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Copyright © 2017 Mayjo

LIVRO I
“Dificuldades e empecilhos podem se tornar barreiras
intransponíveis, mas você pode fazer disso uma oportunidade de
crescimento. ”

MAYJO
Copyright © MAYJO 2016
Título Original: Alexander
Revisão: Bookmarks
Diagramação digital: MAYJO

1ª Edição Digital [2016]

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser


reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meio eletrônico ou mecânico
sem permissão por escrito da autora. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei n°. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.

Está obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.


PRÓLOGO
Lana
Enquanto observamos as cenas na televisão da sala de estar, minha
mãe chora ao meu lado, ao mesmo tempo que sinto as lágrimas de alívio

escorrerem pelo rosto por saber que o meu pai está vivo e bem. A polícia

federal o está resgatando do cativeiro onde foi mantido por mais de uma

semana.
— De acordo com as informações dadas pela polícia, o empresário
Eduardo Mitchell não aparenta ter ferimentos depois de passar quase uma
semana no cativeiro... — a voz da repórter ecoa na sala — Neste exato
momento, o sr. Mitchell está sendo levado para o hospital... — ela continua
dando a notícia, mas eu mal a escuto.
Vejo a minha mãe se levantar enquanto avisa que vai se trocar para
encontrar meu pai no hospital. Eu a sigo, decidida a acompanhá-la. Depois
dessa semana de terror, quando chegamos a pensar que o fim desse pesadelo
poderia ser diferente, precisávamos nos manter unidos.
A entrada do hospital está repleta de repórteres, que se acotovelam para
falar com a minha mãe.
Depois de dois dias internado, meu pai volta para casa, completamente
paranoico com a nossa segurança.
Nunca imaginei que o ocorrido traria tantas mudanças na minha vida.
Nem estava preparada para elas, não mesmo. Aos vinte e um anos, curso a
faculdade de direito. Talvez você ache que sou uma aluna aplicada... mas não
poderia estar mais enganado. Mal assisto às aulas. Minha fase rebelde e
mimada ainda não passou, mas gosto de pensar que sou autêntica. Adoro me
divertir.
Meus pais nunca me deram limites... e não permito que ninguém o faça.

Em algum lugar distante dali...

Saiu tudo errado! Que merda de polícia intrometida! O objetivo do


sequestro de Mitchell não era o resgate. Ele se intrometeu nos meus
negócios, e não permitirei que nada fique em meu caminho. Ele deveria ser
apagado ou abrir mão de certas coisas a meu favor. Isso não acabou! Vou
pegá-lo novamente ou, quem sabe, um membro da sua bela família.
Existem tantas possibilidades de fazê-lo sofrer...
CAPÍTULO 1
Lana
Duas semanas depois...

— O quê?! — grito para o meu pai, que me encara, sentado na


cadeira do escritório em nossa casa, onde tem trabalhado nas últimas duas

semanas. — Pai, não vou andar para cima e para baixo com um guarda-costas

a tiracolo. Não vou aceitar isso!


— Você não tem que aceitar nada, Lana. Está decidido! Quero a minha
família segura. — Sua voz é forte e decidida. — Não vou dar chance de
vocês serem ameaçadas por qualquer perigo. Você vai conhecer a equipe da
segurança hoje.
Bato meu pé com impaciência.
— Não preciso de nada disso, pai Sei me cuidar! — tento argumentar,
mas ele está irredutível. — Como vou sair com os meus amigos com um
guarda-costas atrás de mim como uma sombra?
— Como você sabe se cuidar, Lana? — ele indaga, me encarando. —
Sabe se livrar de um tiro? Se defender se alguém tentar te sequestrar ou coisa
pior? De hoje em diante, o que você quer ou aceita, não interessa. Você não
vai mais a lugar algum sem um segurança.
Saio do escritório furiosa e revoltada. Sei, por experiência própria, que
não adianta discutir com meu pai quando ele coloca algo na cabeça. Tenho
bem a quem puxar. Só não consigo compreender porque isso agora, depois de
duas semanas que ele voltou para casa.
Vou até meu quarto e ligo para Jules, meu melhor amigo. Ele é um ano
mais velho que eu e, de quebra, muito gato. Muita gente acredita que somos
namorados, mas não sentimos nada um pelo outro. Nem atração. Ele é e
sempre será o meu melhor amigo.
— Lana! — ele grita meu nome quando atende. — Pode ordenar que
estou em posição de sentido, como sempre. — Eu o ouço rir.
— Pare com isso, Jules. Você nem parece adulto. Estou com sérios
problemas — reclamo. — Adivinha o que meu pai fez?
— Não posso imaginar. Me deixe pensar... — Ouço apenas a sua
respiração do outro lado da linha por alguns segundos. — Ele tomou seu
carro?
— Não, pior.
— Hum... sem mesada ou cartão de crédito por um ano?
— Nada disso! — nego. — A partir de agora, terei segurança pessoal.
— Nunca tive uma amiga que estrelasse sua própria versão do filme O
guarda-costas. Será que ele se parece com o Kevin Costner? — Ele começa a
rir e canta I will always love you, da Whitney Houston, terrivelmente alto.
— Pare com isso! — protesto. — Você é mais louco do que pensei.
Tenha piedade dos meus tímpanos. — Não consigo segurar a gargalhada.
— Gata, não tem nada de mais em se ter um segurança. — Ele muda de
assunto. — Nossa saída de hoje está de pé?
Com essa novidade, me esqueci de que havíamos combinado de ir a um
clube noturno com nossos amigos, mas não posso mais sair sozinha. E ir a
uma festa na qual a turma não costuma aliviar a farra acompanhada de
alguém pago pelo meu pai para seguir meus passos, não é nada legal. Mesmo
que Jules dissesse que era bobagem eu não ir, decido ficar em casa.
Conversamos um pouco mais e, depois de rirmos bastante, marcamos de nos
encontrar na segunda-feira, na faculdade.
Sei que vou precisar enfrentar a situação. Não adianta fugir das
decisões dos meus pais.
Ouço vozes na sala de estar no momento em que começo a descer as
escadas.
— Essa é a minha esposa, Cibelly. — Ouço meu pai dizer — E esse
rapazinho aqui é o meu filho, Lucas.
— Prazer em conhecê-la, sra. Mitchell. — Uma voz masculina e forte
soa. — E é um prazer conhecê-lo também, cara.
Ao entrar na sala, me deparo com as costas de uma montanha de
músculos cumprimentando meu irmão de dez anos, que o observa com um ar
de admiração, provavelmente pelo fato de o homem ser grande como um
armário.
— Ah... aí está você, Lana. Já ia pedir que te chamassem — meu pai
fala assim que me vê nos últimos degraus. — Venha conhecer o chefe da
segurança.
Caminho a contragosto, e a montanha de músculos se vira. Ah, meu
Deus! Morri e fui para o céu sem nem merecer? O homem mais lindo que já
vi está na sala. Tudo bem, exagerei agora. Mas ele é tudo de bom. Deve ter
quase dois metros — o que faz com que eu me sinta pequena demais. Seu
cabelo é preto, bem curto, e olhos verdes, tão claros que parecem artificiais,
quase transparentes. Entretanto o olhar não é nada gentil. Ao contrário, é
repleto de cinismo. Nariz afilado, lábios perfeitos, corpo de pugilista ou estilo
militar... não sei... não sei distinguir uma coisa da outra. Hum! Eu o analiso
com uma expressão de desejo, mas ele franze a testa e ergue uma sobrancelha
com sarcasmo, voltando a olhar para o meu pai e me ignorando
completamente.
Isso nunca aconteceu antes!
— Essa é a minha filha, Lana — meu pai me apresenta — Filha, este é
Alexander Marshall, o chefe da segurança. — Enquanto meu pai fala, estendo
a mão para cumprimentá-lo. Sinto uma onda de luxúria envolver meu braço
quando a palma da sua mão encosta na minha. Respiro fundo. Meus olhos se
arregalam e meu rosto esquenta, sinal de que estou vermelha como um
tomate maduro.
— P-prazer.
Cacete! Nunca gaguejei ao conhecer um homem bonito, muito pelo
contrário, costumo flertar descaradamente. Ele apenas assente e solta a minha
mão como se estivesse pegando fogo ou, pior, suja. Ele se volta para o meu
pai, me ignorando outra vez.
— Preciso conhecer mais alguém, sr. Mitchell? — A voz sexy
reverbera dentro de mim. Me repreendo mentalmente pelo meu tolo
embevecimento. Bem, ele não me conhece e agir de forma grosseira comigo é
o caminho errado a se tomar.
— Quando vou conhecer o “mala sem alças” que vai me acompanhar?
— Meu tom é bastante insolente. Raramente alguém me ignora, e aquela
“montanha” precisa saber disso. — É você quem vai carregar minhas sacolas
de compras no shopping? — Abro um sorriso meigo e falso.
— Lana! Isso são modos? — minha mãe adverte. — Peça desculpa ao
sr. Marshall
Quem? Eu? Nunca! Eu o observo, mas ele não me olha por um
segundo sequer.
— Pedir desculpas pelo quê? Não fiz nada. — Sei que estou agindo de
forma impertinente, mas não quero ninguém atrapalhando minha vida e me
controlando. O fato de que não terei a mesma liberdade de antes me aborrece.
Dou meia volta e saio da sala, ouvindo a voz na minha mãe recriminando
meu comportamento.
Esse brutamontes não conhece Lana Mitchell, mas conhecerá em breve.
Idiota! Ele deve se achar melhor do que todo mundo. O cara nem me
olhou como os homens costumam fazer. Sei que sou uma mulher bonita, o
espelho me confirma isso todos os dias, apesar de eu me achar baixa demais
com meu um metro e sessenta. Quando eu era adolescente, desejava ser mais
alta para seguir a carreira de modelo, mas passei a me aceitar do jeito que
sou. Meus olhos são cor de mel, tão claros que parecem dourados. E meu
cabelo loiro escuro com reflexos claros, caem em ondas no meio das minhas
costas. Gosto deles. Meu corpo está em forma, embora eu ache a minha
bunda grande demais para minha altura.
Volto para o quarto, e como é domingo, visto um biquíni e vou para a
piscina.
Amanhã promete ser um dia terrível!

Odeio segundas-feiras. Mas preciso fazer média e ir para faculdade.


Odeio cursar direito. Foi um pedido do meu pai e, querendo bancar a boa
filha, aceitei fazer, no entanto, o que eu realmente gosto é de dançar. Amo a
dança. Ser dançarina não é algo que meu pai deseje para a filha. Suas
expectativas são altas demais no que diz respeito ao meu futuro. Talvez seja
por isso que sou tão irresponsável e mimada. Sei reconhecer meus defeitos,
ninguém precisa apontá-los.
Visto um short branco curto, uma regata rosa de seda e por cima, um
blazer esporte, também branco. Desço as escadas e sigo para a sala de jantar,
onde o café da manhã está servido. Tomo um pouco de iogurte desnatado
com granola e um suco natural.
Pego a chave do carro na bolsa e sigo para a garagem — ainda que eu
não vá muito longe.
— Bom dia, senhorita. — Uma voz masculina soa, me assustando. —
Sou Carl, o seu segurança.
Nem me lembrava dessa droga de segurança. Esse é grande também,
mas não tão grande quanto o de ontem. Carl é bronzeado, tem olhos azuis
escuros indecifráveis e o cabelo castanho. Sua postura é de um verdadeiro
guarda-costas.
— Receio, meu amigo, que você não caberá no meu carro
minúsculo. — Ele ri e aponta para uma SUV estacionada na frente da
garagem, provavelmente já nos esperando.
— Aquela será nossa condução daqui em diante, senhorita.
Não acredito nisso! Até meu carro vão tirar de mim?
— O quê? Não vou nisso!
— Receio que sim. — Ele aponta outra vez para o carro. — Vamos?
Vou ter um ataque cardíaco agora! De pura raiva.
CAPÍTULO 2
Lana
Entro no carro, bufando de raiva. Meu pai não deveria ter feito
isso comigo!
— Podemos ir? — O segurança se acomoda no banco do motorista e
olha pelo do espelho retrovisor.
— E você ainda pergunta? Por mim, nem iríamos! — resmungo, mal-
humorada.
Ele tenta estabelecer uma conversa, mas não dou abertura. Isso ajuda a
incentivar o famoso mau-humor para uma segunda-feira. Ao chegar na
faculdade, sigo para aula de direito processual penal.
Durante a aula, me pergunto onde o homem está, já que não o vejo em
lugar algum. Com o dinheiro que meu pai anda esbanjando com essa história
de segurança particular, daria para alimentar inúmeros necessitados que
passam fome na África.
Saio ao meio-dia, e meu guarda-costas está aguardando na entrada da
faculdade. Mas que droga. Pelo visto, não terei mais privacidade.
Jules vem em minha direção e aproveito para driblar o brutamonte.
Meu amigo parece um surfista, com o cabelo loiro com reflexos dourados
pelo sol. Seus lindos olhos castanhos cintilam ao me puxar para um abraço.
— E aí, gata? — ele pergunta, ainda com meus braços ao redor do seu
pescoço. Eu o puxo para trás da pilastra e, assim, saímos das vistas do
guarda-costas.
— Preciso da sua ajuda amanhã — digo, em tom baixo. — Depois da
aula, você vai fazer compras comigo.
— Por quê? Por acaso sou o seu personal stylist?
— Não se faça de desentendido. Preciso despistar esse brutamontes. —
Inclino a cabeça apena o suficiente para ver se Carl não está próximo, mas ele
continua ao lado do carro. — Agora preciso ir, estou em prisão domiciliar —
falo, revirando os olhos.
Me despeço de Jules e sigo para o carro, sentindo como se o peso do
mundo estivesse em minhas costas. Preciso conversar com meu pai. Tenho
que ter, ao menos, a liberdade de dirigir meu carro. O combinado era que eu
teria um segurança, não motorista particular.
Quero ser livre e fazer as minhas escolhas. Não quero ser um fantoche
dos meus pais, porém, tudo está se encaminhando para isso. Preciso dar um
jeito nessa minha resistência em falar o que eu realmente quero para minha
vida. Sabe aquele momento que você deseja fazer algo por conta própria? É
assim que eu me sinto.
Carl me leva direto para casa e, ao parar o carro em frente à entrada
principal, desço e vou diretamente para o escritório do meu pai. Entro sem
bater e fico chocada ao dar de cara com “ele”. Eles estão em reunião, mas não
me importo. Atravesso a sala e ignoro o brutamontes que está sentado na
frente da mesa do meu pai.
— Pai, preciso falar com você — exijo, ignorando o outro ocupante da
sala.
— Querida, não seja mal-educada. Estou em reunião com o sr.
Marshall. Depois conversamos. — Ele é condescendente, e eu odeio quando
ele me trata como criança. Sentado atrás da mesa de trabalho, meu pai
mantém a expressão severa. Será que ele acha que precisa agir como um
carrasco na frente do segurança?
— Preciso falar com você agora! — Cruzo os braços no peito e espero.
Pelo canto do olho, sinto o olhar desdenhoso dele. O que foi, idiota?
Gosta do que vê? Pergunto mentalmente, mas tenho vontade mesmo é de
fazer um gesto bem grosseiro.
— O que há de tão importante, Lana? — Meu pai cede.
— Por que você tirou meu carro? — questiono. — Pai, aceitei que um
segurança me acompanhasse e, apesar disso, você ainda tira o carro de mim?
— Seu pai não proibiu que você usasse seu carro — ele fala. Sua voz é
autoritária e grave, soando fria e com um toque de aborrecimento. — Fui eu.
— O quê? — grito, encarando-o. — Quem te permitiu tal coisa? Quem
você pensa que é?
Sinto meu corpo queimar de indignação.
— A partir de amanhã, vou sair com o meu carro — falo, olhando de
volta para o meu pai.
Esse segurança não me conhece!
Alexander

Detesto patricinhas mimadas, cheias de frescuras e mal-educadas. Até


agora, estou odiando esse trabalho. Conviver com esse tipo de garota riquinha
não faz parte das minhas atribuições. E essa é uma das piores que já vi. Se
fosse minha filha, daria uma surra todos os dias naquele traseiro arrebitado.
Há pouco, quando ela entrou no escritório, tive vontade de colocá-la
nos meus joelhos e dar uma boa surra até que ela aprendesse a ser educada e
deixasse de ser nojentinha. Garota petulante!
— O quê? Quem te permitiu tal coisa? Quem você pensa que é? — Ela
me encara com os olhos castanhos claros, quentes e furiosos. — A partir de
amanhã, vou sair com o meu carro — fala, se virando para o pai.
Sim, princesa! Não preciso de autorização, e você vai descobrir isso
rápido. Vai sonhando que você vai pegar aquele carro para sair sozinha!
Eu a observo com aquele olhar que faz muitos homens tremerem, mas a
pirralha nem pestaneja. Em vez disso, ela empina o queixo e tenho a sensação
de que irá pular na minha garganta a qualquer momento.
— Lana — Mitchell chama sua atenção —, você está passando dos
limites! Onde está sua educação, minha filha?
— Minha educação está bem aqui, pai. Já a cabeça desse aí — ela me
aponta — deve estar com problemas. Tirar meu carro... isso é muita
petulância!
Abro um sorriso de lado. Ela se acha espertinha.
— É para sua segurança, Lana — o pai continua a ladainha para
amenizar o gênio da filha.
Ela sai pisando duro da sala e nos deixa a sós novamente.
— Não tem como devolver o bendito carro? — Mitchell questiona
quando não há mais sinal da filha.
— Não. Além de chamativo, é pequeno demais e nenhum dos meus
homens vai dirigir aquela droga. — Me mantenho firme. — Ou as coisas
funcionam como estabelecemos ou vamos abrir mão do trabalho. A ameaça
de sequestro é bem recente, e a sua filha não pode achar que as coisas irão
continuar como eram. Ela precisa se adaptar ou vai acabar se machucando.
Tento passar seriedade ou Mitchell vai mimar a filha ainda mais,
deixando que ela leve a vidinha despreocupada de sempre. Pai de coração
mole é outra coisa chata! Conheço todos os passos dos membros dessa
família, e descobri que o homem mal conhece a própria filha.

Após a reunião, sigo para o meu escritório. Além de Mitchell, tenho


outros clientes, e sei que os homens com quem trabalho são bons no que
fazem e darão conta do recado. A equipe é formada por antigos colegas das
forças armadas. Depois de ter dado baixa, convidei alguns dos homens que
serviam comigo e fundei a empresa. Ainda que eu não costume confiar em
ninguém, entregaria minha vida nas mãos deles.
Gosto de ter o controle de tudo, para não ser pego de surpresa.
Lana
— E aí? Tudo certo? — pergunto a Jules.
— Vou distrair o grandalhão enquanto você sai. Use o meu carro, mas
cuidado com ele. — Meu amigo olha por trás da cortina do provador de uma
loja shopping, onde estamos fingindo fazer compras.
Escolhi a loja mais movimentada para conseguir passar despercebida
no meio de tanta gente. Comprei um blusão com capuz e me escondi no
provador, mantendo os olhos em Carl.
— Boa sorte! Sabe que depois disso vão ficar no seu pé, não é? — Ele
tem razão, mas preciso fugir do brutamontes.
— Eu sei. Você é o melhor. Te devo uma — digo.
Ele me beija no rosto e sai para conversar com Carl.
— E aí, cara, o que manda? — Jules começa. Carl o olha sério e retorna
a sua pose de estátua — Posso pedir uma opinião? — ele continua, tentando
atrair a atenção do segurança. — Estou querendo comprar um presente para a
minha namorada e não sei o que as mulheres gostam. Você aparenta ser um
cara experiente, que tal me dar um toque? — Jules parece convincente, e
tenho certeza que Carl não vai se negar.
— Não sou o cara certo para aconselhar um Dom Juan, garoto — ele
fala, fazendo com que eu me preocupe. Será que ele não vai cair no truque de
Jules?
— O que você daria para a mulher da sua vida? — Jules apela.
A expressão do homem muda brevemente, mas em seguida volta ao
normal.
Carl reluta um pouco em dar atenção a Jules. Eu o vejo se virar e falar
algo com meu amigo, que rapidamente o puxa para a seção de lingerie. Dou
uma risada, mas preciso sair rápido da loja. Me agacho entre as araras de
roupas e saio de fininho enquanto alguns clientes me laçam olhares estranhos.
Assim que saio, vou apressada para o estacionamento, atrás do carro de Jules.
Como era de se esperar, Carl não me deixou pegar meu carro.
Ao chegar ao salão onde faço aula de pole dance, percebo que já
começou. Corro para o vestiário e troco de roupa. A minha instrutora é ótima,
mas não aceita falta de comprometimento por parte das alunas e detesta
atrasos. Entro na sala e começo o aquecimento, mas ela para o que está
fazendo e me olha, séria.
— Acho que está atrasada, Lana!
Marcela, a professora, é negra e linda de morrer. Ela é o tipo de mulher
que eu gostaria de ser. Exigente demais, quer a perfeição das alunas, o que é
bom. Eu adoro suas aulas. Acredito que é por isso que já estou no nível
avançado. Por mim, eu passaria o dia dançando.
Após o alongamento e aquecimento, começo a série do dia. Passo o
treino sem conseguir me concentrar. Fico me questionando se um bando de
seguranças não entrará aqui a qualquer momento e atrapalhar a aula. No
entanto, não consigo tirar o sorriso do rosto por ter conseguido fugir. No fim
da aula, Victória — uma das minhas colegas de turma — me chama para
tomar um chá verde que amo. Ouço o celular tocar na bolsa e sinto um baque
no coração. Sem dúvidas, todos já sabem da minha fuga. Verifico a tela antes
de atender.
— Oi, Jules!
— Gata, estou sendo feito de refém! — Ele sussurra tão baixo que
quase não o ouço.
— Fale alto, Jules. Mal te ouço.
— Não dá! Eles já descobriram onde você está, e um segurança vai
aparecer por aí em breve.
— E por que você está sussurrando?
— Estou no banheiro! Eles estão a ponto de me torturar com grampos
de mamilos. Acho melhor voltar, gata.
— Que exagero, Jules. Ninguém pregará nada em você.
— Não tenha tanta certeza — ele diz, sussurrando. — Esse seu guarda-
costas é louco. Acho melhor você voltar — repete.
Ele tem razão. Preciso voltar ou vai ser impossível sair daquela casa
outra vez.
Ao desligar, me despeço de Victória e chamo um táxi. Não vou dar
chance para os seguranças me levarem como se eu fosse uma prisioneira
fugitiva.
CAPÍTULO 3
Alexander
— Carl, me explique isso de novo, porque não entendi. —

Cruzo os braços e observo um dos caras mais espertos e profissionais que

conheço me dizer que uma garota passou a perna nele. No fim da noite, ele

aparece para me passar o relatório da família Mitchell, e fico estupefato com

o que a Lana fez.


— Ela fugiu com a ajuda do namoradinho.
— Nada justifica perder um cliente de vista, Carl. Nada!
Porra! Ela poderia ter entrado em apuros, o que provocaria uma
mancha na empresa por falha de segurança. Tudo por causa de um erro banal.
— Você está se deixando levar pelo papo dela? — pergunto, irritado.
— Isso não acontecerá de novo — ele responde e sua carranca
aumenta.
Pela expressão de Carl, eu ficaria com pena da garota, mas não permito
esse tipo de erro. Se ela fugiu dele uma vez, vai tentar de novo, e ainda pode
se machucar no processo. O ideal é trocar o segurança e surpreendê-la.
— Bruno vai ficar no seu lugar — aviso e dou a volta na mesa para
pegar o telefone e chamar o outro segurança.
Ele é mais malandro com esse tipo. Já foi segurança de uma estrela do
rock que adorava uma palhaçada. Então, saberá lidar com ela. Só tem um
problema: ele se acha o gostoso, um presente de Deus para as mulheres.
Chega a ser irritante. E por mais que eu proíba o envolvimento com clientes,
ele sempre quebra as regras. Não tem qualquer escrúpulo em transar com
elas. As mulheres também não ajudam: pulam em cima dele como
desvairadas sem noção. Se ele me causar problemas com seu jeito galinha,
será dispensado também. Lana não é uma mulher vivida, e o pai dela não vai
admitir isso.
— Vai me deixar com cara de idiota se me tirar agora — Carl reclama.
— Nunca deixei de fazer meu serviço bem feito, Alexander.
— Se não quisesse o título, não devia ter permitido que aquela garota te
fizesse de bobo.
Eu o vejo bufar, mas ele acaba acatando minha decisão.
— Bruno? — chamo, quando ele atende. Conversamos por uns dez
minutos. Passo os detalhes, dispenso Carl e vou para casa.
Ao chegar, noto algo estranho. Tem alguém na minha casa?!
Abro a porta devagar e entro sorrateiramente. Não vou muito longe e
sinto um perfume feminino forte que me é conhecido. O que ela faz aqui?
— Oi, querido.
Adriane, minha ex-noiva. A ruiva é linda, mas não sabe o significado
da palavra “fim”. Que merda! Ela sempre aparece na minha casa sem ser
convidada.
— Estava com saudades, amor!
— Se não percebeu, Adriane, não temos mais nada. Então, por
gentileza, vá embora. — Aponto a porta. — Não estou disposto a ouvir sua
ladainha para reatarmos.
— Seu grosso! Só queria fazer uma surpresa!
— Já fez. Agora pode ir — falo e passo por ela, indo para o quarto.
Ao entrar no chuveiro, imagino que a essa hora ela já deveria ter ido
embora. Mas, de repente, eu a vejo entrar no box.
Que merda! A mulher não aceita não como resposta.
— O que você está fazendo, Adriane?
Ela está totalmente nua, com os cabelos lisos soltos até o meio das
costas. Fui apaixonado por ela, porém seu ciúme doentio é insuportável e a
mania de invadir a minha privacidade é intolerável! Preciso mudar os códigos
de segurança da minha casa.
— Me deixa ficar essa noite, Alex. Por favor! — Ela apoia as mãos no
meu peito e desliza até envolver meu pescoço. — Prometo não te decepcionar
— fala contra meus lábios. No entanto, em vez de me beijar, ela se ajoelha e
me leva em sua boca.
Diante da situação, eu deveria ter exigido que ela saísse. Mas eu a
conheço e sei o quanto é boa nisso. Se ela não tem vergonha de se humilhar,
correndo atrás de um homem que já deixou claro que não a quer, não sou eu
quem vai impedi-la de continuar.

— Você ainda quer que eu vá? — A incredulidade na voz de Adriane


me faz olhar para ela, que está só de toalha no meio do quarto. — Imaginei
que depois do que fizemos no banheiro, você havia mudado de ideia. — Ela
faz um beicinho que antigamente me deixava excitado, mas agora não faz
meu pau se mover um milímetro.
— Fizemos? Não. Você fez. Agora eu preciso jantar e dormir — falo e
saio do quarto, deixando-a lá, indignada.
— Estúpido! — Ouço seu grito aborrecido.
Adriane continua a fazer parte da minha vida em respeito ao irmão, que
foi meu melhor amigo desde criança. Ele morreu há quase um ano, num
acidente de carro. Eles eram gêmeos, e a ligação entre os dois sempre foi
muito forte. Quando ele morreu, Adriane — que já era pegajosa e ciumenta
— piorou. Há quatro meses, decidi terminar o noivado, mas ela não aceitou
muito bem e vive aparecendo aqui em casa. Às vezes, me sinto culpado por
ter terminado, porém foi necessário.
Ela aparece vestida quando estou preparando o jantar.
— Boa noite, Adriane — digo, com a voz firme.
— Alex, você tem outra pessoa?
Ela não vai embora. Em vez disso, se senta e me olha com olhos
chorosos. — Vou entender se tiver outra pessoa. Acho que é melhor isso do
que saber que você enjoou de mim.
Não respondo de imediato, porque o que ela está me perguntando dá no
mesmo resultado. Ela não vai gostar da resposta.
Essa será uma noite longa.
Lana
Ontem, ao chegar em casa, passei uma hora ouvindo sermão do meu
pai sobre a minha irresponsabilidade. Jules foi mandado embora e me senti
entediada. Fiz os trabalhos da faculdade e fiquei inquieta o resto do dia. À
noite, foi o mesmo marasmo.
Hoje, a situação é a mesma. Eu queria sair como uma pessoa normal,
sem ter ninguém na minha cola. Mas o que me preocupa mesmo é o
compromisso de amanhã. Quando decidi participar, a dra. Caty Ramos
deixou claro que se isso fosse um capricho meu e eu não tivesse
responsabilidade para cumprir com o que estava me comprometendo, era
melhor nem começar. Sou um pouco doidinha, mas ninguém pode questionar
minha responsabilidade nesse quesito.
Quando desço para sala de jantar, encontro minha mãe tomando o café
da manhã.
— Bom dia, mãe — digo, quando me sento à mesa.
— Bom dia, querida. — Ela me observa com atenção. — Você está
bem?
Assinto e começo a comer.
— Posso pedir uma coisa?
— Claro, mãe!
Sirvo o suco e espero.
— Pode não nos deixar preocupados? Só hoje? — A reprimenda em
sua voz pesa em meu estômago. — Quando você vai começar a agir como
uma mulher adulta?
— Assim que vocês deixarem de interferir em tudo o que faço, mãe —
respondo, com calma. — Vocês precisam me deixar viver.
— Quem te ouve falar assim, acharia que você vive em um porão e que
não tem liberdade. Você sabe que não é isso, filha. — Ela me encara. — Só
queremos o melhor para você.
— Não vivo em um porão, mas é como se fosse. Vocês colocam seus
sonhos em mim, escolhem por mim e não permitem que eu viva por mim
mesma cada etapa da minha vida.
Não falo mais nada até terminar de comer.
Minha mãe não me conhece, na verdade, nenhum deles me conhece.
Talvez a culpa seja minha. Levo praticamente uma vida “dupla”. Não que
seja um segredo da máfia russa, só não quero exposição. Sei que não posso
prometer nada a ela. Hoje, vou voltar para casa como uma adulta responsável.
Mas amanhã será outra história.
Me despeço dela ao terminar de comer e vou para fora da casa. Carl já
deve estar me esperando, mas, para minha surpresa, me deparo com alguns
homens no hall de entrada. Alexander Marshall conversa baixo com eles. Me
pergunto qual o segredo. Até parece que somos da família real de algum
pequeno país no oriente! Não vejo Carl. Mas quando percebem a minha
presença, Alexander se volta para mim.
— Bom dia. — Ele nem me dá tempo de responder. Para dizer a
verdade, sinto faltar o ar em meus pulmões. Droga, por que ele tem que ser
tão lindo? Se não fosse tão idiota...
Percebo que me perdi em devaneios ao ouvi-lo limpar a garganta.
— Ouviu o que eu disse, Lana? — ele questiona, mas continua, sem
permitir que eu fale. — Percebo que não. — Com um suspiro, indica um dos
homens. — Esse é o seu novo segurança.
Novo? E o Carl?
O segurança vem em nossa direção. Ele tem um sorriso simpático e,
diga-se de passagem, é muito bonito. O que é isso? Uma agência de modelos
ou de guarda-costas? Porém, ao observar os outros homens, percebo que não
são lá essas coisas.
— Sou Bruno Ross — ele se apresenta.
Ele é moreno, tem o cabelo liso e um pouco longo, mas num
comprimento que não dá para prender, o que dá um certo charme ao sujeito.
Ainda que seja um homem bonito, não desperta nada em mim, ao contrário
do chefe dele, que com aquele jeito de homem das cavernas, me faz perder o
ar.
Estendo a mão para Bruno e abro um sorriso simpático e sedutor. Se
eles têm alguma estratégia, também tenho a minha.
— Prazer, Bruno. E o Carl? — Me volto para Alexander, que está com
o cenho franzido.
— Foi substituído por sua causa. Por negligência.
Será que ele quer que eu me sinta culpada por causa da fuga?
— Bom, se a reunião terminou, preciso ir. Estou atrasada. — Empino o
queixo e passo por eles, seguindo para a saída. Espero até que o novo
segurança abra a porta do carro para mim e entro. Ao contrário do segurança
de ontem, esse parece gostar de conversar.
— Soube que você driblou o Carl — ele diz com um sorriso, parecendo
um tubarão. — Espertinha, hein? Vou te dar um aviso, gatinha, não tente
nada no meu turno.
Permaneço séria. Preciso ganhar a confiança desse cara. Olho pelo
espelho retrovisor.
— Foi necessário, mas não acontecerá de novo — falo num tom
inocente e abaixo a cabeça para que ele não note a mentira em meus olhos.
Preciso pensa uma forma de fugir amanhã. Bruno puxa conversa sobre
a faculdade, querendo saber do curso, e eu respondo o que ele me pergunta,
pois pressinto que vou precisar de toda a simpatia dele.
Por incrível que pareça, quando chego à faculdade, estou sorrindo.
Bruno é legal e joga charme o tempo todo, mas não é sisudo, nem chato. E
não parece ser guarda-costas. Mas isso não me impede de bolar um plano
para escapar amanhã. A ideia me vem à cabeça no meio da aula, mas vou
precisar da ajuda de Jules outra vez.
Assim que chego em casa, ligo para ele e conto meus planos.
— Estou fora. Você vai se meter em confusão e não quero estar
envolvido — ele fala assim que termino de contar. — O que é tão importante
para você ter essas ideias malucas?
— Por favor! Fico te devendo essa. — Ouço-o suspirar do outro lado
da linha.
— Que horas? — questiona. — Mas lembre-se: você me deve muitos
favores — fala com aquele tom irreverente dele. Eu o adoro demais!
— Amo você!
— Sei que ama.
Bem, agora preciso esperar anoitecer e torcer para que tudo corra bem.
Alexander
Estou preocupado e muito puto com aquela garota irresponsável. Ela
conseguiu fugir mais uma vez, nas “barbas” de homens treinados. Isso é
simplesmente inacreditável!
— Quero que instale uma câmera na porta do quarto dela — aviso aos
técnicos que vieram fazer o serviço hoje. — Eu deveria te demitir por isso. —
Encaro o segurança que estava de plantão na noite anterior na casa dos
Mitchell. — Como uma garota consegue um feito desses? Sinceramente,
acho que vou contratá-la para fazer um treinamento de campo com vocês.
— Chefe, nunca imaginei que que ela fosse se disfarçar de velhinha.
Olho para as imagens da câmera que fica na entrada da casa dos
Mitchell. O relógio marcava quinze para a meia noite quando uma senhora
cumprimenta o segurança e ainda faz pose de velhinha reumática.
— Você está há praticamente uma semana aqui, e ainda não percebeu
que os empregados dormem na casa e ninguém vai embora? Ainda mais a
uma hora dessas?
Pensei que tinha os melhores homens trabalhando comigo, mas vejo
que me enganei. Coloquei vários deles em busca da garota, mas demoramos
muito para perceber o sumiço dela. Enquanto os pais acreditavam que ela
estava dormindo, a moça nem estava em casa! Já se passaram treze horas, e
não tivemos qualquer notícia. O amiguinho disse que não sabe aonde ela foi.
Já fomos ao local em que ela pratica dança, mas fomos informados que ela
nem apareceu por lá.
— Já encontrou a minha filha, sr. Marshall?
Droga! Mitchell está terrivelmente chateado e preocupado, e a mãe
acredita que a filha preciosa foi sequestrada. Que merda! Sinto vontade de
dar uma lição nessa garota para que ela cresça. Ela precisa da porra de um
choque de realidade, e estou prestes a fazer isso.
— Ainda não, senhor — respondo.
— Quando contratei sua empresa, que, por sinal, me foi muito bem
recomenda, sr. Marshall, acreditei estar contratando um serviço de qualidade.
— Ele está vermelho — não sei se de raiva ou preocupação.
— Vou encontrar sua filha, senhor. — E vou mesmo.
Mas tenho que tirar o chapéu para ela. Lana enganou direitinho os meus
homens. Onde ela foi? Pesquisei cada detalhe da vida dos membros dessa
família: seus hábitos e lugares que costumam ir. Será que não dei a devida
atenção aos lugares em que ela costuma frequentar? Onde ela passou o dia?
Se algo acontecer com essa garota, a reputação da minha empresa será
manchada. Não vou permitir isso de jeito nenhum. Quando encontrá-la, vou
dar uma lição.

Quando algum membro sai de casa, estão sempre acompanhados. O


garoto só vai para o colégio e fica o dia todo com um segurança por perto.
Mitchell está sempre em casa. Ele tem evitado sair nos últimos dias. A esposa
é a pior, nunca sai. Mas sempre vejo carros chegando com visitas...
O meu alvo, porém, é a filha. É ela quem me proporciona mais chances
de pegá-la. Vou mostrar ao Mitchell quem é o melhor. Só preciso aguardar o
momento certo.
Eu a vi sair ontem à noite, mas não tive chance de me aproximar. Para
ser sincero, só a reconheci quando ela entrou no carro e tirou a peruca
grisalha da cabeça. A princípio, não entendi sua atitude, mas depois
compreendi. Aquilo fez com que eu me sentisse esperançoso. Os homens
contratados não são infalíveis.
CAPÍTULO 4
Alexander
Depois que Mitchell saiu da sala — onde todo o aparato foi

montado para se tornar uma central de monitoramento —, aguardo o retorno

das ligações que fiz. Contatei o máximo de pessoas possível para que eu

pudesse ter acesso a qualquer câmera onde pudesse ter um vislumbre de

Lana, e nada. Já passava das quatro da tarde quando ela foi localizada.

Orientei que ficassem de olho nela, mas não a abordassem. Em seguida, fui

falar com seus pais.


Cibelly parecia doente e abatida. Ao vê-la assim, senti a raiva ferver
meu sangue.
— Senhores — falo, chamando a atenção deles —, sua filha está bem.
Ela foi localizada e não se trata de sequestro.
— Ah, meu Deus! Onde ela está? Quero vê-la! — Cibelly começa a
chorar, e Mitchell a abraça.
— Calma, querida, está tudo bem. — Ele se vira para mim — Ela está
vindo para casa?
— É sobre isso que quero conversar com vocês — falo. Talvez eu me
arrependa de fazer isso, mas ela merece por deixar os pais aflitos desse jeito.
— Ela não vai voltar hoje. Vai passar um tempinho aprendendo a ser mais
responsável. Mas quero que vocês não se preocupem. Ela estará mais segura
que em qualquer outro lugar. Volta amanhã.
Sinto vontade de acrescentar que talvez a culpa seja deles que não
souberam dosar a liberdade, por isso uma mulher da idade dela faz coisas que
uma criança de cinco anos faria! Bem, se os pais não ensinam, o mundo está
aí para ensinar.
— Onde ela vai ficar?
— Não se preocupem. A sua filha hoje agiu de forma irresponsável, e
quero conversar com ela, só isso. — Senti vontade de rir, mas a situação não
era engraçada. — Fiquem tranquilos que vou trazê-la sã e salva para casa.
Volto para a sala de monitoramento, dou algumas instruções e saio.
Tenho uma missão a cumprir, ainda que me sinta agindo como ela: por
impulso.
Só espero que isso não saia do meu controle.
Lana
Deslizo pela barra do pole dance, mostrando os últimos movimentos
para as garotas. Então as deixo se exercitarem um pouco enquanto incentivo
seu progresso. Quando encerro o ensaio, troco de roupa e deixo o prédio em
direção ao ponto de ônibus mais próximo. Eu estava muito atrasada. O dia de
hoje foi intenso.
Perdi a noção do tempo e percebo que já são quase cinco da tarde.
Esqueci que não avisei aos meus pais que não estava em casa, nem deixei um
bilhete. Agora eles vão ter razão de tudo o que pensam de mim. Pela manhã,
quando cheguei na ONG, a bateria do celular descarregou, e agora, quando
mais preciso, não tenho como usá-lo. Desisto do ônibus e vou à procura de
um táxi, mas não vejo nenhum por perto. Apreensiva, tenho a sensação de
estar sendo observada e caminho apressada pela calçada. Quando um carro
para bruscamente ao meu lado, paraliso e vejo três homens de máscaras
pretas lá dentro. Um deles aponta uma arma para mim.
— Entre no carro, Lana!
A porta de trás se abre, e não consigo me mexer.
Eu. Vou. Morrer.
— Está surda?! — Um homem sai do carro e grita, me empurrando
para a parte de trás do veículo, que sai em alta velocidade.
O homem que está ao meu lado no banco de trás coloca um gorro preto
na minha cabeça e não vejo mais nada. O medo toma conta de mim. Só
percebo que estou soluçando quando ouço um dos caras rindo e me
chamando de chorona e filhinha do papai. Estou sendo sequestrada, assim
como meu pai foi há algumas semanas. Por que não acreditei que algo assim
poderia acontecer comigo? Por que eu tinha que ser tão estúpida? Tão
mimada?
Não sei quanto tempo passa, até que sinto o carro parar e começo a
tremer descontroladamente. Eles riem de mim e sou levada — quase
arrastada. Não tenho noção de onde pisar, nem vejo nada. Cada passo que
dou me deixa enjoada e sinto a bílis subindo pela minha garganta.
Choramingo quando sou empurrada para subir degraus e ouço portas se
abrindo. Sou arrastada, mais uma vez, agora para dentro de algum lugar que
não sei onde é. Estou sufocando nas lágrimas, e a máscara parece tomar todo
meu fôlego. Eles continuam me puxando.
O que vão fazer comigo? Será que vão pedir resgate ao meu pai? Irão
me violentar? Ah, meu Deus! Quero gritar que o meu pai vai pagar qualquer
coisa que eles peçam, mas não tenho voz. O medo é maior que o meu instinto
de sobrevivência.
— Sinto pena de você, garota. — Ouço um dos homens falar perto de
mim. Um calafrio percorre meu corpo. Sou forçada a me sentar no que parece
ser uma cadeira, e minhas mãos são amarradas para trás. Sou deixada lá
sozinha, sei disso porque ouço os passos se distanciarem. O pânico me
domina e choro ainda mais. Nunca acreditei que seria sequestrada, por isso
não quis aceitar guarda-costas, mas agora eu queria um comigo. Pensar que
fugi deles para fazer as coisas do meu jeito provoca outro soluço de pânico.
Permaneço por muito tempo sentada no escuro total, minhas mãos estão
dormentes e continuo chorando. Nunca derrubei tantas lágrimas na vida.
Sinto vertigem quando a porta se abre e ouço sons de passos vindo em
minha direção. Juro que quando sair daqui, serei a pessoa mais bondosa do
mundo.
— Está satisfeita agora, Lana? — Que raio de pergunta é essa? Tenho a
nítida impressão de que já ouvi essa voz antes, mas o horror que me atinge
não permite que eu raciocine com coerência.
— M-m-meu p-pai... — começo, mas sou cortada pela voz dura do
homem.
— Pai?! Que pai? Aquele a quem você não dá a mínima?! — ele
esbraveja. Tremo com o tom e me controlo para não chorar de novo.
— Por favor... — Não sei o que estou pedindo.
Sinto o homem se aproximar de mim.
— Se você se visse agora... onde está a patricinha ousada? Cheia de
truques? Por que não fugiu até agora, espertinha? — A voz é debochada, e
começo a tomar consciência de algo. Esse homem sabe coisas sobre mim.
Pior, estou reconhecendo sua voz.
— Quem é você? — pergunto, com a voz mais firme agora. —
Conheço essa voz.
— É? — O gorro que cobre minha cabeça é retirado e mantenho os
olhos fechados. — Você é patética.
Crio coragem e abro os olhos, só para confirmar o que já temia. Meus
olhos encaram a figura imponente a minha frente, e fico em choque,
atordoada.
— Você?!
Alexander se senta na cama, que fica de frente para cadeira onde estou
amarrada e apoia os cotovelos nos joelhos enquanto olha para mim. Desvio
os olhos e vejo que estou em um quarto simples, organizado e bem
masculino. E a cama é imponente e larga.
— Onde estou? — Engulo o nó de medo e enfrento seu olhar duro. Ele
não ri ou parece simpático, ao contrário, seu olhar sustenta o meu, o cenho
franzido. — Por que está fazendo isso?
— Quem faz as perguntas aqui sou eu, Lana — ele diz. — O que você
fazia naquele bairro?
— Não é da sua conta! — vocifero, meu medo dando lugar à raiva.
— Sabe, garota, não sou o seu pai. Então responda a porra da pergunta!
— Seus olhos parecem jades brilhantes. — Não me custaria te dar umas
palmadas, algo que o seu pai já deveria ter feito...
— Toque em mim, e eu te mato — interrompo, mas ele me ignora.
— O que você fazia naquele bairro? — ele repete a pergunta, mas não
vou responder. Trinco os dentes e o encaro, com raiva. — Não vai responder?
Tudo bem. — Ele se levanta e caminha para a porta, mas para antes de sair —
Você está com fome ou sede?
Agora que ele perguntou, percebo que sim, sede principalmente, minha
garganta está seca e áspera. Assinto. Ele ri pela primeira vez desde que o
conheci, mas é um sorriso frio.
— Então, quando estiver pronta para me contar onde estava, por que
fez meus homens de palhaços com essa fuga e, principalmente, por que
preocupou seus pais — ele faz uma pausa e olha com desdém para mim —,
você me chama que te dou comida e água, sua sabichona. Se não quiser
morrer de fome e sede, é melhor começar a falar.
— Não queria fazer seus homens de palhaços. Só você mesmo, imbecil
— digo, num tom alto o suficiente para ele ouvir. Alexander me olha com
desdém e sai batendo a porta, me deixando sozinha.
Mas o que me preocupa é o porquê de ele ter me trazido para cá e me
amarrar feito um cão sarnento. Como vou sair daqui? Olho ao redor e vejo
uma porta, provavelmente o banheiro. Torço as mãos para ver se consigo me
soltar, mas parece impossível. Agora que descobri que não fui sequestrada de
verdade, meu medo está começando a virar raiva do Alexander. Que homem
odioso! Ele. Vai. Me. Pagar.
Minha valentia começou a diminuir pouco tempo depois. Preciso de
água, meu pulso está esfolado de tanto remexer em uma tentativa de me
soltar...
Quero fazer xixi, beber água e ir para casa, penso um tempo depois, ao
me cansar de me contorcer em vão...
Alexander
Saí antes que perdesse a cabeça e fizesse uma bobagem. Ela só ficou
com medo quando achou que era um sequestro de verdade. Quando percebeu
que não, voltou a ser malcriada. Ela merecia mesmo receber uma lição.
Entro na sala da minha casa e encontro Bruno e os outros três
seguranças que pegaram a Lana. A garota não tem noção do perigo. Qualquer
um poderia tê-la levado!
— Estão dispensados — falo e me sento no sofá. Encosto a cabeça e
olho para o teto.
— Não acha que está sendo duro demais com ela, Alex? — Bruno se
senta na minha frente em vez de ir embora com os outros.
— Não. A Lana precisa crescer e ter responsabilidade.
Ele pode ter razão, mas estou muito puto para ouvir.
— Bem, estou indo. — Ele se levanta e caminha em direção à porta,
parando antes de sair. — Se quiser, posso levá-la comigo. — Ele ri com
malícia. Não acho graça e devo ter deixado isso claro na minha expressão,
porque o Bruno ergue as mãos no ar. — Tudo bem, meu amigo! Mas ela é
linda... posso tentar minha sorte depois — ele diz e vai embora.
Esse cara é um idiota. Nem sei por que o tenho como amigo.
Tento relaxar quando ouço um baque e gemidos no quarto.
Quando abro a porta, sinto vontade de rir. Ela caiu com a cadeira e está
em uma posição bem ruim.
— Tentando fugir, Lana? Você não desiste mesmo, não? — questiono
quando me abaixo e olho em seu rosto vermelho. As lágrimas escorrem dos
olhos. O remorso me atinge, mas não demonstro. — Quer se levantar daí?
— Vá à merda! — ela esbraveja entre os dentes. Parece furiosa.
— Você quer que eu te ajude a se levantar? — pergunto outra vez. —
Tem que aprender a ser mais humilde, princesa! Peça por favor, que talvez eu
te ajude.
Ela fecha os olhos com força e começa e se contorcer outra vez.
— Tsc, tsc, tsc. Você não aprende, Lana. — Me levanto. — Certo, você
quem sabe. Se quer passar a noite assim...
Sigo em direção a porta quando a ouço.
— P-por favor...
É tão baixinho que mal escuto.
— Não ouvi, princesa — digo de onde estou. — O que disse?
— Preciso ir ao banheiro — ela fala mais alto dessa vez. — Por favor.
— Ah! Claro! — Volto e a ajudo a se levantar. Desamarro suas mãos e
aponto para o banheiro. — Pode ir, só não faça nenhuma gracinha. E deixe a
porta aberta.
De cabeça baixa, ela vai e deixa a porta entreaberta. Sento e espero. Ela
demora tanto lá dentro que quase vou buscá-la, até que surge com o rosto
lavado e os cabelos, que antes estavam bagunçados, presos. Ela caminha em
silêncio e se senta outra vez na cadeira. Boa menina, está indo bem.
— E então, vai falar o motivo de sair altas horas da noite, correndo
tanto perigo?
— Já disse que não é de sua conta — ela resmunga. — Quero que me
leve para minha casa imediatamente — exige.
— Quem dita às regras aqui sou eu, princesa. Você só vai para casa
quando eu determinar.
— Por que está fazendo isso? — Ela se levanta bruscamente e corre
para fora do quarto.
Tola.
Eu a sigo com calma, e a vejo tentando abrir a porta da frente. Batendo
e gritando a plenos pulmões. Ah, garota! Não tem noção do que eu poderia
fazer com ela. E isso nada tinha de sexual. Ela não faz o meu tipo. A única
coisa que tenho vontade é de mandá-la para o meio da selva e deixá-la lá
durante uma semana.
— Me deixe ir!
Solto um suspiro, vou até onde ela está e a puxo de volta para sala.
— Socorro!
— Se não parar de gritar, juro que vou dar uma surra na sua bunda,
Lana! — esbravejo.
— Você não teria coragem, seu idiota!!
— Tente-me — rosno, a raiva se enraizando em mim.
Ela deve ter visto que não estou brincando. Seus olhos se arregalam,
mas sou pego desprevenido pelo que ela faz em seguida. Lana joga todo o
peso do seu corpo em cima de mim em um pulo — literalmente — os braços
ao redor do meu pescoço, as pernas ao redor da minha cintura e o rosto
escondido na curva do meu pescoço. Puta que pariu!
— O que está fazendo, Lana?!
Tento empurrá-la para longe de mim, mas ela coloca ainda mais força
nas pernas. Estou preso em uma chave de pernas com uma garota minúscula.
A situação chega a ser ridícula.
— Por favor... — Ela começa a distribuir beijos ao longo da minha
mandíbula. — Me leve embora, por favor.
Ela perdeu a cabeça. Que jogo está fazendo?
— Pare, Lana — repreendo. Onde ela quer chegar com essa atitude?
Agarro sua cintura para afastá-la de mim, mas acho que fiz o movimento
errado, porque agora ela está beijando a minha boca como se a sua vida
dependesse disso.
CAPÍTULO 5
Lana
Não sei o que deu em mim, mas ser arrastada por Alex de volta
para a sala faz o medo do que ele poderia fazer comigo atingir cada célula do

me corpo. Então, faço algo inesperado — até mesmo para mim: agarro seu

pescoço e prendo as pernas ao redor dele. Se essa fosse a única forma de sair

dali sem me machucar, se isso amolecesse o seu coração, eu o faria.


E foi o que fiz: eu o beijei enquanto ele tentava me afastar.
Eu não estava contando com isso, tampouco com esse calor que
começa na barriga e se alastra por todo meu corpo. Aperto ainda mais as
pernas ao redor dele. Estamos colados. Ele tenta se livrar de mim, porém
perde a luta. E quando vejo, estou sendo segurada com tanta força que chega
a doer. Sinto as suas mãos agarrarem minha bunda e a língua enroscar com a
minha. Nos beijamos, famintos. Sua boca é dura contra a minha. Sinto um
frio na barriga que se mistura com o calor que já está lá e, instintivamente,
aperto as coxas e sinto a dureza dele em todos os lugares em que nos
tocamos. Seguro a sua nuca e o beijo com vontade.
Alex me empurra com força para longe, mas eu aperto sua cintura com
firmeza. Estou ofegante e vejo a fúria quando ele para de empurrar e segura
meu rosto entre as mãos, afastando nossas bocas. Abro um sorriso cínico e
arqueio a sobrancelha com ironia.
— Nunca mais faça isso! — Alex resmunga as palavras, os olhos
verdes e ferozes tão intensos.
— Por que não? Está com medo de mim? — Provoco e levo a mão à
boca. Acho que falei demais. Ele segura a minha cintura e a aperta, me
fazendo gemer de dor. Sei que amanhã ficarei com manchas roxas das suas
mãos enormes.
— Você não tem ideia do que eu poderia fazer com você, garota
mimada! — ele diz, tão perto do meu rosto que sinto seu hálito quente em
mim.
— O que você poderia fazer? Hein? Estou esperando — respondo,
insolente. Sinto um comichão por todo o corpo e é como se a adrenalina
corresse solta por mim.
— Lana... — ele começa, mas eu o corto.
— Você não é homem suficiente, Alex? — Ah, merda! O que estou
fazendo? Ele me surpreende e, como tinha relaxado as pernas, ele consegue
me afastar e praticamente me joga no sofá. Ele se aproxima, segura a minha
garganta com força, mas não tenho medo dele, ao contrário: estou excitada,
esperando ansiosa pelo próximo passo dele.
— Acha que sou algum otário, Lana? — Ele me olha com raiva. —
Pensa que não sei o que está fazendo? Que eu sou um idiota? Está achando
que vou cair nesse truquezinho barato?
Mordisco o lábio e o encaro.
Ele está olhando para o movimento da minha boca. Não vai cair, não
é? Vamos ver, grandalhão.
— Você merece uma lição, garota. Coisa que seu pai já deveria ter
feito.
Sorrio, agarro sua camisa e tento puxá-lo para mim.
— Por que você não faz isso? O que está esperando?
Nem sei o que estou fazendo. Só sinto que devo testar seus limites e
quero suas mãos em mim. Droga, nem faz meia hora que eu queira matá-lo,
agora não vejo a hora de ter a sua boca na minha mais uma vez.
— Você é mais louca do que imaginei, garota. — Seu tom de voz
muda. Agora é rouca e provoca uma sensação engraçada em meu estômago
quando ele murmura perto da minha boca. Meu coração acelera quando vejo
o brilho predador em seus olhos. Fecho os meus, esperando que ele me beije,
mas o beijo não vem.
Ouço a porta da frente se abrir, e nos separamos como dois
adolescentes pegos no flagra. Alexander me solta, e eu me sento, ao ver uma
ruiva paralisada na porta. Os olhos furiosos dela estão sobre mim. Ela bate a
porta com tanta força que reverbera na sala.
— Agora entendi, Alex! — Sua voz é chorosa, mas irada. — Quem é
essa puta? É por isso que você me trocou?
O quê?! Vejo vermelho ao ser chamada assim. Antes que eu abra a
boca...
— O que está fazendo aqui, Adriane? — Alexander se move na direção
da visitante, que está olhando fixo para mim. Me levanto com toda a calma,
ajeito a roupa e devolvo o olhar, piscando de forma sedutora para ela, Alex
vai ficar em “maus lençóis” agora. Ela vai achar que somos amantes.
Eu rio.
— Quero que me diga quem é essa! — ela exige.
— Isso, Alê. Diga a ela quem eu sou — falo, com voz dengosa. Paro a
provocação quando percebo que essa é uma ótima oportunidade para que eu
possa fugir e ir para casa. Talvez ela me ajude, no fim das contas. — Não é
nada disso que você está pensando. Ele que me atacou e fez coisas obscenas
comigo, juro que eu não queria... Aaai! — Sou levada de volta para o quarto
onde estava antes. — Não pode me amarrar outra vez, Alex!
Ele me empurra para o meio do quarto.
— Vou cortar essa língua mentirosa, garota! — Ele está bravo... ou
melhor, furioso. — Não me envolva em seus truques, porque não acho a
menor graça! Você gosta de jogar com a vida das pessoas, é isso?
Cruzo os braços e o encaro.
— Me deixe ir embora que deixo a sua vida em paz. — Bato o pé,
como se fosse uma garotinha.
— Fique aqui. Estou perdendo a paciência com você, então não force a
barra — ele fala, sai e fecha a porta, me trancando nessa porcaria de quarto.
Ainda bem que não estou amarrada.
Droga! Estou com sede e fome, não aproveitei a oportunidade quando
tive, agora já era. Ando de um lado para o outro e ouço a voz da ruiva lá fora.
Será que é a namorada dele? Pelo jeito, sim. Parecia que ela ia me matar. Vou
até a porta e tento ouvir a conversa. Viro a maçaneta e a porta se abre, para
minha surpresa. Abro-a devagar e coloco a cabeça para o lado de fora. Olho
ao redor. O corredor está vazio. Saio devagar e me esgueiro pela casa. Eles
parecem estar na cozinha. Sinto meu coração quase sair pela boca, e sei que
vou me meter em confusão outra vez.
— Quero que vá embora, Adriane. — Alex fala. — Estou mudando o
código de acesso e você não poderá mais entrar aqui quando bem entender.
Chega. A partir de hoje, você não vai mais entrar aqui sem permissão.
— Ah, claro! Agora você tem uma vagabunda, não é? — ela desdenha.
— Está pegando franguinha agora, Alex? — ela questiona. Que ridícula. Não
vou ficar aqui ouvindo isso, penso comigo mesma.
Estou quase chegando a porta, quando ouço passos vindo para sala.
Procuro um lugar para me esconder, mas não encontro. Oh, céus! Agacho
atrás do sofá, o único esconderijo viável por perto. Droga, estou parecendo
criança. Eles se encaminham para a porta, e eu engatinho para a lateral do
sofá. Consigo ver quando ele a abre. Burra!
— Estou ocupado, Adriane. Não tenho tempo para suas birras. — Ele
escancara a porta e faz sinal para que ela saia.
Vai, ridícula, não vê quando está sendo dispensada!
— Isso não vai ficar assim, Alex...
— Adeus, Adriane. — Ela se estica e beija o queixo dele.
Reviro os olhos com a cena. Aff! Que ridícula!
— Ligo quando você não estiver ocupado — ela enfatiza o “ocupado”.
Reviro os olhos de novo. Não a conheço, mas já antipatizo totalmente
com ela.
Alexander fecha a porta e só agora vejo o tal teclado para digitar o
código que abre a porta que ele havia falado. Ele volta para a sala e se senta
no sofá onde estou escondida. Ah droga, e agora?
— Já pode sair daí, Lana — ele murmura. O quê, como ele sabe que
estou aqui?!
Sinto vontade de chorar de frustração. Levanto a contragosto e vejo a
sombra de um sorriso nos lábios dele.
— Se não fosse tão patético, seria cômico ver suas tentativas de sair
daqui, pequena trapaceira.
— Por que não posso ir para casa? Isso sim é patético. — Faço um
gesto com as mãos mostrando a casa que pelo visto é dele. Não entendo o
porquê de me trazer aqui. — Por que não posso ir embora? — pergunto mais
uma vez.
— Porque não se senta aqui? — Ele aponta para o sofá ao lado.
— Estou com fome e sede, e você quer que eu me sente e converse?
— Alguém já te disse o quanto você é mimada e irritante, Lana? — Ele
me encara.
— Caso não tenham dito, você fará questão de falar, não é?
Não consigo manter minha boca fechada, mas não me importo. Estou
me sentindo suja, com sede e fome. Bem, está na hora de jogar com o senhor
sabe tudo. Abaixo a cabeça e dou a volta no sofá, me sentando ereta na
beirada, o mais longe possível dele.
— Se eu prometer contar tudo a respeito da minha vida, você me leva
para casa? — Ergo os olhos de forma inocente, tentando parecer o mais dócil
possível. — Mas estou com fome e sede. Posso comer e beber algo antes?
Ele semicerra os olhos para mim enquanto avalia minha súbita
docilidade. Sei que o truque de beijá-lo não funcionará de novo, mas vou
repetir o beijo antes de ir embora daqui. Só para mostrar a ele o quanto ele
gostou do meu toque.
— Isso é algum truque, Lana? — Não percebi que estava sorrindo até
ver seu olhar desconfiado.
— Juro que não.
— Porque, se for, você sofrerá as consequências. E não estou
brincando. Depois não diga que não avisei. — Ele levanta e segue para a
cozinha. — Está esperando o quê? Que eu seja o seu garçom?
Grosso!
Levanto e o sigo. Ele me entrega um copo de água, que bebo em
desespero. Em seguida, ele começa a preparar algo e me sento à mesa para
observá-lo.
Alexander
Coloco o prato com o sanduíche na frente de Lana e observo enquanto
ela devora a comida. Faminta, nem parece a patricinha fresca de todos os
dias.
Agradeço mentalmente a vinda de Adriane. Sei que ela veio com
segundas intenções, achando que dormiria aqui, mas sua intromissão evitou
que eu fizesse uma grande besteira — como ir para a cama com a filha de um
cliente.
Lana é linda e deixa qualquer um louco, mas tenho regras e éticas a
serem cumpridas. Desvio o olhar para os lábios dela, observando enquanto
ela mastiga a comida. Ela é tão sexy... balanço a cabeça para clarear as ideias.
Ela não está agindo de forma provocante, e a minha cabeça não para de
fantasiar com essa atrevida. Queria não ter tantos escrúpulos, porque só de
me lembrar de ter sentido o corpo dela contra o meu fico duro feito pedra. A
vontade de transar com ela é tão grande que, pela primeira vez, me sinto
tentado a quebrar minhas regras de não me relacionar com clientes.
— Vossa alteza quer algo mais? — pergunto em tom de ironia,
tentando afastar o desejo e colocar um pouco de juízo na minha cabeça.
— Sim. Pode me levar para casa agora? — ela pergunta, se levantando
da mesa.
— Sente-se!
— O quê? Você não manda em mim, Alexander.
Lá vamos nós outra vez. Isso está ficando cansativo.
— Lana, precisamos conversar. Você podia estar correndo perigo hoje.
Sua atitude foi tola e insensata. Eu espero que você nunca mais faça algo
assim — eu a repreendo.
— A minha vida não lhe diz respeito. Se você é tão esperto, deveria ser
fácil descobrir onde estou. — Ela volta a sentar e cruza os braços de forma
defensiva.
— Tenho uma empresa de segurança, não uma agência de detetives.
— Para mim, dá no mesmo.
— Quero que você entenda que a única coisa que me interessa é a sua
segurança. Não vou fazer nada para atrapalhar a sua vida particular ou me
intrometer onde não devo — digo, ignorando sua cara amarrada. — Você só
precisa avisar aonde vai. Não precisa sair escondida. Isso é infantil e
inconsequente. Não é atitude de uma mulher sensata.
— Acabou o sermão? — Seu rosto está vermelho, não sei se de
vergonha ou birra.
— Estou falando sério, Lana. Você tem quase vinte e dois anos. Não é
mais adolescente, mas age como se fosse. Os seus pais só querem mantê-la
em segurança. — Falo, tentando despertar seu bom-senso. — Você acha que
o mundo gira ao seu redor, garota? Cresça! E quanto aos lugares onde você
vai, não se preocupe. Até amanhã, vou saber de todos os seus passos. Então,
se quiser me contar, temos a noite toda.
Não entendo o receio dela em falar sobre isso. Eu já descobri, em parte,
o que ela faz naquele bairro da periferia. Será que ela tem vergonha? Ela
deveria se orgulhar e não se esconder. É uma bobagem querer que as pessoas
pensem mal dela.
— Prometa que sempre vai sair acompanhada de um segurança, Lana.
Você corre o risco de ser sequestrada de verdade.
Ela baixa a cabeça e sinto uma pontada de remorso.
— O que aconteceu hoje foi só uma simulação do que pode acontecer
de verdade. Seu pai tem motivos reais para ter contratado a minha empresa.
— Não sou criança para ter que dar satisfação de tudo o que faço.
Ela levanta os olhos da cor de uísque envelhecido. Não deveria desejá-
la, mas meu corpo pensa diferente. Sei que foi um erro trazê-la para cá.
Passar a noite debaixo do mesmo teto que ela não vai ser nada bom para a
minha sanidade.
Lana
Meu olhar encontra o seu e vejo desejo, puro e simples. Tive vários
namorados, mas apenas um amante. Não sou uma garota experiente... meu
ex-namorado tinha a mesma idade que eu e descobrimos juntos a nossa
sexualidade. Nossas relações não eram grandes coisas, e eu jamais me
envolvi com um homem de verdade. Mas Alexander Marshall me desperta
um desejo que jamais senti, não consigo sequer me concentrar no que ele
fala. E o fato de que mal o conheço me assusta pra caramba.
Tento focar a atenção em suas palavras. Ele me repreende como se
fosse meu pai, e eu, uma criança inconsequente. Mas, mesmo agora, tudo o
que quero é colar meus lábios nos dele e beijar sua boca outra vez.
— Alex, não posso expor o que faço. Essa é uma das condições para
que eu possa ir até lá. A minha vida “badalada” não pode se misturar com
aquilo... tem pessoas que vivem lá que querem manter o anonimato, e se
algum repórter fofoqueiro me seguir, não posso mais frequentar — tento
argumentar.
Sinto vontade de chorar por estar justificando meus atos.
— Mas ao ir até lá sozinha, sem segurança, você está expondo essas
pessoas ao perigo também.
Reflito por alguns momentos. Talvez ele tenha razão, mas não sei o que
fazer. Então, as lágrimas que eu estava segurando começam a cair. Ele se
levanta e se aproxima. Sinto seus braços me erguerem e me puxar contra seu
peito. Enquanto ele me abraça, envolvo a sua cintura e enterro o rosto em seu
peito.
— Ah, cara! Isso não vai dar certo — ele murmura.
CAPÍTULO 6
Alexander
Abraço Lana com intenção de consolar e ser gentil, já que fui tão
duro com ela. Mas quando ela me abraça de volta, logo percebo meu erro.

Seguro seus ombros e a afasto um pouco. Seus olhos me encaram, famintos.

O que estou fazendo? Estou perto dela há poucas horas, mas parecem dias...

meses até. Sei que não posso ter esse tipo de pensamento sobre ela. Quando a

conheci, tentei ignorar sua beleza e vivacidade. Eu vi como ela me olhou e

tentei ao máximo ver apenas os seus defeitos, mas fica difícil raciocinar

quando tenho seu corpo colado ao meu.


— Você está bem?
Ela assente, e eu deslizo o polegar em seu rosto para secar suas
lágrimas.
— Se é tão importante que seus pais não saibam, tudo bem. Vou me
certificar de que nada te aconteça, mas você precisa confiar em mim, ou não
vou poder permitir que você continue indo lá. — Sei que posso me
arrepender, mas não consigo segurar as palavras. — Vou garantir a sua
segurança pessoalmente, Lana.
Ela arregala os olhos e então sorri.
— Você? Por quê? — Seus olhos brilham, e sinto que acabei de
comprar meu bilhete para a insanidade. — E aquele segurança novo? Bruno,
não é?
— O que tem o Bruno? — Franzo a testa com aquele súbito interesse.
Será que Bruno já deu em cima dela? Ou foi ela quem fez isso? Acho que ela
não tem qualquer problema em flertar, já que está fazendo exatamente isso
comigo.
— Gostei dele, é muito simpático. — Ela ri. — Posso te beijar agora?
Como forma de agradecimento por não me impedir de ir à ONG? — Ela leva
as mãos ao meu peito em uma carícia tentadora.
— Claro que não, Lana! Você não leva nada a sério?
Seguro suas mãos e a afasto de mim.
— Não devemos misturar as coisas, de jeito algum. Isso é uma regra.
Espero que não a quebre jamais — afirmo, mas o recado serve para mim
mesmo também.
— Adoro regras, Alex, porque é muito, mas muito gostoso quebrá-las.
— Essa garota é o diabo disfarçado. — Tudo bem, já que você não pode
quebrar suas regras chatas, eu as quebro por você, Alex. Por que não relaxa?
O que é isso agora?
— Porque, além de ser cliente, você é uma criança para mim — falo e
saio de perto dela. — Não quero envolvimento com você.
— Não era criança quando você estava com a língua na minha garganta
— ela retruca.
— Chega, Lana, vou te levar para casa. — Sigo até o cofre onde guardo
a arma, pego a chave do carro e ela me segue de perto.
— Sua bunda é sexy. Gosto dela — ela fala.
Reviro os olhos, mas saber do seu interesse me causa um efeito nada
bem-vindo. Não digo nada.
— Aquela mulher é a sua namorada? É por isso que não podemos nos
envolver?
— Você mal me conhece e já fala em envolvimento? — questiono. —
Não acha que é muito atirada, Lana? Além disso, a minha vida particular não
lhe diz respeito.
— Não sou hipócrita como você. Quando quero algo, corro atrás — ela
fala, e eu ouço a sua risada. Me viro, com a intenção de encará-la, mas ela
está andando tão perto de mim que nos esbarramos. Automaticamente, eu a
seguro pela cintura para que não caia. Droga, ela tem que ser tão tentadora?
Seus olhos cor de mel são lindos e muito expressivos.
— Vamos, vou levar você para casa — digo, com a voz rouca. Solto a
sua cintura, seguro a sua mão e a levo em direção à porta. Vou levá-la
embora ou vou acabar fazendo merda!
— Quero ficar aqui com você — ela diz. — Está com medo da atração
entre nós, Alexander?
— Gosto de mulheres maduras e bem-resolvidas, Lana. — Destranco a
porta e saio com ela em direção ao carro. — E você não é nada disso. É só
uma garota que gosta de brincar e jogar.
Ficar com Lana na mesma casa é pedir por problemas.
Abro a porta do carro e a acomodo no banco de passageiro. Pela
primeira vez, ela fica calada. Quando me sento no banco do motorista, vejo
que ela está olhando para fora da janela. Bem, acho que ela entendeu o
recado.
— Não vai dizer nada? — Nem acredito que estou cutucando, parece
que gosto de vê-la fazendo essas loucuras.
— Foda-se!
— Que linguajar! Que bela advogada você vai ser — resmungo e abro
um sorriso.
Ela permanece calada e de braços cruzados, olhando pela janela. Dou a
partida no carro e a levo para casa.
Estamos quase chegando quando meu telefone começa a tocar. Olho no
identificador de chamadas e vejo que é o Bruno. O que será que aconteceu?
Atendo.
— O que houve, Bruno? Você não estava de folga? — pergunto.
— Estou na casa dos Mitchell. É melhor você vir para cá — ele fala.
— O que está acontecendo?
Ele explica que receberam outro bilhete com ameaças. Desligo e
acelero. Vou precisar chamar a polícia para cuidar do caso. Mitchell tem
muito dinheiro, o que acaba sendo um chamariz para bandidos, mas o
sequestro e as ameaças não me pareceram justificados. Tenho quase certeza
de que há algo por trás disso e vou descobrir o que é. Só espero que ninguém
se machuque enquanto isso.
— Algum problema? — Lana se vira para mim, curiosa.
— Nada com que deva se preocupar. — Fico em silêncio por alguns
instantes até que decido puxar assunto. — Você vai para a faculdade
amanhã?
— Por falar nisso, prefiro que o Bruno seja o meu segurança. Ele é
mais divertido que você.
Desvio os olhos da rua e a observo. Ela agora vai usar o Bruno para ver
se sinto ciúme? O que será que ela tem na cabeça? Não sou um cara
ciumento. Além disso, não temos nada e nem vamos ter. Ela está fazendo isso
só porque trocamos um beijo? Isso é muito pouco para que eu sinta algo
assim.
— Bruno tem outras atividades e, além disso, quero ver você fugir de
mim, pequena encrenqueira. — Paro o carro no pátio da casa. Lana abre a
porta para sair, quando seguro o seu braço.
— Espere! — Ela me encara. — Preciso da sua colaboração para que
eu possa fazer meu trabalho direito, Lana. — Reforço, para que ela tome
juízo. — Não se esqueça de que vai depender de você para que a sua rotina
continue igual, inclusive indo aos lugares que você não quer que seus pais
saibam.
— Entendi, senhor!
Rebelde!
Há poucos metros dali...

Observo quando o carro entra na casa e aquele segurança idiota desce


com a garota. Sorrio. Ela vai ser o passaporte para o que quero. Mitchell vai
se arrepender das suas atitudes. Vou focar na garota, que é o único membro
da família que vou ter a chance de pegar agora. E não vou ter misericórdia
dessa vez... enviei mais um bilhete e vou continuar enviando, desviando o
foco deles para outros lugares. Enquanto eles se preocupam, vou
construindo a minha oportunidade...
Lana

Que cara idiota!


Doeu ser chamada de infantil por ele! Não acho que ele goste de
mulheres maduras. A “cabelo de fogo” não parece alguém madura —
descontrolada, isso sim. Preciso descobrir se eles têm alguma coisa, apesar de
achar que eles não são namorados, já que ele não foi nada gentil com ela.
Sinto muita raiva ao pensar que ele me rejeitou! O pior é que eu o
quero de verdade, desde que fiquei frente a frente com aqueles olhos verdes
pela primeira vez. Desde então, ele ficou na minha cabeça. Senti raiva pela
sua óbvia falta de interesse naquele dia, mas agora, o sentimento é ainda
maior, porque sei que ele está atraído também. O beijo que ele me deu foi...
foi... ah, demais! E aquela história descabida de não querer se envolver?!
Sinto te dizer, Alexander Marshall, mas você já está mais que envolvido.
Quero sair correndo do carro, mas ele quer a minha garantia de que
serei uma santa daqui para frente. E é obvio que concordei.
Ao entrar em casa, percebo que algo está acontecendo. A casa está
repleta de seguranças, mas nem me incomodo em procurar saber o que
houve, pois eu sei que não vão me falar. Sigo para o meu quarto para tomar
um banho. O dia foi longo demais.
Quase não consigo dormir. Passei a noite rolando na cama, pensando
em bobagens, onde Alex era o protagonista. É óbvio que tenho uma paixonite
por esse cara. Nunca estive tão interessada em alguém como agora. Deve ser
culpa da rejeição dele. Só isso explica essa fixação repentina.
Quando o dia amanhece, me arrumo para a faculdade. À tarde, vou à
aula de pole dance e como Alexander vai ser meu acompanhante, tenho
planos para ele.
Dou uma última olhada no espelho e me sinto satisfeita com o
resultado. Quero estimular a imaginação do meu segurança, dar algo para que
ele possa cobiçar. Dou uma risada. Isso instiga meu lado mais sacana — ah,
sacana no bom sentido, claro. Vou levá-lo na aula de pole dance e deixa-lo a
mercê de todas aquelas mulheres. Quero ver como ele vai se sair quando elas
caírem matando em cima dele.
Ao descer, encontro a minha mãe e me sinto mal quando vejo sua
expressão de decepção. Estou sempre pisando na bola com a minha família!
Ela está chateada, e com razão. Ultimamente, não faço nada certo. Nem com
meu irmão tenho mantido um contado mais próximo. Preciso mudar isso.
Vou mudar, digo a mim mesma, mas não hoje. Depois que aquele filho
da mãe me deu o maior susto da vida, prometi a mim mesma que ele iria
pagar. Idiota! Me sinto tão eufórica que nem tomo café da manhã. Vou para
fora da casa, meus olhos esquadrinhando ao redor.
Mas, para minha surpresa, quem me espera ao lado do carro não é
Alex, mas sim, o Bruno. Que merda!
— E o Alex? — Não me contenho e pergunto. Bruno me dá bom dia e
abre a porta do carro. Só depois que ele dá a volta e se senta no banco do
motorista é que responde.
— Não sabia que o Alexander faria pessoalmente a sua segurança —
ele responde e parece segurar o riso. Porque diabos ele está rindo? Agora
virei chacota dos seguranças?
— Falei algo engraçado? — pergunto, séria. — Não sabia que eu era a
palhaça desse circo.
Bruno desfaz o riso e me olha de lado.
— Claro que não, só achei sua pergunta estranha. — Ele fica sério, mas
tenho certeza de que está rindo de mim por dentro. — Alex está ocupado.
Você vai ter que se contentar comigo.
Não respondo e o ignoro por todo o caminho até a faculdade.
Passo o resto da manhã frustrada. Preciso fazer algo a esse respeito.
Preciso tomar uma atitude. Essa droga de desejo que sinto por ele deve ser
apenas empolgação. Quando a aula termina, percebo que não prestei atenção.
Minha cabeça estava longe dali. Preciso me divertir um pouco e esquecer
esse homem que está me desestabilizando. Ligo para algumas amigas que não
vejo há quase duas semanas.
— Lana! Que surpresa! Por onde andou? — Karine pergunta, assim
que atende o telefone. Ela é mais louca que eu e é namorada um leão de
chácara de uma boate top em que sempre vamos para nos divertir. Eu a
convido para sair à noite e ela, é claro, aceita. Festa é com ela mesma!
Combinamos de nos encontrar na casa dela mais tarde.
Ligo para o Jules. Ele reclama, mas acaba concordando em me
acompanhar. Hoje tenho aula de dança e é para lá que vou direto da
faculdade.

Pela primeira vez, acho a aula de pole dance chata e não vejo a hora de
terminar. Ao sair, vou direto para a casa da Karine, mas ligo para minha mãe
avisando que não vou dormir em casa. Ela reclama e diz que eu deveria ir
para casa, pois precisamos conversar por causa da minha fuga na noite
passada, mas falo que conversaremos quando eu voltar e que o segurança tem
tudo sob controle. É óbvio que Bruno não sabe ainda, mas vou resolver isso
quando sair da aula.
Ele me espera na porta do salão de dança. Abro um sorriso.
— Preciso de um favor, Bruno — digo, calmamente. — Tenho que
fazer um trabalho da faculdade na casa de uma amiga. Você pode me deixar
lá?
— Casa de amiga? Lana, você sabe que tem que avisar antes para que
possamos tomar providências para a sua segurança — diz.
— Eu não sou nenhuma celebridade, isso não tem nada demais.
— Vou te levar para casa. São ordens.
— Ordens de quem? Do abusado do seu chefe? Ou você me leva, ou
vou a polícia denunciar o sequestro de ontem — ameaço, mas ele ri.
— Você é muito engraçada. Quem acreditaria nessa história?
Solto um longo suspiro e o ignoro.
— Ligue para o seu chefe e fale com ele — peço. — Por favor, isso é
muito importante.
Ele suspira e pega o telefone. Abro um sorriso agradecido. Alex
atrapalhou meus planos, preciso então reverter a situação. Sinto o sangue
correndo rápido nas veias. A sensação de que posso fazê-lo de bobo me causa
euforia. É infantil, eu sei, mas não aceito ser feita de tola. Primeiro, ele
simula um sequestro e, depois, me rejeita! Sei que ele vai ficar uma fera, e eu
vou adorar.
— Alexander, sei que você disse que era para levar a Lana direto para a
mansão, mas estou indo na casa de...
Ele continua explicando enquanto eu aguardo, com uma expressão
inocente, torcendo para que o plano dê certo. Se não, terei que repensar uma
forma de fazer o meu segurança lindo e gostoso de bobo. Ele vai ficar irado
quando souber das minhas peripécias do dia.
— Certo! Vou ficar de olho. Eu sei e não vou fazer isso. — Ele ouve e
me encara. Abro outro sorriso meigo. — Ela vai se comportar, tenho certeza.
— Faço um joinha para confirmar. — Vou fazer isso. Pode deixar.
— E aí? Estou liberada? Acho engraçado que, apesar de esse ser um
país livre, eu vivo em cárcere privado, você sabe — digo.
— Você é muito dramática, mas sim, pode ir para a casa da sua amiga,
mas vou ficar lá com você.
— Que chato!
— Poderia ser pior — ele responde, e eu acredito.
Pouco tempo depois, chegamos ao prédio da Karine. Bruno, assim
como havia dito, entra comigo e verifica tudo. Argh! Essa história é patética.
Quem iria querer me raptar? Só se estivesse desesperado, penso enquanto o
vejo vasculhar os arredores.
— Onde você vai ficar? Espero que não seja dentro do apartamento —
digo.
Ele semicerra os olhos para mim.
— Vou esperar lá fora, Lana. Estou acostumado com coisas piores —
ele retruca, e sinto um pouco de remorso por enganá-lo, mas tento não pensar
nisso.
Quando Bruno sai, Karine se volta para mim com um sorriso. Ela é
uma morena espetacular, cujo corpo foi todo turbinado em uma clínica de
estética. Seus cabelos são negros, e ela dá duas de mim; é alta, uma
verdadeira amazona moderna.
— Vamos nos divertir! — Ela me puxa para o quarto e tentamos
encontrar uma roupa para mim, mas não conseguimos por causa da diferença
de altura. Revolvemos ir às compras antes de irmos para a boate. Sinto pena
de Bruno quando saímos pelo elevador de serviços, mas tento não pensar
nisso. Vamos direto para a garagem e entramos no carro de Karine. Bom, até
que fugir não foi tão difícil.
Saímos, paramos no shopping e compramos um vestidinho branco e
curto para mim. Depois, fomos comer e colocar a fofoca em dia. Bem mais
tarde, seguimos para a casa noturna onde encontro com Jules e alguns
amigos. Mal entramos, e Karine foi se agarrar com o namorado. Eu me
acomodo em uma mesa e sinto um estranho frio no estômago. Depois de todo
esse trabalho, me sinto mal por essa aventura desnecessária. E se ele não vier
atrás de mim? Isso não vai ter graça nenhuma. Tenho vontade de ligar para
Alex, mas não tenho o número. Que merda!
— O que foi, Lana? — Jules pergunta e se senta do meu lado, passando
um braço ao redor dos meus ombros. — Quer beber o quê? — ele grita no
meu ouvido para cobrir o som alto da música.
— Nada!
— Você fez tudo isso para chegar aqui e ficar assim? — Ele balança a
cabeça — Cara, você é estranha! Está só querendo chamar a atenção do cara?
Está a fim dele?
— Claro que não... ah... tudo bem! Sim, estou a fim dele — suspiro. —
Mas ele acha que sou uma garota infantil e inconsequente.
— Ele tem razão. — Ele ri. — Você é deliciosamente inconsequente.
— Que belo amigo você é, Jules. — Dou um tapa no braço dele e uma
risadinha feliz pela parte do deliciosa.
— Amigo de verdade conhece os seus defeitos e, mesmo assim, te ama.
— Também amo você. — Dou um sorriso forçado, e ele insiste em
tomarmos algo. Peço uma bebida leve, já que não sou de beber muito e quero
me manter sóbria.
Pouco mais de uma hora se passa. Jules e eu estamos na pista de dança.
Ouço tocar a música Cuidar Nuestro Amor, de David Bisbal. Imediatamente,
penso em Alex. Sei que é cedo demais para ser amor o que sinto por ele...
mas, lá no fundo, tenho certeza de que o desejo desenfreado pode se tornar
algo ainda mais poderoso... Solto um longo suspiro, me sentindo perdida.
— Jules, quero ir embora — falo, desconsolada. — O meu plano não
deu certo. Acho que o Bruno não percebeu que fugimos. Vou avisar a Karine
que estou indo.
— Acho que você está enganada. Seu plano deu certíssimo. A cavalaria
acabou de chegar — Jules sussurra no meu ouvido.
Eu me viro e vejo a fúria que irradia dele. Prendo a respiração enquanto
observo Alex caminhar, parecendo Moisés abrindo o mar vermelho por entre
a multidão na escuridão. Ele para bem na minha frente, e seus olhos estão
sombrios. Ele não fala nada. Apenas olha para Jules e desliza os olhos em
direção aos braços que rodeiam a minha cintura. Meu amigo me solta
imediatamente, e Alex segura o meu braço e me leva para fora do clube.
— Eiii! Está me machucando — grito, fingindo indignação, mas é o
mesmo que gritar com uma parede.
Saímos para o ar frio da noite, e sou empurrada para o carro. Seu
silêncio é pior do que se ele estivesse gritando. Imagino que deva estar
furioso comigo. Abro um sorrisinho. Parece que consegui o que queria! Ele
dá a partida no carro e sai, dirigindo feito um louco pelas ruas. Não sei aonde
estamos indo, mas pouco me importo.
CAPÍTULO 7
Lana
Sinto a raiva exalar de Alexander por todo o trajeto. Ele não fala
nada, e a tensão no carro vai aumentando à medida que avançamos. Percebo

que ele não está me levando para casa. Em determinado momento, ele para o

carro e percebo que estamos no mesmo lugar de ontem. Ele sai, batendo a

porta, e dá a volta para abrir a outra para mim. Estou com um mau

pressentimento de que nada será como planejei. Sinto o calor intenso dos seus

dedos fortes pressionados em meu pulso quando ele me segura e me leva em

direção a casa.
— Não sou um saco de batatas, caso não tenha percebido, Alexander
— digo, mal-humorada.
— Você é a porra do que eu quiser que seja — ele grunhe e abre a
porta, batendo com um baque pesado depois que entramos.
Estremeço com o barulho. Ele está louco!
— Fui muito compreensivo com você, Lana. Te dei a droga de uma
chance, imaginando que você tinha aprendido alguma coisa ontem, porra! —
Ele grita comigo. — Você é mimada e voluntariosa, e vou te ensinar que
você precisa amadurecer e lidar com as consequências dos seus atos!
Merda!! Ele caminha para o sofá, me levando com ele.
— O que pensa que está fazendo, Alex? — questiono, com meus
instintos em alerta máximo quando ele me puxa para seu colo e me coloca de
bruços. Ele segura com firmeza. Tento me levantar, mas ele me mantém
cativa em seus braços.
— Você vai aprender a merda das boas maneiras, Lana! — ele
esbraveja, e eu solto um grito, surpresa com sua atitude de homem das
cavernas.
Sua mão direita desliza pelo meu corpo enquanto a outra me mantém
firme. O clima tenso se torna elétrico quando a ponta dos seus dedos toca a
minha pele macia. Meu corpo inteiro se arrepia, e eu me contorço contra ele,
assustada com a expectativa do que está por vir.
— Me solta! — grito, sentindo a fúria me tomar. Nossas respirações
estão pesadas, e o som das minhas palavras parece ter o poder de despertar
ainda mais a ferocidade dentro dele. Sua mão forte desliza sobre a minha
bunda, erguendo a barra do vestido. A pele áspera desliza sobre a minha, e
ele a aperta com firmeza, seu toque despertando um desejo que eu não
esperava sentir numa situação como aquela.
— Você precisa aprender a obedecer às regras, Lana. — Seu tom de
voz é rouco e grave, e não consigo dizer se ele está com raiva ou excitado...
pelo toque sensual em meu corpo, talvez um pouco dos dois. — E sou eu
quem vou te ensinar.
Ainda me segurando com uma das mãos, ele afasta a outra do meu
traseiro até que sinto a força do primeiro tapa.
— Seu louco filho da mãe! — eu grito, mas o golpe desperta
sentimentos mistos em mim. Ao mesmo tempo que estou indignada, me sinto
estranhamente excitada enquanto ele acaricia com a palma da mão o lugar
onde me atingiu. Confusa, tento me contorcer, mas meu gesto é em vão. Ele
me mantém no lugar com firmeza. — Eu te odeio, Alex!
— Não me importo, garota estúpida! — A mão que acaricia se ergue
novamente e, antes que eu tenha chance de me preparar, sinto outro tapa. —
Quer jogar duro comigo, Lana? — ele pergunta, a voz ainda mais grave. —
Vamos ver se você aguenta o meu jogo!
Ele volta a acariciar minha bunda, que arde e está quente. Sinto as
lágrimas se formarem em meus olhos, mas pisco para contê-las. Não vou dar
a ele o gosto de me ver chorar. A indignação está tão presente quanto a
excitação, e eu me questiono como ele pode fazer isso comigo. Não sou a
droga de uma menina de cinco anos.
— Pare! — minha voz sai em um gemido trêmulo. Sinto seus dedos me
tocarem contra o tecido fino da calcinha, e eu luto contra a excitação, me
repreendendo mentalmente: isso não é nada sexy, Lana! Ser tratada feito uma
criança por esse brutamontes idiota é humilhante, falo comigo mesma,
tentando me convencer de que não estou gostando.
— Peça desculpas pela palhaçada de hoje — ele ordena. — Não vou
mais tolerar seus truques.
A mão que me mantém firme contra ele desliza pelas minhas costas até
alcançar minha nuca. Ele entrelaça os dedos em meus cabelos, puxando a
minha cabeça de forma que eu consiga ver seu rosto. Tenho certeza de que
ele consegue enxergar a raiva... mas também o desejo em meu olhar. Quando
nossos olhos se encontram, minha respiração falha, e eu tremo de forma
incontrolável. Nos encaramos, medindo forças. Ele aguarda meu pedido de
desculpas, mas não vou dar essa vitória a ele.
— Você é um grosso! — digo, furiosa. — Vai me pagar por isso,
Alexander. Seu trabalho como segurança inclui me agredir?
O peito dele sobe e desce com voracidade. Os olhos estão semicerrados
e a boca se entreabre enquanto ele desliza o olhar sobre o meu corpo seminu
contra o dele.
— Mais uma vez, você colocou a merda da sua vida em risco, Lana! E
ainda acha que não fez nada? Ignora as minhas orientações como se não se
importasse com nada! — Sinto a outra mão apertar minha bunda com
firmeza, me fazendo ofegar.
Estou excitada e perdendo o controle de mim mesma. Quando vejo o
brilho nos seus olhos verdes, tento conter o desejo e protesto novamente.
— Pare, Alex! — Minha voz sai quase um grunhido e não com a
gravidade que eu esperava. Ele percebe que estou sucumbindo ao desejo e dá
outro tapa.
As lágrimas que tanto lutei para conter começam a cair, silenciosas.
Nossos olhares se cruzam, e eu não falo nada, lutando internamente comigo
mesma. O que será que está acontecendo? Devo ser uma devassa. Em vez de
estar lutando para me soltar, estou excitada por estar levando tapas na bunda
como um bebê malcriado.
Então, de forma inesperada, me vi sendo puxada na sua direção e seus
lábios tomando os meus com paixão. O beijo é repleto de desejo, mas
também de raiva. Eu retribuo e ouço seu grunhido, sem saber se essa é uma
resposta vinda do tesão ou da ira. Mas não me importo. Ele me ergue e me
senta em seu colo, nossos peitos colados um contra o outro. Suas mãos
deslizam pela minha cintura e, ao alcançarem o meu quadril, ele puxa o
vestido para cima; ergo os braços para ajudar. Alex o joga para o chão. Fico
só de calcinha em seu colo, e nos encaramos, nossos olhares são um misto de
paixão e ódio, nossas respirações estão descompassadas. Não imaginava que
chegaríamos às vias de fato, mas ele me surpreende por não resistir à atração.
— Levante — ele ordena, e eu saio do seu colo, ficando de pé na sua
frente. — Tire a calcinha. Não era isso que você queria? — ele pergunta e
arqueia a sobrancelha, me olhando nos olhos.
Já me esqueci completamente que estava sendo punida feito uma
criança há poucos minutos. O ressentimento começa a se esvair com a força
do desejo cru que nos envolve. Tiro a calcinha e a jogo em seu rosto. Ele a
pega e a cheira calmamente, olhando em meus olhos. Isso é sexy! Que
safado! Seu olhar queima sobre mim enquanto ele o desliza pelo meu corpo,
de cima a baixo. Perco o fôlego com a intensidade dos olhos cor de jade.
Será que ele me deixou fugir para ter um motivo para me trazer aqui?
Como uma desculpa para quebrar as merdas das duas regras? Essa
possibilidade me deixa ainda mais excitada, e meu corpo arde em
expectativas.
Alex se levanta devagar. Tento abraçá-lo, mas ele se afasta.
— De joelhos no sofá, Lana.
Sua voz é rouca e desperta um arrepio que começa na base da minha
coluna e dispara por todo o corpo, que arde com tesão pelo homem gostoso
na minha frente. Seguro o encosto do sofá e fico de joelhos no assento. Eu o
sinto atrás de mim. De forma inesperada, ele dá um tapa forte na minha
bunda e segura meus glúteos enquanto solto um gemido com a luxúria que
corre solta. Já não estou mais assustada com os tapas. Ele se inclina sobre as
minhas costas e puxa meus cabelos para trás, expondo meu pescoço e o
rodeia com a outra mão.
— Gosta disso, pequena encrenqueira? É isso o que você quer de mim?
— Ele aperta meu pescoço suavemente, e quero esfregar meu corpo contra o
dele. Tento arquear contra ele, mas Alex aperta com mais firmeza.
— Claro que não, seu estúpido! — Nego o óbvio. Só um homem
inexperiente não notaria meus mamilos duros e arrepiados. — Você só fala,
brutamontes? Não fode? — provoco.
Ele me solta e recebo outro tapa de mão aberta enquanto ouço seu riso
gutural.
— Você não aprende, não é, espertinha? — ele grunhe e se afasta de
mim.
Olho para trás e o vejo tirar a roupa. Alex é grande, e sua massa sólida
de músculos é impressionante. Quero muito explorar aquele corpo por todos
os ângulos possíveis. Mas, nesse momento, só quero que ele me tome.
Em pouco tempo, seu pau deliciosamente duro está apontado para mim,
coberto por um preservativo. Não há qualquer romantismo. Esse momento é
de pura fome carnal. Ele volta a se inclinar atrás de mim, deslizando as mãos
pelas minhas costas, subindo pela lateral do meu corpo e segurando os seios
com as duas mãos enquanto aperta meus mamilos. Dor e prazer se misturam.
Rebolo minha bunda contra sua virilha, desejando mais. Quem disse que
quero romantismo? Eu o desejo com loucura. Seus dentes mordiscam o
lóbulo, e a sua respiração em meu ouvido me deixa trêmula. A ponta da sua
língua percorre toda a minha orelha, me arrepiando da cabeça aos pés. Ele
morde a minha nuca, e eu gemo descontrolada, arqueando de encontro ao seu
corpo. Me esfrego contra ele, impaciente e ardente. Eu o quero dentro de
mim!
— Tão ansiosa — ele murmura e se ergue, segurando meus quadris.
Acaricia suavemente minha bunda, e sinto sua boca quente deslizando sobre
os globos redondos, onde antes ele bateu com força. Mordisco os lábios
quando sinto suas mãos, lábios e língua pela minha pele. Enquanto dá
mordidinhas e lambidas de forma sensual, todo o meu corpo se arrepia, e uma
sensação deliciosa toma conta de mim. Estou molhada e excitada demais,
pronta para recebê-lo. Sua boca pecaminosa agora devora a minha boceta, me
fazendo gemer alto. Seu toque é rápido e, antes que eu espere, ele está entre
as minhas pernas, empurrando para dentro de mim em um movimento brutal.
Me penetrando com uma única estocada.
Porraaa!! Isso doeu.
— Ai, seu... — Ele se afasta e penetra até o fundo outra vez, tirando
literalmente o meu fôlego. — Ahhhh — gemo. Apesar do desconforto por ele
ser um homem tão grande, em todos os sentidos se comparado ao meu corpo
pequeno, é tão gostoso... parece que o tenho inteiro dentro de mim.
Alex não é nada gentil, ele me penetra intensamente enquanto eu
seguro o encosto do sofá com firmeza.
— Vai me matar, seu bruto — reclamo, mas minha voz sai ofegante. E,
apesar do protesto, eu adoro a sua pegada.
A luxúria me consome, estou tonta de prazer com a sensação de
preenchimento que Alex me proporciona. Ele entrelaça os dedos em meu
cabelo novamente, segurando-o com firmeza enquanto espalma a outra mão
nas minhas costas, passando a me comer com força, entrando e saindo de
dentro de mim. Me sinto enlouquecida de tesão e acompanho seus
movimentos de vai e vem. Nos tornamos irracionais. Descontrolados.
Extasiados. Até que grito, gozando violentamente e perco o controle de vez,
me dando conta de que, na verdade, não há qualquer controle no que se refere
aos sentimentos que Alexander me desperta.
Ele explode em um orgasmo avassalador, e o sinto estremecer atrás de
mim. Ouço seu rosnado quando perde o próprio controle e goza dentro de
mim. Caímos no sofá, emaranhados e suados. A letargia envolve meu corpo
quando me deito em seu peito duro e sinto seus braços me envolvendo e sua
mão deslizando sobre meus cabelos revoltos...
Alexander
Lana adormece. Eu a carrego para o quarto e a coloco sobre a cama.
Não sei que merda é essa que estou fazendo. Trazê-la até aqui e transar com
ela foi loucura. Já tive a minha cota de relacionamentos difíceis. Não suporto
complicação, por isso terminei com Adriane. Lana Mitchell é um problema
três vezes maior. Não quero que a minha vida seja virada de cabeça para
baixo por uma louca novamente, não mesmo!
Mas essa atração irresistível por ela me tira dos eixos.
Ela se aconchega a cama enquanto eu observo seu corpo pequeno e
curvilíneo. A porcaria do tesão volta com força total, mas me esforço para
ignorá-lo. Eu a cubro e vou para o chuveiro. Uma ducha fria vai acalmar a
droga da ereção. Porra de pau com vontade própria!
Hoje mandei que Bruno ficasse de olho nela que, mais uma vez, provou
ser mais esperta que nós. Eu não estava levando a sério as travessuras dessa
garota, por isso ela consegue essas façanhas. Não pude ficar com ela como
prometi, pois fui me reunir com a polícia para tentar desvendar os bilhetes
que Mitchell tem recebido. Foram horas de conversas. Quando Bruno me
ligou avisando do tal trabalho da faculdade, achei estranho. Até pensei que
era mais um truque dela, ou que Bruno a estava cantando, e como ela é
doidinha, podia estar cedendo aos avanços dele, mas ele me garantiu que não
era nada disso.
Ligo o chuveiro e fico debaixo do jato frio. Preciso colocar a cabeça no
lugar. Fiquei cego de raiva quando Bruno me ligou outra vez, avisando de
mais uma fuga. Geralmente eu cuido da parte administrativa da empresa.
Muito raramente faço a segurança de alguém, mas, agora, Lana não vai sair
das minhas vistas.
Estou muito puto e me sinto decepcionado com ela. Pensei que havia
me escutado. Mas que nada! Tenho certeza de que ela faz de propósito.
Afinal, qual seria a razão para agir dessa maneira leviana? Não sou um cara
violento, mas ainda sinto vontade de apertar aquele pescoço só de pensar no
risco que ela se colocou. Tentei me acalmar durante o trajeto daquela porcaria
de clube noturno até a minha casa, mas perdi o controle. Estou fodido! Ela
pode me ferrar. Não confio nem um pouco nela. Desmiolada do jeito que é,
pode até ir à polícia e dizer que eu a agredi. Estou ficando burro depois de
velho.
Saio do banho, enrolo uma toalha ao redor da cintura e vou para o
quarto. Visto uma boxer e vou verificar o sistema de segurança. Precisei
mudar o código de acesso por causa da Adriane. Ela precisa entender que não
tem mais lugar na minha vida. Já permiti demais que ela se infiltrasse aqui.
Pego o telefone, ligo para a casa dos Mitchell e falo com Daniel, um
dos seguranças da noite. Quero saber se há novidades ou se recebemos mais
algum bilhete. Peço que ele assegure aos pais de Lana que ela está bem.
Como ela mentiu para a mãe dizendo estar na casa de uma amiga, quero que
eles continuem pensando isso. Cibelly é tão ingênua que ainda acredita na
filha.
Depois de desligar, continuo sentado na sala. Sinto vontade de tomar
uma bebida forte, mas fico olhando o teto sem saber o que fazer. Pouco
depois levanto, me sirvo um drinque e vou para o quarto. Eu deveria ir para o
quarto de hóspedes, mas quem disse que tenho bom-senso? Entro e tranco a
porta. Não quero ser passado para trás de novo, caso ela acorde antes de mim.
Apesar que ela não teria como sair, já que a casa não tem chave.
Tomo um gole da bebida enquanto me sento na cama. Coloco a chave
do quarto na gaveta do criado-mudo. Sem resistir, me abaixo e beijo sua boca
suavemente. Ela se mexe e vira para o outro lado. Eu abro um sorriso. Será
que Lana Mitchell acha mesmo que vai dormir a noite inteira?
CAPÍTULO 8
Lana
Abro os olhos. Estou em uma cama estranha e vazia. Levanto a
cabeça do travesseiro e olho ao redor, me deparando com a manhã

ensolarada. A noite anterior me vem à mente de forma nítida. Abro um

sorriso e enterro meu rosto de volta no travesseiro, inalando o cheiro másculo

do meu — ah! — Guarda-costas! A lembrança do momento em que ele me

acordou com beijos luxuriosos para uma segunda rodada de sexo puramente

primitivo é gloriosa. Adoro como ele me segura. Parece ter fome quando me

beija com intensidade. Ah, merda! Estou excitada de novo e ele nem está

aqui. Preciso encontrá-lo. Me levanto e vou ao banheiro, preciso de um banho

urgente. Saio minutos depois, mas não encontro nada para vestir. Por mim,

tudo bem. Enrolo a toalha no corpo e sigo pela casa a procura de Alex.

Ouço vozes masculinas e sigo para a cozinha. Estaco na porta porque


vejo Bruno, que está verificando um mapa na mesa da cozinha com Alex.
Eles percebem a minha presença e me encaram, cada um com expressão
diversas. Bruno abre um sorriso tanto de charme quanto de malícia, e me
observa em questão de segundos. Já Alexander me olha com o cenho franzido
e sai de onde está, me levando para fora da cozinha.
— Você sente tesão em me arrastar de um lado para outro, Alex? —
pergunto porque, convenhamos, é o que ele faz o tempo todo.
— Por que não veste uma roupa, Lana? — questiona, ignorando a
minha observação. — Precisa sair nua por aí?
— Não estou nua. A toalha está me cobrindo — respondo. — Além
disso, não tenho roupas aqui, e nem sabia que você estava com visita. Aliás,
você deveria estar na cama comigo.
Ele me solta e vai até o armário. Em seguida, me joga uma camisa
enorme e uma boxer.
Depois, sai sem dizer uma palavra. Homem estranho, grosso e estúpido.
Nem me deu beijinho de bom dia! Verifico as horas enquanto me visto. São
quase nove da manhã. Ainda bem que não tenho nada de importante para
fazer hoje. Quero ficar o dia inteiro aqui. Visto a camisa que bate nos meus
joelhos de tão grande e jogo a boxer na cama. Afinal, quem precisa disso?
Não eu.
Volto para a cozinha e os homens continuam lá.
— Bom dia, Bruno — cumprimento, já que não o fiz antes.
— Bom dia, Lana, dormiu bem? — Ele abre outro sorriso, que se
desfaz rapidamente com seu comentário. — Não estou muito satisfeito com
você. A sua fuga poderia me custar o emprego, se eu fosse um simples
empregado — ele fala sério. Merda!
— Me desculpe, isso não acontecerá mais — digo e vou pegar um café,
raramente tomo, mas hoje preciso dele.
— Não prometa algo que não vai cumprir — ele diz.
— Por falar nisso, como me encontraram? — pergunto, curiosa. Acho
incrível como eles sempre me encontram tão rápido.
— Se já acabaram a conversa, o Bruno tem trabalho a fazer. — A voz
de Alex soa aborrecida. Bruno se despede de mim e os dois saem, me
deixando sozinha na cozinha.
— Está quebrando as suas regras, Alexander? Coisa rara. — Ouço a
voz de Bruno. — Você não é nada bobo. Ela é uma herdeira linda!
Não ouço a resposta de Alex, mas o sorriso desaparece do meu rosto. O
que será que ele quis dizer com isso? Me sento à mesa e encaro o café. Alex
volta pouco depois, sozinho, e me encara sério.
— Vista suas roupas que vou te levar para casa — diz sem preâmbulos.
— Quero ficar aqui — replico. — Se você me levar para casa, posso
ficar entediada e decidir passear um pouco sem meus seguranças. — Claro
que não vou fazer isso, mas não custa nada tentar uma chantagenzinha, não
é?
— Fuja outra vez, Lana, e vou te dar uma surra de chicote — ele diz
bravo.
— Estou morrendo de medo. Me toque assim outra vez, Alexander
Marshall, e vai ficar sem as bolas. — Eu o encaro e continuo. — Eu mesma
as cortarei fora!
Ele ri da minha ameaça, cruza os braços e apoia o quadril na bancada,
enquanto me olha com deboche.
— É sério — falo. E é mesmo. Os acontecimentos de ontem me vem à
mente. Sei que eu incitei seu comportamento, mas gostaria que as coisas
entre nós fossem mais devagar. — Olha, Alexander, o que aconteceu ontem
não pode se repetir. — Ele me encara, surpreso.
— Não poderia concordar mais com você, Lana — ele diz.
— Estou me referindo àqueles tapas, Alexander — esclareço.
— Isso também. Aliás, nada do que aconteceu ontem deve se repetir.
Sua brincadeirinha infantil e tudo o mais.
— Não concordo!
— O que vai fazer hoje? — ele pergunta, ignorando a minha
observação. É claro que quer mudar de assunto.
— Vou ficar aqui com você. — Abro um sorriso malicioso. — Quer
coisa melhor que isso?
— Não tem que estudar, garotinha? — Odeio quando ele fala assim.
Fico com a sensação de que ele me acha mesmo uma criança.
— Alguém já disse que você é a pessoa mais irritante que existe?
Ignoro sua gracinha, pois tenho algo a esclarecer. Não sou o tipo de
pessoa que guarda as coisas e fica remoendo sem saber o que pensar sobre o
assunto. Minha expressão fica séria quando pergunto.
— O que o Bruno quis dizer com aquela pergunta, Alexander?
— Que pergunta?
— Não se faça de bobo. O que ele quis dizer quando falou que você
não era bobo por ficar comigo? — Olho firme para ele, que aperta o maxilar e
não desvia o olhar do meu.
— O Bruno fala muitas bobagens sem sentido, Lana. Não dê ouvidos a
isso — diz. — Mas não quero que aquilo que aconteceu ontem faça você
imaginar coisas.
— Imaginar coisas? Que coisas? — Não gosto do rumo dessa conversa.
Ele suspira e se aproxima, puxando uma cadeira. Ao se sentar, ele
segura minha mão na sua.
— Não sei o que quer de mim, Lana. — Ele olha nossas mãos juntas e
acaricia a palma da minha com o polegar —, só não pense que vamos ter
qualquer envolvimento entre nós. Isso é inconcebível.
Em outras palavras, só sirvo para ele se divertir por uma noite? Ele
acha que não tenho sentimentos? Afasto a mão da dele e seguro a caneca de
café na minha frente.
— Você se acha melhor do que eu, Alexander? Que não sirvo para
você?
— Talvez seja o contrário — murmura. — Quer comer algo antes que
eu a leve para casa? — ele muda de assunto outra vez. Tenho a sensação de
que ele está fugindo do assunto, como se isso não tivesse importância. Se é
assim que vai ser...
— Tenho que ir mesmo?
— Sim. Tenho trabalho a fazer na sua casa. Você sabe que o seu pai vai
dar um jantar em casa, hoje?
Não sabia disso, mas também não converso com ninguém da minha
casa há dias.
— Não sabia. — Levanto os olhos para ele. — Essa coisa de segurança
não está meio inversa? Era para você estar a minha disposição, não eu a sua.
Ele abre um sorriso e balança a cabeça. Fico embasbacada com a beleza
masculina. Merda! Estou me apaixonando rápido demais por esse homem.
Isso não é nada bom.
Como posso me apaixonar por alguém que não me leva a sério?!
Caramba, isso não vai terminar bem! Não sou o tipo de garota insegura. Sei o
que todos pensam de mim. Que sou convencida demais. Posso até ser, mas
não permito que ninguém me trate feito capacho. Alexander ainda vai
aprender isso. Tenho muito que brincar com ele. E isso não tem nada a ver
com amor. Assim eu espero.
— Certo, então pode me levar para casa, Alexander. — Me levanto e
vou à procura do meu vestido. Não sei onde ele está, nem o meu celular
desde ontem à noite. — Onde está a minha roupa, Alex? — pergunto depois
de verificar na sala e não achar.
— Secando na máquina, vou pegar para você — ele responde, vindo da
cozinha. Pouco depois ele volta com o que sobrou do vestido.
— Acho que não deu muito certo na máquina. — Tenho que rir da sua
cara quando olho para o pano todo retorcido.
— Claro que não, Alexander, isso não se lava na máquina. — Pego a
peça da mão dele e tiro a camisa, ficando nua ali mesmo, e me visto em
seguida. — Pronto!
Ele ainda está parado na minha frente.
— O que foi?!
— Você faz essas coisas de propósito? Você é uma diaba, Lana
Mitchell!
— Do que estou sendo acusada agora?
Eu o encaro com inocência. Trocamos olhares e é inegável que a
atração continua firme e forte, agora mais do que nunca. Ele pode negar o
quanto quiser, mas enquanto estiver enviando sinais contraditórios para mim,
não vou ter dó dele. Não mesmo.
Atravesso a sala e me aproximo de tal forma que meus seios ficam
pressionados contra ele. Deslizo as mãos por seus bíceps e mordisco meus
lábios, o encarando. Odeio ser baixinha porque, mesmo ficando na ponta dos
pés, não alcanço nem o seu queixo, mas não desisto. Vamos colocar o
treinamento de pole dance em ação. Bendita aula! Claro que nem se compara
um poste de pole dance com o meu guarda-costas enorme. No entanto, ele
não esperou minha escalada. Enlaçou a minha cintura me atraindo para ele
com força. Ah, meu Deus! Em segundos minhas pernas rodeiam o corpo de
Alex, que me encosta na parede segurando meus dois braços para cima. Estou
pressionada contra ele e sua ereção muito dura encaixa em minha vulva. Seus
lábios cobrem os meus, sua língua procura a minha e não deixo de retribuir o
beijo. Não o faria nem que estivesse sob ameaça de morte. Seu calor me
envolve e eu gemo descontrolada. Isso é tão bom... ele segura meus braços
com uma mão e a outra desce para minha bunda, sem calcinha. Comemoro a
minha ideia de ter desprezado sua boxer mais cedo.
Mas ele se mostra um estraga-prazeres. Apesar de me ter em suas
mãos, ele para tudo e me coloca de pé, se afastando em seguida.
— É melhor eu te levar para casa.
O quê? Ele é doido? Como assim? Agora estou pegando fogo! Minha
respiração está entrecortada e meu coração bate tão rápido que pareço estar
enfartando.
— Você tem sangue nas suas veias, Alexander? — pergunto, ofegante,
e me escoro na parede. Cara, estou excitada demais!
Ele me olha e vejo que também foi afetado. Prova disso é o volume em
sua calça. Parece que ele não faria nada para resolver isso e eu resolvo
provocar.
— Você é gay, Alex? — pergunto meiga. Minha voz é suave e sinto
vontade de rir. Ele revira os olhos e segue para o quarto. Nada! Esse
autocontrole é irritante.
— Nem vou responder a isso. Deixe de ser criança — ele responde. —
Mexa-se garotinha, temos que ir.
— Não seja estraga-prazeres, Alex. Seja mais homem.
Ah, merda! Ele está chegando à porta do quarto quando termino de
falar, dá meia volta e não tem uma expressão legal. Abro um sorriso e espero,
mas ele está me encarando com uma expressão perigosa.
— Você é impossível, Lana! — Ele deve ter percebido que eu queria
provocar, e desiste, voltando para o quarto.
— Alex?! — chamo e nada. Silêncio. Ele é sério demais. Acho que vou
dar o livro Não Leve a Vida Tão a Sério, do Hugh Prather, de presente.
Assim ele pode aprender umas técnicas para ser mais divertido.
— Vamos! Pegue as suas coisas, não tenho o dia todo. — Ele vem do
quarto e o vejo guardar a arma no coldre debaixo do terno que está usando.
— Para que você precisa de uma arma, Alex? — Me sinto nervosa
perto delas.
— Para que um segurança precisa de arma? — Ele aponta para mim —
Termine de se vestir, temos que ir.
Na SUV, a caminho de casa, Alex explica que meu pai organizou um
jantar com alguns parceiros de negócios. Enquanto ele fala, percebo o pouco
que sei sobre a minha própria família.
Fico calada durante quase todo o percurso, e isso não é muito comum
para mim.
— Alex — eu o chamo em certo momento. — Como ficam as coisas
entre nós? — Estou morrendo de curiosidade para saber o que ele pensa sobre
isso.
— Não ficam — diz simplesmente. Não acredito. Ele acha que sou
mulher de uma noite só?
— Você deve estar brincando comigo — reclamo. — Não sou o tipo de
mulher que você pode usar e descartar, Alex!
— Não é a imagem que você passa, Lana — ele responde mal-
humorado. — Quer que eu te peça em casamento?
— Morreria de tédio casada com você! — brado. Ele cai na gargalhada.
Nossa! Seu riso é tão lindo, penso comigo mesma.... se concentre, Lana!
— Lana, o que vou fazer com você? — Ele olha rapidamente para mim
e volta a olhar para frente. A mão solta o câmbio e segura a minha nuca, me
puxando para perto. Quando paramos no sinal logo à frente, ele se vira para
mim. Seus olhos claros me deixam nervosa, parecem olhar minha alma.
Ofego quando Alex esmaga minha boca com a sua e, naqueles poucos
segundos, me vejo querendo mais e mais dele. — Sabe que isso não vai dar
em nada, Lana — ele diz quando nos separamos.
— Por que não? Você acabou de me beijar!
— Pra mim, parece óbvio. Saí de um relacionamento ruim há poucos
meses e não quero começar outro — ele responde e a minha curiosidade é
atiçada. Será que foi com a ruiva? — Além disso, não acho correto nos
envolvermos.
— Se ainda não percebeu, já estamos envolvidos. Mas tudo bem, não
vou implorar suas migalhas, bonitão. — Olho para fora e o ignoro pelo resto
do caminho. Ele também não diz mais nada, em vez disso, liga o rádio. Just
give me a reason, da Pink, toca.
...
Right from the start
You were a thief, you stole my heart
And I your willing victim
I let you see the parts of me
That weren't all that pretty
And with every touch
You fixed them

Suas palavras ressoam na minha cabeça. Acho que fui fácil, o que faz
com que ele não se importe comigo. Por outro lado, eu o entendo... ter uma
relação comigo deve ser ruim, já que, para ele, sou sinônimo de problemas.
Ao chegamos na minha casa, saio do carro, bato a porta e não olho para
trás. Enquanto me afasto, ele me chama, mas finjo não ouvir. Babaca!
CAPÍTULO 9
Lana
Depois de ir para o meu quarto trocar o vestido de noite, atravesso
a casa, a procura da minha mãe. Ela está na biblioteca, onde costuma passar

boa parte do seu dia. Ela ergue os olhos do livro ao me ver e eu me aproximo,

indo me acomodar perto dela. Sei que precisamos conversar, mas não sei o

que dizer, já que não acredito que ela entenderia as minhas escolhas.
Opto pela alternativa mais simples e a deixo falar...
*
A tarde passa devagar. Passo o resto do dia com Luca, meu irmão
caçula, na piscina. Me repreendo, pois deveria fazer isso mais vezes. A hora
do jantar se aproxima e, desde que cheguei, só encontrei com o Alex uma
vez. Ele agiu de forma estranha, mal me olhou, me fazendo questionar se
aquilo se devia ao que aconteceu entre nós na noite passada, Então, fiz o
mesmo. Ignorei.
Estava descendo as escadas, quando ouço os primeiros convidados
começaram a chegar. Alex estava na porta checando cada um. Isso é mesmo
necessário? Meu pai está neurótico com essa coisa de sequestro!
O jantar transcorre com tranquilidade, mas a minha vontade é estar bem
longe. É maçante ficar ouvindo esses homens falando de negócios, tendo que
interagir com as esposas, umas peruas emperiquitadas. Para minha surpresa, o
pai do Jules está entre os convidados. Não fazia ideia de que eles tinham
negócios juntos. Mas isso pouco importa isso para mim. Olho ao redor, mas
não acho quem procuro. Onde será que ele está? Tenho que dar um jeito de
ficar a sós com Alex. Rio comigo mesma. Será que ele pensa que se livrou de
mim?
Quase no fim do jantar, peço licença e saio da mesa. Tenho um
segurança para caçar.
Amanhã tenho que ir para a ONG. Sei que vai ser divertido lá e tenho
que estar presente. Preciso convencê-lo a me levar.
Alexander
Por entre as sombras, observo os convidados de Mitchell. Qualquer um
pode ser aquele que envia os bilhetes e o mentor do sequestro. Muitos
homens de negócios podem ser implacáveis com seus rivais. Não descarto
ninguém, mas um, em particular, chama a minha atenção. Talvez seja pelo
fato de ele ser muito jovem comparado aos demais, ou, quem sabe, por estar
olhando muito para a Lana, ainda que com discrição. Ele não havia tentado
falar com ela, mas sempre que olho em sua direção, seus olhos estão focados
nela. Isso é irritante.
Não sou hipócrita. Sei que Lana é linda e isso chama atenção. Chequei
a lista de convidados várias vezes e não encontrei nada de suspeito, mas
precaução nunca é demais. Ao vê-lo desviar novamente o olhar para ela, sinto
vontade de arrancar os olhos dele. Solto um longo suspiro, ao me imaginar
como um animal marcando território. E, o pior de tudo, é que não quero que a
noite passada se repita. Que se foda, quero sim, mas sei que isso não vai dar
certo. O pai dela me paga para mantê-la segura não para trepar com ela. Nem
um santo poderia deixar de reparar na garota, ainda mais quando ela
demonstra tanto interesse.
Meu celular toca e vejo que é Adriane. Estou perdendo a paciência com
ela. Imagino que ela esteja na porta da minha casa, tentando entrar de novo.
Ignoro a chamada e guardo o telefone.
Sorrio ao observar Lana se contorcer impaciente na mesa. O que essa
garota tem na cabeça? Provavelmente nada. De repente, ela se levanta, olha
ao redor, mas não me vê. Observo quando ela se aproxima de um dos
seguranças, que aponta na minha direção.
Ela está me procurando? Merda! Aqui não, Lana! Tento me afastar sem
que ela me veja, mas a diaba já vem na minha direção.
Permaneço sério quando ela se aproxima.
— Oi, bonitão!
— O que deseja, Lana? — resmungo.
— Não você — responde e empina o queixo. — Preciso conversar.
— Estou ouvindo, garotinha.
Na mesa do jantar...

Mal consigo acreditar que estou dentro da casa de Mitchell. Nem sua
equipe de seguranças conseguiu me detectar. Jamais irão suspeitar de mim,
o que é perfeito. O jantar foi um arranjo de última hora. Vários empresários
foram convidados para uma conversa sobre uma possível parceria e eu
aproveitei. Vim para observar a rotina da casa. Agora, só preciso aguardar
o momento propício e atacar.
Deveria ter imaginado que o empresário teria um batalhão de homens
fazendo a segurança. Meu alvo principal acaba de sair da sala com um
deles. Não tive oportunidade de me aproximar. Merda! Talvez eu deva
repensar minha escolha... quem sabe a esposa seja uma opção melhor?
Mas não hoje. Por enquanto, vou apenas observar a movimentação.
Tentar algo seria muita burrice...
CAPÍTULO 10
Lana
— Estou ouvindo, garotinha — Alexander repete impaciente.
— Podemos ir para outro lugar? — Olho ao redor. Tento seguir para a
biblioteca, onde teríamos privacidade, mas sou impedida pela mão de Alex
no meu braço.
— Lana, se não percebeu, estou trabalhando. — Seu tom é baixo e
firme. — Não tenho tempo para suas... — ele faz uma pausa. Sua expressão
demonstra pouco caso para o que preciso falar. —... conversas.
Cara, estou tentando fazer a coisa certa e ele acha que é brincadeira?
Que eu quero chamar a atenção? Se eu resolver sair sozinha amanhã, ele não
vai gostar.
— Estou tentando falar com você. — Cruzo os braços e fecho a cara
para ele. — Dá para me ouvir? Tenho que sair amanhã.
— Ninguém está te impedindo de sair, Lana. É só avisar — ele replica.
— Mas é que estou fazendo agora. E você não está dando importância.
— O aborrecimento me toma com o fato de estar sendo tratada como uma
imbecil. A raiva começa a bater de frente com a vontade de fazer a coisa
certa. — Será que sempre que eu tiver que fazer algo vou ter que fazer
estripulias para ser levada a sério? Isso magoa.
— Você é a culpada de tudo isso, Lana. Se leve a sério, e as pessoas
vão te respeitar. Até lá, aguente as consequências da sua infantilidade.
Sinto meus olhos arderem e a garganta se fechar de raiva e decepção.
Dou meia volta e o deixo lá. Ouço Alex chamar meu nome, mas não olho
para ver se ele me segue ou não. Vou para o quarto e me tranco. Odeio essa
atração que sinto por ele. Eu deveria saber que nada ia mudar.
Assim como meus pais, sinto que Alex quer que eu aja de acordo com
suas regras. Pensar em meus pais me remete a conversa que tive com a minha
mãe. Pelo que ela falou, não era só a minha vida profissional que eles querem
manipular. Ela insinuou que o meu pai está pensando em me apresentar ao
filho de um parceiro de negócio. Será que ele acha que eu concordaria com
isso? Voltamos a idade média, onde os pais escolhiam os maridos das filhas?
Ele pode mudar de ideia, porque nunca vou aceitar isso.
Me deito na cama e pego o controle remoto do aparelho de som.
Preciso dançar. Estou há tanto tempo sem fazer o que realmente gosto... mas
decido ficar na cama ouvindo Demi Lovato. Parece que a música foi feita
para mim.
...
Never put my love out on the line
Never said "Yes" to the right guy
Never had trouble getting what I want
But when it comes to you, I’m never good enough
...
A música fala sobre manipular as pessoas, mas, a verdade é que Alex é
o único que não manipulo de alguma forma.
Não aguento ficar muito tempo deitada. Estou com raiva e inquieta.
Preciso fazer alguma coisa. Não quero nenhum segurança perto de mim,
principalmente a droga do meu algoz. Saio para a sacada do quarto.
Ultimamente, sempre tem um segurança debaixo da minha varanda. Deve ser
coisa do Alex “doente por controle” Marshall. Aliás, ele parece querer me
controlar o tempo todo. Saco!
Olho por trás da cortina e não vejo ninguém. Volto para o quarto, visto
uma legging e prendo o cabelo em um rabo de cavalo. Em seguida, envio
uma mensagem para Jules e outra para Karine, enquanto volto para a sacada.
Na lateral, uma escada conduz em direção a piscina e o jardim. Desço os
degraus devagar. Não vejo ninguém para me impedir. Desde ontem, nenhum
dos meus amigos se preocupou se algo havia acontecido comigo depois que
Alex me tirou da casa noturna. Amigos da onça!
Caminho rápido para a casa da piscina. Lá vou poder colocar uma
música alta e extravasar meu mau-humor...
O celular vibra e vejo a mensagem de Karine, dizendo que fala comigo
depois, mas não respondo.
Entro e acendo uma luz difusa na parede. Abro uma janela para o ar da
noite entrar, e conecto o celular no sistema de som. Escolho Domino, da
Jessie J e respiro fundo...
A música começa a tocar e começo a dançar. Isso me faz esquecer de
tudo... como não tem ninguém por perto, aproveito a calmaria para suar e
deixar de pensar em tantas besteiras e em um certo homem certinho demais.
Alexander
Tenho vontade de segui-la e colocar um pouco de juízo na sua cabeça.
Lana tem que entender que as coisas não têm que ser do jeito dela ou na hora
que ela determina. Ela está me distraindo do que tenho que fazer aqui, que é
cuidar do bem-estar da sua família — que paga pelo melhor serviço possível
— e, até agora, estou me envergonhando pelos serviços prestados.
Os convidados terminam de jantar e seguem para outro cômodo da
casa. Mantenho os olhos neles e continuo no canto quando — cerca de quinze
minutos depois — ouço a voz de Bruno na escuta. Ele está com Carl, na área
externa da casa.
— Coelho saindo da toca. — Ele dá uma risadinha característica dele, e
sei que o idiota está se divertindo com tudo isso. — Ela sempre tenta
escapulir de alguma forma.
Ele não precisa dizer que é está se referindo a Lana. Eu devia imaginar
que ela não se manteria quieta por muito tempo.
— Mantenha os olhos nela. E, Bruno, não a deixe sair da casa — exijo.
— Estou de olho, mas acho que ela não vai muito longe. Está se
dirigindo para a casa da piscina. — Eu confio em Bruno, mas sua cafajestice
com as mulheres me preocupa. Não me incomodo que ele se envolva com as
clientes, mas Lana estava fora de questão. Ele que nem pense nisso!
— Me mantenha informado dos seus movimentos, Bruno. — Não
demonstro estar chateado, mas sei que tenho que conversar com ele em
breve. Meu sócio é um cara esperto e profissional, mas quando o assunto é
mulher, nada o segura. Quando coloca na cabeça que vai ter alguém, ele vai
até o fim. Mas se ele acha que a Lana será a próxima, vai ter que mudar de
ideia.
— Ok! — ele confirma e eu espero que realmente esteja tudo certo até
que eu tome as rédeas da situação com Lana.
Parece que os convidados de Mitchell não irão embora tão cedo. Não
quero deixar o meu dever nas mãos dos outros. Não gosto da sensação que
estou sentindo e deixar que outras pessoas assumam a minha
responsabilidade está fora de cogitação. Meu celular continua tocando no
bolso e sei que é Adriane. Que porra de mulher insistente! A culpa é minha,
que não impus limite quando deveria. Tenho que resolver isso logo.
Um pouco mais tarde, os primeiros convidados começam a sair. Não
vejo a hora de todo mundo sair para que eu possa ir embora também. Lana
me vem à cabeça e eu chamo Bruno, para saber onde ela está, mas ele não
responde. Onde será que ele se meteu?
Chamo Carl, que responde imediatamente.
— Diz aí, Alex!
— Onde você está?
— Ala leste, indo para a frente da casa — ele responde. — Algum
problema?
Merda, a casa da piscina fica do outro lado.
— Você esteve com o Bruno?
— Há uns dez minutos. Vou tentar falar com ele. Está acontecendo
alguma coisa?
— Tentei falar com ele, mas não tive resposta. Veja se está tudo bem.
Sigo para o lado de fora e vejo os convidados começarem a entrar nos
carros estacionados.
— Em dez minutos todos estarão a caminho de suas casas.
— Entendido.
Não tenho retorno de Carl, mesmo após os dez minutos. Minha
impaciência e preocupação estão incontroláveis e sigo na direção da ala oeste
da casa. Peço para que um dos seguranças avise a Mitchell que preciso falar
com ele antes de ir embora.
Encontro Bruno e Carl discutindo em voz baixo perto da casa, e paro ao
lado deles.
— As mocinhas já terminaram? Onde está a Lana, Bruno? Não era para
você me manter informado? — grunho as perguntas.
— Ainda está na casa — ele aponta e Carl resmunga.
— Qual o problema com vocês dois?
— Nada demais, Alex. — Bruno sorri e olho para Carl, que mantém o
cenho franzido.
— Carl...
— Nada, Alex. Nós dois temos opiniões diferentes sobre uma coisa.
Deixo os dois sem falar nada e caminho para a casa. Entro e fico
paralisado. Lana está tão absorvida na música que não me ouve entrar. Fecho
a porta e me inclino contra ela, assistindo.
Lana é linda e tão sensual...
Me distraio com a sensualidade da minha pequena encrenqueira. Sinto
meu corpo esquentar, a vontade de esquecer o trabalho aumenta e tudo que
quero é agarrá-la e trepar com ela na merda daquele chão enlouquecidamente.
Respiro com dificuldade quando ela empina a bunda para minha visão
completa. Safada! Já deve saber que estou aqui e me provoca de forma
descarada.
Foco, Alex!
Olho ao redor e vejo a janela aberta. Então, algo me vem à cabeça.
Bruno não estava fazendo nada idiota, não é? Penso na discussão dele
com Carl, quando cheguei. Filho da puta! Vou arrancar suas bolas... a raiva
me toma. Idiota filho da mãe! Espero que ele mantenha as mãos e olhos para
si mesmo. Com certeza ele esteve assistindo o showzinho de dança.
Lana
Percebo a presença de Alex na porta e continuo a rebolar ao som da
música Sweet Dreams, da Beyoncé. Fecho os olhos e finjo que não o notei me
observar. Mas nem chego ao final. Paro, porque não aguento a força do seu
olhar sobre mim.
Que bela dançarina sedutora você é, Lana Mitchell, falo para mim
mesma.
— O que você quer? — pergunto me aproximando do aparelho de som
e desligo a música. — Não tenho nem mais o direito de ficar sozinha?
— Pode continuar. Não pare por minha causa. — Olho para ele na
penumbra e observo seus olhos verdes cintilantes. — Mas, antes, havia mais
alguém aqui com você?
— Mais alguém? Quem? O seu segurança foi o único que apareceu por
aqui, parecendo gostar da minha dança. E se eu estivesse com alguém aqui,
não era da sua conta! Você me atrapalhou.
Ele vai até a janela aberta, olha para fora e a fecha em seguida. Ele se
volta para mim e seu rosto é uma máscara de frieza. O que fiz agora para ele
estar tão puto?
— Bruno disse alguma coisa a você? — ele pergunta. Seu queixo está
tenso. — Você conversou com ele?
— Conversei? Não tenho nada para falar com seus funcionários. — O
olhar duro continua lá. — O que fiz agora? Não posso nem vir aqui? —
Aponto ao redor. — Isso já virou paranoia sabia?
— O que você queria falar comigo, Lana? — Ele suspira. Se renda,
Alex. É mais fácil. — Tenho algo para resolver, então fale.
Eu o encaro, mas perco o foco do que ia dizer. Balanço a cabeça e pego
o celular O para voltar para casa. Alex é demais para minha sanidade mental.
— Não é nada de importante. Amanhã o seu segurança me leva onde eu
tenho que ir ou vou sozinha — respondo e tento passar por ele, indo em
direção à saída, mas a mão dele se apoia na porta, mantendo-a fechada.
— Fala, Lana!
— Alex, estou cansada disso. Você me pressiona, depois volta atrás e
vice-versa. Suas ações são contraditórias o tempo todo — as palavras saem
em um turbilhão e a coisa que mais odeio acontece: sinto as lágrimas
começarem a cair. — Só me deixe em paz, por favor.
— Vai fazer beicinho agora ou vamos conversar como adultos? — Ele
apoia o ombro na porta
— Vá se foder!
— Qualquer hora dessas vou lavar sua boca com sabão. — Alex abre
um sorriso de lado e estende a mão, segurando o cabelo que soltei enquanto
dançava. Ele se inclina na minha direção e murmura. — Onde você quer ir
amanhã, garotinha?
— Você sabe. Você não disse que sabe de todos os meus passos? —
fungo, dramática. — Porque não começa seu discurso sobre como eu sou
infantil e tudo mais?
Ele não discute. Apenas segura meu rosto com as duas mãos e me olha
nos olhos com firmeza.
— Preciso que vá para dentro de casa, Lana. E amanhã vou te levar, ou
mandarei alguém, onde você queira ir. — Seu polegar acaricia minha boca.
Fecho os olhos e umedeço os lábios, lambendo seu dedo no processo. Ouço a
sua respiração e levanto os olhos para encarar os seus. — Acho melhor enviar
uma mulher para te acompanhar, assim você não vai seduzi-la — ele fala,
mas não me larga, em vez disso, se aproxima mais, fazendo meu corpo
encostar na porta fechada. — Tenho que falar com o seu pai antes de ir
embora. Então é melhor que você entre e fique lá dentro até o amanhecer.
— Tudo bem — concordo.
— Tudo bem? Assim, tão fácil? — Ele me observa e ri. — Não vai
tentar me seduzir?
— Não quero mais nada com você. Já matei a curiosidade — falo de
forma inexpressiva. Em seguida, acrescento casualmente. — Não estou mais
a fim. Posso ir dormir agora?
Ele me olha surpreso. Parece acreditar em mim, pois suas mãos se
afastam do meu rosto e seus olhos perdem o calor.
— Vamos. — Ele abre a porta e saímos em direção a casa. — Fique no
quarto, Lana. — diz quando alcançamos as escadas da sacada.
— Pode deixar.
Sinto vontade de mostrar a língua para ele. Quando vê que entrei e
tranquei a porta, Alex vai embora. Corro até a cômoda, pego uma mochila e
enfio algumas roupas lá dentro. Em seguida, saio pela varanda, outra vez. Sei
que colocaram uma câmera na frente da porta do quarto, então evito sair por
lá.
Caminho pelo jardim e procuro o carro de Alex, que sempre fica
estacionado do lado de fora da garagem e quase em frente à casa. Estou
prestes a virar a esquina quando um segurança vem na minha direção. Me
escondo entre a parede e um arbusto alto. Será que ele me viu? Ele se
aproxima mais e para bem na minha frente. Merda!
— O que está fazendo, Lana? — É Carl. Ainda bem. Ao menos eu o
conheço.
— Oi, Carl, estou tomando ar. Algum problema? — pergunto e
continuo agachada.
— Problema nenhum, mas o horário é bem impróprio. E, por acaso,
você toma ar na terra? Está praticamente com o nariz no chão.
— Você é tão engraçado. Qual é o carro do Alexander? E onde ele
está? — pergunto e me levanto. Tenho que me aliar a alguém.
— Por que quer saber? — Ele me observa atentamente.
— Combinei de ir para a casa dele, sabe? — Suspiro. — Amanhã tenho
que sair e ele vai me levar. Meus pais não sabem... e gostaria que isso
continuasse assim. Você pode me ajudar e deixar eu fique esperando no
carro?
— Claro que não!
— Não vou sem que o Alexander saiba. Ele que me mandou vir até
aqui para esperá-lo — insisto. Cara chato!
— Tudo bem... mas preciso perguntar a ele antes.
Ah, droga.
— Não precisa. — Me aproximo mais dele. — Tudo bem, você
venceu! Queria fazer uma surpresa para ele. — Faço beicinho. — Vou
esperar no carro, você queira ou não, e se tocar em mim vai se arrepender.
Caminho com passos firmes até o carro, abro a porta, sento no banco de
trás e espero. Menos de dez minutos depois, vejo Alex se aproximar.
Segurança fofoqueiro! Ele entra no lado do motorista, me olha pelo
retrovisor, bufa de raiva, fecha os olhos e encosta a cabeça no banco.
— O que você faz aqui? Perdeu alguma merda dentro do meu carro? —
ele grunhe. — Estou cansado disso!
— Vamos embora, Alex. E antes que você me mande sair do carro, se
eu fosse você não faria isso. — Eu o encaro pelo retrovisor. — Ou vou contar
amanhã cedo para o meu pai que fomos para cama e, você sabe, ele ainda
acha que sou virgem! Então, meu querido, vamos logo!
— Gostou das palmadas que levou na minha casa, Lana?
— Se tocar em mim daquele jeito de novo, eu quebro a sua cara — falo
e passo para o banco, virando bem a bunda para o seu lado. — Pronto,
podemos ir!
— Você vai se arrepender disso, garota!
Ele liga o carro e eu escondo o sorriso. Seguimos para a casa dele, que
dirige como um louco pelas ruas, me causando calafrios.
— Você sempre dirige assim, feito um louco? — pergunto segurando
firme no banco.
— Sei o que faço — resmunga.
— Mas eu não, por favor, vá com calma.
— Foi você que entrou no meu carro sem permissão. Então aguente!
Ao chegarmos na casa de Alex, sou prensada contra o corpo duro e
grande de Alex. Hummm, para quem não me queria perto... sua boca cobre a
minha com firmeza, a língua me invade e suga a minha. Ofego quando ele
morde meus lábios e o brilho malicioso nos olhos verdes são o único indício
de que vim parar na cova do leão. E eu amo ser a droga da sua presa. Ele dá
um tapa na minha bunda e a segura com força.
— É isso o que veio buscar, garotinha?
— Você gosta, Alex, admita.
Deslizo as mãos na frente da calça e acaricio seu pau por cima da
roupa. Sua sólida manifestação de desejo me deixa molhada e louca para
fazer tudo o que ele quiser. A luxúria violenta aperta meu baixo ventre e
começo a desabotoar sua camisa, passando as mãos por todo o seu peito. Me
inclinando, deslizo a língua por sua barriga enquanto desabotoo a calça.
Quando consigo, levo as duas mãos para dentro da boxer e aperto sua bunda
sexy. Tento tirá-la, mas ele, como sempre, tem que atrapalhar minha
diversão...
— Vem. — Ele segura minha mão e me leva para o quarto. Caímos
juntos na cama, ele por cima de mim, e nos beijamos com ferocidade, como
animais descontrolados. As respirações entrecortadas são os únicos sons no
quarto enquanto sou devorada viva. Alex segura meus pulsos para cima.
Levanto o dorso para encostar nele, que prende rapidamente os meus pulsos
com uma algema. Em seguida, me prende na cama. Ele suga meu mamilo por
cima da roupa deixando os bicos duros e salientes, deixando a marca da sua
boca na minha blusa, e repete o mesmo processo no outro seio. Gemo alto,
querendo mais.
— Alex — sussurro, louca de tesão, e querendo seu contato como uma
desesperada.
Ele se afasta me deixando excitada, e me olha com um sorriso
malicioso, de pé ao lado da cama.
— Vai ficar aí parado? — pergunto, sem fôlego.
— Não, vou checar uns documentos e dar uns telefonemas. — Ele
caminha para a porta me deixando lá. — Até amanhã!
O quê?
— Aleeex!!!
— Se comporte!
— Você está brincando comigo, não é?
— O que você acha?
— Isso não tem graça, Alex!
— Essa é só uma pequena lição, Lana. E tentar me chantagear não é
uma boa ideia — ele fala, parado na porta. — Você vai descobrir que essas
coisas não funcionam comigo. Eu tinha uma noite sensual programada e você
estragou com essa chantagenzinha de merda!
— Noite com quem? — pergunto furiosa, minha excitação esquecida.
— Você tem alguém? É aquela sua namorada?
— E se for? — Ele arqueia uma sobrancelha. — Ah, durma bem. —
Alex sai do quarto fechando a porta suavemente. Ele não vai me deixar aqui
assim, vai?
Começo a gritar e xingar todos os palavrões que conheço. Filho da
mãe! Não sabia que eu estava brincando? Que não contaria nada para o meu
pai?
— Aleeex!!! — grito inutilmente. — Vou matar você!
Depois de muito tempo me contorcendo, me convenço de que ele
realmente quer me dar uma lição. Que droga! Parecemos duas crianças
medindo forças.
Meus braços estão dormentes e as lágrimas de raiva começam a cair.
Não sei quanto tempo se passa. Devo ter adormecido, porque quando
acordei estava solta e o quarto estava claro. Nem sinal de Alex.
Continuo deitada, sentindo uma tristeza fora do comum. Fico pensando
se devo ir para a ONG com esse ânimo. Olho para o relógio da cabeceira da
cama. São cinco da manhã, ainda tenho tempo. Ao perceber que estou com as
mesmas roupas de ontem. Tiro tudo e volto nua para debaixo dos lençóis...
CAPÍTULO 11
Alexander
O dia amanhece e ainda estou na sala. Durante a madrugada fui
até o quarto e retirei as algemas de Lana. Mesmo que não tenha sido uma

ideia genial da minha parte, serviu para nós dois. Preciso manter a cabeça no

lugar e tentar fazer meu trabalho, mas a provocação de Lana é enervante e, ao

mesmo tempo, tentadora. Quero realizar todas as fantasias que ela me pede

com aqueles olhos travessos.


Me manter longe está sendo mais difícil do que eu poderia imaginar.
Afinal, sou um cara saudável e com muito tesão, diga-se de passagem. Mas
sucumbir uma vez, na outra noite, já foi demais.
Ouço-a se mexer no quarto e mantenho os olhos fechados. Quase tive
uma briga feia com o Bruno por puro ciúme, quando o encontrei depois que a
deixei no quarto. Não sei de onde vem esse sentimento. Nunca senti isso por
ninguém e sinto o controle escapar das minhas mãos.
Brigar com meus amigos por causa de uma mulher, me faz sentir como
um idiota. Ainda mais ao saber que, para ela, isso não passa de um capricho,
que ela não tem qualquer interesse de verdade em uma relação entre nós.
Avisei ao Bruno que se mantivesse longe dela, mas ele levou isso na
brincadeira, achando eu estava agindo como o Alex de sempre, aquele que
não dá chance para envolvimento pessoal com clientes. Faltou pouco para eu
quebrar a sua cara. Descobrir que a discussão com Carl foi porque ele estava
muito entretido com a visão dela dançando e não achou importante me deixar
informado do que estava acontecendo, só havia piorado as coisas. Falta de
comprometimento. Fico imaginando a equipe "foda" que eu tenho. A
começar por mim, que permito que ela apareça quando acha conveniente.
Mas tentar suprimir esse sentimento que só cresce — apesar do pouco tempo
que nos conhecemos — só o faz crescer. Eu a queria para mim e isso é
errado!
Como me enganei achando que a desprezar mudaria as coisas. Eu a
quero porque — além de ser linda — ela faz questão de demonstrar que
também me quer daquele jeito tosco dela. Mas, ao mesmo tempo, não posso
agir de forma antiética. Além de Lana ser minha protegida, não combinamos
em absolutamente nada. Muitos outros seguranças têm casos com clientes. É
algo bem comum entre eles. Bruno, por exemplo, se envolveu com a maioria
das clientes. Para ele, isso não importa, desde que seja mulher. Mas eu penso
diferente. Sou adulto, não um adolescente para me envolver com uma
garotinha de vinte e um anos que não sabe nada da vida e que não está nem aí
para nada, enquanto eu me envolvo em uma história que não tem futuro. O
pior de tudo é que ela já não sai mais da minha cabeça.
Franzo o cenho quando ouço a porta do quarto se abrir. Lana sai lá de
dentro usando uma calça colada ao corpo e uma blusa larga, que parece caber
duas dela ali dentro, deslizando pelo ombro de um lado e a mochila na mão.
Ela me olha e para no meio do cômodo.
— Estou pronta para ir — ela fala, mas não da forma espontânea
habitual. Seus olhos não encontram os meus e ela fica lá em pé, parecendo
tensa.
— Bom dia, Lana! — Ela mal resmunga algo de volto. Não sei qual o
seu jogo, mas ela vai me falar em breve, como sempre.
Levanto e vou para a cozinha servir o café da manhã, mas ela não me
segue.
— Não vai tomar café? — pergunto enquanto começo a servir.
— Estou sem fome — ela murmura da sala. — Tenho que ir, se você
não se importa.
Que porra ela tem agora?
— Depois que você se sentar e comer, podemos ir onde você quiser —
respondo com paciência e me aproximo de onde ela está.
Achei que ela ia responder com gracinhas, mas ela nem pisca. Se eu
não a conhecesse, ia achar que ela havia acordado no corpo errado. Mas seu
olhar magoado despedaçou algo dentro de mim. Com certeza deve ter ficado
chateada por não ter feito as coisas do seu jeito. Não posso permitir que sua
mágoa me transforme em seu cachorrinho de estimação.
— Se sente e coma, Lana — falo com firmeza. — Só vamos sair depois
que você tiver se alimentado.
Ela evita me olhar ao passar por mim em direção a cozinha. Quando se
senta e segura a caneca, vejo os pulsos esfolados pelas algemas. Merda! A
culpa me atinge ao ver que a machuquei. Seguro seu braço para olhar mais de
perto e ela se assusta com a minha proximidade. São ferimentos superficiais
e, mesmo me estapeando mentalmente, beijo a parte interna dos seus pulsos,
um de cada vez, lentamente.
— Me desculpe por isso. — Minha voz soa estranha até mesmo para
mim. Mas, além da visível pulsação acelerada, ela não dá qualquer sinal do
que está sentindo, além da óbvia raiva que cintila nos olhos cor de conhaque.
Lana
Eu estava me sentindo irada. Quando acordei novamente, já passava
das oito e não vi qualquer sinal de Alex. Depois de um banho rápido, me
visto e pego as coisas que trouxe na noite anterior. Ao sair do quarto, o
encontro sentado na sala.
— Estou pronta para sair.
Quero ficar bem longe dele. Estou me sentindo a pior pessoa do
mundo, como se eu realmente fosse essa pessoa intragável, que faz o que bem
entende. Mas sei que não sou nada disso. Na verdade, vivo uma fachada para
esconder a minha fragilidade. No intuito de querer agradar meus pais, estou
me anulando e isso, às vezes, me mata. Eu deveria ter nascido homem. Só
assim, meu pai não precisaria criar tantas expectativas em mim. Isso seria
natural por já ser seu filho querido, mas em breve tudo isso será direcionado
para meu irmão Luca e eu serei livre de quaisquer expectativas.
Alex insistiu para que eu tomasse o desjejum. Concordo para que
possamos ir embora o quanto antes. Estou terminando de comer quando a
campainha toca. Ele se levanta e vai ver quem é, mas ouço quando ele
resmunga um palavrão antes de abrir a porta.
Olho ao redor. Gosto daqui. É a casa de um homem solteiro.
Masculina, mas confortável. E combina com Alex. Fiquei louca sentindo seu
cheiro masculino nos lençóis da cama. Estar rodeada das suas coisas é, no
mínimo, inebriante... apesar da raiva que estou sentindo desde que acordei.
Pena que ele é um bruto!, penso comigo mesma. Um dia arranco suas bolas!
Eu juro!
Um dia? Será que o meu subconsciente acha que temos futuro? Sou
uma boba mesmo.
Uma voz feminina me tira dos meus pensamentos. Solto um gemido.
Ah, não. A louca! Cara, isso não vai acabar bem. Meu mau-humor vai
explodir se ela falar algo para mim. Continuo sentada e me desligo deles. Já
não me importo mais com o tipo de relação doentia que Alex tem com ela.
Pelo jeito, ela o persegue,
Termino de comer e vou pegar minhas coisas. Alex que fique com a
namorada. Tenho que ir para a ONG. Hoje vai ser divertido por lá e a dra.
Cathy parece um tenente, exigindo total comprometimento de todos os
voluntários.
Entro na sala. Os dois estão em uma acalorada discussão.
— Estou pronta — falo, inexpressiva. — Espero que a sua reunião não
demore muito, Alex.
— Agora eu entendo a sua falta de tempo.
Arqueio a sobrancelha para o tom azedo da visitante.
— Estou de saída, Adriane. Hoje à noite vamos nos sentar e conversar.
Alex se volta para mim.
— Só um minuto, sim?
Ele sai da sala e me deixa com a sua ex.
— E aí, está gostando de ser a puta do meu namorado? — Sua voz
destila veneno. Vejo que a mulher é louca de pedra.
— Seu namorado, é? Pelo que estou vendo, você está mais para cadela
perseguidora que não sabe seu lugar. — Olho para ela em provocação.
— Olha aqui sua... — Ela vem na minha direção e eu me preparo para
arrancar seus olhos.
— Chega! — O retorno de Alex inibe o provável ataque. Ele aponta
para a saída — Vamos!
Nós três saímos. Sigo para o carro e espero, enquanto ele se despede.
Não consigo entender o que está acontecendo com eles, exceto que ela me
odeia. Ouço o bip do carro sendo destravado. Abro a porta e me sento.
Alex entra no carro e dá a partida.
— Não vai dizer nada? — Alex vira-se para mim.
Não respondo. Como ele mesmo falou no outro dia, não tenho nada a
ver com sua vida. Então, vou dizer o quê? Questionar a respeito da estranha
relação com a “cabelo de fogo”? Não, apesar dessa coisa entre nós, não me
acho no direito de questionar. Não somos namorados, só fizemos sexo uma
vez. Ainda assim, não gosto de pensar nele com outra mulher. Confio no meu
potencial, mas talvez o ciúme seja o sentimento mais adequado para definir
as emoções que me atingem quando penso nele fazendo com outra o que fez
comigo.
— Você está estranha hoje, Lana — ele insiste. Acho que não percebeu
que não estou a fim de conversar.
— Acho que se alguém te algemasse e te deixasse preso durante a
noite, você também não estaria de bom humor — respondo. — Vou falar com
o meu pai para trocar de empresa de segurança. Ele contratou uma que tem
um bando de idiotas, que agridem sua filha. Tenho certeza de que ele não vai
gostar disso.
Falo para ofender mesmo. Queria estapeá-lo.
Ele para o carro no acostamento.
— É por isso que você se mete em confusão, Lana. — Seu olhar é
intenso e eu o encaro de volta. Não tenho medo dele, ou de quem quer que
seja. — Seu pai conhece a filha que tem. Falar com ele seria perda de tempo
da sua parte. Além disso, eu não te agredi. Tome cuidado com as palavras
quando acusar as pessoas, Lana.
Sua expressão é brava, mas não me importo.
— Então não me algeme! — retruco entre os dentes. — E não tenho o
dia todo. Podemos ir? Tenho hora, Alexander.
Ele liga o carro e segue outra vez. Não falamos mais. Essa coisa mal
resolvida continua entre nós, o que me deixa aborrecida, já que eu detesto
essa tensão.
Eu não havia dito onde fica a ONG, mas ele para o carro em frente a
casa localizada na periferia da cidade. Antes que eu desça, ele segura meu
braço.
— Espere, Lana — ele pede. Em seguida sai do carro e dá a volta.
— Você vai ficar o dia inteiro aqui, comigo? — pergunto. Imagino que
deva ser chato ficar sem fazer nada, só esperando por mim. — Se quiser ir
embora, Alex, pode ir, vou estar segura aqui.
— Você não pode ter certeza quanto a isso. Quem estiver interessado
em fazer mal ao seu pai e sua família, sabe tudo sobre vocês, Lana. O que
fazem e onde vão — ele fala e eu olho ao redor, automaticamente. — Todo
cuidado é pouco.
Ele para na minha frente e segura meus braços. Estou presa entre o
carro e seu corpo másculo e grande.
— Tenha cuidado. Sempre. — Sua voz é baixa e sexy. Ou, talvez, eu
que seja boba, porque tudo o que ele fala parece poesia para mim. — Quero
que me desculpe por ontem, garotinha. Não sei porque você me faz perder a
capacidade de pensar. — Ah não, estou derretendo na sua frente, que droga!
— Você tem que crescer Lana. Quando vai entender que só vou te levar à
sério quando começar a agir como adulta?
Apesar de saber que isso é mais um sermão, não fico irritada. Seu tom
de voz me seduz completamente.
— Vocês não me permitem ser adulta — digo com determinação. —
Olhe para mim. Tenho que fazer aquilo que me faz bem escondido, porque eu
sei que eles iriam interferir, como sempre fazem.
— Acho isso uma bobagem, sem tamanho. Você não deveria manter
isso como um grande segredo de estado. — Seu tom é veemente. — Deveria
se orgulhar disso. Talvez assim, as pessoas te respeitassem um pouco mais.
— Você não entende — digo, sem força.
— Claro que não. Esse é um trabalho social bacana. Tenho certeza de
que te apoiariam nisso.
— É aí que você se engana. Com certeza, me diriam para dar a minha
mesada como doação — respondo com ênfase. — Mas o que eu faço aqui
não é questão de dinheiro. Isso seria fácil, resolveria muita coisa, mas não é.
Sinto as lágrimas se formarem em meus olhos e escorrerem pelo meu
rosto. Dentro de mim tenho a sensação de que quero convencê-lo de algo
nessa história. Só queria um amigo que entendesse.
— E acha que agindo como vem agindo, conseguirá...
— Só tive problemas para vir aqui depois dessa palhaçada de guarda-
costas — interrompo. — Olhe para esse lugar. Acha que o meu pai me
deixaria frequentar esse ambiente? Não. Eu o conheço melhor que você.
— Há momentos que acho que é você que não os conhece, Lana. —
Ele aponta a casa. — Pesquisei a respeito dessa ONG e, sinceramente, acho
que principalmente a sua mãe iria te apoiar. Você só precisa conversar. —
Ele abre um meio sorriso, como se estivesse tentando me encorajar.
Sorrio de volta e não consigo ficar com raiva dele. A atração que sinto
é mais forte que a raiva. Mas agora não é o momento certo para resolvermos
isso. Tenho um compromisso.
— Bem, espero que você entenda que não quero que eles saibam. Não
agora. — Faço uma expressão brava. — Mas você sabe que temos uma conta
a acertar.
— Tenho medo quando você fala assim. — Ele me puxa pela cintura,
moldando meu corpo no seu. — Você não me disse se me perdoa por ter te
algemado na cama, pequena encrenqueira.
— Me responda antes quem é aquela mulher que está sempre na sua
casa. — Cara, por que não resisto a ele? Devo ser louca.
— Podemos falar sobre isso depois? — Ele segura meu pescoço e beija
minha boca lentamente, mas não retribuo e ele se afasta. — Quero te beijar
— ele sussurra, rouco.
— Estou cansada de te querer e você não retribuir — falo e ele não
responde, apenas me encara. — Eu queria te entender, Alexander Marshall —
digo olhando para aqueles olhos verdes que estão fazendo eu me apaixonar.
Ele não fala nada. O momento parece uma eternidade quando ele se
afasta.
— Vamos! — Ele me puxa em direção a ONG...
CAPÍTULO 12
Lana
Aqui é o lugar onde me sinto bem de verdade. Onde posso ser
alguém que não precisa mentir ou inventar desculpas.
Conheci a dra. Cathy na faculdade. Ela é coordenadora do curso de
psicologia. Durante algumas aulas, ela falou sobre o seu trabalho na CASM e
me convidou para conhecer o projeto social na comunidade carente. Me
apaixonei pelas “meninas” que vem parar aqui. Cada uma suportando uma
carga emocional maior do que podem aguentar.
A ideia da doutora é ir além do trabalho psicoterápico para tratá-las. Eu
e outras voluntárias ficamos com a parte psicossocial, onde fazemos um
trabalho mais “amador”. Lidamos com a autoestima, ajudando a devolver a
vontade de viver das muitas mulheres que frequentam o espaço. Adoro ter a
oportunidade de proporcionar um pouco da leveza para suas vidas, fazer com
que elas se sintam bem.
Hoje, sábado, é o dia das dicas de beleza. Morro de rir com as histórias
que elas contam dos desastres com maquiagem, assim como também conto as
minhas gafes ao exagerar no blush e sair com as bochechas vermelhas feito
uma palhaça. A ideia é fazer com que essas mulheres não enxerguem apenas
o lado sombrio da vida e tenham coragem para enfrentar a vida outra vez. A
ONG atende a vítimas de violência doméstica, além de outros tipos de abuso,
e elas procuram o abrigo quando conseguem deixar seus agressores. Além
disso, aqui posso ser eu mesma. Sem a riqueza do meu pai, sou apenas mais
uma voluntária.
Passei o dia todo trabalhando e mal vi o Alex. Eu sabia que ele estava
ali, porque notei algumas mulheres mais tímidas e outras um pouco tensas,
com a presença dele — ainda que silenciosa. Alex não impôs sua presença, o
que achei legal da sua parte, mas já faço planos de levá-lo de novo na
próxima quarta, que é o dia que ensino dança sensual para as meninas.
No fim da tarde, quando saímos, seguimos por um tempo em silêncio.
— Estou orgulhoso de você, garotinha — ele finalmente diz.
— Obrigada, brutamontes! — respondo com um sorrisinho.
— O quê? — Ele ri de volta.
É estranho ter um momento de camaradagem com ele. Desde que nos
conhecemos, foi só confusão. Estava com vontade de sair com meus amigos,
mas sugerir isso a ele vai acabar com o momento. Sinto falta do Jules e dos
meus amigos de farra, mas sou prisioneira em casa. Meu pai continua
paranoico. Nada aconteceu nos últimos tempos para que tantos seguranças
rodeassem a nossa casa.
— O que vai fazer hoje à noite? — Alex parece adivinhar meus
pensamentos.
— Ficar em casa com minha família.
— O quê? Não tem nem uma fuga na agenda? — ele graceja.
— E se tiver? — alfineto. — Hoje vou te dar uma folga.
— Ah! Falando em folga, vou estar de “folga” amanhã. Você só vai me
ver de novo na segunda. — Fico calada depois da revelação. Estou me
acostumando com sua presença e nossas discussões.
Lembrei que ele havia dito pela manhã, que iria encontrar com a
“cabelo de fogo”.
— E então, qual é a história com você e a namorada psicótica? — Não
aguento e pergunto. Ele me olha rapidamente e volta a encarar o tráfego.
— Quer mesmo saber sobre isso? E ela não é minha namorada. Não
mais.
— Claro, Alex, você age como se não tivesse namorada, mas volta e
meia a mulher está na sua casa — falo e mudo a minha posição para poder
observá-lo.
— Bem, Adriane e eu fomos noivos. Há alguns meses eu terminei, mas
ela não aceitou bem.
— Por quê?
— O irmão da Adriane era o meu melhor amigo desde criança.
Consequentemente, eu a conheço desde que ela usava fralda. Namoramos e
ficamos noivos um bom tempo. Sempre fui protetor em relação a ela, mas
depois do noivado, o ciúme e as cobranças fizeram com que eu terminasse.
— Porque se referiu ao irmão dela no passado?
— Ele morreu em um acidente há um ano — ele fala, a voz repleta de
emoção. — Os dois eram muito ligados e Adriane transferiu para mim parte
dessa dependência. Agora estou tentando colocar um fim nisso sem magoá-
la.
— Você não quer mais? Digo, se estabelecer como você disse? —
Minha curiosidade é grande.
— No dia em que conhecer a mulher certa, quem sabe.
Fico sem palavras pelos próximos minutos. O que eu estava pensando?
Que ele diria que já havia encontrado a mulher certa? Ele nem me considera
mulher, que dirá a “certa”. Olho pela janela, as luzes da cidade passando por
nós, e me sinto como uma criança que perdeu o pirulito. Não sei bem o que
poderia oferecer a um homem. A minha vida é uma bagunça e nem carreira
definida eu tenho. Preciso rever minhas atitudes urgência, penso. A tática de
agir como “louca” para fugir das responsabilidades que meu pai definiu para
mim não está dando certo.
Esse pensamento me faz lembrar do porquê insisto em continuar
fazendo direito — ainda que eu não goste do curso. Não quero deixar meu pai
triste. Mas, além disso, a dra. Cathy disse que, como advogada, vou poder
ajudar muitas mulheres da CASM. Quem sabe consigo fazer algo que gosto e
seguindo a profissão que meu pai tanto deseja?
Solto um suspiro de alívio quando atravessamos o portão da minha
casa. Irônico que, depois de tantas estripulias, agora eu queira ficar longe
dele. O encontro dele com a tal Adriane me vem à cabeça. Detesto ela. Será
que eles ainda transam?
— Você dorme com ela? — Ah, merda! Tampo a boca, mas a pergunta
já saiu.
— Que espécie de pergunta é essa? — Ele soa brincalhão.
— Acho legitima, já que a sua ex está rondando o tempo todo. — Já
que perguntei, porque não saber de tudo?
— Não. Não transo mais com ela. — Ele para o carro na frente da casa
e continua. — Está muito interessada na minha vida amorosa, Lana Mitchell.
— Informação nunca é demais, Alex Marshall. Mas, então, por que ela
entra na sua casa como se fosse a dona do lugar? Quando se termina um
relacionamento não se permite que a outra pessoa tenha livre acesso a nossa
casa. E se você quer a minha opinião...
— Falou a expert em relacionamentos! E não, não quero sua opinião,
Lana — diz.
— Mas darei assim mesmo: acredito que tenha coisas inacabadas entre
vocês. E que vocês ainda transam, sim. — Fico esperando sua admissão com
o coração na mão. — Devia se resolver, sr. controlador — debocho e saio do
carro. — Até mais!
— Espera!
Ele desce e me segue.
— Vou te apresentar o segurança que vai ficar com você amanhã, caso
queira sair. Já que esse é um país livre — ele diz, quando entramos.
— Não parece — resmungo.
—Venha!
— Não há necessidade. Vejo isso depois. Agora só quero um banho e
dormir — mentira! — Boa noite, Alex.
Mas o cabeça dura pega meu braço e me leva em direção à sala onde
estão suas parafernálias. Sou apresentada a uma mulher com cara de poucos
amigos. Minha segurança!
— A Shirley vai te levar onde você quiser ir, Lana. É só falar. — Não
acredito que ele fez isso! Depois das apresentações, vou direto para o meu
quarto sem me despedir.

Não tem nada pior que passar o sábado em casa. Acrescente a isso o
pensamento de Alex com a ex, em uma conversa que pode muito bem
terminar na cama. Estou a ponto de enlouquecer. Olho para o teto, entediada,
quando meu irmão aparece na porta do quarto.
— Oi, carinha. O que manda? — Sorrio para ele.
— Quer jogar comigo?
Ah, não! Mas vou para um jogo com meu irmão. Fazer o que se
estamos presos em casa como se tivéssemos cometido algum crime. Nada
como uns bons tiros no inimigo visualizando certo brutamonte.
Já são quase onze da noite quando volto para o quarto. Pego o celular e
ligo para Juliano, “vulgo” Jules. Sorrio pois sei que ele não gosta muito do
próprio nome.
— Gata, você me abandonou!
— Oi para você também, Jules. Onde você está?
— Em casa, meu pai reuniu a família para anunciar a nossa falência. —
Sua voz sai em tom de lamento. — Tínhamos algum compromisso?
— É sério, Jules? Sinto muito.
Conheço os pais do Jules, ou melhor, a mãe. O pai eu quase não vejo.
Pelo que sei, meu pai já teve algum tipo de negócio com ele, no passado. Mas
não acho tenham qualquer ligação recente.
— Ele disse que em breve tudo vai se resolver. Que voltaremos ao topo
outra vez. — Ele não parece se preocupar, mas isso é bem típico dele. — A
minha mãe que está péssima. Vai ter que parar de comprar bolsas de grife —
zomba.
Conversamos um pouco mais e desligo depois que combinarmos de nos
encontrar. Ele é o meu melhor amigo e sinto a sua falta. Além, disso, preciso
de um pouco de distração.
Perto dali...
Caminho de um lado para o outro no escritório da minha casa.
Contratei uma pessoa para vigiar a casa de Mitchell. Saber que tanto
trabalho foi desperdiçado, que por culpa dele estou indo à falência nos
negócios e que isso pode afetar a minha família, me faz desejar pagá-lo na
mesma moeda. O meu filho é um tonto, vive no mundo da lua, mas é amigo
da filha dele. Posso usar o rapaz para atrair a garota para cá. Faz pouco
tempo que ela esteve aqui, mas não desgrudou um minuto do Juliano.
Quando eu estiver com a querida filha dele, Mitchell não vai manter a
confiança. Hoje, quando anunciei que estávamos à beira da falência, me
senti um fracasso. Ter meus planos naufragados porque Mitchell se meteu
onde não devia, tirou a minha chance de resgatar a empresa da lama. Ele
tirou isso de mim.
Meu filho vai me ajudar, mesmo que não saiba disso ainda. Vou fazer
com que ele a convide para vir aqui e depois vou me livrar dos seguranças
dela.
Alexander

Saio do apartamento de Adriane logo após a conversa que tivemos. Ela


havia preparado um jantar como se ainda fôssemos um casal. Depois de
muito choro e chantagem emocional, ela pareceu entender que não somos
nada além de amigos. Não quero perder sua amizade, porque ela sempre foi
importante para mim. Mas entendo que depois de um relacionamento
amoroso, é difícil manter a amizade.
— É sério com aquela garota? — ela tinha perguntado — Ela não
parece o seu tipo de mulher, Alex.
E Adriane tem razão. Lana não é mesmo o meu tipo, mas Adriane não é
tão diferente assim dela — pelo menos no quesito loucura. Mas, nos últimos
dias, ela não saiu dos meus pensamentos. Mas não por que eu estivesse
preocupado com a sua segurança. Meus pensamentos estavam voltados para
tê-la em baixo de mim, na cama, gemendo em meu ouvido enquanto suas
mãos deslizam pelo meu corpo.
Droga!
Só de pensar nisso já fico duro. Estou perdido.
Volto para minha casa solitária e, depois de um banho frio para acalmar
os ânimos, fico imaginando o que Lana anda aprontando. Ligo para os
seguranças, que afirmam que ela está em casa, comportada. Sinto vontade de
ligar e falar com ela. Isso é péssimo, Alexander. Estou ligado demais nessa
garota.
Nos dias seguintes não vou para casa de Mitchell. Preciso resolver
algumas pendencias na empresa. Não falei nenhuma vez com ela, mas pelo
que soube através da funcionária que deixei de olho, ela tem estado
comportada e agindo com responsabilidade. Pelos relatórios, não faltou a
nenhuma aula. Quero pensar que ela está tomando juízo.
Mas algo chamou minha atenção nos relatórios. Ela não foi à ONG essa
semana. Estranho, ela sempre questão de ir. No sábado, ao chegar na casa de
Mitchell, fico sabendo que ela estava no quarto e não havia saído de lá o dia
inteiro.
Lana
...
I dare you to let me be your,
Your one and only,
Promise I'm worth it,
To hold in your arms,
So come on and give me a chance,
To prove I am the one who can walk that mile,
Until the end starts...
...

Ouço a voz de Adele e minha raiva aumenta ainda mais.


Alex é um tratante filho da mãe. Eu deveria ter ido sozinha para CASM
essa semana. Ele sabe que não gosto de um fluxo de pessoas indo até lá
comigo. Ele prometeu me ajudar, mas nem se importou em perguntar se eu
queria ir com outra pessoa. E, pela primeira vez, deixei de comparecer.
Expliquei a dra. Cathy que não iria, mas, pelo menos, ela entendeu meus
motivos.
Mas hoje é sábado e não vou ficar em casa. Vou sair e me divertir.
O Jules me convidou para ir à sua casa. Disse que o pai perguntou por
mim. Resolvo ir até lá à noite e combinamos de sair para dançar. Saio do
quarto, onde passei a manhã toda estudando para os exames, já que decidi
tentar levar o curso à sério.
Estou prestes a ir para casa do Jules, esperando que a sombra que me
seguiu por toda a semana não ouse me impedir. Mas, para minha surpresa,
encontro Alex na sala, conversando com meus pais.
— Vai sair filha? — Minha mãe me vê e chama a atenção para mim. —
Não te vi o dia todo. Está se sentindo bem?
— Claro, mãe. Estava estudando. Vou sair sim. — Não cumprimento
Alex. Na verdade, faço de conta que não o vejo, mas sei que ele me observa.
— Vou para a casa do Jules e vou dormir lá.
Me despeço do meu pai e sigo em direção à porta, pensando que a
mulher que me acompanhou durante a semana deve estar lá. Que mulher
grudenta! Quando saio, não a vejo em lugar algum. No entanto, logo
descubro o porquê: Alex estava me seguindo.

CAPÍTULO 13
Lana
Fico parada vendo Alex se aproximar.
— Onde está a minha outra sombra? Preciso sair — falo e mantenho o
olhar longe dele.
— Vou ficar com você hoje, Lana. Onde você vai? — pergunta,
parando ao meu lado. — Você deveria ter avisado que ia sair com
antecedência.
— Não sou celebridade! Estou indo na casa do Jules. — Ele abre a
porta do carro para mim e eu entro. Enquanto me acomodo, ele bate a porta e
dá a volta. — E onde estava? Você disse que ia me ajudar!
— Tenho uma empresa para administrar, Lana. Raramente faço serviço
de campo — ele diz, enquanto manobra o carro.
— Promessa é dívida! Você sabe o quanto isso é importante para mim,
Alex? — questiono, magoada. — Nem se importou!
Ele não responde. Para o carro no acostamento, solta o cinto e se vira
em minha direção.
— Sei o que prometi, mas nem tudo é como queremos. — Não falo
nada. Não adianta discutir... mas ele continua. — Como foi a sua semana? —
Agora parece interessado, mas é tarde para isso.
— Tirando a sua falta de consideração comigo, normal — digo seca.
— Só normal? Um pouco estranho para a “fodona” Lana Mitchell. —
Ele está caçoando de mim?
— Pode me levar para casa do Jules? — Ignoro sua farpa.
— Qual o lance com esse Jules? — ele fala o nome com irritação. Ah,
parou de rir, idiota? — Vocês “ficam”, como dizem por aí?
— Porque se importa? Não tenho namorado, posso ficar com quem
quiser. — Percebo quando ele aperta a mandíbula. Abro um sorriso
zombeteiro quando penso que ele pode estar com ciúme. — Não vai me
levar?
— Não vamos à casa do Jules. Quero te levar em um lugar — ele fala
enquanto liga o carro.
— Onde?
— Vocês vão ver. Ligue para o amiguinho e avise que não vai.
— O quê? Alex, isso não tem graça. Marquei com ele e vou, nem que
tenha que ir a pé.
— Tudo bem, se você não vai ligar, eu ligo — ele pega o próprio
telefone e começa a ligar. — Jules?
Tomo o telefone da sua mão e coloco no ouvido.
— Alô? — Ouço a voz de Jules do outro lado.
— Oi, Jules! É a Lana. Só um minuto. — Me viro para Alex. — Não
estou desistindo de sair à noite, Alex. — Volto a falar ao telefone. — Oi,
Jules, não posso ir à sua casa agora, vamos nos encontrar na Secrets Clubs. —
Marcamos e devolvo o telefone, ficando quieta. Meu mau-humor piora a cada
minuto. Alex me irrita demais. Tudo tem que ser do jeito dele sempre.
Vinte minutos depois, Alex para o carro em um parque e eu arregalo os
olhos surpresa.
— O que estamos fazendo aqui? — questiono. Não identifico o parque,
mas também não sou de ir a esse tipo de lugar. — Vamos fazer um
piquenique?
Ele não fala nada quando estaciona. Desce e dá a volta para abrir a
porta para mim. Quando desço vou de encontro ao peito duro dele, que me
sustenta firme.
— Que tal um pouco de diversão? — pergunta com a voz baixa e eu
fecho os olhos quando sua boca cobre na minha. Ah, caramba! Senti falta
disso. Sua língua invadindo minha boca com ímpeto. As coisas nunca são
doces com Alex. É intenso e esfomeado, e eu adoro esse jeito de homem das
cavernas nele.
Nunca imaginei que fosse gostar de passar a tarde em um parque, Mas
confesso que adorei. Alex me mostrou que não preciso de muito para me
sentir solta e feliz!
Ele me leva para uma barraca de cachorro quente e, apesar de não
querer comer, ele comprou dois, me fazendo experimentar um, e adorei.
Sentamos na grama e aproveitamos nossas “iguarias” cinco estrelas.
Mas a parte que mais gostei foi de me sentar e conversar sobre tudo e
nada. Esqueci da raiva que vinha sentindo por toda a semana dele. Alex
contou da empresa e um pouco da sua vida pessoal: a morte prematura do seu
amigo Adrian, como isso o abalou. Acabei perguntando da conversa com a
“cabelo de fogo” e ele negou, terminantemente, ter algo com ela. Eu queria
saber tudo a respeito do seu relacionamento com ela.
— Eu gosto da Adriane. Nós três crescemos juntos. — Ele tira um fio
de cabelo que o vento trouxe para meu rosto, enquanto presto atenção no que
ele diz. — Acredito que dessa vez ela entendeu que não posso sinto o mesmo
que ela. Ela não é má pessoa, Lana, só se entrega demais aos sentimentos,
além de ser muito ciumenta.
— Eu não me humilharia dessa forma por homem nenhum — falo, mas
penso que posso me entregar aos sentimentos avassaladores que Alex
desperta em mim. Eu e a sua ex temos algo em comum. — Ela não gosta
muito de mim. Acha que sou rival?
— Não se preocupe com isso, Lana. — Ele baixa a cabeça capturando
meus lábios nos seus.
Ao fim da conversa, eu estava com um sorriso no rosto, além de um
sentimento de satisfação.
— Alex? — perguntei em certo momento. — Você acha que existe
mesmo a chance de sermos sequestrados?
— Claro que sim, Lana — ele parece pensativo por um momento,
depois suspira. — Posso te contar algo? — Quando assinto ele continua —
Depois que seu pai voltou para casa, logo após o sequestro, ele vem
recebendo ameaças. Isso está o deixando muito preocupado. A polícia está
trabalhando nisso, mas enquanto essa pessoa não for presa, vocês todos
correm perigo, sim.
Fico calada. Não tinha noção de nada disso. Sou mesmo louca por sair
por aí sozinha.
— Então, se você for mais prudente, será muito bom, sua diabinha —
ele fala, beliscando meu nariz.
Nunca pensei em passar uma tarde tão maravilhosa, agindo como
“amigos”. Bem, amigos não ficam de amasso, não é? Mas me sinto cada vez
mais ligada a ele.
Estou me apaixonando de verdade.
Ouço meu filho ao telefone, combinando de ir a um clube noturno com
a filha de Mitchell. Ssondei para que ela viesse aqui, mas como sempre, ele
fez tudo errado e não conseguiu trazer a garota. Ouço o nome do lugar onde
estão isso e providencio para que alguém vá até lá. Envio por e-mail uma
foto que encontro na internet, para que a pessoa que contratei possa ficar de
olho neles.
Agora preciso aguardar e torcer para que ele faça um bom serviço!
Lana
Minha missão no clube noturno esfumaçado é dançar como uma louca,
mas Alex me observa com uma expressão carrancuda da mesa, enquanto
estou na pista dançando músicas eletrônicas eletrizantes com Jules, que está
muito louco. Ele dança muito bem, por isso que amo sair com ele.
Alex veio junto e não desgrudou até eu ir para a pista dançar, disse que
prefere observar. Então vamos dar a ele o que ver. Isso depois de uma ruiva
peituda quase esfregar se esfregar no rosto dele quando foi anotar o pedido.
Qual o problema com as ruivas? E, claro, ele olhou. Safado! Saí da mesa,
logo depois. Não queria jogar a bebida na cara da ruiva “periguete”!
— Que tal você fazer uma dança sensual no palco? — Jules grita em
meio ao barulho ensurdecedor. — O Rico não vai se importar se você fizer
um show gratuito. — O Secret Clubs é de um conhecido nosso. Na verdade,
foi por irmos tanto que fizemos amizade com Rico, um dos sócios do lugar.
— Você é louco, Jules? Meu algoz está bufando ali no canto.
— Vamos, Lana, você está ficando careta depois que arrumou esse
guarda-costas. E qual o lance de vocês? — ele torna a gritar no meu ouvido.
— Não é da sua conta, Juliano — falo rindo. — Não está rolando nada!
— Você guardando segredo, agora? Incrível! Vamos gata, só uma
dancinha?
Acabamos indo atrás do Rico para que eu pudesse dançar no palco
onde algumas mulheres estavam dançando no poste. O encontramos algum
tempo depois, em uma das salas VIPs. Ele realmente não se importa que eu
dê um showzinho. Então, ele me leva ao camarim para arranjar e sou recebida
pelas dançarinas que já me conhecem — não é a primeira vez que subo no
palco. Mas hoje quero fazer aquele grandalhão me notar.
— Vou fazer uma dança solo, meninas, quem vai me ajudar no
figurino? — peço e Amber, a moça que é responsável pelo show, vem na
minha direção dos fundos da sala.
— Lana! Sentimos sua falta. O que houve? Deixou as noitadas para
trás? — Ela ri, amigável. — Venha, vamos procurar algo sexy para você!
Apesar de que você está linda com esse vestido.
Eu a sigo e, em quinze minutos, estou pronta para a apresentação,
usando uma saia minúscula por cima de um short/calcinha e um top — que
estava mais para um sutiã com pedrarias. Os cabelos estão soltos em ondas
luxuriantes que caem por minhas costas e o visual é finalizado por sandálias
de salto agulha. Estou parecendo uma das dançarinas da casa. Amber me leva
até a lateral do palco e pede que eu aguarde a minha vez. Pouco depois, sou
anunciada como atração especial da noite por uma voz masculina. Dou uma
risada ao pensar na expressão de Alex no momento que eu entrar no palco.
No palco, as luzes diminuem e eu caminho até o poste quando a música
Welcome to Berlasque, da Cher, começa a tocar e um foco de luz solitária
foca em mim. Segurando a barra de aço, ondulo meu corpo deixando a
melodia me envolver, dançando o mais sensual que posso, enquanto enrosco
as pernas na barra.
Gosto dessa música por causa da parte flamenca do ritmo, que me faz
rebolar com sensualidade. Tento olhar na direção da plateia para ver se
Alexander está por perto e não demoro a encontrá-lo bem perto do palco.
Seus olhos são chamas incandescentes de raiva ou desejo — não consigo
identificar, mas não me importo. Aproveitando dou as costas para ele e
rebolo rapidamente em um determinado ponto da música, e volto a me mover
ao som do tango. Penso em cada coreografia sensual que conheço, mas é
difícil, já que meus pensamentos estão focados nele e se o estou afetando.
Quando a música termina, os frequentadores aplaudem e eu me curvo em
agradecimento. Desço do tablado em direção ao camarim para me trocar.
— Porra, Lana! Não saia por aí sem me avisar! — ele berra quando me
encontra assim que saio do camarim. — O que eu falei sobre sair de perto de
mim?
Sim, ele veio aqui com a condição de que eu não saísse das suas vistas.
E eu tinha feito justamente o contrário.
— Gostou da dança, Alex? — pergunto com um sorriso malicioso.
Quando eu me aproximo, ele parece se acalmar, e vejo Jules bem atrás
dele.
— Cara, ela está comigo! — Jules diz.
— Cale a boca! — ele repreende. Ele tem implicado com o Jules desde
que nos encontramos mais cedo. — Quando a Lana está com você parece que
ela perde o restinho de sensatez que tem. O que foi aquilo no palco? — Alex
grunhe.
Aproveito e o puxo para dançar. O lugar toca vários estilos e começa
uma salsa no momento que puxo Alex para pista. Me surpreendo por ele não
impor resistência, fazendo-o parar de esbravejar. Já que a minha dança não
teve o efeito que eu queria, aproveito quando ele acaba indo dançar de boa
vontade. O que mais me choca é saber que um homem daquele tamanho sabe
dançar salsa muito bem. Ele tem um gingado sexy demais e eu estava quase
salivando de tesão.
— Alex! — falo ao voltar de um rodopio. Ele segura a minha cintura e
pegamos o ritmo outra vez. — Não acredito que sabe dançar!
— Sei fazer várias coisas que você não sabe, menina bonita! — ele
murmura em meu ouvido.
Dançamos mais duas músicas. A última é Summertime Sadness, da
Lana Del Rey. Ele me puxa para tão perto que ofego. Tudo parece nos
envolver. Sinto o seu cheiro me invadir e pareço estar bêbada de uma luxúria
pecaminosa. Nossas bocas se aproximam quando Alex me ergue, tirando
meus pés do chão. Minhas pernas enlaçam seus quadris e praticamente
estamos transando na frente de todos, completamente envolvidos um no
outro.
— Você me deixou louco enquanto rebolava na porra daquele palco.
Está proibida de subir lá outra vez — ele fala, morde meu pescoço e volta a
encarar meus olhos. Meus lábios entreabertos estão próximos dos seus,
nossas respirações se misturam e bebemos ávidos um ao outro. Nosso desejo
é unir nossas bocas, mas parece que se fizermos isso, o encanto se quebrará.
Nossos corpos querem demais, almejam esse toque que nos leva a loucura.
Estou tão louca por ele, que estou a ponto de agarrá-lo ali mesmo,
quando sinto a evidência de que ele está bem afetado com a dança.
— Faz ideia do que é odiar, querer, sonhar e imaginar estar dentro de
alguém? — ele sussurra — Eu desejo você como se eu fosse um usuário de
drogas. Não posso te querer, Lana Mitchell, mas não consigo evitar.
— Também te quero, muito. — É a única resposta que posso dar nesse
momento. Não tenho porque negar que quero muito dar vazão a essa química
entre nós.
Ele me carrega por entre os outros dançarinos, me levando para um
canto escuro e reservado do clube noturno. Me vejo com as costas apoiadas
contra a parede, e sua boca na minha com paixão. Alex me coloca no chão e
se ajoelha diante de mim. Eu suspiro de antecipação. A saia curta do vestido
facilita seu acesso quando ele levanta um pouco e tira a calcinha, bem aqui!
Olho ao redor para ver se tem alguém olhando e fico mais tranquila que essa
área seja mais escura.
—Alex — chamo e sinto minhas pernas bambas.
—Segure nos meus ombros, Lana — ele ordena e cumpro de imediato.
Ele levanta a minha perna esquerda para seu ombro e afunda o rosto
direto no meu sexo, e só consigo gemer e aproveitar cada segundo.
— Alexander — ofego. — Ah, caramba!
Minha cabeça inclina para trás e solto um gemido desesperada,
querendo algo que nem sei o que é.
Ele chupa meu clitóris antes de continuar a provocá-lo com a ponta
dura da língua. Sua respiração é quente contra a minha carne e suas mãos
estão apertadas ao redor das minhas coxas.
Não quero que isso acabe nunca. Ele ergue a mão e desliza os dedos
para cima, colocando ao redor da minha entrada. Meu corpo enrijece no
momento em que ele desliza um dedo para dentro com facilidade. Estou
encharcada de puro tesão. Não acredito que ele me fará gozar aqui,
praticamente, na frente de todos. Ele me penetra em conjunto com a língua
pecaminosa. Lavas de puro fogo começam a se formar no meu baixo vente e
quero...
— Alex!!! — grito. — Eu... eu não...
Ele levanta e tira o cinto e desabotoa a calça. Vejo quando ele coloca o
preservativo e me ergue em seguida, puxando as minhas pernas ao redor da
sua cintura. Ele me preenche tão profundamente que grito, mas ninguém
parece nos ver, muito menos nos ouvir, ou eu estaria morta de vergonha.
Mas, e se alguém tirar uma foto?
— Ei! — Ele segura a minha nuca e levanta meu rosto quando sente
meu corpo tensionar. — O que foi?
— Ah, nada... — ofego. — Alguém...
— Não se preocupe, ninguém pode nos ver aqui. — Ele desce a boca
na minha e enrola nossas línguas em uma dança sensual. Esqueço de tudo ao
nosso redor e aproveito o prazer inebriante que ele me oferece...
Alexander
Eu a tomo com intensidade, com força, mas com cuidado, afinal,
estamos em um canto escuro da boate. Porra! Ela me enlouqueceu com a
merda da dança. Quando dei por mim, estava quase subindo e a tirando
daquele palco.
Lana me deixa enlouquecido. Ela goza gritando meu nome e sigo com
ela. Chego ao clímax tão rápido que mal consigo pensar de forma coerente.
Sinto uma quentura na coluna, que sobem pelo meu corpo como línguas de
fogo, e meus músculos apertam em êxtase. É como se eu fosse desmoronar
ali mesmo, mas me apoio contra a parede da boate e quase esmago Lana.
Porra!
A batida da música parece voltar com força total. Apoio quase todo
meu peso nela e a beijo outra vez. Minha necessidade por ela cresceu sem
que eu tivesse percebido. Depois de descobrir que ela não era tão
irresponsável quanto gosta de demonstrar, com sua atuação na ONG e o jeito
descontraído e encantador com que agiu no parque, o tesão começou a se
transformar nesse aperto em meu peito. Isso parecia ter quebrado a minha
resistência, aquilo que me mantinha afastado dela. Sei que ela também me
quer, que se derrete cada vez que a toco, mas não posso abrir o jogo com ela,
muito menos me deixar levar. E isso está me deixando louco.
Eu a coloco no chão e ajeito a sua roupa no lugar.
— Preciso ir ao banheiro — ela fala.
Eu enlaço a sua cintura e a conduzo para lá. Tem uma fila enorme e,
enquanto aguardo ao lado dela, ouço gracinhas das mulheres que esperam sua
vez de entrar.
— Vai entrar no banheiro feminino? — uma questiona. — Que
desperdício, o mundo está perdido mesmo!
— Acho que esse tem cara de macho e corpo também — outra fala,
dando uma conferida em mim. Faço cara de paisagem enquanto olho ao
redor. Mulheres!
Também preciso ir ao banheiro e, merda! Deveria ter trazido a Shirley
conosco. Mas, como a Lana sempre deixa de comunicar as coisas, isso
dificulta bastante o nosso trabalho.
Cinco minutos se passam e ela entra. Fico aguardando. Pela quantidade
de mulheres que entrou, sei que ela ainda vai enfrentar outra fila lá dentro.
Resolvo, então, ir ao banheiro também, mas tenho receio de perdê-la de vista.
Pego o telefone e ligo para ela.
— Já com saudades de mim?!
— Quero que fique aí dentro, até que eu te ligue de novo e peça para
você sair.
— Por quê?
— Porque estou pedindo, Lana! — falo e espero sua resposta
afirmativa.
—Tudo bem!
Desligo ao ouvir sua resposta e me apresso em direção ao banheiro
masculino.
Lana
Encaro minha imagem no espelho depois de usar a cabine e solto um
gemido. Meu cabelo está parecendo um ninho de vespas e meu rosto
vermelho. Nossa! Arrumo as mechas e reaplico o gloss. Em seguida molho
meus pulsos latejantes.
Alex me tira dos eixos.
Vou em direção à porta, mas paro quando me lembro que ele ainda não
ligou. Eu é que não vou ficar aqui dentro.
— Porque estou pedindo, Lana! — imito a voz de Alex quando abro a
porta do banheiro, dou uma olhada ao redor e não vejo nada além de
mulheres. Saio e olho no celular para ver se Alex ligou, mas nada. Aproveito
e ligo para Jules que deve estar perdido por aí.
— Oi, gata! — ele grita fazendo com que eu afaste o celular da orelha.
— Jules, qual o seu problema com esses gritos? Onde você está? Estou
indo para o bar, me encontra lá.
Caminho para dentro da boate e vou direto para o bar. Peço uma bebida
refrescante. Porque vou te contar, meu segurança “segura” de verdade. Esse
homem vira a minha cabeça!
Olho ao redor enquanto aguardo. Não vejo Jules, nem Alex. Onde eles
foram?
Minha bebida chega e pego o celular para ligar para Alex quando sinto
um corpo pressionar atrás de mim. De imediato eu sei que não é Alex.
— Olá, princesa — a voz fala e tento me virar de frente para o intruso,
porém sou impedida quando o homem atrás de mim pressiona algo duro nas
minhas costelas...
— Vamos dar um passeio princesa? — ele pergunta no meu ouvido.
Onde está a minha sombra quando mais preciso dela?
Sou levada em direção à saída. Ah, merda! Se eu sair, estou ferrada.
CAPÍTULO 14
Lana
Sinto um frio na espinha enquanto olho ao redor a procura de
Alex. Tento retardar o máximo que posso e ando devagar a frente da pessoa

que mantém a mão nas minhas costas.


— Ande mais depressa, princesa. Seu amigo não pode vir te salvar.
Não acredito nisso, Alex vai aparecer, não vai?
— Por que está fazendo isso? Deve estar enganado, moço. Pegou a
pessoa errada — falo, tentando não deixar o medo me dominar.
— Cale a boca e ande! — Ele dá um empurrãozinho nas minhas costas,
me impulsionando para frente e fazendo com que eu tropece. O celular está
vibrando na bolsinha de mão, onde o coloquei. Alex! Mas não posso atender.
Sou levada para fora, empurrada para um carro estacionado quase na
frente da boate e o medo agora é maior que tudo. Sei que dessa vez não é
uma simulação. O homem que está usando um boné, fazendo sombra no
rosto, comete a besteira de dar a volta no carro para o lado do motorista. Não
penso em nada além de fugir. Nem cogito a possibilidade de levar um tiro ou
coisa parecida. Abro a porta do carro e corro com todas as forças que consigo
colocar nas pernas. Tenho que entrar na casa noturna outra vez, mas sou
impedida de ir além quando me deparo com uma parede humana e começo a
me debater feito louca.
— Pare!
— Alex!
Eu o abraço com força, como se o penetrante aroma masculino familiar
despertasse algum instinto de preservação em meu íntimo. Por mais que eu
implicasse com a presença dos seguranças, me sinto protegida e sei que estou
segura com a presença de Alex.
Alexander
Merda! Todo mundo resolveu ir ao banheiro ao mesmo tempo?
Espero para entrar, impaciente. Não confio que a Lana vá obedecer a
uma ordem. Ela já provou ser indisciplinada há tempos. Depois de usar o
banheiro, volto para o banheiro feminino e ligo para Lana. Ela não atende.
Estou prestes a invadir, quando a porta se abre e as duas moças que estavam
antes na fila saem lá de dentro rindo.
— Veio me esperar, bonitão? — Uma delas ri.
— A garota que estava com você não te segurou? — A outra me
reconhece e faz a graça.
— Sabe dizer se ela está aí dentro? — pergunto.
— Não, já foi embora, mas eu posso...
Todos os meus instintos de proteção entram em alerta máximo.
Não ouço mais o que ela está falando. Volto para o salão, observo ao
redor e não vejo Lana em lugar algum. Volto a ligar, mas ela não atende. Que
merda! Ligo para Jules e, antes que comece a chamar, vejo um cabelo loiro
de relance na saída, merda... o que Lana está pensando ao sair sozinha?
Tem algo muito errado...
Percebo que ela não está sozinha e todos os pelos do meu corpo se
arrepiam com apreensão... Lana!
Sigo para fora o mais rápido que consigo no meio de tanta gente.
Quando chego à porta, paro para me situar e vejo Lana sair de um carro e
correr de volta para a casa noturna em desespero. Corro em sua direção e a
seguro firme quando ela atinge meu corpo.
De forma instintiva, ela se debate desesperadamente, mas minha
atenção não está nela. O cara que estava entrando no carro em que ela estava,
começa a vir na nossa direção, mas dá meia volta quando a vê comigo. Ele
entra no carro e sai em alta velocidade. Penso em ir atrás do filho da mãe,
mas Lana parece fora de si.
— Se acalme, Lana!
— Alex!
— Quem era aquele cara? — Não sei se ela saiu de boa vontade ou se
aquilo poderia ser a porra de um sequestro. Pela reação do cara, parece mais a
segunda opção.
— N... n... não sei! — Ela está tremendo. — Acho que ele estava
tentado me se... se...
— Mas que merda, Lana, eu pedi para ficar dentro do banheiro! Qual a
porra da parte que você não entendeu? — Seguro seu ombro, desejando
colocar um pouco de bom-senso naquela cabeça de vento. Merda! Ela
poderia estar longe agora, e ter se machucado por total imprudência.
— Desculpe — Ela chora convulsivamente. — Ele me abordou no bar
e...
Eu a abraço porque detesto ver mulher chorar, ainda que ela seja a
responsável por isso ter acontecido. Sinto raiva por não ter tido a chance de
ver quem era o cara que tentou levá-la. Eu a levo até o meu carro e me sento
no banco de trás com ela em meu colo, enquanto ligo para a minha equipe.
Sei que não será de muita ajuda, mas talvez tenhamos uma chance de pegar
algo que nos leve até a ele, em parceria com a polícia que está trabalhando no
caso. Ligo também ligo para o encarregado do caso e informo tudo o que
aconteceu. O detetive me prometeu vir até a casa noturna verificar as imagens
das câmeras de segurança. Pela distância — e com aquele boné — vai ser
difícil identificar, mas nada é impossível.
Nesse meio tempo Lana já parou de fungar. Eu a afasto do meu peito e
encaro seus olhos vermelhos.
— Você está bem? — Ela assente. — Onde está o seu amigo? Temos
que ir.
— N-não s-sei... — ela gagueja a resposta, quando penso em algo.
— Quem sabia que você ia estar aqui hoje, Lana? — Ou esse
sequestrador está nos seguindo durante todo o dia, ou ele sabia que ela estaria
aqui. Mas como?
— Não contei para ninguém, Alex, só falei com o Jules — ela fala com
a voz mais firme dessa vez.
— Tem certeza?
— Claro que sim! Eu nem mesmo tenho chance de estar com outras
pessoas, já que estou sempre acompanhada de seguranças.
— Nunca se sabe, Lana. Por favor, seja responsável pelo menos uma
vez e fale se conversou com mais alguém ao telefone — peço.
— Já falei que só conversei com o Jules. — Ela cruza os braços em
atitude defensiva — Desculpe, não pensei em nada quando saí do banheiro.
— As lágrimas deslizam por seu rosto outra vez. Ver a mimada Lana pedindo
desculpas já é meio caminho andado.
— Espero que isso sirva de lição — falo. Apesar do medo que senti,
não posso parecer muito bonzinho ou ela não levará nada a sério.
Deixo a conversa morrer por enquanto. Pego, então, o telefone e ligo
para Jules avisando da nossa partida. Ele diz que vai pegar um táxi para casa.
Dirijo para casa dos Mitchell em um silêncio desconfortável. Não sei se um
dia vou conseguir confiar nela. Se em algo tão bobo, ela falha, fico
imaginando como seria em outros aspectos.

Passo a noite em reunião com os policiais do caso. Tenho minhas


próprias conjecturas sobre o que aconteceu. O sequestrador deve ter acesso
aos passos de Lana através de alguém próximo. Afinal, ele foi direto à casa
noturna. Me mantive alerta e, apesar de ter passado o dia tranquilamente no
parque, como se estivesse de folga, estive sempre no comando.
No caminho para casa, algo me vem à cabeça. Se o Jules já sabia desde
a manhã onde eles iriam, será que ele não tem ligação com o ocorrido?
Resolvo investigar isso por conta própria, afinal a polícia está demorando
demais. Ligo para a empresa de detetives que às vezes presta serviços para
mim e informo sobre o ocorrido e as minhas suspeitas. A única dúvida é: qual
a ligação de Jules com Mitchell? Não vejo nenhuma, mas nem sempre as
coisas são óbvias.
Tenho certeza de que vou descobrir.
Os policiais que estão envolvidos no caso, disseram que provavelmente
o sequestrador vê em Lana o membro de mais fácil acesso da família.
De qualquer maneira tenho que esperar uma resposta.
Mas esse filho da puta não vai conseguir pegá-la. Não mesmo. Só por
cima do meu cadáver!
No dia seguinte...
— Você perdeu a garota? — grito furioso ao telefone com o imbecil
que contratei. — Será que você não faz nada certo? Qual a dificuldade de
pegar uma garota?
— Ela não desgrudou do segurança — ele responde. — Só tive uma
chance e não consegui levá-la comigo. A filha da mãe é mais esperta do que
imaginei.
— Conhece a frase “Não subestime o seu inimigo?” Será que eu
mesmo tenho que fazer isso? — esbravejo. — Vou te dar uma nova chance.
Resolva isso. Precisamos nos encontrar.
Não quero tratar disso por telefone, tenho deixado rastros demais.
Não posso mais errar.
Lana
Nas semanas seguintes me mantenho totalmente isolada das pessoas.
Acho que todo mundo é um sequestrador em potencial e me sinto assustada
com coisas simples do dia a dia. Tenho ido a CASM, como sempre, embora
sem o mesmo entusiasmo. É como se aquela noite não saísse da minha
cabeça, ainda que eu tivesse um segurança sempre comigo. Geralmente é
Alex quem está comigo, embora algumas vezes ele precise me deixar com
outra pessoa. Mas aquele dia mudou algo na nossa relação. Estamos
mantendo um relacionamento estranho, mas bom.
Tenho ficado mais na casa dele do que na minha, embora eu não saiba
onde tudo isso vai dar. Não consigo visualizar um futuro onde estejamos
juntos, já que parecemos ser o casal mais improvável que existe.
A cada dia que passa, me apaixono mais. Só não sei se ele se sente da
mesma forma. E, apesar de tentarmos não demonstrar que estamos
envolvidos, a relação cliente-segurança foi quebrada e a minha mãe percebeu.
— O que há entre você e o sr. Marshall, filha? — ela pergunta em uma
das raras vezes que nos encontramos naqueles dias.
— Nada — digo vermelha. Mesmo negando, minha cara me
denunciava.
— Você não sabe mentir, filha — ela ri da minha reação encabulada.
— Vejo o modo como se olham quando pensam que ninguém está olhando.
Só tenha cuidado. Alexander é um homem vivido e você, por mais que se
ache madura, não sabe nada da vida, Lana.
Fico calada. Sei que ela tem razão... afinal, o que eu sei da vida além da
bolha de vidro em que vivo?
Por mais inconcebível e inacreditável que possa parecer, nós dois
estamos tendo uma convivência pacífica. Aproveitamos cada momento juntos
e não implicamos mais tanto um com o outro.
Mesmo no dia em que Alex questionou a respeito da minha amizade
com Jules, fiquei quieta. Ainda que eu não tenha gostado de que ele
questionasse a minha confiança no meu amigo. Não acredito que Jules tenha
algo a ver com essas ameaças contra o meu pai. Os bilhetes que meu pai
recebeu relacionavam o sequestro aos negócios, e Jules é só um estudante.
Não temos nenhum amigo mafioso ou coisa do tipo. Sei que ele tem de
questionar todas as probabilidades, mas isso?
Falo para Alex procurar outro suspeito e não digo nada para Jules. Não
quero meu amigo constrangido por essas desconfianças.
Naquele dia, em particular, algo estranho acontece. Tem um novo aluno
na minha turma e se eu fosse uma pessoa mais esperta e desconfiada, teria
percebido algo errado. O rapaz se senta perto de mim e começa a puxar
conversa comigo, jogando charme, embora eu não dê muita atenção para ele.
Quando saio da classe, mais tarde, e vou para a aula de dança, acabo me
esquecendo daquilo.
Diariamente, Daniel continua a puxar conversa comigo e a se sentar ao
meu lado. Se passaram apenas três dias que ele entrou na turma, mas age
comigo cheio de intimidade. Quem me acompanha para a faculdade é
Shirley, que fica sempre do lado de fora da sala me esperando. Mas no
intervalo de uma das aulas eu saio e não a vejo como sempre. Olho ao redor a
sua procura e nada. Droga, onde ela foi?
Estou ligando para ela, quando Daniel aparece ao meu lado.
— Oi — diz com um sorriso. — Algum problema?
— Não! — O telefone da Shirley toca e ela não atende. Mas que droga,
onde ela está? Fico apreensiva. Desde aquele dia na boate, ficar desprotegida
causa suores frios por minha espinha. Tudo bem, Lana, você está dentro do
campus, nada de mal pode acontecer com você aqui.
— Você não parece bem — Daniel fala. — Vamos sentar ali? — Ele
aponta um banco de pedra. Não me sinto segura de ir onde quer que seja com
ninguém.
Me sento no banco e ele se acomoda ao meu lado, perguntando o que
estou sentindo. Me concentro em ligar para Alex ou qualquer outro segurança
que me atenda.
— Vou pegar uma água para você. Fique aqui, ok? — Daniel se levanta
e vai em direção à cantina do campus. Faço a segunda ligação para Alex, que
me atende de imediato.
— Lana — diz.
— Alex! A Shirley não está aqui — falo e percebo a minha voz
trêmula. Poxa vida, me tornei uma boba mesmo!
— Como não está aí, Lana? — Ele parece apreensivo. — Onde você
está? Está dentro da faculdade? Vá para um lugar seguro, agora!
— Estou no pátio...
— Vá, Lana! Estarei aí, no máximo, em meia hora — ele ordena outra
vez, e desligo, me levantando para seguir sua ordem, quando Daniel volta
com uma garrafa de água.
— Aqui. Está melhor? — Ele me entrega a garrafa. — Beba um pouco,
vai se sentir melhor. — Abro, tomo um gole e dou um sorriso de
agradecimento a ele.
— Obrigada, Daniel, até mais...
— Está indo aonde? Eu te acompanho. — Ele segue ao meu lado.
Bebo mais água e sinto a língua engrossar, os passos ficarem lentos e as
pernas pesadas...
— Você não parece bem, Lana. — A voz de Daniel soa longe. A última
coisa que me lembro é de ele me segurar.
Alexander

No caminho para a faculdade de Lana, tento falar com a Shirley, mas


ela não atende. Sei que ela está fora de combate, já que nunca deixa de
atender de imediato. Só espero que quando chegar lá não seja tarde demais.
Ligo para Lana de novo, e vai para a caixa postal. Merda!
CAPÍTULO 15
Alexander
Quando chego à faculdade, sei que é tarde demais. Lana foi

levada. Falhei com ela e com seus pais. Estou tão furioso que se eu pegar esse

filho da mãe sou capaz de mata-lo com requintes de crueldade. No entanto,

sou chamado à realidade. Tenho que manter a frieza e pensar em uma forma

de resgatar minha Lana.


