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Xangô e-Racing

Resumo: Sistemas de suspensão e direção no


projeto de um Fórmula SAE elétrico.

João Victor Dias França

2023
Xangô e-Racing

Sumário:

0. Introdução - 4

1. Introdução à dinâmica veicular - 5


1.1 Principais objetivos de um carro de corrida - 5
1.2 Dinâmica de curvas - 6
1.3 Dirigibilidade e estabilidade - 7
1.4 Transferência de carga - 9

2. Pneus - 10
2.1 Geração de força em um pneu - 11
2.1.1 Adesão e histerese - 12
2.2 Sensibilidade do pneu - 12
2.3 Sip Ratio - 13
2.4 Temperatura e pressão dos pneus - 14
2.4.1 Temperatura - 14
2.4.2 Pressão - 15
2.5 Camber, caster e toe - 16
2.5.1 Camber - 16
2.5.1.1 Camber thrust - 17
2.5.2 Caster - 18
2.5.2.1 Mechanical trail e pneumatic trail - 18
2.5.3 Toe - 19

3. Braços de suspensão - 20

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3.1 Bump e rebound - 20


3.2 Anti-geometrias - 22
3.2.1 Anti-dive - 22
3.2.2 Anti-lift/Anti-squat - 23

4. Molas e amortecedores - 23
4.1 Amortecimento - 24
4.2 Molas - 24
4.3 Massa suspensa e não suspensa - 25
4.4 Rigidez à rolagem - 25

5. Geometria de direção - 26
5.1 Ackerman - 27

6. Considerações finais - 28

7. Referências - 28

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0. Introdução

Este resumo tem por objetivo conceituar os principais aspectos teóricos relacionados
aos sistemas de suspensão e direção em veículos de corrida, com enfoque no projeto de um
Fórmula SAE elétrico. Também é finalidade deste documento servir de objeto de estudo para
os membros da Xangô e-Racing, no presente e no futuro.
O projeto de ambos os sistemas é consideravelmente denso e com uma quantidade
elevada de variáveis, tornando imprescindível um embasamento teórico amplo, todavia boa
parte dos materiais de estudo são de difícil acesso e/ou compreensão. Sendo assim, a ideia
deste documento é facilitar o estudo inicial de ambos os sistemas por meio de um compilado
dos tópicos mais importantes relacionados à suspensão e direção.
É válido pontuar que a confecção deste material só foi possível graças ao suporte das
equipes de Fórmula SAE: Tesla UFMG, EESC-USP Tupã e Unicamp E-Racing.
Os objetos de estudo analisados e resumidos neste documento foram: Race Car
Design- Derek Seward; DINÂMICA VEICULAR - Relatório Conceitual(Tesla-UFMG);
Formula Student 101- Claude Rouelle; MILLIKEN, William - Race Car Vehicle Dynamics.

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1. Introdução à dinâmica veicular

A dinâmica veicular refere-se ao estudo do comportamento de um veículo em


movimento, analisando como ele responde às forças e aos momentos que atuam sobre ele
durante a aceleração, frenagem e curvas. É uma disciplina fundamental para entender como
um carro se move e como suas diversas partes interagem para proporcionar estabilidade,
controle e segurança ao piloto.
O entendimento desses fenômenos é a base para o estudo da suspensão e da direção de
um carro de corrida, uma vez que eles representam os componentes geradores das principais
forças que atuam no veículo, mas ao mesmo tempo estarão sujeitos às ações dessas.

1.1 Principais objetivos de um carro de corrida

No contexto de carros de corrida, as aplicações da dinâmica veicular vem no sentido


de priorizar o desempenho, o que se traduz em reduzir tempos de volta ao redor de um
circuito, aumentando a velocidade média do veículo ao longo do traçado. A velocidade média
em uma pista pode ser aumentada de três formas: aumentando as maiores velocidades no
circuito, aumentando as menores velocidades no circuito e diminuindo o tempo gasto nas
menores velocidades.
Para elevar as velocidades mais altas, é necessário reduzir o arrasto aerodinâmico,
ampliar a potência e minimizar perdas por atrito e ineficiências. Já para incrementar as
velocidades mais baixas, é crucial melhorar a aderência dos pneus, permitindo curvas em
velocidades superiores, especialmente considerando que as curvas são pontos críticos de
menor velocidade no percurso.
Para reduzir o tempo gasto em velocidades mais baixas, é fundamental aprimorar a
capacidade de aceleração longitudinal, isso implica aumentar o torque disponível nas rodas
por meio do aumento da aderência dos pneus, possibilitando retomadas de velocidade mais
rápidas nas saídas de curva. Adicionalmente, é essencial fortalecer a capacidade de frenagem
pois isso permite desacelerações mais tardias, proporcionando ao veículo mais tempo em altas
velocidades. A ênfase na melhoria da aderência dos pneus é recorrente, pois não apenas
otimiza as curvas, diminuindo o tempo necessário para percorrê-las, mas também contribui
para diversas outras facetas do desempenho do veículo, sendo uma peça-chave para aprimorar
o desempenho global no circuito.

