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Organização
1
Psicologia Corporal
Copyright 2002 by Centro Reichiano
Catalogação na fonte do
Departamento Nacional do Livro
P974
Vários colaboradores
ISBN. 85-87691-06-6
CDD-170
APRESENTAÇÃO ........................................................................05
Psicologia Corporal /
José Henrique Volpi e Sandra Mara Volpi....................................08
3
O incosciente esculpido no corpo /
Natalina De Bastiani ....................................................................48
Personagens encouraçados /
Laurinda Rocha ...........................................................................84
Caracterialidade fálico-narcisista /
Cristian Guilherme Valeski de Alencar ......................................119
4
APRESENTAÇÃO
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artigos para revistas ou jornais. Dizem os especialistas que
“escrever é uma arte”. Só que essa arte não é tão simples assim.
A grande maioria de nós, desde muito cedo, não é estimulada a
expressar e tornar públicas suas opiniões, pensamentos e idéias.
A educação formalizada tolhe a espontaneidade e, por
conseqüência, a criatividade. Estimula-nos a somente digerir e
reproduzir conhecimentos já cristalizados, puramente teóricos,
racionais, colocando cada vez mais a mente sobreposta aos
sentimentos e a razão muito acima da emoção.
Ao término de uma graduação, é muito comum
encontrarmos os recém-formados sonhando com bom emprego,
mínimo esforço e ótimo salário. Não leva muito tempo para que
esse sonho se desnude na mais dura realidade: o desemprego,
a exigência de experiência na área, salários desrespeitosos,
concorrência desleal, os quais somados, geram não menos que
um descrédito no país e na profissão.
Não são poucos os que abandonam a profissão antes
mesmo de tê-la exercido. Porém, existem aqueles que, desde o
início da graduação, mesmo sem a certeza de como será o
caminho que virá pela frente, lançam-se em busca de novos
conhecimentos, novos desafios, dedicando grande parte de seu
tempo livre para a realização de estágios, leituras, cursos, etc.
No mercado de trabalho, esta dedicação será o diferencial que
proporciona a esse profissional usar toda a sua criatividade na
construção de novas possibilidades de atuação. Esse será o
profissional que estará sempre disponível a aprender, a ensinar,
enfim, a compartilhar.
Reich comparou o trabalho ao amor e ao conhecimento
enquanto fonte da vida. Julgou que a vida deveria ser governada
por todos os três. Isso faz pensar que o ser humano é
naturalmente produtivo, mas que infelizmente, por força de uma
sociedade repressora, essa produtividade é inibida.
Isso fica muito evidente, por exemplo, quando solicitamos
a algum colega que escreva um artigo para que possamos
publicar. A primeira resposta é quase sempre negativa, com
explicações do tipo: “preciso de muito tempo para escrever, pois
não tenho facilidade para isso”; “não sei escrever tão bem assim”;
“não tenho muito a contribuir”, etc.
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No entanto, sabemos que muitos de nós realizam
belíssimos trabalhos tanto teóricos quanto práticos, os quais
deveriam ser tornados públicos.
Acreditamos que só assim, sendo capazes de
compartilhar, poderemos crescer como pessoas e ajudar nossas
profissões a crescer como ciência.
Essa reflexão é um convite a você, leitor, que também se
identifica com essas idéias e dificuldades, para que compartilhe
seus conhecimentos, escrevendo!
Com carinho,
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PSICOLOGIA CORPORAL
José Henrique Volpi
Sandra Mara Volpi
Referências bibliográficas
Boadella, D. Nos caminhos da vida. São Paulo, Summus, 1992
Reich, W. La biopatía del cancer. Buenos Aires: N. Visión, 1985
Reich, W. A função do orgasmo. São Paulo: Brasiliense, 1986
Reich, W. Análise do Caráter. São Paulo: Martins Fontes, 1995
Volpi, J. H. Psicoterapia corporal - um trajeto histórico de Wilhelm
Reich. Curitiba: Centro Reichiano, 2000.
14
PINGUE-PONGUE
COM WILHELM REICH
Sara Quenzer Matthiesen
Referências bibliográficas
Higgins, M. & Raphael, C. (Org.). Reich fala de Freud. Lisboa:
Moraes, 1979
Lamas, B., Moraes, M. & Jacques, M. Bate-rebate com Reich:
uma entrevista ficcional com Wilhelm Reich. In: Revista da
Sociedade Wilhelm Reich. Vol. 2, 1998
Reich, W. Paixão de juventude: uma autobiografia (1897-
1922).São Paulo: Brasiliense, 1996
Reich, W. Last will and testament of Wilhelm Reich. Rangeley,
1957
Udy Magalhães especial. Rio Claro, ano II, n. 96, 13/01/2001
17
AGORA NÃO QUERO MAIS!
Natalina De Bastiani
Referências bibliográficas
Freud, S. A Interpretação dos Sonhos. Obras Completas. Rio de
Janeiro: Imago, 1987, vol. IV e V.
Lowen, A. Medo da vida - caminhos da realização pessoal pela
vitória sobre o medo. São Paulo: Summus, 1986
21
ENQUANTO A AUTO-REGULAÇÃO
NÃO É POSSÍVEL...
Simone Sabino
Referências bibliográficas
Baker, E. F. O Labirinto Humano. São Paulo: Summus,1980
Konia, C. Orgonoterapia – Parte II: Considerações Energéticas.
In: Jornal de Orgonoterapia, v. 20, n.1,1985
Lowen, A. A Espiritualidade do Corpo. São Paulo: Cultrix,1990
Reich, W. Crianças do Futuro. Curitiba: Apostila traduzida pelo
Centro Reichiano de Psicoterapia Corporal, s/d.
Corradini, G. Grupos de Movimentos com Crianças. In: Revista
Psicoterapia Corporal, n. 6, p. 4. Curitiba: Centro Reichiano de
Psicoterapia Corporal, 2000
Sabino, S. A Literatura Infanto-Juvenil Aplicada à Psicologia. In:
Revista Psicoterapia Corporal, n. 6, p. 6. Curitiba: Centro
Reichiano de Psicoterapia Corporal, 2000
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O TIGRE E O DRAGÃO...
E O SUPER-HOMEM
Alberto Pucci Junior
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OFICINA DE TRABALHOS CORPORAIS:
CONTRIBUIÇÃO AO DESENVOLVIMENTO
DE CRIANÇAS
Cassiano Ricardo Rumin
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A técnica da massagem
No desenvolvimento das atividades, nos deparamos com
o questionamento da técnica de massagem que seria mais bem
indicada. Havíamos começado nosso trabalho com a Shantala
(Leboyer, 1999). A Shantala é utilizada na Índia, seu país de
origem, para o cuidado de bebês e também de crianças. Neste
trabalho estas manobras de massagem foram utilizadas como
uma técnica de terapia corporal.
Gerda Boyesen (1986) indicou que a massagem deve ser
aplicada semanalmente. Este período é indicado para que o
organismo possa usufruir alterações no tônus muscular e elaborar
as emoções referentes à dimensão simbólica da região
massageada, é necessário um lapso de tempo para que uma
dinâmica corporal se desenvolva. A utilização de técnicas de
fisioterapia viria agir diretamente no sintoma. Esta orientação de
tratamento contemplaria apenas o aspecto motor da deficiência.
Ficaria negligenciado o sofrimento psíquico e a história que
modelou os corpos. Justamente não era esse o entendimento
que tínhamos da deficiência. Entendíamos apenas que eram
corpos que se delimitavam de forma diferenciada.
Com o auxílio da Psicossomática vimos nos sintomas
físicos uma proteção contra um sofrimento psíquico de intensidade
maior. Groddeck (1997) aponta que os sintomas produzidos pelo
corpo do homem, muitas vezes têm sua predisposição psicológica.
Assim, o toque poderia mobilizar sentimentos que estariam
relacionados simbolicamente, às regiões do corpo que se
encontravam afetadas pelo fenômeno psicossomático.
A escuta terapêutica
A possibilidade da escuta terapêutica se instaurou depois
de várias sessões em que permaneciam calados. As crianças
demandavam apenas o acolhimento de seus corpos neste
momento. As verbalizações sobre seus sentimentos surgiram
posteriormente, em conjunto com mudanças no esquema
corporal. As mudanças na expressão da tensão muscular surgiram
quando seus esquemas corporais já se encontravam mais bem
coordenados. As dores crônicas, de modo geral, haviam reduzido.
Neste momento estabeleceram-se dores agudas; tentávamos
resgatar junto às crianças o sentido, o significado simbólico
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daquelas sensações dolorosas. Tentávamos levá-las ao
questionamento de como aquelas dores poderiam se expressar,
para que elas se estabeleciam, se havia acontecido alguma coisa
desagradável, se estavam aflitos com algum sentimento, se seus
familiares estavam bem. Buscávamos resgatar as atividades do
cotidiano da criança, convidando-as a produzir associações,
tentando apreender de uma forma ampliada, a dor de seu dia-a-
dia.
O esforço terapêutico visava que o paciente tivesse contato
com a realidade. O primeiro nível de realidade que o paciente
deveria ter contato era a imagem corporal. Os contatos com as
regras sociais e as orientações culturais só ocorreriam
posteriormente, a partir do substrato - organização do ego –
oferecido pela integração do corpo cindido.
Na concepção de Lowen (1983) “há uma realidade
indiscutível na vida de toda pessoa, e ela é sua existência física
corporal. Seu ser, sua individualidade, sua personalidade são
determinados por seu corpo” (pág 15). Deste modo o
estabelecimento de dores agudas permitiu o trabalho psicanalítico
da interpretação.
Talvez o campo de interpretação tivesse se estabelecido
por mero acaso em relação ao aparecimento das dores agudas.
Porém, a Psicossomática indicou-nos que a possibilidade de
verbalização apareceu, pois, as crianças estavam tendo contato
com camadas mais profundas de seu Soma. Não foram apenas
as dores musculares que se modificaram, houve uma mudança
relacionada ao contato com sentimentos e fantasias antes
encobertos pelas expressões de dores crônicas.
Passou a existir para as crianças, um espaço onde
poderiam contemplar sentimentos conflitantes. A presença do
trabalho de interpretação possibilitava um sentimento de “estar
seguro” em relação ao contato com os afetos cindidos
(esquizóides), assim, as crianças poderiam elaborar conflitos e
propiciar às funções do ego maior grau de especialização e
organização. A capacidade de elaboração subjetiva e a
possibilidade da expressão dos conflitos no grupo de trabalho
possibilitariam a integração de afetos esquizóides. Entendíamos
que poderia ocorrer uma integração do ego infantil, podendo ter
uma melhor capacidade de discriminação e síntese.
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Por vezes, foram solicitados atendimentos
individualizados. Acolhemos esta demanda e garantimos a todos
os participantes do grupo que encontros particularizados seriam
mantidos em sigilo. Em decorrência das férias escolares surgiu a
demanda do grupo pelo acompanhamento terapêutico. Ouvimos
queixas das crianças e de alguns pais sobre o tempo em que
permaneceríamos afastados. Optamos pela manutenção do
vínculo terapêutico em encontros realizados nas residências das
crianças.
Pensávamos em envolver os pais nas atividades de
aplicação da Shantala, pois, a distância afetiva em relação aos
familiares era uma queixa que ouvíamos de modo generalizado
no grupo. Alguns pais prontificaram-se ao envolvimento neste
trabalho. Outros nem aceitaram nossa presença em suas
residências. Parecia haver o estabelecimento de uma linha
divisória entre os pais que se preocupavam com o
desenvolvimento de seus filhos e os que possibilitavam o acesso
de suas crianças as atividades do Projeto CRER apenas para
ocupá-los.
Referências bibliográficas
Boadella, D. Correntes da vida: São Paulo: Summus, 1992
Boyesen, G. Entre psique e soma. São Paulo: Summus, 1986
Groddeck, G. Estudos psicanalíticos sobre psicossomática. São
Paulo: Perspectiva, 1992
Groddeck, G. O livro DISSO. São Paulo: Perspectiva, 1997
Grünspun, H. Distúrbios psicossomáticos da criança: o corpo que
chora. São Paulo: Atheneu, s.d.
