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Aula Dois
Carxs Colegas,
Com este texto, iniciamos o estudo de Técnicas de Análise
Estatística. Para que você tenha uma idéia clara do nosso percurso ao longo
desta semana, apresentamos a seguir um resumo dos temas que serão
abordados. A aula divide-se em quatro seções. Na primeira seção, vamos
discutir o ato de observar. Parece evidente, mas você verá que a noção de
observação nos reserva algumas surpresas. Passo a passo, você
compreenderá em que consiste o ato de observar. Em seguida, vamos
conversar um pouco mais sobre as pesquisas qualitativas e quantitativas, com
a intenção de identificar aquilo que as distingue e o muito que tem em comum.
A nossa expectativa é de que você compreenda que, com independência de
método, toda ciência empírica da sociedade se impõem os mesmos rigores
Na segunda seção, trataremos do ato de medir. Discutiremos como
a observação nos traz informações sobre a realidade, proporcionando uma
descrição sintética do mundo. Veremos também como estas observações
podem ser vistas através de gráficos, tabelas, equações e cálculos e tais
apresentações nos proporcionam um “retrato” do mundo muito útil para a
compreensão das sociedades. Por fim, você aprenderá a noção de modelo
como representação da realidade e como isso interage com a prática da
investigação científica. O objetivo central da seção é aprender os fundamentos
de modelos para investigação empírica.
Vamos então começar: o que é observar e medir?
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1. Observação e ciência
Toda ciência empírica faz-se a partir da observação, seja ela a
física, a sociologia, a economia, a química ou qualquer outra. Todavia, como
também sabemos desde Platão, a observação não é um fato tão simples
quanto somos tentados a acreditar: nossas observações são menos sólidas
do que parecem. Um exercício simples e interessante é repetir a experiência
do ponto cego. Podem encontra-la facilmente na internet 1. Os sentidos e nossa
própria percepção nos traem. Os modelos numéricos, por vezes, ameaçam
“adquirir vida própria”, como se apresentassem ontologicamente um caráter
estável e intrínseco ao objeto. Entretanto, números são atribuídos à realidade
pelo observador. Assim, sempre corremos o risco de nos enganamos com as
nossas observações e, consequentemente, levar a análises equivocadas
acerca dos fenômenos que queremos compreender e explicar.
Por isso, aprender a observar, com suas potencialidades, limites e
cuidados, é um exercício fundamental. Toda boa pesquisa surge da
capacidade de produzir observações acuradas que forneçam a base empírica
para análises consistentes. A experiência do ponto cego, além de um alerta
contra a tentação ingênua de se dotar os números de poderes especiais,
também serve ao nosso propósito de associar dois termos que nem sempre
andam juntos: observação e reflexão.
O que faz um observador? Distingue objetos, entidades, no
ambiente que o rodeia. Em uma fazenda, um observador poderia dizer:
– Ali está um pato e lá, mais adiante, vejo um marreco.
Uma pessoa que nunca tivesse visto patos e marrecos poderia muito
bem argüir o primeiro observador:
– Os dois têm penas e bicos muito parecidos. Não fosse você um bom
conhecedor dessas aves, eu continuaria acreditando que são dois
patos: um menor que o outro.
O primeiro observador poderia apresentar seus motivos para
distinguir patos de marrecos. Certamente não seriam as mesmas razões de um
biólogo. Mas não precisou fazer isso. Para o segundo observador, bastou a
autoridade do fazendeiro. Toda nossa aprendizagem começou, em vários
momentos de nossas vidas, desta mesmíssima maneira: alguém nos dizia o
que ver! Há, por certo, diferentes modos de ver a mesma cena. Costuma-se
mencionar, vez e outra, que os esquimós possuem uma variedade de palavras
para distinguir tonalidades de branco. O que para nós seria pura e
simplesmente branco, para eles encontra várias designações. Não é para
menos: se o esquimó não aprender a distinguir o branco da neve do branco do
urso polar, o final da história pode ser trágico.
