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MAGF

Magistratura Federal

CURSO EXTENSIVO

Direito Processual Penal


Ação penal

MATERIAL DE APOIO

coordenadores:

Márcio André Lopes Cavalcante


Luís Felipe Pimentel da Costa
1. CONCEITO

É o direito do Estado-acusação ou do ofendido de pedir ao Estado-juiz a prestação


jurisdicional, consistente na aplicação das normas de direito penal ao caso concreto. Em essência,
a ação penal possui natureza jurídica de:

a) Direito público: é exercida contra o Estado.

b) Subjetivo: é titularizada pelo Ministério Público ou pelo ofendido.

c) Abstrato: independe do resultado do processo penal.

d) Autônomo: independe do direito material, sendo preexistente ao direito de punir.

e) Instrumental: é meio para se permitir o exercício do direito de punir.

O fundamento constitucional do direito de ação está no art. 5º, XXXV, da CF/88: “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, que consagra o princípio da
inafastabilidade da jurisdição.

Tal princípio importa no poder-dever do Estado de dizer o direito. É poder, porque o Poder 1
Judiciário tem monopólio de dizer o direito, sendo a autotutela, em regra, vedada. Como exceções à
regra têm-se a legítima defesa e o estado de necessidade.

É dever, porque o órgão jurisdicional não pode se abster de solucionar o conflito.

Além disso, vale dizer que, uma vez inerte o órgão ministerial na propositura da ação penal,
o ofendido toma para si o direito de, por conta própria, provocar o Poder Judiciário (ação penal
privada subsidiária da pública).

2. CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL

As condições da ação consistem em requisitos mínimos necessários ao julgamento de mérito


da ação penal. A consequência da ausência de uma das condições da ação penal depende do
momento em que for verificada:

a) No juízo de admissibilidade da peça acusatória: causa de rejeição da denúncia (art.


395, II, CPP). Se ausentes as condições da ação, a denúncia/queixa (petição inicial do processo
penal) não deve ser recebida.

b) No curso do processo
1ª corrente – Com base no art. 564, II, do CPP, há doutrinadores que defendem a nulidade
absoluta do processo, com base no art. 564, II, do CPP, que, embora se refira à legitimidade da parte,
aplicar-se-ia às demais condições da ação.

2ª corrente – O processo deve ser extinto sem julgamento do mérito, de acordo com a
aplicação analógica da teoria eclética de Liebman adotada pelo Código de Processo Civil.

3ª corrente – Ultrapassado o juízo de admissibilidade da peça acusatória, ausente qualquer


condição da ação, a consequência seria, mesmo assim, o julgamento do mérito da ação, com a
consequente condenação/absolvição do réu. Segundo Nestor Távora, “o momento oportuno para a
discussão acerca das condições da ação seria o da admissibilidade da inicial. Superada esta fase,
resta ao magistrado o enfrentamento meritório.”.

A doutrina majoritária transita pela defesa de uma das duas últimas correntes.

As condições da ação podem ser genéricas (presentes em qualquer ação penal) e


específicas (presentes apenas em algumas espécies de ação penal).

2.1. CONDIÇÕES GENÉRICAS


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A. LEGITIMIDADE DA PARTE

É a pertinência subjetiva da ação, que deve ser estudada sob dois aspectos, a legitimidade
ativa (quem pode ocupar o polo ativo da ação penal) e a legitimidade passiva (quem pode ocupar o
polo passivo).

A legitimidade ativa é estabelecida conforme a natureza da infração. Assim, se o crime for de


ação penal pública, a legitimidade, por força do art. 129, inciso I, da CF/88, será do Ministério Público.
Entretanto, se o crime for de ação penal privada, a legitimidade será do ofendido ou do seu
representante legal.

A legitimidade passiva recai sobre o suposto autor do fato delituoso. O fato de a pessoa se
dizer inocente é questão de mérito, e não de processo. Exemplo de ilegitimidade passiva: acusa-se
uma pessoa que tem o mesmo nome (homônimo) do verdadeiro autor do fato; falsa identidade
(alguém é detido pela prática de um crime, mas descobre-se que outra pessoa estava usando sua
identidade); denúncia oferecida contra uma testemunha.

Outros aspectos importantes sobre a legitimidade ad causam:

→ Legitimidade da pessoa jurídica no processo penal


Ativa: a pessoa jurídica pode oferecer queixa-crime, pois ela é dotada de honra objetiva, logo,
pode ser vítima de crimes contra a honra, a exemplo da difamação.

Passiva: o ordenamento jurídico brasileiro admite a responsabilidade penal da pessoa


jurídica no que se que refere a crimes ambientais.

→ Legitimação concorrente

Ocorre quando dois ou mais órgãos ou agentes estão igualmente legitimados para figurar no
polo ativo da demanda. São exemplos de legitimação concorrente: ação penal privada subsidiária da
pública (art. 29 do CPP) e ação penal em crime contra a honra praticado contra funcionário público
no exercício de suas funções (Súmula n. 714 do STF).

B. INTERESSE DE AGIR

O interesse de agir abrange a necessidade, adequação e utilidade. O grande desafio consiste


em aplicar esse trinômio ao processo penal.

A necessidade é sempre presumida no processo penal, pois não há pena sem processo.
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A adequação não tem tamanha relevância no processo penal, pois não há diferentes
espécies de ação penal condenatória. Cuidado, por outro lado, com as ações penais não
condenatórias, nas quais a adequação ganha maior importância. Exemplo disso verifica-se no
cabimento apenas de mandado de segurança (e não de habeas corpus) em caso de condenação por
pena de multa ou se a infração penal apenas prever pena pecuniária (Súmula 693 do STF).

A utilidade é a eficácia da atividade jurisdicional em relação à possibilidade de satisfazer o


interesse do autor. Nesse aspecto, vale a análise da chamada prescrição em perspectiva (virtual ou
hipotética), que consiste no reconhecimento antecipado da prescrição, em virtude da constatação de
que, no caso de possível condenação, dar-se-á a prescrição da pretensão punitiva retroativa. Ela
não tem previsão legal, porém, olhando para o futuro, antevê-se que haverá prescrição, o que justifica
o seu reconhecimento de forma antecipada.

Súmula 438/STJ: "É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com
fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal".

C. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO

Para que se possa invocar do Estado a aplicação da pena, é preciso que o fato narrado na
denúncia ou queixa seja um fato típico, isto é, uma conduta definida em lei como sendo um ilícito
penal. Nesse sentido o teor do inc. III, do art. 397, do CPP, ao dispor que o juiz absolverá
sumariamente o acusado se o fato narrado não constitui crime. De sorte que, se o fato é atípico e,
apesar disso, se formula uma acusação, a ação penal conterá um pedido juridicamente impossível
e, por consequência, deverá ser rejeitada. Como exemplo poderia ser mencionado uma queixa-crime
ofertada pela prática de adultério (art. 240 do CP), sabidamente revogado pela Lei nº 11.106/2005,
tornando essa conduta um indiferente penal.

D. JUSTA CAUSA

Até a Lei n. 11.719/08, a doutrina afirmava que a justa causa não era uma condição autônoma
da ação, estando inserida no interesse de agir.

Após o advento de referida lei, o art. 395, inciso III, do CPP passou a tratar a justa causa
como condição autônoma da ação, consistente no suporte probatório mínimo para o oferecimento da
ação penal (indícios suficientes de autoria e prova da materialidade do delito).

Vale lembrar que o inquérito policial não é indispensável à propositura de ação penal,
mas denúncia desacompanhada de um mínimo de prova do fato e da autoria é denúncia sem justa
causa. 4
2.2. CONDIÇÕES ESPECÍFICAS

São condições exigidas expressamente pela lei para que o Ministério Público possa oferecer
a denúncia. Trata-se de condições de procedibilidade, consistentes na representação do ofendido
e na requisição do Ministro da Justiça, ambas indispensáveis ao oferecimento da ação penal
pública condicionada.

Alguns doutrinadores elencam as condições objetivas de punibilidade como condições


específicas da ação penal. Todavia, é importante frisar que as condições objetivas de punibilidade
estão ligadas ao direito material. Por outro lado, as condições de procedibilidade referem-se a
requisitos necessários à instauração da persecução penal.

Exemplos de condições objetivas de punibilidade: sentença anulatória do casamento, no


crime de induzimento a erro ao matrimônio (art. 236, CP); ingresso no país, do autor de crime
praticado no estrangeiro (art. 7º, §§2º, “a” e “b”, e 3º, CP); declaração da procedência da acusação,
pela Câmara dos Deputados, no julgamento do Presidente da República (art. 86, CF); a sentença
que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou extrajudicial, nas infrações falimentares
(art. 180, Lei 11.101/05).
3. CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS

3.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA

O titular da ação penal pública é o Ministério Público, nos termos do art. 129, inciso I, da
CF/8819.

ATENÇÃO!
De acordo com o art. 24, §2º, do CPP, seja qual for o crime, quando praticado em detrimento do patrimônio
ou interesse da União, Estado e Município, a ação penal será pública.

A peça acusatória é a denúncia. Divide-se em:

A. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA

A atuação do Ministério Público não depende do cumprimento de qualquer condição, tais


como a representação e a requisição. É a regra no ordenamento jurídico, salvo disposição legal em
contrário. Assim, se não houver indicação no Código sobre a espécie de ação penal, considera-se
que o crime é de ação penal pública incondicionada.
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FCC, PGM/Campinas, 2016: Nos crimes de licitações, a ação penal é pública incondicionada porque cabe
ao Ministério Público promovê-la independentemente de provocação.

B. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA

A atuação do Ministério Público depende de representação do ofendido ou de requisição do


Ministro da Justiça.

3.2. AÇÃO PENAL PRIVADA

O titular da ação penal de iniciativa privada é o ofendido ou seu representante legal. A peça
acusatória é a queixa-crime (da mesma forma que a denúncia, deve ser apresentada junto ao Poder
Judiciário e não à autoridade policial). Existem três espécies:

A. AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA

O direito de queixa só pode ser exercido pelo ofendido. O representante legal não pode
exercer esse direito e não haverá sucessão processual. Exemplo: art. 236 do CP (induzimento a erro
essencial e ocultação de impedimento).
Na ação penal privada personalíssima, a morte da vítima extingue a punibilidade? Sabe-
se que a morte do acusado extingue a punibilidade. Quanto à morte da vítima, tratando-se de ação
penal privada personalíssima, não haverá sucessão processual. Se a vítima morre, o seu direito
morre com ela, razão pela qual, nessa hipótese excepcional, advirá a extinção da punibilidade do
acusado.

B. AÇÃO PENAL EXCLUSIVAMENTE PRIVADA

Se o ofendido for incapaz, seu direito será exercido por meio do seu representante legal. Além
disso, é plenamente possível a sucessão processual. Exemplos: dano; crimes contra a honra.

C. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA

Esse tipo de ação penal só é cabível diante da inércia do Ministério Público. Ela funciona
como importante instrumento de controle da atividade exercida pelo MP.

4. AÇÃO PENAL PÚBLICA

4.1. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PÚBLICA


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a) Princípio da inércia da jurisdição: ao juiz não é dado iniciar, de ofício, um processo penal
condenatório. Visa a preservar a imparcialidade do magistrado e, portanto, o sistema acusatório.

ATENÇÃO!
O “processo judicialiforme”, instaurado através do auto de prisão em flagrante ou portaria do delegado ou do
juiz, com previsão no art. 26 do CPP, não foi recepcionado pela CF/88.

Cuidado! A ordem de habeas corpus pode ser concedida de ofício pelo magistrado (art. 654, §2º, CPP).

b) Princípio do ne bis in idem processual: ninguém pode ser processado duas vezes pela
mesma imputação, ou seja, pelo mesmo fato delituoso. Encontra-se previsto expressamente no
Pacto de São José da Costa Rica, art. 8º, §4º.

c) Princípio da intranscendência: a peça acusatória só pode ser oferecida em face do autor


ou partícipe do fato delituoso. Deriva do princípio da pessoalidade ou personalidade da pena (art. 5º,
XLV, CF/88).

d) Princípio da obrigatoriedade: também conhecido como princípio da legalidade


processual. Presentes as condições da ação penal, o MP é obrigado a oferecer denúncia na ação
penal pública incondicionada. Segundo a doutrina, esse princípio pode ser extraído do art. 24 do
CPP. Podemos dizer, ainda, que existe um mecanismo de controle do princípio da obrigatoriedade,
qual seja, a providência prevista no art. 28 do CPP (“princípio da devolução”). Existem exceções ao
princípio da obrigatoriedade? Sim, algumas delas são:

1. Transação penal (art. 76, Lei 9.099/9529): acordo entre o MP e o autor do delito; se este
aceitar, cumprirá uma medida equivalente a multa ou a pena restritiva de direitos, e o promotor
deixará de oferecer denúncia contra ele. Diz a doutrina que, nesse caso, aplica-se o princípio da
discricionariedade regrada (ou da obrigatoriedade mitigada).