Leboyer, F. Shantala: uma arte tradicional - massagem para bebês.
São Paulo: Ground, 1999
Lowen, A. O corpo em depressão. São Paulo: Summus, 1983
Spitz, R. A. O primeiro ano de vida: um estudo psicanalítico do
desenvolvimento normal e anômalo das relações objetais. São Paulo:
Martins Fontes, 1996
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POTÊNCIA ORGÁSTICA
E ENCOURAÇAMENTO:
DOIS CONCEITOS FUNDAMENTAIS PARA
ANÁLISE E VIVÊNCIAS EM BIOENERGÉTICA
Leonardo José Jeber
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uma agradável e quente sensação de saúde e bem estar. Essa
energia flui através das correntes plasmáticas em nosso
organismo.
Segundo Orson Bean, a eliminação dessa energia se
processa pela atividade, excreção, expressão emocional, pelo
processo do pensamento e ao ser transformada em calor corporal
que é irradiado para o meio ambiente. Além disso, atua sobre o
crescimento. Em casos normais, essa energia é produzida em
proporção superior à que é eliminada. Esse excesso de energia
é armazenado para atender a situações de emergência como,
por exemplo, a luta ou o trabalho excessivo. Mas, quando não se
registra qualquer emergência, a energia continua aumentando
para que o organismo se desenvolva continuamente ou venha a
perecer eventualmente, a menos que exista um mecanismo
qualquer que se encarregue de libertar o excesso da energia
acumulada que tenha atingido determinado nível. Nos indivíduos
saudáveis, esse nível se manifesta pela excitação sexual. A
produção de energia cria um estado de tensão, e o método criado
pela natureza para aliviá-la e regular a sua produção é o orgasmo
sexual. A profunda sensação de calma que se segue ao clímax
sexual realmente satisfatório é a prova da eliminação dessa
tensão. Entretanto, a tensão é liberada e a energia regulada
somente quando o indivíduo é capaz de conseguir uma satisfação
sexual completa, saudável e amorosa, ao que Wilhelm Reich
conceituou de Potência Orgástica. Nas palavras de Wilhelm
Reich, potência orgástica é a capacidade de abandonar-se, livre
de quaisquer inibições, ao fluxo de energia biológica; a capacidade
de descarregar completamente a excitação sexual reprimida, por
meio de involuntárias e agradáveis convulsões do corpo.
As convulsões involuntárias e agradáveis do corpo são o
que Wilhelm Reich denominou de reflexo do orgasmo. Essas
convulsões naturais ocorrem na segunda fase do ato sexual, que
é a fase de contrações musculares involuntárias, diferente da
fase de contrações musculares voluntárias do ato sexual. A
excitação que ocorre causa contrações involuntárias de toda a
________
sempre está a favor da natureza. Aqui basta esclarecer que natural quer dizer
não neurótico, aquilo que funciona espontaneamente, que não perdeu a sua
funcionalidade original.
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musculatura das regiões genital e pélvica. Essas contrações se
experimentam sob a forma de ondas.2
Para Reich, é inútil a experiência sexual compulsória,
obrigatória ou incompleta. O orgasmo deve ser absolutamente
agradável e espontaneamente acompanhado pelo relaxamento
total, na ausência de energia orgônica não eliminada. Essa falta
de eliminação faz-se sentir sob a forma de tensão ou
desassossego. Num indivíduo saudável, a necessidade de
satisfação sexual e eliminação está inteiramente baseada nesse
fluxo da energia orgônica.
Foi estudando e pesquisando sobre os conceitos acima
que Wilhelm Reich chegou a compreender como o organismo
não satisfeito produzia as estases de energia ou as couraças
musculares crônicas.
Couraça ou encouraçamento, portanto, é um outro
conceito criado por Wilhelm Reich.
Couraças ou bloqueios musculares: o movimento
ondulatório do fluxo energético, que se movimenta pelo eixo
longitudinal do corpo, de cima para baixo e de baixo para cima é
interrompido por grupos de músculos que se ordenam ao longo
desse eixo longitudinal, como os anéis de uma armadura; daí a
denominação couraças musculares. Os anéis de músculos são
unidades de função vegetativa, que servem para bloquear
emoções específicas.
Segundo Orson Bean, há muitos séculos, o Homem é o
único entre todos os animais a assim proceder, e vem interferindo
no processamento de suas funções naturais ao evitar o fluxo, a
produção e a liberação de sua energia orgônica. E o faz ao se
tornar incapaz de conseguir satisfação sexual completa, natural
e saudável, através de um processo que Wilhelm Reich chama
de couraça, conforme explicitado acima.
Alexander Lowen, médico e psicoterapeuta, criador da
Análise Bioenergética3 , a partir dos estudos de Wilhelm Reich,
resgatou o termo bioenergia para denominar a energia chamada
________
2 Para maior clareza no entendimento do ato sexual e suas fases, recomendo
a leitura do livro “A Função do Orgasmo”, de Wilhelm Reich.
3 Aqui definimos Análise Bioenergética como a forma de psicoterapia individual
que integra corpo e mente num trabalho que considera os conteúdos verbais
e corporais do cliente.
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por Reich de orgone. Alexander Lowen alargou a abrangência
do trabalho corporal em psicoterapia e introduziu o “Para Casa”
da Bioenergética, que pode ser feito individualmente ou em Grupo
de Movimento e Vivências Bioenergéticas.
Alexander Lowen, no lugar de simplesmente pressionar
músculos cronicamente tensos, fez uso de posições de stress
que forçam os músculos a cederem. E a evidência desse
relaxamento pode ser vista numa vibração fina e tênue dos
músculos. Essa vibração é o elemento chave da vitalidade
orgânica e é similar ao fenômeno das contrações musculares
involuntárias do ato sexual, o qual Wilhelm Reich identificou como
reflexo do orgasmo, que se manifesta através de ondas ou
correntes plasmáticas que circulam livremente pelo corpo quando
este está livre de tensões crônicas.
A descoberta importante feita por Lowen foi a de que uma
pessoa, cujo fluxo de energia é bloqueado, perde parte de sua
vivacidade e de sua personalidade. E essa perda causa
transtornos físicos-emocionais como depressão, ansiedade,
compulsão, angústia. Segundo Alexander Lowen, desta forma,
a vida perde suas cores, se torna sem graça.
A Análise Bioenergética e o Grupo de Movimento em
Vivências Bioenergéticas são trabalhos cujos objetivos estão
embasados nos conceitos acima descritos e em última instância
desejam contribuir para que as pessoas restituam o seu prazer
de viver, pois como nos diz o mestre Lowen, “Com prazer a vida
é uma aventura criativa; sem ele, é uma luta pela sobrevivência”.
Referências bibliográficas
Bean, O. O milagre da orgonoterapia. Art Nova Editora, 1973
Lowen, A. Exercícios de bioenergética. São Paulo: Ágora, 1986
Rablen, E. Introdução à Bioenergética. In: Jornal do I.I.B.A.
Reich, W. A Função do Orgasmo. Martins Fontes, 1995
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UMA VISITA AO CONSULTÓRIO
DO DR. REICH,
COM MORTON HERSKOWITZ
José Henrique Volpi
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A primeira entrevista foi de coleta de informações a
respeito da vida pessoal e profissional de Morton. Ao final, Reich
disse que iria aceitá-lo como paciente apenas provisoriamente e
que a terapia poderia ser interrompida por qualquer um dos dois
ou por ambos quando julgassem pertinente. Além disso, Reich
exigiria a assinatura de Morton num documento que o autorizava
a hospitalizá-lo, caso necessário. A partir daí, o tratamento foi
iniciado, mas o documento para a assinatura de Morton jamais
lhe foi dado. Muitas vezes era essa a forma que Reich tinha para
testar o empenho, o desejo e o investimento de uma pessoa no
processo terapêutico. Segundo Morton, essa consistia numa
prática freqüente por parte do mestre.
A percepção de Reich era algo incomum. Não adiantava
esconder nada dele porque, no final, tudo era explicitado, quando
ele olhava a fisionomia da pessoa e perguntava: “O que é que
você decidiu não me contar?” Para Morton, as sessões com Reich
pareciam ser de uma profunda limpeza. Durante as sessões Reich
era muito terno, mas às vezes assinalava as defesas de forma
muito clara e perturbadora, sempre testando seus pacientes. Certa
vez, após um ano de terapia com Reich, cujos honorários eram
de 50 dólares por sessão, um valor considerável para a época,
Morton foi surpreendido ao final da sessão com o comentário:
“de agora em diante o valor de sua terapia será de 100 dólares”.
Morton não questionou. Desceu as escadas do consultório e
efetuou o pagamento para Ilse Ollendorf. Retornou para a próxima
sessão, ao final da qual foi pagar os 100 dólares. Ilse então lhe
disse: “Não, o Dr. Reich disse que seus honorários são 50 dólares”.
Isso era mais que um teste, ia além de querer verificar se valeria
a pena pagar os 100 dólares por sessão, mas diz Morton que de
fato, se preciso, pagaria 200 dólares ou mais.
Em um ponto de sua terapia, passavam-se as semanas e
nada de especial acontecia. Foi quando Reich lhe perguntou:
“Você realmente quer ser um terapeuta? Você está tão morto
que nunca poderá ser um terapeuta”. Isso bastou para que na
sessão seguinte muita coisa nova acontecesse. Finalmente, certo
dia Reich questionou: “Por que você não toma um paciente para
terapia e depois me diz como está indo?” Foi quando Morton deu
início ao seu próprio trabalho clínico.
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Era muito comum Reich utilizar-se de metáforas tanto no
processo de terapia, quanto nas aulas que ministrava. Costumava
dizer que o caráter de uma pessoa é como uma árvore que
cresceu em um lugar de muito vento e ficou torta, inclinada, e
que a terapia tinha por objetivo endireitar essa árvore retorcida.
Dizia também que a terapia era como uma locomotiva sobre trilhos
e que o terapeuta nunca a dirige, mas simplesmente retira os
obstáculos existentes nos trilhos e que o terapeuta nunca vai ao
que está por debaixo das couraças, mas o que está abaixo vem
até o terapeuta.
Quando Morton estava na metade do processo de terapia,
Reich mudou-se para Rangeley, Maine. Reich avisou-o
antecipadamente e disse que poderia indicá-lo a outros
vegetoterapeutas, mas Morton não aceitou e continuou seu
processo com Reich. Saía do trabalho e dirigia a noite toda até
chegar a Rangeley, na manhã do dia seguinte. Dormia por uma
hora, fazia uma sessão no sábado pela manhã e permanecia em
Rangeley para outra sessão no domingo pela manhã. Em seguida,
dirigia a tarde toda para poder trabalhar na segunda-feira.
Segundo Morton, esse parecia ser mais um teste que Reich estava
fazendo com ele, porque não era fácil dirigir distância tão longa,
semanalmente, tentando a cada semana superar o recorde
anterior de velocidade. Um dia Reich perguntou quanto tempo
Morton levava da Filadélfia, onde residia, até Rangeley. Morton
respondeu que levava em média umas doze horas. Reich,
surpreso, disse que esse era o tempo necessário para ir de Nova
Iorque até Rangeley e que, possivelmente, da Filadélfia seria muito
mais. Morton respondeu a Reich que da Filadélfia até Nova Iorque
eram mais três horas, mas que ele fazia o percurso todo em doze
horas. Reich então lhe disse: “Olhe, a menos que você leve doze
horas, mais três horas da Filadélfia a Nova Iorque, eu não vou
atendê-lo mais, porque você tem o direito de tirar sua vida, mas
não tem o direito de tirar a vida de ninguém que esteja na estrada”.