Aprende-se a observar. Quando crianças, alguém nos ensinou a
distinguir animais, utensílios domésticos, ferramentas. É impossível separar a
nossa capacidade de observar e comunicar nossas observações da
1
Vide: https://www.youtube.com/watch?v=8NqEf1WEajg ou http://ciencianet.com/puntociego.html
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experiência concreta de fazer coisas e interagir com outras pessoas. Todos nós
observamos o que, juntos, aprendemos a observar. Por esta razão, a nossa
experiência tende a aparecer com a força do óbvio e do inquestionável.
Daí a importância da reflexão. Refletir sobre alguma coisa que
acreditamos saber é nos perguntarmos como conhecemos aquilo que dizemos
conhecer. Esta atitude, tão importante na vida cotidiana, base para o
reconhecimento de que as nossas certezas são vulneráveis e devem ser
justificadas, também é fundamental para uma correta apreciação do
empreendimento científico. A pesquisa baseia-se na observação e no
cuidadoso treinamento deste observador profissional – o cientista. Mas é a
reflexão que introduz a dúvida sobre a realidade do que estamos apenas
acostumados a ver e isso fez surgir a ciência, como uma aventura de
permanente redescoberta da realidade. Nas Ciências Sociais, há muitas formas
de se fazer pesquisa e de outro lado muitos objetivos diversos a serem
alcançados. Para alcançar cada tipo de objetivo, há métodos que se mostram
mais apropriados que os demais. Segundo Charles Ragin e Lisa Amoroso
(2011)2, a pesquisa social apresenta de modo geral sete objetivos:
1. Identificar padrões gerais e relações
2. Testar e refinar teorias
3. Produzir diagnósticos e previsões
4. Interpretar histórica ou culturalmente fenômenos significativos
5. Explorar a diversidade
6. Dar voz a grupos minoritários
7. Avançar em novas teorias
A pesquisa quantitativa para eles está ligada principalmente aos três
primeiros objetivos, quais sejam: identificar padrões gerais e relações, testar e
refinar teorias e produzir diagnósticos e previsões. Secundariamente, métodos
quantitativos estão ligados também a explorar a diversidade e avançar em
novas teorias. Essas características estão intimamente ligadas a duas
características das Pesquisas Sociais que são inversamente proporcionais: o
número de casos pesquisados e o volume de características desses casos que
serão analisadas. Métodos qualitativos tem condições de se aprofundar em
poucos casos, são adequados a dar voz a grupos minoritários e explorar
profundamente a diversidade social, entretanto são incapazes de produzir
diagnósticos sociais amplos e informar sobre eficácia de política social que se
aplica a vários contextos. Ela pode entretanto apontar, a partir da análise
aprofundada de um contexto, quais características de um fenômeno tem
maiores implicações sobre os resultados sociais que se pretende alcançar,
sinalizando para pesquisadores que lidam com métodos quantitativos quais
características merecem mais atenção ao investigar um determinado
fenômeno.
Por outro lado, quando se observa numa pesquisa ampla que
determinados grupos ou ambientes apresentam comportamento diverso do
2
RAGIN, Charles C.; AMOROSO, Lisa M. Constructing social research: The unity and diversity
of method. Pine Forge Press, 2011.
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2. Medir e Comparar
Taxas: proporção e temporalidade
Ao longo dos próximos parágrafos, queremos construir, com você,
um exercício de interpretação social através de números. Para esta construção
conjunta, utilizaremos indicadores com três objetivos principais: refletir sobre
sociedade; observar a longa trajetória que vai da observação e produção do
dado até a formulação do indicador; desenvolver a capacidade de extrair
informação de gráficos e tabelas. Nesta seção exercitaremos formas de
organização de informações. Iniciaremos pedindo que você pense no que
significa observar, e nas armadilhas que uma percepção ingênua desta ação
pode oferecer. Para isso, introduzimos um conceito muito importante para lidar
com números: taxas.