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1.2 Dinâmica de curvas

Visando o incremento das menores velocidades em um circuito e redução do tempo


gasto nelas, é muito importante entender como o carro se comporta nas situações de curva.
Devido à inércia, para que qualquer corpo descreva uma trajetória curvilínea, ele deve
ser submetido a algum tipo de força centrípeta. Nos carros, quem cumpre essa função são os
pneus, que resistem à tendência inercial do veículo de sair pela tangente da curva, através da
geração de força lateral. A chave para fazer um veículo percorrer curvas a maiores
velocidades, portanto, é aumentar a capacidade de geração de força lateral. Aumentar a carga
vertical (força normal) sobre os pneus e sua adesão são as principais maneiras de fazer isso.

Um equívoco comum é pensar que aumentar a massa do veículo aumenta sua


aderência, em razão da maior carga vertical atuando nos pneus. Porém, não podemos nos
esquecer que, se por um lado as cargas verticais são aumentadas, o incremento de massa
também resulta no aumento da inércia do veículo. Logo, já se conclui que, no mínimo, não há
ganho nenhum e sim uma compensação de fatores. Mais à frente ainda veremos que não só
não há ganho algum, como também há perda de aderência, em razão do limite de
sensibilidade do pneu. Um outro erro que também ocorre é fazer a associação direta entre
atrito e força lateral; de fato o atrito está envolvido nessa equação, mas é incorreto dizer que a
força lateral é gerada pela força de atrito. Isso porque os principais mecanismos de geração de
força lateral são a adesão e a histerese, que estão relacionados ao comportamento da borracha
com o solo à nível molecular e com a área de contato do pneu. Posteriormente veremos com
mais atenção o que são esses dois mecanismos.

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1.3 Dirigibilidade e estabilidade

Apesar de certas simplificações pontuais em alguns casos, por via de regra um carro
será tratado como um corpo extenso, o que significa que a maioria das forças que atuam nele
serão interpretadas como momentos em torno de um dado eixo. Isso não é diferente para a
força lateral, a sua presença gera momentos em vários eixos, dentre eles está o momento de
Yaw, que atua em torno do eixo Z (vertical) do veículo.

Esse é o momento que garante que o veículo gire na pista. Pelo fato de seu eixo de
rotação estar posicionado no centro de massa, o que acontecerá é que os pneus traseiros em
meio a uma curva terão momentos opostos em relação aos dianteiros, quase como se cada um
tentasse girar o carro em em sentidos contrários. O momento que vai sobressair é aquele que
tiver a maior força e a maior distância em relação ao eixo de rotação.
Entendendo a relação entre essas duas grandezas (força lateral X momento), é possível
sintetizar alguns comportamentos comuns em pista. Todo pneu possui um limite de aderência
lateral, ou seja, produz uma força lateral máxima. Se for exigido mais do que esse limite, a
força produzida cai e o pneu passa a deslizar completamente. Se, por algum motivo, essa
situação ocorrer apenas com os pneus traseiros, o veículo irá lançar a traseira para fora da
curva (imagem abaixo), já que a inércia deixará de ser resistida pelas forças laterais dos pneus
traseiros.

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Essa situação é chamada de sobre-esterçamento (oversteer/saída de traseira), pois o


carro vira mais do que o solicitado pelo esterçamento do volante. Já se apenas os pneus
dianteiros ultrapassarem o limite da aderência, à frente do veículo será carregada pela inércia
para fora da curva, o carro tenderá a sair pela tangente, situação chamada de sub-esterçamento
(understeer/saída de dianteira), já que o veículo vira menos do que o solicitado pelo
esterçamento do volante.

Por definição, um veículo que possui boa estabilidade direcional tem boa capacidade
de retornar para sua condição de equilíbrio quando é desestabilizado, ou seja, quando há
incidência de sobre-esterçamento. Nesse aspecto, as dimensões principais do veículo são
determinantes: quanto maiores a distância entre-eixos e a bitola, maior a estabilidade, devido
ao maior momento polar de inércia. Além disso, a posição do centro de massa do veículo
também influencia diretamente: quanto mais deslocado para trás o centro de massa estiver,
maior será a tendência sobre-esterçante. Diversos outros fatores também influenciam na
estabilidade direcional e serão, em parte, cobertos neste resumo.
Além de boa estabilidade direcional, o veículo também deve apresentar uma boa
dirigibilidade, ou seja, as respostas aos comandos do volante devem ser rápidas, precisas e
com pouca incidência de sub-esterçamento. Note que são conceitos quase que opostos mas
que em um carro bem projetado conversam entre si, elevado momento de inércia, nesse caso,
passa a ser desvantajoso, uma vez que isso aumenta a resistência veículo a mudar de
trajetória.

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1.4 Transferência de carga

Inércia é a propriedade de todo e qualquer corpo que faz com que ele tenda a
permanecer com sua velocidade constante, seja ela nula ou não, exceto se alguma força atua
sobre ele. Esse fenômeno atuará em um carro em movimento nas frenagens, curvas e
acelerações e é ele quem define a diferença entre um modelo estático e idealizado do veículo
e o modelo dinâmico e por vezes imprevisível em meio a uma corrida.
Quando o veículo sofre uma aceleração (que nesse caso é um sinônimo de força), seja
longitudinal (aceleração/frenagem) ou lateral (curva), sua massa oferece uma resistência
natural a acompanhá-la, em razão da inércia. O resultado disso é que, no caso de a frenagem,
por exemplo, com o deslocamento do centro de massa para frente, as rodas traseiras perdem
parte da carga vertical que é obtida pelo peso, enquanto as dianteiras ganham, gerando um
ganho na capacidade de geração de forças na dianteira. A mesma ideia se aplica para para
acelerações ou curvas. Uma maneira prática de imaginar isso é que esse fenômeno sempre
atua no sentido contrário da força que está sendo aplicada, então se a curva é pra direita esse
ganho de carga virá nos pneus do lado esquerdo, todo esse processo é denominado
transferência de carga.