Não era fácil conviver com Reich. Ele ministrava cursos
em Orgonon, Rangeley, Maine, e às vezes varava a noite toda
discutindo a energia orgone. Quando cansava, parava
repentinamente; quando instigado, se irritava; quando
decepcionado, não media as palavras. Conta Morton que, em
41
uma dessas conferências, um biólogo apresentou um belíssimo
trabalho e, ao final, Reich disse que ele não sabia nada sobre o
que estava falando e que existia um grande espaço entre fazer
um trabalho científico e entender o que realmente é um trabalho
científico. Tratava cada um de seus alunos de uma maneira. Às
vezes era amável, dedicado, compreensivo, às vezes era irônico,
agressivo e impaciente. No intuito de chamar a atenção do mestre,
Morton fazia certas brincadeiras, mas não era muito feliz. Certa
vez, querendo mostrar que Reich não era um homem perfeito,
Morton perguntou-lhe: “Por que você tem barriga?” Reich
simplesmente respondeu: “Eu não tenho barriga”, e deu-lhe as
costas. Em outra ocasião, Morton havia lido um livro sobre
psiquiatria esotérica e teceu vários comentários, para atrair a
atenção de Reich, que reagiu dizendo: “Não me diga nenhuma
estupidez!” Assim era Reich. Quando perguntou a Morton se
pertencia a alguma religião, rapidamente o aluno respondeu: sou
judeu. Reich, então, lhe perguntou se ele, enquanto judeu,
freqüentava a sinagoga. A resposta foi “Não”, seguida por uma
contra-resposta: “Então você não é judeu”.
Morton relata que Reich sempre colocou um limite muito
claro e distante entre ele e seus alunos e/ou pacientes e que
raramente saia desse limite. Certo dia, Morton estava jogando
tênis com seu colega de turma Myron Sharaff, que também foi
aluno e paciente de Reich, e resolveram convidar o mestre para
jogar. Reich respondeu: “Quem sabe, um dia, possamos jogar
juntos”, o que jamais aconteceu. Em outra ocasião, convidaram
Reich para ir a um baile em uma taberna da região e a resposta
foi: “Vocês pensam que eu não gostaria de ir? Mas eu não posso
ir”. Era sempre assim, apesar da paixão que Reich tinha pela
dança.
Não era mesmo nada fácil conviver com o Dr Reich. É o
que muitos dizem. Reich era distante, exigente, impulsivo,
cobrador e não “dava moleza”. Mas também era amigo,
companheiro, atencioso, carinhoso, honesto e trabalhador. É o
que diziam Myron Sharaff, Eva Reich, Ilse Ollendorf, Peter Reich,
A. S. Neill e vários outros.
Talvez possamos dizer que Reich era o protótipo da
“encrenca”. Em todos os cantos pelos quais passava, Reich
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deixava marcas, arrumava briga e era considerado um
“intrigueiro”. Muitas vezes, no calor da fúria e embebido pela
impulsividade que o caracterizava, dizia coisas que davam
margem a interpretações fantásticas. Um exemplo disso pode
ser encontrado na biografia de Reich escrita por Ilse Ollendorf.
Ela conta que, ao perguntar algo a Reich sobre um paciente
homossexual, ele respondeu “Não gosto dessa porcaria!” Ilse
sugere em seus escritos que Reich tinha problemas com os
homossexuais e, de alguma maneira, um problema com a sua
própria homossexualidade latente. Por outro lado, em conversa
particular com Reich, Morton lhe perguntou como funcionava o
tratamento da orgonoterapia com homossexuais ao que Reich
respondeu que funcionava muito bem.
Sua forma peculiar de ser, de agir e de falar com certeza
dificultou a vida de Reich quando surgiram os problemas com a
lei. Várias publicações a respeito de Reich foram feitas em
diversas revistas e jornais e todos afirmavam que Reich era louco.
Isso dificultava ainda mais a credibilidade em Reich e nos trabalhos
de pesquisa que ele estava tentando desenvolver. Reich sempre
dizia: “ninguém tem o direito de interferir no meu trabalho” e, assim,
recusou-se a acatar as ordens do juiz federal e continuou
pesquisando, escrevendo e trabalhando com a investigação da
energia orgônica, acabando nos tribunais por desacato à
autoridade. De acordo com Morton, os alunos de Reich tentaram
convencê-lo de que aplicar a antiga sabedoria que era “dar a
César o que é de César” não iria funcionar nesse caso, porque
esse era um problema de ordem legal. Segundo os advogados,
Reich tinha todas as chances de ganhar, mas ele sempre se
recusava a seguir os caminhos legais. E assim, a única pergunta
que fizeram a Reich na Corte foi: “Desobedeceu ou não à
suspensão legal?” Reich disse que sim, mas que nunca foi lhe
permitido dar explicação, uma vez que o juiz não queria saber de
explicações, alegando que o que estava em julgamento era se
Reich havia ou não desobedecido à Corte. Reich também parecia
ter muita esperança nesse caso, mas quis o destino que ele fosse
condenado a dois anos de prisão, ficando encarcerado em uma
prisão de segurança máxima.
Afinal: Reich estava mesmo louco? Durante uma de suas
43
sessões com Reich, Morton teve a oportunidade de avistar um
avião que sobrevoou Orgonon várias vezes. Reich insistia em
dizer que era enviado pelo presidente dos Estados Unidos para
protegê-lo. É sabido que a fama de louco havia perseguido Reich
durante toda a sua vida. Qualquer rompimento entre Reich e algum
grupo, como quando saiu do comunismo, depois da psicanálise
e de vários outros grupos, fazia com que dissessem que ele havia
enlouquecido, fama essa que Reich carregou até o final da vida.
Às vezes, Reich dizia coisas realmente desconcertantes e assim
era possível vislumbrar sua forma de pensar; às vezes, os
pensamentos dele iam além do que se poderia alcançar. Ele tinha
uma mente realmente brilhante, mas aos olhos de quem não
conseguia acompanhá-lo, era a mente de um louco. Por último,
Morton afirmou que “Se tivéssemos um mundo cheio de gente
louca, como dizem que foi Reich, teríamos um mundo que não
se pareceria em nada com o mundo em que vivemos.”
44
VEGETOTERAPIA:
APRENDENDO A AMAR (SE)
Plínio Bezerra de Almeida Jr.
Referências bibliográficas
Navarro, F. A metodologia da vegetoterapia caractero-analítica. São
Paulo: Summus, 1996
Navarro, F. Caracterologia pós-reichiana. São Paulo: Summus, 1995
Volpi, J. H. Psicoterapia Corporal – um trajeto histórico de Wilhelm Reich.
Curitiba: Centro Reichiano, 2000
“A prevenção do encouraçamento é
o aspecto principal da higiene mental
(e da educação preventiva1 ).”
Wilhelm Reich
51
era a de sensibilizar e capacitar pais e educadores para se evitar
os processos de encouraçamento e de neurose nas crianças. O
seu trabalho “Crianças do Futuro”, feito entre 1926 e 1952,
expressa de forma inequívoca suas preocupações e ações para
com a educação das crianças. Outra contribuição de Reich foi a
introdução do princípio da auto-regulação como tentativa de
combater as propostas educacionais consideradas autoritárias
ou o grau exacerbado de intervenção por parte dos educadores.
Mais tarde tentou demonstrar a importância de se introduzir
medidas educacionais terapêuticas que visavam combater o
encouraçamento infantil, a cronificação de defesas com o
conseqüente distanciamento de um funcionamento auto-regulado.
A educadora Maria Veranilda Soares Mota nos lembra que
Reich tomou o princípio da auto-regulação da biologia. Ele verificou
que todos os seres vivos têm essa capacidade. Segundo essa
educadora, Reich percebeu que essa tendência é mais acentuada
nas crianças e chamou a atenção para o fato de que precisamos
pensar nos mecanismos dificultadores de aprendizagem
vivenciados na escola, tendo em mente os “prejuízos” que o
sistema-escola tem causado a inúmeras crianças.
Segundo Paulo Albertini, Reich está mergulhado na ampla
questão da sexualidade humana e sua visão de educação em
nenhum momento separa-se desse âmbito. A visão de educação
de Reich faz parte de um conjunto maior, de um combate cultural
mais amplo, e não se restringe, portanto, ao âmbito da educação
feita na escola.
Segundo a educadora Mota, para Wilhelm Reich, a
educação deveria se preocupar em destruir as couraças
caracteriais, e ainda, aprender a como evitá-las. Essa educadora
diz que: Quanto ao processo de prevenção das couraças, surge
a esperança de um processo educacional que trabalhe as
características básicas do conflito entre as expressões emocionais
inatas da criança e as características próprias à estrutura
mecanizada do homem. O educador precisa aprender a
interpretar a linguagem das expressões emocionais naturais da
criança e aprender a lidar com o meio social, restrito e amplo, na
medida em que este se opõe a essas expressões. É necessário,
portanto, quebrar os bloqueios, deixar a bioenergia voltar a fluir
livremente e assim aumentar a motilidade do homem, que
52
conseqüentemente resolverá muitos problemas decorrentes da
inércia no pensamento e na ação.
Essa mesma educadora acrescenta que, para Reich, uma
boa educação vai depender da saúde do educador, ou seja, do
seu bom estado emocional, pois são as patologias do educador
produtoras de frustrações desnecessárias no educando. Se o
educador não interferir de forma inadequada, não produzirá
patologias nas crianças. Em outras palavras, Mota diz que, para
Reich, a tarefa básica e soberana de toda a educação dirigida ao
interesse da criança (...) é remover todo o obstáculo do caminho
desta produtividade e plasticidade da energia biológica
naturalmente dada. Estas crianças escolherão seu próprio modo
de ser (...) devemos aprender com elas ao invés de impor-lhes
nossas idéias (...) e nossa tarefa é proteger sua força natural
para que elas possam fazer isso...
Alexander Lowen, criador da Análise Bioenergética, é um
psicoterapeuta notável que fez sua formação inicial com Reich, e
que traz contribuições significativas para pensarmos e agirmos
com as crianças em termos de educação e formação humana.
Especialmente em seu livro “O corpo em depressão” discute o
conflito e a relação entre amor e disciplina, dando contribuições
para pensarmos uma perspectiva educacional, na família e na
escola, com base na compreensão e no amor.
Para Alexander Lowen, os educadores que melhor educam
as crianças são aqueles que desenvolvem seu potencial criativo
e sua capacidade de compreensão. Em suas palavras temos:
A pessoa criativa tem bons sentimentos em relação às
crianças, pois reconhece a afinidade de seu espírito com o delas.
Alegra-se com as crianças, tanto suas como as dos outros, porque
toda criança é um novo ser cujos entusiasmos colocam excitação
nas vidas. Compartilha com as crianças os seus prazeres, pois
assim aumenta seu próprio prazer. Quer que toda criança conheça
a alegria de viver que flui espontaneamente quando há liberdade
para a manifestação dos impulsos naturais. Conheceu essa
alegria. Não pode ver uma criança magoada sem sentir dor, pois
também, em seu coração, é uma criança.
Portanto, tomando como referência os autores acima
mencionados nesse texto, realizo encontros de Vivências de
Bioenergética com crianças e educadores, contribuindo para que
53
na escola se criem espaços para um trabalho educacional
integrado, onde todas as dimensões do ser humano em formação
estejam sendo atendidas. Um trabalho em que alunos e
educadores tenham um espaço de expressão e manifestação
catártica de seus sentimentos e emoções, contribuindo assim com
a prevenção de seus encouraçamentos e neuroses.
A partir do trabalho que venho experimentando com
crianças e educadores, sugiro enfaticamente, que não só as
crianças, mas também os educadores possam participar de
vivências corporais através da bioenergética, porque é preciso
resgatar a escola como um espaço privilegiado para a realização
de todas as possibilidades humanas; porque é preciso fazer do
processo educacional um exercício da inteireza em que
educadores e alunos possam lidar com uma sabedoria prática
conjuntamente com os conhecimentos sistematizados que a
escola tenta socializar; porque para lidar com a atual crise mundial
em educação é preciso que cada educador se trabalhe na
instância de sua subjetividade, de seu mundo interior, de modo
que perceba que os conteúdos que compartilha com o aluno tem
a ver também com a maneira como ele está diante do mundo.
