Você está na página 1de 13

Análise de Enquadramento na TV Miramar: Explorando a interseção

entre Mídia e Política em Moçambique

António Damião1

Resumo: Esta pesquisa procura analisar de que forma a Televisão Miramar em


Moçambique contribuiu na construção da imagem dos candidatos do partido Frelimo
Filipe Nyusi e da Renamo Ossufo Momade nas eleições presidenciais de 2019 na
perpectiva da análise técnica do enquadramento jornalístico. Os enquadramentos
também designados de Frames consistem fundamentalmente na forma como as notícias
ou eventos noticiosos são apresentados ao público. Embora limitado, o argumento
central desta pesquisa sugere que existe algumas técnicas que podem configurar a
análise de conteúdo jornalístico no prisma do frame.

Palavras-chave: Enquadramento; Moçambique; Política, Jornalismo; TV Miramar.

Introdução
O papel da mídia na formação da opinião pública e na interação com a esfera
política é de extrema relevância. Uma ferramenta fundamental para entender como a
mídia influencia e é influenciada pela política é o conceito de "frame" ou
enquadramento. Este instrumento técnico permite analisar as abordagens parciais e
imparciais dos conteúdos jornalísticos, revelando como o enquadramento molda o
debate público. No contexto das reflexões de Walter Lippmann sobre a formação da
opinião pública, ele delineia uma perspectiva intrigante. Ele argumenta que a opinião
pública não se origina apenas das expressões individuais dos cidadãos, mas é tecida a
partir das reações humanas a um mundo que é percebido ou concebido mentalmente.
Esse retrato do mundo, uma construção influenciada por diversos processos cognitivos e
atalhos mentais, é o que ele denomina de "pseudoambiente".
Lippmann enfatiza que o pseudoambiente é moldado por mecanismos como
estereotipias e sinais provenientes dos meios de comunicação. Esses elementos atuam
como blocos de construção, erguendo o cenário aparente no qual a opinião pública

1
Mestrando em Jornalismo pelo Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da Universidade Estadual de Ponta
Grossa (UEPG). E-mail: antoniodamiao03@gmail.com.
evolui. Contudo, ele rejeita a noção de que essa opinião pública é simplesmente uma
manifestação direta das opiniões expressas pelos indivíduos de maneira livre.
Lippman advoga ainda que os meios de comunicação Social são culpados pela
opinião pública defeituosa que as sociedades modernas vivem.

Acontece que as condições intelectuais de seus cidadãos não


avançaram no ritmo imposto pela industrialização. Como instituição
moderna, a imprensa, que é organizadora das opiniões públicas, em
vez de ajudar a reverter este processo, muitas vezes, agrava a
complexidade dos problemas e fecha as possibilidades de
esclarecimento racional. Em uma sociedade ideal, defende ele, seria
necessário alterar esta lógica: “as opiniões públicas precisam ser
organizadas para a imprensa e não pela imprensa. Do contrário, a
sociedade moderna é afastada do debate público esclarecido, e
conduzida para os perigos da manipulação e administração”
(Lippmann, 2008, p. 42).

Neste artigo, exploráramos a importância do enquadramento na análise da


relação entre mídia e política, propondo técnicas que podem aprimorar essa interação.
Nos últimos anos, há uma preocupação crescente no campo do jornalismo em
obter as metodologias e técnicas próprias de pesquisa nesta área. Nesse sentido, esta
pesquisa propõe ao campo em estudo, uma técnica que pode esclarecer tal inquietação e
apresentar abordagens conceituais, técnicas-metodológicas, dentre as quais se destaca
para este estudo, o conceito de enquadramento. Exemplificando essa abordagem, temos
o trabalho de Anabela Gradin (2017), que explora o enquadramento das notícias, e o
estudo de Carlos de Carvalho, intitulado "Limites e Possibilidades do Conceito de
Enquadramento Jornalístico (2009) ", além de outras contribuições significativas.