Uma das consequências da transferência de carga é o fenômeno da rolagem (roll).


Análogo ao momento de Yaw, o momento de rolagem também existe em função da geração
de força lateral em torno de um eixo, o eixo X (longitudinal), de maneira que a intensidade do
fenômeno é dada em função da altura do centro de massa e da magnitude das forças
envolvidas.

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Além da rolagem, há ainda mais um momento associado à transferência de carga,
sendo esse denominado pitch. Diferentemente dos outros dois, esse está relacionado à forças
longitudinais (aceleração/frenagem) e ocorre em torno do eixo Y (lateral). Sua influência é
muito simples de ser notada até mesmo em um carro de rua, é justamente a inclinação para
frente (dive) que um veículo tem em uma freada ou para trás (squat) no contexto de uma
arrancada ou retomada.

Todos esses efeitos ocorrem em função de alguns parâmetros fixos, como o peso, as
dimensões do veículo e a geometria da suspensão, e alguns outros variáveis como a posição
do centro de massa, intensidade das forças envolvidas e carga aerodinâmica. Um bom projeto
de suspensão tem que definir bem quais são esses parâmetros fixos e também deve ser capaz
de prever como será o comportamento dessas variáveis em meio a uma curva, por exemplo.
Como o grande objetivo de suspensão e de direção é aumentar as menores velocidades e
diminuir o tempo gasto nelas, no próximo tópico entenderemos como definimos esses
parâmetros estáticos para garantir o melhor desempenho dos pneus nessas situações.

2. Pneus

A parte mais importante de um carro, sem dúvida, são os pneus. São eles a única parte
que toca o solo, logo, são eles os responsáveis por imprimir no veículo as forças que o fazem
acelerar, frear e virar. Basicamente todos os principais sistemas de um veículo trabalham em
função dos pneus. Logo, é primordial entender como é o processo de geração de forças em
um pneu para garantir um bom projeto.

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2.1 Geração de força em um pneu

Um pneu gera forças por meio da deformação da sua banda de contato (contact patch)
em uma certa direção desejada, essa deformação vai ocorrer pois há entre a borracha e o solo
interações intermoleculares que vão resistir ao esterçamento das rodas, por isso há a
deformação. A intensidade dessa interação pode ser definida como o grip, um pneu com mais
grip é mais capaz de gerar forças, então essa é uma característica que, em geral, sempre
vamos buscar aumentar em nosso projeto. Uma das maneiras de medir a magnitude dessa
deformação é o ângulo que há entre a direção de movimento do pneu e a direção para qual ele
aponta, essa angulação é chamada de slip angle (ângulo de deriva).

Como dito anteriormente, é comum imaginar que a interação que há entre a banda de
contato e o solo é simplesmente o atrito, mas isso está incorreto. Se isso fosse verdade, não
haveria nenhum sentido os carros de fórmula 1 utilizarem pneus extremamente largos, pois
note que na equação Força de atrito = µ × Carga normal a área de contato não tem nenhuma
relação com o atrito, mas veremos a seguir que ela é um dos fatores mais importantes para a
geração de forças. A foto abaixo ilustra o quão grande os pneus de um carro de fórmula
realmente são:

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2.1.1 Adesão e histerese

A adesão está relacionada à interação molecular entre sua borracha e a superfície e a


eficácia do pneu em manter contato com a estrada. Essa interação, crucial para a tração do
veículo, é influenciada pela área de contato entre o pneu e a pista, sendo favorecida por uma
banda de contato mais larga, e pela carga exercida sobre o pneu. A carga aumenta a pressão
entre o pneu e a estrada, otimizando o grip. O equilíbrio desses fatores é fundamental para
aprimorar a performance e a segurança do veículo.
Já a histerese tem mais relação com a natureza da borracha e as irregularidades da
superfície à nível microscópico. O pneu se comporta de maneiras diferentes ao ser submetido
a tração em comparação a uma compressão, e essa diferença nas indicações trativas gera uma
componente de força resultante a qual denominamos histerese. Quando a borracha está
submetida a uma carga ela se comprime e absorve energia a uma certa taxa, mas a liberação
dessa energia ocorre de maneira não equivalente, o que gera esse fenômeno.

2.2 Sensibilidade do pneu

Até então, as relações entre carga e força gerada foram descritas como proporcionais,
e de fato são, todavia essa relação não é linear e com o tempo o incremento de grip em função
do aumento da carga vertical vai se tornando cada vez menor, essa característica é inerente a
qualquer composto e é chamada de sensibilidade do pneu. Cada pneu terá sua curva de Grip X
Carga vertical, mas em algum momento essa atingirá o seu ápice e desse ponto em diante é
notória uma queda drástica do grip, quando o pneu passa de seu limite dizemos que ele está
saturado.