Acredito que, só assim, os educadores poderão estar capacitados
para formar, verdadeiramente, as personalidades integradas dos
alunos.
Quando educadores e crianças estão se encontrando em
sala de aula eles têm que se colocar como pessoas inteiras, com
múltiplas dimensões. Isso não tem sido muito considerado na
formação dos professores. Nossa cultura de formação valoriza
por demais a dimensão livresca, letrada e racionalista 2 ,
menosprezando e não considerando que o educador, para ser
inteiro, tem que se formar, também, na sua dimensão física,
emocional e espiritual. Assim, é preciso resgatar a pessoa dos
educadores que estão envolvidos nesse processo, e quebrar a
artificialidade que existe na prática docente.
É preciso tornar o educador sensível a si mesmo para
estar sensível ao outro. “Como os educadores vão conseguir
energia para lutar por uma cultura de solidariedade se eles
mesmos não estiverem inteiros?
O modelo tradicional de escola parou na transmissão de
conteúdos. Na perspectiva transpessoal, o papel da escola é
54
trabalhar com os seres humanos em sua inteireza. É preciso que,
além de serem capazes de elaborar com competência os
conteúdos, os educadores mergulhem corajosamente num
processo de auto-exploração, autoconhecimento e
transcendência. É preciso, também, que os educadores lutem
pela transformação político-social a partir da dimensão subjetiva
de seu próprio ser, de sua autotransformação.
Também para lidar com as dificuldades de seus alunos é
necessário que o professor compreenda as dinâmicas da psique
dentro de si mesmo e isso remete, novamente ao trabalho de
autoconhecimento. Somente trabalhando seu ser no mundo das
dimensões corpo-mente-espírito, o professor poderá ajudar seus
alunos a entenderem e resolverem seus problemas pessoais no
processo ensino-aprendizagem, que deve estar em contato com
a vida como um todo. Enfim, é preciso despertar no educador a
sua consciência inteira que parte da sua consciência corporal e
só assim ele poderá atender e respeitar a natureza corpórea da
criança, que é extremamente cinestésica e motora.
Nesse contexto, a prática e atendimento às crianças e
aos educadores, através das vivências em Bioenergética, feitas
individualmente ou em grupo, surgem como uma tentativa e
perspectiva de construir novos valores sociais que enfatizem a
qualidade de vida e as relações dos seres humanos consigo
mesmos, com seus semelhantes e com a natureza.
Reiterando o exposto acima, percebo que, na escola,
parece que o corpo tem sido indevidamente considerado pelos
professores como condição básica para a aprendizagem escolar.
Assim sendo, a escola de modo geral, não atende a uma série
de necessidades orgânicas e interesses funcionais/naturais dos
alunos por uma prática escolar que considere a dinâmica do corpo
em todo o processo ensino-aprendizagem, em toda e qualquer
disciplina escolar.
Dessa forma, as vivências corporais em bioenergética –
apresentadas numa perspectiva lúdica – fazem parte de um
conjunto
________ de práticas que visam contribuir com a qualidade de
2 É preciso deixar bem claro que a palavra letrada é um conceito
importantíssimo na área da Linguagem e para a formação de qualquer ser
humano, é um patrimônio da humanidade. O que estamos apontando é apenas
uma excessiva valorização desta perspectiva em detrimento de outras.
55
vida das crianças e dos educadores, apresentando-se e
constituindo-se como uma prática corporal terapêutica que tem,
nos princípios de carga-descarga/tensão-relaxamento e restituição
do fluxo energético, as suas bases de organização e execução.
Enfim, minha intenção foi a de mostrar a contribuição da
Bioenergética para a construção de uma formação humana
baseada em princípios educacionais centrados na auto-regulação,
no desencouraçamento, na restituição e manutenção do fluxo
energético, na construção de uma cultura escolar que esteja
integrada à dimensão da natureza humana, permitindo uma
educação preventiva, para educandos e educadores constituírem-
se cada vez mais como sujeitos harmonizados, saudáveis e
felizes.
Referências bibliográficas
Albertini, P. Reich: história das idéias e formulações para a educação.
São Paulo: Ágora, 1994
Gaiarsa, J. A. Sobre uma escola para o novo homem. São Paulo: Ed.
Gente, 1995
Jeber, L. J. A escola e autodisciplina. Mimeografado, 1999
Jeber, L. J. Educação para a auto-regulação. Mimeografado, 2000
Lowen, A. & Lowen, L. Exercícios de bioenergética. São Paulo: Ágora,
1985
Matthiesen, S. Q.. Criança, corpo e educação: fragmentos da obra de
Wilhelm Reich. In: Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v.22, n.2,
p.7, jan. 2001
Mota, M. V. S. Introdução ao pensamento de Wilhelm Reich e seus
reflexos na educação. In: Revista Reichiana do Instituto Sedes Sapientiae,
n.7, 1998
Nunes, O. F. & Paiva, M. J. A. A. A função educativa natural. In: Busseti,
G.R. Saúde e qualidade de vida. Editora Fundação Peirópolis, 1998
Pereira, I. L. L. Nova prática pedagógica. São Paulo: Ed. Gente, 2000
Reich, E. Energia vital pela bioenergética suave. São Paulo: Summus,
1998
Reich, W. Crianças do futuro. (Cópia mimeografada)
56
OS QUATRO ELEMENTOS
E A BIOSSÍNTESE
Maria Rosenberg Mizrahi
Pela psicoterapia
O conceito de temperamento está ligado ao de
constituição, isto é, às bases congênitas do indivíduo. Trata-se
das particularidades fisiológicas e morfológicas que diferenciam
os indivíduos e, precisamente, como diz Mac Dougall, da soma
59
de seus efeitos sobre a vida mental (e afetiva) do metabolismo,
das trocas químicas que se efetuam no organismo. Tudo isso –
não esquecendo que durante a vida embrionária há uma
predominância biológica endócrina e, durante a vida fetal, uma
predominância neurovegetativa – confirma que cada indivíduo
nasce com um temperamento particular.
Esquizóide ++ - -
Oral ++ - ++
Psicopata ++ ++ -
Masoquista - ++ ++
Rígidos ++ ++ -
Genital + + +
Referências bibliográficas
Arroyo, S. Astrologia, Psicologia e os Quatro Elementos. Editora
Pensamento, 1975
Boadella, D. Energy and Character (alguns textos)
Boadella, D. Correntes da Vida. São Paulo: Summus, 1985
Boadella, D. Apostila de Stress e Caráter.
Queiroz, G. J. P. As Qualidades Primitivas na Astrologia. São Paulo:
Editora Pensamento, 1989
Reich, W. Análise do Caráter. São Paulo: Martins Fontes, 1995
Zondag-Hamaker, K. Os quatro elementos e os caminhos da Energia.
Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1989
Considerações Finais
Devemos assumir que criar crianças saudáveis não será
simples, nem fácil, até que as funções básicas de saúde sejam
totalmente conhecidas. A tarefa básica e soberana de toda a
educação deveria ser dirigida ao interesse da criança, e não ao
interesse de programas partidários, religiosos, etc... Essas
crianças escolherão seus próprios modos de ser e determinarão
seu próprio destino. Devemos aprender com elas ao invés de
impor-lhes nossas idéias arrogantes e nossas práticas maliciosas,
que tem se mostrado tão prejudiciais e ridículas a cada nova
geração (Reich, 1987). É importante considerar que muitas
pesquisas feitas com crianças utilizando-se do método de
71
observação, foram feitas com crianças já encouraçadas e assim
é que os parâmetros de um normal desenvolvimento foram
estabelecidos. Uma vez que as crianças não são totalmente
encouraçadas não podemos empregar a mesma técnica
orgonômica de análise do caráter aplicada em biopatias de
adultos. Não podemos remover camada por camada com o
objetivo de alcançar a área e mobilizar a bioenergia genital na
criança antes de quatro ou cinco anos porque a genitalidade dela
ainda não está totalmente desenvolvida. Nossa tarefa está em
remover obstáculos no caminho natural do desenvolvimento em
direção à genitalidade plena.
Queremos também ressaltar a importância de entregarmos
nossos filhos a babás e educadores que não sejam
emocionalmente “tão” comprometidos, para que com isso nossos
filhos não corram o risco de... Você sabe!!! Um indivíduo rígido e
encouraçado não é capaz de perceber a pulsação da vida em si
mesmo; muito menos no outro. Saúde não consiste em nunca
ficar infeliz, ou estar feliz e saudável, mas basicamente na
capacidade de livrar-se da infelicidade e da doença.
Referências bibliográficas
Navarro, F. Caracterologia pós-reichiana. SP: Summus, 1995
Piontelli, A. De feto a criança. RJ: Imago, 1995
Reich, E. Energia Vital pela Bioenergética Suave. SP: Summus,
1998
Reich, W. The câncer biopathy. NY: F, Straus and Giroux, 1973
Reich, W. Esperimenti Bionici. Milano: SugarCo, 1979
Reich, W. A função do orgasmo. São Paulo: Brasiliense, 1986
Reich, W. Bambini del Futuro. Milano: SugarCo, 1987
Reich, W. Orgonomic Functionalism. Orgonon, 1990
Reich, W. Análise do Caráter. São Paulo: Martins Fontes, 1995
Volpi, J. H. & Volpi, S. M. Crescer é uma aventura!
Desenvolvimento emocional segundo a Psicologia Corporal.
Curitiba: Centro Reichiano, 2002
72
A CONSTRUÇÃO DO SELF SAUDÁVEL
COMO UMA FUNÇÃO DO GROUNDING
Odila Weigand
Conclusão
A Teoria do Apego é apoiada pelas neurociências,
confirmando que a regulação do afeto ocorre a partir de uma
sintonia cérebro-cérebro, a qual influencia também as funções
cognitivas.
Modelos Operativos Internos surgem a partir do senso de
self. Numa inter-relação contínua, os MOI passam a se modificar
ao longo da vida, numa recriação constante do senso do self,
que por sua vez tem a capacidade de alterar os MOI. Esta
recriação acontece baseada nas expectativas que se repetem.
Por outro lado, a capacidade reflexiva, ou seja, habilidade de
perceber estados emocionais do outro, parece ser segundo
Fonagy (2000) um elemento protetor favorável ao
desenvolvimento de resiliência e apego seguro, mesmo em
78
circunstâncias de privação e stress.
À sua própria maneira, Lowen tem uma abordagem
existencial da vida, embora seu enfoque se apóie numa visão de
self que passa pela vivência corporal, e não apenas pelas
representações criadas na mente, sem, no entanto excluir estas
últimas. Para Lowen o self saudável tem a capacidade de auto-
conhecimento, auto-expressão e auto-controle, funções que
dependem do funcionamento harmonioso corpomente.
Referências bibliográficas
Damásio, A. O Mistério da Consciência. São Paulo: Companhia
das Letras, 2000
Feeney, J. & Noller, P. Adult Attachment. Thousand Oaks, Ca:
Sage Publications, 1996
Fonagy, P. et al. Attachment, the Reflective Self and Borderline
States. In: Goldberg, S. Muir, R. & Kerr, J. Attachment Theory,
Social Development and Clinical Perspectives. Londres: The
Analytical Press, 2000
Hartmann, H. (1939) Psicologia do Ego e o Problema da
Adaptação. Rio de Janeiro: Zahar, 1989
Lowen, A. (1983) Narcisismo. A Negação do Verdadeiro Self. São
Paulo: Vozes, 1993
Lowen, A. (1995) Alegria: a entrega ao corpo e à vida. São Paulo:
Summus, 1997
Schore, N. A. The Effects of a Secure Attachment Relationship
on Right Brain Development, Affect Regulation and Infant Mental
Health. Infant Mental Health Journal. 22, 7-66, 2001. Disponível
em www.trauma-pages.com (Acesso: Março, 2002)
Zimerman, D. E. Vocabulário Contemporâneo de Psicanálise.