Enquadramento jornalístico
O termo "enquadramento" refere-se à maneira pela qual os eventos e questões
são apresentados pela mídia, influenciando a percepção do público. Essa abordagem
molda a narrativa ao selecionar certos aspetos e omitir outros, resultando em uma visão
específica do assunto abordado. Gaye Tuchman (1980) destacou que a análise dos
enquadramentos pode ser entendida no contexto dos mecanismos que domesticam o
imprevisto nas rotinas jornalísticas. Tuchman utilizou a metáfora da "janela" para
ilustrar esse conceito, comparando as notícias a uma "janela para o mundo". Nessa
perspectiva, as notícias atuam como um quadro que delimita e estrutura o que é
apresentado, ao mesmo tempo em que exclui da visão aquilo que está fora desse
"quadro".
Tuchman (1980) sugere que as notícias têm a função de enquadrar a realidade,
escolhendo o que é destacado e o que permanece oculto, criando, assim, uma
representação seletiva do mundo por meio dessa "janela". Isso reforça a ideia de que a
seleção e edição de conteúdo jornalístico desempenham um papel crucial na construção
da percepção pública sobre os eventos e questões abordados.
Desde sua emergência nos anos 80, o conceito de enquadramento tem estado
intrinsecamente ligado à análise de conteúdo midiático. Inicialmente, essa abordagem
visava compreender como os conteúdos midiáticos eram construídos. Com o tempo, o
conceito de enquadramento evoluiu, adquirindo novas perspectivas. De acordo com
Reese et al. (2001), o enquadramento pode operar em três níveis distintos: no processo
de produção e reprodução de quadros interpretativos; na avaliação empírica, que
envolve estudos quantitativos e qualitativos de casos específicos; e no estudo dos
efeitos, explorando a interação entre textos midiáticos e audiências na construção de
significados e narrativas compartilhadas.
Como método de análise, os estudos de enquadramento podem se basear tanto na
análise paradigmática de conteúdo, realizada de forma aprofundada sobre objetos
claramente definidos, quanto na análise comparativa e sintagmática, conforme proposto
por Entman (1991). Na análise comparativa e sintagmática como propõe o autor aborda
a questão da comparação de diferentes enquadramentos de objetos ou eventos
midiáticos semelhantes, destacando como os diversos níveis de significado atribuídos a
eles contribuem para a percepção do acontecimento.
A mídia desempenha um papel fundamental na formação da opinião pública, e o
enquadramento emerge como uma ferramenta poderosa para influenciar o público e
moldar a percepção das políticas governamentais e dos eventos políticos. Através da
lente do enquadramento, a mídia tem a capacidade de construir realidades parciais,
ressaltando aspetos específicos que podem conduzir a interpretações distintas da mesma
realidade. Em última análise, o estudo do enquadramento midiático destaca a relevância
da análise crítica das mensagens mediáticas e sua influência na sociedade.
De certo modo, o enquadramento como teoria pode ser associado ao
agendamento na medida em que seus indicadores evidenciam certos eventos e ignoram
outros como explica Anabela Gradin (2017) o frame pode definir-se como o conjunto de
pistas, visuais ou linguísticas e conceituais, que enformam o contexto de um objeto ou
acontecimento. A autora ainda diz que essas pistas de como o evento deve ser
interpretado constituem o seu enquadramento propriamente dito, salientando certos
aspetos deste e obscurecendo outros; e são suscetíveis a apresentar muitas formas, com
alcances diversificados:
Podem referir-se a um objeto concreto, como tratar-se de meta construções
simbólicas e culturais que servem de contexto a um conjunto de narrativas de alcance
muito vasto, ou seja, eles podem abranger desde um objeto tangível até construções
simbólicas e culturais mais abstratas, que fornecem o contexto para uma série de
narrativas de grande abrangência (GRADIN, 2016, p. 7-25).
A ideia conceitual de enquadramento, como mencionado anteriormente, está
evoluindo em direção a uma técnica de análise de conteúdo, com uma aplicação inicial
no campo jornalístico. Entman propõe cinco etapas fundamentais que os quadros
(frames) utilizam para analisar um determinado conteúdo jornalístico, que pode ser uma
notícia, reportagem ou qualquer outro gênero do campo jornalístico.
Essas etapas destacam-se como elementos essenciais que auxiliam na análise de
conteúdo por meio de enquadramentos. Primeiramente, é crucial identificar o problema
abordado, compreendendo se ele possui natureza política, econômica, ou de outra
ordem. Em seguida, é importante traçar as causas subjacentes que motivam a
problemática apresentada. Outro aspeto relevante envolve a identificação dos atores
principais envolvidos no caso.
Além disso, é necessário examinar as possíveis soluções propostas para o
problema e determinar a quem é atribuído o poder de resolução. Por fim, a avaliação
moral da construção social resultante do enquadramento é essencial para compreender
as implicações éticas e valores subjacentes à narrativa apresentada (ENTMAN, 1993).
Conforme defendido pelo autor, é vital observar a presença de elementos de
personificação em palavras-chave, metáforas, conceitos, símbolos e imagens visuais
destacadas no gênero narrativo em questão. A construção do enquadramento também se
baseia na recorrência desses elementos ao longo do texto, visto que eles desempenham
um papel crucial na forma como a história é moldada e percebida pelo público.
Já os autores Neto e Verón (2003) entendem que o processo de enquadramento
na perpectiva televisiva da campanha eleitoral envolve o regime do discursivo político e
o regime corporal de contato. E no processo dos Frames, estes elementos compõe um
quadro analítico.
Olhando para as etapas analíticas de Entman (1993) e do Neto e Verón (2003) é
evidente que o uso de frames como um instrumento técnico pode ajudar a compreender
como a Televisão Miramar em Moçambique.
A perspectiva técnica-metodologica do enquadramento
Podemos assumir que a interpretação é uma das principais ferramenta de análise
do enquadramento. Sem dúvida, a interpretação emerge como a pedra angular quando
se trata da análise do enquadramento. Essa poderosa ferramenta desempenha um papel
fundamental na descodificação e compreensão de qualquer situação, contexto ou
informação apresentada no quadro dos frames. Ao explorar o enquadramento de um
evento, imagem, texto ou qualquer outra forma de comunicação, a interpretação permite
desvelar camadas de significado subjacentes. Ela nos capacita a discernir não apenas o
que está visível à superfície, mas também as nuances, motivações e implicações mais
profundas que podem não ser imediatamente aparentes.
Alem da interpretação, tembem destacam como perspectiva metodologica do
enquadramento as metodolofgia de caracter analitica e sintetica.
De acordo com Mendes (2019) esse método se constitui basicamente de dois
momentos, o primeiro, em que predomina a “objetividade” e outro, mais subjetivo, no
qual o analista faz uso das sugestões e redundâncias percebidas no primeiro momento,
comparando-as com os dados de contexto (interno e externo à imagem) também
levantados no primeiro momento.
Para este estudo vamos nos baser na metodologia de caracter analitica objectiva.
Neste modelo técnico-metodológico destacam três momentos: 1)
seleção/discriminação/qualificação/sugestão; 2) análise formal dos signos/elementos
que fazem parte da composição; 3) contextualização da imagem no tempo e no espaço,
e na História da Arte e da Cultura.

