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MODELOS

DE NEGÓCIOS

Ana Clara Aparecida Alves de Souza


Customer development
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Analisar as limitações do modelo tradicional de gestão nas start-ups.


 Descrever a metodologia customer development.
 Comparar as metodologias product development e customer
development.

Introdução
As teorias da administração sempre buscaram desenvolver metodologias
de gestão para o sucesso das práticas produtivas. Ao longo da história,
especialmente a partir da Revolução Industrial, novas formas de produção
foram criadas para melhorar o uso dos recursos (incluindo o trabalho
humano), a fim de gerar mais produtividade e sucesso. Entre esses es-
forços, incluem-se muitas metodologias de planejamento, como planos
de negócios, modelos de negócios e planejamento estratégico. Hoje,
como você sabe, têm surgido novos modelos de empreendedorismo,
que levam em conta a globalização das relações mercantis e os avanços
tecnológicos e comunicacionais.
Neste capítulo, você vai estudar o customer development (“desenvolvi-
mento do cliente”), uma metodologia que contribui para a identificação
das demandas dos clientes, buscando também agilizar o feedback. Assim,
o foco não está mais no produto, no seu desenvolvimento e na entrega
ao possível público-alvo: o foco está em uma sistemática que se dirige
ao público almejado para consulta, aprimoramento, reelaboração, etc.; só
depois é que o produto é entregue. Essa configuração se alinha à forma
como as start-ups são constituídas, já que essas empresas trabalham a
partir de dinâmicas instáveis, como você vai verificar no início do capítulo.
Posteriormente, você vai estudar a metodologia customer development
e, em seguida, vai ver como ela se relaciona com a metodologia product
development (“desenvolvimento do produto”).
2 Customer development

1 O modelo tradicional de gestão e as start-ups


O modelo tradicional de gestão, apesar de estar pautado em ideias administrativas
que já têm mais de cem anos, ainda é encontrado em empresas com tendências
mais conservadoras na concepção e na condução das atividades. Orlickas (2012)
destaca que as primeiras teorias da administração surgem somente a partir da
primeira metade do século XIX, com a Segunda Revolução Industrial. Essas teorias
compõem os modelos tradicionais de gestão. Uma teoria administrativa pode ser
considerada, conforme a autora, uma proposição sistematizada criada para orientar
administradores na gestão de empresas e no cumprimento de metas e objetivos.
Os modelos tradicionais de gestão se pautam nos princípios que nortearam
as teorias da administração. Eles enfatizam aspectos como:

 a racionalização do trabalho no nível operacional, que se caracteriza


pela interação dos profissionais na dinâmica da rotina de trabalho, na
qual se prima por produtividade, eficiência e eficácia;
 as tarefas, a estrutura e a organização formal (sistemas de organização
da empresa que funcionam por meio de processos, normas, padrões,
hierarquia, cargos, obrigações);
 a departamentalização.

Mais tarde, esses aspectos foram substituídos pela organização informal


(interações e relacionamentos que ocorrem entre as pessoas). Também entraram
em cena: a motivação, a preocupação com as pessoas e as dinâmicas de grupo.
Em seguida, a organização formal e a informal foram combinadas, agregando
elementos como: ambiente interno e externo da organização, noção de sistema
aberto, objetivos e resultados, teorias das decisões, integração de objetivos
organizacionais com indivíduos, etc. Isso tudo se deu no período de 1900 a 1950.
A seguir, veja quais são os principais tipos tradicionais de organização
destacados por Orlickas (2012).

 Organização linear: é a organização mais simples e antiga que existe.


