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AÇÃO PENAL

1. CONCEITO:

É o direito de postular junto ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo a determinado


caso concreto. É um direito subjetivo público de demandar a satisfação da pretensão punitiva.

2. NATUREZA JURÍDICA:

É um direito público subjetivo de exigir do Estado a prestação jurisdicional para a aplicação


do direito material (penal).

3. ENQUADRAMENTO DA AÇÃO PENAL:

Em nosso sistema, a ação penal está prevista no Código Penal e Código de Processo Penal.
Para Tourinho Filho, Hélio Tornaghi, José Antônio Paganella Boschi e Frederico Marques, o direito
de ação tem conteúdo processual, pois as normas previstas na lei adjetiva se destinam a regular o
jus puniendi. Para outros, a exemplo de Jorge Alberto Romeiro e Vicente de Azevedo, pertence ao
campo comum do Direito Penal e Processual Penal.

4. CARACTERÍSTICAS DA AÇÃO PENAL:

a) Caráter público: a ação penal é direito público, pois, do ponto de vista subjetivo, é exercido
em face do Poder Público (Estado). Do ponto de vista objetivo, contém uma pretensão de significativa
relevância social (uma pretensão punitiva, baseada em direito material-penal). O direito de ação é
sempre exercido em face do Estado, pois somente ele pode impor o jus puniendi.
b) Constitui direito subjetivo: o direito de propositura da ação penal constitui uma faculdade
– ou dever, no caso de ação penal pública – de agir, com o fito de alcançar a tutela de determinado
interesse. Em essência, o titular pode exigir do Estado-Juiz a prestação jurisdicional.
c) É direito autônomo: não se confunde com o direito material que se pretende tutelar. A sua
existência e a possibilidade de que seja exercido independem de qualquer relação jurídica material.
Decorre da própria autonomia do direito processual.

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d) É um direito abstrato: esta característica decorre da autonomia do direito de ação em
relação ao direito material. Esta doutrina contrapõe-se à corrente antes dominante que encarava
como direito concreto, segundo o qual o direito de ação surge da situação concreta em que ocorra
violação de um direito material. É um direito abstrato, pois pode ser exercido por qualquer pessoa
que tenha capacidade de agir, ainda que nenhuma violação a direito tenha ocorrido. A circunstância
de que o autor da ação não tenha razão, ou de que não se tenham preenchido os requisitos
necessários para que obtenha a tutela pleiteada não obsta a concretização do direito de ação, pois o
Poder Judiciário estará obrigado a manifestar-se, ainda que para decidir contrariamente aos
interesses do autor da ação. Portanto, é direito abstrato porque independe do provimento
jurisdicional, seja ele favorável ou desfavorável, justo ou injusto.

5. CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL

a) Possibilidade jurídica do pedido.

O pedido veiculado por meio da ação penal deve ser, ao menos em tese, passível de
atendimento pelo Poder Judiciário. Para que o pedido seja juridicamente possível, é preciso que haja
um dispositivo de lei determinando que a conduta descrita pelo acusador e imputada ao acusado
constitua infração penal (crime ou contravenção). É preciso haver um tipo penal incriminando a
conduta que, segundo o acusador, foi praticada pelo acusado.
Por isso o artigo 43, inc. I, do CPP dispõe que a denúncia será rejeitada quando o fato narrado
evidentemente não constituir crime. Assim, analisa-se o fato tal como narrado na inicial acusatória,
sem se indagar se a imputação é ou não a verdadeira realidade. Relega-se para o mérito a análise
dos fatos provados. Aprecia-se apenas a “causa petendi” considerada em tese, desvinculada de
qualquer prova porventura existente.

b) Interesse de agir.

A pretensão punitiva somente deve ser iniciada nos casos concretos em que há interesse
público estatal na solução da lide.
Nucci e Capez desdobram o interesse de agir no trinômio necessidade, utilidade e adequação
à causa. Necessidade é relativa ao processo penal, haja vista a impossibilidade de se punir alguém
sem o devido processo legal. No âmbito cível, diferentemente, a pretensão poderá ser satisfeita
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espontaneamente pela parte. O infrator penal jamais poderá submeter-se a uma sanção penal sem
o devido processo penal e condenação. Atualmente, excepciona-se com a transação penal. Por isso,
a denúncia não pode ser recebida se já estiver extinta a punibilidade do agente (art. 43, II, CPP).
Utilidade representa a eficácia da atividade jurisdicional para satisfazer o interesse do autor. A ação
penal tem por objetivo impor pena ao acusado. Se por qualquer motivo essa pena não mais possa
ser imposta (prescrição), então o ajuizamento da ação será inútil, faltando interesse de agir. Apesar
de tema controvertido, existe posicionamento apregoando a falta de interesse de agir (devido à
inutilidade do processo) quando se projetar a prescrição (prescrição virtual ou antecipada) em
concreto antes do oferecimento da denúncia, podendo ser promovido o arquivamento 1 . Outra
situação muito controvertida é a situação dos crimes de bagatela, quando parte da doutrina e
jurisprudência apregoam que não se poderá obter resultado útil da formação de um juízo sentencial
condenatório. A adequação reside no processo penal condenatório e no pedido de aplicação de
sanção penal de acordo com os parâmetros do tipo penal incriminador. Narrada uma conduta típica,
o acusador deve pleitear a condenação do acusado conforme os parâmetros do tipo incriminador. O
desinteresse de agir pode ocorrer, ainda, pela inexistência de provas mínimas idôneas a embasar a
ação penal. Na medida em que o processo penal é, por si, causa de constrangimento, deve ser
instaurado diante da existência de mínimos elementos de prova idôneos em torno da conduta típica.
Evidentemente que a admissibilidade da ação penal não demanda provas robustas. Basta que as
provas sejam capazes de despertar um juízo de suspeita, o suficiente para demonstrar que a
acusação não é fruto de criação cerebrina ou mero capricho.
Também falará interesse de agir quando estiver evidenciada alguma excludente da ilicitude
(art. 43, inc. I, CPP).

c) Legitimidade para agir (legitimatio ad causam).

Consiste em existir previsão legal para que as partes que figuram no processo ocupem suas
respectivas posições processuais. Fala-se, pois, em legitimidade ativa e passiva. Via de regra, a
legitimidade ativa é do Estado, por meio do Ministério Público (art. 129, I, CF), mas também pode ser
exercida pelo ofendido. Há, também, a legitimidade ad processum, isto é, para atuar no processo

1 Não afeta o interesse de agir, uma vez que é impossível a rejeição da denúncia face ao reconhecimento antecipado da
prescrição retroativa, vez que isso implicaria em antecipação de tutela jurisdicional, inadmissível em sede penal. STF,
RHC 76.153-2. STJ, REsp 196003. Ademais, o art. 43, II, do CPP, afirma que a peça acusatória não será recebida quando
“já estiver extinta a punibilidade” e não quando a causa extintiva for provável.
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penal. Ex.: maiores de 18 anos, por seus procuradores. Menores de 18 anos deverão ser
representados.

d) Justa causa para o ajuizamento da ação penal.

Parte da doutrina aventa a possibilidade de a justa causa ser uma condição da ação autônoma.
Consistiria na obrigatoriedade de que exista, no momento do ajuizamento da ação penal, prova
acerca da materialidade do delito e, ao menos, indícios da autoria, permitindo fundada suspeita
quanto à prática de um fato de natureza penal. Trata-se de posição altamente controvertida. A
despeito, encontram-se diversos autores sustentando, efetivamente, que a justa causa representa
uma condição da ação, referindo-se à existência de elementos mínimos de provas para autorizar o
ajuizamento da ação penal. Ocorre que o legislador, com a reforma inserida por meio da Lei n.º
11.719/08, explicitamente distinguiu as condições da ação da justa causa ao estabelecer no artigo
395 do CPP os incisos II e III. Portanto, altamente questionável a conclusão no sentido de que a justa
causa está contida dentre as condições da ação penal.
A despeito desta sustentação, a justa causa não representa mais do que a existência, em cada
caso concreto, do interesse de agir e da legitimidade passiva ad causam. Ora, as provas quanto à
materialidade demonstram a necessidade de que seja instaurado um processo para que se apure o
fato narrado. Os indícios de autoria, por sua vez, é que tornarão possível determinar, mesmo que de
forma relativamente imprecisa, a pessoa que deverá constar no pólo passivo da demanda. A falta de
justa causa, entretanto, constitui ilegalidade e autoriza propositura de habeas corpus, conforme art.
648, I, do CPP.
A justa causa, pois, exige prova da materialidade do delito e indícios da autoria. Entretanto,
a jurisprudência nacional vem ampliando o conceito de justa causa para reconhecer a sua ausência
não só pela falta de prova da materialidade ou indícios da autoria, mas também nas hipóteses de
evidente atipicidade ou de extinção da punibilidade (STJ RHC 14718/ES, j. 03/06/04). Nesta
hipótese, a decisão é de mérito, impedindo a propositura de nova ação. Quando faltarem provas da
materialidade ou indícios da autoria, a decisão não é de mérito.
Guilherme Nucci cita conceito no sentido de que a justa causa, em verdade, espelha uma
síntese das condições da ação.
As condições da ação não se confundem com as escusas absolutórias, que atingem
diretamente o direito de punir do Estado, fazendo com que a pena deixe de ser imposta por

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circunstâncias pessoais do agente. Ex.: artigos 181 e 348, § 2º do Código Penal e 53 da Constituição
Federal (imunidades parlamentares).

e) Condições de procedibilidade da ação penal:

Além da possibilidade jurídica do pedido, do interesse de agir e da legitimidade da parte, a lei


subordina o exercício da ação penal ao cumprimento, pelo autor, de certas condições de
procedibilidade.