1. Seleção/discriminação/qualificação/sugestão
De acordo com Mendes (2019) este momento consiste na identificação dos
elementos que formam a imagem analisada e na qualificação dos mesmos. Nesta etapa o
pesquisador não deve se limitar em identificar os elementos constituintes da imagem,
deve sim observar na sua plenitude a representatividade do objeto analisado (imagem) e
o que ele representa para o telespectador.
1. Quadro Descritivo/Qualitativo e Sugestivo
Este procedimento como explica Mendes (2019) consiste, primeiramente, em
identificar e numerar os elementos/signos relevantes que compõem as imagens
analisadas. Cada um desses elementos é então trabalhado em sua particularidade através
da construção de um quadro no qual são apresentadas as suas qualidades e o que
indicam, sugerem e/ou representam. Este procedimento coloca atenção total da imagem
ao pesquisador. Se desca6aca nesta senda a composição geral do objetivo analisado, se
for uma pessoa, a posição corporal em que está, a vestimenta e outros. Ainda nesta
abordagem analítica podemos configurar para o nosso estudo a ideia da minutagem dos
conteúdos a analisar.
2. Análise formal dos signos/elementos que fazem parte da composição
Destaca-se nesta etapa a repetitividade dos enquadramento da imagem. Para a
nossa pesquisa seria o caso de olhar para a redundância discursiva do candidato em
regiões ou províncias diferentes.
3. Contextualização da imagem no tempo e no espaço, e na história da arte e da
cultura.
Nesta etapa, o pesquisador tem a possibilidade de observar que representação
que cada imagem tem para o publico olhando para a questão do espaço, questão
histórica e cultural.
Refira-se que todas ferramentas supracitados são desenvolvidas tendo em conta
a interpretação. No entanto, é importante frisar que a interpretação também pode ser
influenciada por preconceitos pessoais. Nossas próprias inclinações e suposições podem
colorir nossa análise, levando a conclusões enviesadas ou incorretas. Portanto, a
consciência dessas influências é crucial para uma interpretação mais precisa e
equilibrada.