Tem como característica principal a autoridade linear, isto é, uma auto-
ridade superior tem controle absoluto sobre os subordinados. Baseia-se
em modelos eclesiásticos e militares. É o tipo de estrutura que funciona
em ambientes estáveis e rotineiros.
 Organização funcional: é a estrutura pautada nas funções desempe-
nhadas pelas pessoas, no processo de criação e gestão da empresa. Parte
do pressuposto taylorista de que as funções determinam as decisões
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e ações organizacionais. Dessa forma, alinha-se ao princípio de espe-


cialização das funções.
 Organização linha-staff: desenvolve-se com vistas à eficiência e à eficácia.
Nesse processo, os especialistas de staff se aprofundam em um campo de
atividades, de modo a permitir que os gerentes de linha se dediquem a ati-
vidades com foco mais estratégico. Esse tipo de organização surgiu devido
ao aumento da complexidade das tarefas organizacionais. Os gerentes de
linha passaram a delegar autoridade para o desenvolvimento de atividades-
-meio compostas em unidades ou cargos, também denominado “staff”.

O modelo de gestão tradicional tem um perfil focado em atividades mecâni-


cas, em geral lineares. Esse tipo de modelo é pouco adequado a um contexto de
mudanças, que demanda novos tipos de organizações. Essas novas organizações
precisam de uma gestão diferenciada e adaptada a formatos que, dentro das exi-
gências contemporâneas, gerem maiores e melhores resultados. Nessa perspectiva,
tais organizações alinham-se ao perfil de jovens empreendedores que buscam
desconstruir padrões de relacionamentos hierarquizados e departamentalizados,
ou mesmo de colaboradores focados apenas em suas funções (ORLICKAS, 2012).
As particularidades da gestão conservadora se relacionam às limitações
do modelo tradicional, que encontra dificuldades para se adaptar às novas
configurações de negócios. Assim, esse modelo não se adequa à gestão de
start-ups, que representam o perfil moderno de organização. Nas start-ups, a
gestão horizontal é uma característica marcante. Ela permite fugir de hierar-
quias rígidas e promover o fluxo de ideias de todos os colaboradores, o que
não se observa em modelos tradicionais, que são mais inflexíveis. Para Ries
(2012, p. 33), “[...] uma start-up é uma instituição humana projetada para criar
novos produtos e serviços sob condições de extrema incerteza”. As start-ups
são empresas iniciantes; elas contam com a presença significativa da inovação
e com um modelo de negócios que pode ser repetido e escalado.
Ries (2012) destaca que, durante muitos anos, os empreendedores que hoje
têm o perfil alinhado com as start-ups tinham problemas específicos que
destoavam da administração tradicional. Essa dificuldade de alinhamento
levou diversos desses empreendedores a conceberem os seus negócios a partir
da intuição, o que, na maioria dos casos, não conduziu ao sucesso. Ademais,
Reis (2012) pontua que a administração geral, embora tenha produzido uma
infinidade de conhecimentos, não se adapta ao perfil das novas empresas,
em especial por conta dos cenários de incerteza em que elas operam. O autor
acredita que é necessária uma disciplina gerencial própria ao empreendedo-
rismo, que dê conta das suas singularidades.
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Por estar fundada em padrões tradicionais, a maioria das ferramentas da


administração geral não é projetada para os contextos de extrema incerteza
nos quais as start-ups se estabelecem (RIES, 2012). Dessa forma, embora o
modelo tradicional de gestão permita compreender muitas questões ainda
presentes nas organizações atuais, o perfil das start-ups demanda mecanismos
de gestão particulares e inovadores, de maneira a acompanhar os elementos
emergentes em uma era de globalização das relações em todos os âmbitos da
vida em sociedade.