- representação do ofendido ou seu representante;


- requisição do Ministro da Justiça;
- ingresso do agente em território nacional, em crimes praticados fora do território nacional
(extraterritorialidade da lei penal – art. 7º, inc. II, alíneas “a” e “b”, CP)
- autorização da Câmara dos Deputados para processar o Presidente da República
- trânsito em julgado da sentença que, por erro ou impedimento, anule o casamento (art. 236, par.
Ún., CP)
- audiência preliminar do artigo 520 do CPP
- prova pericial do artigo 525 CPP
- novas provas para denunciar após a impronúncia (art. 409 CPP)

Tourinho Filho considera as condições de procedibilidade condições da ação específicas,


enquanto as demais considera condições genéricas.
Não se confundem com as condições de punibilidade as condições de procedibilidade.
Enquanto as condições de procedibilidade tem cunho eminentemente processual e indicam
que o Ministério Público não pode agir sem a “autorização” do ofendido ou de quem possa em seu
nome dar o consentimento, as condições de punibilidade têm conteúdo penal e constituem
elementos ou circunstâncias exteriores ao fato principal que, por motivos de política criminal,
condicionam sua ilicitude penal ou sua punição. Ada Grinover não concorda em que as condições de
procedibilidade e de punibilidade constituam categorias autônomas ao afirmar que elas sequer
encontram correspondência no processo civil. Para a autora, a ausência da representação do
ofendido, por exemplo, veda o exercício do direito de ação e impede o provimento jurisdicional
condenatório requerido pelo Ministério Público, mas jamais dele retira a legitimidade ad causam, em
virtude da titularidade do direito de punir.
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Exemplos de condições de punibilidade: “Art. 180 da Lei 11.101/05. A sentença que decreta a
falência, concede a recuperação judicial ou concede a recuperação extrajudicial de que trata o art.
163 desta Lei é condição objetiva de punibilidade das infrações penais descritas nesta Lei.” Também
a ocorrência de prejuízo no delito de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia (art.
164 do CP). Da mesma forma a passagem do veículo automotor furtado ou roubado para a incidência
da qualificadora ou majorante do artigo 155, § 5º, e 157, § 2º, inc. IV, do Código Penal.

PENDÊNCIA DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO:

Evidentemente, o Ministério Público não está subordinado à esfera administrativa para a


propositura de ação penal pública. Como dominus litis, tem liberdade para ajuizar a ação assim que
entender presentes os elementos necessários.
Há, entretanto, exceções.

a) O art. 9º da Lei 10.684/03, ao determinar a possibilidade de que débitos existentes perante


o Fisco ou a Previdência Social sejam parcelados pelos respectivos devedores, passou a favorecer
os autores de crimes contra aquelas entidades (previstos nos artigos 1º e 2º da Lei n. 8.137/90 (crimes
contra a ordem tributária) e nos arts. 168-A e 337-A do Código Penal) com a suspensão da
pretensão punitiva durante o período em que as pessoas jurídicas por meio das quais os agentes
tenham cometido os aludidos delitos permaneçam cumprindo o parcelamento ajustado na forma
legal. Nesse período, não poderá ser proposta a ação penal, sendo suspensas aquelas que estiverem
pendentes. Neste caso, discute-se se esta hipótese constitui exceção à regra da independência das
esferas administrativa e penal. O que impede a propositura ou o seguimento da ação penal, nesse
caso, não é a mera existência de procedimento administrativo, mas sim a suspensão da própria
pretensão punitiva do Estado, porquanto suspensa a exigibilidade do débito tributário. Recentemente,
o STF passou a adotar posição no sentido de que na pendência de procedimento administrativo para
apurar o débito tributário não é possível ajuizar a ação penal. 2

6. ESPÉCIES DE AÇÃO PENAL:

a) Pública incondicionada;
b) Pública condicionada à representação;
c) Pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça;
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d) Privada
e) Privada subsidiária da pública
f) Ação penal popular – crimes de responsabilidade do Presidente da República, Ministros
de Estado, etc. Artigo 14 da Lei 1.079/50. Qualquer cidadão poderá propor ação perante a Câmara
dos Deputados. Tourinho Filho e Ada Pelegrini Grinnove a admitem. Predomina, entretanto, que não
se trata de ação penal, pois a expressão crimes de responsabilidade representam meras infrações
administrativas, a partir do conceito de crime previsto na Lei de Introdução ao Código Penal. Seriam
“crimes” de responsabilidade impróprios. Somente os crimes próprios, com pena de reclusão ou
detenção, autorizam ação penal (ex. peculato).

6.1. MOMENTO DE INÍCIO DA AÇÃO PENAL

Predomina, absolutamente, na atualidade, o entendimento no sentido de que a ação penal


iniciase com o oferecimento da denúncia ou queixa, e não no momento de seu recebimento.

2 HC 85949/MS, Julgamento em 22/08/2006, Primeira Turma. EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL
PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. REPRESENTAÇÃO FISCAL. SUSPENSÃO DO CURSO DA AÇÃO
PENAL. DECISÃO DEFINITIVA DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL. CONDIÇÃO DE
PROCEDIBILIDADE DA AÇÃO PENAL. LAVAGEM DE DINHEIRO. CRIME AUTÔNOMO. 1. Denúncia carente de justa
causa quanto ao crime tributário, pois não precedeu da investigação fiscal administrativa definitiva a apurar a efetiva
sonegação fiscal. Nesses crimes, por serem materiais, é necessária a comprovação do efetivo dano ao bem jurídico
tutelado. A existência do crédito tributário é pressuposto para a caracterização do crime contra a ordem tributária, não
se podendo admitir denúncia penal enquanto pendente o efeito preclusivo da decisão definitiva em processo
administrativo. Precedentes. 2. O crime de lavagem de dinheiro, por ser autônomo, não depende da instauração de
processo administrativo-fiscal. Os fatos descritos na denúncia, se comprovados, podem tipificar o crime descrito na
norma penal vigente, devendo, quanto a este, prosseguir a ação penal. Precedentes. 3. Habeas corpus parcialmente
concedido.

7. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA.

7.1. Titularidade: do Ministério Público (artigos 129, I, CF, e 25, III, da Lei n. 8.625/93 (LONMP).

A Constituição prevê única exceção, em seu artigo 5º, LIX, no caso do Ministério Público não
oferecer denúncia no prazo legal, admitindo-se ação penal privada subsidiária, proposta pelo
ofendido ou representante legal. Mesma ressalva é encontrada no artigo 29 do CPP e 100, § 3º, do
CP.

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Desta forma, ficam revogados os artigos 26 e 531 do CPP, que previam o procedimento
judicialiforme, cuja titularidade era conferida à autoridade policial ou Juiz, iniciando pelo auto de
prisão em flagrante ou mediante portaria, nos casos de contravenções.

7.2. Princípios:

a) Princípio da obrigatoriedade ou também chamado da legalidade: Verificada a hipótese de


atuação (prova da materialidade e indícios suficientes da autoria), não pode o Ministério Público
negar-se a dar início à ação penal. A obrigatoriedade decorre do próprio texto legal do artigo 24 do
CPP. Por isso, não pode o membro do Ministério Público determinar o arquivamento do inquérito
policial, devendo propor o arquivamento ao juiz competente, ficando esta decisão a critério do
magistrado. Havendo divergência, deverá ser observado o artigo 28 do CPP.
Atualmente, este princípio sofreu sensível mitigação com a regra do artigo 98, inc. I, da
Constituição, que possibilita a transação penal nas hipóteses de infrações penais de menor potencial
ofensivo. Tal possibilidade está também no artigo 76 da Lei n.º 9.099/95. A partir da transação, pode-
se identificar a existência do princípio da discricionariedade regrada, também chamado de
princípio da disponibilidade temperada, para infrações de menor potencial ofensivo. Pode-se,
também, cogitar de exceção no que se refere ao chamado o acordo de leniência, previsto no
artigo 35-C, da Lei 8.884/94
Art. 35-B. “A União, por intermédio da SDE (Secretaria de Desenvolvimento Econômico),
poderá celebrar acordo de leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a
redução de um a dois terços da penalidade aplicável, nos termos deste artigo, com pessoas físicas e
jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com
as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte:
(Artigo incluído pela Lei nº 10.149, de 21.12.2000)
I - a identificação dos demais co-autores da infração; e (Incisio incluído pela Lei nº 10.149, de
21.12.2000)
II - a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob
investigação.
Art. 35-C. Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei n o 8.137, de 27 de
novembro de 1990, a celebração de acordo de leniência, nos termos desta Lei, determina a
suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia. (Artigo incluído
pela Lei nº 10.149, de 21.12.2000)
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Parágrafo único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se automaticamente a
punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo. (Parágra único incluído pela Lei nº
10.149, de 21.12.2000)

b) Princípio da oficialidade: A legitimidade para a ação penal pública é do Estado. Somente


poderá ser proposta por um órgão do Estado, o Ministério Público. Somente excepciona-se esta regra
quando da inércia do agente, exsurgindo a ação penal privada subsidiária, de titularidade do ofendido
ou representante legal.

c) Princípio da indisponibilidade: O Ministério Público não pode desistir da ação penal (art.
42 CPP). É mais um desdobramento do princípio da obrigatoriedade. Aliás, não pode desistir do
recurso que haja interposto (art. 576 CPP). Este princípio está mitigado frente ao benefício da
suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95). Este é, sem dúvida, um ato de
disposição da ação penal. Este princípio tem sido adotado, também, pela jurisprudência para impedir
o reconhecimento da prescrição retroativa antecipada (prescrição em perspectiva). TRF/3ª Região –
HC 15874-SP, 5ª Turma, j. 26/04/2004, DJU 01/06/04, p. 292.

d) Princípio da indivisibilidade: Também aplicável à ação penal privada (art. 48 CPP). A


ação penal pública deve abranger todos aqueles que cometeram a infração. É um desdobramento do
princípio da legalidade. Se o Ministério Público está obrigado a propor a ação penal pública, é óbvio
que não poderá escolher, dentre os indiciados, quais serão demandados. É a posição de Tourinho
Filho. Para este autor, a única exceção é na hipótese de separação do processo.
Para alguns doutrinadores, porém, aplica-se à ação penal pública o princípio da
divisibilidade, e não o da indivisibilidade, já que o Ministério Público pode optar por processar
apenas um dos ofensores, podendo coletar maiores evidências para processar mais tarde os demais
(Mirabete). Exemplos em que se dá a divisibilidade: Acordo de leniência (art. 35-C, Lei 8.884/94); a
prescrição em abstrato de 1 dos agentes (ex.: menor entre 18 e 21 anos); ocorrer transação penal
com relação a um dos agentes e não com relação ao outro.

