz

Trata-se do princípio que exige a vinculação do Juízo que


formou convencimento com o cenário probatório, seja o mesmo que
vai concluir o feito, prolatando sentença.

1.2.1.12 Imparcialidade do Juiz

Este princípio refere à “honestidade” na prolação de


decisões. A imparcialidade se atrela de maneira a retirar quaisquer
vínculos indevidos com o caráter justo que deva ter a conclusão do
feito.
• • Imparcialidade subjetiva (quanto a sua condição de sujeito
processual) e objetiva (quanto ao objeto).

Proporcionalidade e Razoabilidade
Proporcionalidade: A representação do procedimento de
aplicação/interpretação da norma, com o fim de concretizar direitos
fundamentais. De um modo formal, o seu ponto de partida está
respaldado no princípio da legalidade e, em uma perspectiva
material, trata-se do alcance de uma finalidade, justificada
racionalmente.
• • Necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido
estrito.

Razoabilidade: Representa a aceitação interpretativa das decisões no


universo jurídico.

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema.

8
Aula 02

Assunto: Sistemas Processuais e Sujeitos Processuais

1. Sistemas Processuais

1.1. Sistema Inquisitivo

Trata-se de sistema processual circundado de características


mitigadoras dos direitos e garantias fundamentais dos indivíduos, sob
o fundamento de que a persecução criminal exige celeridade e
preservação da segurança pública.
Inexiste o contraditório e a ampla defesa na sequência dos atos
processuais.
As funções de investigar, acusar, defender e julgar são concentradas
na mão de uma única pessoa, podendo o julgador iniciar o processo
ex officio, bem como gerir a produção da prova, interferindo na sua
imparcialidade para dar um caráter justo à conclusão do feito.
 Importante asseverar a lição de Aury Lopes Jr. que declara que
esse sistema possui um “erro psicológico”, ao atribuir a uma
única pessoa, funções tão opostas.
 O acusado é um mero objeto do processo (concepção distinta
de sujeito de direitos).

É possível dizer que o Código de Processo Penal de 1941, na sua


redação originária, aderiu a certas características desse sistema,
principalmente em razão da figura do Juiz como “superparte” (gestão
da prova, iniciar a ação penal através do processo judicialiforme,
controle do inquérito policial e além da emendatio libelli, exercia a
possibilidade de provocação ao acusador para que este aditasse a
ação penal.
Importante observar o art. 156, inciso I, do CPP (alteração advinda
da Lei Federal nº. 11.690/2008), que enuncia a possibilidade do Juiz
iniciar a atividade probatória, como se acusador fosse.
(Constitucionalidade desse artigo?)

9
 HC 82.507/SE no STF: Impossibilidade do Juiz requerer
diligências após o Ministério Público requerer o arquivamento
do inquérito policial.

1.2. Sistema Acusatório

Cuida-se do modelo adotado no ordenamento jurídico brasileiro,


conforme o que se prescreve da Constituição Federal de 1988,
iniciando pela titularidade da ação penal estabelecida no art. 129,
inciso I, da CF, o que remete a uma característica oposta ao sistema
inquisitivo, qual seja, a dissociação das funções de investigar, acusar,
defender e julgar a sujeitos distintos.
Os Princípios do Contraditório, Ampla Defesa e da Publicidade regem
todo o sistema acusatório, de maneira a consagrar uma ampliação da
discussão e, porventura, um amplo conhecimento ao julgador, cuja
decisão será resultado do livre convencimento motivado, conforme o
art. 155, CPP.
 Característica importante é a gestão da prova que é
responsabilidade das partes, e não do juiz, situação em que
aquelas assumem suas funções de verdadeiros sujeitos do
processo.
 O inquérito policial revestido de elementos informativos
(desprendidos do contraditório e da ampla defesa) e sua
natureza puramente inquisitiva indicavam a necessidade de
instituir um Juiz que não fosse influenciado pelas nuances
investigativas. Surge, então, a figura do Juiz de
Garantias(modelo já utilizado em outros países).
 Juiz de Garantias: responsabilidade pelo controle da legalidade
da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos
individuais (salvo, no que diz concerne as infrações do JECRIM).
 ADI 6298, 6299, 6300 e 6305 (Suspensão do art. 3º-A ao 3º-F
do CPP – Juiz de Garantias e prescrição do sistema acusatório)

O nosso sistema acusatório é o ortodoxo, diferente do puro (que


veremos a seguir), é dado ao magistrado um caráter dinâmico
(habeas corpus de ofício, aplicação de medidas cautelares).
 O inquérito policial não descaracteriza o sistema acusatório
brasileiro, visto que se trata de fase pré-processual.

10
1.2.1. Sistema Acusatório Puro (Sistema de Partes)

Esse sistema é o utilizado nos Estados Unidos da América, baseado


em um juiz totalmente inerte, o que motivaria a conviver com a
possibilidade de se ter uma condenação de alguém pela insuficiência
defensiva ou a absolvição pela atividade acusatória ineficiente.
Shünermann preleciona dois problemas enfrentados nesse modelo:
a) Na questão da verdade dos fatos a ser desenvolvida no processo, é
importante considerar todas as fontes do conhecimento e não
somente o que foi trazido pelas partes;
b) A necessidade de comunicação entre o juiz e as partes, bem assim
com as provas, assegurando determinadas garantias fundamentais.

1.2.2. Sistema Acusatório Misto

Baseado na Revolução Francesa, e circunscrito no Código de


Instrução Criminal Francês de 1808, é subdividido em três fases:
a) investigação preliminar, sob a responsabilidade da polícia judiciária
b) investigação preparatória, sob a responsabilidade do juiz, com
poderes inquisitivos, com o fim de colher provas;
c) instrução judicial, a cargo do juiz, sob o crivo do contraditório e da
ampla defesa (somente nessa fase). Portanto, é composto por um
fase com contraditório e ampla defesa (acusatório) e uma fase
processual sem a presença de contraditório e ampla defesa
(inquisitivo)
Trata-se, pois, de um sistema com características processuais
inquisitivas e acusatórias. Existe possibilidade de recursos, o de
cassação (tratar questões de fato) e o de apelação (questões de fato
e de direito).

2. Sujeitos Processuais (Título VIII do Código de Processo


Penal)

O processo penal é uma relação dialógica, logo, é estruturado por


uma relação mútua, enfatizados por sujeitos processuais.

11
 Sujeitos processuais principais: juiz e partes.
 Sujeitos processuais secundários: servidores, auxiliares do
Judiciário, assistente de acusação e testemunhas.

Do Estado-Juiz
Importante considerar a terminologia “Estado-Juiz” para caracterizar
aquele que assume uma função estatal na relação processual, qual
seja, a de dizer o direito (jurisdicionar).
Impende considerar é a imparcialidade do juízo como fator primordial
para manutenção de sua função, diante o sistema acusatório a qual
nos submetemos e o que se denomina como o mais apropriado para
um Estado Democrático. Nesse ínterim, surgem os impedimentos, as
incompatibilidades e as hipóteses de suspeição do juiz, tratadas de
um modo mais específico nos arts. 112 e 252 a 256, do CPP.
As hipóteses de impedimento referem-se ao objeto do processo,
cujas situações infringem diretamente no processo. O rol é taxativo
(arts. 252 e 253, do CPP), e deve ser reconhecida de ofício pelo juiz,
e em segundo caso, com a possibilidade de arguição por uma das
partes, a qualquer tempo, seguindo o mesmo rito da exceção de
suspeição.
Por outro lado, os casos de suspeição afetam o juiz enquanto sujeito
do processo, pois existe vinculação do julgador a uma das partes.
Esse rol é exemplificativo, podendo utilizar-se de hipóteses não
previstas no art. 254, do CPP. Quando não reconhecida ex officio pelo
magistrado, pode ser arguida pelas partes, por exceção, podendo ser
atingido pelo instituto da preclusão processual.
As incompatibilidades são aquelas invocadas, por razões de foro
íntimo, reconhecendo o julgador à possibilidade de influência na
formação do seu convencimento. (art. 112, do CPP)
No contexto processual penal, o juiz é intrinsecamente vinculado a
determinados poderes, para obter os fins almejados na função
estatal que lhe foi atribuída: a) poderes de polícia ou administrativa:
visa manter a ordem na tramitação do processo; b) poderes
jurisdicionais: visam a condução do processo para que se possa
alcançar o resultado concreto pretendido.

12
Do Ministério Público
Primeiramente, importante asseverar a figura constitucional do
Ministério Público instituída no art. 129, inciso I, da Constituição
Federal, como titular da ação penal (art. 257 e 258, CPP), bem como
se revela como defensor da ordem jurídica, do regime democrático e
dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Esse órgão é norteado como princípio da independência funcional
(art. 127, §1º, CF), ou seja, autonomia suficiente para desenvolver
as tarefas que lhes foram designadas, trata-se, pois, de uma
prerrogativa essencial.
 Seria possível uma parte imparcial? O Ministério Público
atuando na promoção da ação penal, ou seja, como parte, deve
se ater a imparcialidade subjetiva (causas de impedimentos,
suspeições e incompatibilidades), não devendo possuir
imparcialidade objetiva quanto ao papel que assume na
acusação.
 A imparcialidade está vinculada a honestidade dos órgãos
públicos.
 Ovídio Baptista enuncia que a neutralidade judicial é mitológica,
ou seja, até o juiz possua tendência em suas decisões.
 Custos legis (lei) transpassando para a concepção de Custos
juris (direito), atuando nessa posição o Ministério Público deve
respeitar tanto a imparcialidade objetiva, quanto a subjetiva.
 O Ministério Público é dividido em Ministério Público da União
(Chefe: Procurador-Geral da República) e Ministério Público dos
Estados (Procurador-Geral de Justiça), aquele é subdividido
em: a) Ministério Público Federal; b) Ministério Público do
Trabalho; c) Ministério Público Militar; e d) Ministério Público do
Distrito Federal e Territórios.
 Ação Penal Privada Subsidiária (Ministério Público como
interveniente adesivo obrigatório – amplitude de poderes – art.
29, CPP)
 As mesmas hipóteses de impedimentos, incompatibilidades e
suspeições do Estado-Juiz se aplica ao Ministério Público.

Servidores e auxiliares do Judiciário


Trata-se dos funcionários e colaboradores do Poder Judiciário. Do art.
274 ao 281 do Código de Processo Penal, são dispostas as condições

13
legais que se subordinam os servidores e os auxiliares (peritos e
intérpretes) do Judiciário.
Existe, também, a necessidade de se preservar a imparcialidade
diante do caso penal submetido a essas figuras processuais, logo, tais
sujeitos devem observar as normas que dizem respeito às hipóteses
suspeição e impedimento do Estado-Juiz.