2 A metodologia customer development


A metodologia customer development, apresentada por Cooper e Vlaskovits
(2010) e concebida por Steve Blank, é uma estrutura desenvolvida em quatro
etapas. Ela visa a verificar se o empreendedor encontrou o mercado para o seu
produto, se desenvolveu os recursos certos para solucionar as necessidades
dos clientes, se testou os métodos corretos para adquirir e converter clientes
e se implantou os recursos adequados para escalar o negócio. Essa proposição
busca fugir do padrão convencional, no qual o produto era desenvolvido sem
um maior alinhamento com a demanda real dos clientes. Dessa forma, como
o seu nome indica, a metodologia customer development põe a demanda no
cliente no centro do produto ou serviço oferecido. Isso permite reduzir as
chances de que a oferta da empresa seja rejeitada no mercado.
Assim, na concepção de Blank (2006), o customer development concentra-se
na compreensão dos problemas e necessidades do cliente. Essa compreensão
ocorre por meio de: validação do cliente no desenvolvimento de um modelo
de vendas que pode ser replicado; criação e direcionamento da demanda
do usuário final; criação da empresa propriamente, pela transição de uma
organização projetada por aprendizado e descoberta para uma organização
direcionada à execução do projeto pelas lentes do cliente.
Como exemplo de aplicação da metodologia customer development, consi-
dere o caso da empresa Unilever. Sem indicar como utiliza a metodologia, para
não revelar a sua estratégia, ela destaca em seu website que os seus clientes
são os próprios definidores da marca, permitindo a orientação e a previsão
de tendências. Por meio da relação que estabelece com os clientes, a Unilever
(2020) afirma tomar decisões que permitem um crescimento mais sustentável
e com menos impacto ambiental.
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A seguir, veja quais são as etapas que estruturam a condução do customer


development como uma metodologia de alinhamento entre produto e cliente.
Os itens a seguir se referem à fase de descoberta.

 Descoberta do cliente: nesse processo, verifica-se em que medida o


produto ou serviço resolve um problema para um grupo identificável
de usuários (isso levará à descoberta do cliente).
 Validação do cliente: nessa etapa, identifica-se se o produto é vendável
no mercado e se este é grande o suficiente para que um negócio viável
possa ser construído (o que permitirá a validação do cliente). Essa fase
deve ser associada ao que foi definido anteriormente, para garantir o
alinhamento.

A seguir, veja os elementos que compõem a fase de execução.

 Criação da empresa: essa etapa busca identificar se o negócio é esca-


lável por meio de um roteiro repetitivo de vendas e marketing (nesses
processos, há a criação da empresa).
 Construção da empresa: por fim, os departamentos da empresa e os
processos operacionais são criados para suportar a escala (nesse mesmo
momento, ocorre efetivamente a construção ou desenvolvimento da
empresa, com foco no público desejado).

Na Figura 1, a seguir, veja uma síntese dessas etapas.

Figura 1. Processo de customer development.


Fonte: Adaptada de O analista de modelo de negócios (2019).
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De uma perspectiva mais abstrata, Cooper e Vlaskovits (2010) explicam


que o customer development visa a questionar as suposições principais
relativas aos negócios. Isso ocorre por meio da aplicação de um método
científico para a construção de um negócio. As etapas seguidas para o
exercício desse questionamento são semelhantes às do método científico:
observação e descrição de um fenômeno; formulação de uma hipótese causal
para explicar o fenômeno; utilização de uma hipótese para prever os resul-
tados de novas observações; mensuração do desempenho previsto com base
em testes experimentais. Dessa forma, há um processo mais sistemático de
suposição e testagem que leva a definições mais seguras para a organização.

O customer development não deve ser visto como uma composição de padrões inflexí-
veis, mas como um caminho passível de adaptações com foco na melhor adequação
aos interesses dos clientes e da organização. Ademais, com o customer development, as
empresas poderão encontrar informações que não desejam, mas que devem encarar
na busca pelas informações almejadas (COOPER; VLASKOVITS, 2010).

Os modelos de negócios complexos e os seus ecossistemas representam um


desafio para o customer development. Tal desafio é devido às interdependências
complexas existentes entre empresa, parceiros, clientes e outros participantes.
Essas interdependências influenciam o que é prioridade nos negócios e aquilo
que precisa ser testado e validado (COOPER; VLASKOVITS, 2010).
Um passo inicial fundamental é desenhar um mapa do ecossistema no
qual o modelo de negócios da empresa está situado. Tal mapa deve conter:

 as organizações envolvidas (fornecedores, distribuidores, parceiros,


concorrentes, financiadores, etc.);
 o valor direto ou indireto, ou seja, o que o cliente vai receber usando o produto;
 o fluxo da moeda, indicando como os processos estão se pagando, isto
é, quem paga quem;
 a distribuição dos produtos, ou seja, os caminhos pelos quais eles chegam
até os usuários finais.
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Um segundo passo é a definição do valor de cada player, ou seja, dos