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É posição majoritária da jurisprudência, inclusive pacífica no STF e STJ2, que para a ação
penal pública não se aplica o princípio da indivisibilidade, porquanto para ela existe o princípio da
obrigatoriedade.

e) Princípio da intranscendência: A ação penal somente pode ser proposta contra a pessoa
a quem se atribui o cometimento da infração penal.

f) Princípio da suficiência da ação penal: Nas hipóteses em que não existir alguma
questão prejudicial (É toda questão cujo deslinde implica um pré-julgamento do mérito. Questões
prejudiciais podem estar relacionadas com o estado de pessoas (vivo, morto, parente ou não, casado
ou não). Nestas hipóteses, o juiz será obrigado a suspender o processo criminal até que a polêmica
seja solucionada no juízo cível. Ex.: Crime contra o patrimônio sem violência ou grave ameaça
cometido por ascendente contra descendente ou vice-versa). O parentesco terá relevância, pois o
autor ficará isento de pena, diante da escusa absolutória do art. 181, II, CP. A prejudicialidade é
facultativa quando não disser respeito ao estado de pessoas. No caso, o juiz criminal não estará
obrigado, mas apenas poderá suspender o processo, aguardando a solução no âmbito cível. Ex.:
antes de saber se houve o furto, é necessário decidir se a coisa subtraída pertence ou não ao agente,
já que inexiste furto de coisa própria. Se houver ação cível discutindo a titularidade, o juízo penal não
precisará aguardar a solução da demanda na esfera extrapenal, conforme art. 93 do CPP.
É aí que se fala em princípio da suficiência da ação penal. A demanda penal é suficiente para
solver a questão prejudicial não ligada ao estado de pessoas, sendo desnecessário aguardar a
solução no juízo cível.

7.3. Prazos para a denúncia:

Artigo 46 do CPP – 5 dias indiciado preso e 15 dias indiciado solto.

Exceções:

a) Lei 1.521/51 – crimes contra a Economia Popular – 2 dias (art. 10, § 2º).
b) Lei 4.737/65 – Código Eleitoral – 10 dias (art. 357)

2
STF, RTJ, 91/477, 94/137 e 95/1389, HC 74.661-6, 74.333-1; STJ, RSTJ, 23/145.
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c) Lei 4.898/67 – 48 horas (art. 13) Entretanto, entende-se que será processado nos JEcrim.
d) Lei 11.343/06 – Delitos de drogas – 10 dias (art. 54)

7.3. Ação Penal Sempre Pública

Crimes em detrimento do patrimônio ou interesse da União, Estado e Município, a ação penal


será sempre pública incondicionada. Artigo 24, § 2º, CPP.

7.4. A DENÚNCIA

O artigo 41 do CPP elenca os requisitos FORMAIS da denúncia. Tais requisitos, quando


inexistentes, acarretam a inépcia da denúncia. Devem ser argüidos, entretanto, antes de proferida a
sentença condenatória, para ensejar a declaração de nulidade relativa, sanável e sujeita à preclusão.3
São eles:

a) a exposição do fato com todas as suas circunstâncias;


b) a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais possa ser identificado;
c) a classificação ou qualificação jurídica do fato exposto ou narrado;
d) e, quando for necessário o rol de testemunhas.

a) a exposição do fato com todas as suas circunstâncias. Quanto a este requisito, observar
que as agravantes e majorantes podem ser reconhecidas na sentença, mesmo quando não
capituladas na denúncia ou queixa, desde que a inicial acusatória as descreva, no mínimo, quando
da narrativa do contexto fático. Atinente às agravantes, há norma expressa a respeito (artigo 385 do
CPP, final).
As qualificadoras também devem ser descritas faticamente, não podendo ser reconhecidas
pelo juiz sem imputação expressa, sob pena de violação do princípios do contraditório e da ampla
defesa.
Ademais, o réu defende-se dos fatos, não da capitulação efetuada na denúncia. Por isso, se
houver alguma deficiência na capitulação, não proporciona qualquer nulidade.

3
Ver STF, HC 222340, 1ª Turma, 30/10/2001.
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Quanto à conduta dos agentes, na hipótese de concurso de pessoas, há necessidade de ser
individualizada, sempre que possível. Nos crimes societários, há tendência da jurisprudência atual
em exigir a narrativa individualizada da conduta de todos os coautores ou partícipes, vinculando-os
à prática dos fatos imputados. Ou seja, não basta ser membro da empresa, por exemplo, ou ter
posição de comando.
É possível ao juiz corrigir a capitulação da denúncia no ato de recebimento?
Predomina, absolutamente, o entendimento no sentido de que é vedado ao Juiz alterar a
capitulação conferida pelo Ministério Público, ou mesmo pelo querelante, na denúncia ou queixa.
Guilherme Nucci entende que o Juiz pode corrigir a denúncia ao recebê-la. Esta possibilidade
somente pode ocorrer em momento posterior, na sentença (artigo 383 CPP), por meio da emendatio
libelli. Guilherme Nucci, por exemplo, entende que o Juiz pode corrigir a capitulação da denúncia no
ato de seu recebimento.
Entretanto, com o advento do benefício da suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei
n.º 9.099/95), não se descarta a admissibilidade de tal conduta do juiz. Digamos que o delito imputado
na denúncia ou queixa não admita tal benefício, mas o juiz entenda que os fatos correspondem a
delito menos grave, que comporta a benesse. Ex.: denúncia por lesões gravíssimas quando o fato
configura lesão corporal apenas grave. Mesmo assim, trata-se de tese muito incipiente. De qualquer
sorte, reafirma-se que o juiz poderá conferir outra classificação ao delito na sentença (art. 386),
abrindo vista ao Ministério Público para que ofereça, se cabível, a suspensão condicional do
processo.

DENÚNCIA ALTERNATIVA

É entendimento tranquilo na doutrina e jurisprudência que a denúncia não pode ser alternativa,
por violar os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

DESNECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA (OU QUEIXA)

Ainda é amplamente dominante o entendimento da doutrina e tranqüilo na jurisprudência no


sentido de que o Juiz não necessita de fundamentar o recebimento da denúncia (ou queixa), pois
estaria manifestando-se acerca do mérito, o que lhe é vedado nesse momento. Por isso, não há
violação ao artigo 93, inc. IX, da CF.

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Há que se fazer ressalva nas hipóteses em que o procedimento preveja a ocorrência de defesa
preliminar (alegações escritas ou orais) antes do recebimento da denúncia (ex.: lei de drogas, delitos
funcionais e Juizado Especial Criminal). Nesses casos, evidentemente, o Juiz, para receber a
denúncia (ou queixa), deverá rechaçar as alegações preliminares efetuadas pela defesa. Por isso,
acabará se manifestando. No entanto, deve atentar para não manifestar-se acerca do mérito da ação
penal.
Também deverá manifestar-se nos processos de competência originária dos Tribunais,
consoante dispõe o artigo 6º da Lei n.º 8.038/90.

ADITAMENTO À DENÚNCIA

O permissivo legal para tanto encontra-se no artigo 569 do CPP: As omissões da denúncia
ou da queixa, da representação, ou nos processos das contravenções penais, da portaria ou do
auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a todo o tempo, antes da sentença final.

Hipóteses em que pode ocorrer:

a) Inserção de co-autor ou partícipe não descrito na denúncia – aditamento pessoal. Se


isso ocorrer, é imperativa a designação de interrogatório do sujeito ativo incluído. Também é
necessária a abertura de prazo para a defesa arrolar testemunhas e produzir provas. Deve-se, ainda,
ouvir novamente as testemunhas da acusação que se refiram à conduta do novo agente incluído na
denúncia.
Quanto à prescrição, neste caso, não é interrompida pelo aditamento, conforme art. 117, § 1º,
1ª parte, do CP.

b) Inserção de outra infração penal conexa ou continente, não incluída na denúncia –


aditamento real. Veja-se que no decorrer da instrução podem surgir provas de outros delitos
perpetrados, em conexão. Neste caso, deve-se reabrir a instrução no que se refere ao novo fato
delituoso narrado.
Quanto à prescrição, interrompe-se tão-somente em relação ao novo fato.

