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DIREITO PROCESSUAL PENAL:

TEORIA GERAL DO PROCESSO


PROFESSOR: ENDERSON DANILO SANTOS DE VASCONCELOS

Introdução

É um conjunto de regras para a aplicação da lei penal concretamente (instrumentalização).


- busca a verdade possível; a pacificação social.
- da verdade dos fatos: busca-se reconstruir os fatos (a presunção no processo penal deve
ser demasiadamente fundamentada); princípio da presunção de inocência; prova indiciária.
. Pilares:
- materialidade do fato (prova).
- autoria.
. Fases:
- inquisitorial (inquérito policial; busca de indícios) -> denúncia (peça acusatória).
. Princípio acusatório (separação entre acusador e julgador; maior existência de contraditório
e ampla defesa) vs. inquisitorial (confusão entre acusador e julgador).

. Princípios:
Conceito: É uma norma nuclear e estruturante.
. possui função de norma genérica e de norma interpretativa.
. há princípios constitucionais explícitos e implícitos.
- Presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF): “Ninguém será considerado culpado até o
trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”
. ônus da prova (sempre da acusação, exceto em ação rescisória).
. excepcionalidade da prisão cautelar.
* in dubio pro reo (havendo dúvida razoável, decidir em favor do réu).
- Ampla defesa e contraditório (art. 5º, LV, CF): “Aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes.”
. ampla defesa: dela decorre o direito à defesa técnica (defesa processual/específica) e a
autodefesa (defesa material/genérica) direito de audiência, direito de presença/ausência,
capacidade postulatória autônoma).
* vide nemu tenetur se detegere: direito de não produzir provas contra si mesmo, que
possibilita o direito ao silêncio (mesmo que parcial/seletivo).
. contraditório: direito a intimação, manifestação e interferência.
- Juiz natural: Art. 5º, LIII, CF.
. imparcialidade;
. vedação ao juízo de exceção (ou tribunal ad hoc; p. ex., o Tribunal de Nuremberg; art. 5º,
XXXVII, CF).
* vide princípio do promotor natural.
- Identidade física do juiz: Em sentido lato, abrange a concentração e imediatidade da
instrução penal, e a identidade física estrita, conforme art. 399, § 2º: “O juiz que presidiu a
instrução deverá proferir a sentença.”
- Publicidade: O processo será público, exceto se necessário segredo de justiça. Art. 5º, LX,
CF.
. hipóteses de segredo de justiça: preservação da intimidade e interesse social.
- Duração razoável do processo: Embora não haja prazo específico (sequer doutrinário), o
caso concreto deve ter uma duração considerada razoável na dada circunstância.
- Devido processo legal (due process of law): Produção de prova, apresentação de alegações,
demonstração de inocência, convencimento do juiz etc. Art. 5º, LIV, CF.
- Vedação das provas ilícitas/ilegais (art. 5º, LVI, CF): “São inadmissíveis, no processo, as
provas obtidas por meios ilícitos.”
. prova ilícita (obtida com violação a direito material) e prova ilegítima (obtida com
desrespeito ao direito processual).
. prova ilícita por derivação:
* teoria do fruto da árvore envenenada (art. 157, § 1º): prova decorrentes da prova ilícita
estão contaminadas, desde que haja nexo causal e dependência entre elas.
* teoria da proporcionalidade ou interesse dominante (legitima defesa probatória): o
interesse no caso concreto pode superar o princípio em tela.
* serendipidade (prova achada): prova obtida incidentalmente em processo diverso é
licita.
* teoria da mancha purgada: STJ, APn 856, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial,
2017: “A teoria dos frutos da árvore envenenada tem sua incidência delimitada pela
exigência de que seja direto e imediato o nexo causal entre a obtenção ilícita de uma prova
primária e a aquisição da prova secundária. De acordo com a teoria do nexo causal atenuado
ou da mancha purgada, i) o lapso temporal decorrido entre a prova primária e a secundária;
ii) as circunstâncias intervenientes na cadeia probatória; iii) a menor relevância da
ilegalidade; ou iv) a vontade do agente em colaborar com a persecução criminal, entre outros
elementos, atenuam a ilicitude originária, expurgando qualquer vício que possa recair sobre
a prova secundária e afastando a inadmissibilidade de referida prova.”
- Proporcionalidade: É princípio implícito, materialmente contido no art. 5º, LIV, CF:
“Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.” Ou seja,
no due process of law.
. procedural due process of law (formal/processual): restrição do poder público de seguir o
correto rito processual; substantive due process of law (material): obstáculo a edição de
normas arbitrarias e irrazoáveis.
. pressupostos do p. da proporcionalidade:
- principio da legalidade (formal): medidas restritivas devem ser previstas por lei escrita,
estrita e prévia (nulla coactio sine lege).
- princípio da justificação teleológica (material): os fins da norma devem ser socialmente
relevantes para justificar a limitação.
. requisitos do p. da proporcionalidade: extrínsecos (judicialidade e motivação) e
intrínsecos/subprincípios (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito).
- Nemu tenetur se detegere: Ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo.
* aplica-se apenas a intervenções corporais/invasivas (incluindo comportamento ativo;
exs.: colher DNA diretamente do réu, força-lo a escrever carta para fins de reconhecimento
de caligrafia); mas não se aplica a comportamento passivo (exs.: reconhecimento,
reconstituição, provas materiais colhidas para além do corpo do réu).
- Correlação ou demanda: Apenas serão julgados os fatos estritamente apresentados pela
acusação. Em caso de ampliação da tese acusatória, tem-se:
. emendatio libelli: verificando-se que a tipificação não corresponde aos fatos narrados na
petição inicial, poderá o juiz, de ofício, apontar sua correta definição jurídica; os fatos
provados são exatamente os fatos narrados; art. 383.
. mutatio libelli: quando concluir que o fato narrado na inicial não corresponde aos fatos
provados na instrução processual, deve o juiz remeter o processo ao MP, que aditará a
inicial; os fatos provados são distintos dos fatos narrados; art. 384.
- Obrigatoriedade da ação penal: O MP é obrigado a propor e seguir até a sentença em
ação penal; princípio da legalidade e da indisponibilidade.
* princípio da oportunidade: princípio exclusivo da ação privada; o titular da ação penal
(ofendido/representante legal) promove-la-á se quiser, porque o Estado transferiu ao
particular o direito de acusar, em razão da fragilidade do bem atingido.
* princípio da disponibilidade: o autor de ação penal privada pode desistir dela até o
transito em julgado.
- Intranscendência/pessoalidade: Nenhuma pena deve passar da pessoa do condenado; mas
penas econômicas podem ser abatidas de espólio.
- Non bis in idem/ne bis in idem: Ninguém pode ser julgado mais de uma vez pelo mesmo
fato.
- Indivisibilidade: A ação penal deve ser proposta contra todos os autores/partícipes do
delito. Aplica-se apenas a ação penal privada, conforme jurisprudência do STJ/STF e
interpretação a contrario sensu do art. 48: “A queixa contra qualquer dos autores do crime
obrigará ao processo de todos, e o MP velará pela sua indivisibilidade.”
- Comunhão das provas/aquisição processual): Uma vez produzida, a prova é comum as
partes; pertence ao processo e não à parte que a introduziu.
- Persuasão racional (livre convencimento motivado): O magistrado é livre para formar seu
convencimento, desde que externamente fundamentados.

