Você está na página 1de 2

Consumismo

Por Ana Lucia Santana

O consumismo é uma compulsão que leva o indivíduo a comprar de forma ilimitada e sem necessidade bens,
mercadorias e/ou serviços. Ele se deixa influenciar excessivamente pela mídia, o que é comum em um sistema dominado pelas
preocupações de ordem material, na qual os apelos do capitalismo calam fundo na mente humana. Não é à toa que o universo
contemporâneo no qual habitamos é conhecido como “sociedade de consumo”. Depois da Revolução Industrial, que possibilitou
o aumento da escala de produção e incrementou o volume de mercadorias em circulação, o mundo se modificou
profundamente. Com a industrialização veio o desenvolvimento econômico nos moldes do liberalismo e o consumismo alienado,
ou seja, é como se as mercadorias fossem entidades abstratas e autônomas, independentes dos esforços humanos. Porque
agora o homem não consome mais, como outrora, os produtos que ele mesmo elabora. Ele se encontra apartado dos frutos de
seu próprio trabalho.

O consumista não age como o consumidor, que compra as mercadorias e os serviços de que necessita para sua
existência, já aquele está sempre atravessando as fronteiras da necessidade e tocando as margens do supérfluo. Ele atua muitas
vezes movido por distúrbios emocionais e psicológicos, ou por motivações socioeconômicas, como uma espécie de
compensação pela frieza do convívio social, pela carência financeira, por uma autoestima deteriorada, e por tantas outras
razões. O resultado dessa atitude impulsiva é geralmente o endividamento crescente, então o indivíduo assume uma sobrecarga
de trabalho, na tentativa de eliminar as dívidas, consequentemente é submetido a um regime de exploração no trabalho,
novamente se vê emocionalmente frágil e se torna propenso de novo ao consumismo feroz. Como se percebe, cria-se um círculo
vicioso, do qual somente com muito esforço e um eficaz tratamento terapêutico o sujeito pode se libertar.

Além do mais, o acúmulo cada vez maior de supérfluos leva nossa sociedade a uma deterioração dos hábitos e dos
valores, pois as pessoas se tornam gradualmente escravas do materialismo, em detrimento do caráter espiritual da vida. As
próprias relações sociais se desvalorizam diante da valia crescente das mercadorias, na verdade até mesmo os relacionamentos
se submetem a critérios materiais. O consumismo pode provocar também uma grave perturbação psíquica, a oneomania, que
conduz o indivíduo a um gasto compulsivo, mais comum entre as mulheres. A natureza também é prejudicada pelo consumo
ilimitado, porque o incremento das mercadorias, não só da demanda, mas também da oferta, produz no meio ambiente o
aumento do volume do lixo.

Para que a pessoa busque um tratamento, é preciso primeiro que ela se conscientize do processo que se desenrola em
sua psique, mas dar esse passo não é fácil, porque o consumismo é uma atitude muitas vezes inconsciente. O sistema capitalista
gerou em nossa sociedade a ilusória concepção de que o consumo sem limites conduz ao bem-estar e é sinônimo de civilização.
Assim, hoje frequentamos Shopping Centers, verdadeiros templos do consumo, que se proliferam cada vez mais, e nos
envolvemos em rituais de compra e aquisição de serviços, transformando o próprio corpo em mercadoria.

Ao invés de nos entregarmos, como antes, a ritos sagrados, mergulhamos cada vez mais na natureza profana do
consumismo. E como participar deste cerimonial moderno é cada vez mais caro, as pessoas passam a valorizar excessivamente
os meios de aquisição, ou seja, tudo e todos são medidos em termos do metal precioso, do poder e da posição social que ocupa,
pré-requisitos para se estar habilitado a um consumismo crescente. O símbolo da felicidade humana na sociedade
contemporânea é a possibilidade de poder consumir sem freios, trocando em miúdos, a posse dos bens materiais. O que torna
difícil sair dessa ciranda viciosa é que o sistema realimenta continuamente a sede de consumir, para ter à sua disposição um
mercado sempre disponível.

Adaptado de: <https://www.infoescola.com/psicologia/consumismo/>. Acesso: 02/03/2023.

Sobre a vida num mundo líquido-moderno

A “vida líquida” e a “modernidade líquida” estão intimamente ligadas. A “vida líquida” é uma forma de vida que tende a ser
levada à frente numa sociedade líquido-moderna. “Líquido-moderna” é uma sociedade em que as condições sob as quais agem
seus membros mudam num tempo mais curto do que aquele necessário para a consolidação, em hábitos e rotinas, das formas
de agir. A liquidez da vida e a da sociedade se alimentam e se revigoram mutuamente. A vida líquida, assim como a sociedade
líquido-moderna, não pode manter a forma ou permanecer em seu curso por mito tempo.

Numa sociedade líquido-moderna, as realizações individuais não podem solidificar-se em posses permanentes porque, em um
piscar de olhos, os ativos se transformam em passivos, e as capacidades, em incapacidades. (...). Por essa razão, aprender com a
experiência a fim de se basear em estratégias e movimentos táticos empregados com sucesso no passado é pouco
recomendável: testes anteriores não podem dar conta das rápidas e quase sempre imprevistas (talvez imprevisíveis) mudanças
de circunstâncias. Prever tendências futuras a partir de eventos passados torna-se cada dia mais arriscado e, frequentemente,
enganoso. (...).
Em suma: a vida líquida é uma vida precária, vivida em condições de incerteza constante. As preocupações mais intensas e
obstinadas que assombram esse tipo de vida são os temores de ser pego tirando uma soneca, não conseguir acompanhar a
rapidez dos eventos, ficar para trás, deixar passar as datas de vencimento, ficar sobrecarregado de bens agora indesejáveis,
perder o momento que pede mudança e mudar de rumo antes de tomar um caminho sem volta. A vida líquida é uma sucessão
de reinícios, e precisamente por isso é que os finais rápidos e indolores, sem os quais reiniciar seria inimaginável, tendem a ser
os momentos mais desafiadores e as dores de cabeça mais inquietantes. Entre as artes da vida líquido-moderna e as habilidades
necessárias para praticá-las, livrar-se das coisas tem prioridade sobre adquiri-las.

(...)

Numa sociedade líquido-moderna, as indústrias de remoção do lixo assumem posições de destaque na economia da vida líquida.
A sobrevivência dessa sociedade e o bem-estar de seus membros dependem da rapidez com que os produtos são envidados aos
depósitos de lixo e da velocidade e eficiência da remoção dos detritos. Nessa sociedade, nada pode reivindicar isenção à regra
universal do descarte, e nada pode ter permissão de se tornar indesejável. A constância, a aderência e a viscosidade das coisas
tanto animadas quanto inanimadas, são os perigos mais sinistros e terminais, as fontes dos temores mais assustadores e os
alvos dos ataques mais violentos.

(BAUMAN, Zygmund. Vida líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007, pgs. 7-9).

Charges

Você também pode gostar