A comparação é uma ferramenta central da pesquisa quantitativa em
Ciências Sociais. A pesquisa quantitativa não está ligada somente à produzir
dados ou refletir a realidade em números. Esses são procedimentos
metodológicos e técnicos importantes, mas não estão neles a essência da
pesquisa. Está no olhar do pesquisador. É ele (ou ela) quem desenha, planeja,
pensa e produz a pesquisa. Dessa forma, é ele ou ela quem estabelece as
propriedades que sua pesquisa vai ter ao pensar seu modelo. Esse modelo
será capaz de sintetizar informações da realidade e comparar essas
informações proporcionando análises, explicações, interpretações para o
fenômeno que despertou nossa curiosidade e nos motivou a estudá-lo.
Comparar significa também ser capaz de analisar processos e seu
desenvolvimento: se algo melhorou, piorou ou está do mesmo jeito. Ao
compararmos o que acontece com países em condições socioeconômicas
semelhantes na América Latina, conseguimos vislumbrar quais países
avançam mais, quais mostram-se estagnados, e quais não conseguem
progredir ou até regridem em relação ao demais. Suponhamos que nosso
objeto de pesquisa seja, por exemplo, a remuneração ou o salário. Podemos
comparar os rendimentos de um trabalhador em ano com o seu rendimento no
ano anterior. Perceberemos que, provavelmente, houve um ligeiro aumento.
Esse dado em si já nos indica algo para nossa análise? Sim! Contudo, essa
informação por si só é suficiente para dizermos que a situação desse
trabalhador melhorou de um ano para o outro? Talvez fosse interessante
comparar com um conjunto de preços de produtos em um ano e no outro para
saber se o salário teve seu poder de compra aumentado ou diminuído.
Podemos ainda comparar com outras categorias profissionais, por exemplo
bancários, ou operários, ou agricultores, para saber se “nosso trabalhador”
melhorou de situação em relação aos outros ou não. Essa é uma forma de
estabelecer parâmetros de controle para a análise.
Por hora vamos entender que o controle é um nível inicial com o
qual desejamos comparar o contexto que estudamos. No exemplo do salário do
operário, foram estabelecidos dois controles: 1) conjunto de preços de produtos
e sua variação de um ano para o outro (ou inflação); 2) salários de outras
categorias profissionais e de outros setores econômicos. Para comparar,
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Gráfico de colunas
Gráfico 1: Casos confirmados de covid19
3
Consulte: https://covid19.who.int/
4
Vide: https://estadisticas.cepal.org/cepalstat/PerfilesNacionales.html?idioma=spanish
5
Vide: https://estadisticas.cepal.org/cepalstat/PerfilesNacionales.html?idioma=spanish
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infantil (IGME), que é medida pela proporção de mortes a cada mil nascidos
vivos. No México, em 1951 a taxa de mortalidade infantil era de 170 e passou a
11 em 2018. Na Argentina, em 1969, a mesma taxa era de 59,6 e passou a 8,8
em 2018. Já no Equador, passou de 139,9 em 1955 para 12,2 em 2018.
Organizar dados coletados em diversas regiões, sejam da América Latina ou
do mundo ou de seu país ou cidade. Depois disso é possível compará-las e
descobrir coisas incríveis, o que é fantástico! Só nos é permitido esse tipo de
viagem porque as informações foram observadas e coletadas de formas
similares. Essa é uma das funções da pesquisa quantitativa – possibilitar
viagens no tempo e no espaço para fazer comparações, estimar progressos
(ou não!) e conhecer caminhos e diferenças entre nosso rumo e outros.
Uma forma comum para se fazer isso é usar a mesma informação
em dois momentos no tempo. A noção básica é a de proporcionalidade.