Não saber para que lado ela foi levada me deixa gelado. Peço acesso às
câmeras de segurança do campus. Não consigo contato com Shirley e a
polícia chega de forma discreta, começando as buscas. Continuo tentando
ligar para o seu celular que permanece desligado, o que me deixa cada vez
mais preocupado.
As imagens das câmeras não dão pistas de Lana. Quem a levou sabia
exatamente onde as câmeras estavam e evitou, de todas as formas, ser
flagrado por elas.
Deixo a polícia no campus e vou falar com o sr. Mitchell. Ele está
desesperado pela filha — na verdade, toda família está — e sinto por não ter
sido eficiente em meu trabalho e deixado isso acontecer. Não devia ter
permitido que ela ficasse com outras pessoas, sabendo que era o foco do
canalha maldito que está atrás do pai dela.
Shirley é encontrada desacordada com uma pancada na cabeça dentro
de um banheiro desativado e é levada para o hospital, mas não tive tempo
para falar com ela.
Passo boa parte do dia em uma reunião em que reunimos todas as pistas
que encontramos. Não consigo deixar de pensar que negligenciei sua
segurança desde que começamos a ter um caso. Por isso não me relaciono no
trabalho. Perdemos o foco do que realmente importa, que é a segurança dos
nossos clientes. Quando fazemos isso, nos deixamos levar por sentimentos e
acabamos como agora: uma pessoa sequestrada por um lapso da minha parte.
Ao fim do dia, meu humor está péssimo e tudo o que quero é sair e
procurá-la por conta própria. E é o que vou fazer. Esperar que um
sequestrador ligue quando bem entender é demais para o meu equilíbrio. Ligo
para todos os meus antigos colegas que atuavam na área de resgate e
montamos uma estratégia de caçada. Esses sequestradores filhos da mãe não
vão sair ilesos. Não mesmo.
Amanhece e finalmente temos um nome: um bandido local, que já é
conhecido da polícia. O cara de boné que tentou levar Lana na casa noturna e
o segundo cara da filmagem do campus podem ser da mesma quadrilha. A
polícia descobriu que o homem que levou Lana tinha se passado por aluno,
por isso teve acesso tão fácil a ela. Filho da puta. Algumas pessoas a viram
com ele antes de sumir. Tenho certeza de que esses caras não são os mesmos
que estavam atrás de Mitchell, mas não encontro sinal dos dois. Eles haviam
sumido do mapa e sabíamos que eles não apareceriam, agora, de jeito
nenhum.
Por volta do meio dia, Mitchell recebe a primeira ligação dos
sequestradores exigindo que ele não chame a polícia. Isso é algo clássico em
casos de sequestro — uma forma de deixar a família psicologicamente
transtornada. Não conseguimos localizar de onde o cara ligou e fico ainda
mais louco.
Tenho uma equipe preparada para agir a qualquer momento, só preciso
localizar o celular da Lana, mas com certeza o cara o desligou.
Jules
A tensão me envolve ao saber que a minha melhor amiga está nas mãos
de criminosos. Ela é uma pessoa maravilhosa, linda por dentro e por fora, e se
acontecer algo com ela vai acabar comigo.
Alex, o segurança com quem ela vive aos trancos e barrancos, parece
um tigre enjaulado, enquanto aguarda notícias. Todas as pessoas que
mantiveram contato com ela foram interrogadas pela polícia e eu fui o
primeiro a ser ouvido, apesar de não entender o porquê.
Já se passaram mais de vinte e quatro horas que ela sumiu e nem um
rastro foi deixado.
Estou prestes a sair para ir a casa de Lana para descobrir se eles tiveram
novidades. Entro no carro e, enquanto estou colocando o cinto de segurança,
meu pai para o carro ao lado do meu. Coloco a mão na maçaneta, mas paro
ao vê-lo descer do carro falando ao telefone. Ele não consegue me ver, por
causa da película escura, mas eu o vejo parecendo furioso. Em poucos
minutos, ele desliga o celular e bate a porta do carro com raiva. Congelo no
banco do motorista enquanto observo o meu pai. Não me recordo de já tê-lo
visto tão nervoso assim. Um homem entra na garagem e vai em sua direção.
— O que faz na minha casa? — ele questiona alterado.
— Eu ligo e você não atende. — O homem está visivelmente mal-
humorado. — Meu pagamento...
— Aqui não é o lugar — meu pai o interrompe e segura em seu braço,
o puxando para fora da garagem. Abro um pouco o vidro para tentar ouvir,
mas os dois já não estão mais ali.
Ligo o carro e saio da vaga. Quando manobro o carro, vejo meu pai me
encarar na saída de veículos e percebo o choque em seu semblante por ter
concluído que eu estava ali o tempo todo. Não paro. Saio do prédio e sigo
para a casa da minha amiga, pensando no que vi na garagem. Meu pai parece
dever ao homem, que foi cobrar. Estamos passando por uma crise financeira
e meu pai alega ter perdido um grande negócio para a concorrência e, por
isso, tem perdido muito dinheiro. Segundo ele, esse negócio teria tirado nossa
empresa do vermelho.
Chego à casa de Lana e demoro um bom tempo para ser autorizado a
entrar. Alexander está na sala com os pais de Lana e entro, em busca de
notícias da minha amiga.
Alex se aproxima e me cumprimenta. Não sou muito fã do cara, mas
vejo que ele não dormiu essa noite. Sei que eles estão de “rolo”, e isso tudo
deve estar o deixando preocupado. Seus olhos verdes estão vermelhos, e ele
não para quieto um minuto com o telefone na orelha.
— Tem certeza, Bruno? — Eu o ouço falar. — Quanto tempo? Certo,
chame os caras. Vamos lá agora. — Ele desliga o celular e vai para a sala
onde fica a equipe de segurança. Vou atrás dele para saber o que está
acontecendo e fico na porta, ouvindo a conversa.
— A equipe do Mauro descobriu um possível cativeiro. Estou indo para
lá, fica...
Meu olhar se desvia para os monitores da sala e eu me desligo do que
ele fala. As imagens passam repetidas vezes. É do cara que, provavelmente, a
sequestrou. É a imagem daquela noite, na casa noturna, há algumas semanas.
Tenho quase certeza de que o conheço. Não exatamente ele — mas o boné.
Na verdade, acabei de vê-lo na garagem do meu prédio, conversando com o
meu pai.
Como um sequestrador pode ter ligação com o meu pai? O que será que
ele tem a ver com esse cara?
Preciso me concentrar. Um boné não é prova suficiente contra alguém.
Tenho que ir com calma e descobrir algo mais concreto.
— O que está fazendo aí, Jules? — Alex, que neste momento está
enfiando armas por tudo que é bolso, me vê na porta com cara de espanto.
— Nada. — Será que devo contar a ele? Mas e se prejudicar o meu pai?
— Só queria saber se já tem uma pista do sequestrador — disfarço.
— Não.
— E vocês estão indo para onde?
— Vou checar uma coisa. Não quero alarde, pode ser alarme falso. —
Ele me encara ao passar por mim. Resolvo dizer o que vi. Minha amiga é
mais importante que qualquer outra coisa.
— Preciso falar com você — digo para Alex.
— Estou de saída, Jules. Isso não pode esperar? — Ele parece muito
calmo, mas sei que não está. Deve ser difícil não surtar.
— É muito importante. É sobre esse cara das imagens. — Isso é o
suficiente para Alex me empurrar para a sala e fechar a porta.
— Você conhece esse cara, Jules? E escondeu esse fato de nós esse
tempo todo? Tem contato com ele? — A calma de antes desapareceu. Parece
que as veias do pescoço dele vão explodir.
— Calma aí, cara — falo. — Não tenho nada a ver com esse bandido,
mas meu pai pode ter. — É difícil falar isso. Por mais atrito que eu tenha com
o meu pai, será um golpe se for confirmado que ele tem associação com esses
bandidos. Conto para Alexander o que vi na garagem. Mal termino de falar e
ele já está no telefone, fazendo ligações.
Ele parece meio louco! Mas, ao menos, ele se importa com a minha
amiga que, nesse momento, deve estar passando por maus bocados!
Alexander
A informação de Jules pode não ser relevante, mas preciso descobrir se
o pai dele tem ligação com o sequestrador. Ligo para Mauro — que contratei
para ajudar com o caso. Montamos uma linha de raciocínio que jamais levaria
ao pai de Jules, caso ele seja inimigo de Mitchell.
Recebemos a informação de que Lana poderia ter sido levada por
criminosos ligados ao tráfico de pessoas, no entanto isso pode ter sido
plantado para despistar do alvo. Meu pessoal foi verificar a possibilidade do
envolvimento do pai de Jules no caso, e eu fiquei para conversar com
Mitchell. Todas as possibilidades precisam ser investigadas.
— Que tipo de negócios o senhor tem com Andreas Fontes? —
pergunto ao me sentar no escritório dele.
— Já tive negócios com ele há muito tempo. Recentemente, estivemos
em uma concorrência e só. Já fomos amigos, mas o Fontes passou a ser um
concorrente direto e isso fez com que nos afastássemos.
— Acha que ele pode ser um inimigo? — sondo. Não posso dizer nada
sem ter a confirmação do envolvimento do homem nas ameaças. Ainda que
as características dos bilhetes levem a esses indícios. — Essa concorrência
que você falou...
— Minha empresa ganhou a licitação que concorríamos. Não temos
tanto contato assim. Há algumas semanas ele esteve aqui, em um jantar, onde
discuti parceria com alguns empresários e ele acabou aparecendo de última
hora — Mitchell diz. — Acha que ele pode ter algo a ver com tudo isso?
— É uma possibilidade. Gostaria que você me falasse tudo o que sabe a
respeito dele.
— Mas porque está suspeitando dele?
— Bem... o Jules reconheceu um dos caras das imagens. Ele disse que
um dos homens estava conversando com o pai, hoje. — falo, mesmo dizendo
a mim mesmo para esperar. Mas a minha preocupação com Lana é maior que
qualquer coisa. Mitchell fica pálido.
— Você acha que o Jules pode estar envolvido com o pai para atrair
minha filha a uma emboscada? Essa amizade deles é muito estranha... tem
horas que acho que são namorados de tanto que ficam juntos. — Trinco os
dentes ao pensar que a maioria das pessoas acha o mesmo a respeito deles
dois. — Até pensei que os dois poderiam se casar um dia.
O quê?
— Acho que não, Mitchell — digo com cara de poucos amigos e ele
me olha surpreso. — A Lana não pensa em se casar — respondo menos
furioso dessa vez. — Estou trabalhando para trazê-la de volta para casa.
— Você conversa muito com a minha filha? — Mitchell me observa
com ar suspeito.
Será que demonstrei meu interesse por ela? Que se dane, não tenho
medo dele. Mas isso não tinha importância agora.
Onde está você, pequena encrenqueira? A preocupação está me
matando aos poucos.
Uma hora depois de conversar com Mitchell, passo as informações à
polícia, que começa a investigar, ainda que ele não acredite que Fontes possa
ser um potencial inimigo.
O cara que Jules viu com o pai não foi encontrado. Fontes também
sumiu. Se ele é nosso homem não será idiota de esperar que a polícia caia em
cima dele. A razão de ele sequestrar Mitchell e, depois, Lana é muito torpe.
Dinheiro? Ou ele queria outra coisa que não percebi ainda?
A beira da falência e com credores atrás dele, talvez Fontes talvez
esteja irritado por Mitchell ter ganhado a licitação há alguns meses, e por isso
não conseguiu se reerguer financeiramente. Se for isso mesmo, vou acabar
com o imbecil por ferir pessoas inocentes.
O dia já está terminando quando recebemos um sinal do celular de
Lana, foi breve, no entanto nos deu uma direção de onde focar nossa busca.
Estou indo buscar você, Lana!
Lana

Ao abrir os olhos, sinto a cabeça doer... parece que vai explodir. Estou
com náusea e tontura. Meu corpo está muito gelado e treme de uma maneira
estranha. Viro a cabeça e vejo o colchonete em que estou deitada, apesar da
escuridão. Sentindo o cheiro de mofo, tento me sentar. Jamais imaginei que
algo assim pudesse acontecer comigo. As lágrimas deslizam pelo meu rosto,
enquanto começo a lembrar do que aconteceu.
Tentei ligar para Alex e Daniel me ofereceu água... e, depois, não me
lembro de mais nada.
Será que ele me dopou? Mas, como? Eu mesma abri a garrafa. Como
Daniel colocou algo lá dentro? Minha cabeça dói e deixo isso de lado. Não
adianta tentar entender o que não tem mais jeito. O que eu preciso é arrumar
um jeito de fugir daqui. Tento me levantar e descubro que estou com as mãos
amarradas. Tateio no escuro e vejo que não estão tão apertadas. Então, puxo
com o máximo de força que consigo. Machuco as mãos, mas continuo
tentando me soltar. Me sinto grogue, o corpo pesado e meus movimentos
lentos. O lugar parece me sufocar mas, aos poucos, meu cérebro está
voltando a funcionar de novo. Meu coração está acelerado e descompassado.
Agora entendo o porquê de não ficar à vontade com Daniel. Era o meu
subconsciente me alertando de alguma forma. Eu devia ter dado mais atenção
aos meus instintos.
Não sei quanto tempo se passou desde que cheguei aqui, mas estou com
a garganta seca e ferida. Sinto muita sede. Me levanto, trôpega, e tateio as
paredes até encontrar uma porta. Forço a maçaneta, que não abre. Será que
Alexander ou outra pessoa está a minha procura? Tomara que ele não pense
que fugi por capricho. Sinto mais lágrimas se formarem, mas as seguro.
Preciso ser forte. Me inclino contra a parede e minhas pernas parecem de
gelatina quando escorrego até o chão. Apoio a cabeça no joelho e espero. Não
ouço qualquer ruído e o medo — por mais que eu tente mantê-lo afastado,
ameaça me dominar.
Quando penso que me esqueceram aqui, ouço passos do lado de fora da
porta. Pouco depois, ela é aberta e uma sombra se projeta. A luz de fora
clareia o quarto me cegando. Demoro a conseguir recuperar a visão e, quando
consigo, olho ao redor a procura de uma saída. Não vejo nada a não ser uma
janela no alto. O lugar parece velho e tudo indica que estou em uma espécie
de cabana. O quanto estou longe de casa?
— Vejo que a princesa acordou — diz o homem na porta. — Dessa vez
não conseguiu fugir, não é, espertinha?
Reconheço a voz! É o mesmo que tentou me sequestrar na casa
noturna. Mas seu rosto estava coberto por uma touca ninja preta de malha.
Tenho certeza de que o estranho pode ouvir meu coração, que bate
violentamente no peito. Consegui soltar as mãos da corda, mas as mantenho
juntas.
— Hora de comer, princesa. Queremos você viva e bem, por enquanto
— ele diz e deixa uma bandeja com alimentos no chão, perto de mim. Quero
gritar, mas a minha voz não sai.
Assim como apareceu, ele vai embora. Permaneço no lugar, sem saber
o que fazer. A escuridão envolve tudo outra vez e eu me arrasto até a bandeja
atrás de algo para beber. Encontro um copo e, sem me preocupar com o que
tem dentro, bebo de uma vez.
Levanto e vou até a janela Tento abri-la, mas é em vão, pois está
trancada. Que droga! Como vou sair daqui?
O que ele quis dizer com me querer viva por enquanto? Eles não vão
me matar se querem algo do meu pai. Volto para porta. Tento outra vez e
nada. Ouço vozes alteradas do lado de fora, mas não consigo distinguir nada
do que estão falando. Não sei quanto tempo se passou desde que me levaram
do campus. Só me resta esperar.
Ah, Alex! Sinto falta da sua presença sempre constante nessas últimas
semanas. E como será que a minha mãe está? Ela ficou muito mal quando
meu pai foi sequestrado. As lágrimas voltam e eu me deito encolhida. Sinto
muito frio e não tenho nada com que me cobrir.
Quando acordo parece ser dia, pois está mais claro. Sinto muita vontade
de ir ao banheiro. Me levanto e começo a bater na porta, me sentindo fraca.
Ouço passos e me afasto da porta que se abre. Um homem surge.
— Se a princesa não parar de fazer essa porra de barulho, vou arrancar
sua mão fora e mandar para seu papai, garota estúpida! — ele esbraveja.
— Preciso ir ao banheiro — digo e fico satisfeita que minha voz sai
firme.
— Sinto informar, princesa, aqui não é um hotel cinco estrelas — ele
continua com a máscara preta no rosto. — É melhor ficar quietinha aí. E não
me faça voltar.
Ele fecha a porta e percebo que vou ter que fazer xixi aqui mesmo. Que
merda! Onde está o Alex quando preciso dele? Sem outra opção, faço minhas
necessidades no canto, enquanto as lágrimas escorrem pelo meu rosto...
Alexander
Paro o carro longe da cabana e começo a caminhar por entre arbustos e
árvores. O sinal que o celular de Lana emitiu veio dessa parte, e como é no
campo e fora da cidade, procurávamos algum lugar habitável. Ali será o
próximo lugar que vamos abordar. Nenhuma das casas que fomos era o
cativeiro, então tem que ser essa.
Sigo pelo meio do mato e observo alguma movimentação. Quando
chego perto da casa, vejo um cara fumando do lado de fora. Vim
acompanhado de uma equipe que, nesse momento, tem um cerco fechado na
propriedade. Chego o mais perto possível e tento atrair o cara para mim. Faço
um barulhinho suficiente para que ele ouça e atinjo meu objetivo.
Ele sai da varanda e vem na minha direção...
CAPÍTULO 16

Deixo o carro em ponto morto. Ele desliza na pequena inclinação


e eu o desligo. Bato o punho no volante. A sorte não está mesmo a meu favor.

Pego um binóculo de visão noturna e observo a pequena cabana. Vi quando

os carros passaram por mim em um trecho da estrada quando fiz uma

parada. Ainda bem que decidi parar ou agora seria pego pelos homens

contratados por Mitchell.


Depois que passaram por mim, eu os segui devagar para não chamar
atenção. Sabia que isso podia acontecer, mas não achei que seria tão breve.
Aquele segurança idiota está redobrando os esforços atrás da garota porque,
provavelmente, está apaixonado por ela. Isso é péssimo. Ele não pode ficar
em meu caminho, nem atrapalhar meus planos. Que droga!
Observo a movimentação da cabana, sei que eles a tomaram e que os
homens que contratei estão fora de combate. Preciso sair fora daqui antes
que seja associado a eles. No entanto, meu filho me viu hoje com o
incompetente que foi contratado para executar esse serviço, e isso é outra
coisa que vou ter de resolver. Juliano é um imbecil e pode colocar tudo a
perder. Mais uma vez, meus planos de colocar o filho da puta do Mitchell
sob meu controle estão se esvaindo. Quero resolver os problemas da minha
empresa e que ele pague caro por isso. O resgate da filha seria o suficiente
para tirar a empresa do vermelho... mas essa oportunidade está deslizando
por entre meus dedos mais uma vez. Será que tenho de tomar medidas mais
drásticas? Não vou deixar isso acabar assim. Tenho que tirar esse segurança
intrometido do meu caminho.
Acertas as contas com Mitchell é, agora, questão de honra. Se eu vou
para a bancarrota ele também vai, de alguma forma.
Pego a arma no banco de trás do carro e espero...
Alexander
O cara se aproxima o suficiente para que eu possa atacá-lo de surpresa,
parto para cima dele, antes que possa chamar a atenção de outros possíveis
comparsas, e o tenho nocauteado com uma coronhada em sua têmpora. Esse
não parece com nenhum dos dois que estamos atrás, deve haver mais caras lá
dentro se esse for o lugar que minha Lana está. Passo uma mensagem da
localização do cara para os meus homens e corro agachado para lateral da
casa. Escuto atento a algum barulho que indica se há outros lá dentro. A
pequena cabana tem apenas uma entrada, sinto que Lana está aqui. Torço a
maçaneta da porta me esgueirando com cuidado, empurro devagar e dou com
uma sala onde tem outro cara recostado em um sofá velho mexendo no
aparelho celular, parece concentrado no que está fazendo, aponto minha arma
para sua cabeça.
— Onde ela está? — digo e o homem salta da sua posição relaxada e
tenta pegar uma arma, que se encontra ao lado dele, no sofá. — Se eu fosse
você, não faria isso. Onde ela está?
Ele não responde enquanto me aproximo cada vez mais dele. Faço sinal
para que se afaste da arma e, enquanto ele vacila um pouco, eu uso, outra vez,
minha arma para nocautear mais um idiota. Ele cai pesadamente no chão, não
perco tempo, deixo o bandido inconsciente e começo a vasculhar a casa a
procura de Lana.
O pai de Jules pode ser o maldito sequestrador ou o "cabeça" de toda a
operação, na verdade ele sumiu, provavelmente, depois que percebeu que
Jules o pegou em posição suspeita. Quando os investigadores foram em sua
casa, ele não estava e sua esposa não sabia de seu paradeiro, Jules tampouco.
No entanto é uma questão de tempo até termos as mãos sobre ele, mas o cara
é esperto, certamente deu ordem para que o serviço seja feito e se
comprometeu o mínimo possível.
Vou até um cômodo fechado e percebo que a porta está trancada, não
perco tempo e chuto a porta que bate no canto jogando lascas de madeira
velha para os lados. Um grito agudo irrompe dentro do quarto pouco
iluminado, raiva borbulha dentro de mim ao me deparar com Lana em um
canto encurralada. Minha Lana não tem medo de nada e vê-la assim é
revoltante.
— Lana?! — chamo baixinho.
Ela está toda esfarrapada e descabelada. Dois dias, praticamente, e não
há quase nada da minha Lana patricinha nessa garota de rosto assustado.
Lana
Estou apavorada quando escuto barulhos lá fora, estou perdida nessa
escuridão e a única coisa que posso fazer é sentar e esperar, não tenho saída.
Enrolo meus braços ao redor de mim mesma e torço que não seja nada
demais, fiz de tudo para encontrar uma saída daqui, mas a porta se mantêm
trancada. A porta explode para dentro e eu grito estridentemente, não
reconheço de imediato a figura alta e larga na porta, mas ouço sua voz forte
chamar meu nome. A próxima coisa que sinto são braços fortes me
envolverem em um abraço tão apertado que sinto meu pulmão arder por
causa do meu fôlego contido. Levantei e corri para ele e nem percebi ter feito
isso.
— Alexander... — minha voz sai em um suspiro inaudível e começo a
chorar, compulsivamente, de alívio quando, enfim, sei que estou segura outra
vez.
— Você está bem, Lana? — O cuidado no timbre da voz de Alex me
deixa ainda mais chorosa. — Vamos tirar você daqui, está ferida?
— N-não. Só tenho muita fome, eles não me deram comida e sinto-me
fraca por estar a tanto tempo sem me alimentar — Ele não diz nada, em vez
disso, pega um telefone e fala com alguém.
— C-como entrou aqui, Alex? — Será que ele matou os homens que
me trouxeram para cá?
— Venha... — ele me ergue nos braços e deposita um beijo na minha
têmpora, seguindo para fora do quarto.
Vejo um corpo desacordado e vários outros homens ao redor da sala,
mas Alex não se detêm. Ele caminha para fora da sala em direção, do que
imagino ser, a saída. Enterro meu rosto no pescoço dele, inalo seu cheiro e
me aperto ainda mais junto ao seu corpo, nesse momento tudo parece
explodir ao redor. Alex gira o corpo de volta, como se fosse voltar para
dentro, contudo ele se joga no chão e caio por cima dele, em um movimento
rápido gira e cobre meu corpo com o seu.
Isso são tiros?
— Alex! — choramingo em agonia, alguém está tentando nos matar?
— O que está acontecendo?
— Fique quieta, Lana! — Escuto pessoas correndo e percebo que tem
carros parados na frente da casa e é onde Alex nos mantém no chão, atrás de
um carro. Instantes depois escuto pneus guinchando e tiros são disparados
dos homens que vieram de dentro da casa. O corpo de Alex começa a
desmoronar por cima de mim e sinto uma umidade na minha mão que está
encostada em seu peito.
— Alex! — Entro em pânico quando sinto o peso dele em cima de
mim. — Você está bem? — Meu estômago despenca ainda mais com sua
expressão de dor.
— Tudo bem, foi só um arranhão — claro que não, pela quantidade de
sangue que sinto em suas roupas — estou bem — sussurra.
Começo a gritar por socorro, pois não consigo me mexer embaixo dele.
As coisas acontecem em câmera lenta a partir dali, os homens que vi na casa
e outros, todos com roupas escuras, tiram Alex de cima de mim e começam a
latir ordens, enquanto examinam o ferimento em Alex. Tremo
descontroladamente e a angustia me toma por saber que ele se feriu por
minha causa e para me proteger de levar um tiro, sei que era para mim.
Observo Alex, que se mantém consciente e olhando fixo em meus
olhos e ouço um dos homens dizer que ele precisa de um hospital.
Tudo passa a acontecer e me sinto isolada me mantendo concentrada
apenas em Alex, tenho a atenção roubada com o solavanco do carro que nos
leva ao hospital dá passando por buracos. O ferimento de Alex é no braço,
porém a bala rompeu, provavelmente, alguma artéria e por isso tanto sangue.
Seus amigos fizeram um torniquete e fazem pressão no ferimento, sei que se
demorarmos muito a chegar a um hospital, e o sangramento não parar, ele
ficará em perigo.
Não sou de muita valia, mas Alex segurava minha mão e vejo seu
esforço para continuar consciente. Claro que seus amigos tinham feito todo
um trabalho de primeiros socorros. A única coisa que eu faço é rezar para que
ele fique bem, não quero pensar que se feriu por minha causa, por minha
imprudência. Lágrimas ainda caem do meu rosto quando penso que nunca se
pode apreciar a enormidade e a raridade da felicidade sem passarmos por algo
ruim em nossas vidas. No entanto, tão injusto quanto possa ser isso, às vezes,
é necessário para obtermos responsabilidade por nós mesmo e não culpar
quem quer que seja. Eu sou uma pessoa que não passei por nada na minha
vida que me fizesse pensar e refletir minhas atitudes até então. Agora eu não
sei mais quem sou realmente...
Não demoramos muito a chegar ao hospital e somos todos levados a
emergência. Sinto meu corpo entrar em colapso, minha mente vai se
esvaindo, sou atendida por uma equipe e caio em um sono profundo, depois
que aplicam alguma coisa em meu braço.
CAPÍTULO 17
Alexander
Quando ouço os tiros meu coração se aperta e meu primeiro

pensamento é na integridade física da Lana. Sinto algo queimar em meu

braço e tenho certeza de que fui atingido quando caio no chão amortecendo o

corpo dela. Deitados, eu giro e a cubro com meu corpo. Vejo quando os caras

saem de dentro da cabana e revidam os disparos. Quem poderia estar atirando

e de onde? Havíamos percorrido todo o caminho e não vimos nada de

suspeito no entorno da casa. Sinto o ferimento começar a encharcar a minha

roupa e torço para que tenha sido só de raspão.


Meu foco total está em Lana. Seguro a sua mão por todo o caminho até
o hospital. Procuro saber quem estava efetuando os disparos, mas o cara se
mandou. Uma equipe da polícia está atrás dele, mas me sinto frustrado. Esse
cara está fazendo a todos nós de palhaço. Não conseguimos colocar a mão
nele. Nem mesmo a polícia. Isso é inaceitável!
Sinto a consciência ir e vir e tento me manter focado ao chegar no
hospital. Me levam para a emergência. Protesto, dizendo que não quero ser
anestesiado para não me sentir mal e deixar Lana sozinha de novo, mas acabo
apagando.
CAPÍTULO 18
Lana
Quando acordo no hospital, encontro minha mãe ao lado da minha
cama com os olhos vermelhos.
— Oi, mãe — sussurro e sinto a garganta dolorida. Olho para os lados a
procura de algo para beber.
— Como está se sentindo, meu amor? — A voz dela é carinhosa. —
Você dormiu tanto.
— Por quanto tempo? Onde está o Alex, mãe? — Minha cabeça
fervilha com tantas perguntas e me sinto tonta.
— Um dia inteiro, querida. — Ela pega um copo e o estende para mim.
Bebo alguns goles enquanto espero respostas sobre Alex, mas parece que ela
não tem pressa em falar.
— Mãe, onde está o Alex? — pergunto outra vez, impaciente.
— Ele já recebeu alta, querida e, provavelmente, está trabalhando com
a polícia atrás do bandido que sequestrou você.
— Ele estava bem para voltar ao trabalho? — Minha mãe me olha de
um jeito estranho e disfarço a preocupação com Alex. Mas nem sei se adianta
tentar disfarçar, já que ela sabe a nosso respeito.
Me sinto apavorada com a possibilidade de cair de novo nas mãos de
bandidos sem que Alex esteja aqui comigo.
— Sim. Duas pessoas foram presas. Agora estão atrás do chefe deles.
— Minha mãe parece visivelmente abalada. — Não sei quem quer fazer mal
a nossa família... mas não se preocupe com isso, filha.
Instantes depois, um médico aparece na sala e, logo depois de me
examinar, prescreve repouso e boa alimentação para que eu me recupere de
vez. Como não estou machucada, recebo alta e sou levada para a casa
rodeada de segurança e acompanhada dos meus pais. Queria gritar de
impaciência por não saber onde Alex está, mas não tenho coragem de
perguntar mais nada para minha mãe. Não queria que ela tivesse certeza do
nosso envolvimento, talvez por não saber em que pé estamos.
Alexander
Acordo assustado com barulhos de tiros, mas quando abro os olhos,
percebo que foi só um sonho. Sinto só dor no braço. Olho ao redor e percebo
que ainda é madrugada e que não dormi por muito tempo — cerca de cinco
horas, talvez. Levanto e vejo um dos caras sentado em um canto. Quando me
mexo, ele se levanta e vem na minha direção.
— Ei, cara, está se sentindo bem? — ele pergunta com um sorriso.
Olho feio para ele e seu sorriso murcha.
— Onde está a Lana? — pergunto, porque ela é a primeira coisa que
me vem na cabeça.
— Parece que está tudo bem com ela — diz. — Pelo que soube, está
dormindo e seus pais estão aqui.
Levanto e começo a vestir roupas limpas que alguém providenciou, já
que a outra está cheia de sangue.
Minutos depois, saio para falar com os policiais em busca de notícias
do criminoso e, também, para falar com Mitchell. Mas, antes de tudo, quero
me certificar de que ela está bem. Sou levado ao quarto e a mãe dela está lá.
Merda! Seria muito estranho se eu beijasse a filha adormecida na frente da
mãe que chora? Acho que sim, então mudo de ideia e desisto de ir lá conferir
cada pedacinho dela só para ter certeza de que ela não está machucada.
Pergunto como ela está e recebo a notícia de que só está exausta e
desidratada, de resto está bem. Disso eu não poderia duvidar. Lana,
provavelmente, vai achar esse sequestro um passeio no parque. Eu as deixo e
vou até a equipe para terminar meu serviço com a polícia para colocar o
idiota atrás das grades.
CAPÍTULO 19
Lana
Dois dias depois que voltei para casa, Alex vem me ver. Estou no
jardim de rosas da minha mãe, aproveitando o fim da tarde lendo, mas a

leitura é interrompida quando sinto a presença dele. Sinto o ar faltar e fico

sem fôlego quando ele se aproxima e senta ao meu lado.

— Oi, garotinha! Está tudo bem? — pergunta e entrelaça os dedos nos


meus, levando minha mão aos lábios e dando um beijo cálido no dorso.
Limpo a garganta
— Estou bem, mas preocupada com você, que foi quem se machucou.
— Ele leva a outra mão ao braço e assente.
— Não foi nada demais. Estou bem. — Ele suspira. — Preciso falar
com você. — A voz dele está tensa e sei que não vou gostar do que vai dizer.
— Fico feliz que não aconteceu nada de grave com você.
— Obrigada...
— Estou designando outras pessoas para te manter segura, até que
todos os envolvidos estejam presos — Ele aperta meus dedos levemente. —
Quero que tome todo cuidado, Lana.
Sinto que ele está se despedindo de mim e meu peito se aperta. Alex
inclina e beija meus lábios, correspondo sabendo que não o terei por perto
nos próximos dias e lhe dou tudo de mim nesse beijo. Estou encantada por
ele, absolutamente hipnotizada por seu calor.
— Até mais, garotinha — diz quando se levanta e vai embora.

Nos dias seguintes, não vejo Alex e a única notícia que tenho é que ele
se mantém focado em encontrar a pessoa que tentou nos matar na cabana.
Jules passou esse tempo aqui em casa, mas permaneceu calado e tão diferente
do rapaz doidinho que eu conheço.
Então, o pai dele acaba preso como o principal suspeito pelas ameaças
à minha família. Depois disso, Jules saiu, não voltou mais e não atende as
minhas ligações. Estou louca de preocupação com ele. Os dois não têm um
relacionamento amigável, mas, mesmo assim, saber que o pai pode estar
envolvido em crimes graves como sequestro e tentativa de assassinato é
péssimo.
Tenho me sentido frustrada e entediada. Ficar trancada em casa é, no
mínimo, estressante. Meu trabalho na ONG está prejudicado. Sinto falta das
meninas e mais ainda das aulas de dança.
Alexander
Alguns dias se passaram desde o atentado contra nós. Fontes foi,
finalmente, localizado pela polícia. O imbecil estava em um hotel e não
reagiu ao ser preso. A polícia tem fortes indícios de que ele está por trás dos
disparos efetuados naquele dia. Tudo leva a crer que o cara queria se vingar
por estar falindo e queria responsabilizar Mitchell de alguma forma, o que é
algo muito difícil de aceitar. Idiota!
Ele nega envolvimento com os crimes, mesmo depois dos depoimentos
dos comparsas que foram presos na cabana. Por um tempo, temi que ele fosse
solto após o depoimento, por causa daquela palhaçada da justiça de ser réu
primário e ter curso superior, o que poderia deixá-lo livre para colocar outras
vidas em risco. Mas a polícia conseguiu mantê-lo preso após os depoimentos.
Parece que, enfim, meu trabalho na casa do senhor Mitchell está chegando ao
fim.
— Acha que o Fontes tem outros comparsas? — o sr. Mitchell
pergunta, preocupado.
— Acredito que não. — Recosto na cadeira observando ao redor e
olhando as câmeras da casa. Vejo Lana passar pelo corredor principal e entrar
no quarto. Ela demora alguns segundos para abrir a porta. Meu coração
acelera ao vê-la olhar para a câmera e esboçar um sorriso. Em seguida, desvia
o olhar e entra no quarto, fechando a porta. Me sento na cadeira. Sem pensar
duas vezes, encaro o sr. Mitchell e faço a pergunta que eu vinha protelando
em fazer. — Quer manter meus homens aqui por um tempo?
— Se acha que não corremos perigo, não vejo necessidade de
mantermos tanta gente ao redor, mas faço questão de ter um excelente
sistema de segurança.
E, por incrível que pareça, não quero deixar esse trabalho. Estou me
tornando um homem das cavernas só de pensar em deixar Lana. Isso está me
matando! Sei que ela não pensa em ter algo com um cara como eu e, com
certeza, o pai pretende casá-la com alguém do seu meio.
Vai ser melhor ficar o mais longe possível... as coisas serão mais
fáceis... acho que aquele dia, no jardim da casa dela, foi como um adeus.
Depois de quase uma semana sem, praticamente, dormir direito, vou
para casa e tento colocar o sono em dia. Combinei com Mitchell de manter,
por mais uns dias, uma equipe um pouco maior do que ele costuma ter —
equipe essa que não trabalha para mim. Afinal, eles não correm mais perigo.
Pelo menos, não do pai do Jules — que, por sinal, anda sumido da casa dos
Mitchell desde que o pai foi preso.
CAPÍTULO 20
Lana
Não vi o Alex durante toda a semana e, quando o vi, mal falou
comigo. Me sinto em desespero, pensando que ele pode estar com raiva por

ter levado um tiro por minha causa. Sei que é bobo pensar isso depois

daquele dia no jardim, mas é a única explicação que encontrei para sua frieza.

Agora que o pai do Jules está preso, a equipe de Alex não tem mais
nenhum motivo para permanecer fazendo a nossa segurança, segundo o meu
pai. Isso está me matando aos poucos. Durante aquelas poucas semanas de
convívio, me apaixonei por Alex, mesmo que brigando mais do que fazendo
amor. Eu fui a responsável por nos envolvermos, afinal, fui eu quem pulou
em cima dele. Sei que ele tem me evitado e detesto esse sentimento de
rejeição. Será que ele acha que realmente não vale a pena ficar comigo? Ou
só está ocupado? Bom, seja o que for, ele vai ter que falar isso na minha cara,
e não fugir como um adolescente com medo de relacionamentos.
Aos poucos retornei a rotina diária: faculdade, dança e meu trabalho
com a dra. Cathy. Só faltava reencontrar meu melhor amigo, que havia se
afastado completamente. Minha mãe acha que ele está se sentindo
envergonhado por causa do pai, e acho que ela tem razão. Ao sair do estúdio
de dança, decido ligar para ele e, depois de inúmeras tentativas sem sucesso,
decido ir direto à casa dele. Afinal, ele não pode fugir de mim para sempre.
Entro no carro que me aguarda em frente ao estúdio de dança e peço ao
motorista que me leve até lá. Ah, mencionei que agora tenho um motorista? E
não porque tenha sido forçada a isso. Na verdade, não me sinto segura
sozinha. Tenho medo de que, a qualquer momento, um bandido apareça e me
leve outra vez.
Ao chegar ao prédio de Jules, me deparo com um segurança que
impede a minha entrada.
— São ordens, senhorita — o homem diz.
— Ordens de quem, posso saber? — Estou indignada.
— Do Juliano. — O quê? Porque meu amigo faria isso comigo? Ele
não quer me ver?
— Ele está em casa? Preciso falar com ele. É urgente. — Abro um
sorriso charmoso, mas acho que não faz qualquer efeito ele.
Pouco depois, retorno para o carro, furiosa. A rua parece nebulosa, mas
percebo que são as lágrimas que se formaram em meus olhos e começaram a
cair. Fui abandonada pelos dois homens da minha vida: primeiro, Alex se
afastou e, agora, Jules me impede de entrar na sua casa e nem atende as
minhas ligações.
— Merda! — esbravejo e o motorista olha para mim através do espelho
retrovisor. — Pode me levar a outro lugar? — pergunto e ele assente. Preciso
tirar uma história a limpo. O motorista liga o rádio e Don’tcry do Gun’s
n’Roses toca alto no silêncio do carro e do meu coração dilacerado. Não
posso acreditar que Jules vai jogar fora anos de amizade por algo que não foi
culpa dele. Sei da gravidade das ações do seu pai, mas a nossa amizade é
muito maior que isso.
Estou tão triste com tudo isso!
Alexander
Estava assistindo ao futebol, quando sou interrompido pela campainha.
— Quem é o chato que está me incomodando na hora do futebol? —
resmungo baixinho enquanto me levanto. Deixo a longneck na mesa em
frente e vou até a porta. Antes de abrir, olho pelo olho mágico.
O que ela faz aqui? Escancaro a porta e encaro a minha visitante com
irritação. Que merda!
— Que merda você quer aqui?
Estou cansada dessa mulher pegajosa.
— Como vai, Alexander? — Adriane, empertiga o corpo. — Soube que
levou um tiro. Vim ver como está.
— Já viu? — Abro um enorme sorriso forçado para ela. — Como pode
ver, estou em perfeitas condições. Agora, estou ocupado...
— Como é grosso! — ela me corta e entra, mesmo que não tenha sido
convidada.
— Você não viu nada. — Me jogo no sofá, outra vez, pego a cerveja e
a ignoro enquanto olho a TV.
— Conversa comigo, Alex! — Ela se senta no sofá ao meu lado e
estende a mão, tocando meu braço. — Só quero saber se você precisa de
alguma coisa.
— Estou bem, Adriane. Isso aconteceu há duas semanas — falo,
resignado. — Obrigado pela preocupação.
— Só soube hoje, quando liguei no seu trabalho e me disseram que
você estava em casa. Vim correndo. Não posso sequer imaginar que te
aconteça algo que o leve de mim também.
Ah, droga. Tudo o que eu não queria. Uma mulher aos prantos.
Estou prestes a responder quando a campainha toca outra vez. O que é
isso? Dia de visita na casa de Alex Marshall? Que merda!
CAPÍTULO 21
Lana
Toco a campainha da casa de Alex e espero. Estou com muita
raiva dele e de Jules. Os dois acharam que podiam me abandonar que nada

aconteceria? Eles estão bem enganados. Não consegui falar com meu amigo,

mas sei que ele vai aparecer na faculdade — assim espero — então vamos ter

uma conversa séria. Enquanto espero, bato o pé, impaciente, e ouço a porta

sendo aberta e... ah, caramba! Alex está usando só uma calça de moletom que

não deixa nada escondido da minha imaginação. Sei que meus olhos se

arregalam quando ele cruza os braços e sinto que não sou bem-vinda. Mas... o

que ele está fazendo em casa, a essa hora, só de pijama?


— Oi — digo em um fio de voz. Cadê a minha raiva? Não gosto muito
dessa pessoa que me tornei depois do sequestro... alguém tão diferente
daquilo que sou... tão submissa. Droga!
— O que faz aqui, Lana? — Ele encosta o ombro no umbral da porta e
deixa claro que não sou mesmo bem-vinda. Alex desvia o olhar para o carro
que está na calçada com o motorista encostado nele e franze a testa. — Está
andando com um segurança? — A incredulidade em sua voz é nítida quando
ele continua sarcástico. Me pergunto que droga vim fazer na casa dele. —
Achei que você não gostasse de intrusos atrapalhando sua vida de princesa.
— Queria falar com você, já que não procurou saber se continuo viva
depois que saí do hospital — digo ignorando seu sarcasmo.
— Engano seu. Eu sabia que estava bem. — Seu tom agora é mais
suave. — Devia ir para casa.
— Não posso entrar? Preciso conversar com você. É sobre o Jules —
digo, inventando um assunto. Droga, por que estou me impondo na vida dele
assim? Ele não se mexe para me permitir entrar e fico imaginando o que se
passa na sua cabeça. Alex suspira e vejo quando seus olhos suavizam. Sei que
ele perdeu a guerra que estava travando consigo mesmo — seja lá qual for —
e abre passagem para mim. Entro e paro no meio da sala, quando vejo quem
está no sofá, parecendo muito à vontade. Ela se vira para mim e sua cara feia
demonstra que não está feliz com minha chegada.
— Ah! A criança que você cuida chegou, Alex? Que saco. — Ela se
levanta e pega a bolsa ao lado no sofá. — Ela adora acabar com a intimidade
alheia.
Adriane olha diretamente para mim, mas eu desvio o olhar. Sinto
vontade de pular em cima dela. Intimidade? E o que ela faz aqui, afinal?
Ordinária! Juro que ainda arranco cada mecha daquele cabelo ridículo.
— O que ela faz aqui, Alex? Voltou com essa... — Faço cara de nojo,
enquanto a avalio. — pessoa? — Posso quebrar a cara dela, se ela continuar
me insultando. Vadia sem noção!
Porque esses dois não se resolvem? Pelo visto, ele não teve qualquer
problema para deixá-la entrar, como fez comigo. Ou, talvez, não quisesse que
eu a visse aqui, tão à vontade.
— Eu já estava de saída, queridinha. — Ela caminha para Alex e
espalma as mãos no seu peito, aproximando sua boca da dele. — Espero que
você melhore logo, amor — ronrona e depois segue para a porta.
Solto um longo suspiro. Não vim aqui brigar. Mesmo estando com
raiva dele e de Jules, busco a última ponta de confiança que ainda tenho e o
encaro com firmeza.
— Ainda preso a essa mulher? — pergunto sem demonstrar a raiva
latente em meu tom de voz.
— Vai me dizer por que veio aqui, Lana? — Ele caminha para cozinha
e eu o sigo. Ele pega uma cerveja da geladeira, retirando a tampa com um
pop alto e o observo beber direto do gargalo.
— Não sabe? Bem, eu achei que havia algo entre nós, Alex. — Ele
arqueia a sobrancelha e seus olhos verdes estão inexpressivos enquanto me
olha. — Foi você quem fugiu.
— Achei melhor acabar com isso e me afastar, enquanto não tínhamos
ido longe demais, Lana.
Não me conformo com isso. Tinha certeza de que ele gostava ao menos
um pouquinho do que tínhamos. A decepção enche meu coração mais uma
vez. Perdi meu melhor amigo e o homem que me apaixonei parece não
valorizar o sentimento que cresceu dentro de mim ao longo dessas semanas.
Sinto as lágrimas se formarem e um grande nó na garganta, mas faço o
possível para impedi-las de cair.
— Você percebe que não está nos dando uma chance? — questiono. —
Está sendo covarde, Alex!
— Então me responda, Lana. — Ele me encara, a expressão sombria.
— Mas, primeiro, faça uma análise de nós dois. Você tem uma vida pela
frente. É uma socialite rica e mimada, enquanto sou só um segurança que
trabalha para viver. Você largaria sua boa vida e teria um relacionamento
comigo? E não digo uma transa ocasional. Me refiro a um relacionamento
sério. Você tem maturidade para isso?
— Está sendo preconceituoso comigo. — É pior do que eu pensava. Ele
me acha uma perfeita estúpida.
— Gosto de você, Lana. Mais do que deveria, mas não vejo um futuro
em nosso caminho. — Ele parece triste ao falar. Foi um erro vir aqui!
Dou um passo para trás e mais outro, até que estou de volta na sala.
Agarro minha bolsa e caminho para a porta, mas tenho que parar. Não sei o
código da casa, mas aquela mulher nojenta sabe. Esbravejo mentalmente e
espero ele vir da cozinha.
— Você tem razão, Alex. Não é o cara certo para mim — digo para
ofendê-lo. — Somos diferentes demais para dar certo. Acho que você deveria
se casar com a ruiva. Ela deve combinar mais com você, já que não sai da sua
casa. Agora, por favor, abra a porta que quero sair e te deixar em paz para
sempre.
Ele não se faz de rogado. Abre a porta para mim e espera que eu saia,
mas não consigo. A triste verdade é que não quero sair da sua vida. Odeio
estar apaixonada. Me sinto patética. Esse sentimento nos deixa incapazes de
pensar de forma racional e, infelizmente, eu o amo completamente. Mas sou
orgulhosa demais para deixá-lo perceber o quanto a sua rejeição me machuca,
Alex estende a mão e toca em meus cabelos, colocando-os atrás da
minha orelha.
— O que você queria falar comigo sobre o Jules?
— Nada, foi um erro vir aqui.
— Ele está bem, depois do que o pai dele fez?
— Não sei. Ele sumiu e não sei dele há tempos. — Meu tom é
melancólico e vejo quando Alexander fecha a porta e segura meu braço, me
levando para o sofá.
— Me conte o que houve.
Conto sobre o surto de Jules quando soube que o pai era o responsável
pelos ataques que vínhamos sofrendo e seu desaparecimento desde que
descobriu tudo.
— Fui até a casa dele hoje e não tive permissão de entrar. Acho que ele
não quer me ver — digo o óbvio.
— Ele só deve estar chateado com tudo isso, Lana. Daqui há uns dias
ele volta. Dê tempo para as coisas se acertarem. — Queria me aconchegar
nele agora, mas é impossível. O que nem começou está fadado a nunca
prosperar.
Levanto com o intuito de ir embora, mas Alex segura meu braço, me
puxando de volta e acabo sentada no colo dele, com seus braços ao meu
redor. Sinto a sua respiração no meu pescoço e os arrepios percorrem meu
corpo. Como sou fraca! Mas o que mais preciso agora é de carinho. Envolvo
meus braços ao redor do seu pescoço e o beijo profundamente, sabendo que
aquele pode ser nosso último momento...

Saí da casa de Alexander, cerca de três horas depois, e foi com a


convicção que não voltarei mais ali, não vou correr atrás dele, não mais. Mas
isso está acabando comigo, fizemos amor pela última vez e sinto o peso da
despedida. Mas, chega de loucura atrás de loucuras.
Tivemos uma conversa dolorosa e saber como ele se sente é demais
para mim.
— Eu apenas percebi, Lana, que eu e você não funcionaríamos. — ele
tinha dito quando nos despedimos na sua porta, antes de eu sair como a idiota
que eu sou. — Sei que não está pronta para nós.
Nisso ele tem razão, não sou, nesse momento, a mulher para ele. Tenho
de me valorizar como mulher antes de qualquer coisa e não estou fazendo
isso. Critiquei tanto a ex dele e estou indo pelo mesmo caminho. Eu vou
esquecer Alex, prometo a mim mesma. Tenho que deixar tudo para trás e
esquecer que passei as últimas semanas em um romance fracassado e sem
estrutura. Tínhamos nos envolvido sem nenhum propósito, só não imaginava
que eu fosse me apaixonar e não ser correspondida.
Assim que chego em casa, arrumo minhas malas. Quero ficar longe
desse sentimento que oprime meu peito, não tenho um destino certo, contudo
quero meu melhor amigo comigo aqui. Amanhã pela manhã irei embora por
um tempo. Deito na minha cama enquanto as lágrimas que segurei por tanto
tempo explodem de uma só vez, aumento a música: Ternura, para não
preocupar minha mãe com meus soluços altos. Minha vida está uma merda!
Eu não faço nada certo. Só preciso de um tempo sozinha.
...
Todo amor que eu guardei
A você eu entreguei
E eu não mereço tanta dor
Tanto sofrer
Agora você vem dizendo adeus
O que foi que eu fiz
Pra que você
Me trate assim?...

...
Mas, mesmo assim, não consigo fugir da inspeção de minha mãe, ela
parece sentir meu estado de espírito e insiste em bater na minha porta até que
eu não tenho alternativa a não ser abrir.
— Queria saber se você... — ela começa e para quando percebe o caos
que me encontro com o meu rosto inchado por ter chorado.
Ver a preocupação em seu rosto, ao me ver chorando, faz minhas
lágrimas ainda mais tempestuosas. Estou triste por perceber que além do
Jules, não tenho verdadeiros amigos e junto com os últimos
acontecimentos não seguro mais nada dentro de mim. Mas eu ainda tenho
minha mãe aqui comigo.
— Que houve, Lana? — Me abraça como só uma mãe consegue
abraçar sua filha. — Que malas são essas, minha querida?
Não digo nada até que minhas lágrimas sequem e só então conto para
ela o que tem acontecido comigo e vejo o quanto sou uma menina boba e
imatura. Mas falo do meu trabalho na comunidade carente e minhas aulas de
dança que ela não sabia. Quem se importa se meus pais não aprovam nada
disso? Eu, não mais.
Ela não me julga e deve ser porque também já foi jovem, não que
minha mãe seja velha. Ela só me faz mandar levantar, tomar um banho e
quando eu volto ela parece uma locomotiva louca. Até parecia que ela me
queria longe daqui, coisa que sei que não é, ela só quer que eu fique bem.
—Tudo certo — ela diz com um sorriso. — Quanto tempo pretende
ficar fora?
— O quanto for possível — forço um sorriso.
Jules
Eu sou o maior idiota da face da terra!
Estou escondido feito um fodido filho da puta. A culpa me consome,
sei que não é culpa minha, mas ficar junto da família da Lana nesse momento
me enche de vergonha. Eu estou agindo da pior forma possível com minha
melhor amiga. Ela veio aqui hoje e eu a tratei mal não a deixando entrar, mas
eu estou muito chateado com toda essa merda.
Eu necessito de um tempo longe dela. Lana não tem muitos amigos e
deve estar sentindo minha falta. Sou o pior amigo do mundo. Desde que o
porteiro do meu prédio disse que ela saiu mal, quando não a deixei subir, eu
fiquei com a consciência pesada demais para aguentar ficar longe dela.
Soube pela minha mãe que meu pai vai sair da cadeia e eu não
permitirei que ele faça mal para Lana ou sua família.
Talvez seja a hora de voltar para minha linda amiga e deixar de agir
feito um covarde. Afinal não sou meu pai. Só de lembrar meu choque em
saber que ele é o mandante dos sequestros, causa arrepios pelo meu corpo.
Eu não sairei de perto de Lana e não deixarei nada de mal acontecer
com ela.
Alexander
Não esperava encontrar Lana na porta da minha casa e a sua presença
abalou minhas convicções. Mas eu precisava ser honesto com ela e a mandar
embora. Ouço o telefone tocar em algum lugar, mas não saio da janela onde
estou desde que ela saiu daqui, há quase duas horas. O aparelho continua a
tocar até que vou atender.
Olho o visor e vejo que é Carl.
— O que houve? — pergunto ao atender, minha voz sai em um tom
cortante.
— Soube que o Fontes pode ser libertado a qualquer momento.
Segundo informações, isso pode acontecer essa semana ainda.
— Que porra é essa! — grito. — Esse criminoso não pode sair da
cadeia agora. Sequestro, cárcere privado e o cara vai ser solto antes de
completar um mês de prisão?
— Pelo que soube, ele fica em liberdade até o julgamento. O advogado
dele deve ser bom — Carl continua.
Conversamos um pouco mais e, quando ele termina de me passar as
informações, eu desligo.
Troco de roupa e me encaminho até a casa de Mitchell. Ele, com
certeza, já sabe, pois tem uma ótima equipe de advogados que estava atenta a
isso. No entanto, preciso checar a segurança deles para que eu não
enlouqueça de preocupação. Fontes podia estar com ainda mais raiva de
Mitchell.
CAPÍTULO 22
Lana
Encaro minha imagem no espelho do banheiro e passo as mãos em
meus cabelos. Meu coração bate forte. Minha mãe já está com tudo pronto

para minha viagem. Estou pronta para ir, mas me sinto enjoada de

nervosismo... talvez seja por ter chorado tanto hoje. Só preciso de coragem

para sair daqui e enfrentar a decisão.


— Vamos, filha, suas malas estão no carro — minha mãe fala do
quarto.
— Vamos lá, Lana Mitchell, você consegue — resmungo comigo
mesma. — Estou indo!
Termino de aplicar o gloss e fecho os olhos inspirando fundo. Libero o
ar e caminho para fora do banheiro, encontrando minha mãe no quarto. Pego
a bolsa e saímos.
Na sala, me despeço do meu pai e de Lucas. Minha mãe vai comigo até
o carro, mas me detenho no meio dos degraus da frente da nossa casa. Meu
coração dispara agora, repleto de sentimentos loucos.
O que Alexander faz aqui? Será que ele veio atrás de mim? Deixa de
ser burra, Lana! Protesto mentalmente. Não aprendo nunca.
Me recomponho e do choque e sigo até o carro em que ele está parado,
próximo ao motorista que sempre me acompanha agora. Continuo assustada e
com medo de andar sozinha depois do sequestro. Sei que vou estar sozinha na
viagem, e ainda sinto medo. A solidão é terrível para mim, mas sou forte e
não posso continuar chorando pelos cantos. Não sou essa pessoa fraca.
— Boa noite, senhora! — Alex cumprimenta minha mãe, mas mantém
os olhos em mim. Sim, olhe mesmo idiota! — A senhora vai viajar?
A expressão da minha mãe é séria.
— Não, sr. Marshall, é a Lana quem está indo. — Ela segura minha
mão com firmeza. — E não tem data para voltar.
Sinto vontade de rir ao ver minha mãe alfinetar o homem. A mandíbula
dele se contrai quando ele volta os olhos para mim.
— A senhora pode nos dar licença um momento? — Alex pede. —
Preciso falar com ela.
— Ela vai se atrasar e pode perder o voo, sr. Marshall. Acho que isso
pode esperar, não é mesmo?
Minha mãe é uma mulher romântica, vive com meu pai em uma eterna
lua de mel. Se casaram por amor. Ela vem de uma família de classe financeira
inferior à do meu pai, mas isso nunca foi problema para eles. Meu pai já era
independente financeiramente dos meus avós e só cabia a ele decidir com
quem se casaria. Depois de me ouvir desabafar, ela disse que achava que ele
estava preocupado com a diferença social e econômica entre nós, algo que
não fazia o menor cabimento, já que Alex é um empresário bem-sucedido.
— Não, não posso esperar. Tenho um assunto que é de interesse de
toda família e sua filha não pode viajar agora! — Eu o ignoro e abraço minha
mãe.
— Obrigada, mãe, mas posso lutar minhas batalhas por conta própria.
— Beijo seu rosto — Vou sentir sua falta.
Nos afastamos e eu passo por Alex ao seguir para o carro.
— Até logo, Alexander! — Entro na parte de trás do carro e espero o
motorista dar a volta. A porta se abre e Alex entra, se sentando do meu lado.
— Espere lá fora. — Ele aponta para o motorista que obedece a sua
ordem. — Precisamos conversar, Lana. — Alex parece tomar todo o espaço
dentro do carro. Me sinto sufocar por sua presença.
— Vou perder o voo. Sugiro que desça agora para que eu possa sair da
sua vida — falo, no tom mais frio que consigo.
— Você não pode viajar agora, entende? — Ele bufa zangado. — Me
diga para onde você vai que coloco uma pessoa a sua disposição.
— Sabe de uma coisa, Alex? — grunho. — Quero que você saia da
droga desse carro agora! Engula a sua preocupação idiota, não preciso dela.
Estou muito bem, obrigada. Na verdade, nunca estive melhor.
— Não seja insensata, Lana. Mas, afinal, para onde é que você vai? —
Nós dois estamos esbravejando no carro, mas não cedo. Se ele se importa
comigo, que descubra sozinho para onde vou.
— Não vou dizer. Vai se foder! — Perco a paciência. — Você se
esqueceu que fui na sua casa hoje, implorando para que você me ouvisse?
Pois, então, aquela Lana morreu, Alex! Só quero distância de você! E pensar
que achei que estava apaixonada por um babaca preconceituoso. — Quero
machucá-lo do mesmo jeito que ele havia feito comigo. — A idiota aqui
cansou de correr atrás de você. Me esquece, porque eu já te esqueci!
—Terminou? — Sua voz soa totalmente sem emoção. Olho para seus
olhos verdes inexpressivos.
— Nem comecei...
— O Fontes vai sair da prisão. Viajar agora pode ser um erro fatal,
Lana. — Ele continua, como se eu não tivesse dito nada. — Só quero que
você fique bem e segura. Sei que está magoada e furiosa porque nem tudo
saiu do jeito que você quis, mas me importo com você. — Sua voz parece
cansada quando ele termina de falar.
Os sentimentos conflitantes são palpáveis dentro do espaço confinado
do carro.
— Tenho certeza de que o pai do Jules não vai saber para onde vou.
Quero xingar, mas me lembro de que isso não vai adiantar de nada.
— Adeus, Alex — murmuro e espero que ele saia, coisa que ele não faz
de imediato.
— Lana...
— Chega! Você decidiu que não pode haver nada entre nós. Já aceitei
isso — digo irritada —, então, caia fora do meu carro!
— Vou descobrir para onde você vai, mesmo que você não me diga.
Ele solta um suspiro pesado e sinto seu corpo relaxar ao meu lado e,
pela primeira vez, demonstra alguma emoção desde que chegou, antes de sair
do carro acaricia com o dorso dos dedos meu rosto.
— Me desculpe. Não queria te magoar, Lana. — Sua voz é suave,
rouca e profunda. — O que aconteceu entre nós significou mais do que você
imagina e te deixar ir está me matando também. Te quero de uma forma que
nem eu entendo, mesmo que não demonstre. E, talvez seja melhor te deixar ir
agora, mas não vai ser para sempre.
Como ele pode falar algo e agir totalmente o contrário? Ele me chuta
igual um cachorro sarnento e depois vem me pedir desculpas?
— É tarde demais para isso! É melhor sair daqui antes que eu peça a
alguém que te mandar embora. — Ele me encara como se me desafiasse. —
Saia!
Assim que ele sai, minha vontade é de pedir para que volte. Mas não
quero demonstrar mais fraqueza a esse homem, está na hora de trazer a velha
Lana de volta.
O motorista entra no carro e dá a partida. Olho ao redor enquanto ele
manobra para sair. Sinto as lágrimas se formarem, mas me recuso a deixá-las
cair.
Tudo o que eu preciso é de uns dias em Malibu, na Califórnia.
Enquanto conversava com a minha mãe, pensei em transferir a faculdade para
outro país e só voltar quando concluísse a graduação. Mas nunca fui uma
pessoa covarde e não queria fugir dos meus sentimentos. Tudo o que quero
agora é esquecer a loucura do sequestro e toda essa confusão de amor não
correspondido. Quem sabe não encontro um surfista gostoso e esqueço certo
segurança metido a besta.
Pego o fone de ouvidos e coloco uma música. Suspiro ao me lembrar
que estou deixando a dança e as meninas da ONG. É por elas que não vou
ficar muito tempo fora e quando voltar, quero organizar uma festa para elas.
Sorrio com sinceridade ao pensar que adoro estar com elas.
Aumento o som do fone de ouvido e distraio meus pensamentos até que
estou dentro do avião enquanto ouço Don't You Remember, de Adele
Alexander
Vejo o carro se afastar e tensiono a mandíbula com muita força. Dói
deixar Lana ir embora. Não vou permitir que ela corra riscos. Seus pais
precisam saber que as coisas mudaram com a possível liberação de Fontes.
Balanço a cabeça, tentando colocar os pensamentos em ordem, e volto
à realidade, pegando o celular para dar ordens a um agente para que descubra
o destino de Lana.
Sei que sua partida é culpa minha. Eu a magoei e preciso tentar
encontrar uma forma de remediar isso. Mas, talvez, não tenha conserto. As
burradas de hoje foram intencionais para afastá-la Lana de mim. Permiti que
a louca da Adriane a insultasse, insinuando que estamos juntos. Me sinto um
cafajeste e envergonhado pelas minhas atitudes. Justo eu, que acuso a Lana
de ser infantil! Usei as duas nessa situação — uma para afastar a outra.
Queria afastar Adriane porque não sinto mais nada por ela e Lana, porque
tenho medo de que no fim, ela não me queira de verdade.
Depois de instruir Salvatore Benacci — um dos meus prestadores de
serviço — que ficasse de olho nela, entro na casa de Mitchell e encontro
Cybelle na sala com Lucas. Ela não tinha sido nem um pouco sutil, deixando
entender que sabia do envolvimento da filha comigo.
— Sr. Marshall, meu marido o espera no escritório. — Ela é educada,
mas fria. Talvez não fique tão indiferente quando souber que a família ainda
pode estar ameaçada.
Aceno para Luca e sigo para o escritório.
— Entre, Alexander. — Encontro Mitchell sentado na mesa. Pela sua
tranquilidade, certamente não sabe que seu inimigo vai ser posto em
liberdade.
— Tudo bem, sr. Mitchell? — eu o cumprimento e me sento na sua
frente.
— Achei que não o veria tão cedo, Alexander. O que houve? — É,
realmente não sabe de nada.
Meia hora depois, Mitchell está preocupado e liga para seus advogados,
procurando compreender o que será feito para manter Fontes na prisão.
— Você permitiu que a Lana viajasse. Não acho que essa tenha sido
uma atitude sensata, Mitchell — digo.
— Pelo que a minha esposa falou, ela foi embora por sua causa,
Alexander — diz. — Não sei o que há entre vocês, mas espero que você não
a machuque — ele avisa e eu assinto.
Me levanto e estendo a mão quando me despeço.
— Me mantenha informado.
À noite, recebo a informação de onde Lana está e mando Salvatore para
o mesmo hotel, pedindo que ele se mantenha incógnita. Não posso viajar por
enquanto. Mas logo vou atrás dela.
Não sei o que fazer com esse sentimento em meu peito. Achei que
soubesse o que é amar alguém, mas o que senti no passado parece desbotado
em comparação com a agonia que sinto ao pensar em Lana. Como ela
conseguiu me conquistar assim, tão rápido?
Lana
Estou em Malibu há um dia, na praia de Paradise Cove. É tão bom estar
aqui... me esqueci dos problemas assim que pus os pés nesse lugar. Passei o
dia todo à beira mar. Mais tarde, fui a um café em que comi um enorme bolo
de chocolate — a única coisa que comi o dia todo. Ao final do dia, já estava
me sentindo inquieta. As coisas não estavam correndo como imaginei.
Ao voltar para o hotel, a imagem no espelho do banheiro é de uma
jovem mulher com olheiras gigantes, demonstrando a noite mal dormida que
enfrentou.
Uma hora mais tarde, me sento no bar do restaurante do hotel e aguardo
a liberação de uma mesa para jantar, já que passei o dia sem comer nada
saudável. Sinto que estou sendo observada. Me viro e olho ao redor, a
procura dos olhos que sinto sobre mim, mas nada me chama a atenção. Volto
a tomar um gole da minha bebida; Talvez eu esteja paranoica. Mais tarde,
vou dar um pulo na boate do hotel. Preciso dançar para extravasar as
energias.
— Oi — um homem diz, se sentando ao meu lado.
— Oi. — Olho para ele e sorrio.
Bem, as coisas parecem estar começando a melhorar aqui, em Malibu...
CAPÍTULO 23
Lana
Observo o homem de cima a baixo. Ele é bem bonito. Seus

cabelos são castanhos claros e olhos azuis gelo como os de um lobo. Sorrio

por dentro, com a minha descrição. Ele parece ter uns trinta e poucos anos.

Estendo a mão. Quero me aventurar nessa praia paradisíaca. Alexander não

merece meus pensamentos, ainda que fosse recente demais para que eu o

esquecesse.
— Sou Lana Mitchell — falo em um inglês fluente, resultado de anos
de estudo. Me apresento ao homem de olhos de lobo na tentativa de esquecer
certos olhos verdes. Ele segura minha mão e seu aperto é forte. Bom.
— Oi. Mark Anderson, prazer. — Seu sotaque é carregado — Está
sozinha ou devo ter cuidado? — ele brinca. Seu riso é fácil e contagiante, e
me vejo sorrindo de volta.
— Não mais — flerto e ele sorri ainda mais. — Estou esperando por
uma mesa e você?
— Vou jantar também. Estou aqui a negócios — ele informa, mesmo
que eu não tenha perguntado nada.
Começamos a conversar enquanto aguardamos. Me sinto confortável
com ele, mesmo sabendo que bandido não vem com letreiro de neon na testa.
A lembrança do que me aconteceu na faculdade, do sequestro, ainda é muito
vívida, mas não sou o tipo de pessoa que fica “remoendo” um assunto o
tempo todo.
Mentira! Tem uma coisa que não paro de pensar, sem saber o que
fazer, e isso me deixa louca.
— Você trabalha com o quê? — pergunto tomando um gole do meu
drinque sem álcool.
— Estou tentando comprar meu primeiro hotel na cidade. — Ele chama
o barman e pede uma bebida para ele e outra para mim, sem me consultar. O
que há com os homens hoje em dia?
— Espero que consiga — falo.
— Obrigado. É um projeto antigo que espero concretizar em breve. —
Pelo seu tom de voz, ele parece uma criança em uma loja de guloseimas.
— E você, Lana, o que faz aqui sozinha? Estava te observando desde
que entrou e te achei um pouco triste — Mark fala e abro um sorriso meio
sem graça.
— Estou de férias — digo simplesmente. Não quero falar da minha
vida para um estranho que acabei de conhecer. Ainda mais que ele disse ter
estado me observando. — Vou ficar por aqui nos próximos dias... ou, talvez,
pegue um voo e vá para outro lugar.
Vou mesmo ficar por alguns dias, mas não quero pensar no retorno.
Hoje só quero me divertir, e é o que faço com meu novo amigo. Ele é bem
agradável, ainda que eu estivesse tomando cuidado com ele, afinal, Daniel
conseguiu me dopar por eu confiar em estranhos.
Depois que a mesa foi liberada, acabamos jantando juntos. Foi ótimo
ter companhia, pois não pensava nos problemas. Estávamos no meio do jantar
quando o celular toca e vejo o nome de Jules no visor. Agora que ele me liga?
Droga! Nunca deixei de atender as ligações dele, mas não vou ser rude com
Mark, atendendo ao telefone no meio do jantar.
Desligo e envio uma mensagem.
Lana: Te ligo depois...
Recebo uma de volta quase que imediatamente.
Jules: Preciso saber onde te encontrar. Desculpe!
Respondo e coloco o celular na bolsinha que estava usando.
Lana: Agora não posso conversar, te ligo mais tarde.
Quando olho para Mark, vejo que ele me observa com atenção.
— Problemas?
— Não. Era o meu melhor amigo — falo e sei que a minha voz sai um
pouco magoada. — Me fale mais de você, Mark — puxo assunto, querendo
que seu foco saia de mim.
— Não tenho segredos escabrosos, Lana — ele fala com um sorriso
charmoso. — Estou com trinta e dois anos e agora estou me firmando nos
negócios. Sou formado em medicina, mas sempre tive muita vontade de atuar
no ramo hoteleiro, então, estou dando os primeiros passos nessa área.
— Não exerce a medicina? — pergunto surpresa. Acho medicina uma
profissão tão linda.
— Sim, já trabalhei, mas, como disse, agora quero diversificar. —
Tenho vontade de rir. Desejei conhecer um surfista gato, mas acabei
conhecendo um médico. — Se não der certo no ramo hoteleiro, vou entrar
para os Médicos Sem Fronteira e partir para a África. — Ele me surpreende
outra vez e descubro que ele poderá ser uma ótima companhia nessas férias
forçadas.
No fim do jantar eu o convido para irmos a boate do hotel. O lugar é
escuro e a batida forte da música provoca dor nos tímpanos, mas não me
importo. Quero extravasar todo o estresse que venho contendo.
Jules
As palavras de Cybelle me fazem querer voltar para casa e me esconder
para sempre. O sermão dela me queima, mas ela tem razão. Fui covarde.
— Você não tem culpa das coisas que seu pai faz ou fez, Jules — ela
finaliza — Jamais te acusaríamos de qualquer coisa.
— Eu sei... — murmuro.
— Nunca vi minha filha tão triste como tem estado ultimamente. Vocês
cresceram juntos, não a abandone agora. E, além do mais, querido, você
também precisará de apoio com tudo isso que vem acontecendo ao seu pai —
diz. — Você é sempre bem-vindo a nossa casa, sabe disso. Te considero
como um filho, Jules.
Fui até lá falar com a Lana. Descobrir que ela viajou e que não estava
aqui quando ela precisou é frustrante. Sou o seu único amigo e, agora, ela não
tem ninguém.
Na saída da casa, avisto Alexander. Esse cara parece morar aqui. Vou
em sua direção e tento descobrir algo. Cybelle não me deu qualquer pista de
onde ela poderia estar.
— E aí, cara? — cumprimento quando me aproximo. — Tem ideia de
onde a Lana está?
— Ah, vejo que resolveu aparecer. — Ele é irônico. — Se ela quisesse
te falar, tinha ligado para você e dito. Ah! — Ele abre um sorriso frio. — Ela
foi na sua casa e você a expulsou de lá. Grande amigo você é.
Não sei qual é a desse cara. Mas tenho certeza de que ele acha que
tenho algum sentimento por Lana além de amizade. Há um tempo, pensei que
estava apaixonado. Mas eu sabia que para ficar com ela, tinha que ser um
cara mais durão. Alguém a quem ela não dominasse, como fazia comigo.
Nunca consegui dizer não para ela, mas não tenho qualquer interesse
amoroso.
Me sinto mal depois que Alex faz questão de jogar isso na minha cara e
vou embora. Ligo para Lana, que não atende. Logo depois recebo uma
mensagem dizendo que vai me ligar depois.
Aguardo sua ligação a noite toda.
Ela não me ligou e meu coração se aperta. Será que ela está muito
chateada comigo?
Lana
Na manhã seguinte, acordo com a cabeça pesada. Bebi mais do que
estou acostumada. Na verdade, não costumo beber mais que um drinque
quando saio à noite. Enquanto tomo um copo de suco na varanda do hotel,
ligo para Jules, que atende no segundo toque, como se estivesse esperando a
minha ligação. Ele deve ter ficado preocupado.
— Oi, Jules.
— Lana!
— Desculpe por não ligar ontem, fiquei fora até tarde...
— Sem problemas, Lana. Eu que sinto muito por não ter te ligado e
nem ter te recebido quando veio aqui. Me sinto um péssimo amigo — ele
dispara um monte de desculpas.
—Tudo bem, Jules. Já passou. — E falo do fundo do coração.
Pensando bem, sei que o Jules não tem que viver em função da nossa
amizade e que ele precisava de um tempo para processar os acontecimentos.
— Onde você está? — ele pergunta — As pessoas têm mantido isso
como um segredo da máfia russa.
Gargalho e a tensão que sinto parece diminuir um pouco.
— Malibu. Gostaria muito que estivesse aqui. Sinto a sua falta — digo
e sinto as lágrimas queimarem em meus olhos. — Como você está? — Me
lembro de que nada disso deve ser fácil para ele e sua família.
— Minha mãe está meio enlouquecida para tirar meu pai da prisão.
Você sabe que ele pode sair, não é? — Noto o remorso no tom da sua voz.
— Estou sabendo sim, Jules. Espero que tudo se resolva e sua família
fique bem. — Sim, sei que ele pode sair essa semana. Alex fez questão
de comunicar antes que eu viajasse. Pensar nele me faz ficar com raiva, mas
resolvo deixar Alexander de lado e me concentrar no meu melhor amigo.
Conversamos mais de meia hora, até que ele fica calado do outro lado.
— O que foi? — pergunto preocupada.
— Só quero que saiba que, se meu pai sair da prisão, não vou deixar
que nada de mal te aconteça — ele garante, e eu sorrio apesar de tudo.
— Ganhei um segurança?
— Mais um, você quer dizer, não é? — Ouço a sua risada do outro lado
da linha.
— O que você quer dizer com isso? — pergunto aflita. Será que tem
guarda-costas na minha casa, de novo?
— Seu amado segurança vive na sua casa — ele ri. — Ele não gosta
mesmo de mim, não?
— Você deve estar enganado, Jules. Ninguém acredita que você tenha
algo a ver com seu pai — digo.
— Não estou falando sobre isso. Acho que ele não vai com a minha
cara por sua causa.
— Pouco provável. Alexander não dá a mínima para o que eu faço —
retruco e mudo de assunto outra vez. Jules já me conhece e não força a barra.
— Te amo demais, Juliano.
— Ama nada, se amasse não me chamava assim — ele resmunga.
— Esse é seu nome, pequeno Julie — provoco.
— Argh! Cada um pior que o outro. Mas te amo mesmo assim,
patricinha.
Estávamos bem outra vez. Me sinto melhor sabendo que ainda o tenho
ao meu lado.
Assim que termino a chamada com ele, ligo para minha mãe. Ela me
pediu que ligasse para ela todos os dias em que estiver fora de casa.
— Oi, mãe!
— Querida, como você está? — pergunta do outro lado. — Espero que
esteja se divertindo...

— O que você fez o dia todo? — Mark se senta a minha frente, na casa
noturna. Faz três dias que saímos para dançar. Tenho feito o mesmo
programa todos os dias. Não me sinto segura em sair do hotel. Ainda não tive
coragem nem de fazer os passeios turísticos, mas aproveito o máximo às
cadeiras de frente para o mar. Mark passa o dia cuidando dos seus negócios,
então não posso contar com ele como distração.
Abro um sorriso e antes que eu fale, ele ergue a mão, me calando.
— Deixe-me adivinhar. — Ele ri mais agora. — Você passou mais um
dia deitada naquelas espreguiçadeiras?
— Claro que não! Mas vim aqui por causa da praia, então tenho que
ficar o máximo de tempo possível lá — me defendo.
— Deveríamos ir para outro lugar, em vez de irmos para essa mesma
casa noturna. — Ele faz cara de cachorrinho.
— Hoje não. — Me repreendo por dentro, mas sei que não o conheço o
suficiente.
CAPÍTULO 24
Alexander
Porque acusamos as mulheres de inconstantes, se nós, homens,
somos piores que ela? Saber que Lana foi embora por minha causa, fez com

que eu caísse em mim.


Como um homem de trinta anos age como eu tenho feito? Com medo
de uma garotinha de vinte e um? Ela está se afastando porque não fui homem
para assumir os sentimentos que nutro por essa maluquinha.
Faz dois dias que ela foi embora. Salvatore está na cola dela e não estou
gostando dos relatórios que recebi até agora.
Nesse momento, deveria estar indo encontrá-la, mas sou um idiota por
colocar o trabalho antes da minha vida pessoal. Quero me certificar de que o
Fontes esteja na cadeia ou mantido em vigilância, caso seja realmente solto.
Perder esse cara de vista é dar um tiro no próprio pé!
Mas juro que se eu receber outro relatório igual ao de hoje, vou jogar
essa merda para o alto e ir até lá, bater na cara do imbecil com quem ela tem
estado. Lana o conheceu na primeira noite lá e desde então eles não se
desgrudam. Segundo Salvatore, eles dançam a noite inteira e ela volta para o
quarto quase de manhã. Tem bebido mais que o normal — pelo que sei, ela
não bebe quase nada.
Tenho outros clientes além de Mitchell, por isso não posso sair
correndo feito um garoto apaixonado e deixar meu trabalho para os outros.
Mas quando penso que ela pode se interessar por outro cara fico louco e
perco o foco.
—Tem certeza disso? — Estou com Salvatore ao telefone e ele
descobriu que Lana está pensando em viajar para Los Angeles com o cara
que conheceu em Malibu.
Porra! Essa garota acaba comigo. Será que ela não pensa? Nem
conhece esse cara e está se colocando em perigo. Merda!
Os advogados de Mitchell conseguiram impedir, por enquanto, que
Fontes deixe a prisão. Isso pode se arrastar por vários dias e essa merda com
a Lana não pode mais esperar.
— Estou indo para aí. E, Sal, — rujo ao telefone — não deixe que ela
vá embora daí, ou você é um homem morto.
— Certo, chefe!
Desligo irado. Depois de reservar uma passagem, delego algumas
tarefas a equipe e, cinco horas depois, estou no avião bufando de raiva.
Mesmo longe, ela tira a minha razão.

Quando entro no suíte do mesmo hotel em que Lana está hospedada,


sinto cansaço pelo longo voo. Cheguei às dez da noite local e, segundo Sal,
Lana está com seu "amigo" na praia em um passeio ao luar. Tenho vontade
de vomitar. Que coisa sem graça, levar uma mulher para praia à noite, o
cara não tem a mínima criatividade. Penso furioso. Imbecil.
Pego o celular e ligo para Salvatore.
— Onde você está?
— Parece que os pombinhos vão voltar para o hotel — ele diz. —
Provavelmente, vão para a casa noturna. A Lana não sai de lá.
— Tem certeza disso? — Começo a sair da suíte e vou para a recepção
do hotel. Estou quase chegando, quando vejo Lana entrar de braço dado com
um cara. Que porra! Ela está rindo e feliz, diferente da Lana que vi outro dia.
Deixo o telefone cair da minha orelha quando me afasto para que ela não me
veja.
Estou tão puto que preciso de um minuto. E eu sou o único culpado
dessa merda!
Quando conversei com Jules no outro dia, e disse umas coisas para ele,
me recriminei depois, pois fui pior do que ele com Lana. Agora, ela está
dando a volta por cima, mas isso me deixa incomodado demais.
Lana
— Está vendo, doutor? Essa praia é mágica — digo quando entro no
hotel. Mark, que implica por eu passar o dia na praia, adorou a nossa
caminhada.
— Nunca disse que não era. Por isso que quero o meu hotel aqui. Ainda
vai querer ir dançar?
— Claro que sim, só vou trocar de roupa e volto — falo e sigo para o
elevador de braços dados com ele. Sinto os pelos da nunca se arrepiarem e,
antes que a porta do elevador se feche, olho ao redor para ver se estou sendo
observada por alguém. Não vejo nada que me chame a atenção, mas sinto
isso quando alguém fica me observando. Solto o braço de Mark.
— Está se sentido bem? — Ele parece preocupado.
— Sim. — Minha garganta fica seca de repente. Será que o pai do Jules
saiu da cadeia e veio até aqui?
Quando desço no meu andar, pego o celular e ligo para Jules. Nos
falamos todos os dias, no entanto ele não disse se o pai já foi libertado.
— Oi. O que houve?
— Oi, Jules, seu pai ainda está preso? — pergunto, sem preâmbulos.
— Sim, seu pai tem se esforçado para que ele não saia. Nem sei se isso
vai acontecer. Você está bem? Parece assustada.
Sinto o alívio me envolver. Por um momento`, achei que ele tivesse
descoberto onde estou. Aquele louco!
— Achei que tinha alguém me seguindo, aqui no hotel. Não sei, às
vezes me sinto estranha. Como se não estivesse sozinha.
— Deve ser por causa do sequestro, Lana. Isso vai passar com o tempo.
— Droga, ele está com remorso outra vez?
— Jules, quero que pare de se sentir desse jeito cada vez que falamos
disso — repreendo.
— Estou tentando.
—Tenho que desligar agora. No falamos de manhã, logo cedo.
— Qualquer coisa é só chamar. Se cuida, Lana.
Na hora que desligo o celular, ouço uma batida na porta e estranho.
Mark nunca veio me buscar aqui. Ele sempre espera por mim no lobby do
hotel. Caminho até a porta e abro sem pensar.
— Nossa, você foi rápido! Eu...
Tento fechar a porta de volta, mas sou impedida facilmente.
— O que você está fazendo aqui? — pergunto por entre os dentes,
furiosa.
CAPÍTULO 25
Lana
Alexander entra no meu quarto, ignorando minhas tentativas de
impedi-lo. Ele tem quase que o dobro do meu tamanho e sei que seria

impossível detê-lo.
— O que você está fazendo aqui, Alexander? — repito a pergunta,
quando ele não responde da primeira vez. — Não tem nenhum bandido para
você caçar?
— O que acha que vim fazer? Olhar a paisagem? É claro que vim te
ver! Que merda você está fazendo com esse cara, Lana? Você mal conhece
essa pessoa e se torna melhor amiga dele, em poucos dias? — Ele grita tanto
que acho que ele vai acordar o hotel inteiro. Ah, caramba! Ele nem me
cumprimentou e já está esbravejando! Filho da mãe!
— Baixe seu tom, Alexander — digo o mais baixo que posso —, ou
chamarei os seguranças e vou te acusar de invasão.
— Tente — ele deixa o desafio no ar.
Nos encaramos como dois oponentes em uma arena, onde o campeão é
o mais forte. Eu o observo lutando contra a fúria, e não compreendo o porquê
de ele estar nesse estado catastrófico de raiva.
— O que veio fazer? Me vigiar de novo? — Quebro o contato visual e
caminho para vestir outra roupa. Ainda vou sair e ele que não tente me
impedir.
Não vou ser boazinha com Alex. Juro que tentei mudar, prometi a mim
mesma que seria mais madura e responsável, mas Alexander desperta o pior
em mim.
— Estou de saída, então sugiro que caia fora.
— Vai sair o caralho! — Ele se aproxima de mim tão rápido que
estremeço com seu calor. — Ficou louca, Lana? Como você pensa em viajar
com esse cara?
— Como sabe disso? — Paro o que estou fazendo e o encaro.
— Não importa como sei. — Ele cerra os punhos e percebo sua raiva
latente dirigida a mim. — Esqueça essa viagem, Lana. Você não vai a lugar
nenhum. Vou te levar de volta para casa.
Perco o resto de controle que me resta e vou para cima dele.
— Você é louco ou o quê? Acha que pode me jogar fora e me pegar de
volta quando bem entende? — grito. — Deixa eu te esclarecer, Alex. Não
dou a mínima para o que você vai fazer. Não me importo com o que você
acha ou deixa de achar.
Ele não se mexe enquanto esbravejo o mais perto possível do seu rosto
bonito. Mas, ainda que eu esteja furiosa por ele ter me seguido, ainda o
desejo muito. Não consigo controlar meu fascínio por ele. Mesmo me
sentindo humilhada pela sua rejeição, não posso odiá-lo. O amor é uma
droga. Nunca achei que me apaixonaria por alguém. Bem, mas aqui estou, de
quatro por um que não me quer.
Respiro fundo e me viro. Pego um vestido azul-turquesa de alcinhas no
guarda-roupa e sigo para o banheiro. Bato a porta e tranco, não dando chance
a ele de vir aqui e tentar me impedir. Encaro meu reflexo no espelho e não
fico nada satisfeita com o que vejo: estou com as bochechas vermelhas e
minha respiração está tão acelerada que parece que fim uma corrida de dez
quilômetros.
— Abra essa porta antes que eu a quebre, Lana! — Ouço a voz furiosa
de Alex, mas não dou ouvido a sua voz zangada. Me inclino contra a porta e
sinto meu coração bater forte pra caramba. Com um suspiro, tiro a roupa e
entro no box para tomar um banho rápido.
Como é que Alexander sabe que pensei em ir para Los Angeles com
Mark? Ele tem um espião aqui? Será possível? Bem, na verdade, eu não ia a
lugar algum. Esse informante dele é muito desinformado. Mark me convidou
durante o jantar da noite passada, mas não acertamos nada.
Descobri que temos muito em comum: ele é humanitário e eu, uma
aprendiz. Contei a ele sobre a ONG e foi daí que surgiu o convite. Eu não ia,
mas poderia mudar de ideia só para implicar com Alex.
Meu coração está pesado. Ainda que eu não quisesse admitir, sinto o
desejo por Alex se intensificar, cada dia mais. Saí de casa por um tempo,
achando que isso diminuiria se eu ficasse longe dele. Mas seu súbito
aparecimento acaba com a minha determinação de não me deixar levar por
esses sentimentos. Quando isso vai acabar?
Ainda ouço seus resmungos, mas não me importo. Termino de me
arrumar em frente ao espelho, aplicando um mínimo de maquiagem, e abro a
porta para encontrar Alex de braços cruzados diante dela impedindo minha
saída.
— Precisamos conversar — ele anuncia com uma carranca. —
Aconselho que se esqueça do encontro com o doutor. — Suas palavras são
repletas de ironia.
— Não mesmo. Vou sair e você não vai me impedir. — Ele não se
mexe e eu forço a passagem, mas o corpo dele é como um poste na minha
frente.
— Não vai, não. Vamos nos sentar e conversar, Lana. — Ele segura
meu pulso e me puxa em direção ao sofá da suíte.
— Sente-se — ordena.
— Para quê? Estou...
— Sente-se, porra!
— Você não me manda — falo em tom frio e calmo. — Não está
falando com um dos seus homens.
Puxo meu braço e me afasto. Mal chego à porta quando sou agarrada
pela cintura e levantada do chão.
— Me solta, Alexander! — Furiosa bato em suas costas largas, mas não
parece doer em nada. Dou um grito de susto quando sou colocada em cima da
cama. Antes que eu consiga me mexer, ele está sobre mim, me prendendo no
colchão. Eu o encaro, ofegante.
— Agora, vamos conversar — ele fala, se inclina e beija meus lábios
com força. Sua língua invade a minha boca e fico parada esperando que ele
note que não estou brincando com ele. Não sou seu brinquedinho. Ele recua
ao perceber que estou imóvel e eu fecho os olhos, escapando do seu
escrutínio. — Olhe para mim, Lana.
Abro os olhos e o encaro séria. Ele está tão perto que só precisaria
levantar um pouco e estaríamos nos beijando outra vez.
— O que você quer de mim, Alex? — Minha voz soa cansada.
— Quero que me ouça por um instante — ele fala e seus olhos estão na
minha boca. Quando penso que ele vai me beijar de novo, ele rola de lado e
se levanta da cama.
Sento e espero. Ele não fala. Apenas me olha como se eu fosse sumir a
qualquer momento.
— Estou esperando — digo azeda.
— Por onde quer que eu comece? — Ele inspira com força. — Eu não
deveria dizer isso para você, mas sei que sou o culpado por você ter vindo
para cá daquele jeito e estar se colocando em risco, com um cara que mal
conhece.
— Não...
— Não terminei, Lana. O que quero dizer é que, por mais que eu queira
ficar longe, que diga para mim mesmo que não daríamos certo e que preciso
muito ficar longe de você — ele parece desconfortável e nervoso. Pela
primeira vez, ele não parece o cara frio que sempre demonstrou para mim —,
você tem sido uma lufada de ar refrescante na minha vida toda certinha, toda
teimosa e voluntariosa...
Ele para e sorri como se estivesse se recriminando pelo rumo que suas
palavras tomaram. Mesmo tentando consertar as coisas, ele ainda não parece
tão convencido do que quer de mim.
— Sinto muito.
— Sente muito pelo que, Alex? — Me sinto frustrada com ele.
— Preciso que você volte para casa, Lana. Ouça — ele pede quando
faço menção de falar. — Essa sua viagem é mais um motivo de preocupação.
O Fontes pode ter contatos e fazer algo com qualquer um de vocês, mesmo
estando preso. Ele pode até ordenar para alguém que aja por ele...
Ele continua falando, mas não ouço mais nada.
— É isso que você está tentando dizer esse tempo todo? Que quer que
eu volte por causa do pai do Jules?
Nossa, minha burrice não tem limites... e eu acreditando que ele diria
algo de diferente como: vim por que fui um babaca e quero dar uma chance
para nós!
Vou ter que esperar muito para isso acontecer...
Alexander
Quanto mais tento me explicar, mais as coisas saem erradas. Tentei
controlar a minha possessividade ao ver Lana com o médico almofadinha.
Agora, minha vontade é colar meu corpo contra o seu e mostrar que ela é
minha. Porém, ela está agindo de forma completamente diferente dos últimos
dois meses. Me acostumei com a garota sapeca e agora, essa mulher fria me
deixa mais nervoso do que levar um tiro. Seguro a ponta do nariz e suspiro,
enquanto observo Lana sentada na cama com aquele vestido minúsculo que
não deixa nada para imaginação. Abro a boca para explicar o motivo da
minha frieza quando a mandei embora da minha casa, mas...
— Você vai sair com essa roupa para se esfregar a noite toda com
aquele doutorzinho de merda? — É o que falo quando abro a porra da boca.
Vê-la toda sorridente mais cedo foi um baque no meu coração. Percebi que
não adiantava correr. Eu a queria mesmo tendo a certeza de que vamos nos
machucar.
— Sabe, isso não combina com você. — Ela ri, debochada — Essa
possessividade fora de hora. E me esfrego em quem eu quiser, afinal, sou
livre e solteira.
Ela levanta a sobrancelha de forma zombeteira para mim e sei que está
me provocando como sempre faz. Ah, droga, ela sabe como me deixar louco.
— Lana... — Merda, sou um fraco quando se trata dela. — Eu te quero!
— digo simplesmente.
Não sou um cara de palavras rebuscadas, nem romântico, jamais fui
meloso nessas coisas de casal apaixonado. Antes, quando queria uma mulher,
eu saía em encontros de uma só noite. Enquanto era noivo de Adriane, nunca
precisei ser romântico ou bancar o apaixonado — ela me sufocava o
suficiente. Queria me casar com ela, estava apaixonado — mas sei que estar
apaixonado não é amar. Nunca amei uma mulher para pensar em fazer algo
romântico por ela. Não costumo fazer loucuras de amor.
— Alex, não vou correr atrás de você de novo — ela diz, firme. —
Cansei.
— Eu sei. Mas estou aqui, não estou? — Vou até ela e a puxo para mim
— Vamos começar de novo? Não quero esconder as coisas da sua família,
como antes.
— Não sei se quero...
— Porra, Lana! Há menos de uma semana você queria e agora...
— E você me rejeitou. Há menos de uma semana eu não era boa o
bastante para você. O que mudou? Se descobriu apaixonado da noite para o
dia? — ela pergunta com tanta calma, que temo que ela realmente vá me
rejeitar. Seu olhar de desconfiança está abalando a minha confiança.
— Só estava sendo racional.
— Racional? Você tinha é que seguir o coração, como fiz! Abri meu
coração e você o despedaçou — ela fala com a voz trêmula. — Estou de
saída, Alexander. Quem sabe, quando eu voltar, a gente termina essa
conversa.
O quê? Ela está brincando comigo.
De repente, ouço batidas na porta da suíte, o que acaba de vez com o
último resquício de bom-senso da minha parte.
Sigo até lá, furioso, por que sei bem quem está atrás daquela porta.
Abro e dou de cara com o doutor filha da mãe.
— Alex... — Lana começa, mas começo a falar antes que ela consiga
sair do lugar.
— Perdeu alguma coisa aqui, camarada? — solto em um inglês furioso,
o que faz com que o sujeito de um passo para trás.
— Me desculpe. Acho que errei de quarto. — ele sorri sem graça e
começa a se afastar, quando sinto Lana tentando passar por mim.
— Não errou, Mark. Já estou indo — ela praticamente grita para o
almofadinha e ele volta, parecendo ainda mais desconfortável.
— Não sabia que tinha companhia. — Ele me encara e dou meu olhar
mais mortal. Ele tenta ver Lana, que tenta me empurrar, mas não saio do
lugar.
— Agora já sabe. Cai fora! — grunho as palavras, meu tom mais
expressivo que meu discurso.
— Sai da frente, Alex!
— Você não vai sair. Já disse, Lana. — Não tiro os olhos do doutor.
— Algum problema, Lana?
— O problema aqui é você. A Lana já tem compromisso para a noite.
— Abro um pouco de espaço, passo o braço por cima do ombro dela e dou
um grande sorriso para o tal doutorzinho.
— Diga para ele, amor, que você vai ficar ocupada à noite toda —
sussurro e dou um aperto firme nela, colando nossos corpos. Abaixo a cabeça
e beijo seus cabelos.
— Vou te matar, seu idiota — ela fala com a mandíbula trincada de
raiva. Depois suaviza a voz para falar com o cara. — Mark, te encontro na
boate daqui a dez minutos.
— Posso...
— Vai esperar a noite toda — eu o corto de forma grosseira e começo a
recuar para dentro do quarto, levando Lana comigo. — Ah! E esqueça a
minha namorada! — Isso vai deixá-la furiosa, mas não me importo. Se posso
assumir o risco que sejamos magoados no fim de tudo isso, quero tudo a que
tenho direito.
Lana
Vejo Mark caminhar relutante para o elevador. Antes que Alexander
me puxe para dentro do quarto, feito um homem das cavernas, vejo a
expressão decepcionada de Mark e minha fúria aumenta ainda mais.
— Seu idiota! Não acredito que você disse isso! — Dou um soco em
seu estômago, mas em vez de machucá-lo, a minha mão é que lateja. — Qual
o seu problema, Alexander? — grito.
— Meu problema é você, pequena encrenqueira.
Ah, não! Conheço muito bem esse seu tom de voz.
— Vai ter que rebolar, garanhão. Não vou cair nesse seu papo. —
Ando de costas por dentro do quarto enquanto ele me segue. — Estou falando
sério, Alex!
Ele não fala nada quando me agarra. Uma mão encaixa na minha
cintura e a outra em meus cabelos. Que merda! É horrível não ter força para
impedir, mas no fundo sou muito fraca quando se trata dele. Ele não parece
zangado como estava quando Mark bateu à porta. Agora tem um ar predador
e eu sou a caça.
Mas, antes que ele me beije outra vez, me lembro de algo.
— Tem alguém me espionando aqui? — Ele não nega e tudo se apaga
quando seus lábios colam nos meus.
Ah, céus... estou perdida!
Retribuo o beijo, mas meu subconsciente não para de avisar que estou
cometendo um grande erro. Mas não o ouço. Como sempre faço, se quero
algo, eu pego e quero Alexander de qualquer jeito. Me questiono se isso não
é um capricho, como ele costuma dizer. Mas quando sinto meu coração doer
ao pensar que posso nunca mais tê-lo assim, minha resolução de esquecê-lo
enfraquece.
Empurro seu ombro e interrompo o beijo.
— Ainda quero sair.
Mesmo que eu deseje muito cair na cama com ele, tenho que ser firme.
Ele precisa saber que não pode só aparecer e me beijar.
Beijos deliciosos, se me lembro bem.
Ele não me dá ouvidos e cola sua boca outra vez na minha, mais
exigente. É tudo tão cru que acabo me deixando levar. Merda! Amanhã vou
ser forte, eu prometo!
Era como se a música da Pink, Fuckin' Perfect, estivesse tocando na
minha cabeça.
Esqueci nossas desavenças. O desejo entre nós é denso e forte, e agora
parece que temos fome um do outro. Como ele pode afirmar que não sente
nada por mim?
Meu corpo cola no seu e eu puxo a camisa de dentro da calça,
acariciando o abdômen musculoso, as costas quentes e a pele macia. Nossas
línguas se enroscaram úmidas e frenéticas. Alex tira a camisa depois que abro
os botões. Tiro seu cinto, abro a calça, ele chuta os sapatos e tira o resto das
roupas. Então, ele rasga as alças finas do meu vestido, que escorrega para o
chão, e tira o fio dental muito rápido, antes de cairmos abraçados na cama,
nus, ardentes e esfomeados. É para ser sempre assim, intenso e voluptuoso,
com o desejo de nos fundirmos em um...
Tudo o que eu quero é o seu amor incondicional e vou lutar por ele...
CAPÍTULO 26
Lana
Acordo sentindo um peso sobre mim e me mexo na tentativa de
afastar o que me incomoda, quando me lembro que não estou sozinha na

cama. Alex! Merda! Tudo o que eu não queria acabei fazendo na noite

passada. Olho para o relógio na mesa de cabeceira. São 3:16h. Minha

garganta está seca. Tiro o braço pesado de Alex de cima de mim, levanto e

vou ao banheiro. Em seguida, pego uma garrafa de água. Depois de me

servir, em vez de voltar a me deitar na cama, vou para o sofá e me deito lá.

Por que amar é tão complicado? Meu erro é ser tão impulsiva. Não penso —

ajo e lamento depois —, sempre foi assim. Saber que meus pais querem selar

meu futuro como se eu não tivesse vontade própria, havia determinado

muitas ações da minha vida. Era como se eu quisesse viver intensamente até

chegar o momento de aceitar as escolhas deles. Ah, como eu gostaria de ser o

filho que meu pai gostaria de ter tido, e herdar seu legado...
Desvio meus pensamentos quando ouço Alex se mexer. Ele acorda, se
senta na cama e olha para os lados, até me localizar no sofá.
— O que está fazendo aí? Volte para cama. — Sua voz está rouca de
sono, soando mais gentil do que nunca, mas como não me mexo, ele me
observa com atenção. — Qual o problema, Lana? Está se sentindo mal? —
Ele sai da cama e vem até a mim. Nu.
Protesto quando ele se abaixa, me pega no colo e me leva para a cama.
Depois de me acomodar no colchão, me sento encostada na cabeceira e o
encaro:
— Por que você veio, Alex? — questiono. — Até agora, você não disse
o que está fazendo aqui. Só agiu como um homem das cavernas a noite toda.
Espero e ele suspira, como se eu estivesse fazendo uma pergunta difícil.
Mas só quero entender.
— Não é obvio, Lana? — ele grunhe depois de um momento de total
silêncio.
— Não para mim. Fiz exatamente o que você me pediu: esquecer o que
houve entre nós. — A rejeição ainda queima na minha alma e eu não vou
perdoá-lo com facilidade. Não mesmo. — Daí você aparece do nada e quer a
minha total compreensão? Não acha que me deve um pedido de desculpas?
— Por ser sincero com você? — Ele segura meu pescoço e me puxa
para perto de si. Tão perto que sinto seu hálito. — Mas, agora, vim até você
porque quero tentar e ver onde isso pode dar. Sei que demorei a compreender
o que sinto, mas parei de lutar comigo mesmo. E, se você ainda me quiser,
podemos tentar.
Olho profundamente na sua íris verde pálida, mas com um brilho tão
vívido e cheio de promessas que talvez ele não possa cumprir.
— Você acha que por vir até aqui, dizer que me quer, que eu vou para
você? Acha que sou tão fácil assim? — Que homem arrogante! Ele me teve
fácil, como uma boba apaixonada.
— Você é minha, já aceitei isso. — Não acredito nessa súbita mudança.
O que aconteceu para que ele viesse aqui, todo meloso?
— Vai ter que demonstrar que é isso que quer, Alexander. Transar
comigo não é prova de nada. Não prova que você quer dar uma chance de
verdade para nós. — Me inclino e o encaro, quase colada em sua boca. —
Vai ter que conquistar meu coração outra vez, Alex. As coisas foram muito
fáceis para você. Agora, posso até usar você para fazer sexo, mas meu
coração não está disponível para você, até que seja digno dele — sussurro.
— Acha que está sendo fácil? Você só me deu trabalho, Lana Mitchell.
— Ele cola a boca na minha e eu não abro para retribuir o beijo. — Me beija.
— Não... — falo com semblante fechado e ele entende a seriedade da
situação.
— Você está certa, Lana. Fiquei viciado em você. Mesmo que eu tenha
tentado negar, seu toque e seu afeto verdadeiro me conquistou. Não mereci
nada do que você me deu até agora. — Ele se afasta um pouco, olhando em
meus olhos. Uma infinidade de sentimentos cintila em sua íris translúcida,
que me atrai terrivelmente. — Mas sou louco por você! Estou tentando toda a
merda que vem acontecendo para trás e dar uma chance a nó. — ele fala e,
logo em seguida, faz uma careta como se não quisesse admitir que sente algo
por mim.
Será que é tão difícil me amar?
— Não quero que diga algo que não sente ou que acha que é o que
quero ouvir, Alex. — Sinto vontade de gritar de frustração. — Ou você me
quer ou não. Olha para mim. Abra seus olhos e veja quem eu sou de verdade.
— Sei quem você é. — Ele beija suavemente o meu nariz e meus lábios
cerrados. — Eu sei que você é linda, por fora e por dentro e isso é como uma
rajada de brisa morna na minha vida. — ele beija minhas pálpebras — Você é
como êxtase nas minhas veias, minha querida, vamos voltar e fazer tudo certo
dessa vez, pequena rebelde. — ele sussurra.
— Não estou pronta para voltar ainda — digo.
— Não — ele é taxativo. — Temos que voltar, Lana. Hoje.
— Vou ficar até o último dia que planejei. Não tente agir como um
idiota. — Me levanto e vou para o banheiro. Ele sempre tem que ter a última
palavra?
Alexander
Um homem sabe a hora certa de recuar!
Depois que Lana vai ao banheiro, caio na real de que parti seu coração
dela quando a mandei embora. Agora, preciso consertar as coisas. Pego o
telefone e entro em contato com o escritório. Pela hora, já deve ter alguém
por lá. Deixo recado, avisando que vou demorar mais que o esperado e que
quero um relatório diário sobre como as coisas estão. Se para fazer as pazes
com ela é preciso ficar aqui, é exatamente o que vou fazer. Ela não vai ficar
mais sozinha aqui um minuto sequer.
O dia começa a amanhecer e fico pensando em uma maneira de seduzir
Lana de vez...
Ela volta pouco depois e se deita de novo na cama, de costas para mim,
me ignorando.
— Você está certa, minha linda megera — digo, enquanto a puxo
contra mim. Seu corpo retesa e vejo que, ainda que tenhamos transado a noite
toda, ela não confia em mim. Fico aborrecido comigo mesmo por ter sido tão
intransigente ao afastá-la. — Tenho sido um grande idiota com você —
admito. — Você sabe melhor do que eu como agir quando quer algo... não
tem medo de correr atrás. Eu sou um tremendo machista tosco.
— Agora estamos falando a mesma língua, idiota. — Sua voz sai
abafada contra meu pescoço.
Dou um tapinha na sua bunda.
— Não seja insolente...

Passamos um dia estranho, Lana está tão espertinha comigo me


deixando sem saber o que ela realmente pensa da minha súbita vinda para
encontrá-la, sua aparente indiferença me deixa nervoso, mas eu mereço seu
desprezo, no entanto, a frieza dela comigo é tão nova e estranha que me deixa
realmente preocupado.. Lana é tão aberta com seus sentimentos... ela pode até
ser voluntariosa, mas tem um coração puro. Isso é nítido, principalmente pelo
trabalho na ONG. Eu é que não enxerguei isso antes.
Em certo momento do dia, ela foi conversar com o tal médico. Me
segurei para não agir como um selvagem. Enquanto os observei conversar,
meus punhos ficaram cerrados.
— Calma, Marshall, não aja como um bárbaro — resmunguei para mim
mesmo.
Como prometi, baixei minhas defesas e aproveitei o dia com ela.
Fizemos aula de surf —uma das cortesias do hotel. Quando voltamos, o
médico estava no lobby, como se estivesse esperando uma oportunidade para
encontrá-la.
CAPÍTULO 27
Lana
Vejo Mark no lobby e sigo em sua direção para me desculpar por
ontem à noite, deixando Alex aborrecido e à espera. Me sinto constrangida

pela forma grosseira com que Alex o tratou. Ele jamais foi desrespeitoso

comigo.

— Oi, Mark.
— Lana... — Ele olha para Alexander, que está com cara de poucos
amigos. — Que bom que você está bem. Fiquei preocupado.
— Ah, sim, estou bem. — Fico vermelha e nem sei porquê. — Quero te
pedir desculpas por aquilo.
— Tudo bem, Lana. O seu namorado deve ter achado estranho
encontrar um homem na sua porta. — Ele abre um sorriso sem graça. — Se
você fosse a minha namorada, também ficaria chateado.
— É complicado — gaguejo e olho rápido para onde Alex está parado
esperando. — Quando você vai embora?
— Amanhã, como planejado — ele diz.
Ficamos sem saber o que falar durante um tempo, e ele estende a mão
para mim.
— De qualquer forma, foi ótimo conhecê-la, Lana — diz.
— Quero te convidar para ir a CASM qualquer dia desses. Vai ser
muito bem-vindo. — Dou o número do meu telefone a ele. — Vai ser ótimo
ter um dia de consulta grátis. Espero receber uma ligação sua em breve. —
Sorrio e o abraço de forma espontânea. Eu poderia conhecê-lo há pouco
tempo, mas sei que ele é uma boa pessoa.
— Vai ser um prazer ir lá conhecer. — Ele sorri.
Nos despedimos e seguro o cartão com seus contatos. Volto para perto
de Alex.
— Terminou de bater papo com o doutor? — Ele olha para o cartão em
minha mão.
— Ah, sim. Por enquanto... vamos. — Aponto o elevador. Ele fica
parado por um tempo que parece não ter fim, olhando na direção em que
Mark foi.
Meu telefone começa a tocar e vejo que é a minha mãe. Temos nos
falado todos os dias, hoje não seria diferente.
— Oi, mamãe! — Seguro a mão de Alex e o puxo em direção ao
elevador.
— Como você está, filha?
— É bem... estou ótima — respondo e abro um sorriso. Alex arqueia a
sobrancelha para mim. — Estava pensando em ficar mais um mês aqui. —
Não é verdade, mas quero implicar com ele, que arqueia ainda mais as
sobrancelhas.
— Tem certeza, Lana? E a faculdade? Acho que já está na hora de
seguir em frente, depois de tudo o que aconteceu — minha mãe fala. —
Estou preocupada com você. Sei que incentivei essa viagem, mas...
— Soube que o pai do Jules pode sair da cadeia — falo, pois sei que
sua preocupação tem tudo a ver com isso.
— Como você sabe disso?! — Pela apreensão em sua voz, acertei.
Olho para meu segurança- namorado e fico em dúvida se devo ou não contar
que estamos juntos. Ela não é muito fã de Alex. Bem, não desde o dia em que
me encontrou chorando pra caramba no quarto.
— Eu... fiquei sabendo — Droga!
— Lana Mitchell, o que você está escondendo da sua mãe? — Seu tom
é um pouco divertido, mas também apreensivo. — Será que você não
encontrou um amor aí?
Fico sem graça em conversar com ela enquanto Alex está prestando
atenção. E, pelo visto, ele estava até ouvindo o que ela estava falando do
outro lado da linha.
— Claro que não, mãe — respondo. — Conversamos quando eu voltar.
Desligo o telefone ao entrarmos na suíte e me volto para Alex, que está
parado feito uma estátua no meio do quarto.
— Você me deve um primeiro encontro. — Aponto o dedo para ele —
Nunca saímos como casal, portanto...
— Por que não disse para a sua mãe que está comigo? — ele pergunta e
parece chateado.
— Estava te salvando da ira dela. — Sigo para o banheiro — Você está
na lista negra da minha mãe.
— Responda à pergunta, Lana. — Seu tom é frio e controlado como
sempre.
— Já respondi. Ela não precisa saber que você está aqui. Não tem
motivo.
— Vou para o meu quarto — ele fala, se vira e sai. A suíte em que está
hospedado fica ao lado da minha. — Esteja pronta quando eu voltar.
Vou para o chuveiro e fico pensando em seu súbito mau-humor.
Alexander
Vou para o quarto puto. É assim que Lana quer que as coisas mudem?
Me escondendo da sua família? Mas que merda!
Me sinto irado depois de vê-la trocar telefones com o médico e não ter
contado para a mãe que estou aqui. Dou um murro na parede, totalmente fora
de controle! E fico com mais raiva ainda por perde-lo desse jeito.
Será que é tarde demais para que as coisas dessem certo entre nós?
Quando fizemos amor ontem, achei que tudo ficaria bem. Mas os últimos
acontecimentos provaram que estou errado e que, talvez, as coisas não
saíssem como eu esperava.
Que merda!
Vou para o banheiro tomar um banho e esfriar a cabeça. Ligo o sistema
de som e coloco um rock pesado para tocar, enquanto tiro a roupa. Entro no
chuveiro e começo a pensar de que forma vou conquistar o afeto de Lana
outra vez.
Enquanto me sexo, Let her go, de Passenger começa a tocar, zombando
de mim.
CAPÍTULO 28
Alexander
Saio do banheiro e me visto. Pego a carteira e passo os dedos pelos
meus curtos cabelos, em sinal de frustração. Não tenho a menor ideia do que

fazer para agradá-la. Sorrio a contragosto. Estou tenso. Não tenho nada

planejado e não faço a menor ideia de como agir para ser romântico com ela.

Que porra vou fazer?!


Antes de sair, vou até o bar no canto da suíte e sirvo uma dose de
uísque. Geralmente bebo apenas quando não vou precisar mais sair, mas
estou precisando de uma dose. Não sei se estou protelando para dar tempo a
ela de se arrumar ou para pensar em algo que me ajude a reconquistá-la. Fix
You do Coldplay começa a tocar e, enquanto bebo, tento me inspirar na
música, mas nada digno da Lana me vem à cabeça.
...
When you try your best, but you don't succeed,
When you get what you want, but not what you need,
When you feel so tired, but you can't sleep
Stuck in reverse!
...
Tomo o drinque e fecho os olhos por um momento, pensando que essa
coisa de encontro meloso, cheio de baboseiras românticas, é algo bem
desnecessário. Esse tipo de encontro é para casais em busca de
relacionamento sexual, e já passamos dessa fase há muito tempo.
Tudo o que quero é abraçá-la e amá-la com carinho, fazendo amor a
noite toda, intensamente, até que não tenhamos mais forças. Não gosto de
imposição, mas sei que a noite será um desastre se eu não fizer as coisas
românticas que ela mencionou.
Garota petulante! Mas estar apaixonado me faz sentir completo.
No entanto, planejo voltar para casa amanhã, nem que eu tenha que
carregá-la sobre os ombros e a colocar dentro do avião. Não posso
negligenciar meu trabalho. Vamos ter tempo para nos entender melhor depois
que toda essa confusão passar.
Estou prestes a bater na porta de Lana quando meu celular toca.
— Qual o problema, Bruno? — Ele ficou responsável pela segurança
dos Mitchell.
— Não tenho boas notícias — ele fala. — O Fontes vai sair da prisão
amanhã. O juiz concedeu a liberdade sob fiança.
— Que merda! — Quero esmurrar a parede a minha frente. Quando
penso que tudo está se resolvendo, o mesmo problema volta. — Espero que
se mantenha na dele. E os Mitchell? Como estão as coisas por aí?
— Tudo tranquilo, por enquanto — responde e ri de forma debochada.
— E você, quando volta? A garota está te dando trabalho? É hilário ver um
cara como você apaixonado.
— Cuide do seu trabalho, Bruno — grunho. — Não meta seu nariz
onde não deve.
— Você não tem senso de humor. — Ele ri, como sempre, mas em
seguida muda o tom. — Eu te aviso como as coisas estão indo...
— Volto amanhã — eu o corto. — Mantenha uma pessoa na cola do
Fontes quando ele sair da prisão.
A raiva me consome. O cara quase me matou e a Lana, e agora vai ser
solto? Não acredito nisso! Que merda de justiça!
Desligo e fico parado na frente do quarto de Lana por um tempo,
colocando as ideias no lugar. Bem, a noite vai ser longa. Afasto os
pensamentos ruins e volto minha atenção ao que realmente importa hoje.
Respiro fundo e bato na porta, enquanto penso em momentos que
passamos juntos. Lana sempre teve uma postura alegre e impulsiva ao meu
lado e espero conseguir trazê-la de volta. Aguardo alguns instantes, mas ela
não me atende. Bato outra vez e ouço um grito dentro do quarto. Que porra é
essa?
— Lana! — Soco a porta e a chamo.
Jules
— Filho! — Ouço a voz da minha mãe ao entrar em casa — Preciso
falar com você.
Desisto de ir para o quarto — o lugar que passo mais tempo desde que
descobrimos as burradas que meu pai fez e, claro, desde que foi preso.
Ela está na sala de estar com o advogado que contratou para o caso. Eu
o cumprimento e olho para minha mãe.
— Seu pai vai ser solto amanhã. — Ela está com um sorriso forçado no
rosto, algo bem estranho para uma esposa que sabe que o marido vai sair da
cadeia.
Não sei por que ela me conta isso. Ainda me sinto enraivecido por sua
covardia. Sua atitude é inaceitável para mim.
— Que pena. Por mim, ele podia apodrecer por lá — respondo e vou
para o quarto, ignorando suas palavras de que devo apoiar meu pai.
Como posso fazer isso? Minha mãe vive no mundo da lua, ou melhor,
no mundo das bolsas Dior. Ela está agindo como se meu pai não tivesse
cometido um crime grave. Sua complacência é lamentável e me enoja.
O telefone toca. Fecho os olhos quando vejo que é Lana. Tenho que
contar para a minha melhor amiga que o meu pai vai sair da prisão. Temo a
sua reação.
Lana
Depois do banho, coloco um vestido leve, sem alças e sexy — ideal
para uma noite em Malibu. Prendo o cabelo de lado, que cai em ondas por
cima do meu ombro esquerdo. Não faço ideia de onde vamos, mas espero que
Alex não estrague a noite com seu péssimo humor. Afinal, o que eu vi nele?
Me fiz essa pergunta várias vezes. Talvez seja porque ele é o meu oposto e eu
adoro um desafio. Sorrio enquanto aplico uma maquiagem leve. Me apronto
em tempo recorde e o espero. Enquanto ele não vem, aproveito para
conversar com Jules, que atende no quarto toque.
— Oi, gata! Você não me liga desde ontem — ele fala e sinto sua voz
distante. — Você está bem?
— Sim e você? O que tem feito enquanto estou fora? — Sigo para a
varanda que tem vista para o mar. O sol ainda está brilhando lá fora, apesar
de já ser sete da noite. — Você não parece bem.
— Só estou um pouco chateado.
— Chateado com o que, meu amigo? — Ele fica calado e eu insisto, me
lembrando que sua família está passando por momentos nada agradáveis —
Pode me falar qualquer coisa, Jules.
— Tenho uma notícia triste para te dar. — Ele suspira do outro lado,
sua voz soa derrotada quando ele anuncia. — Meu pai vai ser solto amanhã.
Fico muda sem saber o que dizer. Apesar de saber que isso poderia
acontecer a qualquer momento, o medo me invade ao pensar que alguém
pode me sequestrar de novo. Fico paralisada entre o quarto e a varanda
quando ouço baterem na porta. Dou um pulo e um grito assustado sai dos
meus lábios.
— Lana!
— Lana!
Ouço Jules me chamar ao telefone e Alexander, enquanto bate na porta.
Ah, merda! Não é um sequestrador.
— Lana! Você está bem? — Jules grita do outro lado da linha e me
forço a responder.
— Estou sim. Bateram na porta e me assustei — respondo e abro a
porta para Alex.
— Por que você está gritando? — Ele invade o quarto e me olha antes
de desviar o olhar ao redor da suíte.
— Jules, preciso desligar. Falo com você depois.
—Espere, Lana! — ele grita do outro lado. — Você não está sozinha?
Quem está com você?
— Estou bem Jules, não se preocupe — digo — e não estou só! Te ligo
depois. Beijos. Ah, obrigada por avisar — falo me referindo à notícia do seu
pai. — Amo você, querido.
Desligo e solto um suspiro pesado, erguendo meus olhos para encontrar
Alex tenso na minha frente, com seus músculos proeminentes e punhos
cerrados. Vejo em seus olhos que ele está tentando manter as emoções sob
controle. Será que ele achou que eu estava em perigo?
— Estava falando com o Jules? — Sua voz máscula sai rouca. — O que
ele te disse? Achei que você estava sendo atacada.
— Culpa é sua, que bateu em uma hora inconveniente. — Ele arqueia
as sobrancelhas. — Ele disse que o pai vai sair da prisão amanhã. Estava
digerindo a informação quando você bateu na porta.
Alex suspira, estende a mão e a descansa atrás do meu pescoço. Ele
parece fazer muito isso quando estamos juntos. Ele me puxa de encontro ao
seu corpo e me abraça com ternura. Nunca me segurou assim antes, sem
apelo sexual — só um abraço reconfortante.
— Por que você tem que dizer a toda hora que ama esse cara? — Sua
boca está próxima a minha, seu hálito misturando com o meu. — Isso é
chato...
Eu o abraço de volta, envolvendo meus braços em seu pescoço e acabo
suspensa do chão. Como sempre, acabo com as pernas ao redor dele. Sou um
caso perdido.
O que começou inocente muda quando o aperto forte e beijo sua
mandíbula, sentindo suas mãos na minha bunda, apertando com firmeza.
Poucos instantes depois, estou contra a parede e sendo beijada intensamente.
Gemo em sua boca quando a língua desliza contra a minha e...
Ele segura meu rosto e me olha antes de pousar a boca suavemente na
minha e depositar um beijinho nos meus lábios.
— Temos um jantar romântico para ir. — Ele desliza a língua até meu
ouvido e envolve minha orelha entre seus dentes, sussurrando provocante
com sua voz sexual. — Tenho que agradar a minha garota, sabe? Ela é muito
exigente e quer minha total dedicação nesse encontro. Quero fazer todas as
suas vontades ou morrer tentando.
— Alex... — sussurro quando sinto meu corpo quase entrar em
combustão por suas carícias e sua voz safada em meu ouvido.
— Foi você quem exigiu esse encontro, Lana. — Ele ri da minha cara
desesperada e me coloca no chão. — Pronta?
Sim, mas não para o que ele tem em mente. A contragosto, vou em
busca da minha bolsa e, logo depois, saímos da suíte.
— Aonde vamos? — pergunto curiosa. Sei que ele passou o dia de
mau-humor porque exigi que ele tivesse mais atenção comigo.
— Jantar, como todo casal de namorados faz. — Sua mão segura a
minha com firmeza, enquanto saímos do hotel.
— Humm, não sei, nunca fui a um encontro de namorados — falo e
seguimos para onde um carro nos espera.
— O quê? A socialite patricinha não teve muitos encontros românticos
com os inúmeros namorados? — ele pergunta com divertimento. — Linda,
você a cada dia me surpreende mais. Mas fico satisfeito em saber que serei
seu primeiro.
Dou um soco de leve em seu braço e rio da sua expressão de espanto e
brincadeira. É bom vê-lo assim, descontraído.
— Não fique se achando, grandão. — Alex beija o dorso da minha
mão, seus olhos verdes cintilam para mim e me vejo cada vez mais
apaixonada por esse homem tão arredio.
Pouco depois, estamos em um restaurante lindo com vista para o pôr do
sol vermelho e laranja no céu. O Geoffrey's Malibu é elegante e a vista
espetacular. Mesmo não sendo o gesto mais romântico do mundo, o que
quero, na verdade, é que ele dê mais valor a nós. Esse é um começo e estou
adorando cada minuto da sua atenção, me tratando como uma igual, sem
bancar o adulto responsável e me ver como a garotinha desmiolada. Está
bem, às vezes eu sou assim, mas estou me esforçando.
— O que o Jules te disse, Lana? — ele pergunta em um certo momento.
— Já falei. Na verdade, nem terminamos de conversar. — Olho para o
céu vermelho e tento afastar a lembrança das horas que passei naquele
casebre. — Podemos mudar de assunto?
— Vamos voltar para casa amanhã — ele informa e, quando tento
argumentar, levanta a mão me calando. — É importante que eu esteja perto
da minha equipe se o Fontes resolver fazer outra gracinha, Lana.
Estremeço só de imaginar. Não sei qual o problema do pai do Jules
com a minha família. Acabo perguntando a Alex.
— Pelo que investiguei, ele estava participando de uma mesma
concorrência que o seu pai, para uma obra de um gasoduto. Era um projeto
grandioso que ia tirar a empresa do Fontes do vermelho. Mas o seu pai
ganhou a licitação, deixando o Fontes muito furioso com a falta de sorte.
Então, ele levou para o lado pessoal. Me lembro que ele esteve na casa de seu
pai, depois da tentativa do sequestro, naquele jantar. Acredito que era uma
forma de ele tentar conseguir fechar algum negócio ou para observar a casa, o
que me parece mais provável. Mas, naquela noite, ele não fez nada suspeito e
não estava na lista de suspeitos por ser um antigo parceiro de negócios do seu
pai e, aparentemente, seu amigo pessoal, algo que era reforçado pela amizade
entre você e Jules.
— Quero muito que esse pesadelo termine — murmuro e penso no meu
amigo. Jules deve estar triste demais com tudo isso. De repente, não vejo a
hora de voltar para casa e estar ao lado dele. — Você acha que existe a
possibilidade de o Fontes tentar algo contra o meu pai, agora que sabemos
que era ele o tempo todo?
— Nunca se sabe. Não acho difícil, para falar a verdade. — Alex
envolve minha mão na sua, entrelaçando nossos dedos. — Quero me
certificar de que nada vai te machucar, nem a sua família.
— Obrigada. — Meu coração incha no peito e eu aperto seus dedos.
Tenho certeza de que a equipe de Alex vai manter a minha família em
segurança. Tenho que acreditar nisso.
Depois dessa conversa, Alex me distrai e conversamos animados. Ele
me fala dos seus gostos musicais — que, por sinal, não são nada como
imaginei. Achei que ele curtisse heavy metal, como a maioria dos homens
que conheço, mas ele gosta de tudo um pouco. Temos até cantores que
gostamos em comum, e acabo rindo por que achei que não combinaríamos
em nada.
— Claro que você não gosta da Demi Lovato — zombo quando ele diz
gostar de algumas músicas dela. — Ela é fofa demais para você, Alexander.
— Estou falando sério. Assisti ao clip do filme Frozen, só pela música
Let It Go que ela interpreta — ele fala sério, mas sei que está mentido porque,
em seguida, ele ri da minha cara de espanto. — Você me acha um mentiroso,
Lana Mitchell?
— Sexy, mas ainda assim, mentiroso. — Ainda estou rindo quando ele
me puxa para um beijo sensual de tirar o fôlego – que já não é lá essas coisas
quando estou na presença dele.
Terminamos o jantar e saímos do restaurante. Passa um pouco das onze
da noite e, quando chegamos ao hotel, o arrasto para dançar na casa noturna.
— Você não enjoa de vir aqui toda noite? — Alex pergunta quando
percebe para onde o estou levando. — Você é pirada demais, Lana, mas eu
amo isso em você.
Fico paralisada com a sua admissão. Não foi uma declaração de amor,
mas me atingiu com força, da mesma forma. Eu também nunca disse que o
amo e não sei o que me impede de falar, já que não tenho "papas" na língua.
No entanto, quando você se apaixona por um homem que não quer te amar
também, você precisa se resguardar.
Continuo o puxando para a pista. Neste momento toca o remix de
algumas músicas que adoro e o ritmo me contagia, fazendo meu corpo se
mexer contra o corpo de Alexander.
— Você devia se divertir mais, Alex — grito para ser ouvida acima da
música. Sorrio para ele. — Sabia que você é um chato?
Em vez de responder, ele segura a minha cintura e giramos na pista em
um ritmo que não combina com o que está tocando.
— Posso te mostrar mais tarde o quanto eu posso ser "legal", minha
pequena sabichona — ele sussurra no meu ouvido e morde o lóbulo da minha
orelha.
— Vai ter que dar muito duro, bonitão — digo, passando os braços pelo
seu pescoço e balanço meus quadris em um movimento sexy. — Ainda não
vi nada de romântico nessa noite — provoco. Ele está tentando, eu sei.
— Vou adorar dar duro com você, bebê — ele sussurra em tom rouco
com o trocadilho.
Sua boca rouba a minha e o ritmo muda para uma música sexy. O calor
da sua pele me arrepia enquanto dançamos colados um no outro.
Vamos voltar para casa amanhã, e quero levar boas lembranças daqui.
Talvez as coisas não sejam fáceis para nós, nesse começo de relacionamento
— ainda é cedo para saber se vai dar certo ou não — mas vou fazer o
máximo que puder para salvar o que temos.
Fazemos uma pausa de cinco minutos enquanto tomamos um drinque e
Better Than Words do One Direction começa a tocar. Sou arrastada para a
pista de dança por Alex. No começo, fico perdida, sem entender — nunca
achei que ele gostasse de música adolescente. Mas, quando a música começa
a tocar e presto atenção na letra, sinto todos os pelos do meu corpo se
arrepiarem...
Ele me segura com firmeza em seus braços, sou consumida outra vez
por seus lábios que estão muito mais exigentes que antes.
— Você me deixa louco, Lana. — Sua voz soa rouca, quando recua e
me olha faminto — Quero. Ser. O. Seu. Amor. Sempre, minha querida!
Ah, meu Deus!
CAPÍTULO 29
Lana
— Amo você. — Ouço o sussurro rouco e sexy de Alex, antes
da sua boca cobrir a minha em um beijo apaixonado e escaldante, espelhando

suas palavras. Ele me aperta com firmeza. Sinto a ereção roçar em minha

barriga, sua excitação evidente me deixando zonza de tesão. Percebo que não

importa onde estamos, o desejo é como uma presença física entre nós. Enrolo

a língua na dele, retribuindo o beijo como se não houvesse amanhã.


— Você já é o meu amor — sussurro quando ele afasta a boca da
minha. — Mas quero ser o seu amor também. Quero ficar com você e que
aceite isso sem que haja uma constante guerra de vontade entre nós.
Segura sua camisa, me sentindo ansiosa. Sempre que estou perto dele,
sinto vontade de em envolver em seu corpo. Sorrio com o pensamento bobo.
Mas estou tão radiante de felicidade por saber que ele se rendeu ao
sentimento que existe entre nós. A felicidade me aquece.
— Você já é muito importante, Lana. — Seus olhos estão límpidos e
sinceros. — Quero você mais do que já quis alguém. Te mandar embora da
minha casa não foi fácil como você achou. Eu me machuquei também.
Tampo sua boca com a mão, o impedindo de falar.
— Só quero que nos dê uma chance, ok? — pergunto e enlaço seu
pescoço, o abraçando forte, e lhe dou um sorriso provocante. — Também te
amo, grandão.
Amo sentir a dureza dos seus músculos. Ele se afasta de mim e segura
meu rosto:
— Fique aqui, garotinha — ele fala e se afasta da pista.
Fico parada esperando. Observo quando ele vai até o DJ, conversa com
ele e, pouco depois, Thank you for loving me do Bon Jovi soa na boate. Me
encontro sorrindo para o meu guarda-costas favorito do outro lado da pista
enquanto ele caminha de volta para mim. Não precisamos de palavras agora.
Quando Alex está por perto e me toca, perco a habilidade de pensar e
raciocinar. E, agora, não é diferente. Sou moldada ao seu corpo quando ele
chega por trás e me segura como se eu fosse seu tesouro mais precioso.

Dançamos devagar e sensual. Sinto um desejo intenso me tomar e


quando me viro e olho para Alex, vejo o mesmo em seus olhos. Como se
pensássemos a mesma coisa, ele segura na minha mão e caminhamos em
direção a minha suíte. Ao entrarmos, estamos acesos de luxúria.
— Te quero tanto. — Alex morde a minha orelha e estremeço com um
arrepio. Desço as mãos para o botão da calça jeans e começo a abrir.
— Me mostra então...
Ele me segura com tanta possessividade, e me beija tão ferozmente que
perco o fôlego. Minha bolsinha cai no chão quando sou tomada nos braços e
levada para dentro, sendo jogada na cama de repente. Seu corpo cobre o meu
e ele cola a boca na minha.
Entrelaço os dedos em seu cabelo e gemo quando ele tira meu vestido.
Ele desliza a língua pelo meu pescoço, descendo pelo meu corpo. Minha
barriga aperta de ansiedade quando ele abre minhas coxas totalmente, e fico
vermelha por ser o alvo dos seus olhos verdes intensos enquanto ele observa
minha vagina exposta.
— Quis te provar o dia inteiro... mas você é uma coisinha má, Lana
Mitchell. Não pode privar seu homem da sua coisa favorita. — Sua voz sai
rouca e levemente divertida, e eu sorrio para ele. — Agora posso fazer o que
eu quiser.
Ele vai direto para o meu clitóris latejante e, em poucos minutos, estou
me contorcendo contra sua boca. Atinjo o clímax tão rápida e violentamente,
que estremece meu corpo em espasmos deliciosos.
— Alex...
Nem me recuperei do primeiro orgasmo quando sou penetrada com
força. Nem percebi que ele se despiu. Ele segura minha cintura levantando
meu tronco do colchão e fico sentada nas suas coxas musculosas, os bicos
dos meus seios roçam seu peitoral, e ofego de puro prazer quando começo a
rebolar no seu pau delicioso. Ah! Ele enterra o rosto no meu pescoço e chupa
minha pele, com mordidinhas que deixarão marcas depois, mas não me
importo.
— Você é tão apertada, pequena e deliciosa, Lana. — Ele perde o
controle de vez quando segura firme no meu quadril, assumindo o controle
dos meus movimentos...
— Ah! — grito quando sou atingida, mais uma vez, por um orgasmo
violento. Nossos gemidos combinados são os únicos sons do quarto, mas é
cortado pelo grito rouco de Alex quando ele chega ao auge.
Essa viagem não poderia terminar de outra forma.

O avião aterrissa na noite seguinte e, enquanto aguardamos a liberação,


meu coração acelera de ansiedade. Não sei o que vai acontecer daqui para
frente. Um carro nos aguarda no aeroporto, e vejo Carl de pé, ao lado. Meu
primeiro segurança, coitado, se deu mal por minha causa. Ao vê-lo tão sério,
me sinto envergonhada das minhas maluquices — ainda que fosse um
pouquinho só.
— Boa noite, Carl — Alex cumprimenta e abre a porta de trás, para que
eu possa entrar. Cumprimento o rapaz e me sento, esperando que eles entrem,
mas Alex continua do lado de fora, conversando baixinho com o segurança.
Será que ele vai me mandar embora sozinha? Ah, não! Sinto os olhos
encherem de lágrimas, mas as contenho quando ele fecha a porta do meu lado
e se afasta. Ele entra ao lado de Carl, no banco da frente. Duas emoções me
invadem: alívio por ele ir comigo no carro e mágoa por ele não se sentar
comigo, fazendo com que a nossa relação volta a parecer segurança-cliente de
novo.
Ele me olha e eu não disfarço meu desgosto quando o encaro em uma
pergunta silenciosa.
— Vamos te levar para casa, Lana. Seus pais estão preocupados. Carl
acabou de me contar que o Fontes está solto. Quero que você fique segura, na
casa dos seus pais — diz.
Não respondo. Mesmo sabendo que preciso tranquilizar meus pais, não
quero me separar dele. Gostaria que ficássemos juntos, mas sei que não é a
hora de dizer o que penso.
Alexander
Abro a porta para Lana sair do carro, quando Carl estaciona em frente a
casa dos seus pais. Estendo a mão e a ajudo. Sei que ela está brava comigo e
o porquê, mas quero que ela se sinta à vontade para conversar com os pais
sobre o nosso envolvimento. Eu havia ficado puto com ela, por ter escondido
da mãe o nosso relacionamento. Mas sei que — por ser herdeira de milhões
— sua família podia fazer uma ideia diferente ao meu respeito.
— Vou te acompanhar — falo e ela me dá um olhar fulminante dela.
Sorrio, tentando tranquilizá-la, mas sou ignorado. Inclino o meu corpo na sua
direção e digo baixinho: — Amo você.
— Não parece — ela resmunga ao mesmo tempo em que a guio para
entrada da casa. Amo seu jeito marrento, tenho que admitir, mas tenho
vontade de plantar uma palmada em seu traseiro. Me contenho, pois seu pai
pode estar nos observando e até apresentar queixa contra mim, por tocar na
bunda da sua filha.
Estou preocupado, Fontes saiu da prisão enquanto voávamos. Queria
levar a Lana para u lugar distante, mas não me perdoaria se a família dela se
machucasse e não estivéssemos por aqui.
Quando saio da casa dos Mitchell, após quase uma hora, vou direto
para o escritório, onde passo quase a noite toda. Não me sinto animado em ir
para casa sozinho. Cada dia que passa, estou mais ligado na Lana e permitir
que esses sentimentos me envolvam é libertador. Amar sem me importar com
merda alguma é indescritível.
Jules

Cerro os punhos com raiva, as unhas cravadas na palma da minha mão.


É errado sentir ódio e nojo do próprio pai? Pois é isso o que sinto agora. Ele
chegou mais cedo da prisão e parece ter chegado de um passeio no parque.
— O que você disse? — Minha voz sai baixa e áspera.
— Isso mesmo que você ouviu. Você vai me ajudar. Preciso colocar as
mãos em qualquer membro da família do Mitchell. Pode ser aquela sua
amiga, o menino ou a mãe, tanto faz. Quero ver o Mitchell sofrer.
— Seu porco... — Ele me atinge antes que eu perceba. Sinto a cabeça
rodar.
— Seu filho da puta inútil! — ele grita com o rosto vermelho de raiva.
— Vai me ajudar ou vai morar na rua de hoje em diante!
— Qual é o seu problema?! — grito para ele. — Acha pouco ter
sequestrado a Lana e ainda quer continuar essa loucura, seu doente?
— Você vai me ajudar! — ele grita tão furioso, que as veias do seu
pescoço parecem que vão estourar.
Meu pai está louco se acha que vou ajudá-lo neste crime nojento. Nem
que eu não conhecesse a família de Lana, nem fosse seu melhor amigo, não
tenho vocação para bandido, não mesmo. Me sinto decepcionado quando
olho para a minha mãe, que está na sala, e aceita as atitudes criminosas dele.
Como isso é possível? Ela não tem bom-senso para impedi-lo de cometer
essa loucura? E nem diz nada quando ele ameaça me jogar na rua se eu não
colaborar com isso.
— Sente-se, Juliano — minha mãe diz. — Vamos conversar com
civilidade.
É brincadeira isso? Civilidade?
— Compactuar com crime agora é civilidade? Nem fodendo! — grito.
Estou fodido com o tipo de pais que tenho. Saio da sala e volto para o
quarto. Bato a porta e a tranco. O que vou fazer agora? Preciso descobrir para
onde vou, porque não vou ajudar esse doente a cometer mais um crime.
CAPÍTULO 30
Lana
Assim que coloquei a cabeça no travesseiro, peguei no sono.

Estava chateada com Alex por ele não ter me levado para sua casa. Faço uma

careta ao me lembrar da conversa que tivemos sobre a sua ex ser ciumenta e

que ele havia perdido o interesse e percebo que estou indo no mesmo

caminho que ela, querendo sua atenção o tempo todo. Levanto a cabeça e

olho para o relógio: oito e meia da manhã. Desvio o olhar para a janela. O dia

está nublado e parece que vai chover bastante. Ainda bem que não vou a

lugar algum hoje.


Solto um suspiro ao me lembrar que meu pai monopolizou a atenção de
Alex ontem. Nem vi quando ele foi embora. Ficar longe dele é muito difícil.
Desço para o café da manhã e encontro meus pais na sala com uma
visita e me surpreendo quando identifico a pessoa sentada no sofá, com um
lenço na mão, secando os olhos. Letícia Fontes é uma mulher discreta,
elegante e, de tanto Jules falar, procuro a bolsa Dior que estava ao lado dela
no sofá e sinto vontade de rir. Isso me faz lembrar que tenho que ver o Jules.
Estou com saudades do meu amigo.
— Bom dia! — cumprimento Letícia, que mal responde. — Tudo bem?
— pergunto olhando para a minha mãe, que parece desconfortável. Me
pergunto por que é que a deixaram entrar aqui, afinal ela é esposa do nosso
inimigo. Onde está a segurança da casa? Quem deixou isso acontecer?
— Letícia veio nos visitar e se desculpar pessoalmente pelo transtorno
que o marido nos causou — meu pai fala e a vejo balançar a cabeça em
concordância. Só agora ela veio? Depois que o marido saiu da cadeia é que
ela aparece?
Saio da sala e vou tomar o café da manhã. Pego o celular e ligo para
Alexander. Será que ele sabe disso? Ele atende no segundo toque.
— Oi, garotinha — ele sussurra do outro lado. — Sentiu saudade?
Estou indo para a sua casa agora.
— Não senti nada! — minto e dou uma risada quando ele bufa do outro
lado da linha. — O segurança que está de plantão hoje te avisou que a esposa
do Fontes está aqui, no sofá da minha casa?
— O quê? O que ela foi fazer aí? — Ele solta um palavrão.
— Eu me fiz a mesma pergunta. — Sirvo um copo de suco e, em vez
de me sentar na mesa para comer, pego o copo e vou em direção à sala. —
Espero que ela não esteja armando algo. Não ouvi o que ela veio dizer, mas
não confio nela, Alex. Minha mãe disse que ela veio se desculpar.
— Estou quase chegando — Alex avisa e se despede. Espero alguns
instantes e dou uma espiada na sala. Letícia está se levantando.
— Obrigada por me receber em sua casa, Cybelle. — Ela segura a mão
da minha mãe. — Não achei que me receberia tão bem, mas sou grata pela
sua hospitalidade.
— Você não é responsável pelas atitudes do seu marido, Letícia. —
Minha mãe a guia para a porta e solto um suspiro de alívio por ela estar indo
embora. Eu gostava dela antes de tudo isso, mas agora tenho aversão. Talvez
por saber que seu marido quis nos fazer mal.
Ligo para Jules, ao retornar para a cozinha. Ele precisa saber que a mãe
está aqui. O telefone toca várias vezes e cai na caixa postal. Onde ele está que
não atende?
Ligo outra vez, e nada.
— Está tudo bem, filha? — Desvio os olhos do celular e encaro meu
pai. — Se sente e coma, menina. Está magra demais. — Ele se senta e
começa a se servir. Tenho certeza de que essa vai ser sua segunda refeição do
dia.
— Está sim — respondo, distraída.
— Está ligando para quem? Você parece muito preocupada. — Ele
toma um gole de café preto. — Devo conhecer o responsável por esses
suspiros? — Ele sorri, mas acredito que ele fala sério sobre conhecer um
possível namorado. Resolvo acabar com a curiosidade.
— É o Jules quem me deixa de cabelos brancos. — Coloco o celular na
mesa. — Por falar nisso, o que a mãe dele queria?
— Se desculpar, pelo que parece. — Ele não está preocupado com isso,
ainda que devesse, afinal fomos ameaçados por um louco.
— Tome cuidado, pai — murmuro e volto a tomar café.
Alexander
Estaciono o carro perto da entrada da casa dos Mitchell, e vou direto
para o escritório onde o segurança de plantão está. Ao atravessar a casa, não
vejo a mãe do Jules por aqui.
— Quem permitiu a entrada da Letícia Fontes na casa? — pergunto
assim que entro na sala. —Vocês não deveriam ter checado antes de permitir
acesso?
— Foi o próprio sr. Mitchell — Luiz, um dos seguranças, responde.
— Ela não deve ter acesso a casa, a partir de hoje — falo. — Mitchell
nos paga para protegê-lo. Qualquer pessoa, para entrar, precisa passar por
uma revista rigorosa e jamais devem ficar a sós com os membros da família.
Não posso acreditar que ela achou conveniente aparecer aqui agora que
o marido está em casa. Estou mantendo um homem acompanhando todos os
passos do Fontes, mas não havia orientado que seguisse a esposa. Agora, isso
vai mudar.
Vou à procura de Mitchell e encontro Cybelle descendo as escadas. Ao
me ver, ela franze a testa. Sei que ela não gosta muito de mim.
— Olá, sr. Marshall, quanta honra. — Lana tem a quem puxar. — Bom
dia!
— Bom dia, senhora — eu a fito sério. — Soube que a Letícia Fontes
esteve aqui. Aconselho que não a receba de novo. Ela pode estar sendo usada
pelo marido. O fato de ela só ter vindo aqui após a liberação do marido diz
muito.
— Não acredito que ela volte. — Ela me olha com firmeza e a
sobrancelha arqueada. — Veio procurar a minha filha?
Limpo a garganta. Estou sendo intimidado?
— Na verdade, quero passar mais tempo aqui. Assumi a
responsabilidade pela segurança da casa e vou acompanhar qualquer membro
da família que precise sair — respondo.
— Entendo — ela fala com um sorriso frio. Mulher perigosa! Ela
aponta na direção da cozinha. — A Lana está tomando o café da manhã.
Merda, ela não acreditou em mim. Abro um sorriso educado e faço
exatamente o que não devia fazer: vou atrás de Lana.
Um ponto para Cybelle e zero para mim.
CAPÍUTLO 31
Alexander
Sorrio enquanto caminho para a sala de jantar dos Mitchell, mas
ele morre no momento em que ouço a voz de Mitchell falando,

provavelmente, com Lana.


— Achei que você se casaria com ele. Estão sempre grudados um no
outro.
Ele? Quem é ele?
— Que ideia, pai! Eu e o Jules sempre fomos só amigos. — A voz de
Lana soa divertida.
— Ele é um bom rapaz, mas me surpreendi demais com o pai. Jamais
imaginei que um antigo associado pudesse nos fazer mal — ele diz, pesaroso.
— Bom dia — cumprimento ao entrar no cômodo. Meu olhar encontra
o de Lana, fazendo meu coração acelerar com a vontade de beijá-la.
— Marshall, que bom que você veio. Tenho um assunto para tratar com
você. — Ele aponta para uma cadeira. — Sente-se e coma algo enquanto
conversamos.
— Oi, Lana. — Me sento do lado oposto onde ela está, bem na sua
frente, e volto minha atenção para Mitchell. — Claro, temos mesmo que
conversar. E o primeiro assunto diz respeito a quem tem acesso à sua casa.
Assim não posso garantir sua segurança!
— Melhor impossível. — Ela fala e noto certa acidez no seu tom de
voz e a olho. — Preciso sair em meia hora espero que a reunião esteja
terminada nesse meio tempo.
Não imaginei que ela fosse sair hoje. Com certeza não quer que eu
fique na casa. Diante disso, tomo uma decisão. Afinal, sou homem o
suficiente para assumir meus atos e se Mitchell não gostar, o problema é dele.
Depois de uns cinco minutos na mesa, não aguento mais esperar:
— Mitchell, preciso conversar com você em particular. — Lana parece
adivinhar minhas intenções e fica pálida. Vejo que ela não está pronta para
admitir seus sentimentos. Que merda. Do que ela tem medo?
— Claro! Vamos ao meu escritório. — Ele se levanta e sai da sala de
jantar. Fico para trás de propósito.
— O que você pensa que está fazendo, Alex? Não pode tomar essa
decisão sozinho — ela reclama. — Me dê um tempo. Vou contar para eles.
— Não somos adolescentes, Lana. Quero resolver isso hoje. Melhor
ainda, chame a sua mãe e vamos comunicar aos dois que estamos juntos.
— E dizer o quê? Que temos um caso? Eles vão ter uma síncope — ela
reclama
— Se você não vai contar, eu conto — ameaço. Sei que estou forçando
uma situação, mas estou cheio de me esconder. — Não tenho paciência para
esse comportamento adolescente.
Vou para o escritório sem ver se ela me segue. Primeiro converso com
Mitchell sobre a segurança, dando um tempo para Lana se decidir. Vinte
minutos depois, ouço uma batida na porta e ela aparece acompanhada da
mãe. Droga, isso é tão antiquado.
Sei que pedir permissão aos pais é algo fora de moda, mas estou em
uma posição em que tenho o dever moral de falar com os dela. Lana ainda
vive na casa deles e, se quero algo sério com ela, preciso ganhar a confiança
dos meus futuros sogros. Mas, além disso, fui contratado para um trabalho e
acabei envolvido com a filha deles. E isso, por si só, já infringe a minha ética
profissional.
— Vamos fazer uma reunião com a família toda? — Mitchell graceja e
Cybelle se senta no sofá próximo a mesa do marido.
— Parece que o sr. Marshall tem algo a nos contar.
— Sim. Na verdade, é um comunicado — falo sério, enquanto encaro
os dois. Seguro a mão de Lana e a puxo para perto de mim. O pai dela franze
o cenho. — Quero comunicar a vocês que estamos namorando — digo de
uma só vez.
Escuto seus pais ofegarem, mas Cybelle se recupera rapidamente. Lana
fica vermelha e eu ofereço um sorriso encorajador.
— Namorando, sr. Marshall? Não sabia que esse termo ainda é usado
— Cybelle alfineta. Ela, com certeza, não parece surpresa.
— O quê? — Mitchell, sim, parece atordoado com a notícia. —
Queridas, me deixem a sós com o Marshall.
Rapidamente, as duas mulheres saem do escritório e Mitchell me
encara.
— Isso é sério mesmo, Alexander? Não tenho nada contra você, mas
você já deve ter notado que a Lana é muito imatura. Não acredito que ela
consiga manter um relacionamento adulto com um homem como você.
Que merda ele está falando?
— Você está equivocado, Mitchell. E, por esse comentário, percebo
que não conhece a sua filha — protesto. Me sinto aborrecido ao vê-lo
recriminar Lana. Sinto que tenho que defendê-la. — Ela é adulta sim para
assumir um compromisso com qualquer homem ou com o que quer que ela
deseje.
Durante a conversa com Mitchell, deixo claro que espero que eles
aceitem o nosso relacionamento, pois não vou sair da vida dela. E nada me
faria voltar atrás.
Lana
Estou furiosa com Alex. Por que ele decidiu contar as coisas de forma
tão apressada aos meus pais. Ainda que a minha mãe soubesse do meu
envolvimento com ele, sei que ela não gosta muito do fato de ele ter me
magoado há algumas semanas, mas ela não me recrimina.
Saio do escritório com receio do que ele possa dizer ao meu pai. Sei
que ele tem planos para mim. Nunca quis ouvir, mas há alguns meses,
conversei com a minha mãe, que deixou claro que ele queria me apresentar ao
filho de um amigo deles. Acredito que ele ainda não havia feito isso por saber
que eu não aceitaria facilmente. E não aceito mesmo! Meu pai parece ter
nascido no século passado, onde os pais escolhiam o rumo da vida dos filhos.
— Tem certeza do que está fazendo, filha? — Minha mãe me tira dos
meus devaneios e me traz de volta a realidade.
— Sobre o que, mãe? — Me faço de desentendida
— Lembra do que nós conversamos há alguns dias? Te alertei sobre
nossos planos para você, porque percebi que havia algo entre vocês dois —
ela diz — e vejo que eu tinha razão. Mas acreditei que depois da forma como
ele a mandou embora, esse relacionamento ia terminar. Pela segunda vez, me
enganei.
— Ah, mãe... sei que vocês tinham planos para mim. E nem se
preocuparam em me perguntar o que quero. Mas isso não muda o fato de que
estou apaixonada por Alex. Além do mais, sou adulta, mãe. Vou ser sua filha
para sempre, mas posso tomar minhas próprias decisões. Sejam elas certas ou
erradas.
— Seu pai vai ficar desapontado. — Ela não parece tão contra. Só
preocupada, e deixa isso claro. — Você tem uma vida pela frente, só tem
vinte e um anos...
— Idade suficiente para saber o que quero, mãe — eu a corto porque
sei onde isso vai dar. — Vamos ficar juntos. E se vocês não aceitarem, vou
morar com ele. — Ah, merda, não devia ter dito isso. Não quero magoar
meus pais.
— Você enlouqueceu, Lana? Como pode pensar em fazer isso? Vocês
mal se conhecessem! — Ela parece chocada com a minha ameaça. — Não
pode abandonar a faculdade.
— Mas não vou abandonar. — Sorrio para ela. — Eu o amo, mãe. Não
tente, assim como o meu pai, interferir na minha vida, escolhendo os sonhos
que devo sonhar. Estou estudando aquilo que vocês determinaram. Mas não
vou permitir de decidam a minha vida pessoal.
— Acho que devia esperar mais...
— Esperar até quando? Estar velhinha? — Rio da sua expressão
chocada. Vou até ela e a abraço. — Mãe, não seja boba, só quero viver e ser
feliz.
— Para mim, você continua sendo o meu bebê — ela murmura. Sei que
ela não vai colocar empecilhos, mas meu pai pode se intrometer.
Enquanto aguardo que os homens conversem, falo sobre a CASM com
a minha mãe. Tenho planos de ir até lá hoje, e quero que ela vá comigo.
—Tem certeza de que não é um bairro perigoso, Lana? — ela pergunta
quando faço o convite.
— Claro que não. Gostaria que você me ajudasse a organizar um jantar
beneficente em prol da ONG, mãe. Inclusive, as suas amigas socialites
deveriam sair do cabeleireiro e ser uteis na periferia — brinco, mas ela leva a
sério.
Eu havia contado sobre a ONG antes da viagem a Malibu. Na verdade,
naquele dia, contei muita coisa a ela.
— Vamos pensar em algo.
— Certo. Bem, está tudo bem com a história do meu namoro com o
Alex? Sem mais pressão? — Não aguento e pergunto.
— Ainda estou digerindo isso, filha. Não force, tá? — Ela sorri de
forma indulgente para mim. Menos mal. — Te amo e quero que seja feliz.
Estou feliz. Sei que as coisas serão diferentes, mas estou — mais do
que nunca — disposta a tentar.
Jules
Estou ferrado!
Meu pai já se decidiu, assim como eu. Vou embora daqui — só não sei
para onde. Durante vinte e dois anos, vivi como um “mauricinho”. Achei que
teria o suporte da minha família até me formar. Mero engano. Me formo esse
ano, mas não tenho trabalho. Adiei essa etapa da vida e, agora, estou pagando
pela minha imprudência e inconsequência.
Preciso falar com Lana sobre os planos do meu pai. Tenho vontade de
ir até a delegacia, para denunciá-lo, mas não tenho coragem, mesmo sabendo
do que ele é capaz.
Fecho a mochila com roupas e saio do quarto. Paro ao ouvir a voz do
meu pai.
— O idiota do seu filho já alertou os Mitchell? — Ele parece com
raiva, como sempre. Recuo para sair pela área de serviço.
Não quero enfrentá-los.
— Pela forma como fui tratada, acho que o Jules não falou nada —
minha mãe responde — Ainda acredito que ele vai fazer o que você quiser,
querido. — Desde quando a minha mãe se tornou cúmplice dele? Não basta
um só? Os dois vão acabar na cadeia.
Ao sair de casa, entro no carro sem saber que rumo tomar. Passei a
noite em uma casa noturna, tentando esquecer a situação e voltei ainda pouco
para casa. Se eu continuar por lá, ele vai querer que eu o ajude. E nunca vou
trair a minha melhor amiga. Descanso a cabeça no volante e respiro fundo,
tentando achar uma saída. Como isso pode estar acontecendo comigo? Há
seis meses, a minha vida era moleza e, agora, está uma confusão
generalizada. Não sei o que fazer.
Solto um longo suspiro e pego o celular. Está desligado. Merda!
Conecto no carregador do carro e, quando o aparelho liga, vejo as ligações de
Lana.
Ah, droga. Preciso falar com o Alex.
Alexander
Quando avisei a Mitchell que ia ficar com a filha dele, mesmo que ele
não aceitasse, ele apenas me pediu que tomasse cuidado com os sentimentos
dela e todas aquelas baboseiras que os pais gostam de dizer aos namorados
das filhas. Porém, ele deixa escapar que tinha planos para que ela se casasse
com o filho de um associado a ele. Claro que não vou permitir que isso
aconteça.
No meio da conversa, meu telefone toca. Peço licença a Mitchell ao ver
o número de Jules no visor. Me levanto para atender e vou para um canto do
escritório para ter privacidade.
— Jules.
— Oi, cara! Posso te encontrar em algum lugar para conversarmos? —
Ele parece aflito.
— Claro. É urgente? Onde você está? — pergunto — Pode vir à casa
da Lana?
— Não! Quero falar com você a sós — ele praticamente grita do outro
lado.
— O que houve? Está com algum problema? — Desvio o olhar na
direção de Mitchell, que me observa. — Preciso dar uma saída — aviso a ele,
que assente. — Onde você está?
— Saindo do meu prédio. Podemos nos encontrar agora?
— Claro. Passo aí daqui a pouco e te busco.
— Não. Acho melhor ir até a sua casa. Onde fica? Posso ir até lá — ele
sugere.
— Minha casa? O que está acontecendo, Jules?! — Um alarme soa na
minha cabeça — Está com algum problema com a polícia? É o seu pai? Seja
claro, Jules.
— Podemos nos encontrar lá? É importante. Não posso falar agora, mas
tem a ver com o meu pai, sim. — Sua voz soa estranha e decido dar meu
endereço a ele. Desligo e sigo para a porta, sendo interceptado por Lana.
— Está indo embora?
— Preciso ir agora, surgiu uma emergência — falo segurando seus
ombros.
— Emergência? Preciso falar com você. Não pode sair agora!
— Você tem falado com Jules?
—Tentei, mas ele não me atende. Fiquei preocupada porque ele nunca
deixa de atender. Isso só acontece quando ele está encrencado.
— Estou indo encontrá-lo. Parece que ele está com problemas — falo.
— Conversamos depois. — Eu a beijo e me afasto. Acho que o Fontes está
aprontando mais uma.
— Vou com você, só vou pegar a minha bolsa. — Ela corre em direção
as escadas enquanto fala. — Não se atreva a me deixar!
Não consigo dizer não a ela. Penso em ir embora, mas Cybelle — que
estava na sala com ela — se levanta do sofá e se aproxima de mim.
— Não quero interferir na vida da minha filha, sr. Marshall, mas você
vai se arrepender se a magoar de novo — ela fala com um sorriso nos lábios e
acredito em sua ameaça, já que ela provou ser uma mulher que não tem
receio de nada, quando se trata da filha.
— Me chame de Alexander, afinal, vamos ser parentes — provoco. —
E fique tranquila que não pretendo machucar sua filha. Não se depender de
mim.
— Espero mesmo que não! Venha jantar qualquer dia desses para que
possamos conhecê-lo melhor, Alexander — ela enfatiza meu nome e sua
sobrancelha está erguida com sarcasmo.
— O que você está fazendo, mãe? — A voz de Lana nos interrompe. —
Não está intimidando o Alex, não é?
— Estou, sr. Marshall? — ela pergunta com voz suave.
— Claro que não. Sua mãe foi muito gentil e me convidou para jantar.
— Abro meu melhor sorriso para Cybelle. — E, é claro, aceitei.
— Sim, seu namorado é muito educado, querida. — Ela sorri.
— Podemos ir? Quero ver o Jules — Lana parece desconfortável —
Depois vocês dois trocam figurinhas, sim?
Concordo e nos despedimos de Cybelle. Não acho prudente levar Lana
comigo, mas ela e Jules são amigos.
— Por que ele te ligou, mas não atendeu as minhas ligações? — ela
pergunta quando estamos no carro — Onde estamos indo?
— Para a minha casa. O Jules vai nos esperar lá. Coloque o cinto, Lana.
— O que ele vai fazer lá? Que estranho... — Ela coloca o cinto e eu
acelero.
— Acho que ele está com algum problema relacionado ao pai. Só não
disse o que é e, pelo visto, não quer falar com você. — Sei que eu não
deveria dizer isso, mas foi o que me pareceu.
— Ele só ficou assim quando descobriu que foi o pai que mandou me
sequestrar — ela lembra — O que será que aquele homem fez para que ele se
isolasse de novo.
— Não sei, amor.
Lana fica calada e eu volto a fitá-la. Ela me encara.
— O quê?
— Nada... você me chamando de amor — ela ri. — Fica tão fofinho.
— Depois que resolvermos essa coisa com o Jules, vamos aproveitar o
resto do dia. Vou te mostrar que você é o meu amor, pequena sabichona. —
Seguro a sua mão e a levo aos meus lábios. — Não sei se vou deixar você
voltar para casa hoje,
— Sobre isso, acho de muito mau gosto ignorar a namorada como você
faz, sr. Marshall — ela reclama — Na próxima vez que fizer isso, vai se
arrepender.
— Está me ameaçando? — Paro o carro no sinal e me viro para ela. —
Não lido muito bem com ameaças. Sabe aquela algema que tem lá em casa?
Que te algemei uma vez? Está precisando ser usada. — Me inclino e
mordisco seus lábios com mais força.
— Você vai se arrepender se me algemar outra vez, Alexander — ela
fala, mas vejo que seus olhos estão brilhando com malicia. — Talvez, eu vá
te algemar e o torturar a meu bel-prazer?
— Vai sonhando, pequena encrenqueira.
O sinal abre e eu a solto, dando a partida no carro.
— Seria preciso um batalhão de garotinhas do seu tamanho para me
algemar na cama.
— Você é tão prepotente, Alexander. Vamos ver... — Ela está séria e
quase posso ver as engrenagens girando na sua cabeça. Mas vou adorar ver
Lana tentando me algemar. Quem sabe eu não permito?
Pouco depois estaciono na frente da minha casa e vejo o carro de Jules.
— Vamos ver o quer seu amigo tem a dizer — digo e desço do carro.
CAPÍTULO 31
Lana
Quando Alexander para o carro e eu vejo o Jules, desço sem
esperar que ele abra a porta para mim como sempre faz. Jules sai do carro e

me encara. Depois, ele volta o seu olhar para Alexander, que está

caminhando em sua direção.

— Cara, qual foi a parte do “quero falar com você em particular” que
você não entendeu? — Jules pergunta, transtornado. — Se eu quisesse falar
com ela, tinha ligado. — Ele aponta para mim. — Vou embora.
— Não, Jules. Vamos entrar — Alexander fala com firmeza. —, e não
fale assim com ela.
— Pedi para falar com você.
Não entendo essa atitude de Jules. Toda vez que se sente ameaçado,
tenta fugir de mim.
— Deixei de ser a sua melhor amiga, Jules? — pergunto um pouco
magoada. — O que você tem agora?
— Esse é um assunto que não quero discutir com você, Lana — ele
retruca.
— Vamos entrar. Agora! — Alex nos leva para a entrada da casa e
Jules me olha feio.
— O que eu fiz? Não nos vemos há um tempo e não mereço nem um
abraço? — questiono, ficando chateada de verdade com ele. — Belo amigo,
hein?
— Não tem nada a ver com você, Lana. Só queria conversar sobre esse
assunto em particular.
Eu o encaro e vejo mágoa — além de outras coisas. Não me contenho e
vou até ele, envolvendo meus braços ao redor da sua cintura
— Só quero te proteger...
— Eu sei, Jules. Vamos entrar. Você pode falar à vontade. Sei que tem
a ver com o seu pai, mas não vou te julgar. Devia saber disso. Você não é ele,
Jules. Nunca confundiria isso e te afastaria de mim só porque o seu pai
resolveu nos prejudicar — garanto e o sinto relaxar enquanto entramos e nos
acomodamos na sala de estar.
— Pode falar na frente da Lana. Acho que ela é a mais interessada no
que você tem a dizer.
—Tudo bem. — Ele abaixa a cabeça — Vocês sabem que meu pai saiu
da prisão...
— Sim. Foi por isso que voltamos antes da viagem — Alex fala.
— É... eu soube que você também estava lá.
Jules me olha e sorri.
— Continue — Alex o corta, impaciente. — O que o seu pai fez dessa
vez?
— Ele ainda pretende sequestrar um dos Mitchell — ele responde e me
olha com pesar. — Sinto muito, Lana, não sei o que deu nele para fazer isso.
— O que aconteceu para você ligar para mim? — Alex o encoraja.
— Ele me pediu ajuda para continuar com essa história de sequestro.
Como recusei, ele me expulsou de casa. Ele pretende sequestrar o Luca ou a
Cybelle. Ou até mesmo você, Lana. Não tenho para onde ir, agora. Não posso
trair a confiança que a sua família tem em mim, nem facilitar esse crime.
Estou chocada. Como um homem pode cometer tantos crimes, por
motivos tão bobos?
— O que mais ele te disse, Jules? Conte tudo que você sabe — Alex
pede.
— Ele não me contou seus planos, só disse que queria a minha ajuda, já
que tenho acesso à casa da Lana. Me sinto um traidor, ainda que eu não tenha
nada a ver com isso.
Jules está tão triste! Vou até onde ele está e me sento ao seu lado.
Seguro suas mãos e entrelaço meus dedos nos dele.
— Jules, você não tem que se sentir assim. Só por ter vindo nos contar
é prova suficiente de que você não compactua com isso, amigo — falo. — Eu
e meus pais nunca duvidamos de você. Por favor, acredite. Sabe que pode
contar comigo, não é?
— Obrigado. Mas ainda não sei o que vou fazer. — Ele olha para
Alexander. — Só queria avisar para que vocês tivessem cuidado, meu pai
perdeu a razão.
— Claro, Jules. — A voz de Alex soa dura. — Vou arranjar um lugar
para você ficar. — Ele faz uma pausa. — E quanto a sua mãe? Ela não diz
nada sobre isso? Deixou que seu pai te expulsasse?
— Pois é... e você sabe o que ela foi fazer na nossa casa, hoje? —
pergunto e vejo os olhos dele se arregalarem de espanto.
— O quê? Ele conseguiu convencê-la a ajudá-lo nessa loucura! Avise
aos seus pais, Lana. Ela não é confiável.
— Não se preocupe, Alexander. Ele vai ficar na nossa casa!
Alex mantém os olhos fixos nas mãos entrelaçadas e seu cenho
franzido não é amigável. O que ele tem agora? Quando ele me encara, ergo a
sobrancelha em uma pergunta silenciosa.
— Com licença. Preciso fazer uma ligação para avisar a polícia do que
você me contou, Jules.
Alex pega o celular e sai da sala, nos deixando a sós.
— Tenho que ir, Lana. — Jules tenta se levantar. — Já fiz o certo.
Agora é com a polícia, não quero estar por perto quando meus pais se derem
mal.
— Ei, para onde você vai? Não fique assim, Jules. Você não é culpado
de nada e não pode se martirizar pelos erros dos outros.
— Ainda assim, saber que meus pais são criminosos é, no mínimo,
constrangedor, Lana. Você não imagina como estou me sentindo — ele fala.
Com um suspiro, muda de assunto. — Mas me conte, quando você chegou?
— Ontem. Te liguei, mas você não atendeu. — Aperto sua mão. —
Fique lá em casa, Jules. Tenho certeza de que vamos conseguir dar um jeito
nisso.
— Não posso, Lana. Não é conveniente.
Ele se levanta e começa a andar de um lado para outro.
— E vai para onde, posso saber? Deixa de ser tonto, Jules. — Vou até
ele — Você é o meu melhor amigo. Não vou te deixar sozinho.
Nos abraçamos.
— Você é a melhor, Lana Mitchell — ele sussurra no meu cabelo —
Estou perdido, sabe? Sinto tanto por toda essa loucura com a sua família.
— Amo você, independentemente de quem são seus pais, Jules. —
Sinto meu peito apertar por ele.
Alex volta para sala.
— Vocês dois podem parar com o agarramento? Isso está me irritando!
— É melhor se acostumar, dom Juan — Jules graceja e recebe um olhar
feio. — Pelo que sei, a Lana é solteira e disponível.
— Jules, não provoca. Você vai ser jogado aos leões se provocar o
selvagem. — Rio.
Sabia que ele ia sentir ciúmes, mas precisa se acostumar a me ver
fazendo o que quero e decidindo as coisas por mim mesma.
— Terminaram?
Ele vai para a cozinha e nós o seguimos.
— Jules, acho melhor você ficar aqui em casa, por enquanto. Depois
que resolvermos essa questão com o seu pai, você poderá voltar para casa.
— Ele vai ficar lá em casa, Alex — afirmo. — Vocês nem se conhecem
e não parecem se gostar.
— Faço questão, Lana. — Ele me fuzila com o olhar. — Não acha
melhor, Jules? Sei que vai se sentir mais à vontade aqui. — Ele sorri para
Jules, mas sei que é falso. Ele está com ciúmes e sempre fica com o pé atrás
com o coitado do Jules.
— Já que Lana insiste, vou ficar com ela. — Esse é o Jules que
conheço, entrando no jogo. — Como ela disse, eu mal te conheço.
— Tudo bem. Lana, avisa aos seus pais. — Ele está sério — Depois, vá
ao meu escritório. Quero falar com você.
Ele sai e nos deixa prendendo o riso.
— Lana, o seu novo namorado é possessivo!
Ele ri, o que faz com que o cansaço visível em seu rosto seja menos
evidente.
— Não o provoque, por favor. Estamos tentando nos acertar — digo.
— Ele se irrita fácil e você não é santa. Gosta de ver o homem
perturbado. — Jules para de ri. — Fico feliz por você.
Eu o observo.
— Jules, você parece exausto. Vou lá falar com o Alex e já volto para
que possamos ir para casa, ok?
Vou para o escritório que Alex tem em casa e o encontro ao telefone
esbravejando com alguém do outro lado da linha. Eu o aguardo terminar e me
sento em frente a sua mesa.
— Só vão prender esse cara depois que ele matar alguém? É isso? —
Ele ouve a pessoa e, então, volta a falar. — Quero levar o filho dele para
depor. Certo, eu aguardo. Obrigado.
Ele desliga e joga o celular na mesa.
— O que houve?
— Nada. Estava falando com um amigo que está envolvido no processo
do Fontes, mas deixe isso para lá. — Ele se levanta e enfia as mãos no bolso.
— Quero que você fique esses dias aqui, comigo.
— O quê?
— Quero que fique aqui. Vai ser mais seguro e vou ficar mais
tranquilo.
Será que ele bateu com a cabeça?
— Acha que a casa do meu pai não tem segurança o suficiente? Vou
ficar com o Jules. Ele vai se sentir melhor comigo lá. — Sei o que ele está
fazendo, mas não vou fazer suas vontades. Quero ficar na casa dele, mas não
por esse motivo. — Vou ficar na minha casa.
Ele suspira profundamente, demonstrando impaciência.
— Fica aqui, vai ser muito mais prático. — Ele se inclina na cadeira
que estou sentada, as mãos em cada braço da cadeira. — Quero você aqui,
garotinha. Não era isso que você queria? Um convite para ficar comigo?
Ah, mas ele é muito pretensioso! Alinho meu rosto ao dele,
praticamente o beijando e baixo a voz quando respondo.
— Estou rejeitando seu convite, namorado. Não quero que ele seja por
esse motivo. Quando eu vier para cá, será porque você me quer muito aqui.
— Que motivo você acha que eu tenho, além do fato de te querer como
um louco?
— Jules seria um bom motivo?
Ele se levanta.
— Essa sua intimidade com ele me tira do sério. — Ele volta a se
sentar atrás da mesa. —Você sabia que o seu pai achava que vocês dois iam
assumir uma relação algum dia, Lana? — Sua voz sai raivosa. — Se ele
pensa assim, imagina as outras pessoas.
— Você sabe muito bem que não temos nada, e o que os outros pensam
não me interessa. — Me levanto. — Bem, se a minha amizade com ele o
incomoda, você precisa repensar se quer mesmo ficar comigo. Não vou
afastá-lo da minha vida. Você vai ter que se acostumar com a minha amizade
com o Jules. Não temos e nunca tivemos qualquer coisa diferente de um amor
fraternal um pelo outro. Não vou tolerar isso.
— Faça como quiser. — Ele se levanta. — Vamos.
— Onde?
— Vou levar vocês para casa, Lana. — Ele segura a porta para mim.
Vou até ele e, em vez de sair, bato a porta.
— Que tal conversarmos como adultos, sr. Marshall? Ataques de
ciúmes não combinam com você.
— Estou fazendo a sua vontade. Não estou com ciúme. — Ele tenta me
afastar da porta. — Não quero discutir com você — ele grunhe, frustrado, e
segura meu rosto. — Vamos embora. Eu levo vocês.
— Por que a pressa, Alex? Tínhamos planos. — Faço beicinho, antes
que a sua boca tome a minha. Nem sabia que estava louca para beijá-lo até
que nossos lábios se tocam. Seu gosto é divino e me deixa viciada. Nasci para
estar bem aqui, desfrutando do seu sabor único. Sentir seus braços fortes me
envolverem é maravilhoso!
— Você é louco, Alexander — digo quando o beijo acaba. O que posso
fazer? Sou apaixonada por ele e ainda não aprendi a dizer não, mas vou. Só
não aceito crises de ciúme. Preciso dar apoio ao meu amigo.
— Pronta?
— Sim. Mas, depois, quero ir à ONG. Deixei minhas responsabilidades
de lado por muito tempo. — Esfrego as mãos ao longo do seu peito. — Quero
que me leve lá.
— Ok.
— Sem discussão? Que maravilha — gracejo.
— Não abusa, Lana. Posso mudar de ideia e usar aquela algema. — Ele
dá um tapinha na minha bunda, quando estamos saindo da sala.
— Você não perde por esperar! — Vou para cozinha, onde encontro
Jules muito à vontade, sentado na mesa, comendo.
— Fique à vontade, Jules — Alex diz em tom jocoso.
— Já estou. — Ele ri e eu não resisto, o acompanhando.
— Acho que desse jeito ele vai mudar de ideia quanto a sua presença
aqui, Jules. — Ergo o polegar. — Muito bem!
Pouco depois, voltamos para a casa dos meus pais. Alex está calado
enquanto Jules e eu conversamos. Quero distrair meu melhor amigo dos
problemas e dos pais canalhas! Tentar fazer o filho cometer um crime é
inaceitável!
Meus pais ficaram horrorizados, mas acolheram o Jules sem reservas.
Fiquei feliz por isso. Não sei como ele ficaria sem o apoio da minha família.
Não faço ideia do dano psicológico que as atitudes dos pais podem causar
nele. Ele tem idade para ser independente, mas nunca foi e agora eu percebo
que ele nunca teve o apoio de uma figura paterna. Lamentável.
Depois de acomodar meu amigo, vou até o quarto, faço uma pequena
mala e levo para o carro de Alex. Espero que ele termine uma reunião com a
equipe. Bruno está no comando da casa, o que vai deixar Alex mais livre.
Eu o aguardo há quase meia hora, quando vejo Bruno sair do escritório.
Ele é muito bonito, mas sua cara de safado é evidente. Gostei dele desde o
início por sua descontração.
— Como tem passado, Lana? — Ele se aproxima e sorri, charmoso.
— Ótima e você? Vai demorar muito para terminar a reunião?
— Não, já terminou. — Ele me observa com atenção. — Está
aguardando alguém?
— Sim. Alexander vai demorar?
— Acho que não. Sabe que vou ficar responsável pela segurança daqui,
não é? — Quando assinto, ele continua. — Espero que você não invente de
fugir de novo. Sou tão mal quanto Alex... pior, na verdade. Só estou
avisando, caso você pense em me passar a perna.
— Eu? Imagina se vou fazer isso com você. — Rio da sua expressão
incrédula. — Sério, agora não tenho nada a esconder.
— Algo me diz que você não mudou nada, Lana. — Ele ri abertamente
agora — Adoraria te caçar, mas tenho certeza de que você não ia gostar. Ou,
talvez, gostasse muito.
— Gostar do quê? — Ouço a voz de Alex e vejo que ele e o resto do
pessoal saiu da sala, e estão todos nos olhando.
— Ah, enfim acabou! Estou precisando sair, Alex. — Dou um sorriso
para ele, que não retribui.
— O que você ia gostar muito, Lana? — ele repete.
— Nada demais, Alex. — Bruno tem a cara de pau de rir para mim. Ele
provavelmente gosta de provocar o amigo. — Este assunto é entre Lana e eu,
seu novo segurança favorito.
— Lana, onde você vai, minha filha? — meu pai, que está com eles,
pergunta — Quero que tenha cuidado.
— Fica tranquilo, pai. Meu segurança favorito vai comigo — pisco
para Alex, que está furioso. Droga, o que fiz agora? — Bom, está na hora de
ir. Tchau, pai.
— Venha aqui fora, Bruno. — Ouço Alex resmungar em uma voz
irritada.
Caminho para a porta e sou seguida por um Alex carrancudo. Bruno
vem conosco sorrindo. Eles param junto ao carro e Alex fala:
— Fique o tempo todo de olho no Jules — ele fita Bruno em uma
mensagem silenciosa e continua. — E faça seu serviço em vez de flertar.
— Claro, chefe!
— Sem gracinhas ou você pode dar adeus ao seu trabalho aqui. — Ele
abre a porta do carro para mim.
— Como se você pudesse me demitir, sócio. — Bruno não parece
preocupado. Posso afirmar que ele adora provocar Alex.

Está muito tarde para ir a ONG, mas passo por lá só para avisar que, em
breve, vou voltar com as aulas de dança.
— O que você estava falando com o Bruno? Não sabe que ele é um
cafajeste idiota, Lana? — Ah sim, lá vamos nós. — Não dê confiança ou ele
vai se aproveitar disso.
— Sabe, Alex, não vou falar sobre isso. Vou fazer de conta que não
ouvi.
— Só estou preocupado com você, Lana. Seja prudente. Estou avisando
porque conheço muito bem o Bruno, ele não tem escrúpulos com nada — ele
fala, mas sua voz mudou e agora está branda.
— Estou vendo que você não me conhece e nem confia em mim. — Eu
o olho. — Espero que não tenhamos esse tipo de problema.
— É claro que confio em você — diz.
— Não parece. Na verdade, passou o dia desconfiando de mim. Isso
está começando a me chatear.
— Me desculpe. Estou descontando minha frustração em você, que não
merece isso. — Ele para o carro no acostamento. — Vem cá — pede e
desafivela meu cinto de segurança, me puxando para ele, dando um beijo na
minha fronte. — Me desculpe, amor — diz suavemente.
— Tudo bem... só acho que você deveria confiar mais em mim — digo.
— Por que confio em você, Alex. Sei que te provoco, mas não faço metade
das coisas que ameaço fazer.
Eu não deveria ter dito aquilo, porque mais tarde, naquele mesmo dia,
fui até mais neurótica que Alex. Fomos à CASM, mas a doutora não estava.
Conversei com algumas mulheres e o resto da tarde foi gratificante. Como já
era tarde, quando saímos, Alex me levou para jantar e depois para sua casa.
Eu não ficaria sozinha hoje, de jeito nenhum.
Mal entramos e a campainha toca.
— Está esperando alguém?
Ele dá de ombros e vai até a porta, olhando pelo olho mágico antes de
abrir. Ele suspira e fico imaginando quem será para causar tal desânimo. Alex
abre a porta e sua ex aparece do outro lado. Não posso acreditar que ela está
ali de novo. Bem, isso vai ter que acabar hoje.
— O que faz aqui? — Ele não dá passagem para ela. — Estou com
visita.
Visita?!
— Não vou demorar, Alex. — Ela me olha e cruza os braços, a raiva
cintilando em seus olhos — Ah sim! Visita.
— Não sou visita. — Vou para perto da porta. — Agora, se nos der
licença, sua parasita, estamos ocupados. — Pego os dois de surpresa e bato a
porta na cara dela. Me viro para Alex, furiosa.
— Espero que seja a última vez que vejo essa mulher aqui, Alexander
— digo tão baixo que nem reconheço minha voz. — Se acontecer de novo,
vamos terminar definitivamente.
— Lana... — ele começa, mas levanto a mão o impedindo de continuar.
— Não. Não quero saber se você e o irmão dela eram amigos de
infância. Você permitiu que ela me humilhasse e, mesmo assim, te perdoei.
Mas não terá uma próxima vez.
— Ah, amizade de infância só pode da sua parte? — Alex abre um
sorriso nada gentil.
— É diferente. Não fui noiva do Jules. Acho melhor você repensar, ou
vou arrancar todo o cabelo vermelho dela. — retruco antes de ser levantada
no ar e levada para o quarto, terminando de vez a nossa briga idiota.
CAPÍTULO 32
Alexander
O resto da semana foi tranquila. Não tive notícias do Fontes, mas
mantive a guarda erguida para qualquer eventualidade. Lana está na ONG. As

mulheres que vem aqui tem histórico de todo tipo de violência, e acho muito

bonita a iniciativa de Lana. Afinal, ela vive uma realidade tão distinta de tudo

isso que chega a ser estranho vê-la tão envolvida. Sei que ela gosta do que faz

aqui. É o único lugar que não age como uma garota mimada.
Uma música começa a tocar na sala onde ela está com um grupo de
mulheres. Lana me disse que ensinaria passos de pole dance. As mulheres
que frequentam o local vêm aqui para reaprender a se valorizar e levantar a
autoestima. É um grupo maior do que imaginei. Muitas tinham problemas
bem graves — algumas sentiam medo de se aproximar de qualquer homem.
Mas Lana é tão instigadora e bondosa com elas se rendiam a sua doçura.
Entro na sala e me encosto na parede, observando a movimentação lá
dentro. Não sou bem-vindo, já que elas estão tentando aprender algo sensual
e a presença de homens não é permitida. Mas não olho para qualquer outra
mulher na sala além dela. Lana está no pequeno palco onde tem um mastro,
usando um shortinho que mais parece uma calcinha, e um top que mal cobre
seus seios. Ela dá instruções às mulheres que fazem alongamento antes da
dança realmente começar. O que ela faz praticamente nua? Ela não fica assim
onde faz aula de dança, não é? A noite em que ela dançou na casa noturna me
vem à cabeça e fico puto ao me dar conta de que essas roupas não deixam
nada para a imaginação masculina.
— Estou vendo que não seguiram meu conselho de usarem uma roupa
mais apropriada, hoje — ela diz para as mulheres. — Na próxima aula, quero
ver todas vocês com roupas confortáveis e mais sexy que tiverem em casa. Já
sei! Vou comprar um short e top para cada uma. Quero ver a sensualidade
exalar de vocês.
Ela bate palmas e algumas mulheres parecem apreensivas com a
perspectiva de colocarem roupas tão minúsculas quanto as dela. Sorrio.
Tenho uma namorada gostosa que dança — mas que nunca dançou para mim
em particular. Vou fazer com que ela dance para mim muitas vezes.
Ela liga o som e As The Rush Comes, de Motorcycle Club, começa a
tocar. Lana vai para o mastro, enquanto instrui as mulheres. Não consigo
ouvi-la, mas estou fascinado por sua sensualidade enquanto ela rebola de
forma sexy ao som da música.
Tento me concentrar no meu trabalho que é me manter vigilante. Não
confio no silêncio de Fontes. Acho que ele espera que a gente se descuide.
Jules depôs na delegacia, mas como não demos oportunidade para que o
homem agisse, a semana passou em paz.
Vou me encontrar com Adriane hoje. Quero dar um basta para tirá-la da
minha vida. Para que eu possa ter paz, ela precisa seguir em frente. Depois
que a Lana a colocou para fora, ela me ligou, reclamando que não a defendi.
Mas Lana é muito mais importante para mim. A consideração que eu tinha
com ela, por causa do meu melhor amigo, acabou. Na vida, tudo tem limite.
Já conversamos antes, mas ela parece não ter entendido muito bem, porque
continuava aparecendo na minha casa como se fosse a dela.

— O que vamos fazer hoje? — Lana pergunta enquanto tenta pegar


algo no armário da cozinha. Ela resolveu fazer algo para comer depois que
chegamos da ONG. Não imagino o que ela vá fazer, já que nunca cozinhou.
— Vai ficar aí olhando, grandão? Pegue aqui. — Ela aponta para uma panela.
Depois que a entrego, respondo a sua pergunta.
—Tenho um compromisso hoje — falo, cauteloso. Sei que ela não vai
gostar do que tenho a dizer. — Preciso ter uma conversa com a Adriane.
Ela paralisa no momento em que ia acender o fogão e se vira para mim.
Prevejo uma guerra. Me inclino contra o armário, enquanto espero a gritaria
feminina começar.
— E o que você vai conversar com essa mulher?
Vou até ela e envolvo meus braços em sua cintura fina. Deslizo os
lábios por seu pescoço delgado. Seu corpo está tenso, mas o cheiro pós banho
me deixa duro e pronto para arrastá-la para o quarto, que tem sido muito bem
usado por nós. Eu a persuadi a ficar essa semana e seus pais não se meteram,
o que é bom, já que demonstra que me aceitam.
— Quero que ela siga a vida. — Minha mão cobre todo seu seio e solta
dá um gemido. Sei que a estou distraindo, mas não quero discutir sobre
Adriane agora. — Não se preocupe com isso, voltarei logo para você.
— Não gosto disso, Alex — Seu tom não é zangado. Estamos tentando
controlar o ciúme que sentimos um do outro. —, mas confio que você vai dar
um basta nessa mulher. Juro que não vou me controlar se ela aparecer aqui,
de novo. Vou arrancar o cabelo dela a pinça. Fio a fio.
Rio da sua ameaça descabida. Lana é divertida e me apaixono mais a
cada dia. Ela é um vício incontrolável.
Lana
Abraço Alex e beijo seus lábios com ternura. Sei que estou dando um
passo importante na construção da nossa nova vida e, confiar nele, nesse
momento, com certeza é a coisa certa a fazer.
—Vou te deixar na casa de seus pais hoje, ok? — ele pergunta quando
encerramos o beijo.
— Posso te esperar aqui, Alex. Sem problemas — falo e volto ao
fogão. Vou fazer uma macarronada. Para falar a verdade, não tenho ideia de
como fazer, mas estou seguindo uma receita da internet. Se pretendo ter um
relacionamento com ele, preciso repensar minha vida de patricinha e aprender
o mínimo que uma dona de casa sabe faze. Não vai ser terrível, já que não
pretendo ser dona de casa. Quero terminar a faculdade de direito e advogar,
como o meu pai tanto deseja. Só não vou atuar na área do direito
constitucional, que era o que ele tanto queria. Estou pensando em ir para o
segmento público. Quem sabe me tornar promotora de justiça? Só vai
depender de mim, é claro.
— De jeito nenhum, Lana, não vou te deixar aqui sozinha. — Ele se
afasta na direção da porta da cozinha. — Vou trocar de roupa e já vamos.
— E o nosso jantar? — pergunto contrariada.
— Amanhã você pode me mostrar seus dotes culinários, amor. — Ele ri
e vai embora. Sei que ele está debochando de mim, pois sabe muito bem que
nunca cozinhei nada.
Guardo os materiais que ia usar e vou pegar minhas coisas. Eu gostaria
de ir com o Alex e mostrar a ex-noiva que ela faz parte do passado. Mas
posso ser benevolente uma vez na vida.

À noite, o sono custa a chegar. Fico me remoendo, imaginando Alex


conversando com a talzinha. Me arrumo depressa na manhã seguinte e, assim
que desço as escadas, eu o vejo me aguardando na sala. Ele me dá um rápido
beijo e me guia para o carro. Desejo perguntar como foi a conversa, mas não
posso, já que Jules está no carro conosco. Ele está tão calado que estranho ver
o quanto ele mudou em tão pouco tempo. Talvez não seja uma mudança, mas
sim tristeza por tudo o que vem acontecendo.
— Algum problema, Jules? — Alex pergunta em certo momento
Ele balança a cabeça.
— Tem falado com seu pai?
— Não.
— Ele não tentou te ligar? Essa quietude dele é muito estranha — Alex
continua, mas vejo meu amigo se retrair mais.
— Tenho certeza de que Jules diria se falasse com o pai, não é, Jules?
— Tento amenizar o clima entre eles.
— Claro. Lana sabe disso. — Ele me olha firme quando me viro para
observá-lo no banco de trás. — Se fosse para estar do lado deles, não estaria
na sua casa.
— Claro.
Os dias seguem tranquilos, embora eu passe mais tempo na casa de
Alex que na minha. No entanto, tudo muda alguns dias depois. Finalmente o
pai do Jules resolve aparecer. Em uma manhã, ao acordar e me arrumar para a
aula, eu não esperava que o dia terminaria de forma tão terrível. Alex me
deixa na faculdade, mas fica do lado de fora da sala. Às vezes, ele entra na
sala e se senta no fundo da classe. Quando isso acontece, tenho dificuldade
em me concentrar, mas fico aliviada por saber que ele está por perto. Hoje, no
meio da aula, ele aparece. Pela sua expressão, sei que algo está errado. Pego
minhas coisas e saio rápido da sala.
— Alex, o que houve? — Estou sinto aflita, pensando no pior. Ele
nunca interrompe minha aula.
— Vamos embora. — Ele segura meu braço e me leva em direção ao
estacionamento. — Estamos com problemas.
— O que aconteceu? Fale! — Estou praticamente gritando agora.
— Seu pai está no hospital, Lana, mas não é nada grave — ele fala, em
tom sério.
— Fale a verdade, Alex. Meu pai está bem? O que houve? — repito a
pergunta.
— Uma tentativa de sequestro. O Fontes atirou no seu pai, mas foi de
raspão. Na verdade, ele errou o tiro — ele conta enquanto abre a porta do
carro. Entro e afivelo o cinto enquanto ele dá a volta no carro e senta no
banco do motorista. — O problema é que a polícia estava por perto e o
Fontes foi atingindo com gravidade. Pelo que soube, seu caso é grave. Mas,
amor, mantenha a calma, sim?
— Como? Se meu pai está no hospital, Alex? — Pego o celular e tento
falar com minha mãe, mas vai para a caixa postal. — Onde a minha mãe
está?
— Com o seu pai.
Ele manobra o carro e segue para o trânsito que, por incrível que
pareça, está livre para o horário. Em poucos minutos, chegamos ao hospital e
encontramos minha mãe chorando no quarto em que meu pai está. Tem um
curativo no seu ombro — onde a bala passou de raspão —, mas parece bem.
Ainda assim, minha mãe chora.
— Você está bem, pai? — pergunto ao me aproximar da cama. Ele
assente e eu abraço a minha mãe. — Ei, já passou mãe. Vai ficar tudo bem,
você vai ver. — Beijo seus cabelos e me dou conta de que não vi o meu
irmão aqui. — Onde está o Lucas?
— Em casa, querida — minha mãe fala suavemente, sua voz rouca do
choro — Quando esse homem vai parar de nos fazer mal? Quando? — ela
lamenta.
— Acho que isso não vai mais acontecer — Alex afirma, entrando no
quarto — Parece que ele não vai resistir à cirurgia. — Sua voz é neutra,
calma, e me pergunto como ele consegue se manter tranquilo em uma hora
dessas.
Penso em Jules. Será que ele já sabe o que aconteceu?
— Onde aconteceu isso? Por que saiu de casa pai? Está sempre
tomando cuidado... — Ele praticamente não saía mais desde o sequestro.
Trabalhava no escritório de casa, fazia reuniões por teleconferência e só ia até
a empresa quando era realmente necessário. Hoje, que ele resolveu sair,
acontece isso.
— Estava indo a uma reunião que não podia faltar, filha — ele
responde. — O Fontes armou uma emboscada e acabou nisso. Só espero que
agora termine de vez.
— Com certeza acabou, querido. — Minha mãe segura a mão dele que
está com um cateter de medicação, e beija o dorso. — Você me assustou
muito, hoje. Os últimos seis meses foram terríveis para a nossa família...
— Vou ligar para o Jules. Estou preocupada com ele — falo, deixando
meus pais com Alex enquanto me afasto e ligo para o meu amigo.
Ele não atende, mas quando saio da sala de espera, o vejo caminhando
em minha direção. Eu o encontro no meio do caminho e o abraço. Ele deve
estar sofrendo por saber que o pai pode morrer a qualquer momento — ainda
que ele seja o pior pai que já conheci.
—Ah, Jules! Sinto muito, meu amigo. — Envolvo seu rosto com
minhas mãos e enxugo uma lágrima solitária — Sei que você deve
estar sofrendo muito. Vai dar tudo certo, viu? Teve notícias do seu pai?
— Sim. O seu está bem? — Ele aperta minha mão na dele — Sinto
muito por isso ter acontecido, Lana. Lamento muito.
— Ei, não fique assim...
— Estou aqui para saber notícias do seu pai, mas vou voltar para a
delegacia, onde a minha mãe está. — Ele franze a boca em desagrado. —
Você acredita que ela ainda o defende?
— Eles estavam juntos quando ele atacou o meu pai? — pergunto,
estupefata. — Não acredito nisso!
— Não, mas ela foi levada por causa do meu depoimento. Eu queria
que ela fosse enquadrada como cúmplice, para aprender que as coisas não são
tão fáceis quanto ela pensa.
— Fique calmo. Precisa pensar no seu pai, agora. Mesmo ele sendo um
péssimo pai, ainda assim, é seu sangue, Jules. — Eu o puxo para nos
sentarmos. — Quer beber alguma coisa? Vou pegar uma água para você.
— Não, obrigado, Lana... vou falar com seu pai e ir embora.
— Não precisa ir, se não quiser. E você não vai embora da nossa casa.
Vai continuar lá, tá bom?
— Não acho que essa é a coisa certa a se fazer...
— Lana! — Ouço a voz de Alex e me viro, o encontrando na porta do
quarto. — Sua mãe está preocupada com você. — Ao ver Jules, ele fala. —
Sinto muito pelo seu pai. Ele vai ficar bem... — Alex não parece muito
convencido. Afinal, Fontes pode morrer.
CAPÍTULO 33
Jules
Isso só pode ser brincadeira! Será que o meu pai tem merda na
cabeça?
Só um tapado teria tentado algo assim. Só um tremendo idiota faria
isso. Eu sabia que Mitchell não andava sozinho. A polícia estava
acompanhando o caso de perto, um bando de segurança está sempre com ele
e meu pai resolve atacá-lo a luz do dia? Bem-feito que esteja na mesa de
cirurgia, agora, lutando pela vida.
Vou até o quarto do pai da Lana. Me sinto muito perdido. Em vez de
visitar meu pai, estou indo visitar o homem que ele atacou e, por pouco, não
tirou sua vida.
Não sei que rumo tomar daqui para frente, mas não posso mais ficar na
casa dos Mitchell. Não mesmo. E tenho que sair de lá antes que eles voltem
para casa. Cumprimento Mitchell e saio logo depois que peço desculpas pelas
atitudes do meu pai. Agradeço pela hospitalidade em me acolher quando mais
precisei e saio do quarto.
Encontro Lana do lado de fora, grudada em Alex. Sei que essa vai ser a
parte mais difícil: deixar a minha amiga, que está, enfim, se tornando uma
mulher incrível.
— Estou indo, Lana. — Ela acha que vou ver a minha mãe, mas quero
distância dela, que vai aprender com os próprios erros. — Nos vemos por aí.
Venha cá. Com licença, senhor segurança — Tento gracejar com a
possessividade de Alexander. Esse cara é louco. —, posso abraçar minha
amiga?
Ela desgruda dele e me abraça. Tento não demonstrar que aquele pode
ser o último abraço que vou dar nela em muito tempo.
— Amo você, pequeno foguete — sussurro em seu ouvido — Te vejo
por aí. Se cuida.
Eu a solto, aceno para Alex e vou para a saída. Passo em casa, onde
faço uma mala, e saio da cidade. Posso parecer covarde, mas quero me tornar
um homem melhor do que meu pai jamais será.
Lana
Olho para onde Jules foi e sinto as lágrimas se formarem. Sei que ele
está indo embora, sinto no fundo do meu coração, mas não posso impedir que
ele vá. Não é justo que eu imponha a minha vontade a ele. Sinto os braços de
Alex ao meu redor e fungo, tentando dissipar as lágrimas.
— Ele sabe o que está fazendo, Lana. Deixe seu amigo tomar suas
próprias decisões — ele fala e tem razão. Jules sempre fez minhas vontades e
se metia em confusões comigo. Na verdade, está na hora de nós dois
crescermos.
— Eu sei... mas é triste vê-lo partir assim, ainda mais agora, com toda
essa confusão!
— Mas vai ser melhor para ele, já não tinha praticamente nenhuma
ligação com os pais. Vou ficar de olho nele, Lana.
— Jura? Pode cuidar do seu bem-estar onde ele estiver?
— Não vou interferir na vida dele, mas vou ficar de olho para que não
ele se meta em confusão. Por você.
— Muito obrigada. Já disse te que amo hoje? — Sorrio para ele por
entre lágrimas.
— Humm... Deixe-me ver. — Ele finge pensar. — Acho que umas dez
vezes.
— Que convencido! Mas te amo mesmo assim. Muito mesmo. —
Então, fico séria e o encaro. — Sabe quando o meu pai vai ter alta? Sei que
você conversou com o médico que o atendeu.
— Hoje ainda. Ele não perdeu muito sangue, foi só um susto. Ele vai
ficar bem. — Alex beija suavemente meus lábios. — Quando tudo isso
acabar, vou te sequestrar para longe dessa confusão toda.
— Não gosto dessa palavra, Alex. — Franzo a testa para ele. — Que
mau gosto. — Ele ri, segura minha mão e vamos em direção ao quarto do
meu pai.
— Eduardo, não seja imprudente — minha mãe reclama com meu pai,
que já se encontra vestido, provavelmente, para sair. — Você levou um tiro,
querido.
— Estou me sentido ótimo. Vamos para casa. — Ele parece decidido.
— Alexander, convença-o a ficar mais algumas horas. Tenho certeza de
que você consegue o convencer. — Minha mãe apela para Alex, quando não
consegue a atenção do marido. Ah, agora ela é simpática com ele? Tento
esconder meu sorriso e encontro os olhos verdes de Alex, que deve estar
pensando a mesma coisa.
— O Mitchell está bem. Ele vai descansar em casa, não é mesmo?
Alex sorri complacente.
— Certo. Vou ficar em repouso. Por você, querida. Mas isso não foi
nada — ele fala, apontando para o braço.
Quando estamos para sair do hospital, recebemos a notícia de que
Fontes sobreviveu à cirurgia, mas que ainda corre risco de morte.
CAPÍTULO 34
Lana
Faz mais de uma semana que meu melhor amigo partiu e ainda
não consigo aceitar. Alex o encontrou dois dias depois da sua partida, como

havia me prometido que faria. Eu o amava ainda mais por isso.