Porto Alegre: Artes Médicas, 2001
79
O REAL CONHECIMENTO:
SOM, CORPO E MOVIMENTO NA ESCUTA
E LEITURA TERAPÊUTICA
Fabiane Alonso Sakai
Corpo em terapia.
Que corpo é este em terapia?
Este corpo é... o nosso eu (Nietzche/Freud) que faz o
intermédio entre a realidade interna e a realidade externa.
Uma linguagem universal, não verbal, de caráter
conotativo, com significado da ordem do vivido.
O Inconsciente (Gaiarsa,1986) e o Consciente.
Um centro de informações (Weil e Tompakow,1990).
Um instrumento de prazer, de defesa e de conquista.
Antes de ser instrumento de prazer é um instrumento de
sobrevivência (preservação do eu), daí ser um instrumento de
defesa para conquista, chegando ao prazer.
É um processo – vivo, subjetivo – uma cadeia viva de
eventos que se manifesta ao longo do tempo.
É um corpo que se expressa, ou seja, emite sinais e
mensagens conscientes ou inconscientes. É um corpo que fala
com palavras, sons, gestos, posturas, sensações, sentimentos e
atitudes (ações), estabelecendo um diálogo tônico (linguagem
afetiva) de função determinante na aquisição de nossa noção de
vivência do corpo; um corpo que tem razões, que chora, que ri,
que canta, toca e dança.
Toda expressão deste corpo carrega informações
verdadeiras ou não, conscientes ou inconscientes e é um corpo
que será também receptor de mensagens e informações.
Como escutar e ler este corpo e suas informações? E o
que escutar/ler?
A escuta / o escutar é estar atento para perceber, seguindo
somente as suas próprias sensações (sentimento, o sentir) sendo
indiferente a conselhos não apenas dos outros, mas aos próprios,
pois estes fazem parte do aprendido, ou seja, distorcido e defletido,
80
para poder registrar o que foi emitido. É um estado, uma postura
ou uma atitude de atenção.
Escutar de forma integral, tendo real conhecimento, é
escutar com o corpo todo, como Cunha (2001) escreveu, com
todos os sentidos (audição, tato, [paladar], olfato, visão), escutar
pelas imagens mentais, pelas reações neurovegetativas, pelos
sentimentos, pela sensibilidade.
A escuta antecede ou é simultânea à leitura, essa que
vem a ser o observar os sinais, as características emitidas
(escutadas, vistas, sentidas), estudando, percebendo, intuindo
ou deduzindo a significação, decifrando ou interpretando o sentido.
É um conhecer e reconhecer e um sentir dentro de um critério,
como um instrumento de medida das informações consideradas
em conjunto (voz, intensidade, modulação, postura, movimento,
sentimento).
O som e o movimento emitidos, produzidos ou recebidos
pelo corpo (emissor/produtor/receptor) são a informação, o código
que produz no próprio emissor “corpo” uma ação/reação. Toda
ação/reação neurovegetativa é uma emoção e vice-versa, essa
que também faz parte da própria informação.
É necessário saber escutar e ler tanto este som/movimento
expressos, técnica e terapeuticamente, sabendo que são
codificações que representam a informação primária que se
originou de uma intenção psíquica, como também o “como” este
som e este movimento são expressos pelo corpo (indivíduo). Esta
informação é individual e caractereológica de determinada pessoa.
Por isso, há que se conhecer os códigos (som/movimento/corpo).
Mas tanto a escuta como a leitura vão depender da nossa
percepção, ou seja, do que somos capazes de escutar, entender
e ler. O modo como percebemos determina, na realidade, o modo
que escutamos, entendemos e lemos, determina o modo como
observamos o mundo.
Precisa-se conhecer as lentes (monitor de deflexão) que
são usadas para observar e o que estas lentes influenciam na
interpretação do que escutamos, vemos e sentimos.
Precisamos conhecer tudo a que nos relacionamos de
modo verdadeiro. E, enquanto terapeutas/pessoas, só
conseguimos agir assim, se primeiramente atingirmos a nossa
própria autenticação, o nosso próprio autoconhecimento, agindo
81
com as coordenadas da nossa natureza de base. Este
conhecimento é organísmico e é aí que deve acontecer a escuta
e a leitura terapêutica – dentro –, ou seja, no íntimo. Só assim o
escutar e o ler terapêuticos serão precisos, exatos com a natureza
vital e musical deste Corpo – Ser Humano. Longe da adivinhação,
mas muito próximo da intuição.
Referências bibliográficas
COVEY, S. R. Os 7 hábitos da pessoa muito eficaz. Best Seller,
1989
Cunha, R. Seminário Escuta terapêutica: Sons, Silêncios e Palavras.
In: ANAIS – III Fórum Paranaense de Musicoterapia. Curitiba, 2001
Meneghetti, A. Manual de Ontopsicologia. Porto Alegre: Psicologia
Editrice do Brasil. 1996, Vol. 1
Menin, M. Seminário Escuta terapêutica: Sons, Silêncios e Palavras.
In: ANAIS - III Fórum Paranaense de Musicoterapia. Curitiba, 2001
83
PERSONAGENS ENCOURAÇADOS
Laurinda Rocha
87
No livro Psicoterapia Corporal: Um trajeto histórico de
Wilhelm Reich, José Henrique Volpi aborda que, segundo Reich,
“toda frustração gera um desprazer e conseqüentemente uma
hipertonia muscular, chamada então de couraça muscular”. Essas
couraças são tensões crônicas que servem como defesas,
protegendo o indivíduo das experiências emocionais que o
ameaçam e que doem. O autor cita Reich, quando este introduz
o conceito de “identidade funcional” para afirmar que “as atitudes
musculares e as atitudes de caráter têm a mesma função no
mecanismo psíquico: podem substituir-se e podem influenciar-
se mutuamente. Basicamente não podem separar-se. São
equivalentes na sua função”.
Reich, quando teve a clareza da conexão entre estrutura
de caráter e rigidez muscular, passou a trabalhar diretamente a
couraça muscular do paciente, pois a partir daí, com o relato da
história do paciente, também fluia a energia que estava
aprisionada, e no momento em que as couraças iam se diluindo,
o paciente passava a sentir melhor a respiração e a descarga
elétrica que Reich denomina de “corrente vegetativa”.
Para Wilhelm Reich, quando uma couraça se dissolve,
ela libera a energia vegetativa, e traz também à memória
recordações que ficaram lá atrás, na fase infantil, que são as
principais causadoras do encouraçamento.
E assim Reich elaborou a técnica da “Vegetoterapia
Caracteroanalítica”, que inclui num só conceito o trabalho com o
aparelho psíquico e físico. Reich revisou e ampliou a Análise do
caráter, e dessa forma a terapia passou a ser não só psicológica,
como também biofísica, tendo como base as reações
neurovegetativas.
Referências bibliográficas
Lowen, A., Bioenergética. São Paulo: Summus, 1982
Volpi, J. H. Psicologia Corporal - Um Trajeto Histórico de Wilhelm
Reich. Curitiba: Centro Reichiano, 2000
Reich, W. Análise do Caráter. São Paulo: Martins Fontes, 1972
A relação mente-corpo
90
na terceira etapa, teremos um traço de caráter chamado de
Psiconeurótico (masoquista e obsessivo-compulsivo), e se tiver
sido fixado na quarta etapa do desenvolvimento, encontraremos
a predominância de um traço de caráter Neurótico (fálico-
narcisista e histérico). Por outro lado, se não houvesse nenhum
tipo de bloqueio em qualquer dessas etapas do desenvolvimento,
encontraríamos o que Reich (1995) denominou de caráter genital.
Mesmo tendo sofrido um bloqueio em uma etapa, é
possível que a energia se fixe em outra etapa, gerando com isso
novos bloqueios, denominados por Navarro (1995) de coberturas.
Isso explica o porque das diversas reações de uma pessoa que
tem determinado traço de caráter, mas age como se tivesse um
outro.
Em se tratando da depressão, inúmeras são as escolas
que buscam dar uma explicação plausível para esse transtorno.
Do ponto de vista da Psicologia Corporal, a gênese está
ligada a um bloqueio na segunda etapa do desenvolvimento,
etapa oral (Navarro, 1995) ou de incorporação (Volpi & Volpi,
2002), ou seja, no período que corresponde à amamentação e
desmame. Nessa etapa, iremos encontrar dois aspectos
relacionados à perda do seio: a repressão e a insatisfação. A
repressão, a falta – oralidade reprimida – é produzida pela
privação, pela ausência ou insuficiência do seio e afeto da mãe
durante a amamentação. A insatisfação - oralidade insatisfeita -
é provocada por uma satisfação inicial limitada, seguida por uma
súbita privação que geralmente ocorre quando a mãe decide
repentinamente interromper a amamentação sem levar em conta
as necessidades da criança (Baker, 1980). Ambas as condições
são responsáveis pela formação do traço caracterial denominado
por Navarro (1995) de borderline, que determina uma tendência
à depressão. “O oral insatisfeito é quem sempre esconde a
situação depressiva, mas como é plenamente consciente dela,
procura compensá-la com o alimento, álcool, fumo ou qualquer
substituto que possa dar-lhe pelo menos um mínimo de satisfação
no nível oral”, apresentando sintomas como desânimo,
sonolência, bulimia, etc (Navarro, 1995, p. 59). O oral reprimido,
por sua vez, não tem consciência desse aspecto depressivo e
defende-se com um comportamento reativo raivoso e hiperativo,
91
anorexia, ansiedade, cansaço, etc. “A raiva serve para evitar a
depressão” (Navarro, 1995, p. 58). Em alguns casos, a oralidade
reprimida retira energia do pescoço que permanece enrijecido e
passa a mostrar um forte traço narcísico.
Enfim, a oralidade pode ocultar uma depressão e essa
ser mascarada por diversos outros sintomas de acordo com os
demais bloqueios corporais e a direção do fluxo energético que
pode se dar para os olhos (primeiro nível) ou então, para o
pescoço e alto tórax (terceiro nível). Portanto, o refluxo da energia
em direção ao primeiro nível traz manifestações psicóticas
(alucinações, delírios, paranóia, pensamentos suicidas, etc) e
em direção ao terceiro nível, traz um moralismo com tendências
obsessivas e/ou um narcisismo exagerado acompanhado de
sadismo oral, o que explica os diferentes sintomas da depressão.
A explicação da depressão, do ponto de vista médico,
neurofisiológico, vem por parte da deficiência na recaptação de
neurotransmissores como dopamina, serotonina ou
noradrenalina. A depressão não é induzida quimicamente, mas
sem o fator químico não há depressão (Paykel & Herbst, 1989).
Há também quem defenda a opinião dos componentes
genéticos estarem envolvidos na depressão (Teles, 1992). Fatores
genéticos aumentam as chances, mas não resta dúvidas que
fatores ambientais estimulam o desencadeamento de um quadro
depressivo.
Felizmente, são inúmeros os recursos disponíveis para o
tratamento da depressão, tanto do ponto de vista médico quanto
psicológico. O que não podemos esquecer é que ambas as
condições estão presentes e se influenciam mutuamente e que
quando associamos o tratamento médico, seja ele alopático ou
homeopático, ao tratamento psicológico, os resultados são muito
mais eficazes e o tempo de tratamento consideravelmente
abreviado.
Para uma melhor ilustração do assunto, relatarei alguns
trechos de um caso clínico de um paciente depressivo, que irei
chamar de Pedro, que foi tratado por mim durante pouco mais de
dois anos na abordagem corporal da Orgonoterapia.