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c) Inclusão de uma elementar não referida na denúncia. Pode ocorrer que a instrução
criminal demonstra a ocorrência de fatos que alterem a definição jurídica do delito inicialmente
imputado. Por exemplo: incluindo uma qualificadora.
Neste caso, em tese, o recebimento do aditamento interrompe a prescrição, desaparecendo
a interrupção anteriormente ocorrida quando do recebimento da denúncia. O prazo prescricional,
também, passa a ser regulado pela nova pena.

d) Inclusão de nova circunstância não contida explicita ou implicitamente na denúncia


relativa a fatos. Ex.: inclusão de majorante da idade da vítima nos delitos de homicídio e lesões
dolosas (art. 121, §4º, final).
O recebimento do aditamento não interrompe a prescrição. Mas, se a pena for alterada, pode-
se alterar o prazo prescricional.
Importante ressaltar, entretanto, que o aditamento à denúncia é facultativo nos casos dos itens
“1” e “2”, podendo ser oferecida uma nova denúncia para a ampliação dos limites objetivos ou
subjetivos da denúncia. Aliás, em se tratando de novo delito conexo ou continente ou mesmo da
inclusão de novo sujeito ativo (co-autor ou partícipe), poderá ocorrer a separação dos processos (art.
80 do CPP).

8. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA.

No dizer dos artigos 24 do CPP e 100, § 1º, do CP, a ação penal pode depender de
representação do ofendido ou representante legal, de requisição do Ministro da Justiça ou de
requisição do Ministério Militar a que estiver subordinado o militar quando praticar os crimes previstos
nos artigos 136 a 141 do Código Penal Militar.
Diverge a doutrina acerca da natureza da manifestação de vontade que condiciona o
ajuizamento da ação penal. Ora é classificada como condição suspensiva de procedibilidade, ora
como condição objetiva de punibilidade, ou mesmo como condição de procedibilidade. O
entendimento majoritário é no sentido de que a representação e a requisição do Ministro da Justiça
constituem condição processual e não material.

8.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO:

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A representação é uma autorização concedida pelo ofendido ou quem tenha capacidade
para representá-lo a fim de que o Ministério Público possa promover a ação penal a ela
condicionada. Sem a representação, a autoridade policial não poderá sequer instaurar o inquérito
policial (art. 5º, § 4º, CPP).

Natureza jurídica da representação – há dissenso doutrinário quanto à natureza jurídica da


representação, havendo autores que a consideravam como uma condição de punibilidade ou como
condição de procedibilidade. Predomina, absolutamente, o entendimento no sentido de que é
condição de procedibilidade. Esta condição de procedibilidade, entretanto, tem natureza processual-
material. Apesar de sua natureza preponderantemente processual (condição especial da ação),
aplicam-se a ela as regras de direito material intertemporal, como irretroatividade da lex gravior,
bem como a vedação de analogia in malam partem, haja vista sua influência sobre o direito de punir
do Estado, de natureza inegavelmente substancial. Não sendo exercido o direito no prazo legal,
ocorre a extinção da punibilidade pela decadência (art. 107, IV, CP). Por isso, sendo a decadência
um instituto de direito material, a representação não deixa de ter este conteúdo.

Titularidade para representar – Tem legitimidade para promover a representação o ofendido


ou quem tenha qualidade para representá-lo (art. 24 CPP).
A representação pode ser exercida pessoalmente ou por meio de procurador, desde que com
poderes especiais (art. 39 CPP).
Com o advento do novo Código Civil, a regra contida no art. 34 do CPP teria caído no vazio,
não cabendo a representação legal do ofendido capaz, maior de 18 anos. Por isso, há que se ter por
inaplicável a Súmula 594 do STF, no sentido de que “os direitos de queixa e de representação podem
ser exercidos, independentemente, pelo ofendido ou por seu representante legal.” No caso de morte
do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de representação passará
ao cônjuge (hoje admitem-se os companheiros), ascendente, descendente ou irmão (art. 24, § 1º,
CPP). Discute-se se essa enumeração é taxativa. A ordem é de precedência (por analogia ao artigo
36 do CPP). Somente diante da inexistência do cônjuge é que o ascendente poderá representar. Por
isso, o curador do ausente, uma vez nomeado no juízo cível, não pode exercer o direito de
representação, apenas as pessoas antes citadas. Há tendência, entretanto, em reconhecer que o rol
é meramente exemplificativo. Em crimes contra os costumes, tem-se admitido a representação pelo
responsável do menor, ou de quem ele dependa economicamente, ex.: guardião, padrasto, etc.

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Se o ofendido for incapaz, pode o Juiz nomear curador especial para analisar a
conveniência de oferecer a representação.
Também poderá ser nomeado curador se os interesses do incapaz colidirem com
representante (art. 33 CPP). STF HC 76311, DJU 07/08/98, p. 20.
As pessoas jurídicas também poderão oferecer representação, por meio da pessoa indicada
no respectivo contrato ou estatuto social.

Forma – Não há forma explícita para a representação. Não precisa sequer ser expressa. A
simples circunstância de que o ofendido se dirija à Delegacia relatando a existência dos fatos
demonstra sua concordância, podendo ser tomada como exercício da representação. Ver, neste
sentido, HC 88274, de 17/2/07 do STF, reconhecendo a validade da representação com o
comparecimento da vítima à Delegacia de Polícia relatando os fatos.
Deve conter todas as informações que possam servir ao esclarecimento do fato e da autoria
(art. 39, § 2º, do CPP).
Feita a representação contra apenas um suspeito, esta se estenderá aos demais,
autorizando o Ministério Público a propor a ação contra todos. Isso decorre do princípio da
indivisibilidade da ação penal, corolário do princípio da obrigatoriedade. É o que se chama de eficácia
objetiva da representação.
Se representar apenas com relação a um crime, não se estende ao outro porventura contido
na mesma investigação. É o entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência.

Destinatário da representação – Pode ser dirigida ao juiz, ao representante do Ministério


Público ou à autoridade policial (art. 39, “caput”, CPP).
Quando dirigida ao juiz, deverá ele remeter ao Ministério Público as peças que a instruem se
suficientes à ação penal. Se insuficientes, o juiz remeterá à autoridade policial para a instauração de
inquérito policial.
Quando dirigida ao Ministério Público, poderá ofertar denúncia se houver os elementos
suficientes, ou requisitar a instauração de inquérito policial.
Nos Juizados Especiais Criminais, há o entendimento por alguns juizes no sentido de que a
representação para as infrações de menor potencial ofensivo somente pode ser ofertada em juízo, a
partir do que dispõe o artigo 75 da Lei n. 9.099/95, não sendo válida a representação oferecida
perante a autoridade policial ou Ministério Público. Entretanto, não é este o entendimento vigorante
na jurisprudência, a partir do disposto no artigo 39 do CPP. O que o art. 75 da Lei n. 9.099/95 quer
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dizer é que a representação será oferecida em juízo quando ainda não ofertada perante a autoridade
policial ou Ministério Público, naqueles casos em que a audiência preliminar vá ocorrer na mesma
data do fato, quando as partes são encaminhadas imediatamente ao juízo para tentativa de
composição civil dos danos e transação (artigo 69 Lei n.
9.099/95).

Prazo – O prazo decadencial é de 6 meses contados do dia em que o ofendido ou quem tenha
qualidade para representá-lo vier a saber quem é o autor do crime (art. 38 CPP e 103 CP).
Quando morto o ofendido, o prazo começa a correr do dia do falecimento quando conhecido o
ofensor, ou do dia em que o titular do direito de representação venha a conhecer o autor do crime,
nos casos em que isso somente venha a ocorrer após a morte ou ausência do ofendido, desde que
já não tenha fluído para o falecido, evidentemente.
O direito de representação dos familiares do ofendido, pois, independeria, no que diz respeito
ao prazo, do direito do próprio ofendido. Os familiares do art. 24, § 1º, pois, teriam também 6 meses
para ofertarem a representação. Parte da doutrina, entretanto, argumenta que, com a morte de um
legitimado (ex.: cônjuge), o direito de representação transfere-se ao próximo por sucessão (ex.:
ascendente), sub-rogando-se o novo legitimado ao direito do legitimado anterior. Segundo esse
entendimento, o prazo decadencial continuaria a fluir, restando ao novo legitimado apenas a parcela
de prazo que ainda faltava escoar com relação ao legitimado anterior.
A partir da entrada em vigor do novo Código Civil, não tem mais aplicação os artigos 34 e
50, parágrafo único, do CPP, no que diz respeito ao curador ao menor entre 18 e 21 anos de idade.
Da mesma forma, a Súmula 594 do STF está prejudicada para os fatos contra ofendido entre 18 e 21
anos de idade (estabelecia que os direitos de queixa e representação podiam ser exercidos,
independentemente, pelo ofendido ou por seu representante legal”, quando aquele fosse menor entre
18 e 21 anos).
Entretanto, quando o ofendido é menor de 18 anos, a Súmula deve prosseguir sendo aplicada,
pois os prazos são individuais. Do menor, começará a correr após os 18 anos. Neste caso, não da
data em que tomar conhecimento de quem é o autor do fato, mas da data em que implementar 18
anos. Mesmo que tenha contado o fato ao representante legal antes dos 18 anos, o ofendido, ao
completar 18 anos de idade poderá exercer pessoalmente o direito, que somente inicia a partir de
então. Damásio e Tourinho, entretanto, entendem diferentemente, apregoando que o direito de
representação é um só. Se o representação legal do menor souber do fato antes dos 18 anos do
ofendido e para ele decair, o ofendido, ao completar 18 anos, não poderá mais exercer o direito de
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representação. Não é a posição que se extrai da Súmula 594 do STF. Segundo esta Súmula, os
prazos são distintos, nada impedindo que o ofendido, quando completar 18 anos, exerça o direito de
representação (ou queixa). É o entendimento majoritário.
De qualquer sorte, o prazo decadencial é contado conforme o artigo 10 do CP, incluindo na
contagem o dia do começo.