Assistente de acusação
Esse sujeito processual é aliado à figura do acusador (Ministério
Público), nos casos em que se faca presente a figura do ofendido ou
seu representante legal, e os sucessores legitimados do art. 31, do
CPP. (art. 268, CPP).
A justificativa para essa figura pode se dar a partir da legitimidade do
ofendido em buscar a reparação dos danos (ação civil ex delicto) e
adequada aplicação da pena, sob a salvaguarda da vítima (art. 271,
CPP).
Lênio Streck emitiu opinião contrária a figura do assistente de
acusação, em virtude do Ministério Público possuir o “dominus litis”,
em razão do art. 129, inciso I, da CF, não seria permitido perpassar
ou dividir com outro, o papel acusador, bem como, evidencia que o
assistente de acusação seria uma espécie instrumento de vingança
privada.
Como contraponto, é interessante trazer à tona a ação penal privada
subsidiária como fator de comparação a figura do assistente de
acusação, visto que se ao particular é permitido intentar aquela
demanda privada, se infere que ele também pode ser assistente de
acusação.
 Possibilidade de interposição de recursos (art. 584, §1º e 598,
do CPP);
 Possibilidade de requerer a decretação de prisão preventiva
(art. 311, do CPP);
 A admissão do assistente de acusação será permitida até o
trânsito em julgado (art. 269, do CPP)
 Observar as súmulas nº. 208 e 210 do Supremo Tribunal
Federal.

14
Acusado e Defensor
Com o advento do contexto democrático de 1988, observa-se o
surgimento de direitos e garantias essenciais para o acusado e o
defensor, visto que surgiu a adequação para um modelo estritamente
acusatório (ainda que, ortodoxo). O acusado é aquele a quem é
imputada a prática de uma infração penal e o defensor seria aquele
responsável pela defesa técnica do acusado. Podemos citar uma série
de garantias a ambas as partes, após a envergadura da Constituição
de 1988 e a maximização de direitos e garantias fundamentais, senão
vejamos:
 Direito ao silêncio e à não autoincriminação. (Nemo tenetur se
detegere)
 Direito de ter respeitada a sua integridade física e moral. (art.
5º, inciso XLIX, da CF)
 Direito de ser processado e sentenciado pela autoridade
competente. (art. 5º, inciso LIII, CF)
 Direito ao devido processo legal. (art. 5º, inciso LIV, CF)
 Direito ao contraditório e a ampla defesa. (art. 5º, inciso LV,
CF)
 Direito a presunção de inocência até o trânsito em julgado. (art.
5º, inciso LVII, CF)
 Direito de não ser preso, senão em flagrante ou mediante
ordem escrita emanada da autoridade judiciária competente,
salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente
militar, definidos em lei. (art. 5º, LXI, CF e art. 282, CPP)
 Direito a ser informado de seus direitos quando preso, entre os
quais, o de permanecer calado, bem como de assistência da
família e do advogado. (art. 5º, LXIII, CF e art. 306, §2º, CPP)
 Direito de não ser preso nem mantido na prisão, quando a lei
admitir liberdade provisória, com ou sem fiança. (art. 5º, LXVI,
CF)

O defensor não pode abandonar o patrocínio, sob pena de multa de


10 (dez) a 100 (cem) salários-mínimos, sem prejuízo de outras
sanções, salvo em hipótese de motivo imperioso. (art. 265, CPP).

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema.

15
Aula 03

Assunto: Aplicação e Interpretação da Lei Penal e Inquérito Policial

1. A Lei processual penal no tempo.


A lei processual penal, ingressando no mundo jurídico, deve ser
aplicada imediatamente aos atos processuais que estejam
tramitando, independentemente se resultam em benefícios ou
malefícios para o suposto acusado/indiciado, tendo em vista a
regência do princípio da aplicação imediata. (art. 2º, CPP)
A premissa tempus regit actum (“o tempo rege o ato”) corrobora a
validade de atos processuais realizados anteriormente, visto que
esses possuem uma correlação com a vigência da lei à época, onde o
mesmo operou efeitos, conclui-se então que a lei processual penal
nova contém uma carga de aplicação imediata, incidindo aos atos
presentes e futuros.
Essa premissa é decorrência do princípio da segurança jurídica
pautado na regra constitucional do art. 5º, inciso XXXVI, da
Constituição Federal que exige respeito ao direito adquirido, ao ato
jurídico perfeito e a coisa julgada.
Nesse ínterim, é observado que o sistema de direito intertemporal
utilizado é o do isolamento dos atos processuais, que se conceitua
como aquele advindo do tempus regit actum, prelecionando que os
atos praticados na vigência de lei anterior são perfeitos
juridicamente, enquanto que os que foram realizados do período da
vigência da lei processual penal nova em diante devem ser editados
em consonância com esse ato normativo, de forma integral.

 Além da teoria que embasa o nosso ordenamento jurídico


(teoria do isolamento dos atos processuais), acima enunciado,
existem mais dois: a) teoria da unidade processual: o processo
só pode ser regulado por uma única lei, razão pela qual a lei
nova não se aplica ao rito já iniciado, evitando-se efeito
retroativo da lei nova e conferindo efeito ultrativo à lei
anterior; b) teoria das fases processuais: cuja tese central
relaciona-se a um fracionamento do processo, de maneira que
seria possível a aplicação da lei processual penal mais moderna

16
às fases subsequentes e da lei antiga à fase em curso no
momento da modificação legislativa.
 Norma processual vs material (penal): a primeira possui
aplicação imediata e a segunda observa o caráter benéfico e
maléfico para com o réu, visando assegurar direitos e
garantias, podendo possuir efeitos retroativos e ultrativos.

Diante desse contexto, surgem as normas processuais heterotópicas


e as normas processuais híbridas ou mistas. A heterotopia consiste
na hipótese em que, embora o conteúdo da norma confira-lhe
determinada natureza (ex.: penal), o diploma em que ela se encontra
inserida é de natureza distinta (ex.: processual penal). Exemplos: O
direito ao silêncio assegurado ao réu em seu interrogatório, previsto
no art. 186 do Código de Processo Penal ou as normas gerais que
disciplinam a competência da Justiça Federal incorporadas ao art. 109
da Constituição Federal, sem embargo, possuem natureza processual.

 Portanto, normas que possuem carga material penal em


diploma de natureza distinta (relativas a extinção de
punibilidade, prisões do réu e concessão de liberdade
provisória, etc.) devem manter esse caráter relativamente a
possibilidade de retroatividade e ultratividade para beneficiar o
réu e, o inverso, para não causar malefícios.

As normas híbridas ou mistas são aquelas que possuem duplicidade


de conteúdo, agregam conteúdo processual e material,
simultaneamente.

 Para esse caso, podemos contextualizar 2 (duas) correntes, a


primeira assevera que essa norma deve ser dissociada em
relação ao seu conteúdo, situação em que a parte material
deve retroagir para beneficiar o réu, enquanto que a parte
processual deve ter aplicação imediata em relação aos novos
atos praticados. Já a segunda corrente fundamenta que não é
possível a cisão da norma híbrida (processual penal e penal),
portanto, se a parte material prejudicar o réu, a norma, em
sua integralidade, não pode ser aplicada.

17
O Superior Tribunal de Justiça, acolhendo a segunda corrente,
afirmou que a redação do art. 366 do Código de Processo Penal
(Alteração da Lei Federal nº. 9.271/1996) apenas poderia ser
aplicável aos fatos cometidos após sua vigência, não podendo
retroagir para alcançar fatos que lhe fossem anteriores. A suspensão
da prescrição foi considerada como prejuízo ao réu, logo não pode ser
aplicada a parte da norma que implica a suspensão do processo, o
que enseja, que mesmo à revelia do acusado citado por edital, os
fatos anteriores a norma de 1996 podem continuar sendo apurados.

 Ab-rogação: revogação total de uma lei por outra.


 Derrogação: revogação parcial da lei.

2. A Lei processual penal no espaço.

A aplicação da lei processual penal (codificada e extravagante) é


regida pelo princípio da territorialidade absoluta, conforme o art. 1º,
do Código de Processo Penal.
Refere-se a aplicação a todos os processos que estão tramitando em
território nacional, ou seja, aplica-se a premissa locus regit actum.

EXCEPCIONALIDADES A APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL


PENAL NO TERRITÓRIO BRASILEIRO

O art. 1º, incisos I a V, do Código de Processo Penal, estatui um rol


de exceções a aplicação da lei processual penal no território
brasileiro.

I – tratados, convenções e regras de direito internacional.


Trata-se de hipótese de exclusão da jurisdição pátria, observando aas
normas de direito internacional, excluindo da competência
jurisdicional nacional, determinadas infrações que ocorrem no
território nacional.
 Agentes diplomáticos, bem como seus familiares, além de
funcionários de organismos internacionais (p. ex.: a ONU). O
Cônsul, segundo o Supremo Tribunal Federal, só tem direito a

18
imunidade se os fatos delitivos decorrerem do desempenho de
suas funções.

Importante considerar a natureza de determinados tratados que


versam sobre direitos humanos, visto que após a Emenda
Constitucional nº. 45/2004, houve o acréscimo dos §§ 3º e 4º ao
artigo 5º da Constituição Federal, ipsis litteris:

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre


direitos humanos que forem aprovados, em cada
Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por
três quintos dos votos dos respectivos membros,
serão equivalentes às emendas
constitucionais (Atos aprovados na forma deste
parágrafo: DLG nº 186, de 2008, DEC 6.949, de
2009, DLG 261, de 2015, DEC 9.522, de 2018)

§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal


Penal Internacional a cuja criação tenha
manifestado adesão.

Com base nessa modificação constitucional, surgem as figuras dos


tratados de direitos humanos materialmente constitucionais (art. 5º,
§2º, CF – normas de natureza supralegal) e os tratados de direitos
humanos formalmente e materialmente constitucionais (art. 5º, §3º,
CF – normas de caráter de emenda constitucional).
Além disso, importante considerar a submissão do Brasil a jurisdição
do Tribunal Penal Internacional, tendo em vista a implicação do §4º
do art. 5º da Constituição Federal, bem como a aprovação do Decreto
Legislativo nº 112/2002 e pelo Decreto Presidencial nº. 4.388/2012.
 O Tribunal Penal Internacional-TPI refere-se a uma corte
internacional, advinda do Estatuto de Roma, cuja jurisdição
possui caráter subsidiário (quando o país competente não faça
valer a lei penal – processos em andamento ou já conclusos e
não impede o Brasil de adotar medidas específicas), cabendo
nas hipóteses de crimes de genocídio, contra a humanidade, de
guerra e de agressão. É composto por 18 juízes, escolhidos
pelos Estados-partes, com formação em direito penal e
processual penal ou em direito internacional humanitário, além
dos requisitos do art. 39 do Estatuto de Roma. A entrega ao TPI

19
do réu condenado não se confunde com a extradição, já que o
TPI integra a própria Justiça Brasileira, sendo um órgão especial
do nosso Judiciário.

II – prerrogativas do Presidente da República, dos Ministros de


Estado, nos crimes conexos com os daquela autoridade, e dos
Ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de
responsabilidade.
Trata-se da hipótese de jurisdição política em face de determinadas
autoridades, visando com que o Poder Legislativo aprecie e julgue
determinadas infrações político-administrativas, comumente
chamadas de “crimes de responsabilidade”, definidos na Lei Federal
nº. 1.079/1950, com a possibilidade de perda do cargo e inabilitação
temporária para exercício de cargo ou função pública.

III – Justiça Militar.