Ligo para Jules, que não atende o telefone. Só queria informá-lo da
morte do pai, que não resistiu às complicações pós-cirurgia. Mas, talvez, ele
já saiba. Os jornais veicularam a respeito da sua morte. Meu pai fez uma
declaração pública sobre tudo o que estava acontecendo, e deixou todo
mundo atordoado. A mãe do Jules não foi presa e sumiu depois do funeral do
marido. Espero que ela não apareça mais por aqui.
Bem, agora, essa é uma página virada na minha vida e da minha
família.
Jogo o telefone na cama e vou para sala. Estou sozinha na casa de Alex
pela primeira vez, desde que nos conhecemos. Desde então, minha vida tinha
sido um caos, mas como o perigo acabou, ele me deu a senha de acesso e
devolveu meu carro, além de não precisar mais viver colado em mim. Não
que eu não quisesse a sua companhia o tempo todo.
Hoje ele vai me levar para jantar e não faço ideia de onde vai ser.
Enquanto vagueio pela casa vazia, me recordo da conversa que tivemos
sobre Adriane, há três dias.
— Como foi o jantar com a sua ex? — perguntei. Ele não hesitou em
me falar.
— Não quero que se preocupe mais com ela, Lana. — Alex havia me
olhado nos olhos. — Ela não vai mais nos incomodar. Disse umas verdades a
ela, que jamais falei por me sentir culpado, mas agora isso está encerrado.
Além do mais, você é mais importante do que qualquer coisa do meu
passado.
Não fiz mais perguntas. Acredito que ela não vai mais nos incomodar, e
estou feliz demais com isso. Mas, no fundo, tenho pena por ela não se
valorizar e ficar correndo atrás de um homem que não a quer. Penso que
deveria convidá-la para ir até a CASM. Lá, ela teria acompanhamento
psicológico — assim como tantas outras mulheres que não tem amor-próprio
e estão tentando dar um novo rumo às suas vidas e outras estão dando uma
segunda chance a seus casamentos fracassados. Tenho uma missão lá e farei
disso o meu trabalho: vou ser a melhor advogada que elas podem ter. Isso é o
que mais quero.

Nos dias que se seguem, as coisas começam a entrar nos eixos


novamente: voltei às aulas com afinco, à pole dance e à ONG. Daqui para
frente, quero ser uma pessoa melhor do que tenho sido. Me apaixonar fez
com que eu amadurecesse, deixando as minhas loucuras de lado, e, sem Jules,
estou tomando juízo. Rio ao me lembrar de que sem ele não sou tão doidinha.
Apesar disso, ele está fazendo muita falta.
Meu relacionamento com Alexander está indo melhor do que
imaginava. A cada dia, o nosso amor se solidifica, e vejo que somos um casal
que tinha pouca — ou nenhuma — chance de dar certo. Mas acredito no
amor do meu homem. Era um amor improvável, mas não impossível. A cada
dia nos amamos mais.
CAPÍTULO 35
Alexander
Mais de um ano depois
Se me contassem, há pouco mais de um ano, que hoje eu estaria
me sentindo assim, com certeza eu não acreditaria. Depois de terminar um

noivado, a última coisa que eu queria era me apaixonar. No entanto, uma

garota malcriada apareceu na minha vida e as minhas prioridades mudaram.


Hoje é um dia muito importante para mim.
Pedir uma mulher em casamento não é fácil, mesmo fazendo isso pela
segunda vez na vida. Não é algo banal. Deixa qualquer homem inseguro e
apavorado de receber um não como resposta. Estou com um baita frio na
barriga. Tenho certeza do amor de Lana, entretanto, ainda sinto o medo gelar
meu sangue. O que isso faz de mim? Um homem apaixonado?
Sim! Porra, sim...
Vivemos o último ano de forma intensa. Os meses passaram muito
rápido, mas estar com o amor da minha vida é incrível. E meu amor por ela é
tamanho, que me assusta, às vezes. O amor fez morada em nossa vida, e eu
não poderia escolher alguém melhor para me completar. Lana é o meu
oposto: impulsiva, enquanto eu penso muito. Ela se entrega a tudo que faz e a
cautela é meu sobrenome. Mas, por incrível que pareça, depois que a conheci,
aprendi a relaxar. Talvez, isso seja contagioso. Abro um sorrisinho ao
lembrar de como ajo como um garoto apaixonado, fazendo todas as suas
vontades.
Digito o código de desbloqueio de casa e entro na sala vazia. Quero que
ela venha morar comigo. Daqui alguns dias, ela vai se formar e mal posso me
conter para fazer o convite. Desde o começo, essa era a minha intenção, mas
quis que ela se mantivesse focada em terminar a faculdade.
Essa noite, meu sogro vai oferecer um jantar em comemoração. Tomo
um banho, me arrumo, e vou direto para o restaurante. Enquanto caminho até
a mesa dos Mitchell, bato no bolso para confirmar se a caixinha ainda está lá
e solto um suspiro de alívio. Conversei com o Mitchell sobre o pedido —
sabia que precisaria da permissão dele. Ele a criou para ser uma mulher de
negócios e não esperava que ela se casasse tão jovem. Não me importo para o
que ele pensava sobre nós dois, mas o respeito. Então, o avisei que ia me
casar com ela, afinal é melhor ter um sogro amigo do que inimigo, não? Para
meu alívio, ele já me aceitou e, no fim, disse que talvez sua filha precisasse
mesmo de “pulso firme” — palavras dele, não minhas — para que ela se
mantivesse na linha e criasse juízo.
Olho ao redor e vejo que o restaurante está lotado. Meu coração bate
forte e tento me acalmar. Afinal, já tive missões mais difíceis no exército.
Todos já estão sentados quando me aproximo da mesa...
Lana
Vejo Alex se aproximar da mesa. Abro um sorriso de felicidade quando
ele para ao meu lado e me levanto para receber um casto beijo na testa. O
quê?! Que medroso! Só por que meu pai está nos observando? Sorrio e o
provoco:
— Oi, meu amor! O meu pai sabe que você me beija na boca, viu?
— Deixe o pobre homem, filha — minha mãe diz com um sorriso.
— Espero não os tenha feito esperar muito — Alexander fala enquanto
se senta. —, mas tive um problema urgente que não pude evitar.
Me pergunto que problema seria, mas fico calada. Alex não costuma
falar muito do seu trabalho. Nem conheço muitos dos seus seguranças, a não
ser os que trabalharam na minha casa. Vejo o Carl com mais frequência, já
que eles são amigos e sempre saem juntos — além de Bruno, que vive
flertando comigo, mesmo que Alex reclame e o ameace. Eu o levo na
esportiva, pois nunca passou de uma brincadeira. Já Carl é muito sério e tem
cara de poucos amigos. Às vezes, ele fica olhando para Alex e eu, com olhos
nublados com algo que não sei descrever. Talvez, pesar. Já tentei questionar
meu namorado, mas ele não fala nada. Só diz que o Carl sempre foi assim:
taciturno, introspectivo e que não comenta sua vida pessoal.
— Bom, vamos brindar à nova advogada? — Papai me tira dos meus
devaneios. — À minha filha querida! Que seja uma advogada de sucesso! —
Ele ergue a taça de champanhe e nós o acompanhamos.
— Ainda não sou advogada, pai. Nem fiz o exame da ordem — digo
com um sorriso.
— Não importa. Para mim, você já é — Ele parece tão orgulhoso que o
deixo se comportar como um pai coruja.
Estou estagiando há um ano no escritório de um advogado importante
que é amigo dele. Meu pai havia feito questão, e não me opus. Em breve,
começo a especialização.
— À minha linda filha! — Minha mãe levanta seu brinde e tocamos as
taças. — Parabéns, querida!
— Bem, eu gostaria de aproveitar o momento e fazer um pedido
especial — Alex anuncia e afasta a cadeira para trás. Sinto meu rosto ficar
vermelho e olho ao redor quando ele se ajoelha diante da minha cadeira.
Como um verdadeiro príncipe encantado, segura minha mão, beijando meus
dedos trêmulos.
— Lana Mitchell, diante dos seus pais e... — Ele olha ao redor do
restaurante. Ah, meu Deus, meu namorado é brega, mas tão lindo. As
lágrimas se formam em meus olhos. — e essa multidão aí atrás de mim,
quero que saiba que o meu amor por você é maior do que tudo. Me dê a
honra de te amar para o resto das nossas vidas. Case-se comigo, minha
pequena encrenqueira? Eu te amo...
Oh, oh, oh!
— Ah, meu Deus, Alex! Sim, claro que caso! Quando? Amo você
ainda mais... — Ele ri da minha resposta ao colocar uma caixinha na minha
mão.
— Abra.
O anel é lindo e delicado. Um aro fino de ouro branco com um
diamante rodeado de minúsculas esmeraldas. Não poderia ser mais lindo. Eu
o entrego de volta, que o coloca em meu dedo anelar, o beijando em seguida.
— É lindo, amor. — Passo os braços ao redor do seu pescoço e o beijo
profundamente, sem me preocupar com as pessoas ao nosso redor, que
aplaudem o nosso showzinho. Ele tinha que me fazer pagar o maior mico?
Mas eu o amo.
Olho para os meus pais e irmão com um sorriso trêmulo, e estico a mão
na direção da minha mãe.
— Sejam felizes, garotos — meu pai fala, quando retornamos aos
brindes.
Já sou tão feliz... tudo vai ser perfeito.

Deixamos uma trilha de roupas da porta até seu quarto. Vamos


comemorar nosso noivado em nossa cama. Minha e dele.
Empurro seu corpo na cama e ele se deixa cair para trás. Ele está
usando só uma boxer branca que não esconde muita coisa dos meus olhos
famintos. Monto em seu abdômen e tomo sua boca, traçando seus lábios com
a língua.
— Você sabe que é o homem mais gostoso que existe, não é? — eu o
distraio com minha voz sedutora, enquanto levanto seus braços musculosos
acima da cabeça. Mas ele os abaixa para agarrar minha cintura e deslizar para
cima e para baixo nas minhas costas. — O único que quero!
— Você tem toda razão, Lana. Sou o único que você vai ter — ele
declara.
— Quieto, amor! Quero explorar esse corpo que me pertence.
Seguro seus braços de novo e os coloco para cima. Volto a distraí-lo
com beijos em sua boca enquanto pego a algema que está posicionada de
forma estratégica para aquele momento. Ele não percebe a minha intenção até
que a fecho em um dos seus pulsos. Eu queria os dois, mas é impossível
colocar o outro agora que ele está preso por um braço.
— O que você está fazendo, Lana?! — Tento fugir, mas com o braço
solto ele me segura no lugar.
— Um show para você — digo ofegante.
— Me dê a merda da chave, que vou apreciar seu show. Solto. — Ele
balança as algemas que estão presas na cabeceira da cama. — Agora!
— Está bem, está na cômoda. Vou pegar — minto, só quero que ele me
solte. — Pode me soltar? Você é tão sem graça, Alex. Sua noiva nem pode
fazer algo diferente. — Faço beicinho e tento sair de perto dele, mas ele não
permite.
— Você vai me pagar quando me soltar, hein, mocinha? Não tente
nenhuma gracinha.
Claro que vou. E vou amar!
— Volta logo. Odeio me sentir preso.
—Tudo bem — ele me solta.
Saio da cama. Fico de pé ao seu lado, com um sorriso travesso no rosto,
e vejo quando ele percebe que cometeu um erro ao me soltar.
— Não vou fazer nada de ruim com você, amor. Volto já.
— Lana! Volte aqui! — Alex está com raiva, mas vou remediar.
Vou até a sala, pego a bolsa. Conecto o celular no seu aparelho de som
e escolho uma seleção de músicas para ir tocando. Vou para cozinha e pego a
champanhe que comprei especialmente para esse momento. Levo tudo para o
quarto onde ele está sentado, os pés apoiados no chão. Droga, era para ele
ficar deitado! Assim não tem muita graça.
— Deita!
— Isso não tem graça, Lana — diz de cara feia.
Deixo as taças e champanhe do outro lado, longe dele, e vou até o
closet. Tiro a roupa íntima e pego a calcinha fio dental vermelha de renda e a
visto. Escolho umas das camisas dele. Ah, merda. Não está sexy! É enorme!
Burra! Nem pensei nisso quando programei o show. Sem opção, enrolo as
mangas e a deixo aberta. Coloco uma fina gravata vermelha folgada no
pescoço e jogo os cabelos para frente, os deixando armado. Calço um sapato
de salto agulha vermelho e preto. Ao me ver no espelho, não fico muito
satisfeita. A camisa, muito grande, não me deixa sexy como eu queria. Pego o
batom vermelho e pinto meus lábios. Esse é o máximo que posso fazer de
improviso.
— Lana, o que você está fazendo aí dentro? — A voz de Alex me faz
pular. Estou nervosa. Eu devia ter colocado um poste aqui dentro, para fazer
algo sexy de verdade, — Você vai ver só quando me soltar — ele ameaça,
mas isso só aumenta a minha excitação.
A música começa a tocar como programado, mas ainda não é a que eu
quero. Isso é uma lição para ele. Quero que ele me deseje e vou provoca-lo
até seu limite, só para ficarmos quites por ele ter me algemado naquela noite
em que nos conhecemos. Quando saio do closet, ele está lutando com as
algemas. Ainda bem que a cama é de ferro fundido ou já teria quebrado. Ao
notar minha presença, ele para.
— O que você vai fazer comigo? — Abro um sorriso. — Espero que
seja bem malicioso. Promessa é dívida.
— Você está sexy!
Não, com essa camisa enorme. Mas é bom o ouvi-lo falar nesse tom
masculino, me deixando acesa.
— Deite-se! —ordeno e, por incrível que pareça, ele fez exatamente
isso.
— É melhor que isso valha a pena, Lana, ou você vai gritar por
misericórdia quando eu acabar com você. — Suas palavras soam mais como
uma ameaça sexy. Sorrio mais e sei que meus olhos estão brilhando com a
expectativa de ele fazer exatamente o que está ameaçando. — Isso te atiça
ainda mais. Estou ferrado contigo, Lana!
Vou até a cômoda, sirvo o champanhe, mas não sou rápida o suficiente
e ele agarra meu pulso, me derrubando. A bebida cai sobre ele e a cama.
— Ah, Lana, vai ter que secar tudo isso — ele fala em tom de deboche,
apontando para o próprio peito.
—Me solte, Alex! Ainda tenho uma dança para fazer! — peço, mas
inclino para frente até nossas bocas estarem juntas.
Esqueço que quero dançar quando nos beijamos profundamente. Em
seguida, deslizo os lábios pelo seu pescoço, a língua correndo pelo peitoral
esculpido e lambo cada gotícula de champanhe que há nele. A íris está num
tom de verde tão intenso que, por um momento, vacilo e quase fico
hipnotizada por seus olhos, que são magníficos. Não me canso de olhá-los.
Lambo cada gota e sugo seu mamilo com força. Ele geme e agarra
meus cabelos com tanta força que meu couro cabeludo pinica com a dor. Mas
isso só me deixa mais excitada e necessitada do seu controle sobre mim.
— É só isso que sabe fazer, princesa? — Ele puxa meu cabelo para trás
e me faz olhá-lo de frente. Estou com raiva por ele estragar minha dança.
— Por que não cala a boca, Alex? — pergunto e ele ri.
— Estou esperando você calar. Ou não consegue, garotinha? — ele
provoca e me solta.
Me levanto e tiro a calcinha. Fico de pé sobre ele, um pé a cada lado do
seu corpo lado, proporcionando uma visão e tanto, já que estou só de camisa
e salto alto — o que quase me faz perder o equilíbrio. Me inclino para frente
e me sento no seu rosto. Arfo quando ele não se faz de rogado e usa a boca
pecaminosa em mim. Não é primeira vez que ele me devora dessa maneira,
como se estivesse faminto, sugando meu clitóris ou deslizando a língua de
uma extremidade a outra da minha vagina. Amo a sua boca. Sinto arrepios ao
longo do meu corpo quando Alex toma meu clitóris e suga com força. Gemo
e tento me levantar, mas a mão dele me sustenta no lugar, segurando a minha
bunda. Para minha completa vergonha, gozo tão rápido que pareço estar
desesperada por sexo. E estou mesmo. Com Alex estou sempre pronta e
ansiosa.
—Vire-se, Lana — ele fala. Sua voz é rouca e cheia de tesão. — Agora
é a sua vez — ele ordena, fazendo meu desejo se renovar.
Cubro seu pau com meus lábios e deslizo a língua da base à ponta.
Ouço seu gemido gutural e isso reverbera no meu núcleo sensível, me
fazendo gemer enquanto engulo sua ereção até onde posso levar. Perco
completamente a concentração quando ele começa a me foder com a língua e
paro o que estou fazendo para apreciar o momento.
— Chega dessa porra! — Ele bate na minha bunda com força. — De
quatro, gatinha. Quando me soltar daqui, não vou ter piedade de você.
Ele não espera que eu o obedeça. Alex me empurra de cima dele e
consegue me puxar para perto, ficando de joelhos atrás de mim. Fico na
posição que ele mandou, enquanto ele entra em mim, com força e rápido, em
uma única estocada. Grito enquanto ele entra e sai de dentro de mim. A mão
que está solta segura meu ombro, dando impulso. Viro a cabeça para que a
sua boca devore a mim. Me derreto contra ele, enquanto as estocadas não
param.
Isso é... demais.
— Merda de algema! — ele grunhe me dominando com uma mão. Alex
deve odiar não ter total controle.
Gozamos juntos e penso que as coisas vão ficar ainda melhores daqui
em diante.
— Te amo! — ele diz em um sussurro rouco.
O FUTURO
Lana
Quatro anos depois...
Manobro o carro em direção ao transito caótico da hora do rush,
dirigindo com cuidado, já que não quero que nada aconteça com meu

pequenino. Massageio minha barriga proeminente e sorrio deliciada. Minha

vida deu um giro e estou muito feliz, por ter lutado por meu amor e ter

conseguido me libertar da superproteção da minha família. Trabalho com o

que amo na ONG, ajudando mulheres que não tiveram ou não têm a mesma

sorte que eu de ter um companheiro que me ama apesar do meu gênio difícil.

Sou amada e amo Alex acima de qualquer coisa. Estamos casados há três

anos. Depois daquele pedido no restaurante, fomos morar juntos e, por fim,

nos casamos. A única coisa que me deixava triste em alguns momentos, era a

saudade que eu sentia do meu amigo.


Estou grávida de oito meses e ainda não parei de trabalhar, apesar das
reclamações de Alex. Mas estou saudável e não quero deixar as meninas sem
o meu apoio, até que seja realmente necessário. Tenho trabalhado por meio
período nesses últimos meses, quando o cansaço passou a ser maior que
minha teimosia.
— Boa noite, Miguel! — cumprimento o jovem porteiro ao entregar as
chaves ao manobrista do prédio em que moramos. — Obrigada.
— Boa noite, senhora — ele sorri para mim. — Tem uma pessoa te
esperando. — Ele aponta para o saguão do prédio. Olho para lá e paraliso ao
ver quem está sentado. Meu coração explode de felicidade.
— Jules! — chamo. Ele levanta a cabeça e fica de pé num salto, me
alcançando rapidamente. Ele está tão diferente... parece um homem
desenvolvido e mais bonito do que me lembro. Não nos falamos há cinco
anos e, agora, ele está aqui. Meus olhos ardem e percebo que estou chorando.
Ah, merda! Droga de hormônios. Sinto uma pressão no peito de felicidade
por poder, enfim, abraçá-lo.
— Você está grávida! — ele atesta antes de me puxar para um abraço
de urso — Que saudade de você! — Sua voz soa rouca contra meus cabelos.
Eu o aperto com firmeza. Senti tanta falta dele que doía.
— Também estava morrendo de saudade de você, meu amigo. — Me
afasto e ergo a mão para tocar seu rosto áspero pela barba por fazer. —
Voltou de vez? Espero que sim, Jules. Queria tanto ter você por perto de
novo.
Enterro o rosto no peito largo, que está bem forte. O que ele andou
fazendo? Virou um rato de academia? Está enorme.
— Vamos subir, Jules, quero saber de tudo sobre você e o que anda
fazendo. — Desgrudo dele, segurando a sua mão e o levando para o elevador.
— Não acredito que está aqui! — Volto a abraçá-lo pela cintura.
— O que anda fazendo, Jules? Você está gostoso! — digo e ele ri. Sim,
ele ainda é o mesmo Jules que ria das minhas besteiras. Aperto seus bíceps
proeminentes — Ganhou até músculos.
— Já tinha músculos, Lana, você que não enxergava um palmo a diante
do nariz. — Ele toca levemente em meu nariz e seus olhos castanhos descem
até minha barriga — Puta merda, o cara te engravidou!
Estamos rindo ao entrar no apartamento. Jules mantém um braço nos
meus ombros.
— Mas que porra é essa, Lana?! — Alex está descendo as escadas que
leva para o andar de cima e, pelo tom, não reconheceu Jules. Não perco a
chance que provocá-lo.
— Nossa, amor, nem posso trazer meu amante secreto para casa? —
Vou até ele, mas seus olhos estão grudados no visitante.
— Jules?! — Alex pergunta antes que eu diga algo.
— É isso aí, vivo e lindo! — Jules assente.
— Estou vendo — Alex comenta e vira outra vez para mim. — Estava
indo te buscar. Esses seus horários estão passando dos limites, Lana.
Alex me puxa para seus braços e beija meus cabelos. Sua mão desce
para minha barriga, hábito que desenvolveu sempre que está perto de mim.
Depois, vai até Jules e aperta sua mão, batendo em seu ombro, nesses
cumprimentos que só os homens fazem. Sempre que eu perguntava sobre o
Jules e o que ele fazia, Alex não me contava, dizia que era melhor eu não
saber, mas que não era nada ilegal. Nem sempre eu acreditava, pois tinha a
convicção que se fosse assim, ele diria. Mas Alex dizia que eu não saberia
mentir quando encontrasse Jules algum dia e, com certeza, agiria como se
soubesse da vida dele. Talvez fosse verdade.
— Sente-se, Jules, vou servir algo para você — digo. — O que quer?
— Senta você, amor, que eu pego uma cerveja para nós. — Alex vai até
o bar no canto da sala. Me volto para Jules.
— Me conte tudo! Estou tão feliz por você estar aqui, Jules. — Ele não
parece muito à vontade quando o puxo para se sentar. Olho em seus olhos —
Tem visto a sua mãe?
Seus olhos ficam nublados e sua expressão é de desgosto.
— Não, mas não quero falar sobre isso. Me desculpe. — Ele olha ao
redor do apartamento. — Achei que a princesa do Mitchell viveria em um
palácio, mas até que esse apartamento é modesto. — Ele ri.
— Não sou bilionário, caro Jules. — Alex retornar com duas cervejas e
água para mim.
— O orgulho do meu querido marido não permitiu que morássemos na
casa que ganhei de presente de casamento. Mas tenho certeza de que ele vai
mudar de ideia, já que vamos precisar de espaço. — Acaricio a barriga. Esse
é o único motivo pelo qual costumamos discutir. Alex diz que não quer
aceitar nada que o meu pai possa nos dar, por que ele pode sustentar sua
própria família. Orgulhoso!
Jules fica para jantar conosco e descobri, estarrecida, que agora ele é
lutador e é assim que ganha a vida. Por isso os músculos.
— Como você foi se meter com isso, Jules? — pergunto. — Essas lutas
são legalizadas? Iguais às do UFC que passa na TV?
Ele desvia o olhar e sei que talvez não seja.
— Estou tentando, querida! — ele diz. Dando a entender que talvez não
esteja fazendo a coisa certa.
— Quando você foi embora daqui disse que queria ser melhor que o
seu pai. O que mudou? — Assim que as palavras saem, eu me arrependo.
Jules empurra o prato e se levanta.
— Agradeço pelo jantar. — Sua voz sai dura e esse desconhecido não
se parece em nada com o meu melhor amigo. — Vim te visitar porque senti
muito a sua falta, Lana, mas estou indo. Foi bom te ver.
— Não vá, Jules! Me desculpa. Não sei o que deu em mim, sou uma
idiota mesmo. — Vou até ele. — Estou preocupada com você. Só isso. Sente-
se e termine seu jantar, por favor. — Ele volta a se sentar e solto um suspiro
de alívio. Alex se mantém calado e, quando nossos olhos se encontram, ele
me faz uma advertência silenciosa. Não o pressione! Assinto e volto para a
cadeira.
Depois desse pequeno mal-estar, voltamos a conversar e, antes de ir
embora, ele promete me visitar mais vezes, o que me deixa feliz demais. Meu
amigo está de volta! E tudo indica que veio para ficar.

— Agora a minha esposa vai me deixar beijá-la? — Ouço Alex dizer


quando saio do banheiro.
Ele está deitado na cama queen size, usando uma calça de seda azul
marinho. Me deito de lado e seus braços me arrebatam com facilidade, apesar
do peso extra que carrego.
— Quero você bem perto de mim, amor — ele sussurra. Estou entre
suas pernas, as costas coladas a seu peito, sentindo sua dureza contra mim.
Viro a cabeça para receber o beijo que ele havia cobrado. Solto um gemido
audível quando sua língua encontra a minha, seu gosto viciante me deixa
excitada. Pouco depois, ele puxa meu cabelo levemente me afastando dele.
— Te amo tanto — diz baixinho. — Você e o nosso filho.
—Também te amo. — Beijo sua mandíbula. — Por que não me disse
que o Jules estava metido com essas lutas, Alexander?
— Ele não fez nada de errado, Lana. Não seja tão dura com ele. Além
disso, você não é a mãe dele. — Alex me envolve com seus braços e me puxa
para o mais perto dele possível. — Jules ganha a vida honestamente, não
rouba, nem mata ninguém. Só luta! E, por sinal, luta muito bem. Deixa o
cara, Lana. Se intrometer não vai fazer diferença, só vai afastá-lo de você.
Ainda que eu ache ótimo, já que odeio ver a minha mulher abraçando um
marmanjo.
— Tudo bem. Não vou falar mais nada — digo, resignada. — Você
sabe que o Jules é como um irmão para mim e vice-versa, não é? Nós nunca
duvidamos disso.
— Sei, e é por isso que ainda permito que ele te agarre, ou arrancaria
suas mãos — ele ameaça, mas ri. — Cara folgado!
Volto a beijar sua boca calando seu ciúme. Mas sei que não é de
verdade. Ainda mais com Jules. Alex já o havia aceitado há muito tempo...e
eu o amo demais por isso.
Alexander
Um mês depois...
— Aguenta firme, amor. — Seguro firme a mão de Lana, que está
vermelha de tanto fazer força. Ela parece não me ouvir ao gritar tão alto que
meus tímpanos parecem estourar. Mas não me importo quando ouço um
choro irritado ecoar na sala em que os médicos estão ajudando-a a ter nosso
filho. Uma coisinha roxa é colocada no peito de Lana, com o rostinho
enrugado que parece lamentar ter saído do seu casulo quentinho. Estou com
um grande nó na garganta ao ver minhas maiores dádivas juntas: minha
mulher e meu filho, que berra a plenos pulmões. Seguro sua mãozinha
inquieta.
— Ele é tão lindo, Alex. — A voz de Lana está rouca dos gritos. —
Tão lindo. Amo tanto vocês dois. Ben Marshall. Ele tem seus olhos,
Alexander! É tão lindo quanto o papai dele. — Ela ri e está tão linda, me
fazendo sentir uma grande emoção por ter o seu amor incondicional. A sorte
finalmente sorriu para mim.
Inclino e abraço meus dois tesouros, dando um beijo nos lábios da
minha mulher. Estou tentando encontrar minha voz para expressar meu amor,
mas parece que a perdi momentaneamente.
Estou feliz para caralho!
Pouco tempo depois, Lana já está em um quarto e estou segurando sua
mão com firmeza, enquanto ouço uma leve batida na porta. Um coração azul
aparece seguido do Jules.
— Soube que a mamãe urso teve um filhotinho. — Ele entra
acompanhado de uma garota. Eu nunca o vi acompanhado. — Aqui, papai...
— Oferece os balões e se agacha ao lado da cama. Lana, que estava sonolenta
há poucos momentos, agora tem um grande sorriso no rosto.
Parece que não foi só Jules quem resolveu aparecer. Seus pais invadem
o quarto ansiosos para conhecerem o neto.
Lana
Estou tão feliz. Agora, a vida parece estar no lugar. Tenho meu filho
nos braços, além da presença dos meus pais e meu irmão, Jules e a namorada
e o homem que é o dono do meu coração.
Tudo está perfeito!
Além disso, a CASM é o meu segundo lar. As mulheres daquele lugar
são minha maior causa. Minha vida é feliz e espero que continue assim.
Quando mais tarde, naquele dia, os amigos de Alex apareceram com
suas esposas, a reunião fica completa. Todos nós passamos por muitas coisas
durante esses quatro anos e, finalmente, Bruno e Carl haviam encontrado
mulheres maravilhosas. Carl havia mudado muito e eu agora entendia o
porquê ele era tão taciturno. Mas essa é uma outra história. E Bruno e Alicia
tinham razões para viverem com um sorriso bobo.
— Alex, você tinha que ter um garoto? — Bruno ri para Alex — Isso
vai me causar problemas no futuro.
Todos riem da sua exasperação.
Sei que em alguns momentos teremos problemas, mas a nossa vida é a
melhor que poderíamos ter.
— Te amo — sussurro para Alex em meio à algazarra na sala de estar.
Meus dias de patricinha chegaram ao fim e, agora, tenho um lindo bebê nos
meus braços.
— Te amo mais...

FIM
AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer a todas minhas leitoras que me acompanham no


wattpad. Vocês me surpreenderam com tantas leituras, algo que não esperava.
Obrigada por disporem de um tempo e lerem.
Agradeço pelo carinho e cada quote e por sua ajuda, Sheila Pereira,
obrigada. E todas que me ajudam nesse sentido, por compartilhar e indicar.
Obrigada de coração!
Mas não poderia deixar de agradecer a uma pessoa especial que tem
feito por mim mais do que mereço. Patrícia da Silva sem você, amiga,
Alexander não seria publicado agora, você não tinha que fazer isso, mas se
comprometeu e fez, me ajudou demais para que ele ficasse pronto. Obrigada,
amiga, Deus te abençoe cada dia mais. Cat, amiga, obrigada por tudo
também. Vocês são meus anjos da guarda.
Deus, obrigada por mais um trabalho, quando tudo parecia perdido,
continuei por saber que tudo tem Tua permissão. Tu És Grande na minha
vida.
Obrigada,
MAYJO
“Ser grande, é abraçar uma grande causa.”
(William Shakespeare)
LIVRO ii
Copyright © MAYJO 2016
Título Original: Bruno
Revisão: Lucilene Vieira
Diagramação digital: Mayjo

1ª Edição Digital [2016]


Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser
reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meio eletrônico ou mecânico
sem permissão por escrito da autora. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei n°. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Está obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.
Dedicatória
As minhas leitoras fiéis.
Obrigada.
1
Alicia Duran
Uma da manhã, e todos os convidados parecem com energia para
amanhecer o dia na festa. Meus pés parecem que vão pegar fogo de tão
doloridos, mas como organizadora de festas e eventos, tenho que ficar até o
fim ou quase isso. Gosto de saber se tudo correu bem, sem percalços, até o
último convidado sair.
Hoje a festa é uma recepção de casamento, e os convidados dos noivos
não parecem com muita vontade de irem embora tão cedo. Observo o
deslumbrante salão de baile em um dos hotéis mais luxuosos da cidade e dou
um sorriso de contentamento. Minha equipe tinha deixado tudo perfeito. As
luzes suaves davam um ar romântico e deslumbrante à decoração. Certifico-
me se o abastecimento de suprimentos do Buffet está ok e se os convidados
possuem bebidas em abundância. Relaxo um pouco ao ver que todos estão
sorridentes e focados em se divertirem, e é isso que interessa hoje, aqui.
Minha empresa é pequena, mas tenho uma clientela seleta e rica que me
mantém sempre com muito trabalho. Não temos um foco tão definido de
eventos, aceitamos qualquer trabalho desde que esteja dentro de nosso
alcance realizá-lo e, portanto, estamos cada dia crescendo mais e mais no
mercado. E faço questão de estar sempre atenta para que ela continue
crescendo e por essa razão estou sempre presente buscando a melhoria dos
serviços em sua excelência.
Mais de meia hora depois, quando percebo que já começaram a sair, eu
passo a responsabilidade de supervisionar o serviço para Marcos, meu
gerente, e deixo a festa também. Estou acordada há muito tempo, desde as
cinco da manhã. Estou exausta quando estaciono meu carro na garagem do
meu prédio.
Evan provavelmente já está dormindo, ou não, pode ter saído como
costuma fazer nesses últimos meses. Meu casamento de três anos está indo
por água a baixo, como diz o ditado. E não vejo muitas opções de salvamento
à vista.
Cumprimento o porteiro da noite e caminho para os elevadores. Espero
impaciente enquanto ele desce, e tenho uma surpresa quando três homens
saem de dentro dele. Coisa mais estranha. Observo-os saírem e entro no
elevador logo após, um sentimento estranho tomando conta de mim devido
ao encontro com aquelas pessoas.
Medo se arrasta como insetos rastejantes na minha pele; meu corpo
todo treme, e é como se visse isso acontecendo de fora do meu próprio corpo.
Eu sabia, no momento que aqueles homens saíram do elevador, que algo ruim
tinha acontecido. Meus olhos tinham se conectado com um deles, e algo
havia piscado neles. Algum tipo de reconhecimento.
Eles não pararam. O homem que olhou para mim hesitou por um
pequeno instante, no entanto, passou direto, indo para fora do prédio. Não
entendo o porquê de eles não terem sido impedidos de entrar no prédio. Sabia
que não eram moradores, e não parecia que eram convidados de algum dos
moradores do prédio.
Quando desço no sexto andar onde fica nosso apartamento, estou tão
ansiosa e com um pressentimento ruim, que sinto uma dor aguda no
estômago. Empurro a porta do meu apartamento, que está aberta – e isso só
confirma que algo não está bem —, entro e paraliso no lugar. Um grito fica
preso em minha garganta quando olho para minha sala. Tontura toma conta
de mim, as paredes parecem se fechar ao meu redor, me fazendo cambalear, e
tudo parece escurecer à minha volta.
Evan, meu marido, está sentado no sofá, mas seus olhos estão vítreos e
tem um furo ensanguentado na testa. Tento correr para perto, porém minhas
pernas falham e caio sentada em minha própria bunda. Por um momento
curto estou paralisada, depois ajo freneticamente, fazendo a única coisa
plausível para mim, que é pegar meu celular e tentar ligar para a única pessoa
no mundo que pode me ajudar agora.
Enquanto o celular chama do outro lado, eu consigo levantar e sair do
apartamento. Estou indo na direção do elevador, quando vejo que ele foi
chamado para baixo. Sei instintivamente que devo sair daqui e não penso
duas vezes quando vou para as escadas. Melhor não dar chance para a má
sorte. E se aqueles homens adivinharam que sou a esposa de Evan?!
— Alô. Oi, mana — a voz de Matt é sonolenta. Lembro que ele esteve
viajando e deve ter chegado de viagem, e como já passam das duas...
— Matt! — estou sussurrando quando atinjo o quinto andar — Matt, o
Evan está morto na nossa casa e acho que seus assassinos podem vir atrás de
mim. — solto de uma vez.
— Onde você está agora, Alicia? Já chamou a polícia? Estou indo para
aí agora — escuto quando ele se movimenta do outro lado, sua voz agora
totalmente alerta.
— Estou descendo pelas escadas. Não quero ficar dentro do
apartamento, Matt. — digo, acredito que não há ninguém atrás de mim, já
que não escuto passos. Talvez o medo tenha me feito imaginar coisas — Não
sei o que fazer, Matt, não sei o que aconteceu — minha voz embargada
treme.
— Vou desligar e ligar para a polícia, ligo para você em seguida, e
procure um lugar seguro, Alicia — meu irmão é meu melhor amigo e somos
extremamente cuidadosos um com o outro.
Estou no terceiro andar e vou até o apartamento de Cindy. Ela é uma
das poucas pessoas que conheço e tenho algum tipo de amizade nesse prédio,
afinal, só fazem quatro meses que viemos morar aqui. Toco a campainha, e
pouco depois a porta abre. Ela aparece, fechando o roupão e com cara de
sono. Ela é uma moça gordinha, em torno de trinta anos, com cabelos pretos
cortados curtos, tipo Chanel. Seus olhos castanhos se arregalam quando vê
meu rosto.
— Alicia, o que você tem? Parece pálida — ela segura meu braço, e
entro no apartamento dela, fazendo-me respirar de alívio. Ela me puxa para o
sofá na sala e eu praticamente desabo lá. — Aconteceu alguma coisa? Fale,
querida.
Não sei o que dizer. Como falar que meu marido está morto? Eu nem
sabia que Evan tinha inimigos.
— Só preciso ficar aqui uns minutos, ok? — ela saberá em breve, mas
não quero que ela entre em pânico achando que posso atrair assassinos à sua
casa, por isso me calo.
Devia falar, já que pela forma como me olha com pena, deve achar que
levei uma surra do Evan. Evan, coitado, está morto, morto. Quem faria algo
assim? Quem?
— Vou preparar um chá para você, acredito no poder calmante do chá,
você sabe — ela pisca um pouco, sem graça, já que estou parecendo uma
múmia sentada lá, e vai preparar o chá, quando meu telefone volta a tocar.
Atendo imediatamente.
— Matt!
— Você está segura, querida? — ele pergunta
— Estou bem — minha voz está tensa. — Você estará em breve aqui,
Matt? Estou apavorada. — eu nunca imaginei chegar na minha casa e
encontrar meu marido morto, além do fato de encontrar seus possíveis
assassinos. Eu tinha, de uma hora para outra, me tornado quase testemunha
de um crime.
— Está aqui, querida, vai se sentir melhor — Cindy está na minha
frente com uma xícara de chá. Digo para Matt onde estou e desligo.
— Obrigada, Cindy — sussurro. Eu preciso ser forte como sempre fui.
Agora não era hora de demonstrar fraqueza.

***

Três horas depois, estou sentada no departamento de polícia, repetindo


uma e outra vez a mesma história para os policiais. Estou esgotada e não
tinha derramado nem uma lágrima pelo Evan. Devo estar em choque. Tudo
que ainda me mantém amparada é Matt, que sempre foi como um pai para
mim, mesmo sendo apenas cinco anos mais velho que eu, e sei que estará me
dando forças em tudo que está acontecendo.
Nunca fui fraca, mas encontrar uma pessoa morta na sua sala, e sendo
seu marido, desconcertaria qualquer pessoa. Estou tão calma por fora que
qualquer um diria que não sinto pela morte de Evan, mas sei que tudo virá de
uma só vez.
— Você saberia dizer se seu marido tinha inimigos, senhora Duran? —
o detetive da polícia, calvo, de uns cinquenta anos, está indagando e tirando-
me dos meus pensamentos.
— Não, nunca imaginei que ele estivesse envolvido com algo que nos
colocasse em risco — meu casamento não era um mar de rosas, mas Evan
nunca fez algo para que eu suspeitasse que ele pudesse levar uma vida dupla.
Mais de três anos de casamento e parece que não conheço meu marido.
— A senhora pode reconhecer esses suspeitos? — o detetive continua.
— Acredito que sim. Um sim, com certeza, se o visse me recordaria —
garanto. Eu lembro perfeitamente dos olhos de um daqueles homens, se os
visse à minha frente saberia identificá-lo.
Vejo quando Matt aparece e fala com o detetive, e pouco depois sou
dispensada do depoimento. Estou entorpecida, parece que estou no limbo
onde nada pode me atingir, mas sei que a ruptura pode acontecer a qualquer
instante.
Saio da delegacia com Matt, e ficamos calados durante a maior parte do
tempo em que seguimos para a casa dele. Não sei como farei daqui em
diante. Não quero morar mais naquele apartamento, está fora de cogitação.
— Você está bem? — ele pergunta eventualmente a caminho da casa
dele — Poderia ver um médico, afinal você teve um choque e tanto hoje.
— Estou bem, só preciso da minha cama — minha apatia começa a se
evidenciar, o cansaço por estar há mais de 24 horas acordada iria me derrubar
literalmente.
— Não quero que se preocupe com nada, Alicia, cuidarei de tudo para
você — Matt sempre foi assim, cuidava de tudo para mim desde que
perdemos nossos pais. Tinha sempre sido eu e Matt contra o mundo.

***

Acordo algumas horas depois e fico olhando para o teto do quarto de


hóspede do apartamento de Matt. Tudo parece um pesadelo acontecendo em
câmera lenta. Levanto e deixo para lamentar depois, tenho tantas coisas para
organizar. Estou surpresa comigo mesma por estar tão controlada. Não chorar
por Evan parece errado, e sei que depois isso virá tudo de uma vez, sei disso.
Nos dias seguintes, tudo parece acontecer de uma vez na minha vida.
Após o funeral de Evan, toda enxurrada de emoções que não tinha acontecido
ainda veio de vez de dentro de mim. Chorei por ele, por mim e por coisas que
vinham se revelando ao longo desses dias.
A polícia descobriu que ele tinha desviado dinheiro de clientes dele. E
talvez seja essa a razão de seu assassinato, e eu poderia estar correndo risco
de morte por ser sua esposa e indiretamente estar envolvida com as falcatruas
de Evan. Não basta ter um marido assassinado, você descobre que ele é um
homem desonesto e envolvido com desvio de dinheiro.
Sinto que em quase quatro anos não conhecia meu marido, ao menos
não como profissional, porque em casa eu o conhecia bem demais. Isso foi o
catalisador para chorar por tudo que aconteceu. Todos os clientes que ele
roubou podem ser um possível mandante do crime. A polícia não tem
nenhuma pista dos criminosos, já que eles tiveram cuidado para não mostrar
seus rostos nas câmeras de segurança do prédio.
Além disso, estou na mira de seus possíveis assassinos, quando saiu na
televisão que eu tinha encontrado os criminosos. Fui aconselhada pela policia
para ter cuidado com minha segurança ou poderia acabar como Evan, com
uma bala na testa.
Um mês depois, estou morando em um apartamento da empresa de
Matt, um novo empreendimento onde há um apartamento modelo. Não queria
ficar em sua casa, estava acostumada a ter minha própria. Voltar ao meu
apartamento, duas semanas depois daquela noite foi bem difícil, não podia
olhar para aquela sala sem imaginar Evan sendo assassinado ali. Mas tinha de
retirar minhas coisas pessoais de lá. Matt tinha resolvido muitas coisas para
mim, poupando-me das partes desagradáveis.
Estou ajeitando as flores no jarro, na cozinha da minha nova moradia,
quando escuto a porta da frente sendo aberta e a voz de Matt logo em
seguida.
— Hei, maninha! — ele aparece sorridente na porta um momento
depois — Tenho algo para conversar com você. Eu espero que você não surte
antes de ouvir o que tenho a dizer.
— Imagino que não irei gostar. Já não bastam meus clientes cancelando
suas festas comigo? — sim, meu pequeno negócio estava sofrendo com a
repercussão da morte de Evan e seus roubos. Tinham sido cancelados
praticamente metade dos meus compromissos agendados, e isso era um baque
no orçamento da Duran Festas & Eventos. Estar chateada com isso era
pouco. — Fale de uma vez, Matt.
Ele caminha para perto e, depois de depositar um beijo na minha
têmpora, puxa uma cadeira e senta à mesa.
— Senta aqui comigo — ele bate com a palma na mesa. Sento em
frente a ele e espero. Bom, tenho fé que não seja nada tão ruim.
— Eu estive falando com o detetive de polícia e fui aconselhado a
contratar um segurança para você — tento falar, mas ele levanta a mão, me
impedindo — Alicia, não quero ver você morta. É minha única família, não
quero te perder também por culpa daquele...
— Não, Matt — balanço minha cabeça. — Melhor deixar os mortos em
paz — ele tem razão de estar chateado com Evan, sua maledicência estava
respingando em mim.
— Não o defenda, sabe que tenho razão — ele me dá um olhar
consternado — Mas, isso não vem ao caso agora. Só quero que aceite ter um
segurança até esses caras serem pegos pela polícia, ok?
— Não há outra maneira? Como seria esse arranjo? — pergunto —
Onde esse segurança irá ficar? Não é aqui, é?
— A princípio, sim. Esse prédio não tem muita segurança, está ainda
em construção, você sabe. Não sei por que escolheu ficar aqui.
— Estou ajudando você nos negócios, irmão — dou um sorriso —
Poderia fazer propaganda grátis para você!
— Sério? — ele ri, isso é uma piada, já que ele tem uma equipe de
marketing para isso — Isso a deixa mais suscetível ao perigo, isso sim,
qualquer um poderia se passar por cliente e entrar no prédio e chegar até
você.
— Está bem, mas não conheço nenhuma firma de segurança, Matt.
— Deixe isso comigo, Alicia — ele segura minha mão entre as suas —
Tenho um amigo, dono de uma empresa privada, vou entrar em contato com
ele.
Bruno Ross
— Você voltará, querido? — a loira ronrona na minha direção, quando
me vê colocando minhas roupas que estão espalhadas pelo quarto.
Voltar? Acho que não. Por que diabos iria repetir uma transa com uma
mulher quando tem centenas de outras por aí disponíveis? Tenho cara de
otário? Mas é claro que não. Ainda mais uma que nem conheço, a não ser no
sentido bíblico.
Tinha passado a noite aqui em sua casa, mas a conheci ontem numa
boate. Eu sou totalmente avesso a me amarrar a uma mulher só. Tinha sexo
na hora que eu quisesse. Por que diabos iria arranjar problemas? Por quê? Se
as mulheres têm a capacidade de metamorfose maior que qualquer outro ser
vivo? Não, de jeito nenhum voltaria lá. Daqui a uns dias ela iria querer pôr
uma aliança no meu dedo.
— Claro que sim, ligo em breve para você — viro para ela com um
sorriso galanteador — Você é especial, você sabe.
Ela morde os lábios e devolve meu sorriso, acreditando em mim.
Mulheres! São tão ingênuas, acreditam em palavras vazias tão rápido que
chega a ser vergonhoso, só basta um homem sorrir e dizer “eu te amo” que
elas ficam extasiadas. Abotoo minha camisa azul marinho, deixando o
colarinho aberto, e coloco o terno por cima. Dizer o que elas querem ouvir é
tão fácil.
— Até mais, querida! — digo despedindo-me enquanto caminho para
fora de sua casa e de sua vida. — Nos veremos em breve, linda!

É manhã de segunda-feira, e já era para eu estar trabalhando, já que


volto de minhas pequenas férias hoje. Saio da academia que tenho na minha
casa com o suor escorrendo por meu peito nu e caminho para uma chuveirada
antes de ir para a empresa. Estava nessas miniférias da Marshall Segurity
depois de quase dois anos sem tirar um descanso. Alex era um tirano filho da
puta, se nós praticamente não fugíssemos, trabalharíamos sem férias por toda
a vida.
Estou saindo do banho quando escuto meu telefone tocando:
— Isso é tudo saudade, Alex? — falo quando atendo.
— Onde você está? Pensei que já estaria a essa hora aqui. Tenho um
serviço novo para você. Me procure assim que chegar à empresa,
“senhorita”! — ele praticamente vomita as palavras, e nem dá chance para
eu dizer algo, desligando em seguida. Mas era de uma finesse que dava gosto.
Jogo meu celular na cama e vou colocar uma roupa.
Estaciono minha Harley no estacionamento do escritório da M.S. Estou
entediado com as férias, e essa ligação de Alex veio na hora certa, preciso de
ação ou vou enlouquecer. Depois de um certo tempo, com o tipo de trabalho
que deixa você com a adrenalina correndo pelo seu corpo, ficar de “molho”,
mesmo em uma praia tropical, deixa um cara como eu entediado. Tinha
chegado no sábado e saído para uma cerveja com os caras da agência, mas
tinha terminado a noite em uma boate onde conheci a loira e terminado na
cama dela.
— Bom dia, linda! — sorrio para a recepcionista que, naquele
momento, está digitando algo no computador e leva um susto quando falo
inclinando meu corpo em cima do balcão circular de mármore preto e
madeira polida.
— Bom dia, Bruno! Como foram as férias? — Lilian Benacci é a única
mulher que não consigo ter uma chance, e ela é linda. Loira com um cabelo
liso até a cintura, era muita tentação. Eu amo as loiras. Mas a verdade é que
ela é casada com o Salvatore, e o cara morre de ciúme da mulher, mas isso
não me impede de flertar com ela.
— Foi legal — dou outro sorriso com uma piscadela para ela —
Poderia ter sido melhor...
— Sua sala é na recepção, Ross? — viro para o dono da voz nada
amigável atrás de mim.
— O que posso fazer, a recepção dessa empresa me cativa — replico e
levanto minhas mãos — Mas estou indo.
— Babaca pomposo — Salvatore resmunga, e sigo meu caminho para a
sala de Alexander. O cara não parece trabalhar mais, a vida dele agora era
viver para Lana. Nojento isso! Era meloso demais para meu gosto, penso com
um meneio de cabeça. Se o cara tinha total acesso a mulher, por que inventar
de casar e estragar as coisas? Não entendo isso. Antes que pergunte, não
tenho trauma, sou simplesmente do lema “ame e as deixe”.
Bato na porta de Alex, mas não espero resposta, abro e dou de cara com
Alexander e outro homem na sala.
— Ah, enfim — Alex diz, me apontando — Pensei que não chegaria
nunca, Bruno.
— Homem, melhor disfarçar essa ansiedade em me ver, pode dar outra
impressão às pessoas — debocho, sentando na outra cadeira em frente à mesa
e ao lado do cara que não conheço.
— Mathews, este é Bruno Ross, ele que pretendo disponibilizar para a
segurança de sua irmã — ele continua como se eu não tivesse falado, me
apresentando em seguida — Bruno, Mathews Novais.
Aperto a mão dele, e nas horas seguintes fico a par do porquê Mathews
estar contratando um segurança para sua irmã.
Alicia Duran!
2
Bruno
Espero o melhor para minha irmã — diz Mathews Novais para
Alexander. Não gosto do que ele insinua, eu posso ter vários defeitos, mas
faço meu trabalho com competência. Lanço um olhar desdenhoso para Alex,
porém ele me ignora.
— Claro que irei disponibilizar os melhores — garante Alex — Bruno
assumirá tudo que diz respeito a isso, e pode tratar diretamente com ele —
estava me sentido um garoto naquela conversa.
— Bom, espero você lá amanhã, onde minha irmã está morando agora
— ele diz que ela mora em um novo edifício, em fase final de construção, e
fico intrigado como ele quer manter a irmã segura e a coloca em um lugar
mal habitado. Bem, mas ela ainda não está sob minha responsabilidade.

***

Como fiquei sabendo que a irmã de Mathews Novais estava morando


em um apartamento em construção, resolvi aparecer mais cedo hoje. E fico
imaginando como as pessoas são tão burras com relação a sua própria
segurança. Isso é pedir para morrer. Irei mostrar a eles que entrar nesse
prédio é tão fácil como tirar um pirulito de uma criancinha de seis meses de
idade.
Estaciono meu Jeep na frente do edifício e olho ao redor. Qualquer
idiota entraria ali sem nem precisar se preocupar muito em ser visto.
Caminho tranquilamente para dentro, passo por trabalhadores que estão
ocupados no térreo, onde será o saguão do prédio, e vou até o elevador.
Entro, acionando a cobertura, e até agora nem uma alma viva me interceptou.
Desço no último andar, onde existem dois apartamentos, e um ainda não está
totalmente pronto. Pelo visto, o outro que parece habitável deve ser onde
mora Alicia Duran.
Eu tinha marcado com Mathews hoje, só que resolvi vir mais cedo,
para ter uma ideia de onde sua irmã vive e como era a segurança. E até agora
nada aqui me agrada.
Toco a campainha e espero, para pouco depois ver a porta ser aberta e
revelar uma mulher... caramba!
Olho para o seu rosto, e não tenho e nunca terei palavras suficientes
para descrever a beleza dela. Raramente olho muito para mulheres morenas,
tenho preferência por loiras, isso todo mundo sabe, mas Alicia Duran tem um
rosto de beleza radiante. Seus olhos não são nem azuis nem verdes, mas são
lindos, e seus cabelos pretos brilhantes parecem macios, e tenho a súbita
vontade de correr meus dedos por eles. Sem falar no porte altivo e elegante
dela. Registro isso em menos de trinta segundos. Essa não será nenhum
sacrifício proteger...
— Matt, pensei que... — ela deixa escapar, antes de perceber seu erro.
Ela tem uma voz deliciosamente rouca e sensual.
Ela fica paralisada na minha frente, e vejo com perspicácia o momento
que ela começa a cogitar que eu poderia ser uma ameaça. Começa a se afastar
para trás e tenta fechar a porta, no entanto, planto minha palma na mesma,
impedindo que ela feche a porta na minha cara. — Quem é você?
— Com certeza não sou um assassino em potencial, ou você estaria
morta agora, senhora... — deixo a frase no ar, esperando que ela se apresente.
Como ela continua me olhando de olhos arregalados, com provável medo,
prossigo: — Bruno Ross, seu segurança!
Estendo minha mão para cumprimentá-la, ela ignora e recua para
dentro e força a porta, que ainda segura para me impedir de entrar.
Claramente ela perde o medo, porque surpreendentemente tenta chutar
minhas bolas ao mesmo tempo que tenta fechar a porta mais uma vez, mas
estou ligado e desvio a tempo de ser atingido. Escuto o som do elevador
chegando no andar e a voz de um homem.
— Vejo que já conheceu a Alicia — olho para trás e vejo Novais vindo
do elevador — Você está adiantado.
— Vim sondar o ambiente, e devo dizer que sua irmã poderia estar
morta agora — olho para ela — Se eu fosse um assassino em potencial.
— Bem, mas não estou — ela agora estava com o queixo erguido em
desafio para mim — Vamos ficar aqui na porta? — ela parece chateada.
Quando adentramos o apartamento, verifico ao redor. A decoração era
elegante, realmente feita para impressionar clientes, o piso de linóleo dava
para uma sala de estar ricamente decorada. Entretanto, não me atenho a isso.
Olho para a janela, do chão ao teto de vidro, e sei que uma bala pode
atravessar facilmente dependendo do calibre, e balanço minha cabeça em
desaprovação: esse lugar não é nada seguro.
— Esse vidro é blindado, Novais? — pergunto e vou até lá. Olho
através do vidro, percebendo que um atirador de elite do prédio do outro lado
pode muito bem acertar um alvo aqui nessa sala — Eu me pergunto se é sorte
sua irmã estar viva ou se os bandidos que estão atrás dela não pensam muito?
— bato com os nós dos dedos no vidro — Isso aqui? É o mesmo que colocar
uma placa com um alvo em seu peito.
— Não tinha pensando nisso — Novais diz — Sugeri para a Alicia
ficar aqui...
— Não é só isso, entrei aqui sem ser abordado por ninguém, estão
sendo incipientes com a segurança — olho firme para ele — Se eu pude
entrar facilmente, qualquer um poderia tê-lo feito.
— Se não notaram, senhores, estou bem aqui também. Não falem de
mim como se não estivesse presente — volto-me para Alicia Duran e franzo
meu cenho. Onde foi parar a mulher de olhar amedrontado de cinco minutos
atrás? Essa aqui estava soltando fogo pelos olhos. Analiso-a mais uma vez.
Era muito bonita e estava furiosa, dessa forma ficava ainda mais linda!
Dou um sorriso charmoso para ela, mas não surte efeito nenhum. Ao
contrário, ela levanta uma sobrancelha com o olhar nada agradável.
— Eu sugiro que deva procurar outro lugar para morar — falo para ela
— A facilidade que entrei aqui é assombrosa. Terá de ser mais cuidadosa no
futuro, senhora Duran.
— Sempre sou cuidadosa, senhor Ross — ela indica os sofás de couro
branco — Por que não senta e nos conta como o senhor pode me manter
segura com sua grande sabedoria?
Ela estava por acaso caçoando de mim? Ela era azeda demais para meu
gosto. Deve chupar limão pela manhã, mas dou um desconto, afinal, está
viúva há pouco tempo.
— Sente, Ross — Mathews interfere.
Alicia
— Mais um, Marcos? — inacreditável como as pessoas não sabem
separar as coisas — Desse jeito, vamos fechar as portas em breve.
— Os Di Cavalcanti são ótimos parceiros de negócios — meu gerente
diz do outro lado — Perdê-los irá levar outros com eles, você tem de estar
preparada, Alicia.
Meus clientes estavam me deixando preocupada. Sim, eu tenho de estar
preparada para ir à bancarrota? Não, essa não sou eu.
Se tiver que ir a cada cliente e conversar pessoalmente com eles, irei.
Farei isso a partir de amanhã, não vou deixar minha empresa falir por causa
de atos que não são meus.
Despeço-me de Marcos, pedindo que ele marque reunião com quem
não desmarcou ainda e começo a dar meus próprios telefonemas.
Fico parada por um bom momento, pensando no por que Evan nunca
me falou de seus problemas financeiros. Como um casamento se torna tão
vazio que os cônjuges não conhecem um ao outro? Onde ele colocou todo
dinheiro desviado?
Uma lágrima solitária desce pelo meu rosto. Sua traição me magoa
como nunca. Sinto-me culpada por pensar isso de uma pessoa morta, mas ele
não tinha o direito de fazer isso com nossas vidas. Ele estava morto, e eu
poderia ser a próxima vítima de sua falta de caráter. Ele trabalhava com
aplicações na bolsa de valores, ganhava razoavelmente, não havia
necessidade de enganar seus clientes. Empurro os pensamentos desagradáveis
para o fundo da minha mente e volto para o que realmente importa: sair dessa
enrascada em que estou metida.
Escuto a campainha tocar e olho o relógio. Droga, queria terminar uns
telefonemas antes de ter a reunião com Matt e o segurança que vai ficar aqui
comigo. Enquanto caminho para abrir a porta, meus pensamentos distraídos
na situação precária do meu negócio, não noto que nem olhei no olho mágico
quem está lá fora.
Não penso quando escancaro a porta e dou de cara com um
desconhecido. Gaguejo alguma coisa incoerente para mim e tento fechar a
porta, quando dou conta da minha estupidez. Que droga que eu fiz aqui?
Expondo-me ao perigo dessa forma? Esse homem pode ser um assassino.
Não me lembro de tê-lo visto aquela noite, lembraria com certeza. Ele é belo,
mas a beleza pode esconder os piores monstros.
Meu coração começa a bater acelerado e tento controlar o pânico.
Ele está falando qualquer coisa e avança para perto de mim. Meu
instinto de autopreservação retorna e recuo, tento acertá-lo nas bolas, no
entanto, o estranho está prevenido e desvia facilmente do meu joelho. Oh,
Deus, será meu fim? Minha mente explode de aflição.
— Vejo que já conheceu a Alicia — escuto a voz do meu irmão e
relaxo. Quem é ele, afinal? — Você está adiantado.
Vejo Matt cumprimentá-lo e percebo que ele é provavelmente o
segurança. Ele é alto e forte, com vastos cabelos negros e lisos caindo na
testa. Está vestido com um terno cinza e não tem nada que me faça lembrar
um guarda-costas. Seus olhos são reprovadores quando começa uma ladainha
sobre a segurança do prédio. Ele deu-me um susto por nada?
Ele entra na minha casa e começa a apontar as falhas de segurança, e
isso me tira do sério. Se eu fosse especialista em segurança, não teríamos
contratado uma empresa. Quem ele pensa que é? Ele e Matt estão falando de
mim como se eu fosse invisível.
— Se não notaram, senhores, estou bem aqui também. Não falem de
mim como não estivesse presente — digo jocosa. Estou realmente chateada
com essa atitude de senhor que tudo sabe.
Ele sorri para mim, mas dou a ele meu olhar de professora sisuda. Mas
ele continua ostentando o sorriso, agora um tanto malicioso. Sério?
— Eu sugiro que deva procurar outro lugar para morar — ele fala — A
facilidade que entrei aqui é assombrosa. Terá de ser mais cuidadosa no
futuro, senhora Duran.
— Sempre sou cuidadosa, senhor Ross — olho-o severa e aponto para
sentarmos — Por que não senta e nos conta como o senhor pode me manter
segura com sua grande sabedoria?
— Sente, Ross — Mathews aponta o sofá, ele está com a sombra de um
sorriso, deve estar achando engraçado meu mau humor. Eu nem sempre sou
ácida com as pessoas, mas esse segurança é... é ...ridículo. Ele está olhando
para mim com ar de deboche quando vai até a poltrona ao lado do sofá e
senta. Ele abre a frente do terno e dá um vislumbre do peito amplo por baixo
da camisa azul clara que só faz enfatizar seus olhos azuis. Eu não estou
admirando, só apontando um fato, digo para mim mesma.
Não quero um segurança, ainda mais um que tenha de viver vinte e
quatros horas dentro da minha casa. Viver com uma pessoa desconhecida era,
no mínimo, desconfortável. Estou quase mudando de ideia e indo ficar com
Mathews. Este homem de imediato passava a impressão de arrogância, ego
alterado e confiante. Incomoda-me sobremaneira.
— Então vamos falar do que interessa: meu motivo de estar aqui,
senhora Duran — ele começa. — Fale-me de sua rotina diária para que eu
possa planejar sua segurança.
Começo dizendo para ele do meu trabalho com eventos e vejo quando
levanta as sobrancelhas e me interrompe:
— Seria prudente dar um tempo nesses eventos. — diz ele. Aponta
para meu apartamento e continua: — Eu pensei que esse lugar fosse seguro,
porém vejo que não. Senhora Duran, deve perceber que está em um lugar
onde tem várias pessoas desconhecidas, é o lugar propício para um ataque
bem-sucedido. Sugiro que dê um tempo em participar dessas festas.
— Como é? Não vou abrir mão do meu trabalho, senhor Ross! — digo
furiosa — Essa é sua brilhante ideia sobre segurança? Sério?! Estou
assombrada com sua incrível e distinta inteligência. Desse jeito, qualquer um
idiota pode ser um guarda-costas...
— Alicia... — a voz de Matt vem cheia de reprimenda — Ele pode ter
razão. Isso é ariscado, não tinha pensado nessa possibilidade.
— Matt, não vou deixar de atender meus eventos porque ele — sinalizo
o segurança, que mantém a mão debaixo do queixo e olha-me com ironia —
Não se garante como profissional.
— Chega, Alicia! — Matt volta a falar — Desculpe minha irmã, Ross,
tem sido muitas coisas acontecendo ultimamente...
— Não se desculpe por mim — lanço um olhar firme para Matt —
Então, senhor Ross, continue.
— Quando você parar de falar, quem sabe. — ele olha dentro dos meus
olhos. Que insolente! — Posso dar conta do meu trabalho e da senhora com
as mãos amarradas nas costas.
Quanta arrogância. O que diabos ele quis dizer sobre dar conta de mim?
Ouço o riso de Matt antes de ele abafar com a mão. Virei motivo de
riso ou o quê?
Sustento seu olhar afiado, não dando para ele a satisfação de desviar
meu olhar do dele. Pense outra vez!
— Bem, podemos continuar? — ele pergunta quando desvia seu olhar
do meu. Incrível, eu não sabia que tinha esse temperamento exacerbado.
Sempre fui tão centrada e serena, mas cinco minutos com aquele homem na
sala e eu me surpreendi comigo mesma.
A contragosto falo da minha rotina diária, que consiste em ir para o
escritório da Duran Festas & Eventos na parte da manhã, onde fico
trabalhando a parte burocrática à tarde, e à noite, quando tem eventos
agendado, estou sempre onde será a festa. Nunca fico em um mesmo lugar.
— Isso é péssimo! — resmunga ele — Quero sua agenda, senhora
Duran. Antes de qualquer evento, preciso saber com antecedência para tomar
as devidas providencias quanto à segurança do local.
— Coopere, por favor, Ali — diz Matt, que tinha se mantido calado,
observando nós dois com curiosidade. — Lembre-se que isso é por pouco
tempo.
— Será uma eternidade, Matt — resmungo.
— Espero que tenha seu quarto de hóspede arejado, senhora Duran —
Bruno fala com voz grave —Irei acampar aqui com você, até que seus
perseguidores estejam presos.
— O senhor pode muito bem dormir no corredor lá fora — será que ele
pegou a dica?
Ele explode em uma gargalhada.
— Mathews, sua irmã faz bem para meu ego — ele para de rir e fica
sério quando se dirige a mim — Por que não me mostra seu apartamento,
senhora? Mal posso esperar para conhecer meu novo lar.
Prevejo que essa ideia de segurança vai tirar meu sono! Penso
enquanto mostro o apartamento para ele.
3
Bruno
Enquanto Alicia me mostra o apartamento, faço anotações mentais do
quanto impraticável seria ficar aqui. Se todo o empreendimento estivesse
pronto, sim, eu aprovaria. Esse lugar era amplo e confortável com vistas
espetaculares, mas eu não estava confortável, e algo me dizia para sair daqui.
E eu gosto de seguir meus instintos, isso já me salvou algumas vezes.
Ontem, depois que terminamos a reunião com Novais, fui até a
delegacia de homicídio para obter informações de toda a circunstância da
morte do marido de Alicia. A polícia tinha fortes evidências que o crime não
foi contratado por profissionais, um matador de aluguel não sairia do prédio
para qualquer um ver, mesmo de madrugada, ou viria com mais duas pessoas
fazer o serviço. Intriga-me que o porteiro não viu nada. Isso era no mínimo
estranho, no entanto, meu serviço é manter Alicia segura. Algo que está se
mostrando bem desafiador, nesse pouquíssimo tempo que a conheço.
O apartamento é grande e arejado, mas acho que grande demais para
uma pessoa só. Estou pensando, quando volto para a sala, em levar Dona
Senhora Independente para meu apartamento, pelo menos enquanto durar
essa ameaça contra ela. Aqui tem todo um sistema de segurança falho.
Enquanto não for organizado, ela pode ficar comigo.
Mas isso será provavelmente mais um motivo para ela não gostar de
mim, menos do que já gosta, pelo visto. Estava acostumando com mulheres
sempre se rendendo ao meu charme, no entanto, Alicia Duran mostrava que
não ia muito com minha cara.
— Novais, posso falar com você um momento? — pergunto quando
volto para sala, onde o irmão de Alicia está ao celular. Preciso colocar isso
em ação, não tenho tempo a perder aqui.
— Senhor Ross, o que tem a falar com meu irmão pode ser dito para
mim — Alicia está falando quando para do meu lado.
— Você saberá, senhora Duran — Novais desliga o telefone e vem
sentar onde estávamos antes — Bem, eu acredito que você quer o melhor
para que sua irmã se mantenha viva. Sugiro que ela se mude para outro lugar,
um que tenha um sistema de segurança funcional, aqui é impraticável. Ou até
que seja instalado um sistema aqui, coisa que levará um tempinho.
— Senhor Ross, e onde acha que devo ficar? Um hotel? Acha que será
melhor que aqui? — Alicia questiona, lívida, e por um momento ela deixa
transparecer fragilidade, mas no momento seguinte já não está mais ali.
— Normalmente não faço esse tipo de sugestão, mas se não tiver outro
lugar que tenha um forte sistema de segurança... — dou uma pausa e olho
seus incríveis olhos esverdeados — Minha casa será o lugar ideal para que
você passe um tempo, enquanto vejo com seu irmão para que uma equipe
instale neste prédio um sistema melhor, já que até onde vi, nada foi feito
nesse sentido ainda.
— Nem vou considerar essa sugestão, senhor Ross, sinceramente —
Ela levanta e sai da sala, mas vira-se para nós antes de sair — Matt, estou
indo ficar com você. Não demoro muito!
Ela sai deixando o silêncio entre nós e o clima nada agradável
— Qual a razão para sua irmã estar aqui? Vocês dois não pensam? —
eu digo para Novais —Por que diabos você não a colocou em um lugar
seguro? Aqui não acho que seja um lugar adequado.
— Nossa lógica é que aqui seria o último lugar que alguém a procuraria
— ele diz, e tenho vontade de rir —Bem, vamos providenciar os
equipamentos de segurança já. Acho que com um pouco mais de empenho
consigo isso instalado em três dias.
— Só se você contratar um batalhão de técnicos, esse prédio é enorme
— digo. Isso não ficará pronto em menos de uma semana — Até que posso
ficar aqui, mas irei arriscar a vida dela, e sei que você não quer isso. Como
irei monitorar quem entra e quem sai daqui se não tiver sistema de câmeras
instalado e funcionando? Não, prefiro não arriscar. Garanto que a minha casa
é melhor que aqui.
— Não conhece minha irmã, Ross, ela não irá — ele diz.
— Deixe-me falar com ela — digo.
— Bom, se você acha que consegue, tudo bem. — ele levanta e estende
a mão, despedindo-se de mim — Vou deixar meu bem mais precioso em suas
mãos, é bom que tome conta dela direito. — diz enquanto aperta minha mão.
— Antes de ir... — começo — Sua irmã recebeu alguma ameaça real
ou são só conjecturas da policia?
— Fomos aconselhados para tomarmos providências quanto à sua
segurança, já que ela viu os assassinos saindo do prédio — ele diz — Mas até
agora Alicia não recebeu nenhuma ameaça velada, mas não quero dar chance
ao acaso.
— Certo, isso torna meu serviço bem mais complicado — faço uma
careta de desgosto — Pessoas que acham que não estão correndo um perigo
real tornam-se imprudentes e isso leva a erros trágicos, e não quero correr
riscos desnecessários.
— Mantenha-me informado do que decidirem — Mathews diz.
— Claro que sim.
Ele sai logo depois sem se despedir de Alicia, e tenho o pressentimento
de que ela vai surtar em me ver aqui. Sorrio para mim mesmo quando sento e
espero.
Cerca de dez minutos passam e nada de Alicia aparecer com as malas
que ela disse que iria fazer. Falta-me paciência para esperar e vou atrás dela.
Trabalhar de segurança de Alicia não ia ser fácil. A mulher era intragável.
Mas linda pra caralho! E isso era um bônus, não é? Eu sei que ela acabou de
perder o marido, não pensará em outro homem agora, mas posso sonhar, não
é mesmo? Caramba, ela nem faz meu tipo loira, magra e porra louca.
Eu posso tentá-la, fazê-la desejar outra vez. Faz tempo que não tenho
um verdadeiro desafio de ter uma mulher, elas vêm fáceis para mim. Aliás, eu
nunca tive um desafio, para falar a verdade. Mulher gosta de homem que não
se apega a nenhuma pelo simples desafio de fazer aquilo que outra não fez,
que é amarrar o coitado despreparado. Bem, enquanto elas tentam me pegar,
eu aproveito isso da melhor maneira possível: fodendo todas!
Percorro um corredor onde antes tinha visto com ela e caminho para o
quarto principal, o qual foi o único que ela não me mostrou. Chego até a
porta que se encontra fechada e bato suavemente. Não obtendo resposta,
depois de algum tempo, forço a maçaneta e entreabro para que eu coloque
minha cabeça dentro do quarto. E não estou preparado para ver uma Alicia
Duran deitada na cama de bruços e seus ombros delicados convulsionando
pelo choro silencioso. Merda!
Não sei o que fazer, não sei se entro ou se dou meia-volta e volto para a
sala, de onde não deveria ter saído. Mas meu lado cavalheiro venceu. Mesmo
que meus instintos de autopreservação estivessem em alerta total, afirmando
que era um erro me aproximar e, ainda mais, de uma mulher desconhecida
que nem gostava de mim.
Sento na ponta do colchão e levo minha mão para seu ombro. Ela ainda
não se mexeu de sua posição, com o rosto enfiado no colchão
— Você está bem, Alicia? — pergunto em voz baixa. O único sinal de
que tinha tomado consciência do meu toque foi seu corpo enrijecido e tenso.
Alicia
Entro no meu quarto, e em vez de fazer as malas como prometi para
Matt, caio na minha cama e sinto que minhas forças estão se esvaindo do meu
corpo. Estou perdendo a compostura quando fui tão forte até agora. Toda essa
sensação de insegurança começa a pesar sobre mim.
— Foda-se, Evan! Você não podia ter feito isso com nossas vidas. —
falo em voz alta, mas sou quebrada por soluços indesejados — Como pôde
me deixar, sofrendo as consequências de suas atitudes dessa forma? —
pergunto para o vazio do meu quarto.
Meu casamento com Evan já não era mais o mesmo há quase um ano,
cada dia nos distanciávamos mais um do outro, eu não sei se ele tinha alguém
fora de casa, entretanto é o que você imagina que seu marido faz quando ele
sai tanto de casa à noite. Como meu trabalho na empresa me fazia trabalhar à
noite, isso levou a algumas brigas entre nós, ele dizia que eu já não dava
atenção para ele e nosso casamento.
Ele não entendia que eu não nasci para ser só dona de casa. Ter um
negócio lucrativo era minha meta, e isso estava acabando com meu
casamento.
Eu tinha amado Evan, sim, muito. Ele foi meu marido, afinal, mas eu
descobri que a decepção dos últimos dias tinha me feito ver que não o amava
mais tanto assim. Eu sentia sua morte, mas isso não me quebrou, até o
momento só tinha sentido mais raiva dele que outro sentimento, e isso estava
pesando demais no meu peito. Parecia que eu era fria e insensível. Eu não
quero ser essa mulher fria que eu estava mostrando. Mas quando tudo em que
você acredita desmorona aos seus pés, a única forma de se preservar é se
recolher em você mesma, e era isso que estava fazendo, me preservando de
mais decepção.
Enterrando meu rosto para baixo no colchão, tento silenciar meu choro,
não quero que Matt ou aquele homem abominável escutem meu momento de
fraqueza. Odeio perder o controle assim, ficar vulnerável, dar o controle da
minha vida a outra pessoa. Não quero essa fraqueza, porém nada que eu faça
agora impede que o choro saia em convulsões do meu corpo, parece que as
comportas da minha alma abriram-se e eu não consigo sustentar mais nada
dentro.
Por mais que tenha tentado chorar em silêncio, devo ter deixado meus
soluços chegarem ao meu irmão, porque escuto um leve bater na porta e ela
abrindo em seguida. Pouco depois sinto o colchão afundar, comprovando que
Matt veio à minha procura, no entanto não me movo do lugar.
Mas choque atravessa meu corpo quando sinto alguém tocar meu
ombro e sei que não é Matt, e logo após a voz confirma.
— Você está bem? — ele pergunta, e todas as células do meu corpo
enrijecem e fico dura no lugar, enquanto tento me recompor. O que ele fazia
ali no meu quarto? Ele enlouqueceu?
Levanto, saindo da inércia que me encontrava, e travo meu olhar no
dele, azul claro e hipnótico.
— O que faz aqui, cadê o Matt? — digo levantando da cama, limpando
o rosto com minhas mãos trêmulas, e espero uma resposta.
— Acalme-se, Alicia — ele também levanta e para à minha frente —
Por que não vamos para a sala onde podemos conversar? Eu adoro conversar
na cama, mas tenho certeza que você prefere o sofá a cama.
Esse homem por acaso leva algo a sério? Ele estava flertando comigo?
Era isso?
— Prefiro que você saia já do meu quarto, não te dei permissão para
entrar aqui. — minha fragilidade de antes tinha evaporado com a presença
dele.
— Bem, seu irmão tinha algo para resolver e deixou-me para conversar
com você — ele diz, sério.
Caminho para fora do quarto, e ele segue com uma risadinha
debochada que estou começando a odiar cada vez que o escuto fazer isso.
Deus, eu tinha vontade de socá-lo.
— Bem, aqui estamos. Diga o que tem de falar, senhor Ross, e saia —
eu começo quando chegamos à sala — Não sei por que meu irmão confia em
você, porque eu ainda não faço isso.
— Sente-se, Alicia — ele diz duro, sua voz empostada e grave faz
minhas pernas dobrarem mesmo sem querer. — Assim é bem melhor.
Ele senta na minha frente e olha duro em meus olhos quando fala:
— Sei que você está passando por momentos difíceis, senhora Duran,
mas quero lhe manter segura, e este apartamento não é seguro agora. Então,
aconselho que deixe sua má vontade comigo e pense com clareza: não é para
meu bem-estar que quero que vá para outro lugar. Meu apartamento foi só
uma sugestão. Quer ficar com seu irmão? Isso é uma prerrogativa sua, mas
seja sensata.
— E esse discurso é para qual finalidade, Sr. Ross? — digo — Não
quero sair da minha casa.
— Isso não irá levar muito tempo — ele inclina-se para frente,
apoiando os cotovelos nas coxas — Não seja infantil, Alicia. Não precisa
gostar de mim, só confiar.
Eu rio, rio forte, uma risada amarga tão estranha para mim quanto deve
estar sendo para ele. Confiar? Nele? Bem difícil isso. Eu não confiaria em
nenhum outro homem depois de Evan, não poria o controle da minha vida
nas mãos de outros. De maneira nenhuma.
— Confiar no senhor? Acho que está pedindo muito — levanto e
começo a andar para cima e para baixo na sala, enquanto ele me assiste de
testa franzida.
— Não deixe seu irmão preocupado com você mais do que ele já está,
Alicia — ele argumenta. E deve saber meu ponto fraco, porque ele continua
com voz macia: — Ele foi embora porque confia em mim para cuidar de
você.
— Por que quer ir para seu apartamento? — pergunto desconfiada. —
É lá que amarra suas vítimas e as mata? Por que você pode ser um psicopata
disfarçado, senhor Ross.
— Sou, nas horas vagas. — ele realmente está flertando comigo
— Está bem, irei ficar com o senhor, mas espero que não seja por
muito tempo — digo, mas sei que posso me meter em encrenca com essa
minha decisão. — Mas quero deixar claro que não irei deixar meu trabalho,
senhor Ross. Tenho pessoas que dependem de mim, não deixarei meus
funcionários sem trabalho. Eu vou onde tiver de ir para que me mantenha
viva, mas também não deixarei que isso dite totalmente minha vida.
Ele assente, e vejo que não é exatamente como ele queria, mas se estou
abrindo uma exceção, ele também pode.
— Irei tomar as devidas providências e estará de volta aqui o mais
rápido possível — ele diz e começa a discar no celular — Por que não vai
fazer suas malas? — ele sugere e começa a falar com a pessoa do outro lado.
Eu fico parada olhando para o espécime masculino na minha sala e
meneio a cabeça caminhando de volta para meu quarto. Acho que estou em
apuros, e nada tem a ver com os inimigos de Evan.
4
Alicia
Faço minha mala para no máximo dois dias, não tenho intenção de
ficar mais tempo que isso. Pego uma frasqueira com artigos de higiene
pessoal e arrumo tudo rapidamente, indo para sala em seguida, onde meu
segurança late ordens ao telefone. Fico em pé à espera que ele termine e o
observo atentamente.
O homem era muito bonito. Aqueles vastos cabelos negros caindo na
testa e incríveis olhos azuis, além do fato que debaixo daquele terno dava a
entender que seu corpo não era nada flácido e ele era alto, devia ter uns vinte
centímetros mais que eu, e não sou tão baixa assim, estou dentro do patrão,
mas sinto-me pequena ao lado dele. O aperto na minha barriga ao olhá-lo está
causando sérios danos na minha paz de espírito, e só o conheci há algumas
horas, isso era demais. Parecia que estive morando numa ilha deserta há mil
anos.
Tome jeito, Alicia. Isso não combina com você.
Vejo que ele parou de falar e está com uma sobrancelha levantada
zombeteiramente para mim. Acho que fui pega observando, mas o encaro
desdenhosa, fazendo-o dar um meio sorriso e caminhar para mim.
— Só levará isso? — pergunta apontando minha pequena mala ao meu
lado — Pensei que levaria todo o dia para você preparar sua mala.
— Esse deve ser mais um dos enganos de sua parte no que diz respeito
à minha pessoa, senhor Ross — eu não pude evitar. — O senhor está pronto?
— Muito... — ele sugere, fazendo meu rosto esquentar — E me chame
de Bruno, esse senhor Ross está me deixando louco. Odeio essa formalidade
exacerbada. — ele diz baixo em seguida: — Mulher enervante, empertigada.
— Prefiro senhor Ross — faço que não escuto a última parte. Sim, isso
serviria como uma barreira, já basta estar morando com ele na mesma casa, e
eu o conheci a o que, minutos atrás? Coisa maluca essa. Como Matt pode
confiar em uma pessoa que acabamos de conhecer? E ainda me deixar
sozinha com ele aqui. — Então... eu quero ir antes ao meu escritório, senhor
Ross.
— Antes, vamos acomodar você na minha casa — ele diz categórico —
Tudo ao seu tempo, querida!
Que Deus me ajude, estou fortemente tentada a acertar esse homem
com meu punho. Está decido: irei me matricular em uma academia para
praticar Muay thai. Antes que isso acabe, eu o tenho nocauteado.
Saímos do apartamento e, depois de descer do elevador, seguimos para
a entrada do prédio, onde Bruno segura meu braço causando um frisson, que
se origina onde ele está segurando e se propaga para outras partes de mim.
Olho de olhos arregalados para onde ele segura, mas não tenho tempo de
falar nada, pois ele está falando.
— Fique aqui, vou pegar o carro e trazer o mais próximo possível —
esse é mais paranoico do que imaginei. Fico parada lá enquanto ele sai.
Observo quando um carro para bem em frente à entrada pouco depois, e
Bruno desce de dentro olhando ao redor como uma ave de rapina.
— Tudo limpo, madame — diz quando se aproxima de mim outra vez e
pega minha mala.

***

Bruno mora em um apartamento amplo e arejado, que me surpreende


pelo ambiente agradável para um homem solteiro. Quer dizer, eu deduzo que
seja solteiro, que homem levaria uma mulher para sua casa se houvesse uma
esposa lá? Eu não permitiria que meu marido tivesse esse tipo de
comportamento, se por acaso eu fosse esposa de um homem desses com uma
profissão que levava a tanta intimidade. E me surpreendo ainda mais por
haver uma parede de vidro.
Ele me tira da minha casa por causa de uma janela de vidro quando o
apartamento dele tem uma parede?
— Senhor Ross, por que me tirou da minha casa e me trouxe aqui se
sua sala tem uma parede de vidro? — digo furiosa — Estou tentada a
acreditar que me trouxe aqui por razões nada cabíveis a...
— Precisaria de uma bomba atômica para quebrar essa parede, Alicia, e
aqui ninguém irá se meter comigo — ele corta meu discurso — Vamos.
Ele me conduz para um quarto de hóspedes em tons pastéis com
mobília clara e confortável, tudo muito bem limpo ao redor, coisa que
agradeço. Odiaria ficar na casa de um homem bagunceiro. A cama ampla está
forrada com lençóis negros e vermelhos de seda, contrastando com o
ambiente claro das paredes e resto dos móveis.
— Espero que aqui seja agradável e que sua estadia na minha
residência, senhora Duran, seja confortável — ele murmura enquanto
deposita minha mala ao lado da cama.
— Obrigada — eu sinceramente nem sei por que estou agradecendo.
— Vou deixá-la agora, fique à vontade. Temos todo o tempo do
mundo. Depois venha que lhe mostrarei e darei um tour pelo meu
apartamento — ele ri e caminha para fora do quarto, me deixando lá em pé
como uma idiota pela segunda vez no dia.
Bruno
Saio com um sorriso do quarto de hóspede, onde deixei a senhora
empertigada. A mulher era certinha demais para o meu gosto. Eu não consigo
parar minha mente de imaginar se ela continua toda composta quando faz
sexo suado. Pelo jeito, ela nem sabia o que era isso. Deve ficar lá contando
quantos convidados haverá em suas festas e qual cor será a decoração durante
todo o ato. Quando chego à cozinha, estou rindo forte com a imagem
dançando na minha mente. Estou ferrado com ela aqui, vai ser muita tentação
para não investir com tudo para cima da viuvinha empertigada do caralho! Eu
poderia levá-la a outro local seguro, mas trazer ela para cá, foi apenas para
irritar a moça.
Sinto arrepios de excitação quando a imagino debaixo de mim, toda
vermelha e descomposta. Estou correndo o risco de morrer de inanição de
buc...
— O senhor pode me levar agora, senhor Ross? — diz uma voz
feminina atrás de mim. Se não fosse treinado, teria dado um pulo de susto ao
ser pego fantasiando em plena cozinha com a dona da voz. Limpo minha
garganta e continuo sem virar para ela, já que ela provavelmente veria minha
calça com uma tenda digna de um rei beduíno.
Nem sei se tem rei beduíno, mas terá a partir de agora. A tenda da
minha calça daria para sua família inteira morar debaixo.
— Por que não almoçamos, Alicia? — viro minha cabeça, vendo-a
parada no limiar da porta. — Relaxe, seu escritório vai continuar lá.
— Senhor Ross, eu disse que viria aqui com a condição de que não
deixaria meu trabalho negligenciado. Então, eu agradeceria muito se me
levasse para lá — diz, seus olhos soltando faíscas de raiva. Dou um sorriso e
caminho para preparar meu almoço, que será muito demorado hoje. Tenho
minhas habilidades culinárias e irei usar todo meu arsenal. Alicia Duran fazia
o diabinho no meu ombro pular de entusiasmo, vê-la perder essa frieza dela
estava tornando-se uma missão.
— O que quer para o almoço, minha querida? — escuto o bufo de raiva
dela e suas pisadas duras para fora da cozinha. Não tenho o mínimo receio
que ela saia sozinha daqui. Meu apartamento só abre as portas com minha
digital, e se eu não cadastrasse a dela no sistema, ela nunca abriria a porta.
Por isso continuo na cozinha, tranquilo.
Duas horas depois, estou parando meu carro defronte um prédio
comercial e observo o local. Pedi para Alexander mandar técnicos para o
escritório de Alicia para instalar equipamentos de vigilância, onde seria
monitorado a partir da central da nossa empresa. Esse prédio e o dela, afinal,
são péssimos, cheios de ponto cego.

***

— Matt, eu quero sair dessa casa o quanto antes — escuto a voz de


Alicia ao telefone quando caminho para a sala, dois dias depois que ela veio
ficar aqui em casa. Estou prestes a entrar na sala quando ela continua: — Eu
prefiro qualquer outro segurança. Esse que você escolheu tem o péssimo
hábito de andar pela casa nu, completamente! — tenho vontade de rir alto,
mas ela não terminou — Ele acha que é um presente de Deus para as
mulheres! Não, mas ele... é arrogante, pretensioso... Onde você foi arrumar
esse?
Escoro meu ombro no umbral da porta e a observo sentada no sofá. São
seis horas da manhã, e a maldita mulher já está de pé. Isso depois de
encontrá-la de madrugada acordada, e eu nu...
Eu não durmo com porra de pijama nenhum, nada melhor que sentir os
lençóis frescos na pele, e esqueci completamente que meu trabalho estava
dormindo na mesma casa e que ela poderia estar acordada.
Eu levantei de madrugada e segui para a cozinha para beber alguma
coisa, depois de tentar dormir em vão, para deparar com uma Alicia de olhos
arregalados na minha cozinha. O copo que ela tinha na mão se espatifou no
chão quanto ela soltou um grito malditamente alto e virou as costas para
mim. Porra, ela por acaso era virgem, nunca tinha visto um homem nu antes?
Isso só serviu para eu ficar excitado com a visão dela num micro short e uma
regatinha que nada deixava para minha imaginação.
— Ah! Também não conseguiu dormir? — disse enquanto seguia meu
caminho para a geladeira. Ela continuou de costas para mim.
— Com licença, limparei tudo amanhã — ela diz enquanto caminha
para fora da cozinha como o diabo foge da cruz. Eu percebi que, desde que a
conheci, mantenho um sorriso nos lábios. Quando voltei para o quarto, depois
de limpar os cacos de vidros no chão, não escutei nada no quarto de hóspede.
Pena, adoraria atormentá-la mais um pouco.
Agora ela estava na sala, falando de mim para seu irmão. Porra de tesão
de merda por uma mulher que nem gostava de mim! Não estou acostumado a
isso, sempre foi o contrário, elas vinham fáceis, e sei que com Alicia a coisa é
diferente. Pela primeira vez tenho receio de abordar uma mulher diretamente.
Sou mesmo um crápula, ela acabou de enviuvar e já estou pensando em jogá-
la sobre a primeira superfície plana que encontrar e fodê-la como nunca foi
antes. Merda!
Devo ter deixando escapar um gemido, porque ela virou a cabeça em
minha direção e, pela segunda vez, vejo os olhos dela terrivelmente grandes
na porra do rosto de anjo que ela tem, olhando para minhas calças.
— Falo com você depois — ela fala para seu interlocutor — Sim, vou
ficar bem. Só é demais... Também amo você, querido.
Descolo meu ombro da parede e vou para a cozinha preparar um café, e
Alicia me segue.
— Bom dia, querida! — digo cortês, e antes que ela comece uma
ladainha sobre ir embora, eu me adianto: — Quero me desculpar pelo
incidente de hoje de madrugada. — eu mentia, lamentava merda nenhuma, só
não quero seu contínuo pedido para ir àquele apartamento que não está
pronto. Que se depender de mim não ficará pronto nunca. — Você me
desculpa? Esqueci que tinha uma dama aqui. Ato que não se repetirá jamais.
Fique tranquila, que sua honra estará guardada.
Faço meu discurso para ela, que tinha se mantido calada e séria. Ela me
deixa completamente ensandecido.
— Café? — pergunto quando começo a preparar a cafeteira — Além
do péssimo hábito de andar nu, também sou viciado em cafeína — alfineto e
ela cora.
— Senhor Ross, acredito que minha casa já esteja pronta para voltar
para lá — ela diz, ignorando a última parte.
— Receio que não. De qualquer maneira, vamos permanecer juntos.
Lá, aqui, tanto faz — aponto a cadeira — Por que não senta e relaxa um
pouco? Vai criar uma úlcera de tão tensa que você vive.
— Agradeço sua preocupação — diz jocosa, mas senta. Temos um
começo — E agradeceria também que vestisse uma roupa. — aponta para
minha calça de pijama, a única concessão que abri para ela.
Ficamos em silêncio esperando o café ficar pronto, ela sentada olhando
para as mãos entrelaçadas, enquanto eu a observava encostado no balcão da
cozinha. Eventualmente, ela levantou a vista e nossos olhos se conectaram.
Ficamos nos encarando por tanto tempo, que quando a cafeteira apita
levamos um susto. Essa porra não ia prestar, eu precisava procurar uma
mulher e transar até que perdesse os miolos, só assim esqueceria certa
senhora empertigada. Eu sei quando uma mulher sente desejo por mim e
também sei quando ela luta contra isso. Alicia Duran não gosta de mim, mas
sente atração. Cara, eu estou com um sorriso idiota no rosto.
Terei de sair hoje à noite e procurar uma mulher disposta, antes que
agarre essa viuvinha gostosa pra cacete!
Alicia
Meu Deus, dai-me força!
Quando Bruno vira-se para a cafeteira, eu solto minha respiração que
tinha prendido durante o tempo que ficamos nos olhando fixamente. Deus,
acabei de perder Evan e já estou desejando outro homem? O que isso faz de
mim?
Engulo em seco quando olho para a bunda dura debaixo da calça fina
de seda que ele está usando. Meu coração troveja no meu peito quando
lembro que poucas horas antes, nesta mesma cozinha, tinha visto mais dele
do que eu realmente desejaria.
Maldito homem, andando nu em pelo! Ele tinha um problema de ereção
constante? Estou ficando com medo desse tarado em potencial.
Eu preciso ir para minha casa o quanto antes, antes que faça alguma
loucura e venha me arrepender depois. Remorso queima na minha barriga. Eu
estou de luto, que droga estou pensando aqui?
Lembro-me do que acabei de passar por causa de um homem e de o
porquê do meu casamento já não andar bem das pernas. Não era só porque eu
trabalhava fora e não dava atenção a Evan, tinha muito mais que isso
envolvido. A dor nunca acabava, mesmo quando eu tento enterrar lá no fundo
da minha mente angustiada. Envolver outro homem nisso estava fora de
cogitação.
Respirando profundamente, tento manter o foco, sair de perto da
tentação, isso sim...
5
Em um local desconhecido.

— Como anda a vigilância sobre a viúva Duran? — o homem de


terno escuro, magro e rosto ossudo, inclina-se para trás de sua poltrona e fixa
seus olhos negros no homem sentado à sua frente.
Ele era um homem de negócios acima de qualquer coisa, mesmo que
não fossem negócios lícitos, no entanto negócios são negócios em qualquer
patamar. Evan Duran era o homem que lavava seu dinheiro no mercado
financeiro legítimo, mas ele achou conveniente meter a mão no que não era
dele. Por isso pagou com a morte.
— Tenho um homem dentro da delegacia de polícia que me mantém
informado das coisas. Segundo minha fonte, ela não lembra nada concreto
daquela noite. — o outro mais jovem responde.
— O que está te impedindo de finalizar com essa pendência? Não
devemos dar chance para que ela lembre um rosto. Todos nós seremos
associados e será como um castelo de cartas, levando-nos a cair um por um.
Faça alguma coisa, antes que essa mulher abra a boca e entregue todos nós.
Não seja idiota!
— Vamos agir em breve, só não podemos cometer os erros que
cometemos antes — o mais jovem diz.
— Então, aja — diz, sua voz não deixando margem para dúvida do seu
aborrecimento.
Alicia
O que era para serem dois dias estava caminhando para uma semana.
Estou hospedada na cada de Bruno há quase uma semana! Se nós fôssemos
amigos, seria ótimo, mas não somos. Estamos mais para inimigos ferrenhos
que amigos. E eu sou uma completa desmiolada. Eu vivia inquieta e me
pegava pensando mais nele do que seria correto.
Peguei-me o observando a cada oportunidade que tinha, já que éramos
praticamente gêmeos siameses e ele vivia colado em mim dia e noite.
Levava-me à empresa e ficava lá todo o tempo que eu estava trabalhando. Me
perguntava se ele não ficava entediado de não fazer absolutamente nada,
parado em frente da minha pequena sala.
Além do fato de que não conseguia conciliar o sono em seu quarto de
hóspede, vivia dispersa em pensamentos nada adequados para nossa
condição.
Agora estou na sala de espera de um cliente que me abandonou semana
passada. Marcos tinha agendado para hoje uma reunião para que eu tentasse
reverter essas quebras de contrato constantes. Contorço-me na cadeira e aliso
minha saia preta justa. Isso estava me deixando muito preocupada.
— Senhora Duran? — uma voz feminina me tira dos meus devaneios e
volto para a realidade, onde não existem olhos azuis infernais e irreverentes
para me tentar.
Levanto meus olhos para dar com uma loira digna de uma revista
masculina e incríveis olhos violetas. Este é um dos maiores escritórios de
advogados que conheço, perder esse cliente, em particular, era um prejuízo
sem tamanho. Eu tenho que ter argumentos para convencer Danila Arantes, a
responsável pelos eventos da empresa.
Eu já tinha organizado um evento de pequeno porte aqui, este seria o
segundo e bem mais grandioso, onde teria a presença de muitos clientes em
potencial, ainda mais agora que meus antigos estão quebrando os contratos.
Se meus fornecedores estão com pé atrás, imagina um cliente em que sua
organizadora está envolvida indiretamente com falcatruas? Eu não tirava suas
razões de desconfiar de mim, ademais, eu era esposa de um homem que
roubou descaradamente seus clientes.
Essa semana tinha sido caótica, descobri que meu apartamento, que
Evan tinha comprado recentemente, não seria mais meu. Seria vendido para
reembolso de parte do dinheiro roubado. A conta dele no banco estava
congelada e não havia quase nenhum dinheiro lá, e eu corria o risco de ter
meus poucos bens confiscados para investigação. Isso estava me levando à
loucura. Inferno!
Levanto e sigo atrás da loira, que dá um sorriso artificial para mim.
Segundos depois adentro o escritório de Danila Arantes.
— Alicia Duran, como vai? — A senhora Arantes devia ter por volta
dos sessenta anos, casada com um dos sócios majoritários da Arantes &
Belga advogados Associados. Era uma mulher fina e elegante.
Cumprimento-a e sentamos em volta da mesa de reunião, onde tento
mostrar para ela que estou sendo indevidamente injustiçada e que minha
conduta como empresária e prestadora de serviços é idônea e acima de
qualquer suspeita. Que meus eventos são organizados e nunca faltei com um
compromisso. Derramo uma gama de argumentos, e três horas depois saio
mais feliz do que entrei naquela sala. Não era uma vitória, mas um começo.
Ela levaria meus argumentos para sua equipe e logo me daria uma resposta.
Para quem estava com o evento cancelado, já era uma vantagem sair de lá
com esperança de ela reconsiderar minha proposta.
Quando volto para a recepção, depois de me despedir da senhora
Arantes, encontro Bruno praticamente debruçado sobre a mesa da
recepcionista em uma conversa muito mais que particular com a senhorita
miss Califórnia. E pela cara dela, a conversa devia estar muito boa. Ela tem
um sorriso do Gato de Cheshire no rosto de Barbie dela. Paro e espero os dois
terminarem de ronronar um para o outro. Mas como não sou notada, resolvo
intervir:
— Podemos ir, senhor Ross? — digo calmamente — Se quiser ficar
aqui, fique à vontade, eu estou de saída.
Ele se vira para mim com um sorriso e aponta para eu o preceder na
saída. E vejo quando ele põe um papel ou um cartão no bolso da calça do
terno cinza chumbo que usa hoje.
— Nos vemos em breve, querida — ele acena para a Barbie Califórnia.
Prostituto!
Droga, de onde vem esse pensamento? Nem o conheço e já estou
julgando. Mas quem poderia me condenar se ele mal chegou aqui e, pelo
visto, já tem um telefone de uma mulher no bolso? Piso duro para fora da
sala, seguida por ele bem em meus calcanhares.
Nem perderia meu tempo com esse homem, não mesmo. Homem
odioso.
Bruno
Como uma mulher conseguia ser tão malditamente sexy sem nem
mesmo tentar? Eu tenho os olhos grudados no rebolado sutil de seu quadril
enquanto ela caminha altiva à minha frente. Mas que inferno! Eu preciso sair,
e tenho de dar um jeito para que isso aconteça hoje à noite, não posso ficar
em estado duríssimo constantemente por uma mulher que nem me olha
direito nos olhos.
Aquele bumbum sexy levava calor direto para minha virilha, e estava
me deixando mal-humorado. Porra, só preciso encontrar uma mulher e tudo
se resolverá. A loira gostosa da recepção era uma boa distração, tenho o
número dela e posso muito bem usá-lo hoje se eu quiser. Quem sabe não faça
isso? Só tenho de convencer Alex para mandar outro cara hoje para minha
casa. Não tenho de ficar com eterno tesão por causa de certa morena infernal.
Entretanto, nem sei o que me segura para investir todo meu charme
nela. Para ser sincero, ela me causava medo. Com um único olhar, ela faz
minha libido esfriar. Podia estar duro igual titânio, mas ela me olhava com
certo ar desdenhoso e eu perdia o tesão na hora, não importava que logo em
seguida estivesse do mesmo jeito, duro outra vez. Esse jeito professoral dela
me deixa louco.
Essa rivalidade entre nós era um afrodisíaco potente. Ajeito minha
calça apertada quando entramos no elevador, e ela mantém os olhos longe de
mim. Sentia um desejo maldito de ir até ela e desmanchar aquele cabelo
arrumadinho, essas roupas comportadas, deixá-la vermelha de excitação e
tirar um pouco da dor nesses olhos magoados que ela ostenta desde que a
conheci. Esse maldito marido morto dela era um idiota completo, fazer merda
e deixar a esposa arcando com as consequências. Inferno! Não era à toa que a
mulher era azeda!
Que Deus me ajudasse, mas eu não poderia parar de pensar em tê-la
enroscada em mim, mesmo meu subconsciente dizendo para não ir nessa
direção. Alicia Duran ia acabar comigo, sem nem mesmo tentar.
Quando saímos do elevador, percebi que ela não havia me olhado nem
uma vez no percurso.
Antes que ela saísse do prédio onde estivemos até agora, eu seguro seu
braço impedindo sua saída. Sinto o tremor do corpo e, por um momento,
quase não resisto a vontade de puxá-la para mim e beijá-la até perdermos
nossa capacidade de pensar. Só não sabia quanto tempo teria algum escrúpulo
com ela, isso nunca me impediu antes. Ter um caso com uma cliente era mais
corriqueiro que respirar.
Provavelmente levaria um tapa quando o beijo terminasse.
— Nunca saia direto para a rua, Alicia. Que mania, já falamos sobre
isso — repreendo — Quer levar um maldito tiro?
— Então seja ágil, senhor Ross, não tenho o dia todo — ela resmunga,
mas acaba acatando minhas ordens enquanto pego meu 4x4. Estou com
saudade de pilotar minha moto, mas levar dona empertigada para os lugares
numa moto não era nada viável, e ela certamente daria um chilique se fosse
andar na garupa da minha Harley.
Quando estamos acomodados no carro, resolvo começar uma conversa
com ela:
— Você está com problemas, Alicia? Tirando o fato que pode levar um
tiro? — começo. Percebi que ela está com problemas na empresa dela, mas
não fala muito disso, aliás, ela não fala muito comigo.
— Quanta delicadeza, senhor Ross, fico bem tranquila quando o senhor
fala assim — ela tem razão, estou sendo grosso propositalmente para que ela
não seja imprudente. Afinal, isso era uma realidade, por que ignorar se era
verdade?
— Não tenho problema algum, senhor Ross — ela continua. Havia uma
pressão no timbre de sua voz.
Frustração, impaciência. Como se ela estivesse por um fio. Não sei o
grau dos problemas dessa mulher, mas me vi desejando saber mais dela, o
que estava a preocupando e tirando seu sono durante a noite. Eu sabia que ela
não estava dormindo bem, seus movimentos durante a noite eram frenéticos.
Teve momentos nesses dias que tive vontade de ir até ela e tentar, de alguma
forma, afugentar sua inquietação — Leve-me ao escritório agora.
Ela fica calada depois disso, não dando margem para uma aproximação
de minha parte. Acabo deixando para lá, afinal, eu não era o homem
recomendado para aliviar seu fardo. Era um homem com um tesão furioso,
isso sim. Só preciso manter a luxúria até a noite ou iria ser preso por assédio
à viúva engomadinha.
Quando paro meu carro e a conduzo para seu escritório, onde ela se
tranca na sala com o tal Marcos, eu fico do lado de fora. Odiava esse
marasmo que era a segurança particular. Pego meu telefone e ligo para
Alexander.
— Bruno — diz quando atende — Algum problema?
— Por que teria? Não posso te ligar, florzinha? Posso estar com
saudade — gracejo. Ele odiava minhas gracinhas, e não poderia deixar de
atormentar o senhor certinho, cara chato! — Alex, devia pegar sua noiva e
relaxar no mar Mediterrâneo ou quem sabe no deserto do Saara, assim você
ficaria mais quente, homem!
— Bruno, você me ligou para dizer essas merdas sem sentido? Caso
não saiba, sou um cara ocupado que trabalha, ou você não sabe o que isso
quer dizer? — ele esbraveja, me fazendo rir.
— Estou precisando de uma folga hoje à noite — deixo minhas graças
de lado, por enquanto — Mande um homem de confiança para minha casa,
tenho que sair.
— Sair? Bruno, eu deleguei esse trabalho para você, caso não...
— Alex, você devia estar me agradecendo por procurar “diversão”
longe do meu trabalho, não é isso que tanto você fala? Não se envolva com
suas clientes, Bruno. — imito seu tom de voz.
— O quê? Ainda não entrou na calcinha da viúva? — ele diz realmente
espantado. Bem, era isso, estou chocando a humanidade com meu
comportamento inusitado.
— Fica na sua, senhor dominado por uma Patricinha — ele está rindo
às gargalhadas do outro lado.
— Porra! Preciso ver isso de perto. Bruno Ross, garanhão invicto,
levando um fora pela primeira vez.
— Foda-se, imbecil. Ela que não faz meu estilo. Morena, certinha
demais e chata — ele está rindo mais ainda. Merda, não estou convencendo
nem eu mesmo com esse discurso. — Só mande alguém e deixe minha vida
de lado, Ice man.
— Eu faço questão de eu mesmo ir aí. Não se preocupe, garanhão —
diz depois que seu surto de riso passa — Que horas quer alguém aí?
— O mais rápido que puder. E, Alex? — respiro fundo — Não mande
nenhum babaca para cá.
— O único babaca nessa empresa é você, Bruno, caso tenha esquecido.
Mando alguém.
Ele corta a ligação sem nem avisar. Fodido, filho da mãe.
Minha próxima ligação é para a loira de mais cedo. Caralho, eu preciso
extravasar essa porra!
Alicia
...
Eu estava parada no lugar onde você me deixou
Rezando que você voltaria para me buscar
Mas agora eu encontrei uma segunda direção
Agora encontrei minha segunda pele
...

Estou na cozinha da casa de Bruno fazendo meu jantar, escutando Army


of me, da Christina Aguilera, baixinho no rádio que está ligado acima do
balcão de mármore, quando ele aparece na porta vestido totalmente diferente:
camisa branca e jeans e um casaco de couro por cima. Depois que tínhamos
chegado, uma hora atrás, ele me mandou ficar à vontade e foi para o próprio
quarto onde ficou até agora. Deve ter tomado banho, porque gotas de água
brilhavam em seus cabelos negros e o cheiro dele me atinge de uma maneira
totalmente inesperada, me atordoando.
Devo estar encarando, porque o vejo levantar uma sobrancelha
indagadora na minha direção.
— Daqui a pouco irá chegar uma pessoa para ficar com você até
amanhã pela manhã, Alicia — ele diz e fico imediatamente inquieta — Tenho
um compromisso para essa noite.
Compromisso? Sei...
— E daí? — dou de ombros e volto para o fogão, onde estou
preparando um fettuccine parisiense que eu adoro, além da salada. Fiz para
duas pessoas, achando que meu anfitrião jantaria em casa. Droga! E por que
diabos fiz jantar para ele? — Divirta-se.
— Irei... — sua voz soa bem perto de mim, e percebo que ele veio para
meu lado no balcão. Meu coração está bombeando sangue nas minhas veias
numa velocidade incrível e causando sério problema de taquicardia. Por que
me sinto culpada por desejá-lo? Tudo parecia fora de lugar — Você vai ficar
bem?
Ele parece realmente preocupado comigo, e sinto um aperto no peito.
Como não respondo, ele pega no meu braço me virando de frente para ele. E
meu desejo é fugir para bem longe dali, mas fico plantada no lugar. Meu
pulso bate enlouquecido de tensão.
Levanto meu rosto para encará-lo, e nossos olhos se prendem e ficamos
parados bebendo da visão um do outro. Não sei quanto tempo estamos assim,
até que a campainha toca e dou um pulo para longe dele, recriminando-me
por ainda cogitar a possibilidade dele me beijar. Ouço o suspiro dele quando
vai atender a porta. Deve ser o outro segurança que ficará aqui. Desligando o
fogo, caminho para a sala e ouço a voz de outro homem.
— Espero que não esqueça de voltar, Don Juan — a voz é grave e sexy
— Esteja de volta o mais rápido que você descarregar essa merda de você —
ele está dizendo quando apareço na sala. O cara é enorme e está de braços
cruzados na frente de Bruno, que está sério, coisa não muito usual. — Ah!
Senhora Duran.
O desconhecido caminha para mim com a mão enorme estendida.
— Alexander Marshall. Um prazer, enfim, conhecê-la — enfim? O que
isso quer dizer? — Matt é um amigo de longa data, mas não me lembro de tê-
la conhecido antes.
Assim, deve ser por causa do Matt que ele disse isso, não por esse
burro do Ross ter falado de mim para seus amigos seguranças.
— O prazer é meu, conhecer um amigo do meu irmão — aperto sua
mão e ele sorri afável para mim. Bem, eu gostei dele, parecia um homem
agradável.
— Ficarei aqui com você essa noite — ele aponta para Bruno que está
nos observando — Folga para nosso amigo aqui ir encontrar sua nova
namorada.
O quê?
— Sem problemas. Bem, espero que o senhor esteja com fome — dou
um sorriso enorme para ele — Estou preparando um Fettuccine delicioso,
para dois — ignoro o idiota do Bruno, que está de cara feia para nós, quando
caminhamos para a cozinha o deixando lá plantado na sala.
— Me chame de Alex — meu novo segurança diz.
— Claro, Alex, será um prazer — digo — Então, me diga, como você e
meu irmão se conheceram?
— Divirta-se, Ross — Alex diz quando levanta suas mãos em
despedida.
6
Bruno
Devo estar vermelho de raiva. Porra, por que diabos estou me sentindo
traído? Sinto meu corpo fervendo, como se lavas quentes estivessem
correndo nas minhas veias, quando vejo a interação desenvolta de Alicia, tão
diferente de quando é comigo. Droga!
— Divirta-se, Ross — Alexander acena indo para a cozinha, como se
fosse o dono do lugar, e a engomadinha à frente dele.
Qual era o problema deles dois, se acham os donos da minha casa?
Alicia está há uma semana aqui e nunca sorriu para mim, praticamente não
olhava nos meus olhos, e quando fazia isso era com mau humor, mas
bastaram dois segundos e já era toda sorrisos para o idiota do Alex.
E o que ele estava fazendo aqui, afinal? Alex não sai muito da parte
administrativa da nossa empresa, nós fazemos essa parte com maior prazer e
ele administra, mas qual não é minha surpresa ele mesmo aparecer aqui
fazendo, o que tinha prometido, e não mandando alguém como era usual.
Filho da puta, o que ele quer com minha Alicia? Minha? Devo ter
fumado um baseado e não lembro. Ela deve me odiar, e eu fantasiando com
ela. Esse pensamento me incomoda de uma maneira totalmente nova e
desconhecida para mim. Estou ficando um fodido filho da mãe sem sentido.
Por que desejo que ela goste de mim? No fim ela vai embora e partirei
para outra, tão logo ela saia da minha vida, como tantas outras. Talvez seja
porque não tenho nenhuma chance de ter algo com ela, e isso está fazendo
meu ego murchar feito um pneu sem válvula.
— Pode deixar, meu caro, irei fazer exatamente isso — resmungo para
ninguém em particular, afinal, a sala está vazia, onde estou por vários
minutos em pé escutando as vozes divertidas dos dois na cozinha.
Pego as chaves da minha moto e caminho para a saída, mas antes eu
preciso ver o que os dois estão fazendo de tão divertido. Caminho a passos
largos para minha cozinha e paro na porta observando os dois interagirem
como se fossem velhos conhecidos. Alicia está de volta ao fogão e Alex está
ajudando. Inferno! Fui totalmente esquecido aqui.
— Então vocês se conheceram na faculdade? — Alicia está
perguntando — Matt nunca falou de você. Não para mim.
Espero pela resposta do Alex, mas este me vê e dá um sorriso com suas
sobrancelhas erguidas.
— Não vai sair mais, Ross? — ele diz, fazendo Alicia se virar em
minha direção, e seus olhos grudam nos meus — Se não, eu posso ir embora.
— ele continua sorrindo, cheio de dentes. Parece que estava lendo meus
pensamentos. Limpo minha garganta:
— Vim só dizer que estou de saída — digo, e minha voz sai aborrecida
— Até amanhã.
Digo isso olhando para Alicia, e parece uma eternidade quando me viro
e saio deixando-os lá, me olhando com olhares estranhos.
Quando disparo no trânsito com minha Harley em direção ao endereço
da loira, deixo de pensar por um instante em tudo e sinto o vento noturno
bater em mim, levando parte da tensão que foi essa semana.
Cerca de uma hora depois, estou em um restaurante com Evy. Ela é
atraente; não, atraente não, ela é linda, mas não sinto a empolgação de
terminar minha noite com ela. Olhando-a, eu começo a fazer comparações
com a viuvinha empertigada, e minha mente deriva da conversa que mal
mantenho com ela, indo de volta para minha casa e o que aqueles dois estão
fazendo. Ainda bem que Evy falava por mim e por ela. Beberico minha taça
com água, já que não estou bebendo hoje. Pilotar moto e com as veias cheias
de álcool não era uma combinação legal.
— O que você é da senhora Duran? — ela está perguntando, e seu rosto
mostra evidente interesse na minha inexistente relação com Alicia.
— Sou seu guarda-costas — digo sem dar nenhuma outra explicação,
mas parece que ela espera algo mais, só não tenho vontade de falar da minha
vida para ela.
— Só isso? Pareceu que há algo mais pela forma que ela me fulminou
hoje mais cedo com os olhos, no escritório — ela insiste — E a forma como
ela olha para você.
O quê? Tinha curiosidade em saber de que jeito ela me olhava, porque
eu a estava olhando desde que a conheci. Bem, mas agora não estava com
vontade de discutir meu não caso com a viuvinha, tinha outras ideias para
essa noite, já que ela não estava no cardápio.
Estendo minha mão e deslizo meus dedos para cima e para baixo pelo
braço desnudo de Evy.
— Por que não deixamos isso de lado e vamos para um lugar mais
íntimo, querida? — digo com voz macia — Afinal, viemos aqui para nos
divertir, não?
E ela dá-me um sorriso sedutor.
***

Observo Evy sentada no meu abdome e seus cabelos loiros roçando


meu peito desnudo quando ela suga um mamilo em sua boca quente.
Tínhamos chegado à sua casa há mais de uma hora e fomos direto para seu
quarto sem nenhuma cerimônia, e era onde estávamos agora, com ela me
montando igual uma cowgirl sexy.
Eu não pareço um homem que tinha passado a semana com um tesão
maldito, a verdade é que estou entediado e, sem aviso, seguro ela pela cintura
e a tiro de cima de mim, causando um gritinho de susto nela.
Verifico as horas e vejo que não é nem meia-noite. Merda, isso não saiu
como imaginei que seria, tudo que consigo pensar é naqueles dois na minha
casa, o que estão fazendo e, droga, eu sei que Alexander respeitaria Alicia,
mas só de imaginar ela conversando com outro homem me causa certa
vontade de socar a cara do indivíduo.
— Hei, aonde vai? — choraminga Evy quando me vê procurando
minhas roupas pelo chão do quarto dela — Pensei que poderíamos nos
divertir mais. —ronrona.
— Eu tenho um compromisso, não posso ficar toda a noite — dou a
primeira desculpa que vem à mente — Deixei um substituto fazendo meu
trabalho e não posso demorar.
— Você tem meu número, querido, não hesite em me ligar outra vez —
ela pisca sedutora para mim — Apesar de ser tão rápido, me diverti bastante.
Eu dou um sorriso padrão que dou para todas que saio por uma noite e
prometo voltar, mas, como vocês devem saber, ela não me verá uma segunda
vez.
Alicia
Alexander é um gentleman comigo durante o tempo que ficamos
conversando, depois que Bruno saiu e nos deixou a sós. Enquanto devoramos
o fettuccine, conversamos como velhos amigos, e não como duas pessoas que
acabaram de se conhecer. Ele me questiona sobre o dia que encontrei Evan,
mas como não quero ir por esse caminho — cada vez que lembro aquela
noite sinto calafrios percorrerem minha pele — digo para ele que não quero
conversar a respeito.
— Você sabe que qualquer informação pode levar ao suspeito — ele
diz — Sei que a polícia já fez milhares de perguntas a você, mas deixamos
isso de lado.
Eu agradeço sua gentileza e dou um sorriso sem graça. Não posso nem
mesmo me ajudar para sair dessa enrascada.
Mudamos de assunto e, por fim, acabei perguntando mais sobre Bruno.
Queria saber mais do profissional que ele era e suas facetas como ser
humano. Tinha vontade, às vezes, de conversar com ele, mas eu odiava
homens cheios de si, que se acham deuses na terra, e Bruno tinha de imediato
me passado essa impressão, mas eu queria e torcia para estar enganada.
Paro imediatamente minha linha de pensamento. Jesus! Onde quero
chegar com isso? Não tenho tempo para essas coisas e, pior, seria julgada por
conhecidos se, de repente, com pouco mais de um mês eu tivesse em um caso
com outro homem. Pare, Alicia, com isso já?! Ele me faz tão consciente de
mim mesma! Mas não paro e me vejo instigando Alexander por informação:
— Você sempre trabalhou com o Bruno? — pergunto em dado
momento. Eu tinha curiosidade sobre o homem, fazer o quê? — São
parceiros?
— Somos sócios na firma de segurança — ele diz, recostando o grande
corpo na cadeira da mesa da cozinha. Seus olhos incrivelmente verdes me
avaliam detidamente, deixando-me com o rosto quente de constrangimento.
— Alicia, eu tenho o dever moral, além do fato de que Matt é como um
irmão para mim, de lhe deixar a par com relação ao Bruno. — faço menção
de falar, porém ele continua: — Ele não é um homem que se apega a mulher
nenhuma, ele usa o charme dele para se dar bem, principalmente com as
mulheres que ele trabalha fazendo sua segurança. Você pode se perguntar o
porquê de eu estar falando isso do meu sócio, mas é por respeito a você que
pode se deixar envolver por ele, e você está passando por tantas coisas que
tenho o dever de te alertar. Seu irmão não me perdoaria se sua irmã saísse
magoada disso tudo.
Estou chocada com seu discurso e demoro um momento para reagir.
Como ele pode falar mal do próprio amigo? Mas se ele diz, é preciso levar
em consideração.
— Bem, senhor Marshall, deixa eu te falar. Não sou uma donzela em
perigo para que o senhor tenha que me salvar do lobo mau. Seu sócio não tem
esse poder todo que você alega. — digo um pouco aborrecida. Quem ele
pensa que sou, afinal?
— Você não sabe nada sobre ele. E, Alicia, eu sou homem antes de
qualquer coisa, e morar com uma mulher bonita sobre o mesmo teto leva a
intimidades indesejadas. — ele me olha detidamente — E conhecendo Bruno
como conheço, ele está mais que interessado em você.
Está? Hummm
— Garanto que não...
Ele rir, cortando meu discurso.
— Pela cara dele, antes de sair, ele está mais que interessado — ele ri.
— Recado dado, Alex — levanto e vou retirando os pratos usados da
mesa. Mas ele gentilmente se oferece para limpar a cozinha. Eu aceito e peço
licença para ir ao meu quarto. Estou um pouco abalada pelas revelações sobre
Bruno. Eu tinha razão em não confiar muito nele.
Cerca de duas horas depois, eu volto para a sala, atraída pelo som de
uma música, e encontro Alex sentado com o som estéreo ligado ao som de
Magic. Percebo o quanto estou me sentindo um pouco solitária nessa casa, e
ter alguém para conversar é mais que bem-vindo.
Ele me vê parada e faz um gesto para que eu sente. Ele estava
apaixonado? O pensamento me faz rir interiormente. Difícil de imaginar o
gigante bonitão todo derretido de amor, contudo é o que aparenta.
— Incomodei com a música? — ele pergunta quando sento em frente a
ele no sofá.
— Não, eu amo essa música — digo e sorrio, comentando a seguir: —
Mas isso é música para gente apaixonada.
Ele abre um sorriso.
— O que posso fazer? Estou nesse estado lamentável de amor — me
surpreendo por ele admitir. Ele pega o celular, mexe nele e me entrega o
aparelho, onde tem uma foto de uma mulher com um sorriso sapeca no rosto
jovem, e fico mais que surpresa, pois tenho a nítida impressão de que a vi em
algum lugar antes, ela me parece familiar. Ele está ao lado dela na foto, e seus
olhares apaixonados não deixam dúvidas que eles se amam.
— Muito bonita, sua... — o quê? Noiva, namorada, esposa?
— Minha noiva, Lana — ele diz quando entrego o celular de volta —
Estou correndo sério risco por estar aqui esta noite. Essa menina me tem
pelas rédeas. — fala rindo e quase acredito nele, pois parece um cara que não
se deixa dominar facilmente.
Ele começa a contar as estripulias da noiva, e estou rindo alto de suas
histórias quando escutamos a porta abrir e vejo Alex assumir uma posição de
defesa, segurando uma arma. Aconteceu tão rápido que penso que estou
imaginando a coisa toda.
— Porra, Bruno! — Alex grunhiu para um Bruno carrancudo que entra
na sala calmamente, como se ter uma arma apontada para ele fosse nada de
mais. Alex coloca a arma na cintura e volta a sentar — Quando falei para não
esquecer de voltar, não disse que era tão rápido, Don Juan. Alicia tem sido
uma agradável companhia.
— Foda-se, Alex — ele caminha para a sala e joga-se no outro sofá.
Vira-se para Alexander — Agora pode ir. Sua namorada deve estar
preocupada com você sumido. Não se esqueça de levar uma coleira para
amarrar a fera!
— Não se preocupe com minha namorada, Bruno — Alex ri — Estou
mais preocupado com o seu traseiro, isso sim. Mas já que você chegou mais
cedo do que um colegial com toque de recolher, irei embora.
Ele levanta-se e caminha para pegar seu terno, que tinha retirado
quando chegou, colocando por cima da camisa branca. Depois caminha na
minha direção e estende a mão em cumprimento.
— Alicia, deixe eu saber se precisar de algo — ele aperta minha mão
na sua — Até breve. E espero sinceramente que tudo se resolva e você possa
se livrar de todos nós limitando sua vida.
Ele vai embora logo após, acompanhado de Bruno, que mantém uma
conversa sussurrada com ele na porta. Eu fico na sala sem saber se volto para
o quarto ou continuo sentada. Bruno volta, me olhando fixamente, e fico
consciente de que estou com um short e camiseta confortável, mas ele olha
como se eu estivesse vestindo nada mais que minha própria pele. Merda, ele
provavelmente saiu com uma mulher esta noite e está me olhando como
estivesse com vontade de me devorar. Homem prostituto.
Mesmo assim sinto-me quente em todos os lugares, e arrepios correm
por mim quando encontro seus olhos fixos nos meus, só desviando quando
ele desce lentamente pelo meu corpo. Levanto rapidamente, dou um "boa
noite" e corro para meu quarto.
Estou fugindo, eu sei, mas tudo que Alex falou hoje pesa na minha
consciência, sobre eu ser mais uma na sua lista de intermináveis mulheres
fáceis. Que não sou mais que uma cliente em sua lista de conquista.
Durmo mal, revirando-me na cama inquieta, e amanheço o dia para
encontrar um Bruno na cozinha tomando café da manhã. Pela cara dele, não
deve ter tido uma noite tão boa também. Porém, lembro que ele saiu para se
divertir.
— Bom dia. — cumprimento quando entro e vou direto à cafeteira
para tomar um café para acordar. Estou precisando de cafeína em meu
sistema. Viro-me para Bruno depois de me servir — Divertiu-se ontem à
noite?
— Quem se importa? — ele resmunga — Mas me diverti bastante —
fico chocada com os sentimentos que desencadeiam dentro de mim,
imaginando-o fazendo sexo com outra mulher e, ao mesmo tempo, tento
inibir isso, já que não tenho nada a ver com sua vida. É até bom ele sair, só
assim eu tenho mais um motivo para não deixar ele se aproximar de mim.
— Que bom...
— Mas não era a companhia com quem eu queria me divertir — ele
levanta e traz sua xícara para encher perto de mim, e seu corpo prende o meu
no balcão quando ele se inclina para encher a xícara na cafeteira. Engulo o
caroço na minha garganta — Para ser bem sincero, eu pensava em outra
pessoa durante toda noite. Uma chatice — sua voz está enrouquecida. Sinto o
hálito dele batendo no meu rosto.
Tento lembrar a mim mesma que não é culpa de Bruno que estou
decepcionada com os homens em geral, que ele só é a personificação dos
tipos que devo ficar longe, mas o cheiro masculino que sinto emanando dele
me deixa excitada, e totalmente contra minha vontade, salivo. Sem que me dê
conta, corro minha língua por meus lábios lentamente, e quando olho para
aqueles olhos azuis, eles estão famintos e grudados na minha boca.
— Assim fica difícil, Viuvinha — ele soa sexy para meus ouvidos —
Resistir a você está sendo a coisa mais difícil ultimamente. E você me
provoca com seus olhares de desprezo e essa boca sexy pra caralho. Estou
agora mesmo pensando como, onde e em quais posições vou foder você e
tirar fora essa sua capinha de boa moça que me deixa malditamente duro. —
a voz é persuasiva, calma e profunda.
Estou respirando com dificuldade com a crueza de suas palavras, e ele
mais parecia com raiva do que excitado com a perspectiva de fazer sexo
comigo. Estou sentindo que estou corada quando ele ergue a mão e desliza
levemente o dorso do dedo indicador por meu rosto, e arrepios nascem a
partir do toque. Sem aviso prévio, ele segura embaixo do meu queixo e faz
com que eu incline minha cabeça para trás para que eu fique olhando-o, sua
boca pairando na minha. Quando penso que ele vai me beijar, ele morde meu
lábio inferior entre os dentes.
Meu pensamento de fuga evapora, as recomendações de Alex voam
pela janela, e a única vontade que tenho agora é ficar nas pontas dos pés e
beijá-lo. Mas ele não me dá tempo para isso. Sua boca bate na minha, e
quando penso que ele me beijará duro, seus lábios são macios e
dolorosamente lentos nos meus. Beija-me devagar e gemo contra sua boca.
Nossas línguas se encontram e enroscam com lentidão, saboreando
mansamente como se tivéssemos todo tempo do mundo nesse beijo. Mas,
ainda assim, minha respiração está até mais acelerada do que se eu estivesse
em uma maratona de 10km.
Bruno
Isso sim é novidade para mim, beijar uma mulher como se tivesse medo
de quebrá-la. Quando olhei nos olhos verdes azulados de Alicia, agora há
pouco, antes de reivindicar sua boca na minha, ela parecia frágil e ao mesmo
tempo forte, contudo ela me faz pensar antes de agir. Tenho, pela primeira
vez, medo de machucar os sentimentos de uma mulher que quero foder sem
sentido. E isso me abala, faz aquele homem que estou acostumado a ser, o
que não pensa além da cabeça de baixo, colocar um freio nas suas atitudes.
E, pela primeira vez, eu a beijo docemente, com sinceridade. Nossas
línguas dançam uma com a outra. Os gemidinhos que Alicia solta me deixam
com tanto tesão, que quero rasgar suas roupas certinhas e jogá-las no
assoalho e fodê-la forte. Deslizo minhas mãos por sua cintura em direção aos
seios e espalmo meus dedos por essas protuberâncias deliciosas, quando ela
me empurra forte.
Que diabos...
— Está se divertindo, senhor Ross? — ela tenta soar fria, mas sua
respiração entrecortada diz algo bem diferente — Qual é meu número?
De que porra ela está falando, agora?
— Esclareça, docinho — peço — De que número está falando?
— De clientes suas que você seduz, senhor Ross — fala entre dentes.
Que merda.
— Quem disse isso, que seduzo minhas clientes, Alicia? — eu tinha
ideia de quem tinha dito.
— Alexander fez questão de me dizer qual seu modus operandi, senhor
Ross — ela morde as palavras com raiva, e vejo que não será fácil para mim
com essa mulher.
Maldito Marshall, empata foda, filho de uma cadela! Juro que o matarei
lentamente, com requintes de crueldade.
— Além do fato de que o senhor não passa de um homem prostituto,
que saiu com uma mulher ontem à noite e agora já está me beijando — ela sai
de perto de mim, colocando distância entre nós — Sou melhor que isso,
senhor Ross.
Ela tinha razão, afinal, eu não era digno de confiança de qualquer
maneira.
— Viuvinha, você devia relaxar e gozar a vida! — sorrio para ela e
caminho para perto dela outra vez. Que se dane essa porra. Vou dar motivos
para ela me odiar, então.
Até agora, nem comecei com ela!
7
Alicia
Ele está com raiva por tê-lo chamado de prostituto, mas não me
importo, já que ele era isso mesmo, um safado cara de pau.
— Viuvinha, você devia relaxar e gozar a vida — ele ri cheio de
dentes. Seu sorriso era lindo e tinha aquele ar safado que eu estava
aprendendo a odiar e gostar ao mesmo tempo, sem querer. Ele segue atrás de
mim.
— Não chegue perto de mim — aviso. Meu estômago está apertado de
ansiedade. Ele não para até estar colado a mim.
— E o que vai fazer, querida? — ele encosta em mim, seu corpo me
imprensando no armário atrás.
Sua calça do pijama não esconde o quanto ele está excitado, e parece
que quanto mais digo não, mais ele parece gostar.
Ele agarra a bainha da minha camiseta e me puxa em sua direção. Eu
ofego quando bato no seu corpo duro. Bruno envolve minha cintura com um
braço e a outra mão nos meus cabelos. Enrijeço, tensa, a única coisa que faço
é segurar seus braços musculosos. O ruído de sua garganta é de satisfação, e
isso me deixa quente em todos os lugares. Ele corre a língua pela comissura
dos meus lábios, que estão fechados, e sua língua persuasiva tenta abrir
caminho.
— Sabe, querida, sei que gostará disso que tenho em mente para fazer
com você — fala contra meus lábios — Relaxe, bebê... só sinta.
— Pare... — eu cravo as unhas em seus músculos para tentar me afastar
dele — Não estou desesperada, senhor Ross.
Ele ri baixinho, aquele risinho odioso dele.
— Viuvinha, eu tenho certeza que, agora mesmo, seu desespero é
grande — ele desce a mão da minha cintura para minhas nádegas, dentro do
meu short, minha pele contra sua palma, e me esfrega contra sua ereção,
causando nele um gemido rouco. Seus lábios tocam minha orelha num
sussurro provocante —Tenho certeza que está molhada e pronta para mim,
bebê.
Ele sabe que está me afetando, estou sem forças, minhas pernas
parecem geleias, mas...
— Nunca... — ofego porque estou sentindo tudo isso que ele falou.
Maldito! Me tenta além da conta — Nunca vou desejar suas patas em mim,
senhor Ross — oh, meus Deus! Se aquilo é minha voz de rejeição, como
seria a que implorava por seus lábios?
— Você pensa demais, querida. Pense no que posso fazer por você —
diz, o desejo evidente no seu tom — Quero levantá-la em meus braços e me
enterrar dentro de você, como tenho fantasiado desde que a conheci, e sei que
você apreciaria isso. Diga sim, Alicia... Podemos nos divertir, pense no
prazer que posso te dar.
Era isso, se divertir, eu não passava disso para ele. Diversão. Tiro
minhas mãos dos seus braços, as espalmo no seu peito largo e o empurro
forte. Mas ele nem se mexe do lugar. Então falo:
— Vá procurar diversão em outro lugar, senhor Ross — ele levanta a
cabeça para me olhar nos olhos. Meu tom não deixa margem para dúvida de
que não cederei a seus avanços, mas nunca foi tão difícil resistir.
— Por que pensa tanto?
— E por que tenho de ser um desafio para você? Tenho certeza que
pode encontrar alguém disposta...
Ele segura minha cabeça com as duas mãos, bate a boca na minha e me
beija outra vez, e agora nada tem de suave. Sua língua exigente força entrada
na minha boca e me vejo abrindo, receptiva. Tranco meus dedos em seus
cabelos macios e puxo com força, fazendo ele soltar um gemido gutural em
apreciação. Correspondo o beijo combinando seu ardor com o meu, nossas
línguas acariciando-se com fervor, meu corpo reagindo ao estímulo e ao
desejo de tê-lo dentro de mim. Mas preciso pensar se realmente quero isso, se
sinceramente estou preparada para ter um caso de uma noite com esse
homem, porque sei que não será mais que isso. E também não quero ter
qualquer tipo de relacionamento agora na minha vida.
Empurro Bruno lentamente para quebrar o beijo.
— Por favor —sussurro — pare.
— Você deixa qualquer santo louco, Alicia — ele me solta e dá um
passo para trás — Só que não forço nenhuma mulher, não tenho necessidade
para isso. Gosto delas bem-dispostas.
Ele dá meia-volta e senta à mesa como se eu fosse invisível. Ele não via
que eu estava lutando a maior luta interna da minha vida?
Mas não ache que vou implorar, querido.
Empino meu queixo e anuncio:
— Irei sair em vinte minutos, senhor Ross — pego outra xícara de café,
já que meu antigo estava agora frio, e vou trocar de roupa para meu dia.
Encaro a mulher no espelho do banheiro mais tarde, e avalio a figura
refletida. Eu só tinha vinte e sete anos, toda a minha vida pela frente, e estou
frustrada e cheia de mágoa com a vida. Meus lábios estão inchados e
vermelhos, sinal que fui muito bem beijada, e levo meus dedos para tocar
minha boca. Estou pensativa, e mordo o canto dos meus lábios.
O que vou fazer com essa atração? O que vou fazer com você, Bruno
Ross?
Quando volto para a sala, ele já está em pé me aguardando para sair e
não dá sinal do que houve mais cedo. Na verdade, ele não dá pista do que
está pensando.
— Pronto, senhora? — ele fala quando me vê.
— Sempre.
Ele ri com ironia e levanta suas sobrancelhas
— Se você diz. Vamos — aponta a saída e vou para lá.
Passo o dia em reunião com um cliente, um dos poucos que continua
com a minha empresa, decidindo um jantar para quinhentas pessoas. E,
mesmo precisando me focar, nada faz com que as imagens de hoje pela
manhã desapareçam da minha cabeça. Estaria mentindo para mim mesma se
dissesse que não o queria também. Eu quero, mas algo me impede de ir em
frente.
Amanhã tenho um evento para organizar com minha equipe, que já está
no local preparando tudo para a recepção. Não sei como Bruno irá manter a
segurança com tanta gente se movimentando para lá e para cá ao meu redor.
Quando voltamos para seu apartamento depois do trabalho, estou tensa.
Bruno não fala muito mais que o necessário comigo, a não ser para dar
ordens. Ele tinha pedido a lista de convidados, e quando perguntei para que,
ele me olhou como se eu tivesse sete cabeças.
— Amanhã quero sair cedo para esse local que você irá trabalhar — ele
resmunga quando entramos no apartamento — Tenho uma equipe lá, mas
quero conhecer o local com antecedência.
— Como quiser — digo e vou para o quarto, estou sentindo fadiga,
preciso sair do caminho do senhor nervosinho. — Boa noite.
— Só se for para você, senhora Duran — ele resmunga baixinho e
depois acrescenta alto quando já estou deixando a sala: — Durma bem, se
puder!
Ignoro suas provocações e vou cuidar para tentar ter uma boa noite de
sono.
Bruno
Eu a quero, porra!
Estou parecendo um maldito disco quebrado o dia todo com essa
ladainha em minha cabeça, como um mantra. Estou tão frustrado que sinto o
gosto amargo na boca.
Esmurro e chuto com força o saco de pancada na academia do meu
apartamento para liberar toda frustração do meu corpo, mas nada adianta. É
um vicio me exercitar, eu precisava para me manter ágil para meu trabalho e
economizava tempo de locomoção, mas, depois que ela veio morar aqui, eu
tenho feito isso toda essa semana para tirar fora a energia direcionada à
viuvinha.
Desde que cheguei mais cedo com Alicia, eu tinha mantido distância
dela. A mulher me enervava e levava à loucura. Tentar foder com outra tinha
sido um erro, parecia que estava mais frustrado ainda, e só não estou dentro
da calcinha da viuvinha porque o bocudo do Alex achou engraçado fofocar
igual uma lavadeira. Idiota. Não sabe o que irei aprontar com ele, quando
tiver oportunidade. O merdinha era tão ciumento com a Lana, bastava só
piscar para ela que ele ficava eriçado. Filho da mãe!
Verifico as horas e vejo que passam das vinte e três. Droga, tenho tanta
endorfina no meu corpo que dormir será um problema. Adoraria encontrar
Alicia perambulando com aquele shortinho indecente que ela usa, achando
que está bem coberta.
Bem, acho que ela está dormindo, assim não posso provocar nem um
pouquinho, tirá-la da zona de conforto.
O apartamento dela já está todo pronto faz dois dias, mas me mantive
de levá-la de volta. Matt não interferiu na minha decisão. Ainda bem, prefiro
ficar aqui do que naquele lugar deserto onde não conheço cada polegada do
lugar. Que ela nem sonhe que estamos com o lugar pronto.
Finalizo meus exercícios com uma corrida na esteira e caminho para
meu quarto. A casa está em total silêncio, ela deve ter ido para A cama.
Imaginá-la lá era um catalisador para meu pau ganhar vida.
— Calma, pequeno Bruno, ela não quer você. — digo em voz alta,
olhando para ele que está firme e forte em sua missão — A mulher deve ser
frígida para resistir a você. Melhor se contentar com um banho frio.
E é exatamente o que faço, mas meu tesão precisa de atenção também.
Envolvo meu punho em torno de mim e penso na viuvinha empertigada.
Percebo que, depois que a conheci, vivo falando sozinho e com minhas partes
baixas, que é pior ainda.
É, Ross, quem diria isso de você.
Tomo o banho mais demorado da história, e parece que não fiz nada
para aplacar minha vontade de ir no quarto ao lado. Coloco uma calça de
pijama, pois desde que Alicia me pegou nu na cozinha que aderi a ela. Saio
do meu quarto à procura do meu jantar.
Quando ouço gemidos vindo do quarto de hóspede, dou um sorriso ao
imaginar Alicia dando prazer a si mesma pensando em mim. Sou pretensioso
nesse caso, porque eu simplesmente sei que ela me quer também, só é muito
teimosa e certinha. Mas meu sorriso desaparece quando escuto um grito de
agonia e um soluço. As imagens agora não são nada sensuais.
Testo a porta, e ela se abre para um quarto escuro só com as luzes de
fora incidindo para dentro, deixando sombras por todo o quarto. Vejo o
contorno do corpo de Alicia se contorcendo na cama. Ela deve estar tendo um
pesadelo. Caminho para o lado da cama, acendo a luminária do criado-mudo
e sento na cama quando toco em Alicia. Ela solta sons que fazem meus pelos
arrepiarem.
— Alicia? — chamo devagar — Acorde, querida — ela está suada e dá
um pulo, sentando-se e olhando para mim em choque.
— Você estava tendo um pesadelo. — digo — Você está bem?
— S-sim, obrigada — seu rosto está com marcas de lágrimas, e estendo
minhas mãos para tocar sua pele.
— Com o que estava sonhando que te deixou tão triste, bebê? —
acaricio com o polegar as maçãs do rosto dela, nas marcas de lágrimas. Seus
olhos estão marejando, e meu coração bate descompassado quando vejo uma
tristeza profunda neles. Não tinha percebido isso ainda. Qual a causa da
tristeza dela? Será que sentia falta do marido? Devia estar sofrendo por sua
morte repentina. Só podia ser isso.
— Não foi nada, já estou bem — sua voz está trêmula, contradizendo
suas palavras.
— Vou trazer algo para você tomar — digo, já levantando.
— Estou bem. Não preciso de nada, mas obrigada por se preocupar —
diz, mas a ignoro e vou buscar uma dose de conhaque para ela. Volto pouco
depois e encontro a cama vazia, mas sei que ela está no banheiro. Logo após
ela sai e caminha outra vez para a cama. Seus cabelos estão com alguns fios
úmidos, e essa roupa que ela usa me deixa duro e ansioso para tirar dela.
Calma, Ross...
— Aqui. Tome, fará você dormir outra vez — ela pega o copo e cheira,
balançando a cabeça.
— Quer me embebedar? — pergunta, mas toma um gole da bebida. —
Argh! Isso é veneno?
Bem, ao menos a cor está de volta para sua pele. E parece que ela está
se recuperando do pesadelo.
Sento ao seu lado na cama outra vez, e ela se afasta mais para o meio.
Ela tem medo de mim? Porra. Faça sua jogada, aproveite sua vulnerabilidade.
Faça-a esquecer de tudo, Ross.
— Talvez assim, bebê, você possa me deixar te beijar como tenho
sonhado em fazer. Eu poderia fazer você esquecer qualquer pesadelo só com
minha boca, mas sei que você precisa de mais... — olhos arregalados e
respiração ofegante. Sim, Viuvinha, você está excitada e quer isso tanto
quanto eu. — Você me quer, Viuvinha?
Pego sua mão, que está apertada em seu colo, e a levo para meus lábios
para beijar os nós dos seus dedos. Depois a viro e corro minha língua pela
palma, deliberadamente lento. Ela estremece visivelmente, seus lábios abrem-
se e ela ofega. E para chocar mais, agarro sua mão e coloco em minha ereção.
— Sinta o quanto quero te foder.
Ela tenta puxar a mão, seus olhos estão tão grandes que posso me
afogar neles, mas, como eu esperava essa atitude dela, aperto sua mão com
mais firmeza no meu pau por cima da calça do pijama, que não deixa muito à
imaginação.
— Solte-me... — ela diz num fio de voz, que soa como um canto de
sereia para mim. Puxo-a bruscamente e ela cai em meus braços. — Você é
louco!
— Sim, eu sou — beijo-a com força quando rolo na cama com ela por
baixo de mim. Exatamente onde a queria desde sempre. Ela tinha um corpo
maravilhoso, curvas nos lugares certos.
Empurro-a contra o colchão e levanto seus braços para cima de sua
cabeça, fazendo seus seios virem direto para mim. Desço minha boca e
degusto com prazer seus mamilos por cima da sua camiseta branca e fina.
Sugo forte, e ela geme enquanto empurra mais em minha direção. Levanto
minha cabeça pouco depois para apreciar meu trabalho.
Uma mancha molhada mostra seu mamilo ereto e duro, fazendo minha
boca salivar querendo mais. Dou o mesmo tratamento para o seio invejoso do
outro lado e sinto Alicia se contorcendo debaixo de mim, entregue. Deixo
uma trilha de beijos por seu pescoço até sua boca e a beijo com fome. Nossas
línguas deslizam e entrelaçam, e gememos juntos quando minha mão vai para
dentro do short dela e acaricio sua boceta lisa. Minha viuvinha empurra seus
quadris ao encontro da minha mão, com abandono.
Ela está tão excitada! Massageio seu clitóris intumescido, ela grita em
minha boca e tremores saem do seu corpo. Ela treme toda. E eu estava prestes
a gozar só de vê-la tão excitada. Toda minha. Vermelha e desfeita, pronta
para meu bel-prazer.
— Tão ávida, bebê... — sento e começo a tirar suas roupas. Mas as
mãos dela seguram meus pulsos, me impedindo de executar a tarefa. — O
que houve?
— E-eu... não posso — balbucia, mas seus olhos vítreos e ansiosos
dizem outra coisa. Sua indecisão faz a raiva de mais cedo voltar.
Porra, por que ela se nega tanto?! Ela tinha um olhar de foda-me, os
homens sabem essas porras, porém essa boca dela sempre abre para se negar.
— Não pode? Deixa eu mostrar que pode, Alicia — agarro seus quadris
e removo seu short — Você pode e vou te fazer gozar forte e várias vezes! —
envolvo seu clitóris na minha boca, sugando tão duro quanto posso. Levo
dois dedos dentro dela, e as paredes de sua vagina apertam meus dedos,
estrangulando-os. Porra nenhuma que ela não pode. Vou provar que ela pode
qualquer coisa que ela quiser.
— Ohhh, sim — ela sussurra tremendo quando goza tão rápido que me
surpreende. — Ah, Bruno!
Ah, sim, agora ela acertou meu nome. Estou assistindo a viuvinha se
desfazendo lânguida sob meu toque, mas ainda não terminei com ela. Castigo
sensualmente seu clitóris e a faço gritar outra vez. Convulsionando de prazer,
é assim que desejei vê-la desde que a conheci. Sorrio satisfeito comigo
mesmo.
Alicia
Seus lábios então nos meus, devastando todos os meus sentidos. Sinto
meu próprio sabor em sua língua, e é meio constrangedor. Caramba! Irei
fazer sexo com o prostituto do Ross!
— Estou louco para me enterrar em você desde que abriu aquela porta
para mim semana passada, bebê — ele diz pairando sobre minha boca —
Espera aqui. — ele praticamente pula da cama.
Aonde ele vai? Ele sai do quarto, e fico lá sem saber o que fazer, mas
termino de retirar minha blusa que ele tinha começado a tirar. Quando ele
volta com embalagens de alumínio, minha barriga aperta. Oh meu, eu irei
mesmo fazer sexo com ele! Estou sendo imprudente e inconsequente, mas
quem se importa?
Ele tira a calça de pijama que ainda usa e sua ereção pula livre. Ofego
deliciada com a visão do seu pau. Ele me olha com um sorriso safado quando
acaricia para cima e para baixo de seu comprimento. Quero minha boca nele,
isso é certo. Corro minha língua por meus lábios, e seu sorriso amplia mais,
mas ele deve ter outros planos quando rasga um preservativo e se cobre.
Droga! Estou umedecida de antecipação, querendo, almejando-o dentro de
mim.
— Você quer isso, Viuvinha? — ronrona com voz gutural, e coro
violentamente. — Temos tempo para isso depois, agora só quero foder você.
Bruto!
Ele volta para cima de mim, segurando seu peso em seus braços
musculosos. Quando eu levo minhas mãos para seu peito duro com músculos
rígidos, sinto as batidas do seu coração acelerado. Quero sentir minha pele
contra sua pele, e isso me faz sentir contrações em meu baixo ventre. Ele só
pode estar me enfeitiçando.
Quando ele volta a me beijar é totalmente diferente: exigente,
apaixonado, intenso. Oh céus, queria tê-lo beijado mais cedo. Gemo, faminta.
— Você é linda... — seus olhos azuis estão praticamente pretos, já que
suas pupilas dilatadas cobrem quase todo o azul. Seu desejo é latente e quase
palpável. Empurrando minhas pernas abertas, ele fica entre elas. Seus dedos
habilidosos acariciam minha vagina, e não posso me conter, solto gemidos
incoerentes.
— Ah, sim, bebê... eu amo isso também — diz quando me invade com
seus dedos e começa a bombear sua palma, fazendo maravilhas em meu
clitóris. Ele se afasta quando percebe que estou na borda de outro orgasmo.
— Ah, não.
Ele explora outra vez minha boca quando seu pau abre caminho
lentamente dentro de mim, fazendo-me gemer alto em sua boca.
— Sinta-me, querida...
— Pare de falar, Ross — digo, e ele levanta o tronco e me olha
divertido — Você promete muito e não faz tanto como diz. — o suor cobre
nossas peles, deixando-nos suados. Ele move o quadril para frente, se
empurrando mais fundo dentro de mim — Ahh.
— Tudo bem, você que pediu querida— ele puxa para fora e bate duro
de volta.
— Ahh, merda! — grito e ele faz de novo. Ele tinha um olhar carnal,
passional e safado que me deixava querendo mais, e me dá uma e outra vez,
fazendo minha boca abrir em gritinhos deliciados.
— Ah, você gosta disso, não é, Viuvinha? — ele diz. Esse apelido
idiota que ele me deu passa despercebido na névoa sensual que estou
envolvida. Bruno segura minhas mãos, palma contra palma, e enfia forte em
mim. — Sabia que você gostava das coisas duras!
Ele é implacável em busca do nosso prazer, me consumindo, e sou
bombardeada por uma nova onda de prazer quando gozo pela terceira vez e
ele não para de meter forte, até explodir dentro de mim.
— Merda, isso foi rápido — ele diz com a voz rouca e grossa —
Hummm, temos tempo a noite toda para ir devagar, querida.
Temos?
Ele rola e leva-me com ele, seus braços me envolvendo e sua mão
deslizando para cima e para baixo em minhas costas. Ele segura meus cabelos
na nuca e levanta minha cabeça para que eu possa olhá-lo e me beija
suavemente numa carícia delicada. Bom, era bem o oposto do que tínhamos
feito agora há pouco. Eu podia me acostumar com isso.
Ele me solta e cruza as mãos atrás da cabeça, e fico olhando para ele.
— Agora sim podemos ir com calma. Sua vez de explorar, Viuvinha —
ele está com um sorriso cheio de dentes para mim, esperando meu
movimento.
Onde fui me meter?
8
Alicia
Isso não é emocional, é apenas físico, carnal, pura resposta física dessa
atração fora de hora, e eu sei que sou apenas mais uma para ele. Que amanhã
ele pode nem mais lembrar dessa noite. Ele é um lobo maldito que me tenta, e
quero aproveitar nem que seja por um momento. Amanhã de manhã posso
voltar ao meu estado normal. Sem loucuras para cometer.
Ele faz uma careta, levanta e segue para o banheiro, voltando em
seguida sem a camisinha. Joga-se na cama, na mesma posição anterior, com
as mãos cruzadas atrás da cabeça, me olhando com um sorriso de lado.
— Sou muito para você, princesa? — provoca. Princesa? Quantos
apelidos idiotas ele vai me dar?
— Para falar a verdade, quero que saia do meu quarto — digo séria. —
Vou tomar um banho e, quando voltar, não quero te encontrar aqui, senhor
Ross.
Levanto rápido e sigo para o banheiro, deixando um Bruno pasmo
olhando para mim. Escondo meu sorriso maléfico quando entro e fecho a
porta. Começo a contar. Um, dois, três...
— Porra nenhuma que vou ser dispensado assim, querida! — a porta se
abre em uma explosão, e ele entra pronto para a briga. Tenho um pequeno
sorriso, e ele estreita os olhos — Você está brincando comigo, Alicia?
—Não sei do que está falando — sim, estava brincando em parte.
Minha vontade real era de mandá-lo embora, não quero deixar que ele pense
que pode ter sexo quando quiser. Mas eu poderia deixar todas as coisas de
lado só por essa noite; tirar todo esse peso dos meus ombros, por um
momento.
Fico séria quando me lembro do pesadelo, o motivo de acordar
chorando. Era sempre o mesmo sonho, e fazia um tempo que não o tinha, não
sei o que o desencadeou hoje. Talvez a pressão que sinto de um novo
envolvimento tenha trazido para fora, o motivo pelo qual não quero um novo
homem tão cedo em minha vida.
— Hei, terra chamando. — Bruno está na minha frente, gloriosamente
nu e muito à vontade. — Não fuja agora — seu sorriso sedutor é um lembrete
que isso é só hoje, amanhã ou depois, quando voltar para meu lugar, não
lembraremos nem o nome um do outro. Ele estica o braço e coloca uma
mecha de cabelo atrás da minha orelha — Vamos ficar a noite toda aqui em
pé, bebê? Ou vamos explorar mais essa atração entre nós?
— Estou indo tomar banho, senhor Ross — digo e entro no box,
ligando o chuveiro.
— Voltamos ao senhor Ross? Há pouco tempo eu era só Bruno. Isso
não me fará recuar, querida — ele diz, me seguindo. — Quanto mais diz não,
mais sinto vontade de ter você.
— Sou um desafio agora para você? — ele segura minha cintura e me
atrai para ele, minhas costas sendo pressionadas contra seu peito. Inclinando
a cabeça, ele começa a depositar beijos molhados pelo meu ombro, subindo
em direção à minha orelha e mordisca meu lóbulo.
Suspiro, o desejo cru outra vez vindo com força total. Ele me vira de
frente, capturado minha boca na dele, exigente, e estamos outra vez nos
beijando. Bruno me empurra delicadamente na parede do box e desce sua
boca por meu queixo, seios, barriga, ficando de joelhos à minha frente, e
ergue minha perna para seu ombro direito. Ele tem um meio sorriso quando
ergue seus olhos para mim. Estou totalmente vulnerável e disponível para o
ataque de sua língua hábil.
— Assista eu te dar prazer, bebê — sim, por favor. Eu não posso me
conter ao sentir suas carícias, em pouco tempo estou jogando minha cabeça
para trás, em êxtase.
Humm, isso é vergonhoso, nunca gozei tão rápido na minha vida. O
que ele está fazendo com meu corpo? Quando volto a olhá-lo, ele está
sentado sobre as pernas e está me puxando para seu colo e direto para seu
membro que me preenche completamente.
— Ainda não terminamos, querida.
— Bruno... — sussurro roucamente, línguas de fogo correm por minhas
veias partindo de onde estamos conectados, choques de puro prazer sensual.
Agarro seus cabelos que caem na sua testa, o deixando com ar perverso, e
colo minha boca na dele novamente, e começamos a nos beijar com
necessidade. É tão gostoso senti-lo. Estou me dissolvendo em uma massa de
modelar outra vez, quando ele enrosca um braço na minha cintura e me ajuda
a subir e descer por todo seu comprimento.

***

O dia amanheceu, e eu não tinha dormido nada. Droga, que noite!


Estou me sentindo como se tivesse sido atropelada por uma manada de
elefante! Bruno tinha voltado para seu quarto depois que saímos do banho e
me deixado aqui com um sentimento de culpa. E, não sei por qual razão,
afinal, não tenho de dar satisfação para ninguém.
Eu na verdade praticamente o expulsei do quarto, e ele tinha me
olhando como se tivesse duas cabeças.
São seis horas da manhã, então levanto para meu dia que vai ser
corrido. Ainda bem que tenho uma equipe que já sabe como agir em uma
organização de festas, senão eu estaria com problemas, visto que não estou
operando hoje muito bem. Não dizem que sexo te deixa radiante? Acho que
em mim foi o contrário, estou me sentindo estranha.
Visto calça de alfaiataria cinza, com uma blusa branca de mangas
compridas. Calço scarpins preto e faço um coque no meu cabelo. Bem, acho
que seria o suficiente. Escolho um vestido de noite e coloco em um saco para
roupa com os sapatos, já que não voltarei para trocar de roupa, e levo tudo
comigo quando caminho para fora, na esperança que Bruno não solte
nenhuma gracinha. Não estou pronta para sua língua afiada.
Ele está na varanda, sentado em uma das cadeiras de vimes que tem por
lá. Terno cinza claro o deixa deliciosamente sexy, parecendo mais um CEO
que um segurança hoje. Ele está olhando o horizonte, e fico sem saber o que
fazer a seguir, mas resolvo ir para a cozinha para pegar um café antes de sair.
Isso vai ser estranho, eu o tinha enxotado do meu quarto quando terminamos
de tomar banho, depois do sexo no box, e pelo visto ele nunca tinha sido
dispensado depois de uma turnê de sexo.
Suspiro profundamente enquanto encho uma xícara de café, talvez
assim eu crie coragem de enfrentar o homem. Merda! Estou parecendo uma
adolescente que fez sexo pela primeira vez. Empurro os pensamentos de lado
e viro para seguir para a varanda, mas quase deixo escapar um grito de susto
quando viro e dou de cara com Bruno praticamente colado em mim. Como
ele chegou e não senti sua presença? Homem sorrateiro.
— Bom dia, Viuvinha — sua voz é seda pura e seus olhos azuis estão
intensos — Dormiu bem?
— Não devia chegar sorrateiramente atrás das pessoas dessa maneira
— repreendo — E, sim, dormi igual a um bebê.
— Tenho certeza que sim — ele me observa de cima a baixo — Tão
séria, bebê, mas nós dois sabemos que isso é só uma fachada, não é?
— Senhor Ross, estou pronta para sair — ignoro sua conversa fiada e
ele ergue as sobrancelhas ironicamente.
— Quando você me chama assim, bebê, sinto todo meu sangue indo
para a parte sul do meu corpo — ele morde o lábio inferior com um sorriso
— É excitante!
— Não é para ser — digo, tentando o máximo ficar séria, mas acabo
dando um sorriso relutante. E a atração entre nós explode como uma chama
viva enquanto trocamos olhares intensos. — Acho melhor sairmos —
murmuro tomando um pouco do meu café para quebrar o clima tenso. Chega,
Alicia! Ele não faz nenhum movimento para mim, coisa que agradeço
profundamente.

Bruno para a SUV no local onde estamos organizando o evento e abre a


porta para mim. Ele não solta gracinhas quando está na rua comigo, é sempre
sério e focado no seu serviço. Parece dois homens diferentes, o que é um
gaiato e o outro sério, não sei qual dos dois gosto menos. Quando
caminhamos para dentro, noto um outro cara grandalhão na porta aguardando
por nós, provavelmente porque ele caminha direto para se encontrar conosco.
Ele tinha uma aparência distinta e sua feição é fechada.
— Ross, você demorou — ele diz, e seus olhos deslocam para mim,
mas ele não dá nenhum sorriso quando estende sua mão para mim — Carl
O'Nell, vou ajudar Ross hoje com a sua segurança, senhora Duran.
— Ah, sim, prazer, Carl — digo quando dou um meio sorriso para ele.
Ele é tão sério, diferente de seu amigo. — Bem, vou deixar vocês e vou
trabalhar. Até mais, senhores.
Sigo para o salão de festas, mas noto que Bruno me segue depois de
trocar algumas palavras com o sisudo Carl.
— Espera, Alicia — ele segura meu braço, me parando — Vou deixar
um segurança aqui na porta, pois preciso checar as coisas. Se precisar sair
comunique, por favor.
Assinto e tento soltar meu braço que ele ainda está segurando. Ele se
curva um pouco e sussurra:
— Apesar de você me chutar para fora, Viuvinha, eu adorei a noite
passada — ele tem um sorriso largo agora. — Até o fim dessa noite eu vou
estar dentro de você outra vez.
Ele me empurra lentamente para dentro da sala e caminha para o outro
lado, onde Carl está esperando com o cenho franzido para Bruno, me
deixando quente e úmida e de olhos arregalados. Vejo outro homem de terno
se juntando a eles. Bruno aponta para a porta que não fechei ainda, e o
homem caminha para cá. Entro, respiro fundo e viro para sala onde meu
pessoal está dando o seu melhor na decoração do lugar. Caminho em direção
do gerente e tento tirar da minha cabeça certo segurança metido a besta. Ele
era totalmente e ridiculamente irritante. Mas era tão delicioso. Merda!
Bruno
Dispenso o cara que vai ficar de olho em Alicia quando me viro para
Carl, que ainda me encara de cara fechada.
— Não acredito — ele resmunga quando caminhamos para verificar o
nível de segurança, repassar a lista de convidados e ter certeza que um
segurança nosso, além dos que já fazem esse trabalho, verifique na entrada
cada convidado. Não quero nenhum incidente, apesar de que esse é o serviço
mais fácil que já trabalhei. Nada acontece, estou quase mudando para algo
mais perigoso. Adrenalina é viciante. Marshall deve ter algo mais interessante
para mim. Além do fato de fofocar a meu respeito.
— Não acredita em quê? — devolvo, mas posso adivinhar por sua
carranca do que ele está falando.
— Já está mais uma vez envolvido amorosamente com seu trabalho,
Ross? — sua cara de poucos amigos me olha com reprovação — Um dia
você vai se dar mal por causa disso.
— Qual é, O'Nell? Virou padre, é? Não preciso do seu sermão da
montanha, meu amigo — digo, mas suas palavras me pegam de qualquer
maneira. Eu não vou me dar mal porra nenhuma, mulheres tem de sobra por
aí, por que uma em particular pode me ferrar?
— Só estou dizendo — ele levanta a mão, condescendente — Só acho
que dessa vez você foi longe demais. Pelo que soube, a moça está vulnerável,
e você não tem escrúpulos, cara. Devia se conter.
Paro em choque. Qual é a desses malditos caras se metendo na minha
vida? Caralho! Hoje estava se provando um dia muito chato. Eu queria estar
na cama com certa mulher enervante, em vez de estar aqui escutando sermão
desses caras.
— Não se meta onde não foi chamado, O'Nell — vocifero colérico —
não questiono sua vida celibatária de um maldito monge, então não questione
a minha porque eu adoro mulheres quentes e receptivas — e cravo a estaca
no coração — Talvez você seja gay, no fim das contas, não é? Nunca te vi
com mulher nenhuma.
Ele dá um sorriso frio para mim.
— Nem todo mundo tem a necessidade de viver como um maldito puto,
meu caro Ross, mas faça como quiser — diz e aponta para a sala de
monitoramento de câmeras do prédio — Por que não vamos trabalhar?
— Recado dado e recebido — dou um aceno e entramos para fazer o
que realmente importa aqui, que é manter Alicia Duran deliciosamente
segura.
Quando os convidados começam a chegar, naquele dia, eu faço meu
caminho para me manter o mais perto possível da viuvinha que está linda em
um vestido longo e cabelo artisticamente arrumado, mas ela não se mantém
parada no maldito lugar. Estou ficando zonzo, literalmente, de tanto procurar
e mantê-la em minhas vistas. Tenho um cara em cada canto do lugar de olho,
mas sei que essa pessoa que eliminou seu marido não dará suas caras em uma
festa dessas, porém eu nunca subestimo meus inimigos.
Estou num canto do salão principal onde se aglomera a maioria dos
convidados, e minha mente volta para a noite anterior. Sinto o sangue ferver,
e não é de tesão, ah não. A dona empertigada me expulsou do quarto dela
quando estava lindamente saciada. Ela ainda me deve uma foda muito dura,
ah deve sim...
Uma novidade, essa. Eu nunca fui dispensado como um moleque de
recados como fui ontem por ela. Droga, estava me sentindo usado.
Um homem se aproxima dela e entro em alerta total, minha mão corre
para minha arma que mantenho no coldre junto ao meu corpo. Fico tenso,
mas Alicia dá um sorriso para o homem enquanto esse aperta sua mão,
beijando sua bochecha. Aperto minha arma agora por outro motivo mais
obscuro que o anterior.
Foco, Ross, foco, pelo amor de Deus! Seu trabalho é de um mero
guarda-costas hoje à noite, não de um amante cheio de ciúmes porque ela
não te deu um sorriso hoje depois que fizeram sexo na noite passada, e agora
ela está sorridente para outro homem.
Tenho vontade de me aproximar, entretanto controlo a todo custo meu
ímpeto assassino de arrancar a mão do idiota que agora descansa na base de
suas costas enquanto caminham para o buffet. Ela está falando e apontando as
coisas. Demoro a buscar na mente quem é o cara. Ele estava na lista que
verifiquei hoje à tarde. Lembro que ele é algum empresário, mas não sei de
onde. Trinco minha mandíbula e ando ao redor da sala para que eu fique o
mais perto possível dos dois.
Seja um maldito profissional, Ross, não um homem reivindicando seu
território.
Ela vira a cabeça em minha direção, e nossos olhos se encontram e eles
dizem o quanto ela está consciente da minha presença. Isso não era nada
bom. Tinha prometido que não demoraria a tê-la debaixo de mim, suada e
gemendo. Só tinha de continuar com meu jogo de sempre.
Alicia
Pelo canto do olho vejo quando Bruno se aproxima, enquanto Lorenzo
Lamartine elogia a organização do evento, dizendo que em breve me ligará
para um possível trabalho.
Era para eu estar eufórica, já que ele é a terceira pessoa essa noite que
promete me procurar posteriormente, mas, em vez disso, estou com o
pensamento em outro ponto da sala. Fico imaginando quando ele cumprirá a
ameaça de hoje mais cedo sobre estar dentro de mim outra vez.
Argh! Desde quando tenho minha cabeça tão cheia de imagens
indecentes? Foco, Alicia, foco, recomendo mentalmente. Nossos olhos se
conectam e engulo em seco.
— Bem, vou deixá-la para fazer seu trabalho, tem uma pessoa que
desejo falar — diz Lorenzo ao meu lado, trazendo-me ao presente. — Minha
assistente ligará para você em breve.
— Claro, adoraria aceitar o trabalho — ele aperta minha mão em
despedida e vai conversar com alguns outros empresários ali perto. Volto
minha atenção e verifico se tudo está indo bem. Isso é uma coisa automática
nessas ocasiões, e vejo que tudo está em ordem.
Essa noite parece longa e estou cansada, não vejo a hora de ir para casa
e dormir, a noite anterior está cobrando seu preço. Sinto as pálpebras pesadas.
Uma da manhã, e não aguento mais ficar aqui nem mais um minuto.
Procuro Bruno e não demora muito para encontrá-lo, ele se manteve perto a
noite toda, ele e Carl sempre estavam no meu campo de visão. Nenhum
incidente aconteceu, e me sinto aliviada. Caminho até ele e anuncio que já
podemos ir. Estou frustrada por ele não fazer uma tentativa de cumprir sua
promessa, acho que ele fez isso de propósito para que eu ficasse ligada o
tempo todo. Maldito.
— Pronta? — ele segura minha cintura e me guia para fora do prédio e
a SUV já estacionada perto da entrada. Ele segura a porta para mim e depois
dá a volta para o lado do motorista. Devo ter cochilado porque acordo com
Bruno xingando e o carro em alta velocidade pelas ruas, que tem trânsito
livre a esta hora.
— O que está havendo? — indago ainda meio grogue — Por que
diabos está correndo tanto?
— Mantenha-se abaixada, bebê — diz, e sua voz está tensa. Ele olha
pelo espelho retrovisor a cada segundo. E eu noto que estamos sendo
seguidos. Tento olhar para trás na esperança de ver algo — Mantenha-se
abaixada, Alicia!
A voz dele está alta quando me recrimina, e faço o que me pediu, mas
ele me puxa e fico curvada o mais que posso e o cinto de segurança permite,
no banco.
— Me diga o que está havendo, Bruno — estou falando quase gritando
de nervoso.
— Não se preocupe, Alicia, não deixarei que nada aconteça a você.
Eu estou em apuros?
9
Bruno
— Filho da puta! — esbravejo furioso.
Acelero o carro pelas ruas, e o automóvel que tem me seguido desde
que deixamos a festa acelera também. Tento ver o motorista, mas não
consigo distinguir suas feições. Ligo para Carl, que tinha me seguido quando
saí com Alicia, e ele não atende. Que merda!
— Maldição! — Alicia acorda de seu cochilo, desorientada, e procuro
mantê-la abaixada. Não sei quem são esses caras que estão atrás dela, não
quero que essa noite acabe em tragédia.
Acelero o máximo que posso, mas, ao mesmo tempo, tento nos manter
seguros e não causar um acidente. Avanço todos os sinais vermelhos, já que
nesse horário praticamente não há carro nas ruas. Escuto um estampido e vejo
pelo espelho retrovisor o cara tentando acertar o pneu do SUV.
— Merda, merda! — tento ligar para Carl outra vez — Atende, filho da
puta! — ele atende dessa vez.
— Ross, estou atrás de você, fiquei preso no sinal, estou vendo o carro.
Vocês estão bem? — ele diz. Não espera resposta e continua: — Vou tentar
tirá-lo de sua cola. Não tenho ideia de quem está lá dentro, vidros escuros.
— Acho muito bom, não quero assustar Alicia com algo desnecessário
— ela já estava em pânico, óbvio — Tem outros com você? — pergunto. Isso
poderia sair do controle.
— Tenho, vou tentar tirar esses caras de cima de vocês — ele garante, e
eu mantenho a calma o quanto sou capaz quando acelero. Não tenho medo
por mim, mas estar sozinho e com Alicia vulnerável era motivo para me
deixar em alerta total e cuidadoso, qualquer falha de minha parte ela poderia
ser assassinada por esses filhos da puta ou eu perderia o controle do carro e
causaria um acidente. Mantenho contato com Carl e viro-me para Alicia, que
continua tentando se mover do seu lugar abaixada.
— Você está bem, Alicia? Mantenha-se abaixada, não a quero
machucada, apesar de que esse carro tem vidros blindados. — tento passar
calma para ela, apesar da adrenalina estar correndo pelo meu corpo a toda
velocidade. — Boa garota, vou levá-la para casa em segurança, bebê, eu
prometo.
Ela vira seus olhos arregalados de pânico para mim e assente. Melhor
assim, se fosse outra já estaria gritando feito uma desvairada. Eu admirava o
controle dela, era uma das poucas mulheres que se mantinha firme e calma
nos momentos mais adversos. Quando aceitei esse trabalho, naquela primeira
reunião com Matt, ele tinha deixando claro que sua irmã era uma mulher forte
e decidida, e agora descubro o quanto ela permanece fria e calma, apesar do
seu medo evidente.
— Droga! — o carro bate atrás da SUV, nos jogando contra o cinto de
segurança. Com o solavanco, o carro dá uma guinada brusca, batendo de
volta no asfalto. — Merda, Carl, tire esse filho da puta de cima de mim.
Porra!!! — grito para o telefone.
— O que está havendo, Bruno? — Alicia grita numa voz abafada.
— Mantenha-se abaixada, porra! — tento manter o carro no controle e
um olho nela ao mesmo tempo.
Ouço estampido mais uma vez, mas agora vejo também o carro de Carl
seguindo e ele tentando acertar o carro do salafrário que me acertou há pouco.
Jogo o carro em uma rua paralela, saindo das ruas principais.
— Mantenha-se seguro, Bruno, a polícia foi acionada — ouço a voz de
Carl no alto-falante do carro — Acertei um dos pneus dos caras, eles vão
fugir, e agora é o melhor a fazer, mas estou seguindo eles. Melhor levar
Alicia para um lugar seguro.
— Vou voltar ao meu apartamento. Siga para lá depois, quero montar
um esquema mais forte de segurança, um homem sozinho é furada. Isso
poderia ter terminado mal hoje.
Olho ao redor e verifico que não estou sendo mais seguido, no entanto
não facilito, percorro as ruas em alta velocidade. Só estarei bem quando tiver
Alicia protegida em casa.
— Claro!
— Falo com você depois — desligo e estendo minha mão para Alicia
— Tudo bem, já pode levantar se quiser.
Mas ela se mantém quieta, deve estar bastante amedrontada. Desacelero
mais o carro, minha vontade é parar, mas não faço nada disso. Cerca de dez
minutos depois, entro na minha vaga no meu prédio.
— Hei? — desafivelo meu cinto para que eu possa chegar nela, que
continua encolhida no banco do carro sem falar nada. Acabo saindo do carro
e dou a volta para seu lado — Venha aqui, está tudo bem — digo quando
abro a porta. Tiro seu cinto e ela vem para meus braços tão facilmente que
fico chocado. Ela tem lágrimas contidas nos olhos assustados — Hei, estamos
bem agora.
Meu telefone começa a tocar. Carrego Alicia para o elevador e pego
meu telefone. Alexander que está ligando.
— Carl está indo para sua casa, ele perdeu o cara — ele diz assim que
atendo, nem dando chance para eu falar. Cara, ele tinha essa mania — Está
tudo bem com Alicia? Tenho Matt na outra linha querendo falar com você.
— Estamos bem, diga para ele ligar daqui a pouco. E estou esperando
Carl. Percebe que precisamos ter mais cuidado?
— Vou reforçar as coisas por aí — ele diz — Atenda o Mattews e dê
informações da sua irmã.
Desliga como sempre faz. Alicia está tremendo quando passo meus
braços em volta dela e a trago de encontro a mim. Deve estar realmente
assustada para não lutar comigo e ficar de bom grado grudada em mim sem
começar aquela ladainha de mulher recatada dela.
Beijo seus cabelos bem no momento que o elevador abre em nosso
andar. Levo Alicia para dentro do apartamento. Ela desmorona no sofá e vou
pegar uma bebida para ela. Essa fachada durona dela podia ser enganosa.
Quando sirvo sua bebida, meu telefone toca. Matt.
— Seu irmão — depois que digo o que houve ele desliga e, logo após o
telefone de Alicia deve estar tocando, mas deve estar no silencioso, já que
não ouço tocar, porém a vejo tirá-lo de dentro da bolsa que carrega e atender
— Estarei aqui na sala, caso precise de mim. Vou fazer umas ligações para
saber se a polícia tem uma pista desses caras — ela assente e segue para
atender seu irmão no quarto.
Alicia
Estou tentando não entrar em pânico depois dos acontecimentos de hoje
à noite. Agora estou aqui no quarto com Matt ao telefone, buscando acalmá-
lo para ele não aparecer na casa de Bruno quase às três da manhã. Não o tinha
visto muito esses dias, para falar a verdade, só tínhamos nos falado ao
telefone, mas ter meu irmão surtando de preocupação era enervante.
Tínhamos chegado cerca de meia hora atrás, e Bruno estava ao telefone
tentando descobrir junto com os outros seguranças quem atentou contra nós
hoje. Saber que tinha estado tão perto de ser morta era terrível, e eu tenho a
forma mais estranha de lidar com esse tipo de coisa: sempre fico fria e calma
nessas horas. Carl tinha nos seguido até aqui quando Bruno conseguiu
despistar os caras.
— Quero ter certeza de que está bem, Alicia — sua preocupação é
nítida no timbre grave de sua voz — Que tal amanhã você e eu termos um
momento de irmãos, hein? Não nos vimos muito ultimamente.
— Não sei se será possível, Matt. Mas aviso a você. — digo pesarosa.
Eu sei que ele vive para o trabalho dele e não tem que dispensar todo seu
tempo comigo, já sou bem crescida para isso — Só se for um jantar. Posso ir
só ou tenho de levar o mala do guarda-costas?
— Ele é mais que necessário, ainda mais depois de hoje, querida — ele
tinha falado com Bruno em primeiro lugar. Não sei como ele tinha ficado
sabendo de nossa aventura, mas estar em casa era uma benção. — Agora
descanse, querida, te vejo amanhã.
— Te vejo amanhã — despeço-me dele e fico olhando para o nada por
uns instantes. Estou parada a um bom tempo, quando ouço baterem na porta
do quarto.
— Oi. Tudo bem? — Bruno abre a porta e entra sem ser convidado.
Caminha para a cama e senta ao meu lado bem perto. Ele coloca uma mecha
do meu cabelo para trás — Você está tão calma para uma mulher, que estou
com receio que tenha um chilique daqui a pouco.
— Não se preocupe comigo — digo.
— Como não? Esse é meu dever, bebê, me preocupar com você — sim,
eu era um dever, trabalho e nada mais que isso para ele. E por que diabos
acho isso um incômodo?
— Obrigada. Vou tomar um banho e deitar, chega de aventura por hoje.
Chega de ser alvo de assassinos — faço uma tentativa de gracejo, mas minha
voz trêmula denuncia que não estou tão calma assim. Minha ficha começa a
cair; eu poderia estar morta agora. E quando penso nisso, sinto as lágrimas
começarem a cair por meu rosto — Eu não entendo o porquê de eles
quererem me assassinar.
— Queima de arquivo, querida. — Bruno envolve seus braços mais
forte ao meu redor. Simplesmente não importa nada agora, suas palavras
cruas me atingem forte e as lágrimas saem aos montes. — Hei, não deixe que
isso abata você agora, sei que é forte, uma das mulheres mais fortes que
conheço. — ele me coloca em seu colo e me refugio só por um instante lá.
Sinto uma dor tão grande, era quase física de tão intensa. Por que eu
tinha de pagar pelos pecados de outros? Sinto minhas forças, as quais tanto
me orgulho, me deixarem, e a sensação de impotência e desestabilização me
invadirem, deixando um cansaço incomum. Não sei quanto tempo fico nessa
posição com Bruno me segurando, sem nenhum outro apelo a não ser de
conforto. Era o que eu precisava agora.
Sua mão corre para cima e para baixo pelas minhas costas e beija meus
cabelos. Sua amabilidade e carinho me surpreendem, eu não associaria a
palavra carinhoso para ele, nunca, mas sua gentileza me desarma e envolvo
meus braços ao redor dele mais forte. Sinto-o tenso debaixo de mim, mas só
faz me afagar gentilmente.

***

Acordo me sentindo incomodada e pegajosa, e ouço minha própria voz


soar angustiada no silêncio. Mais um pesadelo, mas agora era de
perseguições e pessoas querendo me matar. Evan; tudo isso era culpa dele.
Rolo na cama e percebo que estou com minhas roupas íntimas e sem o
vestido que lembro que estava usando. Bruno não está em lugar nenhum.
Levanto meio grogue e vou tomar um banho.
Olho para as horas: são seis da manhã. Estou me sentindo cansada
como se tivesse lutado num ringue de luta livre. Devo ter dormido e Bruno
ter tirado minhas roupas para eu ficar mais confortável e saído em seguida.
Lembro do seu carinho comigo e algo quente me envolvendo. Ele me fazia
sentir segura, apesar de tudo.
Bruno
Observo Alicia entrar na sala, e sua tristeza era palpável. Sinto algo
mexer dentro de mim, queria pegá-la no colo e fazer tudo desaparecer de sua
vida. Ela não merecia estar sendo ameaçada de morte.
Maldito marido idiota dela. Ela estava pagando por algo que nada tinha
a ver com ela. Se aquele idiota ainda estivesse vivo eu mesmo o mataria
lentamente.
Ela parece pronta para sair. Não tínhamos falado do que houve entre
nós na outra noite, e Alicia estava fazendo de conta que aquilo nunca existiu,
e não estou acostumado com as mulheres me ignorando. Ontem eu tinha sido
só um amigo, afinal, ela tinha passado por um momento estressante. Mas
hoje... percorro seu corpo esbelto envolto em um vestido marinho, deixando-
a com uma aparência comestível para caralho! E eu queria mais um gostinho
da viuvinha.
Viúva! Isso me lembra de que temos que conversar. Sei que ela não
gostará do que vou dizer.
— Bom dia, Bruno — ela para, indecisa. — Humm... vou estar pronta
para sair em dez minutos — anuncia.
— Por que não senta aqui, querida? — aponto a poltrona à minha
frente. — Temos que conversar.
Ela não senta e, pelo visto, não está muito satisfeita.
— Posso tomar meu café da manhã? — nossa viuvinha amanheceu de
mau humor. Dou um sorriso torto.
—Fique à vontade, bebê — ela olha feio para mim e sai da sala. Bom,
ao menos não a tenho chorando. Isso é ótimo, amo provocá-la e manter sua
mente fora de homens querendo tirar sua vida — Não demore, amor!
— Não sou seu amor, Ross — ela resmunga da cozinha. — E nunca
serei. Convencido!
Rio. Era bom ter a senhora ranzinza de volta, com essa eu posso lidar.
Alicia
— Não!
— Não seja imprudente, Alicia — Bruno diz para mim, carrancudo. A
conversa que ele queria ter comigo era para que eu não fosse aos eventos à
noite.
— Deixar meus eventos sem minha presença? Impossível! — como
assim, só um louco para achar que posso deixar minha reputação nas mãos de
outras pessoas — Como vou saber se as coisas estão certas se não vou estar lá
organizando?
Como vou fazê-lo entender que não deixarei um evento nas mãos só
dos funcionários, mesmo sendo eles capacitados para isso?
— Você viu ontem à noite que isso pode ser sua morte, Alicia — ele
fala firme — Você pode muito bem fazer as coisas a distância.
Fico olhando para ele. Ele é louco ou o quê?
— Meu trabalho não se executa a distância, senhor Ross — deposito a
xícara na mesa de centro e o encaro — Se eu contratei segurança foi para que
eu pudesse viver relativamente segura em todos os lugares.
— Ah, estamos chegando ao cerne da questão, senhora Duran.
Exatamente por querer sua integridade física é que até a polícia descobrir
quem são esses caras, você não sairá para essas festas a noite.
Porra! Ele não fala sério!
— Ok, posso falar com seu chefe? — peço com um sorriso falso para
ele.
— Está falando com ele!
O quê?!
— Estou falando do Alexander — esclareço.
— Alexander não é meu chefe! — claro que é, eu imagino, mas ele
continua: — Somos sócios, bebê, e ele não decide tudo na empresa. Ele acata
minhas decisões também.
— Quero falar com ele assim mesmo e com meu irmão — digo
categórica — Você não é o único segurança nessa firma, tenho certeza. Posso
solicitar outro.
— Fique à vontade! — ele estende seu telefone, que eu agarro como se
disso dependesse minha vida — Número um na discagem rápida.
Hum, por que diabos ele tem um homem em primeiro lugar na
discagem rápida? Pensei que seria do prostíbulo mais próximo.
Cinco minutos depois, estou fumaçando de raiva dessa firma de
homens trogloditas.
— Isso te deixa muito vulnerável, e esses caras não vão parar agora,
Alicia — Alexander está dizendo depois que eu esbravejei ao telefone com
ele. — Posso falar com Ross?
— Consiga um outro segurança para mim! Esse aqui é abusado. —
digo.
Estendo o aparelho, e ele pega com um sorriso largo para mim. Ele
parece muito satisfeito consigo mesmo.
— Ross... — diz e levanta, indo em direção à uma porta que sei que é
onde fica seu escritório. Provavelmente para falar em particular. Idiota.
Volto para o quarto, pego meu próprio telefone e ligo para Matt. Não
passaria o dia olhando para a cara debochada de Ross.
— Querida, estava quase ligando para você — Matt diz quando atende
— Você está bem?
— Não estou bem, Matt. Você pode vir me buscar? — como odeio
depender dos outros para as coisas mínimas. Só sei que o troglodita do outro
lado da sala está me tirando do sério, terrivelmente.
— O que houve?
— Nada de mais, só quero ficar com você o dia de hoje.
— Sim, irei cancelar uma reunião e já passo aí e fico com você —
estou parecendo um bebê chorão hoje. Desligo e ligo para o escritório para
avisar a Marcos de minha ausência. Ainda bem que não tenho nenhum evento
por esses dias, ou estaria enlouquecendo aqui.
Quando desligo outra vez e levanto minha cabeça, dou com Bruno na
porta do meu quarto.
Ele entra em linha reta para mim, e estou provavelmente de olhos
arregalados quando ele me puxa com força para ele.
— Então, você quer outro segurança? Deixa eu te lembrar por que você
gosta de mim, Viuvinha — ele me beija duro.
Asas de borboletas estão alvoroçadas na minha barriga quando abro
minha boca para receber sua língua dura na minha. Gemo involuntariamente.
Inferno, isso estava me deixando completamente excitada. Ele agarra meus
braços e afasta-me bruscamente dele, fazendo-me cair em cima da cama. —
Você veio para me deixar louco, bebê.
Ele paira acima de mim. Fico parada, ofegante, na cama. Ele estava
com raiva porque eu queria outro segurança? É isso?
— Pensando bem — ele tem os olhos azuis cintilantes. Imagino ser
desejo que brilha neles. — Acho que você é louco.
Ele levanta e me puxa da cama, me jogando por cima do ombro,
levando-me para fora do meu quarto.
— Ponha-me no chão, Bruno! — grito furiosa e esmurro suas costas.
— Vou foder você na minha cama, Viuvinha, para você não esquecer
quem está te dando prazer.
10
Deni
— Qual o problema de vocês?!! Querem todo o departamento de
polícia atrás de nós? — O homem grita, furioso — Uma perseguição em via
pública? Sério isso? Amadores filhos da puta!
— Mas temos uma informação importante — diz um dos homens em
pé em frente à mesa do escritório.
— Eu espero que seja boa o bastante para vocês virem aqui no meu
escritório — o homem continua — Porque estou perdendo minha paciência
com vocês.
— Claro, senhor. Descobrimos quem é o segurança que anda com
Alicia Duran — ele fala, ainda intimidado pelo olhar raivoso à sua frente. —
Bruno Ross, ela está morando na casa dele.
— Bruno Ross?! Tem certeza? — agora as coisas estavam ficando
melhores!
— Absoluta, senhor. Ele que estava no carro com ela na noite passada e
tinha outros seguranças dando reforço.
O sorriso do homem sentado à mesa era de satisfação.
— E vocês descobriram onde ele está morando, imagino. — fala
mansamente.
— Sim, mas a segurança do local é impenetrável.
— Para vocês, não para mim. E um aviso para vocês, idiotas: não
façam a merda que fizeram ontem. Já ouviram falar em fazer as coisas com
sutileza? — disse — Não irei ser tão bonzinho da próxima vez.
Com isso, ele dispensa os dois homens e recosta em sua cadeira,
definindo um plano.
Alicia
Bruno não ouve meus apelos para que me coloque no chão. Ele abre a
porta da suíte e entramos em seu quarto. Eu nunca tinha estado aqui... Mas
agora não tinha como parar e observar o local, estava muito ocupada com o
que ele pretendia fazer.
— Qual o seu problema, Bruno? Solte-me — grito inutilmente. Dessa
vez ele obedece, porém, caio em cima da cama larga. Tento fugir, mas ele
segura minhas pernas, prendendo-me debaixo dele.
Quão ridículos nós somos? Pessoas lá fora tentando me matar e nós
aqui agindo de modo infantil. Não sei o que ele quer provar para mim.
— Bebê, pare de pensar — é tudo que ele diz. Pouco depois somos
apenas braços, pernas e sensações entrelaçadas.
Segurando em minha cintura, sua língua vai fundo dentro de mim, me
levando para longe dos meus pensamentos coerentes enquanto eu empurrava
contra sua boca. Eu não conseguia me controlar. Eu queria montá-lo. Eu
queria mais dele. Onde foi parar a mulher controlada que eu sempre fui? Sexo
com Evan nunca foi tão... bom.
No começo até era prazeroso, mas no fim já não sentia mais que uma
obrigação, e nem isso mais serviu de alguma coisa. Por que não posso tê-lo
só mais uma vez? Quando estou prestes a explodir com seus beijos, ele
levanta, me deixando frustrada e ansiosa por sua boca. — Então você quer
outro segurança, bebê?
Ficamos nos encarando no que parece uma eternidade, quando ele
perde a luta e geme, segurando meu pescoço e beijando fortemente.
Estamos tão envolvidos um com o outro que não escutamos a
campainha tocando insistentemente.
— Quem é o filho da puta que... — Bruno resmunga frustrado quando
levanta, abotoando as calças que ele nem chegou a tirar — Fique aqui, não se
mexa, irei dispensar o idiota — era provável que fosse Matt, por isso, quando
ele sai, eu recolho minhas roupas espalhadas pelo chão e vou para meu
quarto. Saio de lá cinco minutos depois recomposta em parte, porque, vamos
combinar, frustração é como uma dor constante que nunca vai embora.
Quando entro na sala vejo Carl, e junto com ele está meu irmão, que
vem para mim dando um abraço de urso.
— Estava preocupado com você, querida. — ele diz quando beija meu
cabelo. Meus olhos encontram os de Bruno, que estão furiosos. Tenho
vontade de rir. Ele deve estar tão frustrado quanto eu. Bem feito! — Arrumou
sua mala?
Matt me pergunta, tirando-me dos meus devaneios. Fazer as malas? Por
quê? Antes que eu responda, Matt continua:
— Você não queria outro lugar para ficar? Então, ficará lá em casa,
afinal, esses bandidos podem já saber onde você está e podem tentar outra
vez...
— Matthew, tenho certeza que sua irmã ficando aqui nada irá lhe
acontecer — fala Bruno, e sua voz não deixa dúvida que ele está com muita
raiva — Agora, na sua casa não tenho certeza, já que isso foi descartado
desde a primeira vez que decidimos onde ela ficaria — ele olha firme para
mim — Mas isso cabe a ela decidir, afinal, Alicia não é nenhum bebê que não
saiba o que é melhor para ela.
Droga, estava cansada disso tudo. Quando abro minha boca a seguir,
percebo que sou muito estúpida:
— Bem, acho que ficar aqui seja o melhor a fazer — Ai, Alicia, você
está ficando louca! Vejo a cara de satisfação de Bruno e me arrependo
imediatamente da minha decisão. — Mas ainda quero passar o dia com você,
Matt, afinal cancelei meus compromissos para hoje. Vou pegar minha bolsa,
já volto.
Bruno
— O que está havendo com você e Alicia? — essa pergunta era uma
que eu não gostaria de responder para Matt. Assim que ela saiu da sala em
busca dos seus pertences ele virou-se para mim, desconfiado.
— Nada que seja da sua conta, Matthew — digo — Onde vocês estão
indo? Por que vocês insistem em fazerem as coisas sem combinar com a
segurança?
— Vou levar Alicia para fora da cidade um pouco, ela precisa relaxar
— ele diz. — Falei com Alex antes e ele providenciou uns seguranças para
nos acompanhar.
Quando eu penso que as coisas podem melhorar, elas só pioram. Olho
para Carl, que tinha se mantido calado até agora, e vejo por que ele estava
aqui. Bem, eu não iria nessa aventura, tenho outras coisas além de ser a babá
de Alicia. Se eles queriam brincar com a vida dela, não poderia fazer nada a
respeito.
Deixo-os saírem e vou para meu escritório. Ligo para Alexander, ele
tinha me dado esse caso e agora estava se metendo sem conversar comigo.
Não consigo relaxar no tempo que estou trabalhando, na maior parte da
manhã, nos relatórios que faço para a empresa. Devo ter demorado mais que
devia, quando percebo já passa da uma da tarde. Estou levantando da mesa
quando escuto a campainha tocar.
— Quem inferno é agora? — verifico quem está lá fora e paraliso. Puta
que pariu, como ele encontrou minha casa? — Olha, se não é meu amado
irmão! — faço uma reverência zombeteira para ele e dou um passo ao lado, o
deixando entrar.
— Quanto tempo, irmãozinho — Deni entra na minha sala parecendo
um rei fodido olhando ao redor — Esperava mais de você ao virar as costas
para sua família, irmão, mas... — ele aponta meu apartamento — Isso é tão...
você.
— O que você quer aqui, Deni? Além de me insultar?
— Não posso visitar meu ingrato irmãozinho mais novo? — ele abre o
botão do terno e senta no sofá, cruzando a perna, muito à vontade. Seus olhos
azuis, tão parecidos com os meus, são frios e calculistas como sempre foram.
— Não, não pode. Se eu quisesse ver você, eu iria à sua casa, querido
irmão, afinal sei onde você mora — digo, frio.
— Ao contrário de mim, que tenho de descobrir por acaso — ele
levanta a sobrancelha e verifica ao redor outra vez — Mora só?
— Como descobriu onde moro? E por que quer saber da minha vida?
— rebato — Isso nunca te interessou antes.
Ele sorri
— Nosso pai queria saber onde anda seu filho mais novo — disse,
como se isso justificasse sua presença aqui. Eu não confio nele, alguma coisa
eles querem de mim.
Eu já tinha há muito tempo atrás renunciado aquelas pessoas que se
diziam minha família. Eu não tenho nenhuma vontade de ter algo a ver com
eles ou com o que eles fazem.
Olhando meu irmão no seu terno Armani, muito à vontade, como se
nenhuma preocupação do mundo pudesse tirar esse ar de frieza do seu rosto,
lembranças que queria esquecer ressurgem na minha mente.
Quando eu completei dezoito anos, anunciei para meu pai meu desejo
de ir para as forças especiais. Ele tinha sido categórico quanto a isso; não, ele
não queria nenhum de seus dois filhos servindo para qualquer corporação que
não fosse a da família Ross. Mas eu não tinha vontade de ingressar na sua
empresa, eu deixava isso para Deni, que gostava de ser o espelho do nosso
pai em tudo. Sempre tinha sido uma competição para quem chamava mais
atenção do senhor Ross.
Minha mãe era neutra, não tomava partido para nenhum de nós, mas eu
sabia que ela também não queria que eu fosse para as forças especiais.
Porém, como sempre fiz aquilo que sempre quis da minha vida, me inscrevi e
fui aceito em todos os exames. No dia que comuniquei que estava indo, meu
pai deu o ultimato: se eu fosse, esquecesse que eles existiam e que a partir
dali eu não seria mais seu filho. E que fizesse um favor a todos nós, que não
aparecesse mais na sua porta.
Então, foi o que fiz; deixei para trás minha família, com seus valores
deturpados e sua empresa de fachada. Eu não estaria perdendo muita coisa,
no fim das contas. Fui embora naquele mesmo dia. Isso foi há dez anos, e
agora meu irmão aparece aqui na minha porta? Eu tinha levado um tempo
para decidir que tipo de pessoas eram minha família, mas eu já sabia há muito
tempo, só não queria admitir para mim mesmo.
— Aconteceu alguma coisa com a mamãe? — eu ainda sentia falta
dela, apesar de tudo. Ele ri mais uma vez.
— Sua preocupação é comovente! Mas mamãe está mais saudável que
você, Bruno.
— Então faça o favor de cair fora da minha casa, Deni, aqui não é lugar
para sua "alteza real" — digo e caminho para porta, abrindo-a em um convite
mudo. Ele não se mexe do lugar.
— Relaxa, irmão, não vim aqui brigar com você, só saber de você.
Somos irmãos, lembra?
— Quem esqueceu esse pequeno detalhe foi você e seu querido pai.
Agora, se me der licença, eu tenho trabalho a fazer.
— Falando em trabalho, em que está envolvido agora, já que as forças
especiais chutou seu traseiro? — ele parece tão desinteressado que fico em
alerta máximo. Aprendi que quanto menos demonstrava interesse por algo,
mais ele queria saber a respeito.
Eu conhecia meu irmão bem demais para saber que tinha algo muito
estranho com essa sua pergunta. Que ele não deixaria sua torre de marfim só
para saber de mim depois de tanto tempo para se dignar a saber se eu estava
vivo ou não.
— Meu trabalho não é da sua conta...
— Descobri que você é sócio em uma empresa de segurança e estou
pensando em contratá-los. Estou tentando com isso, unir nossa família outra
vez — diz e levanta, andando até a janela.
O quê? Isso estava muito errado, eu precisava descobrir o motivo desse
súbito interesse do meu irmão em mim. Será que meu pai tinha passado parte
da fortuna para meu nome? Só algo relacionado ao dinheiro poderia deixar
meu irmão louco e fazendo bobagens.
— Por que não vamos logo ao que interessa, Deni, eu não tenho o dia
todo — digo e volto a sentar no sofá. Ele também volta a sentar. Estou
ficando impaciente com seu joguinho maldito, nunca fomos chegados, nunca
tivemos afinidades de irmãos, e isso não ia mudar agora.
— Estou ficando cansado da porra do seu jogo, Deni!
— Calma, meu irmão, além de ser a ovelha negra da família, os anos
não fizeram nada com sua paciência e cabeça quente. — ele diz com um
sorriso, mas continua, levantando a mão: — Tenho uma proposta para lhe
fazer. — diz — Quero que assuma a segurança da nossa empresa e deixe de
ser um Zé ninguém. Podemos fazer isso em família.
Ele só pode estar de brincadeira!
Alicia
— Você esteve tão calada o dia todo, Alicia — Matt diz do outro lado
da mesa onde jantamos, em seu restaurante favorito.
Estamos em uma sala privada, para minha segurança. Carl e mais dois
seguranças estavam ao lado da porta parecendo serem do serviço secreto
americano. Nós tínhamos voltado do haras onde Matt mantinha um cavalo
para ele, quando queria passar um dia relaxante. E eu até me diverti, mas
aquela sensação de insegurança tinha persistido o dia todo, fazendo com que
eu ficasse, a maioria do tempo, pensativa. Me perguntava o que Bruno tinha
feito o dia todo, já que ele não veio conosco. Pelo que ouvi de Matt, Alex
preferiu acatar minha decisão e mudar de segurança. Bruno deve estar muito
enraivecido comigo por isso.
— Não tenho nada, estou pensando no trabalho — digo e lhe dou um
sorriso — Mas talvez eu tenha me acostumado a ser sozinha esses últimos
tempos e não saiba mais do traquejo social. — digo para disfarçar sua
curiosidade sobre mim.
— Tenho minhas próprias conclusões, irmãzinha — ele beberica seu
vinho, seus olhos são preocupados — Notei certa tensão entre você e seu
segurança, querida.
— Tensão é o que mais exala de nós quando estamos na mesma sala,
Matt — estico minha mão para minha própria taça de vinho e bebo para
retardar ainda mais essa conversa. Esse assunto estava fora da pauta hoje.
Dou um sorriso tenso, e Matt só me observa com o cenho franzido.
— Mas você não tem de estar sozinha, eu sempre estarei aqui para
você, não importa o que aconteça, Alicia.
A noite seguiu sem que ele insistisse mais no assunto, o que mais que
agradeci por sua perspicácia. Freddie Mercury canta ao fundo How Can I Go
One, e fico penso onde tudo isso vai dar. Minha vida por um fio e um caso
sem sentido eram mais do que eu posso lidar.

Como posso continuar a partir de hoje?


Quem pode me fortalecer em todos os caminhos
Onde posso estar seguro?
A onde pertenço?
Nesse enorme mundo de tristeza
Como posso esquecer
Aqueles lindos sonhos que compartilhamos
Eles estão perdidos e não consigo achá-los
Como posso continuar?