Irretratabilidade da representação – A representação é irretratável após o oferecimento da


denúncia (art. 25 do CPP e art. 102 CP). Portanto, oferecida a denúncia, a representação é
irretratável. A retratação da representação não se confunde com a retratação do ofensor (crimes
contra a honra) prevista no art. 107, VI, CP.
A retratação da retratação é possível segundo a jurisprudência. Na doutrina, Capez e
Tourinho Filho não a admitem. Entretanto, mesmo na doutrina é majoritário o entendimento de que é
cabível.

Renúncia à representação – Na Lei n.º 9.099/95, por meio da composição civil dos danos
homologada pelo Juiz de Direito, ocorre a renúncia ao direito de representação (artigo 74, § ún., e
79). Quando a infração for cometida por mais de um dos agentes (ex.: lesões corporais leves
praticadas por dois ou mais contra a mesma vítima), pode ocorrer composição civil dos danos
somente com algum dos agressores. Neste caso, a renúncia somente valerá contra este, não
ocorrendo contra os demais. Contra estes, poderá haver representação. Quanto houver várias
vítimas, a composição feita por uma delas não representa renúncia por parte das demais que não
compuseram o dano.
Além disso, com a entrada em vigor da Lei n.º 11.340/06 (Mª da Penha), há previsão no artigo
16 no sentido de que a renúncia à representação da ofendida somente poderá ocorrer em juízo, em
audiência especialmente designada para tanto. Por isso, também em crimes de violência doméstica
e familiar contra a mulher, surgiu o fenômeno da renúncia ao direito à representação, porém somente
perante o Juiz. De qualquer forma, pode-se entender que a expressão renúncia à representação
utilizada nesta Lei é inadequada. Renuncia-se a algo ainda inexistente. Não se pode renunciar ao
direito já exercido (no caso, a representação já ofertada). Por isso, melhor é entender que a expressão
correta na Lei n.º 11.340/06 é retratação da representação, porquanto já teria havido a representação
e a vítima pode retratar-se em juízo, até ANTES DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA neste caso. É
uma exceção.

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Portanto, existe no Brasil, o fenômeno da renúncia ao direito de representação, mas somente
nesses casos. Quando ocorrer, extingue a punibilidade (art. 107, inc. V, do CP)

8.2. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REQUISIÇÃO DO MINISTRO DA JUSTIÇA.

A ação penal é pública, mas depende de requisição do Ministro da Justiça para o Ministério
Público agir.
A requisição é um ato de conveniência política.
Requisição é autorização, não exigindo forma especial. Não vincula o Ministério Público.
O seu conteúdo deve informar, ao menos, dados sobre a exposição dos fatos e sua autoria.
Diferentemente da representação, não há previsão quanto ao prazo para o seu oferecimento.
Assim, não há que se falar em prazo decadencial. O Ministro da Justiça poderá ofertá-la enquanto
não houver a prescrição.
Quanto à possibilidade de retratação, há duas correntes. Uma admitindo-a, aplicando-se
por analogia os dispositivos relativos à retratação da representação. Neste sentido, Jorge Alberto
Romeiro e Guilherme Nucci. Outra, não a admitindo, pois não há previsão legal acerca da retratação
da requisição, ao contrário da representação. Neste sentido, Capez e Tourinho Filho.
Ocorre em crimes cometidos por estrangeiro contra brasileiro, fora do Brasil (CP, art. 7º, § 3º,
“b”), crimes contra a honra de chefe de governo estrangeiro e do Presidente da República (CP, art.
141 I, c/c 145, § ún.), crimes contra chefe de Estado ou governo estrangeiro ou seus representantes
diplomáticos (art. 23, I, c/c o art. 40, I, “a”, Lei n.º 5.250/67).

9. AÇÃO PENAL PRIVADA

Conceito - É aquela em que o Estado, titular exclusivo do jus puniendi, delega a legitimidade
para a demanda penal à vítima ou seu representante legal por razões de política criminal.
Justifica-se a sua existência para evitar que o streptus judicii (transtorno ou escândalo do
processo) proporcione à vítima um mal ainda maior do que a impunidade do criminoso, decorrente
da não-propositura da ação penal.

Princípios –

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a) Princípio da oportunidade ou conveniência: O ofendido tem a faculdade de propor ou
não a ação penal conforme sua conveniência, contrariamente à ação penal pública. Contrapõe-se ao
princípio da obrigatoriedade. Por isso, se a autoridade policial constatar a ocorrência de uma situação
de flagrante delito, somente poderá proceder se houver autorização do particular ofendido. Deste
princípio resultam a renúncia e a decadência.

b) Princípio da disponibilidade: a decisão de prosseguir ou não com a demanda é do


ofendido. O titular poderá dispor da ação penal, mesmo após a sua propositura, por meio do perdão
e da perempção. Deste princípio, resultam os institutos do perdão e da perempção.

c) Princípio da indivisibilidade: estabelecido no artigo 48 do CPP, prevê que o ofendido


pode escolher se propõe ou não a ação. Não pode, entretanto, escolher dentre os ofensores qual
será processado. Ou processa todos ou nenhum. Deste princípio, resultam os institutos do perdão e
da renúncia.

Exceções ao princípio da indivisibilidade:

a) o perdão recusado por algum dos querelados faz prosseguir a ação contra aquele que
recusou;
b) Acordo cível com um e não com os demais autores nos Juizados Especiais Criminais.
Permite a ação penal contra aqueles que não efetuaram o acordo.
c) Não identificação de todos os autores quando da propositura da queixa.
d) Quando ocorrer a extinção da punibilidade com relação a um dos autores do crime e
não com referência ao outro.

Cabe ao Ministério Público zelar pela indivisibilidade da ação penal.


Há três entendimentos acerca da possibilidade de o Ministério Público poder aditar a queixa-
crime para acrescentar algum dos acusados não processados pelo querelante. A) Capez, por
exemplo, entende que não pode, devendo ser rejeitada em virtude da ocorrência de renúncia tácita
no tocante aos não incluídos, porquanto esta causa extintiva da punibilidade se comunica aos
querelados (art. 49 CPP). Posição do STF, no informativo 354. B) Tourinho Filho, por sua vez, admite
que o Ministério Público possa aditar a queixa para incluir algum querelado, com base no art. 46, §
2º, CPP. No mesmo sentido, STJ, RSTJ, 12/153. C) O Ministério Público deveria suscitar a omissão,
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de forma a abrir a oportunidade para que o querelante possa proceder, por conta própria, ao
aditamento da queixa. Somente diante da nova inércia, haveria a renúncia, que se estende aos
demais porventura processados.
Situação diversa é quando da propositura da ação penal privada não se tenha ainda
identificados todos os autores. Neste caso, admite-se que o querelante possa, após ter oferecido a
queixa, aditá-la, pois a omissão não foi por ele provocada. Aqui reside uma exceção ao princípio
da indivisibilidade da ação penal privada.

e) Princípio da intranscendência: a ação penal somente pode ser proposta contra o autor
ou partícipe da infração cometida, não podendo atingir quaisquer outras pessoas. Aliás, princípio
consagrado na Constituição (art. 5º, XLV).

Espécies de ação penal privada:

a) Ação privada personalíssima – somente poderá ser promovida pelo próprio ofendido,
sem que, por sua morte ou ausência, o direito seja estendido aos sucessores do artigo 31 do CPP.
Atualmente, apenas o delito de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento ao
casamento (art. 236, par. Ún., CP) é de ação penal privada personalíssima. O adultério (art. 240 CP)
foi revogado.
Na hipótese de ofendido incapaz, menor de 18 anos ou em razão de enfermidade mental, a
queixa não poderá ser exercida, em virtude da incapacidade processual e a impossibilidade de o
direito ser exercido por representante legal ou curador especial nomeado pelo juiz. Neste caso, a
decadência não corre contra o ofendido pois está impedido de exercer o direito de que é titular.
Deverá aguardar a cessação de sua incapacidade.

b) Ação penal exclusivamente privada ou propriamente dita (artigos 30 e 31 CPP) – é a


ação penal privada tradicional, que pode ser exercida pelo ofendido se maior de 18 anos e capaz, ou
por seu representante legal, se menor de 18 anos, ou no caso de morte ou declaração de ausência,
pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

c) Ação penal privada subsidiária da pública (artigos 29 CPP, 100, § 3º, CP e 5º, LIX CF)
– proposta quando o Ministério Público deixar de exercer o direito de ação no prazo legal e mantiver-

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se inerte. É a única exceção, inclusive prevista na Constituição Federal, à ação penal pública
condicionada ou incondicionada.

Constitui-se em uma mitigação ao artigo 129, I, da CF, que institui a ação penal pública com
titularidade exclusiva para o Ministério Público.