Os crimes militares tem jurisdição especializada, inclusive com
legislação codificada própria tanto para parte material (Código Penal
Militar – Decreto-Lei nº. 1.001/1969) e na parte processual (Código
Processual Penal Militar – Decreto-Lei nº. 1.102/1969).
 Os crimes eleitorais e conexos possuem tanto legislação
codificada (Código Eleitoral – Lei Federal nº. 4.737/1965), bem
como possui justiça especializada (Justiça Eleitoral).
 Observar Inquérito nº. 4.435 do Supremo Tribunal Federal.

IV – Tribunal Especial.
Tratam-se das hipóteses de infrações tratadas pelo antigo Tribunal de
Segurança Nacional (Constituição de 1937), entidade que não existe
mais. Atualmente, os tais crimes são tratados pela Lei Federal nº.
7.170/83, sendo tratados pela Justiça Federal, que correspondem
àquelas práticas ilícitas que afrontam a segurança da nação, do povo.

V – Crimes de imprensa.
A Lei Federal nº. 5.250/1967 (Lei de Imprensa) previa procedimento
específico para tratar dessa espécie de infrações, entretanto tal
legislação não foi recepcionada pela Constituição Federal, conforme
demarca o julgamento da ADPF nº. 130-7, pelo Supremo Tribunal

20
Federal, logo caso existam infrações nesse sentido, devem ser
disciplinas pelo Código Penal e de Processo Penal.

Obs.: Tourinho Filho destaca que é possível a aplicação da


extraterritorialidade ao processo penal (adstrita as normas penais –
art. 7º, CP): a) aplicação da lei processual penal brasileira em
território nullius; b) em havendo autorização de um determinado
país, para que o ato processual a ser praticado em seu território, o
fosse de acordo com a lei brasileira; e c) nos casos de território
ocupado em tempo de guerra.

3. A analogia, interpretação extensiva e os Princípios gerais de


direito.
A analogia consiste em uma forma de autointegração da norma
jurídica (art. 3º, CPP e art. 4º da LINDB). Trata-se da aplicação de
disposição legal aplicada a fato semelhante a fato que não apresente
norma para lhe reger. (mesma razão, mesmo direito)

 Analogia legis: Em razão de lacuna da lei, aplica-se norma


positivada aplicada a caso semelhante e não regulado.
 Analogia juris: Aplicação de Princípios ante a omissão da
legislação.

A interpretação extensiva consiste na ampliação do alcance da norma


jurídica, para assim atingir o significado que o ordenamento jurídico
almeja.
Os Princípios gerais de direito são uma fonte do direito processual
penal (art. 3º, CPP) e se configuram como premissas éticas extraídas
ou inferidas do ordenamento jurídico, sendo estabelecidas de acordo
com a consciência coletiva daquela nação.

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema.

21
Aula 04
Assunto: Inquérito policial e suas implicações

1. A persecução penal.
A persecução penal ou criminal se caracteriza pelo procedimento de
apuração das infrações e pode ser dividido em duas fases: a)
investigação preliminar: procedimento inquisitivo formalizado no
inquérito policial; b) instrução processual: fase do processo
responsável pela produção e apreciação das provas no processo
judicial.

1.1. Conceito e natureza jurídica do inquérito policial

O inquérito policial é um conjunto de diligências realizadas pela


Polícia Judiciária para apurar infrações penais e a respectiva autoria,
com o propósito de subsidiar que o titular da ação penal, possa
oferecê-la.

 Esse procedimento de caráter instrumental e preliminar tem


duas funções: a) preservadora: evitar a promoção de ações
penais temerárias, sem a justa causa, de maneira a preservar o
status dignitatis (estado de dignidade) das pessoas; b)
preparatória: visa subsidiar com elementos de informação a
opinião delitiva (ação penal), conferindo robustez para os
argumentos da acusação.

O enunciado da Súmula nº. 444, do Superior Tribunal de Justiça,


veda a possibilidade de utilização de inquéritos policiais e ações
penais em curso para agravar a pena-base. (presunção de inocência)

22
Verificação de procedência de informações (VPI)

Trata-se de um procedimento investigatório prévio para constatar a


consistência de informações levadas ao conhecimento da autoridade
policial, em função de sua fragilidade, para que assim seja sustentado
o condão de instaurar inquérito policial em face de determinada
pessoa. (art. 5º, §3º, CPP)

 Notitia criminis. (especialmente, a modalidade anônima)

1.2. Características do inquérito policial

Discricionário
Condução do procedimento da forma que a autoridade policial achar
conveniente. Existe uma faculdade em atender ou não determinados
requerimentos do acusado e seu defensor ou pela própria vítima,
porém, não pode restringir certos direitos e garantias fundamentais
estatuídas na forma de atos obrigatórios, tais como, o exame de
corpo e delito.
 Inexistência de hierarquia entre juízes, promotores e
delegados.

Escrito
A forma do procedimento deve ser escrita, de maneira a fornecer
elementos para subsidiar a ação penal (art. 9º, CPP). Os atos
produzidos oralmente serão reduzidos a termo.
 Possibilidade de aceitação de registros audiovisuais, de acordo
com a interpretação progressiva da lei.

Sigiloso
A regra do procedimento do inquérito é a vedação de divulgação de
informações para elucidação dos fatos, não se estendendo ao
Ministério Público e ao juiz.
 O sigilo pode ser interno ou externo, sendo o primeiro aquele
vinculado a limitação de acesso aos autos do inquérito pelo
investigado e seu defensor. Já o segundo corresponde a

23
impossibilidade de divulgação de informações essenciais dom
inquérito ao público em geral, principalmente através da mídia.
 O art. 7º, incisos XIII a XV, e §1º da Lei Federal nº.
8.906/1994 (Estatuto da OAB) permite a consulta ao inquérito
pelo advogado, afastando o sigilo que lhe é atrelado, para fins
de instrumentalização do trabalho do defensor.
 A súmula vinculante nº. 14, do Supremo Tribunal Federal
estabeleceu o marco para o acesso aos autos pelo advogado,
indicando que tudo que esteja documentado, integrando o
inquérito, é permitido ao advogado, visualizar. Interessante
observar que em algumas hipóteses, a existência de mandato é
essencial (quando existir sigilo externo).
 Lawfare: estratégia jurídica de dominação de uma parte em
detrimento da outra, mediante manipulação de meios legais
disponíveis para mitigar o sigilo das investigações em
detrimento das garantias do investigado. Trata-se de abuso de
direito, utilizado, muitas das vezes, pelo acusador. Trial by
media (publicidade ostensiva): conceito próximo ao de lawfare
e refere-se ao propósito de afastar o sigilo das investigações,
com prejuízo ao princípio da paridade de armas, valendo-se da
mídia para tanto, por exemplo.

Oficial
A autoridade policial (delegado) é o presidente do procedimento de
inquérito policial, cuja atribuição se designa por ser membro de órgão
estatal (art. 144, §4º, CF)

Oficioso
Na hipótese de crime de ação penal pública incondicionada, a
autoridade policial deve agir ex officio, instaurando o inquérito e
apurando os fatos correspondentes, visto que a atuação decorre de
imperativo legal (art. 5º, inciso I, CPP).
 Crimes de ação penal púbica condicionada ou privada
dependem de manifestação da vítima, para que se inicie o
inquérito de ofício.

24
Indisponível
Uma vez iniciado o inquérito policial, o delegado não pode desistir ou
dele dispor. Com a percepção de situação que exclua o crime, o
delegado não deve nem sequer iniciar o procedimento. (art. 17, CPP)

Inquisitivo
O inquérito policial é inquisitivo, visto que todas as suas atribuições
correspondem nas mãos de uma única pessoa: a autoridade policial,
bem como existe uma limitação do contraditório e da ampla defesa,
cuja justificativa é a celeridade nas investigações.
 Fatores de mitigação: habeas corpus para trancamento do
inquérito policial; requerimentos, intervenções (razões e
quesitos).

Autoritário
O delegado de polícia que preside o inquérito policial é uma
autoridade pública. (art. 144, §4º, CPP)

Dispensável
O inquérito policial é dispensável, visto que o Ministério Público
(titular da ação penal pública) pode dispensar a sua realização, na
existência de outros elementos que possam fornecer informações
suficientes para a propositura da ação penal.
 O inquérito acompanhará a denúncia ou a queixa, se servir
como base para essas iniciais acusatórias. (art. 12, CPP)

1.3. Investigação realizada diretamente pelo Ministério


Público
Após a prolação do julgamento do RE nº. 593727, o Supremo
Tribunal Federal fixou a tese de possibilidade de investigação direta
pelo Ministério Público, por autoridade própria e por prazo razoável,
observando os direitos e garantias fundamentais do defensor e do
acusado.
A justificativa para tanto vem de um embasamento de que sendo o
Ministério Público o titular da ação penal, ele poderia também realizar
procedimento investigatório próprio e colher elementos que repute

25
indispensáveis para viabilizar a propositura da demanda penal, em
razão da teoria dos poderes implícitos. (implied powers theory).

 Súmula 234 do Superior Tribunal de Justiça (inexistência de


monopólio da polícia judiciária na atividade de investigação).
 Inquérito civil como base para ação penal pública.

2.Formas de instauração de inquérito policial.

Espontânea

É o conhecimento direto dos fatos pela autoridade policial ou através


de comunicação informal.

 Delação apócrifa ou anônima – observar o art. 5º, inciso IV, da


Constituição Federal (vedação ao anonimato) e a necessidade
de realizar VPI – Verificação de Procedência de Informações.

Provocada (cognição mediata)

É o conhecimento da infração pela autoridade policial mediante


provocação de terceiros.

a) Requisição do Ministério Público ou do juiz: para crimes de ação


pena pública, ambas as autoridades solicitam através de requisição, o
que compulsoriamente vincula a autoridade policial a iniciar o
inquérito policial. Em caso de arbitrariedade, deve-se observar a
possibilidade de trancamento da ação penal por habeas corpus.

b) Requerimento da vítima: o ofendido ou seu representante legal


noticiam o fato à autoridade policial, através de requerimento, nos
moldes do art. 5º, §1º, do CPP.

 Possibilidade de recurso ao chefe de polícia, no caso de


indeferimento do requerimento. (art. 5º, §2º, CPP)

c) Delação ou declaração de terceiro: qualquer do povo, nos crimes


de ação penal pública incondicionada pode noticiar o fato criminoso à
autoridade policial. Não existe cabimento nas hipóteses de crimes de
ação penal privada ou condicionada.

d) Representação da vítima: nos crimes de ação penal pública


condicionada à representação, ou seja, naqueles em que o legislador
conferiu essa necessidade de autorização, o início do inquérito policial

26
somente se inicia, mediante representação da vítima (condição de
procedibilidade).
e) Requisição do Ministro da Justiça: trata-se de condição de
procedibilidade para a persecução criminal em infrações que exigem
essa requisição (segurança nacional)
Coercitiva
Refere-se aquela em que a comunicação do fato criminoso dar-se-á
mediante a prisão em flagrante do suposto infrator, podendo ser feita
pelos próprios agentes de segurança pública ou particulares. (art.
301, CPP)

 Art. 13-B, §3º do Código de Processo Penal refere-se a hipótese


em que o inquérito deve ser instaurado no prazo de 72 (setenta
e duas) horas do registro da ocorrência policial.
 Delatio criminis postulatória: crimes de ação penal pública
condicionada

3. Peças inaugurais do inquérito policial.

A portaria é usualmente a peça inaugural mais utilizada para o início


do procedimento (ato de ofício – crimes de ação penal pública
incondicionada). Em outros casos, utiliza-se o auto de prisão em
flagrante, as requisições e os requerimentos, incluindo a
representação do ofendido. Na praxe administrativa, os delegados
utilizam a portaria para iniciar o inquérito, independente da forma de
cognição.