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A sensibilidade do pneu é a grande inimiga da transferência de carga, isso porque essa
natureza não linear faz com que a transferência de carga vertical de um pneu para o outro
sempre gere alguma perda de força. Por exemplo, supondo que nosso pneu tenha uma curva
idêntica à imagem abaixo, que estamos analisando somente o eixo dianteiro e que cada pneu
está sujeito à uma carga vertical de 4000 N:

Note que com 4000 N de carga vertical cada pneu gera algo próximo de 6000 N, o que
totaliza 12000 N de força lateral. Agora se imaginarmos uma situação de curva em que há
transferência de exatos 2000 N de um pneu para o outro, um ficará com 2000 N enquanto o
outro com 6000 N, gerando, respectivamente, algo próximo de 3500N e 5500 N, totalizando
9000 N. Note que mesmo neste exemplo simplificado já foi possível observar uma perda de
3000 N de força lateral. O mesmo exemplo também poderia ser aplicado para a transferência
entre os eixos traseiro e dianteiro.

2.3 Sip Ratio

Enquanto o slip angle está relacionado a forças e deslizamentos laterais, o slip ratio
traz a mesma relação, porém, no sentido longitudinal. O slip ratio nada mais é que a diferença
entre a velocidade de rotação da roda e sua velocidade de translação. Desse modo, se um
veículo que viaja a 100 km/h alcança um slip ratio de 20% durante a frenagem, significa que,

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na verdade, a roda está girando a 80 km/h nesse dado instante. É oportuno mencionar que slip
angle e slip ratio também acontecem conjuntamente. É o que se sucede quando um veículo
freia/acelera e vira ao mesmo tempo, como em entradas e saídas de curvas. A partir da
combinação desses dois parâmetros é que conseguimos determinar qual é o limite de
aderência do nosso pneu. O cálculo do slip ratio em porcentagem pode ser realizado de
acordo com a seguinte equação:

De forma que Ω é a velocidade angular 𝑅𝑐 é o raio do pneu e 𝑉 é a velocidade do


veículo.

2.4 Temperatura e pressão dos pneus

Ambos esses parâmetros são extremamente importantes para o desgaste e o grip dos
pneus de corrida, porém o grande problema é que eles variam ao longo de uma corrida e isso
pode ter consequências drásticas no desempenho final.

2.4.1 Temperatura

A temperatura de um composto está diretamente relacionada com a aderência que o


mesmo gera, isso porque ela modifica as propriedades químicas da borracha até certo ponto, o
que tem impacto direto no jeito que ela interage com o solo. Qualquer pneu tem uma faixa de
funcionamento ótimo, de maneira que se a temperatura exceder essa faixa a aderência cai e o
desgaste aumenta, se for menor que ela o desempenho cai drasticamente. Manter o pneu
dentro dessa faixa é um dos principais desafios em um projeto de suspensão, isso porque a
temperatura da pista, velocidade relativa do vento, umidade do ar, temperatura do ambiente,
quantidade e tipo de curvas do traçado e a quantidade de carga vertical no pneu são apenas
alguns dos fatores que podem causar variações de temperatura nos pneus.

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2.4.2 Pressão

A pressão também é outro parâmetro que atua diretamente na performance do pneu,


pois ela estará relacionada com a resistência à rolagem, a taxa de desgaste, com o tamanho da
área de contato e com o grau de adesão do pneu à pista. Em carros de rua é muito comum os
pneus serem calibrados com pressões consideravelmente elevadas, isso porque nesse caso o
grande foco é reduzir o consumo de combustível e não extrair o maior desempenho do pneu, e
essa redução do consumo vem em função da resistência à rolagem.
Quando o pneu está rolamento livre e não há um slip angle haverá uma compressão
logo à frente da banda de contato, sucedida de uma tração atrás dela, essas forças trativas e
compressivas consomem criam uma resistência ao movimento angular, a resistência à
rolagem. A pressão do pneu entra em cena aqui pois quanto maior for o seu valor menor será
a suscetibilidade à deformação da borracha, o que reduz a compressibilidade da mesma
diminuindo a resistência à rolagem. Quanto menor a resistência significa que o pneu se
movimenta com mais facilidade, reduzindo o consumo de combustível.

Todavia, o aumento de pressão, por diminuir a deformação, gera uma redução na área
de contato, que não só prejudica o desempenho dinâmico do carro mas também induz um
aumento de pressão na banda de contato que aumenta o desgaste, além de fornecer uma
menor adesão na pista. De maneira análoga, diminuir demais a pressão aumenta
consideravelmente a resistência ao rolamento e também induz um desgaste considerável,
podendo até gerar também uma diminuição na área da banda de contato.

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Na maioria das vezes, o caso ideal é, portanto, o meio termo nos valores de pressão,
isso vai garantir o melhor equilíbrio entre resistência à rolagem, desgaste e área de contato. O
problema é que o aumento de temperatura do pneu também pode induzir um aumento de
pressão, tal qual a queda de temperatura acarreta numa perda de pressão. Um ajuste ideal deve
levar em conta todos esses fatores para garantir que o carro permaneça o maior tempo
possível nas condições ideais de desgaste, temperatura e pressão, visando sempre o melhor
desempenho.