2. Colaboração premiada: outra exceção pode ser encontrada na Lei n° 12.850/2013, de


combate à criminalidade organizada, que, em seu art. 4°, § 4°, prevê a possibilidade de o Ministério
Público deixar de oferecer denúncia em relação àquele “que tenha colaborado efetiva e
voluntariamente com a investigação e com o processo criminal”. Para tanto, é preciso que esse
colaborador não seja o líder da organização criminosa e que tenha sido ele o primeiro a prestar essa
colaboração, nos termos dos incisos I e II do mencionado dispositivo. Trata-se de faculdade
concedida ao parquet, como se infere do emprego do vocábulo “poderá”, lançado no texto legal e
que se sujeita ao controle do art. 28 do CPP, aqui aplicado por analogia, caso o juiz discorde do ato
do Ministério Público consistente em não ofertar a denúncia. 7
3. Acordo de não persecução penal: se não for o caso de arquivamento, o Ministério Público
pode propor o acordo de não persecução penal, quando, cominada pena mínima inferior a 4 (quatro)
anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça a pessoa, o investigado tiver
confessado formal e circunstanciadamente a sua prática, mediante as seguintes condições,
ajustadas cumulativa ou alternativamente: I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo
impossibilidade de fazê-lo; II – renunciar voluntariamente a bens e direitos, indicados pelo Ministério
Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; III – prestar serviço à comunidade ou a
entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito, diminuída de um
a dois terços, em local a ser indicado pelo Ministério Público; IV – pagar prestação pecuniária, a ser
estipulada nos termos do art. 45 do Código Penal, a entidade pública ou de interesse social a ser
indicada pelo Ministério Público, devendo a prestação ser destinada preferencialmente àquelas
entidades que tenham como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos
aparentemente lesados pelo delito; V – cumprir outra condição estipulada pelo Ministério Público,
desde que proporcional e compatível com a infração penal aparentemente praticada.

4. Acordo de Leniência: espécie de colaboração premiada nos crimes contra a ordem


econômica. Também chamado de “acordo de brandura” ou “acordo de doçura”.
e) Princípio da indisponibilidade (ou indesistibilidade): o Ministério Público não pode
dispor do processo em andamento. Trata-se de desdobramento lógico do princípio da
obrigatoriedade. A diferença é que este se aplica antes do início do processo, enquanto o princípio
da indisponibilidade é aplicável durante o curso do processo. O MP não pode desistir da ação penal
instaurada (art. 42 do CPP), nem pode desistir do recurso interposto (art. 576 do CPP), embora possa
não interpor recurso. A exceção a esse princípio é a suspensão condicional do processo (art.
89, Lei 9.099/95).

f) Princípio da divisibilidade: a doutrina não é unânime em relação a este aspecto, parte


apontando a divisibilidade como um dos princípios da ação penal pública e parte ensinando que
vigora, ao contrário, o princípio da indivisibilidade. Pela primeira orientação, a ação penal pode ser
dividida, não sendo vedado o desmembramento do processo. Assim, por exemplo, nada impede que
oferecida a denúncia contra um indiciado, posteriormente seja ela aditada, para incluir um coautor.
Ou que, após proferida a sentença contra um réu, seja o coautor do crime, até então não identificado,
processado posteriormente pelo mesmo fato. Ou ainda que, por conveniência da instrução criminal,
seja desmembrado o processo (art. 80 do CPP). É o entendimento que prevalece no STF. Já a
segunda orientação é no sentido de que vigora a indivisibilidade da ação penal pública, já que,
praticado o crime e identificados seus autores, o Ministério Público deve processar a todos, como 8
verdadeiro desdobramento lógico do princípio da obrigatoriedade. É a lição de Afranio Silva Jardim
(Direito Processual Penal, Rio de Janeiro: Forense, 8ª. ed., p. 294 e Hélio Tornaghi, Instituições de
Processo Penal, São Paulo: Saraiva, 1977, 2ª., Ed., vol. 2°, p. 357).

4.2. REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO

A. CONCEITO

A representação do ofendido é uma condição de procedibilidade para o exercício da ação


penal pública, que consiste em uma modalidade de delatio criminis postulatória. Por meio dela, o
ofendido não só informa a prática do crime, como postula a instauração da persecução penal.

Embora a representação seja condição de procedibilidade da ação penal, nem mesmo o


inquérito policial pode ser iniciado se não houver representação por parte do ofendido ou de seu
representante legal.

Na representação, vigora o princípio da oportunidade ou conveniência, ou seja, ninguém é


obrigado a oferecer representação. Assim sendo, observe:

AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA → OBRIGATORIEDADE


AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO → OPORTUNIDADE

B. PRAZO PARA OFERECIMENTO

A representação deve ser oferecida no prazo decadencial de 6 (seis) meses, contado do


conhecimento da autoria (art. 38 do CPP), in verbis:

Art. 38.  Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de


queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que
vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para
o oferecimento da denúncia.

Parágrafo único.  Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro do mesmo


prazo, nos casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31.

Com efeito, a decadência é a perda do direito de ação penal privada ou de representação,


em virtude do seu não exercício no prazo legal. Por isso, a decadência funciona como causa extintiva
da punibilidade.

Como visto, a regra da decadência para representação é de 6 meses. A exceção fica por
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conta do crime do art. 236 do Código Penal (induzimento a erro essencial e ocultação de
impedimento). De acordo com o parágrafo único do referido dispositivo, o prazo só vai começar a
fluir a partir do trânsito em julgado da decisão que anular o casamento.

Art. 236 - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe
impedimento que não seja casamento anterior:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos.

Parágrafo único - A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser
intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou
impedimento, anule o casamento.

Como é feita a contagem do prazo decadencial? Se a decadência é causa extintiva de


punibilidade, possui natureza penal, razão pela qual deve obedecer à norma do art. 10 do Código
Penal. Em outras palavras, o dia do início deve ser computado e o último dia deve ser excluído.

C. LEGITIMIDADE E CAPACIDADE PARA OFERECIMENTO

A representação pode ser oferecida pelo ofendido com 18 anos completos ou mais (art. 5º,
Código Civil). Vale dizer que tanto o art. 34 do CPP quanto, para este efeito, a Súmula 594 do STF
estão ultrapassados, na medida em que, a partir dos 18 anos, a pessoa é plenamente capaz. Por
essa razão, não há necessidade de curador para o menor de 21 anos.

Art. 34. Se o ofendido for menor de 21 e maior de 18 anos, o direito de queixa poderá ser exercido por
ele ou por seu representante legal.