Suponhamos que a escola em que você estudou tivesse 200 alunos
matriculados em 2010 e, em 2020, 300. Divide-se o valor em 2020 (300), pelo
valor em 2010 (200) = 300/200 = 1,5. Como o patamar inicial (2010) tem que
ser considerado como ponto de partida, subtrai-se 1. Porque se deseja um
valor percentual, multiplica-se por 100. O crescimento do número de alunos em
10 anos foi de 100 alunos, que proporcionalmente representa um crescimento
de 50%, que pode ser um tipo de taxa. Tem-se um tipo de taxa de crescimento,
intimamente ligado à progressão no tempo, de 2010 a 2020.
Um outro tipo de taxa pode ser ligado à algo que ocorre em
determinado grupo. Numa sala de aula, com 40 alunos (como nosso grupo),
quantos são afetados pela evasão ao longo do curso? Se 5 alunos evadem,
divide-se 5 por 40 e obtém-se 0,125. Se o valor percentual auxilia na
compreensão, multiplica-se por 100 e obtém-se 12,5% como sendo um tipo de
taxa de evasão na turma que estamos estudando. Nesse caso, não há
preocupação com a definição de um patamar inicial como ponto de partida
igual a zero uma vez que não se objetiva verificar crescimento, mas um
fenômenos dentro de um grupo definido.
A palavra taxa é usada em muitos sentidos. Taxa de crescimento, de
desemprego, de natalidade, de fertilidade, de alfabetização, de crescimento
econômico e outras. Normalmente, o que se deseja é descrever o
desenvolvimento histórico de um fenômeno (crescimento da população, da
matrícula), ou saber o quanto um fenômeno (reprovação, fertilidade) ocorre em
determinado grupo. Além disso, as taxas podem ter bases diferentes, diferente
das porcentagens - que sempre usam uma base 100. Por exemplo, a taxa de
mortalidade infantil é expressa para cada 1.000 crianças nascidas vivas.
Importa sempre que se calcule a taxa considerando em sua base apenas
aqueles que podem ser sujeitos ao fenômeno. No caso da evasão, qualquer
aluno matriculado pode evadir de sua escola em algum momento do ano, por
um motivo qualquer. Isso é mais simples. Mas pensemos nos casos de
gravidez na escola. Todos os alunos da escola podem engravidar? Não,
somente pessoas do sexo feminino podem ser sujeitas a engravidar.
Entretanto, todas as alunas são suscetíveis a serem sujeitas desse fenômeno?
Não, somente aquelas que estão em idade fértil e são sexualmente ativas.
Caberia ao pesquisador definir qual a idade fértil e outras conceituações
pertinentes ao seu modelo. No nosso caso, vamos adotar que a idade fértil
inicia-se em média aos 15 anos. Outros poderiam dotar outras idades, como 13
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3. Modelos
Para refletirmos sobre modelos, podemos primeiro perceber que
eles sempre fizeram parte de nossas vidas. É um exercício elementar de
abstração e representação. Nós observamos o mundo ao nosso redor e
produzimos formas de representa-lo. Isso vale para as formas como
nomeamos e classificamos os objetos, para os símbolos que criamos e o que
eles representam, para os códigos de comunicação e uma vasta gama de
ações que realizamos cotidianamente.
Um exemplo simples pode ser baseado nas experiências escolar,
como professores e alunos. Imaginemos uma professora de educação primária
na Colômbia chamada Ana. Ela trabalha com crianças que ingressaram na
escola há poucos tempo. A maioria tem oito ou nove anos de idade e, entre
eles, há ainda alguns que não desenvolveram adequada proficiência em leitura.
Para acompanhar o desenvolvimento de seus alunos, ela dividiu a turma em
três grupos. No primeiro, estavam os alunos que, a seu critério, precisavam de
uma atenção especial, pois apresentavam mais dificuldades no processo de
alfabetização. No segundo, estavam as crianças que já começaram a ler e
escrever e que precisavam exercitar suas competências básicas. Já o terceiro
grupo era formado pelas crianças que ela acreditava que deveriam se dedicar a
atividades mais avançadas no campo da escrita e da leitura. Ao final de maio,
as anotações no caderno de acompanhamento de Ana tinha a seguinte
aparência. Para simplificar o nosso exemplo, vamos colocar apenas dez alunos
na turma.