Somente é cabível na hipótese de inércia do Ministério Público, jamais quando ocorrer


promoção de arquivamento ou diligências. Neste sentido, veja-se a Súmula 524 do STF, segundo a
qual “Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não
pode a ação penal ser iniciada sem novas provas”. Em uma única ocasião o STJ admitiu a propositura
da ação penal privada subsidiária em caso de arquivamento do inquérito pelo Ministério Público
(REsp 30-0/CE, DJU, 14 dez. 1992, p. 23875). Entretanto, trata-se de posição isolada, que foi
inclusive reformada pelo STF.
O prazo para a propositura da queixa-crime é de seis meses, contados do espiramento do
prazo para o Ministério Público, por analogia ao artigo 38 do CPP. Em se tratando de crimes
falimentares ou de recuperação judicial de empresas, o prazo também é de 6 meses, conforme agora
previsto no artigo 184, § ún., da Lei 11.101/05.

d) Ação penal privada concorrente - Nos crimes contra a honra, conforme dispõe o artigo
145 do Código Penal, quando cometidos contra funcionários públicos em razão do exercício de sua
função, a ação penal é pública condicionada à representação. Entretanto, é pacífico o entendimento
na jurisprudência no sentido de que pode o funcionário público, neste caso, optar entre representar
ou oferecer queixa-crime. Esta posição, aliás, gerou a Súmula 714 do STF.

e) Ação penal secundária – trata-se de expressão cunhada por Fernando Capez nas
hipóteses em que o legislador prevê determinada natureza de ação penal para algum delito, mas
diante do surgimento de circunstâncias especiais, admite outra natureza. Exemplo é os crimes contra
os costumes. Lá, a regra é que a ação penal seja privada. No entanto, se a vítima ou seus
responsáveis forem pobres, dependerá de representação. Se o autor do delito abusar da relação do
poder familiar (pai ou mãe), for tutor, curador ou padrasto, a ação penal é pública incondicionada. Se
o estupro ou o atentado violento ao pudor forem cometidos com violência real, a ação é pública
incondicionada (Súmula 608 STF). Outro exemplo seria crimes contra a honra (art. 145). A ação penal
é privada, mas na injúria real com lesões é pública incondicionada.
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Prazo da ação penal privada:

O prazo para o exercício do direito de queixa é de seis meses contados do dia em que vierem
a saber quem foi o autor do crime (art. 38 CPP).
Exceções:

a) no crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento para o casamento


(art. 236, § ún.), é de seis meses contados a partir do trânsito em julgado da sentença que, por motivo
de erro ou impedimento, anule o casamento).
i) nos crimes de ação penal privada contra a propriedade imaterial que deixarem
vestígios, sempre que for requerida a prova pericial. Conforme os artigos 529 e 530 do CPP, o prazo
para a propositura da queixa crime é de 30 dias se réu solto e 8 se réu preso, respectivamente,
contados da homologação pelo Juiz do laudo pericial. Há muita divergência acerca do tema. Uma
corrente entende que este é o prazo decadencial nos aludidos crimes, na medida em que o artigo 38
do CPP e 103 do CP definem ser de 6 meses o prazo decadencial como regra, salvo disposição
expressa em contrário. Outra corrente, por sua vez, majoritária, entende que o prazo decadencial em
delitos dessa natureza continua sendo aquele do art. 38 do CPP e 103 do CP, isto é, seis meses
contados do conhecimento de quem é o autor do fato pela vítima, sendo que o prazo de 30 ou 8 dias
dos artigos 529 e 530 do CP representariam apenas a validade da perícia homologada pelo Juiz.
Entretanto, o querelante deveria exercer o direito de queixa dentro dos seis meses. Isso para que o
prazo decadencial não fique ao alvedrio do querelante, na medida em que não há prazo previsto para
ele requerer em juízo a perícia. Discute-se, ainda, se o prazo dos artigos 529 e 530 do CPP contam-
se a partir da homologação pelo Juiz ou da intimação do querelante. A partir do disposto no artigo
798, § 5º, CPP, entende-se majoritariamente que devem ser contados da intimação.

O prazo decadencial pode ser exercido pelo ofendido ou representante, quando menor de 18
anos ou incapaz. Não se cogita mais de relativamente capaz entre 18 e 21 anos, a partir do Código
Civil em vigor. Com isso, os artigos 34 e 50, § ún., CPP, estão sem efeito. A Súmula 594 do STF, da
mesma forma. Quanto à Súmula, apenas permanece em vigor se a sua leitura for no sentido de que
os prazos são distintos, para o menor de 18 anos inicia-se quando implementar esta idade. Enquanto
isso, somente seu representante pode exercer o direito de queixa.
O artigo 35 do CPP, que exigia autorização do marido para a mulher casada intentar a queixa,
foi revogado pelo art. 226, § 5º, da CF e pela Lei n.º 9.520/97.
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No caso de morte ou ausência do ofendido, o prazo decadencial de seis meses começará a
correr a partir da data em que qualquer dos sucessores elencados no art. 31 do CPP tomar
conhecimento da autoria (art. 38, § ún., CPP), salvo se, quando a vítima morreu, já havia se operado
a decadência.
O prazo decadencial cessa pelo oferecimento (protocolização) da queixa, e não da data de
seu recebimento (STF RHC 63.665).
O prazo para a propositura da queixa-crime na ação penal privada subsidiária da pública é de
seis meses, contados do esgotamento do prazo para o Ministério Público, por analogia ao artigo 38
do CPP. Em se tratando de crimes falimentares ou de recuperação judicial de empresas, o prazo
também é de 6 meses, conforme agora previsto no artigo 184, § ún., da Lei 11.101/05.
O pedido de instauração de inquérito policial não interrompe o prazo decadencial.
Aliás, o prazo decadencial, por natureza, não se interrompe ou suspende.

A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do
instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, exceto quando
esses esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas ao Juiz.
(artigo 44 CPP).

Legitimidade para oferecer queixa-crime:

Artigos 30 CPP – O ofendido ou quem tenha capacidade para representá-lo.

Artigo 31 CPP – No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão
judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente
descendente ou irmão.

Artigo 36 CPP – A ordem do artigo 31 é de precedência.

Renúncia à ação penal privada artigos 49 e 50 CPP e 104 e 105 CP

O direito de queixa pode ser objeto de renúncia.


A renúncia consiste na manifestação de vontade do ofendido por meio da qual ele desiste de
exercer seu direito de ação.
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A renúncia pode ser tácita ou expressa.
A renúncia expressa pode ser exercida pelo ofendido, seu representante legal ou
procurador com poderes especiais para tanto (art. 50 CPP).
A renúncia tácita ocorre quando o titular da ação portar-se de forma inequivocamente
incompatível com a vontade de ajuizá-la (art. 104, par. Ún., CP). A prova da renúncia tácita pode ser
feita por qualquer meio lícito (art. 57 CPP).
O art. 104 do CP dispõe que a aceitação de reparação pecuniária pelos danos causados pelo
crime não implica renúncia tácita. Entretanto, este dispositivo encontra exceção nos Juizados
Especiais Criminais, a partir do disposto no art. 74, par. ún., da Lei n.º 9.099/95, uma vez que a
composição dos danos civis, homologada pelo Juiz, eqüivale à renúncia ao direito de queixa ou
representação. Ainda com relação aos Juizados Especiais Criminais, se a infração houver sido
cometida por diversos agentes, a composição civil dos danos somente implica renúncia com
referência ao autor que houver concordado em reparar o dano, exceto se houver reparação integral.
Desta forma, também quando houver pluralidade de vítimas, o acordo civil celebrado por uma delas
para obter a indenização do dano que lhe cabe não impedirá a outra a exercer seu direito de
representação ou queixa.
A renúncia é ato unilateral, dispensando aceitação do autor da infração.
Deve ocorrer antes do início da ação penal. É impossível renunciar ao direito já exercido.
A renúncia extingue a punibilidade (art. 107, V, CP).
A renúncia com relação a um dos autores do crime a todos aproveitará (art. 49 CPP). Esta
previsão é corolário do princípio da indivisibilidade. Exceção: acordo cível no Juizado Especial
Criminal com apenas um dos autores do crime. Pode prosseguir contra os demais.
A renúncia pode ser exercida pelo ofendido capaz. Em vista do novo Código Civil, o par. ún.
do art. 50 do CPP não tem mais aplicação, pois inexiste a figura do menor a partir dos 18 anos de
idade.
Não existe renúncia em ação penal privada subsidiária da pública.

Perdão do ofendido:

Consiste na desistência da ação penal pelo autor após a sua propositura. Não existe perdão
antes da propositura da ação penal.
Diversamente da renúncia, o perdão não é ato unilateral, é bilateral. Uma vez ajuizada a ação
penal, o querelado tem o direito de ser processado até sentença final, pois tem legítimo interesse em
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provar sua inocência. Por isso, o perdão somente produzirá efeitos quando aceito (art. 107, inc. IV,
final, CP, e 51 CPP).
O perdão somente tem cabimento na ação penal privada exclusiva (art. 105 CP), jamais na
ação penal privada subsidiária da pública.
Seu fundamento é a disponibilidade da ação penal privada.
O perdão do querelante não se confunde com o perdão judicial, concedido por sentença (ex.:
art. 121, § 5º, CP).

a) forma: pode ser expresso ou tácito. Expresso quando assinado pelo próprio querelante,
seu representante legal ou procurador com poderes especiais. Tácito quando resultar da prática de
ato inequivocamente incompatível com a vontade de prosseguir na ação (art. 106, par. 1º, CP). O
perdão pode ser processual ou extraprocessual.

b) indivisibilidade: em consonância com o princípio da indivisibilidade, o perdão


concedido a um dos querelados aproveitará a todos (art. 51, primeira parte, do CPP, e art. 106, I, do
CP), sendo vedado ao querelante desistir da ação penal apenas em relação a alguns dos querelados.
O perdão, entretanto, não produzirá efeitos quanto ao querelado que o recusar (art. 51, final,
CPP e 106, III, do CP).
Havendo diversas vítimas, o perdão concedido por um dos ofendidos não prejudica o direito
de ação dos demais (art. 106, II, do CP).

c) aceitação: Uma vez concedido, por meio de declaração expressa do querelante nos
autos, o querelado será intimado a manifestar-se, no prazo de 3 dias, dizendo se o aceita ou não (art.
58, “caput”, do CPP).
Da mesma forma como o perdão, a aceitação pode ser processual ou extraprocessual. Em
ambos os casos, entretanto, para que produza efeito extintivo da punibilidade, sua ocorrência deverá
ser demonstrada nos autos. Por isso, o art. 59 do CPP estabelece que a aceitação do perdão por
parte do querelado, quando fora dos autos, deverá ser comprovada por intermédio de declaração
assinada pelo querelado, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais. Isso
quando a aceitação for expressa. Quando tácita, ocorrerá se o querelado deixar de se manifestar no
tríduo legal.
Se o querelado for mentalmente enfermo ou portador de desenvolvimento mental incompleto,
e não tendo representante legal, havendo colidência de interesses entre o querelado e quem o
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represente, competirá ao juiz nomear-lhe curador especial para que decida acerca da aceitação do
perdão (art. 53 CPP).