participantes do ecossistema, tais como clientes, fornecedores, divulgado-
res, distribuidores, etc. É preciso definir como cada um será beneficiado
ao longo do desenvolvimento das atividades e operações. O terceiro passo
se relaciona com o conceito de produto minimamente viável (minimum
viable product — MVP). O MVP é aquele produto desenvolvido com o
menor número de recursos necessários para atingir um objetivo específico.
A ideia é obter um produto de valor significativo, mas sem gastar muito
com a versão oferecida.
Os MVPs também podem ser intermediários ou finais. Os intermediários
minimizam os riscos do modelo de negócios mais alinhado, que utiliza, por
exemplo, reuniões pessoais relativas ao problema sendo resolvido. Já o MVP
final é uma versão final do produto; ela pode ser utilizada, mas ainda requer
aprimoramento. Assim, os primeiros testam componentes de alto risco, en-
quanto os segundos testam o modelo de negócios como um todo, na proposta
de valor oferecida.
O quarto passo trata-se de avaliar se há riscos de que o produto não se
alinhe à demanda dos clientes. Afinal, as restrições são um dos principais
fatores a serem avaliados no sentido de estabelecer os esforços para o custo-
mer development. Isso ocorre porque, quanto mais cedo os problemas forem
identificados, mais chances haverá de realizar ajustes e aprimoramentos
visando ao sucesso. Como quinto e último passo, é criado o caminho de
valor, ou seja, a jornada da descoberta do cliente: chega-se ao MVP final
proposto, que inclui os MVPs intermediários e as principais premissas a
serem testadas na interação direta com o cliente. Por meio da tabela de riscos
criada, devem ser mapeadas as suposições principais a serem testadas para
cada fator de restrição identificado.

3 As metodologias product development


e customer development
Tanto a metodologia product development quanto a customer development focam
o desenvolvimento daquilo que será entregue ao cliente final. De um lado, o foco
está no desenvolvimento do produto em si; do outro, o objetivo também é o desen-
volvimento do produto, mas o foco está no cliente e naquilo que ele espera. Dessa
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forma, tem-se um movimento duplo, no qual se olha para a demanda do cliente e


também para o produto em si, em busca de alinhamento entre essas metodologias.
Cooper e Vlaskovits (2010) destacam que o customer development e o
product development, apesar de serem processos distintos, são também inter-
-relacionados e interativos. Eles são aplicados (como você pode ver na Figura
2, a seguir), em lean start-ups (“start-ups enxutas”). Esse tipo de start-up
busca combinar metodologias de desenvolvimento rápidas e interativas com
princípios de desenvolvimento do cliente. A equipe relacionada ao customer
development testa as suposições relativas a quem são os clientes, ao problema
que eles querem que seja resolvido e à possível solução. Já a equipe de product
development efetivamente cria a solução.
O product development é uma metodologia que possibilita a concepção de
planos de negócio detalhados, com pontos de verificação e metas controladas
em cada etapa, até a saída do produto (verificando as dimensões dos mercados
e das vendas). Nessa metodologia, são priorizados os recursos do produto. A
engenharia se concentra na construção do produto, projetando-o, especificando
a sua primeira versão e contratando uma equipe para construí-lo. Também
são produzidos gráficos detalhados de métodos de caminhos críticos, com
marcos importantes para estimar datas de entrega e custos de desenvolvimento
(BLANK, 2006; BLANK; DORF, 2012).

A metodologia product development pode ser utilizada no desenvolvimento de ve-


ículos, mais especificamente na aplicação da engenharia simultânea, ocorrida em
duas montadoras. Nessa aplicação, dois times de montadoras diferentes trabalharam
focados no desenvolvimento de um mesmo produto, baseando-se no projeto de
veículo concebido (ZANCUL; MARX; METZKER, 2006).