Cenário político e midiático em Moçambique


O cenário político e midiático moçambicano que abordaremos neste capitulo
refere-se ao período pós-independência. Nessa fase, o país adotou um sistema socialista
que perdurou por quase 15 anos. Durante esse período, Moçambique passou por
significativas transformações políticas e sociais, moldando sua trajetória inicial como
nação independente.
Após a independencia em 1995, Moçambique viu-se mergulhada numa guerra
civil. Esta guerra foi entre duas forças a Frelimo, que libertou o país da colonização
portuguesa, tornando-se o primeiro partido político do país até a Constituição de 1990 e
Movimento Nacional de Resistência, que posteriormente transformou-se em partido
político, Resistência Nacional Moçambicana (Renamo). O conflito durou 16 anos ou
seja, desde um pouco depois da proclamação da independência até a assinatura do
acordo de paz entre as duas partes beligerantes, em 1992. Dois anos antes a Assembléia
Popular tinha aprovado, mesmo com um grande número de abstenções, a nova
Constituição, marcando, desta forma, o fim do período monopartidário:

Com a nova constituição, Moçambique muda de nome de República


Popular de Moçambique para República de Moçambique, ao mesmo
tempo em que o multipartidarismo é introduzido. A constituição
anterior, num sistema de um partido, implicava que o presidente da
Frelimo era automaticamente também presidente da República.
Agora, também deverá ser eleito em eleições gerais [...]. A nova
constituição implica que é possível formar partidos políticos em
Moçambique e que esses partidos podem participar nas eleições
(ABRAHAMSSON, 1998. p. 66).

O sistema socialista implantado teve um impacto profundo na estrutura política e


econômica do país. Esse conflito terminou em 1992, com a assinatura dos Acordos de
Roma (na Itália) e por conseguinte realização das primeiras eleições em 1994, onde a
Frelimo venceu, mas a oposição contestou os resultados. Atualmente, a Frelimo e a
Renamo são duas das três bancadas que compõem a Assembleia da República, sendo
que a Frelimo usufrui uma situação privilegiada, tendo em conta que ocupa a maioria
dos assentos e a máquina administrativa do país está nas suas mãos.
O governo desempenhou um papel central na gestão dos recursos e na orientação
do desenvolvimento nacional. Enquanto isso, a mídia desempenhou um papel
fortemente ligado aos interesses estatais, servindo como um veículo de propagação da
ideologia governante e do progresso socialista. A liberdade de imprensa foi limitada e a
cobertura mediática era muitas vezes controlada para atender aos objetivos políticos. 2
No entanto, a partir dos anos 90 com a democratização do sistema político,
Moçambique deu início a um processo de transição para um sistema democrático. Esse
2
NHANALE, E. C. O sistema dos media e a política em Moçambique. Revista Líbero, [S.L.], v. 25, n. 50, p. 37-52,
jan. 2022. Disponível em: https://bit.ly/45cVMui. Acesso em: 24 ago. 2023
período foi marcado por mudanças substanciais na cena política e mediática. Com a
abertura política, houve uma expansão das liberdades civis e dos direitos individuais,
incluindo a liberdade de imprensa. Isso permitiu que a mídia moçambicana
desempenhasse um papel mais diversificado e crítico na sociedade.
Durante esse período, houve uma interligação entre transformações econômicas
e políticas. O Decreto Presidencial nº 72/83, emitido em 29 de dezembro de 1983,
desempenhou um papel fundamental nesse processo. Esse decreto teve como objetivo
principal reduzir a influência do governo nos meios de comunicação. Embora tenha
ocorrido uma diminuição na intervenção estatal nos órgãos de informação, o Ministério
da Informação ainda manteve certa autoridade, como mencionado no artigo 2° do
decreto:

a) Dirigir e coordenar todas as actividades da Informação escrita, falada,


televisiva, audio-visual e gráfica assegurando a cobertura dos acontecimentos
nacionais e internacionais e a sua difusão; b) Orientar a difusão da Informação
para o exterior de acordo com os objectivos da nova ordem internacional da
Informação; c) Dirigir e desenvolver a acção de formação e especialização
técnico-profissional (Moçambique, 1983, p. 13).

Miguel (2008) ressalta que apesar das mudanças pontuais na legislação, essas
não foram suficientes para eliminar práticas como a auto censura no campo jornalístico.
O autor ressalta ainda que a censura já estava enraizada na cultura profissional,
representava um desafio significativo para a liberdade de imprensa. Para combater esse
cenário, foi promulgada a Lei de Imprensa de Moçambique em 1991. Essa lei não
apenas redefiniu a atividade jornalística, mas também estabeleceu os direitos e
responsabilidades dos profissionais da área.
Um elemento fundamental introduzido pela Lei de Imprensa 18/91 foi a criação
do Conselho Superior de Comunicação Social. Esse órgão desempenha um papel crucial
ao garantir a independência dos meios de comunicação, proteger a liberdade de
imprensa e assegurar o direito à informação3. Além disso, o Conselho também
supervisiona o exercício dos direitos de antena (espaço para transmissões) e de resposta,
proporcionando uma estrutura para a expressão equilibrada e justa de diferentes
perspetivas.
Portanto, ao analisar a evolução do cenário político e midiático moçambicano, é
essencial compreender a transição do sistema socialista no período pós-independência e
3
ASSEMBLÉIA DA REPÚBLICA. Lei nº 18/91 de 10 de agosto: artigo 35. Maputo: Imprensa Nacional, 1991. p. 3
a era democrática que parte dos anos 90. Esse processo moldou não apenas a forma
como a política e a mídia interagem, mas também a própria natureza da sociedade
moçambicana, à medida que a nação buscava sua identidade em um contexto global em
constante transformação.

Radiodifusão em Moçambique: TV Miramar


De acordo com Nhanale (2022) o sistema de radiodifusão em Moçambique é
diversificado, incluindo radiodifusão pública (Rádio Moçambique, Televisão de
Moçambique e Jornal Noticias) e radiodifusão comunitária, religiosa e comercial:

No cenário televisivo moçambicano de sinal aberto, encontramos as


seguintes operadoras, em ordem cronológica: Televisão de
Moçambique (TVM), RTP-África, Televisão Miramar, Soico
televisão, TV Sucesso, Mega TV, Strong TV, TV Maná Moçambique
e KTV. A rádio e televisão Klint, criada em 1993, foi extinta em
2002. (NHANALE, 2022. p. 43)

A TV Miramar que é o nosso objeto faz parte da Rede Comunitária Miramar,


que começou a operar no país em 1998. De acordo com Bustamante (2000) essa
operadora é privada e está associada à rede brasileira Record. Ela disponibiliza sua
programação, exceto aquela adquirida de outras fontes, agências e produtores
independentes, cujos contratos impedem a exibição fora do Brasil. “Esse procedimento
reduz os gastos da emissora, que podem ser divididos em despesas de funcionamento,
programação, pessoal e difusão” (BUSTAMANTE, 2000. p. 80).
Numa primeira fase os programas da Record chegavam gravados e eram
transmitidos com uma semana de atraso. Miguel (2008) revela que na fase atual os
programas são captados via satélite, mas não diretamente lançados ao ar, devido a
questões comerciais e de diferenças de fusos horários. Assim, o que é passado num dia
pela Record é visto no dia seguinte pelos espetadores da TV Miramar. O autor destaca
ainda que a TV Miramar surge como um veículo religioso, trazendo consigo uma
proposta única de disseminar programas produzindo para transmitir a ideia de valores
espirituais, oferecer conteúdo inspirador e promover a reflexão sobre questões
relacionadas à fé.