2.5 Camber, caster e toe

O último tópico com relação aos pneus são essas três angulações; camber, caster e toe.
Em um carro de rua, quando se faz o popular “alinhamento” o que de fato acontece é o ajuste
desses três fatores. Esses são parâmetros que quando analisados estaticamente fazem pouco
sentido, mas que tem função de corrigir certos comportamentos do veículo em meio a uma
curva.

2.5.1 Camber

O camber é o ângulo presente entre a direção que aponta o eixo de simetria do pneu
com uma linha vertical imaginária quando se olha o pneu de frente, sendo positivo quando
topo do pneu aponta para fora da carroceria e negativo quando aponta para dentro.

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A ideia por trás de um ajuste de camber é que, quando ocorre a rolagem, as rodas
internas à curva tendem a perder ângulo de camber e as de fora tendem a ganhar camber, esse
fenômeno é conhecido como camber gain. Esse cenário é o pior possível, já que veremos a
seguir que o ideal é que o topo das rodas aponte em direção ao centro da curva, e nesse caso
ambas as rodas apontam para fora. Para corrigir isso, é aplicado um camber negativo nas
rodas, para que quando o camber gain ocorra a roda mais externa à curva tenha seu camber
neutralizado. O nosso foco acaba sendo na roda externa, pois como há a transferência de
carga ela é quem tem maior grip, e no processo a roda interna é sacrificada, de modo que seu
camber que já era negativo fica mais negativo ainda.

2.5.1.1 Camber thrust

Ao contrário do senso comum, a máxima geração de força lateral de um pneu não


ocorre quando ele está perfeitamente perpendicular ao solo, mas sim quando ele está
levemente inclinado para dentro da curva, em razão do fenômeno do camber thrust. Quando o
pneu está inclinado com relação à vertical no plano frontal, ou seja, quando apresenta
cambagem, o padrão de distorção elástica gerado na sua região de contato com o solo cria
uma força lateral no mesmo sentido da inclinação. Há, portanto, um acréscimo na deformação
da banda de contato que gera uma resultante de força no sentido em que aponta o topo do
pneu. Apesar de no nosso caso ser tratado mais como um “bônus”, nas motos de corrida esse
é um dos principais mecanismos de geração de forças laterais.

Em contrapartida, ângulos exagerados de camber além de corroborar com o desgaste


acarretam na diminuição da força lateral, isso porque a partir de um certo ponto o pneu

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simplesmente passa a perder área de contato com o solo e a força gerada pelo camber thrust
não consegue compensar essa perda.

2.5.2 Caster

O caster é o ângulo formado entre o kingpin (pino mestre) e uma linha vertical
imaginária que passa pelo centro da roda quando visto lateralmente. Pino mestre é o eixo em
torno do qual a roda esterça. Devido a essa inclinação, há variação de cambagem quando a
roda é esterçada, de modo que quando ela é esterçada para dentro há ganho de cambagem
negativa e, para fora, ganho de cambagem positiva. E esse efeito é extremamente vantajoso
tanto para curvas quanto para retas: como o cáster (positivo) provoca inclinação negativa na
roda externa à curva e positiva na interna, a rolagem de ambas as rodas é compensada e,
ainda, pode ser gerado em ambas camber thrust favorável.
Ainda nessa vista, se interpretarmos o prolongamento do eixo do pino mestre com o
solo e pegarmos a distância desse ponto até a reta vertical que passa pelo centro do pneu,
encontraremos o mechanical trail. Juntamente com o pneumatic trail, o mechanical trail
compõe o braço de alavanca que gera o torque auto-alinhante quando há força lateral atuando.

2.5.2.1 Mechanical trail e pneumatic trail

Voltaremos a falar agora da outra deformação lateral que ocorre na banda de contato,
que é medida em slip angle. Tal deformação elástica, que ocorre exclusivamente em razão da
atuação da força lateral, altera a forma da banda de contato e a sua distribuição de pressão.
Com isso, tem-se que o centro de pressão da banda de contato é cada vez mais deslocado para
trás à medida que o slip angle cresce. Surge, então, uma distância, chamada de pneumatic
trail, entre esse centro de pressão e o centro geométrico do pneu.
Uma vez que as forças laterais geradas pelo pneu atuam no centro de pressão, essa
distância se torna um braço de momento, que age em torno do centro de pivotamento do pneu.
Como esse momento tende a restabelecer o alinhamento da roda quando há, ele é chamado de
torque auto-alinhante. É por efeito desse fenômeno que a direção “conserta sozinha” quando
liberamos as mãos do volante em uma saída de curva. No entanto, o pneumatic trail produz
apenas parte do torque auto-alinhante total do veículo, o torque auto alinhante total é dado
pela soma deste com o mechanical trail.

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O pneumatic trail não é um parâmetro constante, pois o centro de pressão do pneu
varia em função do slip angle, se aproximando cada vez mais do centro geométrico do pneu, o
que reduz gradativamente o braço do momento e reduz a intensidade do torque auto-alinhante.
Essa redução é crucial para que o piloto saiba quando está se aproximando do limite dos
pneus. Todavia, como o mechanical trail é constante esse feedback pode acabar sendo menos
claro para o piloto, uma vez que a redução do torque auto-alinhante não será mais gradual e
isso se traduz como uma perda abrupta do controle do veículo.