4. Providências investigativas.

Os arts. 6º e 7º do Código de Processo Penal prescrevem as


providências a serem tomadas pela autoridade policial na condução
das investigações.

Trata-se de um rol exemplificativo, cujas providências podem ser


escolhidas de forma discricionária pelo delegado, ipsis litteris:

Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da


infração penal, a autoridade policial deverá:

I - dirigir-se ao local, providenciando para que não


se alterem o estado e conservação das coisas, até
a chegada dos peritos criminais;
II - apreender os objetos que tiverem relação com
o fato, após liberados pelos peritos criminais;
III - colher todas as provas que servirem para o
esclarecimento do fato e suas circunstâncias;
IV - ouvir o ofendido;

27
V - ouvir o indiciado, com observância, no que for
aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll,
deste Livro, devendo o respectivo termo ser
assinado por duas testemunhas que Ihe tenham
ouvido a leitura;
VI - proceder a reconhecimento de pessoas e
coisas e a acareações;
VII - determinar, se for caso, que se proceda a
exame de corpo de delito e a quaisquer outras
perícias;
VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo
processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar
aos autos sua folha de antecedentes;
IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o
ponto de vista individual, familiar e social, sua
condição econômica, sua atitude e estado de
ânimo antes e depois do crime e durante ele, e
quaisquer outros elementos que contribuírem para
a apreciação do seu temperamento e caráter.
X - colher informações sobre a existência de filhos,
respectivas idades e se possuem alguma
deficiência e o nome e o contato de eventual
responsável pelos cuidados dos filhos, indicado
pela pessoa presa.
Art. 7o Para verificar a possibilidade de haver a
infração sido praticada de determinado modo, a
autoridade policial poderá proceder à reprodução
simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a
moralidade ou a ordem pública.

O delegado exerce um juízo de prognose – que seria a escolha de


quais diligências são necessárias para elucidar os fatos investigados,
e a posteriori, um juízo de diagnose – momento em que se examina o
conjunto de elementos e conclui-se a apuração, através de relatório.

 Direito do indiciado: direito de permanecer em silêncio, o


direito mitigado à assistência jurídica (embora, em razão da
natureza inquisitiva, não seja obrigatória), o direito a
comunicabilidade no caso de custódia cautelar.

 Com o advento da Lei Anticrime (art. 14-A) surge o


direito expresso para os servidores da Segurança Pública
e integrantes das Forças Armadas, quando figurarem
com investigados em inquéritos policiais ou qualquer
outro procedimento investigativo, cujo objeto seja
relacionado ao uso da força letal praticado no exercício

28
profissional, de forma consumada ou tentada, incluindo
as hipóteses de excludentes de ilicitude.

 Além disso, esta modificação também acarretou o direito


à citação do investigado para fins de constituir defensor
no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, senão, se
procede com a intimação da instituição, para que em
igual prazo, indique defensor.

5. Prazos de conclusão do inquérito policial.

O inquérito policial é submetido a prazos de conclusão. A regra geral


está prevista no artigo 10 do Código de Processo Penal, sendo o
prazo é de 10 (dez) dias para réu preso e de 30 (trinta) dias para o
réu preso

Prazos especiais

A) Inquérito Policial da Polícia Federal (Lei Federal nº. 5.010/66):


prazo de 15 dias (réu preso) e 30 dias (réu solto), ambos são
prorrogáveis.
B) Crimes contra a economia popular (Lei Federal nº. 1.521/51):
prazo de 10 dias (réu solto/preso), não comportando
prorrogação.
C) Lei de entorpecentes (Lei Federal nº. 11.343/2006): prazo de
30 dias (réu preso) e de 90 dias (réu solto), ambos são
duplicáveis.
D) Inquéritos militares (CPPM): prazo de 20 dias (réu preso) e 40
dias (réu solto), somente o último comporta prorrogação, com
acréscimo de 20 dias.

 Prazo de prisão temporária (Lei Federal nº. 7.960/89 e


8.072/90): 5 (cinco) dias prorrogáveis, por igual período. Caso
seja crime hediondo, o prazo é de 30 dias prorrogáveis, por
igual período.

6. Termo circunstanciado

Nos juizados especiais criminais, cuja competência é pra tratar de


crimes iguais ou inferiores a 2 (dois) anos – menor potencial
ofensivo, o inquérito policial é substituído pelo termo circunstanciado,
como regra. (art. 69, Lei Federal nº. 9.099/1995)

 Legitimidade para presidir o TC: Autoridade Policial – Polícia


Judiciária (não é juridicamente adequado ser elaborado por
policial militar)

29
 Verificar o art. 48 da Lei de Drogas.

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema.

30
Aula 05

Assunto: Arquivamento e desarquivamento do inquérito policial e


teoria geral da ação penal.

1. Encerramento do inquérito policial.


O inquérito policial se encerra com um relatório minucioso acerca dos
fatos apurados, devendo a autoridade policial se eximir de atribuir
qualquer juízo de valor, devendo determinar a classificação do crime
em relação aos fatos indiciados e suas razões.

 Importante considerar posição do Superior Tribunal de Justiça


que assegura a remessa direta do inquérito policial concluído ao
Ministério Público pela Polícia Judiciária, com o fim de assegurar
os Princípios da economia processual e da eficiência (AIRESP
201500690675). Observar a existência de Central de inquéritos
e a prevalência de características do sistema acusatório frente
ao art. 10, §1º, CPP.
 O indiciamento corresponde a “delineação subjetiva” do
investigado frente a convergências de indícios que atrelam a ele
a possível autoria do delito.

2. Arquivamento do inquérito policial.


Existem três situações que culminam em escolha pelo titular da ação
penal, ao realizar vistas do inquérito concluso: a) oferecer denúncia,
visto que houve apuração a contento da autoria e materialidade
delitiva; b) requerimento de diligências imprescindíveis ao
oferecimento da denúncia direcionadas ao Juiz, que por sua vez,
poderá determinar a autoridade policial. Importante ressaltar que
essa hipótese se afigura razoável para indivíduos soltos e que não
caberia ao magistrado indeferir tal solicitação, tendo em vista a
titularidade da ação penal (art. 16, CPP); c) promover o
arquivamento do inquérito policial em virtude da inexistência de
elementos mínimos que motivem o intento de ação penal.

31
2.1. Arquivamento direto

Consiste na hipótese em que o Juízo concorda com o pedido de


arquivamento do inquérito intentado pelo Ministério Público.

Antes da Lei Federal nº. 13.964/2019 (suspensão da


modificação por Decisão do Min. Luiz Fux )

O arquivamento se caracteriza como ato complexo, cuja eficácia


depende de dois atos: a) pedido do Ministério Público; e b) decisão
homologatória do Juiz, correspondente ao seu assentimento.
Logo, na hipótese de discordância pelo magistrado: os autos
são remetidos ao Procurador-Geral (nos Estados e Distrito Federal,
Procurador-Geral de Justiça e na União, as respectivas Câmaras de
Coordenação e Revisão, bem como o Procurador-Geral da República),
para que este:
(I) ofereça denúncia
(II) ou promoverá designação de outro membro do Ministério Público
para oferecimento da denúncia (longa manus – vinculação na
atribuição de denunciar – doutrina majoritária)
(III) ou insistirá no arquivamento, situação em que o Juízo estará
vinculado a aceitar.

Após a Lei Federal nº. 13.964/2019 (suspensão da


modificação por Decisão do Min. Luiz Fux )

O Ministério Público ordena o arquivamento e remete os autos à


instância de revisão ministerial para fins de homologação. Ou seja, o
ato é realizado no âmbito do Ministério Público, sem necessidade de
homologação judicial.

Portanto, não existe a possibilidade do Juiz discordar do


arquivamento.

32
2.2. Arquivamento indireto
Trata-se da hipótese em que o Ministério Público requer a remessa
dos autos para Juízo diverso por entender que o primeiro é
incompetente, situação em que esse poderá aceitar ou não. Caso
haja aceitação, ocorre a efetivação do arquivamento indireto, por
outro lado, ocorrendo discordância, aplica-se o art. 28 do Código de
Processo Penal.
 Verificar jurisprudência: CAT 43-4, STJ.
 Com a Lei Anticrime, deixa de ser aplicável.

2.3. Arquivamento implícito


Refere-se a fenômeno processual penal em que o Ministério Público
deixa de incluir fato investigado ou alguns dos indiciados, sem
justificativa plausível ou expressa manifestação de arquivamento, no
bojo da denúncia. Vincula-se a ideia de omissão injustificada pelo
Ministério Público no seu momento de escolha, após conclusão das
investigações preliminares.
 A consumação desse arquivamento dar-se-á quando o Juízo
não se pronuncia no que diz respeito o art. 28 do CPP.
 O arquivamento implícito poderá ser subjetivo (omissão de um
ou alguns indiciados) ou objetivo (omissão de um ou mais fatos
investigados).
 Os Tribunais não aceitam a existência do arquivamento
implícito no nosso ordenamento, por ausência de disposição
legal para tanto e que o arquivamento exige a necessidade de
homologação pelo Juízo (impossibilidade de queixa subsidiária).
Por outro lado, parte da doutrina entende por sua existência no
universo jurídico.
 Não se permite o desarquivamento, salvo se obtidas notícias de
novas provas. (vide abaixo)

2.4. Hipóteses autorizadoras do pedido de arquivamento do


inquérito.
O pedido de arquivamento do inquérito policial feito pelo titular da
ação penal, o Ministério Público, pode ser feito nas mesmas hipóteses
em que o Juízo poderia rejeitar a denúncia ou absolver sumariamente
o acusado, observando os arts. 395 e 397, do Código de Processo
Penal.

33
No art. 395 do CPP são prescritas hipóteses em que a ação penal não
preenche determinados pressupostos que são essenciais para o
desenvolvimento regular do processo, os dois primeiros incisos se
referem às condições da ação, quais sejam, o interesse, a
legitimidade ou a representação do ofendido, bem como
determinadas situações que se fazem necessárias para a conclusão
do feito e que são antevistas, com fundamento no Princípio da
economia processual.
 As hipóteses do art. 395 do CPP consolidam, em regra, tão
somente, coisa julgada formal, visto que permitem o re-
exercício da ação penal. A única hipótese que faz coisa julgada
material e formal é a de falta de justa causa atipicidade
material (p. ex.: vítima que possui o desejo de não ver o
agente supostamente responsável pela contravenção de vias de
fato, processado, levando em consideração o crime de lesão
corporal leve).
 As situações do art. 397 do CPP constituem, em regra, coisa
julgada material e formal, uma vez que houve manifestação do
Estado pelas hipóteses de absolvição sumária, excluindo o fato
do conceito de crime. Ressalva-se apenas, divergência
jurisprudencial entre o STJ e o STF, em que aquele entende
pela existência de certeza jurídica na promoção do
arquivamento por excludentes de ilicitude, enquanto que este
entende pelo caráter rebus sic standibus, em razão da
possibilidade de modificação com o surgimento de elementos
novos.