Eu tinha tantos sonhos, e isso perdeu-se no caminho, e agora os que


ainda posso realizar estão sendo quase tirados das minhas mãos por uma
pessoa louca que acha que de alguma forma os ameaço.
São onze da noite quando Matt me deixa de volta no apartamento de
Bruno, e Carl me acompanha até a porta. Não tive notícia dele o dia todo e
não sei o que vou encontrar quando entrar por essas portas.
O apartamento está vazio ou Bruno está dormindo, coisa que acho bem
difícil, ele sempre dorme depois de mim. Carl tranca a porta, dá uma olhada
em todo apartamento e confirma que ele não está. Onde diabos ele foi?
— Vou fazer uma ligação, Alicia, vou ficar aqui até Ross estar de volta.
— Carl diz quando sai da sala me deixando lá, sem saber o que fazer. Merda!
Resolvo ir para meu quarto, mas no caminho escuto a voz de Carl no
escritório de Bruno e paro.
— Onde diabos você está, Ross? — ele está dizendo. — Sério? Cara,
você não tem noção de nada, mesmo.
Ele escuta por um momento.
— Sim, ela está bem e... — ele escuta. Depois diz, irritado: — Não sou
você, Ross! Você andou bebendo?
Não fico lá para escutar sua conversa unilateral. Sigo para meu quarto.
Esse dia foi longo demais.
11
Bruno
Fico olhando para Deni depois de sua proposta, e rio alto. Isso é
hilário, sinceramente.
— Não sei qual a graça, irmãozinho — ele parece chateado com minha
atitude.
— Você é engraçado. — falo e faço minha cara de jogador de pôquer
para ele — Deni, qual é o motivo disso tudo? Porque convenhamos, você tem
um motivo muito forte para estar aqui na minha casa.
— Você se tornou muito desconfiado, Bruno. Eu tenho interesse nos
seus serviços de segurança, qual o mistério nisso?
— Bem, deixa eu esclarecer para você: não tenho nenhum interesse de
trabalhar com você, deixei isso para trás há dez anos, Deni. Então, procure
outra empresa. E essa conversa acabou.
Levanto e o convido a se retirar. Ele para à minha frente antes de sair:
— Pense na minha proposta, será vantajoso para nós, e isso fará bem
para você, deixará de ser um reles segurança nessa empresa que você
trabalha. — ele bate no meu ombro em um aperto — Vou esperar seu
telefonema aceitando minha proposta. Pense nisso como um retorno ao lar,
Bruno.
Idiota!
Não respondo, e ele suspira indo embora. Tenho certeza que essa não
será a última vez que o verei.
Ligo para Carl, já que minha protegida fugiu de mim hoje. Fico
sabendo que eles estão passando o dia fora da cidade. Talvez eu precise de
uma folga também, depois de receber a visita surpresa de Deni. Eu preciso de
uma boa dose de álcool no sangue para tirar toda a raiva acumulada ao longo
de dez anos de nenhum interesse da minha família sobre mim. E agora, de
repente, me vejo repleto de lembranças que mantive esquecida durante todo
esse tempo longe deles.
Uma hora depois estou na sala de Alexander, chateado além da medida.
Sou um cara que não me aborreço facilmente, mas me vi nesses últimos dias
sendo levado ao meu limite com a interferência de Alex na minha vida.
Como agora.
— Se acalma, porra! Sua imaturidade ainda pode nos causar problemas
sérios, Ross — esbraveja Alexander quando sua mão bate no tampo da mesa.
— Estou calmo. — digo — Alexander, eu não interfiro na sua vida!
Então não se meta nos meus assuntos! — minha voz, ao contrário da dele,
está calma.
— Não me importo com quem você tem seus casos, mas quando você
se envolve com a irmã de um amigo e ainda ela sendo uma cliente da nossa
empresa, isso me faz interferir, caralho! — ele devolve — Matt pediu-me
para enviar outra pessoa quando sua irmã pediu por isso, e ele faz tudo por
ela.
Merda! Alicia era a mulher que me levaria à morte, isso era certo!
— Foi um mal-entendido, e ela já reconsiderou isso — falo — Ela vai
continuar comigo e assunto encerrado, goste você e Matt ou não. — levanto e
caminho para fora de sua sala, deixando-o lá.
A mania de querer controlar tudo é chato demais para mim. Passo na
minha sala, onde mal estou indo ultimamente, e fico o resto da tarde. Não
tenho vontade de voltar meu apartamento vazio. Deni infectou minha casa
com sua presença inconveniente.
Quando estou saindo para ir para casa, no fim da tarde, encontro alguns
dos seguranças juntos na recepção saindo para um happy hour, e acabo indo
junto com eles. Afinal, não tenho nada para fazer até amanhã.
— Anda sumido, Ross — diz Salvatore do outro lado da mesa, no bar
lotado que fica a poucos quarteirões do escritório. — A nova cliente está
dando trabalho, como sempre dão? Ou essa tem consciência do perigo que
corre? — ele enrosca os braços ao redor da loira do lado dele e me dá um
sorriso debochado. Deve estar sabendo que estou sendo chutado no traseiro
por Alicia com a ajuda do Alex.
— Nada que me preocupe, Benacci — dou um sorriso de tubarão para
Helen, fazendo-o rosnar na minha direção. — Helen, minha linda, quando
você cansar da cara velha e feia do seu marido, deixe-me saber, querida! —
pisco para ela e bebo meu conhaque, peço outro e sou atendido
imediatamente por uma coelhinha da playboy disfarçada de garçonete.
— Vejo que você não tem medo de ficar com sua cara bonitinha
remendada. — Sal resmunga e levanta, puxando Helen para a pista de dança
do outro lado do bar. Rio da sua exasperação. Eu não entendia por que ele era
meio louco quando se referia a Helen. Ela era linda, mas mulher tinha de
sobra por aí.
Perco a conta de quantos conhaques tomei, e estou sentindo que perdi a
noção do tempo quando meu telefone toca mostrando que é Carl, o novo
segurança de Alicia. Dou um sorriso quando atendo:
— Carl, você cansou de ficar com minha garota?! — digo — Ou ela já
cansou de você?
— Onde diabos você está, Ross? — ele diz — Porque você não está
fazendo seu maldito trabalho aqui...
— Fique longe da Alicia, isso é um aviso, meu camarada! — nem sei o
que falo, já que minha fala está enrolada. Os conhaques tinham feito mais
efeito do que eu achava e estava interferindo no meu maldito julgamento das
coisas — Ela não é... para seu...
— Sério, cara?!
Eu começo uma ladainha de ameaças sem sentido para Carl e depois
lembro que não sei se Alicia está bem. Sou um jumento mesmo. Pergunto
para ele onde ela está, e ele me dá uma resposta mal-humorada.
— Estou indo para casa... — resmungo para ele.
Droga, tinha bebido demais, isso era o efeito da minha família na
minha vida despreocupada. Essa merda estava vindo com força para cima de
mim.
Pego um táxi depois de me despedir dos caras. Entro e recosto no
banco, de repente sentindo que sou um homem sem qualquer direção na porra
da minha vida. Eu amava minha vida do jeito que ela estava, mas me vejo
agora questionando toda sorte de merda que jogam para cima de mim. O
motorista deve estar gozando da minha cara quando liga o rádio e Bryan
Adams começa sua voz mansa do caralho e canta Have You Ever Really
Loved A Woman?
Claro que não, e nem pretendo. Isso é perda de tempo, elas estão todas
lá fora querendo você, por que ter dor de cabeça com uma só? A imagem da
Alicia aparece na minha mente e eu a corto fora. Essa era a pior de todas. Tão
certinha! Já consegui dela aquilo que sempre quis em todas as mulheres, mas
sou a porra de um masoquista, ainda não me cansei dela, e ainda vou tê-la até
conseguir tirá-la do meu sistema.

Quando você ama uma mulher


Diz a ela o quanto é desejada
Quando você ama uma mulher
Diz a ela que ela é única
Ela precisa de alguém para dizer-lhe que durará pra sempre
Apenas me diga você realmente
De verdade, já amou uma mulher?

Esse Bryan não sabe porra nenhuma de mulher, porque eu digo todas
essas coisas piegas quando quero levar uma mulher para a cama e nem por
isso estou com elas hoje, e gosto disso do jeito que está.
No entanto, não consigo desligar meus pensamentos de Alicia e meu
corpo também não, porque só de pensar nela eu fico duro.
Praguejo com Bryan Adams. Ele estava certo: para realmente amar e
entender uma mulher, precisamos a conhecer por dentro, conhecer seus
sonhos, ouvir seus pensamentos, e eu não fazia nada disso. Eu só queria
entrar em sua calcinha e fodê-la até seus miolos estourarem, porém eu me via
querendo conhecer os pensamentos e sonhos de Alicia, muito... eu estava
começando a me preocupar com esses ...
Acho que o álcool não está me fazendo racionar direito.
12
Deni
Minha ida à casa do meu irmão tinha provado não ser de muita valia.
Precisava de uma forma de chegar em Alicia Duran, essa mulher poderia
estragar uma vida de negócios bem-sucedidos. A polícia poderia puxar a
ponta dessa corda e ela desandar em cima de nossas cabeças. Minha, do meu
pai e de nossos parceiros, e isso não era nada bom. E seria bem pior para a
mulher de Evan Duran, filho da puta ganancioso.
Entro no meu escritório e peço para minha assistente descobrir tudo que
diz respeita a Alicia Duran, até o tamanho do seu sutiã. Eu precisava chegar
nela antes que essa porcaria de caso explodisse e perdêssemos o controle
mais do que já tínhamos perdido.
— Mais alguma coisa, senhor Ross? — Betany pergunta, fazendo-me
voltar à realidade.
— Sim, quero saber tudo sobre meu irmão Bruno — digo — Tudo que
ele faz, aonde vai...
— Não sabia que o senhor tinha um irmão — olho para ela de cenho
franzido.
— Você não tem de saber de nada, só faça o que pedi — ela acena
rapidamente, saindo da minha sala. Tenho que me reunir com meu pai mais
tarde e isso, por si só, me deixava nervoso. O homem sabia como te fazer
sentir um inútil.
São quase oito horas da noite quando resolvo ir para a casa do meu pai,
mas, antes que eu saia, Betany entra na minha sala com um dossiê de Alicia
Duran.
— São só informações superficiais, mas pedi que continuassem
procurando — Betany me olha com expectativa.
Folheio rapidamente o documento, e nada de mais na vida da viúva de
Duran, só sua empresa que anda mal das pernas. Havia no dossiê a relação de
alguns clientes, reconheço alguns. Também as últimas festas que ela
organizou e suas próximas estavam aqui.
— E nada do meu irmão? — pergunto.
— As atividades do seu irmão não são fáceis de conseguir, mas estou
trabalhando nisso também, senhor.
— Ótimo, espero que até amanhã tenha algo.
Leio todo o documento no caminho da casa do meu pai, e um cliente
em especial chama minha atenção. Bem, vamos colocar a operação em
andamento.
Alicia
Eu sinto falta desses olhos azuis
De como você me beijava de noite
Eu sinto falta de como a gente dormia
Como se não houvesse nascer do sol

A letra de I Never Told You da Colbie vem em meus pensamentos, que


não param. Minha mente hiperativa está inquieta desde cedo. Devo ter
voltado ao meu momento de adolescente sonhadora, onde ficava com os
pensamentos fixos em alguém. Eu preciso tomar de volta as rédeas da minha
vida, que perdi quando Evan foi assassinado. Eu odeio esses sentimentos
turbulentos e não sei o que fazer com eles.
Pelo jeito, meu guarda-costas não estava tão preocupado assim comigo.
Saiu e está provavelmente bêbado e com um rabo de saia, como de praxe
acontece quando um homem sai para um bar.
Levanto e pego meu robe. O visto e vou atrás de algo para beber. Mal
me alimentei no jantar com Matt, adorava meu irmão, mas ele era enervante
com sua curiosidade sobre eu e Bruno. Essa tensão no meu corpo é tão
familiar que acho estranho que nessas duas semanas não tenho sentido nada
anormal. Meu corpo parece que deu uma trégua para mim. Saio do quarto e
encontro Carl na mesa da cozinha. Ele está bebendo algo em uma caneca, e
levanta quando me vê entrar.
— Precisando de algo, Alicia? — ele é tão calmo por fora que chega a
ser curioso.
— Pode sentar, Carl, estou sem sono, só isso — eu começo a preparar
um chá, e enquanto espero viro e encaro o homem à minha frente — Então,
você descobriu onde anda o dono da casa? — digo, me referindo a Bruno.
A cara de poucos amigos de Carl se acentua.
— Parece que nosso amigo tirou folga hoje — ele segura a caneca entre
as mãos enormes dele e olha para mim — Por que você quer outro segurança,
Alicia? Não se sente segura aqui?
Não sei bem o que responder, e viro com a desculpa de terminar meu
chá. Não quero falar com ninguém da minha vida particular, mas devo
imaginar que todos sabem que Bruno dorme com suas clientes, e eu não fui
diferente, não é mesmo?
— Não é isso, só não somos tão amigáveis um com o outro, nada de
mais.
— Não precisa desconversar, Alicia. Todos nós conhecemos o Ross,
ele sabe ser um tremendo babaca quando quer — Carl continua — Você tem
direito de pedir outro para mantê-la segura.
— Está se candidatando para o cargo, O'Nell? — a voz de Bruno
reverbera pelo cômodo. Pelo seu tom azedo da sua voz, ele está chateado. Eu
não me dou ao trabalho de olhar para ele.
— Ah, enfim a Cinderela voltou para casa — Carl debocha — E, pelo
visto, não está pronto para assumir suas responsabilidades.
Pego meu chá pronto e caminho de volta para meu quarto, passando por
Bruno na porta.
— Boa noite! — digo quando saio para ninguém em particular.
Tranco a porta do quarto e me sinto bem melhor depois que tomo meu
chá.
No outro dia de manhã acordo com o sol alto no céu, já que as luzes
derramam seus raios pelo quarto, e lembro que tenho de fazer Bruno me levar
até meu escritório. Pouco depois, estamos saindo sem grande alarde. Eu e
Bruno estamos silenciosos enquanto ele dirige atento pelas ruas.
Ele não comentou o dia de ontem, e eu muito menos, só acatou minha
decisão de ir trabalhar sem questionar, e fiquei chocada quando ele aceitou
tão facilmente, tinha levantado pronta para a briga.
Estou há pouco tempo na minha sala quando recebo um telefone da
Danila Arantes, perguntando se posso comparecer ao seu escritório para uma
reunião hoje. Eu não esperava mais que ela ligasse, depois de ter dito que
ligaria o mais rápido possível naquela reunião de semana passada. Estou com
um sorriso no rosto quando ligo para Marcos para ele pedir que Bruno entre
na minha sala, já que ele sempre ficava lá fora.
Instantes depois, ele irrompe na sala com um olhar estoico para mim.
Eu nunca o chamei aqui, enquanto trabalhava.
— Preciso estar no escritório de Danila Arantes, hoje às três — informo
tranquilamente. Ele só faz arquear a sobrancelha e assentir.
— Mais alguma coisa que queira informar? — diz sério. Que bicho o
mordeu de repente? Será que o álcool comeu seu lado idiota? Tomara.
— Por enquanto só isso.
— Quando quiser sair é só informar. — ele sai, e fico lá olhando
durante uns bons cinco minutos para a porta. Acho que estou começando a
entender a coisa com ele.
Merda, bem que fui avisada.
Estou entretida com meu trabalho quando Erica, da recepção, aparece
com um almoço para mim, coisa que não me lembro de ter pedido, e
agradeço a ela por lembrar:
— Só estou cumprindo ordem, Alicia — ela ri, seu rosto se tingindo de
vermelho — Bruno que pediu seu almoço, só vim entregar. — diz quando
deposita a bandeja na minha mesa e sai em seguida. — Bom apetite, e
lembre-se que você tem uma reunião às três.
Como ela sabe disso, se nem a Marcos eu contei? Só deve ser mais um
recado do meu guarda-costas, modo eficiente. Resolvo me alimentar, já que
está aqui. Estou morrendo de curiosidade para saber o que fez Danila mudar e
resolver aceitar minha proposta, quer dizer, acho que é para isso que ela
marcou essa reunião.
Bruno deve ter chamado a cavalaria para nos acompanhar ao escritório,
tem outro segurança com ele que nunca vi e um carro também nos segue.
Estou ficando realmente encabulada com tanta gente para me manter segura.
Acho tão desnecessário!
Danila me recebe com entusiasmo e um sorriso cordial, porém percebo
uma certa tensão nela. Mas estou tão feliz que ela não me decepcionou e
aceitou minha proposta. Ela não me fala por que resolveu me contratar.
Quando questionei, ela fez uma cara estranha e mudou de assunto. Bem, não
importa, isso era uma volta para as grandes empresas, já que muitos
desistiram de me contratar por causa de Evan.
Quando aperto sua mão em despedida, fora da sua sala, Bruno, que se
manteve em frente à sala mais uma vez, vem ao meu encontro, tenso. Ele me
guia com a mão na minha cintura em direção ao elevador, quando a boneca
Barbie do outro dia aparece na nossa frente.
— Bruno Ross, sabia que encontraria você de novo, querido. — ele não
sorri de volta para ela. Ela agora está fazendo cara de cachorro que caiu da
mudança. — Você prometeu me ligar, e não fez!
Hein?!
— Estamos de saída, senhorita.
— Adoraria que voltasse à minha casa — ela sussurra para ele quando
passamos.
Ele transou com ela? Mas as surpresas só estavam começando naquele
dia. Paramos na frente dos elevadores, e quando ele abre, foi para revelar uma
cópia do meu segurança dentro do elevador. Não bem uma cópia, mas muito
parecido.
O homem dentro do elevador com certeza era parente de Bruno. Os
olhos eram praticamente idênticos, só que esses eram frios, e um desconforto
desliza por mim quando escuto Bruno praguejar baixo ao meu lado.
— Mas que porra ele faz aqui? — a voz de Bruno transmite sua raiva
latente.
13
Alicia
O homem sai do elevador, parando à nossa frente, e volta-se para
Bruno com um sorriso. Formigamentos tomam meu corpo, e sinto o
desconforto de Bruno irradiando para mim, era como se estivéssemos ligados
e sua inquietude fosse a minha própria.
— Bruno, que coincidência encontrá-lo aqui — o homem diz, logo
após volta seu olhar para mim e estende sua mão — Deni Ross, o irmão. —
sim, isso era notável.
— Prazer — digo, não dando mais que isso. Não sei a razão do porquê
não queria ser cordial com ele. Acho que se devia ao fato de Bruno estar
prestes a explodir ao meu lado de tensão.
Eu aperto sua mão e largo o mais rápido possível quando Bruno segura
minha cintura e praticamente me arrasta para dentro do elevador e aperta o
botão para fechar as portas. Que droga foi essa?
— Estou esperando sua ligação, Bruno! — Deni fala antes das portas
fecharem. Olho para Bruno, vendo que ele tem os dentes trincados, sua
mandíbula tensa. Eles provavelmente não são tão chegados, pelo visto.
— Não falou com seu irmão? — digo, e ele me dá um olhar
carrancudo. Esse assunto deve ser delicado, então. Ele está tão sério essa
manhã.
Eu sustento seu olhar, e ele vem em minha direção, me fazendo andar
para trás até minhas costas baterem na parede do elevador atrás de mim. Ele
espalma suas mãos ao lado da minha cabeça, colando seu corpo ao meu.
Sinto sua respiração antes de sua boca cair sobre a minha, seus lábios
envolvendo os meus. Ergo minhas mãos para entrelaçá-las atrás do seu
pescoço, enredando meus dedos por seus cabelos macios, e gemo contra ele.
Eu provo sua língua e estremeço com luxúria. Escuto o barulho do elevador
quando as portas se abrem, então Bruno se afasta.
Droga, o que estou pensando beijando meu segurança no local onde irei
trabalhar em breve? Eu estava ofegante. Bruno consegue tirar minha
compostura. Sinto-me aliviada por não encontrar ninguém lá esperando
quando saímos do elevador, já que não havia pensado em uma desculpa
coerente para dar do porquê estar ali agarrada com meu guarda-costas. Mas
algo continua martelando no meu subconsciente, e antes que me pare me vejo
perguntando:
— Quando foi que você transou com a Barbie Malibu? — surpreendo a
mim mesma por ir por esse caminho. Droga, nunca tive que fazer esse tipo de
pergunta para homens, e agora estou vermelha de constrangimento por isso.
Mas, afinal, faz dois dias que andava rolando na cama com esse homem,
tinha o direito de perguntar.
— Vamos. Não podemos ficar o dia todo aqui, esperando seus
amiguinhos tentarem acertar um tiro em você. — ele diz quando me leva
para o carro que está nos esperando.
Ele está ignorando minha pergunta?
— Então, senhor Ross? — digo quando sento ao lado dele no carro —
Você...
— Alicia, eu não tenho caso com duas mulheres ao mesmo tempo —
ele me corta — Pode me acusar de várias coisas, mas isso não faço.
Realmente, difícil de acreditar nele.
— Sério? Não é o que seus colegas e amigos seguranças dizem de você
— viro meu corpo para que eu possa olhá-lo — Pelo que ouvi, você não
passa de um prostituto que não pode se segurar em suas calças.
Ele não responde, mas vejo seu queixo duro e suas mãos apertarem o
volante quando ele sai com o carro no tráfego da tarde. Quero ir para o
escritório e digo isso para ele, que só assente. Enquanto isso pego meu bloco
de notas e faço anotações das ideias que tenho para a decoração da festa de
um dos meus próximos trabalhos.
Quando chegamos, mais tarde, vou direto para meu escritório sem hora
de sair daqui hoje. Tenho receio de voltar para a casa de Bruno e continuar
fazendo as asneiras que ando fazendo com ele, mesmo dizendo para mim
mesma que não vou continuar com isso. Fazia muito tempo que não sentia
essa frieza na barriga quando pensava em estar com um homem.
E sou ainda tão jovem, o que andei fazendo nesses últimos tempos?
Casar jovem causava essa monotonia em todas as mulheres? Falta de
interesse de estar fazendo sexo com seu marido, como tínhamos no começo
do relacionamento? Por que para eu e Evan ter sexo nos últimos tempos era
coisa muito rara. Mas agora eu queria estar na cama com meu guarda-costas
todas as horas. Estou ficando devassa igual a ele! Maldito homem prostituto.
Bruno
Eu merecia ser chamado de nomes piores por ela, eu realmente era um
cara sem nenhum pudor e pegava aquilo que me interessava, mas o que está
me preocupando não é isso, é o motivo de Deni estar no escritório e aquele
encontro de mais cedo. Que porra ele quer?! Ele se apresentar para Alicia era
ainda mais estranho, Deni não era um cara que era gentil por natureza.
Merda! Estou ficando paranoico quando o assunto é Alicia. Eu não
tinha essa preocupação com outras clientes, eu as fodia, não ficava pensando
se eu não seria capaz de mantê-las salvas ou não.
Nos dias seguintes, nada acontece com relação a novas tentativas de
atacarem Alicia, mas em contrapartida, eu e ela estávamos numa trégua
silenciosa. Não conversamos sobre aquele dia que encontrei Evy na recepção
e ela abriu a boca para estragar meu dia. Odiava quando as mulheres não se
tocavam quando o homem já tinha feito passar muita água sob a ponte e elas
não interessavam mais. Eu e Alicia estávamos nos entendendo melhor do que
eu esperava. Bem, estávamos fodendo mais do que eu imaginei. Eu sabia que
seria por pouco tempo tudo isso, mas não quero que pare. Eu precisava de
mais dela a cada dia que passava.
Naquele dia, quase duas semanas depois da visita de Deni, ele volta a
me ligar no meu telefone de casa querendo uma reposta para sua proposta
descabida e, claro, não aceito. Não sei como ele conseguiu aquele telefone,
afinal não está na lista telefônica. Ele tem feito isso durante aqueles dias,
várias vezes.
— Por que você não se dá bem com seu irmão, Bruno? — Alicia está
deitada ao meu lado na cama em um dos dias que bati o telefone, mais uma
vez, na cara do meu irmão. Era onde mais ficávamos quando estávamos em
casa, na minha cama, para ser exato.
Fico calado por um momento. Não quero falar disso com ninguém, eu
não falava de minha família nem para meus melhores amigos, só quem sabia
da minha família era o Alexander, mas ele não falava disso por aí.
— Tudo bem se não quiser falar, eu entendo — diz Alicia, e agradeço
por ela não insistir, isso só me aborreceria e não quero estragar nossa trégua
com conversa de travesseiro, isso não estava na relação que eu queria com
ela. Bem, para ser claro, com mulher nenhuma, mas de alguma forma Alicia
estava se infiltrando em mim de uma maneira que me assustava pra caralho.
Para fazê-la esquecer de Deni, eu a empurro de bruços na cama e
começo a beijar e lamber todo o caminho da sua nuca e suas costas sexy pra
caralho. Eu amava beijar a viuvinha e deixá-la tonta de desejo. Minhas mãos
têm vontade própria e descem para sua bunda. Seguro apalpando os globos
arredondados, e ela empina mais para mim.
— Bebê... — dou pequenas mordidas por toda extensão de suas costas,
minha língua fazendo redemoinhos na base de sua coluna, e escuto seus
gemidos abafados pelo colchão — Você está com fome? Vou levá-la para
jantar...
— Hummm — ela resmunga quando levanta sua bunda sexy para mim.
Ela emite sons essencialmente femininos de prazer.
— O que você disse? — pergunto quando mordo duramente seus
glúteos e continuo descendo por suas coxas e panturrilhas. Espalho mordidas
delicadas e lambo cada uma delas lentamente. Puxo seus quadris para cima,
deliciando meus olhos com a visão do seu corpo. Ela está molhada e corada,
suas dobras estão inchadas de nossa brincadeira de antes. Droga, eu estou
morrendo aqui... — Vamos lá, vamos sair e jantar... — provoco.
— Bruno, não seja idiota... — bato minha mão em um tapa firme em
sua bunda.
— Que boca suja, bebê — digo com um sorriso, mas ele murcha
quando ela levanta e senta de frente para mim.
— Você bateu em mim? Não é suposto você me proteger, senhor
segurança? — ela está carrancuda — E quero que me leve para...
Avanço e beijo sua boca atrevida antes que ela comece uma nova
ladainha. Fecho os dedos ao redor de sua garganta, não uma ameaça, mas em
um gesto de possessão que me abala. Eu estava querendo demais sua
submissão, e ao mesmo tempo amava seu jeito durão que, no fundo, não
passava de um mascaramento de sua fragilidade. E eu quero sua fragilidade
também, além de seu corpo gostoso e doce pra caralho.
Meus dedos dobram e deslizam por seu pescoço, e a beijo mais
profundamente.

***

Estamos no meu restaurante favorito, e descubro que Alicia ama


comida tailandesa, assim como eu. O cheiro forte de tempero e iguarias está
em todo o ambiente dentro do estabelecimento e me deixa salivando.
— Você me trouxe aqui de propósito, Bruno Ross? — diz Alicia
enquanto esperávamos nossa comida — A comida tailandesa tem essa
característica afrodisíaca, você sabe. — ela está vermelha. É tão bonito ver
uma mulher que se diz resolvida corar quando fala de sexo. Só a alusão disso
já deixa minha pequena megera enrubescida.
— É mesmo? Não sabia disso — digo com um sorriso. Merda, estou
sorrindo tanto com Alicia, outra coisa que não faço tanto genuinamente com
outra mulher. Geralmente quando dou um sorriso é com quartas e quintas
intenções.
Ela tem relaxado mais nesses últimos dias, a Alicia tensa e retraída
estava mais descontraída. Ela devia se divertir mais em vez de só pensar em
trabalho. Fico me questionando às vezes por que uma mulher jovem como ela
é tão séria e não tem muitos amigos. Durante esse tempo todo que ela está
comigo, ela não pediu para sair e encontrar com outras pessoas. Só trabalho e
trabalho e, lógico, Matt. Mas seu irmão não contava.
— Posso perguntar algo? — digo. Ela me olha, desconfiada.
— Acho que sim.
— Como era seu casamento, Alicia? — ela fecha seu semblante e seus
lábios franzem quando encara a mesa à sua frente. Aquele olhar era de uma
mulher que não tinha mais confiança nos relacionamentos, e devo imaginar o
porquê de ela tê-lo em seu belo rosto agora.
— Acho que esse assunto não é da sua conta, Ross. Não temos esse
tipo de relacionamento — ela olha ao redor — Por que está demorando tanto
nosso jantar?
Então temos mais coisa em comum do que imaginávamos. Ela não
gosta de falar de sua vida tanto quanto eu não gosto de falar de minha família
querida.
Deni
Observo meu irmão e Alicia Duran no restaurante onde os segui, e fico
surpreendido quando vejo a troca entre eles. Eles têm um relacionamento
amoroso? Pensei que ele só fosse seu guarda-costas. Estou tão enraivecido
com ele. Fiz aquela idiota da Danila contratar Alicia para ter a chance de me
aproximar dela, mas meu maldito irmão estragou minha oportunidade quando
não me deixou aproximar nem dez segundos da mulher. Trabalho em vão que
fiz, e ele se mete mais uma vez no meu caminho.
Sempre foi assim, seu jeito certinho de ser, sempre o menininho
politicamente correto! Foda-se isso. Agora ele não pode ser a barreira entre
eu e Alicia Duran. Eu tinha de ter acesso a ela, já que os caras que
contratamos só traziam mais estardalhaços para o caso. Espero enquanto eles
estão imerso em uma conversa íntima e me aproximo.
Alicia
— Você é um provocador, Ross — digo olhando para o homem à
minha frente. Ele tem um olhar que diz o quanto era um conquistador, um
homem acostumando à rendição de todas as mulheres, e parecia que eu não
era exceção à regra. Mas o que eu via era mais que isso, às vezes.
Agora ele tinha um sorriso provocante nos lábios, ombros relaxados,
apesar de estarmos em um lugar público, de uma forma que me dizia que ele
estava apreciando nossa noite juntos, tanto quanto eu. Apesar da nuvem negra
de quando estávamos esperando o jantar, quando ele perguntou do meu
casamento, agora ele tinha só flertado a noite inteira comigo e, bem... eu
estava me divertindo sem nenhuma cobrança.
Eu tinha me permitido isso esses dias, sem cobrança, sem culpa ou
remorso, só prazer pelo prazer. Éramos adultos com tesão, afinal. Não me
importo se serei julgada por meus atos que só dizem respeito a mim mesma.
Eu adorava ser alvo daqueles lindos olhos azuis, o calor líquido que fazia
meu núcleo apertar cada vez que eu era alvo de sua intensidade.
Estamos envolvidos um no outro, e não percebemos que tínhamos
companhia até ele falar, ao menos eu não percebi até agora:
— Ora se não são vocês outra vez! — diz uma voz masculina, que
lembro bem, ao lado de nossa mesa, fazendo com que olhássemos para ele.
— Alicia, enfim nos encontramos de novo. Da outra vez não tivemos chance
de falarmos, meu educado irmão não permitiu isso.
O irmão de Bruno está ao lado da nossa mesa, e a mudança nele é
incrivelmente rápida quando cumprimenta Deni friamente.
— Mais uma coincidência, Deni? Isso já está ridículo até para você —
Bruno chama o garçom com um sinal para pagar o jantar, enquanto fala. Deni
senta-se à mesa sem ser convidado e me olha com um sorriso.
— Desculpe a grosseria do meu irmão — ele está dizendo. Eu não
estou entendendo nada disso. A única coisa clara para mim é que eles são
estranhos demais um com o outro. — Estava jantando aqui quando vi vocês e
vim cumprimentar.
— Deni, Alicia não está interessada nessa sua conversa mentirosa —
Bruno fala — Sabemos muito bem que você está me espionando. Muitos
encontros por acaso, não acha?
— Estamos aborrecendo você com essa conversa, não é mesmo? —
Deni ri para mim, piscando um dos seus olhos azuis tão parecidos com os de
seu irmão — Ele está sempre se aborrecendo com minha presença, e eu só
quero ter meu irmão de volta. Acha que estou sendo inconveniente, Alicia?
— Bem... — começo, sem saber o que dizer. Não conheço a história
dos dois.
— Vamos, Alicia — Bruno levanta e estende a mão para mim. Os dois
seguranças que tinham nos acompanhado estão em outra mesa e refletem
nossas ações se levantando também.
Eu dou um sorriso sem graça com um aceno para Deni, que está com
um olhar duro para Bruno, e quando percebe meu olhar ele muda para um
sorriso pesaroso.
— Até mais, Alicia, prazer ter conhecido uma namorada do meu
irmãozinho — diz. Quero negar que sou namorada do Bruno, mas sou
literalmente arrastada por ele pelo restaurante. Argh, ele sempre faz isso
quando Deni está perto.
— Seu irmão te chateia tanto assim? — digo quando sento com ele no
carro e ele arranca feito um louco pelas ruas.
— Quero que fique longe dele — ele avisa com voz dura — Ele é um
maldito lobo na pele de cordeiro. Cordeiro só quando quer ganhar algo com
sua fala mansa.
Fico calada, porque sinceramente não irei ver Deni outra vez e nem
tenho vontade de ter amizade com ele.
A preocupação de Bruno não tem sentido. Não procuro ligação com sua
família.
— Não tenho interesse por sua família, Bruno — digo eventualmente
— Portanto não tem com que se aborrecer com isso.
— Não se trata disso, Alicia — ele diz e olha rapidamente para mim —
Só não quero você junto dele!
— Ok, não é como se pudesse sair sem ter você ou outra sombra por
perto, não é? — digo. Nunca saio só, de qualquer maneira.
Dou um sorriso, e a tensão que eu nem tinha notado saiu dos meus
ombros. Mas ele também relaxa a cada metro que colocamos a mais de
distância entre ele e seu irmão. Isso estava me deixando tão curiosa. Ele liga
o som, e a música nos envolve dentro do carro. Ele estava voltando a ser o
Bruno charmoso do começo da noite.
— Quer esticar a noite, bebê? Hoje eu quero que você se divirta. — dá
um sorriso para mim — Aonde quer ir?
Aonde quero ir? Eu não sei o que é isso, faz um longo tempo. Sair só
por sair e passar uma noite agradável só me divertindo?
— Não sei... — dou de ombro e, de repente, sinto-me culpada por estar
aqui me lamentando da minha vidinha, enquanto tem coisas maiores que
minha falta de diversão acontecendo. Evan morto e uma pessoa ou pessoas
querendo me ver morta também. Era muito, e de súbito sinto vontade de
chorar, mas seguro minhas emoções, não quero essa fraqueza.
Recosto no bando com um suspiro e escuto a voz de Chris Martin,
cantando Clocks coldplay, invadir meus sentidos
— Acho que prefiro ir para casa. — digo por fim.
14
Alicia
Eu tive uma surpresa na semana seguinte: fui chamada pelo
departamento de polícia para comparecer lá. E fomos informados pelo
detetive responsável pela investigação da morte de Evan que o caso seria
encerrado.
Fico totalmente confusa, já que nada foi esclarecido até então. O que
aconteceu para que a polícia encerrasse o caso? Eles nada disseram do que foi
descoberto até agora, e acho muito estranho parar assim, de uma hora para
outra. Tinha sido atacada semanas atrás, e nada foi feito sobre isso? Estou
começando a ficar cada dia mais desconfiada disso tudo. Algumas vezes
cheguei a cogitar se Evan realmente estava morto. Mas depois lembro que o
vi em um caixão, isso era bizarro.
Bruno e Matt tinham ido comigo, mas estavam agora com o detetive
numa conversa particular fazia uns bons vinte minutos. Estou aguardando-os
na sala contígua, e parece que irei ficar aqui por muito tempo.
Meia hora depois, quando eles saíram visivelmente irritados, percebo
que não conseguiram arrancar nada da polícia.
— Temos uma reunião na empresa com Alex — informa meu irmão ao
chegar ao meu lado — Essa decisão da polícia vai nos causar problemas.
— O que você quer dizer? — pergunto, no entanto, posso imaginar que
isso pode ser minha sentença de morte declarada.
— Seu irmão quer dizer que a polícia pode estar assinando sua sentença
de morte — Bruno diz, como se lesse meus pensamentos, sem nenhum
preâmbulo vai direto ao ponto. Gosto disso, ao menos não fico só imaginando
as coisas. — Temos de ir — Ele segura meu braço quando me guia para fora.
Mantenho-me calada em todo o caminho para a empresa de Alex.
Cuidadosamente coloco minha vida em perspectiva, e acho que estou indo de
mal a pior a cada dia. Se a polícia não está mais preocupada se me mantenho
viva ou não, o que devo fazer daqui em diante? Me esconder mais do que
tenho feito? Medo afunda suas garras profundamente nas minhas entranhas.
Cada dia surge alguma novidade nada boa, enquanto fico presa ao meu
segurança, com medo da minha própria sombra. Porque, para ser sincera,
estou vivendo numa gaiola desde que fiquei viúva.
Encontro o olhar azul de Bruno pelo espelho retrovisor, sinto um anseio
profundo que me chama para ele. Queria seu toque agora, e minha garganta
fecha em dor com a súbita vontade de chorar. Por que isso me causa mais
medo do que a possibilidade de ser assassinada por esses criminosos que
andam atrás de mim?
Não sabia aonde estava indo meu caso, que era para ser de uma noite e
já dura semanas. Mas também tenho visto o afastamento lento de Bruno, é
como se ele estivesse aos poucos parando essa coisa entre nós. Os
pensamentos dele são obscuros para mim. Mas tenho de concordar com ele,
isso está indo longe demais e tem que terminar. Amanhã tenho uma consulta
com meu médico, minha consulta trimestral, e sei que com certeza não quero
complicar mais minha vida trazendo permanentemente um homem para ela e
levar a mesma situação que eu tinha com Evan. Não quero isso mais.
Bruno
— Precisamos de um plano de ação e uma investigação paralela —
digo para Alexander, na reunião que estamos tendo desde que chegamos do
departamento de policia há mais de duas horas. Temos andado em círculos e
nada ainda foi resolvido, ao menos para mim. Matt tem se mantido calado a
maior parte do tempo, noto que sua preocupação com Alicia é grande e, como
ele deixou claro, quer que continuemos a proteger sua irmã — Essa decisão
de encerrar um caso que mal começou? Tem algo de errado e vamos ter de
descobrir.
— Isso só está se arrastando, Bruno, e eu preciso de você em outro
lugar — Alex diz.
— O quê? — minha fúria ainda estava sob controle, mas ameaçava
escapar a qualquer momento. E neste instante estava direcionada para Alex
— De que porra você está falando, Marshall?
— Alicia pode ficar com outro segurança, porque preciso de você para
uma missão especial — ele continua calmamente, como se eu não estivesse a
ponto de estourar seus miolos bem aqui. — Podemos conversar em
particular?
Ele levanta e sai da sala de reunião, e não tenho alternativa a não ser o
seguir para a sala dele.
— Esclareça por que você começou a me tratar como a porra de um
empregado seu, Alex? — berro quando entro batendo a porta.
— Você precisa estar em outro lugar, não tenho outra pessoa melhor
que você, Ross — ele senta na ponta da mesa, cruzando os braços — Estou
precisando dos melhores caras dessa empresa para um resgate, eu preciso
daquela equipe que formávamos, e sei que você gostaria de voltar aos velhos
tempos — ele para, me encarando — Não é você que adora adrenalina? Bem,
estou contando com você.
— Como é que você resolve fazer algo desse tipo agora? — replico —
Se não percebeu, estamos com a segurança de Alicia por nossa conta!
— Sempre soubemos que esse departamento de homicídios nunca fez
nada para desvendar a morte do marido de Alicia, então qual a novidade?
— Não quero deixá-la agora. Não tão vulnerável.
—Desde quando isso te impediu antes? Desde quando se importou
tanto quando você precisava mudar de lugar?
— E desde quando você é esse cara sem coração? — pergunto e
levanto para sair, porque essa porra de reunião terminou. Alex ri e, pelo tom,
ele está debochando da minha raiva.
— Bruno Ross, você está apaixonado? — ele está rindo de verdade
agora — Isso é algo estranho de se ver, mas, no entanto, espetacular de
apreciar. Quem diria que viríamos isso um dia?
— Não estou apaixonado, Marshall, só não gosto de ser informado das
coisas dessa maneira e, além disso, quem ficará com Alicia agora? Se não
notou, a polícia não está mais se importando com esse caso.
— Alicia pode ficar com qualquer outro segurança, tenho certeza que
ela prefere. Pelo que ouvi de Matt, vocês dois não são exatamente bons
amigos. — diz.
Sim, realmente não somos amigos, temos sido uma mistura de coisas,
mas amigos? Não sei se aplica a nós esse título. Começo a pensar que esse
trabalho pode vir a ser uma desculpa, a oportunidade que surgiu de terminar
nosso caso antes que se complique mais, antes que eu a machuque. Mas não
estou me sentido tão entusiasmado com essa perspectiva de terminar.
— Ela vai ficar bem, Ross — Alex está dizendo. Eu não estava seguro
disso, algo errado estava acontecendo.
— Como diabos a polícia deixa um caso assim de repente? Sem
comunicar previamente a uma pessoa que pode se ferir com tudo isso? —
digo — Não posso aceitar ir nesse outro trabalho, não quero ser o responsável
se algo acontecer a Alicia.
— O que está havendo com você, Bruno? Desde quando você hesitou
em ir numa missão?
Nunca! Mas também nunca deixei uma mulher me dominar a esse
ponto. Bom, e isso não estava acontecendo agora.
— Está bem, estou dentro, mas quero o melhor cara aqui com Alicia
enquanto estiver fora — Não era porque estávamos dormindo juntos... Afinal,
quando eu saísse para esse novo trabalho nosso caso terminaria também.
— A manterei segura...
— Como anda a investigação?
— Marquei uma reunião para hoje à noite com ele, por que não vem?
— diz — Mas, pelos relatórios, Evan estava trapaceando com gente que não
devia. Pelo que Liam tem me informado — Liam era o investigador
particular que nossa empresa usava de vez em quando, quando queríamos
uma investigação paralela de algum cliente nosso. — Evan Duran estava
desviando dinheiro, muito dinheiro, fazendo aplicações em empresas que não
existiam, que foram criadas para esse fim, na realidade, e depois dizia que
perdeu todo o investimento, como se fosse um capital de risco. Só que ele
investia muito dinheiro. Muito estranho essas pessoas confiarem tanto.
Talvez esses caras nem queiram dar um fim na Alicia, talvez pensem que ela
saiba onde está o dinheiro desviado. Essa é a linha de pensamento de Liam, e
estou começando a acreditar nisso também. Porque, vamos ser sinceros, se
eles a quisessem morta, um atirador já teria feito isso. É só ir nessas festas
que ela organiza que não são seguras, onde qualquer um seria suspeito.
Precisamos focar e descobrir onde Evan escondeu tanto dinheiro.
— Será mesmo que ele ficou com isso? Pelo que soube, ele não deixou
nada em suas contas bancárias e, pelo visto, Alicia também não sabe — digo.
— Por acaso vocês já conversaram sobre isso? Já teve algum tipo de
conversa real com ela, além de estar dormindo com ela?
— Foda-se, Alexander! Você por acaso é algum santo? Pelo que
lembro outro dia, você estava dormindo com uma cliente também. — sorrio
quando vejo a carranca habitual surgir quando Lana é citada em uma
conversa.
— Era diferente!
— Realmente?
— Claro que sim, afinal estamos juntos agora. Enquanto você, sei que
muito em breve estará com outra diversão.
— Reunião encerrada. — Levanto. Essa droga de conversa acabou. —
Preciso falar com Matt.
— A verdade é tão chata, não é, Ross? — Idiota apaixonado.
Quando informamos para o irmão de Alicia nossos planos um pouco
mais tarde, ele não ficou muito satisfeito, mas acatou que sua irmã ficasse
com ele. Mas nós sabíamos que Alicia não ia aceitar isso, ela nunca quis ficar
debaixo da asa de seu irmão antes, imagina agora.

***

— O que está acontecendo? — Alicia vira para mim quando dou


partida no carro — O que vocês resolveram? Vão deixar de fazer minha
segurança também?
— Claro que não, Alicia — digo — Entretanto, temos de conversar.
— Sobre o quê?
— Aonde você quer ir? Casa ou escritório? — pergunto e ignoro sua
curiosidade.
— Escritório. —diz, calma.
Eu sabia que essa calmaria não ia durar quando informasse para ela que
estava partindo. Nunca fui o cara de compartilhar minha vida, essa
necessidade de ter outra pessoa. Eu não lidava bem com essa coisa emocional
forçada que tanto fascina as mulheres. Estava na hora de cortar os laços.
Alicia
— O que precisamos conversar, Bruno? — vou direto ao assunto
quando chegamos ao meu escritório. Ele tinha se mantido muito calado no
caminho para cá, e não tinha insistido em fazê-lo falar alguma coisa.
— Eu estou saindo para outro trabalho e você ficará no seu
apartamento, que já está pronto faz algum tempo — ele diz com uma
naturalidade que me choca, mas ele continua: — Ou você pode ficar com seu
irmão, o que eu aconselho a fazer.
Percebo que estou parada olhando para Bruno, em choque. O que
malditamente está acontecendo? Primeiro a polícia, agora estou sendo
deixada desprotegida pelos seguranças que meu irmão fez questão de tanto
trazer para minha vida? Eu pensei que agora, mais do que nunca, teria reforço
na segurança, e é exatamente o contrário?
— Ficar com Matt é o mais seguro para você... — levanto minha mão,
parando-o.
— Não se preocupe, Bruno. Isso, pelo visto, não é mais problema seu
— Bem, se ele não se importa de me deixar, por que eu lhe daria o prazer de
saber que estava me magoando com essa atitude de assumir outro trabalho
sem se importar comigo? Deve ter cansado de mim e encontrou outra cliente
disposta. Não precisava ter a mente de Einstein para saber disso — Vou
voltar para minha casa, coisa que já deveria ter feito.
— Não seja imprudente, Alicia. — ele começa.
— Imprudente? Eu? Não sou eu que estou pedindo para ficar sozinha
nessa, depois que a polícia anunciou que vai fechar o caso — estou
praticamente gritando com ele — Meu irmão concordou com isso? Quando
ele foi o único que moveu céu e terra para que a sua empresa me mantivesse
segura?
— Outro segurança ficará com você, e Matt não tem nenhuma objeção
com isso.
Ainda bem que não estava apaixonada por esse homem, porque do jeito
que ele estava dispensando seus serviços comigo, seria da mesma forma se
houvesse algum tipo de relacionamento sério entre nós. Mesmo sabendo
disso, eu sinto meu peito apertar pelo fato de que sou dispensável para ele.
Droga! Eu não posso acreditar que o deixei entrar, mesmo que um pouco, na
minha vida, que já estava uma bagunça e agora caminhava para piorar.
Uma batida na porta me tira dessa linha de pensamento nada lisonjeiro.
— Entre! — Eu preciso sentar, toda essa novidade está me deixando
fraca. Marcos coloca a cabeça no vão da porta, e faço sinal para que ele entre.
— Algum problema, Marcos?
— Na verdade, você perdeu uma reunião com um fornecedor para a
festa da Danila Arantes — ele diz.
— Por que não me ligou? — pego minha agenda e, sim, está lá. Que
droga! Tudo estava fora de lugar hoje. Bem, mas eu começaria a mudar isso
agora:
— Obrigada, Marcus, quando acontecer isso outra vez, por favor avise,
sim? — dispensando-o, volto minha atenção para Bruno.
— Eu preciso trabalhar, senhor Ross. Como viu, o dia de hoje não foi
nada bom — aponto a porta para ele também — Pode fechar a porta quando
sair. Está dispensado também.
— Não tão rápido, Viuvinha — ele diz — Ainda temos que conversar.
— Sobre o quê? Não temos nada para conversar, Bruno.
— Temos sim, sobre Evan... — ele deixa a sentença no ar. O que ele
quer saber sobre meu ex-marido?
— O quanto você sabe sobre o trabalho do seu ex-marido?
Para ser honesta, pouco sabia do trabalho dele, Evan nunca foi de ficar
discorrendo sobre o assunto. Como quase tudo em nosso casamento, isso era
errado e confuso. Ele mantinha coisas escondidas de mim, isso era fato.
Sempre dizia que o mercado financeiro era entediante, como se eu fosse
alguma dondoca estúpida, como se eu passasse o dia todo fazendo a unha e
pintando meu cabelo.
Idiota! Isso e toda a frustração que já tínhamos de sobra foram as
razões do nosso casamento ir ruim das pernas, além da minha incapacidade
de dar o que ele queria. Não sei se teríamos durado mais tempo casados se ele
não estivesse morto, agora.
— Sei tanto sobre isso quanto você, ou seja, nada — digo para Bruno
que espera minha resposta.
— Sabia que ele desviava dinheiro dos "clientes" dele durante o tempo
que foram casados?
— O quê? Está insinuando que eu sabia de suas falcatruas? É isso? —
Tinha sido casada por anos com Evan, mas nunca tinha sequer suspeitado de
nada. Para mim, ele era um simples correntista, porém isso parecia longe do
que ele realmente fazia.
— Claro que não, Alicia — ele me olha atentamente — Mas há algo de
suspeito sobre esses caras ainda não terem enfiado uma bala em você, talvez
eles a queiram viva.
— Já que você não está mais trabalhando nisso, não vejo razão para
falar com você. — Eu nada sei sobre Evan, mas estou com raiva do prostituto
Ross e quero deixá-lo saber disso.
— Alicia...
— Não foi você mesmo que disse mais cedo que a polícia estava me
sentenciando? Aí você achou legal e resolveu fazer a mesma coisa?! — grito,
furiosa.
— Não estamos abandonando você, só mudando algumas coisas — ele
chega perto de mim, estendendo a mão para meu cabelo — Já estava na hora
de nós terminarmos, e agora que Alex me colocou em outra missão, foi o
melhor. Foi legal enquanto durou.
Ele não disse isso! Cafajeste idiota!
— Sim — minha voz saiu fria e dou um passo para trás, pondo
distância entre nós. Estou no controle aqui, Ross não tinha o poder de me
machucar, não havia nada para machucar. Repito para mim uma e outra vez,
meus pensamentos são uma tormenta — Você foi uma bela distração para
tentar esquecer que me querem provavelmente morta. Nada mais que isso.
Observo quando seus músculos enrijecem sob o terno bem cortado, sua
mandíbula se aperta e seus olhos azuis ficam glaciais quando encontram os
meus.
15
Alicia
Observo quando seus músculos enrijecem sob o terno bem cortado,
sua mandíbula está apertada e seus olhos azuis ficam glaciais quando
encontram os meus.
— Você tem razão, Alicia, eu gosto de ser sempre a distração de
mulheres lindas — ele caminha para a porta — E elas sempre querem mais
distração. Elas gostam e sempre voltam para uma segunda rodada; eu que as
dispenso.
Ouvi-lo dizer isso foi como um tapa bem dado em meu rosto. Canalha
maldito! Tinha uma boa ideia de quem era Bruno, mas ele estava se
superando ou eu estou muito sensível com tudo isso.
Tenho medo que aconteça algo comigo. Ele podia ter seus defeitos, mas
fazia o máximo para não me deixar desprotegida quando saíamos. E agora
parece não dar a mínima.
Nossos olhos trancam-se um no outro, e nenhum de nós parece disposto
a quebrar esse clima tenso. Quando penso que acordei ao lado desse homem
frio hoje pela manhã, sinto vontade de me estapear por ter dado motivo para
ele ter o poder de me ferir mais do que já estou.
— Talvez sejam mulheres vazias, Ross. E essa conversa acabou —
digo e volto a sentar atrás da minha mesa de trabalho. Se ele queria ir, que
fosse — Não esqueça de fechar a porta — sim, fecharia no sentido figurado e
literal, Bruno Ross não teria outra chance comigo, o babaca pretensioso. Ele
hesita por um momento, porém sai sem dizer mais nada, o que agradeço.
Tenho vontade de jogar algo pesado na cabeça dele.
Respiro profundamente. Não vou ficar remoendo isso, não vou! Até
meu trabalho estou negligenciando por causa dessa confusão. Pego meu
telefone e ligo para meu fornecedor para tentar uma nova reunião.
Cerca de duas horas se passam quando, outra vez, batem na minha
porta. Eu havia ficado imersa no trabalho e nem vi a hora passar. Tiro meus
olhos da tela do computador e olho para a porta, onde Érica está.
— Sim?
— Tem uma pessoa aqui para falar com você, Alicia — ela dá
passagem para Cindy, que adentra minha sala com seu jeito espontâneo. Oh,
cara, eu não tinha tido nenhuma notícia sobre ela desde a noite que saí do
meu apartamento antigo. Nossa, nem agradeci a gentileza dela em me ajudar
naquela noite.
— Cindy, que surpresa! — vou até ela dando um abraço antes de fazê-
la sentar no sofá que mantenho em um canto.
— Você não apareceu mais lá e, desde então, não pude falar com você
— ela sorri olhando ao redor — E acabei descobrindo onde ficava sua
empresa. Vi seu irmão no seu apartamento e perguntei por você.
— Fico feliz que tenha vindo, querida — digo. Por que Matt foi ao
apartamento e não me contou nada? Cindy me avalia como se procurasse
alguma coisa fora de lugar em mim.
— Como você tem passado? — ela começa, e digo um resumo do que
tenho feito ultimamente, mas deixo de lado que sou caçada por algum louco
com uma pistola na mão. — Você não voltou mais à sua casa.
— Eu agradeço de coração por você me receber naquela noite em sua
casa — digo. Eu estava mesmo agradecida, tinha sido muito apavorante
chegar em casa e ser recebida por meu marido assassinado na minha sala de
estar.
— Imagina, Alicia. Fiquei feliz em ajudar, apesar de que seu irmão não
demorou em resgatar você — ela dá um sorriso gentil e afaga minha mão. —
Por que você tem um segurança bravo de plantão fora da sua sala?
O quê?
— Bravo? — O que o idiota fez agora?
— Fui revistada e tudo para entrar aqui, mas eu gostaria de ser
revistada várias vezes por ele, diga-se de passagem. — Ela dá um sorriso
malicioso. Ah, sim, o enganoso efeito Ross.
— Não se iluda, querida, aquilo tem mais veneno que uma naja — Soei
agora como uma mulher despeitada. Estou sendo ridícula, mas ele merecia
levar um soco no meio da cara por ser um babaca. — Não vale a pena. —
digo por fim.
— Ah, sim, percebo — Ela me dá um olhar de soslaio. Será que ela
percebeu que dormi com meu segurança? Era suposto que ninguém soubesse
disso. Ah, Alicia, que imaginação! Como ela saberia? Deve ser minha
consciência doendo. — Devíamos sair qualquer dia desses, Alicia, pelo visto
você não tem se divertido todo esse tempo.
Claro que me diverti, mas não da maneira que ela chama diversão.
Argh! Agora vou ficar sonhando acordada com o prostituto?
— Claro que podemos sair — digo para logo em seguida me
arrepender. Não posso levar Cindy para o perigo que hoje é minha vida,
posso pôr sua vida em risco, ainda mais agora que nem segurança tenho mais.
Ficamos de ligar uma para a outra, e pouco depois ela se despede e eu a
acompanho para fora.
Bruno
Saio da sala de Alicia com vontade de torcer aquele lindo pescoço dela.
Ela me atingiu e nem percebeu, mas ela tem razão; sou um merda mesmo.
Não queria terminar assim com ela, sempre sou charmoso quando se
trata de cair fora de uma relação, sempre falo mentiras, e hoje fui brutalmente
honesto e, francamente, não gostei de ter agido assim, ela está magoada. Isso
é uma droga.
— Eu não preciso dessa baboseira romântica e emocional — resmungo.
Encosto-me na parede em frente à sua porta e olho para o nada. Não sei
quanto tempo estou assim, quando a recepcionista para na minha frente
batendo seus cílios para mim.
— Senhor Ross, a senhora Duran tem uma visita. — diz fazendo-me
focar na outra mulher ao lado dela. Quem era essa? Precisava checá-la antes
que fosse falar com Alicia.
— Qual seu nome e quem é você? — falo brusco e sem um mínimo de
delicadeza. A moça começa a falar que era vizinha de Alicia e que se
chamava Cindy, que Matt disse que encontraria Alicia aqui. Depois de
verificar que ela falava a verdade, deixo Érica conduzi-la à sala de Alicia.
Preciso descobrir qual cara irá ficar com ela em meu lugar, eu não
confio em nenhum desses idiotas com ela. Mas não posso fazer nada para
mudar o que já foi feito. Ligo para Alexander.
— Ross...
— Quero saber quem ficará com Alicia, tenho de passar algumas
informações — digo bruscamente. Hoje Alexander foi para minha maldita
lista negra.
— Cara, você está sendo uma tremenda dor na bunda com essa história,
por que não assume de vez que a viúva pegou você de jeito? — ele está rindo
do outro lado — Ah, se você admitir, daremos um jeito e você fica fora desse
trabalho. Que tal, Don Juan?
— Foda-se, Alex, estou querendo trabalhar e deixar Alicia com uma
pessoa responsável! — esbravejo, fazendo a assistente de Alicia colocar a
cabeça para fora de sua sala, de olhos arregalados. — Mas você resolveu
assumir meu posto de zombeteiro agora?
— Você nunca foi tão fácil de irritar, Ross — diz — Mas dois homens
ficarão com ela, já que agora os "amiguinhos" dela podem achar que ficou
fácil ter acesso e alcançá-la.
Sim, esse era meu receio, eles acharem que poderiam agir livremente,
já que não tinha nada sendo investigado pela polícia.
— Já conseguiu alguma informação com nosso cara lá no
departamento?
— Ross, não é assim tão fácil ter essa informação, mas ele ficou de me
ligar o quanto antes. — escuto ele falar com outra pessoa, depois volta a falar
comigo — Tenho de sair agora.
— Envie os caras para minha casa, hoje — digo antes que ele desligue
— Alicia vai voltar para a dela, então preciso que eles fiquem atentos com
toda a segurança.
— Não conseguiu convencê-la a ficar com Matt?
— Não, talvez Matt deva falar com ela.
— Envio os homens para falar com você, agora realmente tenho de ir.
Tenho uma reunião com Liam, e ele não pode vir aqui na empresa, então
estou indo me reunir com ele.
Desligamos em seguida, e estou indo para falar com Matt, que tinha
nos deixado mais cedo a negócio, quando a porta de Alicia abre. Ela está
acompanhando Cindy, provavelmente para levá-la à saída.
— Senhoras, posso acompanhá-las? — claro que faço a pergunta,
porém vou de qualquer maneira aonde a viuvinha de olhar mortal for. Ela se
despede da amiga e volta sem nem olhar para mim. Bom, acho que agora
tenho uma inimiga mortal. Melhor assim, é o que digo para mim. Não tenho
tempo para isso. Nós dois sabíamos que esse dia chegaria, só que tinha vindo
muito rápido.

***

Quando estaciono no meu prédio, Alicia salta do carro como se mil


demônios estivessem atrás dela e segue para o elevador sem esperar por mim.
Bato forte a porta do carro, irritado. Ela estava sendo infantil sobre isso,
odeio quando a coisa sai do controle assim. Ela não poderia se pôr em risco
porque terminamos algo que não era mais nada que uma transa divertida. Por
isso não tenho caso sério, só leva a dor de cabeça. Quando acaba, as
mulheres, por mais que digam que só querem se divertir, acabam sempre
querendo mais.
Chego no elevador, e por pouco a porta não é fechada no meu rosto.
Fecho meu olhos e respiro fundo, antes que eu agarre Alicia e dê o que ela
anda pedindo com essa atitude. Inferno!
— Se você continuar com essa birra de criança que perdeu o pirulito,
eu não respondo por mim, bebê — digo com voz macia. Vejo como ela fica
tensa e se afasta até ficar o mais longe o possível de mim dentro do
confinamento do elevador. Ela não responde, e acho que sabe o que é melhor
para ela. Porque me desafiar acabaria com nós pelados antes de chegarmos ao
meu andar.
Quando entramos, ela vai direto para o quarto e, pelo visto, ela não vai
facilitar nossa vida sendo coerente.
— É, Ross, você está lascado. — falo comigo mesmo quando vou até a
geladeira e pego uma cerveja. Eu preciso de álcool no meu sistema para
aguentar a dose maciça de desprezo da minha viuvinha mal-humorada.
Não passou nem cinco minutos quando ela aparece na porta da cozinha
puxando sua mala.
— Estou pronta, senhor Ross — diz friamente. Seus olhos esverdeados
estão sérios, iguais quando eu a conheci, sem humor. Ela tinha mudado tanto
nesses últimos dias, estava mais relaxada, agora voltou a ser a mulher
empertigada de antes.
— Pronta para que, querida? — finjo que não me dou conta da mala ao
lado dela. — Pronta para jantar? Humm, temos de fazer, você sabe...
— Não se faça de idiota, estou partindo para casa, e não há nada que
me impeça de ir — ela efetivamente não está de brincadeira — Se você não
vai me levar, vou chamar um taxi. Coisa que já deveria ter feito e não vir aqui
informar a você.
— Por que não senta aqui e falamos civilizadamente, querida? —
aponto para a cadeira ao meu lado, mas só recebo um olhar raivoso em
resposta.
Alicia
Como não obtenho respostas dele, dou meia-volta e pego meu telefone
para pedir um táxi. Estou fazendo exatamente isso quando uma mão tira meu
telefone de mim.
— Por que é tão impaciente? Estou esperando seus novos seguranças
— ele diz — Então, por que não relaxa? Um dia a mais ou a menos não fará
nenhuma diferença, Alicia.
— Para você, que está acostumado com esse tipo de situação —
resmungo. Queria distância dele e ficar aqui não dava.
— Só porque fizemos sexo? Sério isso? — ele caminha de volta para
cozinha — Vou fazer o jantar, esteja convidada a vir também. Sabe que não
pode sair, não é? Mudei a senha da porta.
— Imbecil!
Volto com minha mala para o quarto e retiro meus sapatos quando me
jogo na cama. Ah, sim, agora lembrei por que não queria nada com ele! Bem
feito para mim! Merda, ele ficou com meu celular? Levanto e ligo o som,
esperando que esses novos seguranças não demorem tanto.
Escolho uma música alegre e tento entrar no clima descontraído, mas
nada parece injetar um pouco de ânimo ao meu mau humor. Fecho meus
olhos e trabalho minha respiração dentro e fora, dentro e fora.
Ouço uma batida na porta. Ignoro o troglodita e continuo de olhos
fechados.
— Alicia! Seu irmão está ligando para você. Quer que eu atenda e diga
para ele vir aqui colocar um pouco de razão nessa sua cabeça dura?
Ah, Matt, tinha de ligar agora. Abro a porta, deparando com ele e seu ar
de deboche, segurando meu celular entre os dedos.
— Quando terminar, o jantar estará pronto — avisa me entregando o
aparelho e voltando a me deixar só.
Retorno a ligação de Matt e escuto mais uma vez que estou sendo
imprudente, que não deveria ficar no apartamento que ele tinha
disponibilizado para mim.
— Você está mostrando meu apartamento para algum comprador,
Matt? — pergunto, tentando tirar o foco da conversa para outro tema. — A
Cindy me disse que você tem ido lá.
— Não, só estava dando acesso para um amigo do Alex fazer umas
investigações...
— Investigação? Para quê? A policia já não fez isso? — Que estranho
não ter sido informada de nada disso.
— Investigação paralela, Alicia. Não quero você com mais uma
preocupação. Não pedi que deixasse que eu resolveria as coisas em relação a
isso para você?
Sim, mas era muito incômodo ser deixada de lado de coisas que
envolvem minha vida.
— Bem, já que você não quer ficar comigo, irei ficar com você — ele ri
— E saiba que você irá cozinhar para mim, irmãzinha!
— Leve sua cozinheira, querido — ele com certeza aparecerá lá em
casa. Eu o amo demais, seu cuidado comigo às vezes era exagerado, mas eu
entendo, porque se fosse ao contrário, eu me sentiria da mesma forma.
Desligo pouco depois e volto a deitar na cama. Estou cansada, hoje foi
um dia atribulado de todas as maneiras.
Aumento o som, e Taylor Swift canta Wildest Dreams. Envolvo meus
braços ao redor de mim mesma, e antes de dormir, a letra da música me leva
para longe... Quer dizer, não muito longe assim...

Ele diz "vamos sair dessa cidade


Dirigir para um lugar afastado, longe da multidão"
Eu pensei "os céus não me ajudarão, agora
Nada dura para sempre...
16
Bruno
Pow, pow, pow...
Batendo um soco atrás do outro, há quase uma hora, meus músculos
estão pedindo clemência, mas estou tão puto que a dor é bem-vinda. A
imagem de Alicia magoada, mesmo quando ela acha que consegue esconder
de mim, me persegue.
Como eu fui acreditar que terminando com ela me sentiria melhor? Que
o tempo que tive com ela foi suficiente para eu desencanar da mulher? Agora
parecia que eu a desejava mais. Queria mais! Isso estava errado, eu nunca me
liguei a mulher nenhuma. Por que Alicia seria diferente? Por isso essa
decisão de partir, ficar longe, era a melhor. Droga, quem eu ainda estava
tentado convencer disso?
Os caras estavam atrasados, por isso resolvi vir me exercitar. Ficar
parado olhando as paredes era tentador demais, poderia me levar direto para o
quarto de Alicia e tentar seduzi-la mais uma vez. Ela tinha corrido para o
quarto como uma menininha desamparada quando chegamos mais cedo.
Trinco meus dentes, reprimindo o remorso por ter sido duro com ela. Porra!
Sei que ela tem estado frágil, sei que me aproveitei disso, eu nunca disse que
era um cara bonzinho, mas com ela sinto essa... Porra! Nem sei o que é isso.
Escuto a campainha da porta. Bom, devem ser os caras que Alexander
mandou.
Alicia
Acordo sobressaltada com meu próprio grito sufocado. Devo ter
dormido enquanto esperava a boa vontade dos meus novos seguranças. Noto
que estou com as mesmas roupas que estava usando durante todo o dia de
ontem. Droga. Estão encharcadas de suor.
Mais um pesadelo, deve ser meu subconsciente me preparando para
mais uma consulta com o Dr. Allan, meu ginecologista. A cada nova ida
reacendia uma pequenina esperança de que meu diagnóstico seria diferente,
que eu poderia voltar a ser aquela mulher de cinco anos atrás, que se sentia
feliz com coisas mínimas. Agora eu era uma sombra preocupada com coisas
mínimas, o contrário daquela Alicia.
Fui diagnosticada com endometriose logo que casei com Evan, e ela
tinha sido assintomática até então, mas quando engravidei e acabei por sofrer
um aborto espontâneo, foi um dos motivos que levou nosso casamento a ir de
ladeira abaixo. Os três abortos seguidos foram tão traumatizantes, que esses
pesadelos agora parecem pálidos comparado aos momentos reais que sofri
por não conseguir dar o filho que Evan queria.
Hoje em dia vou ao Dr. Allan a cada três meses para novos exames.
Minha endometriose causa infertilidade além das dores, mas os
medicamentos impedem que sejam piores, nem sinto dores mais assim, já que
minha medicação impede que minha menstruação desça.
Um ano atrás, foi quando tive o último aborto, e o doutor recorreu ao
tratamento por laparoscopia com laser, e hoje só tenho um dos ovários
funcionando, que é monitorado a cada vez que volto às consultas. Tem
grande chance de ele também ser retirado se a doença migrar. Eu não quero
voltar aos pesadelos de perder mais um filho, não quero ficar depressiva a
cada vez que isso acontecer.
Não quero trazer nenhum homem à minha vida para que eu volte a ser
cobrada por algo fora de minhas possibilidades de realizar. Sei que muitos
homens sonham em ter filhos, só não sou eu essa mulher a fazer isso por
nenhum. Eu até posso engravidar, porém não consigo levar uma gravidez até
o fim. Perder outro filho é algo que eu não quero passar de novo. Por isso,
sempre tenho pesadelos com bebês mortos, vários bebês. Cada dia minha
chance de um dia ser mãe é mais remota. Sonhos ruins me lembram disso
sempre, como hoje. As lágrimas queimam meus olhos, porque sinto a dor e
agonia dilacerante nos meus ossos. Me sinto tão pequena, às vezes.
Ainda para completar meus pesadelos de sempre, agora tenho mais um
a acrescentar: posso morrer a qualquer momento pelas mãos de algum
psicopata louco, que acha que sou uma ameaça. Sim, minha vida é uma
bagunça e eu estou sem controle dela, definitivamente.
Escuto a voz de Bruno me chamando na porta do quarto, onde havia me
trancado ontem.
— Alicia? Você está bem? Ouvi você gritando — ele está dizendo —
Posso entrar?
Levanto e destranco a porta. Ele está em pé só com sua calça de pijama.
Ah, ele voltou a usar! Mesmo com resquícios do pesadelo rondando minha
mente, ainda posso notar a gostosura do meu antigo segurança. Maldito
homem gostoso. Sua barriga musculosa era uma visão deliciosa.
Ah, Alicia, você gosta de viver no limite! Definitivamente. Mesmo eu
estando do meu próprio lado nessa história entre nós dois, ainda o desejo,
muito.
O senhor calça de pijama sexy precisava tomar do seu próprio remédio,
só assim saberia como é ser usado e descartado para aprender a valorizar as
mulheres que passavam em sua vida. Cafajeste! Era notável que meu senso
de autopreservação precisava ser revisto.
— Escutei seu grito. Pesadelo? — sua voz está preocupada e algo
brilha nas profundezas azuis de seus olhos. Talvez esteja lembrando-se de
como nós começamos nosso caso. Ele vindo me ver depois que tinha
escutado meus gritos de horror pela minha má sorte.
— Estou bem, Ross — digo e dou meia-volta, deixando a porta aberta
— Nada que deva se preocupar e tirá-lo do seu sono.
— Quer falar a respeito desses pesadelos? Já são duas vezes que você
acorda gritando na minha casa.
— Por que ainda estou aqui na sua casa? Não era para estar agora no
meu apartamento? — digo ignorando seu modo de referir-se a mim e sua
pergunta, pois não tenho vontade de falar dos meus problemas para ele.
Ele deve ter comprado a mudança de assunto, pois fala a seguir:
— Vim te chamar, mas você estava dormindo, provavelmente. — ele
vem para perto de mim — Pela manhã irei levá-la para sua casa. Eu irei
também deixar sua agenda com os novos seguranças para que eles planejem
seus dias sem nenhuma surpresa.
— Quem escuta você falar, poderia pensar que se importa comigo,
Ross — tento gracejar, mas minha voz sai em um sussurro melancólico.
— Só queria ver se você estava bem.
— Como pode ver, eu estou perfeitamente inteira, senhor Ross — dou
um sorriso sem graça para ele.
— Estava com saudade dessa Alicia "cheia de dedos" — ele dá um
meio sorriso.
— Nunca deixei de sê-la...
— Quero que isso tudo se resolva, Alicia, para que você volte para seus
amigos e sua vida, sem estar presa numa gaiola com medo de ser ferida
quando sair de casa. — ele fala e olha sério — E não deixe que nossa
situação afete você. Saiba que é uma mulher incrível, eu que não sou o cara
certo para entrar na sua vida agora. Faço um favor para você, indo embora.
Ele parece realmente convencido disso.
— É tarde, Bruno, e preciso tomar um banho antes de voltar a deitar.
Amanhã cada um tomará seu rumo, não é isso que você faz sempre? — digo
e não espero uma resposta, vou ao banheiro e tento lavar do meu corpo toda
frustração.

***

Achava que Bruno não se incomodaria em levar-me ao meu


apartamento na manhã seguinte, mas ele vem juntamente com os dois
seguranças que foram apresentados para mim quando os encontrei hoje mais
cedo na sala dele. Nate e Connor eram duas muralhas de músculos mal-
encarados. Eram meios assustadores esses dois. Entretanto não importa, não
vou ser amiguinha de nenhum dos dois, afinal.
Voltar para casa é estranho, depois desse tempo na casa do Bruno. Ele
me segue até meu quarto como se fosse o dono do lugar.
— Não acha que seus afazeres comigo já terminaram? — alfineto
porque sei que ele não gosta quando lembro que ele não vai estar mais aqui.
Dou a ele um sorriso malicioso, enquanto deixo minha mala em um canto
para desfazer depois. — Agora tenho dois em vez de um para cuidar de mim.
Boa escolha, hein? Agradeça ao Alex por mim, ele foi...
Ele me pega de surpresa ao me puxar de supetão, me agarrando pela
cintura. Minha respiração engata e tento empurrá-lo para longe. Não consigo
mais pensar sobre isso quando a boca dele cai dura na minha, porém não me
beija agressivamente, ao contrário; sua suavidade e carinho me deixam mais
surpresa que seu beijo.
Retribuo avidamente, pois sabia que não iríamos mais fazer isso, e era
uma despedida, sentiria falta dele, mesmo não querendo admitir. Meu pulso
dispara quando ele começa a caminhar, me empurrando em direção à cama.
Ah, droga, mais um passo e estarei me colocando em apuros sérios aqui.
Ele passa a beijar meu rosto, queixo, pescoço enquanto ofego sem
sentido, quando caímos num emaranhado de membros na minha cama.
Lábios quentes e mãos fortes estão por toda parte de mim. Bruno está por
cima, seu corpo duro e forte me tiram o fôlego.
— Como você é gostosa, bebê... —ele murmura, e eu não penso, só
sinto. Isso é só uma despedida. — Você é linda! A quero muito, bebê, não
importa o que aconteça daqui em diante, por esse momento você é minha. Só
minha...

***

Observo Bruno terminar de se vestir e faço minha cara de paisagem


quando ele volta seu olhar para mim.
— Cuide-se enquanto eu estiver fora, Viuvinha — sua voz está rouca
como se tivesse acabando de acordar — Não seja insensata com as ordens
dos rapazes.
— Não recebo ordens — digo e recebo um olhar carrancudo dele.
— Prometa que se manterá segura. — ele senta ao meu lado na cama.
— Se você se importasse tanto, não iria — digo, o fazendo levantar-se
— Não se preocupe, irei me cuidar. — garanto.
— Eu... — ele para, me olhando, e dou meu sorriso sem graça. Não era
para ser assim. Parecia que estávamos constrangidos um com o outro, e vê-lo
hesitar quase me faz rir. Bruno fodão Ross, receoso para partir. Seria hilário
se não fosse meio constrangedor.
— Está tudo bem.
— Até mais, Alicia.
Ele se vira bruscamente e sai fechando a porta do meu quarto
suavemente. Fico parada olhando o vazio, sem dar-me conta da lágrima
solitária que cai do meu rosto até sentir seu gosto salgado nos meus lábios.

***

Chego na minha consulta com o Dr. Allan atrasada, pois sair sem o
Bruno hoje foi muito estranho. E levando em questão as nossas últimas
ações, fizeram com que eu me atrasasse mais ainda. Estava acostumada com
seu jeito idiota de ser, mas que me passava segurança. Ainda precisava
confiar nos meus novos companheiros das próximas semanas.
— Senhora Duran... — a recepcionista tira-me dos meus pensamentos e
indica que já posso entrar no consultório. O Dr. Allan deve ter uns trintas e
oito anos, faz cerca de três anos que me consulto com ele. Essa consulta de
hoje é pura rotina, sei que nada de novo vai surgir da noite para o dia.
Ele diz que estou bem, só preciso ser mais otimista com minha
situação. Ele acredita que posso agora levar uma gravidez até o fim, depois
da laparoscopia.
— Alicia, pensei que não viria mais — ele fala quando me recebe na
porta, me indicando a cadeira em frente à sua mesa. — Como tem se sentido
ultimamente?
Doutor, tenho feito muito sexo com meu guarda-costas gostoso que
partiu hoje e me deixou a ver navios!
— Estou bem, doutor — digo séria. — Bom, parei a medicação ontem,
então, até agora, não sinto nenhuma dor.
— Ótimo, estamos no caminho certo, e daqui um tempo você poderá
engravidar — ele aponta para a mesa de exame — Já sabe o que fazer.
E lá vamos nós! Gosto do doutor Allan, mas essas consultas são
terríveis, ele me enche de esperança e medo todas as vezes que venho aqui.
Cada vez que diz que posso engravidar ainda, isso desencadeia meus
pesadelos. Que começa comigo grávida e perdendo meu filho em seguida e
sempre esse bebê se multiplica numa montanha de bebês mortos e acordo
sempre chorando e com gritos de agonia...
17
Bruno
Um mês depois
Nossa missão de resgate na Floresta Colombiana provou-se uma
missão suicida e infrutífera. A pessoa que tínhamos sido pagos para resgatar
nunca foi encontrada. As informações não batiam, e agora estamos todos de
volta para casa, sem fazer nosso trabalho. Isso era frustrante pra caralho! O
calor infernal dos trópicos era terrível, estava exausto, mas tinha de saber
como andava minha viuvinha predileta.
Não tinha obtido nenhuma notícia dela. Quando questionava Alex, ele
só dizia que ela estava bem. Essa porra não bastava, tinha que vê-la e saber
que tinha se mantido viva nesse último mês. Sei que nenhuma tentativa houve
contra ela. Isso era tão estranho, um maldito jogo de gato e rato. Nunca
sabíamos quando esses marginais poderiam atacar outra vez. Preciso saber
como anda as investigações do Alex.
Pela informação que tive de "Tico e Teco", os dois babacas que agora
estavam com ela, Alicia estava em uma recepção hoje em um hotel. Alguma
festa de algum figurão, e eu estou indo para lá.
Paro o carro em frente ao hotel, e um manobrista aparece, entrego
minhas chaves. Estou prestes a entrar quando sou parado na entrada por um
dos seguranças. Esse provavelmente não faz parte da Marshall.
— Convite e identificação, senhor — pede.
— Sem convite, mas sou segurança da senhora Duran — digo. Sei que
ele está fazendo seu trabalho e tento ser paciente, coisa que não ando tendo
ultimamente.
— Senhor...
— Ross — informo quando tiro minha carteira de identificação. Espero
que esse cuidado todo se aplique a todos que tentem entrar aqui sem ser
convidado, mas tenho certeza que se um "amiguinho" de Alicia viesse aqui
teria um convite para entrar.
Acabo entrando sem precisar apelar para outro meio e circulo à procura
de Alicia. Não a vejo em lugar nenhum, mas também a quantidade de pessoas
aqui é enorme, parece que toda a cidade resolveu comparecer ao evento.
Estou quase ligando para uns dos "Tico e Teco" quando a vejo.
Ah, merda! Alicia está linda em um vestido preto elegante, toda
feminina e delicada. Minha vontade é atravessar o salão e plantar um beijo
duro nos lábios dela, que neste momento ostenta um lindo sorriso para a
pessoa que fala com ela e que não dá para ver de onde estou. Excitação
percorre meu corpo furiosamente quando começo a pensar numa forma de
levar Alicia à minha casa hoje à noite.
Ah, Ross, você deveria deixá-la em paz. Vocês já tiveram suas chances.
Penso e, no mais, eu não repito cardápio. Mas vê-la me deixa duro e louco,
querendo ser o único homem que a terá daqui para frente. Estou fodido,
completamente.
Começo a me aproximar pelo canto da sala, quando paro petrificado no
lugar. Que porra era aquela? O que ele estava fazendo junto de Alicia? Vejo
vermelho quando me aproximo deles, furioso. Antes que eu abra a boca, Deni
me vê e abre um sorriso afetado para mim.
— Irmão, não sabia que frequentava esse tipo de festa — ele diz,
fazendo Alicia virar-se para olhar-me — Alicia me disse que você estava fora
da cidade.
— Eu quero você longe dela, Deni — minha voz é um sussurro tão
furioso que minha mandíbula dói do aperto que mantenho sobre ela. Viro-me
para Alicia, que está de olhos arregalados olhando ora para mim, ora para
Deni. — Venha comigo.
Seguro seu braço, ignorando sua tentativa de sair do meu aperto. Ando
até uma das sacadas, longe dos ouvidos de Deni, e a encaro.
— O que diabos você faz de amizade com meu irmão, Alicia? —
esbravejo ainda segurando seu braço.
— Solte-me, senhor Ross — ela fala calma, no entanto vejo que está
furiosa e o verde de seus olhos estão mais intensos. — O que deu em você?
Quer acabar com minha reputação, me arrastando por aí como um saco?
Estou trabalhando aqui, senhor Ross. E você não tem nada a ver com isso.
— Quero saber o que faz com meu irmão! — ignoro seu discurso. Eu
sabia que Deni queria me atingir de alguma forma e vou descobrir o que
diabos ele quer. Se aproximar de Alicia não é mera coincidência. Bastardo
filho da mãe! Ele quer algo, e vou acabar com seus planos.
— Seu irmão não é esse monstro que você diz, Bruno — ela olha para
mim — Ele foi indicado pela Danila Fontes para que eu organizasse esse
evento e, até onde vi, ele tem sido um cavalheiro.
— O quê?
— Sim, isso mesmo, seu irmão é o anfitrião do evento, senhor Ross.
Então eu sugiro que você se contenha com suas acusações, sim? — Ela passa
por mim e volta para o salão.
Sim, meu irmão, definitivamente, está de alguma forma interessado em
Alicia. Não acredito que ele vai começar esse joguinho só porque ele me viu
com ela.
— Ora, ora, você não perde a oportunidade de falar mal de mim — a
voz de Deni está carregada de ironia quando ele para na minha frente.
— Entre tantas outras empresas de eventos nessa cidade, você inventa
uma festa sem sentido e contrata Alicia? Deni, o que você quer? Seja breve,
não tenho a noite toda para você. — cruzo meus braços na frente do meu
peito e espero.
— Sabe, Bruno, nem tudo gira em torno de você. Você sabe — ele ri,
desdenhoso —E Ali foi muito bem recomendada por sinal.
— Quero você longe dela, ou eu vou acabar com você — minha
ameaça era um pouco demais, mas eu estava falando sério com esse idiota.
— Acho que não vai ser possível atender a você, irmãozinho — ele
começa a se afastar, mas para olhando por cima do ombro — Alicia e eu
temos planos!
De que porra ele estava falando? Apenas um mês longe e as coisas já
estão todas fora de controle? Por que Alex não me disse que meu irmão
estava rondando Alicia? Ela não sabe com qual cobra venenosa está se
metendo.
Alicia
O que Bruno está fazendo aqui?
Essa pergunta ronda minha mente pelo resto da noite. Não sabia que ele
tinha voltado de sua viagem. Ele tinha se mantido por perto a noite toda, cada
volta que eu dava ele estava lá. Parecia cansado, mas não foi embora, até que
eu mesma chamei um dos meus seguranças e disse que estava na hora de eu ir
para casa, aproveitando que Bruno sumiu de vista por um momento.
Estou caminhando para saída quando Deni Ross aparece na minha
frente.
— Indo embora?
— Sim, não precisam mais da minha presença aqui — sorrio para ele
— Espero que tenha gostado, senhor Ross. — Isso era tão estranho, toda vez
que o chamo de Ross não é bem ele que vem à minha mente. Outro Ross que
vem claramente.
— Você sabe que sim, esse será o primeiro de muitos eventos que você
organizará para mim, Alicia — diz charmoso. Eram tão parecidos, Bruno e
ele — Farei de você a mulher mais procurada da cidade. No bom sentido,
claro. Cada pessoa que queira uma festa excepcional procurará você.
— Você é muito gentil, senhor Ross...
— Deni, chame-me de Deni — ele tem dito isso no decorrer dessas
semanas que organizei às pressas esse evento para ele. Mas eu continuei
chamando-o de senhor Ross
— Claro. Bem, tenha uma boa noite, Deni.
— Dou-lhe uma carona para sua casa, já estou de saída também — ele
diz enquanto caminha ao meu lado para saída.
18
Alicia
— Dou-lhe uma carona até sua casa, também já estou de saída —
Deni diz enquanto caminha ao meu lado para a saída. Não acho que seja uma
boa ideia e declino o convite com gentileza. Ele é um cliente e não quero que
tenha ideias a meu respeito.
— Deni, é muito gentil de sua parte, mas tenho dois seguranças
esperando para me levar — sorrio afável para ele.
— Estou curioso em saber por que uma mulher como você tem dois
seguranças. — ele devolve o sorriso agradável. Entretanto, meu sorriso apaga
com a pergunta curiosa dele. Mas antes que eu responda, somos interceptados
por Bruno que vem no sentido oposto.
Pensei que ele já teria ido embora, mas vejo que me enganei. Ele não
estava satisfeito com Deni perto de mim. Eu realmente queria entender essa
animosidade que ele tem pelo irmão, sei que muitos irmãos não se dão bem,
isso é bastante comum, porém Bruno muda totalmente quando ele está com
Deni.
— Onde está indo, Alicia? — ele para na nossa frente, e noto sua cara
de poucos amigos para Deni.
— Estou sendo um cavalheiro e levando Alicia para casa, caso não
tenha notado. Uma mulher precisa dessas coisas de vez em quando,
irmãozinho. — Deni está sendo caçoísta, mas Bruno o ignora olhando fixo
para mim.
— Bem, Deni, como nós dois sabemos que você não é nenhuma dessas
coisas, eu mesmo levarei Alicia — estou me sentindo a droga de um osso
velho sendo disputado por dois cães raivosos aqui.
Mas estou cansada e com fome, e não ficarei assistindo esses dois
discutirem. Contorno Bruno e caminho para a saída, atrás das minhas duas
sombras.
— Boa noite, senhores — digo, deixando-os lá.
— Deni, melhor seguir meu conselho de mais cedo — ouço Bruno
falar, mas continuo meu caminho.
— Espera, Alicia. Eu a levarei para casa. — Bruno chega ao meu lado
— Dispensei os caras por hoje.
Sério?
Quando não digo nada, ele me guia para seu carro, que está parado
perto da saída, como ele sempre faz quando está comigo. Estaciona o mais
perto possível, sempre cuidadoso.
— Bruno, não vejo necessidade de você levar-me, passei um mês sem
seu precioso cuidado e, por acaso, ainda estou viva. — Fico parada ao lado
da porta do passageiro — Não tinha nada que dispensar os rapazes. É uma
hora da manhã e quero descansar...
— Estou tentando fazer exatamente isso. Entre — ele abre a porta para
mim, e acabo acatando sua ordem, não porque seja obediente, mas porque ele
agora é meu único transporte além de um táxi. Quando sento, o espero fechar
a porta, mas ele se inclina em cima de mim — E, Alicia, nunca aceite carona
ou porra nenhuma que Deni ofereça para você. Ele só está usando você para
me atingir, porque sabe que não gosto dele perto de você.
— Por que vocês não são amigáveis um com o outro? — não aguento e
pergunto, realmente estou curiosa. Mas não espero sua resposta — Não quero
que atrapalhe minhas oportunidades de ter minha empresa funcionando
normal outra vez, Bruno. Então, você ficar atrapalhando não dá.
— É uma longa história, querida, mas seja prudente ao menos uma vez
na vida, confie em mim, por favor — ele diz sem sua arrogância habitual, e
fico desarmada para continuar argumentando com ele. — Bom, vou levar
você para casa.
— Só não quero que continue atrapalhando meus negócios — digo, e
ele assente com ar de resignação.
Suspiro suavemente quando ele sai de perto de mim e fecha a porta,
dando a volta para sentar no banco ao meu lado. Recostando-me no banco
tento relaxar, mas minha fome é maior que meu cansaço. Quando estou
trabalhando esqueço de me alimentar, e não tinha comido praticamente nada
o dia inteiro. Deni tinha me procurado a pedido de Danila e tive de organizar
as coisas às pressas para tudo estar em perfeita ordem para a recepção. Tudo
acabou saindo perfeitamente bem, mas, em contrapartida, negligenciei
minhas necessidades básicas. Agora minha barriga está dando gritos
arrepiantes, chamando a atenção de Bruno para mim.
— Não se alimentou? Devia ser mais cuidadosa com você mesma,
Alicia — ele repreende, enquanto manobra o carro para o trânsito. As luzes
da cidade entram no carro, mostrando o perfil de Bruno quando viro para
olhá-lo.
— Pode parar em algum lugar para comermos? — peço, fazendo-o me
olhar carrancudo, provavelmente sabendo que, para eu pedir isso, tenho de
estar com muita fome, mas não diz mais nada.
Cerca de vinte minutos depois, conseguimos encontrar um restaurante
aberto, e é onde estamos sentados agora, esperando sermos servidos. Pedi um
sanduíche light no pão árabe e uma xícara de chá, levando Bruno a levantar
suas sobrancelhas para mim:
— Vai comer só isso? Sério? — diz balançando a cabeça.
— Vou dormir daqui a pouco — digo à guisa de explicação e tento
mudar de assunto — E como foi no novo trabalho?
— Não foi, mas não quero falar disso — ele faz uma pausa quando
somos servidos e segue logo após: — Quero saber como foi que se tornou
amiga de Deni.
— Esse assunto de novo, Bruno? Isso está ficando chato — me servi da
comida. Bem, eu aproveitaria muito bem minha refeição, se ele quisesse
brigar, ele que brigasse só.
Acabamos conversando durante a refeição de outros assuntos, algo que
agradeci internamente. Não quero tratar Bruno como um inimigo a cada vez
que estamos juntos. Eu estou tranquila com relação ao nosso caso, nunca quis
que nada fosse sério, mas sentia falta daquelas semanas juntos, me fazia bem
e distraía dos meus problemas. No entanto, não quero voltar a ter nada com
qualquer homem, e uma segunda chance com Bruno acabaria comigo
apaixonada por ele.
E tanto eu como ele não estamos preparados para isso. Para mim era
muito cedo e, para ele, seria só mais uma transa sem significado algum. Isso
era algo que eu não queria arriscar, mas quem sabe o que o futuro me
reserva?
Entretanto, não posso perder tempo sentindo pena de mim mesma. É
claro que é mais fácil falar do que fazer. Eu tenho de admitir que sinto falta
da cama e da casa do Bruno, de seu cheiro, a sensação de suas mãos em mim,
suas gracinhas idiotas, seus beijos que me tiram o fôlego, dele dentro de mim
da maneira mais completa possível...
— Alicia... Alicia? — a voz de Bruno expulsa sua imagem quente de
minha mente. — Você está bem?
— S-sim... — limpo minha garganta e bebo sofregamente o resto do
meu chá.
— Pronta? — diz apontando para meu prato — Para irmos?
— Claro.
No percurso até meu apartamento não nos falamos, e algo clica na
minha cabeça quando Bruno estaciona no meu prédio.
— Você dispensou meus seguranças, quem ficará aqui? — digo quando
ele abre a porta para mim.
— Eu ficarei, Alicia.
— Claro que não. — digo e ele empurra-me levemente para o
elevador, sua mão quente na base da minha coluna me faz lembrar do porquê
não o quero debaixo do mesmo teto que eu — Bruno, você aceitou esse
trabalho para ficar longe de mim e agora você voltou como se não tivesse
acontecido nada?
— Nunca deixo um trabalho, Alexander precisava de mim, Alicia —
ele diz como se essa fosse uma justificativa para seus atos antes de partir.
Bem, senhor Ross, você terá uma surpresa.
— Bom, então volte para seu trabalho, prefiro do jeito que estamos
agora.
— Não irei deixar você só, Alicia — sua expressão é indecifrável.
Entramos e ele, como sempre, faz a revista dos cômodos e, se isso era
para me acalmar, só me faz mais nervosa.
— Bruno, quero que vá embora! — digo quando ele volta para a sala
onde estou parada desde que entrei.
— Como?
— Precisamos deixar as coisas como estão, não preciso que fique aqui.
Os outros nem ficam aqui dentro comigo, ficam no corredor. E você pode
ficar lá também. — Pronto, resolvido.
— Está brincando comigo? Alicia, já ficamos mais próximos que isso,
ficar aqui dentro não fará a menor diferença. — diz cruzando os braços,
fazendo a camisa branca de mangas compridas evidenciar seus músculos.
Desvio os olhos para seu rosto.
— Claro que faz. Saia. Minha fase de distração acabou, Bruno. Você já
serviu para um propósito e, bem... não quero repetir meus erros.
Ele me olha fixo por alguns minutos que parecem uma eternidade, e
sem dizer nada caminha para a saída. Acho que acabei de magoar Bruno
Ross.
Deni
Observo a interação do meu irmão com Alicia. Maldição! Ele tinha de
estar de volta tão cedo? Tanto trabalho para ele estar na selva colombiana e
ele já está aqui atrapalhando meus planos. Eu tinha de ganhar a confiança de
Alicia, e meu irmão parece a droga de um carrapato colado nela. Um mês era
muito pouco tempo, mas não desistiria dela. E posso dar um susto em Bruno
por ser tão pé no saco. Pego meu telefone e faço uma ligação quando os sigo.
Devia estar fazendo algo mais útil, em vez de estar aqui nesse carro seguindo
meu irmão, mas tem coisas que só você pode fazer. E eu adorava ver Bruno
irritado quando me via.
Sorrio quando paro ao lado do restaurante e espero. Ele não devia ser
tão óbvio com sua irritação comigo. Desde muito cedo que nós dois
brigávamos pela atenção de nosso pai, mas agora eu só o queria longe do meu
objetivo: Alicia Duran.
Eu estive algumas vezes com ela esses dias, mas não tive nenhuma
chance de perguntar nada pessoal, ainda mais que não convém agora eu ter
essa atitude para com ela. Além de que, os seguranças não a deixaram em
nenhum momento só. Estou sendo pior que os homens que foram contratados
antes para pegá-la. Sutileza não está dando o resultado que eu esperava.
Mas talvez ela não tenha nenhuma informação para onde o marido
desviava o dinheiro. Descobri que a empresa anda mal das pernas, se ela
soubesse onde estava esse dinheiro, provavelmente usaria. Tenho de ter
tempo e paciência, coisa que não tenho.
E se ela lembrar dos assassinos que viu naquela noite? Ela tinha visto
um dos sócios claramente.
Bruno
Saio praguejando todo tipo de maldição que conheço.
Alicia Duran era doida de pedra.
Entro no meu carro e fico parado na frente do prédio de Alicia. Eu
deveria saber que as coisas com ela não iam ser fáceis e, mesmo assim,
dispensei os outros seguranças. Alicia estava consumindo toda minha
sanidade, eu não deveria estar correndo atrás dela dessa maneira. O primeiro
erro foi chegar ontem e ir atrás dela, o segundo foi achar que ela me aceitaria
em sua cama depois de dispensá-la; o terceiro, que estou ficando ligado
demais a ela e não prestando atenção no que deveria estar focado.
Ela me faz pensar em coisas que, até então, eu nunca tinha cogitado ou
que eu possa dar para ela, como assumir uma relação duradoura. E, além
disso, ela transmite sinais duplos; uma hora é fria, outra dá a entender que me
quer. Alicia está fodendo com minha cabeça. Estou aqui tentando ser um
homem melhor do que eu costumo ser, aí ela vem e diz que sou apenas a
porra de uma distração de problemas.
Porra!
O pior de tudo é Deni rondando. Isso me faz lembrar que tenho de
descobrir por que ele apareceu de repente na minha vida.
Pego meu telefone e disco:
— Bruno, que diabos faz ligando para mim a essa hora? — Alexander
resmunga mal-humorado quando atende.
— Desculpe interromper o interlúdio amoroso com a Patricinha, meu
amigo. — digo, rindo — Mas eu preciso que você me diga se tem alguma
novidade no caso de Alicia.
— Não temos uma reunião amanhã? — diz — Agora não é hora para
isso, Bruno. E, cara, vai dormir. Você acabou de chegar de um trabalho
exaustivo.
— Preciso ver outra coisa com você. Na verdade, preciso de um
investigador para descobrir algo para mim.
— Claro, amanhã nos falamos. E, Bruno, pensei que você estava feliz
em deixar Alicia em paz.
— E estou...
— Não parece, chegou hoje e... Onde você está agora mesmo? — ele ri.
— Estou em casa, por quê? — minto. Droga.
— Aposto que está na casa dela. Devia pensar no que anda fazendo,
meu amigo.
— Alex, te vejo amanhã — desligo rapidamente. Não preciso do
sermão do senhor certinho a essa hora.
Ligo o rádio do carro para distrair, sei que não poderei ir para casa e
deixar Alicia aqui sem um segurança, mesmo que ela esteja relativamente
segura em casa.

O problema com as garotas é que elas são um mistério


Algo sobre elas me intriga
Passei minha vida inteira tentando descobrir
Apenas sobre o que todas garotas são

A voz forte de Scotty McCreery soa dentro do carro, e tenho que


concordar com ele: as mulheres são um mistério.

***

São sete da manhã quando termino de falar com os seguranças de


Alicia. Eu tive de ligar para eles virem para ficar com ela, já que tenho coisas
para revolver. E, claro, não quero deixar a engomadinha irritada com minha
presença.
Entro no meu carro e dou partida, entrando no trânsito que a essa hora
está bastante intenso. Cinco minutos depois, pego uma pista livre e acelero
para me arrepender pouco depois. Estou distraído, pensando numa forma de
reconquistar Alicia, quando o pneu do meu carro explode, fazendo-me perder
o controle totalmente, fazendo-me bater forte no carro que vem em sentido
oposto.
19
Bruno
Meu ombro doía e meus olhos estavam cheios de sangue do corte que
tinha na testa, provavelmente. Constato isso quando eu consigo sair de dentro
do veículo. Devo ter ficado desacordado por alguns instantes. Estou meio
zonzo. Que merda tinha acontecido?
Ouço a sirene de ambulância, ou seja lá o que fosse, só sabia que estava
fazendo a minha cabeça latejar. Eu tinha tentado evitar um acidente feio no
último segundo, no entanto não pude evitar bater forte, minha cabeça e
ombro estavam igualmente latejantes.
Olho, mal enxergando como está o ocupante do outro carro. Eu tentei
evitar uma colisão frontal, e o lado do passageiro do meu carro estava uma
bagunça, mas a frente do outro carro também não estava diferente. E a pessoa
ao volante estava pior que eu, pelo visto.
Paramédicos vêm na minha direção como se eu estivesse de passagem
comprada para o céu ou inferno, quem sabe.
A contragosto, pouco depois, sou levado para o hospital. Apesar de
dizer que estava bem, os paramédicos insistiram para que eu fosse atendido.
E agora, uma hora depois, eu acho, porque não tenho noção de tempo, estou
aqui olhando para as paredes brancas do quarto, mais entediado do que
nunca.
A porta abre para deixar Alexander entrar junto com Lana Mitchell
colada em seus calcanhares. Ela agora era um membro da Marshall?
— Ah, que maravilha! — digo, cruzando meus braços no peito.
— O que diabos você andou aprontando, Ross? — ele diz quando para
ao lado da cama — O que houve?
— Não sei, o carro estourou o pneu — digo chateado. Isso não era para
ter causado quase a morte de outra pessoa ou a minha. Isso só aconteceu
porque eu fui negligente e desatento, pensando em uma mulher complicada e
que nada quer comigo. E, para ser bem sincero, eu não penso em ir além do
que dormir com ela mais algumas vezes. Estou fazendo a droga de um drama
mexicano por causa de uma bo...
— Falei com o médico, e ele disse que você ficará aqui em observação
por causa da pancada na cabeça. — Alexander diz, cortando meus
pensamentos impuros em certa parte do corpo de Alicia Duran.
— Deu saudade de mim, Lana? Sabia que um dia se renderia — zombo
para ela que, até então, tinha ficado calada. Essa menina parece tão diferente
da Lana encapetada que conheci algum tempo atrás.
— Vejo que não houve nada com sua cabeça, Bruno. Deve estar bem.
Ainda consegue, morrendo em um leito de hospital, falar um monte de
besteira — ela diz com um sorriso, e recebo um olhar raivoso de Alex.
— Morrendo? Acho que não...
— A polícia verificou seu carro, e parece que não foi por acaso que seu
pneu estourou, Ross. Alguém queria pregar uma peça em você ou tentar te
tirar da jogada. Eu tenho algumas coisas que gostaria de falar com você assim
que sair daqui. — ele diz, cortando meus gracejos para Lana — Temos
algumas novidades sobre o caso da Alicia, e isso que aconteceu com você
hoje pode não ser coincidência.
— Do que você está falando? O que isso tem a ver com Alicia? —
Sento-me na cama e tento me levantar. Droga, preciso ficar perto se algo vier
a acontecer a ela, não confio naqueles babacas que ele exigiu que ficassem
com ela. Minha cabeça gira e volto a sentar. Que merda!
— Calma aí, Don Juan — Alex planta a mão no meu ombro, me
fazendo ficar sentado. Odeio essa sensação de impotência — Alguém mexeu
no seu carro e, provavelmente, encheu demais o pneu e a pressão dentro deve
ter causado a explosão, poderia ter sido pior.
Sim, agora eu tenho alguém querendo minha cabeça? Ótimo, as coisas
poderiam ficar melhores?
— Você tem algum inimigo que eu não saiba? Será algum marido
ciumento? — Ele continua meio brincalhão, porém fica sério quando
continua: — A polícia já tem isso sendo investigado.
— Preciso sair daqui e ver Alicia — ignoro o que ele está dizendo e
tento, outra vez, levantar.
— Ross, tenho a segurança de Alicia sendo reforçada nesse momento
— ele diz — Ela tem algumas reuniões de negócio hoje que poderiam ser
adiadas, mas, como tenho certeza que ela não aceitará, enviei mais um
homem discretamente para garantir que nada aconteça com ela.
Fico mais aliviado sabendo que ela tem reforço. Será que acharam que
ela estaria no carro comigo? Penso isso quando volto a me recostar na cama.
Milhares de imagens vêm à minha mente e franzo a testa quando uma
pontada de dor me faz suspirar.
— Vamos deixar você descansar — Lana fala e começa a puxar Alex
para porta — Essa sua cara de durão não está me convencendo — Embora
fosse jovem e meio louca, ela estava certa. Eu estou precisando dormir, já que
mal fiz isso depois que cheguei de viagem.
— Ficará um homem aqui de babá, durma. Pelo que soube, você
acampou na frente do prédio de Alicia — Alexander diz da porta — Tente
não se matar até termos uma conversa, Ross. Você tem coisas para me
explicar, como ser filho de um homem que está envolvido com negócios
escusos, por exemplo.
Merda!
Fecho meus olhos esperando que ele saia, porém ele continua me
fazendo abrir os olhos.
— Como me mantém no escuro sobre isso, Ross, como...
— Chega, namorado. Bruno não precisa de sermão agora, mais tarde
você acaba com ele — Lana intervém mais uma vez.
— Amo você, Lana Mitchell — eu digo e pisco para ela.
— Ah, como você gosta de brincar com o perigo, Ross — ela ri quando
fecha a porta do quarto. Meu sorriso apaga e volto a fechar meus olhos.
O que Alex tinha descoberto sobre minha família? Eu não gostava de
ser relacionado com eles e muito menos deixar as pessoas saberem do meu
parentesco. Suspiro mais uma vez e tento dormir um pouco.
Alicia
Sinto as mãos másculas correndo pelo meu corpo como se fossem
penas ao longo da minha espinha dorsal; arrepios deliciosos percorrem minha
pele onde os dedos dele me tocam. Sinto seus lábios tocarem minha nuca em
beijos rastejantes e deliciosos...
— Bruno... — ouço meu murmúrio no silêncio do quarto, abro meus
olhos e percebo que estive sonhando. Rolo na minha cama desejando voltar a
dormir outra vez, mas o desejo insano que eu sentia agora me deixa inquieta.
Tudo no que pensava era ele me tocando, beijando e dizendo coisas sacanas
no meu ouvido. Correndo sua língua atrevida por cada canto da minha pele,
fazendo os pelinhos se eriçarem em arrepios deliciosos.
Gemo alto quando afundo meu rosto no travesseiro.
Isso não poderia estar acontecendo. Por que eu não poderia deixar tudo
no modo casual com ele? Tinha de ficar ruminando sobre algo que já era.
Meu corpo, nesse último mês, tem sentido falta do tratamento exclusivo
que Bruno vinha fazendo comigo durante todo tempo que estive na casa dele.
Gemo outra vez quando rolo e fico olhando para o teto. É dia já, e tenho de
levantar, hoje tenho tantas coisas para organizar no Buffet. Olho para o
relógio na mesa de cabeceira e vejo que são mais de oito da manhã. Dormi
demais, mas sinto como se não tivesse dormido quase nada. Sinto meu corpo
pesado de exaustão.
Depois de fazer minha toalete matinal, sigo para fora do quarto
esperando encontrar Bruno na minha sala, mas encontro Nate e Connor
conversando em tom baixo.
— Bom dia para vocês dois — digo e vou para a cozinha preparar um
café, mas como tem acontecido toda manhã, um dos meus seguranças já o
tem preparado na cafeteira. Encho uma xícara enquanto preparo algo para
meu café da manhã. Pouco mais tarde, quando sento à mesa, dou com Nate
parado na porta com sua cara de poucos amigos que sempre ostenta.
— Algum problema? — pergunto enquanto bebo da minha xícara —
Você parece incomodado com alguma coisa.
— Na verdade, senhora Duran, eu só gostaria de saber que horas
pretende sair — ele diz — Temos umas coisas acontecendo e queremos
redobrar a segurança.
— O que houve? — digo, deixando meu café da manhã intocado, sinais
de alerta começam a pipocar na minha mente — Houve alguma coisa com
meu irmão?
— Seu irmão está bem, senhora Duran — o telefone dele começa a
tocar e ele atende, fazendo sinal para mim, saindo em direção à sala, e eu o
sigo — Sim?
Ele escuta a pessoa do outro lado.
— Ainda estou aqui na casa... Acredita nisso? Ele está bem? — ele fala
rapidamente com seu interlocutor. Isso estava me deixando aflita. — Vamos
cuidar disso. — diz e desliga, virando-se para mim.
— Vai me dizer o que está acontecendo? — digo.
— Houve um incidente hoje mais cedo que nos deixou alerta, senhora.
Já estamos cuidando disso, não se preocupe. — ele não responde à minha
pergunta.
— Incidente com quem ou o quê?
— Nada que deva se preocupar — Sério que ele não ia me contar? —
Quando quiser sair estamos esperando, senhora.
Faço uma anotação mental para mais tarde ligar para Matt. Eu já estou
atrasada para minha reunião dos últimos detalhes da festa do escritório de
advocacia de Danila Fontes, que seria daqui a dois dias. Tudo tem que sair
perfeito, afinal, quero voltar às boas graças com meus futuros clientes.
Já passam das nove e meia quando entro no meu escritório e vejo que,
discretamente, tem mais homens de Alex por aqui. O que estava
acontecendo? Penso em ligar para Bruno e perguntar, mas ele deve estar
querendo distância de mim, então resolvo cuidar dos meus negócios que eram
minha prioridade. Apesar da vontade de ligar, mergulho no trabalho e durante
todo o dia não tenho nenhuma notícia do que houve. Acabo deixando de lado,
porque se fosse algo grave já saberia.
De fato, por uma questão de desencargo de consciência, no meio da
tarde, ligo para Matt e tento descobrir algo e fico estarrecida quando soube
que Bruno tinha sofrido um acidente pela manhã, perto do meu apartamento,
depois que tinha deixado os outros seguranças lá e se certificado que eu
estava segura.
Ele tinha estado dormindo na rua na frente do meu prédio toda noite?
Eu imaginei que ele teria ido embora, mas eu devia imaginar que ele não me
deixaria sozinha. Sinto-me mal, agora, por tê-lo enxotado no meio da
madrugada. Droga, Alicia!
— E onde ele está? Ele está bem? — pergunto, não deixando
transparecer meu tumulto interior para meu irmão.
— Soube que ele está no hospital, mas, segundo Alex, não é nada grave
— diz, e começo a arrumar os documentos que estive analisando e que estão
espalhados na minha mesa. Irei vê-lo, é o mínimo que posso fazer depois de
ele se ferir por passar a noite acordado na frente da minha casa.
— Em que hospital? — pergunto. Pego minha bolsa e rumo para a
saída. Ele me informa o nome do hospital, e ando firmemente na direção dos
meus seguranças — Falo com você depois — Desligo furiosa com aqueles
dois idiotas por me esconderem isso pela manhã.
Tenho tantas coisas a serem resolvidas hoje, mas esqueço de tudo isso,
preciso vê-lo.
— Por que não me disse que o "incidente" que você escondeu, na
verdade foi um acidente com Bruno? — pergunto quando paro na frente de
Nate, que está sentado no corredor ao lado da minha porta. — Me leve onde
ele está, nesse momento. — exijo e não espero sua resposta quando caminho
decidida para fora.
Meu estômago estava enrolando em nós de ansiedade e nervosismo.
Quando Nate senta ao meu lado, no carro, peço detalhes do que tinha
acontecido e ele fala muito pouco sobre isso, só diz que foi um simples pneu
furado, mas não acreditava nele, e só me acalmaria quando visse Bruno para
me certificar que ele estava bem.
A viagem até o hospital parece levar uma eternidade, e finalmente me
vejo na frente do prédio. Desço do carro sem esperar meus seguranças, subo
os degraus praticamente correndo. Nate me acompanha e logo depois somos
encaminhados para o quarto particular onde Bruno está.
Acho estranho ter um segurança parado na porta do quarto de Bruno,
mas não me detenho e invado o quarto para encontrar um par de olhos azuis
fixo na porta e que parecia furioso.
— Ah, agora as coisas começaram a melhorar. Minhas preces foram
atendidas e você foi contratada como enfermeira, querida senhora Duran? —
ele cruza seus braços e olha além de mim para Nate, que tinha vindo em meu
encalço — O que ela faz aqui?
— Ela insistiu para vir — ele diz e recua fechando a porta, nos
deixando a sós.
— Vejo que você está bem, senhor Ross — Me aproximo da cama.
Tenho vontade de retirar a mecha de cabelo que cai em sua testa onde tem um
curativo. Se não fosse por isso e o ar cansado dele, seria impossível dizer que
ele tinha sofrido um acidente hoje — Você está bem?
— O que faz aqui, Alicia? — ele está tão sério, frio, e ignora minha
pergunta preocupada.
— Queria saber como você estava, fiquei preocupada — admito.
— Sério? E só agora você apareceu? Humm, fico pensando quando
você não estiver preocupada — dá de ombros, como se não tivesse
importância. Isso não era justo. — Acho melhor você ficar em casa esses
dias, Alicia.
— Eu não sabia, seus amigos seguranças acharam que não era
importante me comunicar — digo e sento na cadeira que está ao lado da
cama.
O engraçado de tudo isso é que me sinto um pouco magoada por ele
não me receber com um sorriso de boas-vindas. Por alguma razão boba achei
que ele iria.
— E por que faria isso? Já não basta que não tenha mais uma vida
social e não saio para lugar algum, a não ser que seja a trabalho?
— O incidente de hoje foi proposital e talvez a pessoa tenha pensado
que você estivesse no carro comigo — ele informa calmamente — Devia
pensar em ficar viva, em primeiro lugar, depois você pensaria na sua
empresa. Afinal, para ela funcionar você tem de estar viva, não?
— Bem, e quem diabos foi que mexeu no seu carro?
— Boa pergunta, a polícia está verificando isso. — ele diz e olha ao
redor do quarto — Poderia ver onde estão minhas roupas? Tenho de sair
desse hospital.
— Você não foi liberado ainda, Bruno — tento falar, mas ele me corta
quando levanta uma mão.
— Se continuar aqui, morrerei de tédio em vez de uma pancada na
cabeça. — Ele toca uma campainha ao lado da cama, e segundos depois uma
enfermeira entra.
— Onde estão minhas roupas? — ele nem a deixa falar — Preciso delas
—Bruno diz com veemência, seus olhos azuis estão brilhantes como se
estivesse febril. Tenho vontade de verificar.
— Senhor Ross, ainda não foi liberado pelo doutor — ela tenta guiá-lo
para a cama, mas ele parece um tanque e não se move do lugar — Senhor...
Tento não rir da situação e levanto.
— Por que não deita enquanto eu falo com o médico, Bruno? — vou
para a porta.
Meia hora depois, um Bruno carrancudo sai do hospital depois de
assinar um terno de responsabilidade. Segundo o médico, a pancada em sua
cabeça foi forte, mesmo os exames terem sido normais, queria que ele
passasse todo o dia aqui antes de receber alta. Eu fico imaginando se não foi
a minha chegada que o fez querer sair mais depressa.
— Não devia ter saído assim — digo quando sento com ele no banco
de trás do carro que Nate está guiando para fora do estacionamento do
hospital.
— Estou bem, tenho uma reunião na empresa e estou indo para lá —
ele resmunga.
— Claro que não, vai voltar para casa e descansar — ele ri.
— Você vai me forçar, Viuvinha? Posso opinar na maneira como serei
obediente a você? — diz, seus olhos azuis perdendo a frieza que tem me
olhado desde que entrei em seu quarto mais cedo.
— Acho que essa batida na sua cabeça só piorou sua babaquice — digo
e dou um sorriso.
— Estou achando, bebê, que você gosta da minha babaquice — ele diz
baixinho quando corre o dedo ao longo do dorso da minha mão. — Qualquer
um acharia que você choraria se eu morresse.
Meu sorriso murcha imediatamente, e sinto como se tivesse levado um
tapa no rosto. Ele deve ter percebido que suas palavras me atingiram e recua
quando diz:
— Desculpe, má escolhas de palavras — sim, elas só fizeram me
lembrar que o último homem da minha vida tinha morrido há tão pouco
tempo e que eu não derramei tantas lágrimas por ele. É ruim se sentir
culpada? Isso sempre me confunde. — Nate, vamos para a empresa — ele diz
quando olha para fora do carro e percebe que estamos indo em direção à sua
casa.
— Alexander cancelou a reunião, Ross — Nate diz, e eu o olho pelo
espelho para ver se ele fala a verdade. Ele não deixa nada transparecer. Ao
lado dele, Connor se mantém calado como sempre e igualmente não dá
nenhum palpite do que está pensando.
— Por que não acredito nisso? — Bruno diz, mas recosta-se no banco
ao meu lado.
Meu celular começa a tocar, e eu passo a procurá-lo em minha bolsa.
Olho para o visor e dou um gemido. Ah, não, logo agora?
— Alô? — digo baixo e olho de esguelha para Bruno.
— Alicia, como você está? — A voz de Deni soa do outro lado.
— Estou bem, e você? — era estranho falar com o irmão de Bruno com
ele estando ao meu lado. Deni está falando e não estou realmente escutando,
estou mais interessada em olhar para as sobrancelhas de Bruno que estão
franzidas nesse momento. Ele me observava, curioso sem ser tão óbvio.
— Posso te encontrar mais tarde em um jantar? Quero discutir algumas
coisas com você — fico sem saber o que responder.
— Deni, sinto muito, pode ser outro dia? — digo e vejo a cabeça de
Bruno virar para olhar-me. — Tenho um compromisso para hoje, então, se
puder ser outro dia, eu agradeceria.
— Sim, claro, ligue-me quando tiver um tempo livre. — ele diz e nos
despedimos logo em seguida. Eu não entendo esse interesse de Deni em mim,
será que é por causa do Bruno? Pelo pouco que observei, eles não são os
melhores amigos, tem umas coisas antagônicas entre os dois. Só não sei do
que se trata.
— Esse é o meu irmão, com quem você estava falando? — ele parece
incrédulo e furioso quando me questiona. — Fique longe de Deni, Alicia...
— Chegamos — a voz de Nate chega até nós, cortando o sermão que
provavelmente receberia agora de Bruno.
Eu desço junto com ele e caminhamos para o elevador. Não sei a
maldita razão de ter vindo com ele aqui. Deus, sou uma masoquista mesmo e
uma louca de pedra, já que rejeitei seus avanços na noite anterior e aqui estou
eu indo para sua casa de bom grado, mesmo que seja por uma questão de
ajudar um amigo doente.
Eu preciso de um psicólogo urgente!
— Devia ir embora, Alicia, vir à minha casa não é uma boa ideia — ele
diz quando entramos no elevador — Você e seus recatos de moça certinha
podem não gostar do que vem pela frente.
— Por que tudo tem de ser sexual para você? — digo e me recosto na
parede do elevador o mais longe possível dele. — Não posso ficar em sua
casa enquanto está doente?
Ele dá uma pequena gargalhada, e o som mexe comigo de uma maneira
que faz meu sangue correr mais rápido nas veias. Droga.
— Acha que estou doente, é? Não se engane, bebê — diz suavemente e
crava seus olhos intensamente em mim.
Ele vem com passos lentos em minha direção e para na minha frente.
Estou prestes a empurrá-lo quando as portas se abrem e ele se afasta com um
sorriso debochado.
— Salva pelo gongo. — Quando entramos, ele vai direto para o sofá da
sala de estar e deita pesadamente lá. — Não terminamos esse assunto de Deni
ainda, Alicia.
— Eu sei, mas agora devia ficar quieto para variar — estou sendo
condescendente com ele porque não aguento essa ladainha dele sobre Deni.
Se ele me contasse o porquê desse mal-estar entre os dois, isso se resolveria
— Quando você estiver bem, vai me contar por que tenho de ficar longe
dele?
— Não! — Seu não taxativo me faz fazer uma careta de desgosto
quando sigo para sua cozinha. Bom, agora sou a babá do meu guarda-costas.
Legal!
— Você quem sabe. Eu tenho negócios com ele! — digo alto, ao
mesmo tempo em que verifico sua geladeira. — E sua casa não tem nada para
comer.
Espero uma resposta, mas ela não vem, então volto para a sala. Bruno
está com um dos braços sobre os olhos, evidenciando seu corpo forte. Eu
nunca antes tinha desejado um homem tão terrivelmente. Eu sempre fui tão
contida com Evan, agora sinto essa vontade de ser impulsiva, selvagem e
desinibida com Bruno, e ao mesmo tempo, quando me sinto dessa forma, a
culpa bate em mim.
Eu sei que posso me apaixonar fortemente por ele, mesmo sabendo que
ele não foi feito para levar um relacionamento sério, e sei que isso não vai
durar muito tempo porque eu mesma posso excluí-lo da minha vida. Não
estou preparada para ele ainda, talvez para homem nenhum.
Bruno
Ouço Alicia pelo meu apartamento e me pergunto o que ela faz aqui.
Essa mulher vai me enlouquecer.
Bruno, não quero você!
Bruno, quero você!
Não, não quero você!
Mulher louca! Uma hora me come com os olhos e na outra me expulsa
de sua casa. Quem as entende? Eu que não.
Preciso conversar com Alex, então pego meu celular para ligar para ele
quando vejo Alicia vir do meu quarto, vestida com umas das minhas camisas
que a deixa malditamente sexy.
— Desculpe por isso, precisava de um banho — ela diz apontando
minha camisa, e não posso controlar a súbita vontade de lhe agarrar e fazê-la
pedir desculpas devidamente a mim de um jeito que vai nos deixar loucos e
suados aqui mesmo no sofá.
Droga! O pensamento me deixa duro, e percebo chocado que faz um
mês que fiz sexo. Recorde total de todos os tempos. Ela estava cheirosa!
Cheira igual o céu, quero correr minhas mãos por suas coxas lisas e beijá-la
bem forte...
Balanço minha cabeça para clarear minha luxúria e disco para Alex.
Foco, Ross...
— Soube que já está em casa — ele diz quando atende. O cara nunca
diz um alô como gente normal?
— Não devia ter desmarcado nossa reunião, Alex, preciso saber como
anda nossa investigação.
— Estou passando em sua casa quando sair daqui do escritório — ele
diz e eu olho para o relógio: são dezoito horas.
— Estou esperando. — Desligo e olho para Alicia, que ainda estava de
pé na minha frente.
— Não devia trabalhar hoje — Ela agora me dá ordens? — Pedi um
jantar leve para você, sua casa não parece habitável, sabia? Devia se cuidar
melhor "guarda-costas".
O toque da campainha me impede de retrucar. Alex foi rápido!
— Seu jantar! — Alicia diz quando caminha para a porta, e eu pulo do
sofá antes que perceba o que estou fazendo.
— Vai abrir a porta assim? — aponto para minha camisa, fazendo-a
franzir o cenho — E para começo de conversa, não devia atender a porta sem
saber quem é. Eu faço isso!
— Tudo bem, irei colocar a mesa — ela se afasta para a cozinha e eu
vou abrir a porta.
20
Bruno
Sinais de alerta piscam na minha mente quando vou para a porta.
Minha cabeça não havia parado de trabalhar desde que Alexander disse que
alguém mexeu no meu carro. Que horas teria sido? Não deixei o carro
durante toda a noite, não dormi. Isso me faz pensar que alguém tem
monitorado o apartamento de Alicia. Está esperando uma oportunidade para
agir? O pensamento de alguém a observando tão de perto me dá calafrios.
A única hora que deixei o carro foi por meia hora enquanto falava com
o Nate e o Connor naquela manhã. Espero que Alex já tenha algumas
respostas da polícia.
Olho quem está lá fora antes de abrir a porta e, sim, é o entregador com
sacolas de comida como se um exército fosse se alimentar na minha casa. Ah,
minha viuvinha quer me deixar cheio de energia. Dou um sorriso para mim
mesmo enquanto pego as sacolas.
— Obrigado — digo quando pago e fecho a porta.
Vou para a cozinha e encontro Alicia na ponta dos pés pegando pratos
no armário. Eu esqueço as sacolas e inclino minha cabeça, deleitando-me
com a curva de seu traseiro quase à mostra.
— Ross, minha cabeça é aqui em cima — ela diz quando me pega
olhando.
— Essa sua parte é mais apreciável, querida. Prefiro olhar para ela, sem
ofensas à sua cabeça — digo e sorrio malicioso para ela. Bem, se ela veio
para minha casa tão facilmente, eu devia pensar em ter uns pequenos
acidentes e mantê-la aqui a meu bel-prazer.
Recebo um olhar recriminatório dela e levo a comida deixando em
cima do balcão de mármore e volto a olhar sua movimentação colocando a
mesa para dois. Ela parecia à vontade fazendo isso na minha casa.
— Por que veio, Alicia? — ela para o ato de colocar os talheres ao lado
do prato e vira-se para me encarar. Seus olhos esverdeados estão frágeis, e
meu coração falha uma batida. Meu instinto é de ir até ela e segurar seu corpo
contra o meu tão apertado que ela nunca mais iria sair do meu abraço. Mas eu
não sou esse tipo de cara. Eu não abraço uma mulher só para consolá-la, não.
Eu vou querer sempre mais alguma coisa dela.
Mas Alicia me faz querer ser melhor e ser o cara que só quer dar aquele
abraço, que fará sua mulher se sentir protegida e segura, sem nenhuma
intenção por trás disso.
— Eu... Bem, não pensei sobre isso, sabe? Só achei que poderia...
humm — ela me dá as costas mais uma vez e termina de colocar a mesa.
— Que poderia o que, bebê? — minha voz é baixa, quase inaudível,
quando chego atrás dela. Segurando seus ombros, digo perto do seu ouvido:
— Vou adorar ser cuidado por você.
— Não deve ficar a noite sozinho quando bateu forte a cabeça — diz
ignorando minha provocação e foge para abrir as sacolas — Estou tentado ser
gentil.
Eu sorrio. É essa a desculpa que ela inventou para vir até aqui? Tudo
bem, que ela pense que me convenceu com isso, se esse é seu jogo, então
estou mais que disposto a jogar junto. Eu fico observando quão bem ela fica
aqui na minha casa. Sinto um calor no peito que é estranho, desconfortável e
bom ao mesmo tempo. Eu pareço um doente seguindo seus movimentos
graciosos com um sorriso idiota no rosto. Ela combina com a minha casa.
— Tire esse sorriso do rosto, Ross — serve a comida e aponta para que
eu sente — Não tenha ideias erradas.
— Devo ficar doente mais vezes, assim terei uma Alicia doce e
prestativa aqui comigo — apoio meu queixo na mão e dou um largo sorriso
para ela, que me olha carrancuda, e isso só me faz sorrir mais.
Ela senta e come em silêncio enquanto a olho, divertido. Não sei por
que estou me sentindo muito satisfeito comigo mesmo. Eu não percebi o
quanto tinha sentido a falta dela esse último mês que fiquei longe. Porra,
estou salivando igual a um lobo em cima de sua presa e nem estávamos
fazendo algo sexual.
— Você tem alguma ideia de quem atentou contra você hoje? — ela me
puxa dos pensamentos obscenos que tenho dela de joelhos à minha frente
toda submissa. Limpo minha garganta para me situar do que está falando. Ah,
sim, o acidente.
— Não, mas descobrirei em breve — garanto para tranquilizá-la, mas
não tenho a menor ideia de quem seja. Não tenho inimigo, que eu saiba, só se
fosse um marido ciumento que agora descobriu que dormi com sua mulher,
como disse Alex no hospital. Só se...
Não, isso não, seria demais para mim. Ele não faria nada tão idiota,
faria?
— Diga-me, tem se encontrado muito com meu irmão nesse último
mês? —sondo, baixando os talheres no meu prato.
— Bruno, sinceramente não sei aonde você quer chegar com essa
pergunta, mas deixe-me dizer que...
— Só responda à pergunta, Alicia — corto firmemente.
— Não temos esse tipo de relacionamento que está sugerindo.
— Não sugeri nada, só fiz uma pergunta que não me respondeu —
inclino na direção dela — Isso só me faz pensar que esconde algo.
— Temos negócios, só isso. E devo ser grata a você, porque segundo
Deni, ele só me contratou por sua causa — diz fazendo meu sangue gelar. —
Ele disse que quer se reconciliar com você e viu em mim uma chance.
Minha reação é rir, e não é um riso feliz. Agora tenho certeza que Deni
não está com boa intenção em relação à Alicia. Resta saber o que ele quer de
mim para tentar usar Alicia. Ele não estava sendo gentil com ela à toa.
Minha raiva é tão grande que me impede de dizer qualquer coisa, quero
sair e encontrar meu irmão e quebrar a sua cara. Meu estômago embrulha só
em pensar em ter uma conversa com Deni, já fazia tanto tempo que me
afastei de todos.
— Eu sinto muito pela forma que agi ontem à noite — Alicia diz,
quebrando o silêncio tenso — Eu ter exigido que você saísse no meio da
noite e você dormir na rua.
Ela tem uma ruga de preocupação entre seus olhos, e estendo minha
mão e agarro a dela. Vejo que minha menina está se sentindo culpada pelo
que me aconteceu.
— Você não tem culpa de nada disso, bebê, não foi você que estourou
meu pneu — faço círculos na palma de sua mão — A culpa de ter batido foi
totalmente minha, estava distraído demais no momento.
Não digo que era ela a minha distração, isso só a fará se culpar mais.
— Venha aqui — peço afastando minha cadeira, mas ela arregala os
olhos e continua sem se mexer do lugar. — Venha aqui, Alicia.
— Termine seu jantar — ela diz, e bufo chateado. Essa mulher e seu
controle eram minha ruína — Você não devia fazer esforço.
— Você está acabando com minha masculinidade falando assim —
respiro fundo e volto a comer — Qualquer um que ouvir você, vai pensar que
estou em pedaços.
Ela ri levemente da minha carranca e, pouco depois, quando
terminamos de jantar, ajudo a retirar a mesa, mas ela recusa terminantemente
que eu ajude com o restante. Estou prestes e argumentar, quando ouvimos a
campainha da porta.
— Acho que a cavalaria chegou — digo, e antes de sair da cozinha,
beijo seu ombro — Não vá embora enquanto converso com Alex, estarei no
escritório.
Ela assente e a deixo para atender Alex e ter a conversa mais difícil que
nós dois teremos.
Verifico a porta como força do hábito, abro e Alexander entra
carrancudo. Ele por acaso descobriu mais merdas de minha família?
— Ross — ele cumprimenta quando passa por mim. — Espero que
esteja melhor.
— A preocupação de vocês está me deixando meio louco — digo e
aponto para meu escritório.
— Vocês quem? — ele para no meio da sala e inclina a cabeça
interrogativamente quando escutamos Alicia na cozinha — Ah, vejo que tem
uma enfermeira disposta cuidando de você. Não perde tempo mesmo, Bruno.
— Falando em enfermeira, cadê sua assistente? Não está colada em
você? — provoco, me referindo a Lana. Não o quero se metendo na minha
relação com Alicia, como se fosse o pai dela. Isso só diz respeito a nós.
Ponto.
— Bruno, ainda quebro todos os seus ossos por flertar com minha
mulher — ele diz e me segue para o escritório. Sirvo um whisky para ele sem
mesmo perguntar, sei da mania dele de tomar uma bebida no fim da noite.
— Então, o que polícia descobriu? — sento atrás da mesa e jogo
minhas pernas em cima dela, cruzando as mãos na nuca.
— A única pista são as câmeras do condomínio que flagraram uma
pessoa indo até seu carro, pouco depois de você entrar no prédio da Alicia de
manhã — ele diz e roda entre os dedos o copo. Depois me olha. — Por que
você estava do lado de fora do prédio, afinal?
— Por nada em especial, não queria deixar Alicia desprotegida — digo
incomodado — Mas isso não diz respeito a você, Alex.
— Como não? Temos responsabilidade por uma cliente, Bruno! Você
primeiro dispensa os seguranças dela, primeira coisa errada!
— Eu posso fazer qualquer merda que eu queira, Alex. Você pode ser o
sócio majoritário da empresa, mas eu também sou sócio e tenho poderes para
fazer algo que ache que devo fazer. — Estou alterando minha voz, e isso só
diz o quanto ele está me irritando com esse papo de grande chefe. — Não me
meto nas suas coisas e nem na sua relação com Lana! Então não se meta na
minha.
— Quer comparar o que tenho com Lana às suas transas aleatórias?! —
ele deve estar brincando!
— É melhor retirar o que disse — digo entredentes — Você que não
compare Alicia com outras mulheres! Ela não é uma transa aleatória e você,
seu filho da puta, tome cuidado com o que fala!
Estou tão bravo agora que tenho vontade de partir a cara presunçosa de
Alexander.
— Então devo acreditar que ela não deu um pontapé na sua bunda
ontem à noite e, por isso, você dormiu na rua? Não vejo você levando esse
envolvimento além do que ele já foi, Bruno — ele diz — Há quantos anos
conheço você? E tem sempre agido da mesma maneira com as mulheres. Não
queira que eu acredite que está apaixonado agora.
— Assunto encerrado e, melhor ainda, Alicia é um assunto que não vou
discutir com você — volto a me encostar na cadeira, bufando de raiva. Filho
da puta intrometido!
— Então, por que não me conta, por qual motivo seu pai é um notório
criminoso, Bruno, e durante todos esses anos que somos amigos você não
disse nada? — ele indaga, tenso também.
— Minha família é um assunto que gosto de manter afastado da minha
vida, Alex — digo por fim — E isso nunca veio à tona para ser discutido.
— Descobrir que meu sócio tem associação com pessoas de índole
duvidosa, para dizer o mínimo, é bastante constrangedor, Bruno, ainda mais
por terceiros. — ele está chateado, e não o culpo por isso. Por não falar com
meus amigos de anos sobre meus familiares.
— O que você sabe sobre eles? O que esse seu homem...
— Na verdade, Bruno, saber de seus familiares não foi a maior das
surpresas — ele se inclina para mim, seu rosto está sombrio quando fala —
Mauro descobriu que seu pai tinha negócios com Evan Duran. Não negócios
diretos, mas, segundo Mauro, seu pai era um "cliente" de Duran. Lavagem de
dinheiro e outras coisas duvidosas, o esquema era bem elaborado. Como
Duran roubou todo dinheiro dos "clientes" e sumiu com ele, bem, isso não
sabemos. Ninguém sabe onde foi parar. Talvez seu pai possa esclarecer.
Que porra era aquela? De que raios ele está falando? Estou totalmente
paralisado. Não reajo.
Não, não, não...
— Não temos uma confirmação, são especulações. Por isso, quero que
fale com seu pai — ele fala isso como se fosse fácil. Que eu discutiria esse
assunto com meu pai, que me odeia!
— Você por acaso quer que eu ligue para ele e marque uma tarde para
tomarmos um café enquanto discutimos isso? — pergunto sarcástico. — Faz
quinze anos que não falo com eles, Alex. E você não os conhece, é melhor se
manter afastado deles. Você não é da polícia, afinal de contas.
— Está de brincadeira? Eles são uma pista para desvendar a morte do
marido de sua Alicia — ele diz dando ênfase no "sua Alicia", e isso me
incomoda. Alex levanta e anda pelo meu escritório, impaciente. — Por que
não me conta essa história toda, Bruno?
Tenho um estalo no cérebro quando a coisa toda fica óbvia para mim, e
eu levanto também, como se mil demônios estivessem atrás de mim. Deus!
Estou lerdo para caralho! Deve ter sido forte mesmo essa pancada.
Deni, filho da mãe! Não era nada comigo, era Alicia que ele queria
ferir! Fique calmo, Ross.
Vou até o canto e me sirvo de uma bebida, que tinha evitado por causa
da medicação que tomei hoje, mas que se dane, preciso de álcool no meu
sistema para me acalmar para que eu não saia agora e quebre a cara do meu
irmão em duas!
— Por que a polícia já não tomou conhecimento disso? — minha voz é
calma, mas a raiva fica latente em meu timbre.
— Não sei, mas faz uns dias que tenho essa informação do Mauro, mas
queria falar com você em primeiro lugar, afinal, a família é sua — ele
continua: —Mas as coisas são mais obscuras do que imaginamos. Seu pai
tem uma rede de contatos e recursos para manter algumas pessoas "cegas" e,
se não estiver muito enganado, esse súbito encerramento do caso que
alegaram por não ter recursos financeiros para prosseguirem, nada mais é que
os cordões puxados nos lugares certos.
Ele estava coberto de razão. Eu agora já não tenho nenhuma dúvida que
Deni e meu pai estavam nisso até o pescoço.
— Você sabia que meu irmão está rondando a Alicia? Deni Ross é meu
irmão, e esse mês que passei fora ele se aproximou dela...
— E você só me diz isso agora!
— Alex, você recebe a porra do relatório dos seus seguranças? Eles
devem ter mencionado. Você não leu, não é? — isso é fantástico.
— Claro que li, só não foi escrito o sobrenome desse tal Deni — ele
rosna, furioso.
Isso só estava melhorando... Como posso contar para Alicia que meu
pai a quer morta? Meu sangue está fervendo de raiva.
Alicia
Eu espero Bruno em seu quarto, automaticamente vim para cá em vez
de ir para o antigo dormitório que usei aqui em sua casa. A desculpa que
estou usando para mim mesma é que preciso ficar de olho nele durante a
noite, mas sei muito bem que isso é mera desculpa para estar aqui em sua
cama.
Eles estão demorando tanto no escritório que tenho vontade de ir
verificar o que tanto eles conversam.
Levanto, saio para a pequena sacada e observo a cidade lá embaixo.
Estou tensa demais, preciso de um tempo longe de tudo isso; fazer uma
viagem longa e distante desse sentimento que me sufoca e me deixa trêmula,
sem foco, fraca. Depois da festa de Danila, deixarei Marcos assumir as
poucas festas e sairei de perto de tudo. Não aguento mais viver presa dentro
de casa sem poder sair sem nenhuma preocupação, dar um passeio na rua,
correr no parque, coisas que eu costumava fazer antes dessa loucura começar.
Eu sinto que estou sufocando e que nada posso fazer para me sentir
livre outra vez. O problema será fugir sem ser notada. Rio silenciosamente.
Bruno certamente estaria dormindo na minha calçada. Balanço minha cabeça
e afugento as imagens da minha mente. Estou imersa em pensamento quando
escuto a voz de Bruno no quarto.
— Alicia!
— Aqui — digo e ele vem e para ao meu lado.
— Que diabos faz aqui fora? Esqueceu que é alvo de algum atirador,
Alicia? — imediatamente ele me puxa para dentro — Tem horas que acho
que você pede para se machucar.
— Não faz nem cinco minutos que saí — retruco — Não seja
dramático, Ross.
Ele não responde, só me olha severamente, a única reação visível eram
os punhos fechados denunciando que ele estava com raiva.
— O quê?!
— Vou tomar um banho e dormir — Hum... desde quando ele é tão
sério assim?
Segue para o banheiro, deixando-me lá sem compreender nada. Será
que cometi um erro vindo assim impulsivamente? Será que ele acha que
estou forçando uma relação?
Estou no mesmo lugar quando ele volta apenas com uma toalha
cobrindo seus quadris estreitos, mas a solta, ficando nu, para vestir uma boxer
branca. Exibido! Finjo não olhar, e ele vai para a cama como se não estivesse
exibindo por aí seus dotes!
— Vai dormir em pé aí, Alicia? — ele agora está escondendo um
sorriso de mim, a raiva deve ter passado e ele parece mais tranquilo — Vesti
uma roupa para não agredir seu moralismo e decoro. — aponta a boxer onde
tem... Droga! Essa vai ser difícil resistir, Alicia. — Juro que serei um santo
com você.
Isso é uma mentira deslavada dele, porque estava na cara que não se
comportaria como um cavalheiro.
— E, bem? —eu digo fingindo calma, mas minhas mãos trêmulas
desmentem-me estrepitosamente. Os olhos azuis de Bruno estão dançando
com divertimento. Maldito seja ele, nem consegue disfarçar sua excitação.
— Venha aqui, bebê...
Rendo-me a contragosto, quer dizer, não sou tão contra assim, nesse
momento, eu quero sentir que pertenço a algum lugar, mesmo que fosse por
um instante.
Caminho vagarosamente para a cama e sento na beirada. Ele vem por
trás, não deixando mais esquivar-me. Levanta meus cabelos fazendo um rabo
de cavalo em sua mão e beija meu ombro por cima da camisa, porém sua
outra mão está nos botões, na frente. Ele consegue desabotoar os três
primeiros e puxa descobrindo meu ombro esquerdo.
— Bruno, não acho que será uma boa ideia, você não está bem...
Não seguro um gemido quando sua boca cai aberta na minha pele. Ele
arrasta a língua até a curva do meu pescoço suavemente, a barba por fazer
arranhando e, sensualmente, ele lambe minha carne delicada. Eu pareço
queimar em todos os lugares, quero virar e alcançar sua boca e beijá-lo
intensamente. Mas ele continua explorando meu ombro com sua boca em
beijos quentes e suga minha orelha em sua boca, mordiscando. Não seguro
mais os gemidos quando ele puxa meus cabelos para trás, expondo meu
pescoço ainda mais para seu ataque irrefreável.
— Senti sua falta... — sussurra tão suavemente na minha orelha que
inclino em sua direção.
Droga, ontem eu o tinha dispensado e agora estou aqui gemendo por
sua boca. Tento sair de seu domínio, mas ele envolve minha cintura com um
braço e me puxa para perto, colando minhas costas em seu peito duro.
Fecho meus olhos quando ele mordisca meu ombro e leva a boca para
minha nuca e morde com um pouco mais de força, fazendo-me arrepiar.
Torço minha cabeça querendo beijá-lo, e ele enfim tem piedade de mim e
suga minha língua em sua boca. Ele está me matando e não passou do meu
ombro ainda. Fico trêmula na expectativa de ele me beijar assim por todo
meu corpo mal-acostumado.
Meu segurança era meu pecado, meu vício...
21
Alicia
Eu fiquei completamente perdida, totalmente absorvida por sua boca
em minha pele. Bruno não tem nenhuma pressa em me saborear. Ele desce
uma das mãos pela minha barriga e para na junção das minhas coxas. Não
posso parar o gemido pela maneira hábil que ele esfrega seus dedos no meu
clitóris, fazendo meus olhos rolarem para trás. Sinto meu corpo começar a
estremecer e empurro mais para sua mão.
— Amo a forma que você se entrega para mim, bebê — ele chupa
minha orelha, e não aguento muito tempo, me desfaço em sua mão
habilidosa. Agarro seus cabelos bem forte para me apoiar. Minha falta de
controle é clara quando penso que amanhã ele terá uma dor em sua cabeça,
mas isso é tão fugaz na minha mente nublada que continuo segurando-o firme
enquanto me deixo levar pelo prazer.
Deito de olhos fechados, todos meus músculos parecem gelatina. Viro
meu rosto para encarar Bruno que está pairando sobre mim, sua cabeça
apoiada na mão e o sorriso que ele ostenta é deliciosamente pecaminoso. Eu
podia ficar viciada nesse sorriso. Uma gama estarrecedora de novas
sensações explode dentro de mim, sentimentos ambivalentes se chocam
quando enrolo meus braços em volta de seu pescoço forte e exijo mais de sua
boca. O beijo como se não houvesse amanhã. Talvez não haja mesmo, cada
dia para mim tem sido como o último. Mas agora estou entre o céu e...
— Você está bem? — pergunta descolando sua boca da minha. Ele está
louco? Estou flutuando ainda na onda leve pós orgasmos.
— Sim, muito bem por sinal — dou meu sorriso para ele e recebo um
beijo nos lábios antes que ele deite nos travesseiros e me puxe para seus
braços. — Bruno...
— Boa noite, querida — ele me corta e apaga a luz ao lado da cama.
Para um homem que nada quer de mim além do sexo, ele está agindo o
contrário disso. Não está preocupado com o próprio prazer?
Ai, Bruno, assim vou começar a achar que você não é tão prostituto.
— O que o Alexander conversou com você? — pergunto momentos
depois, já que o silêncio estava ficando estranho e não conseguia relaxar para
dormir. — Claramente não foi algo que você gostou de ouvir, nunca tinha
visto você tão chateado.
— Você ainda está acordada? — ele se mexe e me encara — O dia foi
longo, Alicia.
Ele não quer me dizer o que conversaram? Isso me deixa ainda mais
curiosa.
— O que a polícia descobriu? — insisto, fazendo-o suspirar
pesadamente.
— Nada ainda, as câmeras de seu prédio não ajudaram muito. Claro
que a pessoa não ia facilitar nossa vida se expondo para elas, certamente —
ele me puxa outra vez para que eu fique de conchinha com ele — Amanhã
conversaremos, agora estou exausto e ferido, querida — ele dramatiza e beija
a curva do meu pescoço.
Mas eu quero algumas repostas, ele não irá mais fugir disso. Por hoje
tudo bem, mas amanhã ele dirá nem que eu tenha de torturá-lo em um porão.
Sorrio da imagem dele sendo meu prisioneiro e me aconchego ainda mais a
ele.
— Boa noite.
Ouço seu leve suspiro e percebo que ele já deve ter dormido. Deve
estar exausto mesmo para dormir antes de mim. Ele nunca faz isso, não
enquanto estive vivendo com ele semanas atrás.
Acordo na manhã seguinte sozinha e não vejo nenhum sinal de Bruno
por perto. Quinze minutos depois, saio vestida e quase pronta para voltar aos
meus afazeres do dia. Pena que terei de ir em casa para mudar de roupa. Essa
estava amassada.
Não vejo Bruno em lugar nenhum, vou olhar no escritório e nada.
Depois de voltar para a cozinha e me servir de um café, percebo o bilhete
dele no balcão.

Nate e Connor estão esperando para levá-la aos seus compromissos. B

Como é romântico!
Fico olhando o papel, e meus pensamentos voam para onde ele poderia
ter ido. Ligo para Marcos e combino de nos encontrar no local da festa de
Danila e, por um momento, esqueço Bruno e foco no meu trabalho. Dez
minutos depois, encontro minha dupla dinâmica esperando na porta de
Bruno, e me questiono por que diabos Bruno deixou os dois no corredor.
22
Deni
Matar uma pessoa era fácil demais, qualquer idiota poderia fazer com
uma arma na mão, mas então sou um idiota e, para ser sincero, eu sentia um
carinho por Alicia Duran. Meio mórbido, é verdade, mas um carinho de
qualquer forma. Ela me fascina de uma maneira que não consigo decidir se é
uma atração por ela ser linda ou a fascinação de saber que tenho um certo
controle sobre ela. Ela era tão serena e delicada, percebi no tempo que pude
ficar com ela no mesmo ambiente.
Eu queria conhecer todos os segredos dela, verdadeiramente. Descobrir
por que ela não revelava à polícia a identidade dos homens que ela disse ter
visto em seu depoimento. Só posso pensar que ela sabe mais do que admite.
Quero conhecer suas fraquezas e apertar seus botões até não ter nada
escondido sob aquela aparência fria e controlada.
Entretanto, eu sempre dava um passo para trás na minha aproximação
com ela. A culpa disso? Do meu querido irmão. Ele sempre consegue chamar
todas as atenções para si. Sempre tinha sido assim, até no dia que foi embora
da nossa casa. Ele deixou minha mãe em lágrimas por semanas e meu pai
raivoso e cuspindo fogo por seu filho preferir ir para o exército do que
assumir um lugar nas empresas da família.
Eu achando que o colocando no hospital, ele sairia do meu caminho
para ter Alicia em minhas mãos. Foi o contrário disso, e ela correu para ele
como uma mulherzinha apaixonada do caralho. Isso só fazia dela uma presa
mais fácil, eu sabia agora onde apertar e fazê-la abrir a boca e falar.
Nesse exato instante, tenho um Bruno enlouquecido subindo para falar
comigo, e sorrio de satisfação por tê-lo aborrecido e tirado de sua zona de
conforto.
Bruno
Quando invado o escritório do meu irmão, a fúria é minha
companheira. Minha vontade é quebrar seu corpo em pedaços sangrentos. Os
homens que faziam seus serviços sujos tentaram me impedir de entrar, mas
eles pensaram bem antes de colocar suas mãos sujas em cima de mim.
Devem ter avisado meu irmão, porque parecia que ele estava me esperando
no seu maldito covil.
— Eu vou acabar com você, Deni — grito furioso quando avanço para
ele e agarro seu pescoço. Minhas mãos em volta dele tão fortes que ele estava
ficando roxo, sem ar. Lembro que o maldito ainda é meu irmão e paro antes
que cometa um crime — Vim te dar um aviso e não vou me repetir: FIQUE.
LONGE. DA. ALICIA!
— Ou o quê? — ele rir e cruza seus braços despreocupadamente, como
se eu não tivesse tirado sua respiração segundo atrás — Vai sujar suas
mãozinhas inocentes com meu sangue? Você, Bruno? Não me faça rir.
— Estou avisando, Deni, saia de perto dela ou direi para ela quem você
é. Melhor ainda, entrego você à polícia como o assassino do marido dela —
digo baixo, minha raiva parecendo que irá explodir de dentro de mim.
— Faça isso e ela será posta em risco desnecessário. Posso deixar de
ser bonzinho e calá-la de uma vez por todas — ele não está brincando, ele
pode muito bem tentar fazer isso — Pelo nosso pai, ela já teria ido fazer
companhia ao marido salafrário dela, eu que ainda poupo sua vida, e olha,
irmãozinho, tive mais de centenas de chances de mandar sua querida
namorada para os ares e não fiz isso. Sabe por quê? Quero você desesperado
sem saber meu próximo passo. — ele está agora claramente debochando da
situação.
— Antes eu mato você, Deni — Caminho para a porta porque sei que
farei algo que me arrependerei mais tarde, como arrancar sua estúpida cabeça
fora de seu corpo maldito.
Falar com ele não vai adiantar, tenho que, de alguma forma, tirar Alicia
da cidade e fazer a polícia chegar neles. E eu mesmo farei questão de falar
com os policiais. Malditos.
Como direi para ela que meu irmão está, de alguma forma, envolvido
na morte de Evan Duran, sem que isso quebre a sua confiança em mim?
Como vou mantê-la afastada dele sem contar tudo?
Ligo para ela quando entro no carro, preciso saber onde ela está e ir até
ela. Não haverá nenhuma força sobrenatural que me fará sair de perto dela.
Nem que eu a algeme ao meu próprio braço. Tenho de pensar em um plano
para fazer Alicia entender que, nesse momento, ela tem de deixar sua
empresa de lado e sair um pouco de circulação. Eu só preciso pensar em algo.
Alicia
Estou a caminho do trabalho quando meu celular toca e o nome de
Bruno aparece no visor.
— Alô.
— Ainda enrolada em minha cama, querida? — ele diz do outro lado.
Tem um toque cínico em sua voz, ele não perdia uma oportunidade para
provocar.
— Não, infelizmente não gosto de brincar só — devolvo e entro na
brincadeira — O dono da cama achou mais fácil fugir logo cedo, me
deixando lá sozinha e querendo atenção.
— Acredite, eu teria gostado de acordar você, bebê, e fazê-la perder a
hora do trabalho — sorrio, incrivelmente contente com a promessa em sua
voz. — Onde você está agora?
Ah não, qual sacanagem ele quer fazer comigo ao telefone na frente dos
seguranças?
— Hummm, no carro ...
— Para aonde está indo? — Argh! Não era nada sacana, eu que estou
sexual hoje!
— Para a casa de eventos onde será a festa de Danila Fontes — digo
frustrada por ele ser tão sério, de repente, quando necessito que ele seja mais
leve comigo. Se eu quisesse ser honesta comigo mesma, mais safado comigo.
Passo o endereço para ele.
— Encontro você lá — ele desliga abruptamente e fico olhando para
meu telefone.
Meu dia começa frenético, logo que cheguei fui "atacada" por Marcos
cheio de dúvidas sobre a decoração do local, já que essa era umas das coisas
que eu teria visto ontem se não tivesse saído feito uma louca para ir atrás de
Bruno no hospital.
Hoje seria um dia longo.
Eu realmente amo o que faço, gosto de sentir a satisfação dos clientes
quando seus eventos saem de acordo com o que eles queriam, e fico mais
satisfeita ainda quando sou indicada para seus amigos. Essa era a verdadeira
propaganda de um negócio bem-sucedido.
Percebo que Bruno chegou logo depois de mim, mas ele ainda não
chegou perto o suficiente para falarmos, ele se manteve longe, me dando
espaço para que eu fizesse meu trabalho. Ele parece bem melhor que ontem,
apesar do curativo ainda na testa.
Só consigo falar com ele quando me arrasta para um almoço tardio,
coisa que eu havia esquecido de fazer hoje. Eu tinha a mania de esquecer
esses cuidados comigo mesma sempre que estava absorvida com o trabalho.
— Devia se alimentar melhor, Alicia — ele diz quando sentamos à
mesa em um restaurante perto do local onde estávamos.
— Estou correndo contra o tempo. Se não percebeu, tenho esse evento
acontecendo amanhã — sei que não falta muito para entregarmos o local
totalmente pronto amanhã, mas corri tanto atrás desse trabalho que estou
ansiosa demais para ficar quieta.
Pedimos nosso almoço, e observo que Bruno está calado e sisudo à
minha frente. Ele tem os olhos correndo ao redor, como de costume, mas ele
está claramente preocupado, percebo pelo vinco em sua testa e sua mandíbula
cerrada. Nesse tempo que convivi com ele, sempre está com um sorriso
cínico nos lábios e me chamando de viuvinha a cada cinco minutos, e desde
ontem que ele não solta suas habituais gracinhas.
— Algo o está incomodando, Bruno? — indago quando vejo que ele
não vai falar — É sobre seu acidente?
— Tenho um assunto para falar com você, mas não sei se seria
prudente trazer esse assunto agora — diz e me olha firmemente — Falar de
mim para uma cliente não é nada convencional.
Cliente? Lá vamos nós outra vez. Quando estou começando a me abrir
um pouco para nossa relação ele diz isso?
— Cliente? — Eu sou uma parva mesmo, não consigo segurar.
— Não me entenda mal, Alicia, tecnicamente você é, sim, minha
cliente acima de qualquer coisa, mesmo nós transando igual coelhos, isso não
muda. Afinal, estou zelando por sua integridade física — ele segura minha
mão por cima da mesa — Eu nunca pedi isso a uma mulher, Alicia. Nunca
precisei levar nenhuma a sério porque elas nunca dificultaram o sexo para
mim. Por que me comprometer se eu já as tinha conquistado e tirado delas
meu prazer? Mas quero assumir isso com relação a você.
Estou paralisada. O quê? Por que ele começou dando a entender que ia
falar um pouco de si e terminou querendo um relacionamento comigo? Ele
parece tão chocado quanto eu.
— Bruno... — começo, mas não sei o que dizer a ele. Estou apavorada.
— Bruno, eu não sei se...
— O quê? Você é mulher, Alicia, e as mulheres sempre querem algo
sério. Você não está sendo coerente, querida — diz, e eu puxo minha mão da
dele.
— Mas era só sexo! — Oh, Deus, o que estou fazendo? Eu não posso,
não ainda — Você disse isso, Bruno. Que podíamos nos divertir e eu poderia
esquecer...
Minha voz falha quando tento levantar da mesa. Estou em pânico...
— Alicia, sente-se — ele segura meu pulso, me fazendo sentar outra
vez — O que está havendo? Entendi tudo errado? Um mês atrás você ficou
puta da vida comigo porque eu terminei com você...
— Eu... — lágrimas queimam meus olhos e um nó na minha garganta
me faz tentar engolir em vão — Eu não posso — digo em um fio de voz.
Bruno
Por que diabos eu fui dizer isso para Alicia?
Ela estava me dando o fora? Ela que, há pouco mais de um mês, estava
puta comigo porque disse que não queria ter nada mais com ela? Eu estou
totalmente confuso agora, droga.
Mas não ia falar isso assim, depois de falar com Deni e ter ideia do
porquê de ele estar atrás dela. A minha ideia original seria tirá-la da cidade de
qualquer jeito, sem que eu tenha de contar sobre minha família, mas quando
abri minha maldita boca foi para fazer uma proposta que claramente ela não
ia aceitar. Confusão do caralho que eu mesmo criei.
Não queria dizer para ela que minha família era responsável por ela
ficar viúva, ela vai me odiar por isso ou correr para longe de mim. Esse
pensamento me deixa louco, no entanto, parece que a fiz se distanciar de mim
de qualquer maneira.
Ela parece apavorada na cadeira à minha frente, está se contorcendo
nervosa, e nunca a vi assim. Nosso almoço chega, e nós permanecemos
calados sem tocar na comida à nossa frente.
— Por que você não pode, Alicia? — É o que pergunto quando minha
maldita língua destrava. — Você não se importa de fazer sexo comigo, mas
levar um namoro ou qualquer dessas merdas de mulherzinha comigo é
demais para você?
— Não é você... — ela começa, mas eu a corto.
— Sim, vamos lá... o clássico "não é culpa sua, é minha". Alicia, somos
mais que isso! — estou começando a ficar furioso com ela.
Ontem essa mesma mulher estava gozando na minha cama, agora ela
vem com essa conversa de que não pode? Mesmo não sendo o que eu
realmente queria dizer, depois que saiu, percebo agora que quero isso com
ela. Eu a quero na minha vida, e isso é malditamente ruim, já que estou me
apaixonado por uma mulher que é evidente seu receio de entrar em um novo
relacionamento.
Qual o problema dela? O que diabos esse ex-marido dela fez para que
ela entrasse em pânico com um simples pedido para ir adiante na relação?
Porra! Não é nenhum pedido de casamento.
Vejo-a respirando fundo e tento me recompor também. Eu meti os pés
pelas mãos com ela agora. Mas Alicia conseguia me surpreender sempre,
nunca agindo como eu achava que ele iria. Entendi tudo errado ontem,
quando ela correu para me ver, preocupada comigo?
Droga, Bruno, você não está batendo bem da cachola, meu amigo,
resmungo para mim mesmo, internamente.
— Bem, não lhe pedirei outra vez isso, Alicia — pego meu garfo e
começo a comer.
Ela limpa a garganta.
— Você não vai me contar sobre sua família? — ela pede
delicadamente, e a incerteza do tom me desarma um pouco. Eu sei que ela
não teve um tempo bom com esse ex-marido, por isso eu queria dar um
pouco de mim, apesar de tudo.
— Não tenho muito o que falar — minto, certamente tenho muito o que
dizer a ela sobre eles — Vamos fazer um trato, Alicia?
Ela levanta seus olhos enormes para mim.
— Que trato?
— Eu conto mais sobre minha família e você me conta sobre seu
casamento e o porquê desse medo. Não; pavor, quando falei de irmos para
uma relação séria. — encosto-me na cadeira e a observando se contorcer
ainda mais em sua cadeira. — Então, temos um trato?
— Eu não acho que isso...
— É pegar ou largar, Alicia, ou a partir de agora serei apenas seu
segurança e nada mais que isso — Eu estou forçando essa porra de verdade.
Estou levanto tudo ao extremo hoje, fazendo exigências demais até para mim.
Mas minha viuvinha vai sair da porra da zona de conforto e falar comigo.
— Bruno, tem sido tão pouco tempo que nos conhecemos... — inclino-
me para ela sobre a mesa.
— Pare, Alicia. Não perguntei nada sobre o tempo que nos
conhecemos, quero saber se aceita o trato — digo e volto a encostar na
cadeira.
— Você não pode exigir isso — ela fala com mais firmeza dessa vez, a
Alicia impertinente começa a aparecer de novo. — Você surge com uma
proposta de uma hora para outra e quer que eu pule ao seu comando? Acha
que devo estar agradecida porque o fodão do Bruno Ross resolveu de um
momento para outro nos levar a sério? Você se escutou, Bruno? Essa não foi
a proposta mais romântica do mundo, sabe disso.
Ela dispara um discurso fervoroso. Descobri nesses minutos que
estamos sentados aqui discutindo, que meu ego não era tão forte assim, sua
recusa está amargando dentro de mim. Eu não sabia até então do quanto eu
precisava dela e do quanto ela se infiltrou dentro de mim. Que sua recusa me
deixou abalado...
— Você nunca fala de você, nunca deu a entender que era mais que
sexo, agora surge com isso e sem ao menos dar uma única indicação de nada?
— Ela, com certeza, não terminou seu discurso.
— Essa é sua resposta?
— Eu quero ficar com você, Bruno, mas isso não precisa ser uma
corrida de trem — ela me olha nos olhos — Por que não vamos devagar?
— Por que tenho a sensação que estou sendo usado sexualmente? —
resmungo. — Viaje comigo. Esqueça seu trabalho por um tempo e vamos sair
da cidade, e então acabamos com essa coisa de "não nos conhecemos de
verdade" —Sim, isso era o que deveria ter feito antes de falar demais.
— E para onde iríamos? — ela fica mais animada com essa
perspectiva.
— Qualquer lugar que queiramos ir.
Ela me dá um sorriso quando diz:
— Tudo bem, vou organizar as coisas.
Bem, as coisas podem não serem tão ruins assim.
23
Bruno
Acalme-se comigo
Me proteja
Me abrace
Deite-se comigo
E me segure em seus braços
O seu coração contra meu peito
Seus lábios pressionados em meu pescoço
Eu estou mergulhando dentro dos seus olhos
Mas eles ainda não me conhecem
Com um sentimento que vou esquecer
Estou apaixonado agora

Ouço a música tocando ao fundo e puxo Alicia para um canto longe


dos convidados. Eu não lhe dou chance de protestar: esmago minha boca na
dela, empurrando minha língua de encontro a sua e a beijo forte. Quando ela
consegue sair do meu agarre, está trêmula e vermelha.
— O que foi isso? — sua voz está permeada de desejo e reprimenda, e
eu me inclino outra vez para sua boca. — Bruno, estou no meu trabalho. —
Ela sussurra como se tivesse medo que alguém a escutasse, mas quem está
dando à mínima que a organizadora da festa está passando bons momentos
com seu segurança?
Eu não me importo, quero-a louca de desejo e me querendo, não
importa o que ela fale de não querer dar um próximo passo.
Desde ontem que algo estalou dentro de mim e estou puto com sua
rejeição, mas estou determinado a fazê-la mudar de ideia, vou deixar essa
mulher louca por mim ou não me chamo Bruno Ross. Se ela quiser a lua,
darei a porra da lua para ela. Mas, no fim, seu coração será meu. Ela será
completa e irrevogavelmente minha.
— Dance comigo — Digo de encontro aos seus lábios
— Não sou uma convidada, Ross, tenho que terminar...
— Quem se importa com isso? Você não parou cinco minutos desde o
começo da noite, dê um tempo para você, Alicia. Eu quero dançar, e ninguém
vai me impedir — digo decidido, passando meus braços por sua cintura fina e
trazendo seus seios de encontro ao meu peito com força, não deixando
dúvidas de quem estava no controle aqui.
— Você está tão abusado — ela fala, mas sei que está se rendendo para
mim.
— Sempre fui assim, bebê — Beijo seus lábios lentamente mais uma
vez, quando nossos corpos vão ao ritmo lento da música que continua ao
fundo. Quero que ela me abrace como quer ser abraçada e como quer ser
amada. Estou tão perdido nela, tão louco por ela, que preciso me policiar para
não esquecer que tenho de mantê-la segura.
— Estou ficando tão louco por você — sussurro em sua orelha, e ela
fica tensa. — Quando você será completamente minha, bebê? Quando
deixará tudo ir e se entregará de verdade para mim? Sabe, gosto de deixar
você molhada, de saber que você pertence a mim e só a mim. Quero ser o
único dono de cada pensamento seu...
— Bruno, não está jogando limpo... — seu murmúrio suave e trêmulo
me deixa duro de encontro à sua barriga, estou latejante por ela.
— Adoro jogar sujo com você, Alicia — digo baixinho — Não vejo a
hora que irmos embora e eu poder foder você bem gostoso...
Ela dá um suspiro trêmulo, e dou um sorriso para mim mesmo; ela
nunca mais dirá não para mim. Minha missão: deixar Alicia Duran louca por
mim.
...

Acalme-se comigo
E eu vou ser a sua segurança
Você vai ser minha garota
Eu fui feito para manter seu corpo quente
Mas sinto frio quando o vento sopra, então me abrace
...
Dançamos absortos, como se existisse só nos dois naquele lugar. E,
pouco depois, quando um dos funcionários vem em busca dela e ela sai dos
meus braços, tenho essa sensação de vazio no peito como se tivesse algo
arrancado de mim.
Olho ao redor da sala ainda cheia e pergunto-me que horas Alicia vai
dar a noite por encerrada.
A festa de confraternização que ela organizou agora virou uma balada
para os jovens advogados da empresa, e ninguém diria que eles eram
advogados sérios, pois estavam mais soltos depois que os superiores tinham
ido embora, pelo visto.
São duas da manhã, e Alicia ainda está elétrica, ela não parou um
instante sequer. Estou zonzo de seguir cada passo dela, mas não vou perdê-la
de vista.
Deni tinha estado na festa mais cedo, ele havia sido convidado, fez
questão de estar cada vez mais perto de Alicia em cada oportunidade que
teve. Eu entendia seu jogo comigo. Ele queria que eu perdesse o foco e
descuidasse dela. Mas ele deveria me conhecer melhor, tenho cada canto
desse lugar cercado. Ele não daria um passo em falso ou eu cairia sobre ele
com fúria.
Ele tinha saído, mas mantive um cara na cola dele. Não daria a chance
de ele se aproveitar hoje com essa movimentação de pessoas ao redor de
Alicia.
Eu passei boa parte do dia com Alex, planejando minha viagem. Ele era
totalmente contra, já que seria mais fácil sermos atacados estando só eu e
Alicia. Nem que eu tenha que ficar em um quarto trancado com ela, vou tirá-
la de perto de Deni. E a ideia de ficar isolado do mundo com Alicia não é má,
na verdade, eu adoro cada vez mais isso.
Corro meus olhos atrás dela quando a vejo ir falar com os garçons. Ela
não cansa? Estou indo atrás dela quando Carl aparece ao meu lado.
— O homem que estava atrás de seu irmão disse que ele foi para casa
— ele diz com seu jeito estoico de sempre — Se ele quiser mesmo fazer algo
para Alicia, acho que hoje não será o dia.
— Não confie nisso — digo e volto a olhar para onde está Alicia e
paraliso — Porra, aonde ela foi?
Alicia
Dando uma última olhada ao redor para certificar-me que tudo tinha
corrido bem e que agora eu poderia ir para casa tranquila, vou até onde estão
os garçons contratados e dou as últimas orientações para eles. Eu gosto de
ficar até o último convidado sair, ver se tudo estava certo nos mínimos
detalhes possíveis, não gosto de ter surpresas desagradáveis mais tarde, mas
isso foi antes de ter um segurança em meu encalço a noite inteira.
Pensando nisso, entro na sala onde estava sendo usada como depósito
de garrafas vazias e, como está tudo ok, dou meia-volta para ir ao encontro de
Bruno e irmos para casa. O salão de festas não fica muito distante, e caminho
calmamente para lá quando paro petrificada no corredor. Um homem de terno
está parado na minha frente, e sinto todos os pelos da minha nuca eriçar. Ele
me parece familiar, tenho a sensação de que o vi em algum lugar quando ele
fica parado, calado, olhando-me. Não lembro se ele é um convidado, se o vi
durante a noite, quando circulei no meio dos convidados de Danila.
— Posso ajudá-lo? — Pergunto, encontrando a minha voz firme, apesar
de sentir meu coração batendo forte em meu peito. — A festa é para lá —
aponto, e ele continua me olhando sem mexer um músculo da face.
Quando tento falar outra vez, ele diz:
— Você é Alicia Duran? — a voz é fria, e antes que eu responda, vejo
Bruno aparecer atrás do homem.
— E você, quem é? — Bruno pergunta, o homem se vira para encontrar
a carranca de Bruno.
— Só preciso saber onde ficam os banheiros. — ele responde
calmamente, como se fosse normal ficar em um corredor e o banheiro fosse
se materializar ali.
— Tenho certeza de que eles não ficam por aqui — Bruno vem para
meu lado, ficando entre mim e o homem.
— Obrigado — seus olhos caem em cima de mim outra vez — Boa
noite, senhora. — A forma que ele me olha faz algo estalar dentro da minha
cabeça, uma sensação de déjà vu.
Ele vira e vai embora. Bruno pega o telefone e fala com alguém sobre
ele. Não escuto o que ele fala, minha mente é um turbilhão frenético como se
quisesse me dizer algo, e minha respiração corta quando uma imagem pisca e
lembro onde vi aqueles olhos me olhando da mesma forma que me olhavam
antes de virar e ir embora.
Oh, meu Deus! Oh, meu Deus!
Sinto minhas pernas fracas quando me encosto à parede que estou
próxima, chamando a atenção de Bruno. Ele tinha parado de falar ao telefone
e segura-me forte pela cintura. Cada respiração que tento dar parece que está
esmagando meus pulmões e pânico começa a se construir dentro de mim.
— Você está bem, Alicia? — ele pergunta preocupado, observando
minhas mãos trêmulas — Ele fez algo com você?
Tento falar, no entanto, minha língua parece colada ao céu da boca.
Tento respirar e não consigo. Bruno me pega em seus braços e leva para fora
do corredor. Como estamos longe da saída, ele me carrega até um banheiro e
me senta no balcão de mármore.
— O que houve que deixou você assim? — ele segura meu rosto em
suas mãos, fazendo-me olhar seus olhos quando ordena: — Diga-me!
— A-aquele homem, eu lembro dele... — digo baixo
— De onde, Alicia?
— No elevador... na noite que Evan... — não preciso continuar para ele
entender o que quero dizer.
— Por que não disse antes, Alicia? — ele está pegando outra vez seu
telefone — Carl, você tem o cara? O quê?
Ele escuta Carl falar e começa a esbravejar ao telefone.
— Puta que pariu, ele só acabou de sair daqui, não daria tempo de ele
sumir. Manda alguém verificar tudo, ele pode ser um dos assassinos de
Duran.
Aperto meus olhos fechados e respiro fundo.
— Estou tirando Alicia daqui agora, indo para saída da lateral — ele
guarda o celular e olha-me por um segundo, fixamente. Seu olhar frustrado
me deixa ansiosa. — Vamos sair daqui.
Ele não espera por nenhuma resposta, pega-me nos braços e me carrega
para fora em direção à parte lateral onde tem uma saída direto para os
seguranças, que têm um carro bem na entrada nos esperando. Quando sento
no banco atrás da SUV, me lembro das minhas coisas, tenho de avisar alguém
para pegar. Estou pensando nisso quando Carl chega e me entrega meus
pertences. O carro arranca, nos levando para o trânsito.
— Conseguiu alguma coisa? — Escuto a voz de Bruno e percebo que
está falando ao telefone — Porra, essa era uma chance de termos algo
concreto sobre esses caras... O local tem a circuito interno, verifique. Estou
saindo do local.
Ele continua falando com a pessoa do outro lado, e minha mente deriva
para imagens nada agradáveis do que poderia ter acontecido se eu não
estivesse sob a proteção de Bruno e os outros homens.
Mantenho-me calada todo o caminho, e cada vez que penso o quanto
estive perto de um dos assassinos de Evan, sinto o suor frio correndo por
minha pele. Ele veio atrás de mim, eu nunca tive tanto medo desde a noite
que encontrei Evan morto na nossa sala. Eu queria correr para longe disso.
Sinto-me fraca, frágil e com a sensação que minha vida pode ser tirada a
qualquer minuto. Não tinha percebido que lágrimas caíam dos meus olhos,
até que sinto o lenço que Bruno coloca em meus dedos trêmulos e me puxa
para seus braços. Enterro minha cabeça em seu pescoço, inalando seu cheiro,
e começo a me sentir mais segura outra vez. Ele não pede que eu fale
qualquer coisa, porque sei que isso só fará a coisa ser mais real para mim.
Quando chegamos ao meu prédio não descemos de imediato. Ele
enviou Nate e outro segurança que não conheço para verificar meu
apartamento, e isso faz eu me sentir com mais medo. Será que ele acha que
alguém vai invadir minha casa?
Passa algum tempo antes que ele fale com Nate e me leve para cima
ainda em seus braços, mesmo eu protestando que posso andar, mesmo que
minha voz seja fraca. Ele não me dá ouvidos. Vamos direto para meu quarto,
e ele me deixa na cama antes de sentar ao meu lado.
— Está melhor? — pergunta, sua voz suave e preocupada. Quando
assinto, ele levanta e vai em direção ao banheiro e volta pouco depois,
retirando seu terno e ficando só com a camisa branca a qual ele arregaça as
mangas até os cotovelos.
— Venha aqui, vamos livrá-la desse vestido — olho surpresa para ele,
mas me dá um pequeno sorriso — Não se preocupe, só quero que tome um
banho e vá para cama.
Humm, chato.
Ele me puxa levemente para ficar de pé, ajuda a tirar minhas roupas e
leva-me para o banheiro onde a banheira está quase cheia. Ele tinha jogado
sais dentro, e acho que exagerou porque as espumas estão densas.
— Vamos lá — diz quando desliga a água e me ajuda a entrar. Não me
importo que ele esteja fazendo algo que posso fazer sozinha, sinto-me bem
com ele aqui cuidado de mim por um momento.
Meia hora depois estou na cama, e meu segurança/babá tem uma xícara
de chá para mim também.
— Obrigada — digo quando ele me dá a xícara — Você hoje está
meigo, senhor Ross.
— Eu sou meigo, bebê — ele me dá um sorriso de molhar calcinha —
Mas você levou um susto e precisa se deixar ser cuidada um pouquinho.
Sinto lágrimas quentes correrem por meu rosto. Além de Matt,
ninguém nunca se preocupou em cuidar de mim, nem mesmo meu ex-marido
tinha esse cuidado ou se importava depois que nós casamos.
— Hey... Está tudo bem. Não deixarei ninguém machucar você,
prometo — Bruno se inclina e tira a xícara de meus dedos. Depois de
depositá-la no criado-mudo, segura meu rosto com as duas mãos, retirando os
vestígios de lágrimas, e beija suavemente meus lábios — Vou cuidar de você,
querida. Confia em mim para isso?
Assinto quando envolvo meus braços em seu pescoço.
24
Bruno
— Está tudo bem, amor — murmuro contra os cabelos de Alicia e a
puxo para meus braços. Beijo ternamente sua face banhada de lágrimas e
tento controlar a raiva.
Esse sentimento avassalador que ela me faz sentir é tão estranho quanto
novo e não sei que rumo dar para ele. Mas a única coisa que posso fazer
agora é segurar minha garotinha frágil e cuidar dela. Ela não é tão forte como
diz e não sabe o que fazer comigo cuidando dela.
Depois de um tempo, ela dorme e eu saio da cama, a fazendo
resmungar algum protesto mesmo dormindo. Vou para a sala, encontrando
Carl lá junto com Nate.
— Alicia está bem? — Nate levanta quando me vê entrar — Ela
parecia não estar nada bem.
— Sim, está dormindo — digo a contragosto. Qual a dele com Alicia,
está afim dela também? Franzo minha testa com o pensamento dele a
cobiçando e tenho vontade de extravasar a raiva que estou acumulando dentro
de mim. — Nada que deva se preocupar.
Digo duro, e ele deve ter notado meu tom nada amigável, porque olha
para mim também com o cenho franzido.
— É claro!
Carl, que se mantinha calado, dá um meio sorriso quando sento em
frente a ele.
— Marcando território, Ross?
— Não preciso disso, só deixando claro as coisas por aqui — não
queria nenhum idiota com um pau perto da minha mulher, isso é um fato
simples. — Quais as novidades? Falou com a polícia?
— Sim, mas você acredita que eles não estão muito preocupados com
isso? — ele escora os cotovelos nos joelhos, inclinando para frente. — Eu
posso apostar que seu pai tem um dos grandes da polícia na folha de
pagamento, cara, isso é muito estranho.
Deve ter mesmo, por isso não fui à polícia ainda entregar os filhos da
mãe. Meu pai era esperto e estava brincando de gato e rato até nos cansarmos
e relaxar para ele fazer a jogada dele.
— A casa está pronta? — Carl tinha ficado encarregado de encontrar
um lugar seguro para mim e Alicia.
— Tudo certo, lá tem até um quarto do pânico — diz sorrindo, coisa
rara de se ver em Carl, um sorriso.
— Espero não poder usá-lo. E o carro?
— Estará aqui sem que haja nada suspeito sobre ele. Tudo limpo —
fala e levanta — Estou indo, meu amigo, amanhã falo com você.
— Mais tarde, você quer dizer — digo, levantando também para segui-
los até a saída. Quando eles saem, verifico o sistema de segurança e volto
para o quarto.
Quando deito, Alicia se agarra a mim como uma tábua de salvação em
seu sono.
Estou ficando fraco para as mulheres. Dormir ao lado dela por noites
seguidas e sem sexo? Preciso me tratar urgente.
Deni
— Qual foi a reação de Alicia ao vê-lo? — pergunto ao homem de pé
em frente à minha mesa logo cedo de manhã.
Eu começo a trabalhar antes das seis todos os dias, não importa o que
aconteça, e hoje eu estou mais que ansioso para saber como Alicia se
comportou ao ver o homem que ela supostamente esqueceu a fisionomia.
— Ela não pareceu me reconhecer — ele diz. Seu nome é Frank, foi ele
que puxou o gatilho naquela noite, mas teve a idiotice de sair junto com os
outros imbecis pela frente do edifício, como uns amadores filhos da puta —
Mas não tive muito tempo com ela, seu segurança apareceu e tive de cair
fora. Pela forma que ele me olhou, pode ter ficado em alerta. Ele não deu
muita chance para eu me aproximar dela durante toda a noite.
— Deixou meu irmão te ver? Como pode ser tão idiota? Aposto que
agora tem um monte de policiais querendo pôr as mãos em você — digo
furioso.
— Espero que não, senhor — olho feio para ele, pensando no quanto de
ingenuidade um homem como ele pode ter.
— Torça para que não seja pego, ou você não chegará vivo na prisão —
dou um sorriso frio para ele ter a certeza que não é brincadeira — Saia de
circulação por um tempo.
Ele assente e sai. Respiro profundamente e aperto meu nariz para
conter a raiva. Me aproximar de Alicia foi um erro. Eu devia ter mantido
distância dela. O tempo está correndo e não consigo executar as coisas direito
quando se trata dela. Um mês perto foi o suficiente para acabar com isso, mas
eu deixei passar e agora eles estão perto demais de pôr tudo a perder.
Alicia
— Onde estamos indo? — pergunto enquanto dobro um par de roupas e
coloco em minha mala, em cima da cama.
Estou fazendo uma mala sem saber para onde vamos. Bruno quer sair
da cidade o quanto antes e não me deu tempo de organizar meus
compromissos na empresa e deixar Marcos supervisionando tudo. Eu ainda
estou nervosa por ontem à noite, mas ele não saiu um minuto de perto de
mim, e quando digo um minuto, é isso mesmo. Ele enviou um dos caras para
pegar uma mala em seu apartamento e não me permitiu ir trabalhar hoje. Eu
cedi porque estou apavorada. Acordei hoje cedo com outro pesadelo. Eles
tinham parado, mas voltaram ontem, me deixando mais nervosa durante todo
o dia de hoje.
Odeio essa sensação de sufocamento que sinto em não poder ser livre
para ir e vir e fazer aquilo que gosto, sem me preocupar se tem um assassino
em minhas costas. Eu tinha chorado de desgosto e medo nos braços dele, e
ele só ficou lá, sem soltar suas gracinhas habituais, sem nenhum apelo sexual
no nosso abraço. Eu sei que ele está muito preocupado com algo que não só é
minha segurança, há outra coisa, além disso, o perturbando, e eu queria que
ele confiasse em mim para falar. Sei que não estamos nesse nível de
confidências, ainda precisamos trabalhar isso, tanto eu como ele.
Ele ainda não me passa segurança emocional, tenho meu pé atrás
porque ninguém muda da noite para o dia, até ontem ele só transava e ia
embora, por que não fará isso comigo? Quem me garante que seu interesse
não é maior porque eu não me jogo nele como deve fazer suas outras
mulheres? Quem garante para mim que sua óbvia preocupação comigo não é
só trabalho? Minha cota de decepções se esgotou com a morte de Evan e seu
mau caráter em me deixar com assassinos atrás de mim.
Mas apesar de dizer tudo isso para mim mesma, ele tem sido um
bálsamo para minhas dores e angústias dos últimos tempos. Eu gosto de sua
companhia, de me sentir querida e sei que, no fundo, estou caindo de amor
mais uma vez por alguém, ainda que continue negando. Ele me assusta
terrivelmente, porque ele pode me machucar mais do que Evan fez, disso eu
tenho certeza. No fim, não amava Evan tanto assim. Ele já havia acabado
com isso, com suas cobranças, como se fosse tudo culpa minha em não dar a
ele o que queria de mim.
Olho para Bruno, que está recostado em minha cama vestido
casualmente com jeans e suéter preto. Ele dá a impressão que está relaxado,
mas não está, sei disso pela mandíbula apertada. Esteve muito calado durante
todo o dia, só reafirmou que queria sair à noite, para não dar chance de quem
estivesse nos observando nos seguir.
Eu não posso decidir se estou chateada, com medo ou frustrada com
tudo isso. Estou quase virando uma fugitiva.
— Surpresa — ele resmunga quando achei que ele não responderia.
— Isso é chato, como vou levar as roupas certas? — levanto minhas
sobrancelhas para ele quando vejo o sorriso malicioso surgindo nos lábios
dele.
— Bebê, roupa não será problema — estica-se mais sobre minha cama
e sorri mais largo, fazendo meu coração pular feito um louco no meu peito —
Leve o essencial.
— Que tipo de viagem é essa? — resmungo quando vou pegar minha
nécessaire com produtos de higiene no banheiro.
Leve o essencial? Homens não entendem que mulher não viaja com o
essencial, ainda mais quando ela não sabe aonde vai.
Quando volto do banheiro, guardo o resto das coisas e fecho a mala,
encarando-o.
— Você é muito curiosa. — ele levanta e me puxa para cima dele e nós
dois caímos na cama — Liguei para seu irmão mais cedo e informei que
vamos ficar fora um tempo.
Oh, meu Deus, mal tenho visto e falado com Matt!
— Preciso falar com ele — digo e tento me soltar de seus braços.
— Alicia, ele disse que posso ficar com você o tempo que quiser. —
ele diz quando segura meu pescoço, trazendo minha cabeça para baixo.
— Mentiroso! Matt nunca diria uma coisa dessa. — repreendo quando
escondo meu sorriso. — Sou sua irmãzinha querida!
— Disse mais, que posso abusar de você de todas as maneiras que eu
quiser — fala de encontro à minha boca, em um sussurro rouco, antes de me
beijar. Retribuo porque sou incapaz de ter sua boca junto à minha e resistir,
não quero resistir mais. Gemo quando ele rola ficando por cima de mim e
aprofunda o beijo. É sempre assim: um pequeno carinho se transforma em
labaredas incandescentes de desejo quando nos tocamos.
— Bruno? — digo quando ele puxa a boca da minha e enterra a cabeça
nos meus cabelos, me deixando respirar um pouco.
— Sim? — ele beija meu pescoço, o colo. Sinto sua boca quente por
cima da minha blusa de malha fina, nos meus mamilos, deixando minha blusa
molhada e...
— Não temos tempo para isso... Ainda quero falar com Matt — digo
ofegante, mas seguro sua cabeça perto do meu peito.
— Ninguém precisa saber aonde vamos — ele levanta e senta na cama
— Melhor para você, não quero dar chance de sermos seguidos. Confie em
mim. É tão difícil assim, bebê?
— Eu confio — fico de joelhos na cama e passo os braços por seus
ombros, por trás, descansando minha cabeça na curva do seu pescoço que
cheira delicioso.
Bruno
Envio o carro de Alicia com Connor dirigindo em outra direção da qual
estou indo com ela. Peguei outro carro novo, já que preciso despistar Deni ou
sua corja de imbecis para longe do nosso destino. Faz uma hora que saímos
de carro. Não vou muito longe, nem vou sair do país, a melhor forma de se
esconder é em um lugar que ninguém acha que você irá.
Tenho mantido o olho no retrovisor, e nada que possa indicar se fomos
seguidos, assim eu espero. Não quero as mãos porcas do meu irmão em cima
da minha mulher, porque, porra, ela é minha e qualquer filho da puta que
colocar a mão nela vai sofrer. Eu não me importo se é meu irmão ou seus
malditos comparsas.
A fúria queima dentro das minhas entranhas e ameaça explodir desde
ontem quando ela me disse que o cara que a abordou era um dos assassinos.
Isso me deixa doente, pensar no que ele poderia ter feito com ela se eu não
tivesse chegado logo. Sinto raiva por não ter segurado o cara. Agora ninguém
sabia dele, ele tinha evaporado e não foi pego por nenhuma câmera do
circuito interno.
Deni miserável, eu preciso falar com meu pai, mandarei ele recuar
junto com Deni, ou seja lá com quem mais eles estão trabalhando. Preciso
saber o que eles querem realmente dela, porque uma coisa é certa: eles
querem algo. Eu conheço meu pai, ele não hesitaria em mandar colocar uma
bala na cabeça dela se ela fosse apenas uma ameaça de uma investigação
caindo sobre eles e seus negócios ilícitos.
Olho para a mulher ao meu lado no banco do carona e sinto meu
coração palpitar no meu peito. Nunca me importei ou me envolvi tanto com
uma cliente como estou com Alicia. Nas outras vezes, eu tinha ido uma ou
duas vezes para a cama com elas e partido para uma nova mulher, mas a
minha viuvinha marrenta me quebrou quando não estava olhando. Estou
apavorado para caralho!
Estendo minha mão e agarro a sua, trazendo para meus lábios e
beijando o dorso, fazendo-a virar a cabeça para me olhar. Olho para a estrada
e começo a investigar:
— Diga-me, o quanto você sabia do trabalho do seu marido? — odeio
essa palavra quando me refiro àquele idiota. Ex-marido filho de uma cadela.
Ela não responde imediatamente, mas, quando fala, sua voz mostra a
decepção clara em seu tom.
— A única coisa que sei é que ele era corretor da bolsa, Bruno — diz
— Eu só soube que ele estava metido nisso quando ele morreu.
— Ele nunca disse nada a você sobre qualquer um dos seus clientes,
nada que você lembre? Geralmente os maridos conversam com suas esposas,
não?
Ela ri, e não é de alegria
— Isso seria a piada do ano — Alicia vira no banco para ficar olhando
para mim. — Não tínhamos mais um casamento, Bruno. Só estávamos
levando isso, talvez, porque não queríamos dar o último passo, que era o
divórcio.
— E por quê? Ele te maltratava? — mordo as palavras. Maldito, se
ainda estivesse vivo acabaria com ele.
— Não como você pensa — ela vira para a janela e não diz mais nada.
Frustração me toma quando percebo que ela não falará mais.
— Fale comigo, Alicia — peço calmamente. Tenho vontade de parar
no acostamento, pegá-la no colo e beijar até que sua tristeza se dissolva em
meus lábios. — Não quero ser invasivo, mas falar, às vezes, faz bem.
Isso era eu mesmo falando? O cara que não quer contar para ela quem é
minha família?
Espero ela começar a falar, no entanto, ela continua virada para a janela
e, depois de um tempo, eu deixo por enquanto, porém voltarei a tentar tirar
alguma informação dela sobre seu casamento e assim eu possa ter uma ideia
do que meu pai quer com ela.
Ligo o som do carro e coloco uma música para quebrar o silêncio que
se instalou, me deixando nervoso. Sei que ela não confia em mim.
Independentemente de ela ter afirmado mais cedo que confiava, creio que
confia somente em mantê-la segura, mas, na parte que interessa, ela não
confia. Aumento o som mais um pouco e Stay With Me invade o silêncio
deixado no carro.

Oh, por que você não fica comigo?


Pois você é tudo o que eu preciso
Isso não é amor, está bem claro
Mas amor, fique comigo
Por que estou tão emotivo?
Não, não dá pra ficar assim
Preciso de auto-controle
E lá no fundo eu sei que isso nunca funciona
Mas você pode deitar aqui comigo para que não doa

Eu preciso controlar meu ímpeto com Alicia, ela simplesmente tira meu
eixo, e a quero totalmente entregue para mim.
Depois que rodamos uma meia hora, ela se vira para mim.
— Vai demorar muito para chegarmos? — seus olhos estão sonolentos.
— Entediada, bebê? — olho rapidamente para ela e volto a olhar a
estrada.
— Só um pouco — diz — Tínhamos de sair tão tarde?
— Sim, era necessário — afirmo.
— Eu liguei para seu irmão hoje — ela diz casualmente.
— Você fez o quê? — eu freio o carro tão bruscamente que ela solta
um grito assustado — Mas que porra, Alicia!!
— Você está maluco? Quer nos matar?! — ela está de olhos
arregalados e agarrada ao banco do carro.
Mas que merda!!
— Que hora você fez isso? — agarro o volante com minhas mãos
crispadas de raiva. Alguém me ajude ou vou esganar essa mulher — Você
disse que íamos viajar, Alicia?
— Claro que não, estúpido! Você passou o dia inteiro falando para não
dizer a quem quer que seja, por que eu falaria para ele? — grita furiosa — E
por que não podia falar? É seu irmão!
— Ele é mais meu inimigo que irmão, Alicia — viro para ela — O que
exatamente você falou para ele?
— Nada de mais, só que precisava adiar mais uma vez nossa reunião.
Eu fiquei de ligar para ele, Bruno, e honro meus compromissos — ela cruza
os braços na defensiva, olhando para frente fixamente. — Não entendo vocês
dois.
— Alicia...
— Não posso aceitar suas exigências sem saber o motivo — ela olha
para mim — Custa me dizer o porquê dessa raiva entre vocês?
—Talvez seja pelo mesmo motivo que você não fala do seu casamento,
Alicia — vejo-a abrir a boca para falar e desiste.
Sei que não é justo mantê-la no escuro, mas, porra, não quero perdê-la
agora. Quero ficar com ela até o último minuto que eu puder. Depois dessa
viagem vamos sentar e conversar. Isso se eu não entregar o filho da puta para
a polícia.
Mesmo ela tendo dito que não falou para Deni, preciso fazer uma
parada antes do nosso destino. Quero verificar se posso continuar com isso.
Verifico minha arma, que mantenho em um lugar de fácil acesso, e ligo o
carro outra vez.
— Desculpe por preocupar você — escuto Alicia dizer, e sua voz faz a
raiva evaporar. Não resisto e passo um braço pelos seus ombros, a atraindo
para mim, e ela vem sem resistência. Essa mulher ainda vai ser minha morte.
— Não quero brigar com você.
— Tudo bem, querida. Só estou sendo cauteloso, não quero que nada
aconteça com você. — ela se aconchega mais em mim. Dirigir e ter Alicia
perto é um perigo. — O pensamento de você se machucar me deixa louco.
— Eu sei.
25
Alicia
Bruno faz questão de fazer uma parada antes do nosso destino final,
segundo ele, para verificar se não fomos seguidos.
Paramos em um posto de gasolina, onde ficamos em torno de meia hora
na loja de conveniência. Nós estamos chamando a atenção por passar tempo
demais fingindo sermos clientes. Depois de comprarmos água, caminhamos
de volta para o carro, deixando o homem do caixa nos olhando esquisito.
Estamos rindo quando partimos de lá. Nossa aventura era divertida, no fim
das contas. Eu imaginava a nós dois como nos filmes americanos, fugindo de
bandidos armados. Bem, de qualquer maneira, estamos mesmo.
O resto da viagem foi sem nenhum sobressalto de ambas as partes.
Acabei cochilando com minha cabeça no colo de Bruno, e quando acordei, o
dia estava amanhecendo. O lugar que ele para o carro é um enorme chalé
requintado à beira de um lago, de madeira escura e rodeado por um jardim
exuberante. Parecia mais uma pequena mansão do que realmente um chalé,
com uma vista linda do lago azul-esverdeado àquela hora da manhã.
Saio do carro para que possa ver mais do lugar, extasiada com a
paisagem. O chalé tem um deck que vai para o lago com piso de madeira e
uma vegetação ao redor indo em direção à água onde há espreguiçadeiras
acolchoadas com estampas floridas de cores claras.
Estou apaixonada pelo lugar e nem vi por dentro, ainda. Bruno não se
detém e pega a nossa bagagem, levando tudo para a porta da frente de
madeira maciça. Ele digita algo em um pequeno teclado escondido por uma
tampa de metal na parede ao lado da porta. Ouço um clique e a porta abre.
Caminho atrás de Bruno e paro, fascinada pela sala. É tudo meio rústico de
propósito, a pessoa que decorou o lugar queria passar a sensação de estar no
campo, de verdade.
Os móveis de madeira envernizada eram luxuosos. Assim como o teto
arcado de madeira e a lareira, em um canto da sala, com sofás de couro
escuros contrastando com a cor caramelo do lugar. No chão, tapetes persas,
não sei se eram originais, mas davam um ar ainda mais requintado à sala.
— De quem é essa casa? — pergunto curiosa para Bruno quando
caminho até a lareira. Queria que estivesse acesa.
— Bom, acho que pertence ao Carl — diz e leva nossas malas para
outro cômodo, que imagino ser um dos quartos. — Eu não queria ir para um
lugar onde tivesse muita movimentação de pessoas, aqui eu tenho uma visão
com câmeras de segurança que estão em lugares estratégicos. Quem se
aproximar daqui eu verei imediatamente. Nosso vizinho mais próximo é a um
quilometro daqui. Então, senhora Duran, você é minha refém. Totalmente
minha.
Sorrio quando paro atrás dele em um quarto com vista para o lago de
tirar o fôlego.
— Oh, não! Nunca mais quero ir embora desse lugar, é fantástico,
Bruno — vou até a janela de cortinas brancas esvoaçantes que se abre para o
deck e respiro o ar limpo e saudável da manhã, enchendo meus pulmões sem
os gases poluentes da cidade grande. — Amei esse lugar, mas eu preciso
dormir.
Digo quando viro para encontrá-lo, praticamente, colado a mim. Ele
envolve seus braços na minha cintura e me atrai para seu peito firme.
— Gosto muitíssimo dessa ideia, bebê — ele me beija, e esqueço que
estou exausta da viagem, sinto-me energizada com sua presença. — Vou
fazer você gozar, querida. — sua voz rouca e profunda fazendo minhas
terminações nervosas palpitarem em expectativas.
Nossas línguas duelam, e gemo quando ele me empurra facilmente em
direção à cama larga e baixa, forrada com lençóis brancos, que está bem no
meio do quarto. Não presto atenção a nada, a não ser no homem que me beija
tão ternamente que minha barriga dói de ansiedade.
Meus braços ao redor do seu pescoço, minhas costas arqueadas para
que meus seios estejam colados ao peito duro de Bruno. Caímos na cama
com ele sustentando nosso peso nos braços, nunca deixando de nos beijar
profundamente. Ele não perde tempo quando os dedos dele brincam com
minhas dobras por baixo da calcinha e, quando introduz dois dedos dentro de
mim, eu grito na sua boca que não desgruda da minha. Meus quadris têm
vontade própria quando mexo ao encontro de seus dedos habilidosos.
— Goze para mim, bebê — Bruno afunda mais um dedo, fazendo tudo
ficar nublado quando gozo gritando seu nome, que é engolido por sua boca
que, como seus dedos, é implacável e cruel tirando tudo que pode do meu
corpo. Nem estamos nus ainda e eu já perdi minha mente nesses poucos
minutos. Vou amar tê-lo todo para mim esses dias.
De repente ele levanta e fica em pé ao lado da cama, trazendo-me à
realidade depois de praticamente perder minha mente.
— Por que não se despe, minha querida? — sugere, mas parece uma
ordem, e seu rosto não deixa margem para dúvida. Faço o que me pede
languidamente, quando sento na cama e começo a retirar meu vestido,
ficando apenas de calcinha e sutiã enquanto ele apenas observa. — Tudo!
Fogo se constrói novamente em mim quando levo minhas mãos às
costas rapidamente e retiro meu sutiã. Logo em seguida minha calcinha faz
companhia à pilha de roupas que estou jogando no chão. Volto a deitar e olho
para ele. Um longo tremor passa por meu corpo quando olho seus maldosos e
maliciosos olhos azuis, e seu meio sorriso safado nos lábios só faz
intensificar mais os tremores em mim.
— Você tem ideia do quanto é linda, Alicia? — engulo em seco quando
vejo seu olhar de fome e desejo gravados em todo meu corpo — Cada dia
você parece mais linda para mim.
Ele tira lentamente sua roupa, como se tivesse todo o tempo do mundo
para isso. Estou a ponto de levantar para ajudá-lo a se livrar delas quando ele
me olha, autoritário.
— Fique aí — gemo quando caio de volta nos lençóis macios e brinco
com meus mamilos duros. Isso atrai os olhos de Bruno para meus seios. Ele
lambe seu lábio inferior lentamente, me deixando trêmula e tão excitada que
parece que estou em brasas, querendo somente que ele venha logo para a
cama. Faz tanto tempo que nós fizemos sexo, desde que ele voltou de viagem
que apenas tem cuidado do meu prazer.
— Vire e segure-se. — oh, ele estava frio e controlado, e não sabia que
gostava tanto de dar o controle para ele. Meu coração está pulando louco
dentro do meu peito quando fico de joelhos na cama e seguro na cabeceira da
cama almofadada. — Melhor segurar firme, tenho algumas continhas para
acertar com você, bebê.
Olho para ele, que está acariciando seu pau enquanto olha meu traseiro
exposto só para seu olhar. Ele vem para perto da beirada da cama e me puxa
pelo quadril, fazendo-me soltar a cabeceira, até que minhas costas estão
quase coladas às suas costas. Sinto o calor do seu pau duro e gemo quando
segura minha garganta, levanta meu rosto e beija-me forte, sua língua um
chicote excitante quando invade minha boca, enrolando com a minha. Ele
morde meus lábios para depois suavizar com sua língua deliciosa.
— Você me rejeitou, isso é mau, muito mau.
Ele segura meu cabelo em sua mão e empurra minhas costas me
curvando para frente e, sem aviso, ele entra em mim sem piedade.
— Oh, céus! — não estou pronta ainda, mas estou bastante lubrificada
do orgasmo anterior e gemo quando ele puxa, depois enfia forte até o fim. Eu
grito alto com o impacto de seu corpo no meu — Bruno!
— Oh, bebê, isso mesmo, grite meu nome — a palmada no meu
traseiro é tão forte que arqueio, arfante — Nunca. Diga. Não. Para. Mim —
cada palavra rouca é seguida de uma estocada de seu pau no fundo da minha
boceta.
Tremor violento de luxúria corre por mim quando planto meus
cotovelos na cama e dou livre acesso para Bruno, empinando meu traseiro
para ele. Segura meus quadris com as duas mãos, e estamos fazendo sexo
duro e rápido e sei que não vou durar muito; calor se constrói e gemo alto
como nunca pensei que gemeria na cama com um homem. Eu gozo tão
rápido que é vergonhoso, estou naquela queda livre de prazer ofuscante, mas
Bruno não parece se importar, porque sai de dentro de mim, agarra meus
cabelos e leva minha boca para seu pau lindamente duro e brilhante de meu
gozo. Chupo até onde posso tomá-lo.
— Chupe-me! Porra! — Ele está segurando tão forte meus cabelos que
dói, mas essa dor é nada comparada com a vontade de vê-lo perder o
controle.
Meus lábios o devoram, e seus quadris fazem uma dança lindamente
sincronizada e rítmica com minha boca. Gemo olhando seus olhos, que
perdem o foco quando goza jogando sua cabeça para trás murmurando meu
nome. Assisto quando ele se desfaz em minha boca e amo isso.
Pouco depois caímos em um emaranhado de corpos suados e exaustos,
e adormeço sendo beijada ternamente.