Tabela 2: Distribuição da amostra de alunos da Prof. Ana por nível de desempenho, em março
Nível de desempenho Frequência Percentual Percentual acumulado
1 4 40% 40%
2 4 40% 80%
3 2 20% 100%
Total: 10 100%
C, um conjunto de objetos {c1, c2, ... cN } que variam em uma dimensão da realidade.
N, um conjunto de números reais
N(c1), o número atribuído ao objeto c1
f, a função que associa os elementos do conjunto C com os elementos do conjunto N
Medida nominal
O questionário pergunta: Sexo: (0) Masculino (1) Feminino
Teremos uma medida nominal se apenas a propriedade da identidade é
preservada: (S1=S2) M(S1)=M(S2)
S1 = S2 diz apenas que esses dois objetos pertencem à mesma categoria
nesta dimensão. Não são iguais em nenhum outro senso numérico: A
igualdade possui significado matemático, tal como a diferença, mas a distância,
a ordem, a proporcionalidade e outros atributos numéricos não se aplicam
neste caso.
Em outras palavras, 0 é diferente de 1 e vice versa. Todavia, neste caso, a
categoria (0) não é menor nem maior que (1) – apenas são diferentes.
Poderiam ser usadas letras ou cores – que também apresentam a propriedade
da identidade. Usam-se números por apresentarem vantagens operacionais,
mas eles devem ser interpretados apenas como diferenciadores.
Não devem ser utilizados procedimentos baseados nas demais propriedades,
como ordem, aditividade e divisibilidade.
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Medida ordinal
Um exemplo são os estratos econômicos (de 1 a 5)
Fo: (S1=S2) M(S1) = M(S2)
(S1<S2) M(S1) <= M(S2) ou M(S1)>=M(S2)
Logo, preserva assimetrias empíricas entre as categorias observadas. Tais
assimetrias são relacionadas à ordem.
O sinal de < deve ser interpretado com cuidado, pois indica apenas uma
assimetria substantiva entre S1 e S2 relativa à ordem. Não há uma relação
matemática na distância entre dois números. Sua ordem é apenas o resultado
do modo como o analista resolveu interpretar a observação.
Assim, a distância entre os estratos 3 e o 4 não é a mesma entre os estratos 1
e 2 e assim para todos. Importa apenas que os estratos são diferentes entre si
e que o 1 vem antes do 2, que vem antes do 3, que vem antes do 4...
Devem ser evitados procedimentos que mobilizem aditividade e divisibilidade.
Medida intervalar
Alguns exemplos são a temperatura (em ºC) e a proficiência (ie. PISA)
F deve ser uma função numérica específica relacionando S e M. No caso mais
simples, uma relação linear.
Fi: M(S1) = a + b(S1)
Há diferenciação: 10ºC são diferentes de 20ºC.
Há ordem: 5ºC são mais frios que 10ºC que são mais frios que 20ºC.
As distâncias são equivalentes. A diferença na oscilação do mercúrio e seu
volume é similar entre 5ºC e 10ºC e entre 10ºC e 15ºC e assim
sucessivamente.
No entanto, 10ºC não é o dobro de 5ºC. Como o início da escala é arbitrado
(logo, não é absoluto), suas proporções são não fixas – apenas seus intervalos.
Basta comparar com a escala Fahrenheit (ºF).
05ºC = 41ºF
10ºC = 50ºF (+5ºC = +9ºF) (10ºC não é o dobro de 5ºC // 50ºF não é o dobro de 41ºF)
15ºC = 59ºF (+5ºC = +9ºF) (15ºC não é o triplo de 5ºC // 59ºF não é o triplo de 41ºF)
Os intervalos são estáveis, mas as proporções não são. Em qualquer dos
casos, o zero não reflete total ausência de calor ou de qualquer dos atributos
medidos. O zero foi arbitrado. Uma escala intervalar pode ser facilmente
convertida em ordinal, embora seja mais adequada mantê-la com suas
propriedades. Podem ser feitas adições e subtrações, mas não devem ser
feitas diretamente multiplicações, divisões, frações, proporções e outras
operações matemáticas.