A partir de agora, você vai ler sobre a inter-relação entre as metodologias


customer development e product development em lean start-ups. Para começar,
observe a Figura 2, a seguir, que ilustra essa inter-relação.
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Figura 2. Inter-relação entre customer development e product development em lean start-ups.


Fonte: Adaptada de Cooper e Vlaskovits (2010).

Do lado esquerdo da Figura 2, está a equipe de customer development, que


atua nos testes de suposições para identificar quem são os clientes. Esse processo
envolve um problema, que é composto por subelementos: núcleo de solução do
problema do cliente, suposições, posicionamento e aquisição. Esses elementos se
relacionam com o cliente, como indica a seta apontando para o centro da figura.
Do lado direito, está a equipe de product development, que atua na criação
efetiva da solução para o problema do cliente, que foi identificado pela outra
equipe. Dessa forma, está em jogo a solução, como indica a Figura 2. Ela é
composta pela plataforma que será utilizada no processo, pela arquitetura dessa
plataforma e pelos recursos disponíveis. Tais elementos se direcionam para o
centro da figura, onde está o produto. No centro propriamente dito da figura,
está o feedback, que pode levar aos clientes ou ao produto. A partir daí, se inicia
novamente um caminho de problema e solução e um processo de validação.
No processo de criação da solução, o product development recebe infor-
mações dos clientes de forma indireta, via customer development, e mede
mais diretamente o uso do produto quando possível. Dessa forma, o product
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development consegue se inteirar sobre o produto de maneira contínua. Esse


processo permite que novas ou diferentes funcionalidades sejam liberadas
para o cliente o mais rápido possível.
Adicionalmente, o customer development recebe informações dos clientes
de maneira indireta, por meio de relatórios do product development que tratam
do uso dos recursos. Ademais, são produzidas informações sobre processos
e análises de customer development. A partir disso, o customer development
repete as principais premissas comerciais, verificando a funcionalidade do
produto, bem como as premissas de aquisição e conversão, que resultam das
hipóteses atualizadas. Também são aprimoradas mensagens de posicionamento,
dados sobre necessidade de recursos e táticas de marketing e vendas.
Reinertsen (2009) destaca que a ortodoxia em product management implica
usar o controle centralizado. Para isso, são criados os escritórios de geren-
ciamento de projetos e os sistemas de informação centralizados. Esse foco
evidencia que a eficiência é mais valorizada do que o tempo de resposta, o que
é visto pelo autor como um erro, dado o papel relevante do feedback rápido, que
permite que a organização se adapte de forma eficiente à imprevisibilidade.
Os modelos de customer development podem ser discutidos em três níveis
(COOPER; VLASKOVITS, 2010). O primeiro nível trata de uma compreensão
filosófica centrada em uma lição fundamental, o exercício de questionamento
das suposições, no sentido de ampliar a visão para uma multiplicidade de
ideias e possíveis caminhos diferentes do esperado. O segundo nível trata da
aplicação dos princípios do customer development ao negócio, ou seja, é um
teste de premissas para verificar se há uma solução para o problema do cliente.
Tal teste é um grande desafio, que pode ser facilitado por meio do uso de
um modelo de negócios já estruturado inicialmente. Assim, as suposições
podem ser testadas considerando os produtos e clientes e buscando uma cor-
respondência. Entretanto, a complexidade do modelo de negócios, bem como
o ecossistema de negócios em questão, dificulta o desafio de alinhamento. Na
medida em que se avança na avaliação de cada questão específica, é possível
verificar a amplitude da dificuldade a ser contornada.
Por fim, o nível três trata da aplicação dos passos do customer development
ao modelo de negócios. Caso sejam bem compreendidos, esses passos podem ser
conduzidos com êxito. Nesse processo, é realizado o passo a passo de descoberta
do cliente, conforme as informações disponíveis, sistematicamente coletadas. Vale
salientar que, devido à complexidade da configuração do customer development,
esse processo não ocorre em um instante, mas toma bastante tempo e exige de-
dicação para o refinamento até que esteja finalizado. Nesse sentido, enquanto a
organização está no processo de conceber uma estrutura baseada nas premissas
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do customer development, outros processos correm em paralelo, entre eles os de