***
Quando acordo estou sozinha na cama, e uma brisa gostosa vem pela
janela refrescando o quarto. Procuro algum sinal de Bruno, e nada. Verifico
as horas e percebo que dormi demais. São três horas da tarde. Nunca dormi
tanto na minha vida. Vejo minha mala em um canto e levando lentamente,
sinto-me leve e um pouco aérea por ter dormido tanto. Consigo achar na mala
um robe branco curto de seda. O contato é delicioso na minha pele sensível.
Olhando ao redor do quarto, vejo uma porta e verifico que dá em um
banheiro. Oh! Certo, isso que eu precisava.
O banheiro é uma mistura em sua decoração: madeira escura com
porcelanas, tudo muito espaçoso, clean e cheirando a pinho. Não me detenho
muito aos detalhes porque estou muito curiosa para descobrir onde anda meu
lindo guarda-costas.
Tiro o robe e entro no boxe para uma ducha rápida. Depois irei explorar
essa banheira enorme que está no canto do banheiro, quem sabe com uma
companhia agradável. Estou com um sorriso bobo no rosto quando tomo meu
banho.
Volto a colocar o robe depois de seca e vou à procura de Bruno pela
casa. Percebo outros cômodos além daqueles que vi desde que cheguei, deve
ter outros dois quartos, e vou abrindo portas para verificar o lugar. Na
primeira porta que abro realmente é um quarto parecido com aquele que
estava. Fecho a porta e vou para a próxima. Essa não se abre quando tento a
maçaneta. Fico curiosa, mas sigo em frente e vou à sala que estive antes.
Escuto música suave vindo de outro cômodo e sigo, reconhecendo o som de
Moonligth sonata. O cheiro de especiarias é delicioso também, e percebo que
estou faminta.
Paro na porta e observo Bruno, apenas com uma calça de moletom, na
cozinha, preparando em cima do balcão de mármore e madeira, alguma coisa
que não consigo identificar. Passaria horas só olhando como ele fazia as
coisas com precisão e leveza, como se isso fosse algo que estivesse
acostumado a fazer e ainda escutando Beethoven. Era tão lindo que meu peito
estava doendo, apertado. Estou tão encrencada. Estou apaixonada. Porque eu
quero muito caminhar para ele agora, envolver meus braços ao seu redor e...
— Ah, enfim, a bela adormecida acordou — a voz de Bruno quebra
meu transe emotivo, e ele solta a faca que tem nas mãos para cortar os
legumes quando vem em minha direção. Termino de entrar na cozinha e ele
envolve meu rosto nas mãos para beijar calidamente meus lábios,
contrastando com a fúria da 5ª Sinfonia de Beethoven que, agora, está
tocando ao fundo. Mas suas mãos estão fazendo uma exploração por baixo do
meu robe.
— Venha comer algo, querida. — fala quando tira sua boca da minha.
Sorrio quando sou puxada para sentar no banco de madeira de
aparência rústica em frente ao balcão ao qual ele estava antes.
— Então, o que vai ser, madame? — ele faz mesuras para mim, e sorrio
igual uma boba — Para nosso almoço tardio temos lasanha e vinho ou vinho
e lasanha. Qual vai ser?
— Sério? Eu achando que você estava fazendo algo espetacular com
essa música e tudo mais — aponto a cozinha e o balcão onde ele estava
preparando uma salada, vejo agora.
— Bebê, sou um homem do exército, sei fazer coisas incríveis e
espetaculares — ele levanta sua sobrancelha e fica com um ar sexy —
Mostrarei para você ao longo de nossa estadia aqui. — diz com um sorriso
que indica que não é de comida que ele está falando.
— Promete? Adoraria aprender um ou dois truques com você, querido
— devolvo.
— Alicia, você está bem? — ele me olha abismado
— O quê?
— O inferno está congelando, você me chamando de "querido" — meu
sorriso murcha, mas trato de disfarçar quando ele vem outra vez para meu
lado, me agarrando pela cintura — Gosto disso. Precisa melhorar, mas eu
aceito isso. — E me beija. Adoro seus beijos.
Quando ele me solta novamente, começa a servir para mim um suco
natural. Agradeço, mas ele, em vez de servir a comida lá, me leva para fora.
Atrás da casa tem uma área com mesa e cadeiras, onde está posta para duas
pessoas. Ah, meu Deus, ele está sendo tão cavalheiro comigo. Estou cada
minuto mais apaixonada por seu cuidado. Ele puxa uma das cadeiras, me
fazendo sentar, e termino meu suco.
Ele serve a nós dois de vinho e, sim, ele não estava brincando quando
disse que era lasanha, vindo e salada.
Olho ao redor, amando a tranquilidade do lugar. A brisa soprava
suavemente, deixando um frescor delicioso, certamente devido ao lago que
praticamente rodeava a casa. Onde estávamos agora dava para ver
tranquilamente a água convidativa, onde alguns pássaros sobrevoavam as
águas tranquilas.
— Então, como é que o Carl tem esse lugar e não vive aqui? —
pergunto entre garfadas da lasanha que, por sinal, está muito boa. — Aqui é
maravilhoso, essa paisagem é linda!
— Não sabíamos desse lugar até há dois anos, quando ele mencionou
em uma conversa depois que tinha tomado uns quatro whiskies — Bruno se
encosta na cadeira, parecendo relaxado — Mas ele não vem aqui há um
tempo. Não sei bem a história por trás da casa.
— Eu amei isso aqui — aponto ao redor — Eu nem sabia que precisava
dessa serenidade, até que estou aqui nesse momento — e era verdade, estou
me sentindo em paz, coisa que não sentia há muito tempo. É como se aqui
não houvesse nenhuma ameaça à minha vida. E, ainda que não sei o que o
amanhã me trará com relação a Bruno e isso que está acontecendo conosco,
estou feliz por ele estar aqui comigo, e sinto que podemos nos conhecer
melhor.
26
Bruno
Verifico pelas câmeras de segurança cada canto da propriedade. Carl
fez um excelente trabalho com a vigilância do local. Esse quarto foi montado
com monitores para ver cada canto da casa e arredores. Eu não confio ficar
aqui sem dar uma verificada a cada hora nos monitores. Paranoia? Talvez.
Não quero dar chance para a vulnerabilidade de ser pego desprevenido,
entretanto.
Mas passei a manhã toda trabalhando para conectar as câmeras online
com o escritório central. Mas algumas ficaram de fora, na verdade, a maioria
de dentro do chalé, só a câmera da porta que estava transmitindo para os
caras na empresa. Assim posso ficar e relaxar com minha viuvinha. Falando
nela, volto minha atenção para a câmera que captura sua imagem.
Observo quando Alicia molha o pé na água do lago. Faz mais de uma
hora que ela está sentada no fim do píer de madeira que sai do deck para
dentro do lago. Ela está pensativa enquanto seu pé balança na água, e só faz
um dia que estamos aqui. O que a está incomodando?
Meu telefone toca e olho o visor para dar de cara com o nome de Alex.
É a primeira ligação que recebo, e sei que meu irmão não pode rastrear essa
ligação, Alex não seria idiota.
— Saudade de mim, meu amigo? — digo com deboche, como sempre.
— Tenho Matt aqui querendo saber se você comeu a irmãzinha dele no
jantar. Então... — a voz dele sai em um misto de severidade e brincadeira,
provavelmente porque Matt deve estar junto com ele.
— Um homem nunca diz essas coisas, Alex. — devolvo. Bem, não
tinha sido bem no jantar, mas como um café da manhã e toda a noite passada.
Sinto meu corpo despertar com a lembrança de Alicia Duran todo submissa
para mim. Isso era quente!
— Espero que esteja tudo bem aí — Alex agora é todo profissional, me
tirando dos pensamentos quentes de uma Alicia disposta e sem amarras.
— Sim, diga a Matt que sua irmã está bem. Alguma notícia do Deni?
— Nessas últimas vinte e quatro horas? A única coisa que ele fez foi ir
à casa de seu pai — diz — Bruno, você precisa decidir o que fazer a respeito
desse assunto.
— Preciso falar com Alicia primeiro. — digo quando suspiro
pesadamente — Vou cuidar disso. Só me dê um tempo antes que tudo acabe,
Alex. Eu estou cada dia mais...
Porra! Apaixonado? Não, claro que não. Isso é impossível! Alicia me
faz um homem melhor, quando estou com ela sou diferente, ela tem o maldito
poder de fazer meu lado idiota baixar a crista por ela está passando por um
momento delicado. Eu tenho esse receio que tudo que fizer vou magoá-la,
como fiz um tempo atrás por sair naquela viagem que até hoje me intriga. Só
em pensar que ela vai pedir para eu ir embora deixa meu coração batendo
descompassado, em um aperto que dói. Estremeço quando penso que vou
perdê-la quando tudo vier à tona.
— Isso está se arrastando, você sabe. Então resolva. Estar apaixonado
por uma cliente dá nisso, Bruno, complicações desnecessárias. Precisa definir
o que é mais importante. — ele desliga como sempre, sem se despedir.
Sim, preciso começar falando com Alicia de minha família, antes que
eu saia daqui. E como ele fica falando que estou apaixonado, se nem sei o
que sinto por aquela mulher? Mas que inferno, se eu não estou louco por ela e
com um maldito medo de perdê-la.
Saio da sala e caminho pela passarela de madeira que leva para dentro
do lago. Alicia escuta meus passos e vira a cabeça para mim, abrindo um
sorriso. Ela tem sorrido mais para mim nessas poucas mais de vinte e quatro
horas do que todo o esse tempo que nos conhecemos, e é um sorriso sincero e
lindo para caralho.
Acordar com ela relaxada hoje tinha sido interessante. Eu nunca a tinha
visto tão carinhosa e receptiva. Esse lugar estava fazendo bem para nós. Mas
nada tinha de relaxado quando começávamos mais uma rodada de sexo, ah
não, isso tem sido duro e árduo. Dou um sorriso quando me aproximo dela.
— Ross, pensei que iria passar a manhã toda trancafiado — ela reclama
— Já estava entediada.
— Estou sendo cuidadoso, Alicia, cuidado nunca é demais — sento ao
lado dela. Olho para o vasto lago azul e respiro forte para trazer um pouco de
tranquilidade e coragem de falar com ela.
— Você está bem? Parece pensativa desde quando sentou aqui —
observo. Estendo minha mão e tiro seu cabelo, que o vento trás para seu
rosto, e coloco atrás de sua orelha delicada. Ela é tão feminina, suave,
macia... Quero estar dentro dessa mulher vinte e quatro horas por dia. E isso
não me cansaria.
— Estou apenas aproveitando a paz que sinto aqui — ela aponta ao
redor — Obrigada por me trazer aqui, não sabia que precisava de um lugar
assim nesse caos que se tornou minha vida, até que ontem me vi aqui e
percebi que era o que eu precisava para relaxar.
Seus olhos estão límpidos e mais verdes que azuis, refletindo a
vegetação ao redor do lago. Ela está tão linda que não resisto, me inclino e
capturo os seus lábios macios em um beijo suave, como a brisa que bate em
nós. Desgrudando minha boca da dela, levanto e estendo minha mão para
ajudá-la a levantar.
— Venha, vamos dar um passeio — agarro sua mão e a puxo para
erguê-la quando começo a caminhar para o outro lado contrário ao lago.
Sou um maldito covarde adiando o inevitável, mas quem pode me
culpar por querer prolongar meu tempo com ela?
Alicia
— Onde estão seus pais, Alicia? — Bruno está deitado na
espreguiçadeira apenas com uma sunga de banho preta e óculos tipo aviador
no fim da tarde. Passamos a tarde caminhando, aproveitando e conhecendo
um pouco ao redor e, quando voltamos, estávamos acalorados e tínhamos
dado um mergulho no lago.
Mas sua pergunta me faz enrijecer na cadeira onde estou ao lado dele.
— Mortos — digo sem maiores informações, não tinha nada a dizer
sobre isso — Somos apenas eu e Matt. Desde que me lembro, nós cuidamos
um do outro, apesar de ultimamente ser só ele que cuida de mim. Mal o vejo.
— Sinto muito por isso — ele diz — Seu irmão sabe que não vamos
deixar nada acontecer a você, Alicia. E Evan? Onde o conheceu?
— Na faculdade. — digo sem dar mais nenhuma informação.
— E casou com o namorado da faculdade. Que original, Alicia — ele
implica com um meio sorriso, fazendo com eu relaxe um pouco. — Fale dele
para mim. — pede e vira sua atenção toda em minha direção.
— Falar o que, pelo visto não o conhecia como achava — digo, a
amargura dói em mim — Eu o conheci, namoramos por um bom tempo e
depois casamos. Fim.
— Tenho certeza que tem mais aí — ele insiste.
— Não tem, mas e você? Onde anda sua família, além de Deni? — viro
as perguntas para ele agora. Falar de mim é tão enfadonho.
Ele não responde agora, voltando a olhar o horizonte a distância. Parece
que toquei em uma ferida, porque ele está visivelmente tenso.
— Bom, meu irmão você já conhece — ele diz quando já estou dando
por certo que não responderia, porém, sua voz tem uma pitada de raiva e
amargura.
— Me fale por que vocês têm essa rivalidade — peço.
— Não é rivalidade, só coisa da cabeça obsessiva de Deni — ele
suspira —Ele é mais velho do que eu, e quando nasci, ele criou uma barreira
intransponível entre nós. Acha que vim ao mundo acabar com a vida dele,
tomar o que é dele, como se eu fosse querer alguma coisa que venha da
minha família.
Acho estranho ele dizer isso, e minha curiosidade leva a maior sobre a
cautela.
— E por que não? Você se dá bem com seus pais? Você nunca os
menciona.
Ele se mexe claramente desconfortável, e o aperto de seu punho é a
prova do seu estado.
— Não há muito o que falar sobre deles — sua voz mudou de raiva
para absoluta amargura. Ele parece que carrega grande mágoa com relação à
sua família, mas eu não posso imaginar o que se trata.
— Claro que há, sempre tem, Bruno. Principalmente se for algo que
nos machuca — ele parece considerar quando exala fortemente, acho que
criando coragem ou seja lá o que for que ele precisa para falar:
— Meu pai é um homem duro, Alicia. Fui criado no luxo e nas
melhores escolas e quando, anos depois, descobri de onde vinha todo
dinheiro da minha família, eu surtei porque ser um playboyzinho não tirou de
mim o senso do que é certo ou errado. Eu tinha uma vida folgada e fácil, mas
isso não tirou meu caráter. Meu pai queria que entrasse para o negócio dele, e
quando optei por servir no exército, ele me deserdou. Na verdade, eu teria
que escolher entre ir ou ficar, então eu fiz minha escolha — sua voz é tão
triste que me toca. Estendo minha mão e toco seu braço, tentando afastar seu
mal-estar. — Saí da casa dele e não voltei nunca mais.
— Isso é muito triste, querido. E o que seu pai faz? — pergunto
curiosa, mas não deve ser algo bom, já que ele não queria estar envolvido.
Calafrios correm por mim, e pela primeira vez estou desconfortável aqui
nesse lugar que só me trouxe bem-estar.
Ele fica calado, e não sei se vai responder, mas ele continua:
— Ele é um homem de negócios. Não negócio legal, no entanto — ele
confirma minhas suspeitas — Ele está em todos os segmentos que acha
lucrativo, e não pense que ele não tem nenhuma empresa legalizada, ele tem,
mas é só mera fachada. — Eu estou chocada que seu pai é algum tipo de
criminoso. Criminoso de alto perfil. — De qualquer forma, ele não achou
legal o filho dele querer entrar para o exército em vez de assumir uma parte
dos negócios ilegais dele. Na verdade, ele ficou indignado, possesso de raiva,
então, fiz como ele disse: um rato que abandona o navio ou coisa que o valha.
Mandou que saísse de sua casa, ela não abrigaria um filho ingrato que estava
cuspindo na mão que o alimentou a vida inteira.
Estou dolorida por ele, seu pai deve ser um homem sem coração para
tratar seu filho assim.
— Que idade você tinha? — minha voz é trêmula, não sei se de raiva
pelo homem que nunca vi ou por compaixão por Bruno.
— Bem, tinha acabado de completar dezoito e anunciei que ia me
alistar — diz sua voz resignada.
— E Deni, por que ele agora quer uma reconciliação? Pelo que ele me
disse, quer que vocês voltem a se dar bem — em vez de responder, ele ri alto,
mas é um riso sem alegria.
— Está mais para me tirar da jogada, querida — isso me choca. —
Como vamos voltar a nos dar bem se nunca fomos amigos?
— Tirar da jogada, como assim? — medo rasteja em minha pele
quando pergunto — Você quer dizer... matar você?
— Provavelmente, se isso não fizesse meu pai deserdá-lo. Eles têm
seus próprios códigos que não consigo entender — diz tão tranquilo eu só
olho boquiaberta para ele.
— E sua mãe? — minha pergunta é em um fio de voz, porque essa
família dele é demais para mim.
— Bem, minha mãe faz o que meu pai ordena. Se ela gosta de mim
como um filho, ela não demonstra muito. Ela antes me fez ter um pouco de
esperança, achava que se importasse comigo, mas sabe o quê? Ela o deixou
me expulsar de casa. Bem, isso deve dizer muito sobre ela e seu amor
materno.
— Sinto muito — levanto e sento na espreguiçadeira que ele está
deitado.
— Não sinta, isso foi há muito tempo.
— Claro que não, eles estão todos vivos e te ignoram, deve doer —
espalmo minhas mãos no seu peito desnudo e acaricio lentamente, lhe
transmitindo um pouco de conforto, mas ele levanta e segura o corrimão do
deck tão forte que vejo a hora de se partir em suas mãos.
— Está enganada, Alicia. Eu quero distância deles, não nasci para ser
um deles — o desprezo na sua vez é claro, mas sei que ele deve sofrer pela
indiferença de sua família.
Algo me ocorre, e um calafrio percorre minha pele quando o encaro:
— É por essa razão que você não queria o Deni perto de mim — minha
voz trai a ansiedade que sinto — Por ele ser uma espécie de criminoso?
— No começo, sim, mas agora — ele para e me olha firme quando
retira os óculos. O azul dos olhos dele é uma turbulência, um misto de
preocupação e outra coisa que não sei dar nome — Você não vai querer
envolvimento comercial com meu irmão, Alicia. Ele pode manchar de vez a
reputação de sua empresa, quando ela já é precária perante seus clientes por
causa de Duran.
Ele tem razão. Agora que sei sobre Deni, não posso me dar ao luxo de
perder o pouco que me resta de cliente. No entanto, como irei dizer a Deni
que não posso fazer negócio com ele sem expor minhas razões?
— Mas agora o que, Bruno?
— Nada de mais, só fique longe — reitera.
— Acha que seu irmão faria mal para mim? Por causa dessa rivalidade
ou porque descobri essas coisas sobre ele? — pergunto como se as palavras
saltassem para fora da minha boca antes que as detivesse.
Bruno não responde, e sei que ele quer dizer muito com esse silêncio.
— Só se mantenha o mais longe possível dele, Alicia. Já disse isso a
você — fala aborrecido depois de vários minutos de silêncio.
— Tudo bem.
— Estou falando sério, sem ligar ou atender telefonemas dele. Falando
nisso, onde está seu celular? — sua voz trai preocupação.
— No quarto, acho... — não termino de falar, ele já está correndo para
dentro da casa. O que foi isso?
Levanto e vou atrás dele para encontrá-lo desmontando meu celular.
— O que está fazendo?
— Droga, Alicia! Alguém pode muito bem rastrear seu celular. Era
para ter deixando em casa. — ele está furioso, mas não dirigido a mim, talvez
com ele mesmo.
— Ninguém disse nada. — ouço seu suspiro exasperado quando ele se
senta pesadamente na cama.
— Erros primários! Alexander tem razão, se envolver com as pessoas
que estamos protegendo não é legal. Perdemos a cabeça e comentemos esses
tipos de erros de jardim de infância do caralho!
Ah! Ele está chateado de verdade. Passa por mim e some no quarto que
fica trancado, ao lado do nosso.
Descobri que lá era uma sala cheia de monitores que transmite imagens
em tempo real da propriedade e todos os cômodos da casa.
Oh, meu Deus! Agora é minha vez de cair de bunda na cama, para
levantar em seguida e correr atrás de Bruno.
Vou para onde sei que ele deve estar agora e entro sem bater, parando
de súbito ao vê-lo falando ao telefone, mal-humorado.
— Só redobre isso — escuta com o cenho franzido — Um lapso, cara.
Você tem razão. Misturar trabalho e prazer nunca é bom, sei disso agora!
O quê? Para quem ele estava dizendo isso? Dizendo para o mundo que
está dormindo comigo? Idiota!
Quando ele desliga, estou carrancuda e de braços cruzados, olhando
feio para ele.
— Para quem está espalhando que está dormindo comigo?
— Me pergunte quem não sabe, querida. — ele vem e enlaça minha
cintura, plantado um beijo no meu pescoço. Ah, agora lembrei o que vim
fazer aqui.
— Bruno, essas imagens são transmitidas para onde?
— Humm, vamos falar disso agora? Prefiro despir você, bebê, e fazer
algumas...
— Alguém vê essas imagens dos cômodos da casa? — tento empurrá-
lo para longe — Algum dos seus amigos está vigiando a casa?
— Não se preocupe, ninguém viu seu traseiro, Alicia — ele ri sem nem
mesmo piscar com a possibilidade de nós estarmos dando um show de sexo
ao vivo.
— Espero que não. — resmungo.
— Mas não vamos poder inaugurar o deck, lá sim tem câmera
conectada com o pessoal da empresa. — ele lamenta — Por mim, eu poderia
muito bem usar o deck hoje à noite, mas sei que seu pudor não vai me
beneficiar.
— Em seu sonho, pervertido — bato no seu braço. Ele me puxa para
um beijo quente, me fazendo esquecer as câmeras.
Droga, agora não vou mais poder ficar à vontade aqui. Saber que seus
amigos podem nos ver fazendo sexo! Ele suga minha língua, e eu perco o
resto de raciocínio que me resta. Enlaço seu pescoço e cintura, e ele me leva
para o quarto batendo contra as paredes até me jogar em meio aos lençóis e
cair sobre mim.
Esqueço nossa conversa de agora há pouco sobre sua família e me
concentro no prazer que ele me proporciona. Envolvo seu pescoço, e uma
gama estarrecedora de novas emoções me bate. Procuro sua boca que vem
ávida para minha, me dando tudo que eu quero e muito mais.
Eu amo isso.

***

Rubor cobre minha face quando retiro a camisa branca que estou
usando e fico apenas em um biquíni minúsculo também branco. Desde que
Bruno disse que aqui tinha uma câmera não me sinto confortável para ficar
tomando sol à vontade. Olho ao redor, tentando achar a câmera e jogar algo
em cima dela tampando a visão, mas...
— Posso saber o que você está procurando? — a voz de Bruno me faz
pular de susto
— Nada!
— Alicia, faz uma semana que olha procurando alguma coisa aqui fora
— sua voz tem um traço de riso contido, e olho para encontrá-lo trazendo
pratos para nosso café da manhã e depositando na mesa. Ele deposita uma
jarra de suco e vou até lá me servir. Eu estou tão mal-acostumada. Ele tem
me paparicado por mais de uma semana nesse lugar. A cada vez que vou
fazer algo, ele me impede dizendo que quer que eu relaxe. Tem sido glorioso
cada dia aqui.
Nós mergulhamos no lago, fazemos caminhadas no fim da tarde,
dormimos e fazemos sexo, muito sexo. Quando formos embora daqui, serei
uma viciada em sexo, pode acreditar. As noites têm sido quentes, e não estou
falando do tempo. Os dias também, mas nos limitamos ao quarto porque não
confio nessas malditas câmeras. E não as esqueço. É a única coisa ruim aqui.
Mas sei que é para minha segurança.
Bruno vem e beija meus lábios, depois cai na cadeira à minha frente
com seu corpo sexy em uma bermuda cargo que cai por seus quadris. O botão
aberto faz meu sangue esquentar com aquele “V” exposto para minha
apreciação. Isso é tão indecente, pode causar taquicardia em uma mulher. E é
todo meu!
Por enquanto. Estou sempre me lembrando disso. Nada bom dura para
sempre. Eu sei disso muito bem.
— Alicia, continue a me devorar com esses olhos, querida, que
daremos um show digno de Oscar para os caras na empresa. — Bruno ri alto
do rubor que me cobre inteira.
Argh! Sempre estou babando em cima dele. Sou uma indecente!

***

Depois de tomar sol a manhã toda, entro para tomar um banho. Encho a
banheira e jogo um pouco de sais dentro. Ligo o som estéreo que foi instalado
aqui no banheiro, escolho uma música das minhas favoritas. Logo Uninvited,
da Alanis Morissette, enche o banheiro me fazendo suspirar.

Como qualquer pessoa ficaria


Eu estou lisonjeada por sua fascinação por mim
Como qualquer mulher de sangue quente
Eu quis um objeto simplesmente para almejar
Mas você, você não é permitido
Você não foi convidado
...

Estou feliz aqui, faz tempo que não ando sorrindo assim... Eu estou me
entregando completamente a tudo isso.
Retiro meu biquíni quando algo me chama atenção. Uma pequena
mancha de...
Oh meu Deus! Meu sorriso se desfaz imediatamente.
Corro para minha nécessaire e agarro minhas pílulas que estão lá,
verificando se não esqueci de tomar algumas e, sim, tomei todas. Vejo que
faltam alguns dias para voltar para o médico.
Droga, por que estou sagrando? Desde que estou fazendo tratamento
não sinto mais tanta dor ou sangro antes da data.
Preciso ligar para o meu médico, urgente! Será que vou começar com
novas crises? Já faz algum tempo, que estou quase esquecendo como eram.
Tenho que falar com ele, marcar exames. Esqueço meu banho e visto meu
roupão, preciso de um telefone.
27
Alicia
Droga!!
Sento na cama respirando fundo, dizendo para mim mesma que tenho
de manter a calma.
— Sim, Alicia, isso não é nada. Só um pequeno sangramento. Isso
acontece às vezes, não é? — Oh, céus! A última vez que isso aconteceu eu
passei por uma curetagem e, logo após, a laparoscopia depois que me
recuperei. Agora isso estava acabando com minha paz conquistada essa
semana.
Procuro meu celular por todo o quarto, quando lembro que Bruno tinha
retirado a bateria e não o tinha me devolvido. Estou trêmula de ansiedade.
Nesses últimos dez minutos, todas as possibilidades ruins passam por minha
cabeça. Pode ser só apenas uma coisa boba, mas quando você está tendo sexo
e já teve vários abortos, a primeira coisa que você pensa é na possibilidade de
que os métodos tenham falhado e que você possa estar tendo outro aborto. Eu
não teria forças nem equilíbrio emocional para passar, outra vez, por esse
calvário na minha vida. Tento lembrar se nos esquecemos do preservativo,
mas nada vem à minha mente. Não lembro se naqueles meses que passei em
sua casa tínhamos sido cem por cento cuidadosos.
Preciso falar com meu ginecologista, só tenho de convencer Bruno a
me levar de volta para casa ainda hoje. Não percebo que estou com lágrimas
caindo, até que escuto a porta abrir e Bruno entrar, me olhando preocupado.
— O que houve, Alicia? Por que está chorando? — sentando ao meu
lado, ele segura meu rosto em suas mãos, me olhando tão carinhosamente que
só faz meu choro aumentar — Shii... está tudo bem, querida.
— Eu preciso voltar para casa hoje, Bruno — digo depois de um tempo
em silêncio — Por favor!
— Ainda não, Alicia. Não conseguimos ainda pegar os idiotas que
estão atrás de você, querida. Dê um tempo para nós trabalharmos nisso. — eu
começo a argumentar, mas ele coloca um dedo nos meus lábios, me
silenciando — Estamos trabalhando nisso sem a polícia, então temos que ser
cautelosos e levar provas contundentes e irrefutáveis.
— Mas você não entende, eu preciso ir ao meu médico e ...
— Você está doente?
— Não, eu só preciso ir no meu ginecologista.
— Alicia, isso pode esperar, vamos ficar aqui mais uma semana. É o
tempo de os investigadores conseguirem achar provas suficientes para
prender esses homens, querida — Estou grata por ele estar sendo tão paciente
com meu súbito surto.
— Bruno, é importante que eu vá hoje, eu preciso.
— Me faça entender, querida — ele fala mansamente — Se for um
caso de vida ou morte eu levo você, mas não podemos ficar fazendo essas
coisas porque você, de repente, resolveu ir ao seu médico para conversar.
Fico apenas olhando para ele. Eu estou me segurando para não surtar e
gritar com ele.
— Devolva meu telefone, Bruno — digo séria — Ou irei embora só.
— Está com algum problema que não conheço, Alicia?
— Não é da sua conta o que eu tenho, Bruno, só me devolva o telefone
— Estou por um triz de surtar e fazer uma bobagem, como ir embora daqui
sem ele.
Ele não diz nada quando levanta e sai do quarto. Eu quero seguir atrás
dele, mas minhas pernas não permitem que me mexa. Tenho tanto medo
daquelas pílulas terem falhado e eu...
A porta volta a abrir e Bruno entra com um telefone na mão, mas não é
o meu, deve ser algum telefone seguro, já que ele acha que podem rastrear o
meu até aqui.
— Para quem vai ligar? — ele está tão sério e frio.
— Dr. Allan, o meu médico, já disse — estico minha mão para o
telefone, impaciente, mas ele não permite.
— Não tão rápido, querida. Quero ter certeza que não fará nenhuma
besteira e, daqui a algumas horas, algum "amiguinho" seu aparecerá aqui
querendo sua cabeça. Não vou deixar você sozinha com esse telefone. Então,
qual o número?
O quê? Não vou me expor na sua frente. Mas minha cabeça está dando
voltas de preocupação, e acabo dando o número do Dr. Allan para ele. Ele
fala com meu médico para ter certeza que é ele realmente, enquanto bufo de
raiva por ele não confiar em mim.
— Seja rápida e não dê nosso endereço — diz quando me entrega o
celular.
— Como se eu conhecesse esse lugar — resmungo, antes de falar com
Allan — Allan? — vou para a varanda para ter alguma privacidade, mas
Bruno me segue, deixando-me mais nervosa.
— Alicia, como vai, aconteceu alguma coisa? Ainda faltam uns dias
para sua consulta.
Digo para ele do surgimento do pequeno sangramento e das minhas
preocupações, mas sem falar nada comprometedor para que Bruno venha
saber meus problemas ginecológicos, isso seria constrangedor. Depois que
termino de falar espero a resposta do doutor, tão ansiosa que tenho de sentar
na cadeira da varanda.
— Alicia, para ter um diagnóstico, eu precisaria fazer exames, mas isso
pode acontecer. Pequenos sangramentos no meio da cartela do
anticoncepcional pode ser apenas um escape menstrual sem importância,
problemas hormonais ou estresse, lembre-se que está ainda em tratamento.
Mas venha ao meu consultório para algo mais concreto, como exames. Você
está indo muito bem com o tratamento da endometriose. Você só precisa
relaxar para que as coisas melhorem.
— Eu não estou na cidade, doutor. O que posso fazer agora? — dou
uma olhada para Bruno que está descaradamente ouvindo a conversa com a
testa franzida.
— Venha quando puder ou, se esse sangramento persistir, venha
imediatamente. Mas mantenha a calma, vamos retornar o remédio que estava
tomando, se for o caso, porque esse tem uma dosagem menor. Não sei se
você tem uma vida sexual ativa, mas...
— Sim — Digo e sinto meu rosto esquentar. Por que ele tem de ficar
me olhando? Tento esquecer a presença de Bruno e continuo: — Pode ser
uma gravidez, Allan?
— Acho pouco provável, mas agora você me deixou preocupado.
Venha assim que puder. Por que não me disse isso quando veio aqui? Não
teria baixado sua dosagem.
Quando fui à consulta mês passado, não tinha dito que estava numa
relação e, portanto, ele tinha diminuído a dosagem da pílula. E esse era meu
medo terrível. Uma gravidez seguida de aborto. Eu ia desmoronar se isso
acontecesse outra vez.
runo
Escuto Alicia falando ao telefone, mas a única palavra que realmente
escuto é "gravidez". Que porra é essa? Fico paralisado quando ela,
enfim, desliga o telefone e vira para mim com olhos cheios de lágrimas.
Saio da paralisação momentânea e vou até ela.
— Você está grávida? — digo tão baixo que mal ouvimos o som da
minha voz. Ela está balançando a cabeça em negativa. Sou atingido por uma
avalanche de sentimentos contraditórios que nem sei qual tem maior
intensidade: alívio, consternação e...
— Claro que não! — ela diz com tanta firmeza que me atinge. Seria tão
ruim assim? Mas eu a entendo, isso seria terrível na situação em que estamos;
seria imprudente e uma total falta de responsabilidade. Primeiro, não
tínhamos base para ter um filho no nosso relacionamento e seriam duas vidas
em risco. Eu seria um louco se cogitasse isso. Nós tínhamos pessoas atrás de
Alicia, que não sabia se defender, lutar por sua própria vida. Se acaso alguém
colocasse as mãos sobre ela e se tivesse outro inocente no meio disso, nunca
poderia deitar e dormir se algo viesse a acontecer.
Ela já era um alvo fácil, e com um filho? Deni a mataria sem
pestanejar, ele enlouqueceria se eu engravidasse uma mulher primeiro que
ele. Uma gravidez agora era muita irresponsabilidade até para mim. Mas
mesmo que isso nunca tenha passado pela minha cabeça até agora, se um dia
eu fosse ter um filho seria com uma mulher como Alicia, que me faz querê-la
em minha vida, e isso sem me deixar com vontade de correr léguas de
distância.
Ela me acalma como nenhuma outra. Eu estava malditamente
apaixonado, isso sim. Alex tem razão, sou um homem comandado por uma
mulher sabichona do caralho, que pode muito bem me fazer beijar o chão que
ela pisa.
— Então, o que você tem, Alicia? Pela conversa que ouvi, você acha
que pode estar — pego o telefone que ainda está com ela e exijo: — O que
diabos está acontecendo, Alicia?
— Nada, Bruno. Esse assunto só diz respeito a mim — ela tenta passar
por mim, mas não permito.
— Não só diz respeito a você. Se suspeita de uma gravidez, isso me diz
respeito.
— Não é gravidez! — Ela grita tão alto que me deixa surpreendido. —
Que inferno! Não posso estar grávida, simples assim, senhor sabichão! Então
me deixe em paz!
— Não vou deixar você me afastar, Alicia — seguro seu braço antes
que ela volte para o quarto e, colocando o celular de lado, pego seu rosto em
minhas mãos fazendo-a olhar-me nos olhos. — Pensei que estávamos
progredindo, Alicia. Você precisa me dizer o que está havendo para que eu te
ajude. — digo persuasivo e o mais calmo que consigo.
Alicia é tão difícil de entender às vezes. Não deixa ninguém entrar
facilmente. Tenho estado perto dela nesses últimos meses, e foram poucas as
vezes que ela me permitiu chegar mais perto. E não estou falando do lado
sexual, mas emocionalmente, e agora não consigo entender sua mudança, não
faz nem uma hora que ela estava rindo — Fale comigo, querida.
Puxo-a para mim. Mesmo com sua resistência, consigo que ela relaxe
aos poucos no meu peito. Depois que parece uma eternidade, ela fala:
— Só fiquei menstruada, nada de mais — sua voz sai abafada por estar
com o rosto escondido em minha camisa. Sei que é mais que isso, mas não a
forço para falar.
— Tudo bem, quando você quiser falar, eu estou aqui — beijo o topo
de sua cabeça, massageando suas costas que estão rígidas — Venha.
Levo-a para a cama e deito com ela em meu peito, que fica lá calada até
que fala baixinho:
— Desculpe descontar em você meu nervosismo, mas eu não quero
uma gravidez, sabe, não quero mesmo — muito estranho uma mulher não
querer ser mãe, e Alicia não parecia esse tipo de mulher. — Você também
não parece o tipo de homem que quer ter filhos.
Oh, eu não me colocaria nessa categoria, nuca pensei, mas agora que o
assunto veio à tona, quero sim ter uma família um dia. Isso nunca tinha sido
colocado diante de mim, portanto, não pensava sobre isso.
— Por que acha isso? Porque ainda não sou um homem casado e essas
besteiras? — digo apertando-a nos braços — Eu quero sim, um dia.
Sinto o corpo dela ficar duro, para em seguida ela sair dos meus braços
e me olhar com pesar e dor nos olhos lacrimejantes.
— Boa sorte, então, para você. Eu nunca vou ter um filho — ela agarra
seu roupão como se ele fosse sua tábua de salvação — Acho que seria melhor
nós pararmos com isso. — ela aponta entre nós dois. — Vejo que me enganei
com você, não é o homem que imaginei que fosse. Aquele que nada quer de
uma mulher a não ser sexo. Mas é igual os outros, quer filhos e uma família.
Estou chocado com sua mágoa, tem algo de muito errado com ela,
porque o que ela diz não parece com a Alicia que estou conhecendo.
— O que isso tem de mau? Um homem pode mudar quando ele se
apaixona, mesmo sendo o pior galinha. Ele no fundo vai querer ter um lar,
Alicia.
— Não comigo. E deixei você entrar na minha vida em um dos piores
momentos por achar que você nunca iria querer essas coisas.
Porra! Ela está me fazendo sangrar aqui. Ela acha que não posso
mudar, amar. Acha que sou tão insensível assim, apenas porque peguei tantas
mulheres antes dela que não consigo contar?
E o que diabos é isso de só ficar comigo porque ela poderia me dar o
fora quando ela bem quisesse? Sou a porra de uma foda descartável?
— E se eu quiser, Alicia? Uma família, como uma pessoa normal?
— Só tenho de desejar boa sorte a você e a mulher que vai ter isso com
você. — ela levanta e caminha para o banheiro, o pesar em sua voz faz meu
coração falhar uma batida.
— Posso querer com você. — ela para, mas não vira para me olhar.
— Se isso for verdade, melhor você começar a rever seus desejos. Não
vou ter outra família, Bruno. Nunca.
— Diga-me por que, não seja covarde, Alicia — porra, acho que falei a
coisa errada porque ela se vira furiosa e magoada.
— Covarde? Acha covarde que eu abra mão de ser mãe? Acha que foi
fácil tomar essa decisão? — ela grita tão apaixonadamente que me corta o
fôlego com sua dor, mágoa, sofrimento; uma mistura de emoções — tomei
essa decisão para não ter esperança, para evitar uma dor maior que dilacera o
coração, Bruno. Você não sabe de nada. Acha que acordei um dia e disse que
não iria ter um filho, nunca? Acha? Nããão, isso foi tirado de mim da pior
forma, uma e outra vez. Quando casei pensei que teria isso, sabe, mas não,
filhos não seriam para mim, nunca. Você não sabe de nada da vida, senhor
Ross!
Ela cai em um choro compulsivo, seus ombros tremendo
violentamente. A única coisa que faço é ir até ela e envolver meus braços ao
seu redor. Não faço perguntas, só fico calado esperando a tempestade passar.
Estou tão curioso que preciso me controlar para não fazer todas as perguntas
que vêm à mente. Sei que ela não falará agora, não quero deixá-la mais
nervosa do que deixei agora há pouco.
Eu tinha notado algo desde que a conheci: seu casamento já estava
acabado quando Evan foi assassinado e que esse casamento pode tê-la
transformado nessa mulher de agora, magoada e sem deixar que outra pessoa
cuide só um pouco dela ou entre em sua vida. Ela tinha poucas amizades
também, e essa quase obsessão por trabalho, como se essa empresa fosse seu
mundo.
Volto com ela para a cama e voltamos à mesma posição de antes. Esse
dia estava se provando nada fácil. E eu nem sei como terminará antes que
outra explosão aconteça. Darei tempo para ela. Agora seria até de mau gosto
forçá-la a dizer algo. Mas, de uma coisa estou certo: ela não me contará nada
se isso a magoa tanto. Só posso descobrir por mim mesmo.
E é o que vou fazer, descobrir tudo sobre Alicia antes que o dia acabe.
Saberei até o número de sua maldita calcinha. Ah, isso eu já sabia.
— Você quer ir para casa? — pergunto depois de mais de meia hora
que estamos em um silêncio total, apenas quebrado pelos pequenos soluços
dela.
— Eu quero ir, mas sei que isso vai de encontro ao que vocês estão
trabalhando. Só ficarei bem depois que ver o Dr. Allan. Irei esperar até a
noite, está bem?
— Claro, bebê, como você quiser. Saiba que pode contar comigo,
Alicia. Seja o que for que esteja te perturbando, certo?
— Estou sendo uma vaca com você, não é? — ela levanta seu rosto
vermelho e inchado de lágrimas. Ela está uma bagunça chorosa. Dou um
sorriso para tranquilizá-la.
— Eu sou forte, você sabe.
— Eu queria que tudo fosse diferente, Bruno, mas não posso ser de
outra forma agora. Eu não quero tudo isso na minha vida outra vez, não quero
magoar e ser magoada por outro homem — mais lágrimas escorrem por sua
face — Eu queria poder me entregar totalmente a essa coisa que aconteceu a
nós, mas eu só vou magoar você. Eu vou magoar você, mas não consigo me
afastar. Sou tão egoísta.
— Shiii, não é. Você é linda! — porra, o que vou fazer com essa
mulher? Comigo?
Ela ainda precisa confiar em mim, isso era um fato. E, porra, estou
incomodado que ela não confie.
28
Bruno
Ficamos os dois deitados por tanto tempo que parecia que algo se
quebraria se nos mexêssemos. Talvez quebrasse mesmo, o meu coração no
caso. Dizem que o hipotálamo é o responsável pelos sentimentos, o amor
entre eles, mas por que o nosso peito aperta e dói para cacete? Eu estou
abalado pelas palavras de Alicia.
— Eu queria poder me entregar totalmente a essa coisa que aconteceu
a nós, mas eu só vou magoar você. Eu vou magoar você, mas não consigo me
afastar. Sou tão egoísta.
Suas palavras ficam rondando minha mente no silêncio do quarto.
Eu já tinha me entregado sem ao menos perceber quanto. Mas as
palavras dela me fazem ver que realmente estivemos brincando ao redor disso
nesses últimos meses. Eu preciso que ela se doe completamente para mim
porque estou totalmente doado a ela. Ela me desperta toda a docilidade que
estive negando a todas as mulheres que passaram por minha vida. Eu não
poderia abrir mão disso agora.
Esfrego suas costas para cima e para baixo. Sua respiração está
tranquila, e percebo que ela dormiu. Levanto devagar para não a acordar e
cubro seu corpo antes de sair do quarto. Vou direto para o telefone, preciso
saber o que afligi uma mulher como Alicia para ela parecer tão frágil. E se ela
tiver alguma doença grave? Pela forma que se comportou hoje, estou
imaginando todo tipo de merda.
Alexander atente imediatamente:
— Bruno, você não pode ficar ligando para mim a cada cinco minutos
— diz
— Você fez alguma investigação sobre a Alicia? Sei que você faz isso
com a maioria dos nossos clientes — digo sem ligar para suas gracinhas, indo
direto ao assunto — Preciso saber se temos em nossos arquivos sua ficha
completa.
— Por que isso? Ela tem algum problema, está acontecendo algo aí,
Bruno? Precisando de alguém aí? Reforço?
— Nada que deva se preocupar, Alex. E não preciso de reforço, tenho
controle aqui, aliás, não tem nada acontecendo com a segurança do local,
tudo em ordem. — suspiro quando prossigo: — Só quero saber toda a ficha
médica e tudo o que você tiver aí sobre a Alicia.
— Não investiguei nada sobre ela. Ela é irmã de Matt, não tinha
necessidade.
— Pode conseguir isso ainda hoje para mim? Ou posso falar com o
pessoal da empresa de investigação daqui mesmo, mas você que tem
paciência de lidar com esses caras.
— Não vai me dizer o que está acontecendo entre vocês dois?
— Isso é pessoal, Alex. Não me meto nos seus negócios com sua noiva,
cara, então fique fora dos meus negócios também.
— Isso que me preocupa, Ross. Sua seriedade é anormal, isso não é
você. Cadê o cara "nem aí" que conheço desde sempre? — ele realmente
pensa isso de mim, que não vou levar nenhuma mulher a sério nunca? Mas
também nunca dei motivo para ele pensar o contrário.
— "Ele" conheceu uma mulher e isso está acabando com o cara "nem
aí" — foi tudo que consegui dizer. — O nome do médico dela é Allan, não
sei o sobrenome, ele deve saber o que ela tem.
— Se ela estiver doente, volte para casa, Bruno. Matt vai matar você se
algo acontecer com a irmã dele. Todos os dias ele procura saber como ela
está, então, cara, não estraga isso.
Eu estou ficando irritado com as pessoas sempre achando que eu que
irei estragar as coisas. Isso poderia ser o contrário, sinto que Alicia pode
muito bem não estar preparada para nós. Não estou preparado para deixá-la
ir, entretanto. Pela primeira vez quero algo, e a mulher em questão está mais
esquiva que um cervo.
— Está bem, vou investigar e mando o que descobrir ainda hoje para
seu e-mail. Mas, mudando de assunto, seu irmão se mantém do mesmo jeito,
sem fazer nenhuma manobra. Mas isso não quer dizer que esteja tão quieto
assim. Acredito que ele pode estar aprontando alguma coisa, pois algo
estranho aconteceu que me deixou em alerta.
— O quê?
— Uma empresa chamada D-Ross Empreendimentos está interessada
na compra do antigo apartamento da Alicia. Tudo indica que essa empresa
pertence ao seu irmão. Ele não está sendo nada sutil nisso, com esse nome.
Ele está começando a errar nesse joguinho de gato e rato.
— Não conheço, mas o que conheço sobre minha família? Nada.
Precisamos descobrir o porquê de ele estar interessado na casa.
— Vamos investigar. Tenho de desligar, envio o documento para você
mais tarde, Ross — ele desliga. Fico parado olhando para o telefone por tanto
tempo que perco a noção da hora.
Levanto depois de um tempo e vou olhar Alicia no quarto. Estou
preocupado que outra crise apareça, mas ela continua dormindo, então volto e
vou para a cozinha, preciso fazer algo para ocupar minha mente antes que
enlouqueça.
Começo a preparar o jantar para quando Alicia acordar. Começo um
camarão à Provençal acompanhado com salada e arroz especial "a la Ross".
Meu toque especial.
Eu sempre fui um cara que gostava de privacidade, então, desde que saí
da casa dos meus pais, aprendi a viver sozinho. Mesmo tendo tantas mulheres
em minha vida, nenhuma passava de apenas uma noite, não tinha tempo para
essa merda de romance e nunca preparei um jantar para mulher alguma. Para
ser sincero, tinha sempre sido o contrário, elas estavam sempre à disposição e
eu nunca dei a mínima. Mas quando consegui me interessar por uma mulher
além de uma noite? Alicia é tão ou mais problemática do que eu.
Como Alicia gostava de comer lá fora, no deck, arrumei para que
jantássemos lá como fazíamos toda noite. Arrumo dois lugares, depois vou
até o pequeno jardim onde colho algumas rosas brancas, levando-as para a
mesa, onde ponho em um pequeno vaso. Bem, eu não saberia dizer se Alicia
iria gostar, afinal ela não deve estar com humor para minhas gentilezas,
entretanto eu gostaria de agradá-la, fazê-la esquecer suas tristezas e angústias
só por um momento. Não imagino como ela irá me tratar sabendo que sei um
pouco mais sobre a vida dela a partir de hoje.
Deixo minhas conjecturas de lado e vou verificar meu e-mail e se Alex
já enviou o documento com as informações que pedi mais cedo. Abro o
notebook na sala de monitoramento, mas ainda não tem nada no e-mail.
Estou chateado demais para permanecer no mesmo lugar, tinha vontade de
sair para uma corrida, espairecer minha mente e meu coração pesado. Saio
para o corredor, volto minha atenção para quarto e abro a porta, me
deparando com Alicia saindo do banheiro.
Ela deve ter tomado banho, pois o cheio de sabonete e loção chega até
mim. E ela também está vestindo umas das minhas camisas. Isso era sexy!
Pena que não poderia afundar no seu corpo e fazê-la esquecer a dor que
estava refletida nos olhos dela. Ela parece mais calma e introspectiva, tímida
até, não imagino o porquê. Ela nunca foi uma mulher tímida, era "cheia de
dedos", mas não tímida.
— Você está bem, bebê? — Vou até ela, mas ela se retraia quando me
aproximo, e isto causa uma dor aguda em meu peito.
— Sim, obrigada. — ela não olha em meus olhos, no entanto, não
posso deixar que ela me afaste dessa maneira.
— Você deve estar com fome, querida, venha jantar comigo —
convido, porém ela já está balançando a cabeça em negativa.
— Estou sem fome, Bruno, obrigada — estendo minha mão e acaricio
uma das bochechas que estão pálidas. Seus olhos estavam sem maquiagem e
ainda meio inchados do seu choro mais cedo. Ela nunca pareceu tão frágil.
Não dando atenção para seu retraimento, seguro seu rosto entre minhas
mãos e beijo seus lábios, um beijo cálido e suave, fazendo Alicia suspirar em
minha boca. Seu sabor me deixa excitado e louco para devorar sua boca
macia, mas dou um passo para trás, me distanciando. No entanto ela vem e
abraça meu tórax, escondendo seu rosto em minha camisa.
Envolvo meus braços em torno dela e aperto seu corpo contra a meu.
Ficamos lá em pé no meio do quarto por vários minutos, calados. Não havia
necessidade de falar, sei que ela só quer ser abraçada. Tenho um maldito nó
na garganta porque sei que se me deixar abater por sua distância, tudo que
vivemos até agora não será suficiente para mantê-la comigo.
Ergo uma mão e seguro o lado de sua face, fazendo-a me olhar nos
olhos.
— Faça-me companhia então, estou faminto. — eu só quero levá-la
para a mesa, sei que lá posso convencê-la a se alimentar.
— Está bem — sua súbita aquiescência me deixa feliz para caralho.
Envolto sua cintura e a levo para o deck que ela adora. Eu vou comprar uma
casa igual a essa para ela, disso não tenho dúvidas. Melhor ainda: farei uma
oferta a Carl e comprarei essa.
Faço Alicia sentar, e ela me olha com olhos assombrados assim que vê
a mesa, as flores e a garrafa de vinho que está ao lado pronta para ser servida.
— Por que está sendo gentil, Bruno? Você não precisa fazer isto, não
comigo, eu continuo a Alicia de antes, não me trate como um maldito cristal.
— Aceite um pouco de carinho, bebê. Isso não é nada de mais. — digo
e a sirvo primeiro, mesmo ela dizendo que não tem fome. Ligo o som com o
controle, e as músicas clássica começam a tocar. Eu as escuto para me
acalmar, e espero que Alicia aprecie também. Apesar de dizer que não queria,
ela começa a comer e dou um sorriso quando geme delicadamente com uma
porção em sua boca.
— Vou contratar você como meu cozinheiro, Bruno Ross. — ela dá um
meio sorriso e pega a taça de água, levando-a aos lábios.
— Não sei se você pode me pagar, bebê, mas posso pensar em algo
delicioso como pagamento — balanço minhas sobrancelhas para cima e para
baixo, fazendo seu sorriso aumentar.
Merda, eu poderia passar a porra da noite fazendo isto se ela manter
esse sorriso nos lábios. Fazendo-a esquecer suas merdas só por um instante.
Estamos quase terminando nosso jantar quando a voz de Josh Groban flutua
através dos altos falantes, fazendo minha pele arrepiar.

...E todas as nossas cartas estão na mesa


Diga-me o que você quer fazer
Só não me diga que é tarde demais
Não me diga que é tarde demais agora
Só não me diga isso
Para que eu te ame...

Sinto a música despedaçar a porra do meu coração.


Tento puxar assunto com Alicia, mas ela volta sua atenção para as rosas
em cima da mesa como se as tivesse visto agora. Pensativa demais.
— As flores são lindas, Bruno. Você não é de todo mal, como eu
acreditava — ela tentar gracejar, mas isso sai meio sem jeito. Acabo
segurando seu pulso e a faço se levantar de sua cadeira e puxo-a para uma das
espreguiçadeiras, sentando-a no meu colo. Deito com ela recostada no meu
peito, quando peço:
— Por que você não me conta como era seu casamento, Alicia? Esse
babaca deve tê-la magoado para que você se tornasse essa mulher tão
desconfiada que é hoje.
Ela fica tensa e não fala por vários minutos, até que enfim murmura:
— Eu casei com Evan logo que terminamos a faculdade, mas já
namorávamos há um tempo, então casar era mera formalidade. Ele foi um
ótimo namorado, porque se fosse de outra forma, não teria casado com ele.
Mas depois que nos casamos, ele mudou. Já não era aquele homem que eu
conhecia. Era indiferente a mim em muitas coisas. Mas o que começou a
levar nosso casamento ao fim foi quando eu não consegui lhe dar um filho
tão longo casamos como ele queria. Eu não evitei tê-los, só nunca procurei
saber por que não engravidava. Mas um dia enfim eu engravidei e tudo
parecia perfeito. Ele mudou outra vez e agora era atencioso, me tratava como
se eu fosse quebrar a qualquer momento, ele parecia feliz e eu estava feliz...
— sua voz quebra em dor, e eu aperto seu corpo mais junto a mim em uma
tentativa de encorajá-la a continuar.
— Estava com quatro meses e, de repente, começou uma dor terrível
nas partes inferiores das minhas costas, depois isso foi tão intenso que eu não
sabia sua origem. Não deu nem meia hora, então começou uma hemorragia
que levou meu bebê de mim — o soluço dela é de cortar a porra do meu
coração.
— Quando estava no hospital, conheci o Dr. Allan, ele é especialista
em endometriose. É uma doença ginecológica que acomete milhões de
mulheres — diz — Com sua experiência, ele desconfiou e quis fazer os
exames. Ele não mentiu para mim, disse que eu tinha a doença e se eu fizesse
o tratamento poderia um dia engravidar e levar uma gravidez até o fim. Eu
não tinha Ânimo para uma nova gravidez, eu não queria isso outra vez, mas
Evan, ele queria. — Esfrego seu braço e Alicia funga.
— Ele achou uma forma de me torturar sem nunca tocar em mim, era
cobrada constantemente, e engravidei outra vez, mas com o estresse que
estava, a gravidez não durou nem dois meses, mesmo com o Dr. Allan me
ajudando, e isso se repetiu e repetiu...
— Eu comecei a ter pesadelos constantes, e isto me deixava mais e
mais nervosa a cada dia. Ficava imaginando quando Evan ia começar sua
ladainha sobre eu ser uma mulher seca que não conseguia segurar seu
precioso filho dentro de mim. Eu não podia fazer nada para segurá-lo dentro
de mim, Bruno, e isso acabava comigo. Eu sinto-me culpada porque, quando
ele morreu, eu não senti tanto assim sua morte, parecia que eu estava livre
para sempre de sua tortura psicológica.
— Alicia, você poderia tê-lo deixado — eu digo, a raiva como veneno
líquido na minha veia. Bastardo filho da puta. Ela quebra em choro mais uma
vez.
— Eu já me sentia culpada por não dar um filho a ele, Bruno, e pedir o
divórcio parecia mais um fracasso. Como se não bastasse, além de infértil, eu
fosse uma inútil no meu casamento. Mas, no fim, eu já pensava em desistir
disso também.
Eu queria matar o filho da puta do falecido marido se o desgraçado já
não estivesse morto. Covarde! Enquanto vivia exigindo que ela lhe desse um
filho, estava metido com bandidos e ainda por cima roubando desses caras e
colocando sua própria mulher em risco.
— Você não é nada disso, Alicia — beijo seus cabelos — Não está em
suas mãos decidir se você será mãe ou não. Isso não cabe a você, quem sabe
não pode ser mãe de outra forma? Talvez exista um bebê lá fora precisando
de uma mãe especial, uma feita especialmente para ele. E que você seja essa
mãe, um bebê que precisa receber tanto desse amor que existe aqui — coloco
minha mão em seu coração, que está batendo tão forte que parece que sairá
de seu peito — Ele pode estar esperando por você, bebê. Nada é por acaso,
querida, tudo tem uma finalidade.
— É fácil falar, Bruno, mas quando nós nos sentimos um fracasso
como mulher é difícil colocar as peças nos lugares outras vez, reunir forças e
esquecer nossa dor que é constante. Mas já renunciei a isso, não me dou mais
esperança. — Eu não tenho autoridade para falar de sua dor, eu a estou
conhecendo de verdade hoje, nunca poderei imaginar como ela se sente.
— E hoje, o que aconteceu? — pergunto depois de estarmos em
silêncio por alguns instantes.
— Um pequeno sangramento. Assim levou ao último aborto, começou
exatamente assim, mas quando percebi já era tarde demais e isso me fez pirar
— diz — Ainda estou pirando aqui, na verdade, é como se estivesse na
berlinda e algo fosse acontecer a qualquer momento.
— E o que o doutor disse para você?
— Que pode não ser nada, e realmente é muito pouco para que eu entre
em desespero. Ele quer saber com exames exatamente o que é, mas agora à
noite nem está descendo mais. Deve ter sido mais desespero de minha parte
ou uma pequena menstruação adiantada.
— Se você quiser, voltamos para casa — digo e penso que não foi nem
preciso ler sobre Alicia em um dossiê. Estou feliz demais que ela tenha
confiando em mim e falado. — Vamos embora amanhã cedo se assim você
quiser.
— Eu amei esse lugar, Bruno. Eu precisava de um lugar assim.
— Posso te perguntar uma coisa? — pergunto cauteloso, não quero
magoar essa mulher mais do que ela já está.
— Claro.
— Você ainda pode engravidar? — Sinto todos os músculos que
tinham começado a relaxar endurecer tudo outra vez.
— Por que você quer saber isso? — sua voz estava na defensiva e
trêmula.
— Só curiosidade.
— O Dr. Allan diz que sim, fiz uma cirurgia há um tempo que foi bem-
sucedida, tenho feito tratamento desde então. Ele diz que quando eu relaxar
isso acontecerá. O problema maior não é ficar grávida. É levar isso até o fim.
Isso parece, às vezes, impossível.
— Você é especial para mim, sabe disso, não é, bebê? — fuço em seu
pescoço em meio à profusão de cabelos e beijo seu pescoço. Eu preciso
distraí-la de tanta tristeza, mesmo sabendo que não posso fazer sexo. Esse
sim seria uma bela distração, porém posso distrair de outras formas. — Você
está com dor?
— Não. O que tem em mente, senhor Ross?
— Quero que venha comigo. — Levando e vou até a mesa, pegando a
garrafa do vinho e duas taças. Volto puxando sua mão em direção ao lago,
lembrando que quando fui à sua procura mais cedo e a encontrei surtando, eu
tinha planejando um passeio. Estava indo chamá-la e esqueci
completamente.
Um bote estilo de canoagem com dois remos estava amarrado no fim
do píer de madeira. Desci primeiro e, segurando a mão dela, a fiz se juntar a
mim e sentamos um de frente para o outro, dentro do espaço pequeno. A
noite estava com uma tímida lua no céu, mas, em compensação, as estrelas
estavam bem visíveis a esta hora. Remo para o meio do lago e ouço os
suspiros deliciados de Alicia à minha frente.
— Tudo bem? — pergunto quando paro o bote no meio do lago.
— É lindo aqui, querido. — diz olhando para o céu. Acho que nem
percebeu que me chamou de querido. Sorrio intimamente. Minha Alicia,
inconscientemente, gosta de mim mais do que quer admitir. Eu, por outro
lado, não tenho nenhuma dúvida que a amo. Eu só preciso coragem para dizer
isso a ela sem a fazer correr para longe de mim.
Sirvo nosso vinho e entrego uma taça para ela, que toma um pequeno
gole, depois volta a olhar para cima com um sorriso nos lábios.
— Poderia passar a noite inteira aqui — diz e me olha. Eu seguro seu
pulso e a trago ela para mim, beijando sua boca com força. O sabor de vinho
em seus lábios me deixa duro, e aprofundo o beijo rolando nossas línguas
juntas. Sugo seus lábios como se bebesse cada gota de vinho que ainda
poderia existir lá. Merda, estou ficando excitado para caralho e não posso
avançar nela como eu desejo.
— Você tem um efeito especial em mim, bebê. Faz-me sentir como se
pudesse ser um homem melhor. Me faz querer te dar o mundo. — murmuro
contra sua boca. — Eu amo você, Alicia.
29
Alicia
Estou paralisada no lugar, inacreditavelmente inerte depois de escutar
Bruno dizer que está apaixonado por mim.
Ele não queria dizer isso, não mesmo. Cadê o homem que pegava
todas, o que seus amigos dizem que não tem escrúpulos e que saía com as
clientes por diversão? Esse aqui está me assustando.
Estou o encarando sem dizer nada, minha respiração é difícil, o ar nos
meus pulmões é dolorido. Porque eu sei que vou magoá-lo como o avisei. Eu
sabia que isso poderia acontecer, porque eu também estava apaixonada, mas
não poderia viver como antes, apavorada, me enchendo de esperança e vê-la
se despedaçar em seguida.
— Eu amo você, Alicia. Sei que talvez não seja o momento certo para
te falar isso, mas porra! — Bruno diz e eu estou hiperventilando, chorar
parece a única coisa que faço bem hoje. — Eu sei que talvez você não esteja
preparada para ouvir ou dizer de volta, mas estou por nós dois. Não preciso
que me diga agora, só me deixe te amar sem promessas para o futuro; um
passo de cada vez.
Oh, Deus, por favor! Grito silenciosamente.
— Mas não posso mais negar isso, bebê — ele sussurra, e minha
vontade é fugir, remar esse bote para terra firme e correr e correr e correr. Ele
não pode me dizer isso assim. Depois de tudo que falei há pouco, ele não vê
que não quero repetir meus erros? Que não vou fazê-lo passar por isso junto
comigo? Que nunca, nunca mais deixarei outro homem impor seus desejos
sobre os meus?
— Eu... sinto muito — engasgo com o nó em minha garganta quando
me afasto dele, sentando o mais longe possível, onde estive sentada na outra
ponta — Eu não quero magoar você, Bruno, mas não quero entrar em algo
com você e, lá na frente, tudo dar errado.
— Não estou fazendo nenhuma exigência, Alicia. Você não pode saber
o futuro, querida — ele me olha com tanta ternura, e meu coração falha uma
batida.
— Podemos ir agora? Estou com frio — era uma mentira, só quero...
respirar. Ele está me sufocando de uma maneira que faz um alerta disparar na
minha cabeça. Eu estou apaixonada por ele, isso é claro para mim. Ele tem
sido tão compreensivo, e isso faz meu coração mais feliz do que já estive em
muito, muito tempo.
A lógica me dizia para correr para bem longe dele, mas o meu coração
destroçado queria receber esse amor; queria sentir-me amada. Mas tudo era
tão recente. Evan morreu faz nem seis meses e eu já estou aqui com outro
homem. O medo oblitera qualquer sentimento que tenho por Bruno, e sei que
mesmo tentado de todas as formas ser fria e não me apaixonar, não consegui
parar esse sentimento.
Eu inconscientemente tinha tentado mostrar para um Evan morto que
eu poderia ter um homem, apesar de ele dizer muitas vezes que nenhum outro
homem jamais olharia para mim se soubesse que eu não poderia lhe dar um
filho; que ele era o único que eu teria e que era tão compreensivo por eu ser
uma mulher problemática. E esse homem, logo após eu revelar meus medos,
diz que me ama. Estou em conflito de emoções neste momento, e elas são
maiores do que eu imaginei sentir outra vez. Seria possível ser feliz com uma
pessoa? Eu tinha perdido essa fé. A única pessoa que me amava era meu
irmão, e não sei se acredito em mais ninguém.
— Eu vou te levar para casa — Bruno diz baixo, como se soubesse o
conflito interior que está dentro de mim agora. Ele rema de volta para o píer,
calado, e eu não sei muito como agir com essa tensão entre nós. Quando ele
me ajuda a sair do bote, eu saio praticamente correndo em direção à casa.
— Espera, Alicia!
Ouço a voz de Bruno me chamar, mas não paro. Corro para o quarto e
deito de bruços na cama. Minha vida tinha sido de mais perdas que ganhos.
Fui destinada a sempre perder, meus pais e seguidamente meus bebês, depois
Evan, mas isso tinha sido uma perda que, não sei, talvez ganho. Sei que é
errado pensar assim, entretanto estou sendo fiel a mim mesma.
Eu estou destruindo o meu relacionamento com Bruno, porém, qual a
garantia que ele me dava? Algumas semanas atrás, ele simplesmente me disse
que era melhor ele e eu terminarmos, nós tínhamos dito coisas nada gentis
um para o outro naquele dia. Eu não podia dar meu coração assim e cometer
os mesmos malditos erros do passado. Inclusive já sofrendo por isto.
— Você está bem, Alicia? — não o tinha escutado entrar no quarto.
Sinto o colchão afundar com seu peso e sua mão acariciar meus cabelos,
seguindo de beijos por minhas costas — Hei, não fique assim, não disse que
amava você para vê-la sofrer. Só quero amar você, quero sanar um pouco sua
dor, bebê. Não estou exigindo que me ame de volta, sei esperar por você.
Pela primeira vez na vida, quero lutar pelo amor de uma mulher. Não me
pergunte o que vejo em você, realmente é ranzinza, resmungona, me chama
de prostituto...
Ele graceja, fazendo a tensão diminuir, e rio entre as lágrimas que
correm caindo no colchão.
— Você é linda, é a mulher mais incrível, mesmo neste momento
correndo de nós. Você é corajosa para mim, tem uma força dentro de si que
nem mesmo você vê isso. Porém, o melhor de tudo é que sei que me ama.
Sou irresistível, querida, eu sei. Então não adianta negar. — Ele
continua gracejando. Mas, oh merda! Ele deve estar magoado com minha
reação e está tentando levar na esportiva. Eu me odeio agora! Sou uma bruxa
má!
Viro na cama e olho seus olhos azuis intensos e lindos, me fazendo
mergulhar dentro dessas piscinas cálidas e convidativas. O carinho dele e sua
gentileza fazendo minhas cicatrizes menos doloridas eram demais para mim.
O que faço agora?
— Você também é muito especial para mim, Bruno. Tem sido desde
que veio para minha vida — digo e estendo minha mão para acariciar seu
rosto áspero da barba por fazer — Você não sabe quanto foi importante tê-lo
na minha vida nesses últimos meses. Mesmo quando eu tinha todos os
motivos de me manter longe de um homem que se assume um cafajeste, me
fez esquecer por vários momentos as coisas ruins que estavam e que ainda
estão acontecendo na minha vida — Digo em um só fôlego. Seus olhos
nublam por alguns instantes, mas logo voltam a me fitar com ternura.
— Mas, Bruno, mesmo isso sendo maravilhoso, você tendo mudado
tantas coisas no meu mundinho particular, não basta para mim agora. Não
quero outro relacionamento que vá me levar à dor outra vez. Desculpe, por
favor.
Ele não diz nada, no entanto sei que o estou magoando terrivelmente,
agora rejeitando sua declaração.
— Você não está dando nenhuma chance a isso, Alicia. Está com
medo, eu sei. — ele enjaula minha cabeça entre seus braços, falando bem
perto de mim — Não está nos dando uma chance. Não pense muito, querida.
Só aproveite cada segundo disto. Sem pensar que amanhã vou me
transformar em Evan Duran, pois não vou, não sou ele.
— Não é isso... — digo baixo. Minha cabeça dói por ter chorado tanto
hoje, e a fonte parece que não seca. Deus, eu virei uma manteiga derretida,
não sou essa bagunça de mulher. O que ele está fazendo comigo?
— Então o que é, amor? — ele beija meus olhos, a minha testa, os
cantos dos meus lábios. Isso é uma tortura deliciosa — Pare de pensar
demais, Alicia!
Ele me beija, e eu me agarro a ele como se ele fosse minha tábua de
salvação em um mar revolto de emoções que nem cabem dentro de mim. Sua
boca é tão terna que me faz cativa, e retribuo seu beijo com todas as minhas
forças. Quero gravar seu carinho no meu coração com ferro e fogo.
Bruno
Eu me precipitei como um idiota me expondo para Alicia, em uma hora
completamente inconveniente. Ela estava abalada de tudo que aconteceu
hoje, aí eu vou e jogo a porra de uma bomba em seu colo. Sou um fodido
idiota!
Ela dorme ao meu lado enquanto estou deitado ao seu lado, olhando o
teto há um bom tempo. Acabo levantando e vou para a sala de
monitoramento, sempre faço isso à noite, para dar uma olhada nas câmeras
do perímetro fora da casa. Cuidado nunca é demais.
Sento e verifico os monitores por um momento, depois volto minha
atenção ao e-mail que chegou de Alex. Não o abro, não quero ver mais da dor
de Alicia estampada em uma droga de relatório. Fico olhando sem nada ver
para os monitores outra vez. Estou prestes a levantar e voltar para perto de
Alicia quando vejo algo em um dos monitores. Aqui é um lugar esmo sem
movimentação de pessoas, o vizinho mora a mais de um quilômetro, mas há
um carro parado fora da propriedade. A câmera que o pega é umas das mais
distante da casa. Mexo na câmera e dou um zoom tentando ver com nitidez
quem estaria dentro do carro. Seria alguém de Deni? Não acredito que ele
descobriu onde estamos. Os caras na empresa não viram isso se
aproximando? Estou prestes a chamar alguém de lá quando o carro começa a
se afastar, saindo de vista. Todas as entradas para o chalé são cobertas por
uma câmera, e procuro atentamente nas outras, mas não consigo detectar
nada. Droga, eu preciso tirar Alicia daqui, essa porra não é mais segura. Não
sei quem está lá, mas não posso facilitar e ela acabar se machucando porque
fui negligente.
Levanto e verifico o alarme da casa. Vejo outra vez se as portas e
janelas estão todas fechadas. O idiota que viesse hoje aqui poderia dizer
adeus à porra desse mundo. Estou puto demais para brincar com qualquer
um. Quando volto para a sala, vejo minha arma e munição que deixei em
cima da mesa. Pego-a e passo a esquadrinhar cada imagem que a câmera
possa pegar. Ligo para a empresa onde tem uma equipe que sempre está lá
trabalhando nessa parte de monitoração dos clientes.
— Ross — um dos homens atente — o que houve?
— Quem está falando?
— Dimas. Houve algum problema aí?
— É você o responsável pelas câmeras do chalé? — pergunto, meu
mau humor levando a melhor.
— Sim, sou um dos que verificam vocês.
— Então por que merda você não viu um carro se aproximando daqui?
Estou enviando as imagens e quero que as verifique e identifique quem está
no carro.
— Não vimos nada — ele diz meio chateado e certo tom de desculpas.
— Isso é óbvio. Me chame quando tiver uma resposta o mais rápido
possível. — digo e acrescento: — Alex por acaso ainda está trabalhando?
— Não, senhor.
— Me chame quando identificar quem está no carro.
Desligo e recosto-me à cadeira. Esses caras não deviam trabalhar nesse
ramo de segurança privada, bando de incompetentes.
Meia hora depois o telefone toca e Dimas diz que as imagens não dão
para identificar quem estava no carro. É muito escuro para ter uma definição
das feições da pessoa lá dentro. Depois de deixar instrução para manterem
um monitoramento constante do local, desligo. Estamos partindo daqui antes
do previsto. Vamos voltar para casa, e como Alicia precisa ir ao médico dela,
então está mais do que na hora. Apesar de não termos feito nada para levar
Deni e os comparsas à polícia.
Ligo a câmera do quarto principal, que até então não tinha sido ligada,
e vejo Alicia ainda dormindo. É, Ross, você se ferrou de vez, meu camarada.
Se apaixonou pela mulher mais problemática do planeta. Mas, e daí? Eu
faria tudo de novo. Alicia só precisa de tempo para retribuir. Eu não vou
deixá-la me afastar, nem que eu tenha de trancá-la em um calabouço e me
aproveitar de seu corpo sexy para caralho até ela tirar da cabeça que não
serve para amar outra vez.
De qualquer maneira, agora era hora de focar em sua segurança.
Alicia
Acordo com cheiro de café e lábios por meu pescoço.
— Hummm — resmungo quando estendo meus braços para o causador
de tais beijos. — Ross, você não é desse mundo. — minha voz sai rouca e
estranha.
— Bebê, você é gostosa pela manhã, não posso resisti — ele agora me
agarra me beijando na boca, mesmo sob meus protestos de não ter escovado
os dentes e essas besteiras que nós seres humanos tememos pela manhã.
— Vamos ter de ir embora daqui a pouco — ele diz quando senta e
pega uma bandeja e coloca em meu colo — Então coma.
Olho para a bandeja e de volta para ele. Oh, ele definitivamente me
mima ao extremo. Um botão de rosa, uma xícara de café, um copo de suco
natural e uma torrada. Ele sabe que não como mais que isso em meu café da
manhã.
— Obrigada, querido. — digo e sorvo da xícara. Depois pergunto,
apreensiva: — Por que temos de ir?
Será que ele mudou de ideia sobre nós, não me quer mais? Cristo!
Quando disse a ele ontem que não queria um relacionamento sério com ele,
eu não imaginei que ele me deixasse. Eu iria morrer de dor. Deus, não sei o
que quero. Uma hora o empurro para longe e na outra o quero perto. Sou a
maldita rainha da indecisão.
— Surgiu um assunto e não podemos mais ficar aqui — ele inclina-se e
deposita um beijinho rápido nos meus lábios — Portanto, senhorita Duran,
faça as malas que vamos partir.
— Aconteceu algo? — Ele ontem tinha dito que precisava de tempo e
hoje quer ir embora.
— Nada de mais, bebê.
— Se você diz... Me dê meia hora que terei tudo pronto.
Bem, levou mais de uma hora para que nós pegássemos a estrada de
volta para casa. Descobri que Bruno não tinha dormido na noite passada. Isso
me deixou preocupada com ele dirigindo.
— Tem certeza que não posso dirigir, Bruno? — pergunto quando faz
meia hora que deixamos o chalé.
— Não se preocupe com isso, Alicia. Só ligue o rádio ou converse
comigo, sim? — ele pede quando sorri para mim e volta a olhar a estrada.
Olhar ao redor é o que ele mais faz desde que saímos.
Ligo o som do carro e músicas clássicas começam a tocar. Eu sempre
achei que Bruno era mais do rock, mas vejo que me enganei mais uma vez
com ele.
Depois eu mudo para outro estilo e encontro um dueto de Meghan
Trainor e John Legend, Like i'm gonna lose you.

Em um piscar de olhos
Apenas um sussurro de fumaça
Você pode perder tudo
A verdade é que você nunca sabe

Então eu vou te beijar mais bebê


Alguma chance que eu tenho
Eu vou fazer a maior parte dos minutos e amar sem arrependimentos

Então, vamos dar o nosso tempo


Para dizer o que queremos
Use o que temos
Antes de tudo se foi
Não, nós não estamos prometendo a amanhã

Eu me viro para olhar Bruno, que mantém as mãos crispadas no


volante. Estico minha mão e coloco em sua coxa. Ele me olha rapidamente.
— Eu vou dar uma chance para nós... — isso é só o que posso prometer
para ele no momento. Mas o pensamento dele estar me dizendo adeus é pior
do que imaginei.
Farei o que puder para não o deixar ir.
30
Alicia
O vazio da minha alma parece desaparecer um pouco quando coloco
para fora estas palavras.
Tentar um passo de casa vez. Isso que estou fazendo. Não adianta me
jogar de vez, sem cautela, porque isso nunca foi meu estilo. Tive apenas três
homens durante toda minha vida, e dois nem conto, pois foram namoricos
adolescentes. Apenas Evan foi meu namorado e depois marido. Não sou lá
a mais experiente com homens vividos, ainda mais com um que parece ter
tido mais mulheres que um sultão.
Bruno tem um poder sobre meus sentimentos que são incontroláveis
para mim. Me envaidece seu interesse, mas ele não pode curar
completamente minhas dores e tirar anos de medos de dentro de mim, isso
pode levar tempo. Mas, certamente, tem sido um bálsamo nessa turbulência
que está minha vida. Uma nova relação traz exigências demais para eu
suportar agora e sobre as quais entendo perfeitamente.
Eu não sou covarde, vou tentar por mim mesma.
A reação dele à minha declaração me deixa nervosa. Na verdade, ele só
pegou minha mão em um aperto firme, levando aos lábios e beijando a
palma, dizendo:
— Ok, bebê. Vai ficar tudo bem.
Apenas isso? Ele disse ontem que não desistiria de mim assim
facilmente. Estou com medo de serem apenas palavras bonitas para me
conquistar. Mas daí me pergunto, o que ele poderia querer se já me tem
completamente entregue em sua cama?
Aconchego-me mais para perto do seu corpo musculoso, recebendo um
pouco do seu calor que me faz derreter enquanto seguimos viagem. Beijo seu
ombro, e ele tira os olhos da estrada por um momento para me olhar.
Nada de mais acontece no resto da viagem, apenas alguns telefonemas
que Bruno recebeu de alguém. Depois disso, ele se manteve calado. Eu sabia
que possivelmente o magoei por não dizer que o amava de volta. Todavia,
estou certa que quero tentar e nos dar uma chance real. E isso, para mim, é
maior do que eu imaginei depois da morte de Evan.
Se ele quisesse manter tudo do jeito que era, sexo simplesmente, eu
poderia prometer qualquer coisa. Porém, ele me surpreendeu com um "eu
amo você, Alicia". Isso é muito para assimilar. Estou um passo atrás dele
nessa relação. Ele pode ser um bom homem, no fim das contas. Minha mente
é um turbilhão de conjecturas do futuro enquanto o carro corta as milhas e
milhas de volta para casa.
Chegar em casa não foi ruim. Eu tinha amado esses dias de férias
forçadas, eu não tenho nenhum arrependimento de ter ido com Bruno até lá.
Mas a primeira coisa que fiz foi ligar para o Dr. Allan, assim que tive acesso
a um telefone, e marcar uma consulta para a primeira hora da manhã; irei vê-
lo, e só assim eu posso ficar tranquila.
O pequeno sangramento de ontem simplesmente não existe mais. Estou
me sentindo meio boba por ter surtado e exposto meus problemas para Bruno.
Mas, por outra parte, foi um alívio colocar para fora tudo isso. Eu nunca
expus todos os problemas do meu casamento para meu irmão. Logicamente
ele sabia de algumas coisas que eu não conseguia esconder. Falar com Bruno
tinha sido benéfico para mim. Por incrível que pudesse parecer, eu me sinto
hoje mais leve.
Querer ter o controle já não parecia um sentimento compulsivo como
era há seis meses. Eu me sentia diferente, e talvez deva isso ao amor que
começava a construir-se em meu coração, que há muito tempo precisava
desse calor envolvente chamado Bruno Ross.
Falando em Bruno, ele sim está estranho desde que saímos do chalé.
Ele agora estava no escritório com Alexander, Carl e outro segurança de
nome Salvatore. Eles praticamente chegaram juntos conosco no prédio. E,
desde então, eles estão trancados lá dentro.
Sem nada para fazer, ligo para Marcos e peço um relatório desses
últimos dias de ausência. Estou tão relapsa com meus negócios, foram quase
duas semanas sem nem procurar saber como andavam as coisas, já que Bruno
confiscou meu celular.
— Você tem três possíveis clientes — diz Marcos depois de nos
cumprimentarmos e eu questionar como andavam as coisas na empresa —
Ligaram logo após você viajar. Mas eu disse que sua agenda estava
superlotada e que teriam que esperar você ter uma vaga. — ele diz, rindo.
Rio de sua astúcia, e ele continua:
— Então, se estiver tudo bem, ligo amanhã agendando uma reunião.
— Sim, por favor, faça isso. Amanhã eu não irei trabalhar, mas depois
volto com todo gás — brinco, e parte da ansiedade sai um pouco.
— Sabe quem ligou procurando você? — Ele indaga, mas sem esperar
minha resposta, continua: — Deni Ross. Ele queria saber onde estava e se
tinha dia para voltar.
Estranho. Eu liguei para ele avisando que viajaria. Mas não me atenho
a isso. Depois de conversarmos por alguns instantes, desligo. Tenho vontade
de ver meu irmão, estamos tão distantes ultimamente, mas sei que sair agora
não será possível, não quando não tem nenhum segurança disponível.
Bruno
— Esse cara é o mesmo que abordou Alicia na festa — digo quando
Salvatore passa o vídeo que enviei ontem em uma imagem trabalhada e com
um programa de identificação de rosto — O cara que ela reconheceu do
elevador. — Tinha enviado para o funcionário verificar e ele disse que não
deu para ver nada. — Verifiquem esse tal de Dimas, Alex. Deni pode muito
bem comprar a lealdade de alguém dentro da MS. Ele simplesmente não
estava vendo um carro se aproximar em um local aberto? Dizer que não
conseguiu distinguir as feições do cara no carro quando isso foi um trabalho
simples de identificação? — Esbravejo.
Estou tão furioso que minha vontade é esmagar a porra da mesa em
duas. Os caras estão olhando para mim, rara foram as vezes que me viram
com raiva, e agora era umas dessas horas.
— Ele simplesmente entregou a porra da minha localização — ando
pelo escritório.
— Calma, Ross. Isso não foi comprovado. Vou investigar isso. — diz
Carl pegando se celular e ligando para alguém. Ele vai para um canto da sala
e começa a falar em um tom baixo, não dando para distinguir o que ele diz.
— Ele vai investigar? Para mim isso é mais que claro. Ele foi
negligente e tosco. — digo para Alexander, que apenas continua analisando o
vídeo.
A necessidade de proteger Alicia me deu um foco que vinha faltando.
Estou tão diferente do Bruno que esses caras conhecem que devo estar
confundindo suas mentes.
— Não quero ser chato, Bruno, mas terá que entregar seu irmão à
polícia. Seu testemunho será decisivo para que eles retomem a investigação e,
com isso, Alicia pode ficar enfim livre disso tudo — Alex diz, e algo aperta
dentro do meu peito. Alicia livre pode não me querer.
O pensamento vem tão rápido que me atordoa, e fico com raiva por
cogitar a possibilidade desse trabalho nunca chegar ao fim e, portanto, ela
nunca se livrará de mim, mesmo querendo.
Balanço minha cabeça e tomo uma decisão que estive protelando até
agora: eu irei amanhã na polícia e toda essa merda irá acabar.
— Você tem razão, irei amanhã ao departamento de investigação e
jogarei a merda no ventilador.
31
Deni
— Então, você é ainda pior que seus funcionários. Não conseguiu
nada com a viúva Duran? — meu pai pergunta detrás de sua mesa. Aperto
minha mandíbula e continuo calado, não adiantava falar.
Eu estava com raiva de mim mesmo por ter deixando Alicia escapar
das minhas mãos quando a tive tão perto. Essa ideia idiota de ganhar a
confiança dela e tentar extrair alguma informação não tinha dado certo.
Agora ela está quase inalcançável para mim. Bruno está tão grudado na
mulher que fica impossível chegar nela. Eu estava esperando-o nos entregar,
mas o "sangue" dele não permitiu. O idiota ainda deve ter uma imensa
vontade de fazer parte da família. Idiota. Antes eu acabo com ele.
— Quero que você a traga aqui, quero conhecer a mulher que fez seu
irmão se apaixonar — diz meu pai, fazendo-me levantar o olhar, surpreso —
E quero isso rápido. Contrate um exército se for preciso, para que os
seguranças que estão com ela desapareçam. — Mas que merda ele quer com
Alicia?
— O que você quer com ela? — levanto inquieto — Eu vou conseguir
a informação dela, papai, e talvez ela nem saiba onde o marido deixou toda a
grana que roubou de nossos associados — digo querendo ganhar tempo,
entretanto sei que quando ele quer algo ele consegue por bem ou por mal.
— Você tem andado atrás dessa mulher há meses e nada tirou dela,
nem a fez calar a boca de uma vez, então eu mesmo irei lidar com isso. — ele
diz aborrecido.
— Está bem, a trarei aqui.
Alicia
— Então você não irá ao médico comigo? — digo na manhã seguinte.
Bruno tinha chamado os antigos seguranças para ir comigo no médico
quando soube que eu tinha marcado a consulta.
— Eu tenho de ir falar com a polícia hoje e não sabia que a senhora iria
marcar algo sem me avisar antes, senhora Duran — ele está aborrecido por
causa disso. Desde que eu tinha informado que ia sair que ele estava me
olhando duro e mal-humorado. — Qual o problema que você tem de nunca
comunicar nada, querida?
Eu não informei porque, no fundo, não queria que ele fosse comigo no
Dr. Allan.
— Bem, de qualquer maneira, quando sair do médico irei me encontrar
com meu irmão — dou um beijo no seu queixo que está com a barba por
fazer. Ele parece sexy assim — Gosto quando você deixa a barba crescer um
pouquinho.
— Não tente me distrair — ele abre a porta do Jeep novo que tem agora
no lugar do outro. — Irei te deixar no médico.
— Por que você tem de ir na polícia? — pergunto quando estamos a
caminho da clínica.
Ele me olha rapidamente e vacila.
— Esse assunto é extenso e complicado, bebê, quando eu voltar,
conversaremos.
— Tudo bem. É sobre a morte de Evan?
— Sim, mas agora não se preocupe com isso.
Não insisto, porque esse assunto me deixa doente.
— Matt está vendendo meu antigo apartamento, você sabia disso? Ele
me ligou informando que uma empresa com seu sobrenome fez uma proposta
irrecusável — digo mudando de assunto. Matt me ligou ontem à noite para
saber como tinha sido minhas férias de duas semanas e para saber como eu
estava lidando com o ócio. Não fiquei exatamente no ócio lá, Bruno me fez
trabalhar de uma maneira quente e deliciosa.
— Sim, eu soube. Pode ser coisa do meu irmão — ele diz com
aborrecimento.
— Não imagino por que a máfia quer meu apartamento — digo e levo
minha mão à boca. Oh, merda! — Desculpe, não quis dizer isso.
Ele ri um pouco.
— Eu também não imagino, querida, deve ser a morbidez do lugar.
— Que horror!
Cerca de vinte minutos depois, ele me deixa na clínica juntamente com
Connor e vai para o que imagino ser o departamento de polícia.
Dou meu nome na recepção e espero ser chamada. Estou tão ansiosa
que minhas mãos estão úmidas de suor.

***

— Então, Alicia, não há mais nenhum sangramento. Você me deixou


preocupado com seu telefonema desesperado, pensei que tinha sido algo mais
grave. — diz o Dr. Allan, pouco mais de meia hora que já estou em sua sala e
depois de ele fazer um exame ginecológico não invasivo.
— Isso não é normal para mim, doutor — digo, a calma dele me
deixando mais nervosa. Desço da cama e, depois de me arrumar, volto a
sentar à sua frente.
— Irei pedir alguns exames, e mesmo que você esteja grávida de
poucos dias, isso será detectado com o exame de sangue. Você não estava
grávida na última consulta, isso posso garantir — ele diz, escrevendo no meu
prontuário. — Mas eu acredito que houve esse pequeno sangramento pela
dosagem fraca da medicação. Alicia, você tem obrigação de contar para seu
médico ginecologista que tem uma vida sexual ativa. Mas eu errei em não ter
perguntado na última consulta quando falamos da dosagem menor — Eu fico
vermelha, e Allan ri da minha cara envergonhada — Você está namorando?
Que coisa boa, fico feliz por você. Você tem passado por muitas coisas, tem
de relaxar mesmo — ele continua.
Estou me sentindo uma adolescente sendo repreendida. Eu ando
ultimamente com a cabeça nas nuvens. E tinha feito sexo sem preservativo
desde que fomos para o chalé, isso era um lapso terrível da minha parte
comigo mesma. Eu estava brincando em torno disso e nem percebi o que
estava fazendo. Preciso voltar ao meu juízo perfeito.
— Faça esses exames ainda hoje, vou pedir o resultado até amanhã.
Não irei passar outra pílula até ter esses resultados. — pego os papéis, e
depois de me despedir, vou imediatamente para o ambulatório fazer os
exames.
Quando termino tudo, percebo que Connor não estava na porta quando
saí da sala do Dr. Allan. Procuro-o em torno da recepção e não o vejo. Vou
até a recepcionista atrás do balcão.
— Olá, você viu o homem que estava comigo agora há pouco? — ela
tira os olhos do computador e me encara como se eu estivesse perguntando
que horas sai a nave para Marte.
— Não vi ninguém, senhora.
— Obrigada.
Que droga, aonde ele foi? Resolvo sentar e esperar, afinal teria de pegar
um táxi se quisesse sair daqui.
Passam cinco, dez minutos, e nada de ele parecer, então resolvo ligar
para ele. Mas o celular apenas chama. Levanto decidida a ir embora e ando
para fora da clínica. Eu sei que estou me arriscado, porém não ficarei aqui
com meu segurança sumido. Vou ao estacionamento verificar, em uma última
tentativa de encontra-lo. Quando chego, vejo Connor ao lado do carro e
suspiro com alívio.
Mas junto a ele está Deni Ross, e algo não parece bem. Eles mantêm
uma conversa tensa, e quando me aproximo, vejo Connor ficar apreensivo e
mudar de cor. Meu instinto me manda dar meia-volta e correr. Os olhos do
guarda-costas me envia mensagem para fazer exatamente isso, mas Deni olha
para cima, para mim, e sorri vindo na minha direção.
— Alicia, que surpresa. Estava falando com seu segurança porque
quero convidá-la para vir comigo. Tem uma pessoa que quer muito conhecê-
la. — Olho para Connor. Ele está olhando fixo para mim e seu rosto reflete
apreensão, mas Deni já está ao meu lado e segura meu braço, me guiando
para um carro que não é o nosso.
— Deni, sinto muito, mas não irei...
— Eu insisto — ele não está sorrido mais, e vejo quando alguns
homens ficam ao lado do meu segurança. Deni abre a porta do carro,
esperando que eu entre.
— O que está acontecendo? — exijo com firmeza. Não irei entrar nesse
carro por livre e espontânea vontade.
32
Alicia
—Diga-me o que está havendo, Sr. Ross — exijo saber de Deni,
ainda em pé ao lado do carro — Não irei a lugar algum com você sem falar
com o seu irmão primeiro.
— Eu sou a favor de você ir sem grandes alardes, senhora Duran. Não
quero chamar a atenção das pessoas em volta. — ele aponta alguns
transeuntes passando por ali, outros entrando em seus carros — Como disse
para seu segurança, meu pai gostaria de conhecer a namorada do seu filho
mais novo, então estou te levando até ele. Sabe, ele é um homem já velho,
não gosta de sair de casa. Então, Alicia, seja sensata e uma boa futura nora e
venha comigo.
— Se seu pai quer me conhecer, ele pediria isso ao Bruno e não a você
— tento me afastar dele, mas ele impede minha passagem com o braço.
— Você, nessas alturas, já deve saber que eles não se falam, minha
querida, e nem eu e ele somos os melhores irmãos ou amigos — ele segura
meu braço, forçando para que eu entre no carro, e acabo sentada no banco de
trás junto com ele que entra em seguida.
Eu tento ver Connor, e o vejo sendo empurrado para um carro também.
Minha cabeça dá mil voltas e nada faz sentido aqui. Por que Connor permitiu
isso e nem reage a nada? Abro minha bolsa e pego meu telefone. Estou
prestes a ligar para Bruno quando Deni pega meu celular.
— Devolva-me isso, Sr. Ross — digo esticando meu braço para pegá-lo
de volta.
— O quanto você gosta do meu irmão, Alicia? — ele baixa a voz em
tom conspirador — Por que se você ligar para ele, ele acabará machucado por
sua causa. Sabe, ele pode ter se livrado do último acidente, mas o próximo
será fatal.
Ele fala com tanta casualidade que me choca. Ele é louco?
— Por que está fazendo isto? O que você quer de mim? Você que
mexeu no carro do seu irmão? — disparo uma pergunta atrás da outra. Meu
sangue começa a esquentar, e fico abismada comigo mesma com a súbita
vontade de descer minha mão em seu rosto com um tapa. — Como ousa
agredir seu próprio sangue? Seu irmão?
Ele ri da minha raiva. Tenho minhas mãos apertadas em punhos
prontos para socar seu rosto. Idiota!
— Devia entregar você para a polícia por tentativa de homicídio —
digo furiosa.
— Você não é um bloco de gelo, Alicia, que grata surpresa. Gosto
dessa gata selvagem que está querendo sair daí de dentro — ele me olha com
desdém, arqueando uma sobrancelha — Mas devia se preocupar com você,
minha querida. Não suporto mulheres descontroladas assim — aponta para
mim.
— O que seu pai quer comigo? — Devia estar tentando sair desse carro
em vez de pensar em agressão física. — Eu quero que você me leve para
casa, Deni, não estou me sentido bem, acabei de sair do médico — Eu não
entendo o que ele está fazendo. Ele bebeu? Tão diferente do Deni que
conheci, todo gentil, esse é um idiota.
— Você está doente? — ele parece genuinamente preocupado. Chega a
ser hilário e contraditório.
— Talvez. — fecho meus olhos, preocupada com o que pode acontecer
comigo e Connor. Ele parecia tão aflito, coitado — O que você fez com
Connor? — viro minha cabeça para olhá-lo.
— Só um pequeno incentivo para que ele cooperasse comigo.
— O que seria isso?
— Talvez não goste da resposta. Ele tinha de escolher entre você e sua
pequena filhinha. Ele não escolheu você! — Diz com deboche.
— Você machucou uma criança? Que tipo de monstro é você? — agora
estou apavorada com seu sangue frio.
— Claro que não. Eu gosto de crianças, Alicia, mas os meus homens
podem não ter meus princípios, e se ele não cooperasse comigo ela poderia se
machucar — ele recosta-se no banco de couro e pisca para mim com malícia
— Isso pode se aplicar a você também, pode se machucar se não começar a
cooperar.
— Do que está falando? —minha voz trêmula me trai — Cooperar com
o que, seu...
— Primeiro, quero que saiba que seu apartamento está sendo comprado
pela minha empresa. — diz, me cortando. Como não digo nada, ele continua:
— Não quer saber por que estou comprando seu apartamento, Alicia?
— Não — minto. Como estou apavorada com o que ele pode me fazer
de mal, minha curiosidade está a mil por hora.
— Diga-me, Alicia: você sabia todos os segredos do seu marido? Sabia
tudo sobre seu trabalho? — sua voz é baixa e macia. Se eu já não estivesse
apavorada, ficaria, porque esse tom de voz dele me dá calafrios.
— Como já disse para a polícia, não sei nada sobre o trabalho de Evan,
portanto, Sr. Ross, não, eu não sei nada da vida do meu falecido marido.
— Pense, Alicia. Às vezes as respostas estão no nosso subconsciente e
achamos que nada sabemos, mas no fim temos as repostas bem ali. É só
pensar com calma sobre o que ele fazia em casa.
— Nunca chegava em casa no horário que pudesse observá-lo, senhor
Ross. Então não tem como saber o que ele fazia quando chegava,
principalmente nos últimos seis meses que antecederam sua morte.
— Onde você acha que foi parar todo o dinheiro que ele roubou dos
seus clientes?
Por que diabos ele está me perguntando isso? Qual o maldito interesse
dele com isso? Oh, Deus! Seria Deni uma das pessoas que Evan roubou?
Ah, merda! Percebo naquele momento que isso pode terminar mal.
Será que nunca vou me livrar das merdas que Evan aprontou? Eu tinha
minhas emoções me fazendo incapaz de manter o foco. Balanço minha
cabeça, limpando minha mente, e respiro fundo e pesadamente.
— Você era um dos seus clientes? Você é umas das pessoas que
querem me matar?
Oh, Senhor, eu realmente sou uma suicida, porque se ele realmente
fosse, eu estava caminhando para minha morte certa. Por isso Bruno não me
queria perto do irmão? Ele sabia de Deni e não me contou?
Deni olha para mim sério, e estou com meu coração na mão esperando
sua resposta quando um telefone começa a tocar. Percebo que é o meu. Deni
olha para ele com um sorriso. Ainda o tem nas mãos desde que tinha pego de
mim.
— Olha só... Isso só melhora, Alicia. — ele aperta o botão de atender
— Alô!
Bruno
Deixo Alicia na clínica, mas não estou feliz. Deixá-la com outras
pessoas me deixa com uma sensação nada boa no peito. Porém tenho de fazer
isso hoje, não posso protelar mais minha ida ao departamento de homicídio e
falar que suspeito da minha família. Seria doloroso cumprir isto até o fim.
Primeiro tenho que passar na empresa, e faço isso em tempo recorde. Vou até
o balcão da recepção, encontrando Lilian lá como sempre, linda e
concentrada.
— Adoro vir aqui, é sempre inspirador e gratificante entrar por aquelas
portas e se deparar com uma beleza estonteante — digo parando junto do
balcão.
— Bruno! Quanto tempo. — fala como sempre quando a provoco,
exatamente como sei que ela faria. Olho ao redor como também sempre faço,
procurando o marido perigoso dela — Sal não está.
Ela ri quando me vê olhando ao redor, e rindo também. Bato meus
dedos no balcão antes de rumar para meu escritório.
— Bom saber, nunca sabemos quando o louco não toma seu remédio
contra o ciúme — ela balança a cabeça, rindo. — Conselho de amigo: devia
colocar uma coleira no homem.
— E quem disse que ele já não tem uma? — ela pisca conspiratória.
— Lilian! Não sabia que vocês dois praticavam BDSM — finjo
espanto, fazendo-a arregalar os olhos, e agora é a vez dela olhar ao redor.
— Bruno! Não é nada disso. E não fale essas coisas aqui onde as
pessoas podem escutar.
Rio quando vou embora, deixando-a murmurando sobre minha cara de
pau. Perco meu sorriso quando pego alguns documentos que Alex disse que
iria deixar em minha mesa. Estes documentos eram todas as provas que
Duran estava envolvido com pessoas de índoles duvidosas, e minha família
estava aqui exposta.
Eu não sei o que irá acontecer com meu pai ou Deni. Talvez, como
sempre, não serão incomodados.
Tenho medo por Alicia, e sei que posso piorar a situação dela dando
esse depoimento hoje. Meu pai tinha muitas amizades, e ficar fora da cadeia
foi o que de melhor ele fez durante toda a vida. Nunca tinha sido preso, muito
menos Deni. Deixando as dúvidas de lado, pego a pasta e saio. Se houve um
momento em que precisei manter meu juízo comigo, esse momento era agora.
Não recuar era o lema.
— Até mais, Lilian. — digo quando passo por ela na saída.
— Tenha um bom dia, Ross — ela responde — E não demore muito
para aparecer por aqui, sentimos sua falta. E traga sua namorada. Preciso
conhecer a mulher que conseguiu te laçar.
Escuto seu riso, e sem me virar levanto minhas mãos em um aceno,
ignorando o "namorada". Eu só sei de uma coisa: que até o fim do dia, Alicia
pode estar me odiando por esconder coisas importantes dela.
Quando paro meu carro no estacionamento do prédio do departamento,
retiro a arma do coldre que estava usando e deixo no porta-luvas do carro. Eu
pego meu telefone e empurro no bolso do terno. Tenho vontade de ligar para
Alicia, mas ela pode estar na sala com o médico.
Minha. Minha, e não vou perdê-la agora, porém minha relutância em
entrar imediatamente nesse prédio se deve ao fato de que, com isso jogado no
ventilador hoje, pode fazê-la de distanciar de mim. Talvez ache que eu possa
fazer mal para ela, pela simples razão de ser um Ross.
Desço e caminho para fazer logo o que tinha de ser feito.
Isso levaria o dia todo, eu sabia. Depoimentos sempre são demorados
pra caralho, então quando me sentei na sala do delegado, avisei:
— Quero terminar com isso rapidamente, tenho serviços me esperando
lá fora que não podem esperar o dia todo.
— Sr. Ross, devo lembrá-lo que foi o senhor mesmo quem pediu para
estar aqui? — diz, não dando muito ouvido para mim — Vamos levar o
tempo que for preciso.
Duas horas depois ainda estou falando e falando as mesmas coisas, para
frente e para trás. Porra, preciso saber onde está Alicia. Não confio em
ninguém cuidando dela longe de mim, por aí. Estou inquieto a cada minuto
passado aqui.
— Você está dizendo que seu pai e irmão são os assassinos de Evan
Duran?
— Estou dizendo, delegado, que há fortes indícios de que eles tenham
parte nisso. Não afirmei que vi meu pai ou irmão puxando o gatilho de uma
arma. Estou apenas lhe mostrando o resultado de nossa investigação paralela.
— digo aborrecido. Por isso protelei tanto minha vinda aqui, esses caras
adoram colocar palavras na boca das pessoas — Preciso de uma pausa para
um cigarro, delegado. — Eu minto, pois nem fumo. Na verdade, quero ligar
para Alicia. Porra! Estou como um cachorrinho adestrado pra caralho.
— Estamos longe de acabar, Sr. Ross — bufo, impaciente com suas
palavras.
— Delegado, preciso de um tempo. Estou fazendo isso como um favor
para vocês. Não sou a porra de um suspeito obrigado a falar horas seguidas
sem descanso. — digo, já levantando. Não obedecerei a esse filho da puta
que não faz seus serviços corretamente. Porque se eles tivessem continuado
investigando, eles teriam chegado ao assassino de Duran.
— Pode ir preso por desacato, senhor Ross, e não está nos fazendo um
favor, está cumprindo sua obrigação de cidadão. — Ignoro-o e saio.
Pego meu celular e ligo para Connor. Apenas chama até a ligação cair.
Droga! Odeio quando eles fazem esse tipo de coisa, não atender telefone
quando estão em serviço. Ligo então para Alicia, e depois do quarto toque
uma voz masculina atende.
— Alô — a voz inconfundível de Deni me faz congelar no lugar —
Irmão, que bom que ligou.
— Cadê Alicia, seu miserável?! — grito, fazendo os policiais ao meu
redor me olharem com cara feia. Dou meia-volta para a sala do delegado.
— Não quero que se preocupe com sua namorada, irmãozinho. Papai
quer muito conhecê-la — Deni está dizendo, quando vejo que o delegado já
não está mais na sala.
— Não a machuque, Deni. — peço muito baixo. Estou correndo agora
para fora do prédio da delegacia — Ela não sabe nada do marido, posso
garantir para você. Ela é inocente, porra!
— Isso quem vai dizer é nosso pai — ele diz com satisfação. — Agora
tenho de desligar.
— Espera! Deixe-me falar com ela
— Oh, meu irmão, está chorando? — Ele está debochando porque sabe
que me atingiu — Implore!
Porra!
— Eu vou acabar com você, Deni!
— Não estou escutando você implorando pela vida dela, Bruno! — ele
diz, rindo. Miserável!
— Por favor... — digo calmamente. Quando entro no meu carro ouço a
voz de Alicia.
— Bruno? O que está havendo? — sua voz é apreensiva, posso sentir
pelo tom de sua voz que ela está com medo.
— Hei, bebê. Você está bem? — pergunto, sem demonstrar que estou
com medo por ela.
— Estou sim... Mas...
— Estou indo buscar você, aguente firme, ok? — manobro saindo do
estacionamento. Conecto meu celular no viva-voz. — Você sabe onde está
indo?
— Deni disse que para ver seu pai. Bruno, isso tem a ver com Evan? —
ela tem a voz trêmula.
— Chega dessa conversa — ouço a voz de Deni — Diga adeus ao meu
irmãozinho.
Ele corta a ligação, e quando tento ligar outra vez vai para caixa postal.
Estou dirigindo para a casa do meu pai depois de anos longe. E na pior
circunstância. Deus me perdoe, mas eu arrancarei a cabeça do maldito Deni
se ele machucar Alicia.
Ligo para a empresa, preciso de reforços se as coisas não saírem bem
na casa do meu pai.
— Terminou aí, Ross? — diz Alex, atendendo.
— Alexander! — estou com tanta raiva que minha voz sai estranha —
Deni está com Alicia.
— Porra! — ele pragueja — Ele não a machucou, não é?
— Ainda não. — passo o endereço da casa do meu pai — Mande
alguns homens para lá.
— E Connor?
— Não consegui falar com ele.
— Vamos resolver isso de uma vez por todas, Bruno! Vou tentar algum
contato com ele.
— Desligando — digo, encerrando a ligação, e dirijo feito um maluco
pelo trânsito caótico. Sei que meu pai não vai matar a Alicia, ele não é idiota,
mas ele pode machucá-la, e isso ele vai fazer.
33
Alicia
Desligo o telefone sentindo lágrimas ardendo em meus olhos. Não
quero chorar, tenho de manter o foco e meu discernimento. Por incrível que
pareça, tenho mais medo por Bruno que por mim. Pela forma que Deni falou
com ele ao telefone, mostra o quanto tem ressentimento de Bruno. Eu não
posso imaginar o porquê de ele sentir menos que amor por seu irmão.
Eu tenho uma relação tão próxima do meu próprio irmão, que acho
terrivelmente perturbador que outros não tenham essa mesma afinidade. Matt
e eu somos nossos portos seguros. Mas esses dois irmãos parecem mais dois
inimigos. Sinto no meu coração que Bruno não odeia Deni. Já o Deni? Esse
parece, sim, odiar o irmão.
— Deni, qual o seu interesse em se aproximar de mim? — pergunto
depois que respiro fundo para me acalmar. Calma, Alicia, esse é o mantra
dentro da minha cabeça.
— Meu irmão não devia guardar segredos de você, querida — ele ri um
pouco quando vira no banco e olha para mim — Bem, já que você não irá
abrir a boca para ninguém a partir de hoje, eu vou te contar.
— O que Bruno deveria me contar? — pergunto preocupada.
— Que ele sabe quem matou seu marido. — diz com satisfação.
O quê? O que esse idiota está falando? Claro que Bruno não sabia, ele
teria me falado. Se não para mim, mas para a polícia. Não guardaria um
segredo como esse. Deni só pode estar mentindo. Mentiroso maldito.
— Como é? — digo com incredulidade — Você sabe como? Se nem a
polícia sabe?
Dor passa por mim e minhas mãos tremem. Eu as aperto ao redor do
meu celular para que ele não veja que está enfim me afetando. Não acredito
que confiei tanto em Bruno e ele não teve a mesma consideração por mim.
— A polícia sabe, ou parte dela. Só é interessante que fiquem calados.
Eles são corruptíveis e fáceis de comprar, Alicia — ele debocha — E seu
marido não era nenhum cidadão exemplar para que eles se importem tanto
com ele. Era um criminoso.
— Como você? — desafio, mesmo com receio que ele pudesse me
fazer mal. Não poderia abaixar minha cabeça diante desse desajustado. —
ele, em vez de ficar irritado, começa a rir.
— Não como eu, minha querida. Ele não teve essa sorte — diz nada
modesto — Ele era um ladrãozinho de merda que roubou da minha família e
de nossos associados. E você, Alicia, deve saber onde ele colocou esse
dinheiro, porque não é pouco.
Oh, meu Deus! Eles eram as pessoas que estavam atrás de mim? E
Bruno sabia disso. Por isso que...
— Você matou meu marido? — minha voz sai sufocada. Angústia não
tem fim dentro de mim, sinto-me enganada — Seu pai, ele... — Paro, não
posso verbalizar isso, é muito para mim.
Ele não diz nada, e não sei se quero saber mais. Estou imaginando por
que diabos estou sendo protegida pelo homem cuja família é a responsável
pela situação que me encontro. Estou me sentindo perdida e mais confusa que
nunca.
O carro para momentaneamente na frente de um portão alto de ferro
preto, que se abre automaticamente para o deixar passar. A casa que surge
adiante — bem, não é exatamente uma casa, mas uma mansão com as
paredes cobertas de heras verdes — era grande e intimidante. O automóvel se
detém diante da provável entrada onde vejo uma porta larga.
Deni desce e estende a mão para mim, como se eu fosse uma convidada
em vez de uma vítima no que parece um sequestro, mesmo que ele não tenha
me machucado fisicamente. Depois daquele telefonema de Bruno, estou me
controlando para não surtar, é isso ou vou começar a gritar por socorro feito
uma maluca desvairada. Sei que não levará a lugar nenhum. O que me dá
essa força é a certeza na voz do Bruno dizendo que vem me buscar. Nunca
acreditei tanto em outra pessoa. Ele parecia tão preocupado.
Mesmo sabendo que ele sabe mais do que me diz, ainda acredito que
ele nunca me fará mal, ele não é igual a seu irmão degenerado. Agora que
tenho meu celular comigo, agarro-o como se minha vida dependesse desse
aparelho.
Achei estranho Deni permitir que eu ficasse com ele, deve saber que
não ligarei para Bruno, afinal, não seria necessário. Mas posso ligar para a
polícia, o 190, e todos esses criminosos seriam presos por sequestro, só assim
ficaria em paz.
Paro olhando ao redor para ver se tem uma rota de fuga, mas
certamente não há. Ainda que tivesse, não posso sair daqui sem respostas.
— Bem-vinda, Alicia — Atrás de mim, Deni diz em meu ouvido
quando se inclina colocando sua cabeça rente à minha, seu queixo no meu
ombro. A intimidade do gesto me incomoda e dou um passo para frente. O
escuto rir baixo, mas não dou nenhuma atenção.
Segurando meu braço, ele me guia para a entrada da casa.
Ele me leva para uma sala enorme e ricamente decorada, mas não me
atento para essas coisas; estou olhando para o senhor elegantemente vestindo
um terno, sentado em uma poltrona. Ele não deve ter mais que sessenta e
cinco anos, magro, mas de uma maneira saudável, e exala poder em minha
direção.
Vejo que os filhos não puxaram a ele fisicamente, quer dizer, apenas os
cabelos, que no caso dele já são grisalhos, entretanto muito parecido com o
dos seus filhos. Seu olhar afiado está fixo em mim. Noto que não há nenhuma
simpatia ou benevolência neles. Um frio percorre minha espinha, porém não
me intimido diante dele. Se vão me matar, não morrerei como uma covarde.
— Papai — diz Deni quando entramos na sala — Quero lhe apresentar
Alicia Duran.
Ele não diz nada, apenas me analisa com olhos de falcão. Empino meu
queixo para ele e o desafio com o olhar. Ele acha que vou falar primeiro?
Está enganado.
Esse homem expulsou o próprio filho de casa e poderia muito bem me
matar aqui e agora. Eu seria apenas mais uma estatística na lista dos
desaparecidos, mas não me curvarei para esse covarde.
— Senhora Duran, enfim posso conhecê-la. — ele diz e aponta para o
sofá de couro À sua frente — Por que não senta? Temos algo para conversar.
— ele cruza as pernas elegantemente e vira seu olhar para Deni. — Deixe-
nos. Enfim, você conseguiu fazer algo rápido. Até mais rápido do que
imaginei.
Olho para Deni que fica vermelho pela reprimenda. Mas, por mais
estranho que possa parecer, eu não queria que ele saísse e me deixasse com
seu pai. Onde estava Bruno?
Vejo Deni sair com uma careta de desgosto e, como não tenho outra
opção, sigo para o sofá e sento, minha coluna reta e tensa. Estou ainda
segurando meu telefone, pronta para ligar para a emergência se for
necessário. Isto chama a atenção do homem à minha frente, e ele faz um
show para se inclinar mais para trás na poltrona e me dar um olhar de
comando.
— Você tem algo que me pertence, senhora Duran — sua voz é baixa e
intimidante — Seu marido deixou algo em seu poder que pertence a esta
família.
— Senhor Ross, não sei nada sobre o que o senhor e Deni estão
falando. Desconheço quaisquer uma das coisas ilícitas que meu marido fazia.
— digo confiante, mesmo que por dentro estivesse igual gelatina.
— Não minta para mim, senhora Duran — ele vocifera com seus olhos
escuros e frios cravados em mim — Não gosto dos mentirosos, então comece
a falar algo que eu quero ouvir.
Onde está você, Bruno? Grito nos meus pensamentos. Seu pai vai me
matar. Penso angustiada.
— Senhor Ross, meu marido não falava dessas coisas. Como já disse
para a polícia, não sei de nada. — minha garganta está seca e tento engolir,
mas está ficando difícil, não sei o que dizer para salvar minha própria pele.
— Estou perdendo minha paciência, senhora Duran, e isso pode não ser
bom — ele descruza as pernas e levanta, caminhando pela sala — Seu marido
morreu e a senhora sabe o motivo. Mentiu, roubou...
O silêncio que se segue na sua óbvia ameaça é denso, e o ar na sala
parece crepitar. Ele não levantou a voz, nada, tudo parece calmo, como se
tivéssemos tendo uma conversa normal. Mas sei que posso morrer ainda hoje,
e tenho um maldito nó na garganta. Evan conseguiu, enfim, acabar comigo.
Ele no fim me venceu, mesmo morto achou uma forma de me fazer chorar,
mesmo que diferente das outras vezes. Era desesperador saber que você pode
morrer por ser inocente. Onde estava a maldita lógica disso?
Vejo o pai de Bruno caminhar até perto da janela da sala, suas mãos no
bolso da calça, depois se volta para mim.
— Soube que meu filho mais novo está apaixonado por você — diz ele
e franze a testa — Que coincidência, não, senhora Duran, logo meu filho ser
seu segurança? Que ironia do destino, não é?
Eu não queria chorar, mas meus olhos ardiam, e sinto quando uma
lágrima solitária desce por meu rosto. Eu a seco.
— Senhor Ross, não tenho nada a dizer ao senhor, não tenho nenhuma
informação que possa interessar, então queira, por favor, me levar de volta
para seu filho. — eu também levanto e tenho vontade de voltar a sentar, pois
minhas pernas estão trêmulas.
— Meu filho não lhe salvará agora, disso tenho certeza. Ele não vem
aqui, por nada — ele diz quando volta na minha direção — Eu sinto muito
pelo meu filho. Vai perder a namorada por ela ser idiota e não falar a verdade
quando isto é exigido dela.
— Eu sinto muito... — meu telefone começa a tocar, me
interrompendo. Olho esperançosa para a tela, mas vejo o número de Allan.
Oh Deus, Bruno não ia aparecer? — Allan! — atendo sem pensar se isso faria
minha morte mais rápida.
— Alicia, você ainda está por perto da clínica? — ele indaga com
jovialidade — Seus exames estão quase prontos, daqui a meia hora no
máximo, se ainda estiver por perto venha me ver.
— Acho que não vai ser possível, Allan, eu... — sinto quando o
telefone é retirado da minha mão, e de olhos arregalados vejo o senhor Ross o
desligando.
Ele se afasta outra vez de mim e pega o telefone que está em uma
mesinha ao lado de sua poltrona. Ele retira o receptor do gancho, disca uma
série de números, falando em seguida:
— Venha aqui. — deposita-o de volta no gancho e me olha — Já não é
necessária, senhora Duran.
Uma porta se abre, e para dar passagem a dois homens. Um eu
reconheço imediatamente. Minhas pernas falham debaixo de mim.
Bruno
Eu nunca imaginei que um dia eu voltaria aqui. Pela forma que saí anos
atrás, nunca cogitei mesmo que remotamente retornaria, mas aqui estou, tão
cheio de ódio que se conseguisse colocar as mãos em Deni, eu o mataria. A
raiva que sentia dentro de mim transbordava para a superfície e ameaçava me
sufocar.
Eu estava assustado com a potência desse sentimento direcionado à
minha família. Nunca senti essa raiva antes. Sempre tinha sentido desgosto
deles por serem como são, no entanto, agora eles estavam extrapolando os
meus limites de tolerância.
Tinha ligado há dez minutos para o delegado. Eu tinha esperança de ter
aquele cretino do Deni preso hoje.
— Senhor Ross, não pode achar que essa delegacia está à sua
disposição para ir e vir quando lhe convier — ele disse quando atendeu.
Devia estar chateado pela minha saída repentina, como imaginei que estaria,
mas não importava agora.
Não dei nenhuma desculpa, apenas dei o endereço do meu pai para ele
e expliquei rapidamente o que houve. Agora estou parado nessa droga de
portão, esperando que alguém venha abrir. Já não tenho acesso livre aqui.
Vejo pelo retrovisor o carro de Alexander chegando atrás do meu. Buzino
furiosamente até que um guarda vem abrir.
Ele deve me reconhecer, porque abre sem muito alarde. Acelero meu
carro, cantando pneu no asfalto até parar na frente da casa. Desço já com
minha arma pronta para disparar na cabeça de qualquer filho da puta que
tentar me impedir de entrar, e espero que não seja tarde demais para Alicia.
Corro para a porta e abro para me deparar com Deni. Eu não penso e
vou para cima dele, furioso. Soco violentamente sua cara repetida vezes
fazendo-o cair. Pareço um trator quando vou para cima dele sem nem
argumentar, qualquer raciocínio lógico que possa existir em mim evaporou
quando vi sua cara idiota.
— Cadê Alicia, seu idiota?! — grito quando ele tenta levantar para
revidar os socos, mas estou tão enraivecido, a adrenalina me dando força que
nem sabia que tinha, não dou nenhuma chance para ele.
Soco, soco, soco.
— Você a perdeu, imbecil — ele ri, sua boca vermelha do sangue de
seus lábios cortados, seu rosto inchando onde tinha socado — Você
PERDEU!
— Maldito! — vocifero partindo para cima dele outra vez.
— Parem! — a ordem vem de dentro da sala. A voz do meu pai é
inconfundível, mesmo depois de anos sem a escutar. Estaco congelado no
lugar e viro para encará-lo.
— Onde está Alicia? — vou em sua direção quando um dos seguranças
dele dá um passo à frente, parando ao ver meu olhar enfurecido. Boa decisão,
filho da puta. Eu não tinha percebido que estava rodeado deles. — É melhor
ela não ter um arranhão ou vou acabar com você — ameaço.
— Não tolero esse tipo de desrespeito na minha casa — meu pai fala,
frio.
— Foda-se a sua casa! Eu não dou a mínima. Cadê a Alicia? — exijo
quando o empurro do meu caminho e entro na sala. E alívio me toma quando
eu a vejo no sofá. Mas o alívio dura pouco quando percebo que ela está
deitada no sofá e não está se mexendo.
— Alicia! — chamo quando caio ajoelhado e verifico seu corpo. —
Alicia, fale comigo!
— Ela desmaiou — diz uma voz atrás de mim. Levanto lentamente do
chão e viro. Meu pai.
— O que você fez com ela?! Se a machucou, vou esquecer que você é
meu pai.
Sentia uma ardente necessidade de acabar com qualquer um que lhe
fizesse mal. A fúria que crescia em meu interior me despojava da lógica e o
controle, me fazendo perder a lógica.
Escuto vozes alteradas lá fora, e depois a polícia invade o local. Meu
pai me olha desgostoso.
— Não havia a necessidade de trazer a polícia com você, filho. — vejo
pelo canto do olho Alexander aparecer ao lado do delegado.
— Fique longe de Alicia a partir de hoje ou não respondo por mim. —
digo furioso.
— Delegado, que honra tê-lo em minha casa — meu pai caminha para
o delegado, ignorando minha ameaça. Vejo incrédulo quando ele coloca a
mão no ombro do delegado e o guia para fora da sala. Porra, ele não tem
limites.
Viro para Alicia e a pego em meus braços. Vou tirá-la desse lugar
contaminado por ódio. Alex se aproxima.
— Ela está bem?
Assinto e começo a sair da sala quando estaco pela terceira vez no dia,
congelado no lugar. Minha mãe está descendo as escadas. Deus, isso é
demais para um só dia.
— Filho...
Saio do congelamento e agarro Alicia mais forte em meus braços,
continuando meu caminho para fora.
— Temo que esses filhos da puta não serão levados presos, Bruno —
Alexander diz ao meu lado. — Descobri que esse delegado tem uns rabos
presos e foi um erro chamá-lo.
— Sei disso agora, por isso a porra da relutância em acreditar em mim
e aquela enrolação no depoimento. Isso não ficará assim. — Saio para
encontrar Deni ao lado do carro de polícia com o rosto inchado.
Coloco Alicia no banco traseiro e sento com a cabeça dela no meu colo.
Ela está voltando a si, e eu abaixo, beijando sua testa que está enrugando com
a careta que está fazendo. Olho para Alex que está dando instruções aos
homens que vieram com ele e, sem me perguntar nada, ele senta no banco do
motorista do meu carro e sai.
Olho através do vidro. Tinha de voltar aqui e acertar as contas com eles
todos, porque eu sabia que essa polícia de merda estava no bolso do meu pai.
Sei agora porque esse caso não foi resolvido. Fodidos corruptos!
— Bruno... — ouço a voz fraca de Alicia e volto minha atenção para
ela. — Você veio.
— Claro que sim, bebê, sempre — beijo seus lábios rapidamente em
um selinho e acaricio seu rosto delicadamente — Você está bem? Eles te
fizeram algum mal, querida?
— Não. Só me assustei um pouco...
— Shii, está tudo bem agora. Vou levar você no médico, isso é o certo
a fazer. — digo.
— Leve-me de volta à clinica, o Dr. Allan quer falar comigo — ela diz
em um fio de voz. — Eles ainda vão querer me matar, Bruno?
— Não, Alicia, porque antes eu acabo com eles! — raiva se apodera de
mim outra vez.
— Por que você mentiu esse tempo todo para mim, Bruno? — ela
pergunta, sua mágoa evidente.
— Não menti, querida, apenas achei desnecessário preocupá-la com
isso — digo tentando amenizar.
— Você mentiu...
— Não, bebê, não pense assim...
— Para aonde quer que a leve, Ross? — a voz de Alex me interrompe.
Dou o endereço para ele e olho para Alicia. Ela está de olhos fechados,
e fico preocupado que não me perdoe.
— Desculpe, amor — sussurro — Só quero proteger você.
— Eu sei, só que não confia em mim — responde.
— Claro que confio, mas isso não é motivo de orgulho para mim, fazer
parte de uma família criminosa. — esclareço.
Ela não responde e continua com os olhos fechados. Pouco depois,
Alex para o caro na frente da clínica, e eu desço com ela no colo.
— E o Connor? Estou preocupada com ele — Alicia pergunta.
— Esse tem muito o que explicar, porque deixou Deni levar você.
— Ele não podia fazer nada, Deni estava ameaçando sua filha. Esse seu
irmão é louco.
— Eu sei disso.
Alicia
Dez minutos depois, estou deitada em uma maca na enfermaria da
clínica e o Dr. Allan está examinando e aferindo minha pressão arterial.
— Está só levemente alterada, mas pela circunstância, é surpresa não
estar mais alta — dissemos a ele que fui assaltada e por isso o "ladrão" tinha
tomado o celular no momento em que ele falava comigo. — Alicia, eu
preciso falar com você.
— Sobre o resultado dos exames? — olho para Bruno que está sentado
ao meu lado na cama.
— Sim. — confirma — Tenho os resultados, pedi que saíssem o mais
rápido possível.
— Bruno, pode esperar lá fora um momento? — Peço.
— Claro que não, não irei deixar você sozinha.
— Por favor.
— Negativo, Alicia.
— Senhor Ross, um médico não pode dar um diagnóstico a um
paciente na presença de outros se assim ele não quiser. — tenta interferir o
Dr. Allan — A ética...
— Dane-se a ética, doutor. Ela não ficará só, eu posso garantir.
— Bem, se você não se importar, Alicia. — eu fico nervosa, mas acabo
assentindo. — Certo, o exame de sangue teve um resultado que talvez você
não goste, Alicia. Você está grávida. Quero descobrir de quanto tempo, já
que você estava tomando medicação.
Ele continua falando, mas não o escuto mais...
Não, não, não, não....
34
Alexander
— Diga-me, delegado, por que não tivemos um preso hoje ou
melhor, dois presos hoje?! — estou berrando furioso na sala do delegado de
polícia — Uma mulher foi sequestrada e os culpados estão soltos? Que porra
de autoridade são vocês?!
— Senhor Marshall, contenha-se. O senhor Ross é um homem de
negócio, não poderia sequestrar sua própria nora como está sendo acusado,
ele me esclareceu que houve um mal-entendido. — diz o delegado.
Ele está brincando comigo.
— Diga-me, o senhor é mesmo da polícia? Está parecendo um capanga
da máfia.
— Posso prendê-lo por desacato, senhor Marshall. — ele levanta
vermelho de sua cadeira — Quero que se retire dessa delegacia, esse caso
está mais que encerrado.
— Muito bem, faça seu serviço. Prenda-me e isso vai parar na
corregedoria, senhor delegado — dou um passo para frente, estou com meu
nariz praticamente colocado no dele. — Agora sabemos por que esse caso foi
encerrado antes de ser resolvido: deram para alguém corrupto e sem
escrúpulo.
Esse filho da puta me enoja. Não fico lá questionando o imbecil, eu irei
entregar toda essa porra de delegacia aos federais.
Havia deixado Bruno e Alicia na clínica e ido direto para a delegacia
saber a razão de o delegado não ter prendido Deni Ross hoje. Estou
simplesmente abismado com tanto pouco caso com esse assassinato.
O pai do Bruno e seus amigos tinham mais poder sobre a polícia da
cidade do que eu imaginei, e não vi isso vindo para nós dessa maneira.
Eu preciso descobrir a razão por que eles não fizeram mal a Alicia, isso
me chocava. E eu sabia aonde teria de ir.
Paro meu carro cerca de uma hora depois na frente da mansão e desço.
Um empregado abre a porta para mim.
— Gostaria de falar com o senhor Ross. Diga que é Alexander
Marshall, que esteve hoje aqui — digo, e o senhor me faz entrar como se já
me esperasse. Provavelmente tinham me visto pelas câmeras que vi ao redor
da propriedade.
Sou levado para um escritório seguindo o empregado silencioso à
minha frente. O pai de Bruno está sentado atrás de uma mesa grande e
imponente.
— Senhor Marshall, que prazer vê-lo duas vezes no mesmo dia — ele
diz quando entro — Não sabia que eu era tão importante. — ele tem um ar
severo, mas noto seu tom sarcástico. Não me importo que esse velhote se
ache o intocável, posso acabar com esse ar de superioridade que ele tem.
— Gostaria de saber o que houve aqui hoje — digo direto, não vim
aqui tomar chá da tarde com ele — Sei que vocês estão envolvidos na morte
de Duran, e trazer Alicia aqui hoje não foi para conhecê-la, como alegaram.
Minha pergunta é: por que ela saiu daqui viva?
— Senhor Marshall, não tenho de dar explicações para o senhor — ele
retruca sem se abalar com minha óbvia acusação — Não tenho que falar de
assunto de família com você.
— Engano seu. Seu filho é meu amigo, mas não vou permitir que use
isso contra ele para se dar bem. Ele pode ter consideração pelo senhor, porém
eu não tenho. — sento à sua frente — E seu outro filho pode ir para a prisão
junto com toda a escória quando os federais entrarem no caso.
— Se acha esperto, senhor Marshall? — ele ri — Não tenho nada a
esconder. Sou apenas um homem de negócios e um pai que quer seu filho de
volta. Respondendo sua pergunta, sim, ela saiu viva daqui porque não sou um
assassino, logo, o senhor não tem nada a fazer aqui.
— Belo discurso, mas vou acabar com você e seus capangas da
próxima vez que se aproximar de Alicia. Ela é apenas vítima do idiota com
quem você fez negócios. — levanto e o encaro —Sei onde seu dinheiro está,
senhor Ross. — jogo a bomba e saio.
Eu não sabia bem onde estava o dinheiro. Para nós e a polícia que
estava investigando o caso, ele tinha perdido toda a quantia. Alex e eu somos
os mais interessados em descobrir a verdade. Só tínhamos que encontrar isso,
e esses caras poderiam deixar Alicia livre ou não, já que ela sabia quem era
um dos assassinos. Eu tinha enviado a imagem do cara ao delegado, mas,
com tudo que aconteceu hoje, ele revelou-se um inútil comprado e eu estou
tomando outras medidas.
Duas horas depois eu tento falar com Bruno, mas soube que ele estava
com Alicia e não podia falar. Porra, o cara não dava sossego para a mulher?
Coitada, tinha acabado de sair de um pseudo sequestro e ele estava matando
em cima dela. Balanço minha cabeça, rindo. Só Ross mesmo aproveitaria da
fragilidade de uma mulher para se dar bem.
Ligo para um antigo colega e envio toda a investigação paralela para
ele. Bom, agora era esperar, e os tubarões começarão a cair em breve.
Alicia
— Não... — meu sussurro é quase inaudível no quarto. Dr. Allan fala,
porém são palavras ininteligíveis — Não, não. — repito mais alto agora. Eu
não posso. Simplesmente não posso lidar com isso. Estou sufocando, é como
se um peso de mil toneladas estivesse em minhas costas agora. Tudo de novo
não! Rezo silenciosamente. Por favor, por favor, não...
Sinto meu corpo convulsionar. Não tinha percebido que estava
chorando até sentir braços fortes me apertando, mas tento sair do aperto firme
de Bruno, que tinha levantado da cadeira ao lado e agora estava sentado na
cama e me abraçando.
— Alicia, bebê. — ouço-o dizer, mas estou entrando em pânico. — Ei,
estou aqui, calma, querida.
— Calma?! Como pode dizer isso? — eu grito quando o empurro para
longe, as lágrimas como torrentes descendo pelo meu rosto — Você não
entende como isso é para mim... vai começar tudo outra vez, eu não quero
isso, não quero...
— Alicia, vamos cuidar de tudo agora de forma diferente. Você está
melhor, sabe disso. Não rejeite isso por medo, porque seu corpo é comandado
por sua mente. Se você se der por vencida, achando que vai perder, é isso que
pode acontecer. — O Dr. Allan está falando rigorosamente comigo — Vamos
tomar todo o cuidado, e a acompanharei de perto. Ficará tudo bem. — ele
garante. — Seria ideal que também tivesse um acompanhamento psicológico.
Eu apenas fico lá por um momento, absorvendo tudo. Uma hora antes,
eu achava que ia morrer e agora estou aqui em uma perspectiva igualmente
assustadora para mim. Talvez mais. Abortar agora seria como realmente me
matar.
Bruno se mantém firme e calado ao meu lado, não tinha se
manifestado, apenas estava lá, taciturno. Seco minhas lágrimas e olho para
ele, que sustenta meu olhar com firmeza. O Dr. Allan deve ter notado que
precisava sair e nos deixar a sós.
— Vou deixar vocês por um momento e volto daqui a pouco. — ele
parece saber que Bruno é o pai do bebê pelo olhar que ele dá para ele. — Não
saia antes que eu fale com você, Alicia.
— Ela não irá, doutor — Bruno garante — Pode ter certeza.
Ele sai deixando o silêncio para trás. Minha boca está seca de repente,
ansiedade toma conta de mim.
— Não me olhe assim, Alicia — ele deixa escapar em um murmúrio —
Eu não sei que atitude tomar. Não sei se fico feliz ou triste. Feliz porque,
porra, eu posso ser pai, isso é... — Oh, Deus! — Por outro lado, triste por
você passar por isso outra vez, sei o quanto isso a magoa. Sinto-me feliz e ao
mesmo tempo temeroso, bebê.
Eu fico calada, sem saber o que dizer. Não sei de que forma ele acha
que estou olhando para ele. Não acredito o quanto fui relapsa com sexo sem
proteção. Mas não penso coerentemente quando se trata desse homem.
— O que vamos fazer? — pergunto baixo — Eu não quero que se sinta
obrigado a nada, isso foi... — minha voz embarga, dolorida. Eu não posso
falar disso agora. E faço a única coisa que não deveria: mudo de assunto
quando temos uma tonelada de conversa sobre nosso bebê — O que
aconteceu hoje com seu pai?
— Sério que quer falar disso, Alicia? Essa questão fica apagada diante
do nosso pequeno participante, não acha? — ele coloca uma mecha de cabelo
atrás da minha orelha — Nosso bebê será bem-vindo, querida. Não se sinta
pressionada a nada, está bem?
Assinto como se isso não fosse grande coisa, mas não aguento fingir
por muito tempo e abraço-o e, sem dizer nada, ele só me segura. Não
precisamos de palavras, nós estamos com o mesmo pensamento, isso é óbvio
pela forma que não temos forças para verbalizar isso. Medo de perdermos. E
eu tenho outro medo maior: que Bruno me culpe se não conseguir.
O Dr. Allan volta pouco depois com muitas recomendações. Que eu
fique em casa sem fazer nada até segunda ordem, que fique deitada sem fazer
esforço de qualquer tipo. Bruno diz que farei tudo isso. Estou de repouso
absoluto até o terceiro mês. Se nada acontecer até lá, posso começar a fazer
pequenas coisas, Allan diz quando me leva para fazer exames de dosagem
hormonal e ultrassonografia. E avisa para que nem pense em sexo. Sim, quem
pensaria nisso? Estou levando para casa "toneladas" de remédios e vitaminas.
— Alicia, tente se manter calma e longe de confusão, esse é o principal
conselho que deve seguir à risca — recomenda. — Sr. Ross, certifique-se
disso.
Ele precisava pedir isso ao Bruno? Ele estava mais que disposto a ficar
me monitorando o tempo inteiro.
— Nem precisa pedir, doutor — ele me dá um sorriso, mas vejo a
tensão dele. Bruno não está confortável com um bebê a caminho, estou certa
disso.
Cerca de cinco horas depois chegamos em casa, e tenho vontade de
bater em Bruno. Ele não deixou meu pé tocar o maldito chão desde que me
pegou na casa do pai dele.
Jurei que morreria quando vi aquele homem aparecer na sala. Se o pai
do Bruno queria me assustar, conseguiu. Colocar um dos assassinos na minha
frente tinha sido a causa do meu colapso e desmaio. O homem que tinha visto
deixando o elevador naquela noite. E ele parecia com medo quando veio
junto com outro homem. Não entendo quando penso sobre isso. Por que ele
estaria com medo?
Olho ao redor do meu quarto. Estou com essa vontade de chorar
absurda quando coloco minha mão sobre meu ventre e fecho meus olhos e
rezo.
— Fique forte para mim, bebê... — sussurro — Eu quero muito te
conhecer, por favor não me deixe.
Não consigo segurar minhas lágrimas quando elas correm silenciosas.
Eu quero ser positiva, mas, às vezes, nós somos nossos piores inimigos.
Agarro o controle que Bruno deixou no criado-mudo e ligo um som,
preciso me distrair.
A voz triste de Josh Groban cantando You Raise Me Up, me faz
encolher na cama.
Eu queria que ele não tivesse saído, mas disse que precisava revolver
umas coisas e que ia ligar para Matt. Sim, eu preciso da força de Matt quando
estou sentindo esse medo horrível. Adormeço com a música ao fundo...

Quando estou triste e toda a minha alma tão cansada


Quando problemas vêm e sobrecarregam o coração
Então, eu me acalmo aguardando no silêncio
Até você vir e sentar-se um tempo comigo
Você me eleva até eu estar sobre montanhas
Você me eleva para andar sobre tempestuosos mares
Eu sou forte quando estou sobre seus ombros
Você me eleva mais do que posso conseguir
Bruno
Eu tenho sentimentos dúbios dentro de mim; um quer gritar aos quatro
cantos que vou ser pai, o outro quer correr em direção oposta a tudo isso.
Estou apavorado desde que o médico disse que Alicia estava grávida. Isso
não era bom, não nessas circunstâncias, mas há um terceiro sentimento
sobrepujando esses dois primeiros. Estou pronto para dar outra surra em Deni
e vou fazer exatamente isso. Colocar uma mulher grávida em perigo? Filho
da mãe!
Deixo Alicia adormecida no quarto e chamo seu irmão, sei que ela
gostaria do apoio dele agora. Ela tem estado calada demais. Eu fiquei com
receio que ela surtasse, mas depois do primeiro rompante ela ficou quieta.
Não sei se isso também é bom sinal.
Porra, estou rindo feito um idiota, agora que estou sozinho na sala
esperando o Matt. Ficar rindo na frente dela pode dar uma maldita ideia que
estou louco de felicidade com essa gravidez. E isso pode causar mais
ansiedade para ela. Achando que se ela abortar vou cobrar dela igual ao
defunto idiota.
Meu sorriso murcha quando escuto a campainha. Ando até a porta e
abro para Matt entrar.
— Cadê minha irmã? — ele entra praticamente me derrubando no
processo — O que fizeram com ela? Ela foi sequestrada?
Eu não acredito que foi um sequestro, meu pai quer fazer algum ponto
comigo, senti isso hoje quando olhei para ele. A atitude dele foi como se
dissesse: está vendo, filho, que eu posso ser bom para você e poupar sua
mulher?
— Nada. Ela está dormindo, eu quero falar com você primeiro —
aponto para a sala e ele senta no sofá — Ela está bem fisicamente, mas eu já
não sei emocionalmente...
Deixo a frase no ar. Matt está carrancudo quando me encara.
— O que ela tem? O que fez com ela?
— Ela está grávida. — isto que fiz com ela. Sou o causador de seu
maior pesadelo.
— O quê? — ele parece realmente chocado — Minha irmã não pode
passar pelo inferno que passou com Evan, não pode. É você o pai do bebê?
— Ele levanta e começa a andar pela sala — Ela disse que nunca
engravidaria de novo. Ela deve estar surtando agora, e você diz que ela está
dormindo? Muito estranho. A última vez que ela perdeu um bebê, ela se
transformou em um bloco de gelo por meses.
— Sim, eu sei que não é a hora certa para isso, mas quero que você
esteja aqui para ela. — digo — Ela pode levar essa até o fim, só precisa de
cuidado e pessoas ao seu redor apoiando — onde foi parar meu eu
verdadeiro? O que esse homem que estava falando todo centrado fez com
"Bruno Ross fodedor de miolos?"
Estou chocado comigo mesmo. Mas Alicia, com sua dor, me
conquistou como um maldito raio. Devo ser daqueles caras que gosta de
coisas para consertar. Alicia era furada desde o começo, mas quem disse que
eu vi essa porra vindo? Estou tomado por ela até a medula.
Matt volta a sentar, assentido.
— Eu sempre apoie minha irmã, não importa o quê — ele diz eu que
preciso sair digo:
— Estou precisando sair, gostaria que estivesse aqui quando ela acordar
— não sei o quanto ele sabe sobre Deni ou se não sabe nada. Não tenho
vontade de começar essa conversa agora.
Levanto e sigo para o quarto para verificar Alicia antes de sair. Ela
ainda dorme quando beijo seus lábios macios e, pouco depois, deixo seu
apartamento e vou até o meu. Precisava fazer uma mala e acampar na casa
dela. Estou levando minha mudança temporária para o carro quando Alex
liga.
— Ross, como está Alicia?
— Grávida.
— O quê?
— Isso que escutou. — estou rindo de novo, que merda, é involuntário.
Estou feliz, porra!
— Ross, você não faz nada pela metade. Tem ideia do que será ter um
filho?
— Marshall, quem escuta você falar pode achar que você é pai de uma
legião de crianças — rio apesar de tudo — Ah, esqueci que sua noiva é uma
pirralha.
— Foda-se.
— Não, você é um papa-anjo!
— Ross...
— Desculpe, não é um anjo, está mais para diaba.
— Tenho de avisar para você que os federais irão assumir o caso — ele
me ignora e muda de assunto, fazendo meu sorriso desaparecer lembrando do
que tenho de fazer.
— Por que eles estão assumindo agora?
— Aquele delegado filho da puta não vai fazer nada sobre isso. Liguei
para o Caleb e ele disse que vai assumir. Devíamos ter feito isso há muito
tempo, quando descobrimos quem eram os responsáveis — sim, mas eu não
tive a maldita coragem de denunciar meu pai, essa era a verdade, mesmo
sabendo que deveria.
— Preciso que você foque em achar os documentos que provem que
Evan perdeu o montante que ele desviou.
— Claro, farei isso, mas primeiro quero ficar com Alicia alguns dias.
— Entro no carro e conecto meu telefone no viva-voz — Me dê dois dias e
vou procurar isso.
— Claro, certamente que seu pai, nem irmão, não farão nenhuma
jogada para matar a mãe de seu filho.
— Eu os mato primeiro.
— Veja isso.
Ele desliga, e meu pensamento corre para Alicia. Ela é minha
prioridade, mas tenho algo a acertar com meu irmão primeiro.
Desço na frente de seu apartamento e sou parado pelo segurança.
— O senhor Deni não está, senhor — ele avisa e olho-o firme para
saber se mente — Ele não voltou hoje.
— Obrigado.
Dou meia-volta. Ele deve estar na casa do meu pai, o idiota.
Como já é noite, volto para o apartamento de Alicia. Tudo está
silencioso quando entro.
Vou direto para o quarto, e meu sangue gela quando verifico que ela
não está lá. Verifico todo o apartamento e nada, nem ela e nem Matt.
O que diabos ela aprontou?
35
Bruno
Eu perco o controle quando percebo o que Alicia fez. A sua mala não
estava aqui, e como obviamente Matt tinha sumido junto com ela, ele a levou
embora daqui sem a porra da minha permissão.
Esmurro a parede em frustração com a falta de fé de Alicia. Não
custava nada dar uma chance para nosso filho antes de pensar que irá perdê-
lo. Será que ela se acha tão incapaz assim? Eu achava que ela seria mais forte
que isso, no entanto, ela está me decepcionando.
Saco meu telefone e disco para o celular dela. Como já imaginava, ele
está desligado. Esse protecionismo para com uma mulher era algo que não
estava acostumado a sentir, porém isso está se acumulando em meu peito,
fazendo meu coração disparar. Eu não imaginei que um dia fosse estar me
sentindo dessa maneira. Eu a queria tanto, e não é porque ela é linda e
gostosa pra caralho ou porque agora ela carrega meu filho, não. Eu a quero
porque, por mais que seja cabeça dura e obstinada, ela toca dentro de mim de
uma maneira que nunca aconteceu antes. Ela me cativa com seu jeito
reservado e que não dá uma merda para mim, porém no fundo ela me quer,
ou não teria ido para cama comigo.
Posso parecer como os outros homens que querem aquilo que não
podem ter. Bem, estou na mesma vibe. Mas, neste momento, sinto vontade de
quando a encontrar trazê-la para casa e mantê-la trancada e protegida até que
nosso bebê nasça. Mas, ao mesmo tempo, tenho vontade de acertar seu
traseiro com umas boas palmadas.
— Ah, Alicia, você está salva porque agora possui algo precioso dentro
de você, ou daria umas palmadas nesse seu traseiro surtado — resmungo
enquanto mudo para um par de jeans e uma jaqueta de couro preta, seguindo
em seguida para a saída.
Pego as chaves da moto que faz meses que não piloto e saio. Preciso
vê-la. Sei bem aonde ela foi. Matt merece uns socos bem dados em sua cara
por compactuar com a neurose da irmã. Saio queimando asfalto pelas ruas.
Calor envolve minhas estranhas de tanta raiva e frustração. Pareço estar
lutando uma luta perdida.
Cerca de quinze minutos depois, estou em frente ao prédio dele, e o
porteiro me deixa entrar sem problema. Toco a campainha insistentemente.
— Sabia que você não demoraria para vir aqui — diz Matt abrindo a
porta. Invado sem nem mesmo ser convidado a entrar. — Sinta-se à vontade
— ele diz irônico, porém tem um toque de humor por trás. Ele deve achar
estranho o segurança de sua irmã praticamente invadir sua casa.
— Onde está Alicia? — Pergunto furioso — Deixei-a com você por
dois malditos minutos e você não controlou suas loucuras?
— Ross, minha irmã é adulta. Não preciso comandar sua vida e decidir
tudo por ela. Se ela quer passar um tempo aqui comigo, é exatamente isso o
que ela vai fazer — ele aponta para que me sente, mas continuo de pé — Ela
precisa de um tempo e eu a entendo.
— Onde ela está? — pergunto, não dando ouvidos para ele — Ou eu
mesmo preciso sair e procurá-la?
Ele fecha os olhos impotente, sabendo muito bem que não vou acatar
essas merdas de Alicia.
— Terceira porta — ele aponta para o primeiro andar, e subo uma
pequena escada para o andar de cima. Como um construtor de prédios, pensei
que ele moraria em algo maior, mas até que é modesto o seu apartamento.
Não ligo para nada ao redor, encontro a porta que ele me indicou e a abro
sem bater.
Alicia está sentada com as costas na cabeceira da cama, olhando para a
porta como se já me esperasse. Ela está mordendo os lábios nervosamente e
seus olhos esverdeados estão um pouco apreensivos. Merda de mulher
teimosa.
— Oi. — ela diz quando fecho a porta atrás de mim.
— Qual é a sua desculpa, Alicia? — paro sério ao lado da cama. Minha
vontade é sentar, pegá-la no colo e correr com ela daqui, mas me contenho
enfiando as mãos no bolso enquanto espero uma resposta que seja plausível
para sua loucura insana, porém ela não parece disposta a dar. — Virei as
costas dois segundos e você desaparece?
— Desculpe. Só quero um pouco de espaço, Bruno — ela desvia os
olhos de mim — Eu preciso digerir tudo isso. É aterrador ficar grávida neste
momento da minha vida. Além do fato que posso abortar a qualquer minuto,
posso também morrer por um membro de sua família. É demais para que eu
fique perto, entenda, por favor.
— Eu não vou deixar nada acontecer com você, deve saber disso —
digo frustrado. Droga, parece que estamos tendo essa conversa diversas vezes
e ela não confia em mim quando afirmo isso.
— Você escondeu de mim que sua família matou o Evan. Como quer
que eu fique perto? — ela leva à mão a barriga, e isso causa um aperto em
meu peito — Não vou ficar lá, onde seu irmão ou pai mandará um assassino
atrás de mim.
— Podemos conversar e deixar tudo isso para trás. Meu pai não vai
fazer nada mais com você, Alicia, eu irei me certificar disso. — digo com
convicção. Sei bem que ele não fará, pois se assim fosse, ela agora estaria
morta. Ele teve sua chance hoje e deixou-a viva, e fico imaginando a razão.
Ele quer algo de mim, sei disso. Só não sei ao certo o que ele quer.
— Você não confiou em mim, sabendo que sou a mais interessada em
toda essa história, mas achou melhor omitir — reclama. Ela tem razão, não
disse porque sabia que ela fugiria de mim.
— Não vou permitir que eles cheguem perto de você outra vez, Alicia.
Aqui você também não está cem por cento segura — digo cansado. — Venha
comigo, confie em mim, bebê.
—Não posso ir, eu não aguentaria ver sua decepção caso eu tenha outro
aborto — ela cobre seu rosto com as mãos trêmulas, e minha raiva ameniza
quando sento ao lado dela na cama. Estico meu braço, seguro seu pescoço e a
atraio para mim. Ela vem sem muita resistência. Sua rejeição me mata e
machuca como nunca pensei ser possível. — Eu sempre disse, Bruno, que
não estava preparada para outro romance sério, que eu ia magoar você. Por
favor, vá embora. Eu preciso que me dê um tempo para assimilar tudo.
— Assimilar o quê? Podemos fazer isso junto, como prometi para você
— seguro seu rosto em minhas mãos e faço-a olhar para mim. — Eu amo
você, não importa se você perder nosso filho, eu irei continuar amando você.
Eu estaria mentindo para você que não me importo com ele. Eu estou muito
feliz, é uma coisa nova e surpreendente para mim, mas eu abraço isso, Alicia,
como nunca fiz com nada em minha vida.
— Bruno...
— Não, me dê uma chance, só uma, para provar que não vou te deixar
na primeira dificuldade, bebê — beijo seus lábios trêmulos e puxo-a para
mim, enterrando meu rosto em seu cabelo.
— Eu queria que tudo fosse diferente, que eu fosse forte para não ter
medo de nada, mas descobri durante o dia de hoje que se eu perder nosso
bebê, serei apenas uma casca sem sentimentos, Bruno. E você não merece
uma pessoa assim ao seu lado. Merece mais porque, nesse tempo que estive
com você, eu me senti muito especial. Mesmo quando não queria me
envolver, você me fez te querer, mesmo não querendo. O quero demais e não
posso negar a você sua própria família. Não posso ser egoísta e não permitir
que você tenha seus próprios filhos. — ela agora é quem segura meu rosto em
suas mãos, com lágrimas descendo por seu rosto lindo.
— Então não negue, venha comigo — meus malditos olhos estão
ardendo e pinicando com lágrimas. Pela primeira vez na vida, nem quando
saí de casa aos dezoitos anos, expulso pelo meu pai, eu derramei uma
lágrima, e Alicia estava fazendo meu coração sangrar. Ela balança a cabeça
em negação.
Eu sei que ela acredita naquilo tudo, a dor está estampada em seu rosto
e ela não vai ceder. Sinto isso em cada célula do meu corpo. Não posso exigir
nada agora, estresse só fará mal para ela e nosso filho.
— Dê-me um tempo, por favor, é tudo que peço. — se dizer nada por
causa do nó em minha garganta, eu a beijo dando todo o amor que possuo
dentro de mim através da minha boca. Nossas línguas se tocam e calor
envolve meu corpo.
Sinto saudade de estar dentro dela, sentido seu calor ao redor do meu
pau que pulsa agora saudoso. Acaricio sua língua com a minha em um beijo
longo, profundo e forte, levando comigo cada nuance de sabor que possa tirar
dela.
Ah, merda, estarei condenado a passar meses sem ter um sabor da
minha viuvinha.
Afasto-me dela com um gemido rouco e abaixo minha cabeça para
beijar sua barriga plana. Demoro com minha boca lá um tempo que parece
horas. Quando levanto, ouço seu soluço e olho para seus olhos cheios de
lágrimas renovadas. Se ela quer que eu fique longe, é isso que irei fazer.
— Você é minha, toda minha, Alicia, e ninguém tocará em você. Não
irei permitir isso nem estando morto — vocifero. Meus dedos correm por
seus cabelos macios — Fique bem, querida. — fecho meus punhos para deter
a vontade de voltar a tocá-la e me afasto, erguendo-me da cama. — Se
precisar de mim, só terá de que ligar, vou estar aqui para você. Cuide do
nosso filho, apenas faça isso.
Caminho para fora sem olhar para trás, apenas escutando seu choro. Se
ela quer distância por que está chorando? Não entendo a Alicia, juro que não
entendo. Ela é tão contraditória.
Matt está na sala quando desço as escadas, e levanta seus olhos do
computador em que ele está mexendo.
— Tudo bem? — pergunta colocando o laptop de lado. Paro e suspiro,
enraivecido.
— Tenha a certeza de que sua irmã irá cumprir toda e qualquer
orientação do médico — digo — Ela não pode ficar sozinha, e se eu souber
que você permitiu que ela saiu para ir trabalhar, arranco sua maldita cabeça
fora.
— Terminou, Ross? Você gosta de insultar um homem em sua própria
casa — ele parece divertido — Eu sou o único que vai cuidar dela. Só
mantenha alguém da segurança por perto, não confio nos membros da sua
família, senhor Ross — ele não parece mais divertido. Alexander tinha dito
para ele todo o envolvimento de Deni e meu pai com o caso Evan Duran.
Ignoro sua óbvia reprimenda. Ele acha que sou a favor da minha
família psicopata?
— Você ainda tem as chaves do antigo apartamento de Alicia? Eu
preciso ir lá verificar algumas coisas. — digo.
— Foram retirados quase todos os móveis de lá, e seu irmão
provavelmente já mandou retirar o que restou. O que vocês querem ver lá? —
pergunta curioso.
— Só quero dar uma olhada. Não fui junto com os homens quando eles
foram lá, mas agora eu preciso ir — digo evasivo. — Você já entregou todas
as chaves a Deni?
— Ainda mantenho uma cópia aqui — ele sai em busca das chaves, e
meus olhos se voltam para as escadas. Merda! Odeio deixá-la aqui!
— Pronto, aqui estão. — Matt volta com um molho de chaves e as pego
me despedindo dele. Preciso ir ou jogarei certa viuvinha nos ombros e a
levarei à força daqui. Enquanto desço, ligo para a empresa solicitando um
segurança para ficar aqui.
Pego minha moto no estacionamento, verifico as horas, vendo que
ainda é cedo. Provavelmente os caras ainda estão em algum bar, eu preciso é
tomar alguma bebida forte também.
Paro em frente ao bar que fica na mesma rua da empresa e, pouco
depois, vejo a mesa de sempre com os caras ao redor.
— Olha se não é Ross em carne e osso — um dos caras me vê e
praticamente o bar todo escuta seu grito. — Pensávamos que você tinha se
aposentado das noitadas. Bem, foi o que me disseram.
— Ross, chega aqui — Sal está no canto junto com Carl — Parece
chateado. Ainda de mau humor por causa de hoje cedo? Seu velho é uma
raposa, isso eu devo confessar.
— Não vim aqui falar disso, Benacci — resmungo. Faço sinal para uma
garçonete para uma bebida e sento ao lado de Carl — Você falou com o
Connor? — pergunto para Carl, apesar de dizer que não queria falar desse
assunto, mas estou querendo saber a razão de Connor não ter feito seu
trabalho hoje.
— Ele está mal, cara. Seu irmão pegou pesado com ele. — Carl fala
tranquilamente — Ele tinha umas fotos da filha dele, então ele estava de
mãos atadas.
— Não gosto disso, poderia ter significado a morte certa de Alicia.
— Mas não foi, Ross.
Minha bebida chega e tomo um gole que desce queimando. Ótimo, isso
era melhor que sentir essa outra queimação no coração por deixar Alicia para
trás.
Alicia
Vejo Bruno sair com meu coração apertado, mas sei que é a coisa certa
a fazer. Não quero ver a decepção naqueles olhos azuis se eu falhar mais uma
vez. Ajeito-me nos travesseiros e tento dormir, no entanto o sono não vem.
Pouco depois ouço uma batida na porta e Matt coloca a cabeça para dentro do
quarto.
— Toc, toc — ele diz com um sorriso quando deita ao meu lado na
cama — Você está bem? Você está tão diferente, irmãzinha. Raramente a vi
chorar durante sua vida toda e, desde que a vi hoje, as marcas de lágrimas
estão no seu rosto.
— Deve ser os hormônios — digo com um bufo de risada chorosa —
Não é culpa minha.
— Claro que não, quem sou eu para dizer o contrário? — ele segura
minha mão junto a dele, entrelaçando os nossos dedos — O que está
acontecendo entre você e Ross? O que há de errado?
Eu balanço minha cabeça e não digo nada. Tudo está errado, achei que
eu era forte, mas sou fraca e patética.
— Nada. — digo por fim — Só as vezes que tudo fica confuso, aí o
medo parece sempre levar a melhor sobre minha vida.
— Lembra quando nossos pais morreram? E você foi uma garota
durona que aguentou os trancos de vivermos sozinhos?
— Claro que sim, Matt — sussurro — Eu tinha você lá para mim.
Sempre priorizou minha vida em vez da sua. Devia casar, sabia? Eu já sou
grandinha, você sabe.
— Então, não conheço bem esse seu segurança, mas ele parece gostar
de você, querida. — ele vira para olhar-me de frente — Se vocês vão ter um
filho, não devia estar fugindo dele assim.
— Você, mais que qualquer um, devia entender meu receio ...
— Alicia, eu entendo você, querida, mas você está vivendo do passado.
Nem todo homem vai te tratar como Evan, te culpando por algo que estava
além de você. Pare de procurar sabotar as coisas para você, se dê uma chance
de ter a família que você queria.
— Talvez eu não tenha nascido para ter essa família.
— Pare de dizer bobagem! Esse seu pessimismo é doentio, irmãzinha,
pode te fazer mal — ele bate levemente no meu nariz — Bruno Ross me
ameaçou de morte truculenta se você sonhar em se mexer dessa cama. Então,
como tenho medo de morrer jovem e por morte violenta, melhor ficar
quietinha e ter essa garotinha daqui A uns meses.
— Garoto.
— Nah, uma garotinha está perfeito, farei todo os desejos da princesa
do titio Matt. — ele ri, me fazendo esquecer minhas fraquezas por um
instante.
36
Bruno
Três dias. É isso que darei para Alicia "digerir" o que for que a esteja
impedindo de aceitar nossa nova condição. Sair e deixá-la nunca foi tão
difícil, mas preciso resolver de uma vez por todas minhas indiferenças com
meu pai e Deni também, para ser sincero. Meu irmão e sua competitividade
em me superar desde pequeno é um fardo constante na minha vida. Tinha
sido antes de sair de casa e tem sido nesses últimos meses. Eu achei que
saindo de casa e deixando-o reinar sozinho fosse suficiente. Não foi, pelo
visto. Quando ele iria entender que não me interessava por nada sobre os
negócios do nosso pai? Que fiz meu próprio caminho naquilo que eu gostava
de fazer? Sua ambição era maior do que eu sempre imaginei.
Paro a moto na vaga da garagem de Alicia, no antigo prédio onde ela
morava. A essa hora da manhã não tem ninguém circulando por aqui. O
guarda da entrada não me impediu de entrar quando me apresentei. Sigo para
o elevador e pouco depois estou entrando no apartamento praticamente vazio
agora, a não ser pelas faixas da polícia na sala de estar.
Ando calmamente observando tudo à minha volta, cada detalhe desse
lugar tinha de ser explorado. Mas sigo para o quarto principal onde ainda tem
alguns móveis deixados para trás. Isso precisava de uma boa equipe de
limpeza. Estranho esse lugar estar à venda nesse estado, talvez Matt não
estivesse planejando vender, contudo meu irmão deve ter insistido nisso, e só
esse fato era capaz de me deixar mais curioso sobre o lugar.
Penso que ele quer fazer, ou já fez, uma varredura aqui atrás da mesma
coisa que eu estou: pista sobre o paradeiro do dinheiro. Apenas não entendo o
porquê meu pai não esqueceu isso, afinal todos eles têm dinheiro para umas
três vidas.
Precisava dar um fim nisso, nesse caso. Alicia merecia ter uma
gravidez tranquila e sem sobressaltos que pudessem pôr em risco essa nova
vida dentro dela. Meu filho ou filha, não importa. Tanto quanto eu nunca
liguei para esses aspectos da vida, estou louco de felicidade. Mesmo tentando
sufocar esse sentimento para não dar mais motivo de temor para Alicia. Ando
batendo nas paredes; nada de parece oca, ou falsa.
Depois de meia hora, não encontro nada que me leve mais perto de
solucionar essa merda fodida de Evan Duran. Entro no banheiro da suíte e
faço o mesmo procedimento que fiz no quarto, toda e qualquer reentrância
que existe, eu verifico na esperança de encontrar provas e levar para meu pai.
Eu não iria para a polícia outra vez. Não, estava fora de cogitação. Os agentes
federais iriam invadir esse local em breve e eu tinha de encontrar algo antes
de eles começarem a própria investigação do caso.
Minha busca aqui também é infrutífera e volto para o escritório. Esse
local era o mais óbvio de guardar algo, se Duran guardou algo aqui era muito
burro mesmo. Mais tarde vejo que aqui também não tem nada. A sala de estar
que passei antes parecia tão vazia que não posso imaginar um local para
esconder documentos. Porra! Isso é frustrante.
Depois de quase duas horas investigando cada canto, eu sento no
colchão desforrado da cama que ainda está aqui e olho ao redor, quando vejo
o abajur na mesinha ao lado da cama. Na mesa não há nada que não seja esse
abajur e um despertador desses pretos comuns com luminosos verdes. Ele
está apagado, e pegando-o, verifico que deve estar com as pilhas gastas por
esses meses todos aqui abandonado. Retiro a parte de trás onde ficam as
pilhas, no caso são duas pilhas das grandes. Retiro-as, essas devem ir para
lixos diferentes.
Estou prestes a devolver o relógio na mesinha quando vejo um adesivo
preto colado na cavidade onde as pilhas se alojam. Arrancando com a unha,
levanto o adesivo e vejo que atrás tem um mini cartão de memória parecido
com chips de celulares. Será que Duran armazenou as informações aqui?
Como não tenho aqui comigo um computador para verificar o conteúdo
do cartão, volto direto para a empresa. Passo pela recepção e, pela primeira
vez, não paro para brincar com Lilian que está sentada atrás do balcão, como
sempre. Vou direto para minha sala. Não perco tempo antes de inserir o
cartão e, para minha decepção, tem que inserir uma senha de acesso aos
dados.
Rosnando de raiva, pego o telefone e ligo para um dos técnicos para
que ele possa tentar uma forma de passar por esse bloqueio. Cinco minutos
depois ouço uma batida na porta e um dos caras aparece.
— Qual o problema, Ross? — Leo Martins, uns dos caras que faz
trabalhos de hackers para a empresa, para em frente à minha mesa.
— Tenho um documento protegido, preciso que veja se consegue
quebrar o código — digo e levanto para que ele sente em minha cadeira e fico
ao seu lado.
— E tem algo que eu ainda não consegui quebrar? — ele se gaba —
Isso aqui é mais fácil que tirar doce de criança, Ross.
Vejo-o trabalhar cerca de três minutos, em que ele desbloqueia com
uma facilidade impressionante.
— Feito!
Olho para tela onde várias pastas aparecem. Leo vai clicando, e essas
não contêm nenhuma senha. Vejo que se trata de transações financeiras e,
sim, isso pode ser o que procuro.
— Esse cara não era lá muito inteligente com segurança, muito fácil. —
ele levanta e volto a sentar.
— Obrigado, Léo, se caso precisar volto a chamar — digo e começo a
ver pastas e mais pastas.
Tem aqui pastas de até três anos atrás. Começo pelas mais recentes.
Puta que pariu! O cara lidava com muita grana. Não demorei em encontrar o
que eu queria, uma em particular tinha o nome Ross e a que imagino ser de
associados.
Como nós já imaginávamos, os milhões que Duran teve acesso não
existiam mais. Pelo que pude perceber, nesses relatórios, o dinheiro foi
investido e perdido em aplicações na bolsa. Compras de ações que se
desvalorizaram e fez o imbecil do Duran fracassar. Eu não precisava ver mais
nada para entender que isso poderia tirar Alicia da mira deles. Eu só tinha de
convencer meu pai e ele manter os outros homens longe de Alicia.
Faço uma cópia, retiro o cartão e levanto, saindo da minha sala.
Precisava agir o quanto antes.
Tenho outro assunto pendente, e pegando meu telefone ligo para o
médico de Alicia.
— Alô — Diz o Dr. Allan quando atende.
— Dr. Allan, Bruno Ross.
— Senhor Ross, em que posso ajudá-lo? Alicia está bem? — ele parece
preocupado — Ela está seguindo minhas orientações?
Isso eu não sabia, afinal estava longe desde ontem.
— Até onde sei, sim, doutor — digo e aceno para Lilian que está de
cenho franzido para mim quando passo pela recepção — Doutor, quero pedir
um favor. Ontem o senhor disse que Alicia precisa de apoio psicológico.
Quero que envie alguém de sua confiança para ela.
— Senhor Ross, isso é bastante inusitado, mas como sei que ela não vai
dar esse passo, ligarei para ela indicando um amigo psicólogo. — ele diz —
De qualquer maneira, ele provavelmente se negará a ir até ela. Isso só terá
resultado se partir dela, a vontade de procurar ajuda.
— Quero que envie ainda hoje uma pessoa para falar com ela — teimo.
Eu não tenho que esperar a boa vontade de Alicia para procurar ajuda.
Mulher teimosa. — Não precisa ser algo formal, doutor, mas apenas uma
visita cordial, e que isso a leve à iniciativa de conversar com um profissional.
Ele diz que irá falar com o amigo. Fico mais aliviado. Pode não ser a
coisa certa, mas não deixarei Alicia se perder em si mesma.
— Nem tudo pode ser resolvido da noite para o dia, senhor Ross, isso
pode ter o efeito oposto do que o senhor quer. Dê tempo, ela se ajustará em
breve.
Mesmo assim dou o endereço de Matt para o médico e exijo que ele
envie alguém e ele diz que vai tentar. Droga! Eu não posso lidar com essa
Alicia irracional sem que perca minha cabeça e diga umas verdades para ela,
que pode fazer mais mal que bem nessas circunstâncias. Eu a amo, mas tem
hora que tenho vontade de bater no seu traseiro até que ponha um pouco de
juízo no lugar.
Estou tentando o meu melhor, porra! E não tenho nada de Alicia. Ela
nunca disse de volta que me ama, isso pode deixar um cara inseguro. Se eu
fosse um cara mais inseguro, estaria pirando achando que ela nunca ia me
aceitar na vida dela, como eu queria estar.
Sigo para a casa do meu pai onde terei uma conversa definitiva.
Alicia
Essa noite passada na casa de Matt foi praticamente em claro. Não
consegui conciliar o sono, suas palavras ficaram martelando dentro de mim
desde que conversamos ontem. E quando consegui dormir um pouco foi para
ter os mesmos pesadelos que me atormentam desde que comecei a ter
abortos. Sempre a mesma coisa, eram vários bebês de olhos vidrados mortos
em pilhas, um monte de sangue ao redor e gritos de agonia de uma mulher,
prantos inconsoláveis que nunca paravam. Depois mudava e eu me via
ensanguentada e com um bebê morto em meus braços, meu choro era
dolorido e sufocante.
Acordei suando e tremendo, acendendo a luz da cabeceira temendo
encontrar os lençóis manchados de sangue, mas alívio me invade quando
percebo que era apenas um pesadelo. Lágrimas descem pelo meu rosto.
Enrosco-me nos lençóis, e a voz de Matt ecoa na minha cabeça:
— Se permita ser feliz, Ali, não deixe seu medo atrapalhar algo que
pode ser bom — Matt diz antes de caminhar para fora do meu quarto, ontem
— Pare de tentar sabotar o que pode ser uma nova chance. Se permita isso
sem culpa, ou seja lá o que esteja te aborrecendo e fazendo correr em
direção oposta das pessoas que te querem bem. Esqueça o passado, Ali.
— Eu não estou correndo — teimo, franzindo o cenho para ele.
— Está sim, querida. Quando parar de se punir por ter perdido seus
bebês, você se sentirá melhor — diz e segura a maçaneta da porta. — Boa
noite. E pare de pensar, dá para escutar seu cérebro trabalhando dentro
dessa cabecinha.
De fato, estava tão apavorada que estava sendo negativa em tudo. Eu
não tinha deixado a maravilhosa notícia da gravidez me dominar por
completo, como se não aceitar isso fosse doer menos se tudo acabasse de um
momento para o outro. Passo a noite rolando sem achar lugar na cama
espaçosa. Sinto a falta de Bruno aqui ao meu lado, e culpo a mim mesma por
estar sozinha agora. Eu só o faço sofrer com meu medo. Medo de me
machucar, de machucá-lo ainda mais lá na frente. Medo de não ser capaz,
outra vez.
Levanto logo cedo e vou para a cozinha para encontrar Laura, a senhora
que toma conta da casa para Matt. Ela deve estar por volta dos quarenta e
cinco anos e está aqui com ele há uns três anos.
— Ah, Alicia, querida! — ela vem e me envolve em um abraço
apertado — Parabéns pela gravidez, querida.
Como ela sabe disso? Deve ter sido o linguarudo do Matt.
— Obrigada, Laura. — digo e sento à mesa — Onde está o linguarudo?
Ela ri.
— O senhor Matt saiu logo cedo, mas deixou recomendado que
permanecesse em repouso — ela me aponta — Eu vou garantir que você não
levante um minuto sequer. Falando nisso, o que quer para o desjejum?
Eu digo qualquer coisa, ela repreende e começa a tagarelar, dizendo
que nunca mais tinha me visto, e acabo me distraindo enquanto como meu
café da manhã.
— E o pai desse bebê, quando irei conhecê-lo? — continua Laura, com
sua conversa cheia de expectativas. Pelo que sei de Bruno Ross, ela não vai
demorar para conhecê-lo.
Não acreditei naquela conversa dele de me dar tempo, talvez um ou
dois dias no máximo. Me pego sorrindo porque sei que, no fundo, é o que
quero, que ele não desista de mim. Não faz o estilo dele deixar nada para lá.
Teimoso.
— Em breve — digo tomando meu suco natural.
Passo a manhã inquieta, sem nada para fazer a não ser passar a maior
parte do tempo falando com Marcos na empresa. Eu tenho de dar um
aumento de salário para ele, o coitado tem se desdobrado para assumir meu
lugar.
Eu não me sinto grávida, não sinto nada dos sintomas de gravidez, deve
ser porque estou de poucas semanas. Mas, ao mesmo tempo, tenho medo de
fazer movimentos bruscos como se isso fosse desencadear algo ruim.
No meio da manhã recebo um telefonema do Dr. Allan para saber como
eu estou. E ele diz, reforçando o dito antes, que nesses primeiros dias e meses
eu faça praticamente nenhum esforço e que fique em casa de repouso. Ele diz
que enviará alguém para falar comigo na casa de Matt.
— Como seu médico, eu quero a garantia de que, além do cuidado com
seu corpo, sua mente esteja em harmonia. Irei falar com um amigo, e ele
passará hoje para uma visita.
Não posso argumentar com ele, mas também sei que ainda não estou
pronta, porém aceito conhecer o amigo psicólogo de Allan.
Almoço uma salada de frango deliciosa da Laura e depois durmo no
sofá na sala de estar, acordando sobressaltada com a campainha. Sei que tem
um segurança na porta, pouco depois escuto a voz de Laura.
— Sim, levarei o senhor até ela. — ela surge acompanhada por um
jovem homem negro, com cerca de vinte e poucos anos. Sua expressão é
jovial e simpática quando eles se aproximam de mim. Levanto e Laura me
apresenta.
— Alicia, esse é o senhor Antony. Ele foi enviado pelo doutor Allan.
— O quê?
— Prazer em conhecê-la, senhora Duran. Meu nome é Ray, e Allan me
disse para vir fazer uma visita e conhecê-la — ele estende a mão e eu pego
em um aperto.
— Sente-se — Aponto para a poltrona e, depois de acomodados, peço
para Laura nos servir algo e ela nos deixa só para providenciar.
— Você é o psicólogo?
— Sim, sou psicólogo, e como disse, vim apenas conhecê-la — ele
sorri, mas eu não o acompanho. Allan realmente acha que preciso de
atendimento psicológico. Talvez eu precise mesmo, Evan quase acabou com
minha mente.
— Senhor Antony...
— Me chame de Ray.
— Bom, eu agradeço sua visita, senhor Antony, mas ainda não estou
preparada para isso — digo meio constrangida. Que droga.
— Claro, vim apenas conhecê-la. Allan disse ontem que você precisava
ter esse acompanhamento, fique à vontade para fazer isso no seu tempo. —
ele diz.
Laura volta com nossa bebida. Ela serve um chá fraquinho para mim
dizendo que não fará mal nenhum, que ela bebeu esse chá em suas duas
gravidezes. Agradeço e ela volta a nos deixar sozinhos.
— Normalmente, não faço esse tipo de abordagem, mas Allan quer seu
repouso absoluto nesse estágio inicial de sua gravidez, portanto, quando
quiser conversar, fique à vontade para ligar que virei aqui.
Eu gosto dele, não parece impor nada e me deixa à vontade para falar,
mas estou com a língua travada e colada ao céu da boca e nada sai. Antes de
sair, ele deixa seu contato para quando eu tiver a necessidade de colocar para
fora minhas angústias. Poderia entrar em contado e marcar uma consulta.
Fico grata.
Volto a deitar no sofá de Matt e deixo minha mente ir para Bruno,
perguntando-me onde ele está. Olho para o telefone e tenho a súbita vontade
de ligar, saber se ele está com raiva de mim por pedir que se afastasse de nós.
Ligo o som e procuro um dos meus cantores preferidos na playlist de
Matt. One, do Ed Sheeran, explode na sala. Encolho-me em mim mesma e
deixo as palavras invadirem meu coração e mente.

E eu sei que você vai ficar longe por um tempo


Mas eu não tenho planos de ir embora
...
Pegue a minha mão, meu coração e minha alma
Eu só deixarei que esses olhos vejam você
...
Então diga-me o caminho para casa
Estou ouvindo músicas tristes
Cantando sobre o amor
Onde ele dá errado

Eu durmo, e quando acordo no fim da tarde, tenho minha decisão


tomada. Não deixarei o homem que me trouxe um pouco de amor escapar de
mim. Mesmo que isso me quebre lá na frente, quem se importa? Mas irei ter a
certeza que tentei.
Pego meu celular e ligo.
Espero que não seja tarde demais, estou ligando para Bruno e ele não
me atente.
37
Bruno
Depois de falar com o médico de Alicia, faço algo que talvez não seja
a coisa certa a fazer, mas que nesse momento não penso sobre isso. Apenas
mando uma mensagem para Alexander avisando que encontrei algo sobre
Evan. Não espero sua resposta, ele provavelmente vai querer que eu vá até
ele para ver essas provas, mas não tenho tempo a perder com isso. Preciso
falar com meu pai e resolver logo isso, o resto depois é com a polícia. Se vão
fazer algo, já não será problema meu.
Paro a moto em frente ao portão, e um segurança o abre para mim
depois de alguns segundos. Cinco minutos depois estou sentado em frente ao
meu pai no escritório. Estou sentindo um maldito mal-estar por estar aqui,
dependendo desse homem para deixar minha mulher em paz.
Eu sou um filho da puta maldito que ainda tenho consideração por ele,
por ser meu pai, apesar de ele não ter a mesma consideração por mim que sou
seu filho. Eu me sinto estranho em estar aqui sendo recebido como um
desconhecido na mesma casa que fui criado.
Meu pai senta atrás de sua mesa, e eu trinco minha mandíbula com
desgosto. Não gosto de estar nessa posição, onde tenha de pedir algo para ele.
— Ter você aqui é uma surpresa e tanto, filho — ele inclina seu corpo
magro para trás e me encara — O que posso fazer por você?
— Por mim nada, talvez eu faça por você — coloco o pen drive em
cima da mesa à sua frente.
— O que é isso? — indaga, mas não se mexe com intenção de pegar.
— O seu precioso dinheiro, que é mais importante que as vidas das
pessoas — debocho e me inclino, e com o dedo indicador empurro o pen
drive na sua direção.
A porta abre atrás de mim e Deni aparece, seu rosto está roxo dos socos
que proferi nele ontem. Tenho vontade de levantar e terminar de acabar com
ele pela forma que colocou meu filho em risco, além de Alicia.
— Olha se não é a ovelha negra de volta ao redil — ele ri e fica em pé
ao lado da mesa, como se fosse um maldito segurança do meu pai. — O que
você veio fazer aqui, Bruno? Veio com a polícia de novo?
Não respondo, apenas olho firme para meu pai que acaba pegando o
pen drive e dando para Deni, dizendo:
— Veja o que é isso — Deni franze o cenho e vai verificar. Ele usa um
laptop que está em cima da mesa, e dou tempo para os dois verificarem a
cópia que tinha feito para trazer a eles.
Observo quando eles vão tomando conhecimento do conteúdo dos
documentos. Meu pai está lívido de raiva e Deni está praguejando. Assisto
com um sorriso interno o quanto eles foram feitos de idiotas pelo mais idiota
ainda, Evan Duran.
— Não acredito que ele fez isso! Nos usou, usou nosso dinheiro para se
dar bem...
— Não tão bem, já que ele perdeu tudo — digo satisfeito.
— O apartamento foi liquidado com nosso dinheiro, comprei a porra do
apartamento e ele tecnicamente já era meu. — Deni esbraveja começando a
andar para lá e para cá na sala. Papai está ainda olhando para o computador.
— Isso, irmãozinho, você realmente é um trouxa. Achava que com isso
iria se aproximar de Alicia? Como é burro — provoco, porque estou louco
que ele reaja e venha para cima de mim. Quero quebrar o resto de sua cara
maldita. — Você sempre quer o que é meu, não, Deni? Vive à sombra de seu
querido pai, mas é incapaz de fazer algo por si mesmo, panaca idiota!
Como previ, ele vem com tudo para cima de mim.
— Vá se fod...
— Chega vocês dois!
O grito do nosso pai o faz parar, mas seu olhar assassino está em mim.
O encaro de volta, pedindo com que ele venha para mim. Quero arrancar esse
arzinho arrogante dele. Esse terno de grife dele é só uma capa para dizer que
é um homem civilizado, mas não passa de um capacho do meu pai.
— O que você vai fazer com isso? — essa é a voz do meu pai, fazendo
com que eu vire minha atenção para ele. — Por que você nos trouxe isso e
não levou para a polícia? Isso faria com que nós fôssemos todos para a
cadeia.
Sim, tinha um documento com um depoimento de Duran, onde dizia
que se ele morresse, os Ross e outras três famílias eram os responsáveis. Ele
sabia que poderia morrer por sua ganância e teve a esperteza de amarrar todos
para ir com ele à bancarrota. Por isso estou aqui, fazendo o que não devia. Se
eu os entregasse, estaria assinando a sentença de morte de Alicia e do meu
filho. Eu preferiria morrer a ter de perdê-la.
— Quero sua garantia que deixará Alicia em paz para sempre. — digo
com voz firme — Ontem, vocês a colocaram em risco junto com meu filho,
não permitirei que isso aconteça outra vez, garantirei que todos estejam no
inferno antes disso, papai. Sequestraram uma mulher grávida que poderia
perder o nosso filho! Malditos doentes do caralho!
Vejo o semblante do meu pai mudar e ouço o gemido aborrecido de
Deni.
— Não sabíamos, filho — meu pai começa, mas eu o corto.
— Você se importaria? Acho que não. — encaro-o com raiva — Eu
estou apostando que daqui em diante você dirá para seus pit bulls para se
manterem longe dela. Ou vão todos para a cadeia. Garantirei isso.
— Não faça ameaças que não pode cumprir — Deni diz raivoso —
Você não é a porra de nada, irmãozinho.
— Cala a boca, Deni! — ele é repreendido por nosso pai. — Sabia que
a moça estava grávida do seu irmão? E não disse nada? Não gosto de ser
deixado no escuro, filho, sabe disso.
Observo a interação dos dois e vejo a raiva de Deni se construindo.
Porra! Ele ainda vai matar nosso pai por repreendê-lo na frente de qualquer
pessoa. Deni odeia isso, e se for por minha causa, essa raiva é em dobro.
— Eu estou feliz que vou ter um neto, enfim — ele deixa Deni em paz
e se vira para mim com um sorriso que não vejo há muitos anos. Isso não me
abala, esse homem é um desconhecido para mim agora. Deni sai da sala
batendo a porta, furioso. Ele me preocupa. Ele é dinamite pura com raiva.
— Seu irmão precisa controlar a raiva, por isso fiquei triste quando
você preferiu ir embora e não aceitar seu legado como meu filho. Seu irmão
não tem a paciência para lidar com pessoas e muito menos para lidar com os
negócios da família. Esse temperamento exacerbado dele é ruim para os
negócios. — sua voz saiu um pouco triste enquanto ele continua — Eu
preferia você desde cedo para assumir, e ser rejeitado por você, filho, foi um
golpe muito duro. Eu reagi da pior forma possível, fazendo você me odiar. Ir
e nunca mais voltar, nem para ver sua mãe.
Não digo nada, porque isso não significa nada para mim, mas sinto uma
parte do aperto que senti esses anos todos sair um pouco do meu peito. Saber
que ele não me odeia tanto parece retirar um pouquinho desse peso, mas isso
não vai me fazer ser um filho querido de volta ao seio da família. Aqui não há
nada para mim, quero distância desse lugar. Minha mãe escolheu apoiar o
marido e não se importar comigo, porque diabos eu iria voltar para falar com
ela?
Não, eu não vou ser tão bonzinho agora para aceitar um almoço de
família aos domingos.
— A única coisa que quero de você é a garantia que Alicia será deixada
em paz. — levanto e enfio as mãos no bolso. Eu preciso sair daqui. Esse
ambiente me incomoda — Ou essa merda será jogada no ventilador e você
pode não gostar, papai.
— Claro. Considere feito, ninguém incomodará sua mulher — ele
parece realmente pesaroso por eu ignorar sua súbita revelação.
— Espero não me arrepender dessa decisão. Se você não cumprir com
sua palavra, irei ter a certeza que vou atingir onde mais dói em você.
— Sua ferocidade é um deleite, meu filho, queria que seu irmão tivesse
um pouco de sua personalidade.
Isso sempre foi o problema com Deni. Ele tinha percebido o que meu
pai não verbalizou, mas deixou claro desde cedo. Eu nunca quis nada disso,
mas Deni não acreditava que eu não quero nada que venha deles.
— Mantenha seu filho na coleira. — Digo e caminho para a porta. —
Não acho que ele levou na boa que vou ter um filho. Ele sempre quer ser o
primeiro em tudo. Então o mantenha longe de Alicia.
— Filho! — paro e viro para meu pai. — Parabéns pela gravidez da
moça.
— Obrigado. — digo com antipatia.
— Se um dia você parar de me odiar, eu gostaria de conhecer meu neto
— ele diz sem sua habitual arrogância tão característica dele.
— Você não fez absolutamente nada para isso, pai, para eu perdoá-lo.
— digo e abro a porta — Eu não sou seu filho por mais de quinze anos, por
que mudar isso agora? Só se mantenha longe.
Saio deixando-o lá parado, não me importo.
Olho ao redor à procura de Deni, mas não o encontro. Porra, eu e ele
ainda temos algo a acertar. Mas eu sei que só o fato de Alicia estar grávida do
meu filho é demais para ele, que adora essa competição comigo. Isso leva um
sorriso a contragosto para meu rosto. Panaca! Nem engravidar uma mulher
ele faz direito.
Verifico minha moto estacionada antes de montar, não confio nesses
caras e muito menos em Deni. Ele não tem os mesmos escrúpulos que eu
tenho. Considerar a familiar, mesmo ela não tendo nada a ver comigo, com
valores diferentes de mim. Ele me mataria sem pestanejar.
Nada aparentemente está errado e sigo para fora de lá. Tenho a
sensação de que não resolvi tudo que tinha de resolver nessa casa, mas saio
de qualquer jeito. É opressivo esse lugar.
Não vou baixar a guarda com Alicia, não agora, não confio no meu pai
e em Deni menos ainda.
Estou inquieto quando vou para a empresa falar com Alexander, ele
deve estar puto comigo. Mas farei essa porra do meu jeito. Paro a moto e vou
direto para sua sala. Ele está com Carl e Benacci, e eu espero fora enquanto
ligo para Matt para saber de minha gravidinha mais porra louca que há nesse
mundo. Não vou ligar para ela, vou dar mais um dia. Se eu aguentar ficar
longe. Sinto sua falta pra caralho. Ela me faz um homem melhor, eu nem me
reconheço.
Ontem à noite no bar tinha tantas mulheres disponíveis dando em cima
e eu não senti nada além de repulsa com o pensamento de outra mulher me
tocando. Viúva feiticeira! Me lançou um maldito feitiço.
Entro depois de falar com Matt e me reúno com Alexander e os outros.
— Onde estava, Ross? — Carl pergunta quando sento no sofá que é o
único lugar desocupado no momento.
— Resolvendo umas pendências. — digo e deposito o cartão com as
informações de Duran na mesa — Estou mostrando isso a vocês, mas não
quero que entreguem à polícia, principalmente você, Alexander. Não quero
ver meu pai tirar a vida da minha família.
Porra, isso saiu da minha boca mesmo? Os caras devem estar pensando
a mesma coisa, porque estão olhando para mim boquiabertos.
Benacci começa a gargalhar, fazendo os outros o acompanharem.
— Porra, Ross, você caiu feio de amor! — ele se curva de tanto rir —
Quero ser o padrinho do casamento!
— Vão se foder! — caio de volta no sofá, fazendo as hienas rirem mais
de mim. — Vocês todos são dominados por boc...
— Cala a boca! — Carl fala sério agora — Bem, o que tem nessa
porcaria de cartão? — ele aponta. Cara, esse nosso amigo precisa se revelar,
ele não fica legal quando estamos falando de mulheres e boceta na sua frente.
Nós temos uma teoria sobre isso: ele deve ter levado o maior chifre da
história.
Deixando o chifre de Carl de lado, começo a explicar o conteúdo do
cartão e digo sobre minha visita a meu pai, deixando Alexander puto como
imaginei que ficaria.
Alicia
Estou preocupada com Bruno. Sei que ele pode estar dando o tempo
que pedi para ele, mas desde ontem que tenho tentado falar com ele e nada.
Quando Matt chegou à noite, disse que tinha falado com ele, em algum
momento, sobre mim. Bruno tinha ligado para saber de mim, indicando que
se importa ainda, e me acalmei um pouco ontem, mas hoje são dez da manhã
e nada de ele retornar minhas ligações.
Ele tem sido tão carinhoso, e eu uma maldita mulher insegura. Em
minha defesa só posso culpar minha vida anterior e o homem que conhecia e
se transformou no meu algoz psicológico. Confiar é um passo gigantesco, e
eu quero dar esse passo com Bruno. A despeito de ele ter um passado nada
bonito sobre as mulheres, eu o vi mudar nesses poucos meses, tenho de dar
crédito ao meu prostituto predileto.
Se eu tenho de fazer as coisas funcionarem, tenho também de encontrar
uma maneira de saber lidar com tudo que vem junto. Passado, meu e dele, um
filho que eu não esperava ter jamais, que me abala e gera pânico. Pensar no
serzinho dentro de mim e saber que posso perdê-lo me apavora sobremaneira.
Tenho medo de ter sido covarde demais e ele ter ido para sempre. Se eu
no começo não soube controlar e superar a atração e acabei apaixonada e
amando Ross, então, não adianta fugir dele agora, isso só fará com que o
perca para sempre.
No meio da tarde recebo a visita do Dr. Allan. Ele tinha prometido vir
aqui uma vez na semana para me acompanhar todo caminho dessa gravidez
bem de perto. Ele não precisava fazer isso, se locomover para me assistir em
casa, mas ele se tornou mais meu amigo que médico, coisa que agradeço
demais. Ele me pediu para ficar em total repouso vinte e quatro horas nas
primeiras semanas e, mesmo com meu trabalho parado, eu vou acatar suas
ordens.
Também liguei para o psicólogo e irei para uma consulta amanhã com
ele. Quero muito que Bruno esteja aqui para me levar, tenho receio de sair na
rua e Deni me sequestrar outra vez.
Deixando de lado minhas preocupações, sento e ligo para a empresa
para falar com Marco. Aceitaremos apenas pequenos eventos a partir de
agora. Ontem foi um dia de muita conversa com ele, e hoje quero deixar isso
mais fundamentado para que ele possa trabalhar sem mim por um tempo. Eu
não farei nada que leve minha pequenina esperança.
Estou impaciente sem o Matt aqui. Laura está ocupada com suas coisas
e não pode ser minha constante dama de companhia, mas está sempre vindo
dar uma conferida em mim, deve ser coisa do meu irmão superprotetor.
Levantando, vou para a cozinha onde ela está com seus afazeres.
— Oh! O que precisa, minha querida? É só chamar que levo para você
— ela seca as mãos no pano de prato. — Seu irmão deu ordem restrita sobre
você ficar parada.
Oh, Matt! Ele tem sido tão carinhoso e cuidadoso comigo desde a
morte dos nossos pais, que isso está arraigado dentro dele e qualquer coisa
que possa me machucar, ele fica meio paranoico com seus excessos de
cuidados. Ele tinha assumido esse papel de pai comigo, e só era dez anos
mais velho que eu. Eu o amo demais por deixar sua vida em espera para que
eu pudesse crescer. Mesmo quando isso aconteceu, ele não me abandonou,
continua aqui para mim.
A única coisa que me faria feliz agora é ver meu irmão com alguém
cuidando um pouco dele, para variar. Ele tem sido minha rocha por anos e
anos, e eu só quero vê-lo feliz. Meus olhos piscam com ardor de lágrimas.
Limpo a garganta obstruída com um nó e digo:
— Não estou inválida, Laura, quero conversar. Minha cabeça está a
ponto de entrar em parafuso de escutar meus próprios pensamentos. — sento
no banquinho no lado oposto do balcão e puxo assunto — Meu irmão tem
uma namorada que eu não sei, Laura?
— Seu irmão não me fala dessas coisas, querida — ela ri.
— Nunca trouxe nenhuma aqui? Sério? — estou chocada com isso. —
Eu sempre soube que ele namorava bastante por aí.
— Ele já trouxe, sim, algumas meninas aqui. Mas não é muito comum.
E nunca a mesma por muito tempo. Por isso não sei dizer se tem alguém
especial — Laura diz e serve para mim um prato de frutas — Estava fazendo
isso para levar para você. Tem de engordar esse bebê, querida.
Sorrio e mordo um pedaço de kiwi, saboreando lentamente. Isso é
ótimo.
— Irei ficar toda minha gravidez aqui com você, então...
Sou cortada pelo som da porta, e Laura sai para verificar quem é. Ela
volta depois acompanhada de Lana Mitchell, a noiva de Alexander. Eu não a
conheço muito bem, acho que a vi uma ou duas vezes, e não imagino por que
ela está aqui.
— Olá, eu sou Lana — ela diz com um sorriso — Desculpe vir sem
avisar, mas soube que você foi sequestrada e quero que saiba que estou aqui
para ajudar no que for preciso. Eu fui sequestrada também algum tempo atrás
e foi horrível, então, se você precisar de uma amiga, estou aqui, pode me falar
de qualquer coisa que você esteja sentindo de ruim, posso dizer que isso
passa com o tempo...
Caio na risada com sua tagarelice e ela fica vermelha.
— Desculpe. Estou falando demais, não é?
— Sou Alicia Duran, prazer — estendo minha mão e ela me puxa para
um abraço que acabo devolvendo. Ela é meio maluca.
— Oh! Sim, sei quem você é, a namorada do Bruno, ex-pegador
inveterado — balanço minha cabeça com o furacão que entrou pela minha
porta, ou melhor, pela porta de Matt.
— Sim, essa sou eu — Sou sua namorada? Já nem sei se sou algo para
ele, já que não retorna minhas ligações. — Falando nele, você ouviu falar
dele?
Oh, meu Deus! Não acredito que estou fazendo isso, especulando da
vida de Bruno para uma quase desconhecida.
— Não ouvi nada, mas espera — ela pega o celular e coloca no ouvido
— Oi, amor! Oh, estou atrapalhando? — ela escuta e vejo, mais uma vez, sua
pele clara avermelhar — Só queria saber onde anda Bruno... Claro que não!
Não sou eu que quero saber onde ele anda, mas sua namorada.
Ela me olha, e dou um sorriso amarelo, mas encorajador. Escuto o bufo
de riso de Laura e volto minha atenção para ela, que me dá um olhar
divertido. Caramba, estou realmente em apuros, usar a namorada de
Alexander para saber de Ross é demais.
— Está bem, não seja grosso comigo quando eu ligar para você, senhor
segurança, sou a prioridade em sua vida, não se esqueça disso — ela diz
severa, mas o humor e carinho na sua voz é identificável — Claro que foi
grosso! Achar que estou ligando para você para saber de outro homem, isso
foi grosseiro de sua parte. Não posso acreditar que você possa pensar que eu
seria tão imatura.
Prendo meu riso. De onde saiu essa maluca tagarela? Ela continua
tagarelando e repreendendo com o coitado do Alexander do outro lado.
— Tudo certo! — ela diz quando termina — Ele não tem notícia do
Bruno desde ontem.
O quê?!
— Mas ele vai ligar daqui a pouco para te falar — Lana diz e senta ao
meu lado, tão espontânea que fico chocada. — Alex me contou que você está
grávida, por isso vim também, para oferecer um ombro amigo. Meu melhor
amigo foi embora, não porque sou péssima amiga, mas foi necessário na
época. Então estou precisando recrutar novas amigas. Pode contar comigo.
Lana se revelou uma companhia excelente para remediar meu tédio,
mas minha preocupação por Bruno persiste, e nada do que ela diga me distrai
o bastante. Faz mais de uma hora que ela está aqui quando recebe uma
ligação de Alexander, dizendo que Bruno está em casa.
Em casa?! Mas por que ele não veio me ver? Deus, eu devo ter o ferido
de verdade.
Depois que Lana vai embora, prometendo voltar para me fazer
companhia, eu me recolho no meu quarto. Pego meu celular e envio uma
mensagem para Ross:

Me perdoa!

Eu fico olhando o telefone por horas, mas nada vem dele. Meu coração
está tão pequeno no meu peito... Eu sou tão estúpida. Não aguentando mais a
espera, eu apelo para algo que o fará vir para mim.

Nosso filho sente sua falta.

Querendo me distrair, ligo o play do meu celular e coloco as músicas


para tocarem aleatórias. Diamonds, da Rihanna, começa a tocar.

...

Eu logo soube que nos tornaríamos um só


Oh, bem no começo
À primeira vista eu senti a energia dos raios do sol
Vi a vida dentro dos seus olhos
...

Eu agora só o queria aqui para mim, como sempre esteve.


Eu o amo.
Muito.
As lágrimas veem molhando meu travesseiro onde mantenho repousada
minha cabeça.
A música para com um beep do som da mensagem.

Só nosso filho?! Estou querendo ser mais persuadido, bebê.

Nãoooo, não só nosso filho.


38
Alicia
Estou com lágrimas nos olhos e um sorriso nos lábios quando digito
de volta. Ele quer ver-me implorando.

Estou pronta. E eu preciso de você, muito. Precisamos conversar, por


favor.