3. Desarquivamento do inquérito policial.


O art. 18 do CPP permite a autoridade policial, o desarquivamento do
inquérito policial, se de novas provas, tiver notícias (impede o
arquivamento pela autoridade policial).
Trata-se da realização de novas pesquisas, reabrindo aquela
investigação encerrada por falta de condão jurídico para dar
andamento à persecução.
 Importante observar as hipóteses de coisa julgada formal e
material, visto que essas não podem ser rediscutidas, logo, não
podendo ser desarquivadas as investigações, ainda que se
tenham notícias de novas provas.
 A Súmula 524 do Supremo Tribunal Federal instituiu a
necessidade de constituição de novas provas para o novo

34
ajuizamento de ação penal, antes não oferecida em razão de
arquivamento de inquérito.
 Novas provas vs noticias de novas provas.
 O Superior Tribunal de Justiça, no RHC 200501786256 e no HC
200201039877, definiu os pressupostos de “prova nova”,
determinando que fosse: a) formalmente nova – fonte já
conhecida, que já foi objeto de apreciação nas investigações
arquivadas e que segue nova “roupagem”, nova interpretação
ou aduz elemento desconhecido; b) substancialmente nova:
fonte desconhecida, de natureza inédita; e c) aptidão para
alterar o cenário probatório – possibilidade de modificação do
cotejo das provas ou elementos.

4. Acordo de não persecução penal

Com o advento da Lei Federal nº. 13.964/2019 surge a figura do


acordo de não persecução penal, que seria uma hipótese de plea
bargain, instrumento jurídico de barganha processual muito utilizado
em países do commow law, como os EUA.
Trata-se da imposição de condições negociais para não propositura da
ação penal, desde que observadas às condições estabelecidas no
artigo 28-A do CPP.
As disposições dessa medida antes eram reguladas pela Resolução
nº. 181/2017 – CNMP. Vejamos o quadro abaixo, que compara a
regulamentação legal e a disposição prevista no referido ato
normativo do Conselho do Ministério Público, ipsis litteris: T

35
36
37
4. Teoria Geral da Ação Penal
Trata-se do direito público subjetivo de pedir ao Estado-Juiz a
aplicação da lei penal ao caso concreto (direito objetivo).

Características
a) Autônomo: Independência do direito material. O direito de
ação é preexistente ao ius puniendi do Estado (ocorrência da
infração penal).
b) Abstrato: O seu exercício não se vincula ao resultado do
processo (improcedência ou procedência).
c) Subjetivo: Possui titularidade referenciada na legislação.
d) Público: É proveniente do caráter coletivo que a sociedade
impõe ao processamento e a condenação do réu.
e) Instrumental: É um meio para alcançar os fins almejados.

Condições da ação penal


Tratam-se dos requisitos necessários para a consecução da ação
penal e o seu desenvolvimento, de maneira a garantir a seriedade da
propositura de uma demanda dessa envergadura.
I- Interesse de agir: È externado no trinômio da necessidade-
adequação-utilidade, podendo se pautar da seguinte maneira: a)
necessidade: No direito processual penal, o interesse-necessidade é
presumido, visto que a instituição de justiça com as próprias mãos é
crime no nosso ordenamento. b) adequação: Trata-se da eleição do
meio adequado para obtenção do fim almejado, logo, por ser situação
antevista, se configura como uma condição (observar art. 383, CPP);
e c) utilidade: Refere-se a efetiva aplicação da lei penal, de maneira a
ocasionar esperança naqueles que movem as demandas (p. ex.:
análise da existência de prescrição).
II – Legitimidade ad causam: É a pertinência subjetiva do caso
concreto com as parte do processo, ou seja, a titularidade para
exercer a ação penal e vinculação como réu.
III- Justa causa: É o mínimo probatório, ou seja, o lastro mínimo de
presença de indícios de autoria e materialidade delitiva.

38
Observação: Possibilidade jurídica do pedido relativizada em
função da emendatio libelli.

 Condições de procedibilidade: Requisição do Ministério da


Justiça e Representação do ofendido
 Condições específicas constitucionais: Admissão de acusação
contra o Presidente da República pela Câmara dos Deputados.

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema.

39
Aula 06

Assunto: Ação Penal Pública

1. Classificação da ação penal.


A principal classificação da ação penal se dá em razão da titularidade,
dividindo aquelas que correspondem à titularidade do Ministério
Público (ações penais públicas - denúncias) e aquelas em que a
vítima figura no polo ativo da demanda (ações penais privadas –
queixas).
1.1. Ação penal pública.
1.1.1. Ação penal pública incondicionada.

Trata-se de ação penal promovida pelo Ministério Público e prescinde


de manifestação de vontade da vítima ou de terceiros, logo, permite
a atuação ex officio pelo parquet.
As infrações penais caracterizadas como de ação penal pública
incondicionada são a regra, logo, essa natureza de demanda se
convalida como a principal nas esfera processual penal. Ato contínuo,
para que se observe se é caso de ação penal pública incondicionada
basta observar se não existe opção legislativa que estabeleça
condição para a sua propositura, ou seja, o silêncio normativo é o
fator de definição de que tal crime é de ação penal pública
incondicionada.
 O art. 26, do CPP não condiz com a titularidade expressa no
art. 129, I, da CF, logo não possui compatibilidade com a nossa
Constituição Federal.
 O art. 225, do CP prescreveu modificação entabulada nos
crimes contra a dignidade sexual, atualmente, se classificando
como crimes de ação penal pública incondicionada. Antes, a
legislação penal prescrevia que ambos eram de natureza de
iniciativa privada ou pública condicionada a representação

40
1.1.2. Ação penal pública condicionada.

Na ação penal pública condicionada, o titular também o Ministério


Público, visto que possui caráter público, no entanto, o legislador
inferiu que existem motivos para necessidade de manifestação de
vontade da vítima, visto que se pode interferir em sua vida privada, a
persecução incondicionada dessa natureza de infrações penais. De
um modo geral, esse permissivo da vítima se denomina como
“representação”.
Os delitos que necessitam de manifestação de vontade da vítima ou
terceiro (representação, em sentido geral) são frutos de opção
legislativa, portanto, para que se observe se diz respeito a crime de
ação penal pública condicionada basta uma disposição que condicione
a procedibilidade da ação penal.

Representação
Essa condição de procedibilidade da ação penal é o fator de
autorização para que se promova a ação penal ou se instaure
inquérito policial. Podendo ser realizada pela vítima ou seu
representante legal, bem como por procurador com poderes
especiais. A sua exteriorização não depende de rigor formal, ou seja,
oralmente ou por escrito, seja na delegacia ou perante o magistrado
(art. 39, CPP).
 O STJ admitiu a fungibilidade de queixa crime para
representação, em virtude do engano na hora da avaliação se
era crime de iniciativa privada ou pública condicionada.
 O prazo decadencial é de 6 (seis) meses, contados da ciência
do autor do fato criminoso, observando o que preleciona o art.
10, do Código de Processo Penal.
 A regra geral é que até o oferecimento da denúncia, o ofendido
pode se retratar da representação, independente de audiência
específica (art. 25, CPP). No entanto, a Lei Federal n º. 11.
340/2006 (Maria da Penha) implica em prazo diferenciado para
a retratação, podendo ser realizada até o recebimento da
denúncia, com audiência designada para tal fim (art. 16).
 Questão de relevo é a jurisprudência acerca da Lei Federal nº.
11.340/2006, tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal,
na ADI nº. 4424 e ADC nº. 19 fixou entendimento de que o art.
41 é constitucional, assegurando assim a inaplicabilidade da Lei

41
Federal nº. 9.099/1995 (especialmente o seu art. 88), bem
como a interpretação conforme a constituição de que o crime
de lesão corporal leve é tem melhor adequação com a ação
penal pública incondicionada.
 No art. 74, parágrafo único, da Lei Federal nº. 9.099/1995 está
prevista a possibilidade legal de renúncia a representação no
acordo homologado para composição de danos civis.
 O art. 34, CPP está tacitamente revogado, em virtude da
capacidade absoluta para os maiores de 18 anos. Na ausência
de representante legal, a jurisprudência tem admitido que
qualquer pessoa responsável pelo menor, pode oferecer
representação.
 O prazo decadencial para representar começa a fluir do alcance
da maioridade.
 A sucessão do direito de representar (nos casos de
morte/ausência declarada por decisão judicial) está prevista no
art. 31, do CPP, onde foi prescrito um rol com ordem legal de
parentes: cônjuge/companheiro, ascendente, descendente e
irmão.
 O curador especial (art. 33, CPP) é a figura para oferecer
representação, nos casos de ausência de representante legal de
menores, enfermos mentais ou pessoas sem o discernimento
mental necessário, bem como quando houver conflito de
interesses (abuso do pátrio poder em crimes sexuais, etc.)
 A representação não vincula ao Ministério Público oferecer
denúncia, em respeito a sua independência funcional, bem
como a sua titularidade na ação penal pública. Uma única
representação aproveita aos demais réus, em razão da
indivisibilidade da ação penal (posição majoritária – Tourinho
Filho).
 Com o advento da Lei Anticrime, o crime de estelionato
(art. 171, CP) se configura como de ação penal pública
condicionada (art. 171, §5º, CP). As exceções
(incondicionada), dizem respeito ao crime de estelionato
cometido contra a Administração Pública, criança e
adolescente, pessoa com deficiência mental e maior de
70 (setenta) anos de idade ou incapaz.

42
1.1.3. Princípios da ação penal pública

Oficialidade
Refere-se a condição estatal que o titular da ação penal pública
possui, dando caráter oficial a essa inicial acusatória.
Indisponibilidade
Princípio decorrente da obrigatoriedade da ação penal (vide abaixo),
cujo fito é determinar a impossibilidade do Ministério Público desistir
da ação penal após sua promoção, bem como de eventuais recursos
que foram interpostos.
Obrigatoriedade
O Ministério Público é obrigado a promover ação penal, quando exista
razão para tanto, não podendo se eximir desse dever legal de iniciar
a persecução processual penal.
 Plea bargain (transação penal, acordo de não persecução penal
e acordo de leniência) não sugerem mitigação, se classificando
como uma “ação penal não convencional” (penas restritivas de
direitos, etc.)

Indivisibilidade
Trata-se da premissa que assegura que é dever do titular da ação
penal pública, ofertar a denúncia em face de todos os envolvidos.
Nesse sentido, a doutrina majoritária vem entendendo pela
inaplicabilidade desse princípio a ação penal pública.
Sendo posição minoritária na doutrina, mas a prevalente nos
Tribunais Superiores, observa-se o entendimento de que o Ministério
Público pode incluir novos corréus a posteriori, sem falar em renúncia
do direito de ação, em momento anterior, sendo inaplicável a ação
penal pública, essa premissa (REP 388.473).
Intranscedência
A responsabilidade processual penal é adstrito a quem se imputa a
prática delituosa.

 Herdeiros podem mover ação civil ex delicto.