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Boa parte das operações e análises com variáveis intervalares acaba por
utilizar procedimentos que mobilizam divisibilidade. No entanto, é preciso ter
consciência dos limites dessas variáveis e não extrapolar as análises para além
de suas propriedades.
Modelos
Para que a noção de modelo fique clara para você, vamos dar um
exemplo de um modelo de uso corrente: o mapa de uma cidade. Todos sabem
que há muitas maneiras diferentes de representar a organização espacial de
uma cidade. Podemos ter um mapa que contém apenas as ruas e avenidas,
com seus nomes. Quando você está em uma cidade pela primeira vez, ele é
imprescindível para a sua orientação. Neste caso, temos um modelo que não é
numérico, é gráfico e espacial. Da mesma forma que os modelos numéricos,
mapas procuram representar alguma característica dos objetos ou algum
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Atividade:
- Produza uma tabela de frequência referente ao nível de
desempenho da amostra de alunos da professora Ana no mês de abril,
seguindo o exemplo da Tabela 2 (página 11)
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1. Comparar
O que é um dado?
Um estudioso6 da pesquisa científica propôs uma interessante teoria
sobre o dado. Para ele, todo dado resulta da comparação de duas entidades.
Falando assim parece complicado, mas fazemos isso todo dia e nem
parecemos estar fazendo coisas complicadas. Para este estudioso, um dado é
uma representação mental da realidade. Uma forma como nós, seres
humanos, organizamos, em nossas mentes, as nossas experiências cotidianas.
Ele pensou assim: temos informações sobre uma entidade, e informações
sobre outras, mas não operamos mentalmente apenas informações isoladas.
Quando comparamos, produzimos algo que nos permite instruir ações. Se sei a
informação sobre a altura de Ana, sei informações individuais, mas isso pouco
me ajuda a tomar decisões. Quando posso compará-las, reflito melhor para
tomar série de decisões.
Pouco importam as informações isoladas em si, ou mesmo padrões
de medida. Ele se referia a métricas ou medidas prévias, como o metro ou o
quilo. Importam-nos as comparações entre duas referências. Ao comparar a
altura de Ana com a altura de Pablo temos um dado = “maior”! Podemos fazer
comparações de outros tipos. Se ele compara uma gostosa maçã com a idéia
de sabor ele tem o dado: “doce”. Quando comparamos Pedro, um aluno de
ensino fundamental, com uma questão de matemática, poderíamos então ter
um dado: “acertou” ou então “errou”.
Quando comparamos Ana com uma régua de 1 metro, temos outro
tipo de dado acerca de sua altura: “1,70m”, por exemplo. Não precisamos de
“réguas” para obter informações relevantes e úteis para nossa investigação,
mas temos necessariamente que comparar uma entidade com outra. Essa
tentativa visa à melhor representação da realidade, ou seja, desenhar um
modelo que se ajusta adequadamente à nossa investigação e à nossa
realidade.
Temos sempre em mente que os dados são representações
limitadas da realidade e que nos possibilitam uma visão sintética e muito útil de
um fenômeno ou contexto, mas que certamente não esgotam em si toda a
realidade – mas reúne as suas qualidades ou características que são mais
importantes para nós naquele momento. Alguns problemas ou contextos
indicam para nós que a pesquisa quantitativa pode ser uma ferramenta
poderosa de produção de informações, sua análise e interpretação, como
fenômenos complexos demais, em grande escala ou com muitas pessoas,
como a natalidade no América Latina. Já imaginou alguém individualmente ter
que acompanhar todos os partos e cesarianas em toda a América Latina? E
ainda se lembrar de cada detalhe e de cabeça analisar tudo isso junto? É
impossível! Como então tratar desse assunto ou de outros que são muito
relevantes para a Ciência e para a Sociedade? Produzindo ou recolhendo
6
JACOBY. William G. Data Theory and Dimensional Analysis. Newbury Park, CA: Sage
Publications, 1991.