Caramba! Eu não sou muito boa nisso, preciso treinar mais com Bruno
o meu charme. Se depender dessa mensagem, talvez ele não ache que o quero
de volta na minha vida.
Não obtenho resposta imediata. Sento na cama, puxando meus joelhos
para junto do meu peito, minha testa encostada na perna, olhos fechados e
espero... e não vem mais nada da parte dele.
Estou tentada, depois de meia hora sentada na mesma posição, a enviar
outra mensagem, mas desisto. Não sei o que dizer, como me desculpar pela
minha falta de fé.
Escuto a campainha da porta e fico chateada pela visita fora de hora.
Não quero ver ninguém, quem eu quero não responde as minhas mensagens.
Que droga!
Estou realmente aborrecida agora, quando ouço uma batida na porta.
Devia ter alertado Laura que não queria mais nenhuma visita hoje. A visita de
Lana serviu por cinco.
— Entre, Laura — digo com voz apática. Penso que ela veio para
avisar da visita, coisa que não tenho a menor vontade de fazer agora. Ele está
me castigando por mandá-lo embora, ele faz isso para me deixar maluca,
apenas isso, eu sei.
A porta se abre e não levanto minha cabeça para olhar.
— Laura, não quero visita. Diga que estou indisposta.
Estou mesmo, meu estômago está embrulhado em nós de nervosismo.
Bruno Ross! Ainda vai me matar de ansiedade qualquer dia desses, mas ele
tem razão em uma coisa: eu preciso ser mais forte por nós.
— Você está bem?! — A voz preocupada e máscula não pertence a
Laura de maneira alguma.
Levanto minha cabeça para encontrar os olhos azuis hipnóticos fixos
em mim. Intensos e um pouco cautelosos, mesmo assim ele me fita com tanta
intensidade que queima dentro de mim como labaredas nas minhas veias.
Calor me aquece quando percebo que ele veio para mim. Mesmo que eu o
tenha chutado daqui dois dias atrás. Ele fica parado no meio do quarto, e sei
que isso depende de mim agora.
Deus, ele é tão lindo que tira meu fôlego. Eu não sei se um dia me
acostumarei com a forma que ele me abala e tira meu eixo; desestabiliza-me
de uma maneira única. Bruno Ross abala meu mundo como ninguém jamais o
fez, e é por isso que estou seguindo o conselho de Matt: me permitindo amar
livre de qualquer culpa e receio. Sei que preciso trabalhar meus medos com
essa gestação, mas o primeiro passo tenho que dar agora, aqui, com ele.
Meu segurança. Minha verdade. Meu porto seguro nesse mundo incerto
que se tornou minha vida. Eu só queria ser boa com as palavras e poder dizer
para ele o quanto ele significa para mim. Mas ficamos ali, os dois, olhando
nos olhos um do outro e sei o que ele quer que eu faça. Dar o primeiro passo,
só assim ele saberá que estou entrando com tudo e para ficar. Que o amo o
suficiente para esquecer meu passado. E olhar para ele como meu futuro.
— Você veio — sussurro. Saio da cama e fico a dois passos dele, ainda
olhando em seus olhos. Eu preciso falar com ele, colocar para fora o peso que
venho trazendo em meu peito, antes que mude de ideia e não fale tudo que eu
quero.
— Nunca imaginei, naquele primeiro dia, quando abri a porta achando
que encontraria meu irmão do outro lado — começo — que eu fosse
encontrar uma pessoa especial que me quisesse e aceitasse com meus
defeitos. Eu não imaginava, naquele dia, que encontraria parado na minha
frente, cheio de si e arrogante, um homem que me fizesse rir outra vez em um
dos piores momentos da minha vida. Que me tirou o chão e fez tudo ficar
mais fácil e leve; que me fez esquecer em momentos cruciais que eu poderia
ter o mesmo destino de Evan e fazer parte do medo ir embora. Eu queria ser
forte e, mesmo querendo isso intensamente, eu descobri que não sou tão forte
assim quando se trata de sentimentos, de se doar verdadeiramente a alguém,
quando lá atrás meu coração foi despedaçado — tomo fôlego e percebo que
lágrimas silenciosas correm pela minha face.
Bruno está me olhando sem nada em seu rosto que indique alguma
reação do que ele sente. Estou tremendo. O coração batendo tão acelerado
que estou temendo um ataque cardíaco.
— Eu costumava pensar que nunca mais seria feliz com alguém, mas
desde aquele dia, algo mudou dentro de mim. Meus pensamentos eram só
seus a cada hora do dia e da noite e neguei tanto, tanto, no entanto você
continuou vindo e se infiltrando dentro do meu peito, tão profundo que eu
nem percebi a hora que você se tornou meu mundo todo. Eu mandei você
embora porque o pensamento de você me abandonar era demais para
suportar, e se eu perder nosso filho não suportaria passar por isso sem você
por perto. Eu morreria de desgosto e só, porque fiz a bobagem de mandar
você sair da minha vida. Não significa que isso não me mate aos poucos. Sem
você por perto meu mundo perde o colorido. Eu quero que saiba que se Deus
não permitir que um dia eu seja a mãe do seu bebê, eu ainda tenho você
comigo, se ainda me quiser. Eu amo você mais do que possa imaginar, Bruno
Ross. — Emoção e dor excruciantes saem acompanhados na minha voz.
Eu soluço tão forte que sinto meu coração falhar uma batida. Sinto seus
braços me envolverem tão apertado que tira o resto da minha respiração.
— Eu garanto para você que vou tentar implacavelmente deixar meus
medos para trás. Tenho uma consulta marcada com o terapeuta, e esse
primeiro passo é por nosso bebê, por mim, por nós. Eu preciso que você
acredite em mim... — minha voz embarga e seus braços apertam-me mais.
— Shiii... está tudo bem, querida — sua voz também está embargada
quando ele segura meu rosto entre suas mãos e seca a torrente de lágrimas
que desce com seus polegares — Eu também te amo. Vai ficar tudo bem,
bebê.
— Sinto muito por ser tão intransigente e não saber lidar com tudo isso.
Você mudou minha vida, Ross, sem você ao redor, cuidando de mim, é vazio
e doloroso demais. E foram apenas dois dias, eu não aguentaria mais um dia
sem você — digo em um fio de voz, passando meus braços em volta de sua
cintura e enterrando meu rosto em sua camisa. — Eu amo você. Muito.
Deixe-me mudar sua vida também, por favor. Eu quero tanto que tudo se
conserte entre nós.
Ele segura minha cabeça outra vez em suas mãos e esmaga sua boca na
minha, beijando-me como se fosse a primeira vez, como se não tivesse de
mim o suficiente, e eu retribuo com todo o amor que sinto por esse homem.
Calor me toma, e agora meu coração está batendo com pura felicidade. Passo
meus braços por seu pescoço e beijo sua boca com fome. Tem sido tempo
demais que não provo sua boca. Gemo, e isso faz com que ele se afaste, me
olhando preocupado.
— Não... — tento puxá-lo de volta, mas é impossível.
— Não devia estar fora da cama, amor — diz ao mesmo tempo que me
pega no colo e me deita na cama e vem comigo, deitando em cima de mim,
mas sem o peso do seu corpo que está sendo seguro pelos seus braços que
estão em cada lado da minha cabeça. Estou em uma gaiola viril e quente. Dou
um sorriso trêmulo de emoção. — Como está meu bebê? — pergunta,
amoroso, deixando-me mais trêmula.
Ele olha para baixo para minha barriga inexistente. Meu coração aperta
em meu peito, com o tumulto de sentimentos que enrolam em um
emaranhado de emoções dentro de mim.
— Bruno, eu farei tudo que puder para ir até o fim. Allan me indicou
um terapeuta — repito sobre o terapeuta porque isso é difícil de admitir, que
eu estou quebrada para que precise de um. Baixo os olhos, mas ele me faz
olhar para os seus, segurando meu queixo entre os dedos.
— Fico muito feliz que aceitou ajuda, querida, você me deixa muito
orgulhoso com essa decisão. Só você pode decidir isso. Estarei aqui para
você, onde quer que você me queira — ele me dá um sorriso lindo quando
acrescenta: — Eu acredito que meu filho é forte pra caralho. Sairá a mim,
pode ter certeza. Não o deixarei ir assim facilmente, pode acreditar. E se tudo
não for como nós queremos, estarei aqui para te pegar e segurar você tão
forte que não haverá espaço para dor.
Sim, eu quero acreditar que ele tinha esse poder, eu só queria que ele
tivesse de verdade.
Acabo rindo de seu convencimento e do amor que seus olhos azuis
deixam transparecer. Ele não é o mesmo homem que conheci meses atrás,
não mesmo.
Oh, céus... O que foi que fizeram com Ross prostituto?
— Você tem certeza de que é um garoto? — pergunto e tiro seus
cabelos que caem em sua testa, empurrando-os para trás. — O que vier para
mim está perfeito — Levo minha boca para sua enquanto o puxo para mim,
beijando sua boca deliciosa.
Beijamo-nos durante o que parece uma eternidade, e quando eu acho
que ele vai além, ele rola me levando com ele, quebrando nosso beijo.
Ficamos deitados em silêncio. Não precisamos falar, é como se essa conexão
entre nós tivesse se estabelecido essa noite. Que o que viesse para nós,
iríamos enfrentar juntos.
— Te amo.
Ele diz, sussurrando em meu ouvido com uma voz arrastada que eu
conheço bem demais. Cheia de tesão. Arrepios percorrem minha espinha.
Levanto minha cabeça para olhá-lo, e ele captura outra vez meus lábios. Não
vamos arriscar sexo. De jeito nenhum. Mesmo que entremos em combustão
nessa cama.
Seus dedos estão agora nos meus seios. Ele torce meus mamilos
sensíveis entre os dedos, e um gemido rouco escapa da minha garganta.
— É tão bom tê-lo aqui, querido. Senti sua falta — digo ofegante.
Depois pergunto para distraí-lo, pois seus dedos são torturadores e estão me
deixando terrivelmente excitada: — Então, o que iremos fazer agora?
— Agora eu quero te beijar, até você perder essa linda cabecinha.
— Sim, por favor...
— Eu não poderia ficar mais tempo distante de você, sinto-me vazio
sem você. — diz antes de me beijar impiedosamente.
Ele é tão lindo que dói em meu coração...
39
Bruno
Um mês depois
Gemo quando abro caminho entre as pernas de Alicia e entro forte
dentro dela. Ela está molhada pra caralho e pronta para mim, seu grito rouco
ecoa no quarto. Meu pau está sendo estrangulado, e eu amo isso pra caralho.
Agarrando sua cintura, puxo-a para mim, encostando seus seios em
meu peito, e faço-a sentar em meu pau, usando minhas mãos como alavanca
para fazê-la subir e descer furiosamente sobre ele.
— Ah, bebê, como você é gostosa! — rosno quando mordo um dos
mamilos que está bem na frente do meu rosto e chupo tão forte em minha
boca que ela grita de prazer e dor. Estou no limiar de me perder
completamente dentro dela. Seguro seu cabelo na nuca e capturo sua boca
com a minha, mordendo e lambendo onde deixei minha marca em seus
lábios. Quero marcá-la como minha, deixá-la louca por mim, para que nunca
pense que pode me mandar sair de sua vida.
— Você é tão linda, meu amor... — digo de encontro aos seus lábios, e
eles se abrem para minha língua outra vez e tudo parece entrar em um frenesi
louco. Nosso beijo fica molhado, louco; estamos ofegantes e loucos de tesão,
meu pau fica mais duro, se possível, dentro dela. Estou prestes a gozar tão
violentamente dentro do seu calor úmido...
— Bruno?! — a voz de Alicia me chama, e o toque de sua mão em meu
peito me faz acordar do sonho molhado muito quente que estou tendo.
Merda!!
— Hummmm — resmungo frustrado.
— Você está bem? Estava parecendo que estava com dor — ela acende
a luz ao lado da cama. Dor? Sim, muita, mas de tesão maldito. Nem em
sonho estou gozando mais.
— Oh, sim, querida, estou com dor, muita dor. — estou com uma
maldita tenda nas minhas calças de pijama, e isto dói pra caralho. Olho para
ela, que está inclinada sobre mim com olhos preocupados.
— Onde é a dor, querido? — Ah, como minha Alicia está inocente.
Pego sua mão e coloco em minha ereção.
— Bem aqui.
— Oh! Eu vejo.
— Humm — ela aperta em torno de mim e gemo involuntariamente.
Ela trabalha a mão para cima e para baixo no meu eixo.
Alicia tem evitado qualquer tipo de excitação, e sexo está
definitivamente fora por tempo indeterminado. Mas isso é tão frustrante.
— Tudo bem, querida. Vou tomar um banho frio. — digo quando
levanto dando um beijinho em seus lábios e fujo para o banheiro.
Serão os nove meses mais longos da minha existência.
E contado...

***

Dias depois

Estou na sala de espera da clínica do terapeuta aguardando Alicia, que


neste momento está em consulta. Essa é a quarta vez que ela vem, e já vejo
seu progresso.
Já não é tão frágil com essa coisa de perder o bebê. O Dr. Allan tem
sido mais que um médico para ela, e esse terapeuta que ele indicou realmente
tem feito um bom trabalho com ela. Já o Dr. Allan vem verificar a cada dois
dias sinais de que ela possa abortar, exames não invasivos para detectar
qualquer sinal de sangramento. Ele faz isso para deixá-la mais tranquila. Mas
tudo tem caminhado bem.
Porra! Felicidade pura e simplesmente me invade a cada dia que passa
e ela continua com nosso filho dentro dela. Se eu disser que não tenho medo
estarei mentido; morro de medo, mas não deixo isso transparecer para ela,
nunca.
Quero ser o homem que vai estar lá para ela. Eu me surpreendo a cada
dia comigo mesmo. Nunca pensei, nem um pouco, que estaria aqui nesse
momento com qualquer mulher. Para ser claro, eu nunca tive a visão de um
futuro para mim igual o que estou tendo com Alicia. A mulher me acertou em
cheio, direto no meu coração.
Tem sido um passo de cada vez nas nossas vidas. Eu a convenci a ir
morar comigo. Ela não queria, mas isso não teve argumento, afinal vamos ter
um filho juntos e ela precisa de mim. Estou fazendo trabalho burocrático da
empresa em casa, para que não tenha de deixá-la nem um minuto do dia
sozinha. O risco ainda é muito grande de aborto nesses primeiros meses e
nada pode ser negligenciado. Sou duro se ela faz qualquer coisa além de
respirar.
Ela fica puta de frustração.
Por que as mulheres são tão independentes? Não tem essa de querer
tomar banho sozinha, caramba! Eu não perderia a chance de ter um gosto
daqueles peitos redondos e duros pra caralho!
Droga, quem está duro agora sou eu com o pensamento dos peitos dela.
Ajeito-me e olho ao redor da sala. Tem um casal sentado em outro conjunto
de sofás à minha frente, e eles não estão olhando para mim. Bom. Já a
recepcionista loira está me verificando a cada oportunidade detrás de sua
mesa, conheço o tipo. Não muito tempo atrás eu já estaria com seu maldito
telefone, mas agora eu prefiro as morenas de olhos esverdeados e
temperamento de um estivador.
Bato com meus dedos impacientes. Nunca entrei nessas consultas com
Alicia, eu prefiro não ir, é algo só dela e respeito sua individualidade, apesar
de o terapeuta ter sugerido que eu poderia participar um dia, pois uma das
razões de Alicia estar aqui é esse pavor de que eu não fique ao seu lado se ela
perder o bebê. Tal qual o maldito Duran fez durante o casamento deles.
Mas sei que ela se sentirá melhor sem a minha presença. Suspiro
quando olho ao redor e vejo que a recepcionista vem na minha direção.
— O senhor deseja que eu sirva um café? Água? — pergunta, solícita.
Os olhos dela em mim oferecem mais que café.
— Estou bem, obrigado — dou um sorriso sem muito entusiasmo para
ela e levanto minha sobrancelha em questionamento quando ela permanece
no lugar.
— Ok, qualquer coisa, mas qualquer coisa mesmo, pode pedir — ela dá
um sorriso sedutor e volta para seu lugar. Tem outras pessoas na sala e ela
não ofereceu nada? Ela poderia ser mais óbvia?
Quinze minutos mais tarde, Alicia aparece acompanhada pelo
terapeuta. Depois de se despedir dele, levo-a para fora em direção ao carro,
abrindo-lhe a porta e dando um beijo rápido em seus lábios, para depois dar a
volta e sentar no banco ao lado.
— Tudo bem? Como foi essa sessão? — pergunto quando dou partida
no carro, Bronken Glass, de Sia, começa a tocar assim que o motor ganha
vida.
— Foi bem — ela fala depois de alguns instantes e estende sua mão,
pousando-a em minha coxa, e esfrega seu polegar em círculos fazendo, junto
com a música, que eu perca um pouco o foco do trânsito.
Tem sido quase dois meses que nós estamos tentando de verdade.

...
Então não desista, é só um romance de jovens amantes
Não estou te descartando como vidro quebrado
...

E vamos continuar juntos. Eu planejo ir devagar com Alicia, pois sei


que ela ainda não está pronta para a próxima fase. No entanto, eu estou mais
que pronto.
Eu tenho mantido Alicia em constante vigilância, ainda não confio que
meu pai vai deixar as coisas assim, fáceis. Não sei se posso confiar na palavra
dele. Bom, mas confio menos ainda em Deni.
Minha mãe me ligou, bem, quem ligou foi meu pai e a colocou ao
telefone para falar comigo, e pediu para ver-me, mas ainda não aceitei. Não
sei se posso esquecer o passado facilmente. Estou precisando de um terapeuta
também. Sorrio com o pensamento.
Olho para Alicia e penso que nunca estive mais feliz do que agora. Só preciso
dela junto a mim.
Estamos vivendo um dia de cada vez, mas minha fé em nós supera
qualquer outro sentimento. E sinto que Alicia está no caminho para confiar
mais em nós também.
Só precisamos ser fortes um para o outro. E vou ser forte para minha
menina.
Ainda não sabemos o sexo do bebê, apesar das ultrassonografias que
Alicia fez até agora. Não importa o que venha a ser, vamos amá-lo de
qualquer maneira. Já amamos.
40
Alicia
Loving can heal
Loving can mend your soul
And is the only thing that I know
I swear it will get easier
Remember that with every piece of ya
And is the only thing we take with us when we die

(Ed Sheeran)

Suspirando, encosto minha cabeça no banco do carro enquanto Bruno


nos leva para uma noite com seus amigos. Estou agora com quatro meses de
gravidez, e a cada dia estou mais apaixonada por nosso filho. Digo “filho”
porque não sabemos ainda qual o sexo, pois me nego a saber ainda. Não tem
um único dia que eu não derrame litros de lágrimas pelo milagre que está
acontecendo dentro de mim.
As coisas ainda estão meio loucas dentro da minha cabeça. Tenho
pesadelos que me fazem acordar suando e com lágrimas nos olhos, porém são
raros agora.
Segundo meu terapeuta, estou indo a passos de bebê contra meus
medos de o meu corpo não ser forte e eu perder meu filho.
É totalmente assustador. Sempre sonho que estou sangrando horrores,
jorrando sangue por todos os lugares, choros de bebês, e depois estou
correndo e correndo e nunca consigo encontrar o bebê que está chorando. É
aterradora minha agonia, tremor me percorre e soluços saem de minha
garganta enquanto deixo um rastro vermelho por onde passo no sonho.
Mas durante as noites que tenho esses pesadelos, sempre que acordo
estou sendo abraçada por braços fortes, que estão ali para mim como
prometido. São meses de aprendizado para voltar a depositar minha confiança
em outro homem, mas eu não poderia pedir outro melhor. Bruno Ross se
revelou meu homem dos sonhos, eu o amo feito louca, se quer saber. Ele
pode ter sido um galinha mulherengo, mas comigo ele tem sido tão gentil e
apaixonado que às vezes tenho receio de ter tanta felicidade
Virando minha cabeça, observo o perfil masculino e forte de Bruno. Ele
bate os dedos no volante como se estivesse nervoso ou impaciente. Sua
mandíbula está com uma leve barba sexy que o deixa mais gostoso, se isso é
possível. Eu aboli o sexo, nem tento nada, Allan não liberou por ser minha
primeira gravidez depois da última cirurgia. Como não planejamos essa
gravidez, Allan proibiu qualquer atividade, portanto, nada de sexo, mas
Bruno também não estava reclamando.
Eu sabia que ele vivia em constante tesão, mas não queríamos correr
riscos desnecessários e nosso filho é mais importante que sexo; haverá muito
depois que o bebê nascer. Também estou frustrada com isso.
Vou ter de esperar meu bebê nascer para voltar a usufruir do meu
homem. Estava ansiando por isso, não sou de ferro.
Eu amo saber que ele mudou tanto por nossa causa. Saber que antes de
nós ele nem cogitou ter um relacionamento sério me faz sentir especial.
— Está me encarando — ele diz e dá uma rápida olhada para mim.
— Estou apreciando a vista. Que é linda daqui de onde estou —
provoco, fazendo-o rir — Onde estamos indo exatamente?
— Os caras estão em um restaurante e bar com música ao vivo e
karaokê — diz — Só não espere que eu cante, amor.
— Oh, céus, você acabou com a minha noite. Como não vai cantar?
— Sem chance, deixo isso para os outros — ele retruca.
— Estraga-prazeres! — Nunca o vi cantar nada, nem no chuveiro, por
isso fico curiosa. Até o fim da noite quero vê-lo cantando.
Pouco depois, ele para o carro em uma rua em frente de um restaurante
e abre a porta para mim. Estamos os dois sendo mais que cautelosos comigo,
eu sinceramente sou a grávida mais neurótica da existência, e Bruno tem sido
muito mais que eu nesse quesito.
— Tudo bem? — ele segura o lado do meu rosto e beija suavemente
meus lábios antes de enlaçar o braço em volta de mim, me guiando para
dentro do restaurante, deixando a chave com o manobrista.
É a primeira vez que irei como sua namorada passar uma noite com
seus amigos. Esses meses que ficamos juntos não tivemos chance de
confraternizar com nenhum; eu não saí muito de casa, tenho me mantido a
mais reclusa das grávidas.
Não quero arriscar me aventurar, apesar das recomendações de Allan
dizendo que tudo é coisa da minha cabeça, que não terei um aborto assim tão
fácil, mas quem disse que o escuto? Muito menos meu amado segurança, que
me apoia na decisão de ficar o mais quieta possível. Bruno acredita que não
percebo sua ansiedade tão ou maior que a minha. Tem me tratado com tanto
amor que às vezes penso que não mereço sua total dedicação.
— Estou sim, querido, não se preocupe — digo quando me encosto
mais em seu corpo duro e forte.
A recepcionista nos cumprimenta, e depois de Bruno dizer que temos
mesa com os outros, somos levados para eles, que estão em uma área
reservada.
Alex, Lana e Carl eu conheço, e o outro segurança, Salvatore, já vi
algumas vezes. Ele tem uma loira ao lado, e suas mãos juntas só podem
indicar que são um casal. Bruno cumprimenta todos e depois me apresenta.
— Alicia, você já conhece todos aqui menos Lilian, a esposa de
Benacci — ele aponta a loira, confirmando o que eu já imaginava. Ela dá um
sorriso sincero que eu retribuo.
— Seja bem-vinda, Alicia — ela diz, simpática.
— Obrigada, prazer em conhecê-la também, Lilian — digo e vejo Lana
se levantar vindo em minha direção.
— Lana você já conhece. — diz Bruno rindo quando Lana me ataca em
um abraço. Ela tem sido um amor indo me visitar sempre. Como minha cota
de amigos está escassa, ela e Cindy são minhas amigas mais próximas.
— Você está tão linda, Alicia — Lana diz, jovial, me liberando do
abraço. Depois se vira para Bruno: — Já você, feio como sempre.
— Patricinha, eu sei que você sente algo por mim — Bruno pisca para
ela, e Lana cora voltando a sentar — Deve ser algum amor mal resolvido pelo
meu charme lendário.
— Vai sonhando... — ela sorri para mim quando fala. — Não sou eu
que tenho o apelido "prostituto", hein, senhor Ross?
— Sou um homem totalmente regenerado. — ele retruca, brincalhão.
Sorrindo, sento na cadeira que Bruno puxou para mim. Cumprimento
os homens e recebo acenos cordiais deles.
— Você disse isso para ela? — Bruno pergunta baixinho em meu
ouvido — Golpe baixo, Viuvinha.
Antes que eu diga algo, Lilian chama minha atenção para ela. Não
deixo de pousar minha mão em sua coxa e belisco forte. Ele apenas pega
minha mão na sua e aperta suavemente, colocando em cima de seu pau. Oh,
Deus! Maldito homem.
Olho ao redor para ver se alguém está vendo onde minha mão está.
— Tão bom tê-la conosco, Alicia. Estava começando a achar que você
era fruto da imaginação. Todos falam de você, e eu não tinha tido a
oportunidade de conhecê-la. — Lilian diz, alheia ao meu constrangimento
momentâneo — E esse nenê? É um garotinho ou garotinha?
— Ainda não sabemos. — digo, e sinto meu rosto esquentar. Droga,
estou cheia de puritanismo hoje, mas conversar com amigos do seu namorado
com a mão em suas partes Íntimas é novo para mim.
— Será um garoto, eu garanto — Bruno diz. Ele repete isso a cada
minuto, acredita realmente que teremos um garoto.
Depois de mais um aperto sobre minha mão, ele a libera com um
sorriso cínico para mim. Maldito safado!
Depois que estamos todos acomodados, o garçom vem anotar nossos
pedidos. Observo o local e vejo que tem um pequeno palco onde tem um
letreiro luminoso escrito “karaokê a partir das 23h”. São apenas oito da
noite. Droga, provavelmente estaremos longe daqui quando começar.
O jantar foi extremamente agradável com os amigos de Bruno e que
agora são meus também. Fico sabendo que Lilian, além de casada com Sal, é
a recepcionista da empresa de segurança e que os dois tem uma longa
história.
— Vamos marcar um dia de nos encontrar, Alicia, e fazer coisas de
garotas, sem esses meninos por perto — ela diz em certo momento.
— Ela já me prometeu visitar a CASM — retruca Lana — Quero suas
ideias de organização de festas. Ah, e você irá organizar meu casamento, que
será em breve.
— Breve quando? — pergunto. Ela começa a discorrer sobre o
casamento e não para de falar até Alexander fazê-la parar quando a puxa para
ele e a beija na nossa frente.
— Vocês dois podem, por favor, parar? Isso é constrangedor —
Salvatore fala, mas os dois o ignoram.
— Alex! Isso é nojento!! — Bruno se junta a Sal para atormentar o
casal apaixonado. Todos estamos nos divertindo enquanto seguimos com o
jantar. Alex resolve soltar Lana, toda ressabiada, de volta para sua cadeira.
Carl é o único caladão e pensativo, mas, durante o jantar, ele se retirou
da mesa quando um som de piano começou a tocar nos alto-falantes do
restaurante. Depois de um tempo que ele tinha saído, a música parou
abruptamente e começou outra canção. Ele voltou com uma carranca pior do
que quando saiu da mesa. Os outros não pareceram notar ou fingiram que não
notaram seu retraimento na conversa. Olho para Bruno, que está me olhando
com a testa franzida quando me pega observado seu amigo.
— O quê? — sussurro para ele.
— Não tente desvendar os mistérios do Carl, Alicia. O homem é uma
fortaleza com sua vida privada — ele sussurra de volta, apenas para mim.
— Não estou preocupada com isso — afirmo calmamente.
São dez horas quando Bruno anuncia que iremos embora.
— Alicia não pode se cansar muito — ele fala como se eu fosse uma
mulher decrépita — Tenho de colocá-la na cama.
Isso gera um monte de sorrisos ao redor da mesa, e eu acabo vermelha
mais uma vez essa noite.
— Bruno, não seja estraga-prazer, quero ficar para o karaokê, amor —
digo gentilmente. Ele se recusa categoricamente em ficar e, pouco depois, nos
despedimos de todos e saímos do restaurante para o ar frio da noite.
Bruno
Quando chegamos em casa, naquela noite, depois de jantar com nossos
amigos e coloco uma Alicia resmungona na cama, dizendo que a trato como
um bebê, recebo um telefonema do meu pai depois de meses sem notícia da
minha família. Eu tenho mantido um olho sobre Deni e ele tem se mantido
afastado de mim, o que é ótimo.
Vejo o número do meu pai e atendo depois do terceiro toque. No íntimo
não quero atender, mas acabo atendendo de qualquer maneira.
— Filho... — ele fala quando atendo. Eu sinceramente não gosto
quando ele me chama assim, não soa genuíno — Que bom que consegui falar
com você.
— O que posso fazer por você?
— Preciso que venha visitar sua mãe — ele diz, fazendo-me recuar.
Não tenho vontade de ser o filho pródigo dos meus pais — Ela tem me
enchido a cabeça com lamentações por você não falar com ela. Estou pedindo
um favor, filho. Diga-me que virá falar com ela.
— Não posso prometer nada, veremos isso depois — não me
comprometo aí, não sinto remorso por não sentir falta deles na minha vida.
Talvez, no fundo, eles tenham feito um favor para mim em me afastar desse
mundo alienado que eles vivem.
Depois de desligar, sem muitas delongas, volto para o quarto onde
Alicia já está dormindo, mesmo que ela tenha reclamado que a trato como um
bebê. Ela gosta desse cuidado. Depois de um banho, deito perto dela,
trazendo seu corpo para junto do meu, sua barriga saliente é onde pouso
minha mão. Meu filho! Beijo seu pescoço, inalando seu cheiro, e ouço seu
suspiro. Mesmo em seu sono ela é receptiva a mim.
Amo essa mulher mais que minha vida. Eu definitivamente estava
esperando por ela por toda minha existência. Deve ser por isso que, antes
dela, nada me segurava mais que uma noite de fodas aleatórias. Cada dia
sinto isso mais profundamente dentro de mim.
— Te amo — sussurro antes que o sono me leve.

***

Quando o dia amanhece, levanto primeiro que Alicia. Hoje eu quero


que seja um dia especial: iremos saber o sexo do nosso filho. Eu tenho
certeza que será um garoto.
Estou na academia me exercitando quando a Luíza, nossa nova
empregada, aparece na porta com o telefone sem fio.
— Senhor Marshall na linha — ela me entrega e sai.
— O que houve, garotinha? — grasno debochado.
— Temos um problema. As câmeras do seu edifício pegaram uma
imagem de seu irmão — Alex fala, e estou totalmente na conversa agora. —
Ele esteve observando seu apartamento durante um tempo, depois foi
embora. Acredito que pode querer fazer algo com Alicia ainda, melhor ter
cuidado.
Filho da puta! Eu devia ter acabado com ele quando tive chance.
— Quer segurança de plantão aí? — Alex oferece.
— Não há necessidade, não saio para deixar Alicia sozinha.
— Fica alerta, Ross.
— Sempre.
Será que isso tem alguma ligação com o telefonema do meu pai ontem?
Bem, espero que não.
Deni
Vejo quando eles entram na clínica do médico de Alicia, e a raiva me
toma. Meu pai só fala nesse neto maldito e o quanto seu filho o orgulha.
Estou inclinado a acreditar que meu pai me odeia.
Mas minha raiva maior está em Bruno, apenas por ele existir. Eu
sempre soube que meus pais não me amavam como amava seu filho mais
novo. Sempre era tratado diferente depois que ele nasceu. Mas agora tenho
algo em mente que irá deixar meu papai orgulhoso do seu filho mais velho.
Bruno não existindo, eu fico com sua mulher e filho; simples assim.
Ninguém nunca iria imaginar o que eu o fiz ou mandei fazer. Sumir com
Bruno de uma vez por toda e "encarecidamente" assumir seu filho e mulher.
Eu só tenho que agir...
41
Bruno
— Oh, meu Deus! Que lindo, querido! — Alicia exclama amorosa e
escandalosamente quando Allan para a ERA da ultrassom para ver o sexo do
nosso filho.
As lágrimas descem abundantes por seu rosto vermelho de alegria.
Minha fria cliente de outrora agora está lindamente exultante com a imagem
na tela. Completamente tomada de um amor que irradiava por cada poro de
sua pele lisa e que faz minha boca aguar com vontade de saborear cada
pedacinho dela.
— Linda, você quer dizer, não é, mamãe? — Allan diz sorrindo.
— O que você quer dizer com isso? É um garoto!! — digo me
inclinando para ver melhor — Estou vendo algo pendurado ali — aponto para
tela na minha frente.
Não pode ser uma garota, isso é demais para minha sanidade mental.
Futuro pai de uma garota? Oh, merda! Onde deixei a porra da minha pistola?
— Você quer dizer esse dedinho aqui? — Allan localiza uma
mãozinha.
— Não, volte para baixo. Vi algo comprido balançando lá! — aperto
meus olhos, tentando localizar o instrumento inexistente do meu filho.
— Ah! Sim, o cordão umbilical!! — ele provoca, sorrindo mais ainda.
Alicia está praticamente tendo convulsão de tanto rir.
— Ah, amor, sinto muito, você será pai de uma menina linda.
— Absurdo!
— Não diga isso, Bruno — ela reclama, mas tem um sorriso tão lindo
no rosto que parece dividido em dois.
— Ainda acho que vi um membro ali pendurado. — insisto — Era
grande como os dos homens da família Ross.
— Sim, sim, dois membros, as perninhas da bebezinha são bem fortes
— ele graceja comigo. Realmente sou uma aberração. — E seu coração
também. Conforme-se, Bruno, não foi dessa vez — Allan diz e tira foto da
nossa nenê que está se mexendo com movimentos estranhos para mim, no
útero de Alicia — Tudo está perfeito, Alicia. Continue indo assim e nascerá
uma garotinha mais que saudável — Allan entrega guardanapos de papel para
ela limpar a barriga, mas assumo isso, limpando cada coisa pegajosa que está
em sua barriga proeminente.
— Bruno, sinto que não é um garoto como desejava — ela diz baixinho
— Mas eu não me importo o que seja, o importante é que nasça saudável.
— Hey! Estava brincando com isso. Não importa, amor, agora serão
duas para me manter na linha. — me curvo e beijo sua barriga — Argh! Isso
é frio e nojento — sua barriga pegajosa me faz mudar meu foco de beijos.
Beijando seus lábios, ajudo-a a colocar sua roupa de volta. — Quero que ela
seja parecida com você, esses cabelos pretos e olhos lindos!
— Oh, céus, comigo não!
— Realmente, seu gênio não, amor! — ela bate em meu braço e eu rio
quando beijo a ponta de seu nariz — Não importa, amarei qualquer coisa que
venha de você, bebê. Você é minha. E nossa filha será mais do que bem-
vinda.
— Oh, eu te amo tanto. — lágrimas descem por sua face, fazendo meu
coração se contrair. Mesmo sabendo que são lágrimas de felicidade, não
gosto da minha garota chorando. — Obrigada por existir, senhor Ross. Amo
você mais a cada dia. Sabe disso, não é?
— O que seria de você sem mim? — gracejo, fazendo-a esquecer as
lágrimas.
Pouco depois estamos sentados em frente ao médico, recebendo
conselhos para a nova etapa da gravidez. Estou feliz para caralho! Mesmo
querendo um garoto.
— Alicia, você está liberada para algumas atividades leves, não fique
tão parada até o parto — ele diz — Não vá a nenhuma maratona e estará tudo
certo.
— Allan, sei que maratona está fora das atividades, mas diga-me —
sorrindo largamente, me inclino para o médico — Sexo pode?
— Bruno!
— O quê? Por acaso você não está com vontade? — viro para uma
Alicia vermelha ao meu lado — E não me diga que não, ontem mesmo você
estava me apalpando em pleno jantar com nossos amigos.
— O quê? — ela está de olhos arregalados, indignada — Você que
colocou minha mão lá.
— Sério? Não me lembro disso, apenas de sentir sua pequena mão me
apertando deliciosamente — Alicia é tão fácil de provocar. Olho para Allan,
que está sorrindo olhando para nossa interação. — Allan, como um bom
médico que sei que você é, diga-me se posso atender minha mulher, ela está
voraz e me atacando em público.
— Oh, Deus! Juro que acabo com você, Bruno Ross — ela fala
indignada. Eu apenas faço um gesto para o bom doutor, como quem diz:
"estou te falando".
— Nesse caso, aconselho algumas pequenas atividades, mas nada que
quebre as paredes ou destrua as camas — ele diz — Não vejo nada que
impeça sexo cuidadoso. Qualquer dúvida pode me ligar.
— Oh, não será necessário, a última coisa que irei pensar é em você,
Allan — Alicia agora é um lindo caqui de tão vermelha que está ao meu lado.
— Você já tem feito por nós mais que um médico faz por seus pacientes.
— Alicia, além de minha paciente, tornou-se uma amiga. E você
também, Bruno. — ele estende a pasta onde tem fotos e a gravação da
ultrassonografia. — Aqui.
— Obrigada, doutor — Alicia pega os objetos e, depois de mais
algumas recomendações, Allan dá por encerrada a consulta, então levo Alicia
para o carro.
Querendo comemorar as boas notícias, de que não há nada de errado
com o bebê, levo Alicia para fazer algo que ela tem desejado como uma
lunática: ir à empresa onde Marcos, junto com um novo gerente, tem
assumido toda administração. Eu não permiti que Alicia fosse lá, certamente
ela não cumpriria as recomendações médicas de ficar quieta em repouso. Sou
um tirano, pode acreditar. Sorrio, pois sei que isso para ela é melhor que um
diamante raríssimo.
— Aonde vamos? — ela se encosta no banco esfregando a barriga, um
ato inconsciente que ela faz a cada minuto. — Estou morrendo de fome.
— Logo verá, bebê — estendo minha mão e acaricio seu joelho. Levo
um tapa na mão, fazendo-me retirá-la imediatamente.
— Tarado! Depois sou acusada de assedio sexual! — ela diz, me
fazendo gargalhar — Como ousa dizer aquilo, Bruno Ross? Que mentiroso!
Sou a única que foi assediada pelo senhor.
— Lembro-me de uma mão me apalpando — estou rindo quando, cerca
de quinze minutos depois, paro o carro na frente da pequena empresa de
eventos de Alicia.
— O que estamos fazendo aqui? — Ela já tem a mão na maçaneta da
porta, abrindo-a.
— Espera, vá com calma — digo segurando seu braço, impedindo que
ela saia. Saio em seguida e ajudo-a a sair do carro, guiando-a para dentro de
prédio.
— Achei que você gostaria de dar uma passada aqui hoje — com
minha mão em sua cintura, me inclino para beijar sua fronte, sussurrando: —
Depois podemos comemorar só nós dois.
— Obrigada, querido, você é o melhor — ela para e fica nas pontas dos
pés para alcançar minha boca. Beijando-a de volta, gemo em deleite. Seu
sabor me deixa louco.
— Bebê, não faça assim — dou um passo para trás — Podemos ser
presos por atos ilícitos na rua.
— Não estamos na rua, estamos em meu próprio prédio — ela olha ao
redor e fica rubra quando vê seus próprios funcionários nos observando. —
Oh, Deus, Bruno! Você está quebrando todos os recordes de me fazer passar
vexame hoje.
— Não tenho culpa se você não resiste a mim, querida — piscando, a
puxo o resto do caminho para cumprimentar seus funcionários.
Ao longo da próxima hora, ela parecia uma criança em festa de doces,
se inteirando de todo o andamento dos eventos agendados enquanto
conversava com Marcos e o novo gerente.
Aproveitei e fiz algumas ligações. Eu precisava terminar algumas
coisas inacabadas com meus pais. Ver minha filha hoje, através daquela tela,
me fez perceber que não quero um futuro cheio de raiva para ela. Se eu tiver
que ir ver minha mãe e ter uma conversa com ela, é o que farei. Converso
rapidamente com meu pai e digo que irei à sua casa no próximo fim de
semana.
— Traga sua namorada com você — ele pede.
— Por quê? Está planejando um novo sequestro? Ela não pode — digo,
seco. Ele que não pense que pode chegar perto da minha filha ou de Alicia.
— Pensei que isso já estivesse resolvido, filho.
— Longe disso. Assustar e colocar em risco a vida do meu filho foi
imperdoável — corto de maneira nada agradável — A única coisa que me faz
ainda falar com você, é você continuar se mantendo longe dela.
— Tudo bem, não quero que desista de vir ver sua mãe. Só era uma
ideia para que nós a conhecêssemos melhor. E para que eu possa me
desculpar pela forma que a tratamos.
— Não se preocupe com isso, ela não se importa com vocês — suspiro
entediado com essa merda de conversa — Tenho de desligar.
Desligo sem esperar resposta. Quero me manter distante, pois quando
os federais caírem em cima não quero associações com qualquer um deles.
Depois de mais duas ligações, volto para perto de Alicia.
— Está na hora de irmos. Você parece cansada, e ainda temos outro
lugar para ir — passo meu braço ao redor dela e olho para Marcos — Queira
nos desculpar, mas Alicia ainda não pode se cansar muito, e voltar a trabalhar
está fora de questão por enquanto.
— Poderia sim, tem serviços aqui que não irão me matar, você sabe —
ela me contradiz — Agora, se você é do tipo machista que não permite
mulher trabalhar, é outra história, senhor Ross.
— Eu? Machista? Sinto-me abalado com essa acusação — rio
cinicamente para ela — Amor, o trabalho pode esperar.
Merda, ela tinha razão. Eu a prefiro em casa por pura razão machista
mesmo, mas nada tem a ver com ela não trabalhando. Tenho um tipo de
trabalho específico para a viuvinha.
— Tudo bem, temos dado conta, apesar de muitos clientes estarem
sentindo sua falta porque você tem um jeito especial com eles — Marcos diz
— Não se preocupe, Alicia!
Alicia
Trazer-me aqui foi um gesto maravilhoso de Bruno, isso prova que ele
está sintonizado com meus profundos desejos. Que esses meses de
convivência tem feito ele me conhecer.
— Obrigada por isso — digo quando saímos mais tarde e ele me leva
para um almoço em comemoração de mais uma nova etapa com meu filho
bem em meu corpo.
Filha! Sinto os olhos encherem de lágrimas. Nunca chorei tanto na
minha vida como tenho feito de um tempo para cá. Cada vez que penso sobre
a minha vidinha dentro de mim, as lágrimas vêm sem que eu tenha controle
sobre elas. Mas não me importo, porque são lágrimas de alegria, felicidade e
um emaranhado de sentimentos que mais parece um cocktail de emoções.
Amor de uma maneira tão pura que sinto meus pelos eriçarem de tão
envolvida que estou nisso, em estado de "fofura" o tempo inteiro.
Eufemismo dizer que o homem ao meu lado é, em sua maioria, o
responsável por parte dessa felicidade e amor. Bruno fez meu mundo tornar-
se belo, e tudo passou a fazer sentido em minha vida.
O restaurante é simples e convidativamente familiar. Olhando ao redor,
fico imaginando por que ele me trouxe aqui.
— Tudo bem? — Oh, Deus, ele não para de perguntar isso a cada
minuto!
— Ross, seu cuidado comigo é tocante — digo — Mas você é tão
exagerado.
— Não é exagero, é só cuidado com você e nossa filha.
Uma garçonete chega ao lado da nossa mesa e entrega um cardápio,
dizendo que virá logo em seguida anotar nosso pedido. Quando ela nos deixa
a sós, digo:
— Por que me trouxe aqui exatamente? Poderíamos almoçar em casa,
não quero sair da minha dieta.
— Alicia, você ainda precisa trabalhar seu lado megera — ele ri,
fazendo meu coração dar cambalhotas; amava seu sorriso — Eu quero apenas
brindar a nós. Nossa pequena família. A você e a pimpolha que vem por aí.
— Oh, você é tão fofo, Ross.
— Fofo? Você acaba com minha masculinidade! Sou todo macho,
amor.
— Disso não tenho dúvida! Mas sério, há um motivo especial para vir
aqui?
— Nenhum motivo escuso, apenas um momento fora de casa para
comemorar a boa saúde de nossa filha — ele encosta na cadeira e me olha
com amor visível em seus olhos cobalto — Você me faz feliz, Viuvinha.
— Prostituto, esse nome ridículo não tem mais graça — rio apesar do
mau gosto dele — Isso é mórbido!
— Ah, não, José de Alencar me inspirou para esse apelido — ele
garante sério, me fazendo rir.
— Sério isso? Vai culpar o coitado por esse mau gosto?! — exclamo
com fingida exasperação.
— Ora, se ele pode ter uma viuvinha, eu posso ter a minha também —
fazendo sinal para que a garçonete venha anotar nosso pedido, continua: —
Mas ele não era tão sortudo assim igual a mim, bebê.
— Oh, definitivamente fofo, Ross, mas te amo assim mesmo —
gracejo.
Durante o almoço, ele continuou bem descontraído com suas gracinhas,
me fazendo rir. Era tão bom relaxar e aproveitar este momento único com ele.
Sinto-me feliz como nunca estive antes.
42
Bruno
Hoje os caras estão reunidos em um encontro de bebedeira de final de
sexta-feira e, como parte da turma, estou aqui, mesmo que minha cabeça
esteja em casa.
Eu estou um merdinha sentimental, quem diria isso? Meu Passado me
Condena, esse sim é o nome de filme de Hollywood para minha vida antes de
Alicia, mas hoje estou para Meu Presente é Minha Perdição. A mulher me
tem enrolado em seu dedo e vem outro dedinho para me dominar, mas eu sou
apaixonado pelas duas de qualquer maneira.
O bar onde estamos possui dois ambientes: strippers dançando em cima
de um palco de um lado e do outro tem telas de TV’s onde passam jogos e
notícias, que é onde estamos agora. Que nossas mulheres não saibam onde
estamos hoje ou estaremos em maus lençóis. Carl é o único solteiro aqui. E
ele está bebendo um drink atrás do outro.
— Bruno, você está com a cabeça onde? — Benacci pergunta,
acertando meu ombro com um soco — Deixa aquela mulher em paz uma
noite!
— Foda-se — digo quando volto minha atenção para os babacas na
minha frente — O quê? — pergunto, pois todos estão me olhando como se
estivessem esperando uma resposta que eu não sei qual é.
— Queremos saber quando será o grande dia — diz Alex bebendo sua
cerveja.
— Grande dia de quê? Perdi algo? Tem um grande cliente que
precisamos trabalhar que eu não sei? — fico confuso, já que não sei que porra
significa o grande dia. Os caras caem na risada. — Falem logo, seus imbecis!
— O grande dia do seu casório — esclarece Carl com a voz um pouco
arrastada — Estamos prontos para sermos os padrinhos, basta dizer o dia que
estaremos lá. Para consagrar o amor!
Casamento.
— Humm — começo — Bem, ainda não sei, outro dia quase a pedi em
casamento durante um almoço, apenas não fui até o fim. Levei-a lá para pedir
que casasse comigo, porém voltei atrás. Ela merece flores e todas essas coisas
de romance, apenas não sei o que fazer. — digo virando o resto de minha
bebida e sinalizando para mais uma ao garçom — Alicia não estava pronta
naquele momento, de qualquer maneira.
— Você perguntou para ela? Talvez seja você que não queira casar,
Ross, que não está pronto — Alexander sugere — Ela talvez não queira nada
disso. Um simples pedido pode fazer o mesmo efeito que um anúncio no
telejornal.
— Boa ideia, Alex — Benacci ri do outro lado da mesa — Isso é
original, hein! Se quiser ajuda, estou aqui.
— Vocês todos viraram uns babacas sentimentais — diz Carl, nos
surpreendendo. Ele sempre permanece calado quando o assunto é mulher —
Supervalorizam o amor quando ele nada mais é que um rótulo para justificar
tanta baboseira e, no fim, não dá em nada. Absolutamente nada!
Own! Alguém está amargurado hoje. Olho para Carl e noto que ele está
bebendo mais que o habitual e, pelas suas palavras, está ficando alto.
— Desde quando você é expert nisso, cara? — Salvatore o encara —
Eu amo minha mulher e isso não faz de mim um idiota.
— Não? Depende da perspectiva, meu caro — Carl retruca e o encara
friamente quando diz: — Não foi ela que matou o seu filho e você continua
idolatrando-a? Para mim isso é baboseira.
Vejo Benacci levantar, e sei que isso pode acabar mal. Fale o que
quiser dele, mas não toque na sua loira platinada. Ele perde a cabeça facinho,
facinho.
— Nunca mais se atreva a insultar minha mulher ou quebro esse seu
nariz empinado do caralho! — Sal murmura furiosamente. Sua raiva está
exposta em seus olhos quando se inclina na mesa para ficar no mesmo nível
de Carl.
— Quero ver você tentar — Carl diz displicentemente, como se
estivesse pedindo por uma briga. Tem algo de errado com ele hoje, isto é
certo.
— Muito bem, meninas, já chega — digo quando coloco a mão no
ombro de Sal, fazendo-o sentar — Fica calmo aí, fanfarrão. Você não quer
que sua loira fique sabendo que estava no bar cheio de strippers e, além disso,
brigando igual um Pit Bull raivoso.
— Algo está errado, Carl? — Alexander deve ter notado também que
algo não estava bem com nosso amigo — Você está precisando de férias,
talvez?
— Quando quiser eu aviso, senhor presidente — diz sarcástico — E
não tem nada de errado comigo.
— Não? E desde quando você anda bebendo? Isso não é seu estilo,
O'Nell — digo e vejo-o ficar tenso na sua cadeira.
— Não interessa — ele resmunga baixo, cheio de sentimentos não
ditos, e volta sua atenção para o copo à sua frente. Ele olha o fundo do copo
como se de lá fosse sair respostas para a fome do mundo.
Depois disso voltamos a conversar animadamente. Eu fico relaxado por
algumas horas, sabendo que Alicia não está só. Matt está com sua irmã, isso
me deixa mais tranquilo para sair com meus amigos por uma noite. Sorrio,
lembrando do quanto ela acabou comigo depois da consulta naquele dia.
A cada oportunidade que estivemos em público, ela dava um jeito de
pôr suas mãos sobre mim. E quando eu começava a entrar no jogo, ela fazia
cara de paisagem e retirava sua mão de minha ereção. Mulher vingativa! Mas
isso era bom, porque eu tinha resolvido que deixá-la excitada contava ao meu
favor.
Novidade, novidade, eu não estou tomando banho frio. Sexo sem
penetração tinha suas vantagens e uma boca pecaminosa também. O
pensamento me deixa meio eriçado!
Na TV, que estava ligada onde passava um jogo, entra o comercial e o
locutor começa a anunciar um concerto musical que irá acontecer amanhã em
algum lugar da cidade. Eu apenas escuto o estilhaço de vidro se quebrando
para depois observar sangue saindo da mão de Carl, que tem a mão ao redor
do copo agora quebrado.
— Que merda, cara! — todos nós levantamos da mesa para verificar o
estado de O'Nell, que está com olhos vidrados na tela da televisão.
Sigo seu olhar e vejo a musicista que fará a apresentação amanhã. Que
diabos significa isso? Volto a olhar para Carl, e nunca vi tanto ódio nos olhos
dele. O cara não sentiu nem o corte em sua mão.
Voltando à realidade depois que a imagem dela some da tela, ele fixa
os olhos na mão ensanguentada, pega um guardanapo e tenta secar o sangue
que não para de sair. Um garçom aparece com uma toalha, que ele enrola na
mão sangrenta.
— Devia ir ao pronto-socorro, O'Nell — Alexander fala.
— É apenas um arranhão! — Carl contesta com raiva contida, depois
fica apático e pensativo. O olhar fixo no vazio.
Ele é o cara mais estranho que já vi. Não conheço muito da vida
pessoal dele, apesar de sermos amigos há algum tempo. Ele mantém a vida
pessoal isolada de todos nós. Hoje foi a primeira vez que o vi perder o
controle assim.
O corte realmente não foi profundo, mas ele deveria ir desinfetar isso,
no entanto ele fica lá sentado sem se mexer por um longo tempo. Depois
desenrola a mão da toalha e levanta da mesa nos deixando estupefatos
quando segue para o outro lado do bar onde estão as strippers e dançarinas
fazendo lap dance. Pouco depois ele tem uma mulher em seu colo em uma
dança que mais parece um acasalamento.
— O que diabos deu nele? — Benacci fala ao nosso lado, onde
assistimos Carl recebendo a dança superquente. Mas é seu rosto que chama a
atenção. É totalmente sem expressão, como se nada o afetasse. Mesmo que a
mulher esteja esfregando a bunda em sua virilha.
— Acho que tem a ver com a mulher do comercial — digo virando
para encarar Alexander e Sal. — O cara pirou quando a viu na TV.
Ficamos nós três confabulando a melhor história para Carl e a musa do
piano.
São duas da madrugada quando saímos do bar. Como todos tomamos
álcool, seguimos para o serviço de táxi. Menos Carl, esse tinha saído à
tiracolo com a dançarina.
Entro no táxi e vou para casa. Não lembro uma época que entrei em um
táxi desses sozinho, depois de ter estado em um bar cheio de mulheres
disponíveis.
Agora, eu tenho uma única para voltar.
Alicia
Os meses seguintes foram lindos com a preparação para a chegada da
minha filha.
Sem que nada tenha sido acordado ou falado, estou morando com
Bruno definitivamente. Ele não fala em casar, mas eu também não toco no
assunto. Para ser sincera, não preciso disso; casamento não é algo que me
atrai tanto. Prefiro viver assim, em harmonia comigo mesma e com um
homem que me agrada além da conta.
Estou indo para um jantar com Bruno, ele diz que será o último que
fará comigo com a barriga enorme. E, sim, minha barriga está tremendamente
gigante, minha filha está enorme. Estou com trinta e nove semanas e posso
ter minha filha a qualquer momento. Meu rosto se divide em um sorriso. É
também meu aniversário, e ele quer que seja especial.
Colocando um brinco de diamante na orelha, observo quando Bruno
vem para dentro do quarto e para atrás de mim. Ele retira do bolso um colar
de pequenas turmalinas azuis esverdeadas e cravejadas com minúsculos
diamantes que brilham para mim.
— Feliz aniversário, bebê — ele beija meu ombro enquanto coloca a
joia em meu pescoço — Seus olhos parecem turmalinas. Esse colar foi feito
especialmente para você. — ele sussurra em minha orelha antes de chupar em
sua boca o lóbulo, fazendo-me tremer e soltar um gemido involuntário.
— Isso não é justo, Ross — murmuro dengosa — Obrigada pelo
presente, ele é lindo! Amei, querido.
— O melhor para você — ele me vira em seus braços e espalha beijos
por meu pescoço e queixo, beijando lenta e sedutoramente o canto dos meus
lábios. — Pronta? — quer saber com sua boca praticamente colada à minha e
sua ereção pressionando minha barriga.
— Muuuito — devolvo maliciosamente quando beijo sua boca. Sua
língua varre a minha boca com ganância sedutora.
Depois do que parece uma eternidade, nós nos separamos ofegantes.
Estamos atrasados para o jantar. Acabo de colocar os brincos de turmalinas.
Eles são discretos e fazem par com o lindo colar. Bruno deve ter gasto uma
fortuna com esses presentes.
O restaurante que fomos me surpreende porque é o mesmo que viemos
meses atrás com nossos amigos. Aquele que tem karaokê a partir de certa
hora da noite e cujo eu não tive a oportunidade de ver Bruno cantar.
Seguimos para a mesa indicada pela recepcionista e fico emocionada
por ver todos ali e mesas conjugadas para que fiquemos todos juntos. Matt e
sua nova namorada, Marcos, Alexander e Lana, Sal e Lili, Carl e Cindy,
todos com sorrisos sinceros para mim. Lágrimas encharcam meus olhos e,
quando sou parabenizada por todos, sinto que irei estourar de felicidade.
Ah, esqueci que Connor está aqui também. Alguns meses atrás, ele veio
se desculpar por deixar Deni me levar naquele dia para casa de seu pai. Eu
não o culpava por nada. Afinal, que culpa ele tem se Deni é um louco? Não
ouvi falar nada a respeito dele mais, melhor assim.
O jantar é cordial e estou feliz por Bruno ter a sensibilidade de convidar
todos para comemorar conosco. Não lembro quando foi a última vez que meu
aniversário foi tão divertido. Ele senta ao meu lado com uma mão grudada na
minha, seu polegar a acariciando todo o tempo. Estamos quase terminando o
jantar quando ele sussurra ao meu ouvido:
— Vou ao banheiro, não fuja daqui — ele levanta e sai. Sigo-o com os
olhos, e quando volto a olhar ao redor, tenho uma plateia me olhando com
olhares risonhos. O quê? Perdi algo?
— Vocês dois são tão lindos juntos — Lana diz, sonhadora — Apenas
perde para o meu Alex e eu, que somos lindíssimos juntos.
— Sim, claro, você não é nada modesta, garotinha! — Alex diz, e todos
riem. A música ao vivo que estava sendo tocada para e uma voz anuncia que,
atendendo a um pedido, o karaokê começará mais cedo essa noite.
— E já temos o primeiro candidato dessa noite a postos — a voz do
homem anuncia — Divirtam-se!
Estou rindo porque irei pedir que Bruno cante hoje, não há como ele
fugir. Uma música começa a tocar. Viro de frente para o palco, pois estava de
lado. A voz familiar começa a cantar

—To really love a woman


(Para realmente amar uma mulher)

Volto minha total atenção quando, passando a primeira parte, uma voz
de Bruno sai do microfone.

When you love a woman


(Quando você ama uma mulher)
You tell her that she's really wanted
(Diz a ela o quanto é desejada)

Oh, Deus! Bruno...

When you love a woman


(Quando você ama uma mulher)
You tell her that she's the one
(Diz a ela que ela é única)

Não aguento mais chorar... ele não devia fazer essas coisas. Mesmo sua
voz não sendo tão espetacular, a emoção contida nela me arrepia e energiza
toda minha alma. Você também é meu único, digo mentalmente para ele.

She needs somebody, to tell her that it's gonna last forever
(Ela precisa de alguém pra dizer-lhe que durará pra sempre)

As lágrimas que tento conter jorram por toda minha face.

To really love a woman


(Para realmente amar uma mulher)
Let her hold you
(Deixe que ela te abrace)
Till you know how she needs to be touched
(Até você saber como ela precisa ser tocada)
You've got to breathe her, really taste her
(Você tem de respirá-la, tem de sentir seu gosto)
Till you can feel her in your blood
(Até senti-la em seu sangue)
And when you can see your unborn children in her eyes
(E quando vir seus futuros filhos nos olhos dela)
You know you really love a woman
(Você saberá que realmente ama uma mulher)

— Case comigo, bebê. Eu apenas sei que amo você. — quando ele
chega perto da mesa, onde vem cantando e quando percebo o que ele vai
fazer, eu levo minhas mãos à boca e meus olhos se arregalam, surpresos. Não
acredito que ele vai fazer isso aqui e agora. Deus, meu prostituto é louco. —
Depois que te conheci, escutei essa música apenas uma vez e disse a mim
mesmo que ele não sabia porra nenhuma sobre as mulheres. Alicia, eu estava
enganado. Quando a gente ama uma mulher, nós dizemos para ela o quanto
ela é única, que é desejada e que permaneceremos juntos não importa o quê.
Então, casa comigo? Você é a única para mim.
Deus, ele realmente fez isso aqui? Tento ficar de pé, mas ele vem para
junto de mim ajudando-me a levantar, e não dou chance nenhuma a ele
quando enlaço seu pescoço com meus braços, enterrando meu rosto em seu
peito. Meu rosto está quente, devo estar tão vermelha!
— Você não respondeu, bebê — ele diz no meu ouvido.
— Você tinha que fazer isso assim? — eu levanto meu olhar para seu
olhos azuis, olhando o fundo de sua íris que amo tanto — Você também é
meu único. Eu...
Estou paralisada para dizer a palavra.
— Eu o amo mais do que você imagina. Sim, eu caso com você, se me
tirar daqui agora! — digo isso sussurrando para que as pessoas ao nosso redor
não ouçam meu apelo ridículo.
Ele apenas ri de mim, como sempre.
— Não seja boba, são nossos amigos — ele levanta meu queixo e me
beija profundamente, fazendo-me esquecer quem quer que seja.
— Ross, essa é minha irmã. Menos cara, bem menos — a voz de Matt
me faz sair do torpor que estou, essas brumas cor de rosa que estou agora são
muito densas. — Ela precisa de um anel. Eu não acredito que você teve
coragem de cantar, mas não comprou um anel?
— Claro que tem um anel, não faço nada pela metade — ele garante.
Puxando um anel idêntico ao meu colar e brincos, ele segura minha mão,
onde o enfia no meu dedo. — Agora não pode mais mudar de ideia.
— E quem disse que vou?
Agora somos os dois parabenizados por nossos amigos. Champanhe é
aberto em comemoração, e brindo com minha água.
— Você não é tão terrível cantando — digo para ele depois que as
coisas voltam ao normal na mesa. — Você planejou isso?
— Claro que sim — ele me puxa mais para perto, depositando beijos
em meu ombro desnudo. Meu vestido azul turquesa de um ombro só foi feito
para acomodar minha gravidez.
A noite acabou sendo perfeita. Quando finalmente todos caminhamos
para fora do restaurante, não imaginei que minha noite pudesse me abalar
mais que tudo que tinha acontecido até então. No entanto, me enganei.
Caminhamos para o estacionamento, mas todos paramos quando vimos
Deni encostado ao carro de Bruno.
— Ora, ora, se não é a turminha da Mônica! — ele ri da própria piada.
Está bêbado? Ele cambaleia para frente, fazendo todos ofegarem quando
percebemos a arma em sua mão. Ele aponta para Bruno e eu paraliso.
Deus, não!!
— Então, irmãozinho? — ele arrasta as sílabas grosseiramente. Seu
terno de grife está um pouco abarrotado, sua semelhança com Bruno está
longe de ser vista agora, pois a carranca dele deforma suas feições que são
tão parecidas com a de Bruno. — Pronto para dizer adeus à sua filha? À sua
namorada?
— O que você está fazendo, Deni? — a voz de Bruno, por mais dura
que esteja, tem uma nota de pânico, e sei que é por mim, que ele teme por
nossas vidas, minha e de nossa filha. — Solte essa maldita arma.
Deni ri. Estou tremendo tanto que minhas pernas falham debaixo de
mim, fazendo-me segurar o braço de Bruno com tanta força que devo o estar
machucando. Sinto alguém se aproximar de mim do outro lado, mas não
tenho coragem de tirar meus olhos do louco à minha frente.
— Eu vou soltar quando você estiver morto, seu maldito imbecil!
Quando você desaparecer e nosso pai deixar os negócios enfim para mim. Ter
o controle de tudo sem interferência do filho mais novo idiota que não quer
assumir nosso negócio, mas que ele deseja tanto isso de você que fica cego
para mim, que estou sempre fazendo tudo por ele! — ele berra furioso,
gesticulando com a arma. Cada vez que ele a aponta para nós eu tenho um
pequeno enfarto.
— Eu que assumo riscos, dou minha cara a tapa por nosso legado, e
você, o que faz? Ah, simplesmente abandona tudo e vai embora, esquece que
tem uma mãe e todo o resto, mas, mesmo assim, ele quer você lá para ser a
porra do mandachuva do negócio que fiz questão de aprender desde cedo.
Você apenas joga isso na nossa cara. Esnoba! Então, quando você não existir,
ele me fará o único herdeiro do que já me pertence!
— Você é um doente, Deni! — Bruno tenta me empurrar para trás dele,
mas eu finco meus pés no chão, não permitindo que ele se faça de escudo
para mim.
— E você é um fodido babaca, irmãozinho — ele rosna, e sua raiva é
tão latente.
— Bruno?! — chamo, porque estou perdendo os sentidos. Não quero
distrair Bruno para que ele venha a se ferir por minha causa.
As coisas parecem acontecer em câmera lenta quando eu simplesmente
apago de nervosismo. A última coisa que vem em meu pensamento é a minha
filha.

Eu acordo para dar com luzes passando rápido por cima de mim e
vozes alteradas ao longe. Eu tento voltar à realidade, mas não consigo sair
desse limbo entre a consciência e a inconsciência.
43
Bruno
Estou apavorado quando pego Alicia nos braços e entro no carro com
Connor dirigindo como um louco e a buzina escancarada para os motoristas
abrirem caminho.
Ainda bem que existe um hospital a poucos quarteirões de onde nós
estávamos. Chegamos em pouco minutos, e ela é levada para ser atendida o
mais rápido possível. Quando ela desmaiou praticamente aos meus pés, eu
entrei em pânico achando que Deni havia atirado nela e não visto, apesar de
não tirar os olhos dele.
Maldito louco! Mas o desmaio de Alicia veio a calhar, sua distração foi
suficiente para que Carl dominasse o idiota. Eu estava muito ocupado
pegando Alicia em meus braços para me importar com qualquer outra coisa
ao redor.
Ando de um lado para outro na sala de espera onde estão chegando
nossos amigos, menos Alexander e Carl. Benacci entra junto com Lillian e
Lana. Matt e a namorada vêm logo depois, e ele parece tão apavorado quanto
eu.
— Como está minha irmã? — indaga quando chega perto.
— Sendo atendida, ainda não sei como está — digo voltando a
caminhar de um lado para outro. Agarrando meu telefone, e disco o número
do meu pai, que atende quase que imediatamente.
— Eu te pedi para deixar seu maldito cão de guarda longe de Alicia! —
eu esbravejo e saio para outro corredor quase vazio do hospital — E você
simplesmente não o manteve na coleira. Se algo acontecer com ela, eu juro
que vocês todos irão pagar por isso.
— Do que está falando, filho? — ele pede.
— Estou apenas avisando, senhor Ross — enfatizo nosso sobrenome,
pois sei que ele detesta quando o chamo assim. — Ligue para seu filho.
Desligo o telefone e volto para a sala onde tudo parece igual a um
minuto antes.
Eu estive com meu pai meses atrás, fui lá conversar com minha mãe, e
na ocasião pedi que se mantivesse longe de Alicia, pois sei que não quero
minha mulher e filha contaminada por ele, mas isso hoje foi demais.
Ver minha mãe e conversar com ela não mudou muito o conceito de
família desajustada que eu tinha sobre a minha, penso enquanto me perco nas
lembranças do dia em que finalmente fui visitá-la.

***

Eu paro o carro na frente da casa da minha família e respiro


fortemente. Isso poderia ser pior.
Seguindo para dentro, já encontro minha mãe esperando por mim na
sala. Ela parece elegante como sempre, mas tem um ar melancólico em suas
feições que me abalam um pouco por ter sido tão duro com ela todos esses
anos. Quando digo duro, foi por não falar com ela quando fez algumas
tentativas de termos um diálogo. Porém estou aqui agora, e isso é muito para
alguém que prometeu a si mesmo que não voltaria jamais a essa casa.
No entanto, um homem pode mudar de opinião, afinal ela é a mulher
que me trouxe ao mundo, e apesar de tudo a amo, mesmo quando isso me
machuca para caralho!
— Mãe — digo à guisa de cumprimento — Bom ver você.
Ela caminha em minha direção e envolve seus braços em torno de mim.
Eu fico duro no lugar, sem coragem de devolver o abraço. Quando ela
percebe minha falta de reação, se afasta pedindo:
— Desculpe, filho. Eu só quero abraçar você, faz tanto tempo — tenho
um nó em minha maldita garganta. As mãos dela estão trêmulas quando me
convida para sentar. — Você quer algo para tomar?
Não sou uma maldita visita de clientes do papai, tenho vontade de
dizer.
— Não, estou bem — sentando no sofá, continuo: — Mãe, não posso
demorar tanto tempo.
— Sim, claro. Como está sua namorada? Espero que o bebê esteja bem
— ela dá um sorriso frágil. — Não tive a oportunidade de vê-la.
— Qual hora você queria vê-la? Quando ela estava sendo ameaçada
por seu marido? — ela se encolhe visivelmente.
— Está atacando sua mãe, Bruno? — a voz do meu pai é como um
chicote permeado de insatisfação pela minha grosseria — Devia ter mais
respeito por ela.
— Tudo bem, eu o entendo — ela me defende — Sou a única
responsável pela atitude dele. Em todos esses anos desde quando você o
mandou embora, não o defendi. Sou a única que não teve a coragem de ser
uma mãe melhor. Que coloquei o amor pelo meu marido na frente do amor
pelo meu filho. Se você me odeia, querido, eu não posso te julgar, você teria
razão. Não te protegi como deveria.
— Não fale bobagens, você não fez nada errado — meu pai vai até
onde ela está e senta ao lado dela, segurando suas mãos — Eu que fiz
quando o mandei embora. Não se culpe assim, querida.
Minha mãe me olha firme quando diz:
— Quero que nos perdoe e volte para casa, filho.
O quê? Sem chance. Perdoar até poderia. Voltar? De jeito nenhum.
— Já tenho minha própria família — escorando meus cotovelos nos
joelhos, me inclino para frente — Mas não se preocupe, não tenho raiva de
você, mamãe, apenas aqui não é mais meu lugar. Não quero que fique
pensando que te odeio, claro que não, eu nunca odiei você. Estava ferido por
sua indiferença quando saí daqui anos atrás, mas agora sou adulto e tenho
minha própria família. Contanto que se mantenham longe de Alicia, estou
bem com isso, apenas não espere que eu venha aqui a cada domingo fazer
uma visita. Não gosto de ser hipócrita fazendo de conta que nada aconteceu
e que vocês não tentaram matar minha mulher.
Olho para meu pai que está de cenho franzido, indicando que não
gosta do que acabei de dizer.
— Vou pedir outra vez a você: mantenha seu filho longe de nós. Eu não
quero problemas, porque isso pode não ser bom para nenhum de nós —
levanto e vou até onde mamãe está sentada, agacho à sua frente e seguro sua
mão na minha.
— Você quer que eu perdoe você? Então perdoo, mas não deixe Deni
atrapalhar minha vida e serei eternamente grato a você — exagero, mas
beijo o dorso de sua mão e ela se desmancha em lágrimas quando joga seus
braços por meus ombros, me abraçando.
Deixo-a com esse momento, só quero ir embora daqui. Deixá-la em paz
é o que posso fazer. Porra, eu sou a porra de um magnânimo?
Meu pai me olha em agradecimento por acalmar sua mulher. Aperto
meus braços por sua figura, e ela chora ainda mais murmurando desculpas e
desculpas.
Não fique tão satisfeito, meu velho! Penso, olhando seus olhos astutos.
Bem, ele deve ter entendido.

Quando saí de lá, naquele dia, saí com a certeza de que meu pai
manteria Deni longe. Ledo engano do caralho!
***
Benacci me mantém informado do que houve com Deni. Ele estava
agora com os federais. Carl e Alex tinham ligado para eles, que vieram e o
levaram preso. É bom que o mantenham lá ou, Deus, eu não sei o que faria
com ele. Se o desgraçado não fosse meu irmão, já teria estourado seus
miolos.
Agora ele deve estar sendo acusado de tentativa de homicídio, mas ele
tinha meu pai para pagar uma fiança exorbitante por sua liberdade.
Meia hora depois, um médico aparece dizendo que posso ver Alicia.
Ele apenas diz que ela voltou à consciência e que está bem, e nossa filha
aparentemente está bem. Apenas um ligeiro aumento do batimento cardíaco
do bebê, mas que ele já estava entrando em contato com o médico de Alicia,
que eu imagino ser o Allan.
Sigo até uma sala onde ela está sendo mantida e caminho para perto
dela, verificando-a. Ela parece um pouco pálida e assustada.
— Hey!
Beijo sua testa antes de sentar ao seu lado. Pego suas mãos na minha.
— Você está bem?
— Sim. E o seu irmão, o que aconteceu com ele?
— Não se preocupe com isso, bebê — beijo sua mão carinhosamente
— Está preso. — digo apenas.
— Vou demorar aqui? Minha filha está bem? Estava aqui preocupada
com você.
— Sim, um pouco. Allan foi chamado caso entre em trabalho de parto.
Apenas preocupe-se de ficar bem, meu amor.
— Sério? Estou bem.
— Mas eles a querem em um hospital para uma eventualidade, você
passou um susto danado. — suavemente tiro seus cabelos do seu rosto, e ela
fecha os olhos. Lembrando que nossos amigos estão lá fora esperando
notícias, levando e digo: — Volto já, querida.
Volto para a sala de espera e os tranquilizo; agradecendo a todos, os
dispenso para irem embora. Eles acatam depois de saber que Alicia ficará
bem. Menos Matt, que foi ver sua irmã. Depois que eles saem, volto para o
quarto de Alicia.
Allan chegou pouco mais de meia-noite no hospital e depois de
examiná-la disse que era melhor preparar a sala de parto. Ela não sentia dor
nenhuma, mas estava com dilatação, palavras dele não minhas, ele falava
grego para mim.
Ele coloca um cateter em seu braço, dizendo que daqui a pouco ela
começará a sentir dores. Diz isso quando injeta algo no soro dela.
São três horas da manhã quando ela começa a se contorcer de dor, e eu
fico meio sem saber como agir. Odeio vê-la vermelha, suada e gemendo,
assim. Era bom fazer um bebê, mas tê-lo era algo bizarro.
Mesmo com a medicação, Alicia não dilatou o suficiente para o parto
normal, segundo Allan. E, como o coração da nossa filha estava agitado, ela
foi levada para a sala de cirurgia para uma cesariana. Não vou assistir o parto,
não sou tão corajoso, fico do lado da sala afundando o chão com meus
passos. Faz meia hora que ela foi para lá, e estou sofrendo de antecipação
quando vejo caminhando, porta adentro da sala, nada mais, nada menos que
meus pais.
Mas que merda é essa?! Caminho até onde eles estão.
— A única coisa que eu já pedi para vocês foi que Deni ficasse longe
de Alicia, e vocês não fizeram isso — vou acusando sem nem mesmo
cumprimentar. Eu sei que eles não poderiam controlar Deni, mas porra! Isso
era culpa deles mesmo.
— Não podemos controlar todos os passos de seu irmão, Bruno —
papai diz, ecoando meus pensamentos.
— Ah, pode sim, só espero que você não o tire da cadeia agora. — digo
ameaçador — Ou vou esquecer que somos do mesmo sangue.
Mamãe lamenta em voz baixa, mas não dou a mínima.
— Considere feito, filho — Ele diz — Ele permanecerá lá até criar
juízo. Como está Alicia?
— Em cirurgia — mordo as palavras.
Saio de perto deles e volto a andar igual a um leão enjaulado.
Frustração é meu nome. Deus! Como eu queria ter tido a chance de quebrar a
cara de Deni. Sabe quando você sente aquela sensação de impotência? Assim
que me sinto por não ter dado nem um soco na sua cara bêbada.
Segundo Bennaci, ele levou uns bons socos de Carl, que andava meio
violento de um tempo para cá. Bem feito para o filho da puta ganancioso.
Isso me lembra de algo. Vou até meu pai.
— Me tire do seu testamento. Isso para ontem, e deixe apenas Deni
como herdeiro de tudo — digo — Isso tudo é por causa do poder. Poder esse
que nunca quis e nem quero. Dê para ele, assim ele me deixará em paz para
sempre e eu lhe agradeceria muito. Só assim ainda irei ter alguma
consideração por vocês dois.
Ele assente, acatando meu pedido. Bem mais fácil do que do que
imaginei.
Estou prestes a voltar para minha andança pela sala quando Allan sai
com um sorriso. Eu paraliso.
— Ross, parabéns! Sua filha nasceu e Alicia passa bem, apesar do susto
de ontem — ele diz, e tenho de me escorar na parede. Bruno Ross pode
desmaiar a qualquer momento.
— Obrigado, Allan — minha voz sai embargada.
— Daqui a pouco pode ir vê-las — ele volta, e eu sento na cadeira mais
próxima.
Obrigado! Agradeço em pensamento.
Alicia
Estou sonolenta e grogue quando sinto algo macio tocar meus lábios.
Beijos cálidos e macios são colocados em meus lábios e rosto. Mãos
passeiam por meus cabelos.
— Acorde, bebê — uma voz máscula me chama — Sei que você não
quer perder isso.
— Bru... — limpo minha garganta obstruída — Bruno.
— Esse sou eu e nossa filha. Brulícia está aqui! — a voz dele é
recheada de riso.
— O quê? Que raio de nome é esse, Bruno?! — Oh, Deus, o que ele fez
com nossa filha?
— O nome dela, querida — Abro meus olhos e o vejo inclinado para
mim com um pacote rosa nos braços — ela esteve reclamando com o papai
dela que não tem nome.
Ele ri e vejo a malícia em seus olhos azuis.
— Então, estamos chamando nossa princesa de Brulícia — Oh, céus! O
que irei fazer com esse homem provocador?
— Retire esse nome horroroso dela, agora! — exijo, entrando nesse
joguinho dele — Isso é lá nome de gente, ainda mais da minha filha. —
Reclamo.
— Como não é nome de gente? São nossos nomes. Que tal Brunilda?
— Bruno! Fale sério, vai deixar essa garotinha assustada e para sempre
em acompanhamento psicológico.
— Alicia, você é tão fácil de provocar — ele diz, rindo tão largo que
meu peito incha de amor por ele.
Sorrio de volta quando uma onda de felicidade toma conta de mim.
Olhando para o pacotinho precioso no colo dele, eu apenas choro. Oh, cara!
Eu consegui, nós conseguimos ir até o fim.
Entendendo o porquê das minhas lágrimas, ele deposita nossa filha em
meus braços.
— Diga olá para mamãe, meu docinho. — fala amoroso para ela.
— Eu quero dar o nome de minha mãe para ela, Bruno, se você não se
importar — digo quando aperto e sinto o cheiro de bebê da minha filha. Isso
me inunda até a alma, me enchendo de mais amor por esse serzinho especial.
— Claro que não me importo, querida — ele beija meus lábios
suavemente. — Como sua mãe se chamava? Você nunca me disse.
— Valentina.
— Então será Valentina Ross — ele olha com amor para Valentina. —
Tão apropriado para minha guerreirinha mais linda!
— Eu te amo — sussurro para ele — Você me deu o maior presente
que alguém jamais poderia me dar.
— Não fiz nada, bebê. Eu fiquei com a melhor parte disso, que foi fazer
junto com você essa lindinha aqui. — ele nos beija e sorri.
— Então, quando vamos começar a fazer outros? — ele diz cada
palavra levantando as sobrancelhas sugestivamente — Estou contando os
minutos, sabe disso, não é? Eu, você, uma cama...
— Oh! Ela está escutando você falando essas coisas impróprias para
menores — aperto Valentina em meus braços.
Ele ri, me fazendo rir também.
— Estou falando sério, Alicia.
— Sei que está. Eu apenas sei que ele é perfeito para mim.
44
Alicia
— Amor?
Estou amamentando minha Valentina, embevecida de amor e gratidão,
olhando-a sugar com fome.
Ainda estou no hospital, em recuperação das horas de parto. Ontem, a
essa hora, eu estava sentindo tanta dor, mas tudo deu certo, tenho meu
tesouro mais preciso em meus braços. A alegria não cabe dentro de mim, é
tanto amor que tenho medo de ser um sonho.
— Amor? — percebo que Bruno esteve falando comigo e eu mal
escutei. Levanto meus olhos para ele. Está em pé com as mãos no bolso, sua
barba por fazer. Ele não saiu desse quarto desde que eu vim para cá.
— Não te ouvi, querido — respondo — O quê?
— Sim, agora estou em segundo lugar. Caramba, Alicia, fazendo-me
ficar com ciúme de uma garotinha? — ele graceja e vem sentar na poltrona ao
lado — Tenho de te perguntar algo.—Certo, deixe apenas eu colocar essa
garotinha na caminha dela que sou todas ouvidos ao meu segurança favorito.
— digo rindo
— Bebê, sou seu único segurança — ele levanta para pegar Valentina
nos braços, e é tão delicado e cuidadoso com ela que me deixa com lágrimas
nos olhos.
Eu me pergunto, às vezes, por que relutei tanto em me doar inteira para
esse homem. Ele era tão lindo! Eu sempre fui uma mulher que me amava
acima de qualquer coisa, mas meu casamento me levou ao fundo e fez-me
pensar que eu não era capaz, não era uma mulher completa que não teria uma
experiência única de ser a pessoa mais importante na vida de outra pessoa.
Aí vem um playboy mulherengo e me dá um presente lindo, único, que
é minha filha, mas não posso dar crédito a apenas a ele, eu fui a responsável
por isso também; consegui quando não achei que conseguiria. E não posso
deixar de amar esses dois como nunca amei algo na minha vida.
— Prontinho, minha princesa, papai agora precisa conversar com a
mamãe. Seja uma boa menina e não peça para mamar pelos próximos cinco
minutos, sim? — ele está falando com Valentina enquanto a coloca no
bercinho ao lado da minha cama. Estou boba do quão delicado ele é com ela.
Deixando-a lá quietinha, ele vem sentar ao meu lado na cama.
— O que houve? — estou preocupada. Nossa vida ainda corre perigo?
— Nada de mais, amor — ele me olha, segura minha mão e a leva aos
lábios para um beijo cálido — Sei que você pode se recusar a vê-lo, por toda
a situação que minha família criou para você, a colocando em risco, no
entanto meus pais querem muito conhecer a neta deles. Mas só os deixarei a
verem se você permitir, bebê. Você se sente segura e confortável para isso?
— Oh! — eu não tinha pensando nisso, que seus pais poderiam querer
fazer parte de nossas vidas. Não os queria perto da minha filha. Era tão
recente tudo que houve. — Não quero seu pai junto da minha filha, Bruno!
Não confio nele.
— Então irei dispensá-los — ele diz, levantando. Eu agarro sua mão,
parando-o.
— Eles estão aí fora?
— Sim, desde ontem, e querem ver Valentina, mas, como disse, você
decide isso.
— E você quer que eles tenham contato com nossa filha? — pergunto,
porque ele é o pai também e pode muito bem ter sua opinião levada em conta.
— Não quero ser hipócrita e ser o melhor filhinho do meu pai, mas
estou tão feliz que não me importo agora de eles a conhecerem.
— Então tudo bem — sorrio para ele — Só não quero ser amiga de seu
pai também, eles me causaram muito mal junto com seu irmão. Deixe-os
conhecerem a netinha linda deles, a mais linda do mundo inteiro.
— Sim, somos tão fodas, amor, fizemos juntos a bebê mais linda — ele
se gaba, e rimos juntos igual dois tontos. O amor pode fazer cada coisa
incrível!
— Vou os deixar entrar, ok? — ele beija meus lábios e se levanta para
chamar seus pais.
Pouco depois, a mãe de Bruno vem me cumprimentar e parabenizar.
Ela me esquece dentro de cinco segundos quando olha Valentina ao lado.
— Ela é tão linda! — ela suspira, emocionada.
Deni
Faz dias que olho as paredes da cela onde estive trancafiado nesse
último mês. Rio para mim mesmo.
Papai está fazendo tudo que pode para me manter aqui. Ele veio me
fazer uma visita um dia depois que aqueles federais filhos de uma cadela me
colocaram aqui. Veio dizer que eu tinha ultrapassado os limites ao tentar dar
um fim naquele meu irmãozinho de bosta. O tapa que ele me deu vai custar
caro para ele. É só eu sair daqui.
Alexander Marshall teve a audácia de dizer que matei Evan Duran, e
posso pegar alguns anos de cadeia por isso. Ele não perde por esperar.
Ouço a outra cama da cela gemer quando o meu companheiro de cela
se mexe. Odeio isso aqui. Os primeiros dias tive alguns problemas, os
desgraçados acharam que poderiam me intimidar. Descobriram logo que não
podiam, jamais. Bando de imbecis.
Tenho meus advogados trabalhando na minha liberdade, isso é uma
questão de tempo.
Saio da cadeia um mês depois e sou recebido por três seguranças do
meu pai. Eles abrem o carro, não deixando dúvida que tenho de ir com eles.
Eles me levam direto para casa. Esse tratamento nada convencional me deixa
intrigado, e quando sou escoltado para o escritório dele, estou bem chateado.
— Espero uma boa razão para estar sendo tratado como um delinquente
por você, pai — digo assim que entro.
— Sente-se — papai diz e sigo suas instruções. — Eu tinha de ter
certeza de que você iria vir direto para cá.
— Não sei mais para onde iria, já que moro aqui.
— Sabemos que não é bem assim. Mas vamos logo ao ponto. Estou
passando todo o negócio não legal para você, como sempre quis. — ele diz
como se isso fosse grande coisa. A verdade era que sempre estive à frente
disso. Mas tinha de reportar todas as merdas a ele no fim do dia.
— E por que isso agora? — pergunto calmamente — Estranho, já que
fui deixando para apodrecer na cadeia por você. E agora essa generosidade?
— Tenho uma razão, e você não vai levar tudo sem fazer algo em troca.
— E o que seria?
— Vou fazer um documento passando tudo para você, mas tem duas
cláusulas. Primeira: vai deixar seu irmão e a família dele em paz, sem
gracinhas de sua parte. Segunda: se algo acontecer com ele ou sua família,
você perde tudo. E sei que você quer muito dominar o submundo dessa
cidade. Tenho certeza que é maior que sua raiva por Bruno.
Aplaudo. Sua vontade de ficar bem com Bruno deve ser muito grande
para ele estar abrindo mãos de tanto poder.
— Não vai dizer nada? — diz quando apenas fico olhando ao redor.
Bem, vamos ver o quanto ele quer fazer isso.
— Bem, papai, eu aceito, mas essa casa fica comigo também.
— Sabe que essa casa pertence à sua mãe — ele diz
— E daí? Sem casa, sem acordo.
— Tudo bem, posso comprar uma melhor para ela.
— Sei que pode. Mas não terá o mesmo significado dessa. — Sim, eu
sei disso, essa casa pertenceu ao meu avô materno, e vamos ver se ele
convence mamãe de sair daqui. Eu levanto e caminho para a porta.
— Preciso de um banho — rindo, caminho para meu quarto.
Quando termino e saio do banheiro, encontro mamãe me esperando.
— Hoje é o dia da visita ao filho mau? — vou até ela e beijo sua testa.
— Vim dizer para você ficar com a casa. Iremos sair, filho. — Que
merda, eu queria um motivo para acabar com a raça de Bruno. Entretanto,
meus pais estão loucos pela neta. Soube que Bruno era pai de uma menina —
Aceite a oferta de seu pai.
Claro que ia aceitar, meu irmão não valia o esforço. O que eu queria
estava sendo dado facilmente para mim. Eu sou o rei dessa cidade finalmente.
— Claro que sim, mãe — dou um abraço nela e vou me vestir. Tenho
um negócio para administrar. Minha vingança não é tão importante assim.
Posso viver com isso.
Epílogo
Bruno
Seis meses depois...

— Pode ir tranquilo, senhor Ross, ela dormirá até amanhã.


— Tem certeza disso? — olho para a babá da minha filha — Outro dia
eu jurava que ela estava dormindo e que acordaria somente na manhã
seguinte, e mal cheguei á porta do quarto e o grito estridente dela quase me
matou de susto.
— Tenho sim, senhor Ross. Ela dorme igual um anjinho — ela garante
enquanto cobre o corpinho frágil da minha filha com um cobertor.
— Se você diz — digo incredulamente — Me chame, se precisar.
— Vá sossegado, tenho tudo sob controle aqui — eu duvido muito,
minha filha sabe ser imperiosa e brava tal qual sua mamãe, teimosa também.
Claro que confio no profissionalismo da babá, mas todo cuidado era
pouco com minha florzinha.
Depois de uma última olhada nela, caminho para fora do quarto infantil
decorado nas cores rosa suave e branco cremoso e vou para meu próprio
quarto. Faz apenas dois meses que estamos nessa casa nova, mais espaçosa
para minha família. Depois de me livrar das roupas, vou para o banheiro.
Tenho uma noite de luxúria me esperando. Alicia deve chegar daqui a poucos
segundos. Ela estaria aqui antes da meia-noite, mas quando ela diz isso,
sempre chega antes, parece que quer me pegar fazendo algo inapropriado.
Mulher má. Agora são onze e meia, e tenho de deixar tudo pronto para
seduzir.
Alicia
— Dará conta de tudo? — questiono Marcos, que está me olhando feio
agora — Ookaayyy! — levanto minhas mãos em rendição à sua cara de
homem mau.
— Quando passou quase um ano afastada, quem deu conta, senhora
Duran? — ele parece ofendido.
— Você está certo, força do hábito. Então deixarei tudo em suas mãos
capazes. — Olho para os convidados e dou uma conferida geral no salão para
ver se algo está fora de lugar, mas nada parece fora do normal.
Esse é o aniversário de quinze anos da filha de um político, e tudo
parece ir melhor do que imaginei. Voltar a trabalhar tem sido agridoce.
Deixar minha princesa em casa é muito difícil. Transferi parte do escritório
para a nova casa onde moramos e só venho conferir as coisas nos eventos e
geralmente saio cedo. Nada de uma, duas horas da manhã. Isso é coisa do
passado. — Boa noite. Ligue-me logo cedo amanhã.
Cerca de meia hora depois, estaciono na garagem de nossa casa e
desço. Tudo está silencioso e com pouca iluminação. Bruno deve estar no
quarto de nossa filha, mimando nossa garotinha. Ele tem o péssimo hábito de
deixar nossa bebê dormindo em seu peito em vez de na caminha dela. Isso
logicamente faz nossa princesa espernear malcriada quando é deixada para
dormir sozinha.
Não casamos ainda, queremos nossa filha de dama de honra, então
vamos esperar, não precisamos de um papel para nos sentirmos casados.
Haveria algo melhor que o fruto do nosso amor andando pelo corredor da
igreja com nossas alianças? Acho que não. Tenho um sorriso feliz nos lábios
desde o dia que ela veio ao mundo.
Estranho meu querido “marido” não ter vindo me receber. Subo as
escadas para o andar superior onde ficam os quartos e vou direto para o de
Valentina. A cena aqui não é o normal. A babá está pronta para dormir e
minha filha está dormindo em seu berço. Silenciosamente vou até ela e cheiro
sua cabecinha gostosa, tentando não acordar meu anjinho.
— Tudo bem? — pergunto cochichando para Kelli. Ela assente com
um sorriso e volto-me outra vez para Valentina, beijando-a — Boa noite, meu
amor.
Sussurro um boa noite para Kelli e saio à procura de Bruno. Tão
estranho não encontrá-lo com Valentina. Entro no quarto para me deparar
com ele saindo do banheiro secando o cabelo, totalmente pelado.
Fico parada apreciando a vista até ele se dar conta da minha presença.
— How! Bebê, por que sempre atrapalha meus planos para você? —
ele reclama, e segurando as duas pontas da toalha a joga para trás do pescoço,
deixando seu físico apetitoso para minha apreciação.
— Que planos você tinha em mente? — termino de entrar e jogo os
saltos para um lado. Humm, delícia enfiar meus pés no carpete felpudo.
— Planejava uma noite quente para nós — ele faz um beicinho sexy.
Ele é ridiculamente lindo, me olhando com cobiça — Você está gostosa nesse
vestido.
Sim, ele deve estar apreciando meu vestido, porque seu lindo e
delicioso pau está bem acordado me saudando. Oh, sim, ele conhece sua
dona.
— Você ainda pode executar isso — digo com má intenção, e ele vem
para perto de mim e prende-me, jogando a toalha ao redor de mim para me
atrair para seu peito firme, onde gotículas de água me fazem salivar com a
vontade de lambê-las. Não resisto e passo minha língua por seu peito e
mamilo. Minha mão circula seu pênis duro entre nós — O que tem aqui para
mim?
Ele não responde, apenas me beija duro. E eu tenho minha resposta.
Meu segurança favorito sabe fazer suas duas mulheres felizes de maneiras
bem diferente.
— Planejei uma noite de sexo tântrico para nós, mas tinha todo um
clima, velas, músicas... — ele salpica beijos — Mas vou pular essa parte,
vamos direto foder bem forte.
— Tão romântico, amor — debocho quando círculo seu pescoço com
os braços.
— E eu não sei disso? Nunca me imaginei dessa forma, todo
romântico, falando poesia — ele ri, e é tão bonito. Suspiro, mais apaixonada
do que nunca.
Ele me beija e eu me entrego como sempre. Ele me tem desde que veio
para minha vida. E eu amo isso.
O DIA D
Bruno
Nervosismo tem nome e sobrenome. Bruno Quase Casado Ross.
Meu smoking parece apertado no meu pescoço. Ao meu lado,
Alexander e Carl, que têm sido meus amigos desde as forças armadas, estão
me olhando com caras de idiotas, passando o dedo transversalmente na
garganta em sinal de que estou indo para uma morte certeira.
Alex é um hipócrita porque ele é um urso pardo dominado por sua
fêmea. Tenho vontade de rir alto com minhas comparações. Isso deve ser o
nervosismo de estar casando com essa mulher linda, ranzinza e que me leva à
loucura. Eu estava suando frio, e não era culpa do calor, aqui dentro da igreja
estava tudo perfeitamente climatizado. Tive a melhor organizadora para esse
evento.
— Prepare seu coração, Ross — Alex diz, rindo. — Você tem duas
mulheres hoje o dominando legalmente.
— Ainda tem tempo de sair correndo, Ross — Carl rosna do outro lado
— Tem exatamente... — ele olha o relógio no pulso — Uns minutos.
Podemos te dar cobertura.
— Fechem suas bocas! — A voz de Lana vem do banco da frente, onde
ela está sentada junto com alguns dos caras da empresa e meus pais. Meu
irmão não está aqui e nem quero que esteja. Meu ultimato a meu pai é
simples: quer ver sua neta crescer? Mantenha Deni bem longe, e ele tem
cumprido isso até agora. — Alexander, você está com problemas sérios,
grandão!
— Agora eu que posso dizer: cara, é melhor correr, essa menina tem
suas bolas — digo baixo para ele antes de piscar maliciosamente para Lana.
Meu coração da um baque quando a música anuncia a entrada da
daminha de honra. Não caibo dentro de mim mesmo quando vejo minha
pequena princesa em passos trôpegos começando a andar para dentro da
igreja. Alguém vem guiando-a para dentro.
Porra, ela está tão linda em um vestidinho branco, e quando me vê vem
em total disparada. Não me contenho e vou ao seu encontro. Tenho medo que
ela caia, afinal ela começou a andar tem tão pouco tempo. Ela joga a
almofada que traz nas mãos no chão, e eu rio. Minha filha estava nem aí para
essas alianças. Tenho malditas lágrimas nos olhos quando agacho e pego-a
nos braços, quebrando qualquer protocolo de casamento.
— Pa-pa — ela balbucia feliz quando a agarro forte. Ela tem um
sorriso, e seus dentinhos brancos são as coisas mais lindas do mundo. Eu vivo
para esse sorriso. Pode amor demais causar infarto? Juro que tenho uma dor
infernal no meu peito.
— Você foi perfeita, princesa. — eu sussurro para ela quando volto
para o altar e uma música de Beethoven, Love Story, uma das nossas
favoritas, começa a tocar. E a vejo. Minha Alicia não poderia estar mais
linda, perfeita.
— Ma-ma — Valentina aponta, querendo sair do meu colo, mas eu a
perto mais firme, tentando ao mesmo tempo engolir o nó formado em minha
garganta.
Droga! Segure-se, homem, chorar igual a um bebê na frente de sua
filha? Sério? Irei traumatizar minha filha.
— Ma-ma.
— Sim, princesa, mamãe está linda — digo e caminho pela segunda
vez para encontrar meu segundo amor. Ela tem lágrimas correndo pelo rosto
vermelho, seus olhos esverdeados estão brilhantes e aquosos quando
encontram os meus.
— Você está perfeita — sussurro e beijo seus lábios rapidamente.
Valentina me imita e molha sua bochecha com um beijo molhado. — Nós te
amamos. — ela funga e sorri. Vejo que ela quer falar, mas apenas chora.
Dou meu braço para Alicia e caminho de volta para o altar com as duas
mulheres da minha vida.
A cerimônia é feita com nós três juntos no altar, e o choro silencioso de
Alicia ao meu lado só me faz mais feliz, porque sei que ela chora por estar
feliz, e isso traz minha própria felicidade.
Quando o padre manda beijar a noiva, já estou beijando faz um
tempinho. Valentina corta meu barato indo para os braços de sua mãe, que a
pega feliz, apertando nossa garotinha nos braços, e eu só faço abraçar as duas
juntas.
— Eu amo tanto vocês — Alicia diz com voz embargada.
Bem, eu só posso concordar com ela; eu e Valentina somos fáceis de
amar. Sou um charme, vocês sabem. Sou gostoso pra caralho.
— Senhora Ross, você é uma mulher de sorte, tem o homem mais
gostoso do recinto e a filha mais linda.
— Só posso concordar com você, prostituto! — ela sussurra apenas
para eu ouvir.
— Hei, deixei essa vida para trás! — finjo-me indignado.
— Você é meu prostituto, Ross.
— Eu amo ser seu, para sempre...

Fim
LIVRO III
Copyright © 2017 MAYJO

Revisão: Patrícia da Silva


Diagramação digital: MAYJO

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.

Todos os direitos reservados.


São proibidos o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte dessa
obra, através de quaisquer meios — tangível ou intangível — sem o
consentimento escrito da autora.

Criado no Brasil.

A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n°. 9.610/98 e


punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Prólogo

— É apenas um ano, meu amor, depois estaremos juntos para


sempre.
—Prometa-me ligar todos os dias — reclamo mal-humorado. Eu não
queria essa separação agora, queria me casar com ela.
— Sempre. — Ela beija meus lábios e eu a beijo de volta já com
saudade.
— Você nem irá sentir minha falta, logo estarei de volta para você.
Amo você para sempre.
Estão chamando seu voo e eu a abraço tão apertado que ela reclama.
Solto-a com relutância e ela caminha para o avião.
— Espere por mim! — grita antes de sumir pela porta.
Eu esperei, mas não foi ela que voltou para mim.
Suas palavras naquela carta destroçaram todo o amor que já senti na minha
vida por ela. E que poderia sentir por qualquer uma depois dela.
Eu sei cada umas das palavras escritas, porque todos os dias eu leio
para me lembrar de não amar outra vez .
Amor,
Não sei se posso te chamar mais assim, não sei se tenho mais
esse direito, só sei que quando terminar de ler esta carta irá me odiar
para sempre.
Não sei por onde começar... faz alguns meses que nos
separamos com a promessa de nos vermos logo, mas ao chegar aqui as
coisas mudaram, as prioridades mudaram. Você sabe o quanto estar
aqui é importante para mim. Diante disso tenho de me dedicar
totalmente ao meu sonho que é ser a melhor musicista que eu puder.
Amor, saiba que algo dentro de mim está quebrando aos pedaços agora
e nunca terá conserto.
Vou te amar sempre mesmo que eu seja a responsável por
terminar com você. Mesmo que um dia outra pessoa venha fazer parte
da minha vida não terá o mesmo significado no meu coração, mas eu
acredito que amor como o nosso não acontece muitas vezes, isso só
acontece uma vez na vida. Lágrimas estão caindo enquanto dilacero
seu coração, nosso amor foi tão especial para mim, mas a música
tornou-se minha prioridade e tenho de abrir mão de algumas coisas
por ela e umas delas é você. Carl, peço-te não me odeie por isso. Não
me ligue, não mande mensagens, não serei tão forte se você continuar
tentando contato. Eu te amo, mas a música agora é tudo que quero.
Adeus,
Samantha
1
Carl
“A gente destrói aquilo que mais ama
em campo aberto, ou numa emboscada;
alguns com a leveza do carinho
outros com a dureza da palavra;
os covardes destroem com um beijo
os valentes destroem com a espada.
Mas a gente sempre destrói aquilo que mais ama.”
Oscar Wilde

Hoje, sexta-feira, é dia de cerveja com os caras da empresa. Faz


tempo que não fazemos isso, temos tido muito trabalho e estive bastante
ocupado esses dias depois que trabalhei com Bruno no caso de Alicia. Estava
querendo tirar uma folga também, mas a cada dia a empresa cresce mais e
como sócios parece que temos mais trabalho que os outros. Porém, a partir de
amanhã, estou indo trabalhar com um político durante sua campanha, então
está longe de eu ter uma folga novamente.
Saio do banheiro para o quarto e a TV ligada me chama a atenção.
— ...O concerto tinha sido adiado por motivos pessoais, mas Sam
Stollen, como é conhecida no mundo da música, desembarcou hoje no
aeroporto de Guarulhos para delírio de milhares de fãs da pianista...
A voz do repórter penetra meus ouvidos, gelando meu sangue e ao
mesmo tempo fazendo tudo esquentar como se um líquido tivesse sido
injetado nas minhas veias.
— A vida pessoal da musicista é um segredo para o público, mas
ultimamente ela tem sido vista com o tenor italiano Pietro Baldon. Más
línguas afirmam que os dois podem anunciar um casamento em breve...
Entretanto, são apenas especulações... mais informações sobre o concerto
você encontra no site...
Enquanto ele estava falando, as imagens dela vestida elegantemente
de braços dados com um almofadinha engomado surgem na tela.
As imagens queimam minhas retinas e quero apagá-las da minha
mente.
Na escuridão e amargura é onde vivo desde que ela me deixou. Pegou
meu amor e jogou de volta na minha cara. Um homem pode ser o mais forte
dos homens, entretanto quando ele resolve dar seu amor a uma única mulher,
ele faz isso completa e irrevogavelmente. Então, essa mesma mulher decide
te magoar da pior forma possível. Pega esse amor, pisa em cima, dilacera sua
alma e vira as costas para você, quando tudo que disse se transforma em uma
coisa feia e amarga. Suas lembranças de momentos felizes perdem sua cor,
sua verdade, seu verdadeiro significado.
Estou em completo estado catatônico parado no meio do meu quarto
olhando para a televisão de plasma na parece. A toalha esquecida na minha
mão no ato de secar meu peito desnudo. A imagem na tela me mantém preso
ao chão. Eu tinha esquecido o como essa mulher era linda e quanto poder só
o nome dela tinha sobre mim. É como uma injeção de adrenalina em minhas
veias, nem a mais perigosa missão nas Forças Armadas fez meu coração bater
feito um alucinado cão raivoso no meu peito. Quero a porra do pescoço dela
torcido entre minhas mãos por ser minha fraqueza e ainda amar cada pedaço
daquele corpo delicioso. Lembranças vêm com tudo em minha mente e tento
sem sucesso apagá-las, mas essas imagens desencadearam meu próprio banco
de imagens particulares que mantive por anos guardado à sete chaves em meu
cérebro.
— Carl? — a voz angelical e delicada chama meu nome com doçura
e amor.
— Hummmm — meu resmungo sai abafado pelo travesseiro onde
tenho minha cabeça enterrada. — Você acabou comigo, princesa. Estou sem
forças.
A risada cristalina me faz virar para encontrá-la inclinada em cima
de mim. Uma cortina de cabelos castanhos claros moldura seu rosto risonho
e lindo. Amo seu cabelo sedoso, tem cheiro de shampoo, um cheiro limpo e
rico que embriaga meus sentidos. Amor me invade tão intensamente que
meus olhos ardem em lágrimas contidas. Sim, ela me faz assim,
irrevogavelmente apaixonado. Eu sou completamente louco por essa menina.
Devia ser internado porque isso às vezes é obsessivo, o quanto quero passar
o dia abraçado a ela. Exatamente como quero fazer agora.
— Você ainda está vivo, meu amor? — Ela abaixa a cabeça e beija
meus lábios suavemente. — Isso foi incrível!
Sim, quando fazíamos amor era de abalar a terra, isso se deve ao fato
de que colocamos todo nosso amor no ato. É intenso, fogoso, cru e
extremamente suave.
— Te amo...
— Te amo em dobro — ela diz, voltando a me beijar e eu esqueço de
respirar quando a agarro e rolo ficando por cima dela, intensificando e
aprofundando o beijo, nossas línguas dançando juntas, sensual e
eroticamente. Gememos quando o desejo nos domina mais uma vez. Não
demora muito para estar enterrado dentro dela, amando, respirando e
sugando as delícias que ela me faz sentir...
*
Dor queima meus pulmões quando percebo que estou sem respirar
com as lembranças de suas mentiras. Amava em dobro? A mentira mais
deslavada que ela disse para mim. Eu sinto vontade de magoá-la da mesma
forma que ela me destruiu.
Saindo do torpor, sigo para pegar uma roupa casual, terno está fora de
cogitação hoje. Jeans e camiseta são mais que perfeitos, raramente tenho
oportunidade de vestir-me com algo assim. No nosso trabalho estamos quase
sempre de ternos escuros, para nos manter o mais discreto possível.
Depois de pegar carteira e chave do meu carro, saio de casa para
tentar esquecer toda essa novidade nada boa para minha paz de espirito.
Chego ao bar e os caras já estão lá. Bruno, Alex e Salvatore. E como meu
humor negro está em alto nível hoje, começo a tomar whisky um atrás do
outro. Os caras ficam falando de suas mulheres e isso me irrita tanto que me
sufoca.
— O grande dia do seu casório — digo com a voz um pouco arrastada
pela quantidade de bebida que tenho ingerido desde que cheguei. — Estamos
prontos para ser os padrinhos, basta dizer o dia e estaremos lá. Para consagrar
o amor!
Ironizo com as merdas apaixonadas de Bruno, o galinha mais notório
da Marshall, caído de amor chega a ser cômico se não fosse trágico. Ele não
sabe que essa mulher pode destruir a porra do coração dele se ela quiser? Eu
não acredito mais em mulher alguma, todas falsas e mentirosas que dizem te
amar em dobro e te apunhalam pelas costas quando você não está olhando.
Tudo por culpa dela. A maior mentirosa de todas. Falsa e tão linda. Sou um
amargurado de coração de gelo, devia seguir em frente, mas meu coração
masoquista não deixa. Que merda! Tudo hoje aflorou de uma forma que não
acontecia há anos desde que ela foi embora.
Fico calado quando eles continuam falando, mas explodo em certo
momento.
— Vocês todos viraram uns babacas sentimentais — escarneço. —
Super valorizam o amor quando ele nada mais é que um rótulo para justificar
tanta baboseira e, no fim, não dar em nada. Absolutamente nada!
— Desde quando você é expert nisso, cara? — Salvatore me encara.
— Eu amo minha mulher e isso não faz de mim um idiota.
Salvatore é suspeito para falar, porque, convenhamos, ele é dominado
pela nossa assistente na Marshall.
— Não? Depende da perspectiva, meu caro. — Encaro-o friamente.
— Não foi ela que matou o seu filho e você continua idolatrando-a? Para
mim isso é besteira.
Benacci se levanta inclinado em minha direção, furioso por eu ter
ofendido sua mulher, mas eu quero que ele me dê um soco, talvez assim sinta
alguma dor e essa outra dor saia do meu peito. Estou igual essas pessoas
invejosas que não podem ver outras pessoas felizes por não terem a mesma
coisa. Sim, eu perdi tudo isso muito anos atrás, agora sou apenas um caco
vazio, frio e sem emoção. Ou tenho emoção demais. Mas por fora ninguém
diz que vivo com um turbilhão dentro de mim.
— Nunca mais se atreva a insultar minha mulher ou eu quebro esse
seu nariz arrogante do caralho! — Sal diz baixo e contido, mas é como se
quisesse me matar.
— Quero ver você tentar — digo displicentemente para provocar.
— Muito bem, meninas, já chega — Bruno interfere e coloca a mão
no ombro de Sal fazendo-o sentar. — Fica calmo aí, fanfarrão. Você não quer
que sua loira fique sabendo que estava no bar cheio de strippers e, além disso,
brigando igual um Pitt Bull raivoso.
— Algo está errado, Carl? — Alexander me olha com cuidado. Ele
tem sido meu amigo e sócio há muito tempo, mas nenhum desses caras
conhecem esse meu lado amargo ou, se têm ideia, não comentam. Pelo
menos, não comigo. — Você está precisando de férias, talvez?
— Quando quiser, eu aviso, senhor presidente — digo sarcástico.
— E não tem nada de errado comigo.
— Não? E desde quando você anda bebendo? Isso não é seu estilo,
O'Neal — Bruno diz e tenciono em minha cadeira.
— Não interessa — resmungo baixo. Olho para o copo na minha
frente e não vejo lá as respostas que tanto procuro. HOJE ESTÁ SENDO UM
DIA DE MERDA!
Como para me insultar mais ainda, a TV do bar começa uma porra de
anúncio do concerto dela. Estou tão vidrado olhando para as imagens que não
percebo que estou apertando o copo em minhas mãos até que sinto a picada
de dor quando o copo espatifa entre meus dedos.
— O que deu em você, homem? — um dos caras pergunta, mas não
sei quem. Minha visão e audição estão afetadas demais, raiva irradia de mim
em torrentes me envenenando.
Praguejo furiosamente, e enrolo a mão em um lenço. Meus amigos estão
preocupados comigo, mas não dou ouvidos para seus questionamentos.
Pouco depois estou do outro lado do bar com um novo copo de whisky e uma
dançarina me dando um lap dance erótico. Quero esquecer o dia de hoje.
Quero apagar as lembranças que vêm rolando na minha cabeça desde que a
vi, mais cedo, na TV.
Uma menina loira e outra morena estão rebolando em cima de mim.
Eu apenas quero empurrar as duas e ir embora, mas, em vez disso,
permaneço.
— Vocês querem ir para minha casa? — minha voz sai grogue. Estou
bêbado demais para me importar. Eu não devia perder o controle assim.
Eu a odeio. Eu a amo.
Parece um sentimento infantil, mas não é menos verdadeiro. Ela
consegue fazer coisas comigo que mais ninguém consegue. A maldita filha
da mãe.
— Tudo que você quiser, lindo! — ronrona uma das garotas.
Acariciando meu rosto com a ponta do dedo sensualmente.
Certo, hoje não quero saber mais nada sobre uma certa pianista
mentirosa...
2
Samantha
Mais cedo...

— Você tem uma agenda apertadíssima amanhã e depois, Sam.


Aproveite o dia de hoje para descansar, sim? — Minha assistente pessoal e
agente, Zara, fala enquanto descemos do avião no voo que veio de NY onde
estive fazendo a penúltima apresentação da turnê desse ano. No Brasil será a
última, depois quero passar uns dias aqui para visitar velhos amigos e
esquecer toda loucura e estresse que esses exaustivos concertos são.
Zara está comigo desde sempre, ela sabe mais sobre minha vida que
eu mesma. Ela tem tudo sobre controle, eu só tenho de seguir suas
orientações, tem sido assim desde que ela se tornou minha agente. Tínhamos
frequentado a mesma escola de música e ela desistiu da carreira de violinista
para trabalhar como agente, e uma das boas. Eu agradeço aos céus por tê-la
comigo. Enquanto eu me tornava uma musicista famosa, ela estava subindo
os degraus de agente, mas agora ela trabalha apenas comigo. Assim como eu
desisti do que mais amava pela música, ela também teve suas desistências, é
por isso que nos dávamos tão bem, apesar de haver dias em que eu gostaria
de dar um sumiço nela. Ela exigia demais às vezes e tem momentos que você
apenas quer esquecer toda essa badalação e ficar quieta em seu quarto. É
como se eu já não tivesse a mesma gama de emoções suficientes para
continuar. O cansaço de viajar sem parar é exaustivo. São dez longos anos
lutando para me manter no topo.
Zara continua falando sobre minhas apresentações e dos programas de
TV que tenho de participar, mas minha cabeça está em outra coisa. Na
verdade, não uma coisa, em alguém para ser exata. Sabia que vir aqui traria
toda sobrecarga de lembranças boas e ruins. Ruins porque não posso lembrar
das boas sem sentir uma dor no peito.
Tem repórteres esperando fora do aeroporto, mas agora não tenho
vontade de falar com eles. Então vamos direto para o carro que nos espera.
Depois de nos acomodarmos viro-me para Zara, que mal se sentou e já está
com a cara enfiada no tablete que não larga nunca.
— Você conseguiu descobrir o que pedi para você? — pergunto. O
frio em minha barriga é intenso e um tanto desconfortável.
— Estou verificando isso agora. Estava esperando um e-mail com as
informações. — Ela digita rápido e concentrada. — Sim, você tem o
endereço que queria. Envio para você em uma mensagem.
Oh, meu Deus! Terei coragem de ir lá? Sinceramente não sei o que
fazer com essa informação. Ir até a casa dele pode ser um tiro no próprio pé.
Mas eu seria uma condenada se saísse do Brasil sem vê-lo.
E se ele for casado? Tiver uma mulher, filhos?
Mas eu preciso conversar ou vê-lo de longe, mas tenho de estar perto
de alguma forma.
— Consiga um carro para mim. Discreto, sim?
— O que vai fazer, Samantha? Não pode sair por aí sozinha. — O
tom recriminatório dela me irrita.
— Posso e vou.
— De quem é esse endereço? — Ela realmente quer seguir pelo
caminho da inocência? Ela sabe tudo sobre ele.
— Você quer me dizer que não verificou? Ah, Zara, eu te conheço.
Deve saber tudo sobre a pessoa que mora lá. — Viro meu rosto para a janela.
Tenho medo de perguntar a ela se sabe de alguma coisa.
— Por incrível que pareça, não sei nada. Você deixou bem claro que
só queria o endereço — ela retruca, mas está sorrindo.
— E desde quando isso é um impedimento para você?
— Nenhum — admite.
Sim, ela sempre está interferindo sobre tudo. Inclusive sobre deixar as
pessoas pensarem que um dia vou casar com Pietro. “Tudo isso só faz bem
para sua carreira, Sam.” Não sei porque, afinal, lutei sozinha para estar onde
estou. E nunca precisei de uma muleta, mas a deixo pensar o que quiser.
— Seu carro será entregue mais tarde — ela corta meus pensamentos.
— Sua eficiência é notória. — Sim, ela é a senhora maravilha, por
isso aguento suas loucuras às vezes.
— Obrigada.
— Não faça nada que eu não faria, Senhorita Stollen. — Ela me
aponta um dedo fazendo-me rir.
— Claro que não. — Eu nem sei o que estou fazendo com essa minha
decisão, só sei que preciso disso como nada que já quis nesses últimos anos.
— Mas esteja pronta amanhã logo cedo. Tem um café da manhã no
programa de TV.
Vou vê-lo não importa o que diga para mim mesma. Talvez seja a
última vez. E eu o esqueça para sempre.
3
Samantha
Dez longos anos sem ver essa cidade me deixam nostálgica. Nós
cortamos as ruas e minhas lembranças são doces e lindas, passada em uma
época que nada era mais importante do que ter a tarde livre e as noites
preenchidas de amor e sexo selvagem com meu namorado Carl O’Neal. O
que ele faz agora? Tenho pavor de pensar que ele me esqueceu ou, pior, se
ainda me odeia. Não o culpo. Também me odeio.
Sua mensagem no meu celular, dias depois que enviei aquela carta, me
fez ver o quanto o magoei.
— Ainda acho arriscado você sair sozinha — Zara está falando e
falando, porém tudo se perde diante da sensação que estou sentindo de estar
de volta em casa. A urgência que tenho dentro de mim só aumenta. — Não
esqueça que aqui você não está totalmente segura, não ache que os problemas
acabaram.
Isso me chama para a realidade. Sim, fazia pouco mais de um mês que
os e-mails não chegavam. Isso me deu certa tranquilidade.
— Tenho uma mensagem de Pietro perguntando sobre o voo e se
chegou bem. — Zara não para de digitar na maldita coisa. — Devo responder
em seu nome?
— Por favor — digo sem entusiasmo. Pietro era um dos meus amigos
mais chegados, mas essa insistência dos fofoqueiros de plantão transformou
nossa amizade em algo mais, o que me chateia sobremaneira. Tive apenas um
namorado durante esses últimos dois anos, antes estive muito ocupada sendo
a pianista de sucesso que eu sempre quis ser. E apesar de tentar um
relacionamento com Anton, não tive sucesso. Depois de seis meses de
namoro, o inglês desistiu de tentar me fazer amá-lo. Eu tentei, juro, mas eu
não consegui me entregar a nossa relação.
Tenho vinte oito anos e apenas respirei música e mais música,
deixando tudo para trás, e agora que estou no topo a insatisfação é enorme.
Falta-me algo que dinheiro não pode comprar. Que a música não me deu.
Achei que ela me daria tudo, mas não deu alguém para compartilhar meu
sucesso e aproveitar tudo. Dez anos que não sei o que é diversão. Tudo se
resume a trabalho e mais trabalho. Amo a música e sinto prazer com ela,
entretanto faz um tempo que estou me sentindo frustrada.
Apesar do trânsito normalmente lento de São Paulo, não demorou
tanto para chegarmos ao hotel. Zara reservou uma suíte com dois quartos para
nós, como sempre faz quando estamos em turnê.
Depois que trouxeram nossa bagagem, ela pede nosso almoço e eu
estou grata já que não quero sair, mais uma vez, para qualquer lugar que seja.
Estou exausta.
— Seu carro só vai ser entregue lá pelas cincos horas — ela diz
quando estou indo me refrescar antes do almoço.
— Por que tão tarde? — Paro e me viro chateada com ela.
— A empresa de locação teve uma confusão com os horários.
— Sério? Então procure outra — digo antes de entrar no meu quarto.
Zara tem sido como uma irmã para mim desde que nos conhecemos. Foi uma
época conturbada da minha vida, um momento de escolhas difíceis e ela
estava lá. Temos um entendimento porque ela sabe muito de mim e da minha
vida. Ela desaprova muita coisa, porém não tenho que dar satisfação dos
meus atos. Eu sei que ela não aprova a visita que farei hoje e está pondo
dificuldades em realizar uma ordem minha. Não sei porque ela tem tanto
receio.
Esquecendo por um momento esse dilema, abro uma mala para pegar
roupas e vou para o banheiro. Quando volto, meia hora depois, minha mala já
está desfeita e Zara a está guardando.
— Desfiz suas malas, preciso de você descansada para nossa
programação. — Tem hora que penso que ela é paranoica. Rindo eu aponto
para a porta.
— Fora, você não me dá descanso.
— Querida, por isso você me paga, para facilitar sua vida. Ah, antes
que eu esqueça, Pietro mandou outra mensagem. Quer falar com você.
Ela sai e respiro fundo. Acho que está na hora de terminar com essa
carreira e tentar outra coisa. Minha vontade de ensinar tem crescido muito,
mas quando falei para Zara dessa ideia ela quase teve uma síncope. Isso tem
se mantido em standy by por um tempo, mas quando essa turnê findar vou
lidar com isso. O single que lancei no ano passado finaliza aqui essa primeira
turnê de um ano nas maiores cidades do mundo. Eu quis que fosse aqui por
uma única razão. Eu precisava de uma desculpa para voltar e estou aqui
agora, mas não sei o que fazer. É tão doloroso.
Meus pais agora moram na Europa, onde tenho vivido nos últimos dez
anos e eles há cinco anos, porque eu não vinha visita-los aqui. Então a única
forma foi se mudarem. E viviam muito bem. Mas agora eu estou fazendo o
caminho de volta. Talvez não seja o mais fácil a fazer, mas eu convivo com
minhas escolhas, com meus erros e nada pode me ferir mais que já não tenha
ferido antes.
Deixando meus pensamentos errantes de lado, termino de me arrumar
e saio. Não retorno a mensagem de Pietro e isso deve deixar o homem
arrancando os cabelos do outro lado do atlântico. Não estou no clima para um
bate-papo com Pietro agora. Ele está indo junto com a mídia, querendo
enveredar por um novo rumo de nossa relação e eu definitivamente não quero
isso. Olho ao redor e aprecio o requinte da suíte. É luxuosa, mas nada
impressionante. Acho que me acostumei tanto a estar em hotéis que nada
mais me chama a atenção.
— Estava indo verificar se tinha se perdido — Zara fala da mesa
posta com nosso almoço, ainda agarrada ao seu tablete.
— Fomos convidadas para um jantar na casa do governador, a
primeira-dama ama sua música — ela diz feliz. — Quando a última
apresentação em Florianópolis terminar voltamos para cá.
— Zara, não aceite convite sem me perguntar primeiro, já falamos
sobre isso — digo chateada, eu tenho meus próprios planos para depois da
turnê. — Apenas desmarque, sim?
— Samantha, é deselegante, acredito que seja uma boa ideia ir. —
Fecho meus olhos e suspiro. Ah, lá vamos nós.
— Só desmarque, invente qualquer coisa — digo resoluta. Não estou
sendo voluntariosa, no entanto tenho limites. — Não pode marcar nada para
depois da turnê. O que combinamos? Eu preciso de férias, Zara, de tudo.
Tudo mesmo. Depois eu volto e você pode fazer as coisas do seu jeito como
sempre.
Ela não diz nada e isso quer dizer muita coisa. Está chateada.
Almoçamos em um silêncio um tanto desconfortável, por fim ela me olha
carrancuda.
— Eu apenas penso no melhor para sua carreira, Sam — diz. —
Quando isso for demais para você, tem o direito de me demitir.
— Também não vamos exagerar — amenizo. — Eu sei que pensa no
melhor, mas eu preciso saber sobre esse melhor antes que você o faça, Zara.
Não pode pensar por mim.
Ela assente e volta a comer. Essa não é nossa primeira divergência.
Estamos trabalhando juntas há muito tempo e temos nossos calos.
— Liguei para seus pais. — Assinto. — Eles mandaram beijos e
desejaram um bom concerto amanhã.
— Obrigada — digo fazendo uma anotação mental de ligar para eles.
Ao contrário da ligação de Pietro, a dos meus pais é muito importante para
mim.
Ela tinha pedido minha comida favorita: salmão ao molho de
maracujá. Estava meio ruim ou era minha ansiedade que estava atrapalhando
meu apetite. Tudo estava amargando em minha boca. Empurrando o prato
para longe, eu levanto da mesa.
— Vou deitar, descansar um pouco, quando meu carro chegar avise-
me imediatamente — digo e sigo para o quarto outra vez.
— Claro, Sam. — Ouço a resposta de Zara antes de fechar a porta.
Eu deito pretendendo não dormir e pego o celular para verificar o
endereço que Zara enviou para meu telefone. Devo ter cochilado porque
quando abro os olhos novamente está tudo escuro. Eu pulo da cama e acendo
a luz perto da cama verificando as horas. Que droga! São quase oito da noite!
Como dormi tanto? E porque diabos Zara não me acordou?
Pego minha bolsa e saio furiosa do quarto, encontrando-a na sala
falando ao telefone.
— Falo com você depois — ela finaliza a ligação e me olha. — Ah,
você acordou. Tentei acordá-la, mas estava dormindo tão profundamente que
achei melhor deixá-la dormir à vontade.
— Zara — começo tão enfurecida —, as chaves do carro.
— Sam, é tarde, não devia sair...
— As chaves, agora!
Ela caminha até a mesa onde almoçamos mais cedo e pega as chaves
que estão lá.
— É um Dodge Durango, discreto como pediu. — Praticamente
arranco as chaves de sua mão e sigo para a porta, não dou nem uma olhada
em minha aparência. O endereço fica muito longe daqui, provavelmente umas
duas horas de distância. Inferno!
Não sei o que estou indo fazer, mas essa necessidade mórbida de vê-
lo, mesmo que não vá falar com ele, é quase compulsória. Depois de ser
orientada por um funcionário do hotel, localizo o carro e entro. E desde
quando um Dodge é discreto? Respiro fundo para a raiva sair e ligo o GPS,
sem ele não posso achar o endereço a essa hora. Manobro o carro, colocando
em movimento e demoro muito para começar a seguir as instruções que o
GSP indica. Infelizmente não tenho hábito de dirigir e a noite só atrapalha.
A localização era residencial e, depois de duas horas, eu paro o carro
em frente de um condomínio. Ele mora aqui? Não era bem o estilo de Carl,
ele sempre disse que moraria em uma casa. Olho o endereço mais uma vez
para ter certeza que estou no local certo. A rua está quase deserta a esta hora.
Desço do carro e caminho para a entrada onde tem uma guarita com um
guarda.
— Boa noite — cumprimento e o homem me analisa respondendo
com outro boa noite — Carl O’Neal mora aqui?
— Não posso dar informações sobre os moradores, senhora — ele
diz.
— Ok. Tudo bem, eu espero no carro. Só queria apenas ter certeza
que ele me deu o endereço certo quando me pediu para visitá-lo — digo
distorcendo um pouco os fatos.
— Posso verificar se a senhora tem autorização para entrar. Qual seu
nome, senhora? — Ele enfim cede um pouco, mais ainda desconfiado.
— Samantha, mas...
Ele já está pegando o telefone e discando, provavelmente para o
apartamento de Carl. Depois de um tempo ele pousa o aparelho no gancho.
— Acredito que não há ninguém no apartamento, senhora — ele
lamenta, me deixando frustrada e triste. Porém, se ele não está em casa,
significa que irá chegar e poderei vê-lo sem que me veja. Isso é perfeito.
— Muito obrigada, senhor. Boa noite. — Começo a voltar para o
carro quando um táxi para na calçada. Vejo uma mulher descer e, pelo
aspecto dela, parece uma dançarina de boate. Ela está rindo. Eu paro, sem
saber a razão, e vejo outra mulher, parecendo uma cópia da primeira,
descendo também e rindo.
— Oh, bebê, você é tão mau — a primeira ronrona para alguém ainda
dentro do carro. O tempo parece passar lentamente quando observo um
homem descer tropegamente do carro. O reconhecimento de quem é me bate
tão forte que quem cambaleia sou eu agora. Ele se veste casualmente com
jeans e camiseta preta. O corte de cabelo curto ainda parece o mesmo de
quando o vi pela última vez, porém mais sofisticado agora. Parece bêbado ou,
se não, quase isso. Ele se endireita e cada uma das mulheres agarra um braço.
Ele abaixa a cabeça para beijar o pescoço de uma e depois da outra, antes de
levantar a cabeça e começar a andar em minha direção.
Eu tinha permanecido uma estátua no caminho e ele me veria. Eu não
tenho força nas pernas para correr e impedir o vexame que irei passar.
— Vamos, minhas senhoras, a noite apenas vai começar — ele diz
quando puxa as duas para frente, parando em choque. Seus olhos estão
vidrados em mim, perturbados.
4
Carl
Deixo os caras no bar, pouco depois das dez, e saio com as duas
garotas que estiveram dançando para mim. Eu pretendia me divertir essa
noite para esquecer uma certa pianista, parece que estava dando certo. Eu
realmente estou me divertindo essa noite. Para falar a verdade, estou bêbado e
não sei se é muito sábio levar duas desconhecidas para minha casa estando
meio fora da minha mente. Há um bom tempo que ando ranzinza demais.
Vendo meus amigos apaixonados tem feito coisas estranhas comigo, tem
trazido lembranças demais, que há muito tempo quero esquecer. Primeiro foi
Alexander com a patricinha maluquinha da Lana Mitchell. Apesar dela ser
louca de pedra, é apaixonada pelo meu amigo. Tenho de admitir. Agora o
Bruno, que dizia que ia morrer em uma orgia, amarrado até a medula por sua
viúva. Quer dizer, exviúva. Rio baixo para mim mesmo.
Exviúva. É correto isso? Devo estar mais bêbado do que imaginei.
Apoio minha cabeça no encosto do banco traseiro do táxi e tento pensar em
uma forma de me livrar dessas duas quando umas delas me acaricia. Eu estou
duro igual uma pedra, mas não sei se é por uma dessas meninas. Desde que a
vi na TV que tenho me mantido duro com o pensamento nela. Maldita seja!
Agarro a mão feminina que está esfregando a frente do meu jeans e
aperto mais sobre o aço debaixo do tecido. Com a outra mão livre seguro os
cabelos da outra e trago sua boca para um beijo. Antes que as coisas fiquem
quentes demais, o táxi para na frente do meu prédio. As garotas descem e eu
pago a corrida, descendo em seguida. Umas das meninas fala comigo. E eu
não entendo nada. Dando os braços um para cada uma, caminho para a
entrada.
— Vamos, minhas senhoras, a noite está apenas começando —
anuncio.
Dou dois passos para frente e paro no lugar. Minha mente para e vejo
vermelho. Maldição, estou tão envenenado com aquela mulher que a vejo em
todos os lugares?
— Carl.
Fantasmas não falam, porra!
Devo ter entrado em algum universo alternativo, porque no meu
universo Samantha não existia mais. Mas lá estava ela.
Ela me olha com espanto, como se não acreditasse que esse sou eu, e
percebo que não é um fantasma da minha mente alcoólica, mas ela é de carne
e osso e está bem na minha frente. Eu fico sóbrio tão rápido, acho que o
álcool evaporou com o susto que tive ao vê-la aqui.
O que diabos ela veio fazer aqui? Não a quero aqui. Não quando tudo
está tão revirado dentro de mim. Por que ela veio? A pergunta martela na
minha cabeça. Fecho meus olhos tentando negar sua presença, porém,
quando abro novamente, ela ainda está aqui. Em pé e me olhando como se
estivesse com dor também. A menina que amei não está mais lá, em seu lugar
está uma mulher requintada e elegante. A jovem despreocupada que me pediu
para esperar naquele aeroporto, dez anos atrás, não existe mais. Mas isso é
bom, porque eu poderia ser tão fraco que talvez não resistisse e a tomaria em
meus braços. Viver do passado é uma merda!
Dor me queima, fazendo-me oscilar sem saber se a abraço ou se a
mando para o quinto dos infernos de onde ela veio. Mas estou travado no
lugar e lembro vagamente que não estou só, tenho uma mulher em cada
braço. E não poderia ser em melhor hora.
Sam!
Eu a odeio como nada nesse mundo.
Se eu tivesse alma ainda, ela seria a minha. Se não a tivesse levado
com ela naquele dia. Suas palavras naquela carta destroçaram todo o amor
que já senti na minha vida por ela. Mas agora vendo-a aqui, tudo dentro de
mim duela sobre a garota dos meus sonhos, a garota que não quero ver. Dou-
me conta, nesses poucos minutos, que vivo com esses sentimentos dúbios
durante anos em relação a ela.
Empurro as duas mulheres para que andem e faço sinal para o porteiro
da noite deixá-las entrarem. Elas olham de mim para Samantha e dão de
ombros entrando, deixando-me com meu fardo Samantha Stollen.
Eu paro na frente de Samantha e emoções, que achava não mais existir
dentro de mim, apertam meu peito quase me sufocando. Desde que a vi, mais
cedo hoje na TV, tudo veio à tona e agora parece mais intenso. Tenho
vontade de gritar tão alto para que ela vá embora, mas, ao mesmo tempo,
tenho gana de agarrar seu corpo malditamente apertado. Como posso me
controlar se meu pau tem sua própria ideia de Samantha, ele sempre foi
escravo dessa garota. O bastardo. Ela me desconcerta e ainda significa mais
para mim do que qualquer outro ser humano. Pode isso ser amor? Será que
tudo que ela fez, indo embora, não matou esse sentimento? Estou doente. Sou
um fraco. Incoerente.
— Carl. — Percebo que ela chama o meu nome pela segunda vez, da
primeira vez eu ainda estava desnorteado com sua presença. Cravo meus
olhos nos dela duramente.
— Vejam só, Sam Stollen, a grande pianista na porta de um pobre
mortal — digo com desprezo obvio. Minha voz é dura e inflexível. Sim, raiva
é melhor que tesão. — A que devo tão grande honra?
— Eu... — ela gagueja, endireitando seu corpo em um porte altivo e
limpa sua garganta como se a mesma estivesse obstruída. — Eu queria ver
você.
Começo a rir de seu atrevimento. Dez anos sem dizer um oi e agora
essa?
— Queria me ver?
— Sim, eu na verdade precisava...
— Isso, diga-me — falo com antipatia.
— Precisava falar com você. Tenho tantas coisas para explicar...
— Como pode ver, tenho uma noite ocupada. Eu não posso perder
tempo com... — finjo procurar uma palavra e continuo — Com coisas sem
importância. Não perdeu nada aqui, Samantha.
Ela se retrai, provavelmente chocada com minha grosseria. O que ela
esperava? Confete e chá de boas-vindas?
— Nunca mais apareça na minha frente, Samantha. Você não é bem-
vinda aqui — digo com todo desprezo que consigo colocar na minha voz. —
Está dez anos atrasada. Você achou que ainda é especial? Achou que iria
correr para você, te abraçar? Deixa eu te dizer, perdeu seu tempo.
Caminho passando por ela, mas o som de seu soluço me para.
— Suas lágrimas mentirosas não me cativam mais. — Sinto dor por
atingi-la, mas eu não quero dar outra chance para essa mulher me magoar. —
Você atrasou minha noite divertida. Cai fora!
— Queria apenas dizer oi — ela murmura.
E para cravar a estaca em seu coração, digo inexpressivo:
— Para quê? Não quero seu oi, nem sua preocupação e você... não é
nada para mim. Não passa de uma menina que usei para meu bel prazer há
séculos atrás.
— Carl... — ela tenta outra vez, mas não quero escutar. Estou
irracional. Não quero ouvir.
—Não diga meu nome, eu te proíbo de falar meu nome como se
estivesse com dor. Você não tem coração, Samantha Stollen. Você é uma
mentira!
Deixo-a, sem dizer mais nada. Olho para trás e a vejo correndo para
um carro estacionado ali perto. Meu coração dizendo para fazer o caminho de
volta para ela, porém meu cérebro é suficientemente inteligente para saber
que esse caminho entre eu e Sam já foi percorrido. E o resultado havia sido
catastrófico.
Samantha
Assim morre outra vez meu coração
Nessa estrada onde eu caminho só
( Eu só queria te amar – Laís)

Eu não devia ter vindo na casa dele.


Bem feito para mim. Quem eu acho que sou? Não sou mais sua
amada Sam. Me sinto corroída pela culpa, porque eu sei que sou a culpada de
transformar um homem amável e apaixonado em outro que não tinha nada de
amável em seus olhos. Eu destruí o homem gentil que ele sempre foi comigo,
a pessoa que ele tinha em um pedestal e que o magoou tão profundamente.
Ligo meu carro desesperada para sair dali, minhas mãos tremem
desordenadamente. Estou cega pelas lágrimas que jorram abundantemente
pelo meu rosto.
Tenho vontade de gritar, mas nada sai da minha garganta... Carl.
Quando consigo sair com o carro, sigo sem destino. A dor parece
dilacerar tudo dentro de mim. Eu era tão masoquista. Por que eu fui lá? Eu só
queria vê-lo um instante, era isso que eu queria fazer. Ter um vislumbre dele
foi maior que a humilhação de seu desprezo.
Fragmentos da nossa conversa vêm nitidamente na minha mente
como um filme tecnicolor.
— ... Não quero perder tempo com... com coisas sem importância.
Não perdeu nada aqui, Samantha... — sua voz era tão diferente do meu Carl.
— Para quê? Não quero seu oi, nem sua preocupação e você... não é
nada para mim. Não passa de um menina que usei para meu bel prazer há
séculos atrás. — Seus lábios estavam ligeiramente levantados como se
tivesse nojo de mim.
Sua indiferença queima nas minhas entranhas e ligo o som do carro
no último volume para calar a voz amarga dele que não para de ressoar dentro
da minha cabeça. Quero apagar da minha memória.
A voz que sai do som me faz chorar ainda mais. Sinto-me um nada,
dilacerada, tenho vontade de morrer... meus soluços cortam no meio da
música...
...Sozinha então me sinto
Seu jeito me ferindo o coração
Eu perdendo a razão...
Quero desaparecer de tanta dor no meu coração, nossas vidas eram
feitas de promessas quebradas, por mim, por ele...

...Não vou mais te esquecer


Assim morre outra vez meu coração
Nessa estrada onde eu caminho só...

Nossos momentos de promessas foram esquecidos, aniquilados...Sinto


as lágrimas descendo por minha face.

...E o céu que se abriu pra gente se amar


Ficou cinza e de repente se escondeu de nós
Onde a gente se perdeu queria tanto achar
E me lembrar, eu só queria te amar...

Oh, Deus! Dói tanto e eu sou a única culpada. Eu o feri


profundamente quando o deixei, quando só pensei em mim. Ele me odeia e
não suporto isso...
...Assim morre outra vez meu coração..
Eu pensei que poderíamos ser civilizados, mas seus olhos tinham
apenas repulsa e quero rasgar meu coração fora do peito.
—Não diga meu nome, eu te proíbo de falar meu nome como se
estivesse com dor, você não tem coração, Samantha Stollen. Você é uma
mentira!
Volto para o presente com soluços doloridos que impedem-me de
respirar. Estou destroçada, porque fui eu que criei aquela pessoa sem coração,
sou a única que jogou seu amor no lixo e pisei no que era o mais lindo dos
homens. E eu o levei a algo que parecia não ter conserto. Magoei o mais doce
dos homens. Eu era má. Tão má...
A voz da mulher no carro me faz sofrer ainda mais, porque é como
uma trilha sonora da minha situação atual com Carl. Gemo internamente.
...Não posso não, não consigo não
Quero a nossa vida, de volta
...A alegria que soltou da minha mão...
— É apenas uma pausa no nosso amor, Sam. Tenho certeza que logo
vamos estar juntinhos — a voz do passado mistura-se na minha cabeça. —
Vou cuidar de você de longe, esse oceano filho da mãe não será páreo para
mim.
— Você é tão romântico — digo beijando seus lábios. — E onde
vamos morar?
— Quando você voltar, tenho uma surpresa para você — ele diz
pegando-me pela cintura e me girando em torno dele. — Você terá um lugar
perfeito para compor suas músicas, minha Chopin de saia.
Gargalho alto quando ele me gira mais rápido.
— Só não esqueça de me amar — ele fala quando para e me beija...
— Não, não, não...Eu não deixei de te amar... — grito fechando meus
olhos brevemente quando piso no acelerador e os soluços altos que solto
parecem romper todas as comportas de dor dentro de mim. As lágrimas
molham meu rosto copiosamente. Quando abro os olhos, segundos mais
tarde, é para soltar um grito de pavor. Estou saindo da pista e indo de
encontro ao acostamento da estrada. Estive dirigindo sem rumo e não sei
onde estou. Eu saí da cidade? Puxo a direção, mas é tarde demais... Não vejo
nada, senão a noite escura.
— Caaarl!! — meu grito se perde quando sinto o impacto do carro
batendo em algo e depois...Meu último pensamento vai para os olhos cheios
de desprezo dele...
Escuridão.
6
Carl
Olho para as duas garotas e sinto nojo de mim mesmo. Elas estavam
me esperando junto com o guarda do prédio. Como elas são dançarinas e
ganham a vida com isso, eu pego algumas notas e entrego para as duas.
— Aprecio o interesse, meninas, mas não estou mais no clima para
essa noite. — Meu estado alcoólico tinha passado com minha visita
surpreendente. Estou sóbrio agora. As garotas fazem beicinhos, no entanto
pegam o dinheiro e vão embora depois que peço ao guarda para chamar um
táxi para elas. Caminho para meu apartamento disperso em meus
pensamentos e, tomo a decisão de sair por um tempo. Pego meu telefone no
bolso e chamo Alexander:
— Você está bem, cara? — ele pergunta assim que atende.
— Estou saindo da cidade por um tempo, para passar uns dias fora.
Vou deixar o celular desligado — informo.
— Por que isso, Carl? Precisamos de você com aquele político, junte
suas merdas e deixe isso de lado — ele diz. — Eu sei que você está com
problemas pessoais que nunca compartilha, mas ficar sozinho agora não é a
solução.
— Alex, eu também posso decidir se posso trabalhar ou não — digo
firmemente. — Não posso garantir cem por cento de atenção com um cliente
quando minha cabeça está em outro lugar.
A verdade estava longe, quero sair porque sei que se ficar irei atrás de
Sam. Estou me sentindo um merda por tê-la tratado com rispidez. Irei cair na
tentação e correr atrás dela. Isso é um fato. Dizer aquelas besteiras foi nada
mais que uma forma de me impedir de segurá-la e não soltar jamais. Estou
completamente desnorteado. Meu peito parece comprimido como estivesse
como falta de ar. Este é o efeito Samantha em mim.
— Eu sei, Carl. Você está certo, estar cem por cento no trabalho é o
mais importante — Alex recapitula. — Resolva seus problemas e quando
estiver pronto, ou eu precisar de você com urgência, você volta.
Desligo e vou direto para o quarto fazer minha mala. Jogo algumas
roupas aleatórias dentro e quando estou pronto para sair, pego as chaves da
casa no lago. Não vou lá há muito tempo. Quando Bruno precisou da casa por
uns dias, eu simplesmente pedi para o casal que toma conta da propriedade
deixar tudo organizado para eles. Mesmo estando longe sei que o lugar se
mantém impecável.
Pouco depois, estou deixando meu celular para trás e pegando meu
carro. Não quero correr o risco de ligar para ela também. É fácil descobrir
onde ela está e conseguir o telefone do hotel. Então, o celular fica em casa.
Estranho o trânsito lento essa hora da noite. Ligo o aplicativo de trânsito do
carro e ele informa um acidente mais à frente.
Praguejo impaciente, devia ir por outro caminho, pode levar muito
tempo aqui. Quando vejo uma rota alternativa, mais a frente, pego-a para
evitar o local do acidente. Irei levar mais tempo, mas não quero ficar parado
pensando nos olhos magoados de Samantha. Trinco a mandíbula e tento
manter a mente em outra coisa.
*
Vir a esse lugar pode não ter sido a melhor das minhas ideias. Aqui
sempre foi o lugar que eu preparei para viver com Sam, para quando ela
quisesse compor... Quando comprei a propriedade eu tinha algo em mente,
queria um lugar bonito, calmo e perfeito. Quando vi a casa com o pequeno
lago, não pensei duas vezes, eu queria esse lugar pronto para quando ela
voltasse. Contratei um paisagista e arquiteto para deixar o lugar ainda mais
perfeito. Só que, antes de terminar a obra, recebi aquela carta de Sam e tudo
desmoronou ao meu redor. Tudo ficou inacabado até alguns anos depois
quando eu saí das forças especiais e vi que tinha uma propriedade sem uso.
Vir até aqui era doloroso, pois os planos que tinha feito para viver já não
eram possíveis. Mas eu decidi terminar a obra. Poderia sempre vender se
quisesse, mas nunca tive coragem de me desfazer do lugar.
Depois de anos, vir a essa casa é como fincar uma adaga afiada em
meu peito. O lugar era decorado para parecer rústico. Mas um rústico
requintado, decorado com elegância e classe. Eu almejara o melhor para
minha Sam. Era rodeado por hectares de terras além do lago, era perfeito e
calmo. Eu estava demasiado ferido para aproveitar o lugar quando não foi
possível viver aqui os nossos planos.
Eu nos imaginava aqui. Seus cabelos soltos esvoaçando na brisa vindo
do lago, sua voz chamando meu nome em um sussurro rouco, seu riso que
sempre trazia alegria ao meu coração. Sentia-me orgulhoso por ser o cara que
a fazia rir. Imaginava seus olhos claros e risonhos em uma cor indefinida que
me cativava sempre. Imaginei-a aproveitando o deque com um piano
compondo suas músicas, mas tudo não passou de um sonho de minha parte.
No fim, a única coisa que proibi o decorador de colocar aqui foi um piano.
Esse item foi riscado da lista. De todas as coisas que já ouvi, uma das mais
certas é: as pessoas que você mais ama são as mais difíceis de manter por
perto. Amar demais, às vezes, pode ser a ruína de um homem.
Eu não sei se o que sinto por Samantha ainda pode ser chamado de
amor, já se passou tanto tempo, mas vê-la hoje foi tão doloroso! Pode ser
uma obsessão? Por ela me abandonar, isso virou uma obsessão?
Droga, Carl O’Neal, você está completamente ferrado. Nem sabe que
dia é hoje e isso é apenas o começo, seu trouxa. Dou-me um tapa
mentalmente para voltar a realidade.
Deixando de lado minha besteira sentimental, coloco minha mala no
quarto e vou até a cozinha verificar os mantimentos. Vejo que terei de ligar
para o caseiro pedindo para trazer mais amanhã. Bato na testa, recordando
que deixei o celular para trás. Droga. Bem, posso ir de carro comprar, mas
lembro da linha fixa de telefone da casa.
Voltando para a sala jogo-me no sofá de aparência desconfortável, e é
realmente. Gosto deles confortáveis, mas esse é esquisito para o meu gosto.
Devo ter cochilado porque acordei com a luz tênue do amanhecer se
infiltrando pela janela. Minha cabeça dói. Deve ter sido o uísque que bebi
ontem. Levantando vou para a cozinha onde acho pó de café e começo a
preparar uma xícara. Como um velho hábito, procuro meu celular outra vez e
balanço a cabeça quando lembro que não o tenho. Movimento errado a fazer,
é o que percebo quando sinto como se meus miolos fossem sair do crânio.
Deixo a água no fogo e saio à procura de uma aspirina. Vasculho o armário
do banheiro e encontro uma caixa com analgésico e pego um. Volto para a
cozinha e engulo o remédio antes de começar a tomar meu café.
*
A semana passa rápido, apesar de meu tempo ser passado a beira do
lago no deque. Meu corpo estava aqui, porém minha mente não. Pensava em
Sam o tempo todo e no trabalho que deixei a cargo dos meus amigos. Estou
sendo irresponsável, algo que há muito tempo não acontecia. Desde que
entrei para as forças especiais, seis meses depois de perceber que Sam não
voltaria — onde conheci Alex, Bruno e Salvatore, e nos tornamos amigos.
Eu fui o que menos demorei na organização, saindo depois de cinco
anos, Alex e o os outros ficaram mais tempo do que eu. Depois, como dizem,
é história. Fomos trabalhar com segurança particular para os riquinhos e
agora temos a M.S.. Alexander é nosso líder, claro. Mas no momento que não
quisermos mais, podemos deixar a sociedade e irmos para a carreira solo. E
eu, durante todo esse tempo, nunca havia deixado trabalho para eles fazerem
por mim.
Esticando meu corpo na espreguiçadeira do deque, tomo minha
bebida. Eu estou inquieto, mas não me arrependo de ter vindo para cá,
precisava desses dias longe de tudo. Quando voltar acredito que Sam já terá
ido embora. Pelo que ouvi, ela tinha apenas três concertos em uma semana.
Tomara que esteja certo e não tenha de vê-la outra vez. Tenho curiosidade em
saber o que foi fazer em minha casa. Como ela descobriu onde moro? Por que
o interesse depois desses anos todos?
Será que ela nunca me esqueceu da mesma forma que eu não a
esqueci? São apenas conjecturas que nem deveria estar levantando porque só
fará minha curiosidade maior e consequentemente posso querer saber mais.
Uma música toca ao fundo me distraindo. Guns N' Roses, minha
banda preferida, me deixa melancólico.
Retiro os óculos aviador e esfrego os olhos. Deus! Transformei-me
em um homem obcecado. Escuto um carro se aproximando e levanto atento.
Quem poderia ser? Agarro a camisa que tinha jogado ao meu lado e caminho
cautelosamente para verificar quem estava vindo. Uma velha picape para na
frente da casa e vejo meu caseiro descer logo depois.
— Seu Carl — cumprimenta tirando o boné surrado que está usando e
passa as mãos nos cabelos ralos. Pedro, um senhor de uns setenta anos, é a
imagem de um homem do interior. Ele e sua esposa cuidavam da
propriedade, então eles sabem mais sobre essa casa do que eu.
— Pedro. O que faz por aqui? — Faço um gesto para que entre e
caminho para a cozinha. — Quer alguma coisa para beber meu velho?
— Um copo de água seria bom — ele diz me seguindo. — Vejo que
tem aproveitado o sol escaldante.
— Sim, só não tive coragem de pular no lago — digo rindo. — Deve
ter umas piranhas lá.
— Vocês garotos da cidade não sabem distinguir uma piaba de uma
piranha — ele rebate. — Esse lago não tem piranha, seu Carl.
— Se você diz, mas não arrisco. Posso ficar sem minhas partes
essenciais — digo quando sirvo a água para ele. Ele bufa do meu gracejo. —
O que o traz aqui?
Ele fica sério e olha ao redor.
— Não veio com nenhum tipo de comunicação? Não usou o quarto
onde tem aquelas bugigangas de tecnologia? — ele pergunta apontando em
direção ao quarto onde tem todo o sistema de monitoramento de câmeras e
computadores. Onde não estive desde que cheguei.
— Não vim para ficar conectado, Pedro — digo. — Vim relaxar.
— Uma moça, acho que foi... Não lembro bem o nome dela... acho
que é Lana. Sim, Lana. Pediu que ligasse para ela porque não consegue
contato com o senhor — ele fala em um fôlego só. O que diabos a diaba
maluca quer comigo?
— Ela não disse do que se trata?
— Não. Trouxe meu celular, caso precise. — Ele estende o aparelho.
— Obrigado, Pedro. — Pego o telefone e, em vez de ligar para Lana,
ligo para Alexander. Chama e ele não atende. O que ele anda fazendo? Deve
ser a diaba loira que o mantém ocupado.
Disco o número dela e ela atende imediatamente.
— Carl? É você?
— Não.
— Oh, enfim consegui falar com você. — Ela está sem fôlego. —
Preciso que você venha para casa agora.
— Lana, o que houve? Está com algum problema? Alexander está
ferido?
— Eu não me meto em problemas, senhor O’Neal — ela diz com
tanta indignação que quem não a conhece acreditaria. — Porém, depois de eu
dizer o que tenho para falar, talvez você queira voltar.
— Estou voltando na próxima semana. Não pode esperar?
— Não. Na verdade aconteceu algo com a pianista. Alexander disse
que você a conhece, que são amigos, então eu assumi que você poderia
querer saber — ela diz.
— O que houve com Samantha? — Eu caio sentado na cadeira mais
próxima.
— Não sei direito. Saiu algumas reportagens falando do acidente, mas
nada claro. Sabemos que ela está no hospital e os concertos foram
cancelados. Sei porque fiz Alexander comprar os ingressos e não teve,
então...
— Lana, pare! Eu estou voltando.
— Achei que voltaria — ela fala. — Sabia que você gostaria de saber
se ela é sua amiga. Eu gostaria se fosse comigo.
— Obrigado. — Desligo e me sinto anestesiado. Vejo Pedro pegar o
telefone e perguntar o que houve, mas eu não repondo. Levanto e vou direto
para o quarto e ligo o notebook. Enquanto espero ele conectar, mil coisas
povoam minha mente. Todo tipo de coisas ruins. Estou suando frio, o suor
fazendo minha camisa grudar. O que houve com ela?
Vou direto para o seu site e não há nada além do cancelamento dos
concertos por motivo de saúde. Digito no Google e aparecem várias notícias
sobre ela, mas um link me chama a atenção. Clico sobre ele e abre um vídeo
de uma repórter falando de um acidente de carro há uma semana.
— O acidente da musicista aconteceu há uma semana e quase nada
se sabe sobre o que realmente aconteceu com ela. Sua agente tem mantido
sigilo da gravidade do estado de saúde da artista...
A voz do repórter se perde ao longe quando minha mente registra a
data do acidente. Mas que merda era essa?
Pulo da cadeira como se mil demônios estivessem atrás de mim.
Fecho o notebook com força e corro para meu quarto para colocar uma roupa.
Passo por Pedro que está esperando sobre o que vou fazer e digo:
— Estou voltando para casa, agora. — Não espero respostas.
O que diabos fiz a você, Sam?
Samantha
Dor é a primeira coisa que sinto quando volto à terra dos vivos ou no
que eu acredito ser a terra dos vivos. Porque não consigo abrir meus olhos e
nem me mexer? Escuto um bip e mais bip de algum lugar, mas não atino
onde exatamente estou. Minha cabeça dói. Uma dor latejante que não para,
tenho a sensação de que vai explodir. Tento falar, mas nada sai dos meus
lábios. Minha boca está seca e tento tragar saliva, mas essa tarefa não é nada
fácil. Parece que minha língua está grudada no céu da minha boca. Depois da
dor eu sinto frio, muito frio. Meu corpo parece estar congelando e eu tremo.
Tem algo de errado comigo. Algo de ruim aconteceu e não consigo
lembrar. Não sei onde estou, apenas sinto dor e frio. Algo tão ruim que eu
não quero lembrar ou saber. Escuto mais bips soando alto e depois vozes,
mas não distingo o que dizem.
Pouco depois caio no sono outra vez. A próxima vez que minha
consciência volta, escuto claramente a voz de Zara falando com alguém. A
dor agora está mais branda, mas minha cabeça parece oca. Provavelmente
estou com ela enfaixada.
— Temos feito todo o possível para sua recuperação. — Escuto uma
voz de homem dizendo. — A contusão na cabeça aparentemente não mostra
nada, mas vamos aguardar quando ela acordar.
— Mas porque ela não acorda? — A voz de Zara parece tensa.
— O estresse pelo qual ela passou, talvez descansar agora seja o
melhor. — O que diabos tinha acontecido comigo? Não consigo lembrar. A
última coisa que lembro foi que estava no hotel com Zara e muito chateada
com ela por não ter me acordado mais cedo. Tento abrir meus olhos e minhas
pálpebras estão pesadas, não insisto e volto a ficar quieta e a dormir.
*
— Samantha? Você está me escutando? — Outra voz familiar tira-me
do meu sono. Conheço esse sotaque italiano. — Sou eu, Pietro, querida.
O que ele estava fazendo aqui? Porque está usando termos carinhosos
comigo? Qual o motivo dele deixar seus compromissos e voar atrás de mim?
Quando levantar daqui irei dizer claramente que não tenho nenhuma intenção
de ter algo com ele. Como não tenho vontade de vê-lo, continuo de olhos
fechados.
Minha cabeça lateja.
— Tem uma semana que ela está assim. Os médicos dizem que ela
não sofreu nenhum dano sério, além da perna quebrada, do punho machucado
e da forte contusão. — Essa é Zara, minha fiel escudeira, penso sarcástica. A
voz dela está mais distante quase como se estivesse sussurrando, mas posso
escutar nitidamente. — Estou ficando preocupada. Os concertos foram
cancelados. E não sei o que dizer para todo mundo. O que diabos ela fazia
naquele lugar remoto? Esquisito. Não sei mais o que dizer aos
patrocinadores.
Sim, minha agente era muito preocupada comigo. Eu começo a pensar
seriamente que estou em algum Reality Show. Eu sofri um acidente? Não me
lembro. Estou cansada, não tenho ânimo para puxar a memória do que houve.
— Ela não poderá tocar por bastante tempo — Pietro diz. — Não será
nada bom para sua carreira.
— Tanto fiz para que ela tivesse a carreira perfeita. E ela joga fora por
causa daquele homem. — Franzo a testa quando a voz chateada de Zara me
atinge. Ela nunca está contente com nada. Sempre interferindo. — Tentei
manter esse incidente longe da imprensa, mas não sei por quanto tempo. Não
quero nem saber o que vão dizer quando perceberem o lugar do acidente.
Perguntarão se ela estava atrás de drogas. Isso será terrível, Pietro.
— Ei, calma. Tudo vai ficar bem. Daqui uns dias ela voltará a tocar.
— Fico imaginando, pelo tom de sua voz, que ele deve estar abraçando
minha agente. — O que a polícia diz sobre o acidente?
— Segundo a investigação, ela perdeu o controle do carro e bateu
contra um trecho da estrada. A frente do carro está toda retorcida, ela poderia
estar morta agora, tudo porque não segue minha orientação.
— Ela vai voltar melhor do que antes, você verá — Pietro continua
dizendo. Não sabia que eles eram tão amigos. — Vi hoje na televisão sobre o
acidente, temo que seus esforços não tenham dado resultados. Não queria
dizer para não deixá-la mais preocupada. Você devia falar com a imprensa e
dizer o que realmente aconteceu em vez de esperar que eles inventem suas
próprias teorias. Falei com Amanda e Jânio, eles chegam hoje.
Meus pais? Devo ter sofrido um acidente grave mesmo para meus
pais virem para cá.
— Eu tentei dissuadi-los de virem, mas sabe como são... — O quê?
Não estou entendendo mais nada dessa história. Essa nuvem nebulosa me dá
dor de cabeça quando tento pensar. Minhas pálpebras tremulam abertas e
ainda assim tudo está escuro à minha frente. Fecho meus olhos novamente
bem apertados, isso acentua ainda mais a minha dor de cabeça. Abro os olhos
outra vez, mas tudo está escuro. Não enxergo nada.
O que está acontecendo comigo?
8
Samantha
Luto contra a náusea que ameaça me tomar. Quero levantar, mas o
medo do desconhecido me paralisa na cama.
Tenho a sensação que estou afogando em desespero para sair da
escuridão ao meu redor. Não estou enxergando nada, nada! Um grito rasga
minha garganta enfraquecida, parece que não tenho forças para gritar mais
alto e a escuridão me domina.
Por que estão mantendo as luzes apagadas? Por que não acendem as
luzes?
Não, não, não... por favor não, por favor... Não posso estar cega,
posso?
— Alguém acende a luz. Ajude-me — peço debilmente tentando
mover minhas mãos na minha frente, mas isso é inútil, não consigo. —
Alguém, por favor, me ajude. — Eu não reconheço minha própria voz. O
terror impregnado no meu tom é angustiante. Eu engasgo com meus soluços,
lágrimas molham meu rosto e me sufocam.
Estou balbuciando coisas incoerentes e devo ter chamado a atenção de
Zara e Pietro. Escuto em meio aos meus próprios sons desesperados as vozes
deles me chamando. Tudo é nebuloso e sombrio, essa sensação de não saber
onde estou, para onde ir, me deixa transtornada, desorientada. Quero me
agarrar a algo sólido e esse desespero só cresce como um tsunami de horror
me ameaçando.
— Não consigo enxergar — falo, mas minha voz é inaudível. Minha
garganta está áspera, seca e as palavras de agonia não saem muito
compreensíveis para eles, porque continuam me chamando.
— Samantha? — a voz de Zara está acima de mim. — Querida, o que
você disse? Fale o que está sentindo...
Ela continua e continua, mas estou tentando controlar meu desespero.
Uma terceira voz aparece e manda os dois se afastarem. Sinto quando
começam a me examinar. Sinto o toque em meus olhos, levantando as
pálpebras. Sinto certo desconforto no olho, mas não sei atentar para a causa.
— Samantha? Sou o Doutor Mauricio, quero que você fique calma —
diz. — Você sofreu um acidente, você lembra? Está no hospital agora. Você
consegue enxergar alguma luz?
— Não posso ver — consigo dizer baixo. Meus soluços agonizantes
tinham cessado um pouco. Minha voz está trêmula quando indago: — O que
houve com minha visão?
— Você sofreu uma contusão na cabeça. Isso pode ter afetado sua
visão, mas não foi detectado nos exames que fizemos. Vamos fazer exames
mais detalhados com o oftalmologista para descobrir o que está acontecendo.
Na tomografia que fizemos não apareceu nada anormal, mas faremos tudo
para dar um diagnóstico mais preciso. — Sua voz é calma e tranquila, mas
não faz nada para parar o horror e medo que estou sentindo de ficar cega para
sempre. — Vamos tomar todas as medidas para que fique bem. Você lembra
do acidente?
— Não! — digo e tento levantar, mas sinto mãos me segurarem no
colchão. Meu corpo todo treme como nunca senti antes. O medo do
desconhecido é terrível.
— O que você lembra, Samantha? — ele insiste.
— Nada.
— Como nada? Sabe quem você é?
Não digo nada, quero balançar a cabeça para dizer que sim, sei quem
eu sou, mas não me lembro do que aconteceu depois que saí do hotel.
— Calma, tudo ficará bem. Vou dar um calmante para que possa ficar
mais calma e continuaremos com as perguntas. Pode ser apenas uma
desorientação passageira. — Eu sabia que era mentira, nada poderia ficar
bem se eu não podia enxergar. Eu não consigo ficar parada. De repente algo
me bate, fazendo-me tremer descontroladamente. E minha carreira? Como
será agora? Oh, meu Deus!
— O que está acontecendo, doutor? — a voz de Zara vem de algum
lugar. — O que ela quer dizer com “não posso enxergar”?
— Sem exames específicos não podemos dizer nada ainda. Mas agora
que ela acordou vamos continuar com os exames — o doutor diz. — Vou
solicitar agora mesmo. Essa perda da visão e perda parcial da memória pode
ser apenas ocasional por causa do choque, mas nada pode ser afirmado antes
dos exames. Ela tem retração da pupila com a luz, isso mostra que a causa
não pode ser irreversível. Bem, irei providenciar os exames o quanto antes. A
medicação logo fará efeito e ela ficará mais tranquila. Com licença.
Não escuto mais a voz dele, apenas os sussurros de Zara com outra
pessoa. Deus, essa falta de controle é terrível.
Eu não quero ficar mais tranquila, quero minha visão de volta. Sinto
lágrimas quentes caindo dos meus olhos e, pouco depois, caio no mundo do
esquecimento mais uma vez.
A próxima voz que escuto quando acordo é o choro de alguém e a voz
reconfortante do meu pai. Minha mão está presa na mão de outra pessoa, o
cheiro de antisséptico é forte no local. Aperto a mão que está segurando a
minha e a voz de mamãe sai trêmula quando ela fala.
— Filha, querida — ela funga chorosa. — Sou eu, a mamãe!
— Oi, mãe. Oi, pai — minha voz sai com falsa alegria. Não sinto
alegria por tê-los aqui. Não quando o medo de nunca mais ver o sol, as cores
e, principalmente, não tocar piano tomam lugar dentro de mim. Nem a
presença dos meus pais aqui traz conforto. Mas ao mesmo tempo uma
letargia corre por mim. Como se eu já estivesse aceitando esse fato muito
rapidamente. Essa não sou eu! Eu sempre luto, mas ficar cega agora parece
um castigo merecido para meus pecados. Só que é um castigo tão pesado. Eu
não tinha percebido que estava chorando até minha mãe se inclinar sobre
mim.
— Ah, minha menina, eu sinto tanto. — Ela chora também. — Você
vai ficar bem.
— Filha, estamos todos aqui. Vamos levar você para os melhores
especialistas que existem, não vamos aceitar isso — meu pai fala e segura
minha outra mão onde sinto a picada desconfortável de um provável cateter.
— Falamos com o médico e ele não tem nada concreto, vamos tirar você
daqui.
— Eu quero ir para casa — digo apática. E percebo que nem sei
aonde é minha casa. Tenho vivido esses anos todos em hotéis e mais hotéis.
Não tenho um lugar para ir, um lugar caseiro ou familiar. E agora vou
depender das pessoas para tudo, até me adaptar a minha nova condição. —
Eu não tenho casa.
— Ah, meu amor, minha menina, está tudo bem. Como não tem casa?
Claro que tem uma casa. Onde nós estivermos sempre será sua casa. — Sinto
um toque no meu rosto.
Tenho vontade de levantar e correr como uma louca daqui, mas isso
não será mais possível.
É o que preciso: correr e me esconder de todos. Eu só preciso de mim
mesma. Essa angústia só aumenta, como se eu estivesse me preparando para
algo terrível. E talvez eu esteja. Uma pessoa que não sabe o que o futuro lhe
reserva para as próximas horas, pode esperar qualquer coisa.
— Pietro, que bom que pôde vir — a voz de minha mãe está
embargada. — Minha filha precisa muito de você agora.
Tenho vontade de gritar que eu não preciso desse tipo de coisa agora.
E, como se alguém tivesse ouvido minhas preces, ouço barulhos e vozes
dizendo que vieram me buscar para realizar exames.
Nas próximas horas, sou submetida a todo tipo de exames que eles
têm disponíveis. Eu estou alheia a tudo, como se isso estivesse acontecendo
com outra pessoa. Estou em uma realidade fora do meu corpo, parecendo
assistir tudo de longe.
O neurologista juntamente com o oftalmologista dizem não haver
aparentemente nada me impedindo de enxergar. Também dizem que estou
com algum bloqueio para lembrar o acidente pois isso é, de alguma forma,
angustiante para mim. Que devo estar com amnésia seletiva.
Imagino a manchete nos jornais que dará um ataque em Zara:
SAMANTHA STOLLEN DEIXA O MUNDO DA MÚSICA, CEGA E
COM AMNÉSIA.
Tenho vontade de rir e percebo que estou fazendo justamente isso
quando ouço mamãe perguntar o que tenho.
— Filha, tudo na vida tem uma razão para acontecer — ela recita e
minha histeria cresce mais em forma de riso. — Você tem de agradecer por
ainda estar viva.
Sim, estou viva, mas sentindo-me morta por dentro também. Eu dei
tudo pela música e agora o quê?
Nada. Eu não sinto nada, ás lágrimas parecem ter secado. Estou me
sentindo vazia por dentro. Perdi umas das coisas que mais amo no mundo,
minha música. Como irei viver agora? Quero gritar tão alto, quero rasgar essa
dor no meu peito. Não sentir nada era melhor do que sentir essa dor e
desespero tão profundo que nada poderia consertar.
— Nada mais importa — sussurro com minha voz quebrada, palavras
vazias e sem emoção. Quem era Samantha Stollen agora, sem sua música?
Nada mais importa, eu só quero um lugar em que todos me deixem
em paz.
9
Carl

You had me in the palm of your hand


Why your love went away
I just can't seem to understand
Thought it was me and you baby
Me and you until the end
But I guess I was wrong
(What Goes Around... Comes Around
Marilyn Manson )