Súmula 594. Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos, independentemente, pelo
ofendido ou por seu representante legal.

Mas, sob outro aspecto, ainda pode ser possível invocar a súmula 594. Suponha-se um crime
perpetrado quando a vítima contava 15 anos de idade, sem capacidade, porque incapaz, de ingressar
com a queixa ou a representação. A legitimidade para fazê-lo, nesse caso, era de seu representante
legal que, porém, quedou-se inerte, deixando transcorrer o prazo decadencial de seis meses. Indaga-
se, então: atingindo a plena capacidade, ao completar 18 anos de idade, poderá o ofendido ajuizar
queixa-crime ou ofertar representação? Divide-se a doutrina.

Parte dela responde negativamente à indagação. Sustenta que o prazo decadencial é um


só e que, portanto, se o representante legal da vítima, ao tempo em que ela contava 15 anos, tinha
conhecimento da autoria do crime, mas deixou transcorrer in albis o prazo decadencial, não há que
se cogitar a inauguração de um segundo prazo, agora para o ofendido, quando ele atingir a plena 10
capacidade aos 18 anos.

Outra corrente doutrinária entende que são dois os prazos: o primeiro conferido ao
representante legal enquanto a vítima não completar 18 anos e, um segundo, concedido a esta
última, ao atingir a maioridade. Há quem sustente esta segunda solução porque, afinal, antes de
completar 18 anos a vítima não possuía legitimidade para o exercício da ação penal e, portanto, não
há que se falar na perda de um direito, pela decadência, da qual ela não era titular. É dizer: se a
vítima estava impedida de exercer um direito, não pode ser penalizada com o reconhecimento da
decadência, que importa exatamente em uma sanção aplicada ao inerte. Nesta esteira, se a súmula
594 não tem mais aplicação no que se refere ao art. 34 do CPP, continua válida para enfrentar a
indagação aqui proposta.

E se o incapaz não possuir representante legal? Nesse caso, a lei prevê a nomeação de
curador especial pelo juiz (art. 33 do CPP). Ressalte-se que o curador especial não é obrigado a
oferecer queixa. A ele cabe proceder ao juízo de conveniência e oportunidade sobre o assunto.

Isso também se aplica à ação penal privada (direito de oferecer queixa).


FCC, TJ PI, 2015: Sobre a ação penal, é correto afirmar: Na ação penal privada, se o ofendido for
mentalmente enfermo e não tiver representante legal o direito de queixa poderá ser exercido por curador
especial nomeado de ofício pelo juiz competente.

Destaque-se que a emancipação não confere à vítima capacidade para oferecer


representação ou queixa-crime. O problema é que essa pessoa funciona como um “incapaz”, porém
não tem representante legal (já que é emancipado). A doutrina trabalha com duas soluções: 1)
nomeação de curador especial; 2) aguarda-se que a vítima complete 18 anos (até lá, não haverá
decadência).

Em caso de morte do ofendido, ocorrerá a chamada sucessão processual. O direito de


oferecer a representação será transmitido ao cônjuge/companheiro, ascendente, descendente e
irmão (art. 31 do CPP – C.A.D.I). Essa ordem é preferencial.

D. DESTINATÁRIOS

A representação pode ser oferecida à autoridade policial, ao juiz ou ao Ministério Público. É


importante frisar que a representação jamais obrigará o Ministério Público a oferecer denúncia. O
órgão ministerial somente oferecerá denúncia se houver justa causa para tanto. 11
E. AUSÊNCIA DE FORMALISMO

A posição consolidada na jurisprudência é a de que não há necessidade de formalismo. A


representação pode ser escrita ou oral, contanto que revele, de modo inequívoco, a intenção de
instaurar a persecução penal contra seu ofensor.

F. RETRATAÇÃO

A retratação significa “voltar atrás”, ou seja, arrepender-se de um direito que foi exercido. De
acordo com o CPP, a retratação da representação é possível até oferecimento da denúncia (≠
recebimento). É o que dispõe o seu art. 25 do CPP:

Art. 25. A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.

Cumpre atentar ao disposto no art. 16 da Lei Maria da Penha (11.343/06):

Art. 16.  Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata
esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência
especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido
o Ministério Público.
Logo, a retratação da representação nos crimes praticados mediante violência doméstica e
familiar contra a mulher pode ser feita até o recebimento da denúncia. Cuidado! Há doutrinadores
que reproduzem esse dispositivo, porém não atentam para um detalhe. O art. 16 da Lei 11.340/06
não fala em retratação, mas em “renúncia”. Ocorre que, quando alguém renuncia, está-se abrindo
mão de um direito que ainda não foi exercido. Ora, mas se a denúncia foi recebida, como diz a norma,
é porque o MP já a ofereceu, o que somente pode ser feito se a vítima tiver representado
anteriormente. Assim, podemos concluir que a “renúncia” a que se refere o art. 16, em verdade, é
uma retratação. Ressalte-se, ainda, que esta retratação não pode se dar de qualquer forma, mas
somente perante o juiz, em audiência especialmente designada para essa finalidade.

Vale dizer que a retratação pode ser expressa ou tácita.

É possível que haja retratação da retratação da representação?

Em um primeiro momento, a vítima representou. Logo depois, a vítima se arrependeu de ter


representado, mas, em seguida, arrependeu-se de novo e quis representar. A maioria da doutrina
entende que isso é possível, desde que ocorra antes do prazo decadencial.

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CESPE, TJDFT, 2013: Uma vez apresentada, a representação de crime de ação penal pública somente pode
ser retirada antes do oferecimento da denúncia, não se admitindo retratação da retratação.
ERRADO

G. EFICÁCIA OBJETIVA DA REPRESENTAÇÃO

Feita a representação em relação a um delito, o Ministério Público é livre para oferecer


denúncia contra todos os coautores e partícipes (lembre-se: ação penal é pública).

Por outro lado, feita a representação em relação a apenas um delito, o MP não pode oferecer
denúncia em relação a outros crimes que não foram objeto de representação. Nesse caso, se algum
crime não foi objeto de representação, deve o MP provocar o chamamento da vítima para manifestar
o seu interesse na persecução penal.

4.3. REQUISIÇÃO DO MINISTRO DA JUSTIÇA

A. CONCEITO
É ato de conveniência política, a cargo do Ministro da Justiça, autorizando a persecução penal
nas infrações que a exijam. Essa requisição está sujeita à discricionariedade (conveniência e
oportunidade) do Ministro da Justiça.