2. Prazos para oferecimento da denúncia (ação penal pública)


A regra geral prevista no art. 46, caput, do CPP é de 5 (cinco) dias
para réu preso e 15 (quinze) dias para réu solto.

43
Prazos específicos
10 (dez) dias – crimes eleitorais.
10 (dez) dias – tráfico de drogas.
48 (quarenta e oito) horas – abuso de autoridade.
2 (dois) dias – crimes contra a economia popular.
A data do termo de vista conta como o primeiro dia para oferta de
denúncia. Existindo vários réus, uns presos e outros não, conta-se
como se todos tivessem presos.

3. Hipóteses de rejeição e aditamento


As hipóteses de rejeição da denúncia estão previstas no art. 395, do
CPP. Todas se referem às condições que possibilitam o
desenvolvimento da demanda.
O inciso I refere-se aos aspectos formais, condizentes ao art. 41, do
Código de Processo Penal. Os incisos II e III referem-se às condições
da ação penal, já referenciadas. (inclusive, a justa causa).
Importante considerar que as hipóteses de absolvição sumária
também se enquadram como motivo para rejeição da denúncia,
conforme o art. 397, do CPP.
 Rejeição parcial: A possibilidade do magistrado excluir alguns
acusados ou infrações da mesma denúncia, em não havendo
justa causa, ressalvando a outra parte para apreciação judicial.
 Além do mencionado no princípio da indivisibilidade (vide
acima), importante considerar a situação prevista no art. 384,
CPP (mutatio libelli).

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema

44
Aula 07
Assunto: Ação Penal Privada e Ação Civil ex delicto

1. Ação penal privada

Trata-se de demanda (queixa ou ação penal privada) proposta para


infrações penais que possam ocasionar escândalo com a divulgação
do processo (strepitus iudicci), visto que os bens jurídicos desses
crimes se comportam em uma esfera muito intima das vítimas, o que
fez com que o legislador determinasse para que o ofendido
escolhesse em promover ou não a ação penal. Existe uma ampla
possibilidade do ofendido se manifestar, bem assim de recompor
eventuais danos materiais sofridos.
As infrações dessa natureza são determinadas por opção legislativa.

1.1. Titularidade

O titular é o ofendido ou o seu representante legal (art. 30, CPP),


aplicando-se igualmente o art. 31, do CPP, para situações de morte
ou ausência por decisão judicial, bem como a figura do curador
especial nas hipóteses previstas no art. 33, CPP.

 Ministério Público como custos legis.

A pessoa jurídica também possui legitimidade para intentar queixa,


conforme o art. 37, do CPP, sendo representada por quem os seus
atos constitutivos designarem, ou os seus diretores ou sócio-gerente.

1.2. Terminologia e classificação

A terminologia atribuída a presente ação penal é o vocábulo ”queixa”


ou “queixa-crime” (ação penal privada), cujas partes possuem as
seguintes especificações: a) autor – querelante; b) réu – querelado.
 Necessidade de representação por pessoa detentora de
capacidade postulatória (advogado)

45
Ação penal privada propriamente dita
Trata-se daquela que pode ser exercida tanto pelo ofendido como por
seu representante legal, em crimes que somente se procedam
mediante iniciativa privada.

Ação penal privada personalíssima


É a hipótese em que o direito de ação somente pode ser exercido
pelo ofendido. Não há intervenção de representante legal ou
sucessão. Ocorrendo a morte, a punibilidade será extinta.
 O único exemplo é o crime de induzimento a erro essencial e
ocultação de impedimento ao casamento (art. 236, CP), visto
que o antigo crime de adultério foi revogado (art. 240, CP).

Ação penal privada subsidiária da pública


É a ação privada ocasionada por inércia do Ministério Público, visto
que o art. 39, do CPP legitima o ofendido a oferecer ação penal
privada, após o exaurimento do prazo para o parquet oferecer
denúncia.
Submete-se ao crivo do prazo decadencial de 6 (seis) meses,
contados do exaurimento do prazo para oferecimento de denúncia.
O Ministério Público atua como interveniente adesivo obrigatório,
podendo aditar, repudiar, fornecer elementos de prova, interpor
recursos e retomar a ação em caso de negligência.

1.3. Prazo decadencial

O prazo decadencial é de 6 (seis) meses, conforme o art. 38, CPP,


contados a partir da ciência do autor da infração penal.
Prazos específicos
O crime do art. 236, do CP – induzimento a erro essencial e ocultação
de impedimento ao casamento – tem o prazo decadencial com termo
inicial diferenciado, visto que somente se inicia com o trânsito em
julgado da sentença anulatória do casamento.

46
Os crimes contra a propriedade imaterial possuem prazo decadencial
diferenciado (30 dias), cujo termo inicial é da homologação do laudo
(art. 529, CPP).

1.4. Hipóteses de rejeição

As hipóteses de rejeição são as mesmas da denúncia, previstas no


art. 395, CPP. Ressalto somente, observância do art. 41, CPP como
engajamento dom inciso I e os outros são circunscritos as condições
da ação. Ressalte-se que as hipóteses de absolvição sumária também
podem ser motivo para rejeição (art. 397, CPP).

1.5. Aditamento

Querelante
Eugênio Pacelli aduz que este pode aditar a queixa para lanças fatos
novos, encontram como limitação somente o fato da matéria não
condizer com a ação penal privada e a inobservância do prazo
decadencial.

Ministério Público
Na ação privada propriamente dita, o Ministério Público não tem
legitimidade para aditar, incluindo corréu, visto o que preleciona a
Súmula n. 16 das Mesas de Processo Penal da Faculdade de Direito
da USP, entretanto, é permitido ao MP aditar como custos legis, com
o fim de acrescentar elementos que influam na fixação da pena.
O art. 46, §2º, CPP, assegura para que em 3 (três) dias o MP adite a
queixa, sob pena de seu silêncio, expressar assentimento.

1.6. Renúncia ao direito de queixa

A renúncia é ato incompatível com a vontade de ver processado o


possível infrator (tácito) ou através de declaração expressa nesse
sentido (expresso).

47
Decorre do princípio da oportunidade, visto que a vítima pode
escolher em mover ou não a ação penal.
É ato unilateral (não depende de aceitação), voluntário, pré-
processual e irretratável (extinção de punibilidade).
A renúncia se estenderá a todos os imputados (art. 49, CPP). A
renúncia tácita admite todos os meios de prova (art. 57, CPP) e a
expressa é feita através de declaração assinada pelo ofendido ou seu
representante legal, ou ainda, por procurador com poderes especiais.

1.7. Perdão

O perdão é ato de benevolência, também incompatível com a vontade


de ver o infrator ser processado.
É ato voluntário, bilateral (depende de aceitação do ofensor – sentido
de provar a sua inocência), processual (até o trânsito em julgado) e
se vincula ao princípio da disponibilidade.
O perdão também possui forma tácita (art. 57, CPP), admitindo todas
as provas em direito. A forma expressa é através de declaração
assinada pela vítima ou representante legal dentro dos autos, bem
como procurador com poderes especiais.
Aproveita os demais envolvidos, desde que ocorra a aceitação (art.
51, CPP). O curador especial pode aceitar o perdão (art. 53, CPP)
A forma expressa quando necessita de aceitação da outra parte,
ocorre um procedimento, em que o Juízo intima a outra parte para se
manifestar em 3 (três) dias, sobe pena de aceitação tácita (silêncio).
Necessidade de consonância entre a vontade do ofendido e do
representante legal na concessão do perdão (arts. 52 e 54)
 É possível o perdão extrajudicial, dispensando ratificação do
juízo.

1.8. Perempção

Trata-se de sanção processual em função de desídia da parte


querelante, que acarretam a extinção da punibilidade do agente do
suposto ilícito. As hipóteses estão previstas no art. 60, CPP, vejamos:

48
I – Inércia por período ininterrupto e injustificado por prazo igual a
30 (trinta) dias pela parte querelante.
II – Não comparecimento ao processo dos legitimados a suceder no
direito de queixa, no prazo de 60 (sessenta) dias, independente de
intimação judicial.
III – Não comparecimento aos atos do processo, sem motivo
justificado, a que deva estar presente, bem como deixar de realizar
pedido de condenação no ato de alegações finais (em regra, debate
oral, exceção é a proposição de memoriais).

 Tratam-se, pois, de hipóteses injustificadas que acarretam a


inércia do feito, exceto o último, no inciso III do art. 60.
 Extinção da pessoa jurídica sem presença de sucessor acarreta
a perempção.

1.9. Princípios

Oportunidade
É a premissa que assegura a escolha para o ofendido em promover
ou não a queixa, facultando-lhe a opção de se manter inerte e deixar
o prazo decadencial transcorrer in albis.

Disponibilidade
Trata-se da possibilidade de desistir da ação penal privada, seja
através do perdão (ato voluntário) ou da perempção (sanção). A
queixa é baseada no interesse do ofendido, que pode arrepender-se
ou dispor do seu direito de ação.

Indivisibilidade
O art. 48 do CPP prevê que a ação penal privada deve respeitar
rigorosamente o princípio da indivisibilidade, ajuizando a demanda
em face de todos os envolvidos, uma vez que o parquet fiscalizará
para garantir a prevalência desse Princípio.
 Os Tribunais Superiores vem tornando obrigatória somente
para a queixa, o repeito a indivisibilidade da ação penal.

49
Intranscedência
A ação penal privada deve ser proposta somente em face de quem
tem correlação indiciária com a materialidade do crime, visto que a
responsabilidade penal é pessoal.

2. Ação Civil ex delicto

A ação civil ex delicto deve ser compreendida a partir da ideia de que


um fato pode ter correspondência a várias ilicitudes a ramos do
direito, ou seja, um ilícito civil pode ser um ilícito penal e ilícito
administrativo.
Importante considerar que as esferas cível, administrativa e penal
possuem caráter independente (interdependente).
Na esfera penal, os ilícitos (conduta criminosa) podem ocasionar
danos civis as vítimas, visto que muitas vezes atingem bens jurídicos
que possuem certo valor moral ou patrimonial.
Para embasar o estudo nessa espécie de demanda, faz-se necessária
a leitura dos seguintes artigos:
o Arts. 186, 927 e 935 do Código Civil;
o Art. 91, I, do Código Penal;
o Art. 515, inciso VI, do Código de Processo Civil;
o Arts. 63, 64 e seguintes do Código de Processo Penal;

2.1. Classificação das ações civis ex delicto

Ação de conhecimento, strictu sensu ou de cognição


Trata-se da ação proposta antes do trânsito em julgado da sentença
penal condenatória, ou seja, sem a existência de um título executivo.
Podendo ser ajuizada antes ou durante a tramitação do inquérito
policial e do processo judicial.
Seu objetivo está circundado na obtenção de indenização dos danos
ocasionados pela infração penal, e como qualquer processo em que
se discute a procedência de um pedido de conhecimento, é
imprescindível a existência de uma fase de instrução.

50
Serão discutidas as provas acerca do fato e da autoria do delito.
o Art. 64, CPP.

Ação de execução ou latu sensu


A ação civil ex delicto de execução se comporta naquela que vista
executar a sentença penal condenatória transitada em julgado, visto
se enquadrar como um título executivo, dispensando o processo de
conhecimento, logo, não tem fase instrutória,uma vez que a autoria
e a materialidade delitiva já se encontram definitivamente
esclarecidos.
Durante a pendência de ação penal condenatória, não corre a
prescrição da ação civil.
Em regra, o título é ilíquido, porém, o Juízo Criminal poderá ter fixado
valor mínimo do dano (art. 387, IV, CPP), tornando o valor líquido ou
parcialmente líquido (é possível apurar o dano efetivamente sofrido).