Quando chego em casa já passam das dez da noite. Deixo minha


mala e troco de roupa depois de lavar o suor fora em um banho rápido.
Vestido em um dos meus ternos habituais, saio em direção a casa de
Alexander. Preciso saber o que ele sabe sobre Samantha e porque diabos sua
namorada ligou para mim. Nunca falei com meus amigos sobre ela, nunca
tive coragem de confessar que sou o maior bobo apaixonado de toda história.
Ligo meu telefone, que agora tem dezenas de chamadas de Lana, e
disco para a empresa. Têm homens de plantão hoje e peço para que localizem
em qual hospital Sam está.
— Quando tiver uma notícia me chame imediatamente — digo depois
de passar os dados dela que ainda lembro. Desligo e me concentro no trânsito
à minha frente.
Bato na porta de Alexander pouco depois de uma viagem rápida de
carro onde avancei todos os sinais vermelhos que pude. Que as multas
venham, só espero não perder minha carteira de motorista. Isso seria o
cúmulo, mas estou pouco ligando para essa porcaria.
Ele abre a porta e vejo que o tirei da cama.
— Carl? O que faz aqui? — ele parece surpreso por eu estar àquela
hora em sua casa. Eu não peço licença quando o empurro, entrando em sua
casa.
— Preciso falar com você — digo e caminho para a sala. Eu apenas
vim aqui porque não tive como localizar o paradeiro de Sam. Ainda não tive
nenhum retorno dos homens na empresa.
— Sobre o quê, O’Neal? — Ele aponta a sofá. — Senta aí, cara.
— Samantha Stollen — digo. — Lana ligou para mim contando sobre
o acidente.
Ele parece constrangido quanto ao assunto.
— Ah, Lana, essa menina é minha perdição. — Ele passa a mão por
seus cabelos curtos — Bom, eu...
— Você gaguejando, Alex?
— Para ser sincero, sua reação naquele dia no bar me deixou curioso
— ele começa. — Só fiz uma pequena investigação e ...
Eu tinha deixado transparecer meus sentimentos em relação a
Samantha naquele dia? Eu não tinha percebido naquele momento, talvez
tenha estado mais bêbado do que pensei.
— Bisbilhotou meu passado? Se eu quisesse que vocês soubessem
teria contado — digo um pouco chateado.
— Eu sei, mas estava preocupado com você. Um cara tão centrado e
de uma hora para outra estava saindo, deixando trabalho inacabado... e tudo
poderia estar ligado a essa mulher. Eu queria saber, mas não sei toda história.
Apenas descobri que ela era sua namorada na época de colégio e faculdade.
— E achou legal envolver sua namorada pentelha? — pergunto, mas
no fundo não estou chateado.
— Peço desculpas pela intromissão de Lana — ele diz suspirando. —
Quanto a moça, eu não sei onde ela está, se é isso que você veio saber. Nem a
imprensa sabe. Não está mais no hospital que ela foi levada primeiramente
quando a socorreram. Segundo soube, a agente dela transferiu-a de hospital
por causa do tumulto. Apesar de ser muito estranho esse mistério todo em
volta dela.
Que merda estava acontecendo com ela? Por que toda essa discrição
sobre o acidente? Nada foi dito claramente e esse mistério faz com que todos
fiquem especulando quão grave é seu estado de saúde. Eu preciso vê-la.
Culpa dispara em ondas por mim. Não devia ter dito aquelas palavras duras
para ela. Teria sido melhor deixar o passado no passado, porém quem disse
que estava pensando claramente naquela noite.
— Você quer falar sobre isso? — Alexander pede. Fico tenso e
caminho para olhar através da janela de sua casa. Passo as mãos pelo rosto e
a aspereza da barba por fazer de uma semana arranha minha palma, fazendo-
me consciente que não sou mais tão jovem como era dez anos atrás.
— Não tenho nada para falar — digo e viro-me para ele, mas acabo
confessando em seguida. — Eu preciso descobrir onde ela está, esse acidente
foi culpa minha.
— Do que está falando? — Alex vem e para na minha frente. — Por
que não senta e me conta o que está havendo entre você e essa mulher, Carl?
— Não quero falar sobre isso, basta saber que é uma história
complicada e que aconteceu há muito tempo. — Enfio as mãos nos bolsos da
calça. — Mas deve saber por andar bisbilhotando minha vida.
Ele faz um som de escárnio e me olha preocupado.
— Você saiu daqui feito um louco. Eu, como seu amigo, estava
preocupado. Você, Bruno e o Salvatore são como irmãos para mim, então,
cara, vou sempre me meter na vida de vocês. — Ele segura meu ombro. —
Leve seu tempo para resolver essa história com essa moça. Sei muito bem
que está apenas começando. Tente descobrir por que estão mantendo-a
escondida da imprensa como se ela tivesse uma doença contagiosa.
— Obrigado — digo apenas. — Pedi ao pessoal da empresa que
investigasse, mas irei até lá agora.
Como se o tempo tivesse cronometrado, meu telefone começa a tocar.
É Dom, um dos caras que está de plantão hoje no sistema de monitoramento.
— O’Neal? Não tenho boas notícias — ele vai direto ao ponto.
— Descobriu em qual hospital Samantha está?
— Não. O hospital onde fizeram os primeiros socorros não quis dar
nenhuma informação para aonde ela foi transferida já que não somos da
polícia.
— Ligou para nosso contato na polícia? Está havendo alguma
investigação do acidente? Afinal ela é uma pessoa pública, deve haver
alguma investigação a caminho.
— Segundo nosso cara da polícia, o caso está quase encerrado.
Segundo ele, a causa do acidente foi possivelmente alguma medicação que a
moça tomou e a fez perder o controle do carro ou, pela forma que aconteceu,
ela tentou se matar já que o carro estava em uma velocidade considerável.
O quê?
— O que você quer dizer com medicação? — pergunto atordoado.
Samantha estava envolvida com drogas? — Que tipo de medicação?
— Só vendo o relatório da polícia para saber, não obtive essa
informação — Dom diz, pelo visto, um tanto chateado por não poder ajudar.
— Tem como conseguir isso para mim? E o nome dessa agente?
— Vou ver o que consigo, ligo para você o quanto antes — ele se
despede e desliga.
Fecho meus olhos e respiro fundo. Que situação mais sem lógica?
Como uma pessoa sofre um acidente e tudo vira um caso de segurança
nacional?
— Pelo visto não tem boas notícias — Alexander deduz.
— Estou achando que esses agentes, que trabalham com artistas,
tentam o máximo manter as coisas em segredos, ainda mais se estiverem
lidando com algo que venha manchar a imagem do artista — digo pensativo.
— E tudo indica que Samantha poderia estar usando algum tipo de
medicação.
Medicação ou algo ilícito. Seria possível que esse mundo onde ela
vive hoje tinha a corrompido tanto? Eu não posso acreditar. Ela sempre foi
tão contra essas coisas ilegais, mesmo no colégio quando éramos jovens e
loucos ficamos longe dessas coisas. Mas agora eu não a conheço mais.
— Tenho de ir — falo. — Diga para sua namorada se manter longe da
minha vida privada.
— Peço desculpas mais uma vez. Ela me viu com o relatório que
recebi do passado de Samantha — ele diz meio constrangido. — E para sua
informação já joguei fora.
— Fico grato.
Pouco depois saio da casa de Alexander mais preocupado do que eu
cheguei. Sinto-me impotente por não ter notícias de Sam.
Passo a noite na empresa atrás de informações. Como era madrugada,
foi difícil as ligações para as pessoas que poderiam nos dar algo mais
concreto. São cinco da manhã quando descubro em que hospital estão
mantendo Samantha isolada do mundo exterior. E é para onde vou.
Não sei o que vou encontrar e, pela primeira vez, em muito tempo, eu
tenho medo.
Medo do desconhecido, de encontrá-la machucada. Medo de ela estar
ferida e nunca me perdoar por dizer as coisas horríveis que disse. Talvez nós
nunca iremos ficar juntos novamente, mas não quero que ela me odeie.
Apesar de ter falado o quanto a odiava.
Eu odeio, mas também amo. Esses dois sentimentos guerreiam tão
ferozmente dentro do meu peito que machuca. Mesmo em meio a essa mágoa
não quero vê-la machucada, acaba comigo saber que indiretamente lhe causei
dor. Sou um bastardo contraditório do caralho.
Ligo o som do carro enquanto estou no trânsito já intenso. Tenho
vontade de rir da música que sai pelo alto-falante do carro. What Goes
Around Comes Around caçoa de mim, só pode ser isso.
…You had me in the palm of your hand
Why your love went away
I just can't seem to understand…
Sim, tenho essas perguntas fervilhando dentro de mim para fazer a
ela, mas talvez eu nunca faça.
Chego ao hospital e não paro para saber onde é seu quarto, meu
contato já tinha me informado. Chego ao sexto andar onde ela está em um
quarto particular e bato.
Uma mulher jovem abre a porta e parece me conhecer quando se
dirige a mim.
— O que faz aqui? — ela pergunta, mas a raiva com a qual faz a
pergunta me surpreende e dou um passo para trás. — Não é bem-vindo aqui.
— Ela sai e fecha a porta atrás de si.
— E quem é você? — pergunto nada agradável. Será essa mulher a tal
agente de Sam?
— Sou agente da senhorita Stollen e estão proibidas visitas — ela
esclarece, confirmando minhas suspeitas.
— Sou Carl O’Neal, amigo de Samantha. — Olho para a porta fechada diante
de mim. A única barreira entre Sam e eu.
— Eu sei quem você é e Sam não o quer aqui — ela diz com
satisfação e olha para o pulso onde um relógio de aparência cara está. — E,
para ser mais clara, essa hora não é permitido visitas.
— Eu faço minha própria hora de visitas. — Dou um passo para a
porta e abro, deixando a agente boquiaberta. Passo por ela e entro no quarto.
10
Samantha
— Não pode entrar aí —a voz aborrecida de Zara falando com
alguém me acorda. Fico entre acordada e dormindo o tempo todo, porque
estou sempre sendo engolida pela escuridão ao redor. Quem poderia estar
aborrecendo-a? Ela quase nunca sai de perto de mim, a não ser para ir ao
hotel. Ela me avisa cada vez que sai, algo que acho desnecessário. Se ela vai
ou não, tanto faz. Nunca respondo as suas perguntas nem dos meus pais. Na
verdade, quero que eles saíam e me deixem sozinha por um minuto. Suas
perguntas insistentes, se estou bem, me irritam. Eles não percebem que estou
mal? Ficar sem visão não é suficiente para deixar qualquer pessoa
desesperada? Ainda mais eu que tenho uma carreira pela frente, é como
cortar meus membros fora do meu corpo.
— Eu faço meus próprios horários — escuto uma voz de homem
dizer, também com aborrecimento em seu tom, e isso me bate com a força de
quinhentas toneladas de granito direto em minha cabeça. Meu coração
começa uma corrida enlouquecida e dor me atravessa quando flashes dessa
mesma voz chicoteiam meu cérebro.
Uma dor súbita e feroz faz minha cabeça latejar e pressiono as
têmporas com os dedos. Queria gritar minha dor em voz alta, mas trinco os
dentes impedindo que os gritos rompam em minha garganta.
— ... Não quero perder tempo com coisas sem importância. Não
perdeu nada aqui, Samantha...
Oh, Deus!
Abro meus olhos tão rápido, porém nada vejo diante de mim. Lembro
do rosto cheio de raiva por mim na calçada.
— Nunca mais apareça na minha frente, Samantha, você não é bem-
vinda aqui — a voz de Carl vem nítida na minha mente, como dardos
venenosos intoxicando minha alma.
— Carl — sussurro inaudível. Imagens de mim mesma dirigindo para
me encontrar com ele. Seu rosto repleto de desprezo e amargura faz um
buraco em meu estômago de horror por ter me exposto a sua raiva. Não o
quero aqui. Não quero que ele me veja assim. Uma enxurrada de imagens
passam em minha mente e eu começo a chorar quando lembro do porquê
estou assim aqui.
O que afinal ele está fazendo aqui depois de tudo? Não foi ele mesmo
que disse que me odiava? Veio rir de mim? Da minha desgraça?
— Vá embora! — grito alto. — Vá embora! Não te quero aqui!
— Sam? — sua voz é calma e preocupada. No entanto não acredito
nele. Veio terminar o que começou? Me humilhar mais?
— Vá embora — digo sufocada. Tento sentar e derrubo o suporte para
o soro na minha tentativa de apoiar minha mão.
— O que você está fazendo? — a voz de Zara vem de algum lugar.
Suas mãos em meus braços me fazem repelir fora seu toque.
— Não! Saiam todos! — grito enquanto continuo tentando ficar de
pé. Sinto tontura, minha cabeça gira e eu perco o controle do meu corpo. Não
achei que a cama fosse tão alta e estou caindo quando mãos fortes me
seguram antes. — Não!
— Samantha, fique calma — ele diz, mas sua voz só me deixa mais
perturbada e meus gritos são cada vez mais altos.
— O que está havendo aqui? — uma voz feminina fala chateada. —
Isso não é hora para visitas. Quero que todos se retirem.
— Por favor — digo quando mãos me forçam a deitar. — Não quero
ninguém aqui.
— Vocês ouviram? Esperem lá fora, estão perturbando a paciente —
a mesma voz diz e eu tento me acalmar. Afinal tem alguém concordando
comigo.
— Qual o problema com ela? — a voz de Carl insiste.
— Senhor, espere lá fora — a mulher fala com mais rigor agora. Ouço
passos e deduzo que ele foi embora.
— Eles já foram? — pergunto e mal reconheço minha voz cheia de
medo. Jesus, estou um caos choroso. O pensamento traz novas lágrimas,
agora silenciosas. Não quero que ele me veja e sinta pena. Odeio que ele veio
aqui. — Não deixe esse homem entrar aqui — peço para a mulher, ela deve
ser a enfermeira.
Ela me acomoda na cama e fico mais calma, apesar das lágrimas
ainda estarem escorrendo. Não sei porque agora comecei a chorar tanto.
— Você está sentindo alguma coisa? — ela pergunta com a voz
amável — Por que ficou tão agitada?
— Eu... — será que conto que lembrei do acidente? Bom, melhor
dizer logo. — Acho que lembrei do acidente — digo e um soluço corta minha
fala. Dor e desespero antes de perder o controle do carro. A voz de Carl
reverberando em minha mente. Parece que estou em uma nuvem de algodão,
flutuando. Minha garganta está se contraindo, a bile subindo com ânsias. Mas
isso tem de terminar, porque não é real, não sou eu. Não sou eu aqui! Era
outra pessoa passando por um momento difícil. Eu não quero acreditar que
agora sou uma pessoa deficiente.
Porém a realidade é tão dura que me bate como um soco no meu
plexo solar.
Não sei se é dia ou noite, só sei que caio no estado de sonolência que
estive entrando e saindo todos esses dias. As lágrimas quentes são minhas
únicas companhias agora.
Escuto a movimentação quando a enfermeira chama o médico
dizendo que tive uma reação, ou seja, que estou lembrando do acidente.
Talvez a inconsciência seja o melhor lugar para estar nesse momento de dor.
— Não diga meu nome, eu te proíbo de falar meu nome como se
estivesse com dor, você não tem coração, Samantha Stollen. Você é uma
mentira!
A voz de Carl é dura na minha cabeça. Eu fecho minha mente para
que essa noite desapareça outra vez. Agora eu sei porque esqueci. Dói muito
lembrar. A autopiedade é um sentimento novo que queima profundamente.
Meu otimismo habitual evaporou naquela noite que Carl me mandou embora
como um cachorro sarnento para a sarjeta e, consequentemente, sou agora
uma deficiente!
Eu não o culpo por não me amar mais. Quem amaria uma mulher que
o deixou sem nada. Nem sequer um adeus apropriado. Mas, como meu
coração é bobo, o som de sua voz agora há pouco me fez sentir viva outra
vez.
Esse pensamento só me deixa pior do que já estou.
11
Carl
— Vão embora! Todos vocês!!
O que é isso?
Vejo Samantha caindo como se não pudesse ver um palmo à sua
frente. Vim preparado para qualquer coisa, mas ela parece ter sido atropelada
por um caminhão de concreto. Hematomas por toda maldita parte de seu
corpo exposto. Eu a encaro por um longo momento e fico chocado com seus
gritos frenéticos para sairmos do quarto. Eu obedeço a enfermeira que entrou
parecendo um sargento e vou para fora ainda escutando os lamentos
dolorosos de Sam.
— Qual seu nome? — pergunto a mulher esquisita que saiu junto
comigo. Ela assemelha-se a um maldito urubu com um traje elegante todo
preto. Nem parece que ela está em um hospital. Seu ar de quem acabou de
sair de uma sala de reunião é estranho para o lugar.
— Acho que eu que devo fazer as perguntas, senhor O’Neal — ela diz
meu nome com desprezo. — O que faz aqui?
— Garanto que isso não é da sua conta. — Encaro seus olhos astutos.
— Qual seu nome? E onde estão os pais de Samantha?
— Sou Zara e, como já disse, agente dela — ela diz com relutância.
— E seus pais devem estar dormindo, senhor O’Neal.
— Quem é o médico dela? Nome? — pergunto não dando atenção a
sua ironia sobre os pais de Sam. — Quero saber o que há de errado com ela.
Antes que ela me responda, um médico vem pelo corredor e entra no
quarto de Sam. Eu entro no quarto atrás dele. Os gritos de Sam pararam e isso
deve ser um bom sinal.
O médico conversa com a enfermeira e começa a chamar Samantha.
A enfermeira me olha carrancuda.
— Espere lá fora, senhor. — Eu a ignoro e vou para perto do médico
que examina os sinais vitais de Samantha.
Olho para o nome no jaleco do médico.
— Doutor Mauricio, ainda não me disseram qual o estado de saúde
dela — digo, fazendo com que Samantha abra os olhos. Mas eles estão sem
foco, é como se ela olhasse através de mim.
— Não... — seu fraco gemido faz um nó apertar em meu estômago.
Deus, quero correr e pegá-la no colo, mas algo me freia. Tento manter uma
atitude racional, eu preciso disso.
— O senhor é o que dela? — Ele se vira para mim e fico sem saber o
que dizer.
— Sou um amigo — digo por fim. Minto um pouco sabendo que ele
tem a ética médica de não revelar a qualquer um o estado se saúde de seus
pacientes. Baixo o tom de voz quando digo — Sou... humm. Namorado. Carl
O’Neal — apresento-me.
Eu vou para o inferno por mentir assim, mas eu tenho que saber dela.
Olho ao redor para ver se a agente pode me desmentir, mas ela está lá fora.
Melhor.
— Bem, Samantha tem um quadro de amnésia seletiva. Porém,
segundo a enfermeira, ela lembrou parte do que tinha esquecido, por isso essa
agitação — ele diz calmamente como se fosse a coisa mais normal do mundo.
No entanto ele me choca quando continua. — Além da cegueira, que não
sabemos a real causa ainda...
O quê? Jesus!
Eu fico parado olhando a cara sem emoção do médico como se algo
tivesse me congelado no lugar.
Que porra é essa que ele está dizendo? Dou um passo para trás em
choque. Olho para o rosto que povoa meus sonhos há anos. Desejando que
ela voltasse e continuássemos com nossos planos, mas isso nunca aconteceu.
Agora vê-la assim me deixa doente. Quero me sentir indiferente, porém não
posso. Fico com a consciência culpada quando me dou conta de que ela teve
um acidente. Pelo que disseram ela perdeu o controle do carro. E tudo aponta
para mim como culpado por deixá-la nervosa mandando-a embora daquele
jeito rude e grosseiro. Por mais que ela tenha me magoado, vê-la assim é
demais para mim.
— Essa condição ainda está sendo investigada e nada fisicamente
parece estar impedindo-a de voltar a enxergar. Assim como a memória está
voltando, ela pode voltar a enxergar — o médico continua. — Estamos ainda
fazendo exames físicos para seguir com a linha psicológica... — Ele é
interrompido pela voz fraca de Samantha.
— Vá embora!
— Tudo bem, Samantha? — o médico começa a questioná-la e eu me
distraio olhando-a. Seu corpo frágil me atinge tão forte, os instintos
protetores, que sempre tive em relação a ela, voltam com uma força
desconhecida. Minha garganta dói do esforço que faço para conter as
emoções que estão tomando proporções gigantescas dentro do meu peito. A
menina alegre e otimista está apagada no corpo de uma jovem mulher
quebrada em cima da cama. Olho ao redor do quarto e vejo que a agente dela
voltou. Ela está perto da porta olhando-me com raiva. O que diabos há com
essa mulher? Ela é desagradável.
Vou até ela.
— Por que Samantha está sendo mantida escondida de todos? Qual a
razão desse mistério em torno do acidente?
— Quem é você? Por acaso é da polícia, senhor O’Neal? — ela
debocha jocosa.
— E se for? Quero saber o que está acontecendo. Por que alguns sites
de fofocas estão especulando sobre Sam ter tomado alguma coisa ilícita para
ter causado o acidente? — Baixo meu rosto para que fique bem rente ao dela.
— Não houve nada sobre isso — ela diz na defensiva. Estreito meus
olhos para sua reação. — Ela não quer você aqui — ela continua dizendo
isso, mas eu estou mais inclinado a acreditar que é ela quem não me quer ao
redor de Samantha. Merda, sou paranoico pra caramba. Por que diabos ela
poderia não querer isso? Ela nem me conhece.
— Temo que ela não possa me impedir de ficar por aqui. — Dou um
sorriso nada amigável para Zara. — Eu não sou de aceitar as coisas
facilmente, então, é melhor começar a se acostumar com minha presença.
Vejo o médico ditando ordens a enfermeira e volto para junto dele,
pedindo que me explique melhor o que pode estar havendo com Sam. Tenho
vontade de ficar ao lado dela e conversar, mas ela parece mais tranquila e não
quero mais perturbá-la. Óbvio que minha presença causou esse transtorno.
Acompanho o médico para ter uma conversa privada.
— Me explique por que ela está sem enxergar — peço ao médico
quando ele me leva até um consultório e me faz sentar em uma cadeira em
frente à uma mesa.
— Senhor O’Neal, como estava dizendo anteriormente, ainda estamos
na fase de exames físicos, mas, pelo que vimos até agora, Samantha pode
estar com “cegueira histérica”. Esse termo nem é mais usado, podemos dizer
que é uma cegueira psicossomática. Sua mente está convertendo problemas
emocionais em problemas físicos. Mas essa é apenas a impressão que passa.
Vamos continuar com ela aqui no hospital até ter certeza que é emocional e a
partir daí vamos encaminhá-la ao tratamento psicológico.
Deus!
— Faz uma semana que ela está aqui e não o tinha visto ainda — ele
parece se dar conta que andei mentido.
— Estava viajando, trabalho com segurança privada e estive fora —
minto de novo. Merda.
— Bem, de qualquer maneira, vamos fazer tudo que pudermos para
que ela se recupere. — Ele exala exaustivamente. — O apoio de familiares
agora é fundamental para ela. Conheci seus pais e acho muito bom que todas
as pessoas importantes na vida dela estejam por perto.
— Claro! — Eu não sei nada sobre quem é importante para ela. Mas
minha presença aqui pode não ser boa de qualquer forma. Se foi por minha
causa que ela ficou assim, presa a uma cama... e nem quero pensar nela sem
visão.
— ... devem ter em mente que ela pode voltar a enxergar a qualquer
momento ou não — ele está dizendo, tirando-me da minha mente
enlouquecida.
Quero esmagar alguma coisa para extravasar a dor que sinto por ela,
por mim, por nossa história inacabada. Porque diabos isso agora?
Saio do consultório do médico e vou em direção ao quarto de Sam,
mas não chego até lá. Eu preciso sair daqui ou vou fazer alguma merda sem
tamanho se eu ficar e continuar vendo como ela está quebrada e frágil pra
caralho .
Tudo culpa do meu maldito ego que não aceitou bem a rejeição de
anos atrás e trouxe para nosso presente, causando mais dor para mim e
principalmente para ela. Não quero imaginar como é perder algumas de
minhas habilidades físicas e saber que ela está em estado constante de
escuridão me mata.
Não quero sair daqui sem falar com ela, mas acho que agora eu só
faria mais mal do que bem. Por isso faço meu caminho para fora do hospital.
12
Samantha
Três dias depois de recuperar a memória do acidente, estou saindo
do hospital. Eu não quero ficar mais aqui. Todos os exames que fiz não
acusaram nenhuma anomalia que possa estar me fazendo mal. Então por que
ficar aqui? O melhor que eu faço é me recuperar e adaptar a minha nova vida
em casa. E é exatamente o que estou fazendo agora, mas tudo é estranho e
novo. Estou parecendo um potro recém-nascido cambaleante em suas pernas
fracas. Estou insegura até para dar um passo, tenho a sensação que irei cair a
qualquer momento.
— Filha, você tem certeza disso? — mamãe pergunta pela
milionésima vez desde que decidi ir embora do hospital, mas o que me fez
decidir ir para casa são as constantes visitas de Carl. Ele tem vindo todos os
dias, desde que esteve aqui, e eu me lembrei do nosso encontro naquela noite
fatídica. Eu não permiti que ele entrasse em meu quarto, não tive coragem de
enfrentá-lo ainda. E não sei se terei. Esse sentimento de rejeição, mesmo que
indevido, é forte demais para lidar.
Os médicos querem me manter aqui, mas eu sei que nada que eles
fizerem irá trazer minha visão de volta. Ainda parece um sonho ruim o que
está acontecendo comigo, estou sem reação. Estou anestesiada com tudo isso.
Eu fico esperando o momento que a barreira vai cair e vou ficar apenas um
fiasco comparado com a Samantha musicista de sucesso que eu era.
— Você fez o que pedi? — Em vez de responder sua pergunta, eu que
sigo com a linha de perguntas para ela.
— Claro que em pouquíssimo tempo não pude achar um lugar melhor
— minha mãe diz. — Mas, Samantha, não entendo essa sua decisão de ficar
no Brasil. Você poderia ser melhor assistida em casa.
Por casa ela se refere aonde mesmo? Porque eu vivi oito anos da
minha vida em hotéis espalhados pelo mundo. Qual era o ponto de manter
uma casa se eu nunca estaria lá? Ela mora na Itália, exatamente em Palermo,
onde junto com meu pai fixaram moradia permanente. Eu não me importava
de manter os dois morando lá, afinal eu vivia para minha música. Mas eu
nunca quis morar com eles, nunca foi minha vontade morar em outro país e
eu sabia que um dia voltaria a morar aqui. E se esse acidente foi um empurrão
nesse sentido, que assim seja.
Três dias atrás eu pedi para ela providenciar um lugar e ela deve ter
trabalhado nisso com Zara, que está tão indignada com minha decisão que
mal falou comigo nesses últimos dias. Ela quer, assim como minha mãe, que
eu pegue um avião a vá para algum lugar me tratar. Elas não percebem que
isso não será resolvido com cirurgia ou seja lá o que elas pensam que os
médicos irão fazer?
Os médicos já não deixaram bem claro que tenho uma cegueira
psicossomática? Ou qualquer coisa que não tenho a menor ideia do que seja?
Enviaram uma psicóloga para falar comigo ontem e ela passou um bom
tempo, que pareceram horas, sentada ao lado da minha cama, mas eu não
falei nenhuma palavra, apesar de sua insistência.
Falar o quê? Tudo estava um caos dentro de mim. Se eu começasse a
falar eu iria desmoronar de vez. Já estou uma bagunça e ficaria pior. Quando
ela cansou de esperar, foi embora dizendo que voltaria hoje e viria todos os
dias, só que eu não estarei mais aqui. O médico me deu alta e recomendou
minha ida a um psiquiatra ou coisa que o valha. Não sei se irei.
Levantar e ir para o banheiro é a única coisa que faço, além de estar
deitada nessa cama, e tem sido um desafio. No primeiro dia eu entrei em
pânico. A enfermeira que estava comigo, que deve ser uma santa, manteve-se
calma quando eu entrei em parafuso sem enxergar nada. Deus, isso é tão
difícil e não aguento mais.
Meus olhos pinicam de lágrimas reprimidas.
— Porque ainda não saímos?
— Samantha, temos de seguir as normas do hospital. Há toda uma
burocracia já que você está assumindo o risco de sair — mamãe diz com voz
amável como se tivesse medo de me machucar com palavras duras. — Seja
paciente, filha.
— Como quer que eu seja paciente quando estou cega, mamãe?! —
grito perdendo o controle. — Diga-me!
— Eu sei que não é fácil...
Rio de sua voz condescendente. Depois paro quando percebo que ela
não tem culpa da droga em que estou. Da minha agonia.
— Desculpe. Só quero sair daqui — digo por fim. — Isso é pedir
muito?
— Vai sair, filha.
13
Carl
— Não pode entrar e deixar a paciente nervosa, senhor — a
enfermeira diz parecendo um sargento na porta do quarto de Sam. — Temo
que não seja possível sua entrada aqui.
Depois de, mais uma vez, ser barrado na porta do quarto de Samantha,
eu volto para a empresa. Estou precisando de um trabalho que tire o meu foco
dela. Entrar em seu quarto exigindo vê-la me tornará um maldito hipócrita,
afinal não sei o que dizer a ela e faz pouco tempo que eu mesmo disse que
não tínhamos nada para conversar. A culpa me fez ir como um louco vê-la.
Saber que ela estava bem e viva, apesar de estar temporariamente cega, era
um alívio. Estar com vida já é um milagre.
Quando saí, três dias atrás do hospital, fui direto para casa e passei
duas horas dentro da piscina até sentir meus músculos pedirem socorro de
exaustão, precisava expulsar a raiva e emoções conflituosas que estavam me
matando. O quanto um homem pode se castigar com seus próprios demônios
interiores? A minha vontade era bater em alguma coisa até não ter de pensar
o quanto ainda quero Samantha e que vê-la no hospital me mata. Uma morte
lenta para caralho.
Entro na sala de reunião onde Bruno e Alexander já estão esperando
por mim e resmungo um cumprimento para eles antes mesmo de sentar em
uma das cadeiras vazias ao redor da mesa.
— Alguém acordou feliz hoje, hein? — Bruno diz sarcástico. E o que
ele faz aqui? Não devia estar com a mulher grávida dele?
— Carl, como está Samantha? — Alexander pergunta. — Você andou
sumido desde que voltou.
Eu não queria falar de Samantha para meus amigos, eu a deixei fora
da minha vida porque era onde ela realmente estava. Sempre fui um homem
de poucas palavras, desde que me tornei adulto, quando mais jovem era mais
espontâneo. Não foi à toa que conquistei a maior gata do colégio, mas veja no
que deu.
— Está tudo bem — digo. Não quero levar meus problemas pessoais
para a empresa, independentemente se eles eram meus amigos e traziam suas
vidas pessoais para o trabalho. Ou melhor, o trabalho deles tinham se tornado
pessoal. Lanna e Alicia, no início, tinham sido apenas mais um trabalho para
a empresa. Esses caras não sabem manter seus paus nas calças. Eles são
descontrolados. Eu não me vejo fazendo isso.
Trinco minha mandíbula quando penso no cara frio que me tornei.
Isso era uma merda. Não me emocionava mais com atos românticos. Nunca
pensei que eles mudariam suas vidas por mulheres, mas agora eram
dominados por elas. Lastimável. Tenho vontade de rir de mim mesmo. Como
sou hipócrita, outro dia estava correndo da cidade por causa de uma mulher.
Grande exemplo eu sou, não é?
Mas eu tenho uma desculpa, Sam era meu mundo todo. Caralho! E eu
a perdi de uma maneira que ainda tento entender como tudo aconteceu. Em
um momento eu a tinha no outro, nada. A mulher que eu planejei amar até a
morte sumiu da minha vida como fumaça.
Mas vim hoje aqui a fim de pegar um trabalho que me mantenha com
a cabeça longe de Samantha.
— Quais as novidades do seu caso com Alicia? Tudo calmo? —
pergunto para o burro provocador do Bruno, esse cara tem uma família que
não é nada fraternal. Estava trabalhando com ele no caso, mas ele assumiu de
vez já que seu irmão queria Alicia fora do mundo dos vivos. O pior é que
nada podia ser provado ainda.
— Nada.
— Deni sabe que não pode fazer suas jogadas mais, sabe que estamos
de olho — Alexander diz e depois se vira para mim. — Posso te colocar com
o político? Ainda estou vendo um cara para trabalhar com ele.
— Claro, não estou com nada em vista. — Ótimo, Alex estava em
sintonia comigo. — Eu estive pensando em um trabalho fora da cidade, mas
esse está ótimo.
— Vocês vão me dizer o que está havendo com O’Neal ou não? — Bruno
reclama. — Vivem falando em porra de enigmas, por acaso acham que sou
algum vidente?
Acabamos rindo de sua tirada, deixando-o ainda mais bravo. — Não
tem graça manter os amigos fora dos assuntos interessantes. Vocês dois são
duas mulherzinhas fofoqueiras agora?
— Bruno, ninguém aqui está mantendo você na obscuridade — Alex
diz rindo. — Você que é um total desligado. Deve ser o amor.
— Meu amor vai muito bem, obrigado, cara. — Ele estufa o peito. —
Minhas mulheres estão todas lindas em casa esperando o papai.
— Deus! Era tão bom quando você era um puto — digo. — Esse cara
meloso é tão causador de diabetes, é muito açúcar em um só pacote.
— Você é um burro, meu chapa, não sabe o que é bom, nunca nem
viu uma boceta na vida. — Ele ri.
— Isso que vocês chamam de reunião? — A porta abre e o cara do TI
entra. — Ficam falando de BCT o tempo todo?
— O que é tão urgente, Souza? — Alex pergunta nada amistoso,
virando-se para olhar o cara. Mas ele não se intimida assim tão fácil, afinal o
cara tinha sido um hacker nas forças armadas, além de um soldado treinado,
portanto não iria sair correndo da carranca do Alexander.
— Calma, Marshall. Só quero falar com Carl antes que ele suma da
empresa. — Ele me lança um olhar preocupado. — Antes de sair preciso falar
com você. Tenho certeza que vai querer ver isso. Já estou de saída, chefe!
Antes que qualquer um pisque, ele está fora da sala.
— Que porra foi essa? — resmunga Bruno me olhando. — Trabalho
extra curricular?
— Sim, o que foi isso? — Alex também pergunta curioso.
— Não sei. — Eu havia pedido para ele descobrir qualquer coisa
sobre Samantha e sua agente, aliás toda essa gente que a rodeava, e ele vinha
trabalhando nisso esses dias. Espero que tenha algo para mim. Esse mistério
me irrita.
Estive lá hoje cedo e, mais uma vez, senti o antagonismo da agente.
Sua mãe estava no quarto com Sam, mas não saiu para falar comigo. Eu
agora sou a porra do inimigo. Eu que fui abandonado, estou sendo tratado
como se fosse o culpado de levar um pé na bunda. Tive vontade de entrar e
dizer umas verdades, mas eu já tenho minha cota de culpa para digerir.
Ontem tinha falado com o médico de novo e nada tinha sido diagnosticado
fisicamente para causar sua cegueira, mas ele me informou que tinha
começado um tratamento psicológico. Não entendo merda nenhuma disso.
— Bem, vou ver do que se trata. — Levanto e caminho para a porta
dizendo: — Alexander, me passe as informações do cliente.
— Vou pedir para Lilian falar com você — ele diz e dou um aceno
em despedida.
Caminho direto para a sala de TI e encontro Souza com a cara
praticamente enfiada na tela do computador.
— O que você tem para mim? — digo quando entro.
— Ei! Homem, senta aí. — Ele aponta uma cadeira de couro ao lado da
mesa dele. — Você não vai gostar do que tenho aqui.
— Fale logo! — Sento e olho para a tela que ele aponta.
— Como você pediu, andei verificando as coisas com sua gata — ele
diz e recebe um olhar assassino meu.
— Sem gracinha, porra! — sussurro, estou cheio das graças desses
caras. Onde está a seriedade desses homens?
Ele fica sério quando vira a tela do computador para mim. Vejo uma
caixa de e-mail aberta e olho para ele interrogativo.
— Essa caixa de e-mail é de Samantha Stollen — ele diz me deixando
chocado. Que porra ele faz invadindo a privacidade de Samantha?
— Que merda é essa? Quem lhe autorizou a violar a privacidade dela?
— berro furioso, levantando da cadeira pronto para quebrar seus dentes.
— Calma, O’Neal, estou apenas fazendo o que você pediu — ele diz.
—Apenas se acalme, homem. E no fim você vai me agradecer por invadir a
privacidade dela.
— Você está de brincadeira!
— Algum lunático está ameaçando sua cantora — ele diz, chamando
minha atenção. Minha raiva muda de foco com suas palavras. — Ela tem
recebido e-mails de alguém e não consegui rastrear porque o cara tomou
cuidado. Sempre um e-mail com remetente diferente e simplesmente se perde
na rede, esse cara certamente sabe que poderia ser rastreado e tomou cuidado.
— O que diz? — murmuro. — E ela não é uma cantora, é uma
pianista.
— Que seja. Bem, basicamente os e-mails dizem que ela se
arrependerá se parar de tocar. Tem uns bem horripilantes.
— Descobriu se ela levou para as autoridades? — Deus! Será que
esse acidente foi mesmo um acidente? Com qual merda estamos lindando
aqui?
—Eu não consegui descobrir isso, já que não sei onde ela mora. E na
polícia eu teria que ter um tempo maior para descobrir algo. — Ele franze a
testa. — Essa mulher não para nunca em algum lugar? Estive rastreando os
lugares por onde ela passou e quase entrei em parafuso.
— Quais são as datas desses e-mails?
— O último que ela recebeu faz um mês — diz e começa a digitar. —
O primeiro foi exatamente há um ano. O mais estranho é que esses e-mails
parecem não ter uma conotação sexual como geralmente têm quando algum
lunático se apaixona por essas celebridades.
— Verificou todos os outros? — pergunto friamente porque um gelo
está tomando conta de mim. Quem é o maldito que está ameaçando Sam? Ele
não sabe, mas é um cara morto do caralho! — Quero saber tudo, sobre todas
as pessoas ao redor dela.
— Sim, já verifiquei a agente e ela está limpa — ele diz. — Mas não
fui a fundo em nenhum outro, porque queria informar para você
imediatamente.
Por ironia do destino enquanto estamos falando a tela apita um novo
e-mail e olhamos um para o outro quando ele atualiza e verifica de quem é.
— Que merda é essa? — Ele clica para abrir sem nem pensar. — Ele
acabou de mandar outro e-mail.
Olho para a tela para ver e congelo na cadeira.
“Acidentes acontecem como avisos.”
“Talvez o próximo não tenha tanta sorte.”
“Cabe a você continuar, o mundo não pode perder seu glorioso talento”.
Não tinha assinatura, nada, apenas isso.
— O’Neal, esse e-mail foi enviado aqui do Brasil para ela. Dá para
verificar o IP. Veio provavelmente de uma Lan House, esse não teve nenhum
cuidado. Talvez não tenha sido a mesma pessoa — diz enquanto verifica. —
Não é exatamente uma ameaça, mas tipo um lembrete para não esquecer o
que pode acontecer se ela parar o que quer que seja.
— Continue tentando descobrir quem é esse defunto do caralho. —
Levanto tão furioso que perco um pouco o foco. Como alguém pode ameaçar
uma pessoa doente e completamente indefesa como Samantha está agora?
Maldito filho da puta. Eu tenho de fazer alguma coisa.
14
Carl
Quando estaciono o carro em frente ao hospital, pela
segunda vez hoje, estou fervendo de raiva. Como é que um covarde maldito
ameaça uma mulher e, o pior, no estado em que ela se encontra? Eu sou
insensível às vezes, mas tenho minha consciência para me castigar depois.
Bato a porta do carro e, quando estou entrando no edifício, vejo Samantha em
uma cadeira de rodas sendo empurrada por sua mãe que não vejo há muitos
anos. Elas estão prestes a entrar em um carro quando me aproximo. Por que
diabos ela está saindo do hospital? Ela não teria que continuar o tratamento
aqui? Que droga é essa?
A mãe dela é a primeira a me ver chegando e seus olhos se arregalam,
não sei se de desgosto ou advertência para não incomodar sua filha, mas eu
não estou dando a mínima. O que eu quero é falar com Samantha sobre sua
segurança. Mas quem me aborda é a onipresente agente.
— Senhor, já ficou claro que sua presença aqui é indesejada. — Ela
vem e para na minha frente bloqueando meu caminho. — Teremos de chamar
a polícia para relatar sua perseguição?
— A polícia é uma ótima ideia — digo e Samantha deve ter escutado
minha voz porque vejo-a endurecer na cadeira. Viro outra vez para a agente.
— Por que ela está saindo do hospital?
Não espero sua resposta porque ela não dará nenhuma, pois sua má
vontade é evidente. Viro-me para Sam. Ela está frágil e ainda com algumas
ataduras. Livrando-me da agente, vou até onde ela está.
— Senhora Stollen! — cumprimento com um aceno — Preciso falar
com sua filha — digo apenas por reconhecimento de sua presença, pois se ela
tentar me impedir de falar com Sam descobrirá que não sou muito obediente.
— Minha filha não quer sua presença, Carl — ela diz não muito
satisfeita. — Agora não é o momento. Como vê, estamos indo para casa.
Por que ela não diz nada? Deixa as pessoas falarem por ela? Será que
esse acidente matou o seu lado impertinente que não tinha medo de nada?
Não reconheço em nada a garota por quem fui tão apaixonado. Sua apatia me
abala. Não gosto de vê-la assim. Talvez ela esteja me dando um tratamento
de silêncio, se assim for, é melhor do que saber que esse acidente tinha
mexido com sua cabeça além do reparo. Porque sua música terá que dar um
tempo em sua vida agora. Quando me preparo para falar, um homem se junta
a nós e, pelas minhas pesquisas, reconheço o tal cantorzinho que dizem ser
namorado de Samantha.
— Samantha, vou colocar você no carro — ele para perto dela e eu
bloqueio seu caminho. Não vou deixá-los sumirem com ela novamente. Não
confio em nenhum deles.
— Eu levo Samantha para casa, tenho um assunto para discutir com
ela e todos vocês — digo. Terei de falar com todos sobre essas ameaças
contra Sam. — E não pode ser aqui no meio da rua.
— Não quero você perto de mim — a voz de Sam vem mais dura e
olho para ela.— Não venha mais perto de mim, senhor O’Neal.
Sou senhor agora? Ela não tem ideia de quão teimoso posso ser.
— Faço questão de falar com você, Samantha. Então, vou para onde
vocês estão indo. — Viro-me para sua mãe. — Onde vocês estão morando?
Em algum hotel?
— Uma casa, alugamos para que Samantha possa ficar até se
recuperar. — Ela não parece muito feliz por me dar essa informação, mas
deve ter notado que não irei embora tão facilmente.
Vou até ao lado de Samantha e, como a porta do carro está aberta,
tomo-a em meus braços e a coloco no banco do automóvel. Quando a
deposito no carro, noto que ela está tremendo violentamente e lágrimas caem
silenciosas por sua face. Meu próprio coração dá um nó de angústia quando a
emoção toma conta de mim. Tudo ao redor desaparece e apenas vejo-a na
minha frente. Sinto seu cheiro por estar tão perto, mas esse cheiro não é o
mesmo que ainda tenho em minha memória. Meus olhos pinicam e eu não
sou o tipo de cara emocional, não mais, ou eu achava que não era mais até
vê-la e tocá-la.
— Vá embora. Por que está fazendo isso comigo? — a voz quase
inaudível dela me alcança, o tom tão malditamente triste que me corta o
coração. Ela agarra a frente do meu terno uma vez que ainda estou curvado
para dentro do carro. — Carl, por favor, só vá embora.
— Eu não posso — digo buscando firmeza, onde eu não sei. — Eu
não posso deixar você se machucar mais do que já está. — E sabendo que ela
não me aceitará tão facilmente sem um bom motivo para minha presença,
resolvo falar o porquê de estar aqui neste momento. — Você está em perigo,
Samantha. Tive acesso a e-mails ameaçadores contra você, eu preciso de sua
colaboração para discutir isso com sua família — informo baixo para que só
ela ouça, não quero um pandemônio de todos.
— O quê?
— Vamos conversar quando estiver confortável em casa — digo. —
Vou seguir vocês e não importa que não me queira perto.
— Mas você disse que tudo...
— Não importa o que eu disse, Sam — corto calmamente. — Importa
que você tenha uma recuperação sem nenhum transtorno. Não vou deixar
nada acontecer com você mais do que já fiz.
Nem que eu tenha de lutar contra eu mesmo para não magoá-la mais.
Eu passei dez anos da minha vida parado no tempo por causa dela, então
porque deixar alguém machucá-la? Só por cima do meu cadáver.
— Eu vou seguir você — repito e afivelo seu cinto de segurança. Bato
a porta do carro fechada e digo para a mãe dela: — Estou bem atrás de vocês.
Não espero um argumento e caminho de volta para meu carro. Tomo
consciência de que irei fazer a coisa mais difícil da minha vida: conviver com
minha ex que não consegui esquecer e com quem não tenho nenhuma chance
de voltar ao que tínhamos. Isso me deixa louco. Emoções que pensei que não
sentiria mais vêm com tudo me tirando do eixo. Não sei se essa é uma boa
ideia, me intrometer em sua vida assim, mas, porra, eu não sei ser normal
quando Sam está envolvida. Perco a razão e sigo meu coração traiçoeiro. Seu
pranto silencioso era mais preocupante do que se ela estivesse em um choro
violento. Minha capacidade de derreter em uma poça por ela era chocante.
Quando sento no meu carro, jogo minha cabeça para trás no encosto
do banco e respiro fundo. Vejo quando eles começam a sair do
estacionamento do hospital. Ligo meu carro e sigo-os.
Eu sou um homem fodido. Estou cavando minha própria infelicidade
por me envolver de novo com ela, porque eu sei que se ficar por perto
dificilmente vou resistir. Sim, isso mostra quão fraco sou. Minha casca
durona é apenas para os outros de fora. Mas isso não é o que vim fazer aqui,
sua segurança é prioridade.
15
Samantha
A sensação de desalento que eu estava sentindo ao sair do hospital é
totalmente nova para mim. É escuro e sem rumo. Estou tentando me
acostumar quando escuto o som da voz de Carl. Deus, por que ele não
desiste? Por que insiste em vir aqui jogar sal na ferida aberta? Permaneço
quieta, mas todo meu corpo está duro de expectativa e medo. Quero dar
tratamento de silêncio, talvez assim ele me deixe em paz.
Mal escuto o que ele está dizendo para minha mãe, ainda estou
desorientada, sem costume de usar os outros sentidos para me orientar. Sinto-
me perdida. Tudo parece tão diferente. Minha coordenação motora ainda não
foi testada por ter ficado deitada direto e um dos braços está imobilizado por
causa do punho machucado. Eu penso, a cada minuto do dia, como é que vou
aprender a conviver com minhas limitações. Deus, pode uma pessoa
enlouquecer de tanto pensar? Tanto barulho... Parece uma cacofonia de todos
os lados. Não ter noção de onde se está é tão assustador. Se minha mãe não
estivesse aqui comigo estaria gritando a plenos pulmões, no entanto ela não
saiu de perto de mim. Sou grata, passa-me a sensação de segurança que não
tenho mais.
Estou tão distraída que quando braços fortes me pegam eu começo a
tremer descontroladamente. Sinto o cheiro e sei que é ele me segurando,
colocando-me no que imagino ser o banco do carro. Eu quero passar os
braços por seus ombros e me agarrar nele até a eternidade, mas não faço nada
disso. Eu não esqueci sua rejeição. Os acontecimentos daquela noite ainda
queimam dentro do meu cérebro como veneno. Eu perdi a visão, mas vejo
cada cena nitidamente atrás das minhas pálpebras.
O toque dele agora inflama na minha pele como brasa ardente
fazendo-me chorar pela minha realidade. As lágrimas silenciosas molham
meu rosto e eu não me contenho mais, quero falar com ele, pedir que me
deixe em paz, deixe-me com minha dor.
— Vá embora, por que está fazendo isso comigo? — balbucio
agarrando com minha mão livre sua roupa, trazendo-o para mais perto de
mim. — Carl, por favor, só vá embora.
Não suporto tê-lo aqui assim e não poder abraçá-lo como desejei fazer
quando desci daquele avião na semana passada.
— Eu não posso — ele diz. A sua voz é como um bálsamo para mim,
tenho tanta saudade de escutá-la. — Eu não posso deixar você se machucar
mais do que já está. — O que ele está dizendo? — Você está em perigo,
Samantha. Tive acesso a e-mails ameaçadores contra você, eu preciso de sua
colaboração para discutir isso com sua família.
— O quê? — Como ele descobriu sobre os e-mails? O que ele sabe?
— Vamos falar sobre isso quando estiver confortável em casa — ele
continua. — Vou seguir vocês e não importa que não me queira perto.
— Mas você disse que tudo...
— Não importa o que eu disse, Sam — fala, impedindo-me de
continuar. — Importa que você tenha uma recuperação sem nenhum
transtorno. Não vou deixar nada acontecer com você.
Sinto suas mãos tocando na lateral do meu corpo e um arrepio passa
por mim. Seu perfume masculino penetra minhas narinas e inalo como um
elixir. Não sei se o terei assim tão perto de mim outra vez. Minhas lágrimas
agora são mais fortes. Ah, eu ainda o amo tanto!
Sinto o calor se afastar e o barulho da porta sendo fechada. Nem se
despediu de mim. Meu soluço inaudível é doloroso porque eu não tenho
direito de chorar por nada, engulo minha dor e foco no que ele falou sobre as
ameaças. Essas ameaças são velhas, não devem ser nada. Nunca aconteceu
algo que pudesse me deixar temerosa, não sei por que ele está se metendo
nisso.
Reprimo minhas lágrimas e suspiro. Meu emocional está em
frangalhos.
É apenas o acúmulo de emoções e acontecimentos desde que desembarquei
aqui. Digo para mim mesma quando encosto minha cabeça no banco. Sou
prisioneira da escuridão, talvez esse seja o castigo por meus pecados.
Percebo que os outros estão entrando no carro e a voz de Pietro vem
do lado do motorista. Sua mão toca a minha que está enrolada em punho no
meu colo.
— O que esse homem quer com a Sam? — ele parece chateado, não
me incomodo em responder.
— Ele disse que tem algo para falar conosco, pode ser algo ligado ao
acidente de Samantha — mamãe diz. — Vamos ver o que ele tem a dizer,
soube que ele trabalha com segurança privada. Pode ter alguma razão para o
carro se descontrolar da forma que...
— Ele é o único culpado de tudo — diz Zara de algum lugar, não
atino de que lado vem.
— Do que está falando? — mamãe indaga. — Como esse rapaz pode
ser responsável pelo acidente? Explique-se, Zara.
— Não vamos falar disso agora — Zara reponde. Por quê? Só por que
estou aqui? Por que ela se acha no direito de intervir sempre que pode na
minha vida? Estou cansada disso.
— Claro — ouço mamãe concordar. Odeio essa sensação de que estão
falando em código para não ofender a cega.
— Não se incomodem por mim — digo jocosamente. Eles mudam de
assunto falando da casa que iremos morar e não tocam mais no nome de Carl.
*
Como não sei mais a noção de tempo, depois do que parece uma
eternidade ouço mamãe falar que chegamos ao nosso destino. O carro para e,
não se passa nem um minuto, a porta do meu lado é aberta.
— Vou pegar você, Sam — Carl fala perto de mim. Como ele chegou
tão rápido aqui? Ele tinha super poderes que eu não sabia?
— Senhor, eu posso muito bem levar minha noiva — Pietro está
dizendo com a voz postada de tenor, mas Carl parece não se importar com
sua revelação. Noiva? É outra coisa que está me chateando, essa mania de
Pietro gritar aos quatros ventos que somos um casal, o que não é verdade.
Sair para jantar algumas vezes não fez de nós um casal. Que chateação!
— Me ponha na cadeira — peço quando Carl me toma outra vez nos
braços, ele acomoda meu braço são em volta de seu pescoço e começa a
caminhar. Para aonde? Não sei. — Onde estamos indo?
— Para dentro de sua nova casa. E não tem cadeira, acho que aquela
era do hospital — ele diz, seu hálito batendo no meu rosto e a única coisa que
faço é deitar minha cabeça em seu ombro.
O ar frio da casa me indica que entramos. Quando penso que ele irá
me colocar na sala, pergunta:
— Qual é o quarto onde ela ficará? — Não tenho noção à quem ele
está perguntando, mas é a voz de papai que ouço responder:
— Vamos deixá-la aqui no térreo. — Carl começa a me levar para o
que parece ser o tal quarto e, segundos depois, ele me deposita na cama. Sinto
falta dos seus braços ao redor de mim quando ele levanta.
— Obrigada, Carl, daqui em diante posso lidar com minha filha. —
Mamãe deve ter vindo atrás de nós.
— Sinto contradizê-la, senhora, mas preciso falar a sós com Sam —
Carl diz. — Peço licença aos senhores, pois é uma conversa particular.
Ele está louco? Como pode falar assim com meus pais. Mas eu estou
curiosa sobre o que ele quer falar comigo. Não tenho mais saco de ser regida
por todos à minha volta. Não sou uma inválida. Cega, mas não inválida.
— Não é hora para isso, meu rapaz. Minha filha acabou de chegar do
hospital, caso não tenha notado, precisa descansar e não discutir algum
assunto importante que não pode esperar. — Mamãe está chateada, é óbvio
pelo seu tom de voz.
— Está tudo bem, mãe — rebelo-me por fim. — Eu vou falar com
ele, ainda não estou morta para que não tenha opinião própria.
— Eu já estava ficando preocupado — Carl fala surpreendendo-me
com o tom leve. Será que ele não é mais o homem de gelo que demonstrou
para mim naquele dia? Mas do que ele estava falando?
— Ainda acho que pode esperar, você precisa pensar em si mesma,
Sam — ela insiste.
— Vamos, querida, o quanto antes isso acabar mais rápido Sam
poderá descansar — papai diz, sensato como sempre.
Ouço a porta bater e procuro ficar o mais confortável nessa cama, mas
o colchão mole atrapalha meus movimentos para me firmar. Mamãe havia
dito que papai tinha passado muito tempo aqui com alguns profissionais
adaptando a casa para mim, por isso ele não tinha ido ao hospital desde que
manifestei minha intenção de ficar no Brasil.
— Venha aqui, deixe eu ajudar — a voz de Carl está bem perto e,
segundos depois, está ajeitando os travesseiros atrás de mim para me deixar
em uma posição confortável.
— Obrigada — sussurro e depois pigarreio um pouco constrangida
que um simples ato da parte dele pode me deixar tão dócil.
— Não há de quê, Samantha. — Ele parece frio porque sua voz não
deixa nada transparecer. Gostaria tanto de ver seu rosto. Eu queria tanto vê-lo
outra vez um dia e quando o tenho aqui, tão perto, isso é tirado de mim. —
Você precisa de alguma coisa?
Era pena na voz dele? Por isto que ele estava aqui? Com pena de
mim?
— O que você quer de mim, Carl? — pergunto quando o silêncio se
estende e não sei o que ele está fazendo. Essa é a pior das sensações. — Não
acredito que você saiu do seu caminho para ficar apenas aqui me olhando.
— Não sabe se estou olhando para você — ele diz. — Mas acertou,
estava olhando para você.
— O que quer falar? — Ignoro sua tentativa de fazer graça porque
quero que ele vá embora.
— O que sabe sobre essa pessoa que está enviando e-mails para você?
É um fã? — ele pergunta sem muita enrolação.
— Como sabe sobre os e-mails? Pedi para Zara deixar isso quieto —
digo chateada que ela desobedeceu uma ordem direta minha. Que droga!
Porque ela não faz apenas o papel de agente como já pedi tantas vezes? Por
que tem de se intrometer na minha vida tanto assim?
— Não foi Zara que me disse, na verdade, descobri sozinho — ele
continua. — Por que não relatou a polícia?
— Não era necessário.
— O quê? Acha normal receber ameaças de uma pessoa
desequilibrada que acredita que você não pode parar nunca de fazer shows?
Em que mundo você vive, Samantha?
— Não é da sua conta o que eu faço e, não faço shows, faço concertos
— digo baixo. —Você não quer saber, esqueceu? — Não deixo de alfinetar.
— Bem, agora faço ser da minha conta — fala com a voz exaltada,
fazendo-me recuar um pouco. Ele estava gritando comigo? Sério? Ao menos
não me trata como se eu fosse uma “demente” como os outros.
— Não é nada, apenas um louco que acha que devo morrer em cima
de um piano — digo como uma piada, mas acho que o momento não é legal
pois o silêncio que se segue as minhas palavras me deixa inquieta. — Como
disse, não é nada demais, esses e-mails começaram há mais de seis meses,
não devem ser nada, apenas mais um louco que ameaça artistas.
— Você realmente acredita nisso? Devia se preocupar mais com você
mesma e esquecer a porra da música apenas por cinco segundos da sua vida.
— O rancor da voz dele me bate com violência.
Bem, estava aí a mágoa. Ele odeia minha música.
16
Samantha
Ele está aqui por quê? Se sente tanta raiva do que escolhi fazer? Da
minha profissão?
Eu finjo que o tom profundo e forte da sua voz não me machuca. Eu
queria poder olhar em seus olhos agora. Queria apenas um vislumbre dele.
Isso me quebra por dentro, talvez eu nunca mais vá vê-lo outra vez.
Estou sendo complacente com minha situação? Pode ser. Desde que eu
perdi a visão tudo tem sido diferente. O pensamento parece me sufocar e
concentro-me nele. É uma tortura tentar imaginar o cenário a minha volta. A
sensação de estar perdida em um espaço vazio é agonizante. Tento manter
minha mente no aqui e agora, concentrar-me no que ele quer falar, mas é tão
difícil. Quero vê-lo, minha última visão dele estava distorcida por lágrimas e
desespero por suas palavras duras. E, agora, ele ainda estava usando esse
mesmo tom. Sinto a dor me atravessando, deixando mais fundo o buraco no
meu peito no lugar que meu coração deveria estar.
— Eu queria um encerramento quando te procurei, Carl. — Eu me
vejo murmurando quando o silêncio se estende depois de suas palavras. —
Eu sei que você me odeia. Mas eu não odeio você por não esperar. Eu fui a
primeira a desistir de nós, mas era por pouco tempo.
Eu tento puxar o assunto que me levou à sua casa, acreditando que
essa é minha oportunidade de conversar já que ele está aqui, mas ele me
corta.
— Não vim aqui falar do passado, Samantha. Vim tentar descobrir o
que está acontecendo, apesar de tudo. Por que diabos a polícia não foi
notificada das ameaças que você recebeu? — diz sem dar nenhuma chance de
eu retrucar. Ignora minhas palavras com facilidade. Foi assim há dez anos. Eu
não merecia um ano de espera? Eu sei que não cumpri com nosso acordo
quando parti, mas era só mais um pouco de tempo longe e ele me odeia por
isso.
— Então...? — Noto que ele está esperando minha resposta.
— Zara tem cuidado disso, não chega mais nada até mim.
— Não estou acreditando que estou escutando isso. Confia sua
integridade física a uma mulher?
— Mulheres também sabem se cuidar — digo amarga. — Estou viva,
não estou? Portanto não perca sua noite de sono por mim, Carl.
— Jesus!
— Não tem nada demais nisso, receber ameaças faz parte, têm muitos
loucos por aí.
— Sério? E como esse louco sabe seu e-mail pessoal? — ele pergunta
e chama minha atenção. Nunca tinha imaginado quem poderia ter
conhecimento de meus dados pessoais, já que não era divulgado. Meu e-mail
comercial, sim, era de conhecimento de todos. Zara que tem total acesso a
ele, afinal ela que cuida de tudo para mim desde que saí da escola de música.
— E por que essa pessoa acha que você vai parar de tocar?
— Talvez — digo sem emoção —, essa era para ser minha última
turnê. Bem, de qualquer forma, como irei tocar de novo? No fim não
precisarei decidir, não é? Deve ser o castigo de ter deixado você pela minha
música.
Dou um riso irônico. Ele continua calado e eu continuo:
— Mas você também me deixou, Carl — eu digo e sinto as picadas de
lágrimas começando outra vez. Será que nunca vou deixar de chorar?
— Samantha, eu não sei que jogo você está fazendo — ele diz agora
bem próximo a mim.
— Não faço jogos com você, nunca joguei — minha voz sai em um
grito angustiado. — Eu apenas pedi um tempo!
— Você com isso de novo?! Tempo? Não era de tempo que falava
aquela carta, Samantha! — ele levanta sua voz também. — Falava de outra
coisa bem diferente. E não quero ouvir nada agora. Suas mentiras não
mudarão nada, então não venha com mais conversa para mim!
— Carl! — chamo, mas ouço seus passos se afastando. — Carl!
Eu fico chamando seu nome, mas em vão, ele não volta. Estou
soluçando igual um bebê de novo. Por que tudo tem de ser assim com a
gente? Por que tudo tem de ser tão complicado?
— Filha — ouço mamãe correr para dentro do quarto.
— Não quero ver ninguém! — grito e me dou conta que já não posso
ver ninguém. Que ironia! — Saia!
— Precisa de companhia, filha, de mim — ela diz quando senta na
cama.
— Quero ficar sozinha, por favor!
— O que ele disse para te deixar assim? Esse homem não é bom para
você, filha! — ela está falando e me irrita além do imaginável.
— Saiaaa! — meu grito rasga meu coração. — Vocês me sufocam,
quero que todos saíam. Vão embora, me deixem! Quero todos fora dessa
casa!
Não sei o que estou dizendo, apenas não os quero aqui. Não posso dar
um passo sozinha. Não suporto mais e meu choro me tritura, torce-me em dor
e agonia. Ela se mantém calada e, depois de um momento de silêncio, onde
apenas meus soluços são ouvidos, ela diz:
— Não pode ficar só. Sabe disso!
— Saia, mamãe! Não quero magoar você! — Sim, ela pode sofrer
com as palavras que posso dizer a qualquer minuto se ela não sair. Minha
garganta está dolorida para pôr tudo para fora. Quando vão parar de tentar
dizer o que tenho de fazer?
Até um desconhecido acha que pode ditar quando devo parar de tocar
piano.
— Diga a Zara que venha aqui — vocifero.
— Filha, não faça nada precipitado. Sua vida agora está um caos, mas
vai melhorar, acredite — mamãe insiste. — Vai voltar à sua carreira, eu sei
que isso deve estar matando você, mas sua carreira não acabou. Eu sei que
você não quer demonstrar seu sofrimento, mas a dor que está em seu rosto
dói em mim também, minha querida.
Começo a rir e chorar na mesma medida. Choro de raiva de mim
mesma. Sou tão idiota! O que ela sabe sobre mim? O que ela pensa que sabe?
Porque em nenhum momento ela pergunta o que eu quero para mim.
Acha que eu quero continuar sozinha mais dez anos da minha vida?
— Chame Zara!
— Claro que sim. — Sinto o colchão se mexer quando ela levanta. —
Devia se acalmar primeiro. Você acabou de chegar do hospital, melhor tomar
um banho e descansar.
— Mamãe — digo em tom de aviso.
Escuto seu suspiro frustrado, seus passos e, depois, o silêncio. Eu me
sinto separada da minha própria vida. Na escuridão agora onde vivo.
17
Carl
Saio furioso do quarto de Samantha. Deus! Não quero falar do
passado agora, por que ela insiste? Quer me magoar mais? Que inferno! Ela
estava doente, quebrada e descontrolo-me. Não me comporto como um
homem de verdade. Não, eu grito e saio como um moleque. Como fiz quando
recebi sua carta, simplesmente aceitei sem questionamentos e fui para o
exército curar minha maldita dor.
Bato a palma da mão no volante até quase quebrar. Minha frustração
não tem limite. Estou descontrolado. Jesus! Por que ela faz isso comigo e por
que permito que ela tenha esse efeito sobre mim?
Fraqueza! Sou fraco e isso me deixa ainda mais furioso. Quero apenas
falar do agora, de sua segurança que está me deixando com o cabelo
arrepiado de tanto nervoso, e ela vem com essa conversa de novo. O passado
fica onde está, no passado, merda!
Ligo o carro e dou uma olhada na casa. Passei por todos que estavam
sentados na sala. Deveria ter parado e falado sobre a ameaça à Sam, mas
passei reto por eles. Agora tenho que fazer alguma coisa sobre esses e-mails.
Vou à delegacia de polícia conversar com meu amigo detetive Rogers
Santoro. Ele pode fazer alguma coisa dentro da lei por ela. As coisas que eu
já fiz, como invadir sua conta, não são legais.
Ele me recebe em sua sala e nos cumprimentamos com um aperto de
mão.
— Você deveria ter ligado, estou quase saindo — ele diz e aponta
para a cadeira na frente de sua mesa. Quando estou acomodado na cadeira
nada confortável, ele continua. — O que aconteceu, cara, para você vir aqui
me pedir socorro?
Ele está brincando, claro. Conheço Roger desde a época que nos
alistamos e tínhamos uma certa amizade, não como tenho com meus
melhores amigos, mas sempre mantivemos contato, já que estamos nessa
mesma linha de trabalho.
— Preciso de um conselho sobre um caso — começo. — Um caso de
ameaça por e-mail.
— Você veio fazer a denúncia? Caso seja isso vou chamar...
— Não é contra mim — digo fazendo-o parar. — Uma amiga tem
recebido ameaças. Ela não fez nenhuma denúncia.
— Bom, ela tem de prestar queixa, se não, não se pode fazer nada. Ela
é cliente da sua empresa?
— Não, quer dizer, pode se tornar caso isso se agrave e tivermos de
tomar precaução sobre o fato.
— Peça que ela preste uma denúncia o quanto antes, não a deixe
pensar que é bobagem, esse é o maior erro de vítimas de ameaças desse tipo,
achar que é apenas um maluco querendo botar medo.
Exatamente o que ela pensa, que não é nada, que é bobagem.
— Ela é uma pessoa famosa e não acha que seja algo perigoso. Pode
ser um fã?
— Tem de ser investigado, Carl. Pode ser um fã ou pode ser qualquer
outra pessoa. Depende do teor das ameaças.
— Basicamente que ela não deve encerrar sua carreira artística. Tenho
uma pessoa tentando recuperar os e-mails deletados, não sei se ele vai
conseguir — digo. — Precisamos descobrir até onde vão essas ameaças.
— Deixe isso para a polícia, Carl — ele diz, mas dou de ombros.
Sempre que queremos resolver algo para um cliente na empresa quase nunca
recorremos à polícia.
Logo depois Rogers recebe uma ligação e precisa sair rapidamente.
Encerramos nossa conversa.
— Me passe os dados depois que irei investigar isso paralelamente se
achar que o caso merece uma atenção urgente, mas não posso tornar oficial se
não tenho um caso concreto — ele diz quando levanto para sair. — Diga a
sua amiga que vá à delegacia de crimes virtuais, que é especialista nesses
casos, e abra uma ocorrência.
— Claro que sim.
Saio com uma decisão para ser tomada, mas dúvidas ainda persistem.
Tenho de amadurecer isso. Não adianta me envolver com os problemas de
Sam e achar que não podemos nos machucar mais, porque isso está bem na
cara. Nós nem arranhamos a superfície de nossos problemas.
Já mais calmo, eu volto para a casa de Sam, quero falar com seus pais
e com ela de novo, mas agora eu vou tentar agir com maturidade e
discernimento de um soldado. Deixar-me levar por sentimentos é pedir por
problemas.
Paro o carro e sigo direto para sua porta. Bato e, pouco depois, seu pai
abre para mim.
— O senhor aqui de novo? — Ele fica vermelho de raiva quando me
vê. — Não acha que já fez estrago demais para um dia, senhor O’Neal?
— Não tenho tempo para isso, senhor, preciso falar com você sobre a
Samantha. — Entro sem ser convidado e vou para sala de estar onde parece
que um pandemônio atingiu todos. A agente de Sam está furiosa caminhando
de um lado a outro na sala. Ela tem um celular na mão e digita furiosamente
nele. O cantor está sentado com cara de enterro em uma poltrona ao lado do
sofá onde a mãe de Sam está com lágrimas escorrendo pelo rosto — O que
está havendo?
Zara vira-se para mim como um raio. Ela tira os olhos do aparelho,
encarando-me com desgosto.
— O que diabos você ainda quer aqui? Isso é tudo culpa sua! — ela
grita e eu franzo a testa me perguntando o que Samantha tem na cabeça para
ter uma pessoa desequilibrada dessa como agente. E como ela consegue ter
uma carreira de sucesso nas mãos de uma mulher que mostra não ter o menor
equilíbrio? — Você sempre mexe com a cabeça dela.
Não sei de que merda ela está falando, mas pouco me importo. E nem
quero saber.
— Não vim aqui para me preocupar com você — digo fazendo pouco
caso de sua explosão. — Quero saber por que vocês todos não deram queixa
das ameaças que Samantha vem recebendo há mais de um ano?
Todos ficam calados, olhando para mim como se eu estivesse falando
chinês.
Viro para olhar sua mãe que têm os olhos arregalados. Todos parecem
surpresos, talvez por que eu saiba disso?
— Então, senhor Stollen, porque não convenceu sua filha a prestar
queixa sobre essas ameaças?
— Não sabemos nada sobre isso. — A mãe dela afunda mais no sofá.
— Do que ele está falando, Zara?
É o que quero saber. O porquê uma agente não aconselha sua cliente a
prestar queixa sobre uma ameaça.
— Sim, Zara, diga-nos por que sua cliente, que você cuida com tanto
esmero, não foi a uma delegacia, quando é o correto a fazer?
— Não posso convencer Sam a fazer tudo —diz de queixo erguido.
— Eu faço meu papel, senhor O’Neal, cabe a ela aceitar.
Tenho vontade de rir, ela não me desce. Sua dominância sobre a vida
de Sam me incomoda. Eu só estou há quatro dias ao redor delas e já estou
enjoado. Merda, isso só faz minha ideia louca mais certa.
— Bem — digo mansamente. — Eu aconselho a fazerem algo sobre
isso. — Começo a caminhar para o quarto de Sam e digo por cima do ombro:
— A delegacia mais próxima, Zara, fica a cinco quarteirões daqui.
Eles não ficaram muito preocupados com a notícia. Povo estranho.
Parecem não estar preocupados que esse perseguidor possa machucar
Samantha.
— O’Neal, aqui não é sua casa para entrar e agir como se fosse o
dono — diz o cantor insignificante levantando seu traseiro da poltrona. —
Saia agora. Esse é um assunto de família que tem de ser tratado entre os
membros.
Eu não sou de gargalhar muito, é muito raro. A coisa realmente tem
de ser engraçada para arrancar um sorriso meu. Mas as palavras do
almofadinha me fazem rir fortemente.
— Então, o que está fazendo aqui? — digo depois que meu sorriso
some. Olho-o duramente e me viro para sair da sala.
O quarto está na penumbra e Samantha aparenta estar adormecida.
Caminho lentamente até ao lado da cama e a observo. Sim, ela está
dormindo. Ela parece atribulada, suas feições estão franzidas, como se ela
tivesse ido dormir preocupada. As marcas de lágrimas em seu rosto indicam
que ela chorou. Merda, devo tê-la feito chorar por sair tempestuosamente
mais cedo.
Não me contenho e sento na beira do colchão e velo seu sono. Uma
dor aguda me atravessa enquanto a observo. Minha mandíbula dói de tanto
apertar. A vontade de me inclinar e beijar seus lábios é quase impossível de
controlar. Levanto minha mão e retiro uma mecha de cabelos castanhos de
seu rosto que ainda tem uma coloração amarelada da pancada na cabeça. Ela
se mexe fazendo-me retirar a mão. Um gemido escapa de seus lábios e ela
abre os olhos que estão nadando sem rumo. Seus olhos claros sem foco me
machucam por ela estar presa na escuridão.
— Quem está aí? — sua voz é temerosa e só faz meu coração apertar
ainda mais. — Carl, é você?
— Sim — digo e me pergunto como ela sabe. — Você está bem?
— Sim — responde e tenta ficar sentada sem sucesso, o punho e
pernas machucados impossibilitando seus movimentos. Eu ajudo-a sentar e
volto sentando-me ao lado dela. — Por que voltou?
— Precisamos conversar como adultos, Samantha — digo humilde,
porque estou me sentido um troglodita por ter gritado com ela mais cedo. —
Desculpe por meu descontrole.
— Tudo bem, eu também estava forçando a barra com você. — Ela
torce as mãos juntas no seu colo.
— Você precisa de alguma coisa? Ir ao banheiro? — ofereço e ela
balança a cabeça. — Ok.
Ficamos em silêncio, um silêncio que é mais alto que um show de
rock. Ela limpa a garganta e se mexe desconfortavelmente, e eu sou um
sádico porque a deixo se contorcendo por um bom tempo antes de dizer:
— Quero que vá a uma delegacia e preste um depoimento. Nas suas
condições eu posso fazer com que isso aconteça aqui. Trago um detetive,
amigo meu, e ele pode agilizar as coisas.
— Não vou prestar depoimento, não tenho motivos para fazer isso.
Não vou tocar mais, Carl, para que o desgaste disso tudo? — ela fala teimosa.
— Que inferno, Samantha! Você pode se machucar por causa dessa
teimosia. — Frustração queima dentro de mim.
— Nada pode me machucar mais do que já estou — profere resignada
e infeliz em seu tom. — O que mais posso perder?
Porra! Não quero ter que dizer essas coisas para ela. Mas ser duro
agora talvez seja o melhor. Por isso discorro com cautela.
— Sua vida, para começar. Não ache que perder a visão é o fim da
linha, Samantha. Milhões de pessoas no mundo vivem nessas condições e
nem por isso desejam a morte. Pensei que você fosse mais forte que isso.
— Fácil falar, não é? Eu não posso fazer mais algo que amo. Como
posso realizar um desejo antigo se não enxergo um palmo à minha frente? —
pergunta.
— Aprendendo! Adaptando-se. E não ache que isso é para sempre. —
Sem me conter, seguro seus ombros delicados. — Não te reconheço mais,
Samantha. Onde foi parar a menina que desistiu de nós por que tinha um
sonho?
Ela suga uma respiração e seu queixo treme, mas eu continuo. —
Tenho uma proposta para você.
Que Deus me ajude! Estou prestes a cometer meu pior ato de loucura,
apenas por que estou me sentido responsável por ela? Por esse acidente ou
por que ainda a quero perto de mim?
— O quê? — sua voz sai com um quê de curiosidade.
— Preciso que confie em mim. — Fecho meus olhos, o que estou
fazendo? Porra, não faça isso, Carl O’Neal. Você pegou a porra da doença de
Alexander e Bruno? É isso? Minha briga pessoal não me impede de dizer: —
Quero que venha comigo. Eu posso proteger você até que tudo se resolva.
Estou muito fodido. Adoro sofrer, porra!
18
Samantha
— O que disse? — Mas o que ele estava falando? Como ele
ainda quer ficar perto de mim?
— Quero que fique segura, Samantha — ele continua tão calmo,
como se fôssemos um casal e não um ex-casal mal resolvido. — Veja bem,
essa pessoa não quer que você pare de tocar. Então você, quer queira quer
não, vai parar e essa pessoa pode se descontrolar e fazer algo. E, pelo que li
naquele email, esse acidente pode ter sido provocado ou a pessoa viu aí uma
oportunidade de te ameaçar e pode muito bem fazer algo pior.
— Por que faria isso por mim? — pergunto — Você não tem que
fazer nada por mim, Carl... Você nem gosta de mim.
— Não tenho de fazer mesmo, porém faria para qualquer um que
estivesse passando pelo que você está, Samantha — ele diz e sinto um toque
de emoção em seu tom. — Não quero pensar mais tarde, se qualquer coisa
acontecer com você, que eu podia ter feito algo e não fiz. Seguimos caminhos
diferentes, no entanto não quero vê-la ferida mais do que já está.
— E para aonde iremos? — rio sem humor. — Acho que não está
prestando atenção na minha condição, Carl. Estou toda quebrada e cega,
dependendo de outras pessoas para as coisas mais básicas. Não posso aceitar.
Eu agradeço.
— Não estou dando muita opção para você declinar, Samantha. Tem
que aceitar, é o mais sensato a fazer quando você não sabe de onde pode
surgir um louco querendo te fazer mal — ele fala severo. — Você terá que
vir comigo.
— Você se escuta falando? É tão contraditório de há duas semanas
atrás — retruco ficando com raiva de sua teimosia. — Tenho meus pais que
podem cuidar do meu bem-estar.
— Vem comigo e esqueça duas semanas atrás, eu não quero falar
sobre isso — diz resoluto e estou inclinada a acreditar que ele pode me levar
com ele a força. Bom, eu estaria mentindo se dissesse que não quero ficar
perto dele, mas não nessas condições. Com ele se sentindo culpado pelo
acidente, como Zara estava proferindo para todo o mundo.
— Carl, eu não culpo você pelo acidente, culpo a mim mesma. —
Estendo minha mão tentando alcançá-lo sem sucesso. — Eu nunca iria culpar
você por nada. Meus sentimentos por você, eles sempre foram reais...
— Seus sentimentos? Não quero saber deles, Samantha — ele diz
com voz acentuada diluída com escárnio. — A minha única preocupação é
manter sua segurança e faço isso porque me sinto responsável por seu
acidente. Por isso estou aqui, não ache que estou por outra razão a não ser ter
certeza que tudo estará bem com você.
Esperança! Não sabia que a acalentava em meu peito até aquele
momento. E ela acabou de morrer. Ele não se importa. Sou tão ingênua. Eu
deveria ser mais durona. Sua preocupação nada tem a ver conosco, mas com
sua própria consciência. Bem, que assim seja. Eu vivi todos esses anos sem
ele. Posso viver mais cem.
— Não coloque palavras em minha boca, Carl O’Neal. — Digo
enérgica. Não vou permitir mais que as pessoas venham aqui e determinem
minha vida, como tenho deixado tudo para Zara resolver e ficando focada na
música, mas eu nunca tive nada além da música para viver. Se eu tocasse e
tocasse, não me importava com mais nada. Agora eu não tenho a música para
me manter sã e eu terei de tomar as rédeas da minha vida outra vez.
Ter anunciado mais cedo à Zara meu afastamento definitivo,
desencadeou um turbilhão de coisas desagradáveis. Zara era totalmente
contra a minha decisão. Mas qual era o ponto se não sei se irei enxergar a luz
do dia novamente? Eu achei que seria mais difícil, a decisão de largar dez
anos de total dedicação, mas estava me sentindo mais leve, um peso tinha
sido tirado de mim. Eu posso fazer outras coisas, se eu quiser, só tenho de
aprender a lidar com minhas limitações. Chega de permitir que governem
minha carreira como se eu não fosse humana e sim um robô que seguisse
ordem. Eu consenti tudo isso porque eu não me importava com nada. Mas
agora estou vendo o quanto fui permissiva com tudo.
— Eu agradeço sua preocupação, Carl, mas terei que recusar ir com
você. — Recusar ir com ele é como arrancar um pedaço de mim mesma,
porque era o que sempre almejei. — Se você não se importa, eu preciso que
minha mãe me ajude ir ao banheiro.
— Não vou sair daqui sem que tenha certeza que se manterá segura
— diz teimoso. Que droga, eu não me lembro de um Carl assim, ele era tão
permissivo comigo, fazendo sempre com que meus desejos tornassem
realidade. Agora ele é sempre duro e isso me mata um pouco cada vez que ele
fala comigo dessa forma.
— Eu preciso usar o banheiro, chame minha mãe — digo ignorando-
o. Percebo ele se aproximando de mim e fico tensa.
— Venha, ajudo você — ele fala com suavidade, contrastando com
seu tom anterior, e meu coração começa uma corrida louca em meu peito
quando sinto-o tocando minha mão.
— Claro que não, não vou ao banheiro com você. — Fico apavorada
de fazer minhas necessidades com ele olhando, ainda mais não conseguindo
nem tirar a roupa. Que vergonha! — Chame a mamãe, por favor.
— Samantha — ele chama com carinho surpreendente, fazendo-me
parar e escutá-lo. — Vou levá-la e quando estiver acomodada, eu saio sem
problema. Venha.
Minha mãe tinha me ajudado a colocar uma camisola de algodão, mas
eu me imaginei completamente nua na frente dele. Por mais que um dia nós
fomos íntimos, dez anos se passaram, eu não tinha mais dezoito anos, nem
corpo de uma garota, e somos completos desconhecidos agora. Mas, mesmo
toda quebrada, a fagulha de excitação ainda existe. Carl sempre teve certo
efeito sobre mim, os mais deliciosos que posso lembrar. Ele sempre foi meu
único amor e acho que vou morrer amando-o. Pode um amor durar todo esse
tempo e ainda por cima depois da nossa história?
— Venha, Samantha. Vou pegar você, será mais rápido. — Sinto seus
braços por baixo das minhas coxas e atrás das costas. Meu instinto é me
agarrar nele, mas fica difícil quando se tem apenas uma mão sã. Ele me
carrega para o banheiro e coloca-me de pé ainda me segurando para que eu
não caia. Deus, que situação. Essa será minha vida daqui para frente,
depender de outras pessoas para tudo? Um nó fecha minha garganta, mas eu
não me permito chorar mais. Eu sinto como se um peso de dez toneladas
estivesse em cima de mim. — Vai ficar tudo bem, Samantha.
A voz dele só faz o nó em minha garganta aumentar. Não quero sua
piedade. Eu quero seu perdão, porque eu já o perdoei faz tanto tempo. E ele
está levando dez anos para fazer algo que fiz em menos de um ano depois.
Ele agora me chama de Samantha, tão diferente da forma carinhosa que me
chamava no passado, de uma forma única em um mundo repleto de outras
mulheres talvez muito mais lindas que eu. Mas eu o amava, nós nos
amávamos.
Eu lembro do sorriso irresistível que se espalhava em seu rosto cada
vez que ele me avistava indo em sua direção, sua covinha no queixo era algo
que me deixava quente em todos os lugares. Porém, tudo isso ficou perdido lá
atrás quando eu resolvi que a música era meu caminho. Que pensei que o
amor que sentíamos poderia ser maior que tudo. Estava enganada, ele não
soube entender e muito menos esperar antes de partir para o exército sem
dizer nada a ninguém e, bem, eu só soube que eram as forças armadas porque
Zara me disse quase dois anos depois. Mas eu entendi que ele não gostou
quando quebrei nosso acordo preferindo estudar mais em vez de voltar meses
depois como prometi.
No entanto, para que remoer tudo isso agora? O fato de que perdemos
um ao outro me entristecia além da razão, mas seu ódio por mim? Era mais
que doloroso, era a forma mais lenta de morrer. Porque eu estava morrendo a
cada dia lentamente. Um pouco a cada maldito dia. Sua rejeição me
apunhalava com força desmedida, esse é o preço do meu sonho. Eu não pude
ter dois ao mesmo tempo e talvez, no fim, eu fique sem os dois.
Saio dos meus pensamentos quando ele diz:
— Posso fazer mais alguma coisa por você?
— Obrigada, posso seguir daqui — não sei como, mas não vou deixá-
lo me assistir.
Oh, meu Deus! A que ponto o ser humano chega. Penso com imensa
vontade de rir de mim mesma.
— Qualquer coisa é só chamar — ele sai me deixando sem saber bem
o que fazer.
Pouco depois ouço uma batida na porta e a voz de Carl:
— Tudo bem aí, posso entrar? — Droga. Certo, Samantha, isso não é
nada demais, você pode muito bem fazer isso sozinha. Agora é apenas você
aprendendo como fazer tudo como um bebê.
— Só um minuto! — digo de volta. Tateio até encontrar a pia, mas há
um problema, é longe demais para que eu possa alcançar a torneira ainda
sentada onde estou no vaso sanitário. Meu receio de levantar, cair e machucar
mais minha perna engessada é maior que não enxergar nada. Seria bom se eu
tivesse as duas mãos livres, mas com uma mão e uma perna imobilizadas era
terrível. Apoio minha perna boa e, segurando a pia com minha mão livre,
faço força para levantar. Consigo ficar de pé e o simples esforço me deixa
zonza. A escuridão ao meu redor me sufoca, sinto-me fraca, exausta com a
perna trêmula e estou a ponto de perder o equilíbrio quando ouço o barulho
da porta sendo aberta.
— O que está fazendo, Samantha? — Carl vocifera quando me segura
antes que me espatife ao chão. Ele me segura pela cintura, seu peito forte
colado as minhas costas e eu faço a coisa mais idiota que já fiz hoje, encosto
minha cabeça em seu ombro. Sinto as batidas fortes e rápidas do coração
dele. — Maldita mulher teimosa. Vou levar você de volta para cama.
Sua voz é cavernosa e composta por algo que eu não quero dar nome,
porque posso estar fantasiando tudo em minha mente louca por afeto.
— Preciso lavar minhas mãos — digo envergonhada. Sinto meu rosto
queimando, devo estar vermelha de vergonha. Lavo minhas mãos e fico sem
saber o que fazer com elas. Eu estava assim mesmo, patética? Acho que a
presença de Carl está me deixando mais incapaz do que eu sou realmente.
Sinto o calor dele mais próximo quando se inclina e logo depois uma toalha,
provavelmente, é colocada em minhas mãos.
— Pronta? — Assinto e ele me pega, levando de volta para o quarto.
Ele me ajeita na cama com cuidado e eu murmuro um agradecimento. — Não
precisa agradecer, mas aceitar vir comigo já é um bom começo.
— Você percebe que dependo de alguém para as mínimas tarefas,
Carl? — Deixo sair um pouco cansada. — Percebeu que até para ir ao
banheiro dependo de outra pessoa até que eu tenha tirado esse gesso, ao
menos? Não posso ir com você. Você não é responsável pelo meu bem-estar.
Vou ficar bem aqui, não se preocupe.
Ele não diz nada. Quando volta a falar o assunto anterior é deixado de
lado por dois segundos.
— Por que sua agente está tão furiosa lá fora, isso é normal? — ele
pergunta depois de um pesado silêncio. — E o que eu tenho a ver com tudo
isso? Segundo ela, claro.
— Ela vai se acalmar. — Dou um sorriso sem graça, sem vontade. —
Ela acha que ainda poderei tocar e que não quero mais por sua causa. Que
estou renunciando a minha carreira por você.
— Diga para ela que você já fez isso, mas que foi sua carreira que
ganhou a disputa — ele devolve com acentuado desprezo. Bem, voltamos à
estaca zero. — Não quero falar disso, do passado, nada irá mudar, então
apenas deixe isso lá, Samantha — fala e percebo que diz como se estivesse
convencendo a si mesmo sobre deixar o passado ir. Ele segue sem esperar
uma reposta de minha parte: — Vou deixar você conversar com sua família,
Samantha, sobre ir comigo.
— Carl, estamos indo para frente e para trás sobre isso e não
chegaremos a lugar nenhum. Quero descansar, sinto uma dor de cabeça
começando. — Sim, estou tão cansada de tudo isso e a tontura que senti no
banheiro está piorando. Ele toca minha testa com os dedos e eu suspiro. Era
tão bom senti-lo, mesmo que um ínfimo toque. Era como se ele se importasse
comigo de verdade. Mas eu sei a verdade nua e crua.
— Vou chamar sua mãe para dar seu remédio — murmura e o
colchão se mexe quando ele se levanta de onde estava sentado.
— Carl — chamo e tateio alcançando sua mão. — Obrigada por ainda
se preocupar comigo.
Minha voz sai embargada de emoção contida.
— Eu nunca deixei de me preocupar com você, Samantha, e vê-la
assim me dilacera, porque por mais que eu odeie você, não suporto vê-la
ferida — fala com tanta força e emoção que sinto minhas lágrimas vindo com
pujança aos meus olhos. — Não suporto pensar que alguém pode te machucar
e não fiz nada para impedir. Isso não quer dizer que possamos continuar de
onde paramos um dia, entente?
Eu não tenho voz para falar nada. Apenas assinto. — Venho amanhã
buscar você e levá-la a um lugar onde possa ficar segura.
— Que lugar? — Isso chama minha atenção. Mas ele não responde e
tenta puxar sua mão da minha e eu a seguro mais forte. — Carl?!
— Até amanhã, Sam — ele devolve o aperto em minha mão antes de
se soltar do meu agarre firme.
Quando ele sai eu apenas encaro a escuridão diante de mim. A vida
era uma maldita cadela.
Eu não sabia a razão dessa súbita preocupação de Carl, mas talvez
essa seja uma oportunidade que nós dois temos de conversar, de colocar o
passado a limpo. Meus pensamentos dão voltas e voltas e eu caio no sono
outra vez. No fundo aceitando a proposta dele, vendo uma chance do destino
para nós.
19
Carl
If you wait for me then I'll come for you
Although I've travelled far
I always hold a place for you in my heart
If you think of me
If you miss me once in awhile
Then I'll return to you
I'll return and fill that space in your heart
(The Promise – Tracy Chapman)

— Senhor e senhora Stollen — eu digo sem muita gentileza


quando saio do quarto de Samantha. Eu não me sinto à vontade para chamá-
los pelo primeiro nome. Foi se o tempo que eu poderia falar com eles assim.
Há anos atrás eles me receberam muito bem em sua casa quando comecei a
namorar Samantha, mas agora eram totais estranhos para mim, igual sua
filha. — Preciso falar com vocês dois em particular.
Eles me levam ao escritório da casa, onde deixo claro que Samantha
está correndo risco, mesmo ela achando que é bobagem. Exponho minha
opinião clara e evidente que não confio em ninguém ao redor de Sam sem
que ela possa se defender. Digo também que quero mantê-la longe para se
recuperar. E, lógico, eles não concordam. Porém deixo claro que a palavra
final é de Sam, se ela quiser vir comigo não há ninguém que me impeça de
levá-la. Eu sei que isso se deve por essa sensação de culpa, mas não digo
nada para eles.
— Por que esse súbito interesse na minha filha, Carl? — a mãe dela
pergunta e eu não tenho resposta, só sei que meus instintos pedem que a
proteja.
— Acho melhor ir vê-la, está sentido dor e precisa de seus remédios
— digo ignorando sua pergunta e logo em seguida saio de lá. Não quero ir a
fundo do porquê eu coloquei na cabeça que quero levá-la para nossa casa.
Mas talvez eu saiba a razão, só que é vergonhoso admitir até para
mim mesmo.
Entro no carro e saio para o trânsito. Ligo o rádio para me distrair.
Tirar minha cabeça de Samantha um minuto. Abraçá-la naquele banheiro
apertado foi umas das coisas mais difíceis que fiz ultimamente. Não dar
vazão aos sentimentos que me sufocam, foi como segurar a porra de um touro
furioso pelos chifres.
Eu trinco minha mandíbula quando a música que toca zomba de mim.
Eu disparo uma gargalhada que nada tem de engraçada e feliz. Essa porra de
música está tirando onda com minha cara?
...Se você esperar por mim, aí eu voltarei pra você.
Ainda que eu tenha viajado tão longe
Eu sempre guardarei um lugar para você no meu coração
Se você pensar em mim se você sentir saudades vez em quando
Aí eu voltarei para você
Eu voltarei e completarei o espaço no seu coração
Lembrando
Do seu toque
Do seu Beijo
Do seu Abraço Apertado...
Eu acharei meu caminho de volta para você
Porra nenhuma que ela achou, quer dizer, achou quando era tarde
demais... Agora não me interessa mais. Eu irei fazer o que eu acho certo e
depois que ela estiver fora de perigo eu a mando embora da minha vida por
mais dez, vinte, cem anos.
...Se você estiver me esperando
Se você sonhar comigo, como eu sonho com você
Num lugar quente e escuro
Num lugar onde eu possa sentir os pulsos do seu coração...
Não estava esperando por ela, não mais... Acabou para nós. Amanhã
vou levá-la para nossa casa e mostrar o que ela perdeu por me abandonar.
Pronto, estava bem aqui, na minha mente, minha maior razão. Meu
interesse nela. Mas isso perde um pouco a motivação já que não posso olhar
em seus olhos na hora que ela perceber para aonde a estou levando. Sem sua
visão, não posso saborear minha vingança como desejei. Eu sei que estou
sendo cruel, mas não posso lutar com algo que é maior que eu.
A voz do cara me irrita, desligo o som e meu telefone começa a tocar
como se estivesse esperando apenas eu desligar o rádio.
Vejo o nome de Souza nele e o pego rapidamente.
— Souza — digo quando atendo.
— Você precisa ver o que acabou de chegar nos e-mails de sua garota
— ele diz. Estou quase chegando em casa e dou meia volta em direção à
empresa.
— Estou indo para aí — digo e desligo. Essa merda não poderia ficar
pior, poderia?
Pelo visto sim.
*
Bato na porta da sala de Souza e entro sem esperar autorização. Ele,
como um bom nerd de computador que é, está vidrado na tela como sempre o
encontramos quando vínhamos aqui.
— Bem na hora, O’Neal. Achei que você fosse querer ver isso. —
Caminho até ficar atrás dele e ver a tela do computador. Que droga era essa?
O e-mail de Sam estava aberto. Além de uma mensagem curta, tinham duas
fotos anexadas.
Uma foto tirada hoje mais cedo na frente do hospital, mostrando
claramente Samantha sendo empurrada por sua mãe na cadeira de rodas,
marcada com um X vermelho em cima dela, faz meu sangue esquentar nas
veias. Miserável, mas o que me deixa mais puto é a próxima foto. Esta é
minha saindo da casa onde Sam está morando. Minha foto tinha um ponto
vermelho bem em cima do meu peito, uma clara alusão de um tiro no meu
coração. A mensagem em cima das fotos é curta e direta:
“O quanto você quer ele vivo?”
Raiva se funde dentro de mim. Quem diabos poderia ameaçar
Samantha dessa forma? Quem diabos faria algo assim?
— Pensei que você gostaria de ver — Souza diz. — Fiz uma cópia
impressa para você. Acho que devia dar mais atenção ao caso, Carl. Estamos
lindando com um perseguidor psicopata ou apenas um fã enlouquecido por
sua musa deixar o show business?
— Você está certo, vou providenciar segurança para ela o quanto
antes, mas o que me preocupa não é isso. — Pego as copias das fotos. — É
convencer uma pessoa que não acredita que está sendo ameaçada que ela
corre perigo.
— Carl, não é a primeira vez que um cliente não acredita que precisa
de proteção. — Ele está certo, estou emocionalmente envolvido e isso não é
bom.
— Obrigada por estar atento a isso. — Bato em sem seu ombro
amigavelmente e aceno antes de sair. Passo por Lili, que está em sua mesa, a
caminho da sala de Alexander. — Tem alguém trabalhando nessa empresa?
— Oi, Carl. Não o tenho visto por aqui, isso sim — ela sorri. —
Faltando no trabalho, hein? Mas eu sou do time que torce para você tirar
longas férias.
— Acabei de chegar de uma. — Aceno e sigo para falar com Alex o
mais rápido possível, eu sei que tenho de agir com frieza para que Sam fique
segura. Minha preocupação é com ela lá sem alguém de confiança. Eu não
tenho medo, já perdi isso com meu trabalho, sou cauteloso, mas essa merda
com Sam está me deixando temeroso por ela.
Dou um simples toque na porta de Alex antes de entrar e... droga.
Bruno comentou mesmo que esse cara não trabalha mais, ele vive se pegando
com Lana em tudo que é lugar, e o escritório praticamente virou um motel
para esses dois.
— Marshall, você não tem casa com um quarto, não? — Encaro-o.
Ele tem uma Lana muito vermelha sentada em seu colo e com a blusa
totalmente desabotoada.
— Se você batesse antes de entrar, não teria problema. — Ri como se
fosse normal um cara em sua posição ser pego aos amassos com a namorada
no escritório. Como os homens só têm marra quando não há mulher
envolvida?!
— Precisamos conversar, urgente. — Dou meu olhar sem expressão
para Lana e o pequeno desastre ambulante pega a dica.
— Essa é minha deixa para ir embora — ela diz, pegando sua bolsa
que está no chão. — Ligue-me, querido!
Espero a porta ser fechada e jogo em cima da mesa as fotos que
trouxe comigo.
— O que é isso? Você virou alvo de alguém?
— Acho que sim, mas essa não é uma ameaça direta para mim e sim
para Samantha. — Não me sento, estou inquieto para sair daqui e
providenciar um lugar seguro para Sam. Jesus, por que ela tinha de voltar
depois de tanto tempo? — Cancele qualquer outro serviço, Marshall. Estou
assumindo esse que é mais que pessoal, se você me entende.
— Porque não me conta o que está havendo, Carl? Somos amigos,
sempre trabalhamos juntos e se sua garota está com problemas, resolveremos
todos juntos, como sempre fazemos aqui na empresa.
— Ela não é minha garota, ela costumava ser. Agora? Não mais,
porém tenho que mantê-la segura. Está com problemas visuais, segundo os
médicos um problema passageiro, e está machucada fisicamente. Além de
tudo isso, tem um lunático ameaçando-a. — Tomo fôlego porque essa porra
me deixa louco de raiva. — Eu preciso dos serviços de investigação
particular de primeira.
— E a polícia?
— Sem denúncia, sem investigação. Ela não quer, acha que é
bobagem — digo frustrado.
— Isso é loucura, Carl. Sabe se é realmente um fã apaixonado? Um
ex-namorado? — pergunta.
— O teor não é sexual, dá a entender que é uma pessoa que não quer
que ela deixe os palcos. — Ando até a janela — Ela tem uma agente,
assistente, ou seja lá o que for sua função, que me deixa um pouco nervoso.
— Meu conselho é que convença Samantha a prestar queixa. — Ele
vem até ao meu lado. — Se esse caso tomar proporções maiores, não cabe a
nós fazer justiça, Carl. Isso é âmbito para a polícia. Nosso papel é manter as
pessoas fora de perigo, não investigar crimes.
— Sei disso, mas não posso impor nada para ela, não temos nada um
com o outro — exalo duramente.
— E por que você está se envolvendo? Não seria melhor aconselhá-la
a ter um guarda-costas e ir à polícia? Se isso não importa para você, então
caia fora, O’Neal.
— Quem disse que não me importo? É mais complicado do que
imagina, Alex. — Viro-me para ele. — Eu sinto um pouco de culpa por ela
perder o controle do carro. — Isso estava mesmo me afetando, eu não ia ter
uma longa conversa com Alex sobre eu e Sam, mas acabo dizendo mais do eu
já disse a qualquer um. — Ela me procurou para conversar antes do acidente,
e eu como um bebê chorão maldito a expulsei depois de falar umas merdas,
porém para minha defesa estava bêbado e magoado.
— Tem certeza de que ainda não está? E porque nunca falou dessa
mulher para nós? — pergunta.
— Samantha faz parte de um passado que não quero lembrar mais.
— Sério? Então pense de novo porque você está no meio dessa, meu
amigo. E pelo que ouvi até agora, que não é muito devo deixar claro — ele ri
—, esse passado está mais presente do que você consegue admitir para si
mesmo. Ainda é apaixonado por ela?
— Claro que não — digo tão rápido que é estranho até para mim.
— Estou vendo. — Ele me olha preocupado — Arranje alguém e
mande para a casa dela. Será melhor para os dois. Sentimentos envolvidos
nesse campo de trabalho pode ser perigoso para sua garota, sabe disso. Tudo
se mistura e não sabemos ser racionais quando devemos ser. A vontade de
proteger a pessoa que amamos é tão forte que, às vezes, pode atrapalhar
nosso raciocínio para fazer o que tanto queremos que é mantê-las seguras.
— Vou tirá-la da cidade.
— O quê? Perdeu a razão, pelo que disse ela precisa de assistência
médica. E vai levá-la para onde?
— Minha casa.
— Carl, você devia pensar direito sobre isso.
— Não estou pedindo sua permissão, Alex, apenas estou informando
já que faço parte de uma equipe. — Vou até a mesa e pego as fotos. —Veja
outro cara para minhas funções enquanto resolvo isso. — Abano as fotos à
guisa de explicação.
— Sabe que se isso ficar complicado é só ligar. Onde tenho
informações de Samantha? Você fez uma investigação paralela sobre esse
cara das mensagens?
— Souza tem as informações com ele, que não é muita, na verdade a
pessoa não deixa rastro. Alex, quero que isso seja feito sem alarde. Não quero
alertar o suposto perseguidor, quero que ele se sinta tranquilo para errar e nos
dar uma pista de sua identidade.
*
Deixo o escritório de Alex e vou até minha sala ligar para o caseiro
abastecer minha casa. Sei que não será fácil lidar com Samantha dependendo
da ajuda de outra pessoa para todas suas necessidades, mas não posso deixar
alguém machucá-la. Poderia contratar uma enfermeira para cuidar dela,
contudo eu não quero mais ninguém envolvido. Daremos um jeito, digo para
mim mesmo. Tentar ajudá-la ou correr deixando tudo para outros fazerem,
estavam convergidos na mesma questão. Ou seja, ou eu enfrentava meu
passado ou corria dele.
E nós precisávamos desse encerramento e, talvez, depois disso nós
dois seguiríamos em frente e encontraríamos outras pessoas para tentar ser
feliz de alguma forma. Digo de minha parte, já que sei muito pouco sobre a
vida dela longe do Brasil. Tinha o tal Pietro rondando por perto e não gostava
nada disso. Pedirei a Roger atenção especial sobre o cara. De qualquer
maneira eu vou fazer o que for preciso para convencê-la a sair comigo por um
tempo.
Depois de falar com Pedro, ligo para Roger para marcar dele ir à casa
de Sam ainda hoje. Quero tirá-la daquela casa o quanto antes, eu sinto que
sua segurança naquela casa não é das melhores, a foto tirada na frente da casa
é uma prova disso. Enquanto não tirá-la de lá, ficarei por perto.
— Infelizmente não posso ir hoje, estou em uma ocorrência na rua e
pode demorar.
— Estou tirando-a da cidade, mas antes queria deixar uma
investigação em andamento. Mandarei os e-mails recuperados com as
mensagens para você ainda hoje.
— Certo, mas podemos mandar alguém lá.
— Quero discrição sobre o caso, ele exposto pode causar mais danos.
— Ligarei assim que chegar ao departamento. Pode ser amanhã logo
cedo. — Eu agradeço sua boa vontade e desligo. Antes de sair da empresa,
peço para Souza enviar tudo para Roger e vou para casa fazer uma mala. Eu
tenho uma missão. Salvar quem não quer ser salvo é uma das coisas mais
difíceis para um segurança fazer seu trabalho bem-feito.
20
Samantha
“Cause you are not alone
I'm always there with you
And we'll get lost together
'Til the light comes pouring through
'Cause when you feel like you're done
And the darkness has won
Babe, you're not lost”
( Lost – Michael Bublé)

— Você tem visita de novo hoje — mamãe diz quando me ajuda


com o jantar. Ela está me servindo como se eu fosse um bebê outra vez. —
Esse homem está meio louco.
Eu sabia de quem ela estava falando e me sentia muito feliz apesar de
tudo. Ele se importa, mesmo dizendo que me odeia. Ele pode odiar, mas se
importa. Eu não digo nada sobre a observação de mamãe e ela suspira
frustrada.
— Não vai dizer nada? Vai deixar que ele volte para sua vida assim,
sem mais nem menos? E pior, ele exigiu um quarto porque vai ficar aqui!
O que ele está planejando com isso? Estou louca que ele diga, porque
a curiosidade é maior que minha prudência. Tê-lo aqui, assim, tão perto? É o
céu e inferno ao mesmo tempo.
— Posso tomar meu suco? — digo displicentemente. — Estou com
sede.
— Você me deixa nervosa, sem eu saber o que pensa. — Mamãe
coloca o copo em minha mão e consigo levar o copo à boca sem maiores
traumas. A primeira vez que fui comer sozinha tinha sido um desastre. Pura
teimosia da minha parte por querer tentar ser um pouco independente.
— Amanhã uma tutora virá aqui para ajudar com suas limitações,
querida. Zara contratou, ela é uma enfermeira, na verdade...
— O quê? Como planejam as coisas sem me consultar, mamãe? —
Tento devolver o copo para ela, mas minha agitação faz o copo entornar e
molhar minha roupa. — Droga!
— Filha... — ela lamenta.
— Posso trocar essa roupa? — peço chateada.
— Tudo bem, mas a tutora virá, sim, amanhã. — Fico calada, porque
não adianta discutir com ela. Posso muito bem despedir a enfermeira amanhã.
Depois de trocar minha camisola, ela sai e recosto-me na cama
imaginando o que Carl veio fazer novamente aqui, pela terceira vez no dia.
Ele não tem vida própria?
O som da porta abrindo me deixa tensa, porque sei que é ele. Não
faço qualquer movimento para indicar que sei de sua presença. Só ele que
entra calado dessa forma.
— Sam?
— Vai morar aqui agora?
— Se for preciso — ele diz e o colchão se mexe quando ele senta. —
É muito tarde para uma conversa?
Deus, ele vai me deixar louca. Em um momento ele é todo intenso e
explosivo, no outro, como agora, sua voz é igual seda pura, fazendo-me
engolir em seco.
— O que foi agora?
— O de sempre, sua segurança. Tenho um amigo da polícia que vem
aqui amanhã.
Isso outra vez? Por que insiste nisso?
— Carl, por favor...
— Eu disse que iria levar você à um lugar, esqueceu? — A voz dele
está mais perto. E sinto o calor de sua mão em meu queixo fazendo uma
carícia de leve. — Será um lugar sem estresse para que se recupere.
— Já falamos sobre isso, não posso depender de você até para tomar
banho, Carl — digo exasperada.
— Não seria a primeira vez que daria um banho em você — ele fala
me chocando por trazer um assunto do nosso passado, ainda mais íntimo. Eu
estou vermelha, certamente, porque estou quente. Lembranças de nós dois
tomando banho juntos preenchem minha mente agora. Parece que a falta de
visão aguça todos os outros sentidos e a lembrança dele me tocando,
ensaboando lentamente em cada pedacinho da minha pele lisa, é tão real que
solto um gemido constrangedor. Além de tudo, o dedo dele continua a carícia
delicada no meu rosto. Céus, eu estou inválida, mas minhas partes íntimas
estão em pleno funcionamento.
Samantha Sttolen, se contenha!
— Venha comigo amanhã, Sam — ele diz roucamente. — O que
posso fazer para convencer você?
— Eu... não posso ir assim. —Essa é minha voz mesmo? Jesus! Eu
não entendo o jogo de Carl, não sei porque ele resolveu se aproximar agora.
— Talvez isso te convença — diz antes de eu sentir o toque macio de
seus lábios nos meus. Ele beija delicadamente o canto da minha boca de um
lado, depois do outro, salpica beijos suaves no meu nariz, depois nos meus
olhos fechados, volta para a boca onde me beija com mais persuasão agora.
Eu faço a única coisa plausível, eu abro minha boca para receber seu beijo.
Sua boca é tão familiar e tão estranha que isso me bate fortemente. Ele está
me beijando outra vez. Não percebo que ele parou de me beijar até que ouço
soluços que vem de mim mesma.
— Ei, não queria deixar você triste...
— Eu... é muito...
— Me desculpe — ele diz. Eu não sei porque estou chorando...Mas
estou com meu peito contraído e a súbita vontade de receber um abraço é tão
intensa que só me faz chorar mais... — Sam, desculpe.
Eu sou tão boba e sentimental.

Tento controlar a gama de emoções que se acumulam em meu corpo e


respiro fundo, não posso permitir que ele me afete dessa maneira, mesmo que
meu corpo diga para agarrar com força cada pedacinho dele. Ele está
murmurando desculpas por ter me beijado e eu não ligo para suas
explicações. Isso foi cruel da parte dele, me dar um pouco daquilo que eu
quero mais que tudo. Buscando uma força no fundo da minha alma, falo com
mais firmeza do que eu sinto realmente.
— Por que está fazendo isso comigo, Carl? — questiono quando a dor
abranda no meu peito. — Por que está brincando dessa forma comigo?
Limpo com raiva uma lágrima teimosa que insiste em cair e espero
sua resposta, mas ela não vem logo e quando acho que ele vai ignorar diz:
— Gostaria de ter uma resposta para sua pergunta, Samantha, mas eu
não sei o que me toma quando o assunto é você. — Ele parece com raiva,
talvez, dele mesmo, de mim, da nossa história, não sei. — Eu quero que
esqueça esse deslize, não acontecerá novamente.
— Não ache que pode brincar comigo apenas porque estou... — não
consigo concluir. Passei quase dez anos almejando seus beijos, seus braços ao
redor de mim e agora não posso permitir que ele apenas faça como algum
tipo de diversão.
— Já pedi desculpas, Samantha — ele pede outra vez.
Ficamos em silêncio por um tempo. Eu não sei os motivos dele para
estar aqui, porém a curiosidade é grande para descobrir.
— Me dê uma razão mais concreta para ir com você a qualquer lugar,
Carl. — Tateio até puxar as cobertas para cima do meu corpo, minhas feridas
estão começando a incomodar. Deve ser devido ao dia estressante que estou
passando, um dia que parece uma semana. Minha perna está latejando e não
quero tomar medicação de novo.
— Sua agente comunicou se recebeu hoje um novo e-mail? — Ele
não coloca nenhuma entonação na voz que me indique se algo está errado
com essa pergunta.
— Não, ela está chateada com o meu comunicado de mais cedo,
portanto esteve ocupada com meus contratos — digo, porque foi essa
informação que mamãe me disse quando questionei onde Zara estava. Porque
essa não colocou mais os pés aqui no quarto desde que eu anunciei que ela
poderia chamar meus patrocinadores e deixar claro meu afastamento do
mundo musical até segunda ordem. Ou seja, eu posso voltar um dia ou nunca.

— Tomei a liberdade de interceptar um e-mail seu — ele começa


como se estivesse envergonhado de admitir. Céus! Eu tenho ganas de rir de
toda situação que me coloquei quando resolvi aceitar essa turnê aqui no
Brasil, não turnê, apenas alguns concertos, e agora estou no meio de quase
uma conspiração. — E hoje você recebeu um e-mail bem mais ameaçador,
Samantha.
— Carl, é tarde e tenho que descansar. Estou cansada de tudo isso.
Essa pessoa está apenas tentando colocar medo em mim, mas não vou
permitir e nem me esconder de quem quer que seja — digo contundente
repetindo o que já disse a ele mais cedo.
— Amanhã um policial vem aqui pegar seu depoimento — ele diz
como se não tivesse me ouvido. — Eu estou ficando aqui no quarto de
hóspede essa noite.
Eu tinha esquecido desse detalhe, o beijo tinha sugado todo meu
precário equilíbrio.
— Eu não entendo porque você se dá ao trabalho.
— Samantha... — Ouço ele respirar fundo. — Não tente entender,
apenas tente confiar em mim. Sei que é pedir muito nesse momento, mas
aquelas fotos de hoje me afetam também, é só o que precisa saber. A pessoa
está perto demais, Sam, e mostrar que pode chegar mais perto tirando uma
foto dessa casa é muita ousadia.
— Daqui? — Agora estou ficando preocupada. — Como, se não tem
nem dois dias que meu pai alugou essa casa?
— Exatamente, não quero que fique apavorada, estou aqui para
mantê-la segura — ele garante confiante. Eu acredito nele, porque se eu o
conheço um pouco ainda, ele sempre foi essa pessoa que cuidava de mim
com zelo, amor e tanto cuidado.
Ele poderia ainda ter um pouco daquele Carl dentro desse novo
homem que vi na outra noite? Tão frio e cruel? Eu quero acreditar que sim ou
ele não estaria aqui, não é?
— Tudo bem — digo no intuito de acabar com nossa conversa que me
deixa tão nostálgica. Estou me sentindo sonolenta e cansada também, o dia
tem sido longo. Essa avalanche de acontecimentos e emoções estão tirando-
me as forças.
Ele se despede logo em seguida e acredito que sai do quarto, pois fica
apenas o silêncio. Perco-me nos pensamentos entre passado e presente,
perdida nas lembranças...
Devo ter dormido porque acordo com a voz de mamãe me chamando.
Não sei se é noite ainda ou dia. Tento ficar quieta para ver se ela irá embora,
mas ela insiste.
— Querida, são quase nove da manhã e tem um policial aqui — ela
está dizendo. — Carl está prestes a vir aqui para acordá-la.
Droga, isso faz com que eu me mexa para levantar.
*
Uma hora depois, mamãe empurra a cadeira de rodas para fora do
quarto. Eu prefiro assim. Falar com um policial na cama não é muito atraente,
ainda mais quando não posso ver nada ao meu redor.

— Devia tomar seu café da manhã primeiro, querida — ela diz, mas
meu apetite é zero. Estou nervosa com a ideia de sair dessa casa para ir com
Carl para esse lugar que ele faz questão de manter em segredo.
— Bom dia, Samantha. — É pensar nele e ele aparece. Alegria e paz é
o que sinto quando escuto sua voz. Deus, se não fosse mórbido estaria feliz
que tive esse acidente. Isso é tão louco. Porque sei que se não fosse por isso
ele não estaria aqui e nós talvez nunca teríamos uma nova chance para nos
encontrar. Naquela noite, na frente de seu prédio, vi o quanto ele estava certo
de nunca mais querer me ver. Mas agora? Uma esperança mesmo que
pequena me faz aceitar minha cegueira como talvez uma coisa ruim que me
trouxe algo de bom. Nada é tão trágico que não tenha seu lado positivo, não é
mesmo? Amor é confusão. É acordar todas as manhãs com trilhões de
problemas e achar o mundo lindo, e eu sempre amei Carl por todo minha
vida. Vou agarrar essa "confusão" em que estamos e tentar viver esse amor.
Só não sei ainda como faremos isso. Eu só preciso ter a coragem de agarrar
essa chance torta que a vida está estendendo para mim.
Ele não me dá nenhuma esperança, mas tenho por ele e por mim, pois
um dia nós tínhamos um amor sublime e tenho absoluta certeza que ainda há
um pouco desse carinho lá no fundo. Eu só preciso de um motivo para
acreditar.
— Bom dia. — Com o pensamento cheio de esperança, pela primeira
vez em muito tempo, dou um pequeno sorriso contente ou assim eu espero
que pareça para ele. Estendo minha mão a procura da dele quando mamãe
para de empurrar a cadeira e só encontro o vazio.
21
Carl
Acordo às cinco da manhã no quarto de hóspedes da casa de
Samantha, e a primeira coisa que vem a minha mente é o calor de seus lábios,
não devia tê-la beijado, movimento errado do caralho, mas, caramba, foi
incontrolável! Sua pele cremosa, refinada, mesmo que essa perfeição tivesse
alguns machucados não tirava sua beleza. Seu perfume delicado me fez tonto
pela proximidade, quando percebi estava beijando-a e nem era da forma que
imaginei que um dia voltaria a beijar sua boca linda. Não, eu sempre imaginei
faíscas saindo para todos os lados, roupas voando em todas direções,
gemidos, sua boca falando meu nome como uma oração e o som de nossos
corpos chocando-se um contra o outro quando eu estivesse enterrado dentro
dela. Fecho meus olhos quando deslizo minha mão pela barriga onde os
músculos estão enrijecidos e seguro meu pau dolorido. Gemo roucamente e
paro. Que merda estou fazendo? Ou prestes a fazer? Carl O'Neal, você está
possuído?
Carl O'Neal agindo fora da linha? Novidade do caralho. Bastou uma
semana perto de Sam e o gelo já começou a derreter?
Claro que não, merda. Eu estou aqui para mantê-la segura e nada
mais. Recrimino-me, jogo as cobertas de lado e levanto. Dormi praticamente
só duas horas, por isso devo estar agindo despropositadamente. Havia ficado
sentado ontem em uma poltrona velando seu sono e só saí por volta das três
horas da madrugada, depois que verifiquei todas as portas. Essa casa não
podia impedir um assassino de entrar aqui. Mesmo sendo a coisa mais errada
a fazer, envolvendo-me mais com Samantha nesse momento delicado de sua
vida, meu lado racional e irracional vivem em uma briga constante. E o lado
irracional sempre leva a melhor.
Preciso receber Roger daqui a pouco, ele tinha enviado uma
mensagem ontem dizendo que viria falar com Sam. Seria ótimo. Ele
conseguiria arrancar alguma coisa de alguém dessa casa.
Agora, depois de tomar um banho rápido, estou saindo do quarto
quando ouço uma voz no quarto que fica quase em frente ao qual foi
designado para mim. A voz de Zara é baixa e autoritária, como normalmente
ela fala.
— Temos de fazer ela mudar de ideia, a multa por abandonar os
compromissos agora é gigantesca. — Ela para de falar e chego mais perto da
porta, mas não escuto vozes. Será que ela está ao telefone com alguém? —
Temos de fazer uma intervenção. Ela não pode tomar decisões dessa
magnitude nesse momento. Ela está sendo influenciada por um problema que
está apenas na cabeça dela. Os médicos já deram um diagnóstico definitivo,
ela não está cega por problemas físicos. Está sendo teimosa como sempre.
Samantha tem vivido com essa mulher por quanto tempo para que ela
tenha essa atitude desrespeitosa com ela? Até parecia que Samantha
trabalhava para ela. Isso é real mesmo?
— Eu sei, como advogado dela já era para você estar aqui tomando
essas decisões — ela continua dizendo —, vou falar com seus pais, eles irão
concordar comigo. Uma intervenção será o que iremos fazer até ela voltar ao
seu juízo perfeito.
Intervenção? O que ela está pensando em fazer? Não vou deixar que
isso aconteça. Entretanto me pergunto como farei isso, não sou nada mais que
um ex-namorado que não sabe deixar nada quieto. E um ex abandonado,
devo lembrar a mim mesmo. Era a verdade olhando nos meus olhos e rindo
de minha incapacidade de ir embora e deixar Samantha resolver sua própria
vida.
Não fico mais escutando, vou direto para a cozinha, preciso tomar um
café. Surpreendo-me quando encontro o cantor sentando à mesa. Ele não
estava por perto ontem quando voltei para dormir aqui. Agora ele me olha
com desconfiança e desprezo.
— Não acha que está invadindo o espaço de Samantha agindo como
um troglodita, senhor O'Neal? — ele fala depositando a xícara na mesa com
mais força que necessário. Ele deve estar se sentindo ameaçado. Grande
idiota. — Hospeda-se sem ser convidado? Não acha sua preocupação um
pouco sem argumento?
Caminhando até a armário, pego uma caneca a encho com café antes
de voltar minha atenção para ele.
— Acho que já tivemos essa conversa, não? — Encosto-me no balcão
de mármore, encarando-o. — Eu posso te fazer exatamente a mesma
pergunta. O que faz aqui afinal?
— Antes de tudo, sou amigo da Samantha. É normal que esteja aqui
quando ela está doente. — Ele se empertiga todo, como se estivesse na
defensiva.
— É médico? — Minha pergunta irônica tira-o um pouco do sério. O
desagrado de antes apenas se acentua mais em seu rosto.
— Não sou médico, mas somos mais que meros amigos...
— Ontem você era noivo, hoje é amigo mais que meros conhecidos,
amanhã será o que, senhor cantor? Marido dela? — Minha pergunta jocosa
faz com que levante, empurrando a cadeira com força. Receio que o barulho
perturbe a casa, apesar que, ao que parece, todos estão acordados.
— Somos namorados e em breve, sim, seremos marido e mulher. —
Olho atentamente para ele. Será que ele era o perseguidor de Samantha? Essa
confusão de sua parte sobre a relação dos dois era muito estranha. Estreito
meus olhos encarando-o e ele desvia os olhos. Droga! O quanto antes tirá-la
daqui, melhor.
— Homem de sorte, não? — digo com um meio sorriso de quem
acreditava nele, mudando minha tática. Se ele fosse a mesma pessoa que
estava mandando esses e-mails, ele poderia se precipitar e fazer alguma
loucura antes que eu tirasse Sam daqui. — Espero que dê certo.
Bebo meu café lentamente e o observo sair me deixando sozinho.
Pego meu celular e envio uma mensagem para Roger, preciso que ele venha o
mais rápido que puder, e eu esteja fora daqui antes que o dia de hoje termine.

Pouco depois a empregada vem fazer o café da manhã e eu saio um


pouco rondando pela casa, tenho vontade de acordar Sam, mas me refreio.
Ela precisa descansar. São sete da manhã quando enfim Roger chega e o
recebo fora da casa.
— Que bom que veio. Preciso que, antes de falar com Samantha, fale
com as pessoas que convivem com ela — sugiro. — Principalmente com esse
tal Pietro e a agente dela que tem atitudes suspeitas.
— Quantos anos está fora do sistema, meu amigo? — Ele ri da minha
expressão confusa. — Às vezes, os suspeitos mais prováveis são os
inocentes.
— Claro que sei disso, mas quero todos os detalhes desse caso
verificado. — Encaminho-o para dentro da casa.
— Ensinando padre a rezar, O'Neal? — ele graceja. — Foi para isso
que você correu para mim.
Apresento-o para todos e ele usa o escritório para falar com cada um
separadamente. Eu gostaria de ficar junto, porém Roger diz que será melhor
que ele fale com todos sem pressão da minha presença. Não fico contente
com isso, mas aceito.
Enquanto ele conversa com Zara, vou a procura de Sam que ainda
está dormindo, segundo Amanda, a mãe dela.
— Acorde-a, ela precisa falar com Roger, e faça uma mala para ela —
exijo quando a encontro na sala.
— Carl, não vou permitir que leve minha filha assim doente, Deus
sabe para aonde — ela lamenta.
— Ela vai ficar bem, na verdade afastá-la daqui talvez seja o melhor
para sua recuperação. — Encaro-a sem nenhuma simpatia. — Sua filha
precisa sair dessa opressão em que vive.
Ela ri um pouco e me olha com questionamento.
— Carl, eu conheci você quando era um rapaz de faculdade que não
tinha muito para oferecer à minha filha, mas talvez tivesse amor naquela
época.— Ela levanta e para ao meu lado. — E agora? Nem isso por ela você
tem mais, então por que está aqui? Quem pode me garantir que não é você a
pessoa que está tentando coagir Sam?
Se era para ser engraçado, não achei a menor graça no que ela acabou
de sugerir.
— Amanda, se eu fosse um serial killer de pianista, eu já teria tomado
sopa com os ossos da sua filha, porque até agora ela tem sido exposta para
qualquer um fazer mal a ela. — Aponto na direção do quarto de Sam. —
Agora, vá acordá-la ou eu mesmo farei isso.
Ela suspira, mas segue para atender minha ordem. — E, Amanda?
Quando ela para e me olha, digo com cara de poucos amigos que me é
peculiar:
— Não tente convencê-la a não ir comigo ou não responderei por
mim.
— Você está em minha casa, não esqueça disso... — ela começa,
porém a corto.
— Por pouco tempo. Então ande logo com isso e não esqueça da mala
pronta, partiremos assim que terminarmos de falar com o detetive.
Estou sendo duro, chato e intransigente, mas, caramba, esse povo
parece sanguessuga na vida da minha ex-namorada.
— Ela nunca devia ter voltado a esse país, onde ela nunca foi
ninguém. E você deve estar contente por ela estar passando por isso, não é
mesmo? — Não respondo, porque não merece minha atenção e, quando nem
olho em sua direção, ela sai me deixando. Eu vou até a janela e olho ao redor.
Tento ver alguém suspeito lá fora, mas tudo parece tranquilo. Mas é sempre
assim, tudo fica calmo para depois explodir como uma bomba em nossas
caras. Mas dessa vez nada vai acontecer, não se eu puder evitar.
Fico até escutar a barulho da cadeira de rodas que foi providenciada
para ela. Pouco depois as duas surgem e meus olhos caem em Sam, ela
parece mais calma e fresca essa manhã, os machucados menos visíveis.
— Bom dia, Samantha — digo caminhando para tomar o lugar onde
sua mãe está empurrando a cadeira. O pequeno sorriso, mas sincero de Sam,
me faz acreditar que ela não têm dúvidas que ela virá comigo onde eu quiser
levá-la.
— Bom dia – ela responde.
Ela estende a mão no ar e tenho vontade de segurá-la, contudo me
contenho dizendo a mim mesmo que tenho um limite de hoje em diante com
Sam. Cabeça fria e profissional. Recito isso como uma oração em minha
mente. Chega de beijos impulsivos.
22
Samantha
— Eu a levo daqui, Amanda — Carl fala com minha mãe
empurrando a cadeira de rodas, sei que é ele pois sua presença atrás de mim é
notável. Parece que calor transborda dele em minha direção. Fico imaginando
se ele lembra do beijo de ontem. Involuntariamente levo minha mão aos
lábios e os toco. Sinto seus lábios perto do meu ouvido, sua respiração me
tocando. — Está pronta?
— Sim.
— Ótimo, não vai demorar, você só precisa abrir uma ocorrência para
que Roger trabalhe. Ele não vai te interrogar ao ponto de exaustão — ele diz
enquanto empurra a cadeira, provavelmente, para o escritório onde o policial
está conversando com todos, segundo mamãe.
*
Duas horas depois, estou sendo colocada no banco de trás de um
carro. Foram quase meia hora de lamentações e recriminações de mamãe para
que eu não saísse assim: Debilitada e dependendo de outra pessoa para um
lugar desconhecido com um homem quase desconhecido também. Ela tinha
razão. Era loucura, meio fora da realidade, mas estou cansada de viver a
minha realidade.
Carl me deixa o mais confortável possível no banco do carro,
apoiando minha perna engessada e fecha a porta do carro.
O carro se mexe e o som do motor ganha vida e ele pergunta:
— Pronta para uma aventura, senhorita Stollen? — a voz dele está
alegre.
— Não!
— Resposta errada. A aventura está apenas começando.
— Pensei que era para minha segurança, senhor O'Neal — digo com
um sorriso.
— Ah, desculpe, eu menti. — Ouço Carl dizer e o pânico começa a
crescer. Será que ele me odeia a ponto de me fazer algum mal?
— O que você quer dizer com mentiu? — balbucio frenética. — Onde
está me levando, Carl? Responda!
— Sua confiança em mim é tocante — ele responde em um tom leve
e brincalhão. Ele parece estar se divertindo por ver minha reação. — Mas,
como já disse antes, é um lugar que quero há muito tempo mostrar para você.
— E porque tanto mistério? Está me deixando com medo. E sobre
confiar em você, eu sempre fiz isso no passado, mas agora precisa conquistar
isso — digo confiante, porém não recebo resposta dele. A única coisa que
escuto é o ronco suave do motor do carro em movimento. Passam alguns
minutos, acho, ou minha falta de visão está afetando minha noção de tempo,
porque parece uma eternidade e não tenho nenhuma manifestação da parte
dele. — Carl?
— Estou aqui. — Vem a reposta.
— De repente ficou calado. — Eu queria poder vê-lo. — Algo
errado?
— Não, apenas não quero dizer o que não devo. — Sua voz perdeu
um pouco da leveza de antes. — Tente dormir um pouco, a viagem é longa.
Não se preocupe, vai gostar desse lugar. Era um dos seus sonhos, Samantha.
— E voltamos a ficar calados por um longo tempo.
— Eu confio em você, apesar de nossa história — confesso em um
dado momento. — Não é cem por cento como antes, mas ainda confio ou não
estaria aqui. E apesar de claramente me odiar, esse ódio não me causa medo,
Carl, porque você é incapaz de fazer mal a alguém.
Depois do meu pequeno discurso, sinto-me melhor e aceito que nossa
história é muito cheia de coisas não ditas ou ditas de maneira errada, mas
tenho fé acima de tudo. Eu não tinha antes, mas agora? Com ele me
protegendo, mesmo quando provavelmente não gosta tanto de mim, prova
que nosso amor adolescente ainda está lá. Só precisa que seja regado e
florescerá novamente.
Eu costumava acreditar quando mais jovem que nosso amor passaria
por tudo e continuaria forte, não conheceria tempo nem distância, cada dia
aumentaria mais. Mais forte e mais intenso. Mas no fim não soubemos como
lidar com todos esses sentimentos. Fico quieta e esse sentimento de paz que
a muito não sentia me bate e caio no sono.
— Quando voltar você já terá nossa casa pronta? — Viro minha
cabeça para olhá-lo e recebo um beijo cálido no nariz. Carl e eu estamos
deitados na cama em seu apartamento de solteiro, porém muito confortável.
Era onde eu passava muito do meu tempo quando não estava estudando no
Conservatório de Música. Muitas vezes passava a semana inteira lá,
causando pequenas, porém chatas, discussões com meus pais pois, segundo
eles, estava passando muito tempo com Carl quando deveria estar
preocupada e me dedicando ao que sempre quis ser, uma pianista. E agora
eu tinha um intercâmbio que me permitiria estudar fora por um tempo e,
bem, nós tínhamos muitos planos quando eu voltasse.
— Certeza disso? Sabe que é muito nova para pensar nessas coisas,
não é, garota? — ele pergunta, como tantas vezes quando eu insisto que
devemos morar juntos. — Isso é coisa para gente grande. Sabe que quando
acontecer nunca mais deixarei você sair da minha vida, Sam. Amo você mais
que minha própria existência, minha linda.
— Te amo cem vezes mais — replico feliz. Ele aperta o braço em
torno dos meus ombros me atraindo ainda mais para perto dele. — Quando
nós dois pudermos, iremos ter uma casa longe de todos, para não sermos
denunciados pelos vizinhos por causa do piano, com uma varanda, um lago,
um jardim e...
— Só isso? Diga-me mais. — Ele começa e cutucar minhas costelas e
me desfaço em risadas com as enxurradas de cócegas que faz em mim.
— Por enquanto só isso — gracejo. — Depois exigirei mais de você,
amor.
— Como é abusada! — Ele distribui beijos no meu pescoço, queixo,
canto dos lábios e esqueço tudo ao redor com sua adoração óbvia. Como
amo cada pedacinho dele. — Um lugar especial para o grande amor da
minha vida.
— Você promete?
— Vou procurar incansavelmente por um lugar assim para nós, pode
ter certeza. Quando voltar, começaremos uma vida juntos — ele me garante.
— Amo você.
Completamente fascinada recebo sua boca na minha, gemo quando a
língua dele invade a minha boca, molhada, quente, deliciosamente suave.
Nossas línguas dançam juntas, parece que nunca temos o suficiente um do
outro, queremos nos engolir vivos de tão boa que é nossa conexão. Ergo meu
quadril de encontro ao dele, sentindo como ele está duro para mim. Gemidos
e o som da nossa respiração ofegantes enchem o quarto. Minhas entranhas
apertam de ansiedade para senti-lo dentro de mim outra vez.
—Um lugar especial é onde nós dois estivermos juntos, meu amor —
ele diz antes de nossos corpos se conectarem de forma mais íntima...
Acordo sobressaltada e percebo que o carro ainda está em movimento.
Uma música toca baixinho no interior do carro. Estou ofegante e úmida. As
imagens desaparecem aos poucos na minha cabeça e deixo-me ficar aqui por
uns instantes apreciando a letra de Lost que invade meu coração como se
fosse feita para nós.
— Sam? — a voz de Carl me puxa para realidade. — Você está bem?
— Sim — minha voz sai engasgada e limpo a garganta dizendo mais
firme. — Sim. Onde estamos?
— Já estamos chegando. Tem um posto mais à frente, quer dar uma
parada?
Eu até quero, pois estou dormente nessa mesma posição, mas sei
como seria impraticável sair desse carro agora e perderíamos muito mais
tempo.
— Estou bem. Prefiro descer de uma vez.
— Não tem problema se quiser — ele insiste.
— Estou bem, Carl, podemos seguir.
— Estamos chegando.
Um telefone começa a tocar e a voz de um homem preenche o carro
encobrindo a música que tocava.
— Onde você está, O’Neal? — ele parece chateado.
— Estou saindo da cidade — Carl reponde.
— Não pensei que fosse fazer isso sozinho, homem. Alexander não
me deu detalhes do que está acontecendo, mas devia contar conosco para te
dar uma força. — O outro homem diz.
— Ross, obrigado. Tenho tudo sobre controle, pouca gente sabe onde
estou indo.
— A casa do lago não foi muito segura para mim, lembre-se disso. —
Não escuto mais nada do que estão dizendo porque a única parte da conversa
que foco é: casa do lago?
Tento voltar a prestar atenção no que Carl está falando.
— Caso haja algo que não possa administrar sozinho, ligo para vocês
— ele está dizendo. — E Alicia?
— Ela quer me matar, estou em jejum de...
— Ross, a ligação está no viva voz, ninguém quer saber de sua vida
sexual — Carl interrompe e homem do outro lado que está rindo divertido. —
Devia agradecer, ao menos você a tem. — É pesar que percebo em sua voz?
— Claro que tenho. E você ainda não gosta da palavra com B perto de
você? — O tal Ross está rindo do outro lado. — Cara, vou arrumar umas
garotas gostosas para você transar e acabar de vez com esse jejum maldito...
A música volta a tocar cortando a voz do homem, Carl deve ter
desligado.
— Filho da puta, boca grande. — Ouço o resmungo baixo dele e meu
coração pesa com a insinuação de Carl com outra mulher. As imagens das
duas mulheres daquela noite vêm a minha mente, deixando um rastro
dolorido no caminho do meu coração. Sei que ele teve uma vida nesses
últimos dez anos, não sou hipócrita quanto a isso, mas ainda assim é tão
doloroso pensar que não era eu com ele. Tudo culpa minha. Nunca devia ter
viajado, mas também eu não teria realizado meu sonho e... Droga, não
adianta chorar agora por causa disso, não podemos fugir das consequências
daquilo que fazemos no passado, das atitudes que tomamos. A única coisa
que temos de fazer é aprender com elas. Eu só lamento ter perdido o seu
amor tão facilmente.
Ele não comenta nada depois do telefonema e eu tampouco e algum
tempo depois o carro reduz a velocidade e para após alguns minutos.
23
Carl
Paro o carro de frente para o chalé e fecho meus olhos respirando
fundo. Emoções apertam tão forte em meu peito que tenho receio de estar
sofrendo um ataque cardíaco. Esse momento foi tão esperado na minha vida
que estar aqui, agora, parece um sonho onde estou fora do meu corpo e estou
assistindo essa cena acontecendo em algum filme.
Eu tinha pensado em mil formas de dizer a Samantha o que era esse
lugar cada vez que ela me perguntava onde estávamos indo, mas não disse e
agora estou aqui contemplando a casa sem saber pela primeira vez o que
fazer.
Então o que acontece agora que a trouxe aqui? Dizer “Aqui está a
casa que planejei te dar quando você voltasse, mas você nunca voltou?”
Ou “Aqui é o lugar especial que esteve esperando por você todos
esses anos, mas nunca ficará nele, só trouxe você aqui para que veja o que
perdeu?” Será que isso me faz um homem mau? Sentir vontade de jogar na
sua cara nossa casa? Para ser bem sincero, esse foi o primeiro pensamento
quando cogitei trazê-la para cá.
Merda, sou um idiota. Ou deveria dizer que aqui era onde eu sempre a
quis? Que por anos não coloquei os pés aqui por não suportar ver o lugar
vazio sem o som de suas risadas e do piano. Mesmo que ela nunca tenha
vindo aqui, é como se o lugar fosse de Samantha. Cristo! Eu vivi idolatrando
essa mulher. Será que sou um louco obsessivo?
Mas do que adiantava tudo isso se ela não enxergava nada? O melhor
a fazer é agir como seu segurança.
Mas quando o assunto era Sam, eu era irracional, dúbio, louco sem
sentido. Deus sabe o quanto eu tenho raiva de me sentir vulnerável. Mas essa
é nossa história, só tenho de saber lidar com tudo com discernimento. A
viagem tinha sido dura porque me peguei divido em olhar a estrada e olhar
seu sono, seu rosto, enquanto ela dormia. Em algum momento pareceu que
sonhava, pois ela parecia feliz, lembrando-me da Samantha de anos atrás. A
minha Samantha.
Depois de alguns minutos, resolvo descer e cuidar do bem-estar dela
em vez de dizer algo para nos machucar. Por que tenho certeza que não iria
me controlar de tentar mostrar o que ela perdeu indo embora de vez da minha
vida.
— Chegamos, Samantha — digo quando abro a porta do passageiro
Ela tem o rosto contraído — O que você tem?
— Só um pouco de dor, não é nada — ela diz frágil. — Eu só preciso
deitar um pouco.
— Espera, vou abrir a porta para levá-la para dentro — digo e sigo
para a porta da frente, mas essa se abre e vejo Pedro sair. — O que faz aqui
ainda, homem?
— Tive um atraso nas compras e só agora consegui deixar tudo
pronto — ele responde e estica o pescoço para o carro. — Tem companhia?
— Sim, trouxe uma cliente, mantenha a porta aberta, vou levá-la. —
Ele assente e volto para pegar Sam. — Vou pegar você, ok?
A manobra para tirá-la do carro é um pouco complicada, mas consigo
levá-la em meus braços para a casa. Minha garganta se fecha de emoção, no
entanto me controlo para nosso próprio bem. Quando entramos, Pedro vem
atrás de mim.
— Posso ajudar com alguma coisa, senhor Carl? — Sinto o corpo de
Sam ficar tenso ao som da voz dele e a aperto mais em meus braços levando-
a para o quarto principal.
— Está tudo bem, querida, é apenas meu caseiro — digo em seu
ouvido e ela relaxa suspirando. Por que diabos estou chamando-a de querida?
Deus, O’Neal! — Traga as malas que estão no carro, Pedro. Obrigado.
— Que lugar é esse, Carl? — Pela enésima vez ela pergunta e algo
me impede de dizer. Talvez eu queira que ela descubra quando recobrar a
visão. Sim, vamos ficar aqui até ela estar bem.
— É apenas minha casa fora da cidade, Sam — digo.
— Tem um lago?
O quê? Como ela sabe disso?
— Como sabe disso? — Será que ela sabe desse lugar? Pesquisou
minha vida? Será que ela sabe que continuei com isso mesmo ela não dando a
porra de nenhum valor? Será que ela planejou isso? Vir aqui?
— Seu amigo falou no carro. Carl, você está me apertando — ela diz
e percebo envergonhado que estou com os braços tensos em sua volta.
— Desculpe — peço desconfortável.
— Tudo bem — diz com uma risadinha e encosta a cabeça no meu
ombro dizendo baixinho: — Só preciso que me leve ao banheiro. Fiquei
muito tempo no carro. Desculpe.
— Não precisa pedir desculpas por isso, Samantha. — Entro no
quarto e vou direto para o banheiro. Ainda bem que é tudo espaçoso aqui.
Depositando-a sentada, fecho a porta atrás de nós.
— Pode ir, Carl, eu posso fazer isso sozinha — ela garante, mas eu
não vou deixá-la sozinha em um lugar desconhecido para que se machuque
mais caso caia.
— De hoje em diante será apenas você e eu, Samantha, pense em mim
como um enfermeiro — digo e vou ajudá-la sob protesto.
Minutos depois estou acomodando-a na cama.
— Você, enfermeiro? Bem difícil de associar, Carl — ela comenta
enquanto a ajudo vestir uma roupa confortável. Ela está trêmula e ruborizada.
Ela tinha razão, meus pensamentos não são de enfermeiro agora que vejo
muito de seu corpo. Deus! Será um inferno cuidar dela sem poder tocar como
eu quero, mas não posso.
— Você tem razão, pense em mim como um médico — tento gracejar
e fica ainda pior porque agora estou pensando em brincar de médico com ela.
Que merda! Ela está mais vermelha agora, acho que sua dor foi esquecida
com essas insinuações um tanto inocentes, mas nossas mentes estavam a mil
por hora.
Limpo minha garganta e tento de novo. — Não pense em nada.
— T-tudo bem — ela gagueja quando meus dedos tocam os lados dos
seios dela enquanto abaixo sua roupa. Jesus! Isso vai ser a missão mais difícil
da porra da terra e não faz nem cinco minutos que chegamos.
— Vou preparar algo para você comer — digo e me afasto da cama.
— Eu volto já.
Saio do quarto como se o diabo em pessoa estivesse atrás de mim.
Deus, eu sou um monstro desejando uma mulher quase inválida. O que isso
faz de mim?
Devo me tratar com um psicanalista e rápido. Entro na cozinha e
escoro meus punhos fechados no tampo da mesa. Minha cabeça pendura para
frente em desalento. Não pensei que isso seria tão difícil. Tê-la aqui, enfim.
Sam estava em casa... Faço uma careta para mim mesmo. Deixe disso,
homem. Isto não é o que o seu coração estúpido acha que é, Carl. Você só
tem que protegê-la, sim.
Porque independentemente de tudo, ela sempre foi minha e eu protejo
o que me pertence. Isso é o que o estúpido coração diz para meu lado
racional.
— Dia difícil? — a voz de Pedro me arranca do meu martírio.
— Difícil não é bem a palavra, Pedro. Está mais para estupidez das
grandes. — Vou até a geladeira, abrindo a porta. — Comprou tudo que pedi?
— Sim. Se tivesse dito que traria uma pessoa, eu teria pedido a Maria
para fazer o jantar — ele diz referindo-se a sua esposa.
— Está tudo bem, obrigado.
— Bem, de qualquer forma ligue se precisar de algo, estou indo. —
Ele coloca o chapéu que está rodando entre os dedos na cabeça e me olha
preocupado. — Quer que Maria venha ajudá-lo com sua cliente? Vejo que ela
está machucada e precisará de alguém...
— Obrigado, Pedro, mas cuido da Sam sozinho, não tem problema —
corto e começo a escolher os ingredientes para uma sopa. Ela precisa de
comida fácil e leve, então nada de comidas elaboradas. — Agradeço sua boa
vontade.
— Então, vejo você depois. — Quando ele sai me deixando sozinho,
eu sou uma pilha tensa de músculos. Preciso urgente de algo para extravasar
ou vou ficar louco.
— Bem feito para você, Carl O’Neal — resmungo para mim mesmo e
vou cuidar do nosso jantar. Mas antes vou até o armário e pego uma dose de
conhaque para aliviar um pouco a tensão. Ergo o copo em saudação antes de
beber. — Bem-vinda, Samantha!
*
Quando entro no quarto mais tarde com a sopa para Sam, encontro-a
dormindo. Eu tinha demorado um pouco verificando toda casa depois que
Pedro saiu. Não sabia se as ameaças eram reais ou apenas intimidações, mas
não queria ser pego desprevenido aqui, caso esse perseguidor nos seguisse, já
que ele parecia tão próximo ao ponto de ter fotos nossas.
Paro ao lado da cama e a observo por um momento. Deve estar
exausta da viagem longa que fizemos.
Minha Sam, tão quebrada, indefesa, estava pálida, talvez devesse
ainda estar no hospital se cuidando, mas foi tão teimosa em sair. Só faziam
duas semanas desde o acidente e, ainda por cima, viemos para cá. Coloco a
bandeja no criado mudo, ao lado cama, ajoelho-me para que eu possa
observar de perto sua tez cremosa, ainda com hematomas, mas nem isso tira
sua beleza.
— O que vou fazer com você? — sussurro, meu coração tomba de
dor, quando penso no que era para ser e nunca foi. Será que devo agradecer a
esse psicopata por mandar mensagens e portanto nos trazer aqui? Onde
sempre desejamos estar? — Eu lembrei de você todos os dias, carinho, e essa
mistura de amor e ódio que senti não me permitiram seguir em frente. Eu juro
que tentei tanto deixar o passado para trás, aceitar que você foi embora.
Minha voz treme e eu paro de falar porque estou em um círculo
vicioso com os sentimentos que sinto por ela. Mas uma coisa tenho certeza,
não deixarei ela sair daqui até que esteja totalmente recuperada. Farei de tudo
para que possamos viver um pouco em paz, sem nenhuma cobrança ou o que
seja. Quando ela estiver recuperada, talvez possamos conversar, algo que não
fizemos, até porque não tivemos espaço e eu não fui lá muito compreensivo.
Admito. — Sam — sussurro outra vez deixando a mágoa sair um pouco,
correr livre, porque estava presa a tanto tempo. Fui duro comigo mesmo e
com ela por longos anos, e isso estava acabando comigo.
Se fosse outro homem já teria esquecido tudo, mas esse sou eu,
sempre senti demais as coisas. Quando meus pais faleceram e fui morar com
minha tia, eu tinha onze anos, fiquei anos sem saber lidar com a dor que me
comia por dentro. Quando enfim saí da concha, comecei a viver fora do lugar
seguro onde me escondia, conheci Sam logo depois e me apaixonei tão
violentamente, dando tudo de mim. Mas, posteriormente, ela também me
causou essa dor tão grande que estou até hoje carregando comigo. Com raiva,
mal-humorado, cínico até com as vidas amorosas dos meus amigos.
Transando com mulheres aleatórias, apenas por necessidade fisiológica, sem
sentimentos envolvidos. Nunca mais namorei nenhuma mulher, nem por um
dia sequer. Porque lembrava que as mulheres não são confiáveis. Essa
besteira já dura há tanto tempo que acho que morrerei sozinho.
Agora posso tentar deixar tudo isso de lado e cuidar dela, pois não
podia deixá-la sozinha quando mais precisava de alguém que não fossem
aqueles que viviam sugando toda vida de uma pessoa que era tão radiante,
moleca e de sorriso fácil. Mas agora? Ela nem sorri mais. E eu quero ver esse
sorriso de volta, mesmo que no fundo esteja sangrando. Eu não quero
nenhum milagre, achando que agora será o retorno do nosso romance, nós
tínhamos quebrado umas das coisas mais importantes de uma vida a dois:
confiança, que uma vez quebrada, quiçá, não será consertada nunca. Ou
quase. Haviam os sortudos que voltavam a confiarem.
Seguro sua mão e beijo a palma suavemente. Ela tem que se
alimentar, parece tão magra!
— Carl?! — ela me chama com a voz temerosa. Será que ela percebe
que cada vez que acorda chama por mim? Será que ela ainda se importa
conosco?
— Sou eu. Trouxe seu jantar — digo ainda segurando sua mão na
minha e trazendo para mim. Passo o dorso da sua no meu rosto, minha barba
por fazer, provavelmente arranha, porque ela solta um riso tímido dizendo.
— O que você está fazendo? — Ela torce a mão querendo que eu
solte e vira a palma para meu rosto acariciando meu maxilar áspero. Sinto a
carícia como tivesse sido atingido por um fio desencapado e estremeço. Tocá-
la era um tormento, eu queria abaixar e beijá-la, não com a intenção da última
vez, quando queria uma resposta positiva dela de vir para cá, mas porque a
vontade de saborear sua boca é maior que tudo. Seguro sua mão beijando,
outra vez, a palma e parando seu toque.
— Você ainda tem de se barbear duas vezes ao dia, não é? — ela
comenta ainda com um sorriso, mas agora um pouco trêmulo. Eu a deixo
nervosa? Se ela soubesse.
— Devia comer, Sam. — Levanto e ajudo-a em uma posição
confortável para que ela possa se alimentar.
— Não tenho fome, Carl — diz e sua cabeça cai para seu peito.
— Claro que tem, não comeu o dia todo — aponto. — Fiz uma sopa
para você.
— Não posso! Agradeço pelo trabalho que teve, mas não posso.
O que diabos era isso? Como não pode?
— Não pode o quê, carinho? — Seguro seu queixo, trazendo seu rosto
em minha direção. Lágrimas deslizam silenciosamente por sua face. Seus
olhos claros estão perdidos no espaço, antes de fechá-los. — Ei, está tudo
bem.
Mesmo me recriminando, acomodo-me melhor perto dela e a faço
encostar em meu peito, embalando-a em meus braços. Fecho meus olhos
quando inalo o cheiro se seus cabelos e uma dor aguda me norteia, apenas
aperto-a mais firme. Faz tanto tempo que senti seu corpo junto ao meu, que é
quase irreal tê-la assim tão perto e, ao mesmo tempo, tão longe.
— Por que não me diz o que a incomoda, Sam? Assim podemos
resolver isso, humm? — Tento saber já que ela não fala coisa com coisa. Seu
nervosismo é claro e não entendo, além do óbvio, o motivo dela estar assim.
— Eu não tenho nenhuma coordenação quando me alimento. Mamãe
que ajudou a me alimentar e irei fazer uma bagunça suja aqui na cama... —
ela para e depois dispara como uma maluca. — Essa é a sua cama?! Oh, meus
Deus!
— Samantha, eu te trouxe aqui sabendo que teria de ajudar você em
tudo — digo firme. — Então, não fique com receio e perdida achando que te
deixarei sozinha, sem rumo. Estou aqui para o que você precisar. Vou te
ajudar com a sopa, não se preocupe, e — baixo o tom da voz e murmuro
perto de sua orelha —, sim, a cama é minha.
Ela notadamente prende a respiração e meus olhos caem para seu
peito onde a camiseta branca não esconde muito de seus seios redondos.
Droga, pare, Carl!
— Bem, estamos entendidos? — forço um tom descontraído e me
afasto para que ela se acomode e comece a se alimentar.
Pacientemente dou-lhe a sopa, colherada após colherada. Observo
cada gesto desajeitado que ela faz. Os cabelos castanhos claros e sedosos
estão caindo em torno de seu rosto, o nariz afilado e atrevido. Eu não tinha
visto seu lado atrevido, minha Sam adulta era uma total desconhecida para
mim, e eu estou apenas um dia perto e já quero desvendar tudo que eu puder
sobre ela.
— Estou satisfeita — ela comenta algum tempo depois. — Estou mais
cansada que com fome, não entendo já que a única coisa que faço é ficar
deitada.
— Seu corpo tem um limite, Sam, e ele ainda precisa se recuperar. —
Deposito o prato na bandeja, pego o guardanapo de linho, que desentoquei de
algum lugar no armário da cozinha, e levo aos seus lábios limpando
suavemente. Ela fica imóvel enquanto passo lentamente o tecido, seus lábios
se abrem um pouco e ela os lambe como se estivessem ressecados. O gesto
me mantém de olhos fixo em sua boca e, quando percebo, estou me
inclinando, como se um imã estivesse me puxando, para beijá-la.
Volto a sentar ereto e limpo minha garganta, terminando meu ato de
limpeza esmerado.
— Vou levar a bandeja na cozinha — digo ainda sentado ao lado dela.
— Obrigada, Carl — com a voz suavemente rouca agradece. — Você
não tinha que estar fazendo isso por mim.
— De nada. — Ela balança a cabeça aquiescendo. — Eu tinha que
fazer sim, afinal fui indiretamente culpado pelo acidente.
Levanto, pego a bandeja e vou para cozinha, não dando a chance de
ela responder a minha observação. Sento na mesa olhando o vazio e silêncio
da casa. Foi apenas um dia e já estou no meu limite.
Depois de limpar toda cozinha, volto para o quarto principal. Preciso
tomar um banho. O dia foi longo e ainda quero ligar para Roger, saber se ele
tinha descoberto algo das conversas com os pais e amigos de Samantha. E ele
também ficou de verificar o conteúdo dos e-mails.
Entro no quarto e Sam está deitada, seus olhos fechados. Caminho
direto para o banheiro.
24
Samantha
That I love you
I have loved you all along
And I miss you
Been far away for far too long
I keep dreaming you'll be with me
( Far Away - Nickelback )

Acordo sobressaltada quando algo pesado cai por cima do meu


estômago e algo duro me aperta ao lado do meu corpo, uma respiração bate
no meu rosto e ouço um ronronar satisfeito. Estou apenas alguns milésimos
de segundos de gritar a plenos pulmões por Carl quando lembro onde estou e
que esse me agarrando deve ser o próprio.
Meu Deus! Ele está todo enroscado em mim. A posição está
desconfortável, porém não ouso me mexer. Parece que minhas preces estão
sendo atendidas e ele está baixando a guarda comigo. Seu carinho, cuidando
de mim na hora que veio com meu jantar, foi tão tocante, pois ele não
precisava fazer nada disso. Minha perna lateja lembrando-me que não tomei
minha medicação antes de dormir, pois a viagem me esgotou. Aconchego-me
mais junto dele, volto a dormir, apesar da dor incômoda.
A próxima vez que acordo não sinto mais o calor ao meu lado, mas
escuto sua voz em algum lugar.
— Vejo que a bela adormecida acordou. — Escuto seus passos se
aproximando e em seguida o colchão afundar com seu peso. — Bom dia,
linda.
Humm?
— Bom dia — respondo um tanto constrangida. Ando ficando muito
assim quando estou perto dele, não sei se por não ter ideia de como me
pareço para ele ou se fico assim só pela sua presença marcante. — Esteve me
olhando dormir?
— Sim, eu não tinha ideia de que horas você acordaria, portanto
fiquei esperando — ele confirma meu temor. Deus, ele esteve me olhando
enquanto eu dormia?! Devo estar uma bagunça, desarrumada, e ele me
observando! — Você estava igual um anjo descabelado.
— Oh, Deus! — gemo e levanto freneticamente minha mão aos meus
cabelos.
— Brincadeira, Sam, você está linda. — Agora sei que ele está
mentindo. — Você é linda de qualquer jeito.
— Obrigada, acho.
Essas horas eram as que mais me constrangiam. Depender dele para
minhas necessidades básicas é horrível, no mínimo. Mas eu já fui íntima dele
uma vez, então, é um ponto positivo, não? Não, não é, droga.
— Dá para ver daqui a fumaça saindo de suas orelhas com seus
pensamentos fervendo, Sam — ele graceja, talvez esteja sendo um fofo para
me deixar a vontade. — Venha, vou levantar você. Trouxe sua cadeira para
ajudá-la a se locomover — diz. — Quanto tempo ficará com esse gesso?
—Humm, pelo que o médico falou, no mínimo, três meses — digo.
— Essa imobilização é incômoda.
— Imagino. E sua visão? Como se sente sobre isso? — ele pergunta e
ouço a hesitação. Eu não quero sua compaixão, mesmo que minha vinda aqui
tenha muito de sua compaixão por mim.
— Não sei, parece que tudo não passa de um sonho — murmuro. Sim,
eu vivo sem acreditar que perdi minha visão, ainda que os médicos não
achassem que eu fosse ficar cega para sempre. Eu não aceitei bem e essa
rejeição da realidade pode bater com força em mim. Espero poder pegar os
pedaços depois. — Eu não tive tempo de pensar seriamente sobre isso até
então.
— Entendo. Mas seja o que for que está impedindo sua visão de
voltar, tente colocar isto para fora — ele continua. — Mas agora vamos tentar
fazer a senhorita sair dessa cama! Quero levar você ao redor e conhecer todo
o lugar.
— Esqueceu dentro de dois segundos que não enxergo, Carl? —
aponto tristemente por cessar seu tom entusiasmado.
— Mas eu acredito, carinho, que você verá em breve. — Minha
garganta fica obstruída com sua fé em mim. — Vamos lá!
Carl empurra a cadeira para fora do quarto após eu tomar o banho
mais constrangedor da minha vida. Ficar nua na frente dele, Jesus! Além de
constrangedor, era excitante. Ele se manteve calado durante todo o processo.
Eu fico imaginando o que ele estava pensando. Queria ter a coragem de
perguntar. Mas, em todo momento, o senti tenso, suas mãos se mantiveram
imparciais, sem tocar em lugares inapropriados.
Nem eu nem ele tocamos no assunto dele ter dormido abraçado
comigo, isso parecia ser um segredo nosso. Talvez ele estivesse embaraçado
por esse deslize. Porque eu sei que foi um deslize de sua parte. Certamente
ele não faria algo assim conscientemente, mas eu adorei.
— Por que não me conta que lugar é esse? — peço quando ele me
leva para mesa e começa a servir meu café da manhã. Um rádio toca baixinho
em algum lugar da casa quebrando o silencio. — É seu, o lugar? Ou da sua
empresa de segurança?
— Como sabe da empresa de segurança? — Ele coloca um copo ou
caneca na minha mão com alguma coisa quente dentro. — Café como você
gosta, ou gostava — esclarece.
— Ainda bebo assim, preto com pouco açúcar — repondo e espero
sua resposta sobre a casa, que não vem. Então repondo a pergunta dele. —
Você mesmo falou, não?
— Devo ter falado — ele resmunga.
— Algo errado?
— Não. Aqui, abra a boca — ele cutuca meus lábios.
— O que é isso? — Ele empurra a colher na minha boca sem
cerimônia. Ainda bem que é mamão. Depois de engolir digo rindo. — Carl,
avise antes de enfiar a colher na minha garganta!
— Acho que não avisarei, já que isto fez você rir na primeira manhã
aqui. — Sua observação faz meu riso aumentar. Eu estou a menos de vinte e
quatro horas com ele e já sinto-me mais feliz do que estive em muito tempo.
— Me conte sobre essa casa! — peço ainda com meu sorriso feliz.
Mas o longo silêncio que se estende faz meu riso desaparecer.
Apenas a voz que vem do rádio é ouvido.
...Eu te amei o tempo todo
E eu sinto sua falta
Estive tão longe por muito tempo
Eu continuo sonhando que você estará comigo...

O silêncio se estende por tanto tempo que me mexo inquieta na


cadeira. Eu sentia a tensão se esvair de seu corpo em minha direção. O ar
parecia denso e pesado a cada segundo que passava e ele não dizia nada. A
música ainda toca ao fundo baixinho...
— Carl?
— Por que não termina seu café? — ele enfim diz. O tom totalmente
diferente de antes me faz estremecer. Nunca sei qual humor ele estará e,
como não tenho outra alternativa, faço o que ele diz. Pouco depois, termino
meu café da manhã com sua ajuda em total silêncio. Não ter noção do espaço
ao redor é agonizante. — Você está satisfeita?
— Obrigada, sim. — Estendo a mão com cuidado para o lugar onde
sei que ele está parado e encontro algo duro, retirando minha mão
rapidamente. — Desculpe.
— É apenas meu braço, Samantha. — Ele agarra minha mão na dele e
sinto a cadeira se movimentar. — Venha, vou te levar para tomar ar fresco.
— Obrigada.
— Você percebe que já disse isso uma dezena de vezes essa amanhã?
— diz com a voz cortante. Droga, o clima ameno tinha evaporado. E quando
ele para a cadeira de rodas em algum lugar que julgo ser fora da casa, sinto a
brisa fresca batendo em meu rosto.
— Esse lugar parece mágico, sinto isso — digo iniciando algum
diálogo.
— É especial para mim — a voz de Carl me abala por sair em um
misto de rancor e dor. — Construí isso aqui para ter um lugar onde descansar
longe da cidade grande. — Você fez tanto mistério que estava preocupada —
Ainda não entendo a tensão em torno disso.
— Quando eu tive a ideia de te trazer aqui, essa conversa não
aconteceria assim — ele começa em tom baixo e eu fico atenta a sua voz. Ele
assume um tom duro quando continua. — Queria você enxergando, queria
olhar em seus olhos, ver sua reação por saber que construí esse lugar
pensando unicamente em você!
— Por quê? O que tenho a ver com esse lugar, Carl? — Do que ele
está falando? Sua risada amarga me choca e a lembrança daquele dia que fui
vê-lo me abala. Ele tinha rido nesse mesmo tom cruel. — Não lembra, não é?
— Ouço seus passos se afastando. — Eu gastei meu tempo com essa droga de
casa inútil porque era seu sonho e você esqueceu? — ele berra furioso.
— Fale com mais clareza, não tenho uma bola de cristal, Carl. Não
posso adivinhar as coisas!
— Eu deveria ficar feliz por você ao menos lembrar meu nome? Não
lembra qual era seu sonho comigo, Samantha? Quando voltasse da sua
gloriosa estadia na Europa? Lembra o que me pediu? — ele solta uma
enxurrada de perguntas e o nó que estava se construindo na minha garganta,
está me sufocando!
— Não...
— Não o quê? Não lembra mais? Deixou o trouxa acreditar que
estava apaixonada da mesma forma que ele? — Ele perdeu o controle? —
Mentiras, isso aqui foi construído em cima de sentimentos falsos? De uma
menina que nada sabia sobre amor? Eu entreguei tudo para você, como um
garotinho carente enquanto você brincava!
— Carl, pare com isso, sabe que eu amei você. Não distorça o que
tínhamos! — Eu deixo o nó se desfazer em minha garganta e as lágrimas
descem. — Está me dizendo que essa é nossa casa? Que construiu isso aqui
para me fazer ver o quanto perdi por não fazer tudo do seu jeito?
— Do meu jeito? Eu passei seis meses procurando o lugar perfeito
para a garota que eu escolhi amar e quando eu o tinha você destruiu tudo com
aquela carta, não por telefone, ao menos, mas a porra de uma carta como na
idade média, para terminar tudo! — ele berra tão perto do meu rosto que
recuo assustada. — Meu jeito não era assim, pode acreditar.
— Por favor. — Eu choro porque não entendo o que ele está falando.
Eu escrevi uma carta, sim, pois eu não tive coragem de falar sobre a mudança
de planos de seis meses para um ano em um telefonema. Dizer sobre mais
seis meses longe, para que eu pudesse estudar mais, era doloroso, pois a
saudade dele já era tanta que seria duro ficar um ano, porém não terminei
tudo, nunca faria isso. — Por favor, eu...
Nem sei mais o que peço, tudo está confuso, mal esclarecido, meias
verdades, uma confusão tão grande que minha cabeça dói.
Sinto as mãos dele em mim e me encolho.
— Desculpe, não deveríamos ter essa conversa agora — ele diz. A
cadeira se movimenta e pelo que percebo estou entre os joelhos dele. — Eu
fico fora de mim quando começo a falar sobre isso. Vamos fazer o seguinte,
quando você ficar melhor terminamos essa conversa. Fico com a sensação de
que estou atacando você.
— Carl, eu não terminei com você — insisto ainda com lágrimas. Por
que nós mulheres sempre somos as que choram quando as emoções se tornam
demais dentro da gente? — Eu mandei uma carta, mas eu não terminei com
você — repito, quero que ele saiba disso.
Ele ri com incredulidade
— Não? Não era o que dizia, Sam. — Ele segura minhas mãos, elas
tremem e as dele também não parecem firmes. — Eu te trouxe aqui para que
ficasse melhor, nossa história pode esperar. Quem esperou dez anos, espera
algum tempo mais. — Amargura envolve sua voz. — Eu gostaria que as
coisas fossem diferentes, mas elas não são.
— Carl... — tento outra vez.
Ele ri porém o som sai forçado, estico minha mãos, tocando seu rosto.
Nós vivíamos nos extremos, da raiva a calma em minutos. — Eu ainda
mantenho aquela carta, sabia?
— Então me mostre — digo e percebo em que droga estamos. Eu não
posso ver. — Quer dizer, se eu voltar a enxergar quero ver.
— Que conveniente — ele resmunga irônico.
— Carl, você me odeia e ainda assim me trouxe aqui. Foi para me
humilhar, não é? — pergunto com o coração na boca. Se ele disser sim, eu sei
que irei desabar. Não aguento mais me sentir dessa forma.
— Não posso mentir para você — ele fala com calma, a raiva anterior
abrandada. — Inicialmente sim, eu queria jogar na sua cara essa casa, mas vi
que era apenas uma casa e que hoje você deve ter casas melhores que essa.
Por que se importaria com esta aqui? Passei dez anos vivendo no passado,
Samantha, é hora de mudar.
Eu estou chocada com sua revelação sobre esse lugar. O nosso lugar
especial. Quero gritar tão alto com as voltas que a vida dá. Por que nós não
pudemos ser felizes? Eu queria minha carreira mais que tudo, porém, não
tanto assim, teria lugar para ele na minha vida. No entanto, pelo que vejo,
tudo foi distorcido de alguma forma, mas eu irei descobrir tudo, só preciso
ficar boa logo. Se eu ficar.
— Vamos ficar aqui até se curar, Sam. Não temos que fazer uma
guerra de quem mentiu ou não. Vamos dar um tempo nisso, ok? Você não
precisa de mais estresse, precisa de recuperação — ele continua. Apesar de
querer continuar esclarecendo as coisas, eu acato sua decisão. Precisamos
esfriar a cabeça e descobrir o que houve com nossa comunicação dez anos
atrás. Havia tantas coisas para serem esclarecidas.
— Tudo bem — digo. — Mas teremos de conversar um dia. Eu ainda
quero saber dessa carta.
— Venha, quero levar você no fim do deque, tem um lago como
queria — ele fala já empurrando a cadeira, fazendo barulho no chão, que
parece duro debaixo das rodas. — Depois iremos ao jardim, tem suas flores
favoritas plantadas lá, apenas chegou na época que não há flores.
Ele continua falando e falando, e minhas lágrimas bobas continuam
caindo, agora de pesar e uma saudade dentro de mim tão grande que dói
terrivelmente. Saudade de algo que era para ser e nunca foi. Acho que no fim
do dia estarei desidratada completamente.
— Aqui? Sente a brisa? — ele diz quando paramos. Sim. Eu sinto
batendo em meus cabelos e respiro fundo, levando ar fresco ao meus
pulmões. Eu daria qualquer coisa para enxergar o que ele falava. O deque no
lago como sonhávamos nas tarde que passávamos em seu apartamento. — Eu
quero pedir desculpas por ter gritado com você.
Ele fala depois de um tempo que estamos ali parados.
— Tudo bem.
— Vamos tentar aproveitar e esquecer nossa história por uns dias —
ele sugere.
— Será difícil, mas tentarei — digo sincera. Não posso deixar as
coisas ficarem assim mal resolvidas.
— Eu sei. Mas iremos com calma, Samantha. Afinal, trazê-la aqui
nunca foi uma reconciliação, é para sua segurança. — Fecho meus olhos com
força. Ele acabou de enfiar a faca no meu coração.
— É tarde demais para nós, então vamos focar na sua melhora —
continua.
— Pode me levar ao jardim? — peço, porque quero que ele pare de
me ferir. — Não quero falar mais disso. Me conte sobre a casa. Como ela se
parece.
As coisas melhoraram durante o dia e não tocamos mais no passado.
E minha estadia na casa de Carl acaba sendo o que eu precisava.
Ele pode ter razão, calma e tranquilidade deve ser o que preciso para
me recuperar com mais rapidez. Os dias seguintes só provam isso, apesar das
dificuldades de minha condição eu sinto-me mais forte a cada dia.
25
Carl
A mágoa e raiva ainda existem e corroem tudo.
Se alguém me perguntar porque passei dez anos da minha vida
remoendo minha história mal fadada de amor e não segui em frente, eu
poderia responder sem pensar: eu não queria seguir em frente. Primeiro
porque eu alimentava uma raiva por Sam que era maior que eu. Segundo, eu
não queria seguir em frente, eu não queria sentir tudo aquilo por uma pessoa
novamente. Queria viver o passado, ou melhor, o futuro que planejamos. Eu
até posso pensar que eu queria o que não poderia ter, a velha história de
querer o impossível o que não se pode possuir.
Estou levando a sério demais essa história de cuidar de Samantha.
Dormir na mesma cama? Nunca ouvi uma história dessas...segurança dormir
na mesma casa que suas clientes. A única desculpa é que não somos meros
cliente e segurança. Afinal ela não me paga nada por isso.
Olho para ela dormindo serenamente ao meu lado. Faz duas semanas
que estamos aqui e ela melhora a olhos vistos. Tem sido bom para nós dois.
Estou menos amargo, mas essa coisa está lá no fundo e sei que pode explodir
a qualquer momento. Mantive-me alimentando isso por muito tempo para
mudar assim dentro de poucos dias e perdoar.
Viro meu corpo de frente para Sam e sem que me dê conta meu dedo
desliza ao longo do braço delicado dela, um toque leve com a ponta do dedo
indicador. Vejo quando os pelinhos se erguem em um arrepio, percebendo
que ela não está dormindo como achei que estava, ela gosta do meu toque. E
com esse pensamento faço um movimento que não deveria, mas a vontade é
tão grande que me domina por completo. Ergo-me apoiando minha cabeça na
palma da mão e continuo meu caminho até a mão que repousa por cima do
lençol e refaço o caminho de volta até o ombro. Inclino e beijo ali
delicadamente. Escuto um suspiro e volto meus olhos para seu rosto. Ela está
com os olhos fechados, porém seus lábios estão úmidos e entreabertos, está
lindamente ofegante. Puxo o lençol descobrindo seu corpo que agora não
mostra nenhum hematoma e se não fosse pela perna engessada, ninguém diria
que esteve em um acidente. Olho seu corpo e minha atenção se prende nos
dois montículos que me chamam para provar os mamilos eriçados e rijos por
baixo da regata branca que ela vestiu ontem à noite antes de irmos dormir.
Corro meus olhos até a calcinha também branca e engulo seco. Deus, ela era
perfeita. Passar duas semanas desejando, tocando e sem poder dar vazão a
isso era a pior tortura que um homem poderia ter. E eu acabo de perder o
restinho de controle que me resta. Umedecendo meus lábios me curvo e
chupo em minha boca um mamilo e o suspiro trêmulo de Sam me encoraja.
Solto-o segundos depois deixando a marca da minha boca. Corro a língua por
seu colo até o outro seio e faço o mesmo, chupo com força e agora o gemido
que ouço sai de minha própria garganta. Senti-la outra vez é como
experimentar algo proibido, mas não tenho capacidade de parar agora.
Levanto e puxo sua regata para cima desnudando o abdome delgado.
Seus seios firmes surgem gloriosos para minha apreciação e não resisto,
seguro um em umas das mãos e esfrego meu polegar sobre o bico duro, seu
peito sobe e desce frenético agora e, sem dizer nada, termino de retirar a
roupa fora tendo uma visão da mulher linda que ela se tornou. Sem me conter
mais e querendo vê-la toda, retiro sua calcinha deixando-a completamente
nua diante de mim. Desejo-a tão ferozmente, estou a ponto de gozar como um
adolescente em sua primeira vez, fecho os olhos, mas se torna pior. Tudo o
que eu posso ver, sentir, é ela contra mim. Tudo o que eu posso imaginar
agora é em fazer amor com ela na minha cama, na qual devia ser nossa cama.
Ela foi a minha primeira namorada, minha última... minha única mulher de
verdade...
— Carl ... — vem o primeiro sussurro dela desejoso, ofegante. Está
temerosa e quero tirar o temor de sua voz e colocar um som prazeroso no
lugar.
Sem responder, pois as emoções misturadas com o tesão que ela me
desperta queimam na alma, começo um caminho de beijos suaves por sua
perna sã até a junção de suas coxas. Não paro e sigo subindo, beijando seu
osso do quadril e ela responde levantando os quadris de encontro à minha
boca, deslizo a língua no umbigo, em sua barriga plana e alcanço seus seios
novamente onde arrasto minha língua devagar, mas sigo, pois tenho um alvo
na mente: beijá-la.
Sam tem o rosto vermelho e solta sons de excitação que me
incentivam a tocar, explorar e provar mais dela. Contorno o lábio inferior
com a ponta da língua e ela suspira entreabrindo os lábios para mim. Seu
gosto me faz viajar ao passado. Ela me intoxica com tão pouco...
— Quero tanto beijar você. Cada segundo, minuto... — sussurro
contra sua boca, e a resposta dela é levantar seu quadril de encontro ao meu
pau duro confinado na minha boxer. Ela se esfrega em mim, como se a
necessidade de nosso toque fosse algo elementar. — Eu desejo tanto estar
dentro de você outra vez, me perder em você, que dói.
A mão dela agarra meu pescoço fazendo nossas bocas colidirem e
estamos nos beijando. Nossas línguas dançam frenéticas, fazendo amor com
pura luxúria, devoro sua boca com a minha como tenho sonhado em fazer
desde que ela voltou para minha vida. Não há doçura quando consumimos
mais um do outro. Tudo é sôfrego e cheio de ânsia. Meu corpo agora esmaga
o dela no colchão. Esquecemos que ela não está cem por cento ainda de suas
feridas. Nem eu nem Sam estamos preocupados com nada, a não ser a
vontade louca de ter mais um do outro com tanta intensidade que arquejamos
como se estivéssemos com dor. Enfio minha língua com habilidade em sua
boca, explorando, sugando. Os bicos rígidos dos seus seios esfregam em meu
peito causando estrago na minha mente.
— Samantha. — Afasto minha boca da dela e desço beijando e
mordiscando sua pele até abocanhar um mamilo outra vez. Estou a ponto de
explodir. Mordo seu mamilo com mais força do que pretendia e isso causa
um pequeno grito arquejante de Sam. Lembro que ela sempre gostou do sexo
mais rude. Isso me excita mais, alivio a mordida com a língua. Ela geme
desesperada se contorcendo debaixo de mim. Eu preciso prová-la, sentir sua
essência outra vez. Ter tudo dela... Como desejo arrancar cada gota de prazer,
fazê-la gritar.
O Som de um celular vibrando na mesa de cabeceira paralisa-me no
lugar. Mas que inferno! Quem seria uma hora dessas? Saindo de cima de
Sam, estico meu braço e pego o telefone. O número de Alexander pisca na
tela. Praguejo rudemente. — Alex? — digo quando atendo nada
gentil.
— O'Neal! O que diabos você fez? — ele praticamente está berrando
do outro lado. Esse cara tinha bola de cristal além de ser um empata foda? —
A empresa está sendo processada!
— O quê? Por quê? — Droga! A coisa é mais complicada que saber
que estou sendo um fraco e fazendo sexo matinal com Sam.
— Os pais de Samantha Stollen estão processando a empresa. — Ele
está muito emputecido. Nunca ouvi ele desse jeito. Bem, vi quando Lana foi
sequestrada, ele quase pirou, mas agora...— Estão alegando que você levou a
filha deles doente e incapacitada sem autorização, sabe Deus para onde, à
força da casa deles. Você disse que tinha tudo sobre controle, Carl. Puta que
pariu, homem! Não devia agir como a porra de um colegial cheio de
hormônio.
Pulo da cama e saio do quarto, sinto a raiva começar a crescer em
ondas através do meu sangue!
— Informe para eles que meu caso com Samantha nada tem a ver com
a Marshall — digo baixo, porque estou muito irado para gritar. — E mande
esses filhos das putas todos ME processarem.
— Precisa voltar, Carl! Não vou ser responsável por suas merdas! —
ele esbraveja.
— Eu a tirei de lá porque ela poderia acabar mais machucada do que
já estava — digo fervendo. — Aqueles sanguessugas do caralho não fizeram
nada para protegê-la, nem um merda de um segurança tiveram a decência de
contratar!
— Mas não cabia a você tirar a moça de lá assim, O'Neal. Sei que ela
é importante para você, mas ela...
— Ela não é uma criança, sabe o quer e decidiu vir comigo — corto.
— Não sequestrei ninguém, Alex! Diga aos seus pais que a filha deles está
melhor do que estava há duas semanas atrás.
— Cristo! Carl. Homem, você é o cara mais centrado que conheço.
Que merda anda bebendo? Quero que a leve para casa!
— Marshall? Desde quando manda em mim? Até onde eu sei não,
amigo.
— Carl, não vamos por esse caminho — ele começa, porém corto-o
outra vez.
— Não vá você! Eu não vou voltar agora! Sam precisa de um lugar
para se recuperar totalmente! E tem mais, esse é um trabalho pessoal, nada
tem a ver com a nossa empresa.
— Então venha resolver seus problemas, estou fora! — ele diz mais
calmo. — Nosso advogado vai falar com eles, ligue para Nathan e resolva
com ele.
Ele desliga e fico escorado na parede do corredor. Deus! Por que as
coisas tinham que ficar piores do elas já estão?
Volto para o quarto e Sam está sentada na cama enrolada no lençol,
ela está vermelha e os cabelos um pouco eriçados. Seu cenho está franzido e
seus dedos estão apertados fortemente no lençol. Ela está tão linda! Por um
momento esqueço nossos problemas e fico embevecido com sua beleza
delicada que me chama como o canto de uma sereia, minha sereia.
— Está me olhando? — ela pergunta, fazendo-me sair do transe
hipnótico. Sorrio.
— Claro que sim, você é boa de olhar, carinho — repondo e caminho
para perto.
— O que está acontecendo? Você estava gritando. Fico nervosa com
seus gritos — ela diz.
— Desculpe.
— Escutei meu nome, o que tenho a ver com tudo isso? — ela solta o
lençol e agarra meu braço. — Fala, Carl.
— Seus pais estão criando problemas — digo, não adianta esconder
nada mesmo. — Estão processando a Marshall por que eu tirei você da casa.
— O quê?! Não acredito que sejam eles, pode ser Zara — ela diz e
tem razão, aquela mulher tinha modos horríveis.
— Tenho que dar uns telefonemas. Estamos há quinze dias aqui e eu
não me comuniquei com ninguém, nem com Roger.
— Quem é Roger?
— O detetive que está investigando seu perseguidor — esclareço.
— Acredita que há um perseguidor? — Ela ainda duvida?
— Claro que sim. Ninguém se daria ao trabalho de me ameaçar
também se não fosse verdade e só quisesse fazer uma brincadeira de mau
gosto com você, seja lá quem for — digo, mas preciso me focar, pois o lençol
caiu e os seios dela me atiçam. Eu ainda estou duro da nossa interação de
mais cedo. Será que ela não percebeu que está meio nua na minha frente? Ou
percebeu?
— Ameaça a você? Não me contou isso, Carl!
— Não? — estou distraído, caramba. — Você está fazendo isso de
propósito?
— O quê?
— Me mostrar seus peitos depois de nossa aventurinha de mais cedo?
Quer continuar? Porque estou ainda cheio de tesão...
— Oh, meu Deus! — ela cobre os seios novamente e um tom rosado
cobre todo seu rosto e colo.
Não resisto e seguro seu rosto entre as duas mãos e beijo-a.
Que se dane nossos problemas. Tudo pode esperar, menos isso.
26
Samantha
Carl me beija lento e longamente. Ainda sensível de nossa interação
de antes, gemo contra sua boca ansiosamente. Tudo fica intenso e nós
estamos nos devorando como se esse fosse nosso primeiro beijo.
— Vou machucar você — ele diz contra minha boca tão perto que
respiramos o mesmo ar. Eu sei que não é o momento de nós complicarmos
mais nossas vidas adicionando sexo a essa confusão, mas eu não me permiti
tantas coisas nesses últimos anos, deixei tudo de lado pela minha música e
nada foi tão importante que me fizesse pensar que estive hibernando dentro
de mim mesma. Deixei que Zara tomasse conta de tudo para mim e nunca
questionei porque não me importava. Se eu tivesse meu piano já era
suficiente, porém agora, aqui, junto com o homem que amei desde jovem, eu
quero me permitir fazer loucuras com ele, mesmo que amanhã nós não
estaremos mais juntos. Nossa história talvez não seja para sempre, mas posso
senti-lo agora tão perto e tão meu.
Essas duas semanas aqui têm sido maravilhosas, ao menos para mim.
A sensação de liberdade mesmo com minhas limitações tem sido incrível.
Apesar de certos momentos de hesitação comigo, de ser comedido, ele cuidou
de mim tão amorosamente que se eu não conhecesse seus sentimentos,
pensaria que ele era aquele Carl do passado; apaixonado e dedicado. Mas sei
que ele está apenas se sentindo culpado pelo meu acidente, não sou boba nem
tão ingênua para acreditar em milagre de um dia para outro. Temos um longo
caminho pela frente e talvez no fim cada um siga seu caminho. Por isso quero
tanto estar com ele agora. Permito-me esse momento fugaz com meu
segurança. Meu primeiro amor...
— Não me machucará, querido. Faça amor comigo — peço ofegante.
E mesmo que isso possa me machucar eu continuo. — Me dê um pouco do
seu amor, Carl. Eu preciso tanto de você.
— Carinho... — a resposta carinhosa me faz derreter contra ele. Perco
o resto de juízo quando sinto Carl me empurrando lentamente para trás e me
deita sobre o colchão. Estou nervosa, tremendo, mas ainda assim muito
excitada para parar isso tudo.
O toque de seus dedos em minha pele, tocando meus seios sensíveis,
deixam-me quente, luxuriosa e sedenta demais. Sua língua desliza pelos meus
lábios, lambendo, sugando, mordiscando e tudo parece sair da realidade e
amplifica os meus outros sentidos. Sinto Carl em cada parte minha. Ele me
prende com força na cama. Com minha mão livre deslizo por sua pele, queria
poder tocá-lo dos pés à cabeça como antigamente. Levanto meus quadris de
encontro ao dele, me esfregando eroticamente no cume duro de sua ereção
espessa, quente. Era uma promessa dura e rígida de satisfação e eu quero
mais e mais dele.
— Quero sentir você dentro de mim outra vez, Carl — sussurro
sôfrega. — Não seja gentil, preciso de você completo, me dando tudo de
você.
— Não seja gananciosa, carinho — fala contra meu pescoço, a língua
serpenteando meu pulso sensível. Gemo quando inclino para que ele tenha
mais acesso a essa parte erógena. — Não tem ideia do tamanho da minha
fome.
Desço minha mão por seu corpo e agarro seu pau com força suficiente
para causar um gemido rouco dele — Talvez tenha sim.
— Quieta — ele é autoritário agora. Seu peso some de cima de mim e
não entendo. Ele vai parar?
— Não pare agora.
— Claro que não, não seja ansiosa, Samantha. Sei que quer meu pau
todo para você, mas ainda está machucada — ele está dizendo e sua voz soa
mais distante. Escuto algo rasgando e imagino que seja um pacote de
preservativo. Ah, sim!
Sinto que ele volta quando a mão dele percorre minha barriga,
subindo pela lateral até acariciar um dos meus seios sensualmente. Gemo
excitada, ele aperta meus mamilos simultaneamente, fazendo-me empinar
para frente querendo mais, mordo meus lábios com força na tentativa de
controlar meus gemidos, porém são em vão. Perco a noção das coisas, estou
perto de gozar apenas com ele explorando meus mamilos? Ah sim, faz tempo
que quero esse homem me fodendo de todas as maneiras, movo meus quadris
automaticamente de encontro a ele, necessitando dele dentro de mim,
precisava desesperadamente.
— Carl. — Estou tão perto de explodir, mas ele tem outras ideias e
me frustra quando desce as mãos para baixo. Ele passa o dedo na abertura da
minha boceta e gemo descontroladamente. Ele não é tão delicado como disse
que eu precisava. Ele empurra, enterrando fundo dois dedos dentro de mim
com força sem nenhum aviso. O polegar no meu clitóris duro me leva fora da
minha mente e explodo em seus dedos. Presa na luxúria avassaladora que ele
desperta em mim, meu corpo dominado com desejo puro, gemo seu nome
sem parar, empinando-me mais. Agarro seus cabelos curtos e me entrego
totalmente engolfada por um tesão incontrolável, tudo estala dentro de mim
em sintonia com seus dedos. A boca dele cai na minha engolindo meus
gritinhos de puro prazer carnal. Pulsando ao redor dos seus dedos
pecaminosos, choramingo. Isso é tão deliciosamente bom. Seu corpo
musculoso sobre o meu, seu gosto na minha língua, transcendem todo meu
raciocínio...
— Você está tão sensível e ainda não fiz nada com você, amor — ele
está dizendo quando volto a mim. Estou pulsante, cheia de energia, quero
mais. — Quero comer cada pedacinho seu. — Oh! Quero dizer que é ele que
me deixa assim, mas Carl já está me levando em uma nova viagem de prazer.
Ele suspende minha perna sem gesso, colocando em seu ombro e sem
preâmbulos bate seu pau com tudo, fazendo-me gritar. Oh Deus, eu tinha
pedido por isso, gentileza estava fora dessa cama hoje. Minha perna
engessada não parece empecilho para ele bater com força dentro de mim.
Derreto-me enfraquecida, minha respiração fica difícil quando tento
acompanhar seu ritmo, empurro de encontro a ele e encontramos a sincronia
perfeita, os sons do quarto me deixam ainda mais excitada. Nós dois juntos
outra vez é quase surreal. Sentir Carl outra vez dentro de mim é tão... tão...
— Sente isso, carinho — a voz rouca me chama e ele se inclina para
frente fazendo com que vá ainda mais fundo nessa posição que estamos. Ele
me toma com força. — Sente que vai explodir? Sente que sempre foi minha,
que pertence só a mim?
Não respondo porque estou arquejando com sua posse. Ele levou a
sério o "não seja gentil" e eu amo isso nele.
Calor vem em rajadas pelo corpo todo, me fazendo arder, reagindo a
sua voz rouca, dura, pois ele parece com raiva agora enquanto profere as
palavras. Está com raiva por ceder ao desejo por mim, é isso? Estou tão
molhada que seu pau não tem dificuldade de ir e vir dentro de mim.
Ele não fala mais, porém sinto que ele me fode com desespero, como
se quisesse me marcar com seu toque duro, áspero. Eu me perco nele,
aproveitando tudo que posso ter dele, agora. Mais tarde? Não sei se poderei
sequer tocá-lo. Quando a luxúria lambe nossas peles suadas nos levando ao
êxtase nada parece errado, tudo está encaixado em seu devido lugar.
27
Carl
Encosto minha cabeça na porta da geladeira na cozinha e sorrio para
mim mesmo. Sabia que isso ia acontecer cedo ou tarde. Essa minha ideia
brilhante de trazê-la aqui tinha seus furos. Inconscientemente posso ter
planejado isso. Trazer Samantha para terminar na cama com ela, depois de ter
jogado em sua cara tudo que ela deixou para trás. Bem, mas esse misto de
amor e ódio ainda me corrói, sinto-me um pouco incomodado por
inicialmente ser meu plano, mas as coisas nunca saem como queremos
quando o assunto são os sentimentos envolvidos em histórias mal revolvidas.
Saindo do estado letárgico pós foda começo a preparar nosso café da manhã
tardio.
Três dias se passam e nos aproximamos cada vez mais, Sam está mais
sorridente, mais leve e isso me contagia também. Mas apesar disso se
mantém longe das músicas clássicas que tanto ama. Chopin e companhia
nunca foram tão desprezados. Ela pediu que não colocasse esse tipo de
música enquanto estivesse aqui. Eu tinha comprado uma seleção de músicas
quando comprei seu piano e coloquei na casa. Pensando nisso agora, pareço
um louco perseguidor. Porém tudo isso me preocupa, essa negação dela com
sua visão é preocupante. Tenho receio que essa atitude não está fazendo bem
para sua recuperação.
Ela está tão diferente. Era como fazer amor com outra mulher
diferente daquela que conheci um dia. Ouço uma batida na porta de trás e
pouco depois Pedro aparece carregando sacolas com mantimentos.
— Bom dia, seu Carl. Desculpe ir entrando assim — ele diz meio
constrangido. — Bom dia, Pedro. Sem problemas. — Aceno e aponto para as
sacolas de compras.
— Obrigado por isso.
— Sei que não pode deixar a moça só — ele diz. Ele conheceu
Samantha formalmente nas vindas dele aqui. — É meu trabalho.
Ele coloca as sacolas na mesa e para ao lado tirando seu boné, como
de hábito, uma ruga se forma em sua testa, seus olhos escuros preocupados.
— Está fazendo alguma manutenção na câmera de entrada da
propriedade? — pergunta e travo no lugar e a ruga agora está em minha
própria testa.
— Não, por quê?
— Quando passei notei que umas das câmeras sumiu. — Ele coça a
cabeça. — Ou posso ter me enganado.
— Certeza? Levantei e não verifiquei as câmeras ainda, erro meu. —
Jesus! Estou relaxado demais aqui. Eu não tenho feito meu trabalho direito
com relação a segurança de Sam, talvez esteja achando que nada irá
acontecer, estivemos em uma bolha nesses dias longe de tudo. Roger não
conseguiu descobrir de onde veio o e-mail de ameaça, certamente feito para
não ser identificado, mas ele ainda não tinha desistido de achar a origem, mas
tudo no Brasil leva tempo e não estava com muita fé que ele iria conseguir.
Eu sugeri que um bom hacker teria isso há dias, já que Souza, nosso homem
da empresa, não estava mais trabalhando nisso, mas Roger é daqueles bons
policiais que fazem tudo do seu jeito. Mesmo que seja mais demorado. —
Vou verificar isso agora — digo para Pedro.
Ele me segue para a sala de monitoramento que montei quando
construí esta casa, na verdade fiz por força do hábito e, claro, testando algum
equipamento da empresa. Cinco minutos depois, vejo que Pedro tem razão. A
câmera da entrada da propriedade está desligada. Melhor, o dispositivo diz
que está desconectada. Pode ter sido derrubada? Tenho de verificar isso.
Levanto pronto para sair com Pedro para averiguar onde foi parar a
bendita câmera quando ouço a voz de Sam me chamando:
— Carl?! Está ai? — Sua voz está abafada e viro-me para Pedro:
— Volte lá e veja se acha a câmera no chão, depois venha me relatar
o que houve — digo já encaminhando para o quarto e ele sai sem questionar.
Sam já consegue fazer algumas coisas sozinha, mas ainda precisa de
mim para quase tudo, se ela não estivesse com a perna engessada seria muito
mais fácil para ela lidar com a cegueira sozinha. Encontro ela de cara
amarrada na cama.
— O que houve?
— Precisando de uma mãozinha — ela pede constrangida. Eu rio, ela
ainda tem horror de precisar de mim para suas necessidades básicas. Sei que
deveria levá-la para uma casa adaptada para ela, mas estou sendo egoísta
mantendo-a aqui. Sei que isso explodirá em breve na minha cara, pois os pais
dela estão infernizando a vida de Alexander na empresa.
Depois de ajudar Sam, levo-a na cadeira para fora do quarto e noto
que Pedro não voltou.
— Carl, preciso do meu celular — Sam diz. — Não posso passar mais
tempo protelando ligar para mamãe. Já se passaram quase três semanas sem
nenhuma notícia minha. Isso não é legal da minha parte.
— Não deve se preocupar com eles, são todos crescidos — argumento
chateado. Ela queria falar com o cantorzinho? Ela nunca me explicou o
motivo do imbecil dizer para quem quer ouvir que ele é namorado dela.
— São meus pais, Carl.
— Tem certeza que é só com seus pais que está preocupada? —
pergunto mal-humorado.
— E porque não seria? Você não me disse mais nada sobre o processo
que abriram contra sua empresa.
— Nosso advogado está lidando com isso. — Levo-a para sala e
ajudo-a a se sentar no sofá. — Vou buscar seu café da manhã.
— Carl?
— Sim.
— Algo está chateando você? Está com a voz estranha. — Ela estica
seu braço e agarra minha mão, puxando-me para perto.
Sento ao seu lado no sofá e beijo a palma de sua mão enquanto seguro
sua nuca.
— Nada demais, apenas uma câmera que sumiu e percebi que ando
muito relaxado com a segurança da casa — esclareço.
— Não se preocupe tanto. — Ela ri — Eu fico lisonjeada que sou uma
distração para você, grande bicho papão — diz zombeteira.
— Não devia brincar com isso — recrimino duro, mas quebro todo
trabalho de parecer mau quando esmago seus lábios com os meus. O gosto de
seus lábios me faz devorar sua boca, o beijo é lento, profundo e suave.
Bebemos um do outro, nossas línguas torcendo lentas e facilmente juntas. Era
por isso que estava distraído, tentação demais, seu sabor delicioso vai direto
para meu pau que reage duro. Daria para quebrar nozes de tão duro que estou.
Porra, ela é tão gostosa que quero empurrá-la nesse sofá e comê-la
inteira...Minha mão desliza por entre suas pernas em direção ao ápice de suas
coxas onde sei que ela está molhada e pronta...
— Desculpem–me — vem uma voz constrangida de algum lugar e eu
pulo em pé. Que merda, estou precisando voltar à realidade. Como diabos
não vi Pedro entrar? Acho que Alexander tem razão. Preciso levar Sam de
volta para que outro segurança fique na casa dela. Eu estou arruinado com
sua boca pecadora, tentadora e suculenta, que me faz um tonto.
Falando em boca, ontem à noite foi...
— Seu Carl? — Pedro está esperando em pé ainda ao lado da porta e
eu aceno para ele me seguir.
— Só um minuto, Samantha — digo quando saio com Pedro em meus
calcanhares.
— Onde estava a câmera? — pergunto, pois ele a tem nas mãos.
— Estava a poucos metros do poste onde estava antes, mas acho que
não vai gostar muito de saber como ela está. — Ele me entrega e vejo que foi
propositalmente derrubada, estava quebrada como se alguém tivesse
esmagado com um pedaço de madeira ou coisa do tipo.
O telefone da casa começa a tocar e é interrompido antes de eu
atender, penso que a pessoa desistiu quando ouço a voz de Sam vindo da sala.
— Alô? Quer falar com quem? — sua voz fica estridente e eu corro
para lá a tempo de vê-la jogar o aparelho longe. Eu não havia deixado ela ter
acesso ainda ao telefone e agora ela tinha conseguido atender, já que estava
perto do aparelho e ele não costumava tocar na casa. Ela parece em choque.
Quem diabos era ao telefone?
28
Samantha
Quando o telefone tocou ao meu lado, minha única reação foi
estender o braço, pegar o aparelho e atender.
O silêncio do outro lado parece gritar, então, digo receosa: — Alô?
Quer falar com quem?
— Encontrei você, vagabunda — a voz estranha distorcida diz,
fazendo-me jogar o aparelho distante em um ato reflexivo de pavor.
— Samantha?! — Sinto Carl ao meu lado, seus braços ao meu redor,
mas minha mente está correndo a toda velocidade. — Quem era no telefone?
— N-não sei...
— O que a pessoa disse? — sua voz sai dura e tremo de encontro ao
seu peito.
— Disse que tinha me encontrado. — Deixo de fora o vagabunda,
isso era horrível de ouvir de um desconhecido. Ouço Carl praguejando e me
agarro mais a ele. Tinha se tornado um hábito nos últimos dias, isto porque
sinto-me protegida quando Carl está por perto. Por mais estranho que posso
parecer, eu confio nele para me manter segura.
— Tudo bem, carinho. Estou aqui. — Ele beija o alto da minha
cabeça e eu, aos poucos, paro de tremer. — Você reconheceu a voz? — Carl
indaga depois de um tempo me segurando.
— Não. — Parecia uma gravação, mas a respiração do outro lado era
muito real. Eu, até então, por mais que Carl e aquele policial de outro dia
tenham tentado me fazer acreditar em um perseguidor ou algo como isso, não
tinha levado tão a sério. Havia uma possibilidade de ser alguma brincadeira,
mas com isso? Acho que está ficando sério. Pergunto-me, por que agora?
— Tudo bem, foi só um susto — Carl murmura no meu cabelo. —
Vou ter de te deixar por um instante e fazer uma vistoria da área, pode ser
que esse imbecil esteja por perto. Deixarei Pedro aqui com você. Não tem
nada que temer, Sam.
Não! Quero gritar, mas apenas digo sem muito entusiasmo:
— Tudo bem. — A ideia dele sair lá fora tendo algum louco à espreita
faz meu coração quase parar de angustia. Mesmo assim confio em sua
capacidade de se manter a salvo.
Beijando minha testa ele se afasta, falando com Pedro. Ouço suas
vozes indistintas quando eles se afastam. Nervosismo revira meu estômago e
agradeço por não ter tomado meu café da manhã ou ele estaria no chão agora.
Sinto minhas mãos trêmulas e as aperto juntas.
Fico perdida nos pensamentos e uma onda vem como miríade de
conflitos, começando se infiltrar nessa nevoa densa de tensão que esse
telefonema desencadeou. Começo a ponderar alguns hiatos dessa relação com
Carl. Do rumo que isso vem tomando.
Fecho meus olhos apertados e os abro novamente como se com isso
eu fosse enxergar outra vez. Percebo que faço muito isso. Encolho-me no
sofá e minha mente voa pegando cada momento perdido de nós dois aqui
nessas semanas. Estamos camuflando nossos sentimentos, não me permiti
ainda analisar como me sinto aqui com ele, pois sinto felicidade e agonia ao
mesmo tempo, porque pode ser nossa última chance de estarmos perto um do
outro. A dor e raiva sempre vêm fortes demais quando me permito pensar
como agora, então eu as calo no fundo do meu coração.
Tenho raiva do pensamento de como me odiei achando que eu
estraguei tudo quando mandei aquela carta, mas, diante do pouco que sei
agora, eu não tenho mais certeza de nada. Quem tinha nos afastado? Porque
tenho absoluta certeza que algo aconteceu com minha carta, e eu posso
pensar apenas em algum par de pessoas que poderiam ter acesso a essa carta.
Porém tudo tem de vir à tona. Contudo não deixo de constatar algumas
perguntas conflitantes:
Se ele me culpa por abandonar tudo isso, tenho de mostrar que nem
tudo é preto e branco, há mais cinza em nossa história do que Carl possa
imaginar. Aperto meus olhos de novo irritada agora, meu nervosismo de
antes dando lugar a pura raiva de não poder enxergar e tentar mostrar para ele
que não sou tão má assim. Será que é errado uma mulher querer ter sucesso,
ser independente? Por que tem de ser o homem sempre a ditar o
relacionamento? Será que fui tão cruel porque escolhi uma carreira? Se fosse
o contrário, ele ficaria feliz se eu fosse tão taxativa como ele está sendo sem
nem querer me ouvir? E eu não pedi uma vida, apenas mais alguns meses.
Será que era muito? Quando tínhamos uma vida inteira?
Eu o amo, mas essas dúvidas estão aqui me corroendo. Será que ser
jovem e se deixar levar por todas as dúvidas e emoções pertinentes a minha
idade, na época, virou um crime tão hediondo? Quem nunca foi jovem e
errou por não saber lidar com as decisões mais acertadas? E nem foi como ele
imaginava; que eu o abandonei. Quando penso se tivesse sido ele no meu
lugar, escolhendo uma carreira, iria existir todo esse drama? Ou será que por
mulher tenho de ser recata e dona de casa?
Ele parece diferente nessas semanas. O carinho com que tem me
cuidado sobrepõe qualquer mágoa que ele possa ter, mas quem me garante
que isso é verdadeiro? Ele me confunde. Pois fala do seu ódio por mim e ao
mesmo tempo age como se me amasse. Seu toque é tão amável, tratando-me
como um bebê e como não sou nada boba, claro, aproveito.
Agora o riso que sai dos meus lábios é de carinho e ternura. Ele tem
sido o meu Carl.
Quente e frio definem nosso caso. Ah, mas tem sido mais quente que
frio, posso garantir. Eu sei que ter adicionado sexo na mistura louca dos
nossos sentimentos pode não ter sido a coisa mais certa a fazer, porém
quando queremos tanto algo que dói, ter controle sobre essas coisas do
coração é difícil. E eu quero Carl tão forte que chega a doer.
Ah, Deus, antes que essa história termine vou pirar, pois são tão
dúbios nossos sentimentos. Temos um longo caminho pela frente e temo não
termos tanto tempo para resolver nossa história.
— A senhorita quer alguma coisa? — a voz masculina me faz pular
de susto.
Quentura sobe por meu pescoço e rosto quando percebo que estive
fora de órbita e que Pedro tinha voltado para sala.
Limpando minha garganta, para disfarçar meu constrangimento, digo:
— Estou bem. — Meus pensamentos vão para onde Carl está agora.
Ele estava arriscando a vida por mim?
— E Carl? — pergunto quando o silêncio se estende.
— Ele está bem, senhorita — ele garante.
Eu preciso falar com meus pais sobre essa história de que Carl me
sequestrou. Eu tinha passado esses dias perguntando a ele sobre isso, claro,
ele não me deixava continuar, sempre me calando com seus beijos, mas está
na hora de pegar minha vida pelas rédeas novamente.
— Pedro você pode fazer uma ligação para mim?
— Claro, senhorita — diz sem preâmbulo e dito o número de mamãe
para ele rapidamente.
Ela seria a primeira a me responder porque diabos está acusando Carl
de sequestro quando ela sabe bem que vim porque eu quis. Eu não entendo a
fixação de todos comigo. Eu já fiz tanto por eles.
— Aqui, senhorita — ele diz colocando o aparelho em minhas mãos.
29
Carl
Pego uma arma no armário atrás da porta da sala de comunicação e
enfio no cós da calça. Eu sei que provavelmente esse filho da puta não está
aqui por perto, ele não seria tão idiota, mas, caso ele seja mais burro do eu
imagino, será melhor levar minha arma por garantia. Pretendo dar uma
verificada ao redor.
— Fique na sala com ela enquanto vejo ao redor — digo para Pedro
antes de sair pela porta lateral que dá para o lago.
Relutantemente deixo Sam com Pedro, porém tenho de pensar com a
mente e não o coração.
Olho por todo o perímetro ao redor da casa e não vejo nada. Seria
muita burrice alguém se aproximar da casa, considerando que tenho câmeras
por toda parte do lado de fora, mas esse ponto cego agora é o que me
preocupa. Alguém deve estar se divertindo. Depois de verificar tudo, começo
a voltar para casa. Ligo para Roger para saber se ele tem alguma pista do
perseguidor e informar o que está acontecendo aqui.
— O'Neal, você não morrerá tão cedo — ele fala quando atende a
ligação. — Estava pensando em ligar para você.
— Isso quer dizer que tem alguma novidade?
— Sim, nosso "admirador secreto" tem conhecimento da deep web e
por isso não vamos conseguir localizar o IP da máquina que ele usa para
enviar os e-mails, chegar nele é o mesmo que procurar uma agulha no
palheiro — ele diz.
Quem seria? Eu jurava que poderia ser Zara ou o suposto noivo.
Talvez aquele advogado que nunca vi, pelo teor da conversa com Zara não
era nenhuma coisa boa.
Corja de gente ruim, perto demais...
— Isso não ajuda muito, Roger, estou tendo problemas aqui. Alguém
quebrou a câmera da entrada da propriedade — digo chateado. Minha
preocupação com Sam só aumenta. — Você pesquisou a mulher?
— Você está com fixação na agente — ele diz. — A única coisa que
descobri é que ela tem um caso com o pai da Sam. Ou tinha, pois os dois
ultimamente só têm ressentimentos.
Que merda era essa agora?
— Como diabos descobriu isso? — Estou totalmente chocado.
— Nas conversas, naquele dia que estive na casa deles, algo me
chamou a atenção e só juntei as peças. Sutilmente questionei o senhor Stollen
e ele apenas confirmou que já esteve envolvido com a moça.
— Isso é surpreendente — comento. Essa família de Sam a cada dia
me choca e deixa-me mais preocupado.
— O senhor Stollen teme que a moça revele isso para Sam — ele
continua.
— Roger, tem certeza? E pode ter alguma relação com as ameaças à
Sam?
— Talvez sim.
— Não vejo nenhuma ligação. — Realmente quero entender toda essa
merda.
— Para isso temos de investigar — ele faz uma pausa. — Carl, talvez
seja prudente você não ficar aí sozinho — ele adverte. Ele tem razão, venho
pensando nisso desde que Alex ligou há três dias e se não fui embora ainda é
que estou protelando, levando meu tempo com Sam aqui. Merda, isso não é
saudável para nós dois.
— Vou procurar um lugar seguro — digo por fim. Desligamos depois
dele me garantir que vai continuar investigando.
Encontro Sam no telefone quando volto e, pelo tom da conversa, é
com a mãe que ela está falando. Não fico nada contente, porém deixo ela
falar, afinal não iremos continuar aqui. Pedro ainda está com ela e acena
quando passo por eles. Tenho vontade de fazer Sam largar o telefone e beijá-
la, mas controlo meus arroubos apaixonados e sigo para o deque. Sentando-
me na cadeira confortável de vime com almofadas, ligo para a empresa.
Preciso falar com Lilian. Preciso que consiga um lugar para Sam ficar e
contratar uns dois seguranças para reforçar sua proteção.
— Lilian? — digo quando ela atende no segundo toque.
— Carl, querido, você está bem?
— Sim, obrigado. Lilian preciso de um favor — digo. — Preciso de
uma casa com sistema de segurança de primeira e dois seguranças
trabalhando nela.
— O que está acontecendo? — ela pergunta curiosa.
— Preciso reforçar a segurança de uma pessoa e necessito para
ontem.
— Todos vocês são assim, querem tudo com urgência, para ontem.
Homens — ela reclama, mas escuto o som dos dedos dela no teclado do
computador, provavelmente já procurando algum lugar. — Qual o nome do
cliente?
— Eu sou o cliente.
— Tão misterioso! Tudo bem, a fatura vai ser exorbitante — ela
rebate rindo. — Certo, temos uma casa pronta para você amanhã. Vou escalar
dois seguranças para estarem lá ainda hoje e que tudo esteja em ordem
amanhã. — Ela me passa um endereço e eu agradeço sua agilidade.
— Já disse que amo você, Lili?
— Claro que não, você é tão fechado que nem em sonho diz isso para
alguém. — Ela ri alegremente. — E isso me diz que você está mudando, que
bom.
— Não sou tão ruim assim. — Rio. E escuto alguém gemer atrás de
mim.
Viro-me para dar com Sam e Pedro parados na porta de correr que dá
para o deque.
— Ligo para você mais tarde, Lili — digo desligando e olho para
Sam. — Você está bem?
Levanto e vou até ela, empurrando a cadeira para frente. Ela não
responde.
— Pedro, obrigado. Se quiser ir, tudo bem.
— Está tudo certo por aqui? — ele quer saber.
— Aparentemente sim, estarei saindo daqui até à noite. — Ele acena
e, depois de uma breve despedida para Sam, some de vista dentro da casa.
Volto minha atenção para Sam que está com o rosto voltado para o
lago.
— O que falou com sua mãe? — pergunto sentando de volta na
cadeira.
— Nada importante — diz séria ainda com o rosto voltado para o
lago.
— Não acho que não foi nada importante, já que está agindo
estranhamente. — Tento pegar sua mão e ela puxa quando sente meus dedos
envolver os dela. — O que foi? Ela disse algo que magoou você?
— Não e não se preocupe, pedi para ela deixar essa besteira de
sequestro para lá.
Suspiro.
— Não estou preocupado com isso, Samantha. — Viro a cadeira de
frente para mim, deixando-a de costas para o lago, mesmo que ela não me
veja, quero sua atenção. — Estou preocupado com você, levou um susto mais
cedo. Deve estar nervosa ainda.
— Estou bem. Seu tom é frio, sua feição fechada é uma contradição
de suas palavras.
— Aparentemente não está — devolvo gentilmente.
— Já disse que estou bem, poderia me levar para o quarto? Estou
cansada.
— Está mentindo.
— Talvez não seja eu a mentirosa aqui — diz aborrecida.
— Deus, mulheres! Elas nunca falam as claras. — Suspiro outra vez.
— Eu não entendo enigmas, carinho.
— Não me chame assim! — ela grita empurrando com força para trás
e me surpreendo com sua histeria, porém me movo em tempo de impedir a
merda que está prestes a acontecer. A força que ela impõe faz a cadeira
começar a deslizar pelo deque indo em direção ao lago.
— Carl! — Sam grita assustada.
Eu sou um cara grande e, às vezes, o tamanho te impede de ser ágil,
mas devo ter voado em sua direção, segurando a cadeira antes dela cair
dentro do lago. Agarro os lados da cadeira, meu coração bombeando com
uma provável injeção de adrenalina.
— Jesus, Samantha! — Eu a tiro da cadeira segurando-a contra meu
peito e caminho para dentro da casa. Minhas pernas parecem gelatinas do
caralho. — Que porra, mulher!
Esbravejo enquanto sigo com ela para dentro.
Caminho com Sam e deposito-a na cama com cuidado. Depois de
inspecionar todo seu corpo, mesmo sabendo que ela não está machucada, mas
ainda assim verifico cada polegada, limpo a lágrima solitária que ela tem no
rosto. Ela teve um segundo susto hoje, caramba. Que diabos!
— O que estava pensando, Sam? Poderia ter se machucado —
repreendo baixinho soltando pequenos beijos em sua face.
— Você se importaria? Por que estou me perguntando agora o que
estou fazendo aqui? Por que que me trouxe para cá e ainda por cima faz amor
comigo se tem alguém em sua vida, Carl?
Ah não, não! Para onde está indo os pensamentos dela?
— Eu me importo mais do que imagina, Samantha. — Inclino-me até
quase ter nossas bocas juntas. — E do que está falando?
— Você a ama mesmo? Que boba que eu sou, claro que ama. Se não
amasse, não diria em alto e bom som! — ela diz e sua voz tem tanta dor que
meu peito aperta.
Que merda! Ela tirou conclusões precipitadas de minha conversa com
Lilian? Já não bastam nossos problemas?
— Entendeu errado, carinho — digo acariciando sua testa, retirando
os cabelos castanhos claros revoltos e salpico beijos em sua testa enrugada.
— Não amo ninguém, Sam. Lilian é apenas uma funcionária da empresa e
casada com um dos nossos amigos. Foi apenas uma expressão de carinho.
— Porque devo acreditar em você? Anda expressando muito carinho
por aí — ela diz e o tom de mágoa permanece. — Deixe-me sozinha, por
favor.
— Não vou embora, Samantha, fale comigo. Eu sou um tonto bruto,
eu sei — digo para me redimir. — Eu não poderia amar ninguém, carinho.
— Por que não? É um homem livre para fazer o que quiser. — Ela
vira o rosto para o outro lado. — Se temos de ir embora, me leve para casa.
— Bom ... — digo e me deito ao lado dela. A brisa do lago penetra
pela janela aberta deixando o ambiente arejado. Respiro fundo o ar fresco e
continuo: —Não posso fazer isso, vamos ficar em um lugar tranquilo e...
— Mais tranquilo do que aqui? Acho que não está funcionando. —
Levanto segurando meu peso em um braço, assisto seu rosto onde uma ruga
vinca entre suas sobrancelhas.
— Tudo em seu tempo, carinho, você só saiu do hospital há algumas
semanas. — Não querendo prolongar essa discussão, inclino-me e beijo-a.
Ela impõe resistência fechando os lábios, mas insisto até ela ceder abrindo-os
para mim. Depois que a deixo sem fôlego, levanto a cabeça olhando seus
lábios inchados dos meus beijos. Amo beijar essa mulher. Tenho um sorriso
nos lábios quando indago. — Estava mesmo com ciúmes?
— Claro que não — ela fala rápido e tenta me bater acertando meu
rosto, a mão acertando em cheio um lado. — Oh, meu Deus, desculpe-me.
Não digo nada, apenas volto a beijar sua boca, bem que eu merecia
um tapa por ser tão bronco com ela e não perceber minha gafe deixando-a
quase se machucar. Mas saber que tem ciúmes de mim, deixa-me com essa
sensação de satisfação incrível no peito.
— Tudo bem, às vezes eu gosto de apanhar — digo levemente em
tom de brincadeira. — Mas também poderia dar uma ou duas palmadas de
vez em quando.
— Não brinque com isso. Escutar você dizer aquilo, fez-me sentir
horrível — ela fala com voz trêmula.
— Por quê? — Ah, Carl, não vá por aí. Recrimino-me interiormente,
mas estou descendo uma ladeira sem volta quando continuo. — Qualquer um
pensaria que ainda me ama.
— Acha impossível? Acha que deixei de amar você, como você
deixou de me amar?
— Não acredito, estamos mesmo falando sobre isso.
— Não acha que está na hora de enfrentar os fatos, Carl? — ela diz,
seu tom triste e com uma ponta de recriminação.
— Samantha... — Começo a levantar e ela estende a mão segurando-
me no lugar. Eu sei que essa conversa pode acabar com o pouco que
construímos esses dias aqui, ainda assim sento e ajudo-a a fazer o mesmo.
— Deixe-me falar. Eu tenho certeza que alguém mudou o conteúdo
daquela carta que mandei para você — ela fala convicta e apenas encaro-a.
Antes que diga algo, ela continua. — Eu enviei a carta junto com a que enviei
para meus pais...
— Samantha, é muito história da carochinha para acreditar. Quer me
dizer que seus pais escrevem igual a você? — debocho porque é ridículo.
— Eu não queria falar com você e disse para meus pais que enviaria
uma carta explicando que não voltaria no tempo combinado. Pedi que eles
entregassem a carta para você — ela diz.
— Eu devia acreditar em uma história tão fajuta dessa? Sam, por que
apenas não admite que queria ser famosa quando surgiu a oportunidade? Por
que inventar uma história sem pé e sem cabeça?
— Não é verdade, eu não disse que preferia a música. Eu pedi mais
seis meses, que era o tempo de adaptação na orquestra — ela grita com raiva.
— Por que eu tenho de implorar para que acredite? É a verdade!
— Certo. E quem poderia mudar o conteúdo da sua carta? —
pergunto incrédulo. Ela acha que vou acreditar nisso?
— Não sei. Pode ter sido a Zara? Meus pais? Só eles tinham acesso a
mim na época — ela sugere.
— Por que Zara faria isso, qual motivo? — Eu acreditaria se fosse
agora. Essa mulher faria de tudo para Sam não abandonar a carreira lucrativa
e, claro, mantê-la como uma agente de sucesso.
— Conheci Zara na escola de música. Ela entrou na mesma época que
eu e estudamos na mesma escola aqui no Brasil também. Nos tornamos as
melhores amigas em poucas horas, talvez porque estávamos sozinhas em um
país estranho. Ela estava sempre presente quando falava com meus pais, ela
se apegou a eles, já que ela não tinha os dela por perto. Ela falava com eles
sempre e nunca questionei, a não ser agora. Quando começo a pensar em
tudo... Ela sabia de você, do meu amor, conversamos por horas e horas sobre
como eu ia voltar depois da temporada na Europa. Ela queria que
formássemos uma dupla ou algo parecido. Eu dizia que não tinha essa
intenção, que voltaria para cá e conciliaria minha música e nosso casamento.
— Está dizendo que ela de alguma forma escreveu aquela carta? Com
sua letra? Que não queria que você voltasse e, portanto, nos separou?
Achando que com isso vocês duas fossem fazer alguma parceria? — Levanto
impaciente e começo a andar.
— Não sei, Carl, isso é apenas uma hipótese, e se for possível? Pois
tenho certeza que não enviei uma carta terminando em definitivo com você,
eu pedi mais seis meses e então eu voltaria. — Ela repete tanto isso que as
dúvidas se misturam em minha mente, fazendo-me duvidar do conteúdo da
carta. — E quanto a escrever com minha caligrafia? Zara é muito engenhosa,
Carl, poderia sim imitar minha letra. E você também tem sua parcela de culpa
por não estarmos juntos. Quando eu voltei aqui você tinha ido para o exército
e, principalmente, não questionou nada que eu supostamente dizia na carta.
Você aceitou com tanta facilidade que agora eu me pergunto se realmente se
importou como diz.
Fico olhando para ela por um instante e depois lembro que ela não
pode enxergar meu olhar assassino.
— Você tem o péssimo hábito de dizer que eu não a amava — digo,
minha voz sai dura e cheia de rancor. — Não deduza o que não sabe,
Samantha.
— Já ocorreu a você que sua atitude também não foi tão maravilhosa
assim, que não lutou, Carl, por nada?
— Preciso sair um minuto, preciso digerir tudo isso. — Saio
deixando-a e caminho para sala onde começo uma caminhada impaciente ao
redor. Minha cabeça gira de raiva contida, será que Sam fala a verdade? Os
argumentos veementes dela me fazem começar a questionar as circunstâncias
também. Eu passei dez anos acreditando que ela foi embora porque preferiu o
sucesso a mim, ao nosso amor, e agora tudo parece tão sem sentido.
Será que vivi preso aos sentimentos de um rapaz de vinte anos
durante dez anos?
Seguro minha cabeça com as duas mãos, ainda andando de um lado
para outro, depois cruzo as duas mãos na nuca e olho para o teto sem nada
enxergar. O pensamento daquela mulher mesquinha envolvida na nossa
separação me faz questionar essa questão de não bater em mulher, porque,
sinceramente, se for verdade, ela merece uma maldita surra por ser tão
mesquinha e invejosa.
Meus punhos estão cerrados em eminência de esmurrar a parede mais
próxima, meu sangue bombeando nas veias quando começo a pensar nos dez
anos jogados fora por não viver a vida plenamente, preso em um passado que
agora parece tão melodramático e bobo. De um ódio, talvez, sem
fundamento, que me fez cego. Sinto ondas de ressentimentos em uma mistura
de vergonha e arrependimento por ser tão fraco.
Amor! Cristo, talvez eu nem acreditasse mais nesse sentimento.
As vozes do passado com Sam vêm a minha mente, as risadas, o
toque do piano velho que tinha comprado na internet quando fizemos um ano
de namoro. Eu queria que ela tivesse seu instrumento no meu pequeno
apartamento. Foi o dia que mais ganhei beijos de minha namorada. Ela
falando do seu amor por algum mago, mago segundo ela, da música clássica,
horas e horas falando como ia ser uma compositora de sucesso, sua
expressividade incomparável de dez anos atrás parecia apagada agora com
tanta mágoa. O sucesso que ela tanto queria veio e eu me vi odiando esse
sucesso por anos.
Estou me sentindo vazio agora. Volto para o quarto e Sam continua
sentada como se estivesse esperando eu me acalmar, sabendo que voltaria.
— Por que me procurou quando chegou aqui no Brasil, Sam? — boto
para fora a pergunta que vive martelando dentro de mim.
— Eu queria vê-lo, conversar. Eu sentia saudade, por mais que não
acredite. Me sentia culpada por ter enviado aquela carta.
— Eu sinto muito, Sam. — Nem sei porque estou dizendo isso, mas
sinto que estou em dívida com ela, principalmente por ter ido embora para as
Forças Armadas sem uma palavra. Mas eu estava tão malditamente magoado.
— Carl — ela chama e sua voz faz-me sentir ainda pior. — Eu
preciso que você acredite em mim para que possamos seguir em frente,
mesmo que daqui em diante sigamos separados, que você tem uma vida
construída e não há lugar para o passado.
Fico calado absorvendo suas palavras. O telefone começa a tocar me
surpreendendo e tirando do marasmo sombrio do rumo que meus
pensamentos vão tomando. Pego a extensão e levo ao ouvido. Esse telefone
quase não tem uso, mas hoje ele resolveu funcionar pelo visto.
— Alô? — O silencio do outro lado é denso e perco a paciência, o
resto que ainda tenho e grito enfurecido. — Por que não fala, porra? Ou não,
faça melhor, aparece bem na minha frente e vou quebrar a porra toda de seus
ossos...
O beep, significando que a ligação caiu, faz com que eu pare de falar!
Filho da puta covarde.
— Quem era, Carl? — a voz assustada de Sam me faz olhar para ela.
— Não sei, talvez o mesmo idiota que ligou mais cedo. Fique aqui —
digo indo até ela, beijando sua cabeça. — Vou falar com Souza um cara do
TI da empresa e ver se ele consegue identificar de onde são essas ligações,
esse filho da mãe está me fazendo de palhaço. Não demoro.
Saio do quarto furioso seguindo para o escritório. Essa pessoa está
começando a me irritar.
Quando ligo o computador, a primeira coisa que noto são as câmeras
que estão todas sem sinais. Alguém desligou a transmissão remotamente.
Alguém está brincando de gato e rato comigo.
Começo a reconectar já que a pessoa só desconectou. Esta era uma
mensagem para mim. Um insulto claro.
Ligo para Souza.
— O’Neal — ele cumprimenta quando atende.
— Preciso de um favor pessoal. — Durante os próximos minutos
explico que meu sistema foi invadido e quero que ele consiga rastrear a
pessoa.
Fico alguns minutos no escritório quando ouço um carro se
aproximando e saio para verificar. Um carro com identificação da polícia está
parando na frente da casa. Saio com cautela e vejo um policial descer do
carro.
— Carl O’Neal? Sou o capitão Lima, amigo de Roger, recebi uma
ligação dele com um pedido para que viesse dar uma verificada nas
redondezas — ele se identifica. — Problemas com vândalos?
— É o que parece — digo quando aperto sua mão.
30
Samantha
When life has cut too deep and left you hurting
The future you had hoped for is now burning
And the dreams you held so tight lost their meaning
And you don't if you'll ever find the healing
(The Sun Is Rising -
Britt Nicole)

Fico estarrecida quando Carl sai do quarto e o medo de alguma


acontecer me deixa paralisada no lugar. Começo a pensar que esse
perseguidor pode estar aqui perto e apenas esperando uma oportunidade para
ferir Carl.
Torço minhas mãos impaciente enquanto o tempo passa e nada dele
voltar. Ali estava eu sentada e impotente quando alguma coisa devia estar
acontecendo lá fora. Esse louco pode ferir Carl por minha causa e eu aqui
cega e presa nessa escuridão. Eu devia impedir tudo isso. Sinto o desespero
começar a se infiltrar por cada poro meu. E se Carl se ferir? Eu nunca me
perdoaria. Já não bastava tanto mal-entendido entre nós? Tinha de vir um
louco e querer acabar com nossa paz?
O tempo parece se arrastar e meu medo fica maior a cada segundo,
minutos.
— Carl?! — chamo e nenhuma resposta vem, nenhum som de que ele
ouviu meu chamado. — Você está aí?
Nada. Escuto meu próprio coração batendo acelerado e levo a mão ao
meu peito em uma tentativa de me acalmar. Em um momento normal, se eu
estivesse enxergando, talvez o medo não fosse tanto, mas essa sensação de
impotência faz com que eu me sinta perdida no vazio escuro.
Não tenho noção de quanto tempo estou sentada me sentindo patética
quando escuto o barulho de pneu derrapando em algum lugar e sons de
passos correndo e se distanciando.
— Carl?! — chamo desesperada — Carl?!
Oh, meu Deus! Quem seria? E se fosse esse louco e matasse Carl?
— Carl?! — grito chamando igual uma louca, um grito atrás do outro
e nenhuma reposta dele. Não posso ficar parada aqui. Tateio em busca da
cadeira de rodas, mas não alcanço e lembro que ela não está aqui. Ficou lá
fora quando mais cedo quase caí no lago. Com meu ciúme. Ouvir ele falar
que amava essa tal Lili foi como rasgar meu coração com um punhal afiado.
E se ele morrer? Não poderia viver sabendo que ele não estava mais aqui,
seria uma morta-viva para sempre. Ainda mais que esse louco estava atrás de
mim.
No meu desespero para sair daqui e ir ajudá-lo, forço-me para fora da
cama, colocando meu peso na minha perna boa e tento me agarrar aos
móveis, mas o quarto é estranho para mim, não sei como me situar no lugar.
Meus olhos ardem com as lágrimas e eu aperto na tentativa de reprimir o
fluxo de lágrimas de medo por Carl. Ele disse que esse lugar era seguro, mas
isso se provou falso. Guiando-me cegamente agarro a beirada da mesinha de
cabeceira, tento levantar, meus movimentos incertos, e eu perco o equilíbrio
segurando precariamente o móvel, derrubando tudo o que há em cima. Tento
pular em uma perna só, mas o gesso é pesado além da falta de visão e, dessa
vez, perco de vez o equilíbrio caindo no chão. Lágrimas, agora de pura
aflição e frustração, caem em abundância por minha face.
Minha imaginação corre solta. Imagino Carl caído, sangrando, e eu
aqui sem poder ajudar, inútil.
— Carl —minha voz apavorada raspa em minha garganta dolorida e
eu forço meu corpo para frente, meus soluços cortam o silêncio do quarto em
sons angustiados. — Por favor esteja bem, esteja bem — rezo desalenta. —
Não me abandone agora, Carl O'Neal, você não pode fazer isso. Eu já estou
indo, por favor. Eu te amo.
Aperto meus olhos e abro na tentativa de enxergar aonde estou indo,
mas tudo que vejo é a escuridão. Se ele se ferir, será culpa de minha
incapacidade de ajudá-lo, minha visão maldita que não volta. Será que viverei
na escuridão para sempre? Ah, Deus, por favor! Grito na minha mente em
agonia. Se concentre, Sam, deseje voltar a ver, foi o que o médico disse no
hospital, tire de sua mente o impedimento, mas eu não sei como fazer isso!
Arrasto-me no que imagino ser a direção da porta. Só preciso enxergar outra
vez e ajudar Carl, por favor. Rezo e rezo em uma oração silenciosa. Estou tão
louca de angustia e concentrada em chegar até Carl que tudo some.
— O que diabos está fazendo? O que aconteceu? — a voz brava de
Carl ecoa para dentro do meu desespero, inundando-me de alívio, e o alívio é
tanto que todo meu sentido me deixa. Ainda o escuto me chamando, agora
com uma nota de preocupação, e eu simplesmente apago.
*
Não sei quanto tempo passo desacordada, mas o que noto,
primeiramente, quando acordo, é uma voz murmurando carinhosamente;
segundo, o cheiro amadeirado e fresco de seu perfume entrando em minhas
narinas; terceiro, que significava que ele estava bem. Minha imaginação
louca já o tinha desacordado em uma poça de sangue.
— Ei, carinho, você acordou — a voz carinhosa de Carl me faz
suspirar. Sinto lábios tocarem os meus, tento dizer algo, mas nada sai.
Apenas estendo a mão e agarro sua camisa apertado.
Abro os olhos e os fecho imediatamente porque eles doem com
flashes de luz branca, levo meus dedos para eles e toco. Devo ter gemido
porque ouço Carl dizer:
— Você machucou alguma coisa quando caiu? Já inspecionei todo
seu corpo e não vi nada machucado.
Movo minha cabeça negando qualquer machucado, apesar de estar
dolorida por ter caído. Mas minha mente está no fato de ter imaginado essa
claridade. Tento abrir os olhos de novo e, sim, a claridade ofusca e dói
manter meus olhos abertos.
— Carl — chamo indecisa. — Quem era no carro? Estava preocupada
com você.
— Ah, carinho, foi apenas um amigo de Roger verificando como
estamos — ele esclarece e lembro alguma coisa desse Roger ser um policial.
— Ele estava preocupado comigo, conosco, e pediu a um amigo para dar uma
verificada no local. Ele já foi.
— Não devia ter deixado ele ir embora, Carl, tem algum louco nas
redondezas — digo. Dois telefonemas no mesmo dia é demais. —Por que
demorou tanto? Fiquei apavorada sem saber o que estava acontecendo.
— Desculpe, carinho, eu perdi o jeito de lidar com as mulheres. Hoje
só meti os pés pelas mãos com você.
Não comento que esse "perdi o jeito de lidar com as mulheres" me
deixa um pouco chateada. Estou ciumenta até a borda hoje, penso
descontente.
Fico com vontade de dizer quer estou vendo tudo branco agora, mas e
se não for verdade? Por que minha visão voltaria assim do nada?
— Carl, podemos ir para o hospital? — É o que sai da minha boca
sem que eu me controle. — Eu preciso ver o médico que cuidou de mim.
— Você disse que não estava machucada! — ele exclama e começa a
me verificar outra vez. — Onde está doendo, Samantha?
— Acho que tem alguma coisa acontecendo com a minha visão —
começo a falar, mas ele já está em ação.
— Está enxergando? Vou ligar para seu médico. — Ele parece
exasperado agora.
— Só estou vendo uma claridade muito intensa. — digo, sem colocar
muita expectativa na minha voz. — E doem se mantê-los aberto.
— Vou deixar o quarto escuro. — Ele se move e ouço-o fechando
portas ou janelas. Ele me disse quando cheguei aqui que o quarto tinha uma
janela que dava para o lago. — Pronto, tudo escuro, tente outra vez, querida.
Ele parece eufórico na esperança que minha visão tenha voltado. Abro
devagar os olhos e agora vejo tudo embaçado como uma névoa tampando,
impedindo-me de ver com clareza, tento me deixar acostumar e focar em
algo. Vejo sombras e uma delas parece bem na minha frente.
— Consegue ver? — Não vejo seu rosto nitidamente, mas agora é por
causa das lágrimas de alegria pela possibilidade de vê-lo outra vez, é mais
que emocionante saber que vou voltar a enxergar.
Levanto minha mão, toco seu rosto e prazer me inunda quando vejo
ainda desfocado seu sorriso contente.
— Está desfocado, mas eu vejo você! — digo emocionada, minha
garganta dói da comoção, do prazer de enxergar.
Às vezes não temos noção do quanto algo nos é precioso, até que nos
é tirado ou nos dado de volta quando perdemos por um tempo. Conseguir
enxergar é uma sensação indescritível, ver o rosto masculino na minha frente,
olhando-me com carinho, e não a última visão que tive dele, é demais para
controlar a sucessão de sentimentos.
Olhos azuis me olham com expectativa e apreensão.
— Ei, estranha — ele diz suave e carinhoso. — Que bom vê-la
melhorando. Você vai ficar boa, carinho, isso é certo.
Não contenho minhas lágrimas de alegria de voltar a enxergar. Sem
conseguir me controlar passo os braços em torno do pescoço de Carl que está
inclinado acima de mim e grudo nele com força. E para expressar toda a
felicidade eu colo minha boca na sua, exigente, com paixão. Minhas lágrimas
se misturam com desejo, nossas línguas enroscadas juntas.
A emoção por pensar que não o veria jamais e agora poder vê-lo,
eleva-me como se um balão de ar estivesse dentro de mim.
— Sam? — ele chama, tentando me olhar, mas estou agarrada
fortemente nele. — Vou te levar para o hospital para...
— Não! — digo. Sei que a ideia foi minha em primeiro lugar, contudo
quero antes poder ficar um momento com ele aqui. — Me beija, por favor.
Quero sentir você.
— Mais tarde posso beijá-la inteira, agora tenho que leva-la para seu
médico. Vamos, levante! — ele diz ficando de pé. — No caminho ligamos
para ele. — Ele me ajuda a levantar e eu tento olhar ao redor ainda com
dificuldade. A névoa branca não me deixa ver as coisas claramente e talvez
ele esteja certo, preciso ir ver o oftalmologista.
— Poderia ter se machucado, Samantha. O que fazia no chão,
querida? Eu disse para ficar quietinha — ele ralha, mas seu tom é
preocupado. Sento na cama e observo ele andar de um lado para outro.
— Eu não sabia o que estava havendo lá fora, tive medo de alguém
fazer algo com você — digo e percebo o quanto fui boba. O que eu poderia
fazer para ajudá-lo? — Eu só queria salvá-lo — finalizo.
Ele vem e agacha na minha frente, tocando meu rosto em uma carícia
terna.
— Ah, minha linda, eu estava bem — diz e segura meu rosto beijando
minha testa.
— Eu tenho medo que se machuque por minha causa, essa pessoa
poderia estar...
Ele me corta quando me beija e não é um beijo casto. Nosso beijo é
cru e poderoso como se fosse a primeira vez que nos fundimos assim um no
outro. Nossos gostos juntos e misturados, uma combinação de paixão, fúria,
amor e desespero. Com um gemido áspero ele me empurra de volta para
cama, colocando seu peso deliciosamente em cima de mim. As mãos dele
estão percorrendo meus seios e eu gemo em sua boca ansiosa. Carl empurra
sua língua em minha boca, lambendo cada canto, fazendo com que meu
corpo se movimente de encontro ao dele, freneticamente procurando o seu.
Ele está duro e bate onde mais quero nesse momento.
— Preciso de você, Carl — murmuro ofegante. — Preciso tanto de
você.
Mas em vez de me dar o que tanto almejo ele sai de cima de mim, sua
respiração faz conjunto com a minha, ofegante. Era estranho como o desejo
ardente e poderoso podia pegar do nada, deixando-me pulsando nos lugares
mais secretos enquanto minha mente derretia pela tempestade crescente.
— Vamos cuidar de você primeiro, carinho, depois eu posso fazer
tudo que você quiser — ele promete. Não tento outra saída e acato o que diz.
Mas aceito, pois não posso me movimentar com rapidez suficiente para
agarrá-lo e trazê-lo de volta para a cama.
— Não faça essa cara, Samantha — ele diz rindo deliciosamente. —
Você parece tão tranquila, pensei que estaria meio surtada agora que está
voltando a enxergar.
— Eu tenho a melhor visão aqui comigo, não poderia escolher nada
melhor para ver primeiro — digo e é verdade. — Eu sempre desejei te ver
mais uma vez, e isso está acontecendo...
Paro de falar quando ele fica muito quieto, a visão um pouco
desfocada dele está imóvel no meio do quarto. Acho que estou me
precipitando dizendo isso para ele. Será que esse tempo aqui não abrandou
seu coração e nada que falamos serviu de alguma coisa? Ele me frustra, mas
eu não vou desistir dele até provar que não sou a cruel dessa história. E se eu
tiver de ir embora depois, irei.
— Vai ficar tudo bem. — É o que ele diz sempre e estou começando a
acreditar que nada vai ficar bem. Ele é gelo e fogo no mesmo homem.
Não demoramos para pegar a estrada de volta, o tempo que
demoramos foi o dele fazer as malas e colocar no carro. Durante o trajeto
coloco um óculos escuro, pois a claridade irrita demais meus olhos, então os
mantenho fechado também. Minha cabeça viaja e lembro do dia que cheguei
e fui vê-lo, seu tom sarcástico, desdenhoso, e logo depois o acidente. Algo
clica na minha mente e fico alerta pensando. Não era para ter ido até a casa
de Carl naquela noite tão tarde, eu ia de tarde. Lembro que dormi demais e
Zara não me chamou em tempo. Será que...
— Você está inquieta, Sam, o que tem? — Carl fala ao meu lado.
— Estou pensando — digo e ele ri.
— Você pensa muito alto, estou ouvindo as engrenagens rodando
daqui — graceja. — Carinho, estou enferrujado sobre ser delicado com as
mulheres e tudo mais, contudo, não vou deixar você sozinha agora. Vou ter
certeza que sempre estará segura.
— Sei disso, Carl. Certamente não é sobre o que estou pensando, mas
no dia do acidente — resolvo falar.
— O que tem o dia do acidente? Lembra de algo suspeito?
— Nada demais, só que era para ter ido vê-lo à tarde e dormi demais
— digo.
—Pelo que li sobre o relatório da polícia você perdeu o controle —
ele diz o tom um tanto recriminatório. — Lembra de algo que possa mudar
isso?
— Não, lembro que estava chorando, depois o impacto e, por fim, a
escuridão.
Ficamos calados depois, nós dois lembrando porque estava chorando
antes do acidente ocorrer, não quero que ele se sinta culpado de nada, porém
ele diz em voz baixa e cheia de culpa.
— Eu causei isso, não foi?
— Claro que não, Carl, você...
— Claro que tenho culpa, devia ter sido mais gentil e educado com
você, mas fui mesquinho e agora está machucada por eu ter sido tão
intransigente.
— Não culpo você e nem devia se culpar — digo por fim.
Não sei para onde vamos a partir daqui. Mas tenho uma certeza, não
vou deixar as coisas mal esclarecidas entre nós. O resto da viagem passamos
em silêncio quebrado apenas com o som ligado do carro. Encosto minha
cabeça no ombro de Carl e de vez em quando ele toca minha perna em uma
carícia quando troca a marcha do carro.