Quando me procurou pela primeira vez, Pedro estava com
35 anos. Tinha concluído o segundo grau e nunca mais teve
92
interesse em voltar a estudar. Trabalhava como funcionário
público e tinha uma situação financeira estável. Estava casado
há 9 anos e sem filhos por opção. Essas foram as poucas
informações colhidas em nosso primeiro contato porque quando
perguntei a ele sobre os motivos que o levavam a buscar
psicoterapia, Pedro respondeu: “essa é a última chance que
dou a mim mesmo. Não tenho mais forças para lutar e nem sei
contra o que estou lutando. Só sei que não quero mais viver”.
Naquele momento, tentei investigar mais a respeito de sua queixa,
de que luta era essa, mas não tive sucesso. Tudo girava em
torno de apenas uma frase: “eu já disse: não quero mais viver”.
E realmente essa frase era expressa até mesmo no corpo de
Pedro, que nesse momento encontrava-se murcho, sem vida e
sem energia. Os olhos estavam parados e sem brilho, os cantos
da boca caídos tal qual os ombros que se arqueavam para frente
numa posição de defesa do peito, e a respiração, nem dava para
perceber.
Nessa mesma sessão questionei-o sobre o uso de
medicamentos, na tentativa de encaminhá-lo para um tratamento
paralelo, mas imediatamente ele responde: “não acredito em
remédio e não quero fazer uso disso”.
Senti que de nada adiantava ficar querendo saber da
origem daqueles sentimentos porque além de tudo, Pedro dizia
que já não tinha mais forças nem para falar. Lowen (1972) nos
chama a atenção para o fato de muitas vezes o paciente deprimido
não querer ou não poder verbalizar porque a depressão imobiliza
a pessoa e “terapeuticamente, é mais fácil e efetivo trabalhar
com um paciente através do lado físico ou energético da
personalidade do que pelo lado psíquico ou dos interesses”. E
complementa dizendo que “qualquer pessoa que tenha vivido ou
tratado de alguém deprimido sabe quanto é difícil ativá-lo
aumentando seu interesse. Sua resistência contra ter um
interesse ativo no mundo é enorme” (p. 68). E era isso o que
podíamos perceber em Pedro, um estado de apatia geral, uma
postura defensiva e um tom de voz extremamente agressivo,
característico de quem tenta se defender da depressão (Navarro,
1995).
As primeiras sessões com Pedro foram praticamente sem
93
o uso da palavra, já que ele não tinha forças para verbalizar. No
início de cada sessão, a ênfase se dava em trabalhos respiratórios
e na massagem reichiana, mas de forma enérgica e energética
(sem dor), principalmente na região das costas e pernas a fim de
estimular os músculos e a energia daquelas regiões que são
muito importantes principalmente quando nos sentimos cansados,
deprimidos ou enfraquecidos. O trabalho com a concha, um dos
actings (movimentos) da vegetoterapia sistematizada por Navarro
(1996a), gradativamente foi acalmando o paciente de forma a se
sentir cada vez mais protegido e seguro. Naquele momento, eu
estava representando o útero bom e acolhedor que ele não teve,
história essa que acabou sendo revelada por um de seus
comentários quando disse que era filho de mãe solteira, que não
queria ter o bebê, mas não tinha nem ao menos condições
financeiras para fazer um aborto. “Então, resolveu deixar assim
e eu nasci”.
O acting da concha era seguido dos actigns dos olhos e
da boca, mas o tempo todo, mesmo durante a massagem, eu
chamava a atenção de Pedro para a sua respiração, que deveria
ser mais profunda e pausada, na tentativa de aumentar a sua
absorção de oxigênio e conseqüentemente, o nível da sua
energia. Esse era uma meta naquele momento. “Ajudar a pessoa
a recuperar sua energia é o primeiropasso no tratamento da
depressão” (Lowen, 1972, p. 70).
Um outro recurso de fundamental importância no
tratamento do paciente depressivo, e que utilizei com Pedro, foi
a manta orgonótica. Feita de material orgânico e inorgânico, a
manta tem como função captar energia orgone da atmosfera e
transmiti-la ao corpo, aumentando com isso a captação das
moléculas de oxigênio feita pelos eritrócitos e com isso, aumentar
a energia das células. Eu havia emprestado a Pedro uma de
minhas mantas para que ele fizesse uso em sua própria
residência, 30 minutos pela manhã e 30 minutos no final da tarde.
Como Pedro estava de férias nessa época, passei a
atendê-lo três vezes na primeira semana. Na semana seguinte,
na quarta sessão, os resultados já eram visíveis. A pele de Pedro
estava mais corada, sua postura mais ereta, já conseguia se
alimentar melhor, falar mais e começava a demonstrar, nas
94
poucas palavras, um certo interesse pela vida. “A energia se move
para dentro de um organismo na forma de comida, ar ou estímulo
excitante... Quando está faltando prazer, a motivação para a
movimentação diminui concomitantemente” (Lowen, 1972, p. 71)
A continuidade do tratamento foi revelando um traço de
caráter borderline muito forte, somado a um leve bloqueio dos
olhos, o que explicava o refluxo energético para esse segmento
e os pensamentos suicidas. Um outro traço de caráter muito
marcante era o seu masoquismo.
Ao mesmo tempo em que Pedro apresentava uma certa
melhora já nas primeiras sessões, afloravam suas resistências
ao tratamento, que eram algumas vezes demonstradas pelos
atrasos às consultas, pedindo que terminássemos mais cedo a
sessão porque ele tinha um compromisso agendado, etc. Além
disso, Pedro passou a zombar de cada acting (movimento) que
fazia, ou ria muito sem motivo aparente, tecia comentários sobre
uma situação qualquer ou algo que havia se lembrado e queria
me contar naquele momento, movia-se constantemente no divã,
demonstrando claramente um incômodo. Estas resistências eram
explicitadas e analisadas conforme iam surgindo, o que dava
margem à novas transferências que apareciam, dessa vez, nos
momentos em que Pedro era questionado ao final de cada acting
(conforme a proposta da orgonoterapia), sobre suas sensações
e pensamentos. Suas respostas eram do tipo: que saco, ta chato,
to perdendo tempo, etc, num tom de voz era agressivo como que
querendo se afastar do terapeuta. Essa situação, da dificuldade
da entrega ao movimento, aos poucos foi revelando o desejo de
Pedro de um dia poder ter conhecido o pai para lhe dizer “umas
boas verdades e mostrar o quanto ele foi cachorro em abandonar
a família”. Essa era a raiva que Pedro sentia do pai e a dificuldade
de se permitir ser cuidado por alguém, devido ao medo de ser
rejeitado. A rejeição era parte da sua história e logo precisaria
ser enfrentada.
Nas sessões seguintes, uma grande quantidade de
material verbal foi surgindo. Suspendemos temporariamente o
trabalho com os actings, mas não com a manta orgonótica, e
passamos a trabalhar verbalmente nas questões de Pedro,
aproveitando esse momento já que não era característico dele
95
falar tanto assim. Segundo Lowen (1972), “quando o problema
da depressão é trabalhado terapeuticamente, cada um dos seus
aspectos – perda de fé no self, busca de objetivos irreais, fracasso
por não estar devidamente fundamentado, diminuição do grau
de energia devem receber atenção. Não é suficiente, por exemplo,
sugerir um novo interesse à pessoa deprimida a menos que ela
possa extrair algum prazer dele, e isso não será possível se ela
tiver culpas inconscientes e ansiedades a respeito do prazer.
Estes precisam ser resolvidos primeiro” (p. 72).
Cada vez mais se tornavam claros os motivos que
detonaram a depressão de Pedro. Num período de
aproximadamente seis meses antes da depressão se manifestar,
Pedro passou por uma série de situações frustrantes. A primeira
delas foi a reprovação em uma seleção interna em seu trabalho
para um cargo que ele sempre quis conquistar. Em seguida a
mão adoeceu e teve que ser operada. Como ele não tinha nenhum
outro membro da família por perto, passou praticamente um mês
dormindo com a mãe no hospital. Enquanto a mãe estava no
hospital, a esposa cobrava a atenção do marido, demonstrando
muito ciúmes e querendo que ele ficasse por perto o tempo todo.
E assim, uma série de situações frustrantes aconteceram nesse
período, o que, para uma estrutura de caráter oral como a dele,
fez com que suprimisse seus sentimentos e criasse “uma
predisposição para a depressão, uma vez que ela impede o
indivíduo de confiar em seus sentimentos como um guia para
seu comportamento” (Lowen, 1972, p. 64). E em decorrência do
bloqueio no segmento ocular e o refluxo para essa região, o
resultado era de uma depressão com tendências suicidas
(Navarro, 1996b).
Aos poucos fomos voltando ao trabalho com os actings e
progredindo em direção aos segmentos inferiores. Na
orgonoterapia começamos o trabalho sempre no primeiro
segmento de couraça (ocular) e dirigimo-nos para o sétimo e
último (pélvico). Com aproximadamente seis meses de
orgonoterapia, chegamos ao segmento do pescoço e peito e foi
quando Pedro trouxe à tona os conflitos de seu casamento
passando agora a questionar os sentimentos que tinha pela
esposa e a sentir atração por outras mulheres.
96
Foi somente quando demos início ao trabalho sobre o
diafragma e abdômen que Pedro teve vontade de voltar a estudar.
Ciente do tempo que estava afastado da escola, ingressou num
cursinho preparatório e em seguida prestou vestibular, tendo sido
aprovado numa das melhores colocações. Esse fato fez com que
ele comentasse em uma sessão o quanto estava feliz por saber
que era capaz e que estava começando a acreditar que sempre
foi capaz, mas nunca se empenhou para conquistar seus
objetivos. Essa é mais uma das características da oralidade:
esperar que as coisas cheguem prontas, sem precisar fazer muito
esforço.
Praticamente um ano e meio já havia se passado e Pedro
continuava em terapia, sendo atendido uma vez por semana em
sessão de uma hora e meia, tempo tradicional da sessão de
Orgonoterapia. Desde então, muita coisa havia acontecido e
mudado na vida de Pedro. Pode discutir abertamente com a mãe
a respeito de suas frustrações com ela, foi aprovado numa nova
seleção interna para o cargo que sempre havia almejado, estava
decidindo os últimos detalhes da separação, havia conhecido e
saído com várias outras mulheres, mas dizia que ainda não estava
pronto para assumir um novo relacionamento. Estava muito claro
para ele que seu casamento não foi por amor e sim, como ele
mesmo dizia: por “comodismo de ambos”.
Após pouco mais de dois anos de tratamento,
caminhávamos em direção ao término da Orgonoterapia, com o
trabalho sobre o segmento pélvico. Não demorou muito para que
Pedro trouxesse novamente suas queixas do casamento, dizendo
que estava muito triste pelo tempo que deixou de viver durante
todos esses anos, escondendo-se atrás de um emprego
monótono e de um casamento sem amor e sem prazer algum.
Disse também que pela primeira vez estava conseguindo fazer a
distinção entre gozar e ter orgasmo numa relação sexual e que a
cada dia estava mais convicto de que viver vale a pena.
Conseguimos também nessa etapa que ele buscasse tratamento
homeopático, que, depois de iniciado, parecia estar surtindo muito
efeito e coincidiu com o término do nosso trabalho.
A última notícia que tive de Pedro, uns três anos depois
que ele terminou a Orgonoterapia, foi por meio de um e.mail que
97
ele me enviou dizendo que estava se organizando
financeiramente para passar novamente pelo processo da
orgonoterapia (terapia de manutenção), mas que no momento
ainda não estava em condições porque havia se casado e já
tinha uma filhinha de dois meses. Dizia estar na reta final de sua
graduação e me agradecia, do fundo do coração, por ter lhe
ajudado a ver que a vida podia ser diferente. Em suas últimas
palavras Pedro escreveu: “obrigado por me ajudar a dar cor à
minha vida... por acreditar que eu podia sair dessa... por me ajudar
a encontrar coragem pra viver e hoje poder dizer: amo viver!”