B. PRAZO PARA OFERECIMENTO

No silêncio da lei, não há prazo para formulá-la. Logo, a requisição não está sujeita à
decadência, podendo ser ofertada a qualquer tempo, enquanto a punibilidade não for extinta.

C. DESTINATÁRIO

Deve ser dirigida ao Ministério Público, na figura de seu chefe.

D. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A palavra “requisição”, neste ponto, não é sinônimo de “ordem”, uma vez que o Ministério
Público continua sendo o titular da ação penal pública. Assim, por mais que o Ministro da Justiça
tenha apresentado a requisição, o MP não é obrigado a oferecer denúncia se entender que não
houve crime.
13
E. RETRATAÇÃO

A maioria da doutrina entende que é possível a retratação da requisição por parte do Ministro
da Justiça, que deve ser feita até o oferecimento da denúncia (Luiz Flávio Gomes). Ressalte-se,
contudo, que não se trata de posição francamente pacífica, pois há também forte entendimento no
sentido de que não cabe retratação da requisição, por ausência de previsão legal, além de ser um
ato de natureza política que exige serenidade e ponderação antes de ser exercido (Tourinho Filho).

F. EFICÁCIA OBJETIVA DA REQUISIÇÃO

Assim como na representação, prevalece o entendimento segundo o qual a requisição


ministerial também goza de eficácia objetiva, ou seja, se não forem contemplados todos os
criminosos, poderá o MP, de pronto, denunciar os que não foram inicialmente enquadrados, sem a
necessidade de aditamento pelo Ministro da Justiça. Por outro lado, feita a requisição em relação a
apenas um delito, o MP não pode oferecer denúncia em relação a outros crimes que não foram objeto
de requisição.

5. AÇÃO PENAL PRIVADA

5.1. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PRIVADA


a) Princípio da inércia da jurisdição: ao juiz não é dado iniciar, de ofício, um processo penal
condenatório. Visa preservar a imparcialidade do magistrado e, portanto, o sistema acusatório.

b) Princípio do ne bis idem processual: ninguém pode ser processado duas vezes pela
mesma imputação, ou seja, pelo mesmo fato delituoso. Encontra-se previsto expressamente no
Pacto San José da Costa Rica, art. 8º, §4º.

c) Princípio da intranscendência: a peça acusatória só pode ser oferecida em face do


suposto autor ou partícipe do fato delituoso. Deriva do princípio da pessoalidade ou personalidade
da pena (art. 5º, XLV, CF/88).

d) Princípio da oportunidade ou conveniência: mediante critérios próprios de oportunidade


ou conveniência, cabe ao ofendido optar pelo oferecimento ou não da queixa-crime. Esse princípio
é aplicável antes do início do processo. Caso o ofendido não tenha interesse em exercer o direito de
queixa, poderá: deixar correr o prazo decadencial (6 meses) OU renunciar ao direito de queixa.

e) Princípio da disponibilidade: desdobramento lógico do princípio da oportunidade ou


conveniência. A diferença é que o princípio da disponibilidade é aplicável durante o curso do
processo. Significa dizer que o querelante pode dispor do processo em andamento. Assim, da 14
mesma forma que não é obrigado a oferecer a queixa-crime, pode desistir do processo em curso.
Formas de disposição do processo: perempção (negligência do querelante); perdão do ofendido
(depende de aceitação); reconciliação e desistência do processo no procedimento especial dos
crimes contra a honra de competência do juiz singular (art. 522 do CPP).

f) Princípio da indivisibilidade: o processo de um dos coautores ou partícipes obriga ao


processo de todos. A aplicação desse princípio traz algumas consequências: (i) a renúncia concedida
a um dos agentes estende-se aos demais; (ii) o perdão concedido a um dos agentes estende-se aos
demais, mas desde que haja aceitação.

A fiscalização do princípio da indivisibilidade cabe ao Ministério Público (art. 48 do CPP). E


como ocorre essa fiscalização? Sabe-se que o MP não pode fazer o aditamento, pois este só cabe
ao querelante. Logo, o MP deve instar a parte para que proceda ao devido aditamento. Como o MP
não possui legitimidade ativa nos crimes de ação penal privada, existem duas possibilidades:

1. Verificando-se que a omissão do querelante foi voluntária, ou seja, o querelante ofereceu


queixa contra apenas um dos coautores, apesar de ter consciência quanto ao envolvimento de
outros, deve ser reconhecida a renúncia tácita em relação àqueles que não foram incluídos na peça
acusatória, renúncia esta que se estende aos demais, em virtude do princípio da indivisibilidade.
2. Verificando-se que a omissão do querelante não foi voluntária, deve o MP requerer a
intimação do querelante para incluir os demais coatores ou partícipes. Se o querelante permanecer
inerte, há de se reconhecer renúncia tácita, que se estende a todos os coautores do delito.

5.2. RENÚNCIA

A renúncia é o ato unilateral e voluntário por meio do qual o ofendido abre mão do seu direito
de queixa. Não é necessário, portanto, ouvir o acusado, pois não depende de sua concordância.

Quanto à natureza jurídica da renúncia, temos que ela funciona como causa extintiva da
punibilidade (art. 107, inciso V, do CP), mas apenas nos casos de ação penal exclusivamente privada
e ação penal privada personalíssima. A renúncia não atinge a ação penal privada subsidiária da
pública, pois ela, na sua essência, tem natureza pública. Assim, ainda que a vítima não queira exercer
o seu direito a propor a ação penal subsidiária, não haverá extinção da punibilidade, pois o Ministério
pode oferecer a denúncia a qualquer tempo.

Observação!
Segundo Rogério Sanches, não obstante a renúncia seja instituto próprio da ação penal privada,
excepcionalmente, cabe também renúncia na ação penal pública condicionada à representação, desde que 15
a infração seja de menor potencial ofensivo (art. 74, p. único, da Lei 9.099/95). É que nesses casos há
disciplina própria na Lei nº 9.099/95 estabelecendo que o acordo homologado entre o agente e o ofendido
(composição civil dos danos) acarreta a renúncia do direito de queixa e de representação.

A renúncia, ainda, está ligada ao princípio da oportunidade ou conveniência. Já vimos que,


na ação penal privada, o ofendido não está obrigado a iniciar a persecução penal.
Consequentemente, a renúncia deve ser feita antes do início do processo, no momento pré-
processual.

Quanto ao modo de exercício da renúncia, diz a doutrina que ela pode ser tácita ou expressa.
Renúncia expressa: é aquela feita através de uma declaração inequívoca, ou seja, o ofendido declara
de maneira inequívoca (sem qualquer dúvida) que está abrindo mão do direito de queixa. Renúncia
tácita: vislumbra-se quando o ofendido pratica um ato incompatível com a vontade de processar. Ex.:
a vítima convida o agente para ser padrinho do seu casamento.