. Princípios explícitos (CPP):


- Territorialidade (art. 1º): O processo penal reger-se-á em todo o território brasileiro pelo
CPP, ressalvados:
I - tratados, convenções e regras de direito internacional (ex.: julgamento de chefes de
Estado/governo estrangeiros e de crimes funcionais do cônsul pela Convenção de Viena
sobre Relações Diplomáticas);
II - crimes de responsabilidade (em sentido amplo, são crimes que a qualidade de
funcionário público é elementar do delito, e em sentido estrito, aqueles que só podem ser
cometido por determinados agentes políticos; possuem caráter político);
III - processos de competência da Justiça Militar;
IV [REVOGADO] - processos da competência do tribunal especial (CF antiga);
V [REVOGADO] - processos por crimes de imprensa (Lei não recepcionada pela ADPF 130).
* há mais exceções, como crimes eleitorais, competência originária de tribunais, juizados
especiais, crimes falimentares, do EPI, LMP e Lei de drogas.
- Lei penal no tempo (art. 2º): A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da
validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.
* vide art. 6º, § 2º, LINDB: “Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular,
ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-
fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.”
* norma híbrida/heterotópica: possui caráter material e processual, devendo prevalecer,
o art. 2º, CP (retroatividade apenas benéfica ao acusado; ex.: prisão, liberdade provisória;
progressão).
* vigência: está produzindo efeitos; vacância: intervalo entre publicação e produção de
efeitos; revogação: pode ser expressa ou tácita e total ou parcial; repristinação: vedada
pelo art. 2º, § 3º, LINDB: “Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por
ter a lei revogadora perdido a vigência.”
Termos, expressões e outros:

- Designação de audiência de ofício nos crimes relacionados à Lei Maria da Penha: Art. 16:
“Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei,
só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério
Público.” Vide ADI 7267/DF, 2023: “Apenas a ofendida pode requerer a designação da
audiência para a renúncia à representação, sendo vedado ao Poder Judiciário designá-la de
ofício ou a requerimento de outra parte. [...] inconstitucionalidade da designação, de ofício,
da audiência [...] inconstitucionalidade do reconhecimento de que eventual não
comparecimento da vítima de violência doméstica implique retratação tácita ou renúncia
tácita ao direito de representação.”
- Decisão motivada vs. intima convicção: O juiz decide motivadamente de acordo com seu
livre convencimento baseado no processo; os jurados do júri, de acordo com sua convicção
própria, que não devem exalar.
- In dubio pro judicato: Em sede de revisão criminal contra sentença criminal condenatória,
predominam os princípios do in dubio pro societate e in dubio pro judicato.
- Inquérito do fim do mundo: Inquérito Policial 4871, instaurado por Alexandre de Moraes
no STF.
- Investigação criminal defensiva: Investigação preliminar feita pelo advogado; a prova
defensiva estará restrita à juntada de documentos, laudos, perícias ou prova oral quando da
realização da audiência de instrução e julgamento (já na etapa do procedimento judicial).
- Mulher de César: “A mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta”.
- Palavra da vítima em violência doméstica e em crimes sexuais: A palavra da vítima tende
a se sobrepor a palavra do réu em valor probatório (supervaloração, principalmente em
âmbito doméstico). “A jurisprudência desta Corte Superior orienta que, em casos de violência
doméstica, a palavra da vítima tem especial relevância, haja vista que em muitos casos
ocorrem em situações de clandestinidade.” (STJ, HC 615661/MS, 2020) “Os elementos
probatórios delineados no v. acórdão increpado são suficientes à análise do pedido [...].”
(AgRgAREsp 1236017/ES, 2018) “A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que,
em crimes de natureza sexual, à palavra da vítima deve ser atribuído especial valor
probatório, quando coerente e verossímil, pois, em sua maior parte, são cometidos de forma
clandestina, sem testemunhas e sem deixar vestígios.” (AgRgAREsp 1594445/SP, 2020)
Mesmo assim, apenas e exclusivamente a palavra da vítima não é suficiente, havendo
“necessidade de que a versão apresentada por ela deva guardar sintonia com as demais
provas apresentadas, a fim de que se possa atribuir a devida credibilidade” (desembargador
Ulysses Gonçalves Junior, TJ/SP).
- Prisão preventiva de ofício: Não, com exceção do art. 20, Lei 11340/06: “Em qualquer fase
do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor,
decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante
representação da autoridade policial. Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão
preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como
de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.”
- Produção de provas de ofício: Art. 156: “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer,
sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal,
a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a
necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; II – determinar, no curso da
instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre
ponto relevante.” (Redação/Incluído pela Lei 11.690/08)
- Revitimização (vitimização secundária): É uma série de atos e questionamentos que geram
constrangimentos nas vítimas de violência; a vítima de um crime é sujeita a um tratamento
indevido e completamente insensível durante o processo de justiça criminal. P. ex., a vítima
de abuso sexual que, após o sofrimento da violência própria do ato, é interrogada de maneira
inescrupulosa de modo a lembrar, de maneira dolorosa, os momentos em que esteve sob o
jugo do agressor.

. Bibliografia e exemplos:
- DE LIMA, Renato. Manual de processo penal.
- Caso Evandro (Guaratuba/PR, 1992).

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