Referências bibliográficas
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gballone/voce/dep.html#1
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Vol. XIV, 1972
LOWEN, A. O corpo em depressão: as bases biológicas da fé e
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Navarro, F. Metodologia da Vegetoterapia caractero-analítica. São
Paulo: Summus, 1996a
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Paykel, E & Herbst, K. Depression. Oxford: HMB, 1989
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Volpi, J. H. & Volpi, S. M. Crescer é uma aventura!
Desenvolvimento emocional segundo a Psicologia Corporal.
Curitiba: Centro Reichiano, 2002
98
HIPERTENSÃO ARTERIAL E
TRATAMENTO NÃO MEDICAMENTOSO
Ana Maria Gomes Soares
Justificativa
Os vasos sanguíneos são formados por tecido muscular
liso e comandados pelo sistema nervoso autônomo: simpático
(contração) e parassimpático (expansão). Embora o músculo
cardíaco seja constituído de músculo estriado, ele recebe o mesmo
comando nervoso dos músculos lisos. O estudo bioelétrico das
fibras musculares efetuado por Setekleiv, citado por Boadella,
nos mostra que, quando as fibras estriadas se apresentam no
estado ativo, as lisas tendem a se manter relaxadas. Temos
poucos meios para interferir nos músculos lisos, mas se
trabalharmos nos estriados vamos interferir nos lisos.
Na hipertensão, a contração das artérias é a expressão
do aumento do tônus muscular da parede dos vasos, isto é, há
um predomínio do simpático (contração). Assim, considerando-
se os fatores psiconeurofisiológicos da hipertensão:
simpaticotonia, alexitimia, hostilidade latente, intensidade em tudo
que faz, etc, achamos que estes tipos de pacientes podem ser
beneficiados com um trabalho corporal de abordagem reichiana
e neo-reichiana, com o objetivo de atuar na musculatura estriada
para promover um aumento da parassimpaticotonia, como
também facilitar a liberação da hostilidade. Por isso optamos em
aplicar as técnicas de trabalho corporal da Core Energetics, que
se apóia nas seguintes premissas básicas:
- A pessoa humana é uma entidade psicossomática;
- A fonte de cura está dentro de nós, e não em um agente externo;
- Toda existência forma uma unidade que se move em direção a
uma evolução criativa;
- Somos inteiramente responsáveis pelo nosso próprio processo
101
evolutivo.
O grupo
Desde abril de 1997, no Centro de Saúde da Unidade de
Saúde Integral de Planaltina, temos utilizado técnicas da Core
Energetics com o objetivo de verificar seus efeitos nos níveis de
pressão sanguínea dos hipertensos. Os pacientes são
encaminhados pelos médicos cardiologistas e clínicos da unidade,
sem que modifiquemos sua orientação terapêutica. A pressão
arterial destes pacientes foi tomada antes e ao final de cada
sessão.
No período de 2 de abril de 1997 a 12 de fevereiro de 98
foram atendidos 185 participantes, durante 61 encontros
semanais. Estabeleceu-se como critério de inclusão neste estudo
a participação em mais de 14 sessões. Vinte pacientes
preencheram este critério e foram incluídos no estudo. Destes, o
mais jovem tinha 36 anos e o mais velho 73 anos. A média de
idade do grupo foi de 53,6 anos. O paciente com maior tempo de
evolução de doença havia sido diagnosticado há 21 anos e o de
menor tempo há 4 anos.
Resolvemos não adotar nenhuma das classificações para
hipertensão uma vez que o método mais preciso para tal é o
mapa (monotorização ambulatórial de pressão arterial), que é
inviável nas nossas condições de trabalho. Por outro lado, os
pacientes já faziam tratamento medicamentoso e haviam sido
orientados e conscientizados quanto à dieta apropriada, o que
impossibilitava obter uma precisão quanto ao estágio da doença.
O Método
As sessões foram sempre estruturadas em cinco etapas:
1)Movimentação - aquecimento; 2)Percepções corporais;
3)Trabalhando a negatividade; 4)Trabalhando a positividade e 5)
Canalização de energia.
Resultados
Calcularam-se as médias das pressões (sístolica e
diastólica) dos 20 pacientes em cada uma das quinze primeiras
sessões das quais participaram. As médias obtidas para as
pressões sistólica e diastólica na primeira sessão foram
102
comparadas com as médias obtidas em cada uma das 14 sessões
posteriores, por intermédio do teste estatístico T de Student. Ao
nível de significância de 10%, houve diferenças significativas
apenas na pressão sistólica, na quinta e na décima segunda
sessões em relação à primeira. Quanto à pressão diastólica, não
se registrou qualquer diferença significativa entre a primeira
sessão e as demais. Segundo os pacientes em seus depoimentos,
os benefícios experienciados no grupo foram: melhora da
qualidade do sono, diminuição da ansiedade e de respostas
negativas a preocupações, ao estresse, ao medo, à depressão,
diminuição da cefaléia, do nervosismo, diminuição da dosagem
dos medicamentos e das crises hipertensivas. Dois pacientes
relataram que não precisaram mais procurar as unidades de
emergência. Sentiam-se mais felizes, mais seguros, mais
contatados com os companheiros do grupo e familiares,
demonstrando mais ânimo para viver.
Conclusões
No período em que trabalhamos, não observamos
nenhuma complicação secundária que pudesse ser atribuída à
prática dos exercícios realizados. Atribuímos a não redução
significativa dos níveis tencionais à idade dos pacientes (média
de 53,6 anos), na qual já existem calcificações e diminuição da
elasticidade e flexibilidade dos vasos.
A Sociedade Brasileira de Hipertensão recomenda, entre
outras medidas não medicamentosas para o controle da
hipertensão e dos fatores de risco cardiovasculares, a redução
do peso corporal e exercícios físicos regulares, e inclui nas
medidas sem avaliação definitiva as medidas antiestresse.
Nas técnicas do Core Energetics, usamos exercícios
físicos regulares com o objetivo de liberar as emoções e reduzir o
estresse. O trabalho já realizado com esses 20 pacientes nos
permite concluir que estudos devem ser realizados com a
aplicação da Core em pacientes com hipertensão limítrofe em
que a pressão sistólica esteja igual ou superior a 140mmHg e
abaixo ou igual a 160mmHg e a pressão diastólica esteja igual ou
acima de 90mmHg e abaixo ou igual a 95mmHg.
Um dos aspectos mais atraentes desta recomendação é
o baixo custo do tratamento e a ausência de riscos. Acreditamos
103
também que hipertensos já definidos, principalmente nos estados
iniciais da moléstia, poderão beneficiar-se grandemente do
trabalho regular com a Core. Isto poderia evitar que tais pacientes
evoluam de hipertensão limítrofe para definitiva e desta para os
níveis mais avançados.
Referências bibliográficas
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104
A VISÃO REICHIANA DE HOMEM:
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Ivomar Pelizzaro
106
visão de homem é uma visão saudável. Para isso, ele nos aponta
novos caminhos e direções.
Referências bibliográficas
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Volpi, J. H & Volpi, S. M. (Org.) Revista Psicologia Corporal.
Curitiba: Centro Reichiano, 2000b, no. 9
107
CORPO:
CRIANDO INTIMIDADE
CONSIGO MESMO*
Ana Lucia Rocha
108
vivo onde os novos acontecimentos que nos atravessam
imprimem em nós mudanças, e vemos assim, modos da gente
ser – da gente se relacionar, modos da gente se dizer, modos da
gente se perceber – se alterarem.
Podemos então experimentar a potência, as possibilidades
e a plasticidade de nossas vidas, dos nossos corpos. Podemos
perceber que não somos seres fechados, mas sim seres
processuais. Somos auto-construção. Formamos novos eus,
novas formas. Essa é a jornada e o destino de todos nós: nos
formar sempre novamente.
E aí, olhando para trás, podemos admirar quantos eus já
formamos, quantos jeitos, quantas formas diferentes e múltiplas
– para dar conta dos acontecimentos-em-nós.
E olhando hoje, podemos ver eus, formas de si ser,
algumas inéditas, outras conhecidas que estamos sendo agora,
para dar conta dos efeitos dos acontecimentos em nossas carnes.
E se olharmos para frente, podemos imaginar que corpos
de hoje também se transformarão pois não vivemos num mundo
estático. O mundo, nós, e tudo no mundo somos de natureza
processual, construindo-nos na borda presente-futuro, sempre
inédita.
Quantas vezes vivemos ou ouvimos de amigos: estava
levando a vida de um jeito, mas... aí então...
Podemos também lembrar como são os enredos dos
filmes: os personagens, a cidade ou o planeta estão levando suas
vidas, aí então... São situações onde os personagens lidam com
acontecimentos internos ou externos: o como são afetados por
eles, e, como usando suas carnes, vísceras, sentimentos e
sistema nervoso (e, às vezes, usando efeitos especiais!) criam
novas formas, novos comportamentos, gerando, com o que tem
em si e ao seu redor, saídas para as situações.
Podemos dizer (utilizando o título de um grande filme):
e... o vento levou uma forma de ser, gerando outras. E isso, nos
filmes, nos encanta, e isso faz crescer em nós um sentimento de
que somos todos da mesma humanidade: seres que, afetados
em si pelos acontecimentos, geram, com a matéria prima de seus
corpos, respostas, criam formas novas de prosseguir.
Podemos dizer que nosso destino é estarmos sempre
grávidos de nós mesmos, gerando outras formas de si ser.
109
Sou um corpo vivo, pulsante, sou um processo contínuo
que cria formas. Formas de si mesmo. Experimento que me auto-
construo o tempo todo fazendo formas, comigo mesma, para dar
conta dos acontecimentos que vão ocorrendo em mim mesma.
Vou fazer um convite para você: acesse a você mesmo
neste momento, faça uma pausa na maneira como você estava
me lendo... Dê um tempo... Quem aparece aí?... O que altera em
você ao ler este parágrafo com este tipo de convite?... Perceba,
caso este meu convite o tenha afetado, como está reverberando
em você?... Você pode ter a experiência que a engenharia de
você mesmo, a sua forma, se alterou. E...
É assim que vivemos a vida toda: metamorfoses em
nossos estados modificando formas para dar conta do que se
passa em nós mesmos.
110
O corpo pessoal – como uso a mim mesma
Estes dois corpos, estas duas camadas da nossa
experiência somos nós como matéria prima, a plataforma de onde
criamos subjetivação.
Onde crio formas que respondem aos meus estados
afetados pelos acontecimentos.
Há muitos anos atrás me encantei com uma frase do
Caetano Veloso: “como é bom poder tocar um instrumento”. Essa
frase repercutiu em mim. Pensava comigo mesma, deve ser muito
bom estar em certos estados de alma e poder transformar isso
em expressão. Ter a experiência interna alongando-se pelos meus
dedos, roçando um instrumento e que virasse som; virasse forma,
expressão no mundo.
Passados os anos, conheci o pensamento e as práticas
corporalistas, entre elas, a que me responde hoje, o pensamento
de Stanley Keleman.
Hoje a frase do Caetano se transformou e se encarnou:
como é bom poder usar a mim mesma – criando forma, criando
corpo ao que se passa em mim e pôr no mundo –criando existência
– solidificando a experiência processual via formas no mundo.
Essa é a nossa terceira camada de experiência, é o corpo
pessoal. Nas outras duas camadas (pré-pessoal e pós pessoal)
o processo nos possui, são respostas ou do corpo herdado ou do
corpo social.
Aqui eu possuo o processo – eu dialogo com a experiência-
em-mim moldando formas.
O corpo pessoal é a maneira como lido, como trabalho os
meus legados, é o como subjetivo o que me afeta.
Acesse seu corpo pessoal... e você acessa as suas formas
próprias de afeto, suas formas pessoais de pôr limites ou propor
aproximação. Acesse esse corpo e você traz as suas formas
singulares de pensar, de se comunicar, de se ligar, de se aquecer,
de se divertir, de se sustentar na dor, e de ter prazer.