O recebimento de dinheiro a título indenizatório pelo ofendido significa renúncia ao direito de


queixa? Lembre-se que, no âmbito do CP, o recebimento de indenização não importa renúncia tácita
(ex.: art. 104, p. único, do CP). No âmbito dos Juizados, por sua vez, a composição civil dos danos
acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação (art. 74, p. único, da Lei 9.099/95).
Por fim, cumpre destacar a incidência do princípio da indivisibilidade, pelo qual a renúncia
concedida a um dos coautores estende-se aos demais. Ressalte-se, entretanto, que, na hipótese
de duas vítimas, a renúncia de uma não prejudica a outra, pois cada qual possui direitos
autônomos. Além disso, em caso de morte da vítima, a renúncia do direito de queixa por parte de
um dos seus sucessores não impede a propositura da ação penal pelos demais, respeitado o prazo
legal.

5.3. PERDÃO DO OFENDIDO

Trata-se de um ato bilateral e voluntário por meio do qual o querelante perdoa o acusado,
acarretando a extinção do processo. Ao contrário da renúncia, o perdão é um ato bilateral, o que
significa dizer que depende de aceitação.

Pode ser que o acusado não aceite o perdão, pois deseja ver proclamada a sua inocência.
Ressalte-se, entretanto, que o fato de o acusado aceitar o perdão não significa que ele está admitindo
que é culpado.

É correto dizer, então, que o perdão extingue a punibilidade? Não. Conforme o art. 107,
V, do CP, a aceitação do perdão é que extingue a punibilidade, justamente porque se trata de ato 16
bilateral.

Apenas é válido nos casos de ação penal exclusivamente privada e ação penal privada
personalíssima. Não se aplica aos casos de ação penal privada subsidiária da pública pelos mesmos
motivos acima expostos.

Destaque-se que o perdão do ofendido não se confunde com o perdão judicial (ex.: art. 121,
§5º, do CP). Este último, inclusive, é concedido pelo juiz e não pelo ofendido.

O perdão do ofendido está ligado ao princípio da disponibilidade, ou seja, o ofendido pode


dispor do processo durante o seu curso, do que se conclui que o perdão só pode ser concedido
durante o curso do processo, até o trânsito em julgado de sentença condenatória. De toda sorte, ela
pode se dar no bojo dos próprios autos ou extraprocessualmente (ex.: cartório), nos temos do art.
106 do CP.

Quanto ao modo de exercício, o perdão pode ser concedido de maneira expressa (declaração
inequívoca) ou tácita (prática de ato incompatível com a vontade de processar). Vale dizer que, aqui,
a aceitação também pode ser expressa ou tácita; a própria lei prevê, inclusive, que o silêncio do
acusado implica a aceitação tácita (art. 58 do CPP).
Por fim, também se aplica ao perdão o princípio da indivisibilidade, de modo que o perdão
concedido a um dos coautores estende-se aos demais, desde que haja aceitação. Se um dos
coautores não aceitar o perdão, o processo irá prosseguir com relação a ele. Ademais, o perdão
concedido por um dos ofendidos não prejudica os demais, pois eles possuem direitos autônomos.

RENÚNCIA PERDÃO

Conceito: ato unilateral e voluntário por meio do Conceito: ato bilateral e voluntário por meio do qual o
qual o ofendido abre mão do seu direito de querelante perdoa o acusado, acarretando a extinção do
queixa. processo.

Natureza jurídica: causa extintiva da Natureza jurídica: com sua aceitação, é causa extintiva
punibilidade (ação penal exclusivamente privada da punibilidade (ação penal exclusivamente privada e
e ação penal privada personalíssima). ação penal privada personalíssima).

Princípio da oportunidade ou conveniência (a Princípio da disponibilidade (só pode ser concedido


renúncia é pré-processual, ou seja, só pode ser durante o curso do processo, até o trânsito em julgado 17
feita antes do início do processo). de sentença condenatória).

Ato unilateral (não depende de aceitação). Ato bilateral (depende de aceitação).

Renúncia expressa (declaração inequívoca) ou


Perdão expresso (declaração inequívoca) ou tácito
tácita (prática de ato incompatível com a vontade
(prática de ato incompatível com a vontade de processar).
de processar).

Recebimento de indenização pelo ofendido:

Aceitação tácita ou expressa. O silêncio do acusado


CPP: não importa renúncia tácita;
implica a aceitação tácita (art. 58 do CPP).

Juizados: importa renúncia tácita.

Princípio da indivisibilidade (a renúncia com Princípio da indivisibilidade (o perdão concedido a um


relação a um dos coautores estende-se aos dos coautores estende-se aos demais, mas desde que
demais). haja aceitação).

5.4. PEREMPÇÃO
A perempção corresponde à perda do direito de prosseguir no exercício da ação penal privada
em virtude da negligência do querelante (ou dos sucessores). Perceba que o direito de queixa já foi
exercido, mas, durante o processo, o ofendido mostrou-se negligente, razão pela qual a própria lei o
pune com a perempção.

Destaque-se que a perempção não se confunde com a decadência. A perempção é a perda


do direito de prosseguir; a decadência, por sua vez, é a perda do direito de dar início ao processo
em crime de ação penal privada.

Assim como a renúncia e o perdão, a perempção também funciona como causa extintiva da
punibilidade (art. 107, inciso IV, do CP), mas apenas na ação penal exclusivamente privada e na
ação penal privada personalíssima. Não se aplica à ação penal privada subsidiária da pública,
pois, neste caso, ocorrendo a negligência do ofendido, caberá ao Ministério Público retomar
o processo como parte principal.

São causas de perempção (art. 60 do CPP):

a) O querelante deixa de promover o andamento do processo durante 30 dias seguidos:


entende a doutrina que, antes de o juiz declarar a perempção, é necessária a intimação do 18
querelante.

b) Falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecem em juízo, para


prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 dias, os sucessores: há quem diga que é necessário
intimar os sucessores, mas a maioria não concorda.

c) O querelante deixa de comparecer, injustificadamente, a qualquer ato do processo a que


deva estar presente: a ausência do querelante na audiência de conciliação é causa de perempção?
Não, pois essa ausência demonstra tão somente que o querelante não tem interesse em fazer
acordo.

d) O querelante deixa de formular o pedido de condenação nas alegações finais.

e) A querelante, pessoa jurídica, for extinta sem deixar sucessor.