Querelante e querelado menores de idade: Dispõem os artigos 52 e 54 do CPP acerca do


querelante ou o querelado serem menores de 21 anos e maiores de 18 anos. Quanto ao querelante,
o perdão poderia ser concedido por ele ou seu representante legal, mas o perdão concedido por um,
havendo oposição do outro, não produziria efeito (art. 52). Quanto ao querelado, o mesmo ocorre
quanto à aceitação do perdão (art. 54).
Entretanto, parcela majoritária da doutrina entende que, com o advento do novo Código Civil,
tais dispositivos não são mais aplicados, em virtude da plena capacidade aos 18 anos.
Para outros, entretanto, o artigo 52 não se refere à maioridade, mas apenas menciona os
limites de idade para os quais haveria necessidade de representação legal. Persistem, pois, em vigor.
É posição minoritária.

Perempção:

Consoante a doutrina, perimir significa genericamente “matar”, “destruir”, extinguir.


Há, em síntese, duas espécies de perempção. Uma, quando o autor da ação penal privada a
abandona. Outra, quando o autor da ação penal privada desaparece, sem que alguém lhe suceda.
Sempre, a perempção é causa extintiva da punibilidade (art. 107, IV, CP).
Somente pode ocorrer após iniciada a ação penal.
Somente ocorre nas ações privadas exclusivas, inexistindo na ação penal privada subsidiária
da pública.
No artigo 60 do CPP, há quatro hipóteses de perempção:

I – Quando, iniciada a ação penal, o querelante deixar de promover, injustificadamente,


o andamento do processo durante 30 dias consecutivos. Ocorre o abandono.

II – Quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer


em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 dias, qualquer das pessoas a quem
couber fazê-lo (rol dos arts. 31 e 36 do CPP). Não há necessidade de intimação dos sucessores,
contando-se o prazo da data em que ocorrer o falecimento ou em que sobrevier a incapacidade do
querelante. Quando a incapacidade do querelante decorrer da ausência, caberá prosseguir na ação
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as pessoas indicadas no art. 31 do CPP. Se a incapacidade decorrer de outras causas, caberá ao
representante legal prosseguir no feito.

III – Quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do
processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações
finais.
Neste caso, há divergências quanto ao não-comparecimento do querelante à audiência
preliminar a que alude o artigo 520 do CPP, no procedimento especial para crimes contra a honra
que não são da competência dos Juizados Especiais Criminais (art. 138, c/c 141, 140, § 3º, e nas
hipóteses de violência doméstica ou familiar contra a mulher, art. 7º, IV, Lei 11.340/06). Há uma
corrente que entende ocorrer perempção, pois essa audiência seria um ato relativo ao processo,
configurando condição de procedibilidade da ação. É majoritária ainda. Outra, entende que a aludida
audiência ocorre em momento anterior à própria propositura da ação penal, não constituindo ato
processual. Assim, não haveria perempção. STF HC 31028-MT. STJ HC 32577, 05/08/04.

IV – Quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.
Se existir sucessor, terá este o prazo de 60 dias para, substituindo o querelante extinto, assumir a
ação.

Decadência:

Como regra geral, estatuída nos artigos 38 do CPP e 103 do CP, o prazo decadencial é de 6
meses contados do momento em que a vítima tomou conhecimento acerca de quem é o autor do fato
para o exercício do direito de queixa ou representação.
O mesmo se pode dizer para o exercício do direito de queixa crime subsidiária à denúncia,
quando se conta o prazo do dia em que se esgotar o prazo legal para que o Ministério Público ofereça
a inicial acusatória.

Exceções:

a) induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento ao casamento, quando o


prazo será de 6 meses contados da data em que transitar em julgado a sentença que, por motivo de
erro ou impedimento, anular o casamento (art. 236, par. Ún., CP).
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b) Crimes contra a propriedade imaterial sujeitos a ação privada. Há divergência se o prazo
dos artigos 529 e 530 (30 dias réu solto e 8 réu preso), contados da homologação da perícia por
sentença, é prazo decadencial ou prazo de validade da perícia. Na doutrina, prevalece que o prazo
é de 6 meses (art. 38 CPP e 103 CP). No STJ 30 ou 8 dias. Resp 336553-SP – 20/02/03, RT 814/566.
RHC 11848-SP 7/02/02, RT 801/480.

O prazo decadencial é fatal, não se interrompe nem suspende.


Conta-se conforme o artigo 10 do CP, computando-se o dia do início.
Considera-se exercido o direito de queixa quando da distribuição do feito, e não da data
do despacho que determina o recebimento da peça inicial.
Nos crimes continuados, o prazo será apreciado em relação a cada delito, de forma
individualizada. É divergente. Outra posição: quando do último delito.
Nos crimes habituais, o prazo será contado a partir do último ato praticado conhecido pelo
ofendido.
Nos crimes permanentes, conta-se o prazo a partir da ciência, por parte da vítima, de quem
seja o seu autor, e a partir da data dos fatos posteriores a essa ciência se persistirem os efeitos da
infração (sua permanência).

RESUMO SOBRE DECADÊNCIA, PERDÃO, RENÚNCIA E PEREMPÇÃO:

1) Ocorrem anteriormente ao início da ação penal – renúncia e decadência.


2) Ocorrem após o início da ação penal – perdão e perempção.
3) Atuação positiva do ofendido – renúncia e perdão.
4) Atuação negativa do ofendido – decadência e perempção.
5) O perdão é bilateral. Necessita de aceitação. É expresso ou tácito.
6) A renúncia é unilaterial. Não necessita de aceitação. É expressa ou tácita.

AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA

Artigos 29 CPP, 100, § 3º, CP e 5º, LIX da CF.

Constitui uma exceção ao princípio da titularidade exclusiva da ação penal pública do


Ministério Público, no artigo 129, I CF.
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Somente é admitida quando da inércia do Ministério Público dentro do prazo legal em exercer
a ação penal pública.
Não cabe quando promovido o arquivamento ou requeridas/requisitadas diligências.

Ofertada queixa-crime subsidiária, o Ministério Público pode (art. 29 CPP):

a) aditar a queixa;
b) repudiá-la;
c) oferecer denúncia substitutiva.

No transcurso da ação penal, pode o Ministério Público intervir em todos os termos do


processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência
do querelante, retomar a ação como parte principal.
Na ação privada subsidiária da pública não ocorrem os efeitos do perdão e da perempção.

EMENDATIO LIBELLI

Previsão legal - Art. 383 CPP: O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da que
constar da queixa ou da denúncia, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave.

Os fatos estão corretamente narrados na denúncia ou queixa, mas o juiz, na sentença,


entende que o tipo penal imputado não corresponde aos fatos narrados.
Neste caso, o juiz pode operar de ofício a alteração da capitulação na sentença, mesmo que
ocorra a aplicação de pena mais grave. O réu se defende dos fatos, e não da capitulação jurídica
descrita. O juiz apenas corrige a capitulação, pois os fatos estão corretamente narrados.
Exemplo: fatos narrados corresponderem a um roubo e a capitulação ocorrer erroneamente
no artigo da extorsão (art. 158 CP). Fatos corresponderem a roubo e a capitulação ser feita
erroneamente com base no furto.

MUTATIO LIBELLI

Base legal – art. 384 e par. Único CPP:

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Art. 384. Se o juiz reconhecer a possibilidade de nova definição jurídica do fato, em
conseqüência de prova existente nos autos de circunstância elementar, não contida, explícita ou
implicitamente, na denúncia ou na queixa, baixará o processo, a fim de que a defesa, no prazo de 8
dias, fale e, se quiser, produza prova, podendo ser ouvidas até três testemunhas.
Par. Ún. Se houver possibilidade de nova definição jurídica que importe aplicação de pena
mais grave, o juiz baixará o processo, a fim de que o Ministério Público possa aditar a denúncia ou a
queixa, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, abrindo-
se, em seguida, o prazo de 3 dias à defesa, que poderá oferecer prova arrolando até três
testemunhas.

Agora, trata-se de nova definição jurídica, em conseqüência de fato não narrado na denúncia,
explicita ou implicitamente. Exemplo: Em um processo por furto com descrição de fatos imputando
furto ao réu, surgirem provas da ocorrência de grave ameaça ou violência para subtrair,
caracterizando o roubo.

CONSEQÜÊNCIAS:

a) Se a nova definição jurídica acarretar a diminuição da pena ou a sua manutenção em


igual patamar, basta ao juiz, por ocasião da sentença, baixar os autos à defesa a fim de que se
manifeste no prazo de 8 dias e, se desejar, produza prova (inclusive testemunhal – até 3
testemunhas) (art. 384, “caput”);

b) Se a nova definição jurídica acarretar aumento da pena, o juiz deverá intimar o Ministério
Público a tomar as providências que entender cabíveis, isto é, o aditamento da denúncia. Após, abrir
prazo de 3 dias à defesa para oferecer provas e arrolar até 3 testemunhas. Neste caso, o aditamento
é obrigatório, não podendo o juiz corrigir a nova imputação sem esta providência, sob pena de
nulidade. Se o Ministério Público não promover o aditamento, o juiz deve absolver o réu. (art. 384,
par. Ún.).