CLACSO Seminário Virtual nº 2025 – Técnicas de Análisis Estadístico 20
7
Vide Babbie (1999) e Jacoby (1991).
CLACSO Seminário Virtual nº 2025 – Técnicas de Análisis Estadístico 23
sobre um mesmo tema, mas tais informações não estão tão claramente
organizadas e dispostas. Alguns exemplos são a saúde de uma pessoa, ou a
qualidade de vida de uma cidade. Para alguns, a resposta a esta pergunta é
muito simples: somente observar a renda. Quanto mais dinheiro, melhor a vida
das pessoas.
Há contudo outras formas de enxergar o mundo e isso nos levaria a
observar “as coisas de um outro jeito”. Um economista indiano, Amartya K.
Sen8 propôs ver as “coisas de um outro jeito”. Para ele, renda é um elemento
da qualidade de vida porque mostra o que as pessoas tem condições de
adquirir a partir de informações do mercado internacional, como câmbio.
Entretanto, a vida cotidiana é regulada por outras coisas, como se alimentar
bem, habitar em locais com boas condições de higiene, ter acesso a serviços
de saúde e educação e, portanto, ter mais chances de viver mais e melhor. Ele
definiu um conjunto de características ligadas à qualidade de vida, como
informações sobre mortalidade infantil, expectativa de vida, educação e outras,
e quis aglutiná-las em um único indicador, o que ele chamou do Índice de
Desenvolvimento Humano, o IDH, que passou a ser usado por muitos
organismos internacionais, como a ONU, por melhor representar o fenômeno e
isso lhe rendeu também o Prêmio Nobel.
8
SEN, A. K. On economic inequality. Clarendon Press. 1973.
ANAND, Sudhir; SEN, Amartya. Human Development Index: Methodology and Measurement.
1994.
CLACSO Seminário Virtual nº 2025 – Técnicas de Análisis Estadístico 25
3. Questionários ou instrumentos
A pesquisa parte de um exercício de representação da realidade.
Um de seus passos iniciais é a criação de instrumentos de pesquisa e de
mensuração. Por vezes, essa se torna a etapa mais decisiva e complexa de
uma pesquisa quantitativa, pois envolve múltiplos desafios. A observação (e
registro) dos dados deseja ser muito bem planejada, sintética, ajustada à
realidade, ampla e padronizada, para permitir posterior comparação e análises.
Para tanto tem que saber exatamente o que observar e como observar, para
depois traduzir tais observações em números e processar a análise. Se houver
falha no instrumento, todo o resto estará fatalmente comprometido. A
formulação do questionário ou instrumento de pesquisa é uma tarefa muito
importante. Nele, o modelo já aparece desenhado em linhas gerais, que depois
serão completadas pelo cruzamento de informações da organização e análise
dos dados (como a construção de escalas). O modelo é uma forma de
representar a realidade através de informações centrais, consideradas as mais
relevantes, e que devem ser obtidas através do instrumento de pesquisa. Logo,
uma regra básica é que toda informação relevante para o modelo deve
aparecer no questionário e, por questão de síntese e inteligência, só devem
aparecer no instrumento os itens dedicados a produzir informações
previamente definidas no modelo. Ainda que uma informação for curiosa ou
interessante ou até importante, mas não estiver prevista no modelo analítico,
não deve fazer parte do instrumento. Perceba que a análise já nasce junto do
instrumento, pois na verdade análise e instrumento são inerentes ao seu
modelo de representação da realidade.