5.5. DECADÊNCIA

A queixa deve ser oferecida no prazo decadencial de 6 (seis) meses, contado do


conhecimento da autoria (art. 38 do CPP), in verbis:

Art. 38.  Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de


queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em
que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo
para o oferecimento da denúncia.

Parágrafo único.  Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro do mesmo


prazo, nos casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31.

Com efeito, a decadência é a perda do direito de ação penal privada ou de representação,


em virtude do seu não exercício no prazo legal. Por isso, a decadência funciona como causa extintiva
da punibilidade.

A instauração do inquérito suspende ou interrompe o prazo decadencial? NÃO. Frise-


se que o prazo decadencial é fatal e improrrogável. Assim, a instauração de inquérito policial em
crimes de ação penal privada não interrompe nem suspende o curso do prazo decadencial. Se o
inquérito não estiver concluído em 6 meses, é preciso verificar se já há elementos com relação à
autoria; se sim, deve-se oferecer a queixa-crime de imediato; se ainda não se sabe quem é o autor
do delito, o prazo decadencial ainda não começou a fluir.

Destaque-se que o curso do prazo decadencial será obstado com o exercício do direito de
queixa ou de representação, pouco importando se a queixa foi proposta perante o juízo
incompetente. O que interessa não é a competência do juízo, mas se o direito foi exercido ou não. 19
5.6. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA

Vem prevista na Constituição Federal (art. 5º, inc. LIX), e nos arts. 29 do CPP e 103, § 3º, do
CP. É cabível apenas nas situações em que o crime for de ação penal pública e quando se verificar
a inércia do Ministério Público. Tomemos o exemplo de um crime de roubo. Recebido o inquérito
policial, abrem-se três alternativas para o Ministério Público: ou oferta a denúncia, ou pede o
arquivamento ou requer a devolução dos autos à delegacia de polícia para novas diligências. Ora,
se passado o prazo legal de 5 dias, estando preso o indiciado, ou 15 dias, estando ele solto, nenhuma
dessas alternativas for adotada pelo promotor de justiça, está configurada sua inércia e, por
consequência, pode a vítima (ou seus sucessores, representante legal ou curador), apresentar a
queixa que irá, exatamente, substituir a denúncia do Ministério Público. Repita-se, esta espécie de
ação (raramente vista na prática) só é possível quando o crime, na sua origem, é de ação penal
pública, como o roubo no nosso exemplo. Se o crime é de ação penal privada, o titular já é o ofendido
(querelante) e, portanto, a queixa por ele apresentada jamais irá substituir a denúncia do Ministério
Público, que no caso é incabível.

O prazo para oferta da queixa pela vítima continua sendo de seis meses, conforme previsto
no art. 38 do CPP. O termo a quo, porém, se inicia após o prazo concedido ao Ministério Público,
isto é, no 6º dia (se preso o indiciado), ou no 16º dia (se solto o indiciado), sob pena de decadência.
Findo o prazo para o parquet, e com sua inércia, tem início a contagem do prazo para o particular
ajuizar a queixa-crime subsidiária.

AÇÃO PENAL PRIVADA EXCLUSIVA → 6 meses, contados do dia do conhecimento da autoria do delito.

AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA → 6 meses, contados do fim do prazo para o
oferecimento da denúncia pelo MP.

A qualquer momento pode o Ministério Público ofertar a denúncia, enquanto não apresentada
a queixa pelo ofendido, já que para o parquet não se opera a decadência. Demais disso, eventual
inobservância do prazo, pelo “parquet”, configura mera irregularidade, sem qualquer consequência
para o processo propriamente dito.

Na ação penal privada subsidiária da pública, o Ministério Público:

a) Pode opinar pela rejeição da peça acusatória (art. 395 do CPP);

b) Pode aditar a queixa-crime, tanto para incluir elementos secundários (ex.: lugar do crime,
modus operandi etc.), como também para incluir novos fatos delituosos, coautores e partícipes.
20
c) Deve intervir em todos os termos do processo – atua como interveniente adesivo
obrigatório.

d) Pode repudiar a queixa-crime, hipótese em que o MP estaria obrigado a oferecer denúncia


substitutiva (do contrário, estar-se-ia negando o direito de ação ao ofendido, retornando-se ao status
quo ante).

e) No caso de negligência (desídia) do querelante, deve retomar a ação como parte principal
(a ação privada subsidiária é indisponível). É a chamada ação penal indireta.

ATENÇÃO!
Lembre-se de que, no caso da ação penal privada, cabe ao MP fiscalizar o princípio da indivisibilidade,
contudo, ele não poderá aditar a queixa-crime, devendo, pois, apelar, para que a parte proceda ao devido
aditamento. Já na ação privada subsidiária da pública, por sua vez, o MP poderá aditar a queixa-crime,
já que a ação penal continua sendo pública de qualquer forma.

É admissível a oferta de ação penal privada subsidiária na hipótese em que o Ministério


Público requereu o retorno dos autos à delegacia de polícia para a realização de diligência que se
revele absolutamente desnecessária, ainda que deferido o pedido pelo juiz. Lembre-se, nesse
aspecto, que o art. 16 do CPP autoriza a devolução do inquérito policial somente para a realização
de “novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia“. É verdade que, a rigor, não
houve omissão do parquet, que, no prazo legal, manifestou-se pela realização de diligência. Ocorre
que a absoluta impertinência do pedido corresponde à inércia, legitimando a vítima, neste caso, a
ofertar a queixa.

Saliente-se, por último, que somente é cabível essa espécie de ação quando se verificar,
como já dito, a inércia do Ministério Público. Assim, se o órgão promove o arquivamento do inquérito
policial, não há inércia e, portanto, não se admite a queixa subsidiária. O mesmo ocorre quando
requer novas diligências de fato necessárias.

6. OUTRAS ESPÉCIES DE AÇÃO PENAL

6.1. AÇÃO PENAL POPULAR

Trata-se de ação penal que pode ser ajuizada por qualquer pessoa do povo. A doutrina cita
dois exemplos em que isso é possível: no habeas corpus e no art. 14 da Lei n. 1.079/50.

1º exemplo: o habeas corpus pode ser impetrado por qualquer pessoa, capaz ou incapaz,
física ou jurídica. Frise-se que o HC não constitui uma ação penal condenatória. Trata-se de um
21
remédio constitucional, com ampla legitimidade, que visa proteger a liberdade de locomoção.