Pode ocorrer que a mutatio libelli leve à modificação da competência para o processo e
julgamento. Ex.: lesões dolosas leves (JECrim) para lesões graves (juízo comum).
A inobservância das formalidades do parágrafo único do art. 384 do CPP leva à nulidade da
sentença condenatória.
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Se a necessidade de alteração prevista no art. 384, par. Único, CPP, der-se em grau recursal,
no Tribunal, não poderá ocorrer, devendo o Tribunal absolver o réu, não podendo anular a sentença.
Sumula 453 STF – Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do CPP, que
possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não
contida explicita ou implicitamente na denúncia ou queixa. Entretanto, esta súmula não se aplica aos
processos de competência originária dos Tribunais (ex.: foro privilegiado).

RATIFICAÇÃO DA DENÚNCIA

Nas hipóteses de deslocamento da competência, é possível ocorrer que a denúncia seja


ratificada, dispensando o oferecimento de nova inicial acusatória. Isso porque a nulidade processual
decorrente da incompetência do juízo não atinge a denúncia, mas o despacho que a recebe. Há,
inclusive, recente julgado do STF dispensando até a ratificação da denúncia oferecida por membro
do Ministério Público Federal com atuação em seção judiciária diversa. 4

NÃO-RECEBIMENTO E REJEIÇÃO DA DENÚNCIA OU QUEIXA – RECURSO CABÍVEL

Reina grande divergência na jurisprudência e doutrina acerca do recurso cabível quando do


não-recebimento ou rejeição da denúncia ou queixa.
Com efeito, a inobservância dos requisitos formais do artigo 41 do CPP leva ao não-
recebimento. Quando ocorrerem as hipóteses do artigo 43 do CPP (requisitos substanciais), ocorrerá
a rejeição.
Parte da doutrina e jurisprudência apregoa que contra a rejeição cabe apelação. Contra o não-
recebimento, recurso em sentido estrito (art. 581, inc. I, CPP). Esta é, por exemplo, a posição da
jurisprudência do Rio Grande do Sul.
Prova disso são os Juizados Especiais Criminais. O artigo 82 da Lei n.º 9.099/95, por sua
vez, também prevê apelação contra a rejeição da denúncia ou queixa.
Entretanto, no âmbito da Justiça Federal, é uníssono o entendimento no sentido de que,
tanto quando da rejeição quanto no não-recebimento, cabe recurso em sentido estrito (art. 581, I,
CPP). Veja-se que o STJ tem posição firmada nesse sentido: Resp 184477/DF, 5ª Turma,
19/02/2002.

4STF – HC 85.137-MT, Primeira Turma, 13/09/2005.


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Importante observar que, caso tenha sido interposto recurso contra a decisão que não recebeu
ou rejeitou a denúncia ou queixa, a intimação do denunciado é obrigatória para as contra-razões,
sob pena de nulidade. Nesse sentido, Súmula n.º 707 do STF.

SUMULA 608 DO STF

“No crime de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.”

Por primeiro, relevante destacar que esta súmula tem sido aplicada, pacificamente, por
analogia, ao crime de atentado violento ao pudor.

Ademais, a sua existência funda-se na interpretação do Supremo Tribunal Federal no sentido


de que os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, com violência real, são delitos complexos
“lato sensu”, e não em sentido estrito. Isso porque, além de ser crime (estupro ou atentado violento
ao pudor), contêm eles outros delitos, tais como lesões corporais e constrangimento ilegal. Na
hipótese, mesmo que as lesões corporais de natureza leve passaram a depender de representação
(artigo 88 da Lei n.º 9.099/95), ainda assim haverá o delito de constrangimento ilegal, que é de ação
penal pública incondicionada.
De qualquer sorte, estupro e atentado violento ao pudor com vias de fato (violência real), não
haverá a incidência da aludida súmula, que apenas se aplica a partir das lesões corporais de natureza
leve.

DELITO DE INJÚRIA REAL COM LESÕES CORPORAIS DE NATUREZA LEVE

O delito de injúria real (art. 140, § 2º) com violência (lesões corporais), consoante dispõe o
artigo 145 do Código Penal, é de ação penal pública incondicionada. Observar, com cuidado, que
injúria real com vias de fato, portanto, é delito de ação penal privada (art. 145).
Ocorre que, a partir da entrada em vigor do artigo 88 da Lei n.º 9.099/95, que estabelece a
ação penal pública condicionada à representação para o delito de lesões corporais de natureza leve,
passou-se a questionar se o delito de injúria real com lesões leves também seria de ação penal
pública condicionada à representação. Nesse sentido, Fernando Capez e Bitencourt entendem que
a injúria real com lesões leves é delito de ação penal pública condicionada à representação.
Guilherme de Souza Nucci, por sua vez, entendendo que é crime complexo, sustenta que continua
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sendo delito de ação penal pública incondicionada. Entende que deve haver alteração legislativa. Os
demais autores silenciam.

LEI n.º 11.340, de 07/08/2006 (VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER)

Em 07 de agosto de 2006, surgiu a Lei n.º 11.340, que criou mecanismos para coibir a violência
doméstica e familiar contra a mulher.

No artigo 5º, define que configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação
ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico
e dano moral ou patrimonial:
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio
permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que
são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido
com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação
sexual.

Portanto, definido o âmbito em que ocorre.

No artigo 7º, encontramos estabelecidas quais são as formas de violência doméstica e familiar
contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou
saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano
emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou
que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz,
insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio
que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
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III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar,
a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou
uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto
ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o
exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção,
subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos
pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas
necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia,
difamação ou injúria.

Pois bem.

Na Lei n.º 11.340/06, não há qualquer previsão acerca do procedimento a ser adotado nas
hipóteses de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Entretanto.

O artigo 41 estabelece questão fundamental:

Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher,
independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.

Ou seja. Todos os delitos que configurarem violência doméstica e familiar contra a mulher
(violência física: lesões corporais; violência sexual: estupro, atentado violento ao pudor, posse sexual
mediante fraude, atentado ao pudor mediante fraude, assédio sexual, corrupção de menores,
seqüestro ou cárcere privado; violência patrimonial: delitos contra o patrimônio; violência moral:
calúnia, difamação ou injúria), isto é, artigo 5º combinado com o artigo 7º, não serão da
COMPETÊNCIA dos Juizados Especiais Criminais, mas sim do Juízo Criminal Comum. No Juízo
comum, não poderão ser aplicados os benefícios da composição dos danos civis, transação e

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suspensão condicional do processo, pois todos previstos na Lei n.º 9.099/95. Em síntese, é VEDADA
a aplicação da Lei n.º 9.099/95 aos delitos de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Exemplo: lesões corporais entre sogra e nora.


Crimes de calúnia, difamação e injúria contra a mulher nos ambientes do artigo 5º.
Crimes contra o patrimônio da mulher, nos ambientes do artigo 5º.
Crimes contra a liberdade sexual da mulher nos ambientes do artigo 5º.

Outra questão que merece reflexão diz respeito à AÇÃO PENAL.

O artigo12 estabelece que:

Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro
da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem
prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:

I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se


apresentada;

Em complemento, o artigo 16 define:

Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata
esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.
Ora. Passaram os delitos tipificados como violência doméstica e familiar a depender de
representação da ofendida?

Aparentemente, sim.
Qual o sentido de a autoridade policial, nas hipóteses de violência doméstica e familiar dever
colher a representação da ofendida se não passaram a depender de representação? Qual o sentido
de haver previsão quanto ao direito de representação somente poder ocorrer em juízo, em audiência
especial?

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Sendo dependentes de representação, pode-se imaginar a seguinte hipótese: calúnia,
difamação e injúria entre sogra e nora, do genro contra a sogra, entre mãe e filha, do marido contra
a mulher, agora dependem de representação.
Furto de filho contra a mãe, a avó, bisavó, do marido contra a esposa, do companheiro contra
a companheira, do ex-companheiro contra a ex-companheira agora dependem de representação.
Desta forma, certamente está alterado o artigo 181 do Código Penal que prevê imunidade material
absoluta em crimes contra o patrimônio (exceto se com violência ou grave ameaça, para terceiros e
se a vítima tiver idade igual ou superior a 60 anos) praticados em prejuízo entre ascendentes e
descendentes e cônjuges na constância da sociedade conjugal, desde que a vítima seja a mulher.
Passaram a depender de representação. A imunidade é agora relativa?
Todas as lesões corporais contra a mulher (do artigo 129, § 9º, graves, gravíssimas ou
seguidas de morte?), nas hipóteses de violência doméstica e familiar, agora dependem de
representação?
Todos os delitos contra a liberdade sexual contra a mulher, desde que caracterizem violência
doméstica e familiar, dependem de representação?
Certamente o legislador não imaginou tamanhas conseqüências.
Entretanto, por mais inusitadas que tais situações possam parecer, agora estão previstas em
lei.

A polêmica não tem mais sentido de existir a partir de decisão do Supremo Tribunal
Federal que, por maioria de votos, vencido o Presidente, Ministro Cezar Peluso, julgou no dia
09.02.2012 procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 4424, ajuizada pela
Procuradoria-Geral da República, quanto aos artigos 12, inc. I, 16 e 41 da Lei Maria da Penha,
entendendo que a ação penal é pública incondicionada.

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Todos os Direitos Reservados – Fundação Escola Superior do Ministério Público - FMP
Professor: Fábio Roque Sbardellotto Área: Direito Processual Penal Tema: Ação penal – Material de apoio
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