O enquadramento da TV Miramar na cobertura das eleições presidências de 2019


Na última corrida eleitoral em Moçambique se destacaram três principais
candidatos. A Frelimo4 para a reeleição do seu candidato Filipe Jacinto Nyusi, a
Renamo5 com seu candidato Ossufo Momade e Daviz Simango pelo Movimento
Democrático de Moçambique6.
Por conta da dificuldade em encontrar conteúdos produzidos pela TV Miramar
na época em analise, o estudo analisou oito materiais, quatro deste pertencente ao
candidato da Frelimo e outras quatro ao candidato da Renamo. Refira-se que as oito
matérias analisadas foram produzidas e transmitidas por esta emissora nas províncias de
Nampula e Cabo Delgado no norte do pais, Sofala e Zambézia na região central e na
cidade de Maputo no sul do País. Dado que estas eleições ocorreram em um passado
distante, especialmente considerando o contexto africano, onde a conservação de
conteúdos digitais ainda é um desafio, conseguimos localizar apenas alguns desses
materiais no site da emissora mencionada e na plataforma YouTube. Cientes das
limitações na obtenção de um número suficiente de arquivos para abranger toda a
extensão da nossa pesquisa, os conteúdos que encontramos pelo menos nos
proporcionaram uma base sólida para compreender como a TV Miramar construiu a
imagem dos candidatos dos partidos Frelimo e Renamo durante a corrida presidencial
em Moçambique e servir de exemplificação de uso das ferramentas de analise do
enquadramento no campo do jornalismo.
A TV Miramar constituiu uma das primeiras emissoras privada a emergir em
Moçambique pós-democrático cobrindo apenas 5 capitais e hoje tem uma abrangência
total dai ocupar uma posição importante para um estudo da magnitude desta pesquisa.
Nas campanhas eleitorais, o discurso é acompanhado pela movimentação
corporal como explica Fausto Neto e Verón (2003) e o candidato da Frelimo Filipe
Nyusi usou essa técnica durante o seu comício na província de Nampula e a câmara o
enquadrou, fez uma trajetória sincronizando a movimento corporal e discursivo que era
dado naquele momento.
4
A Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) é um partido político oficialmente fundado em 25 de Junho de
1962, com o objectivo de lutar pela independência de Moçambique do domínio colonial português. E governa o Pais
desde 1975. Disponivel em: https: https://www.dw.com/pt-002/frente-de-liberta%C3%A7%C3%A3o-de-mo
%C3%A7ambique-frelimo/t-17418268. Acesso em: 24 ago. 2023.
5
A Resistência Nacional Moçambicana, mais conhecida pelo acrónimo Renamo, é o segundo maior partido político
de Moçambique. O seu líder histórico foi Afonso Dhlakama. Disponivel em: https://www.dw.com/pt-002/resist
%C3%AAncia-nacional-mo%C3%A7ambicana-renamo/t-17423802 . Acesso em: 24 ago. 2023
6
O Movimento Democrático de Moçambique (MDM) é o terceiro maior partido político de Moçambique, criado a
partir de uma dissidência da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo). Disponivel em: https://www.dw.com/pt-
002/movimento-democr%C3%A1tico-de-mo%C3%A7ambique-mdm/t-17422667. Acesso em: 24 ago. 2023.
Ainda sobre o enquadramento das imagens, é notório em quase todos conteúdos
analisados, a câmara começa num plano geral exaltando a postura física do candidato,
capturando expressões faciais e gestuais durante a interação discursiva entre o candidato
e a multidão.
Outro elemento a destacar foi o enquadramento de detalhes especifico como
adereços da campanha, símbolos do partido e folhetos propagandísticos. Esses detalhes
visuais adicionais acrescentam camadas de significado à imagem do candidato,
permitindo ao público uma compreensão mais profunda das dinâmicas envolvidas no
comício.
No concernente a minutagem dos conteúdos em analise, a TV Miramar priorizou
o candidato da Frelimo em suas reportagens, concedendo-lhe cerca de 50 segundos a
mais durante a sua interação com o público. Nesse período, o candidato aproveitou para
se conectar com o público, fazendo promessas de desenvolvimento e reabilitação de
infraestruturas sociais, enquanto também direcionava críticas aos partidos de oposição. 7
Já o enquadramento do candidato do maior partido da oposição Ossufo
Momade, referir que a câmera focava principalmente na imagem do candidato,
mantendo-o em uma posição fixa e não acompanhando muito sua movimentação física.
Embora a câmera oferecesse uma visão panorâmica da multidão presente,
proporcionando um plano geral do ambiente.
Sobre a minutagem, o candidato da Renamo recebeu menos que 20 segundos
dos seus discursos resultando assim na limitação de tempo dedicada às suas palavras
durante o comício.
O estudo realizado em 2005, sobre a formação do voto e comportamento
eleitoral dos Moçambicanos, mostra que 38% dos cidadãos receberam informação
eleitoral, diretamente, por via de organizações partidárias e 62% receberam a
informação através dos meios de comunicação que os partidos políticos usam para
informar, como os comícios, pela mídia (tempo de antena e notícias) e outros tipos de
contatos (igreja, família e amigos). No grupo de todos os meios de comunicação, os
inquiridos reconhecem que a televisão se configura como uma das maiores fontes de
7
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=P07Z3atfCbg. Acesso 23 ago, 2023.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=13S17r44ZxY. Acesso 23 ago, 2023.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=auGeF1yCU7Q. Acesso 23 ago, 2023.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=soS8HXbMa2E. Acesso 23 ago, 2023.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2oANGiWmBxk. Acesso 23 ago, 2023.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=zNRNHDdYFuI. Acesso 23 ago, 2023.
informação principalmente nas regiões urbanas. Esta abordagem ilustra um panorama
do processo da cobertura das eleições tanto municipais quanto presidenciais naquele
país localizado no sul da África.