O uso do corpo pessoal, ativar essa camada, é a grande
sacada de como viver como processo onde tudo nos afeta, entra,
excita e remelexe nossas carnes. É tomar o processo da vida
nas mãos, é ser artesão de si na vida. É criar compromisso com
o próprio destino.
111
Como podemos viver a experiência de criar a própria vida
Podemos viver nossas vidas como vítimas ou
desbravadores – como disse Stanley Keleman no livro “Realidade
Somática”. Nós nascemos como corpo biológico da espécie e
somos inseridos numa sociedade com o seu repertório próprio
de comportamentos, valores, sistemas de troca, sistemas de
conhecimentos e de poderes. Nestes dois corpos nós não
exercemos escolha pessoal.
Os acontecimentos internos e externos nos afetam, nos
atravessam e nos modificam, e, também nesta esfera, não tem
escolha pessoal. Não tem como evitar ser afetado.
Quantas vezes dizemos ou ouvimos: eu nasci assim, ou,
eu sou assim. Ouvimos esta afirmação em diferentes tons:
melancólicos, autoritários, apegados...
Aqui aparece a questão: viver a vida vitimados pelas
circunstâncias ou como fundadores de novos jeitos de si ser?
Reconhecer que podemos pegar nossa vida nas mãos,
pegar nossos jeitos de viver e modificá-los se constitui como o
grande desafio para nossas vidas.
Vamos ver como essa tarefa é possível:
“O corpo fala por sensações, sentimentos, motilidades,
portanto ele precisa falar de volta consigo mesmo, de tal modo
que possa influir em seu comportamento. Então o corpo influencia
a si mesmo moldando-se a si mesmo em ações, inibindo-se a si
mesmo ou agindo em relação a si mesmo. Isso ele faz através de
um elegante sistema de feedback que chamamos cérebro. O
corpo organiza a si mesmo para conversar consigo mesmo
construindo para si um órgão capaz de receber de volta seus
padrões de ação e conversar consigo mesmo sobre eles.”
(Processos de corporificação do sujeito – cotejo com a
neurociência).
A possibilidade que temos é influenciar o como nos
encontramos. “Alterar sua situação de vida é ser capaz de mudar
seu funcionamento. Isso não significa apenas mudar a sua mente,
mas o modo como você usa a si mesmo.” (Realidade somática)
Pegar nosso processo de vida nas mãos é a tarefa de
auto-gerenciar-se, é pilotar-se:
- usar a nós mesmos como fonte de informação, de pesquisa e de
consulta;
112
- usar a nós mesmos para influirmos nos nossos estados atuais;
- usar a nós mesmos como desbravadores para outros jeitos de si ser;
- usar a nós mesmos para a criação de futuros.
1) Endings (Términos)
Interrompem o que estava estabelecido como seqüencial
e ordenado. Endings são uma desconfiguração, algo está
fenecendo, relações estão se modificando. “Endings geram
conflito entre ficar e partir. Cria-se um espaço, um vazio, um vácuo,
tanto no mundo objetivo quanto em nosso self emocional e
neurológico.” (Realidade Somática)
Experimentamos uma tristeza que ultrapassa nossa
compreensão, experimentamos desconforto, um estranhamento-
em-nós. Experimentamos lascas soltas de excitação que não se
encaixam nas nossas formas e corpos. Algo nos escapa. Nossas
edificações identitárias se desfocam e se corroem. Sustos,
apreensões, arrepios, desamparo, pausas e velocidades
alteradas de ansiedade.
Uma das tentativas desesperadas na experiência do
ending é manter todos os espaços e tempos preenchidos,
reconhecíveis. Quando terminamos alguma coisa um espaço
vazio realmente surge. A experiência da ausência de contornos,
da ausência da precisão dada pelo conhecido, a experiência de
frio ou confusão, a dissipação do contato pela ausência do atrito
com o(s) corpo(s) agora ausente(s) descrevem a despovoação
em nós mesmos. É um momento de encarar a nós mesmos como
desconhecidos.
O passado que fomos nos pede para dar um jeito para
inverter o quadro, para voltarmos a ser o como nos reconhecemos.
E, paradoxalmente, o presente, nos mostra que a vida e nós
estamos seguindo. Imperiosamente prosseguimos para frente –
114
a vida não pára! Pois a vida quer viver, e esse impulso básico
também nos remete a encarar o inominável.
Endings nos ensinam que os sentimentos, as formas de
ligação não se exterminam, e sim, se transformam, se desdobram.
Não rompemos conexões, não passamos borracha ou deletamos,
e sim mudamos direções, maneiras de conexão e destinos.
116
3) Forming (Etapa formativa)
“Do oceano do middle-ground, uma corrente somática de
organização nos impulsiona em direção ao
crescimento.”(Realidade Somática, p. 69) A partir do middle-
ground experimentamos intensidades, estados emocionais que
vão, aos poucos, se solidificando em formas. Descobrimos
aspectos diferentes de nós mesmos, configuramos novas
necessidades e imaginamos novas formas de estar no mundo.
No forming usamos os recursos dos nossos tecidos e
trechos/fragmentos dos nossos comportamentos sociais e
usinamos, conosco mesmo, formas novas de ser. Nos
reconhecemos num novo jeito. Se no middle ground colhemos a
abertura para novas experiências, sensações, necessidades,
aspirações, podemos, no forming, nos comprometer com o que
queremos formar. Como diz Stanley Keleman (Realidade
Somática, p. 69): “É transformar o insight e a visão em ação
muscular, forma corporal e forma social.”
O forming é uma fase de excitação que gera movimento e
aprendizagem. É um momento de rascunhos de comportamento,
hesitações, tentativas. É a fase do explorar e se familiarizar. É
um momento de mudar a ligação com pessoas, idéias e valores.
É lidar com os afetos e os ecos que estas novas formas geram
em nós mesmos e nos mundos que nos cercam. Experiência de
viço, de frescor e de recepção dos efeitos das novas formas.
Convivência com êxitos e fracassos. Momentos de
coragem de retomar o novo que estamos “corpando” frente à
ação automática dos hábitos.
Stanley Keleman extrai do cotidiano uma experiência, e
nos relata como o forming é como a aprendizagem de andar de
bicicleta. Há, no início, desajeitamentos, dificuldades, pequenas
seqüências de coordenação, desafios para seqüências de ação
mais longas, novos tropeços e inadequações, até que a nova
habilidade se instaura.
Forming é a experiência de sermos fundadores de nós
mesmos. É a experiência de dar conta das novas circunstâncias
de vida. Exercitando e acompanhando as nossas novas formas,
se torna possível ultrapassar o medo de se arriscar diferente ao
como nos conhecíamos. As novas formas não se opõem às formas
anteriores. Deleuze fala como “estados sucessivos de mim”. O
117
novo não é melhor que o velho. Também não estamos falando de
substituições. Estamos aqui experimentando a multiplicação de
nós mesmos. São outras formas de mim que estou incorporando.
Somos uma assembléia de corpos. Se estamos criando outros
graus na forma do enternecer-se com o outro, não significa jogar
fora a forma do enfrentamento ou da maternidade. Quanto maior
o nosso número de formas e graus de formas, maior possibilidade
teremos de dar conta do que surge em nosso processo de vida.
Referêcias bibliográficas
Keleman, S. Realidade somática. São Paulo: Summus, 1994
Keleman, S. Corporificando a experiência: construindo uma vida
pessoal. São Paulo: Summus, 1995
Keleman, S. O Corpo diz sua mente. São Paulo: Summus, 1996
Favre, R. & Sawaya, R. Processos de corporificação do sujeito –
cotejo com a neurociência. (acervo do Centro de Educação
Somática Existencial, São Paulo), 1997
Rolnik, S. Cartografia sentimental: transformações
contemporâneas do desejo. São Paulo: Estação Liberdade, 1989
118
CARACTERIALIDADE
FÁLICO-NARCISISTA
Cristian Guilherme Valeski de Alencar
Referências bibliográficas
Baker, E. F. O Labirinto Humano: causas do bloqueio da energia
sexual. São Paulo: Summus, 1980
Navarro, F. Caracterologia Pós-reichiana. São Paulo: Summus,
1995
Reich, W. Análise do Caráter. São Paulo: Martins Fontes, 1995
Volpi, J. H. & Volpi, S. M. Crescer é uma aventura!
Desenvolvimento emocional segundo a Psicologia Corporal.
Curitiba: Centro Reichiano, 2002
121
PENSANDO SOBRE
A INTELIGÊNCIA
Sandra Mara Volpi
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do mundo – inclusive daqueles que muitos adultos nunca nem
tinham ouvido falar – e que é capaz de uma após a outra,
relacioná-las aos respectivos países a que pertencem... ah, essa
criança sim, é inteligente! Nem por um minuto se pensa do que
vale uma criança saber o nome dos países de incontáveis
bandeiras. Para que servirá, no futuro? O que ela poderá produzir
de útil para si mesma e para as pessoas que a cercam a partir
dessa “inteligência”? Infelizmente, a insistência dos adultos que
cercam uma criança como essa, algumas vezes a levam a uma
compulsividade pela chamada “decoreba” e a um isolamento
tamanhos que a afastam de si mesma e de suas potencialidades.
É comum também que crianças que são criativas desde
muito cedo, sendo capazes de dar respostas eficientes em sua
interação com o mundo, ao entrar na escola, não tenham o
desempenho que até então parecia se pronunciar. Quando isso
acontece, ou seja, quando a criança não se adapta às
formalidades do ensino, passa-se a desconfiar do julgamento
anterior, segundo o qual a criança era esperta e inteligente, em
função de uma nova imagem, de fracasso escolar, ou, em outras
palavras, de “falta de inteligência”, para não dizer de “burrice”.
Jamais se desconfia do sistema de ensino, no qual um elefante
será sempre cinza e nunca amarelo ou cor-de-rosa...
Nestes casos, ou a criança passa a ser preterida e
abandona em um canto qualquer da sala de aula, ou sua agenda
é preenchida dia e noite com reforços escolares (e assim vai sendo
dizimada toda a sua criatividade) ou é levada quase que de
ambulância a uma avaliação psicopedagógica. Esta última pode
aplicar, de forma mecânica, seguindo o manual, os diversos tipos
de medição da inteligência por meios verbais, os quais fornecem
um número onde se encerra a inteligência da criança como um
todo, número este que será determinante em tudo o que se pensa
ou se fala sobre a criança a partir dali. Por outro lado, pode utilizar
estes mesmos testes de forma dinâmica, sem se ater ao número
em si, mas priorizando o desempenho da criança em habilidades
específicas, além de considerar outros meios de expressão da
inteligência, e com isso, desenvolver uma visão muito mais ampla
das competências daquela criança.
Hoje, questiona-se profundamente as antigas concepções
124
sobre a inteligência. Uma das teorias pioneiras em contestar tudo
que até então se falava sobre a inteligência é a Teoria das Múltiplas
Inteligências. Criada a partir do chamado “Project Zero”, na
Universidade de Harvard, em Boston, Massachussets, há mais
de vinte anos, por Howard Gardner, esta teoria parte da idéia de
que inteligência...
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Segundo a teoria das Múltiplas Inteligências, são sinais
da inteligência:
· Inteligência lingüística
· Inteligência musical
· Inteligência lógico-matemática
· Inteligência espacial
· Inteligência corporal-cinestésica
· Inteligência intrapessoal
· Inteligência interpessoal
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Eu inteligente, um Eu que dirige seu comportamento, conhece a
realidade, inventa possibilidades novas, cria significados livres.
É a partir dessas idéias que a Teoria das Inteligências
Múltiplas aproxima-se da Psicologia Corporal; entendendo que o
ser humano é sujeito e não objeto de suas próprias
potencialidades.
Referências bibliográficas
Gardner, H. Estruturas da Mente. Porto Alegre: Artes Médicas
Sul, 1994.
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Normas para publicação de artigos