product development, marketing e vendas (COOPER; VLASKOVITS, 2010).
Steve Blank afirma que, quando propôs a metodologia product development,
pretendia contemplar as start-ups (BLANK; DORF, 2012). Entretanto, a enge-
nharia ágil acabou se tornando o método preferido de product development.
Dessa forma, como um método iterativo e incremental, o product development
acabou demandando um processo paralelo para fornecer feedback rápido e
contínuo ao cliente. A partir disso, o autor propôs o customer development,
articulado nas quatro etapas que você viu anteriormente.
Blank e Dorf (2012) destacam que, no final do século XX, as start-ups
optaram pela metodologia product development, acreditando que ela as con-
duziria pelo caminho correto na sua jornada inicial. Esse processo, além do
desenvolvimento de produtos, envolvia o lançamento e o gerenciamento do ciclo
de vida desses produtos. Tais etapas eram quase idênticas àquelas ensinadas
nas escolas de negócios para aplicação em grandes empresas.
Como os autores ressaltam, essas etapas fornecem planos de negócios
detalhados, com pontos de verificação e metas para cada fase da entrega de
um produto (realizando o dimensionamento de mercados, estimando vendas,
desenvolvendo documentos de requisitos de marketing e priorizando os recursos
do produto). Entretanto, há uma questão crucial: tanto nas empresas pequenas
quanto nas empresas grandes (e mesmo nos gigantes corporativos), há um
número de quase 100% de falhas a cada 10 produtos. Isso se aplica a todas as
categorias de produtos, mesmo com bons financiamentos, sejam de alta ou
baixa tecnologia, oferecidos on-line ou off-line. Blank e Dorf (2012) destacam
que, mesmo com falhas semelhantes ocorrendo ao longo de décadas, ainda há
surpresa por parte dos investidores diante da falha de um empreendimento
no momento de execução do plano de negócios. Além disso, os investidores
seguem confiando no mesmo processo de introdução dos produtos.
O problema está no fato de que as start-ups, ao utilizarem o product de-
velopment, estão utilizando ferramentas apropriadas a cenários nos quais o
negócio é conhecido. Entretanto, esse não é o tipo de cenário das start-ups, que
se caracterizam pela imprevisibilidade. Dessa forma, a sua busca por construir
um caminho de sucesso deve partir de outra metodologia. Por esse motivo, os
processos tradicionais voltados ao gerenciamento e à introdução de produtos
são descartados, e se busca uma combinação entre o product development e
o customer development, como você viu nas fases de descoberta e execução
ilustradas na Figura 1. Só assim é possível testar e utilizar um modelo de
negócios que permita desvelar as incógnitas (BLANK; DORF, 2012).
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Como pontos de sincronização entre o customer development e o product


development, Blank (2006) destaca que deve haver um consenso entre as duas
equipes sobre a descoberta do cliente, a validação do cliente, a criação do
cliente e a criação da empresa, para só então o projeto avançar. No processo
de descoberta do cliente, o foco da equipe de customer development deve ser
a validação das especificações do produto. Somente se os clientes concor-
darem que não há um problema efetivo a ser resolvido, a equipe de product
development se reúne e adiciona ou refina recursos ao produto.
O autor destaca que, na descoberta do cliente, caso este comente a respeito da
necessidade de novos recursos ou modificações no produto, parte da equipe de pro-
duct development deve se deslocar para ouvir tal comentário antes de desenvolver
o que é demandado. Blank (2006) ressalta ainda que, na validação do cliente, os
principais membros da equipe de product development devem atuar como parte
da equipe de suporte de pré-vendas junto aos clientes. Finalmente, na construção
da empresa, a equipe de product development faz instalações e oferece suporte
ao produto inicial, ao mesmo tempo em que treina a equipe de suporte e serviço.

A empresa Easy Taxi combinou as metodologias product development e customer


development. O seu empreendedor criou um protótipo do serviço recebendo direto
no seu e-mail o pedido do usuário e buscando um carro disponível. Quando viu que
havia demanda, partiu para o desenvolvimento do aplicativo (CARVALHO, 2015).