REFERÊNCIAS
BUSTAMANTE, Enrique. Políticas de comunicacíon y cultura: nuevas necessidades
estratégicas. In: BOLAÑO, César; MASTRINI, Guillermo; SIERRA, Francisco.
Ecnomía política, comunicación y conocimiento: uma perspectiva crítica
latinoamericana. Buenos Aires: La Crujía, 2005. p. 251-268.

ENTMAN, Robert (1993). Framing: toward clarification of fractured paradigm.


Journal of Communication, v 43, n 4, p. 51-58, Set/Dez, 1993.

FAUSTO NETO, Antonio; VERÓN, Eliseo. O corpo entre capturas e fugas


enunciativas in: _____ (org) RUBIN, Antonio Albino. Lula Presidente: Televisão e
Política na campanha eleitoral. Unisinos, 2003.

GRADIN, Anabela. Framing: o enquadramento das notícias. Lisboa: Livros


Horizonte, 2016.

NHANALE, E. C. O sistema dos media e a política em Moçambique. Revista Líbero,


[S.L.], v. 25, n. 50, p. 37-52, jan. 2022. Disponível em: https://bit.ly/45cVMui. Acesso
em: 25 ago. 2023.

LIPPMANN, W. O mundo exterior e as imagens em nossas mentes. In: Opinião


pública. Petrópolis: Vozes, 2004. p. 21-42.

MIGUEL, J. Televisão e espaço público em Moçambique: o setor televisivo aberto.


189 f. Tese (Doutorado) - Curso de Programa de Pós-Graduação em Ciências da
Comunicação, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2008. Disponível
em: https://bit.ly/45AVFIL. Acesso em: 24 ago. 2023.
MOÇAMBIQUE. Constituição da República de Moçambique. Aprovada pela
Assembleia da República em 02 de novembro de 1990. Maputo: Red de Seguridad y
Defensa de América latina, 2018. Disponível em: https://bit.ly/3YMSR9s. Acesso em:
24 ago. 2023.

TUCHMAN, Gaye. La producción de la notícia. Estudio sobre la construcción de la


realidad. Barcelona. Editorial Gustavo Gilli, 1983. p. 196-232.

Você também pode gostar