2.5.3 Toe

Por fim, se as rodas apontam para direções diferentes e simétricas entre si quando o
volante está alinhado é porque elas possuem algum valor de convergência (toe). Se ambas
apontam para dentro, a convergência é dita positiva (toe in). Se apontam para fora, é dita
negativa, ou é chamada de divergência (toe out).
Novamente, a presença dessas angulações afeta diretamente a dirigibilidade e a
estabilidade do veículo. O toe, assim como a cambagem, varia da condição estática para a
dinâmica. Desse modo, mesmo se o veículo utilizar valores nulos de toe estática, podem
surgir valores não nulos quando forças longitudinais foram aplicadas/geradas nos pneus e/ou
quando o curso da suspensão variar. Para compensar isso, uma opção é empregar valores
estáticos não nulos de toe. O efeito colateral mais evidente de valores não nulos de
convergência é o maior desgaste dos pneus, devido à maior geração de calor e arrasto (porém,

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até isso pode ser uma estratégia para se aquecerem mais rapidamente os pneus em dias mais
frios). Além disso, o maior arrasto também prejudica o ganho de velocidade em retas.

3. Braços de suspensão

Os braços de suspensão são os componentes que conectam as rodas ao ao chassi, de


maneira que a sua geometria tem diversas aplicações no comportamento dinâmico do veículo.
No nosso caso, o nosso objeto de estudo será uma geometria do tipo double-wishbone (duplo
A) independente, que é a mais comum em carros de alto desempenho.

3.1 Bump e rebound

Em uma pista de corrida existem diversas irregularidades ao longo do traçado, que por
sua vez podem provocar uma movimentação vertical tanto ascendente quanto descendente das
rodas e relação ao chassi, sendo esses, respectivamente, bump e rebound.
A importância dessas movimentações, no contexto da geometria dos braços, está
associada ao ganho de camber. No momento em que ocorre o bump há uma perda de camber,
no rebound o oposto ocorre, a intensidade dessa dinâmica depende justamente da geometria
dos braços de suspensão e da posição do instant centre.

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O instant centre é um ponto obtido a partir do prolongamento das linhas dos braços
superiores e inferiores, de maneira que em situações de bump e rebound as rodas vão
rotacionar ao redor desse ponto. O nome “instant” se dá pois esse ponto não é fixo, conforme
momentos como o da rolagem atuam no carro a sua posição pode variar consideravelmente,
ou seja, aquele ponto só estará naquela posição naquele instante em específico que está sendo
analisado.

O instant centre possui aplicações além do ganho de cambagem no bump e rebound,


ele também é o responsável por determinar a posição do roll centre, que é também um ponto
imaginário que se acha a partir da interseção entre uma duas linhas que saem das bandas de
contato até os seus respectivos instant centre. A linha formada entre o roll centre da traseira e
o da dianteira define o roll axis, e é ao redor desse eixo que o carro rotaciona quando há a
rolagem.

A posição do roll centre em relação ao centro de massa é extremamente importante,


pois ela define a magnitude da rolagem que ocorrerá naquele eixo, quanto mais distante ela
estiver maior será o momento da rolagem. Todavia, é importante salientar que, por depender
de um parâmetro variável que é o instant centre, a sua posição também está sujeita à
mudanças de posição em meio a uma curva. Uma ideia que pode parecer bem razoável é a de
aproximar ao máximo a posição desses dois pontos, a fim de ter quase nenhuma rolagem, mas
isso pode não ser positivo pois para encurtar essa distância em geral é necessário diminuir o
tamanho do swing arm, que é a distância horizontal entre o instant centre e o pneu, o que
pode gerar um ganho de cambagem no bump e rebound consideravelmente alto,. Além disso,
a rolagem também exerce certa função no ajuste fino do carro, então zero rolagem pode
representar menos possibilidades.

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3.2 Anti-geometrias

Quando fazemos uma análise lateral dos braços de suspensão se torna evidente que
existem alguns tipos de geometrias duplo A que garantem certas propriedades em relação aos
momentos que atuam no carro, especialmente se analisarmos o pitch que ocorre na ação de
forças longitudinais. É importante frisar que qualquer alternativa geométrica que vise
minimizar a intensidade dos momentos roll e pitch é ineficaz em anular os efeitos da
transferência de carga. Esta, por sua vez, dependerá somente da altura do centro de massa e da
magnitude das forças envolvidas, não podendo ser evitada, já que é impossível existir um
carro com uma altura nula. A única coisa que podemos fazer em relação à transferência de
carga é minimizar ao máximo seus efeitos negativos e moldar o projeto em torno da sua
existência.

3.2.1 Anti-dive

Como o nome sugere, é uma geometria que visa minimizar o dive, o declínio da
dianteira que ocorre durante a frenagem. Para isso os braços precisam estar sujeitos a uma
inclinação, de modo que intersecção do prolongamento de suas linhas formará o instant centre
lateral, que é análogo ao instant centre comum só que agora analisando em um outro eixo. A
ideia é que a altura desse ponto em relação ao solo crie um momento que se opõe ao momento
do dive, fazendo com que não exista nenhuma inclinação aparente na frenagem. Esse é o caso
de uma geometria 100% anti-dive, essa porcentagem varia de acordo com a posição vertical
desse instant centre lateral.