Outro passo muito importante diz respeito à métrica das
informações. As observações podem ser mensuradas em nível nominal (sexo,
raça), ordinal (preferências, opiniões, rankings), intervalar (temperatura,
proficiência), ou de razão (idade, altura, saldo). Quanto mais precisa a medida,
mais detalhada e coerente com a realidade, melhor ela é. O mesmo vale para
seu nível: quanto mais alto, melhor. Todavia, NUNCA se deve forçar uma
expressão real de um fenômeno a assumir valores ou medidas que não são
“naturais” dele. Você não quer criar outro mundo, com medidas ideais, mas
apenas traduzir o mundo real em um modelo numérico de representação
coerente com a realidade.
Agora que já sabemos o quanto os instrumentos são importantes e
que temos noção sobre a relação entre modelo, métrica, instrumento e análise,
podemos partir para algumas orientações para elaboração de instrumentos de
pesquisa ou questionários. O instrumento está intimamente ligado ao modelo, e
não deve conter perguntas redundantes nem supérfluas. Todos os itens devem
ser ajustados ao fenômenos real e devem conter uma proposta de tradução do
fenômeno em uma métrica criada pelo pesquisador, como expresso no modelo,
ou seja, sua codificação adequada para inserção no modelo analítico.
As perguntas devem ser dirigidas somente a quem de fato conhece /
experimentou o fenômeno. Se o sujeito não viveu ou não conhece o conteúdo a
que está sendo questionado, sua eventual resposta não contribui para a
pesquisa – só introduz mais ruído e distorce os dados. Antes de formular os
CLACSO Seminário Virtual nº 2025 – Técnicas de Análisis Estadístico 26
itens, procure ler e aprender com outras pesquisas que investigaram o mesmo
tema. As formulações devem ser claras, diretas, evidenciando objetivamente o
que se deseja saber. De outro lado, evite termos tendenciosos ou dúbios, que
podem induzir o entrevistado a um tipo de resposta. Evite frases negativas,
como: “Qual alternativa NÃO descreve sua preferência”, ou “Todas as opções
são válidas, EXCETO”. Evite também assertivas com formulações absolutas,
como “sempre”, “nunca”, “jamais”.
Cada pergunta deve se dirigir a uma única informação. Não junte
perguntas nem reúna duas perguntas em uma. Pergunte uma questão de cada
vez, procurando ser conciso, claro e direto. Um fenômeno em geral apresenta
várias manifestações das dimensões latentes envolvidas. Identifique as
principais para cada dimensão, organize-as em conjunto e padronize sua
mensuração (codificação) de forma a viabilizar a construção de um indicador
sintético posteriormente, como uma escala, um índice ou uma tipologia.
Ao formular alternativas nos campos de respostas, lembre-se de ser
exaustivo, ou seja, todas as respostas possíveis devem encontrar alguma
alternativa que as contemple. Uma forma de se precaver é incluir ao final a
opção “nenhuma das alternativas acima” ou “outro(a)s”. Ao montar uma
sequência ordinal de opções, por exemplo sobre opinião (concorda
plenamente, concorda parcialmente, discorda parcialmente, discorda
totalmente), observe se você deseja ou não uma opção de centro (“nem
concorda nem discorda”. Essas opções podem atrair muitas respostas de
indivíduos com pressa ou que não querem dedicar muita atenção à entrevista
ou indecisos. No entanto, essa opção pouco te auxiliar a identificar o lado mais
propenso de a pessoa se identificar – que é exatamente o objetivo deste tipo
de bloco. Uma alternativa é a seguinte sequência: “concorda integralmente”,
“concorda mais que discorda”, “discorda mais que concorda”, “discorda
integralmente”.
Por fim, devem ser evitadas / excluídas as perguntas que porventura
possam causar constrangimento ou fira algum princípio ético. O mesmo vale
para a confidencialidade, o anonimato, o sigilo dos dados e seu uso
estritamente acadêmico dos dados. Submeta sua pesquisa ao Conselho de
Ética em Pesquisa de sua Instituição. Siga suas orientações. Deve tomar
cuidado ainda em não oferecer nenhum tipo de prêmio ou punição por qualquer
tipo de resposta, seja material ou simbólico. A resposta tem que ser livre e
espontânea. Muito sucesso no curso e nas suas pesquisas.