2ª exemplo: segundo o art. 14 da Lei n. 1.079/50, “é permitido qualquer cidadão denunciar o


Presidente da República ou Ministro do Estado, por crime de responsabilidade, perante a Câmara
dos Deputados”. Parte da doutrina entende que tal previsão legislativa cria uma espécie de ação
penal popular, que pode ser iniciada por qualquer do povo. Todavia, prevalece na doutrina que se
trata apenas de uma notitia criminis, que, de fato, pode ser oferecida por qualquer do povo, mas não
implica no oferecimento de uma ação penal, uma vez que ela depende do órgão fracionário do Poder
Legislativo. Além disso, a Lei n. 1.079/50 não versa sobre infrações criminais, mas sobre infrações
político-administrativas.

6.2. AÇÃO DE PREVENÇÃO PENAL

É aquela ajuizada com o objetivo de se aplicar medida de segurança a inimputável do art. 26,
caput, do CP, através de uma sentença absolutória imprópria.

6.3. AÇÃO PENAL ADESIVA


Trata-se de possibilidade de integrarem no polo ativo, em conjunto, o Ministério Público e o
querelante, nos casos eu que houver hipótese de conexão ou continência entre crimes de ação penal
de iniciativa pública e de ação penal de iniciativa privada. (Nestor Távora, pág. 282)

No Direito Alemão, é possível que o Ministério Público ingresse com a ação penal pública
mesmo em relação aos crimes sujeitos à ação penal provada, desde que haja um interesse público.
Neste caso, o querelante poderá constituir-se em parte acessória, o que equivale ao instituto
brasileiro do assistente do Ministério Público.

Para Denílson Feitosa é possível que o MP ofereça denúncia em crimes de ação penal
privada, desde que visualize a presença de interesse público. Nesse caso, o ofendido pode se
habilitar como acusador subsidiário, como se fosse uma espécie de ação penal adesiva ou ação
penal acessória.

Para Fernando da Costa Tourinho Filho esse tipo de ação existe no ordenamento alemão,
porém não é propriamente uma ação penal, haja vista o objetivo de se obter a satisfação do dano ex
delicto no juízo criminal. Quanto ao ordenamento pátrio, Tourinho observa o art. 268, CPP que
permite ao ofendido o direito de ingressar no processo penal, ao lado do Ministério Público, como
assistente. Trata-se de intervenção adesiva facultativa. Não há pois, ação penal autônoma. (Renato 22
Brasileiro, pág. 283-284)

6.4. AÇÃO PENAL SECUNDÁRIA

Ocorre quando as circunstâncias do crime fazem variar a espécie de ação penal. Exemplo:
crimes contra a honra; dano.

7. PEÇA ACUSATÓRIA

Lembre-se que a peça acusatória é chamada de denúncia, na ação penal pública. Na ação
penal privada, de queixa-crime. Tanto a denúncia quanto a queixa, em regra, devem ser
apresentadas por escrito, através de uma petição.

7.1. REQUISITOS (ART. 41 DO CPP)

O art. 41 prevê os seguintes requisitos para a inicial acusatória:

Art. 41.  A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa
identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
a) Exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias: quanto mais simples
a peça acusatória, melhor. Ela serve para narrar uma história. No processo penal, o acusado
defende-se dos fatos que lhe são imputados, independentemente da classificação formulada. Frise-
se que não pode o promotor, simplesmente, reproduzir o tipo penal (ex.: não se deve falar “João
subtraiu coisa alheia móvel para si”, mas sim “João subtraiu a carteira de Gustavo para si”). Quanto
à deficiência da narrativa do fato delituoso, há quem chame de “criptoimputação”. Segundo a doutrina
e a jurisprudência, trata-se de causa de inépcia formal da peça acusatória, sendo que a inépcia é
apontada como uma das causas de rejeição desta (art. 395, inciso I, do CPP).

b) Qualificação do acusado: envolve a indicação do nome, da filiação, da data de


nascimento, do número de CPF e RG etc. Se o promotor ou o ofendido não souber a qualificação do
acusado, o que fazer? De acordo com o próprio CPP e o entendimento da doutrina, ainda que não
se saiba a qualificação, é possível o oferecimento da peça acusatória, que deve apontar outros dados
pelos quais se possa identificar a pessoa.

c) Classificação do crime: a classificação do crime corresponde à indicação do tipo penal


que descreve a conduta praticada pelo agente. Ex.: furto simples – art. 155, caput, do CP; roubo
tentado – art. 157, caput, c/c art. 14, II, do CP. 23
O erro na classificação do crime autoriza a rejeição da peça acusatória? Não. Eventual
erro da classificação não autoriza a rejeição da peça acusatória, visto que o CPP dispõe de
instrumentos para a retificação da classificação do crime. São eles: emendatio libelli e mutatio libelli.

d) Rol de testemunhas: o rol de testemunhas só deve ser apresentado quando necessário.


Isso porque nem todos os crimes dependem de prova testemunhal.

Qual a consequência da não juntada do rol de testemunhas na peça acusatória? Haverá


preclusão temporal (já que a lei estabelece o momento determinado para a prática do ato).

e) Procuração da queixa-crime: esse requisito só vale para a queixa-crime (art. 44 do CPP).


Trata-se, vale dizer, de procuração com poderes especiais. Ela deve fazer menção ao nome do
querelado e ao fato delituoso. Quanto ao fato delituoso, entende a doutrina majoritária e o STJ que
basta a indicação do dispositivo legal, não sendo necessário descrever toda a conduta. Ainda,
também para a maioria da doutrina, eventuais vícios da procuração podem ser supridos a qualquer
momento, antes da sentença condenatória, nos termos do art. 568 do CPP.

Cumpre fazer ressalva, entretanto, ao informativo n. 665, no qual a 2ª Turma do STF


considerou obrigatória a menção expressa ao fato criminoso, de modo que o instrumento de mandato
contenha, ao menos, referência individualizadora do evento delituoso, e não apenas o nomen iuris,
não sendo necessária, por outro lado, a descrição minuciosa ou a referência pormenorizada do fato.

Além disso, a 2ª Turma do STF também decidiu que o vício na procuração outorgada pelo
querelante ao seu advogado somente pode ser corrigido durante o prazo decadencial, ou seja, até o
período máximo de 6 meses contados do dia em que se veio a saber quem é o autor do crime. (RHC-
105920/RJ). Note, assim, que agora não mais se admite a correção do vício na procuração a qualquer
tempo, mas apenas até antes de ocorrer a decadência.

Estamos totalmente à disposição para quaisquer críticas ou sugestões. Sua contribuição é fundamental para nós. Eventuais
apontamentos podem ser enviados para duvidas.mtapoio@vorne.com.br.

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