Apesar de parecer totalmente vantajoso uma geometria 100% anti-dive na verdade tem
sérias implicações na performance e na resposta do veículo, isso porque ela induz o fenômeno
de tyre tramp, que é uma vibração exagerada no ato da frenagem, que acaba por afetar
diretamente o grip em um momento crucial que é a entrada de uma curva. O mais comum é a

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adoção de valores bem mais modestos de anti-dive, algo em torno dos 20% para evitar esse
tipo de problema.

3.2.2 Anti-lift/Anti-squat

Segue exatamente a mesma lógica, mas nesse caso é para o lift e para o squat, o
movimento crescente da traseira quando há a frenagem e o movimento decrescente da mesma
quando há aceleração, respectivamente. A aplicação desses tipos de geometria tem função não
somente de evitar que a frente ou a traseira do carro toque o solo, mas também de garantir um
fluxo de ar mais estável ao longo do assoalho, uma vez que essas variações bruscas na altura
do carro podem acarretar em uma perda drástica de carga aerodinâmica, o que representará
uma perda considerável de grip.

4. Molas e amortecedores

Molas e amortecedores equipam os carros por três motivos principais: tornar o contato
dos pneus com o solo o mais contínuo possível, reduzir forças de impulso no chassi e ditar o
comportamento permanente e transiente do veículo em curvas. A mola, por meio de uma pré

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carga, exercerá uma certa pressão no pneu que sempre atuará no sentido de manter o pneu em
contato com o solo. Além disso, ela também absorve a energia dos impactos que a roda
recebe ao passar por ressaltos da pista, convertendo a energia cinética do impacto em energia
potencial elástica. Observa-se que acaba de ser definido um sistema massa-mola, que oscila.
A oscilação do chassi é prejudicial tanto ao conforto, quanto ao comportamento dinâmico do
veículo. Ela gera flutuação das cargas verticais aplicadas sobre pneus, podendo resultar em
um comportamento dinâmico inconstante devido às perdas intermitentes de aderência.
Além disso, a liberação da energia contida na mola impulsiona o chassi para cima, o
que pode ocasionar descolamento total do pneu em relação ao solo se a energia armazenada
for muito grande. Eis que entram em cena os amortecedores, que atuam dissipando essa
energia, convertendo-a em calor, estabilizando o chassi.

4.1 Amortecimento

Se o amortecimento for insuficiente, ocorrerá o mencionado no tópico anterior. Se o


amortecimento for excessivo, a resposta da suspensão será muito lenta e o veículo perderá
capacidade de leitura do solo (de se manter em contato com o solo mediante as imperfeições
da pista), assim como repassará mais impactos para o chassi, também ocasionando perda de
aderência. Além disso, ocorrerá maior aquecimento dos pneus, já que sofrerão mais
deformação e trabalharão mais em amortecimento.

4.2 Molas

No que diz respeito às molas, quanto menor é a sua rigidez, ou seja, quanto mais
macias são as molas, maior é a capacidade do veículo de ler o solo, pois o chassi estará sujeito
a menores impulsos verticais (desde que os amortecedores sejam adequados), além de que
maior será o curso efetivo da suspensão, melhorando a capacidade do pneu de alcançar
depressões.
No entanto, sabemos que carros de corrida possuem suspensões duras, com elevada
rigidez de mola, sendo que, contraditoriamente, são justamente eles os veículos que mais
precisam manter os pneus em contato com o solo. Isso se justifica porque molas rígidas
reduzem a rolagem do chassi, mantendo a suspensão em geometria mais adequada;
possibilitam menor altura de rodagem, logo, menor altura doCG, já que o curso da suspensão
é reduzido; promovem maior eficiência aerodinâmica de veículos com difusor, uma vez que a

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altura de rodagem é mantida praticamente constante, possibilitando geração adequada de
downforce pela base do carro; impede que veículos de elevada downforce toquem o chão
quando sob alta carga aerodinâmica; além disso, pistas de corrida geralmente são terrenos
regulares, logo, as rodas recebem menos impactos e variam menos de altura e, por
consequência, dependem menos de suspensões macias.

4.3 Massa suspensa e não suspensa

Ainda referentes à dinâmica vertical são os conceitos de massa suspensa e massa


não-suspensa. A primeira corresponde essencialmente ao chassi e a tudo que está rigidamente
montado nele (transmissão, motor, bancos, painel etc.), além do próprio piloto. Já a segunda é
correspondente a todos os outros componentes que estão separados da massa suspensa pelas
molas e amortecedores (rodas, pneus, pinças de freio, cubos de roda etc.). E, quando falamos
de desempenho do veículo, é quase que um dogma a busca por minimizar a massa
não-suspensa. Quanto maior ela for, mais trabalho os amortecedores e molas têm que fazer
para manter os pneus em contato com a pista sobre superfícies irregulares, pois mais difícil
fica de acelerar e desacelerar essa massa, o que prejudica a manutenção de uma carga estável
no pneu, que é de suma importância para a aderência. Além disso, quanto maiores as massas
não-suspensas rotativas (rodas, pneus,discos de freio e cubos de roda), mais energia é gasta
apenas para vencer a inércia rotativa desses componentes, logo,maior dificuldade o veículo
terá para transmitir potência para o solo.