2.2. Legitimidade

A legitimidade ativa pertence à vítima, seu representante legal e os


herdeiros (art. 63, CPP).
 Possibilidade do MP ou advogado dativo (municípios que não
tem Defensoria Pùblica) promover a ação, em caso de vítima
pobre. Inconstitucionalidade progressiva do art. 134, CF.

A legitimidade passiva pertence ao autor do crime a ao responsável


civil (ações de conhecimento).

2.3. Competência

Em razão da matéria
Juízo Cível

Território
Lugar do ato ou fato (minoritária)

51
Lugar do seu domicílio ou local do fato, bem como o domicilio do réu
(majoritária)

2.4. Sistemas de reparação de danos

Sistema da confusão
Duas pretensões desenvolvidas em ação única no juízo criminal.
Pedido condenatório (criminal) e reparatório (danos civis)
Sistema da união
Duas ações, civil e penal, se desenvolvendo em um processo único.
Podendo ser movidas por pessoas distintas, contra responsáveis
diversos. São duas pretensões e dois pedidos, tramitando no mesmo
processo.
Sistema da livre escolha
A parte opta pelo pleito reparatório na esfera cível ou na esfera
penal.
Sistema da Separação
Era o modelo adotado no Brasil, até o ingresso da Lei Federal nº.
9.099/1995 e em função do art. 387, inciso IV, do CPP (2008), visto
que ambos mitigaram a separação de esferas para tratar de cada
pedido (reparatório e condenatório).

2.5. Suspensão da demanda civil

Para evitar contradições, admite-se que o juiz cível suspenda o curso


da ação indenizatória, aguardando o trânsito em julgado da penal.
(art. 200 e art. 206, §3º, CC)
Mesmo a ação penal não tendo iniciado, a civil pode ser suspensa.
 3 (três) meses para a ação penal ser deflagrada. (§1º, do art.
315, CPC), Simultaneidade: prazo máximo de 1 (um) ano de
suspensão.

52
2.6. Sentenças absolutórias, decisões penais e seus efeitos
civis.

Art. 386, CPP (hipóteses de absolvição)


Inciso I: Realiza coisa julgada material/Sem ação civil ex delicto
Inciso II: Não faz coisa julgada material/Ação civil ex delicto
Inciso III: Não faz coisa julgada material/Ação civil ex delicto
Inciso IV: Faz coisa julgada material/ Ação civil ex delicto
Inciso V: Não faz coisa julgada material/Ação civil ex delicto
Inciso VI: ?? (Atividade/Turma)
Inciso VII: Não faz coisa julgada material/ Ação civil ex delicto

 Decisão de arquivamento do IP
Regra: Não faz coisa julgada material/ Ação civil ex delicto
Exceção: (causa real de ilicitude)

 Decisão de extinção de punibilidade


Não impedem o ajuizamento de ação civil ex delicto

 Sentença absolutória imprópria


Não se considera título executivo (ação de conhecimento)

 Sentença absolutória do Júri


Art. 483, inciso I e II, CPP (coisa julgada material)
“Quesito genérico” (?)
 Transação penal
Homologatória ou condenatória? (Ação civil ex delicto de
conhecimento.

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema

53
Aula 08

Assunto: Jurisdição Penal e Competência (primeira parte)

1. Jurisdição Penal
1.1. Conceito

Trata-s e do poder estatal responsável pela aplicação do direito penal


as situações que lhe forem apresentadas como violadoras de bens
jurídicos.

 Substitutividade, inércia e definitividade.

1.2. Classificação

a) Quanto à matéria;
b) Quanto ao objeto;
c) Quanto ao grau de jurisdição;

1.3. Princípios

1.3.1. Princípio do juiz natural


Observância do art. 5º, incisos XXXVII e LIII, da CF. Trata-se da
premissa que veda a criação de juízos de exceção, logo, as situações
que ensejem a resposta jurisdicional penal devem observar aquele
juízo competente, de acordo com normas jurídicas postas no
ordenamento.

1.3.2. Princípio da investidura


Necessidade de aprovação em concurso público, nomeação, posse e
exercício para que se efetive a jurisdição.
 Quinto Constitucional (art. 94, CF).

54
1.3.3. Princípio da indeclinabilidade
Impossibilidade de se dispor de realizar ou da lei afastar a prestação
jurisdicional (art. 5º, inciso XXXV, CF).

1.3.4. Princípio da indelegabilidade


Impossibilidade de se delegar a atividade jurisdicional que lhe foi
outorgada.

 Expedição de carta precatória, rogatória e de ordem.

1.3.5. Princípio da improrrogabilidade


Impossibilidade do Juiz invadir área de atuação de outrem, salvo em
hipóteses autorizadas em lei (prorrogação de competência em casos
de conexão).

1.3.6. Princípio da inevitabilidade (ou irrecusabilidade)


As partes não podem recusar o juiz que foi designado ao caso.

 Suspeição, impedimento e incompetência.

1.3.7. Princípio da inércia (ou da iniciativa das partes)


O juiz não pode dar início à ação penal.

 Art. 156, inciso I e II, CPP.

2. Competência
Trata-se da delimitação da jurisdição, de maneira a ensejar que um
Juiz não pode julgar todos os casos.
 Vide art. 69, CPP.
 Ratione loci, ratione materiae e ratione personae.

2.1. Competência absoluta ou relativa.

55
Observância do interesse público nas competências em razão da
pessoa e da matéria, visto que não caracteriza somente as partes, o
cumprimento dessa regra de fixação, logo, ambas são competências
de caráter absoluto.

 Nulidade absoluta.

A competência em razão do território é relativa, visto que se a parte


interessada não alegar no momento oportuno, considera-se
prorrogada a competência, tornando-se válido o julgamento pelo
juízo que, em princípio, não possuía competência territorial.

 Nulidade relativa.

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema

56
Aula 09
Assunto: Competência Penal (segunda parte)

1. Competência Penal
Refere-se à medida de jurisdição incumbida a determinado Juiz para
apreciar determinada matéria penal, logo, possui caráter objetivo e
concreto.

1.1. Critérios de fixação de Competência Penal (art. 69, CPP).

1.1.1. Ratione personae (Competência em razão da pessoa):


Necessidade de observância das condições pessoais dos sujeitos
envolvidos. Eleição de Órgão Judiciário. Determinação de tramitação
perante juízes singulares ou Tribunais.
 “Quem praticou o delito?”
 Prerrogativa de Foro.
 Cargos políticos, funções públicas.
 (Súmula 394/STF e art. 84, §§ 1º e 2º, CPP)
 ADI nº. 2797 – Existência de cargo ou mandato
 Prerrogativa de função e exercício do cargo, mandato ou da
função que lhe confere a prerrogativa. QO – Ação Penal 937,
STF. (crimes relacionados ao cargo ou mandato e praticados no
exercício do mesmo).
 Obs.: impossibilidade de deslocamento de competência com o
encerramento da instrução processual.
 Diplomação.
 Extensão somente para parlamentares? (ratio decidendi)
 Aplicabilidade para Deputados Estaduais (Obs.: art. 53, §1º, CF
– Art. 27, §1º, CF)
 Ação de improbidade não tem foro privilegiado.
 Inq. 3357/PR, STF (Extensão aos licenciados)
 Desnecessidade de relação do crime com o cargo, mandato ou
função.
 Deputados Estaduais e necessidade de fixação na Carta
Estadual.
 Crimes comuns de Prefeitos (art. 29, X, CF).

57
 Crimes Eleitorais – no mesmo grau de jurisdição da respectiva
Jurisdição Competente e conexão com crimes comuns.
 Súmula Vinculante nº. 45 do STF e a incidência da Competência
do Tribunal do Júri. (exceção: STJ fixou entendimento de que
não se aplica a referida súmula aos Deputados Estaduais).
 Hipóteses Constitucionais:

1.1.2. Ratione materiae (Competência em razão da matéria):


Avaliação da natureza dos fatos incriminados para fixação da
competência do Juízo, observando se será na Justiça Especial Militar,
Justiça Especial Eleitoral, Justiça Comum Federal e Justiça Comum
Estadual.
 Justiça do Trabalho (não possui competência para tratar de
assuntos criminais, conforme exclusão do art. 114, CF).
 Ratione materiae vs ratione personae (prevalência ).
 “Qual foi o delito praticado?”.

58
1.1.3. Ratione loci (Competência em razão do lugar):
Observância do local atribuído ao suposto cometimento da infração
penal, cuja avaliação ensejará o foro competente para processamento
e julgamento da demanda, podendo ser: determinado Conselho de
Justiça na esfera da Justiça Militar; determinada Zona no caso da
Justiça Eleitoral; a Seção/Subseção na Justiça Federal e a Comarca
na Justiça Estadual.
 Necessidade de provocação do interessado (incompetência –
infraconstitucional – Súmula nº. 33 do STJ – preclusão).
 “Onde ocorreu o delito?”.

1.1.4. Domicílio do réu (critério alternativo ou facultativo):


Hipótese de fixação de competência de caráter alternativo, visto que
é aplicável quando não se sabe o local em que foi praticada a infração
penal, ou de natureza facultativa, para a propositura de ações penais
exclusivamente privadas, existindo assim um juízo de conveniência
do querelante entre o domicílio do réu e o local da infração.
 Art. 72, §1º, CPP – Prevenção na hipótese de réu com mais de
uma residência.
 Art. 72, §2º, CPP – Conhecimento formal dos fatos pelo
primeiro Juiz.

1.1.5. Prevenção: Trata-se da hipótese fática de existência de dois


ou mais Juízes competentes para a ação penal e um deles se
anteceder ao(s) outro(s) na prática de atos jurisdicionais (carga
decisória).
 Súmula 706, STF (nulidade relativa).
 Artigos 70, §3º; 71; 72, §1º; 78, II, c; 83, CPP.

1.1.6. Normas de Organização Judiciária: Após a fixação da


competência ratione materiae e após definição do foro competente, é
necessário definir o Juiz Competente dentro da respectiva Comarca,
deve se observar o art. 74 do CPP, cuja referência indica a
necessidade de se observar as leis de organização do Judiciário, salvo
para o Tribunal do Júri.

59
1.1.7. Distribuição: É o critério determinado pelas regras de
organização judiciária, em que na mesma hipótese de juízos
igualmente competentes para a matéria.
 Juiz Natural.
 Prevenção a partir da distribuição dos autos.

1.2. Causas modificadoras da competência (arts. 76 e 77,


CPP).
Além de fixar a competência, ocorre o que denominamos como
prorrogação ou modificação aos nos deparamos com as hipóteses
de conexão ou continência.

1.2.1. Conexão.
Ocorre na hipótese se duas ou mais infrações estiverem
umbilicalmente vinculadas entres si, conforme o art. 76, do Código de
Processo Penal, o que vai propiciar ao Julgador uma perfeita visão do
quadro probatório, e assim, melhor conhecimento da situação fática.