Novos contextos e novas configurações de negócios e mercados demandam


que processos tradicionais sejam repensados e ajustados diante de desafios
contemporâneos. Como você viu, o contexto no qual as start-ups atuam é
considerado bastante instável. Dessa forma, a estruturação desses negócios
deve ser flexível e ajustável aos desafios constantes enfrentados. A metodologia
customer development permite que rápidos feedbacks possam vir dos clientes,
visando ao ajustamento e à entrega de acordo com a demanda apresentada.
As formas tradicionais de gestão não precisam ser superadas ou esquecidas,
mas repensadas conforme o perfil de cada negócio e contexto. Insistir em
modelos de gestão rígidos em contextos de mudança não é uma decisão segura,
dado que há grandes chances de isso levar a falhas ao longo dos processos.
Por conta das adaptações necessárias, as metodologias product development
Customer development 13

e customer development são utilizadas de acordo com o perfil do negócio, ou


mesmo podem ser combinadas em diferentes etapas do desenvolvimento de
um produto, com vistas a atender mais rapidamente às demandas dos clientes.
Fundamentalmente, compreender as características dos negócios contempo-
râneos, como as start-ups, e identificar o momento em que as metodologias de
gestão surgem, bem como as finalidades que buscam atender, permite entender
melhor a dinâmica de mudança e desafio na qual os negócios estarão sempre
envolvidos. Afinal, muitos fatores externos sempre interferem nas relações
comerciais. Ao longo deste capítulo, você pôde se familiarizar com a discussão
em torno do perfil das start-ups e estudar configurações tradicionais e modernas
de condução dos processos de desenvolvimento de produtos. Como você viu, é
necessário atentar às exigências do mercado, que está cada vez mais globalizado.

No YouTube, há diversos vídeos interessantes sobre a metodologia customer deve-


lopment. Procure o vídeo “Desenvolvimento do Cliente ou Customer Development
- Giovanna Baccarin - Mentora - Autora”, do canal Giovanna Baccarin, para conferir
uma aula com exemplos práticos sobre o tema.

BLANK, S. The four steps to the epiphany: successful strategies for products that win.
New Jersey: Wiley, 2006.
BLANK, S.; DORF, B. The startup owner’s manual: the step-by-step guilde for building a
great company. [S. l.]: K&S Ranch Publishing, 2012.
CARVALHO, R. Lean startup: entenda a metodologia usada pela Amazon, Facebook
e Zappos. In: NA PRÁTICA.ORG, 2015. Disponível em: https://www.napratica.org.br/o-
-que-e-lean-startup/. Acesso em: 29 abr. 2020.
COOPER, B.; VLASKOVITS, P. The entrepreneur's guide to customer development.
Newport Beach: Cooper-Vlaskovits, 2010.
ORLICKAS, E. Modelos de gestão: das teorias da administração à gestão estratégicas.
Curitiba: InterSaberes, 2012.
REINERTSEN, D. G. The principles of product development flow: second generation lean
product development. Redondo Beach: Celeritas Publishing, 2009.
14 Customer development

RIES, E. A startup enxuta: como os empreendedores atuais utilizam a inovação contínua


para criar empresas extremamente bem-sucedidas. São Paulo: Lua de Papel, 2012.
UNILEVER. Leadership lessons from our customer development team. London: Unilever,
2020. Disponível em: https://www.unilever.com/careers/our-teams/customer-develo-
pment.html. Acesso em: 29 abr. 2020.
ZANCUL, E. S.; MARX, R.; METZKE, A. Organização do trabalho no processo de desen-
volvimento de produtos: a aplicação da engenharia simultânea em duas montadoras
de veículos. Gestão & Produção, v. 13, n. 1, jan./apr. 2006. Disponível em: https://www.
scielo.br/scielo.php?pid=S0104-530X2006000100003&script=sci_abstract&tlng=pt.
Acesso em: 29 abr. 2020.

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun-
cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a
rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de
local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade
sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.

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