...Quando a vida tiver te cortado profundamente e tiver te deixado


ferido
O futuro que você esperava agora está queimando
E os sonhos que você segurou tão forte perderam o significado
E você não sabe se irá encontrar cura...
Talvez esse tempo juntos, seja o começo da cura.
31
Carl
Enquanto Samantha está na consulta com o médico, ligo para Lilian
e ela me dá os nomes dos seguranças que ficarão com Sam. Irei colocar um
pouco de espaço entre nós, estou seguindo igual Alex e Bruno vivendo vinte
quatro horas com clientes e isso é ruim, apesar de Samantha não ser
exatamente uma cliente, contudo ela ainda precisa de seguranças que estejam
atentos sem distrações. E estou sem foco que levo tudo para o lado pessoal,
sei que ela não vai gostar de ter outras pessoas perto, mas será para seu bem.
Precisamos de espaço entre nós dois. Ao menos ficarei longe dela
parte do dia. Essa aproximação não nos deixa espaço para pensar, analisar,
tudo que estamos vivendo e descobrindo sobre nosso passado.
— Eu pensei que você só viesse amanhã, Carl — Lilian está dizendo
do outro lado da linha, estou tão distraído que nem tinha escutado o que ela
estava falando. Distração era perigoso. — Silas e Leandro irão amanhã de
manhã e ficarão durante o dia.
— Coloque uma mulher que ajude para ficar com Sam — digo
preocupado com a locomoção de Sam, sua visão está melhorando e ela, no
caminho para cá, disse que a névoa estava saindo. Mas ela precisa de uma
pessoa que a ajude.
— Não temos essa disponibilidade — ela retruca.
— Contrate alguém de fora — sugiro.
— Carl, eu gostava mais de você quando era estoico, na sua, caladão.
Agora vive dando ordem a torto e à direita. — Ela ri.— Não garanto que irei
conseguir, sabe que tem de passar pelo aval do Alexander, certo?
— Tenho certeza que você consegue, Lilian. Afinal criar dois irmãos
menores fez de você uma mulher que consegue o impossível.
— Você me adula...
— Quem te adula, querida? — Ouço uma voz masculina conhecida ao
fundo e balanço a cabeça. Lá vamos nós.
— Carl — é a resposta abafada de Lilian para o dono da voz. Escuto o
resmungo de urso ao fundo. Depois diz para mim: — Você estará em apuros,
Carl.
— Segure seu cão de guarda, Lilian. — Suspiro olhando o corredor
do hospital, vazio àquela hora no começo da noite. Faz uma hora que
Samantha está lá dentro e já estou impaciente com a demora. Ela está se
submetendo a exames novamente, o médico quer ter certeza de que ela está
bem depois de dizer que tinha levado uma queda mais cedo. Entrar no quarto
e vê-la chorando, tentando ir ao meu encontro, fez tudo dentro de mim ficar
em um nó apertado. — E, Lilian, encontre uma segurança até amanhã.
— Verei isso, Carl — ela me garante e desligo. Estou ligando para
Alexander quando vejo a mãe de Sam vindo pelo corredor vazio.
— Ótimo, ainda mais essa, como diabos ela soube que estamos aqui?
— resmungo enfiando o celular no bolso.
— Onde está minha filha? — ela indaga quando se aproxima. —
Você deveria ter ligado avisando que ela está no hospital de novo.
— Olá para você também — digo jocoso. — Sam está muito bem e
não sei como soube que ela está aqui, mas garanto, senhora, não ficará
próxima de Sam até termos uma conversa muito esclarecedora.
— Está dizendo que me impedirá de ver minha filha, Carl?
— Exato. Antes vamos conversar e você vai me dizer porque me
entregou uma carta falsa de Sam.— Dou um sorriso que nada tem de gentil.
Ela parece confusa com minha conversa, entretanto não sou trouxa o
suficiente para descartá-la logo dentre os que poderiam ser responsáveis pela
minha separação de Sam.
— Do que está falando? — Ela parece genuinamente ignorante do
assunto.
— Aqui não é local para essa conversa, mas vou garantir que todos os
envolvidos recebam uma visita minha. Falando nisso, onde anda a tal agente?
— Cruzo meus braços e fico no corredor impedindo que ela passe. — E
também quero saber, por que estou sendo acusado de sequestro?
— Carl, você não sabe o que fala. E deixe-me saber onde Sam está —
ela insiste, ignorando o que acabei de dizer. — Quem você pensa que é
agindo dessa forma bárbara? Acha que vivemos na era dos homens das
cavernas que levavam as fêmeas pelos cabelos? É da minha filha inválida que
estamos falando aqui. E foi ela que me ligou dizendo onde estava.
— Samantha não é inválida. — Dou um passo à frente invadindo seu
espaço pessoal. — E não fale essa merda perto dela que arranco sua língua
fora, mãe dela ou não.
Ela arregala os olhos, dando um passo para trás, e sei que estou sendo
um bárbaro, como ela disse, mas enquanto certas coisas não forem
esclarecidas, não vou dar colher de chá para porra nenhuma. Mulher, homem,
tanto faz, dizer que estou puto é eufemismo. E que horas foi que ela ligou
para a mãe? Estive com ela o tempo todo.
— Como ousa me ameaçar... — ela começa, mas a porta da sala abre
e o médico de Samantha aparece.
— Ah, doutor, como está minha filha?
— Ela está bem, sua visão enfim voltou. — Ele nos olha atentamente.
— Eu sabia que quando ela estivesse pronta voltaria a enxergar. Às vezes
nosso estado emocional faz coisas engraçadas conosco. — Ele volta sua
atenção para mim— Ela está na sala esperando você.
— Vou vê-la — a mãe de Sam se precipita à frente e entra na sala.
— Samantha agora só precisa se curar fisicamente e está indo muito
bem.
— Sua queda não afetou sua perna, não é? — pergunto preocupado.
— Não, daqui uns dias vamos tirar o gesso também. Só mais um mês
e ela começa a fisioterapia para agilizar no processo de recuperação. — Ele
acena para mim. — Agora tenho de ir.
— Antes diga-me, por que a visão voltou assim de repente?
— Algum gatilho deve ter acionado o que impedia a visão de voltar
— ele diz. — Aconteceu alguma coisa?
— Ela tem passado por momentos intensos— digo apenas.
— Tudo vai ficar bem, senhor O’Neal — ele garante antes de
começar a se afastar.
Despeço-me do médico e vou atrás de Sam, não a deixarei muito
tempo com sua mãe.
Depois que saímos do hospital, levo Samantha para o novo lugar onde
ficará com segurança reforçada.
— Você tinha de ser tão rude com minha mãe? — ela censura quando
seguimos para a casa segura.
Sim, fui rude e serei com todos sanguessugas do caralho. Ela tinha
chamado a mãe, pensando que eu iria levá-la de volta para eles. Ledo engano,
bebê. Penso irônico.
Amanda tinha feito um pequeno escândalo quando deixei claro que
ela não levaria Sam para casa.
— Sua mãe não devia me fazer seu inimigo — digo me referindo
sobre o processo que eles abriram contra mim.
— Eu quero paz, Carl, por favor — ela murmura abatida ao meu lado.
Estendo minha mão e puxo-a para mais perto.
— Você não terá nada com que se preocupar.
— Você vive dizendo isso — ela retruca.
— Acredite, carinho, vou ter certeza que esse bandido seja eliminado
e você terá seu livre arbítrio novamente — falo. Eu desejo esse dia e o temo,
pois sei que quando não tiver nenhum motivo para permanecer por perto, irei
embora da sua vida.
32
Samantha
Não fico atenta onde Carl está me levando, minha cabeça estava na
conversa um tanto esclarecedora que tive com mamãe antes que ele
aparecesse e praticamente enxotasse ela da sala de exames. Enquanto
esperava o médico, pedi um celular à enfermeira e liguei para mamãe. Eu
sabia que se pedisse ao Carl ele não me daria, mas precisava ter uma
conversa com ela pessoalmente e, já que estava de volta à cidade, era o
melhor momento. Eu estava com um sentimento de perda por sair da casa
onde estava com Carl no interior de São Paulo, mas nossas vidas estavam em
um beco sem saída lá. Tínhamos de seguir em frente. Ele quer me levar para
um lugar seguro, como ele diz, contudo, acho que não seja uma boa ideia nos
isolarmos outra vez, apesar de amar estar com ele, ainda mais agora que estou
enxergando outra vez.
Eu estava olhando abismada para minhas mãos como uma boba, era
como se estivesse enxergando pela primeira vez quando mamãe entrou no
quarto.
— Ai, filha, que noticia maravilhosa! — Ela corre para me abraçar,
depois segura minha cabeça entre as mãos verificando meu rosto. — Saber
que voltou a enxergar me deixa tão feliz.
— Tudo bem, mãe...
— Vou levá-la para casa, assim talvez as coisas voltem ao normal. —
Ela senta ao meu lado. — Pietro teve de voltar para seus compromissos na
Itália e Zara está uma fera. Você precisa...
— O que tem a Zara? — interrompo seu falatório interminável.
— Ela quer que Carl pare de esconder você de todo mundo. Que volte
e honre com os compromissos que ela não pôde desmarcar.
— Como não pôde?
— Bem, ela sabia que você voltaria logo.
— Não, mamãe, deixei claro que queria todos compromissos
cancelados e ela não ouve metade do que falo com ela — digo irritada. —
Vou ter que demiti-la da função de agente, já passou do limite e vocês
permitem a loucura de Zara.
— Porque concordamos com ela. Aí está você, enxergando outra vez.
— Ela me choca com sua admissão, será que todos eles queriam tanto minha
volta para os concertos? — Eu disse que era apenas uma fase, querida, vai
voltar aos concertos mais rápido do que imagina.
— Mãe — começo com um nó na garganta de medo da sua resposta
—, você sabe alguma coisa sobre a carta que mandei para Carl, você entregou
a carta certa para ele?
Ela para e me olha sem dizer nada por um segundo ou dois, não sei, e
isso me mata por dentro. Ela sabe a verdade? Ela mudou o conteúdo? Ela,
Zara, meu pai? Um dos três era o culpado. Mas o que não entendo é essa
ameaça recente, meus pais teriam coragem de fazer isso? Por quê? Por medo
de perder a vida de luxo que levavam? Eu não quero acreditar nessa hipótese,
seria como me esfaquear nas costas.
— Não vai dizer nada?
— Não sei do que está falando, filha. Lembro dessa carta, mas não vi
seu conteúdo. — Ela levanta, mudando de assunto. — Vou cuidar para que
seu pai venha buscá-la, querida, e em breve iremos embora desse país.
— Samantha ficará comigo — a voz de Carl estronda da porta. — Ela
não sai do Brasil antes que seja esclarecido quem anda ameaçando sua vida.
Ele tranca os olhos ferozes em mamãe e tento acalmar os ânimos
quando estendo minha mão para ele.
— Por que não vem aqui, querido? — Vejo os olhos da minha mãe
alargar com minhas palavras carinhosas para Carl.
— Não antes de sua mãe sair e deixar você respirar um pouco. — Ele
mantém a postura nada amigável ainda encarando-a.
— Sua grosseria já passou dos limites — mamãe retruca e vem para
perto da cama. Isso com certeza não vai acabar bem, sei que ele está chateado
com a história da carta, com minha família e Zara, eles estão agora em sua
linha de fogo. Quase tenho pena deles, quase. Estou muito chateada com
todos também, estou magoada e ferida.
Digo para mamãe ir para casa, pois ainda quero um tempo com Carl,
porque se nos separarmos agora essa lacuna entre nós talvez nunca feche.
Precisamos viver um pouco desse nosso amor, não é? Talvez eu esteja
fantasiando amor onde apenas há uma história mal resolvida. Mas estou
pagando para ver.
Meus pensamentos voltam para o presente com a mão de Carl em
minha coxa. Seu aperto delicado me deixa quente em todos os lugares.
— Estamos quase lá. Não durma ainda — ele diz leve, depois sorri
divertido. — Se sua mãe não me odiava, agora ela faz.
— Você mudou, sabia?
— Por que diz isso? Sou o mesmo Carl de sempre.
— Não é mesmo. Você ficou grosseirão e mal-humorado — replico e
encosto minha cabeça no seu ombro, enquanto o carro corta as ruas da
cidade.
Ele ri alto e sinto seu corpo relaxar ao meu lado. Não tinha percebido
quão tenso ele estava com essa situação toda.
— Situações drásticas requerem atitudes drásticas, carinho — replica.
— Você era gentil e educado, mas hoje foi terrível com mamãe, não
gosto disso. — Olho de relance para seu perfil. — Chega de tanta confusão.
— Estou te protegendo...
— Eu agradeço sua preocupação, mas é da minha mãe que estamos
falando, senhor O’Neal.
— Tentarei ser gentil, prometo. — Sua promessa não parece muito
convincente, entretanto acato com sua boa vontade.
Fico cala o restante do caminho com os pensamentos em polvorosa no
que vai acontecer de agora em diante.
*
Chegamos em um prédio residencial e Carl entra na garagem
subterrânea do edifício, estaciona em uma vaga separada das demais e, apesar
da visão ainda um pouco turva, vejo elevadores bem próximo. Ele desce e
pega a cadeira de rodas que ainda preciso para me locomover. Em breve
quero me livrar dela também, mas por enquanto ainda é necessária. Ele me
pega no colo e coloca-me sentada na cadeira, beijando o topo da minha
cabeça.
— Você deve estar exausta, carinho. — Ele se inclina atrás de mim.
— Vou deixar você descansar essa noite — garante e ri um pouco. — Mas
será difícil ser um cavalheiro.
— Estou bem. — Sorrio e inclino minha cabeça para trás, olhando
para seu rosto acima do meu e recebo um beijo nos lábios, rápido e duro.
— Vamos, não fique me tentando, Samantha — fala com uma
carranca nada convincente e sua covinha na bochecha, uma quase
imperceptível que eu não tinha visto em anos, aparece fazendo meu coração
dar pulos dentro do peito. Ele é tão lindo, másculo e viril. Não é à toa que
ainda sou apaixonada por ele desde sempre.
— Aqui a segurança é excelente, irá ficar segura aqui. Só usamos
lugares como esse quando é extremamente importante — Carl está dizendo
enquanto me guia para um dos elevadores. — Esse aqui vai direto para o
último andar. — Ele insere o dedo em um dispositivo de identificação digital
ao lado e as portas abrem. Ele repete para fechar as portas e, pouco depois,
entramos direto em um apartamento espaçoso. Dou uma rápida olhada ao
redor, percebo que é pouco mobiliado, uma decoração minimalista que me
agrada, menos coisa para tombar com minha cadeira.
— Vou levá-la para seu quarto para que descanse. — Estou exausta,
sim, hoje foi um dia intenso e, segundo recomendações médicas, ainda
preciso de repouso, mas eu não tenho vontade de deitar e dormir enquanto
tudo a minha volta está um caos.
— Carl, não quero me isolar aqui outra vez, não estou reclamando do
tempo que fiquei na sua casa, eu quero voltar lá um dia e apreciar tudo que
você fez, mas quero resolver os problemas que estão tomando rumos que não
me agradam. Já deixei Zara decidir muito do que não deveria.
— Pensamos nisso amanhã, Sam, hoje você já teve muitas coisas
acontecendo — ele diz e segue empurrando a cadeira para o tal quarto. —
Vamos resolver tudo isso ao seu tempo.
— Mamãe me disse que Zara está meio maluca com meus
compromissos, ela não cancelou a minha agenda como eu ordenei, isso não é
bom, Carl, preciso ter uma reunião com ela — teimo. Por que Zara não
entende que minha carreira acabou? Que ainda posso trabalhar com música
sem que tenha de sair pelo mundo?
— Zara é um problema que devia ser tratado depois de uma noite de
sono, ok? — Carl resmunga — Ela leva seu trabalho de agente muito além do
limite.
— Eu sempre a tratei mais que uma simples agente, ela não é tratada
como uma funcionária e sim como uma amiga — digo ainda em defesa de
Zara, mas sei que no fundo tem algo de errado com ela. Sua mania de fazer
tudo sem meu consentimento é irritante. Ela ajudou muito na minha carreira,
mas parece que ela perdeu o controle dela mesma. Mas ele está certo, preciso
resolver depois que descansar.
— Não a quero por perto, não enquanto não tiver certeza de quem
anda querendo machucar você.
Algumas horas depois estou deitada em uma cama espaçosa no que
parece o quarto principal do apartamento e, como o resto do lugar, a
decoração segue o mesmo padrão clean e minimalista A única coisa que
quero fazer é me enroscar nessa cama com Carl e dormir até amanhã.
— De quem é esse apartamento? — pergunto virando-me para Carl
deitado ao meu lado, eu busco ficar o mais colada nele possível, parece que
seu corpo tem um imã que me atrai. Minha mão rasteja por baixo de sua
camisa, acariciando cada polegada de pele quente e lisa sobre os músculos
abdominais, ele ainda está vestido com jeans e camiseta preta colada ao peito
forte. Quando questionei se ele iria dormir assim, ele disse que ainda tinha
coisas para fazer antes de deitar e que ficaria comigo até que eu estivesse
dormindo. Ele é fofo por baixo dessa aparência rude, às vezes. Não disse o
que tinha para fazer e também não forço ele a me contar nada, contudo minha
curiosidade desse lugar acaba levando a melhor sobre mim.
— Da empresa, usamos com alguns clientes — diz e suspira tirando
seus olhos do teto e olhando para mim. Ele se inclina para baixo, pegando
meu queixo entre os dedos e beija minha boca sem aviso, sua língua quente e
molhada enrosca-se com a minha, lentamente, esfregando uma na outra com
puro desejo, buscando cada canto da minha boca e eu apenas retribuo com a
mesma fome dele. Gemo quando ele para o beijo, porque só atiçou a vontade
de mais, todavia rouba toda minha capacidade de pensar. Ele suga meu lábio
inferior como se esse fosse nosso último beijo.
O beijo acaba cedo demais, seus olhos encontram os meus e quero
puxá-lo de volta para mim, porém ele joga um balde de água fria quando fala.
— Samantha, amanhã virá outros seguranças para ficar com você.
— O quê? Me trouxe aqui para em seguida me deixar com estranhos?
— Tento levantar e ficar sentada, mas sou puxada de volta com a cabeça
deitada em seu ombro.
— Calma, não vou abandonar você e não são estranhos, são homens
qualificados que confio para mantê-la segura — ele diz e decepção me
inunda. — Tenho que trabalhar, descobrir algumas coisas, e ficar vinte e
quatro horas ao seu lado não está dando muito resultado. Esperar não é muito
meu forte. Então durante o dia terá novos seguranças aqui e eu mesmo farei o
turno da noite.
— Não gosto disso, pensei que teríamos mais um tempo para nós —
digo chateada, mas entendo, em parte. — Quero passar mais tempo com você
sem brigas.
— E vamos passar, porém sem nada sobre nossas cabeças nos
ameaçando. — Ele aperta o braço forte ao redor dos meus ombros.
— Sim. Você vai mesmo nos dar uma chance real, Carl?
33
Carl
A pergunta chicoteia meu cérebro e não consigo responder.
Volto minha atenção para o teto e as palavras não saem. O que poderia dizer?
Eu não tenho certeza se nós dois temos chance alguma, poderíamos estar
mais envolvidos, mas chance real? O que ela quer dizer com real? Uma vez
achei que tínhamos algo real e me enganei.
Inquieto resmungo um “tenho de verificar a segurança” e levanto da
cama.
— Volto daqui a pouco — digo saindo do quarto. Eu sei que estou
sendo um covarde fugindo dessa questão, mas meu coração e meu cérebro
vivem em constante guerra. E ainda não sei quem será o vencedor dessa
disputa.
*

O começo do dia está nublado, tem pouca visibilidade daqui de cima,


apesar da altura do prédio. Eu dou uma conferida nos prédios arredores, não
quero surpresa enquanto não estiver aqui com Sam. Estou acordado desde às
cinco da manhã, dormi pouco essa noite. Sam havia dormido quando eu
voltei, depois de minha saída abrupta, ela tinha adormecido, então aproveitei
e fui trabalhar. Mandei uma mensagem para minha primeira missão amanhã e
depois fui deitar.
A guarda-costas contratada chegou mais cedo do que eu esperava, na
verdade, os outros seguranças ainda não se apresentaram. Estou na sacada do
prédio observando a área ao redor com um binóculo quando meu telefone
toca com um número desconhecido.
— O’Neal falando.
— Senhor O’Neal, sou Angelina Schneider, a nova segurança, e estou
aqui em baixo esperando autorização para subir — uma voz feminina com
toque severo fala do outro lado.
Lilian tinha passado as informações dela ontem à noite. Ela era uma
ex-agente das Forças Especiais que deixou a corporação por motivo
desconhecido, mas tinha começado no exército. Não parecia muito estável
com essas mudanças em sua curta vida de vinte e nove anos, mas se era da
confiança de Lilian, então, eu faria um esforço e confiaria nela com Sam.
— Vou liberar o elevador — digo, mas antes acesso a câmera pelo
celular e vejo uma mulher jovem vestida de preto, cabelo loiro preso em um
rabo de cavalo apertado, batendo o pé impaciente na frente do elevador. Não
gosto dessa impaciência. O segredo do bom guarda-costas é ser paciente e,
pelo visto, ela não parece muito calma, mesmo assim libero sua subida,
vamos ver o que acontece.
Volto para sala de estar e vejo quando ela sai do elevador. É alta, deve
ter um metro e setenta e cinco. Franzo minha testa enquanto a analiso; muito
feminina para uma segurança, espero que seja eficiente e dê conta do recado.
— Prazer em conhece-lo, senhor O’Neal. — Ela para na minha frente
com a mão estendida. Ela tem um ar circunspecto quando me encara com
firmeza. Bom, odiaria que fosse toda sorrisos.
— Seja bem-vinda, Schneider, sente-se — aponto para o sofá da sala
depois de apertar sua mão. Ela tem um aperto de mão firme. — Irei deixá-la a
par do seu trabalho com Samantha.
Na meia hora seguinte explico que será mais como uma babá de
Samantha. Se ela não gostou, não deixou transparecer, mas estudo
atentamente sua reação quando digo:
— Pedi que viesse mais para que a ajude com a locomoção, ela está
com uma perna imobilizada. — Ela acena. — Então quero que esteja
preparada para serviços além de mantê-la segura.
Vejo sua mandíbula delicada apertar, como se não estivesse muito
satisfeita, porém isso é rápido e ela fica acenando com ar frio e controlado.
Seu pé não está impaciente agora. Estive olhando.
— Claro, senhor!
— Carl? — ouço a voz de Sam chamando e o som da cadeira de rodas
vindo para a sala. Ela aparece e fica surpresa por me encontrar com Angelina
na sala. — Oh, não sabia que tínhamos visita.
Vou até onde ela parou e empurro sua cadeira o restante do caminho.
— Schneider, essa é Samantha, nossa cliente — digo e recebo um
olhar carrancudo de Sam. — Samantha, essa é sua segurança pessoal,
qualquer coisa só chama-la. Ela estará a sua inteira disposição.
— Senhora — Schneider acena para Sam e essa retribui apenas com
um aceno de cabeça.
Espero que as duas se deem bem.
Pouco depois, os outros dois seguranças chegam e levo mais um
tempo com as apresentações e orientações, não quero nada dando errado
enquanto estiver fora. Deixo Sam tomando seu café da manhã e converso
com os três seguranças no escritório e quando volto Sam está claramente
chateada.
— Tudo bem? — pergunto sentando na cadeira desocupada ao lado
dela.
— Ótimo! — Mas se vira para mim com faíscas saindo dos olhos. —
Você não me disse que teria uma babá. E desde quando sou sua cliente, Carl
O’Neal?
— Angelina será mais confortável para você pelo simples fato de ser
mulher, carinho — digo sorrindo, sei porque está chateada. Mulheres! Falam
dos homens, mas adoram marcar território. — Para os outros é sim. Agora
tenho um lugar para ir. Volto mais tarde. Não seja ranzinza com todo mundo.
— Não sei do que está falando...
Beijo-a duro na boca até ela amolecer e corresponder. Depois de um
tempo interminável saqueando sua boca, levanto e acaricio seu rosto. —
Comporte-se. — Saio em seguida.
A pergunta que ela tinha me feito ontem à noite parece esquecida essa
manhã, deixando-me aliviado. Eu não era mais bom em expressar
sentimentos e ainda a culpava por isso. Eu não seria bom para ela mais, estive
por muito tempo sozinho, remoendo o passado.
Deixar Samantha aos cuidados de outros é um mal necessário, não
estou satisfeito, contudo, tenho de cuidar de outros assuntos.
Cerca de meia hora depois, paro o carro em frente à casa dos pais
dela. Tenho uma pessoa para ver. Pego o telefone e ligo, Zara atente quase
imediatamente.
— Alô?
— É O’Neal, estou esperando. — Aperto o botão de desligar e vejo,
pouco depois, quando ela sai da casa e caminha para meu carro. Vamos dar
um passeio.
— Espero sinceramente que isso seja uma brincadeira de mau gosto,
senhor O’Neal. — É a primeira coisa que Zara fala quando entra no meu
carro. Eu arranco sem nem olhar em sua direção. — Não tenho tempo para
esse tipo de coisa, tenho muito com que me preocupar.
O único lugar que poderia ter uma conversa particular é na minha
casa, e é para aonde a levo. Eu posso estar cometendo um erro fazendo essa
jogada com ela, mas esse impasse precisa acabar, começando com minha
maior suspeita. Vou arrancar dela a verdade e entregá-la para a polícia. Eu
tinha combinado com Roger ontem, depois que Samantha foi dormir, para
conseguir uma confissão de Zara, já que nem a polícia conseguiu identificar
os e-mails. O destinatário tinha conhecimento profundo de mundo virtual
para não deixar rastro. Passei semanas fora e nada foi resolvido, era uma
merda.
Paro o carro na minha vaga e viro-me para ela.
— Vamos lá, temos de conversar, desça — digo e saio do carro. Ela
demora um pouco, mas segue minha orientação.
Quando entramos no meu apartamento, aponto para o sofá na sala. —
Sente-se, Zara.
— O que acha que vai conseguir tomando essas atitudes, Carl? — ela
indaga, mas segue meu conselho — Só vim porque...
— Por que você está escondendo algo e sabe que eu sei? — pergunto
me referindo ao antigo suposto caso dela com o pai de Sam. — Apenas sente-
se.
— Não sei do que está falando. — Sua bravata já não é tão grande
assim. Ela vacila quando eu sento na sua frente, cruzo minhas pernas e olho-a
firme. Não digo nada por bons dois minutos e ela se contorce no lugar,
tentando não demonstrar seu desconforto.
— Diga-me o quanto você quer Samantha de volta ao mundo da
música? — casualmente pergunto. — Estou perguntando porque ela está
enxergando outra vez e talvez seja bom que volte a tocar.
— Está falando sério? Quer que ela volte? — Ela parece incrédula,
mas percebo que talvez ela esteja acreditando em mim.
— Claro, Samantha não sabe viver sem seu piano, ela já me
abandonou por ele uma vez e, claro, agora eu não quero ser o trouxa a ser
abandonado novamente. — Inclino minha cabeça. — Ela disse a você que
iria me abandonar, Zara?
— Por que veio falar comigo sobre isso? Muito estranho. Não
acredito em você. — É, parece que terei de mudar de tática com ela.
— Você é a única que parece não desistir da carreira de Samantha,
manteve seus compromissos quando tinha ordens de cancelá-los. —Inclino os
cotovelos apoiado nos joelhos. — Você está ameaçando-a com e-mails.
Tenho provas contra você, Zara.
Claro que não tenho, mas ela pode começar a cometer erros a partir de
agora. Meu trabalho ontem à noite tinha rendido algumas informações que
foram deixadas de lado pela polícia que esteve investigando o caso de Sam.
Quando estive no hospital, depois do acidente, o médico havia me informado
que nos exames de sangue de Sam tinham encontrado substâncias que
poderiam ter levado ao acidente. Não foi investigado devidamente. Talvez
eles acharam irrelevante esse detalhe. Eu tenho certeza que ela não tomava
nada ilícito. Talvez alguém a tenha drogado. Isso e meu comportamento com
ela naquela noite podem ter sido a causa do acidente. Só preciso descobrir
quem, e Zara era minha maior suspeita, afinal ela era a mais próxima de
Samantha.
Zara fica em pé com ar indignado.
— Mas do que está me acusando?
— Você tem razões para querer continuar como agente de Sam,
dedicou sua vida toda a ela, única cliente, deixou de ter sua própria carreira
musical — enumero. — Tem motivos para não querer que ela pare e deixe
você sem trabalho.
— Você é patético, Carl. — Ela ri e volta a sentar. — Tenho
capacidade de encontrar novos clientes se assim quiser.
— Será que tem mesmo?
— Foi minha opção ser uma agente em vez de me dedicar à música, e
foi há muito tempo...
— Quando juntou-se aos pais de Sam para que ela nunca desistisse de
tocar e assim todos se dariam bem?
— Samantha tinha um sonho e ninguém a forçou a fazer nada. Você
não era tão importante assim, Carl. Não culpe os outros se não era prioridade
dela — debocha satisfeita.
— Ela ia voltar, abandonar a escola na Europa, mas você trocou a
carta dela, não foi? — eu digo mansamente.
— Prove. — Ela ri.
— Vou sim e você vai me dizer, Zara, quem foi que trocou a carta ou
Samantha saberá que mantém um relacionamento um tanto duvidoso com o
pai dela — digo e espero sua reação. Ela fica pálida. Na mensagem de ontem
dei a entender que sabia dessa história e por esse motivo ela aceitou falar
comigo. Então Roger tem razão, ela tinha algo com o pai de Sam.
— É mentira! — zomba.
— Claro que sim — sorrio —, mas tenho que contar para Samantha,
Zara. Vai ser um pouco conturbado quando ela souber que sua agente anda
aprontando nas suas costas. — Levanto e vou até a janela deixando-a
absorver. Ela está sem reação, contudo eu sei que ela não vai confessar nada.
Tinha sido burrice, mas temos um ponto, ela pode a partir daqui cometer um
erro e é onde vamos pegá-la ou qualquer outra pessoa envolvida nessa merda.
Achar que ela se entregaria fácil foi tolice.
— Eu posso facilitar as coisas para você, Zara. Você só tem de
cooperar — garanto.
— Não tenho que falar nada com você. — Levanta-se e caminha em
direção a porta. — Quero ir embora.
— Tudo bem, você que sabe. — Caminho até a porta, também
frustrado. — Por onde anda seu outro comparsa? Não acredito que voltou
para casa. Afinal o que ele fazia aqui?
— De quem está falando?
— Aquele cantorzinho de merda, ele está metido nisso com você? Eu
sei que você anda metendo os pés pelas mãos com Samantha, seria mais
digno confessar. — Paro ao lado dela. — Você terá uma conversa com
Samantha onde dirá tudo que anda fazendo, por exemplo: você teve semanas
atrás uma conversa ao telefone, lembra-se? Com um advogado? — digo
como se não tivesse importância, mas sua palidez só aumenta. — Interditar
Samantha é um truque baixo até para você, mas veja, parece que eu acabei
com seus planos quando a afastei de vocês, não?
— Leve-me embora! Você é um louco que inventa coisas! — ela grita
perdendo a compostura. Sorrio friamente para ela. Acho que consegui
perturbar a moça agora.
— Claro, esse é um país livre. — Abro a porta fazendo uma mesura
para ela sair. Levo-a para fora do prédio e aceno para um táxi. — Sinto não
poder levá-la de volta.
Aponto para ela entrar no carro.
— Vai se arrepender, Carl O’Neal — ela fala com raiva quando entra
no táxi e ele arranca. Vejo o carro discreto seguir o táxi e agradeço a Roger
por colocar alguém na cola da megera. Agora é só esperar ela começar a ficar
nervosa e pisar na bola. E ela vai.
Pego meu telefone e ligo para Roger, ele atende imediatamente.
— Conseguiu alguma coisa com a moça?
— Nenhuma confissão, mas ela está visivelmente nervosa e agora é a
hora de conseguir algumas provas.
— Tenho um homem seguindo-a, se tudo correr como planejado e ela
for a pessoa por trás dessas ameaças, vamos pegá-la — ele faz uma pausa. —
Carl, deixe a polícia fazer seu trabalho, essa ideia de falar com ela também
pode culminar em um ataque à sua cliente. Isso terminará logo, consegui
colocar uma escuta na casa, se for alguém de lá, teremos nossa resposta o
quanto antes.
— Samantha não é minha cliente — esclareço.
— Imaginei, ninguém leva uma cliente para sua própria casa. — Eu
tinha que rir disso. Ele não conhecia Bruno? Pois esse levou sua viúva para
morar com ele, mas desconfio que tudo foi uma desculpa para entrar na
calcinha dela, ela não teve a menor chance com aquele pervertido. Mas eu
tenho de admitir, o cara estava apaixonado.
— E ninguém vai atacar Sam, posso garantir para você.
*
Depois de desligar vou para a empresa. Trabalho tentando manter a
mente longe de Sam por um dia, ao menos, mas parece impossível, pois a
cada segundo me pergunto se fiz bem em deixá-la com outros seguranças.
Porém nossa situação tem de ser colocada em perspectivas para serem melhor
compreendida. Passo o resto do dia trabalhando com Souza e volto para o
apartamento por volta das oito da noite.
E encontro-a em um mau humor terrível.
34
Samantha
Quando Carl sai, empurro minha cadeira de volta para o quarto e
fico na janela olhando para fora. Estou chateada e nem sei por qual motivo,
só estou com esse aperto no peito desde ontem quando ele não respondeu
minha simples pergunta. Ele se mantém frio e quente, exaspera-me e fico
chateada demais. E para piorar ele simplesmente me deixou aqui com
estranhos. Ele está se afastando intencionalmente?
As questões se acumulam em minha mente deixando-me ainda mais
de mau humor.
Rodo a cadeira no quarto e vejo um controle remoto em cima de uma
cômoda, pego e aperto aleatoriamente, não vi nenhuma TV nem som no
quarto, mas devo ter ligado algo pois uma voz feminina começa está
cantando.
Remember when you used to say
Lembra quando você costumava dizer
You know our love can save it all
Você sabe que nosso amor pode salvar tudo...
Desligo o som e deito na cama. Estou há um tempo deitada quando
ouço uma batida e, sem nenhuma cerimônia, a tal segurança entra no quarto.
Ah, agora lembrei o porquê estou tão chateada. Estou com ciúmes da
mulher e ela não fez nada além de respirar.
Controle-se, Samantha, você não é uma mulher das cavernas.
Sorrio para ela.
O dia será longo sem meu segurança aqui.
— Senhorita Stollen, vim verificar se precisa de algo — a segurança
fala quando entra no quarto. — Tudo bem?
— Estou ótima, você poderia bater antes de entrar da próxima vez —
digo jocosa e ela levanta as sobrancelhas bem delineadas com o meu tom.
— Incomodo a senhora? — ela pergunta diretamente. Bem, pelo
menos não estávamos sendo hipócritas. Eu estou imaginando milhões de
imagens dessa mulher ao redor de Carl e não estou sabendo lidar com esse
sentimento. Dez anos e ele deve ter tido várias mulheres iguais a ela
rondando por perto, trabalhando com ele. Seriam mulheres assim que ele
gostava agora?
— Talvez, vai depender — digo e a olho firme. Pare, Sam, deixe de
ser louca e ciumenta. Digo internamente, mas minha boca desobedece meu
cérebro e me vejo perguntando: — Conhece Carl há quanto tempo?
Ela parece confusa um momento e logo parece compreender a
situação.
— Não sei onde essa conversa vai dar, contudo posso imaginar o que
está havendo, senhorita Stollen. — Ela vem para perto da cama. — Eu acabei
de conhecê-lo, se isso a deixa menos preocupada. E mesmo que o conhecesse
há mais tempo, não me envolvo com pessoas do trabalho, quero deixar isso
claro. Não que precise dar satisfação de minha vida pessoal, porém para que
possamos não ter nenhum mal-entendido.
— Ah — digo um pouco sem graça, estava me sentindo igual um
animal marcando território, agora estou um pouco envergonhada.
— Então já que deixamos isso claro — ela faz um gesto casual —,
podemos trabalhar sem nenhum percalço.
— Espero que sim.
— Se caso precisar de alguma coisa, estarei logo ali no corredor,
basta apenas chamar. — Ela acena com a cabeça e sai assim como entrou. Ela
era tão séria e esquisita.
— Olá — chamo depois de dez minutos que Angelina saiu. A porta
abre e ela entra outra vez. — Você pode conseguir um computador para
mim? Ou um celular que possa usar internet? Qualquer coisa.
— Vou ver o que posso fazer, senhora. — Assente saindo novamente.
Ela volta depois com um tablete e nem quero saber onde ela arranjou.
Passo o resto do dia verificando meus e-mails, falando com alguns
dos patrocinadores e organizadores dos meus concertos e raiva começa a fluir
através de mim. Zara não tinha feito nada sobre a minha decisão de parar de
tocar. A desculpa que ela deu foi que eu tive um acidente e precisei de um
tempo, que daqui alguns meses voltaria a viajar e fazer meus concertos, como
mamãe tinha comentado.
Ligo para Zara e ela não atende, o que apenas aumenta meu mau
humor. E para completar Carl passou o dia todo fora me deixando trancada
nesse apartamento com três estranhos. Estou começando a pirar com esse
isolamento.
Quando Carl se digna a aparecer é noite e estou bufando de tão mal-
humorada.
— Ei, carinho — ele diz quando entra na sala onde estou sentada. Ele
vem e senta ao meu lado plantando um beijo nos meus lábios, indiferente aos
seguranças ali perto.
— Oi — digo aborrecida. — Pensei que não voltaria nunca.
— Um homem tem que trabalhar — ele diz rindo. — Vejo que sentiu
minha falta e está de mau humor.
— Passar o dia isolada com estranhos tem esse efeito nas pessoas.
— Ok, amanhã pode sair e passear — ele diz irônico. — Sam, precisa
ter calma.
— A única coisa que quero é falar com minha agente, e para ontem.
Preciso que traga-a aqui ou leve-me até onde meus pais estão morando.
— Faremos isso, mas preciso que espere um pouco. — Ele desabotoa
a gola da camisa ao redor e aponta para os seguranças. — Vocês estão
dispensados por hoje. Cheguem cedo amanhã.
Os dois que estavam por perto dão boa noite e saem. Angelina
também.
— Correu tudo bem durante o dia? Cuidaram bem de você? — ele
pergunta quando volta sua atenção para mim outra vez.
— Entediante. Não irei ficar aqui muito tempo. E sua preocupação foi
muito tocante o dia todo, senhor O’Neal — alfineto.
— Nisso concordamos. — Ele levanta e abaixa, pegando-me no colo.
— Agora venha cá. Preciso de um banho e você deve deitar.
— Tenho cinco anos para dormir a essa hora?
— Quem falou em dormir, carinho? — Ele me aperta contra seu peito
musculoso no caminho para o quarto. — Estou planejando passar a noite em
claro.
— Sei... — Minha respiração engata quando alcanço seu pescoço e
mordo levemente sussurrando com voz suave. — Eu preciso de você.
Ele me coloca deitada na cama e vem para cima de mim, seu peso é
delicioso, tomando minha boca na dele em um beijo feroz, sua língua me
deixando quente e excitada. Seus lábios sensualmente descem por meu
queixo e pescoço com pequenas mordidas, fazendo gemidos brotarem de
minha garganta. Os dedos fortes nos botões da minha blusa trabalham
rápidos, revelando que estou sem sutiã por baixo, meus mamilos reagem
duros quando a boca dele se fecha sobre um deles sugando com fome. —
Senti saudade disso, carinho. Quero te fazer gritar apenas comendo seus
mamilos deliciosos.
Gemo desesperada por mais, arqueio minhas costas dando mais para
sua boca quente e faminta.
— Não tenho o suficiente de você... — murmura rouco e eu
estremeço de antecipação, querendo mais de sua boca em mim, como uma
viciada. Eu que não tenho suficiente dele, eu sempre quero mais e mais.
Ele desce a boca úmida por minha barriga, beijando o caminho para
baixo, ele enterra a língua dura na cavidade do meu umbigo e levanto
involuntariamente meu quadril. Uma das mãos dele está amassando um dos
meus seios, enquanto a outra sobe pela lateral de minha coxa, levando a saia
junto. — Quer minha boca devorando você, carinho?
— Sim... — ofego agarrando um punhado de seus cabelos. Ele desce
mais e beija meu monte por cima da roupa e se livra do meu aperto em seus
cabelos.
— Preciso de um banho antes — ele avisa levantando-se. Não
acredito!
O volume do seu pau em sua calça me faz salivar de ansiedade.
— Carl, eu não posso esperar. Pode ter esse banho depois? —
Contorço-me na cama, querendo ele de volta. — Amo seu cheiro, não
importa quantos anos ficar sem tomar banho.
Ele gargalha divertido e começa a tirar a roupa. Desabotoa a camisa
lentamente me olhando nos olhos, seus dentes mordem o lábio inferior
sensualmente e seu sorriso cínico é de quem sabe que está me torturando. Sua
ereção parece agigantar por trás do tecido de sua calça. Estou quente, ansiosa
de sentir ele dentro de mim. — Fica linda toda excitada assim, Samantha,
poderia passar a noite apenas te olhando...
— Quero você dent... — Ele joga a camisa no chão e eu olho
abismada para a tatuagem ao lado do seu abdome, era uma pequena tatuagem
preta de uma mulher tocando um piano de cauda e isso me deixa totalmente
sem fala. Ele tinha marcado sua pele com algo que lembrava a mim. O que
significava isso? Era bom ou ruim?
Eu não tinha visto Carl sem roupa desde que minha visão tinha
voltado ontem. Por isso não tinha visto e tampouco ele falou a respeito. Ele
percebe que estou olhando para sua costela e sabe que vi sua tatuagem.
Abro minha boca, mas nenhum som sai antes que eu formule uma
pergunta
— Não é grande coisa. — Ele aponta para o desenho. Toda excitação
que estava sentindo parece desaparecer.
35
Carl
Eu tinha todo um discurso sobre essa tatuagem, caso um dia
Samantha a visse, mas nada como o que saiu da minha boca, a alegria parece
extinguir dos olhos dela quando minto sobre a tatuagem. Mas quando a fiz,
não foi por romantismo, tinha feito para me lembrar do porquê não poderia
baixar minha guarda com outras mulheres, apesar que, com o tempo, a
silhueta da mulher ao piano era tudo que eu tinha de Sam e passou a ter um
significado todo especial. Mesmo com todo ódio que nutri por ela tanto
tempo, meus sentimentos eram dúbios, eu sentia atração e repulsa na mesma
medida e com a tatuagem não era diferente.
Eu a fiz há mais de sete anos em uma das folgas das Forças Armadas
e fiz para nunca esquecer, talvez nem precisasse. Eu não precisei olhar para a
tatuagem para lembrar dela, não, porque ela nunca saiu da minha mente
fodida.
Agora dizer que não era nada, estava magoando-a. Ela baixa os olhos
feridos e sento na cama ao seu lado, seguro seu queixo para que me olhe.
Pego sua mão na minha outra mão e beijo a palma levando-a ao meu peito.
— Isso não tem importância, é apenas tinta. A única marca que
importa para mim é essa aqui. — Bato levemente sua palma em cima do meu
coração. — A única que vale a pena e garanto, carinho, que foi escrita a ferro
e fogo para sempre.
Eu não queria falar desse jeito, mas sua dor já não me dava nenhum
prazer. Eu não consigo deixar tudo ir embora, mágoa, raiva e tristeza. Eu
preciso perdoar, parar de lutar, de correr do sentimento de medo, de nova
decepção, mas, caramba, como era difícil abandonar velhos hábitos.
— Carl... — ela balbucia os olhos cheios de lágrimas contidas —
mas...
— Quando a fiz não foi com o coração cheio de amor, Sam, era pura
raiva que sentia, então não importa para mim, eu prefiro essa aqui, a única
que importa. — Bato outra vez com nossas mãos juntas no meu peito. Atraio
sua cabeça para mim e saqueio seus lábios trêmulos. Quero marcá-la da
mesma forma que ela faz comigo, mas no fundo as velhas lembranças são
vivas demais, deixando esses momentos agridoces. — Mas ainda assim,
nunca me desfarei dela, ela agora faz parte de mim.
Ela sorri como a minha Samantha de dez anos atrás, seu rosto brilha
suave e me estapeio pela mancada, eu quero ser duro com ela, mas não
consigo.
— Você é linda quando sorri assim, carinho. — Acaricio a bochecha
macia com as costas dos dedos e traço cada ângulo do rosto dela. — Nunca
esqueci cada traço seu, esteve vivo em minha memória cada segundo. —
Encosto suavemente meus lábios nos dela beijando lentamente, poderia
passar a noite inteira apenas beijando-a.
Amar Samantha era tão natural em mim quanto odiá-la. Nessas
semanas juntos o amor vinha superando o ódio tão facilmente. Eu estava
cansado de lutar, porque escolher amar alguém não é achar que a pessoa será
perfeita o tempo todo, não, temos de saber que essa pessoa cometerá erros,
pois nós também vamos errar. Ela sempre foi perfeita para mim e no dia que
ela errou, ou melhor, nós erramos, eu enlouqueci de raiva e o amor deu lugar
ao ódio que alimentei por anos. Não foi só por culpa que tentei mantê-la
segura, isso qualquer outro cara poderia fazer, eu não tinha de levá-la para
minha casa, mas quem disse que estava pensando racionalmente? Não, todo
esse trabalho foi uma forma de mostrar para ela o que tinha perdido me
deixando anos atrás.
Daí me pergunto será que ela realmente se importa com isso? Agora
que sabia que nós, provavelmente, fomos vítimas de alguma alma venenosa,
esse sentimento negativo que sentia por ela estava cada dia mais fraco.
— Eu te amo — o sussurro dela me deixa duro no lugar. — Nunca
deixei de te amar, querido, estou pronta para você, sempre estive pronta.
Eu perco o resto de controle que eu tenho e a beijo com força, rude, o
som de nossas bocas juntas. O som molhado me deixa igual uma barra de aço
de tão duro. Cubro seu corpo com o meu moendo meu pau contra a junção de
suas coxas, ela tem a boceta mais deliciosa que já experimentei, e esse
pensamento só faz com que eu a beije profundamente, nossas línguas
enroscadas uma na outra. Sam ergue seu quadril ganancioso para mais
contato e nós dois gememos juntos. Levanto e retiro o resto das minhas
roupas, voltando para cama, preciso fodê-la mais do que eu quero respirar.
Não perco tempo com mais preliminares e só a monto como um animal
faminto e estoco meu pau até o fundo nos fazendo gemer alto...
Minha fome dela só aumenta quando me movo rápido e duro, seu
corpo delicado está tenso de tesão, a pele arrepiada. Inclino-me e provo seu
mamilo rígido que estão duros, esfrego minha língua neles, insaciável, até
sentir seu canal estrangular meu pau.
— Porra, Samantha... — Quero devorá-la inteira enquanto ela pulsa
em torno de mim. Puxo-a e volto a saquear seus lábios inchados dos meus
beijos, mordo-o levemente entre meus dentes, cada toque parece intensificar
cada vez mais nosso desejo pois viramos uma bagunça gostosa pra caralho.
Ela explode gritando rouca e isso dispara como um tiro por minha
espinha, quente e intenso, minha própria carga dentro dela.
*
Estamos deitados quietos, o rosto de Sam enfiado no meu pescoço,
sua respiração tocando minha pele. Sei que ela não está dormindo ainda
porque sinto seus dedos correndo pelo meu peito levemente.
— O que você irá fazer depois que toda essa confusão passar? — Não
deveria ter feito essa pergunta, eu temo já ter a maldita resposta. Porque pode
muito bem ser “foda-se, Carl” e partir outra vez por mais dez anos.
— Quando eu resolvi vir para o Brasil, já tinha em mente dar um
tempo na música, não parar de tocar, mas fazer outras coisas — ela fala. —
Eu havia planejado colocar um ponto final no que tinha deixado inacabado
aqui.
Ela não respondeu minha questão, mas continua falando. — Eu ainda
tenho alguns dos planos iniciais como parar com tantas viagens, que era a
única coisa na minha vida de musicista que eu não apreciava.
— Muita gente adoraria ter a possibilidade de viajar o mundo.
— Não falo de conhecer lugares, isso era maravilhoso, falo das
viagens cansativas, de nunca parar para conhecer de verdade tantos lugares.
— Ela levanta a cabeça olhando-me. — De que adianta ter o mundo aos seus
pés se você não é totalmente feliz?
— Mas era o que sempre sonhou, Samantha, ser famosa — digo.
— Naquela época tinha uma outra visão da fama, pensava que poderia
ter tudo, fama, minha música e você — ela fala com tristeza. — Eu achei que
tudo estaria igual quando voltasse, acho que subestimei muitas coisas.
Não digo nada e ela desvia os olhos voltando a enterrar a cabeça na
curva do meu pescoço, ela aperta-se mais contra mim como se quisesse
fundir nossos corpos.
— Mas além da música eu também quero esse cara que me olha como
se eu fosse única, como eu fosse sua coisa favorita na terra, esse cara que
mesmo dizendo que me odeia me protege, eu ainda quero tudo afinal de
contas. Só não sei se vou ter, mas irei tentar até o fim.
— Você nunca deixou de ser minha coisa favorita, senhorita Stollen.
— Seguro seu queixo trazendo sua boca para a minha. — Nunca canso de te
querer.
Tudo o que eu queria fazer era segurá-la aqui para sempre, onde
ninguém mais existia, onde era apenas nós dois.
*
Samantha ainda dormia profundamente quando acordei na manhã
seguinte. Dormia de bruços, as costas delicadas à mostra me fez inclinar e
beijar sua omoplata. Ela solta um gemido e continua a dormir com um
suspiro suave. Sorrio e levanto, depois de um banho vou encontrar os
seguranças que já estão no apartamento. Faço, como de hábito, o café da
manhã da minha “coisinha favorita no mundo” escolhendo o que ela gostava,
tudo saudável, não era à toa que mantinha aquele corpo todo gostoso apenas
para mim.
Enquanto espero, ligo para Roger a fim de verificar se tem alguma
novidade sobre Zara, se ela mordeu nossa isca. Falo com Roger durante uns
bons cinco minutos, mas ele não tem nenhuma novidade. Volto para o quarto
e levo uma bandeja com o café de Sam, tenho de me preparar para sair daqui
a pouco.
Ela ainda está do mesmo jeito que a deixei, mas eu tenho de acordá-la
e conversar sobre sua vontade de falar com Zara, ter essa reunião com a
agente pode não ser bom agora que deixei ela saber que estamos de olho.
Zara era muito esperta, não viria falar com Samantha e confessar que era o
perseguidor. Eu tenho de mostrar minha antiga carta para ela, já que sua visão
voltou, ontem eu não a peguei, mas preciso mostrar para ela o quanto antes.
— Bom dia, dorminhoca — digo quando deposito a bandeja na
mesinha e sento ao seu lado na cama.
— Carl, é madrugada — ela geme tentando voltar a dormir.
— Preciso sair, Samantha, e precisava falar com você. — Beijo a
ponta de seu nariz e seguro sua mão entre as minhas. Olho nossas mãos
juntas e são tão diferentes. Deposito um beijo na palma macia, deixando
minha língua tocar o centro de sua mão, sinto seu estremecimento pelo ato
sensual. — Olhe, sei que já está mais que na hora de você ter uma conversa
com Zara sobre tudo, mas eu preciso de tempo, ontem eu falei com ela. Roger
e eu estamos tentando descobrir algumas coisas por meio dela...
— Carl, eu não posso deixar isso acontecer, irei falar com ela hoje,
nem que eu tenha de ir até ela, não posso viver escondida aqui como uma
criminosa, eu que pareço a criminosa me escondendo de todos, tenho de
tomar as rédeas da minha vida de volta. — Ela levanta exasperada. — Não
podemos esperar mais com isso.
— Acha que ela simplesmente vai dizer que é a responsável de ter
mudado o conteúdo de uma carta de anos atrás endereçada a mim? E que
agora ela resolveu interferir, mais uma vez, passando-se por um louco
ameaçador? — Estou bravo também. — Ela não confessará nada, pode
acreditar.
— Não é sobre isso que estou com raiva e preocupada, Carl. É a
atitude dela com relação a uma ordem direta que ela não cumpriu, é isso que
estou falando. — Ela me olha severa. — Estou cansada de me esconder dos
problemas, Carl.
— Você estava frágil. Estava cansada de tudo, esse tempo longe devia
te fazer bem, não mal — tento amenizar a ruga de preocupação de sua testa
delicada. — Deixe-me cuidar de Zara por enquanto.
— Não gosto disso — diz contrariada. — Mas eu não sei dizer não a
você, contudo ainda acho que deveria falar com ela, não tem nada demais.
Ela não vai puxar uma arma e atirar na minha cabeça na frente de três
seguranças, vai?
— Não fale besteira, não quero ter essa imagem na minha cabeça. —
Beijo sua testa e levanto colocando a bandeja no colo dela. — Sem Zara por
hoje, ok? Por favor?
— Tudo bem, mas não demore com essa de detetive por muito tempo
ou irei contratar outra firma de guarda-costas, essa tem um chefe muito
mandão. — Ela me mostra a língua infantilmente e eu não resisto em voltar
para cama e beijá-la implacavelmente.
— Grosso! — resmunga quando levanto, deixando-a toda vermelha,
mas tem um sorriso nos lábios.
Pego sua mão e coloco em cima da minha ereção.
— Sim, carinho, desse jeito — digo rindo e vou tomar um banho.
Estamos bem, afinal, só tenho de ser menos ogro com ela, mas, porra, dez
anos não se desfaz em pouco tempo, além de que, temos coisas mal
explicadas e uma delas irei resolver hoje.
*
Antes de ir para a empresa, vou ao meu apartamento, tenho de finalizar
algumas coisas entre Sam e eu. A carta que recebi dos pais de Sam. Talvez
ela tenha falado a verdade e não a escreveu, mas ainda quero olhar em seus
olhos quando mostrar a carta. Sim, ainda sou esse cara com pé atrás, velhos
hábitos nunca morrem. Mas eu já mudei tanto nesse período com ela que nem
me reconheço, dez anos é muito tempo para ficar preso a alguém e eu passei
como se estivesse casado com minha raiva e decepção. Não dei chance para
ninguém nem para mim mesmo. Fui tolo, eu sei. Qual homem faz isso? Acho
que nenhum.
Mas Sam me tira o chão completamente desde que a vi pela primeira
vez.
Droga, Carl! Por que é tão difícil acreditar na mulher que passou dez
anos amando? Não foi só amando, mas passei tanto tempo da minha vida
ligado a Sam que acho hipocrisia ficar com o pé atrás ainda com tudo que
estamos descobrindo ao longo das semanas. Abro o cofre e pego o papel
amarelado do tempo.
Vou para a empresa depois, porém fico inquieto igual um adolescente
e ao meio dia volto para o apartamento onde Sam está. Preciso vê-la.
Encontro-a almoçando na varanda do prédio, é um ambiente amplo com
mesa, cadeiras estofadas e sofás nos cantos, provavelmente projetado para ser
um ambiente familiar e confortável. Sam está sentada à mesa de tampo de
vidro, seus cabelos soltos só a fazem parecer mais jovem.
— Ei, querido, voltou cedo hoje, eu devia reclamar mais, um dia que
reclamei e você já chegou mais cedo — ela graceja quando me vê parado.
Vou até à mesa e sento-me à sua frente depois de beijar rapidamente o topo
de sua cabeça. — Carl, você está economizando beijos?
— Deixando acumular para depois. — Pisco levemente para ela que
tem esse sorriso que me deixa meio louco para jogá-la na cama mais
próxima. Coloco a pasta que trouxe na cadeira ao lado e cruzo meus braços
olhando-a.
— Você está radiante — constato e recebo um olhar malicioso dela.
— Eu estou, apesar de tudo, feliz. — Ela empurra o prato vazio para o
lado, e eu temo que irei ofuscar essa felicidade quando mostrar essa bendita
carta. — Eu descobri que meu ex-namorado tem minha silhueta tatuada em
seu tanquinho.
Eu rio quando aponto para minhas costelas, mas não é um riso
espontâneo. — Se chama costela, querida.
— Tanto faz. Você está preocupado com algo? Está tenso.
— Não, mas tenho algo para lhe mostrar. — Pego a pasta e retiro o
envelope pousando no tampo da mesa deslizando em sua direção.
— Isso é...?
— A sua carta. — Observo-a pegar o envelope e o ar brincalhão
sumir de seu rosto. Suas mãos agora um pouco trêmulas. Não tiro meus olhos
do rosto dela, quero pegar cada reação. Ela abre e volta seu olhar
imediatamente para mim.
— Achou que essa letra era minha?
— Essa é sua letra, está um tanto diferente, mas é sua.
— Não, não é. Essa é a letra da Zara tentando escrever como eu. —
Ela bate o papel na mesa. — Você passou quase dez anos achando que traí
nosso amor por causa disso?
Ela fica vermelha de raiva.
— Não se atreva a ficar brava quando acreditei que era sua carta,
afinal, Samantha, eu a recebi lacrada e com seu nome. Por que diabos iria
imaginar que não era sua carta? Quem diabos iria imaginar?! — Estou puto
com tudo isso.
— A única coisa que estou imaginado agora é que você não me
conhecia e nem prestava atenção em mim. — Ela está brava, não, furiosa
comigo. Que droga! Eu que sou o culpado agora? Samantha tem o dom de me
deixar na defensiva. Não sei como ela consegue isso. Ela enfim começa a ler
o conteúdo do papel. Dois minutos depois ela levanta esses olhos claros para
mim. — Ah, Carl, sinto muito.
— Não quero seu pesar, Sam, foi há muito tempo. — Era muito
tempo, contudo não deixei para lá, não é mesmo?
— Mas é a causa desse retraimento, o que ainda te impede de nos dar
uma chance...
— Já dei essa chance, por isso está aqui, caso contrário nunca
teríamos essa conversa, nunca foi uma opção para mim um dia ir atrás de
você. — Curvo-me para frente. — O que me diz de tudo que tem escrito aí?
O quanto isso é seu?
Ela limpa uma lágrima solitária no rosto e volta seus olhos para a
bendita carta.
— Boa parte são minhas palavras sim, eu queria muito seguir minha
carreira, mas eu nunca iria terminar dessa forma, esmagando seu amor por
mim — sua voz falha trêmula e puxo a cadeira para perto dela, pegando sua
mão entre as minhas. — Eu nunca seria tão cruel com você. Eu disse que
demoraria mais alguns meses para voltar, que poderia com isso atrasar nossos
planos.
— Então como Zara teve acesso a sua carta? Não foi ingênuo de sua
parte, deixa-la ter acesso a sua vida? — Meu tom faz com que ela puxe sua
mão da minha e me olhe furiosa.
— Nós duas estávamos sozinhas em um país desconhecido e, claro,
nos tornamos confidentes e amigas. Carl, as mulheres tem dessas coisas,
contar para outras sobre seus namorados. Eu não posso imaginar o motivo
dela ter feito algo tão mesquinho. Por que ela faria isso?
— Tenho várias teorias, mas a que mais acredito é que ela pode ter
uma quedinha por você? Ou por mim? — tento gracejar.
— Por você? Acho que não. Quero falar com ela, Carl, resolva logo
com seu amigo policial. Não posso esperar por mais tempo, cansei de ficar
aqui esperando acontecer algo. Ela não vai se expor assim, além disso, ela
pode não ser a pessoa que está me ameaçando. Ela poderia ser presa e ela não
é tão boba assim. Ela ama a carreira dela.
— Fui a polícia, Sam, e agora são eles que cuidam do caso, eu só
posso proteger você e esperar a investigação.
— Longa por sinal — diz emburrada. — Chateada com isso. Esse
isolamento.
— Vamos sair, nada nos impede — sugiro levantando e fazendo com
que ela fique em pé. Abraço-a fortemente sentindo o perfume do shampoo em
seus cabelos soltos. — Eu fico feliz em saber que não escreveu essa carta.
Ela não tem ideia do quanto. Estou realmente começando a acreditar
nela? Sim, estou. Meu coração parece mais leve.
Ela segura meu rosto entre as mãos olhando firme.
— Gostaria que nunca tivesse lido essa carta e fico muito triste de
você não ter me procurado e exigido uma explicação. Quantos mal-
entendidos... Por que não fomos maduros, Carl? Eu passei dez anos longe
porque eu também fui abandonada por você. Eu voltei aqui e você não me
queria mais, nem sabia onde você estava. Eu não sou a única culpada de a
gente não ter dado certo, você foi imaturo também. — Ele me olha triste. —
Eu sempre amei você, mas eu não tenho mais certeza se você me amou do
mesmo jeito. Estou decepcionada com tudo e só quero esquecer, virar a
página.
— Eu sei, querida, você tem razão, não soube lidar com a dor e
decepção, agi com orgulho maldito dizendo-me que você não merecia nada
mais de mim. Apenas bloqueei você totalmente da minha vida.
— Precisa trabalhar essa desconfiança que ainda sinto que você tem
por mim. Contudo fico feliz que esclarecemos alguns pontos, eu pensei que
seria pior. — Ela puxa meu rosto para perto. — Eu preciso de você todo,
Carl, não pela metade.
— Concordo com você, vou lhe dar tudo de mim — digo malicioso
quebrando o clima chato de antes. — Que tal irmos para o quarto?
— Querido, eu gostava mais do outro Carl, o mais novo, ele não era
tão “vamos para o quarto” era mais ousado — ela provoca puxando meus
cabelos curtos. — Essa varanda é bem legal, não acha?
Beijo-a esquecendo toda a merda de carta e quem a escreveu, eu
apenas quero provar cada pedacinho de Sam durante a tarde...
36
Samantha
Semanas depois...

Hoje é um dia libertador para mim, enfim tirei o gesso da minha


perna e agora preciso andar apenas com as muletas até segunda ordem
médica. Tinha passado o dia todo no hospital e estou sentindo-me revigorada.
A sensação que minha vida tinha parado com o acidente parece ter sido
deixada para trás. Estive tão apática, deixando tudo nas mãos de outras
pessoas que mal posso me conter de tomar as rédeas de novo e o que faço
primeiro é pedir ao segurança que me leve a casa alugada dos meus pais.
Carl não está comigo hoje, disse que tinha outros trabalhos, tem sido
assim durante essas semanas. Ele tem tralhado em outros casos com seus
amigos na empresa. Passávamos o dia longe um do outro, era muito chato
passar o dia sem vê-lo, contudo, as noites têm sido as melhores. Saímos
algumas vezes para fazer coisas normais que namorados fazem, como jantar
fora. Outro dia ele me levou no cinema. Parece que temos dezoito anos outra
vez, eu amo fazer as coisas mais simples com ele novamente. Sinto que ele
está cauteloso comigo, não se doa completamente, apesar de eu dizer lhe que
ainda o amo, ele não parece tão convicto assim. Eu quero entendê-lo, mas
ainda assim magoa-me não tê-lo totalmente. Ele me ama, sei disso também,
ele não falou as palavras, contudo suas ações falam por si só.
O carro para na frente da casa e um dos seguranças desce ajudando-
me com as muletas. O médico quer que use até andar sem dor, melhor que a
cadeira de rodas que estava usando por causa do punho machucado que não
me deixava usar uma das mãos.
— Vocês não precisam ficar, rapazes — digo para os seguranças que
me seguem para dentro. — Vou demorar.
— Somos pagos para isso, senhorita, não vamos deixá-la aqui — um
deles diz.
— Não se preocupe com a demora, Samantha — Angelina diz. Estou
me dando bem com ela agora, ela não é de todo mal. É muito linha dura,
como diz Carl, casca grossa.
— Tudo bem.
A porta da frente abre antes mesmo de alcançá-la e Zara aparece.
Ótimo. Ainda bem, ela é a pessoa que estou procurando.
Espero que Carl não fique tão bravo por ter vindo aqui, mas já dei
tempo, mais que suficiente, para ele e a polícia. E as descobertas sobre Zara
que estou acumulando estão cada vez mais difíceis de segurar.
— Olá, Zara, quanto tempo — digo quando chego na porta. Minha
vontade é acertá-la com essa muleta.
Eu ainda estou processando o que Carl me contou de que esse amigo
dele da polícia acha que Zara dorme com meu pai. Sobre a carta que ela
mudou, sobre minha equipe que não foi informada de minha possível, e
provável, saída do meio musical, que posso ir trabalhar de outra forma que
não seja fazendo concertos pelo mundo afora.
Eu não queria acreditar que ela fez tudo isso pelas minhas costas, até
agora, mas juro que vê-la na minha frente me faz não ter muitas dúvidas do
que ela pode fazer. Só quero saber o motivo de tanta mesquinhez de uma
pessoa que considerava família.
— Enfim você resolveu assumir suas responsabilidades — ela fala
como se eu fosse a errada aqui.
— Pois é, e vou começar por um lugar que você não vai gostar, Zara,
por que não entramos?
Levanto minhas sobrancelhas sugestivamente para ela.
— Sim, claro...
Ela não parece muito feliz quando eu a sigo para dentro.
Caminho devagar para dentro de casa atrás de Zara e com Angelina
em meus calcanhares. Ela leva a sério e ao pé da letra a função de guarda-
costas, raramente saía detrás de minhas costas.
— Não reclame porque tenho ordem de ir até no banheiro com a
senhora — ela resmunga apenas para que eu escute. — E eu sigo as ordens
sempre. Os outros vão ficar de olho ao redor da casa.
— Tudo bem, não ia pedir que saísse — comento não me importando
com seus atos, era perda de tempo e energia tentar impedi-la.
— Seus pais infelizmente não estão, Sam. Mesmo eles não estando
aqui posso garantir que estão preocupados com seu isolamento com Carl,
esse homem aparece do nada e leva você com ele, provavelmente é o único
que enviou esses e-mails — Zara para na sala de estar com as mãos no
quadril, falando essas asneiras. Eu apenas termino de entrar na sala e sento
calmamente no sofá rebaixado cor café que há na sala. A decoração é
simples, porém requintada, nota-se que não é baixo o valor desse imóvel e,
bem, devo estar pagando por todo esse conforto. Como de costume.
Eu quero rasgar esse ar de inocência dela, minha vinda aqui está indo
contra a vontade de Carl, ele não percebe que Zara não será descuidada agora
que ela sabe que estamos juntos? Que ele desconfia dela?
Quando ele chegou, semanas atrás, com a carta que ele guardava por
anos, eu queria vir aqui e arrancar sua confissão depois a despedir
sumariamente.
Olho para Zara e a raiva recomeça a construir lentamente, estava,
durante todas essas semanas, fervendo em fogo brando e hoje eu posso
explodir como nunca fiz em toda minha vida. Estou me sentindo enganada,
usada por uma pessoa que considerei como uma irmã um terço de minha vida
e nunca foi sincera comigo, apenas me usou quando teve chance, mas a raiva
não é só dela, é de mim mesma também. Por estar cega por um sonho e um
amor que no fim não soube conduzir. Meu terceiro dia naquele apartamento
novo foi um dos dias mais difíceis por ter de esperar o momento certo para
confrontar Zara, minha suposta melhor amiga e agente. O que descobri ao
longo dessas semanas têm sido como um belo choque de realidade. A carta.
O possível caso dela com meu pai. As minhas ordens não atendidas e o
quanto ainda não sei por deixar ela cuidar de tudo para mim? E agora ela
culpa Carl?
— Por que não senta aqui, Zara? Você está nervosa? — Aponto
porque ela está em pé e isso só me deixa mais irritada, mostra que ela está
preocupada com algo e desconfio que ela esteja se perguntando o quanto Carl
disse para mim.
— Claro. — Ela acata minha sugestão e senta à minha frente. Se eu
não tivesse com receio de quebrar a outra perna daria umas boas “muletadas”
em sua cabeça maldosa.
— Por que não começa me explicando porque não seguiu minhas
ordens expressas sobre meus contratos, Zara? — Começo com o assunto mais
fácil, porque se eu começar esfregando essa carta na cara dela vou perder
toda minha compostura.
— Sabe que sempre penso no seu melhor, Sam, esse é meu trabalho
— ela diz como se tivesse ofendida.
— Você é paga para fazer o que eu peço para ser feito — retruco
furiosa. — Não vou voltar a fazer concertos, deixei claro desde que aceitei
essa última turnê, mas você continua sem informar para ninguém sobre isso.
Toda uma equipe achando que continuam trabalhando para mim, quando na
verdade deviam ter sido devidamente informados por você.
— Você já mudou de ideia outras vezes quando disse que pararia,
Samantha, por que seria diferente agora? Mas eu deveria saber, sempre quis
vir para esse lugar atrás de um homem como uma mulherzinha que não pode
viver sem um homem em sua vida. Você tem o mundo aos seus pés, mas joga
fora por causa de um homem? — as palavras são ditas com ausência de
emoção. Ela acredita mesmo nisso? Eu fico preocupada com tudo que deixei
Zara decidir sozinha, sem nunca questionar as decisões dela como minha
agente, acreditando que seria melhor para mim.
Mas de tudo que ela disse, algo mexeu com meu já estado de mau
humor.
— Como se atreve?! — Como ela em coragem de falar assim, devia
me agradecer por ter um emprego que lhe fornecia uma vida de luxo. — Foi
por isso que mexeu em uma carta particular, Zara? Foi por isso que teve a
ousadia de interferir na vida de outras pessoas? Na minha vida?
— Não sei do que está falando — ela devolve ainda sem qualquer tipo
de afeto em seu tom apático, entediado. — Seu namorado me culpa por você
deixá-lo? Não contou para ele que você preferiu a música e não ele?
— Você me odeia, Zara — constato isso claramente agora. — Você
me odeia e ficou ao meu lado por quase dez anos?
— Odiar você? Não, Samantha, isso seria sentir alguma coisa. — Ela
levanta e vejo Angelina dar um passo para frente como se preparasse para me
defender. Eu tinha esquecido de sua presença. Ela ri para Angelina,
desdenhosa.
Retiro a carta que tenho comigo desde que Carl me entregou e mostro
para ela.
— Reconhece isso? Não acha que está na hora de me falar a verdade.
Por que imitou minha caligrafia e escreveu o que não deveria estar aqui nesta
carta? — grito furiosa. — Como se atreveu? Eu, diferentemente de Carl,
reconheço muito bem sua letra, Zara!
— Você é tão dramática, Samantha, fiz um favor para você. Fiz de
você uma mulher rica com tudo que lutei e corri atrás para você, dedicação
total a sua carreira, sem outro cliente, e não agradece — ela devolve. —
Ainda reclama quando alguém te fez um favor e não deixou você cometer a
maior burrice de sua vida.
Tenho vontade de rir da sua ousadia.
— Certamente você tocava piano para mim, não é? — pergunto
irônica. — Por que fez isso? Você não pode continuar negando o óbvio,
como pode ser tão cínica?
Levanto trôpega, meio desajeitada com as muletas, quero arrancar
esse sorriso dela, mas era provável que ela levasse a melhor sobre mim.
— Você é tão ingênua? Mas eu só vi a oportunidade quando surgiu.
Nós duas estrangeiras na escola de música, você foi a escolhida para
continuar e eu ia voltar para casa e, se quisesse continuar no meio musical,
teria de tentar a sorte por aqui, mas não queria voltar, eu queria continuar fora
do Brasil. Eu sabia que você ia jogar fora a oportunidade que era para ser
minha. Eu falava com seus pais muitas vezes e, claro, sabia dos seus planos
de voltar e casar com esse cara de quem vivia falando dia e noite como uma
tonta. Contei para seus pais que você não ia seguir com a carreira que eles
tanto queriam para você e eles ficaram loucos — ela conta. — Você acha que
a ideia de mudar a carta foi minha? Não, Samantha, sinto informar que
apenas segui uma sugestão de seus pais que não gostavam de vê-la com Carl,
imagina deixar uma carreira promissora por um namoradinho de escola.
Eu volto a sentar e dor dilacera minha alma.
— Por que não espera eles chegarem para terminarmos essa
conversa? Gostaria de vê-la quando eles assumirem que tem mais culpa nisso
que eu.
— Você dorme com meu pai? — eu pergunto por perguntar, porque
agora se alguém me dissesse que eles jogaram a bomba de Hiroshima eu
acreditaria. Eles não poderiam me chocar mais. Minha mãe e meu pai, eles
mentiram todo esse tempo e tudo para quê?
Preciso de ar ou vou desmaiar na frente dessa cobra.
— Quem lhe disse isso está mentindo — ela diz. — Mesmo se fosse
verdade não confirmaria isso para você.
— Eu vou acabar com você — eu digo entredentes, levantando. Vou
atacá-la onde mais dói nela, nessa sua carreira de agente mentirosa e
trapaceira. — Vou acabar com sua vidinha medíocre, Zara.
Digo e vou cumprir, não vou bater nela como uma pugilista apesar da
vontade.
— Cuidado, Sam, não gosto de ameaças.
Ela era demais. Filha da mãe.
Eu não posso bater, mas sei quem pode dar um soco nessa sua cara-
de-pau. Só pelo desaforo da maldita.
— Angelina — chamo e começo a andar para fora, eu já sei tudo que
preciso saber dessa mulher. — Poderia fazer algo por mim?
Olho para minhas mãos ocupadas com as muletas e volto meu olhar
sugestivo para a segurança que está de pé ao meu lado. Ela não precisa de
explicação.
Ela vai com tudo para cima de Zara, acertando um verdadeiro soco
nela. Ai, ela era forte. Vejo Zara cair para trás amaldiçoando.
— Está demitida, querida — cantarolo saindo por onde tinha entrado.
Pena que papai e mamãe não estavam aqui. Mas esses dois têm muito que me
explicar.
Sento no banco detrás do carro com Angelina e olho para sua mão.
Acho que irei ter umas aulinhas de socos poderosos com ela.
— Obrigada por isso — digo apontando sua mão.
— Adorei bater na galinha cacarejante. — Ela sorri pela primeira vez
desde que eu a conheci.
Apesar da raiva e decepção, também estou sorrindo quando o carro
entra no tráfego. Porém, quando chego no apartamento, dou vazão as
lágrimas que contive até agora de decepção pelos meus pais. Eu não esperava
isso deles. Nunca.
37
Carl
A filha do Bruno nasceu hoje. Ele está tão metido a besta que tenho
vontade de acertar um soco de tão meloso que o cara se tornou. Como
trabalhei com ele algumas vezes ajudando a proteger Alicia, estou meio
sentimental com a menina deles. Enquanto estou parado olhando através do
vidro, onde tem uma enfermeira cuidando dos bebês lá dentro, fico
imaginando que se tivesse seguido o curso da vida, lá atrás, há dez anos, eu
teria uma garota ou garoto, quem sabe os dois, com Sam. O pensamento
invoca uma imagem de uma garota igual a ela, talentosa e linda.
Observo o berçário mais alguns minutos e depois volto para a sala de
espera do hospital onde os pais de Bruno estão aguardando. Não entendo o
que eles fazem aqui, afinal Bruno não os suporta. Foi um ano complicado
para Bruno com o ódio do seu irmão Deni e a ameaça sobre Alicia. Ainda era
provável que acontecesse algo, Deni é imprevisível, por isso estou aqui.
Quando todos estiverem bem, irei apresentar Sam para todos. Eu
tenho mantido meus amigos no escuro sobre ela, mas estarei mudando isso.
Cada dia eles querem saber mais sobre a mulher misteriosa da minha vida.
O celular vibra no bolso e puxo, verificando. É um dos seguranças e
meu coração salta no peito. O que será que houve?
— O que houve? — digo preocupado quando atendo.
— Nada demais, mas a senhorita Samantha já chegou do hospital —
diz e hesita.— Ela, bem, ela foi na casa dos pais. Teve uma conversa com a
agente.
O quê?
— Porque diabos deixou Sam falar com ela? Eu disse para todos
vocês que Zara estava proibida de chagar perto de Sam. — Eu esqueço onde
estou e falo alto recebendo olhares ameaçadores das pessoas. — Onde Sam
está agora?
— No quarto.
— Estou indo para aí. Ela está bem?
— Aparentemente sim — diz. Desligo muito puto. Sam e sua
teimosia.
Que merda!
Marcho para fora do hospital, pronto para torcer o delicioso pescoço
de Sam.
*
Entro no apartamento e Angelina vem ao meu encontro.
— Senhor O’Neal, não pude dizer não a senhorita Samantha, ela é
bem insistente. — Ela segura meu olhar, mas vejo que está chateada. —
Porém não aconteceu nada demais, além de uma discussão entre ela e Zara.
— Devia ter sido informado que iam sair do planejado. A polícia
tinha um plano que agora pode ter sido arruinado, podendo até custar uma
vida, Schneider — digo aborrecido passando por ela. — Onde está Sam?
— Senhor, não querendo questionar a decisão tomada por vocês, mas
a família de Sam pode ser a responsável pelas ameaças. A conversa das duas
hoje leva a crer que podem ser os próprios pais que estão envolvidos nessa
ameaça à vida dela. Que pode não ser uma ameaça real, talvez seja tudo um
plano da família para Sam continuar na sua carreira.
Paro e volto-me para ela.
— Zara admitiu isso?
— Ela não falou sobre os e-mails, mas admitiu sobre uma carta. —
Angelina franze a testa em aborrecimento. — Eu não fiquei sabendo sobre
essa carta nas informações sobre o caso.
— Vou falar com Samantha agora. Fiquem atentos, essa mulher pode
tentar alguma gracinha achando que Sam a demitirá — digo. — E sobre a
carta, seu trabalho é manter Samantha longe do perigo.
— Sim, senhor — ela fala irônica. — E acredito que a agente foi
demitida.
— Então nem o vento deve entrar nesse apartamento sem que haja
uma revista. Olho nas câmeras de segurança. Se ela aparecer, não a deixe
entrar.
Samantha deve estar mal com essas revelações, ainda que tudo não
seja novidade, ela mesma apontou que um dos três seria o responsável, mas
eu sempre apostei minhas fichas em Zara, seus pais nem tanto, vejo que me
enganei também.
Caminho para o quarto, agora preocupado, e a primeira coisa que noto
é a música clássica tocando. É a primeira vez, desde o acidente, que ela
voltou a escutar os clássicos, deveria ter pedido um piano para que tocasse
um pouco. Entro e encontro-a sentada na poltrona de frente para a janela,
olhando absorta para fora. Seu semblante triste me destrói por dentro, por não
poder ajudar e tirar esse ar melancólico dela.
— Ei, carinho — digo me aproximando e abaixo para um beijo cálido
em seus lábios. — Ah, vejo que descobriu enfim essas pernas tentadoras.
Gracejo sobre o gesso retirado, sento na outra poltrona e cruzo minhas
pernas em uma pose falsamente relaxada. Merda, vim todo o caminho
fumegando de raiva por ela se expor dessa forma, mas saber que os pais
estavam envolvidos em nossa separação freou toda vontade de recriminá-la.
Ela deve estar sofrendo com tudo isso.
— Ei, Carl! Você disse que tinha de trabalhar com seus amigos, mas
vive chegando cedo. — Ela me olha curiosa — Já fofocaram para você?
— Os seguranças não fazem fofoca, carinho, você que é teimosa. Eles
não deviam tê-la permitido ir até lá sem mim. Sabe que aqui dentro eu confio
totalmente na capacidade deles em garantir sua segurança, já lá fora? Eu fico
preocupado em saber que pode ser atingida e não estar por perto para
protege-la.
— Tenho vivido tanto tempo sem sua proteção, Carl, e ainda estou
aqui. — Sua amargura me toca. — Eu vivi rodeada de pessoas que não
merecem nada mais que apenas meu desprezo agora. Está doendo muito
saber que meus pais tiveram a coragem de me trair.
Levanto e a pego nos braços, voltando a sentar, acomodando-a no
meu colo. Abraço seu corpo delicado tão forte que temo quebrá-la ao meio.
— Eu sei, carinho.
— Eles não tinham direito de interferir na minha vida, eu sempre quis
tocar, era meu sonho, mas não podiam terem me magoado desse jeito. Nós
dois. — Ela se vira para mim, seus olhos úmidos. Puxo seu rosto e beijo-a
longamente, tentando tirar sua tristeza fora com meu toque.
Ela me fala do encontro com Zara e sua admissão sobre alterar a carta.
— Ela me odeia — admite por fim.
— Ela sente inveja por não ter sido escolhida para ficar na Europa —
digo revoltado. Eu devia uns pedidos de perdão a certa pianista.
— Você acredita em mim agora? — Ela parece ler meus
pensamentos.
— Eu fui um burro cego e teimoso com você, vejo agora o quanto fui
injusto. — Beijo-a novamente. Depois de um tempo olho-a e digo:— Estou
tão bravo com você.
— Não fiz nada. Aliás, vai me levar para falar com papai e mamãe
amanhã, não é? — Ela bate no meu ombro. — Você e sua mania de me
manter no casulo não vai funcionar mais.
— Só quero proteger você.
— Só irei ficar bem quando falar com eles. E expulsar Zara da minha
vida.
— Você tem um advogado? — Lembro que escutei uma conversa de
Zara.
— Temos, ele mora na Itália onde meus pais tem residência. Zara tem
mais contato com ele que eu, na verdade.
— Demita esse cara e contrate um novo aqui — sugiro. — Escutei um
diálogo entre Zara e um provável advogado falando sobre interditar você.
— Como? E por que isso? Por acaso estou demente? Que ousada! —
Ela tenta se levantar furiosa.
— Calma, leoa.
— Não brinca, Carl, isso é sério. Zara está doente. — Ela geme
desalentada.
— Preciso de um advogado para olhar todos meus negócios. Zara
pode ter feito coisas que nem quero imaginar. Tudo culpa minha por confiar
demais nela.
— Tudo bem, querida, você não é a primeira nem a última pessoa
sendo enganada e usada por aqueles que mais deviam amá-la ou querer seu
bem.
Ficamos um tempo escutando a música que tinha mudado o estilo
musical. A voz masculina embala nós dois enquanto assimilamos tudo. Uma
pergunta cutuca minha mente. Quem diabos envia os e-mails?
— Será que é a Zara? — pergunto. — Ela disse o que sobre isso?
— Não falamos sobre isso. Eu pedi apenas que Angelina desse um
soco nela. — Ela ri.
— Sério? — Sorrio.
— Humrum, eu mesma daria, porém essa muleta é um problema —
ela aponta torcendo a boca.
— A próxima vez eu seguro ela e você bate — digo sério.
Ela cai na gargalhada e eu acompanho-a. É bom sorrir outra vez com
ela.
38
Zara
Ódio mortal queima nas minhas veias.
Mal-agradecida, Samantha nunca vai entender o que fizemos por ela.
Ela acabou de tornar real as ameaças daqueles e-mails. Eu nunca tinha
pensado em fazer deles uma ameaça de verdade, mas o soco que aquela idiota
da segurança me acertou vai doer mais em Sam do ela imagina. Vou fazer
valer aquele e-mail que ameaçava Carl O’Neal. Ferir Samantha não vai doer
tanto nela do que ferir aquele namorado metido a guarda-costas dela.
Pego meu telefone e faço uma ligação.
Devo mostrar para Carl quem é mais esperto. Eu segui a sugestão dos
pais de Sam para que a separasse de Carl, mas eles perderam o controle de
tudo há muito tempo. Samantha não pode parar agora, tem contratos a serem
cumpridos, porque assumi compromissos por ela, visando seu crescimento e
consequente o meu, pois como agente e empresária dela, eu podia assumir
compromissos e apenas comunicar depois. Ela sempre acatou sem maiores
polêmicas. Mas agora? Não, esse idiota voltou para a vida dela e ela, como
sempre, ficou cega. Seus pais têm razão, ele não é bom para o sucesso de
Sam. Carl saindo de cena fará com que volte para a única coisa que ela sabe
fazer na vida. Tocar piano.
— Alô?
— Temos que nos encontrar — digo quando a voz masculina atende.
— Temos que conversar e não quero ter essa conversa por telefone.
— O que está planejando, Zara?
— Falamos depois.
Desligo depois de dizer o local do encontro e vou até o banheiro olhar
o estrago que aquela infeliz fez no meu rosto. Está começando a inchar.
Maldita guarda-costas, ela poderia ter sua lição também. Raiva contorce
minha feição. Molho o rosto e depois que seco volto para a sala. Escuto o
barulho do carro dos pais de Sam. Idiotas. Eles não sabem o que fazer
comigo. Perderam o controle, aliás nunca tiveram porque tinham culpa da
separação de Sam tanto quanto eu. Piores que eu, são seus pais. O medo dela
descobrir e odiá-los manteve esses dois na linha.
Não espero por eles. Não tenho mais paciência com esses dois.
Gostaria de saber como Carl descobriu que tive um affair com Jânio, pai de
Samantha. Não foi nada demais, mas poderia ser ruim se viesse à tona agora.
Até me encontrar com Peter, ficarei quieta. Estávamos na turnê de
Sam pelos Estados Unidos, ano passado, quando ela teve a brilhante ideia de
parar de tocar quando viéssemos esse ano para o Brasil. Segundo ela, um
fechamento. Como sua empresária, eu não podia deixar isso acontecer, ela
tem apenas vinte e oito anos, um mundo pela frente. Eu vivi dez anos sendo
sua amiga, torcendo por ela, trabalhando, e ela simplesmente queria jogar
tudo fora? Não pensei duas vezes, contratei Peter para forjar os e-mails
ameaçadores. Ele era um Zé Ninguém que queria dinheiro fácil. Ele seguia
minhas ordens de quando enviar as ameaças, mas Samantha como sempre
tinha de acabar com os planos. Teve o maldito acidente, por mais que tenha
tentado impedir, dei remédio para ela dormir, mas lá foi a teimosa e teve esse
acidente idiota. Para piorar, Carl tinha de vir com seu maldito cavalo branco
socorrer a donzela em perigo. Odeio esse homem. Ele agora vai se afastar de
vez da vida de Sam. Peter não teria escrúpulo de fazer isso acontecer, eu só
teria que oferecer a quantia certa.
Os pais dela sabem que os e-mails não eram realmente de um louco
atrás de sua filhinha, mas eles não tinham mais controle nenhum. Se
tentassem me parar eu levaria os dois juntos comigo. No fim das contas são
meus maiores cúmplices.
39
Samantha
Settle down with me
Cover me up
Cuddle me in
Lie down with me
And hold me in your arms
( Kiss me de Ed Sherann)

Jantamos sozinhos na varanda, os seguranças foram embora e nós


cozinhamos nosso jantar, não pedimos como de costume, ele tinha dado um
telefonema e, pouco depois, compras foram entregue no apartamento.
A música me acalma e ficamos sentados aqui fora por um longo
tempo, apenas vendo a luz da cidade lá embaixo. Sinto-me em um casulo,
protegida de todos, quando estou assim com ele.
— Eu não sei o que fazer agora, Carl — digo quebrando o silêncio da
noite. — Os momentos que perdemos parece ser um tempo infinito e o futuro
incerto. Não sei onde tudo isso nos levará.
Fico calada por um tempo. Mas estou tão impaciente que viro-me
para ele quando não tenho resposta.
— O que você quer depois daqui? Depois que tudo isso acabar e
poder sair livremente, o que você vai fazer quando eu tiver ido?
— A pergunta de um milhão de dólares é: O que você quer,
Samantha? Eu estou, estive, sempre aqui. — Ele virou o jogo para mim?
— Você sabe o que quero, eu já disse para você — retruco. Ele não
responde. Apenas levanta e estende sua mão para mim.
Coloco minha mão na dele, sem nenhuma ideia do ele está pensando
além desse olhar quente e lindo que amo mais que tudo. Há algo
intrinsecamente errado com nossa história, pois são quase quatorze anos
desde o primeiro dia que nos conhecemos e ainda não sabemos tudo sobre
nós.
Ele me leva para dentro e seguimos para o quarto. Seu rosto é
torturado agora quando ele me coloca suavemente nos lençóis, eu quero me
agarrar nele, porém, apenas nos fitamos por um longo tempo ou talvez seja
minha ansiedade que faz o tempo se arrastar.
— Queria deixar você confortável — diz à guisa de explicação por ter
me trazido aqui, provavelmente. Ele senta ao lado da cama e parece estar em
uma luta interna consigo mesmo, suspira forte e olha firme, intensamente,
causando esse frio na barriga que dá ansiedade intensa. — Eu passei dez
anos fechado dentro de mim mesmo, falando constantemente que nunca,
nunca, daria munição para que ninguém me atingisse outra vez. Ser fraco?
Não. Nunca mais. E isso só me fez mais doente de ódio por uma história
inacabada. Deixei de viver, talvez, um casamento com alguma mulher
aleatória, de ter filhos. Porque eu não dei chance. — Dor me corta quando
penso que ele poderia ter tudo isso com outra mulher. Que não fez por me
odiar, e eu sou egoísta quando sinto-me feliz por ele não ter dado chance a
ninguém, sou a pior pessoa do mundo. — Culpava você por minha vida sem
graça. Mas estando aqui, agora, com você, podendo esclarecer tudo, eu
acredito que não é por acaso. Nós tínhamos que ter esse fechamento. Para
recomeçar.
Tenho medo de não querer saber sobre recomeçar.
— Para dizer mais uma vez que ainda existe amor na nossa história.
Que passar anos amando uma pessoa não nos faz piegas, mas que o amor é
tão intenso e verdadeiro que sentimos no mais profundo do ser. Desde o
momento que te encontrei me apaixonei e o amor que eu sinto é puro, o amor
que nós sentimos, carinho, é intenso demais para acabar porque não fomos
capazes de segurá-lo.
Estou chorando tanto agora que seria cômico se o momento não fosse
tão cru. Ouvi-lo falar assim me faz querer sair e gritar do alto do prédio que o
amo com a mesma intensidade.
— Eu nunca deixei de amar cada parte de você — ele continua me
olhando nos olhos, o azul escuro é tão febril, profundo e ardente, que me
absorve completamente.
— Eu também te amo — balbucio fraca.
— O que eu quero daqui para frente? Não sei. Talvez seguir você para
o fim do mundo? — Ele se aproxima lentamente de mim. O ar apaixonado
dele dando lugar a algo predatório e eu sou a única presa disponível, eu quero
ser sua única presa. Ele para bem perto, seu hálito cheirando ao vinho que
acabamos de beber invade minhas narinas deixando-me bêbada. — O amor
que eu sinto nunca vai ter fim, Samantha Stollen...
Ele me beija apaixonadamente, tirando tudo de mim. Tornamo-nos
demasiados emocionados para falar e apesar dos meus esforços em me
conter, as lágrimas transbordam dos meus olhos. O gosto salgado faz nosso
beijo mais intenso. É emocional e quente ao mesmo tempo. Queremos nos
fundir e celebrar esse pouco de felicidade. Carl me despe devagar, como se
quisesse prolongar esse instante para sempre.
Saboreando seu gosto, movo a minha boca sobre a dele delicadamente
e sugestivamente... Aprofundando o beijo cada vez mais. Todo o meu corpo
se liberta com o calor e euforia de senti-lo tão meu. Calor derrama do meu
coração. Oh, Deus! Quanto tempo se passou desde que eu me senti assim,
amada por ele? Um calor escaldante desenvolve dentro de mim e quando ele
desliza para dentro do meu corpo, apenas o aceito profundamente. Nosso
ritmo é lento e suave, exploramos cada pedacinho um do outro sem pressa.
…Settle down with me
Cover me up
Cuddle me in
Lie down with me
And hold me in your arms…
Kiss me de Ed Sherann toca ao fundo. Sinto a música juntamente com
o toque de Carl sobre minha pele. Voltar a fazer amor de verdade com ele é
magnífico, meu corpo parece derreter de encontro ao dele pelo simples fato
de saber que pertencemos um ao outro de novo, talvez agora mais forte que
antes. Nossos corpos suados mantém uma dança lenta, suave, prazer
deslizando através de nossas veias, e gozamos juntos como uma máquina
bem oleada com as engrenagens perfeitas.
— Eu te amo — sussurro pela milésima vez para ele. Meu coração
parece enfim começar a se acalmar no meu peito. Esta sensação de estar
completa outra vez é tão poderosa.
— Você não sabe o quanto quero você, carinho. — Ele me beija
novamente e perco totalmente minha mente, mais uma vez. Seu impulso
muda e ele bate com força em mim. Ele tinha feito amor antes suave e lento,
agora ele está me fodendo do jeito que amo. — Hoje à noite eu quero me
enterrar fundo dentro de você, quero amar seu corpo, quero que sinta o
quanto quero te foder duro, te foder até que você esteja me pedindo para
parar.
— Eu não vou pedir para parar, apenas que continue, Carl. — Ofego
quando suas palavras batem em mim como um tornado deixando-me quente e
excitada.
Ele se enterra fundo em mim, mordo seu ombro quando grito pedindo
mais... Eu não quero que essa noite termine nunca.
*
Eu começo na manhã seguinte uma “operação controle de danos” e a
primeira coisa que faço são cortes. Bloqueio no banco conta das despesas que
Zara usa junto com mamãe e cartões de créditos dos meus pais. Quero que
eles venham até a mim. Zara se quiser boa vida terá de gastar seu próprio
dinheiro e, como agora ela não trabalha mais minha funcionária, não tenho
nenhum remorso sobre minhas atitudes. O amigo de Carl, Souza, me ajudou.
Descobrimos a empresa que meu pai alugou a casa e essa também será tirada
deles. Sei que estou sendo cruel, uma péssima filha, contudo a raiva de ser
enganada por todos ainda é maior que meu lado idiota de coração mole.
— Certeza que quer punir seus pais a esse ponto? — a voz de Carl me
traz de volta a realidade.
— Claro que sim, viver apenas do básico ensinará eles a respeitarem
minhas decisões e minha vida. Ensinará que ninguém pode interferir na vida
dos outros, como fizeram conosco, Carl — retruco voltando ao trabalho que
estava fazendo. Tenho toda uma equipe para comunicar minhas decisões,
algo que minha agente não fez.
— Certo, irei trazê-los aqui. — Carl senta na poltrona à minha frente
e me olha com um sorriso nos lábios.
— O quê? Qual a graça, senhor segurança? — Aponto o dedo para
ele. — Está rindo de mim?
— Não, carinho, estou apenas gostando de ver que está tomando as
rédeas de sua vida — ele diz e encosta a cabeça no espaldar da poltrona. —
Gosto de você assim, dona de si mesma. Isso é ótimo.
Eu não digo nada, apenas sorrio feliz para ele que retribui. As
lembranças da noite anterior me deixam quente.
— Eu posso pedir uma coisa? — peço marota.
— Claro, senhorita pianista — ele retruca no mesmo tom.
— Pode faltar no seu trabalho hoje? Tenho uma proposta.
— Talvez, se a proposta que irei receber for boa... — ele pisca
malicioso, levantando e chegando perto de mim. — O que a senhorita deseja?
Ele para na minha frente e olho para cima encontrando seus olhos
famintos, o azul escuro quase preto me consumindo.
— Me beije — sussurro.
— Só isso?
Sorrio quando sou levantada em seus braços e ele caminha para o
quarto.
— Samantha Stollen, faltar ao trabalho por um beijo? Acho que não,
vamos negociar.
— Sim, por favor...
Eu nunca estive tão...feliz.
40
Samantha
Sinto-me bem por estar no controle da minha vida de novo. Ou talvez
eu nunca estive no controle.
Começo a dar novos rumos para minha vida. Pedi que trouxessem
meu piano de cauda para esse apartamento, ainda não consigo tocar direito,
mas as sessões de fisioterapia que tenho ido estão ajudando bastante meu
punho. Talvez eu esteja com medo de tocar e a fisgada de dor que sinto é
apenas em minha cabeça.
Sento no banquinho à frente do piano e respiro fundo, nunca passei
tanto tempo sem tocar como agora e ainda estou meio esquisita sobre o
pensamento de que nunca mais iria tocar, mas aqui estou. Aperto uma tecla
aleatória e o som agudo me acalma. Passei esses dias planejando um novo
rumo. Não vou deixar minha música, mas quero aproveitar de outra forma. A
vida de país em país com meus concertos, durante dez anos, foi tão
desgastante. Apesar de amar minha carreira, eu me sentia só, vazia de
sentimentos, talvez por isso não me importei com as atitudes de Zara.
Meus pais estavam para chegar a qualquer momento e planejo ser
dura com eles. Eu não podia deixá-los saírem impunes, mesmo que no futuro
eu devolva tudo que tirei deles essa semana, pois não poderia deixá-los
passando necessidades. Afinal, eles são meus pais. Quanto a Zara, não era
mais minha agente e estava me sentindo ótima com isso.
Carl vem da sala que ele mantém como escritório e está sério quando
caminha para mim.
— Seus pais chegaram — ele informa fazendo-me engolir em seco.
“Ok, Samantha, você consegue fazer isso.” digo para mim mesma e vou para
sala de estar espera-los.
Escuto o ding do elevador chegando e em seguida a voz da minha
mãe.
— Samantha, filha, o que está havendo?
— Olá para você também, mãe — digo sem deixar transparecer
qualquer tipo de fraqueza ou emoção, mesmo que por dentro esteja quebrada.
Não a vejo em dias e a ela só está preocupada com o que está acontecendo
com sua boa vida.
— Não seja irônica, filha, por que estamos sendo enxotados de nossa
casa? Por que estamos com cartões bloqueados? — Ela para na minha frente.
— Vejo que está bem, não tem necessidade de perguntar nada.
Será que todo carinho que ela demonstrava era ilusão? Porque essa
mulher na minha frente era uma estranha. Papai se mantém calado, com seu
jeito, e tudo me enoja. Saber que esse homem que aparenta ter uma imagem
calma manteve um relacionamento extra conjugal com Zara me faz queimar
de raiva. Olho para minha mãe furiosa.
— Antes que você exija explicações, mãe, comece me explicando por
que decidiu juntamente com papai e Zara o que era melhor para mim anos
atrás? — mordo as palavras quando elas saem.
Ela tem a decência de corar.
— Não foi bem assim...
— Então me explique como foi, mamãe? Me diga o quanto a parceira
de vocês mentiu acusando-os de interferir na minha vida!! — grito com
amargura, meus olhos ardem pois tenho um nó na garganta de pura raiva e
decepção.
— Só queríamos seu bem, o melhor para você — papai fala pela
primeira vez, por que minha mãe agora está chorando, contudo não acredito
que nada vindo deles seja sincero. Papai se aproxima. — Passamos anos
gastando em escolas de música e instrumentos caros para você. Fizemos tudo
para que estudasse em um conservatório, as despesas não eram baratas e
quando você teve a sorte de estudar, de seguir uma carreira de sucesso, o que
você fez? Pensa em abandonar tudo porque estava apaixonada. Apaixonada
não, tudo não passava de um capricho adolescente. Fizemos o certo por você.
— O quê? Acha que foi certo decidir por mim? Acha? — vocifero
indignada.
— Acho sim. Agora, dez anos depois, está indo para cometer o
mesmo erro que a impedimos antes— ele continua com desprezo na voz, olha
ao redor com semblante demostrando nojo. — Vai abandonar sua carreira por
causa de uma paixãozinha barata. Se tivesse que fazer tudo de novo, faria,
tiraria esse homem da sua vida.
— Acho que sua preocupação não é comigo, papai, é com vocês
mesmos, afinal pago a boa vida que vocês levam — aponto. — Eu sinto
muito se causei tantos gastos com o conservatório, mas acho que já paguei a
dívida, não é mesmo? Vocês me decepcionaram.
— Samantha, filha ... — minha mãe começa, porém a interrompo.
— Vocês me ameaçaram também, com esses e-mails? Porque se for
verdade, acreditem, irão para cadeia — falo duramente, não me importando
que esse seja um blefe, no fundo não deixaria que fossem presos, mas
vontade não me faltava.
Minha mãe empalidece.
— Não fomos nós, Samantha. Há muito tempo queríamos contar para
você, mas Zara sempre nos ameaçava, ela nunca foi tão dura comigo, mas
com seu pai ela era... — mamãe fala chorosa.
— Isso está cada vez melhor. — Olho para papai quando digo. —
Como ela ameaçava você, pai? Diga-me. Ela ameaçava contar que tinha um
caso com você debaixo de nossos narizes?
— O quê? — o grito da minha mãe se perde no silêncio mortal que
segue na sala.
Carl aparece e fica ao meu lado, eu sabia que ele esteve escutando a
conversa.
— O que ela está falando? — mamãe se vira para meu pai.
— Querida... — seu olhar perdido só confirma que era verdade. Zara
não tinha confirmado, mas ele agora sim. Como eles me decepcionam. Suas
justificativas eram fracas demais, eu precisava de um tempo longe deles, de
todos.
— Quero os dois fora da minha vida — digo dura. Viro as costas para
os dois e como Carl estava atrás de mim eu peço: — Tire os dois daqui.
— Samantha, não pode nos deixar sem dinheiro, como vamos viver?
Como eu vou viver ainda mais agora quando descubro que...
— Se vira, mãe, vá trabalhar um pouco para variar — respondo sem
me virar.
Enquanto Carl os coloca para fora, eu continuo no mesmo lugar
dando vazão as lágrimas silenciosas que descem pelo meu rosto. Não dou
ouvidos aos gritos da minha mãe nem as palavras duras do meu pai. Não
quero absorver nada. Não agora.
Sinto os braços de Carl, pouco depois, me levando para em direção ao
sofá. Ficamos calados por um longo tempo.
— Você está bem?
— Não, mas vou ficar.
— Estou aqui, carinho — ele fala carinhoso, beijando meus cabelos.
41
Carl
Duas semanas depois

— Você é o cara mais esquisito que conheço, O’Neal. Quando


vai apresentar formalmente essa mulher misteriosa para nós? — Alexander e
Salvatore estão sentados à mesa do bar que frequentamos, Alexander surge
com a pergunta sobre Sam. Sei que é besteira querer mantê-la apenas para
mim em uma redoma de vidro, mas é o que estou fazendo exatamente nessas
semanas com Samantha.
— Samantha teve um acidente, não estava em condições de uma vida
social agitada — dou a primeira desculpa que encontro. —Além de tudo, as
ameaças não tiveram fim e também não quis expor ela a nada que viesse
piorar sua saúde. De qualquer forma não é da conta de vocês o que acontece
entre nós.
Não quero explicar aqui meus planos com a polícia, eu só tinha dito
para eles ficarem atentos ao meu sinal a qualquer hora.
— Quer dizer para nós que ela não é a mulher que você passou dez
anos querendo matar e te impedindo de ter outra? — Salvatore pergunta
rindo, cruzando os braços musculosos na frente do peito. — Não negue,
O’Neal.
Dou um sorriso malicioso para ele, sabendo que estou cutucando a
onça digo:
— Talvez eu estivesse querendo certa loira lá da empresa. —
Encosto-me e espero a tempestade.
— Já teria arrancado suas bolas, imbecil, caso eu visse você piscar
para Lili.— Ele me fuzila com olhos furiosos e o rosto vermelho de raiva,
como era fácil deixá-lo eriçado. — Deixe minha mulher fora dessa conversa.
Rio de sua cólera.
— Você é hilário, Benacci — digo e viro para Alexander que assiste a
conversa com as sobrancelhas levantadas. — O que foi?
— Isso já se arrastou por tempo suficiente. Acho que não estão dando
tanta importância, Carl. Mande a porra toda para o ar.
Esse era Alexander.
— Roger não conseguiu as informações de onde vieram os e-mails, a
pessoa que estava enviando sabia um pouco sobre camuflar suas informações
na rede. Nem Souza conseguiu — digo chateado, porque isso impedia
qualquer passo no caso. Mas estamos de olho e já estamos de olho nos
movimentos de Zara. É questão de horas, dias, para ela ser pega.
— Espero que sim, estou ficando mais impaciente que você — ele
diz.
— Temos de ter calma, afinal, é da vida de Samantha que estamos
falando, não quero que nada aconteça com ela — digo carrancudo. — Depois
iremos cada um viver nossas vidas. Depois de tudo isso, ela pode nem querer
mais olhar em minha cara.
— Mesmo você negando, sabemos que essa mulher faz parte de sua
vida.
— Talvez. Só não sei do futuro — digo. Samantha ficou estranha
depois de ter falado com os pais. Talvez a quebra de confiança tenha abalado
ela mais do que deixava transparecer ou falar.
— Tire seu tempo, Carl, as coisas no fim dão certo para quem acredita
que vai dar certo. Devia tentar ser feliz — Salvatore diz já calmo.
— Não devia estar assumindo outros trabalhos — comenta Alex.
— Eu precisava. Na verdade eu e Samantha precisamos desse espaço,
deixar as coisas fluírem sem respirarmos o mesmo ar vinte e quatro horas por
dia e agirmos por impulso.
— Eu entendo. Quando Lana me deixou por uns dias e viajou, depois
que eu disse para ela que não a queria, o fato de tê-la longe clareou minha
mente. Percebi que preferia correr o risco do que deixar passar a vida
lamentando — ele aponta para mim. — Deveriam dar uma chance um ao
outro, Carl, quem sabe não será diferente agora?
— Concordo plenamente e já vivi uma história parecida como a sua,
Carl. O passado voltou para minha vida e não me arrependo de ter dado uma
nova chance — Sal reitera. Qual era a desses caras? Eram psicólogos agora?
— Eu amei Sam por anos e anos, parar de amar agora seria quase
como deixar de respirar — digo por fim. — Então sim, talvez tenhamos uma
chance.
Ficamos por mais um tempo em silêncio quando Alexander informa
que tem de ir embora. Quando está saindo diz:
— Lana está planejando, juntamente com Alicia, um jantar em
comemoração ao nascimento de Valentina. Apareça e leve Samantha.
— Vou ver isso — digo acenando.
— O’Neal, precisa relaxar meu camarada — Sal diz, também
levantando. — Tenho uma loira para satisfazer em casa. Vai por nós, você
precisa deixar as coisas fluírem, deixar ir.
— Obrigado, dr. Benacci — ironizo, fazendo-o rir. Imbecil
— Até mais, parceiro!
Levanto meu copo em despedida.
*
Fico no bar, terminando minha bebida, depois que Alex e Salvatore
saem. Esses dois são um pé no saco, esse era o papel de Bruno, mas ele está
bastante ocupado. Graças aos céus!
Coloco uma gorjeta na mesa para o garçom e caminho para o
estacionamento, está meio deserto a essa hora da noite, mas têm algumas
pessoas circulando. Deveria pegar um táxi para casa, em vez de dirigir, mas
não quero deixar meu carro aqui. Estou caminhando em direção ao veículo
quando sinto os pelos da nuca arrepiarem. Nunca deixei de seguir meus
instintos quando pressinto o perigo. Mas esse perigo eu quero correr, estou
esperando por ele faz um tempinho, dou um sorriso e continuo minha
caminhada. Eu sabia que um dia ela daria um passo em minha direção, mas
ela não tem ideia do que vai acontecer.
Caminho lentamente sob a luz fraca do poste. Destravo o carro e abro
a porta quando sinto a arma encostar em minha costela.
Dou um sorriso e levanto minhas duas mãos. No fim não é Zara que
me aborda.
— Me pegou, camarada — cantarolo.
Vai se arrepender, imbecil.
*
Dois dias antes...

— Ele é a única maneira de chegar até Samantha — Zara diz


esticando-se na cama. — Eu planejo fazê-la pagar pela humilhação. Estou
sem cliente e expectativa de qualquer um, pois ela fez ser conhecido para
todas as agências e contatos que eu era uma fraude, que a droguei e causei
um acidente. Acredita?
A voz dela é cheia de ódio.
— Acredito. E por acaso não é verdade? — Peter deitado ao lado dela
vira-se para olhá-la de frente. — Você a dopou e isso pode ter sido a causa do
acidente.
— Claro que não foi, ela que é tonta! — desdenha. — Você sabe
como pegá-lo, ele é muito amador, tem mantido o hábito de ir ao bar toda
semana no mesmo dia, mesma rotina, e será a chance de pegá-lo sozinho.
— E os amigos?
— Ele mantém os amigos distante pelo que andei observando há
semanas. — Zara levanta, pegando um papel e entregando ao homem. —
Terá de levá-lo a esse local. É deserto e você pode dar um fim nele, Peter.
— Sabe que a grana será grande dessa vez, não? Diferente de enviar
e-mail, eliminar alguém é outro negócio. — Peter senta-se, pega o papel e
depois de olhá-lo guarda-o no criado mudo. Sua atenção volta para Zara outra
vez. — Vamos voar juntos para Itália, depois?
— Claro que não, a partir daqui não quero que nos vejam juntos— ela
fala com um sorriso falso no rosto. — Não quero que nada manche minha
reputação de agente.
Peter ri.
— Acredita que Samantha vai recontratá-la? Você é louca?
— Claro que vai, ela não terá escolha — diz com confiança.
— Você sonha demais, Zara. Deveria pegar a grana que juntou todos
esses anos e ir se divertir.
— Diversão demais me entedia — fala categórica. — Mas faça seu
melhor, Peter. Quero Carl fora de nossas vidas para sempre.
— Claro que sim, mas não tente me sacanear, Zara, ou eu mesmo
mato você. Não brinque comigo. Seu amigo, em dois dias, terá uma surpresa,
mas eu não gosto de surpresas, lembre-se disso.
Ela lhe dá um sorriso sem graça e caminha para o banheiro do quarto
de hotel onde estavam.
— Eu nunca brinco com coisa séria, Peter. — Sim e depois que
tivesse se vingado de Sam, Peter poderia desaparecer também.
42
Carl
O cano da arma pressiona minha costela, não reajo, sei que esse é
apenas um emissário do verdadeiro criminoso e eu quero ir até ele. Essa é a
única forma de pegar Zara e seu comparsa. O cara tateia e pega minha arma
do coldre e não verifica se tenho outra arma. Ele era mesmo um cara
treinado?
— Abra a porta e entre devagar, qualquer movimento brusco eu atiro
— a voz de homem vem de trás. Eu deduzo essa frase porque o interlocutor
com certeza não é brasileiro, ele está tentando falar português.
Eu poderia desarmar o idiota, mas faço exatamente o que ele pede e
entro, sei que ele me levará até onde quero estar. A vigilância sobre Zara
detectou que ela está se encontrando com um homem. Pelas investigações ele
era americano e descobrimos que ele é um ex Seal da marinha americana com
habilidades especial como hacker, mas que tinha sido expulso por má
conduta. Não era à toa que estava impossível detectar as origens dos e-mails.
O cara estava envolvido com o crime organizado da Itália que atua nos EUA,
eles tinham algum romance ou alguma merda doentia do tipo.
Sento e rapidamente o cara está atrás de mim encostando a arma em
minha nuca.
— Dirija! — ordena. Otário.
Manobro o carro para o trânsito e pouco depois ele joga um papel no
banco ao lado. — Para esse endereço.
— Não sei onde fica, tenho de ligar o GPS, amigo — digo
calmamente. Não sabia o local exato, mas sabia que direção tomar. Porém, eu
queria atrasar o que pudesse até que Roger entrasse em ação, ou eu estaria
sozinho daqui em diante, algo que não me causa nenhum pavor. Eu ia
estourar a cara desse imbecil quando eu descesse do carro.
— Não tente nenhuma graça. — Tudo só confirma ainda mais minha
tese de que Zara contratou alguém para fazer o trabalho sujo por ela e poder
continuar dando uma de boa moça. Quando não passava de uma pilantra.
— Sinto, mas não sei onde fica esse lugar — insisto, ainda guiando o
carro tranquilamente no trânsito — Bem...?
— Faça isso, mas não tente nenhum movimento ou estouro sua
cabeça — avisa rudemente. Não me faço de rogado, ligo o GPS que não é
exatamente um GPS comum, mas um adaptado para localização que quando
acionado manterá a empresa ciente de minha localização e com isso aciona o
sinal que estou em estado de alerta. Eu estava tranquilo até perceber que ele
estava fazendo uma ligação.
— Estamos indo para o local combinado, Zara — ele fala com seu
interlocutor e mal dá para entender, mas o nome de Zara é muito nítido. Ele
escuta e depois de resmungar algo ininteligível coloca o aparelho no meu
ouvido. A voz de Zara é muito clara do outro lado:
— Sabe o quanto vou rir da cara de sua namoradinha quando ela
estiver aos prantos pela sua vida? — O idiota atrás de mim aperta o aparelho
na minha orelha. Maldição. — Ela no fim vai voltar ao juízo perfeito
quando...
— Quando eu colocar as mãos em você, Zara, ela enfim se livrará de
você — digo com falsa calma, raiva pura queima através do meu sangue
quando penso nela fazendo qualquer mal à Samantha. — Chegue perto dela e
não terá muito motivo para rir.
— Você já percebeu que não está em posição para me ameaçar? —
ela berra descontrolada do outro lado. — Vocês acabaram com minha carreira
e vão pagar muito caro por isso — ela continua não deixando margem para
que eu fale. — Pena que não poderá dizer adeus à sua amada Samantha.
— Você é uma grande idiota invejosa e ambiciosa do caralho, terá o
que merece em breve — digo indignado, perdendo a calma que tento manter.
— Não pode machucá-la mais, Zara!
— Será que não, Carl? Vou adorar mostrar à você que sim. — Ela
desliga e eu agora estou preocupado. Será que essa víbora conseguiu ter
acesso ao apartamento? Por que diabos não verifiquei com os seguranças
antes de sair do bar? Porra!
— Ande com esse carro, não temos a noite toda! — o filho da puta
fala, fazendo minhas mãos encresparem no volante.
— Vou arrancar seu coração com minhas próprias mãos — deixo
escapar entre dentes.
Ele bate com a coronha levemente na minha cabeça.
— Não me ameace ou pode morrer antes do tempo — fala bem perto
da minha orelha.
Dirijo por mais meia hora quando vejo o carro nos seguindo. Sim.
Roger e sua equipe. Mas nada me tranquiliza mais. Como diabos faço para
saber de Sam? Terá aquela louca conseguido entrar no prédio? Seria
possível? Aquilo ali era uma fortaleza e ainda teriam de enfrentar três
seguranças. Estou agoniado sem reposta. Ainda falta um tempo para o destino
fora do centro.
O que diabos está acontecendo? Piso fundo quando o trânsito libera
em alguns trechos, eu preciso chegar nesse local e acabar com isso, só espero
que Zara esteja lá.
43
Samantha
Eu sabia que alguma coisa estava errada, já era tarde e Carl não
tinha chegado. Ele tinha avisado, mais cedo, por mensagem de texto, que iria
se encontrar com seus amigos e tomar um drink, como tem feito ultimamente
depois do trabalho, mas que até as vinte e uma horas ele estaria de volta,
porém, até agora, nada dele chegar e nem um aviso do porquê estava
atrasado. Ele nunca chegou tão tarde sem antes me avisar. Estávamos
construindo algo entre nós, a confiança voltando aos poucos, pois tínhamos
passado por tantas mentiras. Confiar era um processo longo e eu sabia que
nós dois, estávamos trabalhando a confiança. Eu sei que tem de ser
construído tijolo por tijolo, contudo ele sempre me deixa a par do que anda
fazendo. Ele tinha ao longo desses dias prometido descobrir de vez quem era
meu perseguidor, e eu mesmo não verbalizando temia que essa pessoa o
atacasse também, já que um dos e-mails fora uma ameaça direta a ele, que só
me contou recentemente.
Estou tocando o piano, tentando me manter tranquila quando percebo
os seguranças em uma movimentação estranha. Eles sempre são discretos,
entretanto cinco minutos atrás o telefone da casa tocou e um deles atendeu.
Quando o olhei indagadora ele apenas sinalizou que era sem importância e
saiu levando o telefone consigo. Eu tinha voltado a tocar e agora Angelina
veio e está parada ao meu lado sem saber o que fazer.
— O que houve? — Paro de tocar e olho-a, questionando. — Fale,
você está me deixando nervosa.
— Não sabemos se é prudente lhe contar, mas...
— Fale, Angelina! — repito perdendo a paciência. — Estou sem
paciência para ser tratada como se fosse de vidro, chega disso.
— Recebemos um telefonema de sua ex-agente.
— E o que tem? Ela já ligou outra vezes tentando falar comigo e não
teve esse suspense. — Ela baixa a cabeça e faz aquela cara de pessoa com má
notícia. — Aconteceu alguma coisa grave com meus pais?
Ou pior, Carl?
— Ela exige falar com você? É sobre o senhor O'Neal...
Não deixo ela terminar de falar, já estou levantando e se não fosse as
recomendações do fisioterapeuta teria saído correndo com muleta e tudo. Eu
sabia que algo estava errado, ele nunca demorava tanto para chegar.
— Cuidado, Samantha —adverte Angelina sobre minha caminhada
manca apressada. Ela me guia para o sofá, porque estou perdendo o
equilíbrio, a perna boa está agora tão trêmula que temo cair. — Melhor você
ficar aqui, vamos trazer o telefone.
— Então cadê? Me dê isso — exijo. Eu não sei o que Zara quer com
tudo isso, mas vou descobrir, tenho certeza. Ela esteve todos esses dias
tentando contato comigo, segundo Carl, mas ele não deixou nenhuma vez eu
atender o telefone, disse que tinha algo em mente e que ia fazer Zara perder a
paciência. Para ele não existia dúvidas que Zara era a autora dos e-mails, que
ela ia cometer um erro e a polícia iria agir. Eu estava quase acreditando em
sua intuição, como ele mesmo dizia. Um dos seguranças vem com um
telefone sem fio em minha direção.
— Senhora, só iremos passar o telefone porque queremos descobrir o
que está havendo, então tente puxar assunto. — Eu arranco o aparelho das
mãos dele e aperto o botão ansiosamente para tirar da espera.
— Zara! — digo ansiosamente.
— Ah, enfim você teve a decência de falar comigo, que ingratidão,
não acha, Sam? Anos de serviços prestados e assim que você retribui? — ela
fala debochada.
— O que você quer? — Ignoro suas palavras e pergunto muito
furiosa.
— Fazer você sofrer, querida. Quero você implorando pela vida de
seu namorado. — Ela ri e o medo me congela no lugar, perco totalmente
minha bravata.
— O que disse Zara? — minha voz não trai meu estado congelante.
— Sabe, eu queria ver sua cara agora, queria ver as lágrimas que vai
derramar quando eu atirar na cabeça desse segurança idiota que você diz
amar. Vamos ver o quanto o ama, Samantha?
— O que você fez? — Tenho medo da resposta, estou tremendo tão
violentamente. Eu deveria saber que Zara era ainda mais louca do que se
imaginava. Ela queria me atingir por demiti-la e como não podia chegar até a
mim... Minha mente começa a elaborar hipóteses, Carl sangrando, morto por
minha culpa, por ter sido egoísta e não ter dado ouvido as loucuras de Zara.
— O que diabos você fez, Zara? — minha voz sai estrangulada de medo, mas
também o ódio que nunca senti por outro ser humano borbulha como larvas
incandescentes dentro de mim. Eu a mataria com minhas próprias mãos se ela
machucasse Carl por causa do seu orgulho ferido.
— Oh, é tão poético escutar o medo na sua voz, Samantha. — Ouço
gritos no fundo e perco o controle de mim mesma quando tento conter os
soluços. Ela estava realmente machucando Carl.
— O que diabos você, fez?! — grito — Carl!
A risada dela faz o ódio subir como bile em minha garganta. Medo,
pavor, angustia misturam se dentro do meu peito quando a dor me corta tão
violentamente. — Por favor deixo-o em paz. Por que está fazendo isso
comigo?
— Não será possível, querida. Ah, que pena, não poderá nunca mais
vê-lo, Sam — ela debocha.
Afasto o telefone do ouvido e olho para os segurança que estão à
minha frente.
— Por favor! Diga que Carl não está com ela, por favor — eu peço ao
que me entregou o telefone.
—Acreditamos que ele esteja sim, ele acionou um alerta de
emergência.
Não acredito nisso, ele não deixaria ser pego assim tão facilmente.
Desespero me dilacera na alma. Não posso perde-lo agora que o tive de volta.
Será que só faço feri-lo nessa vida? Por que tudo tem de ser uma tragédia
conosco, por que não podemos ser apenas felizes?
— Zara, por favor, diga o que você quer? — volto a falar com a
maldita víbora do outro lado.
— Sabe que é por sua causa que ele vai morrer, não é? — percebo o
que ela está fazendo quando o segurança pega o telefone das minhas mãos.
— Não! Me dê isso! — Tento levantar e Angelina me impede, eu não
tenho força, estou drenada de minhas capacidades física. — Por que vocês
não fazem alguma coisa? Não sou eu que estou em perigo, é ele, saíam atrás
dele!
Estou gritando cheia de pavor.
— Samantha, ela pode muito bem estar mentido — a voz de Angelina
vem de algum lugar na minha mente perturbada.
— Carl tinha todo um esquema sobre isso, ele vai ficar bem, só
estamos preocupados por que ficamos sem notícias por algum instante. A
polícia vai prender essa quadrilha, Samantha, só tem de manter a calma.
Não dou ouvido ao que ela fala, minha mente já está tomada por
gritos de dor e sangue de Carl. Tudo isso porque uma louca acha que pode
continuar manipulando minha carreira.
— Angelina— digo alguns minutos depois —, se essa mulher for
pega pela polícia, quero ir visitá-la. E também quero sua arma emprestada.
Eu falava muito sério, eu não estava brincando, o desejo de pegar a
primeira arma e ferir quem ousava ferir Carl por minha causa era maior que
pegar alguns anos de prisão por assassinato.
— Ele estava gritando — digo para ninguém em particular.
— Isso pode ser apenas um truque para deixar você nervosa, Sam. —
A sensata Angelina continua sentada ao meu lado. Ela pode ter razão? —
Vamos esperar.
Minhas lágrimas vem em um turbilhão. Essa incapacidade de fazer
algo a respeito para salvá-lo acaba comigo mais e mais.
Essa espera pode ser minha morte.
44
Carl
Sei que Roger e os caras não irão nos interceptar, mas tenho receio
que o otário atrás de mim perceba que estamos sendo seguidos, já que agora
estamos entrando em uma rua deserta. O lugar é cheio de galpões industriais
que, provavelmente, estavam fora de uso e, devido ao horário, não tinha uma
alma viva. Ele perceberia um carro se aproximando e poderia colocar a
operação em risco. Eu teria de ter provas concretas contra Zara ou ela sairia
impune. No entanto, minha preocupação maior é com Sam. Isso está me
deixando louco, o que aquela psicopata está planejando? Eu sei que entrar no
edifício seria muito difícil ou mesmo impossível, mas quando a pessoa em
risco é sua alma, seu coração, seu tudo, não tem como não ficar maluco de
preocupação. Sempre fui um cara controlado, só quem, às vezes, me tirou do
sério foi a própria Sam, mas estou a ponto de colocar tudo a perder por
impaciência.
— Pare aí — vem a ordem do imbecil, paro e espero. Ele desce e bate
com a arma na janela. — Desce, sem gracinha.
— Vou matar você, imbecil — digo para ele quando saio. Olho
discretamente para trás e não vejo brilho de faróis contudo um carro vem pela
rua devagar com a luz apagada. Ótimo, já vai acabar. Não demoraria e Roger
estaria com esse lugar cercado e tudo teria um fim. Só preciso de um minuto
lá dentro para ter a prova que precisamos e essa ordinária finalmente iria para
cadeia.
— Andando — ele instrui, apontando a arma para mim. Começo a
caminhar para o galpão. O lugar é escuro e abandonado, mas vejo uma luz
fraca dentro quando entramos.
Não vejo ninguém de imediato. Zara não estava aqui? Um movimento
no canto me chama a atenção. Alívio me toma quando percebo que Sam não
está aqui. Por um momento absurdo eu pensei que ela não estava mentido
sobre ter Sam em seu poder e estar machucando-a. Mas não tem sinal dela
aqui.
— Carl O’Neal se acha esperto, não é? — a voz dela é cheia de
desprezo e escarnio. — Acabei de matar sua namoradinha. — Ela ri com seu
jogo de palavras.
— Mesmo? Acho que não, Zara. Você ainda sonha em viver às custas
da sua suposta amiga. É incapaz, invejosa demais para matar a pessoa que
você vive na sombra — eu zombo de sua tentativa de me atingir, percebendo
agora seu jogo. Tentar me desequilibrar com palavras. O babaca atrás de mim
mantém a arma encostada nas minhas costas. Eu só preciso da porra de uma
confissão dessa vadia antes de terminar com tudo. Mas diante do que temos,
ela pode muito bem pegar uns anos de cadeia sem confessar que estava
ameaçando Sam esse tempo todo — Acabe logo com isso, Zara, diga-me
porque diabos inventou uma ameaça contra a vida de Sam?
— Por acaso é retardado, O’Neal? Não era simples invenção.
Samantha precisa colocar o juízo no lugar e não abandonar uma carreira de
anos por sua culpa. Eu dei tudo de mim para a carreira dela e simplesmente
hoje estou sem nada, e por quê? Ela é tola. E você vai morrer por ser o
culpado. No fim ela volta a única coisa que gosta e que sempre esteve
primeiramente na vida dela. Não acha que ela aceitou muito fácil deixar você
dez anos atrás? Você está iludido e, quem sabe, ela não fará tudo de novo?
Vai deixar você, O’Neal, e como você é apaixonado por ela igual um
cachorro vira-lata é melhor que esteja morto, não é? Estou fazendo um favor
para você.
Olho sua feição distorcida de raiva e rancor, ela realmente me odeia.
Raiva ácida queima no meu estomago, essa mulher perdeu totalmente o
controle.
— Seu jogo acabou, Zara — digo com desprezo. — Não caio nesse
seu papo psicótico.
— Temo que acabou para você, Carl — ela aponta para o cara atrás
de mim — Peter amarre-o na cadeira. — Ela aponta uma arma para mim. —
Você precisa de uma lição antes que acabe com você!
Olho ao redor rapidamente. O galpão tem outras entradas e
provavelmente já temos mais que suficiente de Zara para incriminá-la, além
de sequestro que eu faria questão de colocar em sua conta. Tentativa de
homicídio também. Com a certeza de que Roger está por perto, ajo
rapidamente quando giro em torno de mim mesmo e seguro a arma do tal
Peter em um golpe hábil de krav maga, técnica de combate eficiente em
defesa corpo a corpo. Bato com a palma da mão aberta forte e rápido na
mandíbula do cara, atordoando-o e pego sua arma apontando para ele.
Tudo acontece tão rápido, as cenas se seguem como um borrão. Mal
escuto o zoar de um tiro disparado, só sinto algo quente no meu flanco, o cara
na minha frente tem o rosto atordoado e surpreso. Vejo quando um filete
vermelho aparece em sua camiseta verde escura. Dou um passo longe dele e
olho para o caos atrás de mim. Zara está no chão dominada por policiais. Ela
tinha atirado em mim ou no tal Peter? Se foi em mim, ela acabou acertando
seu parceiro, mas a bala ainda passou de raspão nas minhas costelas, sinto o
calor em minha roupa, por pouco ela não me acerta. Volto meus olhos para o
cara que agora está ajoelhado no chão, antes de cair para frente, ele não está
morto, mas está perdendo sangue rápido, um policial vem para perto dele
verificando seu estado. Vou até Zara e minha vontade de feri-la guerreia
contra o bom senso.
— Boa estadia na cadeia, Zara — praticamente cuspo as palavras para
ela. — Espero que dure lá.
— Maldito filho de uma cadela. Irei sair e terminar o que comecei —
ela ameaça.
Afasto-me dela, caminhando para saída ou irei cometer assassinato
friamente. Preciso ligar para Samantha. Alexander aparece no meio do caos e
vem até mim.
— Cara, você tinha que vir para tão longe? — ele bate no meu ombro
e pulamos juntos quando outro tiro é disparado atrás de nós. Giramos rápido
para olhar de onde veio o tiro e fico boquiaberto quando vejo uma arma na
mão do comparsa de Zara. E ela no chão em uma poça do próprio sangue.
Que diabos! Ele tinha pego a arma do policial? Pelo visto foi o que
aconteceu.
— Puta que pariu ele disparou nela? Que diabos aconteceu? —
Alexander fala ao meu lado.
— Acho que eles estão na vibe do vamos juntos dessa para melhor —
Bruno comenta vindo de fora. Os homens estão todos aqui? — Tão poético
isso. Tenho uma lágrima aqui no canto do olho — ele zomba.
Olho feio para ele, isso lá é hora de brincar? Ele dá de ombros — O
quê, O’Neal? Tive de sair da cama quentinha para vir livrar seu traseiro de
ser levado dessa para melhor.
— Até parece que esses dois dariam se bem — comento. — Sabe de
Samantha? Ela está bem?
— Ela está no apartamento, O’Neal, e não saiu de lá — diz Alex,
deixando-me enfim aliviado.
— Até onde eu vi, você tinha uma arma na cara. Você precisa de
treinamento. Estou dando aula aos novatos, agende com minha secretária —
Bruno nos ignora e fala, rindo debochado quando passa por mim.
Esse não tem jeito, faz piada de tudo.
Saio do galpão e vou para o carro pegar meu celular. As coisas
definitivamente terminaram pior que imaginei. A morte seria bom demais
para Zara. Eu a queria passando uma temporada no meio das presidiárias em
uma cadeia superlotada. Meu celular está longe de ser visto. Vasculho o carro
até achá-lo caído no assoalho, mas está fora de cobertura.
— Merda — resmungo furioso, jogando o aparelho no banco.
— Aqui, O’Neal, ligue desse — a voz de Sal vem do escuro. — É via
satélite.
— Por que diabos está aí no escuro, Benacci? — pergunto quando
vou até ele pegar o aparelho.
— Precaução. Quem vai saber quantos amigos essa louca tem? — Ele
está armado até os dentes e quase rio de seu exagero.
— Você é louco. — Afasto-me dele e ligo para Sam.
45
Samantha
You're a carousel, you're a wishing well
And you light me up, when you ring my bell
You're a mystery, you're from outerspace
You're every minute of my everyday
(Everything
Michael Bublé)

A espera me mata aos poucos, eu não tenho mais lágrimas para


derramar, estou parada olhando fixamente para a porta como se ela fosse me
dar respostas ou notícias de Carl. As horas parecem intermináveis e
agonizantes. Não posso perde-lo ou que ele venha se ferir por minha culpa.
— Samantha? — a voz de Angelina me chama, tirando-me do caos
que minha mente construiu. Olho para ela que veio sentar ao meu lado. —
Falamos com a equipe que está dando cobertura a Carl e ele está bem, eles
tinham isso sobre controle.
Aceno mais aliviada, porém só respirarei tranquila quando vê-lo
entrando por aquela porta.
— Zara estava falando a verdade? Ela realmente estava com ele?
— Segundo o pessoal, ela tinha uma pessoa ajudando-a — Angelina
fala.
— Quem pode ser? São meus pais?
— Um homem, não sabemos a identidade.
Seria Pietro? Lembro dos dois cochichando quando ainda estava no
hospital, mas depois Pietro tinha voltado para Itália e não ouvi mais falar
dele. Sei que ele tinha em mente um relacionamento comigo, mas como viu
que estava envolvida com Carl deve ter desistido, mas será que ele estava
junto com Zara nesse plano. Quando foi que Zara perdeu-se? Quando ela
deixou de ser uma mulher de negócio e tornou-se uma criminosa? Apenas
rancor faz isso com as pessoas? Inveja? Ira?
Um zumbido começa em algum lugar e vejo Angelina pegar o
telefone da mesinha em nossa frente, estendendo-me.
— Alô! — Por um momento temo que seja Zara.
— Carinho — o som da voz de Carl do outro lado faz meu corpo
afundar de alívio no sofá. Uma onda quente de alegria me toma e quase choro
de alivio.
— Carl — digo em fôlego. — Você está bem? Por favor diga que
sim. Está ferido?
— Não. Estou bem, querida. E você, está bem? — a voz é grossa com
emoção.
— Estou agora que sei que não está ferido. O que aconteceu?
— Conversamos quando eu voltar, tenho de terminar algumas coisas
aqui, mas quero muito ter você junto a mim, carinho. Preciso sentir você.
— Sim, amor — digo quando as lágrimas quentes que pensei terem se
esgotado reúnem-se nos meus olhos novamente.
— Não. Voltarei em breve para casa. — ele fala — Tenho de desligar.
— Espera! O que houve com a Zara?
— Ela foi baleada e está morta. — Choque perpassa por mim. Morta?
Deus.
— Oh — é tudo que digo.
— Não perca tempo se martirizando, Sam — ele fala com autoridade.
— Eu estarei em casa em breve, querida.
— Te amo.
— Eu também amo você, carinho, loucamente — diz antes de desligar
e eu estou sorrindo mesmo em meio caos que está acontecendo.
A noite é turbulenta e estou quase dormindo quando enfim o elevador
sinaliza a sua chegada. Eu levanto trôpega e avanço na direção dele que me
pega nos braços, ignorando as outras pessoas na sala e levando-me para o
quarto. Eu me emaranho toda nele. Minhas pernas em volta do seu quadril.
Ele senta na beirada da cama comigo sentada em seu colo de frente para ele.
A boca quente e faminta cai sobre a minha quando nos beijamos sem
conseguirmos falar nada um para o outro. É pura adrenalina junto com
deslumbramento quando o desejo começa a pulsar vivo entre nós. A certeza
que ainda temos um ao outro faz com que tudo seja mais intenso. Seus lábios
devorando com força o meus, sua língua mergulhando na minha boca
avidamente. Desejo borbulha dentro de mim junto com alivio de tê-lo vivo
em meus braços.
—Te amo tanto — tento dizer contra sua boca, mas ele agarra minha
nuca dominantemente quando me beija duro com um resmungo de protesto
por ter interrompido o beijo anterior. Sua língua acaricia a minha e eu chupo
e esfrego contra ele. Nossas respirações são erráticas e meu coração tem um
ritmo louco no meu peito. Suas mãos começam a atirar minhas roupas para
longe e não demora muito para estarmos pele contra pele. Eu sendo empalada
firme por ele. Gemo quando sinto ele todo dentro de mim.
— Amo você mais que tudo, carinho — a rouquidão da voz de Carl
deixa-me mais excitada e, quando desejo cru constrói gigantesco em minha
barriga, passo meus braços por seu pescoço e me movimento em seu pau. Eu
amo cada estocada firme e deliciosa dele.
Eu esqueço toda tragédia de hoje quando ele segura minha bunda em
suas mãos e me faz dele como nenhum outro foi capaz de fazer.
Depois conversaríamos, agora eu só quero senti-lo. Vagamente estou ciente
de chamar o seu nome uma e outra vez. Como eu me transformei nessa
criatura em êxtase que queima através de minha pele nua? Fogo parece
lamber cada pedaço de pele e eu explodo em êxtase. Eu ouço um rugido.
Então seu pau empurra dentro de mim e ele jorra esperma quente em meu
corpo. Como se ele não pudesse controlar a si mesmo. É como se fosse a
nossa loucura e esta é a única cura um do outro. A cura de dez anos de
solidão. De espera.
Estamos lado a lado na cama depois de saciar temporariamente nossa
necessidade um do outro. Carl me conta tudo que aconteceu hoje à noite, sua
preocupação comigo e todo o plano que ele tinha com a polícia, esperando
um momento oportuno para provar que seu instinto sobre Zara estava correto,
mas que sem prova nada adiantava já que toda ameaça tinha sido pela internet
e irrastreável. Ele estava frustrado com a morte dela.
— Merecia passar alguns anos na cadeia — resmunga mal-
humorado.
— Sinto muito por colocar você em perigo, meu amor — digo
beijando seu ombro, minha mão correndo por sua barriga — Eu
involuntariamente te coloquei na mira de uma Zara louca.
— Nada disso é culpa sua. Eu nunca deixaria nada te magoar mais do
que a vida tem feito. — ele levanta e me puxa para fora da cama junto com
ele — venha tomar um banho comigo.
Pouco depois, saio primeiro do que ele do banho, estou me sentindo
exausta física e mentalmente e o espero na cama.
— O que vai acontecer com esse homem, Carl? — pergunto quando
ele volta do banheiro, a toalha em volta de sua cintura deixa-me sem fôlego
mesmo nós tendo acabado de fazer amor. A visão dele faz crescer em mim
essa vontade louca de estar agarrada nele e nunca mais soltar. Saber que ele
esteve em perigo hoje faz meu coração doer de tanta aflição. Não falamos de
futuro, eu sei que nos amamos, porém isso não nos impediu de nos separar no
passado. — Ainda estou chocada com o que aconteceu com Zara...
— Ela teve o que merecia, Samantha, não deve se martirizar por uma
pessoa que não tinha a menor preocupação com você, aliás, ela só queria seu
mal — ele diz soltando a toalha e vestindo uma calça de pijama azul marinho.
Eu bebo da visão sexy dele me desconcentrando do que estamos falando. —
O comparsa dela ainda está vivo e, provavelmente, será deportado.
— Por um momento pensei que fosse o Pietro, afinal o dois eram
amigos — digo lembrando que pensei que esse homem fosse ele. — Não
lembro de ter conhecido esse homem.
— Esqueça-os e concentre-se apenas em nós agora. — Ele deita ao
meu lado e acaricia minha bochecha. — Estive tão preocupado com você
hoje. Por um momento achei que Zara falava a verdade e estava com você, e
não posso te perder novamente, nem agora nem nunca mais.
As suas palavras fazem com que a dor que senti hoje comecem a se
dissipar e eu olho-o cheia de amor. Seus olhos azuis escuros são belos e me
perco dentro de sua profundeza serena. Como o amo, eu poderia morrer por
ele.
— Ah, querido, eu sinto-me da mesma forma, eu... — minha voz
embarga quando a respiração falha. — Eu não quero te perder também, nunca
mais. Amo tanto você, nós devemos a nós mesmos uma segunda chance,
Carl...
— Te amo, carinho — ele fala baixinho em um sussurro rouco antes
de tomar meus lábios nos seus. O beijo me desfaz em pequenos fragmentos
de mim mesma. Nossas respirações juntas quando ele se afasta e me olha nos
olhos. — Eu juro que nada, nem minhas dúvidas, pode nos separar de hoje
em diante, Samantha Stollen. Eu nunca mais irei deixar nada em nosso
caminho. Eu amei, amo e amarei você até a última respiração, meu amor.
As lágrimas de felicidade descem aos montes agora. — Não quero
que chore jamais...
— Choro de felicidade, por nós — digo me inclinando e apenas
abraçando-o forte. Ficamos apenas lá absorvendo nosso momento. Eu estou
melosa e doce, eu sei, mas isso é o que o amor faz em nós, nos torna melhor.
Sorrio com o pensamento e Carl me olha risonho. — O quê? Está
rindo de mim, senhorita Stollen?
Senhorita, eu sonho com o dia que serei senhora O’Neal. Sonho com
isso desde tão jovem. Será que um dia ele vai me propor?
— Claro que não. Estou rindo de nós, velhos e apaixonados. —
Cutuco seu abdómen. — Apesar que você é um coroa muito gostoso.
Sua risada descontraída é tão fascinante. Droga! Pode se apaixonar de
novo mesmo já apaixonada? Vê-lo rir faz as borboletas fazerem festa na
minha barriga.
*
Sair como um casal em um encontro novamente, é estranho. Ao
mesmo tempo é de uma magnitude absurda para mim. Eu quero colher em
meu coração esses momentos que estou tendo com Carl com uma
preciosidade infinita, porque sei que esse é o começo de uma nova vida com
ele, mesmo que o meu guarda-costas mais que particular não tenha feito
nenhuma proposta. Ele é tão misterioso! Mas amo cada pedacinho dele.
Arrumo-me com esmero redobrado. O vestido azul royal é requintado e
acentua minhas curvas, sinto–me bem para meu primeiro encontro em anos
com o homem da minha vida.
Faz duas semanas que Zara saiu de nossas vidas. Meus pais
juntamente com a família dela resolveram seu funeral, não quis me envolver.
Mal falei com meus pais, porém temos uma conversa pendente, deixei isso
para depois, agora quero esquecer esse capitulo da minha vida e olhar apenas
para frente. E na frente tem muito amor para ser redescoberto e vivido.
— Você está linda — a voz me faz virar e olho para Carl em um terno
preto sob medida e camisa branca perfeita. Ele é lindo. Sinto-me quente
quando lembro que essas duas semanas estávamos mais na cama do que em
qualquer outro lugar, ele não tem ido trabalhar e estávamos ainda no
apartamento, agora sem os outros seguranças. Apenas eu e ele, é como uma
lua de mel. — Você está corando? Isso é pelo elogio ou tem outras coisas em
sua mente, carinho?
Por seu olhar malicioso deve estar pensando nas mesmas ideias que
eu e coro ainda mais, fazendo seu sorriso lindo aumentar.
— Obrigada, você também está bem — digo sem ar. — E não tenho
nada em mente — minto.
— Pronta então? — pergunta quando oferece o braço para mim. — Só
um minuto. — digo quando vou pegar minha pequena bolsa de mão. —
Agora sim.
O restaurante é requintado e tem uma mesa reservada esperando por
nós. Os outros encontros que tive com ele, semanas antes, parecem
diferentes, por isso considero esse um verdadeiro encontro. Estamos agora
em um patamar diferente daqueles dias onde estávamos sem perspectiva
nenhuma, aqui estamos olhando para um futuro.
Ele puxa uma cadeira para mim na mesa onde tem uma única vela
acesa em um candelabro de mesa, a toalha vermelha, tudo gritando romance
no ar. Quando sento, ele se inclina para falar em minha orelha. — Já disse
como está perfeita hoje? Não vejo a hora de ver o que veste por baixo desse
vestido.
— Carl!
Ele senta à minha frente e pega minha mão por cima da mesa beijando
a palma lentamente, causando arrepios por todo meu braço.
— Vai ser minha mulher, Samantha — ele diz calma e
categoricamente. — Então quero ser o único em sua cabeça e em seu coração
agora.
— Sempre foi, Carl. — Um garçom vem com uma garrafa de vinho e
ele aprova. Quando já estamos com os pratos servidos, Carl me olha do outro
lado da mesa. Seu olhar é escaldante para mim.
— Quero apresentar você aos meus amigos, estive escondendo você
por tanto tempo — diz e eu sorrio, isso diz muito para mim, ele querer me
envolver em sua vida. — Eles acham que você é um fantasma e invenção da
minha cabeça.
— Quase sou isso mesmo. — Sorrio feliz para ele. — Também quero
muito conhecê-los. — Levo o último bocado do meu filé à boca. Estou meio
frustrada com o jantar romântico. Eu achei que ele ia me pedir para morar
com ele, ao menos, mas ele nem tocou nesse assunto à noite toda. Tenho uma
baita vontade de chorar de decepção.
— Algo incomoda você, carinho? — ele pergunta quando estou
olhando ao redor onde outros casais estão em um clima íntimo entre eles.
— Nada. — Dou um sorriso meio sem graça para ele. Seu olhar
atento nunca me deixa, além do sorriso misterioso que ostentou toda noite.
Uma música ao fundo toca baixinho e não aguentando mais, volto-me
para ele.
— Vamos dançar? — convido, pois nem me pediu para dançar! Carl
era mais romântico. Penso estreitando meus olhos.
— Nós vamos, temos todo o tempo do mundo para isso. Contundo
antes... — ele busca algo no bolso do terno e estende para mim. Uma
sensação quente me envolve quando ele coloca uma caixinha azul marinho na
mesa, na minha frente, e olha nos meus olhos. — A única mulher que sacudiu
minha alma e me arruinou para todas as outras, a única que física e
metafisicamente me afeta de uma maneira que não consigo explicar a mim
mesmo. A única que consegue fazer minha vida mais completa que me põe
louco e são de uma só vez. A mulher mais linda e talentosa, a mulher da
minha vida. Samantha Stollen, case comigo?
Estou hiperventilando e sorrindo ao mesmo tempo. — Não há
segundas chances para muitos casais por aí, mas nós dois tivemos isso e não
vou deixar essa segunda vez passar, meu amor. Case comigo, carinho.
Derreto em uma poça de sentimentos loucos na minha cadeira, apenas
estendo minha mão por cima da mesa para ele, não consigo falar, caramba.
Emoção como uma onda de tsunami faz-me querer beijar cada parte dele. Ele
abre a caixa, dentro o anel de diamante em formato de pera com minúsculos
rubis ao redor deixa-me totalmente fascinada de amor.
— Isso é um sim? — olha –me com carinho quando segura minha
mão nas deles. — Fale querida. Diga que é minha, Samantha.
— Nunca diria não para você, Carl. Milhões de sins e sou sua. — Ele
desliza o aro por meu dedo e cabe perfeitamente.
— Amar você transcende o tempo, Samantha — diz baixo quando
beija meu anel em meu dedo. — Faz parte de mim amar você. Tira-me da
escuridão — sua voz engrossa rouca quando diz possessivo. — É minha
agora.
Quando ele levanta, puxando-me para meus pés e me beija... eu
esqueço o tempo, o espaço e onde estou. Retribuo com tudo que tenho. Todo
meu amor por ele em apenas um beijo.
— Agora sim aceito seu convite para dançar — fala contra meu lábios
com os olhos fixos em mim. — Você é linda.
Ele me leva para a pequena pista de dança ou o que achamos que é
uma pista de dança, já que outros casais não estão dançando, e me toma em
seus braços tão apertado.
— Caralho, estou feliz. — Ele ri em minha orelha quando seguimos
dançando lentamente, alheios ao mundo ao redor. — Poderia apenas gritar
aqui que você me pertence.
— Te amo.
— Eu sei.
— Ah!
Ele me beija enquanto seguimos os passos de nossa própria música.

Você é um carrossel, você é um poço dos desejos


E você ilumina-me
E eu não posso acreditar que, uh que eu sou seu homem

Rio deliciada quando ele me rodopia em um passo que não tem nada a
ver com a música. Quero prolongar esse momento para sempre.
Quando saímos do restaurante estamos embriagados de nós mesmo,
do nosso amor florescendo gigante sobre nós.
Ele chama um táxi, entramos e seguimos para o apartamento. Quando
paramos é que noto onde estamos. Não fomos para o apartamento onde
estivemos esses meses, mas para o dele. De onde ele me expulsou, onde vi
ele com aquelas duas mulheres. Onde disse palavras que dilacerou meu
coração naquele dia. A dor me cegou por um tempo e o acidente, a cegueira,
tudo volta na minha cabeça e eu tremo.
— Por que me trouxe aqui? — minha voz sai trêmula e fraca. —
Quero ir embora. Por favor, Carl.
— Shiiii, calma, amor. — Ele desce e estende a mão para que eu o
siga. Desço a contragosto e o táxi dá partida, nos deixando na entrada
exatamente onde ele disse coisas que quero esquecer.
— Aqui foi onde disse tantas coisas que me envergonharam depois
que as proferi. — Ele me olha e a sombra de dor aparece nos olhos azuis
profundos. — Eu não poderia continuar com nossas vidas sem vir aqui, nesse
mesmo lugar, e pedir perdão de joelhos para você por ser a causa de tanta dor
naquela noite. Porque seu sei que fui o culpado por seu acidente, mesmo que
indiretamente. Eu não tenho vivido bem comigo mesmo desde então, Sam.
Você nem eu merecemos continuar com alguma dúvida para o futuro que
escolhemos para nós.
— Eu não tenho.
Lágrimas quentes descem quando a emoção me toma e vejo Carl
ajoelhado na minha frente. Ele não tem culpa sozinho, eu preciso que ele me
perdoe também e por isso ajoelho em frente a ele. Parecemos dois loucos ali
ajoelhados e eu me debulhando em lágrimas.
— Você me perdoa, carinho? — pergunta secando com o polegar as
minhas lágrimas. — Por dizer tantas bobagens?
— Não antes que me perdoe por fazer você sofrer por anos, Carl. Por
ir embora e não voltar quando disse que voltaria, nos causando tanta dor e
mal entendidos. Você tem de perdoar as pessoas que nos magoaram também
para que possamos seguir em frente.
— Eu só me importo com você, nada mais. — Ele fica de pé e me
puxa para seus braços. — Estou velho para ficar de joelhos muito tempo,
querida.
Sorrio feliz quando recebo sua boca faminta na minha. Ele me leva
para seu apartamento que é tão masculino e sem enfeites, não há nada
feminino aqui.
— Venha conhecer meu quarto. — Ele me puxa para lá. Nossas
roupas seguem em uma trilha pelo chão e quando ele me deita na cama
espaçosa, vindo por cima de mim, beijando-me em reverência, eu sei que
iremos ficar bem.
Gemo quando ele suga com fome meus mamilos em sua boca
faminta. Sua boca perversa faz um caminho para baixo no meu abdome, sua
língua deixando um rastro de fogo e meu quadril levanta em antecipação.
— Quero você, Carl — gemo alto e exigente. — Não seja gentil, seja
apenas mau essa noite.
Minhas pernas em cada lado de seus ombros é o sinal de que ele vai ser
“mau” e levar as coisas lentas. Estou louca de tesão para ser delicada hoje. Eu
quero viver intensamente cada momento...
46
Samantha
Semanas depois...

Naquela noite que Zara levou um tiro e faleceu, seu comparsa foi
preso e tudo veio à tona sobre sua obsessão por mim, ou melhor, minha
carreira. Nada me chocou mais que saber que ela queria voltar a trabalhar
comigo, ela estava louca mesmo.
Hoje estou em frente aos meus pais em uma conversa que estive
adiando por dias
A conversa é esquisita, para dizer o mínimo. Fui até o hotel onde os
dois estão hospedados desde que cortei os subsídios. Minha mãe e meu pai
não parecem bem e eles confirmam isso quando eu pergunto.
— Seu pai teve um caso debaixo do meu nariz, Samantha, e você quer
que estejamos bem? — mamãe fala olhando feio para papai que está sentado
do outro lado da mesa. Ele parece que não estar nem aí para o que ela pensa.
Ele sempre foi muito na dele, pelo visto, acho que isso não mudou. — Não
podemos estar bem, ainda mais com tudo que você tem feito para nós.
Ela reclama. É inacreditável como eles deixaram as máscaras caírem e
mostram que a única coisa que importa é se vou continuar pagando suas
contas. Estive dez anos cega, vivendo com mentirosos dia e noite, mas não
percebi. Minha ingenuidade não teve limites.
— Deviam se unir já que não terá a mim para explorarem, mamãe —
falo com amargura. — Dei um tempo para vocês verem se era possível
mudarem, mas tudo continua igual, não é?
— E você é uma ingrata — papai replica furioso. — Fizemos tudo
para que hoje fosse a mulher bem sucedida que é...
— Obrigada pelo sacrifício, papai — retruco interrompendo-o. —
Vão escolher ficar aqui ou voltar para a Itália e, para que não digam que estou
sendo ingrata, fornecerei apenas o necessário para que vivam bem, porém
sem regalias nenhuma. — Levanto a mão parando os protestos. — Não
reclamem ou irão viver sem nenhum ajuda.
— Não queremos sua esmola Samantha, não vou ficar aqui vendo
você nos humilhar dessa forma — papai diz e levanta deixando apenas eu e
mamãe.
— Não devia ser tão dura conosco, filha. — Ela olha meu anel de
noivado. — No fim você está onde queria. — Ela balança cabeça descrente e
me olha com pesar. — Vai abandonar de vez sua carreira? É inacreditável.
— Tenho opções, mamãe, posso fazer tantas coisas sem que saia pelo
mundo em turnê. Posso trabalhar com música sem que seja uma pianista em
um país a cada semana. — Toco meu anel e sorrio. — Eu dei dez anos da
minha vida aos concertos, agora é hora de mudar, ter mais que só música e
viagem na minha vida. Posso continuar minha carreira de outras formas.
— Você quem sabe se vai jogar tudo fora para viver uma vida de
dona de casa, a vida passa muito rápido, Samantha, e você viu o que
aconteceu comigo e seu pai, anos de convívio, confiança e ele traiu isso. —
Ela abana a cabeça. — Veja que rumo vai tomar com sua decisão de trocar
uma carreira bem sucedida por um homem.
Caramba, parece a Zara falando.
Bem, não adianta falar com eles, meus pais estão ficando igual Zara
com a teimosia de tentar viver suas vidas através de mim. E isso tem de
acabar.
— Certo, mamãe, só que nem eu nem Carl somos vocês. — Empurro
as passagens que comprei para eles na mesa. — Aqui tem passagens para
Itália, voltem para a casa de vocês, quem sabe não se acertam? Não esqueçam
que agora não vou estar por perto, não quero esse tipo de amor que vocês
dois dizem sentir por mim, visando apenas que os sustente, então posso fazer
isso de longe.
— Samantha, podemos viver aqui...
— Não, mamãe, eu prefiro vocês lá onde sempre almejaram viver . —
digo. — Terão suas contas pagas, porém tudo será avaliado antes que eu
pague.
— Isso é tão humilhante!
— Não é, tem de agradecer por eu ter coração bondoso, outra pessoa
não seria tão generosa com vocês depois da palhaçada que fizeram para mim
juntamente com Zara. — Dou um sorriso apesar de tudo. — Mas eu
agradeço por tudo que fizeram, mãe, por isso ainda pagarei suas contas.
— Talvez não seja dinheiro que queremos.
— Não?
Ela desvia os olhos e sei que não é de meu afeto que estão sentindo
falta.
Pego minha bolsa na cadeira ao lado e levanto para ir embora. — Se
resolverem ir, avisem-me.
Saio de lá sem olhar para trás, eu tenho de fazer esses dois
entenderem que estou magoada e que com o tempo pode passar, mas não
agora. Ainda é muito recente para dizer a eles que os perdoei, seria mentira,
pois ainda sinto raiva.
Pego meu celular quando entro em um táxi e mando uma mensagem
para Carl, perguntando onde ele está, recebo quase que imediatamente a
resposta dele dizendo que está na empresa e que logo irá embora também.
Amanhã nós vamos nos encontrar com seus amigos e eu estou super ansiosa
para isso. Mas primeiro tenho algo para fazer, eu tenho um encontro com
Alexei Kolovky, um russo que conheci há alguns anos, para que ele organize
o último concerto. Será um fechamento da minha carreira como musicista, eu
também devia três concertos aqui. Mas irei fazer um totalmente filantrópico.
Alexei está me esperando em um restaurante perto do hotel onde ele se
hospedou, nosso contato tem sido todo por telefone e e-mails. Hoje
finalmente faremos uma reunião depois de sua chegada ao Brasil.
Ele é fácil de encontrar. Seus cabelos lisos, quase na altura dos
ombros, são pretos e contrastam com a pele branca e olhos castanhos. Ele é
impressionante e não falo de seu tamanho avantajado.
— Samantha — ele fala levantando-se quando me vê chegando. Seu
sotaque russo é impressionante e sexy. — Prazer revê-la.
Aperto sua mão.
— Alexei, seja bem-vindo — digo sentando a sua frente. Ele é jovem,
mas os concertos que esse homem organiza e promove são gigantescos, e eu
quero fechar com chave de ouro.
— Fico muito honrado pelo convite, terá seu melhor concerto,
Samantha — ele me garante.
Passo as próximas duas horas acertando detalhes incluindo local,
custos trabalhistas, decorações, publicidade e, depois de tudo acertado, deixo
em suas mãos mais do que capazes para executar. Quero organizar tudo e
fazer uma surpresa para Carl, ele nunca foi em um concerto meu, talvez por
orgulho, mas também nunca dei um aqui. Eu espero que ele goste da
surpresa.
Volto para o apartamento dele onde estamos morando agora. Depois
do pedido de casamento viemos para cá. Ainda não paramos para pensar em
um lugar para nós, as coisas estão sendo mais lentas nesse sentido, porque
afinal não estamos em uma corrida, ou seja, não precisamos de muito, apenas
de nós.
O táxi me deixa na frente do prédio e sigo para dentro, estou ansiosa
para ver Carl, passar o dia todo longe um do outro é sacrificante, já que
estivemos colados um no outro esses dias, porém paro surpreendida com a
figura masculina parada na entrada. O que diabos ele estava fazendo aqui?
— Como me encontrou aqui? — digo quando me aproximo. Pietro
estende a mão para mim, hesito antes de apertá-la.
— Vejo que está bem desde a última vez que a vi. — Ele me avalia de
cima a baixo.
— Obrigada. A que devo essa visita, Pietro?
— Não posso visitar minha ex-namorada que não se deu ao trabalho
de terminar comigo e já está morando com outro cara? — sua voz cheia de
rancor ou até mesmo raiva me surpreende. Ele ainda vive nessas nuvens?
Quantas vezes terei de dizer que nunca houve nada entre nós? — Não vai me
convidar para entrar?
Claro que não, não sou nenhuma idiota para convidar um homem que
tem alguma obsessão amorosa por mim para entrar em um local apenas eu e
ele.
— Pietro, você sabe que nunca ouve nada entre nós o máximo que
tivemos foi um...
— Conversa. Sabe que tivemos um romance.
— Tivemos um namorico para as câmeras e você sempre soube disso.
— Sinto-me inquieta com essa conversa sem sentido. — Bem, de qualquer
forma nunca tivemos nada sério e muito menos fomos noivos como as vezes
fala. Quero que pare com isso.
— Quer? Onde está seu guarda-costas agora? — Seu olhar muda
quando fixa em mim. Ele se aproxima no meu espaço pessoal, segurando
meu braço com força suficiente para deixar marcas. Quando ele fala, o tom
baixo me faz estremecer um pouco de medo. — Podemos ir para um lugar
melhor para conversar, Samantha? Isso não é um convite, estou muito irritado
de ter sido feito de bobo por você.
— Pietro é melhor você ir — digo tentando sair de seu agarre. —
Solte-me.
— Você gostou da lição que fiz para você?
Então tinha sido ele que ligou para a casa do lago? Eu pensei que
tinha sido Zara. Oh, meu Deus, estava vivendo com essas pessoas ao redor?
— O quê?
Ele ri quando fala de encontro ao meu rosto, tão perto que seu hálito
bate na minha face.
— Zara me contava muitas coisas e uma delas foi que recebia e-mails
de um admirador que não queria o fim de sua carreira. Eu queria você longe
desse cara para que pudéssemos ter uma chance, Sam — ele diz me deixando
chocada. — Você ficou com aquele babaca quando não teve nem a decência
de terminar comigo. Eu era seu namorado e você me desprezou quando corri
para cá, quando estava vulnerável. Eu fui um bobo romântico e recebi apenas
desprezo em favor daquele cara que nunca mereceu você!
— Você é tão louco, igual a Zara, solte-me — exijo quando o medo
de outro maluco tentar algo contra mim. Quando eu pensava que tinha tudo
acabado surge esse louco.
47
Carl
— Sério? Vai enfim nos apresentar Samantha? — Bruno levanta
a sobrancelha sarcasticamente — Deve ser uma mulher muito especial para
você manter em um cofre, O’Neal ou você a mantém a pão e água amarrada
em sua cama ao seu bel prazer?
— Eu a pedi em casamento — digo a eles ignorando as gracinhas de
Bruno. — Mas nossa história era complicada demais antes, não complicada,
para ser mais claro, porém cheias de mal entendidos e anos de orgulho ferido.
— Isso nós já sabemos, que ela é a causa da sua cara feia — Bruno
diz rindo. — E do seu azedume, meu caro amigo.
— E quem é o culpado de sua chatice, Ross? — rio também, com ele
por perto não tem quem fique sério por muito tempo.
— Ah, isto é de berço, nasci assim, é parte do meu charme lendário.
— Ele balança as sobrancelhas para cima e para baixo irritantemente.
— Lendário? Sei... — Salvatore debocha.
— E agora está tudo bem? Com você e Samantha? — a pergunta vem
de Alexander de onde está sentado na cabeceira da mesa de reunião na
Marshall Segurity.
— Como disse, pedi-a em casamento e ela aceitou. — Cruzo meus
braços na frente do peito — Eu namorei Samantha desde que ela tinha
dezesseis anos, planejamos casar e ter toda essa merda de romance
adolescente. Fizemos grandes planos porque sabíamos que nos amávamos
apesar de sermos jovens, mas ela ganhou uma bolsa em um conservatório de
música clássica na Europa quando fez dezoito anos. Seria pouco tempo longe
e quando ela voltasse iríamos nos casar, mas depois de meses recebi uma
carta dela destruindo tudo que eu acreditava, eu estava louco por aquela
menina e do nada ela joga esse amor na minha cara e eu não soube lidar com
essa merda. Perder Samantha foi dilacerante e eu a odiei por destruir tudo. Eu
tentei esquecê-la indo para as Forças Armadas e o resto é história, vocês
viram em primeira mão que não fui nenhum pouco simpático nesses anos
todos. Eu odiava e amava Sam na mesma proporção e às vezes a raiva levava
a melhor.
— Tu é um cara romântico pra caralho! — Bruno ri descontrolado. —
Quem agora é dominado por uma bu...?
— Vá se ferrar! — digo rindo, caramba quando foi a última vez que ri
descontraidamente com meus amigos? Quase nunca acontecia e agora vem
facilmente. Samantha é minha luz, saber que ela está em minha vida faz tudo
parecer perfeitamente em seu lugar.
— É só isso? —Sal se inclina para frente, baixa a voz e diz malicioso:
— Já fez amor com ela em cima de um piano? Dizem que isso é romântico,
última moda dos caras românticos.
— Isso não é da sua conta, imbecil — retruco olhando-o com uma
carranca, mas realmente precisamos batizar seu piano, afinal a música tem
estado entre nós há muito tempo.
— Agora eu tenho uma visão disso. Piano, uma mulher nua... —
Bruno se inclina para trás em sua cadeira, as mãos cruzadas na nuca. — Acho
que vou comprar um piano, Alicia é tão certinha que ia ficar escandalizada
quando eu a usasse para tocar o Lago do cisne negro com ela.
— Lago do Cisne, você quer dizer — corrijo.
— Só me interessa o lado mau da coisa — retruca.
— Vocês são uns doentes — Alexander diz rindo.
— Falou o homem que não trabalha mais a não ser na calcinha da
patricinha — Bruno bate no ombro dele. — Menos, senhor todo poderoso,
você é o pior. Dizem as más línguas que você dançou em uma boate apenas
de cueca cheia de brilho para satisfazer a Lana. Isso aconteceu em Malibu —
ele fala tão sério que outros acreditariam.
— Ei, não inventa essa merda porque ele vai achar que foi eu que
disse isso, apesar que teve umas coisas estranhas lá — Salvatore diz. — Não
quero ser demitido, mas a Lana sabe como...
— Acabaram? Vocês falam muita besteiras quando se juntam. —
Alexander me olha. — Boa sorte, Carl, você merece uma boa mulher e tenho
certa que vão dar certo.
— Obrigado. — Levanto e pego meu terno no encosto da cadeira
vestindo-o — Espero que venham conhecê-la. — Cito o restaurante que
vamos e saio, quero encontrar Samantha, sinto falta dela o dia todo. Pela
mensagem que recebi ela deve estar indo para casa agora, depois do encontro
com seus pais. Não fui com ela, ela precisava resolver sozinha, tomar as
rédeas de sua vida sem que haja alguém fazendo isso por ela, como todos têm
feito há anos.
Como é fim da tarde e não estou em nenhum trabalho com clientes,
volto para o meu apartamento onde estamos morando. Eu tenho procurado
uma casa para nós, quero fazer uma surpresa para Sam, o chalé no lago não
parece mais tão certo como anos atrás, ela agora tem outros planos,
certamente não pode morar longe da cidade, seria inviável.
Meu apartamento fica relativamente perto da empresa e não demora
muito para chegar. O casal na frente do prédio me chama atenção de longe e
eu conheço aquela mulher a quilômetros de distância. Paro o carro e desço,
eles estão discutindo tão entretidos que não veem eu me aproximando. Eu
reconheço o cantorzinho filha da puta e vejo vermelho, o que diabos ele faz
tocando em Samantha.
— Você é tão louco igual a Zara, solte-me — Samantha está
praticamente gritando quando exige. Meus punhos fecham quando marcho
para eles. Minhas preces foram ouvidas, eu desejei quebrar os ossos desse
filho da puta um dia. Bem, esse dia tinha chegado.
— Isso, filho da puta, solte minha mulher! Eu esperava o dia que ia
quebrar essa sua cara bonitinha, cantorzinho de merda. — Eu não espero uma
reação dele, meu soco vai direto em sua mandíbula e ele cai no chão. Minha
raiva cega faz com que chova socos na sua cara. Não dou chance para ele
revidar.
— Carl, você vai matar ele! — a voz de Sam penetra a bruma
vermelha que tenho diante de mim, não vejo nada além da raiva cega. Filho
de uma cadela. — Carl!
Saio de cima da massa sangrenta dele imóvel no chão e envolvo meus
braços em torno de Samantha. — Shiii, está tudo bem — digo beijando o
topo de sua cabeça, ela está tremendo violentamente. — Estou aqui, carinho
— A raiva borbulha dentro de mim. Filho da puta, fiquei tão concentrado em
Zara que não olhei direito para ele, imbecil. Pego meu celular e ligo para
Roger vir buscar esse calhorda.
— Você quase o matou — Samantha diz a voz abafada, pois seu rosto
está colado em meu peito.
— Ele merecia muito mais, carinho, não seja tão boazinha — reclamo
apertando meus braços em volta dela. — Não acredito que deixei ele chegar
perto de você.
— Eu sei que você não deixaria nada acontecer comigo. — Ela aperta
os braços em volta da minha cintura.
— Pode ter certeza, amor, mas esse bundão filho de uma cadela teve
oportunidade hoje de machuca-la. — olho para o cantor ainda no chão
desacordado. — Como você sobreviveu todo esse tempo com tanta gente
usurpadora ao seu lado?
— Não sei, acho que sempre fiz o que os outros esperavam de mim e
nunca questionei nada. — Ela suspira — Não tinha motivos além da música
para viver, agora eu tenho tudo que sempre quis.
— Nunca mais deixe ninguém ditar sua vida, Samantha, ou teremos
sérios problemas— falo seriamente.
— Vai fazer o que, senhor O’Neal? — Ela intensifica o aperto mais.
— Humm... posso pensar em algumas maneiras, carinho, eu sempre
penso.
Ela tenta rir, mas sai um riso forçado e sei que ela ainda está
assustada. Se esse cantorzinho já não estivesse no chão levaria mais uns bons
socos.
Não demora muito para Roger chegar, contudo garanti que esse
imbecil não fosse a lugar nenhum. Como amassei a cara dele, foi levado
primeiro para o hospital. Roger facilitou para nós e pegou nossos
depoimentos sem precisar que fossemos a delegacia, claro que depois
teríamos de ir.
— Carl, você devia pensar antes que de tentar matar o cara, isso pode
gerar problemas — Roger diz quando aperta minha mão em despedida. —
mantenha contato.
— Claro.
Depois levo Samantha para dentro do apartamento, odeio que ela teve
de passar por isso.
— Você está bem? — pergunto pela milionésima vez quando sento-a
no sofá, servindo uma bebida para ela. Eu não sei o que faria se algo
acontecesse com ela agora que a tenho finalmente aqui.
— Sim, amor — ela sorri enchendo meu coração com esse calor
cálido que me acalma. Acaricio seu rosto, amorosamente. — Ele não vai
incomodar mais.
— Espero que não.
— Vou garantir isso, querida.
Beijo seus lábios suavemente de início, mas o desejo de fundir com
ela é grande demais, intensifico o beijo, minha língua mergulhado e
vasculhando cada canto suculento de sua boca. — Eu quero você.
Ela geme quando pego-a nos braços, levando-a para nossa cama.
48
Samantha
Estamos no aeroporto vendo meus pais caminharem para o
terminal de embarque internacional e uma calma tranquila me toma.
Nessas semanas passadas foram um turbilhão de acontecimentos. Eu
fiquei muito triste com todo desfecho, não era para ser assim. Terminar
em tragédia, com Zara morta e Pietro preso, mas segundo Carl ele seria
solto. Eu não me importo, só quero distancia de tudo, quero pensar no
futuro. Meus pais tinham enfim entendido que eu não ia mais ceder em
nada para eles e revolveram voltar para sua casa na Itália, o lugar que eles
sempre quiseram estar quando eu pude presenteá-los com uma casa.
Dou um suspiro quando não avisto mais eles, eu sei que são meus pais
e fizeram muito por mim, mas agora quero que eles vivam suas vidas e
deixem que viva a minha com o homem que me ama da mesma forma que o
amo.
— Tem certeza que quer eles longe? — braços fortes e musculosos
me abraçam pela cintura e a voz rouca e sexy fala em meu ouvido, fazendo
minha cabeça pender para trás e se encaixar no seu ombro largo.
— Sim, quero apenas ser eu mesma daqui em diante — digo e viro-
me para olhar nos olhos azuis escuros que tanto amo. — Eu amo você.
— Carinho... — Carl tira uma mecha de cabelo do meu rosto e beija
minha testa — Você é linda e cada dia meu amor é maior.
Ele segura minha cintura e seguimos em direção ao carro. — Quero
levar você em um lugar — ele diz.
— Aonde?
— Surpresa.
— Odeio surpresa, já te disse isso? — resmungo fingindo mau humor.
— Você amou a última que fiz — ele passa o braço direito por cima
do meu ombro levando-me para fora do aeroporto. Claro que sim, afinal, ele
tinha me pedido em casamento. Olho o anel em meu dedo e meu peito aquece
com uma onda gigantesca de amor.
Uma hora depois ele para o carro em frente a uma casa em um bairro
residencial arborizado. Olho ao redor, eu gosto do clima daqui, porém fico
preocupada se ele mudou o horário e local onde iríamos encontrar seus
amigos, tínhamos um encontro hoje a noite e eu enfim vou conhece-los —
Vamos nos encontrar com seus amigos?
— Não.
— Que lugar é esse? — questiono.
— Por que não entramos? Podemos falar lá dentro. — Ele aponta para
casa. Vejo uma mulher em um terninho bege na frente. Quando passamos um
portão preto de ferro para um pequeno pátio onde tem um canteiro de flores
no meio como se fosse uma fonte, mas em vez de água tem flores plantadas
lá.
— Isso é lindo e a casa é... — toda pintada na cor clara e tem
provavelmente um primeiro andar com janelas brancas em cima, não é um
palácio, mas de um bom tamanho, é charmosa por fora e parece nova.
— Bom dia, senhor O’Neal, que bom que veio — a mulher fala
quando nos aproximamos. Carl aperta a mão dela e vira-se para mim.
— Samantha, essa é Adriana Brasil — ele apresenta. — Ela é
corretora e irá mostrar a casa para nós, Adriana, essa é minha noiva
Samantha.
— Seja bem-vinda, Samantha — ela me dá um sorriso caloroso e
aponta para nós entrarmos.
Depois de meia hora percorrendo a casa e a corretora falando sobre
cada canto fico encantada. Como imaginei, tem um primeiro andar onde
ficam os quartos e embaixo a sala, cozinha e outros cômodos, todos vazios,
eu já estava começando a decorar o ambiente em minha mente. É pequena
comparada com a casa que temos na Itália onde meus pais vivem, porém eu
prefiro assim, menor, mas que terá muito amor envolvido. Eu não tenho
dúvidas de que Carl pensou a mesma coisa já que ele me trouxe aqui e tinha
tudo acertado para ser essa a casa que iríamos morar, quando enfim
decidimos nos casar. Casamento esse que vai ser tão logo os papeis fiquem
prontos. Não queremos nada espetacular, mas simples e reservado.
— Você pode nos deixar a sós um momento, Adriana? — Carl pede
quando chegamos ao quarto principal. — Já falamos com você.
— Fiquem à vontade — ela diz e caminha para fora. — Estarei lá
embaixo.
Quando ela sai Carl se vira para mim
— Você gosta da casa?
— É perfeita.
— Você pode preferir outra, eu apenas achei que aqui daria para nós
— ele segura minha nuca com umas das mãos me atraindo para ele. Sua testa
encosta na minha.
— Eu amei essa.
— Ótimo — ele diz antes de me beijar ferozmente. Sinto-me quente
com sua língua perversa sugando a minha em sua boca. — Amo você e quero
que essa casa seja nosso pequeno ninho.
— Ele será. Também te amo.
Quando saímos de lá e voltamos para o apartamento dele, a única
coisa que pensamos é em dar vazão a luxúria que se mantém constante em
nossas veias quando estamos juntos. Esse amor que parece finalmente no seu
devido lugar.
*
O Vestido esmeralda na altura do joelho justo combina com os
brincos de esmeralda na minha orelha, meus cabelos soltos em ondas foi o
que optei para o jantar com os amigos de Carl. Somos os primeiros a chegar
no restaurante e sento nervosa. Eu sei que é besteira, mas se eles sabem da
nossa história podem me achar uma megera má que não merece Carl.
— Você já contou para seus amigos sobre nós? — pergunto
mordendo os lábios
— Algumas coisas — ele diz distraidamente enquanto beija o dorso
da minha mão. — Pare de se preocupar. Eles são como uma família para mim
e irá tratá-la como tal.
— É que... — a frase fica no ar quando vejo uma loira caminhar
direto para nossa mesa acompanhada de um homem enorme, ela parece
minúscula perto dele, mas posso dizer que ela é uma força a ser reconhecida.
— Aí está você, Samantha. Eu sabia que você só poderia ser muito
bonita para deixar Carl todo apaixonado — ela diz quando para ao nosso
lado, ela estende a mão para mim simpática — Lana Mitchell.
Escuto o resmungo de Carl ao meu lado e sorrio para ela. — Olá
Lana. Sou, Samantha.
Digo, desnecessário já que ela pare saber quem sou.
— Samantha, esse é Alexander e sua namorada Lana, como deve
saber por sua personalidade loquaz — Carl diz apontando o homem de olhos
verdes claros. Ele parece intimidante, mas me dá um sorriso caloroso.
— Samantha — ele beija minha mão, cavalheiro. — É um prazer
enfim conhecê-la
— Igualmente — responde feliz, pois não vejo nenhuma animosidade
da parte deles.
Lana fazendo jus ao que Carl disse sobre ela, vem e me dá um abraço.
Dizendo que quer me conhecer melhor e que estou convidada a ir em sua
casa qualquer dia desses. Gosto dela. O novo casal que aparece tem outra
loira, mas essa parece ser mais reservada do que Lana, porém é amável
também. Carl me apresenta como Lilian e seu marido Salvatore. Ele é
moreno e quase tão grande quanto Alexander, todos parecem simpáticos
comigo e vejo que não tinha motivos para temer conhece-los.
O último casal Bruno e Alicia chegam e todos nós sentamos depois
dos cumprimentos
— Samantha, você é real mesmo? Eu tinha sérias dúvidas sobre isso
— Bruno diz, sorrindo para mim. — Carl tem sido muito vago sobre você.
— Carl sempre foi muito protetor comigo, temos passado por alguns
percalços e foi preciso nos manter fora das vistas. — digo conciliatória.
Seguro a mão de Carl por baixo da mesa e dou um aperto firme. — Mas, sim,
sou real. Antes vivia viajando, passei muitos anos fora do Brasil
— Eu tinha outras teorias — Bruno continua e sua esposa
provavelmente lhe belisca, pois ele esfrega os braços olhando para ela de
testa franzida.
— Sam não ligue para ele, sempre fala o que não deve — Alicia diz
para mim.
— Quando vamos ouvi-la tocar? Sei que você é pianista — Lana
pergunta fazendo eu me voltar para ela.
Eu pareço ser o centro da atenção de todos e, se já não fosse
acostumada a isto, estaria vermelha agora com todos me olhando e fazendo
perguntas sobre mim.
— Estou preparando um último concerto e todos estão convidados —
digo e percebo o que disse. Eu não tinha contado para Carl ainda. Bem, agora
ele sabe e está me olhando surpreso.
— Não sabia disso — ele diz baixo apenas para mim.
— Eu ia contar, apenas escapou agora. Era surpresa.
— Vai me falar sobre isso mais tarde — ele diz em um tom sério.
O jantar transcorre bastante agradável e gostei muito dos amigos mais
chegados de Carl, eram como irmãos, uma família como ele disse mais cedo.
Fico quieta apenas vendo a interação de todos e fico imensamente
feliz por finalmente fazer parte disso ao lado do homem que amei minha vida
inteira. Estamos quase no fim do jantar quando Bruno e Alicia dizem que vão
embora, pois têm um bebê em casa que precisa deles.
— Vamos marcar qualquer dia desses um almoço, Samantha, você
precisa de novas amigas agora que está aqui em definitivo — Alicia diz
quando se despede. — Lana e Lilian são ótimas companhias, uns podem
dizer que não, mas são — ela provoca sorrindo para Lana. — Essa menina é
uma louca, mas uma louca muito gentil e amável.
— Eu sou mesmo — Lana replica rindo. — Não é querido?
— Você? Não tenho certeza, preciso verificar sua amabilidade mais
tarde — Alexander diz e Lana cora violentamente.
— Aqui não, amor, assim vão pensar coisas indecentes — ela
responde com um sorriso travesso, seus olhos totalmente maliciosos.
— Se ninguém imaginou, Lana, agora não tenho mais dúvidas disso
— Bruno fala rindo e puxa Alicia para seu lado acenando. Depois pisca para
mim. — Até outro dia, fantasminha.
Eles vão embora e fico imaginando quando também começarei uma
família com Carl. Isso seria perfeito.
49
Carl
Não perdi as esperanças de te encontrar outra vez
Eu voltei
Voltei pra te dizer que é impossível
Te esquecer
( Primeiro Amor – Malta)

Sorrio quando vejo Sam entrar na cozinha apenas com uma camisa
minha branca de mangas compridas. A camisa masculina a deixa sexy como
o inferno, sinto o desejo de agarrá-la e nós fizemos amor há menos de meia
hora, minha sede dessa mulher parece interminável.
— Bom dia, carinho — cumprimento de onde estou encostado no
balcão tomando meu café nas primeiras horas da manhã. Ela franze a testa
quando se aproxima.
— O que é isso que está bebendo? — pergunta saindo de perto de
mim — Fede.
— Isso é café, Sam. — Dou um gole e ela faz uma careta. — Até
ontem você bebia café
— Deve estar estragado então. — Ela abre a geladeira e se curva
dando-me uma visão privilegiada de sua bunda sexy. — Melhor fazer outro.
— Acabei de fazer — digo distraído. Maldição ela é perfeita.
— Hoje tudo tem de ser perfeito. — Ela levanta e me pega
conferindo-a. — Estava olhando minha bunda, senhor O’Neal?
— De jeito nenhum — digo inocente.
— Alexei me garantiu que só preciso comparecer e fazer o que
sempre fiz, mas estou nervosa demais, algo que não acontece há muito tempo
quando o assunto é tocar piano. — Ela me olha mordendo os lábios.
— Você será um sucesso. — Coloco minha caneca no balcão e vou
até ela. — Você é perfeita. E será uma esposa perfeita.
— Você me bajula. — Ela envolve os braços no meu pescoço e
nossos lábios se unem em um beijo lento, Sam me empurra e sai correndo de
perto de mim e volta para o quarto me deixando lá sem ação.
O que diabos foi isso? Penso quando vou atrás dela. Encontro
Samantha trancada no banheiro e o som de quem está vomitando vem de lá.
— Carinho, o que você tem? Você está bem, amor?
— Já vou, Carl — a voz sai abafada e pouco depois ela abre a porta e
parece verde. — Acho que estou mal do estômago.
— Melhor ir no médico, pode ser nervoso, tem de se controlar, amor
— digo quando a puxo para meus braços.
— Não me beije, esse gosto de café em sua boca está me enjoando.
— Me senti atingido agora, meu ego não pode sustentar essa rejeição
— brinco quando levo-a para cama e a deito. — Descanse e pare de se
preocupar com esse concerto, vai tudo correr perfeitamente.
Ela acena, mas sei pelo olhar aflito que minhas palavras não valeram
de muita coisa.
*
A noite do concerto de Samantha é agridoce porque eu desejaria que
ela tivesse mais disso em sua vida, que foi por essa razão que ela sacrificou
sua vida pessoal e desejo também que ela fique comigo para sempre. Sei que
uma coisa não anula a outra, mas construir uma família com alguém viajando
a todo momento não deve ser fácil. Mas sinto que ela está fazendo o que ela
quer. Indo para outro rumo de sua carreira. E só posso apoiar suas decisões.
O Teatro Municipal de São Paulo está lotado. Uma orquestra está no
palco e eu não vejo Samantha há um tempo. Localizo Alexander, Bruno e
suas mulheres e me junto a eles. Angelina também estava presente, Samantha
me fez localizá-la para que viesse essa noite. Ela merecia uma noite de gala
por ter acertado um soco em Zara. Ainda sorrio quando me lembro. Eu
concordo plenamente com Sam, Angelina merece um prêmio. Deveria ser
contrata pela Marshall em definitivo.
Salvatore e Lili chegam depois e todos sentamos.
A orquestra começa a tocar uma música que não parece nenhum
clássico quando um homem começa a cantar...
Não perdi as esperanças de te encontrar outra vez
Eu voltei
Voltei pra te dizer que é impossível
Te esquecer
Eu voltei
Ela estava me dando um recado tão claro e eu a amo demais, meu
peito está apertado nó e sinto vontade de beijá-la tão profundo...

Então olha pra mim


Diz que vai ficar, que sente saudade
E espera a tempestade passar
Nossa tempestade tinha findado, deixando nos mais ligados um ao
outro, enfim tínhamos tido paz
Que ainda sou seu primeiro amor
Que sente minha falta no seu cobertor...
Agora não mais, eu a tenho em meu cobertor, na minha cama, na
minha vida para sempre, carinho, tenho você.
Que sente minha falta no seu cobertor...
Puta que pariu. Meu coração pula no meu peito quando os últimos
acorde cessam, as luzes apagam e um facho de Luz ilumina o palco. No
piano sentada com um vestido longo dourado brilhante está a mulher mais
linda do planeta, e ela toca para mim, eu sei que é para mim.
Frederik Chopin - Mariage D'amour aparece escrito no telão ao fundo.
Ela toca com a alma em cada acorde dirigido direto ao meu coração. Merda,
sinto que poderia chorar aqui. Por que eu nunca fui a um concerto antes?
Perdi essa delicadeza por puro rancor. Ela toca como se sua alma
transbordasse com os acordes e notas saem por seus dedos magníficos. Seu
corpo vibra de emoção. Eu nunca tinha vista ela tão entregue, tão poderosa.
O concerto é perfeito e quando termina eu subo ao palco e a beijo
para todo teatro lotado saber que ela toca para mim, que ela me toca de todas
as maneiras...
— Tenho você, carinho — digo quando a sustento nos braços.
— Você é minha música mais perfeita, Carl O’Neal.
*
Dois dias depois...
— Isso não é normal — digo quando vejo Samantha correr para o
banheiro outra vez quando sente o cheiro de café. — Você não está nervosa
hoje. Vamos no médico.
— Estou bem — ela diz, saindo verde do banheiro e caindo na cama.
— Só preciso de um minuto.
— Samantha Stollen, vamos ao médico agora. — Pego-a nos braços e
caminho para fora do quarto.
— Carl, estou toda descabelada!! — ela protesta, porém não escuto e
levo-a para o carro.
Uma hora depois estou paralisado na emergência do hospital
particular. Precisamente na frente do médico que está atendendo Sam.
— Como? — a voz de Sam sai em um sussurro.
— Pelos sintomas que está sentindo tudo indica uma gravidez — ele
repete. — Vamos fazer uma ultrassonografia e confirmar?
Ela assente automaticamente e eu continuo lá paralisado. Filho? Com
Sam? Puta que pariu!
O médico pede para irmos para sala de exame e as surpresas apenas
começam.
— Sim como imaginei. Não, não... isso é...— ele está dizendo,
passando o aparelho no estômago plano de Samantha, eu estou olhando para
ele procurando onde meu filho está porque seu abdome é totalmente plano.
— Não é um bebê.
— Não? — Samantha diz aflita agarrando minha mão.
— Não é um bebê, são dois bebês. — Ele ri e um som fraco começa a
ser ouvido na sala. — Certo, são dois corações batendo. Parabéns!
— Jesus Cristo! — digo baixo. Sinto vertigem como uma dama
vitoriana.
— Certeza? Dois? — Sam chora e ri ao mesmo tempo. — Carl.
— Sim, carinho, deixe-me respirar um minuto.
Eu seguro seu rosto e beijo duro. Eu apenas estou ficando louco.
Dois filhos? Porra eu não fazia nada pela metade.
Saímos do hospital como zumbis mais tarde, não tínhamos nada mais
em mente que essas duas vidas para coroar nosso AMOR.
*
Ajudo Sam a entrar no carro e ficamos os dois parados absorvendo as
novidades. Meu peito parece que vai explodir de tanta emoção. Vamos ter
gêmeos? Puta que pariu. Estou entrando em pânico.
— Vamos ter dois bebês, Samantha. — Viro meu rosto atordoado
para ela. Ela está brilhando intensamente com um sorriso radiante nos lábios.
Eu não me controlo e agarro sua nuca, trazendo-a para mim, pressionando
minha boca contra a dela. Um gemido longo escapa de nossas gargantas. Nos
beijamos, nossas línguas se enroscam e nos agarramos e, porra, é tão
profundo como se nós tivéssemos encontrado uma fonte de água cristalina no
deserto. Levo minhas mãos a seu abdome e acaricio com cuidado e apreço.
Nós dois fizemos isto e é perfeito demais.
— Eu te amo pra caralho — digo emocionado junto aos lábios dela.
Quero gritar alto aos quatro cantos. Ela voltou para mim e além tudo me deu
o presente mais perfeito.
— Eu também amo você mais que tudo — ela diz em uma mistura de
riso e choro.
*
Felicidade.
O sentimento correndo em minhas veias é pungente e potente.
Eu estou carregando um pedaço de Carl dentro de mim, um não, dois.
Parecia que a vida estava me compensando pelo tempo perdido e me deu logo
dois bebês de presente de uma só vez.
— Leve-me para casa, amor —digo e ele faz exatamente isso.
Um mês depois...
— Eu os declaro marido e mulher — o juiz recita e eu sorrio tão
amplamente que meu rosto dói. Hoje é o dia com o qual sonhei por mais de
doze anos. Estamos dez anos atrasados, mas não importa, eu e ele somos
mais sábios agora e, portanto, não cometeremos tantos erros. E talvez era
para ser nesse momento. Nunca sabemos porque algumas tragédias nos
atinge, mas certeza que não é por acaso. Agora é maravilhoso. Minha barriga
já mostrando meus bebês no vestido curto de noiva marca esse momento para
sempre.
Optamos mutuamente por algo simples e rápido. Apenas seus
melhores amigos e, bem, eu estou sozinha no que diz respeito a familiares,
papai e mamãe se recusaram a participar do meu casamento, contudo, o que
devo fazer? Eles ainda não me perdoaram pelo modo que os tratei quando
descobri o quanto eles foram levianos com meus desejos.
Carl segura-me firme e sinto os lábios dele devorando os meus. Seu
amor me basta de uma maneira incrível e eu sei que minha família está
apenas começando.
O que tinha de ser, foi e não precisamos mais lamentar o que não
podemos mudar.
— Amo vocês — seu sussurro é minha garantia que tudo está mais
que perfeito.
Epílogo
Samantha
Três anos depois...

Eu sabia que poderia ter realizações com minha música sem que
tivesse viajando de lado para outro. Hoje é um dia mais que feliz para mim.
Recebi um telefonema que me deixou nas nuvens, minhas árias que estive
compondo durante um ano é agora parte dos concertos de Valentina Lisitsa,
umas das maiores pianistas da atualidade e de quem sou grande admiradora.
Vejo Carl entrando na saleta de música e eu abro um sorrido radiante
para ele. Cada dia ele fica mais lindo e eu mais apaixonada, se isso é
possível.
— Você tem de comemorar isso em grande estilo, amor — Carl diz
quando digo para ele quem era ao telefone. — Tenho certeza que será um
sucesso.
— Comemorar como? — pergunto maliciosa, levantando
sugestivamente uma sobrancelha. — Tem alguma sugestão, senhor O’Neal?
— Humm, talvez — diz caminhando para perto de mim com esse ar
predatório que eu amo demais. Ele me puxa de encontro ao seu corpo quando
para a minha frente.
Ele envia as duas mãos em meus cabelos uma em cada lado da minha
cabeça e me beija profundo e intensamente, sua língua é impiedosa quando
ataca minha boca. Ele me pega nos braços e deita-me em cima do meu piano
de calda que está nessa sala. Não é a primeira vez que usamos o piano como
cama, mas sempre parece especial quando ele me toma aqui.
— As crianças? — eu pergunto sem folego, quando ele me empurra
em cima do piano e senta-se na banqueta.
— A babá saiu com elas — responde enquanto desliza a palma da
mão da minha barriga para o vale entre meus seios. Ele agarra um por cima
da minha camiseta branca e eu gemo quando ele belisca o mamilo duro com
as pontas dos dedos.
— Eu quero te comer até você gozar — ele rosna e segura minhas
pernas abertas para que fique entre elas, seu rosto bem ao alcance da junção
das minhas coxas.
—Você é tão linda e toda minha, porra — ele resmunga e baixa a
cabeça beijando-me por cima do tecido da minha calcinha de renda. Ele
afasta o tecido úmido e desliza sua língua sedosa ao longo de todo o local
pulsante e lambe toda minha excitação, em seguida começa a lamber minha
boceta como se tivesse faminto, sedento e eu fosse um banquete suculento
para seu prazer. Minha cabeça está inclinada para trás e o meu corpo se
arqueia e torce contra sua boca. Agarrando meus quadris, ele me fode com a
sua língua. Então ele chupa meu clitóris em sua boca até que eu estou
gritando.
—Eu estou quase... — balbucio incoerente e tento empurrar sua
cabeça de encontro onde mais preciso dele. Caramba, isto é demais!
—Não — diz ele, cessando o seu movimento. —Você gozará quando
eu estiver dentro de você, carinho. Meu corpo empurrava em espasmos e
minha cabeça gira sem controle
— Preciso de você, amor — ofego descontrolada.
Estou tão fora de mim de desejo insatisfeito que nem percebo que ele
se livrou da calça. Ele agarra meus pulsos e, segurando-os por cima da minha
cabeça, bate ainda com força em mim. Sua boca cai em um beijo duro e
faminto da mesma forma que ele está golpeando seu pau dentro de mim.
Enterrando-se ao máximo, meu corpo perde totalmente o controle e eu
começo a convulsionar de êxtase. Seu membro vidra dentro de mim quando o
prazer começa a tomá-lo também.
Ele cai por cima de mim esgotado, sua cabeça repousa em meu
abdome.
— Melhor nos mexermos ou seremos pego em flagrante — sorrio
acariciando seus cabelos macios.
— Humm...
— Eu te amo — digo cheia de ternura quando recebo um beijo na
barriga.
— Te amo mais.

*
Casa do Lago...
Dois pequenos corpos passam correndo em passos trôpegos pela sala
onde estou olhando minha relação de novos alunos para as próximas semana
de aula. Quando vejo os gêmeos fugirem para o deck, eu espero que Carl vá
atrás dos dois, mas ele não vem. Ele sempre está correndo atrás desses dois
travessos.
Levanto suspirando e vou verificar o que eles estão aprontando. Vejo
primeiro Monick em pé segurando a grade de proteção do deque e olhando
para a agua abaixo e, depois, seu irmão Liam tentando escalar. A grade é alta,
feita dessa maneira desde que eles começaram a andar. O cuidado era pouco
quando se dizia respeito a esses dois. Eles tinham muita energia, multiplique
por dois e você terá um monte de energia aqui.
— O que estão fazendo, queridos? — cruzo meus braços com cara de
brava. — Onde deixaram o papai?
— Mamãe! — Monick vem correndo para mim.
— Ei, bebê! — pego-a nos braços beijando sua bochecha rosada.
— Não sou um bebê — ela reclama, porém agarra meu pescoço
apertado. Sinto um cutucão na perna e olho para baixo para ver olhos azuis
escuros esperando sua vez. Com três anos eu não consigo mais pegar os dois
nos braços.
Sento na longa longue chaise e coloco cada um em uma perna.
— Tudo bem, querido? — beijo seus cabelos castanhos e recebo um
beijo molhado. — Onde está o papai?
— Ali, mamãe — Monick aponta para o lago e meu coração bate
como um louco quando vejo Carl acenando do pequeno barco para perto do
deck. Agora entendi por que os gêmeos estão querendo escalar a proteção.
Os gêmeos dessem do meu colo e vão para a grade outra vez.
Caminho e paro ao lado deles, olhando seu papai remar até parar.
— Me leva, papai! — Monick, como sempre a mais falante, grita
animada.
Tudo que eu mais amo está bem aqui, meus filhos e o homem que o
tempo não pode apagar do meu coração.
Liam era tão parecido com ele e tinha herdado minhas inclinações
para música. Ele já tocava piano lindamente. Os dois tocavam piano, mas o
talento do meu pequeno era notável. Eu sabia que ele provavelmente se
tornaria um grande concertista.
— Senhora O’Neal, jogue-me esses dois aqui — Carl grita lá de baixo
e seus filhos gritam felizes em acordo.
— Não vou jogar meus filhos, Carl, eles podem cair na água — digo
apreensiva.
— Eles não cairão, amor, para isso estou aqui — ele garante. Sei que
ele está. Meu segurança favorito sempre está pronto para nos proteger.
— Quero pular, mamãe! — eles falam ao mesmo tempo pulando para
cima e para baixo em expectativa e apenas faço suas vontades.
As risadas, depois, dos três lá embaixo enchem meu coração de uma
maneira que eu não sei como ainda não explodir de felicidade...
— Agora sua vez, carinho — ele diz sabendo bem que não vou pular
igual uma adolescente.
— Obrigada, querido, estou bem aqui. Mais tarde você pode fazer eu
pular de outra forma – sugiro maliciosa piscando para ele.
— Pode apostar, amor.
Fim
“A simplicidade é a conquista final. ”
Frederic Chopin
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus por mais um trabalho realizado. A
Ele toda graça.
Agradeço a Patrícia da Silva pelo trabalho com Carl. Obrigada amiga.
Lisse, Lu, obrigada meninas.
Minhas leitoras queridas, obrigada por continuarem até aqui comigo.
As lindas que divulgam meus livros.
Grata.
MAYJO

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