1.2.1.1. Conexão intersubjetiva (art. 76, I, CPP).


Modalidade de duas ou mais infrações praticadas por duas ou mais
pessoas, o que configuraria o elo entre essas duas práticas.

a) por simultaneidade.
Hipótese de conexão intersubjetiva sem a existência de prévio ajuste
entre eles, existindo uma unidade de desígnios.
b) Conexão intersubjetiva por concurso .
Hipótese com existência de conluio ou liame subjetivo na intenção de
cometerem dois ou mais delitos.
c) Conexão intersubjetiva por reciprocidade.
Hipótese em que existem lesões recíprocas, cometidas por duas
pessoas, uma contra a outra.
 Rixa – continência (crime único – três ou mais pessoas
cometendo crimes ao mesmo tempo)

60
1.2.1.2. Conexão objetiva (art. 76, II, CPP).
O liame dessa conexão está na motivação de uma delas que a
relaciona com à outra infração.
a) teleológica
A motivação do primeiro delito esteja relacionada ao cometimento do
segundo delito, facilitando-a.
 Não pode haver aplicação do Princípio da Consunção.

b) consequencial
Quando a infração for cometida visando ocultar a outra ou
cometimento de infração para garantir a impunidade da outra ou
assegurar a vantagem de outra infração penal.

1.2.1.3. Conexão instrumental ou probatória.


Quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas
circunstâncias influir na prova de outra infração.

1.2.2. Continência
a) por cumulação subjetiva
Ocorre quando duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma
infração penal. Crime único cometido por duas ou mais pessoas em
coautoria ou participação.

b) por cumulação objetiva


Ocorre em todos os casos de concurso formal, bem como nas
hipóteses de erro na execução (aberratio ictus) ou resultado diverso
do pretendido com duplo resultado (aberratio criminis)
1.2.3. Regras de prevalência
Previsão legal no art. 78 do Código de Processo Penal.

1.3. Separação de processos.

61
1.3.1. Obrigatória
Previsão legal no art. 79 do Código de Processo Penal.

1.3.2. Facultativa
Previsão legal no art. 80 do Código de Processo Penal.

1.4. Desclassificação e competência.

a) Crimes únicos
 Rito Comum

 Rito do Júri

b) Crimes Conexos

 Rito Comum

 Rito do Júri.

1.1.. Verificação da Competência.

62
_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema

63
Aula 10
Assunto: Prisões, medidas cautelares diversas e liberdade no curso
do processo

1. Introdução.
A prisão é o cerceamento da liberdade, e pode ser subdivida em
prisão carcer ad poenam (prisão definitiva – após o trânsito em
julgado) e a prisão ad custodiam (prisão processual ou provisória).
 Presunção da inocência (art. 5.º, inciso LVII, CF).
 Ordem fundamentada e escrita (art. 5º, inciso LXI, CF).
 Excepcionalidade da prisão provisória.

2. Prisão em flagrante.
Trata-se de segregação processual prevista no art. 5º, inciso LXI, CF,
cuja situação fática implica que houve visualização do autor do delito
cometendo a suposta prática criminosa e o consequente
encaminhamento até à autoridade policial. O art. 302 do Código de
Processo Penal estabelece a concepção de flagrância. Vejamos:
a) Flagrante facultativo e obrigatório (art. 301, CPP)
b) Flagrante próprio
c) Flagrante impróprio
d) Flagrante presumido
e) Flagrante provocado
f) Flagrante esperado
g) Flagrante forjado
h) Flagrante retardado ou ação controlada
i) Flagrante cataléptico

 O Presidente da República e Agentes diplomáticos não podem


ser presos em flagrante. Deputados Federais/Senadores, Juízes
de Direito, Membros do MP e Advogados, no exercício da
profissão, somente podem ser presos em flagrante por crimes
inafiançáveis.
 O eleitor, nos 5 dias anteriores e nas 48 horas posteriores ao
encerramento da eleição, só pode ser preso em flagrante e os
candidatos, nos 15 dias anteriores ao pleito. Os membros das
mesas receptoras e fiscais dos partidos, no dia da eleição.

64
Crimes de ação privada A prisão é possível, mas o auto
só pode ser lavrado se o ofendido
requerer.
Crimes de ação penal pública O ato prisional é possível, mas a
condicionada lavratura do auto pressupõe a
prévia representação da vítima.
Infrações de menor potencial Termo Circunstanciado (Assumir
ofensivo o compromisso de ser
imediatamente levado ao JECrim
ou se comprometer dele mesmo
ir.
Homicídio e lesão culposa na Se caso houver prestação de
direção de veículo automotor socorro imediata, a prisão em
flagrante torna-se vedada.
Crimes permanentes A prisão em flagrante pode ser
efetuada enquanto durar a
permanência.
Crimes continuados O flagrante é possível em razão
de cada um dos ilícitos que
constituem a continuidade forem
cometidos.
Crime habitual Possibilidade do flagrante, dês
que a autoridade tenha
constatado a realização de vários
atos que indiquem a
habitualidade.

2.2. Auto de prisão em flagrante


Documento elaborado sob a presidência da autoridade policial, cujo
teor indica a apresentação de pessoa presa em flagrante e no qual
constam as circunstâncias do delito e da prisão.
 Comunicação imediata ao juízo e lavratura e remessa de cópia
a respectiva autoridade, pelo delegado, no prazo de 24 horas.
 Apresentação e narração verbal realizada pelo condutor do
flagrante -> relaxamento ou determinação da lavratura do auto
de prisão em flagrante -> oitiva formal do condutor do
flagrante, colhendo sua assinatura -> entrega do recibo do
preso, caso seja dispensável a sua permanência -> oitiva das
testemunhas (testemunhas de apresentação, art. 304, §2º,
CPP) -> oitiva da vítima -> interrogatório do preso -> lavratura
do auto.
 Respeito as garantias fundamentais do individuo preso.

65
 Necessidade de entrega da nota de culpa
 Ao receber o APF, o Juiz (Audiência de custódia) deve: a)
relaxar a prisão ilegal (ausência de formalidade essencial;
ausência de motivo para prisão em flagrante; atipicidade do
fato e excesso do prazo; b) converter em prisão preventiva,
observando os pressupostos dos arts. 312 e 313 do CPP ou; c)
conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

3. Audiência de custódia.
Momento de apresentação do custodiado ao Poder Judiciário, para
observar os motivos da prisão em flagrante e se existem motivos
para decretação de segregação cautelar. Sua realização deverá
ocorrer no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, conforme a aplicação
da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José
da Costa Rica), no art. 7º, item 5, 1ª parte.
 ADI 5240 (Provimento do TJSP) e ADPF 347 (julgamento da
cautelar)
 Resolução nº. 213/2015.
 Vedação dos agentes policiais responsáveis pela
prisão/investigação.
 Atendimento prévio e reservado por advogado por ela
constituído ou defensor público, sem a presença de agentes
policiais.
 Abstenção de apreciação do mérito.
 Aplicação às prisões cautelares ou definitivas, nos termos da
Resolução nº. 213/2015.
 Previsão expressa na Lei Anticrime (art. 310, CPP).

4. Prisão preventiva.
Modalidade de prisão processual determinada exclusivamente por
autoridade judiciária, e desde que presentes os pressupostos dos
arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal.
 Fumus commissi delicti e periculum libertatis (pressupostos).
 Medida excepcional, tendo em vista a presunção da inocência.
 Necessidade de análise do caso concreto, visto que o
ordenamento jurídico exige adequação e proporcionalidade e
fundamentação suficiente (não pode encampar os argumentos
acusatórios) para o cerceamento da liberdade.
 Decisão interlocutória simples (RESE e HC).
66
 STJ (RHC 75.716/MG) – Necessidade de oitiva da defesa,
quando não ensejar riscos para o sucesso.
 Descumprimento de medidas cautelares; Conversão do
flagrante e demonstração das necessidades no curso do
processo.
 Garantia da ordem pública e/ou da ordem econômica,
conveniência da instrução criminal, garantia da futura aplicação
da lei penal, descumprimento de obrigações impostas por
medidas cautelares aplicadas (fundamentos).
 Crimes dolosos com pena maxima superior a 4 anos;
condenação anterior definitiva por outro crime doloso no prazo
de 5 anos da reincidência; crime resultante de violência
doméstica para garantir a execução de medidas protetivas de
urgência (condições de admissibilidade)
 Dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou insuficiência de
elementos para esclarecimento.
 Indícios de excludentes de ilicitude e pena diversa do
cerceamento de liberdade (vedação).
 Formalidades do mandado (art. 285, CPP).
 Jurisprudência e a estipulação de prazos, em virtude da
impossibilidade de prisão indeterminada. Excesso de prazo em
razão da defesa (Súmula 64/STJ) Entendimento doutrinário:
120/125 dias.
 Término da instrução ficará superada a alegação de
constrangimento ilegal (Súmula 52/STJ).
 Avaliação da razoabilidade e proporcionalidade, caso a caso.
 Prisão preventiva domiciliar (faculdade): arts. 317 e 318, do
CPP. Monitoração eletrônica.
 Lei anticrime: Revisão da prisão preventiva (90 dias),
fundamentação idônea da decisão judicial (art. 315, §2º, CPP)

5. Prisão temporária.
Modalidade de prisão processual, decretada por tempo determinado,
destinada a possibilitar as investigações de crimes graves, durante o
inquérito policial, conforme a Lei Federal nº. 7.960/89.
 Requisitos cumulativos: Crimes do inciso III do art. 1º, e desde
que existam as hipóteses ou do inciso I ou do inciso II.
 Cabimento de RESE.
 Prazo prorrogável (extrema e comprovada necessidade) de 5
dias. 30 dias (Hediondos)

67
6. Medidas cautelares diversas da prisão.
São medidas cautelares a serem avaliadas, a priori e em regra, antes
da decretação de prisão cautelar, cujas situações estão presentes no
art. 319 e 320, CPP.
 Com o advento da Lei Anticrime, as medidas cautelares
não podem ser decretadas de ofício, tendo em vista a
necessidade de requerimento das partes ou
representação da autoridade policial. (art. 282, CPP)
 Além disso, existe previsão expressa, de intimação da
parte contrária, para se manifestar em 5 (cinco) dias,
para oitiva da outra parte, ressalvada os casos de
urgência ou perigo de ineficácia da medida.
 A prisão preventiva só pode ser decretada, após análise
individualizada do não cabimento das medidas
cautelares.
 Necessidade de reavaliação (CNJ)
 Fiança: direito do réu, que lhe permite mediante caução e
cumprimento de certas obrigações, ficar em liberdade durante o
processo, desde que preenchidos os pressupostos.
 Autoridade Policial: pena máxima igual ou inferior a 4 anos.
 Art. 322 e seguintes, do CPP.
 Crimes inafiançáveis (art. 323, CPP)
 Situações inafiançáveis (art. 324, CPP).
 Monitoração eletrônica.

_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema

68
Aula 11
Assunto: Questões e processos incidentes

69
70
71
_______________________________________________________
* conteúdo de direcionamento para estudos, com caráter
complementar. Recomenda-se a utilização de obras jurídicas
relacionadas ao tema

72

Você também pode gostar