4.4 Rigidez à rolagem

Um outro parâmetro importante que também é definido pelo subsistema de


amortecimento é a rigidez à rolagem, que é justamente a resistência ao momento de rolagem.
Quanto mais rígidas as molas, menor é a rolagem, mais constante fica a geometria da
suspensão e melhor é o desempenho desta. Porém, molas muito duras comprometem
odesempenho vertical do veículo de absorção de impactos e leitura do solo. Empregam-se,
então, barras estabilizadoras, que auxiliam na contenção da rolagem, possibilitando que as
molas sejam mais macias.
As barras estabilizadoras, assim como as molas, podem ter rigidez diferentes entre os
dois eixos. Quando isso ocorre, temos que o eixo mais rígido resiste mais à rolagem que o
outro eixo. Ocorre, em razão disso, um fenômeno bastante relevante para o comportamento

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dinâmico do carro: o eixo que resiste mais à rolagem transfere mais carga. Isso é
relativamente fácil de entender. Para resistir à rolagem o eixo deve reagir, fazendo força
contrária ao movimento de rolagem. Quando isso ocorre, a normal do pneu envolvido nessa
reação é aumentada. Está aí a transferência de carga. Desse modo, se considerarmos um carro
com rigidez à rolagem nula (abstração) no eixo dianteiro eixo traseiro com rigidez à rolagem
padrão, toda a reação para conter a rolagem total do carroserá feita somente pela traseira e,
por isso, toda a transferência lateral de carga ocorrerá somente na traseira. É justamente por
isso que ao determinar a geometria dos braços de suspensão nós não pensamos em ter zero
rolagem, pois isso tornaria impossível realizar esse tipo de ajuste que é fundamental para a
dinâmica do carro.
Outro ponto a evidenciar é a rigidez torcional do chassi. Quando o chassi não tem boa
rigidez torcional, ele acaba funcionando como uma mola de torção em série como sistemas de
suspensão dianteiro e traseiro, anestesiando o efeito das configurações de setup que visam
alterar a distribuição de rigidez à rolagem entre os eixos.

5. Geometria de direção

A geometria de direção vai exercer influência direta em como as rodas responderão ao


serem solicitadas pelo esterçamento do volante. Quando analisamos geometricamente a
trajetória de cada uma das rodas de um veículo percorrendo uma curva, vemos que todas elas
descrevem arcos de raios diferentes entre si, já que a bitola do veículo condiciona um maior
raio de curva da roda externa em comparação com a interna.

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Desconsiderando o silp angle, é necessário que cada uma das rodas dianteiras aponte
exatamente na direção de sua trajetória para que nenhuma delas deslize. Concluímos, então,
que a roda dianteira interna deverá ter maior ângulo de esterçamento que a externa, já que seu
raio de trajetória é menor. Esse é o princípio da geometria de Ackermann.

5.1 Ackerman

Se as rodas permanecerem paralelas enquanto são esterçadas, dizemos que a


geometria é 0% Ackermann ou paralela. Se corresponderem à imagem abaixo, 100%
Ackermann ou Ackermann verdadeiro. A geometria de Ackermann é empregada para que, em
baixas velocidades, não haja deslizamento de nenhuma das rodas e, assim, o desgaste dos
pneus seja minimizado. Majoritariamente veículos urbanos utilizam essa geometria de
direção.

No entanto, veículos de corrida que alcançam elevadas acelerações laterais


desenvolvem grandes valores de slip angle, e a geometria acima perde um pouco da sua
função. Somado a isso, aumentos na carga vertical sobre um pneu deslocam o pico do gráfico
‘força lateral x slip angle’ para a direita, ou seja, é necessário um maior slip angle para se
atingir a força lateral máxima. E, uma vez que há transferência lateral de carga em curvas,
temos que a roda externa adquire maior carga normal que interna. Logo, é preciso gerar maior
slip angle na roda externa que na interna para que o eixo alcance a máxima força lateral
possível. Inclusive, dependendo do caso, pode ser necessário empregar uma geometria oposta
à Ackermann, com a roda externa esterçando mais que a interna. É o que chamamos de
geometria anti-Ackermann (geometria < 0% Ackermann). No contexto de um Fórmula SAE o
ideal acaba sendo o equilíbrio, pois os circuitos em que esses carros correm são uma mescla
entre curvas de baixa velocidade extremamente acentuadas e curvas de média/alta velocidade
com um raio maior.

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6. Considerações finais

Ao final deste relatório de cunho introdutório do sistema de suspensão e direção no


contexto de um Fórmula SAE, foi possível verificar que há uma quantidade vasta de conceitos
teóricos que influenciam diretamente uns nos outros e por vezes tornam o projeto desafiador.
Nosso grande objetivo em um carro de corrida é aumentar a velocidade média do veículo na
pista, e vimos que no fim isso se traduz em maximizar o desempenho do pneu nos pontos
mais críticos do circuito, logo é extremamente importante que todo o projeto esteja de acordo
com esses princípios.

7. Referências

➢ Race Car Design - DEREK, Seward


➢ DINÂMICA VEICULAR - Relatório Conceitual (TESLA - UFMG)
➢ TCC Suspension and Steering Design - HOCHSCHULE, Karlsruhe
➢ Race Car Vehicle Dynamics - MILLIKEN, William

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